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1 GT 16 Economia Social e Solidária Alternativas de Trabalho e Mobilização Coletiva Economia solidária, políticas culturais e cidadania: O encontro da ‘loucura’ com a arte Marilia Verissimo Veronese Docente e pesquisadora no Programa de Pós-graduação em Ciências Sociais Universidade do Vale do Rio dos Sinos (UNISINOS)

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GT 16 Economia Social e Solidária Alternativas de Trabalho e Mobilização Coletiva

Economia solidária, políticas culturais e cidadania:

O encontro da ‘loucura’ com a arte

Marilia Verissimo Veronese

Docente e pesquisadora no Programa de Pós-graduação em Ciências Sociais

Universidade do Vale do Rio dos Sinos (UNISINOS)

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1 INTRODUÇÃO

O texto aborda a articulação entre economia solidária, o binômio cultura/arte e a produção de

cidadania e autonomia entre sujeitos em situação de sofrimento psíquico, de vivência do que

chamamos de “loucura”. Trata, conforme refere Vilutis (2011), da dimensão simbólica da vida social,

da dimensão da cultura como criatividade, como recurso e ainda como um direito de cidadania. Trata-

se de uma pesquisa em fase bastante inicial, ainda exploratória, e a apresentação visa justamente seu

aperfeiçoamento, decorrente da publicização e discussão a serem proporcionadas pelo GT.

A dimensão da cultura que pode produzir vivências cidadãs é pensada na perspectiva da superação da

exclusão social e do combate às desigualdades. Busca-se identificar e minorar os efeitos perversos e

deletérios das múltiplas formas de desigualdades e discriminações, reforçando o potencial da

criatividade humana e estimulando o pertencimento a grupos e comunidades engajados em processos

de resgate da cidadania.

A proposta deriva de ampla contextualização empírica e teórica através de investigações anteriores,

dando continuidade aos projetos de pesquisa intitulados “Em busca das epistemologias do Sul: saberes

sobre a vida coletiva entre grupos ‘subalternos’” (executado de 2010 a 2013), e “Inquirindo as

epistemologias do Sul: saberes e práticas sociais entre catadores de material reciclável” (2014-2016).

Há um fio condutor que pretende realizar o que Boaventura de Sousa Santos denomina de sociologia

das ausências e emergências, bem como a compreensão do que significam as epistemologias do Sul

e os grupos sociais que as produzem, localmente. As sociedades modernas possuem uma característica

de serem abissalmente dividas entre os que têm e os que não têm acesso a bens simbólicos e materiais,

portanto entre quem é plenamente cidadão e quem não é, ou é de uma categoria “inferior” e

desqualificada; tal é a proposição das linhas abissais e do pensamento abissal. (SANTOS, 2002;

2006; 2009). Toda a experiência social produz e reproduz conhecimento e pressupõe uma

epistemologia, um modo de conceber as coisas e os pressupostos sobre o que conta como conhecimento

válido (SANTOS E MENESES, 2009). Não há conhecimento sem práticas e sem atores sociais

engajados em produzi-las, sendo que os saberes estarão na base das práticas sociais, das relações em

todas as esferas da vida. Não se entende o saber numa dimensão exclusivamente cognitiva, mas

incluindo os saberes do corpo, dos afetos e da prática vivida e relacional.

Essa espécie de fio condutor, ou articulador teórico-metodológico central das pesquisas acima citadas,

foi o de conhecer e compreender “as vozes do mundo”, sua diversidade de perspectivas (Santos, 2009)

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e, através da compreensão e difusão de suas lógicas e saberes, contribuir através da pesquisa social

participativa no entendimento e no combate às desigualdades.

Na primeira pesquisa citada, ouvimos as vozes de quilombolas, indígenas, ativistas comunitários e

pescadores artesanais (Veronese, 2012; 2013); na segunda, as dos catadores de materiais recicláveis

urbanos (Veronese, 2015 e 2016). Mantendo o princípio de “pesquisar com” e não “pesquisar sobre”,

estaríamos trabalhando com as vozes dos sujeitos da experiência da loucura, grupos que utilizam a

produção cultural e artística – que tem sua dimensão econômica, daí a articulação com a economia

solidária – para superar o sofrimento, a dissolução de suas identidades e a discriminação social. A

reforma psiquiátrica brasileira efetuou uma série de mudanças na atenção à saúde mental, com a ideia

do cuidado em liberdade, e tais grupos se formaram nessa perspectiva. E são essas são as “vozes” em

foco no projeto de pesquisa, já em andamento, que gera este texto.

3 PROBLEMÁTICA E MARCO TEÓRICO-CONCEITUAL

À riqueza de emergências de experiências que articulam cultura e saúde mental, subjaz uma

racionalidade que busca legitimar e difundir as chamadas alternativas sociais, nesse caso vinculadas

geralmente à reforma sanitária e à mudança das práticas de cuidado em saúde, em curso desde os anos

de 1980.

Conforme referem Lopes et al (2010), existem na região sul do Brasil algumas experiências desse teor,

a exemplo do CAPS Nossa Casa, na cidade de São Lourenço do Sul-RS, pesquisado pelos autores; lá

ocorrem oficinas de artes plásticas e geração de renda, e os produtos feitos pelos usuários são

comercializados em feiras de economia solidária. Também participam de um programa de rádio

semanal, supervisionados por acompanhante terapêutico. A lógica da inserção dos “loucos” dos

processos artístico-culturais é a de “libertar subjetividades” (Souza; Couto; Freitas, 2010, p. 205), ou

seja, escutar e valorizar o sujeito em sua singularidade, proporcionar contínuas inserções no território

urbano (filmes, discussões, palestras, festas, eventos variados, atividades culturais) para problematizar

a experiência da loucura e sua relação com a comunidade em geral.

A reflexão gravita entre três eixos temáticos: a economia solidária, a cultura/arte e a associação de

sujeitos com sofrimento psíquico, que no âmbito da reforma psiquiátrica estão em busca de sua

autonomia e ampliação de sua cidadania antes tutelada e marcada pela segregação e estigma

(AMARANTE, 1995).

Recentemente, estudos importantes foram produzidos na temática da Reforma Psiquiátrica e da

reabilitação psicossocial, no contexto da articulação entre as políticas da Saúde Mental e da Economia

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Solidária, a exemplo de Pacheco (2013), Andrade e Costa-Rosa (2014), Martins (2014) e Santiago e

Yasui (2015), sendo a intenção nesta pesquisa articular tal discussão com a noção de cultura,

procurando compreender a complexa polissemia do termo.

As epistemologias do Sul (este entendido como uma metáfora do sofrimento humano causado pelas

relações coloniais predatórias, pela exclusão, exploração e ocultação produzidas por efeito do

colonialismo, do capitalismo e do patriarcado) remetem a existências culturais, que produzem habitus,

comportamentos, valores (SANTOS; MENEZES, 2009). Trabalha-se na perspectiva dos saberes e

práticas cotidianamente produzidos e intercambiados como produção de subjetividade, sendo esta

entendida enquanto fronteira entre o psicossocial e o cultural, a um tempo categoria analítica e

realidade empírica. Nesse processo, a mediação semiótica desempenha um papel fundamental, pois

além de constituir as funções psicológicas superiores, possibilita a socialização e a individuação do

sujeito inserido em uma determinada cultura (JOVCHELOVITCH, 2008; JOVCHELOVITCH;

PRIEGO-HERNANDEZ, 2013). Para Nunes e Torrenté (2013, p. 2861), a relação se dá no âmbito

antropológico:

Na antropologia contemporânea são cartografadas interfaces entre as culturas e os sujeitos. Assim, os sujeitos têm acesso ao mundo através de um conjunto de práticas incorporadas (analisado, por Bourdieu, através do conceito de ‘corpo socialmente informado’), as culturas intermediam construções de pessoa particulares, a subjetividade é forjada e modificada em interações intersubjetivas e institucionais (Goffman descreve magistralmente o processo de despersonalização forjado no seio de instituições totais).

Existem arranjos grupais e produtivos que envolvem, ao mesmo tempo, cultura autogestionária e

produção artístico-cultural. Segundo Vilutis (2009; 2011), da mesma forma como a cultura pode ser

pensada a partir de uma perspectiva de produção e mediação semiótica, direito e cidadania, de “sujeitos

culturais atuantes”, a economia solidária trabalha com uma dimensão da economia que vai para além

do binômio produção/consumo.

Para Gaiger (2016), inspirado na visão de Karl Polanyi em seu artigo “Our obsolete Market mentality”,

publicado em 1947, o problema da nossa civilização não é econômico, mas sim justamente o desafio

de abandonar a dimensão econômica como fonte de resolução de todas as mazelas sociais. É preciso

superar a obsoleta crença no determinismo econômico, que se apresenta através da supremacia da

racionalidade de mercado capitalista. Urge valorizar outros sistemas de vida, outras formas de

subjetivação, modos não mercantis e não utilitaristas de existência social, baseadas, sobretudo, em

vínculos sociais. É a isso que a pesquisa em economia solidária se propõe, em termos gerais,

“escavando” presente e passado em busca de práticas alternativas às da ortodoxia econômica. A

ortodoxia científica mantém o equívoco da obsessão pelo produtivismo e crescimento econômicos

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como resolução dos problemas sociais, sendo que outras perspectivas que tragam maior reciprocidade,

equidade e bem-estar humanos podem ter seu espaço ampliado numa racionalidade que possa gerar

uma sociedade e uma economia plurais (LAVILLE, 2009).

As atividades econômicas conduzidas por iniciativas de cidadãos, consumidores e produtores,

organizadas por princípios comunitários, autogestionários, cooperativos, de solidariedade e

sustentabilidade constituem o campo social da economia solidária. Obviamente que se tratam aqui de

princípios normativos, que se alcançados por esses coletivos, o são em graus muito distintos; não se

pode idealizar o conceito de empreendimento econômico solidário, ademais um construto de tipo-

ideal, não uma constatação empírica real. São grupos informais, associações de vários tipos,

cooperativas populares, redes e clubes de trocas, bancos populares, experiências de moeda social,

comércio justo, produção agroecológica, comunidades produtivas autóctones, serviços de

proximidade, pequenas empresas autogestionárias, empresas recuperadas etc. (GAIGER E LAVILLE,

2009).

Nesse sentido, o estudo dos modos não exclusivamente mercantis de disposição de recursos

necessários para a vida que constituem a economia solidária é uma forma de sociologia das ausências

e emergências e de combater o desperdício da experiência social. Tal desperdício ocorre quando

experiências dotadas de múltiplas riquezas culturais – e algum potencial econômico, eventualmente -

são invisibilizadas, tornadas “não-existentes” (inclusive por sua desqualificação, quando não pela sua

supressão pura e simples).

São cinco as lógicas de produção das não-existências identificadas por Santos (2006), que constituem

monoculturas nas dimensões epistemológica, temporal, de classificação social, escalar e produtiva.

A sociologia das ausências coloca a necessidade de por em questão cada uma dessas lógicas, propondo

substituir a monocultura do saber científico por uma ecologia dos saberes, que possibilite a disputa

epistemológica entre diferentes saberes; não há ignorância em geral, a não ser relativa a certo saber.

São cinco, consequentemente, as principais formas sociais de não-existência que assume aquele sujeito

ou grupo social que foi excluído como alternativa credível, como possibilidade de presença

reconhecida e respeitada na esfera pública. Então, o não-existente será o ignorante, o residual, o

inferior, o local e o improdutivo.

Eventualmente, os sujeitos que se inserem nas experiências de associativismo no âmbito da superação

do modelo manicomial sofrem todas essas formas de desqualificação, por serem pobres, considerados

“irracionais”, incapacitados e violentos, com baixa escolaridade e residirem em periferias. Não há,

portanto, condições de possibilidade de igualdade entre saberes científicos e os saberes dos grupos

deles apartados: há uma grande desigualdade social no campo cognitivo-expressivo. Privilégios extra

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epistemológicos são conferidos aos que produzem e acessam o saber científico ou acadêmico, e a

desqualificação costuma acompanhar os excluídos dessa possibilidade.

No caso desta reflexão, interessa identificar e compreender os saberes e práticas sociais produzidos

por grupos de pessoas consideradas “inferiores” na lógica hegemônica de hierarquização do

conhecimento e do reconhecimento social. Atores que se encontram invisibilizados pela sua

condição de “inferioridade” naturalizada socialmente. Para Meneses (2009, p. 235),

Pensar a descolonização da economia requer necessariamente o reconhecimento de que não há justiça social global sem justiça cognitiva global, que assenta na busca de um tratamento igualitário de todas as formas de culturas e saberes e daqueles que o possuem e praticam, abrindo o campo acadêmico à diversidade epistêmica do mundo. Esse apelo à descolonização requer a identificação de processos mediante os quais a epistemologia e a racionalidade hegemônicas produzem a “ausência” de saberes, ao mesmo tempo em que se procura conceptualizar a criação de um novo tipo de relacionamento entre os saberes do mundo.

Segundo Fontes (2009), não existe uma “fórmula mágica” para combater a exclusão e desqualificação

sociais dos considerados loucos. A segregação resulta de representações do outro ancoradas em

preconceitos profundamente arraigados na mentalidade das pessoas. Preconceito e exclusão somente

são possíveis de serem combatidos quando a “vítima” de preconceito é introduzida no contato social

com outras pessoas, quando estas percebem que muitas das visões que têm dos estigmatizados não são

verdadeiras (por exemplo, que os “loucos” são violentos e perigosos, que não conseguem ter uma vida

social, que são incapazes para o trabalho).

Segundo Coneglian, Cavalcante e Leandro (2015), a Reforma Psiquiátrica Brasileira tem como núcleo

basilar de seus pressupostos o resgate da cidadania dos usuários do sistema de saúde mental. Ela

não é somente um projeto de mudança nos serviços de assistência para as pessoas com transtorno

mental, mas se constitui uma nova forma de olhar para esses sujeitos. Paulo Amarante destaca três

dimensões do processo de Reforma Psiquiátrica, que seriam as seguintes: a) dimensão teórico-

conceitual ou epistêmica que concentra a necessidade de revisar os conceitos tradicionais da

psiquiatria, que coloca a doença como foco, esquecendo o sujeito do processo saúde-doença; b)

dimensão sociocultural, que propõe modificar as representações sobre a loucura, o manicômio, a

exclusão e o preconceito; c) a dimensão técnico-conceitual, que envolve a revisão da assistência e dos

serviços de cuidado à saúde mental. (AMARANTE, 2009).

Assim, a Reforma Psiquiátrica propõe o cuidado em liberdade, em serviços de assistência, nos moldes

dos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), nas comunidades, resgatando a cidadania antes

suprimida. Pois essa é justamente a lógica da inserção dos grupos de usuários da reforma psiquiátrica

nas atividades artístico-culturais. É desse modo que voltamos à questão das políticas culturais e da

importância de associarem-se às práticas de cuidado e reinserção em saúde mental as dimensões da

cultura, da arte, da convivência e da ludicidade.

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Segundo Lima e Ortellado (2013), constata-se que o financiamento de atividades culturais está inscrito

em dois paradigmas principais: o financiamento público e o mercantil. Ou seja, ou acontece via ação

direta do Estado, ou da iniciativa privada (que chamam de tradição liberal ou neoliberal, cuja mais

recente expressão seriam as correntes dominantes da chamada economia criativa). A partir da análise

de duas políticas públicas brasileiras – o programa Cultura Viva e a Lei de Fomento ao Teatro da

cidade de São Paulo, os autores argumentam que as experiências podem constituir a gênese de um

terceiro paradigma, que não busca financiar produtos culturais, mas sim o processo de produção

cultural em si, e se orienta para a constituição do direito de produzir cultura como um direito social

dos cidadãos, como parte da cidadania mesma (LIMA; ORTELLADO, 2013).

O Programa Cultura Viva é uma política nacional criada após a institucionalização do Sistema

Nacional de Cultura (PEC 416/2005) e do Plano Nacional de Cultura (lei 12.343/2010). Sancionada

em 2014 pela presidenta Dilma Roussef, a Lei Cultura Viva (lei 13.018/2014) transformou o Programa

Cultura Viva e os Pontos de Cultura (sua ação estruturante mais conhecida), na Política Nacional de

Cultura Viva (BRASIL, 2015). Os Pontos de Cultura são entidades ou coletivos culturais certificados

pelo Ministério da Cultura e formam uma base social capilarizada e com poder de penetração nas

comunidades e territórios, em especial nos segmentos sociais mais vulneráveis (BRASIL, 2015). As

concepções predominantes na criação dos Pontos de Cultura e outras iniciativas de políticas públicas

para populações indígenas, ciganos, comunidade LGBT, quilombolas, religiões afro-brasileiras,

pessoas com deficiência e “loucos”, são vinculadas justamente à ideia de resgate da cidadania e de

ampliação de direitos sociais, inclusive a trabalho e renda (AMARANTE et al, 2012).

Assim, observa-se que o tema da economia solidária percorre de modo transversal o programa Cultura

Viva, e é uma preocupação manifesta em suas diversas ações. Afinal, há uma provável expansão de

capacidades para os sujeitos, que se origina da criação artística e do acesso a bens culturais, que podem

inclusive vir a constituir produtos e serviços culturais, compondo a abordagem da economia da cultura

e da cultura como recurso (YÚDICE, 2002). O autor considera que o papel da cultura se expandiu

como nunca para as esferas política e econômica, ao mesmo tempo em que as noções convencionais

de cultura de certo modo se esvaziaram (YÚDICE, 2006). Essa é uma das perspectivas teóricas a serem

desenvolvidas nesta pesquisa e a proposta é avançar na revisão dos principais autores que a

desenvolvem, como YÚDICE, (2002; 2006), ALMEIDA (2014), VILUTIS (2011, 2015), FLEURY

(2009) E TOLILA (2007).

Outros autores de temas concernentes à pesquisa deverão ser revisados, como Foucault (1978), Hall

(1997; 2005), Goffman, (1988, 2005); Jodelet, (2010); Basaglia (2005), Wacquant, (2004, 2005),

Spivak, (2010), Facina (2010, 2014, 2015) e outros a serem indicados, para estabelecer uma relação

dessas perspectivas com a de Santos, das linhas abissais e das epistemologias do Sul.

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4 CAMPO EMPÍRICO E PROPOSTA METODOLÓGICA TRABALHADO S

O campo empírico proposto se compõe de experiências onde os usuários da rede de saúde mental e

portadores de sofrimento psíquico em geral têm acesso à produção de arte e cultura e vivências

comunitárias vinculantes, dela decorrentes. Diz-nos Paulo Amarante que nessa dimensão sociocultural

ativa, ocorrem importantes dispositivos para a transformação do lugar social da loucura, das relações

entre a sociedade e a loucura. Considerando o impacto e a expressão que os diversos projetos artístico-

culturais recentemente constituídos estão produzindo, é possível, para ele, afirmar que se está

assistindo à constituição de um movimento social cultural como base desse novo campo artístico-

cultural (AMARANTE et al, 2012).

Nos primeiros contatos de campo, destaca-se a participação do grupo da GerAção-POA – Oficina

Saúde e Trabalho, serviço que compõe a rede de atenção psicossocial de Porto Alegre-RS, cujas ações

de promoção da saúde incluem o trabalho como eixo central, como organizador da vida dos usuários,

contribuindo para a sua inclusão social. Um de seus eixos de atuação é justamente a perspectiva da

economia solidária, tendo gerado a Contraponto, loja da Associação de Produtores da Economia

Solidária, espaço em que a GerAção POA comercializa seus produtos. Da antiga concepção de ocupar

o tempo e afastar o ócio, o papel do trabalho na reabilitação social se desloca para o campo dos direitos,

das potências e das capacidades das pessoas que, ao realizá-lo, realizam-se como cidadãos, assumindo

um papel de inserção social ativa e promovendo maior autonomia em suas vidas.

Num primeiro momento do trabalho empírico, a perspectiva do registro de caráter etnográfico

participativo é uma alternativa para a fase de inserção no campo (BAUER; GASKELL, 2002;

BERGER; LUCKMANN, 2001; DUBAR, 2005; MEAD, 1982 GOFFMAN, 2002), prevendo-se a

realização de observações participantes e entrevistas com os sujeitos envolvidos na experiência da

produção cultural/artística, especialmente os usuários dos serviços de saúde mental e integrantes dos

grupos que produzem na lógica do binômio arte/cultura. Como referem Nunes e Torrenté (2013, p.

2861), “uma análise etnográfica crítica tem como intenção desnaturalizar o mundo, evidenciando suas

construções sociais, culturais e políticas”. Desde essa concepção, toda a forma de contato com os

sujeitos será transformada em registro narrativo, o mais denso e completo possível, para gerar uma

análise qualificada, de tipo interpretativo. Norteando o inquérito, a questão de como se define e se

representa para estes sujeitos a sua experiência com a produção artístico-cultural? Que efeitos

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essas vivências têm em suas trajetórias de vida e itinerários pessoais e coletivos na busca por

autonomia?

Também inclui-se nos registros empíricos trabalhados o Bloco Carnavalesco Loucura Suburbana,

com o qual a pesquisadora mantém vínculos. A iniciativa foi criada em 2001 no Instituto Municipal

Nise da Silveira, no Rio de Janeiro. Atuam o ano todo com diversas atividades culturais, mas o ponto

alto é no carnaval, pois as festividades reúnem usuários, familiares, funcionários e moradores do bairro

do Engenho de Dentro e adjacências1. Transpondo os muros do “hospício”, a prática criou um

movimento de integração com a comunidade de entorno, tendo como motivação a maior festa popular

brasileira. O “Loucura”, como é carinhosamente chamado pelos participantes, abre o carnaval do

Engenho de Dentro, resgatando o carnaval de rua do bairro e promovendo mudanças de mentalidade

na comunidade que, participando do seu desfile anual, vê transformar o preconceito contra a loucura

em sentimentos de respeito e desejo de integrar-se. Em 2010 o bloco recebeu a chancela de Ponto de

Cultura , passando a oferecer à rede de saúde mental do Rio de Janeiro e à comunidade atividades

permanentes integradas (BRASIL, 2014).

É deste registro empírico que já disponho de dados coletados, e possibilidades que apontam para uma

potência extremamente relevante desse encontro, da ecosol, arte e “loucura”. Em fevereiro de 2017,

realizei imersão de alguns dias no Rio de Janeiro, numa fase exploratória da pesquisa.

5 ELEMENTOS PRIMEIROS PARA ANÁLISE EMPÍRICA: DIÁRIO DE CAMPO E

REGISTROS FOTOGRÁFICOS.

Desfile do bloco carnavalesco loucura suburbana – 23/02/2017 – diário de campo

Estava me deslocando até o local da concentração do desfile e já via as pessoas saindo de suas casas,

fantasiadas, levando pela mão ou ao colo crianças fantasiadas, mostrando o quanto a comunidade de

entorno participa ativamente do desfile do bloco. Há toda uma preparação, uma produção para que

participem, evidenciando o valor que dão ao evento. As pessoas levam crianças pela mão, de várias

idades, usando diversas fantasias. Muito legal! Como a comunidade de entorno participa mesmo...

A rua foi parcialmente trancada e vigiada pela polícia, que, contudo, tratava respeitosamente a todos

os transeuntes que se aproximavam, como foi meu caso (sabemos que nem sempre é assim...). Na

medida em que me aproximava da concentração, uma espetacular diversidade humana aparecia. De

1 Disponível em: http://loucura-suburbana.webnode.com/ (acesso em 08/1/2017).

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bebês a idosos; de diversas origens étnico-raciais: todas as cores e matizes do branco ao negro; do

estilo estético mais familiar ao mais transgressivo dos “valores tradicionais”; foliões de todas as

origens, trabalhadores da saúde, vendedores de bebidas e comidas acompanhavam o caminhão de som

e os músicos. Ganhei um folheto com a letra do samba e comecei logo a cantar a plenos pulmões:

“Eu sou

O Loucura Suburbana

Ninguém me engana

O verbo é pra resistir (Lutar...)

Lutar

Pelo fim do manicômio

É Carnaval e agora eu vou me divertir

Tô feliz

Vou sambar

30 anos de cultura

A arte pode transformar!”

Cantava em meio à essa diversidade toda e, claro, os usuários dos serviços da saúde mental. Eles são

facilmente reconhecíveis, são visivelmente usuários, possuem as marcas no corpo, na postura, no olhar,

na boca (poucos dentes), na atitude. A tragédia do encarceramento e da falta de cuidados humanizados

em liberdade, a negação de direitos, produziram marcas indeléveis... e algumas, provavelmente

irreversíveis.

São acompanhados por pessoas que os cuidam, com atitude protetora, porém não intervencionista. São

deixados livres. A expressão que me ocorre vendo-os dançar (os que conseguem) foi: corpos livres.

Uns curtem muito, dançam, sorriem e socializam. Outros ficam mais ansiosos e perdidos... Esses vão

de mãos ou braços dados com cuidadores (profissionais da saúde, oficineiros dos CAPS etc). Uns estão

em cadeiras de roda, outros caminham com bastante dificuldade, encurvados para frente. Um deles,

senhor idoso e sorridente me viu olhando para eles e me sorriu bem abertamente. Sorriso de poucos

dentes. Me abanou, me fez sinal de polegar para cima várias vezes. Respondi alegremente com os

mesmos sinais e sorrisos. Me emocionei... lágrimas escorreram. Quem disse que a pesquisa social

expulsa a emoção? Ela é constitutiva da experiência humana e, portanto, da produção de conhecimento,

experiência tão humana quanto qualquer outra. Como diz Boaventura Santos, ela não ameaça o rigor

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no que chama de “novo paradigma, do qual só existem sinais”, e eu acrescentaria “desejos e projeções”.

E algumas práticas, claro.

Fui fotografando e filmando para registrar a riqueza incrível do que via e ouvia. Procurava ultrapassar

a observação ingênua (Bauer e Gaskell, 2002) e adentrar nos sentidos mais profundos daquelas

interações e sociações. Me vem à mente Simmel: aquelas pessoas estão ali para fruir da relação de

alegria e festa carnavalesca. Muitas jamais se veriam novamente até o próximo ano, quiçá nunca mais.

Mas naqueles momentos ocorre uma interação intensa, visceral, cuja finalidade é a relação mesma,

não seus resultados. Dos locais com os forasteiros, como eu, gaúcha tomadora de chimarrão sem ginga

no pé; dos usuários com o povo incrivelmente variado que segue o desfile.

Também têm muitos militantes, a dimensão política - que já está presente no desfile em si - assume

várias formas de manifestação entre os foliões: Tem FORA TEMER (no cartaz de uma usuária, e no

final, chegando de volta ao INS, em coro!), tem luta pela reabertura dos restaurantes

populares/homenagem ao Betinho/carnaval sem fome, tem LBTG, tem pessoal das favelas, tem EES

comercializando e divulgando modos de vida coletivos/autogestionários, e obviamente tem muita coisa

da luta antimanicomal.

Cansada e aproveitando pausa do carro de som (ficou som mecânico, mto bom por sinal), sentei-me

ao lado de um pessoal; uma usuária idosa muito animada, com dificuldade de fala, logo interage. Ela

se comunicava me cutucando e mostrando aquilo que a encantava, especialmente as pessoas com as

pernas de pau, lá no alto... ao lado dela, cuidadosa mas promovendo autonomia, estava Adriana,

oficineira do CAPS da Colônia (Juliano Moreira). Começamos a conversar e ela me concedeu quase

uma entrevista. Falamos da dimensão da tragédia que envolve o que aconteceu com os usuários, a

história da saúde mental no Brasil (país cheio de tragédias, negros, mulheres, índios, crianças, lembra

ela); tantos que não tinham doença mental, mas desenvolveram pelo encarceramento e os maus tratos;

contou-me como funciona o Colônia e me convidou pra visitar. Marquei pra segunda feira. Falou-me

que vários CAPS foram convocados pro desfile e a maioria marcou presença mesmo. Alguns usuários

iam e vinham, falavam com ela e voltavam a dançar alegremente, com expressões de alegria, encanto,

relaxamento, alívio momentâneo das dificuldades de suas vidas. Dei-me conta da extraordinária

importância daquele evento. Quanta coisa num lugar só, em algumas horas de desfile que, certamente,

tomaram muitas outras de preparação prévia de tantas pessoas e grupos.

Certo momento, me incomodou muito a quantidade de latinhas e garrafas de plástico do chão. Anos

de inserção em EES de reciclagem não são ausentes de resultados... reciclo o lixo há mais de 25 anos,

desde que Olívio Dutra implantou em POA a coleta seletiva. Comecei a juntar tudo, mas as mãos

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ficaram cheias e eu não achava uma lixeira (por isso jogam no chão, pensei). Acabei pedindo para um

vendedor de bebidas colocar no plástico que usava como lixo, ao que ele se prontificou. Todos me

pareceram cooperativos e receptivos.

Como adoro criança, Tb me encantava com pequenas mulheres maravilhas, Fridas Khalo, Pedritas,

pequenos batmanzinhos, indiozinhos e outras fofuras. Pensei sobre a importância daquela experiência

para o futuro das crianças que dela participavam, tão cedo na vida. Ri e brinquei com muitas delas,

quase esquecendo que estava fazendo uma observação! O calor nem me incomodava mais.

Voltando à conversa com A., ela conta sobre o trabalho, a tentativa de promoção de autonomia através

da arte e o abandono por parte do sistema de saúde (oficineira foi como ela se denominou, junto com

o colega que a acompanhava, Emerson). Relata que o material das oficinas vem do bolso dos

oficineiros e de algumas doações. Pergunto se as oficinas tem a perspectiva da geração de renda, e ela

disse que todas têm. Só dificulta a falta do material adequado pra preparar coisas mais

comercializáveis. “A saúde mental só recebe alguma verba pra trabalhar se sobrar”, relata. Atua no

CAPS Arthur Bispo do Rosário, no bairro da Taquara, RJ. Vou visitar ainda nessa pequena temporada,

pensei, ou perco o gancho. Enquanto conversava com ela ainda chorei algumas vezes. Impossível ficar

impassível diante de tragédias, de dramas tão intensos. Mesmo em meio à alegria, cor e música. Mesmo

em meio à incrível beleza daqueles momentos.

A usuária idosa ficou ao nosso lado o tempo todo, olhando tudo e mostrando com entusiasmo os artistas

nas pernas de pau, o que mais a encantou, vê-los tão altos!, como podia?! Ela sorria e apontava,

emitindo sons que expressavam o espanto e admiração. Não conseguia usar a fala para se expressar...

mas estava alegre e LIVRE. Dançava e rodopiava; depois vinha se apoiar no muro e na Adriana.

Conversei muito com a Adriana, a oficineira do CAPS Arthur Bispo do Rosário. Que pessoa bonita,

amorosa. Dedicada à militância e ao trabalho no CAPS. E também informante a me introduzir no

campo empírico por ela mencionado e descrito. E foi o que fez. Visita combinada! Conversamos uns

30 minutos, no mínimo.

Conta das dificuldades, da falta de material e de verba para diversificar e ampliar o trabalho, “pra saúde

mental só se sobra $, e não sobra!”. Adriana me apresenta Anderson, também oficineiro. Os usuários

gostam dos dreads dele, acham graça e demonstram proximidade e confiança com ambos, pedindo

orientações de vez em quando.

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Depois de interagir com mais usuários, crianças, foliões, cantar, dançar, descobrir EES até de cerveja

artesanal e provar uma feita na favela da Maré, nos despedimos e sigo seguindo o bloco. Já está escuro,

o trajeto recomeça de volta ao ponto de partida.

Na chegada, teve FORA TEMER, gratidão à comunidade, pessoas felizes e contentes com a fruição

daquele momento incrível. Cada uma a seu modo, e os modos são muitos. Singularidades animadas

por um coletivo potente e que por sua vez o potencializam a cada ação. Experiência difícil de descrever,

tal a sua intensidade. Tive certeza que queria conhecer muito mais, entrevistar mais gente, voltar ali e

visitar tudo.

Visita ao CAPS Arthur Bispo do Rosário – 24/2/17 – Taquara/Colônia, RJ. Diário de campo

O calor está demais. Chega a doer. Tento me informar da melhor forma de chegar ao CAPS do bairro

do Grajaú. Me disseram na rua onde é a parada de ônibus para chegar a Jacarepaguá, entro no primeiro

que diz “Taquara”. Falo no CAPS, no Museu. Ninguém conhece... me ajudam, tentam orientar,

cobrador e duas passageiras. Solidariedade já no trajeto de ida, converso com eles. Vou monitorando

o Uber, pois faz um calor terrível dentro no ônibus, são 13:20 da tarde, é quase insuportável. A vista

compensa, lindo o trajeto da estrada Grajaú-Jacarepaguá, depois Pau-ferro, que os locais chamam de

“subir e descer a serra”.

Penso que quase todo mundo ali naquele ônibus não tem a opção que eu tenho, descer e ir no ar

condicionado do Uber até o destino final... devia ter ar condicionado em todos os ônibus! Quando

começa a dar 20 reais, salto e chamo um. Ele me deixa no Museu Arthur Bispo do Rosário, está tudo

meio ermo em véspera de feriadão/carnaval. O sol queima, tem de se abrigar dele. Entro, fotografo,

olho... os guardas dizem que está fechando, que não tem exposição, que não pode subir, me expulsam

educadamente. Reclamo que foi difícil chegar até ali e pelo menos uma olhada geral vou dar.

Fig. 1- Museu Arthur Bispo do Rosário. Rio de Janeiro. Foto da pesquisadora.

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Ensinam-me o caminho do CAPS, vou a pé... fizeram uma obra para a Copa do Mundo de 2014 que

criou um elevado, agora para pedestre passar tem de passar por um túnel (meio psicodélico para entrar

no clima, penso) e caminhar um pouco.

Fig. 2 – Túnel sob o elevado que leva ao CAPS. Foto da pesquisadora.

O CAPS aparece logo à direita de quem vai; cenário bucólico, no meio do mato, lugar bonito. Na

frente tem um campo de futebol, aberto, com duas goleiras. Bem simples, mas grande. Depois saberia

que ali equipes de jovens treinam e às vezes os treinadores convidam os usuários para brincar, jogar

bola junto com eles.

Fig. 3 – Chegando ao CAPS, a vista. Foto da pesquisadora.

A presença da arte é visível nas paredes pintadas/decoradas, por todo lado. Arthur Bispo do Rosário é

figura recorrente, o inspirador daquele lugar, aparece em pinturas, fotos... lugar que realmente parece

à primeira vista respirar arte. Os oficineiros Adriana e Émerson, como pude constatar, estão a frente

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disso. Uma equipe amorosa pode muito diante da adversidade... Falta cola, falta tinta, falta material de

todo tipo, mas eles arrumam o que podem com doações, campanhas, ou pagam do próprio bolso.

Figs. 4 e 5 – Muro decorado, sala da oficina de artes. Fotos da pesquisadora.

Entro, cumprimento... pessoas sentadas (visivelmente usuários) na sala da frente, de espera. Um se diz

“enfermeiro”, mas percebo que é usuário e levo na brincadeira... pergunto onde ele é enfermeiro e

conversamos sobre o hospital imaginário dele. Chega uma técnica do local e interrompe. Me dizem

que posso entrar e ficar à vontade, então me dirijo ao pátio e encontro o Anderson com 4 usuários,

ensinando a fazer pulseiras de fios coloridos.

Eles me acolhem alegremente e começo a conversar após as apresentações. Um lê a bíblia e mal fala;

dois desenham e um enfrenta seriamente o desafio de tecer a pulseira, pacientemente orientado por

Anderson. Pergunto sobre a geração de renda, e eles me contam da “lojinha”, da tentativa de fazer o

artesanato virar renda para eles. Essa renda, contudo, acaba sendo parcialmente encaminhada para

comprar mais material, ficando pouco pra eles. Vejo o que eles chamam de lojinha, umas prateleiras

com vidro onde ficam expostos os trabalhos, e acho tão singela. Lamento que seja ainda precária, e

não esteja cumprindo um papel mais importante como efetiva geração de renda e consequente maior

autonomia.

Os usuários parecem gostar muito do Anderson, que é carinhoso, compreensivo, animador, me parece

excelente no manejo com eles. Peço para gravar um pouco da fala dele, permite imediatamente. Fala

da oficina de artes, das garrafas decorativas, cestas de palito de picolé, mandalas de lã e linha... os

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usuários conversam e falam, dizem seus nomes e gostos. Tem o B., o P., o M., o T. e depois a D., que

é deficiente e não fala, mas olha os desenhos interessada. Me olha desconfiada e pinto uma folha bem

colorida para estimulá-la. Ela apenas pega um lápis verde, faz uns rabiscos e se recusa a desenhar mais.

Me guiam pelas dependências do CAPS, me mostram a sala das oficinas; tem vários trabalhos de arte,

violões, arara de roupas para o brechó.

Fig. 5 – Vista geral do pátio interno. Foto da pesquisadora.

Ganho desenhos de presente e compro uma mandala feita pelo B., que fica conosco o tempo todo,

durante toda a visita. Foi o que mais se vinculou comigo. Alguns vão e vem. M. chega, se apresenta e

começa a desenhar. O P. tecia a pulseira esforçadamente, mas interrompeu para o lanche da tarde; o

T. é ferrenhamente evangélico, lê a bíblia o tempo todo e conta experiências evangelizadoras do

passado, nas quais ajudava as pessoas a “aceitarem Jesus” e lutava contra a malignidade do... (não

lembro a expressão que ele usava para se referir ao demônio, era diferente e curiosa. Pena que não

anotei).

A arte é vista como remédio, me dizem, e usam o lema “mais arte, menos remédio”.

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Fig. 6 – Parede pintada. Foto da pesquisadora.

B. e Anderson são meus acompanhantes até o final da visita. Encontramos os cachorros coletivos do

CAPS... são 3, tem o Tóbi, a Pretinha... Os usuários cuidam deles, interagem, B. gosta de dar banho

neles. Me conta que a Adriana adora bichos e é a protetora deles. Faço festa, brinco, acaricio e conto

que também adoro bichos e tenho 2 gatos, só não tenho cachorro porque moro em apartamento e não

teria tempo de sair com ele.

Percorremos todo o lugar, conversamos bastante. O CAPS tem quartos com várias camas, e os que

estão em surto ficam ali, onde eles chamam de “o acolhimento”. Quando melhoram, vão para suas

casas e frequentam as oficinas e as consultas, de dia. Percebi também uma relação afetuosa com a

merendeira (não recordo o nome), que Anderson diz ser uma “psicóloga nata”. Ela me oferece água e

café.

Na hora de sair, está ficando tarde e o transporte dali é difícil, B. faz questão de me acompanhar até o

ponto da Van para voltar à Taquara. Pede pro Anderson, que o estimula a ir. Me despeço de todos,

agradecendo muito, inclusive dos cachorros! Prometo voltar, o que realmente intento. Adriana não

estava e quero voltar a conversar com ela, participar das oficinas.

B. caminha a meu lado, me mostrando as coisas. Ele repete tudo que a gente diz e depois acrescenta

algo. O lugar me surpreende, parece uma cidade do interior! Tem igreja bonita, praça bucólica, galo

cantando, casas antigas em ruínas. Muita árvore e mato. Ele conta que fazem caminhadas,

alongamentos, exercícios por ali, orientados pelo Anderson e pela Adriana.

Chegamos ao ponto da Van, que devo aguardar. Agradeço, me despeço com cuidado para não ter muito

contato físico, o que pode ser mobilizador e perturbador para os usuários do SSM (lembro do estágio

de psicopatologia, há quase 30 anos... aliás, lembrei muito daquela época durante toda a visita. 1989...

nem tinha CAPS, nem tinha SUS). Aperto sua mão calorosamente, segurando-a entre as minhas e

dizendo palavras afetuosas, mas não o abraço, com medo disso. Penso que tal ideia está em desuso...

Ele se despede e toma o caminho de volta ao CAPS. Caminho um pouco por ali, tiro fotos, me sinto

noutro mundo. A Van chega. Entro e começo a viagem de volta ao “mundo real” do Rio de Janeiro.

Cheia de emoções, ideias, afetos e desejos de saber/conviver mais com eles. De conhecer mais o legado

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de mitos como Nise da Silveira e Arthur Bispo do Rosário.

Figa. 7 e 8 – Paredes da despedida. Fotos da pesquisadora.

6- FINAL DESTA ETAPA DE RELATO EXPLORATÓRIO, COMEÇO DA JORNADA

O próximo passo é arregaçar as mangas, ampliar os registros empíricos e fazer a análise articulando

os três eixos temáticos (recordando, a economia solidária, a produção cultural e artística e a associação

de sujeitos com sofrimento psíquico) que demonstram, de saída, ter uma potência ético-estético-

política muito intensa: Na proposta evidente de combate às desigualdades e injustiças da segregação,

pensa-se e age-se com uma ética, que propõe estar junto daqueles que por suas condições sociais são

colocados num lugar de impotência e segregação; em uma estética, que visa o caráter criativo, de

produção imaginativa e de vida artística, em valorização da vida; e produz-se uma política, que

concebe o sujeito em seus contextos históricos e culturais em busca da cidadania, ativo, reflexivo e

capaz.

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