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MINISTÉRIO DA SAÚDE Secretaria de Atenção à Saúde Departamento de Ações Programáticas Estratégicas Saúde Mental e Economia Solidária: Inclusão Social pelo Trabalho 1.ª edição 1.ª reimpressão Série D. Reuniões e Conferências Brasília - DF 2005

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MINISTÉRIO DA SAÚDESecretaria de Atenção à Saúde

Departamento de Ações Programáticas Estratégicas

Saúde Mental e Economia Solidária:Inclusão Social pelo Trabalho

1.ª edição1.ª reimpressão

Série D. Reuniões e Conferências

Brasília - DF2005

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© 2005 Ministério da Saúde.Todos os direitos reservados. É permitida a reprodução parcial ou total desta obra, desde que citada a fonte e que não seja para venda ou qualquer fim comercial.

Série D. Reuniões e Conferências

Tiragem: 1.ª edição – 1.ª reimpressão – 2005 – 3.000 exemplares

Elaboração, distribuição e informações:MINISTÉRIO DA SAÚDESecretaria de Atenção à SaúdeDepartamento de Ações Programáticas EstratégicasÁrea Técnica de Saúde MentalEsplanada dos Ministérios, bloco G, Edifício Sede,6.º andar, sala 606CEP: 70058-900, Brasília - DFTels.: (61) 3315-2313 / 3315-2655 / 3315-3319Fax: (61) 3315-2313E-mail: [email protected] Home page: http://pvc.datasus.gov.br

Organização:Equipe da Coordenação da Área Técnica de Saúde Mental

Colaboração:Ministério do Trabalho e Emprego (MTE)Secretaria Nacional de Economia Solidária (SENAES)Fórum Brasileiro de Economia Solidária (FBES)Fernanda Nicácio (consultora MS)

Ilustração usada na Capa: Fernando Diniz (Acervo do Museu de Imagens do Inconsciente/Instituto Municipal de Assistência à Saúde Nise da Silveira)

Impresso no Brasil / Printed in BrazilFicha Catalográfica

Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Ações Programáticas Estratégicas.Saúde mental e economia solidária: inclusão social pelo trabalho / Ministério da Saúde, Secretaria de

Atenção à Saúde, Departamento de Ações Programáticas e Estratégicas. – Brasília : Editora do Ministério da Saúde, 2005.

134 p. – (Série D. Reuniões e Conferências)

ISBN 85-334-0943-5

1. Saúde Mental. 2. Trabalho I. Título. II. Série.NLM WM 40

Catalogação na fonte – Editora MS – OS 2005/0661Títulos para indexação:Em inglês: Mental Health and Solidary Economy. Social Inclusion through Work Em espanhol: Salud Mental y Economía Solidaria. Inclusión Social a través del Trabajo

EDITORA MSDocumentação e InformaçãoSIA, trecho 4, lotes 540/610CEP: 71200-040, Brasília – DFTels.: (61) 3233-1774/2020 Fax: (61) 3233-9558E-mail: [email protected] page: http://www.saude.gov.br/editora

Equipe Editorial:Normalização: Gabriela Leitão e Andréa Campos

Revisão: Mara Pamplona e Ricardo BortoletoProjeto gráfico e capa: Sérgio Ferreira

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S u m á r i o

Apresentação. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 7

1 Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 9Reforma Psiquiátrica e Inclusão Social pelo Trabalho . . . . . . . . . . . . . . . . 9• Pedro Gabriel DelgadoCoordenador da Área Técnica de Saúde Mental/Dape/SAS/MS

2 Saúde Mental e Economia Solidária . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 11• Paul SingerSecretário Nacional de Economia Solidária/Senaes/MTE

3 Oficina de Geração de Renda e Trabalho de Usuários de Serviços de Saúde Mental . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 13

3.1 Mesa de Abertura: Conferência: Economia Solidária e Saúde Mental – 22 de novembro de 2004. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 14

3.1.1 Apresentação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 14• Rita MartinsAssessora da Área Técnica de Saúde Mental/Dape/SAS/MS

3.1.2 Conferência de Abertura: Economia Solidária e Saúde Mental . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 15• Pedro Gabriel DelgadoCoordenador da Área Técnica de Saúde Mental/Dape/SAS/MS• Paul SingerSecretário Nacional de Economia Solidária/Senaes/MTE

3.2 Mesa-Redonda: “Experiências de Geração de Renda e Trabalho em Saúde Mental” e “Agências de Apoio e Fomento” - 23 de novembro de 2004 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 30• Fábio Sanchez

Senaes/MTE• Teresa Monnerat

Coordenação de Saúde Mental da Secretaria de Saúde do Rio de Janeiro/RJ

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• Rosemeire Aparecida da SilvaCoordenação de Saúde Mental da Secretaria de Saúde de Belo Horizonte/MG

• Luciana Cristina de AlcântaraCooperativa Cândido – Campinas/SP

• Carmen Vera Passos FerreiraGerAção – Porto Alegre/RS

• Silvia Maria de Oliveira MendesTrabalharte – Juiz de Fora/MG

• Vera PazosNúcleo de Saúde Mental e Trabalho (Nusamt) –Secretaria de Trabalho e Renda do Rio de Janeiro/RJ

3.3 Mesa-Redonda: “Direito ao Trabalho e Produção da Autonomia: Saúde Mental e Economia Solidária” . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 74

3.3.1 Reforma Psiquiátrica: Direito ao Trabalho e Emancipação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 75Fernanda Nicácio – Docente do Curso de Terapia Ocupacional do Departamento de Fisioterapia, Fonoaudiologia e Terapia Ocupacional da Faculdade de Medicina da USP – São Paulo/SP

3.3.2 Uma outra economia acontece . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 79Oscarina Camillo – Cooperativa de Psicologia – Coop Mútua-Ação – Santo André/SP e Coordenação do Fórum Brasileiro de Economia Solidária (FBES)

3.3.3 Proposta de criação da Rede Nacional de Saúde Mental e Economia Solidária . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 82Pedro Gabriel Delgado – Coordenador da Área Técnica de Saúde Mental/Dape/SAS/MS

3.3.4 Políticas Públicas e Economia: possibilidades de Interface com a Saúde Mental. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 88Valmor Schiochet – Senaes/MTE

3.4 Relatórios dos Grupos de Trabalho . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 101

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3.5 Portaria Interministerial n.o 353, de 7 de março de 2005 . . . . . . . . . 112

4 A Trajetória do Movimento da Economia Solidária no Brasil: do Fórum Social Mundial (FSM) ao Fórum Brasileiro da Economia Solidária (FBES). . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 115

4.1 A constituição do Grupo de Trabalho Brasileiro da Economia Solidária . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 115

4.2 A carta ao governo Lula e a I Plenária Nacional da Economia Solidária . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 115

4.3 A II Plenária Nacional no FSM – 2003 e as decisões de mobilizações pelo País . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 116

4.4 A III Plenária Nacional cria o FBES para duas tarefas: a mediação e a mobilização . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 116

4.5 O I Encontro Nacional dos Empreendimentos da Economia Solidária (agosto de 2004). . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 116

4.6 A Economia Solidária no centro do FSM – 2005 . . . . . . . . . . . . . . . . 116

4.7 Estrutura e funcionamento do Fórum Brasileiro da Economia Solidária . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 117

5 Anexos

ANEXO A - Instituições que participaram da Oficina de Geração de Renda e Trabalho de Usuários de Serviços de Saúde Mental – 22 e 23 de novembro de 2004. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 119

ANEXO B - Mapeamento Preliminar das Iniciativas de Geração de Renda e Trabalho em Saúde Mental . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 121

ANEXO C - Entidades de Assessoria e Fomento à Economia Solidária. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 129

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7S a ú d e M e n t a l e E c o n o m i a S o l i d á r i a : I n c l u s ã o S o c i a l p e l o T r a b a l h o

A p r e s e n t a ç ã o

Humberto CostaMinistro de Estado da Saúde

A Reforma Psiquiátrica superou com êxito incontestável sua primeira etapa. O País já se acostumou à idéia de que a profunda mudança assistencial, recomendada pela Lei n° 10.216 de 2001, é sensata, factível, racional e efi ciente.

Certamente, ainda temos muitos problemas, mas o caminho está sendo trilhado. Do início de 2003 até agora, reduzimos 5.400 leitos em hospitais psiquiátricos, de forma cuidadosa, sem produzir desassistência e substituindo-os por uma rede de serviços comunitários onde os pacientes são atendidos com mais humanidade e efi cácia.

Até abril deste ano, o Brasil tinha 622 Centros de Atenção Psicossocial (Caps) em todo o País, 260 Serviços Residenciais Terapêuticos, inúmeros ambulatórios, servi-ços em hospitais gerais e uma participação cada vez mais efetivada atenção básica no atendimento em saúde mental. Para os pacientes de longa permanência, o Pro-grama De Volta para Casa mostra-se um mecanismo concreto e poderoso de apoio à reintegração social.

Há apenas cinco anos, 91% dos recursos da saúde mental no SUS se concentra-vam em hospitais psiquiátricos e apenas 9% no sistema ambulatorial, caracterizando a grande distorção do modelo. No fi m de 2004, cerca de 68% do total dos recursos eram destinados à área hospitalar, com tendência a cair ainda mais, em 2005. Por outro lado, foi ampliado o fi nanciamento da atenção extra-hospitalar. Por isso, não se pode mais dizer que o modelo hospitalocêntrico seja dominante no Brasil.

A mudança de modelo segue uma rota planifi cada e segura. O fi nanciamento direto dos Caps pelo Ministério da Saúde tem garantido a ampliação dos investi-mentos para a saúde mental e a aplicação mais efi ciente dos recursos. E, em casos mais urgentes, quando são necessárias medidas emergenciais, o ministério atua de forma contundente, como nas intervenções que fi zemos em oito hospitais psiquiá-tricos do País.

Entretanto, novos desafi os têm que ser enfrentados, com a mesma coragem que tem nos pautado e a indispensável participação da sociedade. Por ser um projeto amplo de inclusão social e promoção da cidadania, a Reforma Psiquiátrica tem que enfrentar de maneira objetiva os percalços no caminho da reintegração social dos usuários de serviços. Não bastam as residências terapêuticas, o Programa De Volta para Casa: é preciso ir além. Daí a importância de os Ministérios da Saúde e do Tra-balho e Emprego estarem perfeitamente articulados, sob a inspiração da Economia Solidária.

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8 S a ú d e M e n t a l e E c o n o m i a S o l i d á r i a : I n c l u s ã o S o c i a l p e l o T r a b a l h o

Quem trabalha no campo da saúde mental sabe da importância das cooperati-vas, das ofi cinas de geração de renda e trabalho e das associações que colaboram para a venda das obras de arte produzidas nos Caps, para o bem-estar, auto-estima e efetiva inclusão social dos usuários. Mas ainda são experiências frágeis e de pe-quena sustentabilidade.

É preciso construir condições objetivas, por meio de políticas públicas e da parti-cipação da sociedade, para que tais experiências se consolidem, ampliem, superem e possam atender com mais efetividade às necessidades dos usuários, propiciando uma cooperação solidária de toda a sociedade com o processo de superação do manicômios.

Daí a importância da Ofi cina de Experiências de Geração de Renda e Trabalho, que os Ministérios da Saúde e do Trabalho e Emprego realizaram em novembro de 2004. As valiosas contribuições apresentadas nessa ofi cina são apresentadas neste volume. O trabalho é resultado do compromisso assumido pelos dois ministérios e pelo governo federal e expresso pela Portaria Interministerial n° 353, de 7 de março de 2005, de incluir defi nitivamente a aliança entre Saúde Mental e Economia Soli-dária na agenda social da política brasileira.

Brasília, maio de 2005.

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9S a ú d e M e n t a l e E c o n o m i a S o l i d á r i a : I n c l u s ã o S o c i a l p e l o T r a b a l h o

1 I n t r o d u ç ã oR e f o r m a P s i q u i á t r i c a e I n c l u s ã o S o c i a l p e l o T r a b a l h o

Pedro Gabriel DelgadoCoordenador da Área Técnica de Saúde Mental/DAPE/SAS/MS

As associações de usuários que se constituíram ao longo do processo da refor-ma psiquiátrica têm manifestado, em diversos momentos e ambientes, seu desejo de que projetos de trabalho, desenvolvidos em articulação com a rede de serviços, se tornem mais fortes, mais duradouros, e capazes de incluir um número maior de participantes. Assim foi na III Conferência Nacional de Saúde Mental, e nos diver-sos eventos e reuniões dos movimentos que apóiam a reforma psiquiátrica e a luta pela superação dos manicômios. No Congresso Brasileiro de Caps, que reuniu 2 mil pessoas no ano passado, a conferência do Prof. Paul Singer sobre a Economia Solidária permitiu a todos perceberem as aproximações e pressupostos comuns entre aquela proposta e a da reforma psiquiátrica, gerando grandes expectativas de uma cooperação produtiva das duas políticas.

São muitas as experiências brasileiras de “geração de renda”, “cooperativas”, “tra-balho protegido” e outras, que se articulam com a rede de atenção psicossocial em inúmeros municípios. Reunidas na provisoriedade de uma primeira Ofi cina Nacio-nal de Experiências, elas mostram em sua diversidade duas características comuns: a angústia por serem frágeis e com pouca sustentação institucional e fi nanceira, e a certeza dos bons resultados obtidos e da adesão dos usuários. São boas e frágeis, efi cazes porém inseguras.

Também suas referências teóricas nascem de origens diversas, às vezes contradi-tórias, mas o determinante ético é, em todas, a produção da autonomia e a inclusão social dos usuários. O componente da antiga reabilitação pelo trabalho no marco asilar vai sendo aos poucos integralmente substituído pelas novas exigências de compreensão que a lida diária com o mercado capitalista e com a sociedade exclu-dente impõem. Portanto, o marco referencial da Economia Solidária de certa forma propicia um caminho mais promissor para os embates práticos e teóricos desse novo campo no mundo da reforma psiquiátrica.

Dessa articulação das duas políticas públicas espera-se também a construção de um suporte institucional de apoio e fi nanciamento das iniciativas existentes, e a ex-pansão das ações de “inclusão social pelo trabalho” no campo da saúde mental.

O debate sobre os Centros de Convivência e Produção Cultural faz parte dessa nova agenda – que reforça, aprofunda e potencializa a agenda obrigatória da subs-tituição do modelo hospitalocêntrico.

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10 S a ú d e M e n t a l e E c o n o m i a S o l i d á r i a : I n c l u s ã o S o c i a l p e l o T r a b a l h o

Nesta publicação, algumas experiências signifi cativas do campo da saúde mental dialogam com a economia solidária, gerando propostas concretas para uma coope-ração efetiva no plano das políticas públicas.

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2 S a ú d e M e n t a l e E c o n o m i a S o l i d á r i a

Paul SingerSecretário Nacional de Economia Solidária

SENAES/MTE

“Creio que, até por esta visão que a economia solidária traz de travar este debate [...] com essas condições adversas do mercado, que é um mercado que não inclui, mas exclui, entre a economia solidária e a reforma psiquiátrica há uma vocação cooperativa inevitável. [...] O fundamental é que ambos nascem de uma matriz comum [...] nessa vontade de mudar a sociedade, de modo que ela possa ser uma sociedade mais generosa, mais inclusiva, mais solidária etc. Essa é a matriz que nos interessa. Na verdade, a reforma psiquiátrica não é uma tecnologia de montar serviços de saúde mental, mas um movimento social de transformação profunda e de fato das concepções sobre a loucura e sobre a diferença.” (Pedro Gabriel)1

Esta publicação resume diálogos (mais que debates) travados ao longo de dois dias entre militantes da reforma psiquiátrica, muitos ativos em Caps, e integrantes do gover-no federal, nas áreas de economia solidária e de saúde mental. A ofi cina se destinava a lançar as bases de uma colaboração permanente entre essas áreas e entre os integrantes dos movimentos sociais correspondentes, tendo em vista a reinserção social de egres-sos de manicômios por meio da construção de empreendimentos solidários.

Como diz tão bem o Dr. Pedro Gabriel, na epígrafe, a economia solidária e o mo-vimento anti-manicomial nascem da mesma matriz – a luta contra a exclusão social e econômica. Uns são excluídos (e trancafi ados) porque são loucos, outros porque são pobres. Há ricos, que enlouquecem porque empobreceram e há pobres, que en-louquecem porque ninguém os nota (o que é uma forma particularmente cruel de ex-clusão). A matriz comum de ambos é uma sociedade que fabrica pobres e loucos de modo casual e inconsciente.

A economia solidária é a resposta organizada à exclusão pelo mercado, por parte dos que não querem uma sociedade movida pela competição, da qual surgem inces-santemente vitoriosos e derrotados. É antes de qualquer coisa uma opção ética, política e ideológica, que se torna prática quando os optantes encontram os de fato excluídos e juntos constroem empreendimentos produtivos, redes de trocas, instituições fi nancei-ras, escolas, entidades representativas, etc., que apontam para uma sociedade marcada pela solidariedade, da qual ninguém é excluído contra vontade.

Parece-me que a reforma psiquiátrica também se compõe dos que optam por uma sociedade sem manicômios (e o muito que isso implica), que se unem aos sofredores psíquicos para construir com eles as pontes institucionais que levam à reinserção eco-nômica e social dos mesmos. Como há muitos excluídos pelos motivos mais diferen-

1 Informação verbal fornecida por Gabriel Delgado

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12 S a ú d e M e n t a l e E c o n o m i a S o l i d á r i a : I n c l u s ã o S o c i a l p e l o T r a b a l h o

tes – gênero, raça, idade, estilo de vida, etc. – a luta contra a exclusão é travada por numerosos movimentos. No plano político, eles mobilizam, protestam, pressionam os poderes constituídos, disputam eleições. No plano econômico, eles constroem empre-endimentos cooperativos, em que discriminados, técnicos, familiares e outros neces-sitados colaboram.

As lutas contra a exclusão econômica enfrentam obstáculos formidáveis. De um lado, a falta de capital, de qualifi cação profi ssional, de mercado, de formalização legal, en-fi m das condições objetivas para o exercício de uma atividade econômica regular. De outro, as difi culdades subjetivas: como passar do trabalho protegido ao autônomo, o único verdadeiramente cooperativo; a loucura tem graus: só os dotados de mais auto-nomia devem ser escolhidos para formar cooperativas? E o trabalho é terapêutico por si ou pelo resultado pecuniário que proporciona a quem o exerce?

Essas e numerosas outras questões foram discutidas, revelando aos olhos de um ob-servador externo, ampla variedade de preocupações e posturas. Mas, todas fi ncadas fi rmemente numa vontade comum de instaurar a solidariedade como norma social, mediante a construção de entidades autônomas, autogestionárias, abertas não só a doentes mentais e seus familiares, mas a todos os excluídos, seja qual for o motivo da exclusão. Essa convicção, expressa por tantas participantes durante a ofi cina, faz crer que as muitas carências, que afl igem todos trabalhadores da economia solidária (não só os egressos de manicômios), acabarão sendo superadas.

Esta ofi cina foi só um primeiro passo de uma longa jornada. Mas, que passo! O en-contro entre o movimento da reforma psiquiátrica e o da economia solidária foi emo-cionante pelo reconhecimento mútuo. Nas próximas ofi cinas esse reconhecimento já estará dado, visto como óbvio. Quando a inclusão social e econômica dos egressos se tornar realidade, no bojo de uma outra economia, que acontece cada vez mais, este primeiro encontro será recordado com saudade, a empolgação dos que lá estiveram sendo silenciosamente invejada pelos que vieram depois.

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13S a ú d e M e n t a l e E c o n o m i a S o l i d á r i a : I n c l u s ã o S o c i a l p e l o T r a b a l h o

3 O f i c i n a d e G e r a ç ã o d e R e n d a e T r a b a l h o d e U s u á r i o s d e S e r v i ç o s d e S a ú d e M e n t a l

A Ofi cina de Geração de Renda e Trabalho de Usuários de Serviços de Saúde Mental realizada nos dias 22 e 23 de novembro de 2004, em Brasília, inaugurou a parceria entre a Área Técnica de Saúde Mental e a Secretaria Nacional de Economia Solidária. Dessa parceria surgiu o projeto que fomentará as experiências de Gera-ção de Renda na área de Saúde Mental. A proposta da Ofi cina teve como objetivo reunir projetos formais e informais de Geração de Renda e Trabalho de Usuários de Serviços de Saúde Mental e, assim, promover uma rede de discussão e incremento dessas iniciativas.

O evento aconteceu na Universidade de Brasília e teve como participantes 78 experiências vindas de diferentes regiões do Brasil, representadas por técnicos, co-ordenadores municipais e estaduais, usuários e familiares.

A Ofi cina foi estruturada por mesas-redondas, grupos de trabalho e plenária fi nal para aprovação das propostas e encaminhamento de deliberações. As mesas-redondas serviram de disparadores para as discussões dos grupos de trabalho. Cada grupo fi cou responsável por elaborar propostas para o Projeto de Geração de Renda e Trabalho da Área Técnica de Saúde Mental. As propostas foram consolidadas e apresentadas na plenária fi nal pelos relatores de cada grupo.

Com base nas propostas oriundas dos grupos de trabalho, o coordenador-geral de Saúde Mental, Pedro Gabriel Godinho Delgado, e o Secretário Nacional de Econo-mia Solidária, Paul Singer, encaminharam as três propostas-síntese abaixo:

• Criação e consolidação da Rede Nacional de Experiências de Geração de Ren-da e Trabalho em Saúde Mental;

• Criação de um mecanismo de articulação entre a Área Técnica de Saúde Mental e a Secretaria Nacional de Economia Solidária e suas respectivas políticas;

• Criação e manutenção de incubadoras que apóiem, capacitem e fomentem ini-ciativas de Geração de Renda e Trabalho em Saúde Mental.

A seguir apresentamos a transcrição dos debates que ocorreram durante a Ofi cina.

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14 S a ú d e M e n t a l e E c o n o m i a S o l i d á r i a : I n c l u s ã o S o c i a l p e l o T r a b a l h o

3.1 Mesa de Abertura: 22 de novembro de 2004Conferência: Economia Solidária e Saúde Mental

3.1.1 Apresentação

Rita MartinsAssessora da Área Técnica de Saúde Mental/DAPE/SAS/MS

Primeiramente, quero dar as boas-vindas ao Professor Paul Singer. É um prazer ter o senhor aqui. Boas-vindas a todos. Farei uma explanação rápida de como será este evento.

A Coordenação-Geral de Saúde Mental está iniciando um plano de ação na área de geração de renda. Esse plano é fruto da parceria com a Secretaria Nacional de Economia Solidária. Nossa proposta é trabalhar em conjunto com a Economia Soli-dária e temos dois pontos para discutir nesta Ofi cina: a idéia de um Fundo Nacio-nal de Economia Solidária e Saúde Mental e a de uma Rede Nacional de discussão sobre Geração de Renda em Saúde Mental.

Hoje, vamos ter as conferências com o Doutor Pedro Gabriel e o Professor Paul Singer falando sobre essas propostas. Amanhã, o evento vai começar com uma Mesa onde falaremos sobre as experiências identifi cadas a partir de um mapeamento que fi zemos. Estamos começando este plano de ação com o mapeamento das iniciati-vas, vendo o que está acontecendo na área de geração de renda em saúde mental. Vamos ter a SURICATO – MG, a Cooperativa Cândido – SP, a GerAção-Poa – RS, a Trabalharte – MG, o NUSAMT (Núcleo de Saúde Mental e Trabalho) – RJ e a Coo-perativa da Praia Vermelha – RJ.

A segunda Mesa versará sobre o direito ao trabalho e produção da autonomia: saúde mental e economia solidária, em que falaremos um pouco sobre reforma psi-quiátrica, direito ao trabalho e emancipação do usuário. Nossa proposta é inclusão pelo trabalho. Em seguida, discutiremos a criação de uma Rede Nacional de Saúde Mental e Economia Solidária e, também, a possibilidade de interface entre os dois movimentos.

Depois teremos os grupos de trabalho. A idéia é lançar propostas, falar do que está acontecendo na ponta, nos serviços, o que está sendo feito pelas coordenações locais para incrementar o diálogo entre a saúde mental e a geração de renda, para podermos construir, junto com os senhores, um plano de ação da Coordenação de Saúde Mental.

Quero agradecer a presença de todos, desejo um bom evento.

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3.1.2 Conferência de Abertura: Economia Solidária e Saúde Mental

Pedro Gabriel DelgadoCoordenador da Área Técnica de Saúde Mental/DAPE/SAS/MS

Boa-noite a todas as senhoras e todos os senhores, boa-noite ao Professor Paul Sin-ger, a sua equipe da Secretaria Nacional de Economia Solidária, aos colegas que estão aqui presentes, a Rita Martins e a Tânia Grigolo da organização desse evento, da equi-pe de saúde mental, a todas as experiências que foram convidadas para essa primeira Ofi cina, a algumas instituições que são representantes de familiares ou de usuários da saúde mental que também foram convidadas. Em nome de todos os presentes, queria também dizer que essa primeira Ofi cina destina-se àqueles que estão em lugares e ex-periências que nós não conhecemos ainda, realizando um esforço de integração social, de inclusão social por meio do trabalho, de cooperativas, de outras ações de geração de renda e no plano das atividades culturais, nessa rede imensa de serviços que está sendo construída no Brasil para atender às exigências da democratização da saúde mental em nosso País, às exigências da democratização do acesso de todas as pessoas que preci-sam de cuidado e de atendimento no campo da saúde mental. Desejo boas-vindas aos senhores, mas também estou fazendo uma saudação que já se destina a incluir todas aquelas experiências que não estão chamadas aqui, em parte porque não foi possível identifi cá-las e localizá-las, pois esse é um esforço inicial que estamos fazendo, em parte também por razões de organização, razões operacionais.

Na verdade, o objetivo deste primeiro encontro nasce de uma conversa que tive-mos com o Professor Paul Singer no ano passado. Quem esteve no Congresso Bra-sileiro de Caps se lembra que essa conversa prosseguiu com uma conferência do Professor Paul Singer nesse Congresso, falando da economia solidária, que teve des-dobramentos, até ser construída essa Ofi cina com o objetivo de pensar um progra-ma interministerial. Um programa que inclua também todas as outras instâncias da gestão pública, municipal e estadual, além do trabalho de organizações não-gover-namentais, de entidades, de associações, do movimento social em torno da reforma psiquiátrica no Brasil, para poder abrir essa nova frente do campo da reforma, que é a frente da inclusão social pelo trabalho, das cooperativas sociais, das cooperativas e experiências de geração de renda. Essas experiências já existem em nosso País, mas são ainda muito incipientes e precisam, de fato, de esforços conjuntos de to-dos nós, da sociedade e do Estado, para garantirem sua sustentabilidade, e poderem funcionar de maneira mais efi caz no sentido de promover, realmente, a inclusão social dos usuários dos serviços de saúde mental, com a reintegração social dessas pessoas, a melhoria das suas condições de vida e a melhoria também da efetividade do seu proje-to terapêutico, porque sabemos que a inclusão nesses projetos é muito positiva, muito efi caz, para o bem-estar dos usuários desses serviços.

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Creio que esse é um momento auspicioso, é mais uma frente que abrimos: esperamos que seja produtiva, que seja um caminho que possamos trilhar daqui para frente de uma forma criativa e efi ciente, incorporando cada vez mais um número maior de pessoas.

Temos aqui presentes tanto pessoas que são do campo da saúde mental, como as que são do movimento de economia solidária. Quem vai falar sobre economia solidária é o Professor Paul Singer, a pessoa que tem, no Brasil, trazido de uma forma sistemática esse debate à sociedade brasileira. Eu queria, em duas ou três observações, dar um panorama para os senhores do momento da reforma psiquiátrica em nosso País.

Uma primeira observação é de que o movimento de reforma psiquiátrica é um movimento de inclusão social. Ele não é apenas um esforço coletivo de mudança do modelo assistencial, de substituição dos manicômios, dos hospitais tradicionais por uma rede comunitária de atenção em saúde mental, a qual já se mostrou mais efetiva, mais humana, mais adequada, mais moderna do que o tratamento conven-cional em hospitais psiquiátricos. Esse é, talvez, o componente mais visível, que é a mudança do modelo assistencial. Sendo uma mudança de modelo, uma mudança de concepção, esse movimento da reforma não diz respeito apenas à organização de serviços de saúde, ao planejamento de saúde, ao fi nanciamento de recursos, à capacitação de recursos humanos, ou seja, a todos esses ingredientes da constitui-ção e sustentação de uma política pública. Ele diz respeito também à mudança de conceitos, à mudança até do imaginário social sobre a questão da loucura, diz res-peito à construção e, digamos, à busca, que deve ser tenaz, permanente, constante e cotidiana – ou então, fracassará – da construção de um novo lugar social para os loucos, para os dependentes de drogas, para esses segmentos para os quais a socie-dade só construiu, ou só vinha construindo, espaços de segregação, de segregação institucional.

A reforma psiquiátrica, a luta por uma sociedade sem manicômios, é um movimento de ampla base social, mas não é apenas um movimento que se dá no plano da refor-ma da assistência em saúde mental. É, principalmente, um grande movimento social de inclusão, de reintegração social e de construção, o que exige de nós uma grande in-ventividade, ousadia e criatividade, de modo a fazer surgir um lugar social novo para essas pessoas para as quais só existia um tipo de institucionalização, ou existia, como forma dominante, uma institucionalização que produzia a redução da autonomia, que via nos institucionalizados apenas aquilo que eles tinham perdido de produtividade e de potência criativa. Precisamos substituir tudo isso por esse esforço que todos os se-nhores fazem nos seus locais de trabalho, que é ver nessas pessoas o que elas têm de criativo, o que elas têm de contestação, na verdade, há uma certa ordem cinzenta, que a vida cotidiana nos impõe, o que elas têm de criatividade muitas vezes radical. Vimos, na recente exposição nacional de artes plásticas dos pacientes dos Caps, que existe uma grande criatividade, uma grande originalidade na relação que essas pessoas travam com o cotidiano, com a vida, com os valores e com o imaginário social. São pessoas que nos

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ensinam muito a ver de uma forma diferente, menos enviesada e menos convencional, a crise permanente que constitui a existência humana, na verdade, a única possibilidade de passagem do ser humano pela terra, uma experiência sempre provisória e sempre de crise. Essas pessoas nos ensinam muito.

A reforma psiquiátrica é, também, uma mudança do olhar a respeito dessas pessoas, é pensar nesses sujeitos como sujeitos que estão construindo um outro tipo de mundo, uma outra possibilidade. Penso que a reforma também signifi ca (por que não?) uma maneira mais romântica de pensar a loucura, talvez a recuperação até de certos olhares românticos sobre a experiência radical da loucura, mesmo sendo ela uma experiência trágica, porque essas pessoas sofrem muito, as famílias também vivem situações de inten-so sofrimento, porém, ela não é necessariamente uma experiência negativa. É, também, uma experiência de produção de subjetividade, de produção de sentido e de sentidos novos. Todas as loucuras, o consumo de drogas, a psicose, as experiências de sofrimento intenso, são também formas muito positivas de viver a experiência da existência humana. Então, existe uma estética que deve ser valorizada na experiência da loucura.

Portanto, a reforma psiquiátrica não é apenas o desafi o de acabar com manicômios e criar outros serviços. É, também, extrair a positividade naquilo que é visto apenas como negativo. Aí, a questão das ofi cinas de geração de renda, a inclusão social pelo traba-lho, as cooperativas, são instrumentos extremamente efi cazes. Se pensarmos uma expe-riência internacional como a italiana, veremos que o trabalho das cooperativas sociais e das empresas sociais foram experiências cruciais para que, nas regiões da Itália, onde a reforma italiana deu certo, tais iniciativas pudessem se consolidar, aos olhos da opinião pública, como experiências positivas e muito bem-sucedidas.

Um componente fundamental da experiência italiana, que é importante na infl u-ência que ela tem sobre nós do Brasil, é justamente da inclusão social pelo trabalho das empresas sociais e das cooperativas. Em vários países do mundo, essa questão do trabalho protegido e da inclusão pelo trabalho é um componente fundamental do processo de mudança do modelo de assistência.

Queria dizer ainda, para as pessoas que não são exatamente da área de Saúde, que abrir esse campo, essa nova frente de trabalho das ofi cinas de geração de renda e da economia solidária no campo da saúde mental, vai ser uma forma também de fortalecer todas as demais áreas de intervenção da reforma psiquiátrica. Por exemplo, o Programa De Volta para Casa, cujo material informativo está sendo distribuído para todos, é também um programa de inclusão social. O De Volta para Casa é diferente dos programas de simples apoio por meio de uma bolsa, ou de apoio pelo subsídio mensal. É um programa muito nítido de inclusão social, porque repassa recursos diretamente para os pacientes, e não para suas famílias, não exige do paciente que tenha nenhum tipo de relação especial com sua família, para que seja reconhecida sua autonomia de utilizar esses recursos, porém exige do gestor municipal, do po-der público municipal, que garanta um atendimento adequado para essa pessoa, a

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fi m de que, só assim, ela possa sair dessa proteção que vivia na experiência asilar, na experiência institucional.

O programa das Residências Terapêuticas, de que todos conhecem o material de divulgação, mas talvez o pessoal da economia solidária não conheça, também se constitui de ações incisivas de integração social e de criação de um espaço real de vida para essas pessoas na cidade. São casas na cidade, casas mantidas pelo poder público, mas são as casas de moradia dessas pessoas, onde elas se organizam numa nova forma de vida depois de terem saído da vida institucionalizada durante tantos e tantos anos. Algumas pessoas passaram 30 anos vivendo institucionalmente e vão construir um novo lugar para viver na sociedade. Para isso, precisam desses apoios, desses suportes. Também esse programa vai se associar, como os senhores já sabem, aos programas dos Caps, porque muitos dos Caps trabalham com ofi cinas. A pala-vra ofi cina é uma palavra usual nos Caps, “tudo é ofi cina”. Isso aqui é uma ofi cina, estamos fazendo uma ofi cina entre nós, é mais uma das várias ofi cinas, cujo ofício é permanentemente discutir a própria prática. No caso dos pacientes, trabalhar com eles a sua recuperação, seu tratamento e sua inclusão social.

Essas ofi cinas, que são quase que da natureza dos Centros de Atenção Psicossocial, que substituem, com muita vantagem técnica e ética, o tratamento convencional, também produzem riqueza, produzem valores de troca, produzem valores na relação dos pacientes com sua família e com a sociedade como um todo. São ofi cinas que podem, e freqüentemente fazem isso, ser um instrumento a mais, quer dizer, ter um produto a mais, que é o produto concreto que nasce daquele ofício ali realizado e que pode, assim, se confrontar com o mercado, um mercado pouco afeito a esses produtos menos competitivos, um mercado que, em geral, segue regras muito incle-mentes em relação a alguns segmentos sociais, mas um mercado com o qual temos que travar uma batalha e um diálogo permanente.

O Diretor de Saúde Mental da OMS, Benedetto Saraceno, que vem da experiên-cia italiana, nos recomenda travar, no caso dos pacientes mentais e dos dependentes químicos, um diálogo permanente com o mercado real, construir com o mercado real alternativas reais e concretas de inclusão dessas pessoas, em vez de apenas nos colocarmos numa posição de aceitar que esse mercado real e essa sociedade concre-ta permaneçam com sua posição de exclusão do diferente, de exclusão do paciente mental ou do usuário de drogas. Caberia construir alternativas, de fato, de inclusão nesse cotidiano real que vivemos de um mundo capitalista, de um mundo onde a in-clusão social não é a regra, onde a regra é a exclusão, fazendo isso de uma maneira programática, tenaz e permanente, com apoio do governo, das políticas públicas, mas políticas públicas permanentes.

Esse, digamos, é o objetivo. Queremos construir aqui um dispositivo de intervenção que apóie os 592 Caps atualmente existentes. Finalizaremos o ano ultrapassando o número de 600 Caps, onde trabalham mais de 12 mil pessoas, e são atendidos cer-

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ca de 250 mil pessoas com transtornos mentais graves e persistentes, que precisam desse atendimento. É uma rede ainda insufi ciente, mas uma rede em expansão, que já construiu outra possibilidade de vida e de tratamento para essas pessoas. Então, a idéia da geração de renda, da articulação com essa idéia absolutamente generosa da economia solidária, é transpor os limites; criar, na verdade, novos limites. Quando saímos dos manicômios, transpusemos um limite, mas, agora, estamos vendo que há outros limites, que há outros obstáculos, e é preciso criatividade e ousadia para transpor esses outros obstáculos que vão se interpondo à tarefa da inclusão social, que é a tarefa fundamental da reforma psiquiátrica e da luta pela sociedade sem manicômios.

Era isso que queria dizer aos senhores. Creio que esse é um momento importan-te para nós, porque estamos tentando construir agora essa nova senda, esse novo caminho para ser acrescentado às diversas e variadas trilhas que estamos construin-do para fazer a reforma psiquiátrica e a democratização radical da assistência em saúde mental do nosso País. Era o que eu queria dizer à guisa de saudação para, di-gamos, de alguma maneira, introduzir aqui a conferência do professor Paul Singer. Obrigado a todos.

Paul SingerSecretário Nacional de Economia Solidária – SENAES/MTE

Boa-noite. Antes de mais nada, quero agradecer não só ao doutor Pedro Gabriel, meu colega de governo, do Ministério da Saúde, na Coordenação de Saúde Mental, mas agradecer a todos os senhores pela opção que fi zeram pela economia solidária. Não era a única opção, obviamente, mas o fato de os senhores terem optado, a meu ver, tem enorme signifi cado. Esse vai ser o meu único tema e não pretendo falar demais. Foi fundamental ouvir o doutor Pedro Gabriel, porque entendi melhor a lógica da nossa confl uência. Quero, então, falar um pouco da proposta da economia solidária, o que ela tem a ver com inclusão social.

A economia solidária nasce efetivamente com uma proposta de inclusão social, mas não de inclusão social no capitalismo. Quando eu falei à televisão, a pergunta foi sobre como fazer inclusão social, se é com empresa privada, com associações, etc. Eu falei que não, que a empresa privada não era nossa “praia”, mas por que não é nossa “praia”? Porque a empresa privada capitalista é a origem da desigualdade. Do jeito como ela é constituída, por donos e assalariados, aí está a fratura, que gera a possibilidade de exclusão social. Nós aspiramos por uma sociedade em que não haja exclusão, em que haja o direito efetivo ao trabalho. Ele está consignado na Constituição, mas não é efetivo. A mesma Constituição diz: “Priorizamos a iniciativa privada, o mercado, etc.”. Então, ela é contraditória, quer dizer, o sistema não funciona sem exclusão social e sem desempregados, sem o exército industrial de reserva.

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A economia solidária vem de uma idéia de que uma cooperativa, para começar, é uma associação de pessoas que têm os mesmos direitos sobre a atividade coletiva de que participam, mas, mais do que isso, ela não está a serviço de seus membros. A lei que regulamenta o cooperativismo no Brasil diz exatamente o contrário, diz que as cooperativas são associações a serviço de seus membros. Isso não é verdade. Não vou dizer que é um absurdo, embora eu entenda que seja, porque eu sou uma pessoa bem educada, mas a proposta é exatamente uma proposta aberta. A coope-rativa está aí para quem precisa, embora, na prática, as circunstâncias econômicas não permitam levar isso às últimas conseqüências, mas a idéia não é meramente encontrar uma solução para aquelas pessoas que estão dentro da cooperativa – ela é para todos. Por isso, a economia solidária está sendo vista, sobretudo no Brasil, mas também na Itália e em outros países, como sendo uma via de inclusão social para os excluídos. Ela é isso enquanto não se generalizar, enquanto for um modo de produção menor e subordinado, como é hoje, acaba sendo, vamos dizer, uma via preferencial para os excluídos, sendo que os doentes mentais são, certamente, excluídos. Para as pessoas que estamos pensando aqui, para os egressos do siste-ma manicomial, sem dúvida, poder ganhar é vital, mas eu diria que os efeitos da economia solidária vão muito além disso, porque existe, na proposta da economia solidária e na sua realização prática, um pouco de sonho, de ousadia de uma outra relação, e não é uma relação de produção – ela vai além.

Estou muito infl uenciado por um exame de qualifi cação, do qual acabo de sair hoje de manhã na USP, em que uma cooperativa que já existe há bastante tempo, uma das primeiras, na hora de escrever como eles conseguiram fundar, porque na-quela época não se falava de cooperativa, a pessoa descreve assim: “Aí, surgiram uns dez loucos ou umas dez loucas que ousavam sonhar, e sonhar alto”.

É muito comum, em economia solidária, falarmos de loucos, não no sentido te-rapêutico, mas no sentido de ousadia, de não se deixar prender pelo realismo e de sonhar alto, de sonhar junto e compartilhar sonhos. Isso dá uma outra qualidade de vida. Creio que, por isso, essa opção que os senhores estão fazendo é tão importante. Pode ter, inclusive, efeitos terapêuticos, como o doutor Pedro Gabriel sugeriu. Pode ter, mas, independentemente de ter ou não (eu não entendo disso), tenho certeza que, se as cooperativas, ou associações, ou seja o que for, se viabilizarem econo-micamente, elas proporcionam muito mais do que o rendimento monetário a quem delas participa. Penso que esse é o ponto fundamental.

Eu queria meramente acrescentar a isso o seguinte: uma das grandes difi culdades que nós temos de incluir os excluídos, de incluir pessoas que tenham todos os han-dicaps que os transformam em excluídos por defi nição individual, pela cor da pele, por características, por gênero, ou o que seja, é no sentido de que é difícil entrar no mercado. A meu ver, isso foi abordado de uma forma correta, mas insufi ciente. Não é nenhuma crítica, mas apenas que devemos pensar mais.

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O que tenho visto em cooperativas sociais que existem efetivamente no Brasil, e não estou pensando apenas nos sofredores psíquicos, mas em cegos, que fazem muita cooperativa, que produzem vassouras, por exemplo, entre outras coisas dessa natureza, é que a inserção no mercado dessas cooperativas é extremamente margi-nal. O resultado é que as pessoas ganham muito pouco. Eu diria que fi cam no fi o de uma lâmina entre a benemerência e o mercado propriamente. Quando o cego vai, ele em pessoa, vender os seus produtos, ele está fazendo um apelo também à generosidade das pessoas. Eu odiaria se as nossas cooperativas precisassem ter esse caráter. Penso que podemos ser loucos e sonhar alto, exatamente pelo que o Pedro falou, no sentido de que há um potencial nessas pessoas. Pelo menos artístico, creio que não há a menor dúvida, mas talvez outros também. Precisamos conhecê-los melhor e lhes dar todas as chances.

O que eu queria colocar como proposta minha nessa jornada comum que estamos começando, no sentido de criarmos pelo Brasil afora cooperativas e associações de excluídos, é que não sejam somente de sofredores psíquicos, mas também sejam de incapacitados físicos, ou semi-incapacitados, exatamente porque, quando as defi ci-ências são diferentes, elas se complementam e ajudam muito a ter um campo mais vasto de manifestação.

Podemos pensar isso mais adiante, mas, de qualquer forma, a minha proposta é de que esses grupos não tenham uma única defi nição produtiva. Vamos todos fazer vassouras, vamos todos fazer qualquer coisa, exatamente porque essas pessoas são diferentes. Teremos grupos chamados multiobjetivos, multiprodução. Não há nada errado que tenha na mesma cooperativa, digamos, uma pessoa que inventa coisas e a outra que faz contabilidade, uma terceira que faz telemarketing, uma quarta ou quinta que façam outras coisas, para que as pessoas possam experimentar.

Como o doutor Pedro acabou de dizer, são pessoas as mais diferentes, inclusive quanto às histórias pessoais, alguns que passaram uma grande parte em instituições totais, outros com outras experiências. A meu ver, seria uma violência partir da pró-pria proposta alguma defi nição que, para isso, tem mercado, porque acaba sendo, muitas vezes, esse tipo de mercado que me deprime, porque a condição de insu-fi ciência e de inferioridade passa a ser um apelo de venda. Não quero me alongar nesse tema.

Penso que teremos que fazer mais ofi cinas, na medida em que nós formos aprofundan-do as experiências. Eu adoraria poder estar aqui amanhã de manhã e, se me deixarem, estarei, porque estou interessadíssimo nessas experiências que vão ser expostas aqui. Va-mos ter que trabalhar, os senhores, nós, o governo, para que aprendamos realmente qual é a melhor forma de criar essas cooperativas sociais, a melhor forma para os seus mem-bros, e que sejam, ao mesmo tempo, satisfatórias e economicamente viáveis. Penso que são desperdiçadas muitas possibilidades pela ansiedade de já começar a fazer alguma coisa. Em algum momento, é claro, algumas decisões terão que ser tomadas, mas, talvez,

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possamos inventar um período de carência em que as pessoas tentarão coisas diferentes, individual e coletivamente, e, daí, possivelmente, encontraremos coisas que nenhum de nós espera, o que, aliás, é uma das coisas mais belas da existência humana. Obrigado.

Pedro Gabriel Delgado

Vamos aproveitar o tempo que ainda temos e abrir para um rápido debate, para todos os participantes, para quem quiser dirigir perguntas, ou fazer colocações, ini-ciando o nosso trabalho.

Participante(não identificado)

A pergunta é para o professor Paul. Eu fi quei com uma questão quanto ao senhor expor que cooperativa não é objetivamente para quem é associado, para seus mem-bros. Era essa a idéia que, acredito, uma grande maioria de pessoas tem. Como seria esse outro jeito de poder incluir outras pessoas sem ser via associação individual? Não consegui conceber isso.

Paul Singer

Obrigado pela pergunta. Obviamente, eu não fui claro. É um dos princípios do cooperativismo internacional a chamada porta aberta. Essa porta aberta funciona em dois sentidos: um de que a cooperativa está sempre pronta a acolher novas pessoas que queiram trabalhar nela. Geralmente, ela aporta o recurso, ela integra o capital e, ao fazer isso, em princípio, permite que tenha os instrumentos, etc. Então, a capa-cidade de expansão das cooperativas é infi nita. Esse é um aspecto. O outro é que as pessoas são livres para sair e, ao saírem, levar o seu patrimônio, o que implica uma negociação, e assim por diante. Essa postura é uma postura ideológica. Essa coope-rativa que hoje de manhã nós examinamos, na qualifi cação, das “dez loucas”, aliás, são mais de 20, elas estão optando por ajudar a formar outras cooperativas, porque elas percebem que, se fi carem muito grande, a qualidade da relação vai se perder.

A opção não é necessariamente que a cooperativa cresça absurdamente em função da porta aberta, mas ela pode se manifestar sobre a forma de incubar, acompanhar e apoiar, como essa cooperativa que eu estava falando realmente faz, assim como outros grupos cooperativos. Essa seria uma das coisas, a meu ver, mais interessantes, quer dizer, se conseguíssemos, a partir das cooperativas de doentes mentais que já existem, que vamos ter uma amostra amanhã de cinco ou seis delas, já vermos em que medida essas experiências poderiam ser o ponto de partida de outras experiências.

Hoje, estou convencido de que a cooperativa limitada a poucas dezenas de pes-soas é uma cooperativa autêntica, ou seja, ela realiza os valores humanos. É fun-

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damental o contato face a face. Ter uma cooperativa do tipo que tem em Mondra-gon, com 3 ou 4 mil pessoas, que precisa ter a representação indireta, é um outro desenho, mas elas são economicamente pouco viáveis. Isso é importante. Tamanho é documento em economia, mas isso se resolve sem violentar nada, nem as leis da economia, muito menos os princípios da economia solidária. São criadas coopera-tivas de 2.º grau. Existe uma tradição e, mais que isto, um dos princípios também da aliança cooperativa internacional é a cooperação intercooperativas. Então, para de-terminadas fi nalidades, cinco ou dez cooperativas podem se unir numa cooperativa de 2º grau, por exemplo, para comercializar seus produtos. Em geral, isso é muito conveniente. Algumas vezes, também, para unifi car suas compras e conseguir fazê-las de uma forma mais favorável.

O que me importa é que o princípio, que não foi inventado por mim, da porta aberta é o que explica, por exemplo, Mondragon. Não sei se os senhores sabem, mas é uma instituição, um complexo cooperativo, que hoje tem 60 mil pessoas tra-balhando, mais de cem cooperativas, inclusive uma universidade. Mondragon virou uma comunidade, em que a cooperativa é um elemento importante, mas, certamente, não se limita a isso. O Padre José Maria Arizmendarrieta, quando criou Mondragon, começando a primeira cooperativa em 1956, ele estabeleceu uma retirada mensal que tinha a ver com a retirada mensal dos trabalhadores da área, que eram muito pobres, para permitir que eles pudessem entrar.

Uma das difi culdades das cooperativas que vão muito bem economicamente é que a porta fecha para entrar, porque é muito caro entrar, o capital fi cou muito alto. Isso teria que ser abordado ideologicamente, não apenas em termos econômicos. Uma das saídas clássicas são os fundos não divisíveis. Uma parte do capital da co-operativa deixa de pertencer aos membros, para pertencer à instituição. Isso é feito especifi camente para facilitar que novos membros possam aderir à cooperativa. Esse é um longo assunto.

Participante(não identificado)

Professor Paul Singer: gostaria que o senhor esclarecesse um pouco a questão da inclusão no capitalismo e esse conceito de inclusão que o senhor traz na economia solidária.

Paul Singer

Quando digo inclusão no capitalismo, estou pensando na existência da econo-mia solidária no Brasil hoje. O que estamos fazendo é inserir esses grupos que esta-mos cogitando agora, mas também, por exemplo, as empresas recuperadas por seus próprios trabalhadores. É um veio de economia solidária extremamente importan-

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te, temos mais de 700 hoje no Brasil. Ou as cooperativas da reforma agrária, nos assentamentos da reforma agrária, da Contag, do MST, e assim por diante. Estamos inserindo essas cooperativas na economia geral, que é dominada pelo capitalismo. Isso é óbvio, e seria bobagem negar. Isso é melhor do que nada. Evidentemente, não é possível construir alguma coisa diferente, a não ser começando dos interstícios que a própria insufi ciência do capitalismo oferece. O capitalismo nos oferece hoje milhões e milhões de excluídos, que precisam de uma alternativa, e a economia so-lidária pode ser uma delas.

Agora, onde sonhamos, esse é o direito de sermos um pouco loucos e sonhar, é ter uma economia solidária tão ampla que o capitalismo seja eventualmente um implante, e não o contrário. Na minha opinião, pelo menos, o ideal não é eliminar o capitalismo, a não ser quando as pessoas não queiram mais, mas deve ser uma livre opção. Para os brasileiros de hoje, como nós os vemos, uma grande parte quer capitalismo, quer patrão. Penso que eles têm esse direito. Se há alguém que quer empregar e alguém que quer ser empregado, é um direito deles, e não pretendo questionar. Agora, o ideal seria chegarmos num momento em que não fôssemos mais uma dependência do capitalismo, mas alguma coisa no mínimo com certa au-tonomia, o que implica também organização da economia solidária em redes, que é uma das nossas preocupações. Não está fácil, mas há uma preocupação grande de organizar redes, e penso que isso interessa para o que estamos discutindo aqui. Espero, sinceramente, que as cooperativas que já existem e as outras que vão ser constituídas possam se integrar nas várias redes de economia solidária que estão se constituindo no Brasil.

Para dar um exemplo que me vem à cabeça agora, a Cooperativa da Praia Verme-lha, que é do Instituto Pinel, no Rio de Janeiro, trabalha muito para as outras coopera-tivas populares incubadas no Rio de Janeiro. Eu participei de várias reuniões em que todo serviço de buffet era feito por eles. Esse é um exemplo pequeno de integração, mas vai um pouco nessa direção a pergunta que a senhora me fez.

Marta Pequeno Alves Presidente da Cooperativa Social CABESSA – Brasília-DF

Meu nome é Marta, sou presidente de uma cooperativa social de Brasília. Nós funcionamos há dez anos, porque foi uma iniciativa da diretora do Instituto de Saúde Mental da época. Ela viajou para a Itália, trouxe essa experiência, e começou “meio no escuro”. Nessa época, eu ainda não trabalhava lá. O que acontece no momento atual, temos ofi cinas, produzimos, mas temos um problema de administração, por-que a lei das cooperativas, que é uma lei bastante antiga, não reconhece as coo-perativas sociais. Nós temos uma lei das cooperativas sociais que, quando foi para ser sancionada, vários artigos foram vetados e acabou fi cando inócua porque, na hora em que vamos ver aquela lei, ela não nos benefi cia em nada. Tentando fazer

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as coisas corretas, buscamos o apoio da Organização das Cooperativas do Distrito Federal (OCDF). Eles estão nos aconselhando a trocar o termo social por especial, e isso implica alguma mudança.

A nossa preocupação é se vamos mexer nisso que é por demais importante, até para nossa atuação no mercado, porque já tivemos problemas. Por exemplo, fomos fazer um trabalho, até muito interessante, um trabalho muito bom, que conseguimos fazer, mas que não foi uma coisa muito ofi cial, porque tivemos que dar um recibo, porque ela não está plenamente organizada, apesar de ter CGC, ser inscrita na Junta Comercial. Temos algumas implicações na questão de imposto. Então, falar nessa questão de economia, se não trabalharmos a base para organizar, penso que não vamos muito longe. É o que estou sentindo na pele. Tentamos passar, muitos esta-dos nos procuram, porque temos um nível de experiência muito interessante, temos um trabalho, e quem quiser visitar, está sendo convidado, apesar das difi culdades, porque muitas pessoas não compreendem o trabalho, pensam que uma pessoa com problema mental não é capaz de produzir, mas temos feito alguma coisa.

A difi culdade que vejo é na administração dessa conversa. Vamos sentar e tentar resolver. O pessoal da OCDF, até da Organização das Cooperativas do Brasil (OCB) está disposto a fazer isso. Eu já tentei várias vezes, por meio da assessoria do de-putado Paulo Delgado, buscar um lugar para começarmos essa discussão, mas não temos tido esse retorno. Aí, eu pergunto se aqui poderíamos começar fazendo isso, porque discutir fi nanciamento, entre outras coisas, sem ver a base, vamos nos perder no meio do caminho, como estamos agora, meio sem saber o que fazer, se vamos ser cooperativa social, se vamos tentar ser especial, mudando uma série de coisas. São dez anos de busca.

Paul Singer

Quero agradecer sua pergunta. Essa é uma problemática da qual não estou a par, mas, de qualquer forma, fi co feliz em saber que já temos uma cooperativa que está dando certo há dez anos. Isso é importante. Toda legislação de cooperativa no Bra-sil me parece falha, inclusive porque é obsoleta. A Lei geral, a de n.º 5.764, é de 1971, tem mais de 30 anos. Então, está na hora de substituir, mas como o campo está completamente partido, o campo do cooperativismo está muito fracionado, as tentativas que foram feitas desde a nova Constituição brasileira, desde 1988, prati-camente não deram em nada. Penso que não temos tempo para fi car esperando um processo legislativo extremamente moroso, senão totalmente parado.

Na minha opinião, a opção correta é a opção européia, que é ter leis específi cas para as especifi cidades cooperativas. Cooperativas de trabalho precisam de uma lei de cooperativa de trabalho. Elas não têm nada a ver com cooperativa habitacional, com cooperativa de crédito, ou cooperativa de consumo. Cooperativismo cobre todo tipo de atividade econômica, mas como, graças a Deus, não temos uma única lei

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que rege toda a economia brasileira, vejam a loucura que seria, não há razão de ter uma única lei geral do cooperativismo. Pode ter para algumas coisas muito gerais e abstratas, mas, no concreto, precisamos ter uma legislação para as cooperativas sociais, ou o nome que quisermos dar.

Estou a par de que a atual vigente, que é do Governo Fernando Henrique Car-doso, não é boa, não nos ajuda. Uma das coisas que ela contém é que pessoas sem defi ciência só podem participar das cooperativas enquanto voluntários. Isso me pa-rece um absurdo. Pelo contrário: é desejável que a cooperativa não seja apenas de pessoas com essa ou aquela defi ciência, mas deve ter uma boa quantidade de pes-soas que não tenham defi ciência nenhuma, pelo menos visível, porque, invisível, todos nós temos.

Eu queria lhe dar uma resposta muito concreta. O Fórum Brasileiro de Economia Solidária está aberto à senhora e à sua cooperativa, obviamente, e nós temos um grupo de trabalho lá chamado Marco Legal, que, basicamente, se compõe de advo-gados de cooperativas, não da OCB, mas de cooperativas como essas que eu falei, as recuperadas, de trabalhadores, do MST, enfi m, de várias organizações que trabalham em economia solidária. Até agora, ninguém levantou ainda a questão das coopera-tivas sociais. Se os senhores quiserem se ligar ao Fórum e, eventualmente, mandar alguém a esse grupo de trabalho, certamente essa questão será posta na agenda e vamos começar a trabalhar.

Independentemente disso, do que o Fórum Brasileiro de Economia Solidária po-derá vir a fazer, creio que os nossos Ministérios também poderiam fazer alguma coi-sa. Poderíamos levantar a legislação, talvez fazer no futuro uma ofi cina sobre essa questão, para ouvirmos os que praticam, onde estão as insufi ciências, a que aspiram, para, a partir daí, tentarmos desenvolver um outro projeto mais adequado.

Nicéia Maria Malheiros Castelo BrancoGrupo de Projetos “Tenda Criativa” – Vitória/ES

Eu queria, talvez, polemizar um pouco. O professor Paul Singer colocou que odiaria, e eu também concordo, se o nosso trabalho fosse na direção, e citou até o exemplo dos defi cientes visuais que fazem as vassouras, de ter um forte apelo das pessoas comprarem porque têm pena ou benemerência, e não gostaria que trilhasse esse caminho. Concordo plenamente com isso. Pergunto se não há um outro caminho que talvez pudéssemos utilizar, porque não é possível fazermos um trabalho à parte, porque, por mais que o trabalho seja dentro da perspectiva da economia solidária e que tenha outros atores para adquirir os produtos e os serviços, se não poderíamos fazer, não digo um apelo social, mas utilizar algo como um marketing positivo.

O exemplo é o Projeto Tamar. Não sei se todos conhecem, porque é um trabalho principalmente no Espírito Santo, que desenvolve uma atividade de preservação das tartarugas marinhas, e têm uma forma de geração de renda muito interessante. Eles

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fazem camisetas belíssimas, têm um trabalho dentro de uma loja de shopping, com uma qualidade muito boa. Na verdade, as camisetas não são baratas, mas eu, por exemplo, compro camisetas do Projeto Tamar porque eu sei quem faz, porque tem a questão do valor agregado.

Não seria positivo fazermos o apelo social no sentido de mostrar o lado que o Pedro Gabriel colocou, da loucura como produtiva, como criativa, e não que estão adquirindo porque aquelas pessoas são “coitadinhas”? Era nesse sentido que eu que-ria polemizar, utilizarmos isso como algo positivo, porque a lógica do mercado fala de agregar o valor, e assim por diante. Eu queria que o senhor comentasse isso.

Paul Singer

Obrigado, Nicéia. Eu devo confessar uma coisa aos senhores. Existe uma impor-tante corrente na economia solidária que pensa exatamente como a senhora, que se chama a corrente do consumo responsável e consciente. Existe literatura sobre isso, posições tomadas. Aquela corrente entende que o consumidor tem um voto, que é o dinheiro que ele gasta, e deve gastá-lo também com fi nalidades que não sejam apenas as necessidades dele. Eu tenho divergências com essa corrente, não obstante minha Secretaria fazer política de consumo consciente. Eu consigo dividir entre as minhas posições pessoais e as do movimento. Não tenho a menor idéia de impor as minhas idéias ao movimento.

Vou ser breve, porque essa é uma longa discussão. A minha grande dúvida em re-lação ao consumo consciente é se ele não cria um nicho que, no fundo, vá prejudicar a economia solidária. Não é necessário que seja apenas para os loucos, ou para os cegos. É possível usar o argumento social de uma forma mais geral, e há toda uma proposta de certifi car os produtos da economia solidária, todos, independentemente do tipo. O selo vermelho ao lado do selo verde, que é o do Tamar, da questão am-biental. Eu não vou dizer que eu sou contra, mas pode ser minha formação de eco-nomista. Eu preferiria que os produtos que estamos procurando vender sejam bons em qualidade e em preço, sem ser preciso usar qualquer outro argumento.

Em dois minutos, o argumento todo é o seguinte: obviamente, só vamos conse-guir sensibilizar para o consumo consciente uma pequena minoria da população. Penso que seria muito otimismo imaginar que metade dos brasileiros vão começar a comprar coisas tentando ver a origem, etc. Pouca gente faria isso. Se procurarmos fazer a economia solidária inteira depender dessas pessoas, a capacidade de crescer terá minguado. Eu não gosto do mercado protegido por isso, porque não precisa-mos realmente ter a mesma qualidade e o mesmo preço que os demais. No entan-to, essa é uma discussão que não acabou, e eu estou pronto a deixar me convencer que estou errado.

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Maria Dirce CordeiroOrganização Social “De Volta Para Casa” – Santo André/SP

Meu nome é Maria, eu coordeno um grupo de trabalho no município de Santo André. Nós vivemos, há tempos atrás, uma experiência riquíssima com esses usu-ários do serviço de saúde mental do município. O professor colocou uma questão que entendo fundamental porque, quando nos sentávamos para conversar com to-dos os outros envolvidos na questão da formação, de orientação e tudo mais, nos deparamos com problemas na seguinte linha: “Mas vocês vão produzir o quê?” Eu respondia sempre que nós iríamos produzir uma série de coisas, o que vai nessa linha do que o senhor disse. Não vamos produzir um produto. Na verdade, pen-so que sonhamos e acreditamos que a nossa possibilidade de produção é imensa. Na minha opinião, estamos aqui diante de um desafi o enorme. Teremos que fazer muitas construções, porque existem muitos atores que estão e deverão estar envol-vidos num processo desse, com um grande desafi o. Estou me sentindo talvez hoje um pouco mais animada por estar junto com parceiros nessa briga, mas me chamou muita atenção quando o senhor fez essa colocação, porque é algo extremamente importante nesse processo.

Um outro problema com o qual me deparei muito era o seguinte: nós trabalhamos com muitas pessoas que recebem um auxílio-doença, um benefício por essa via. Nós fazíamos grupos de formação para aprender como formaríamos uma cooperativa, e as pessoas fi cavam apavoradas, porque diziam que, se recebiam um benefício, não poderiam ser associados de uma cooperativa, porque colocava em choque a ques-tão de ganhos associados. Sem dúvida, essa é uma questão que merece também o nosso pensar e o nosso discutir, como tantas outras.

Paul Singer

Primeiro, quero lhe agradecer. A senhora está dando uma grande contribuição para o que estamos querendo construir, principalmente pela experiência concreta. Eu que-ria apenas dar mais um passo no nosso raciocínio comum. Um grupo extremamente excluído no Brasil é o dos jovens. A taxa de desemprego entre os jovens costuma ser duas vezes maior do que a média. Em São Paulo, a média estava por volta de 20, agora está menos, está 18. Isso quer dizer que mais de 30 ou 40% dos jovens não conseguem emprego. Uma das saídas seria também formar cooperativas de jovens. Seria preciso mudar a legislação, porque, como eles são menores de idade, já começa por aí. As difi -culdades são as mesmas dos sofredores psíquicos e dos jovens, mas também as mesmas oportunidades. Se reunirmos 20 jovens e resolvermos fazer uma cooperativa, alguns vão querer cantar, eventualmente, ou dançar, ou fazer grafi te, outros terão idéias inte-ressantes. Então, é muito parecido com isso que estamos discutindo.

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Estou sonhando, na verdade, a partir disso que estamos começando hoje à noite, que criemos um processo de multiplicação de cooperativas de excluídos por qual-quer motivo e procuremos lutar para que haja as adequações legais que nos dêem o espaço necessário para que isso possa frutifi car.

José de Souza De PaulaSociedade de Serviços Gerais para Integração Social pelo Trabalho (Sosintra) – Rio de Janeiro/RJ

Eu quero saudar a Mesa, saudar os companheiros. Meu nome é De Paula, perten-ço a uma associação de familiares na área de saúde mental. É a chamada Sosintra, fundada em 1978. Na época, os familiares que tinham seus parentes com transtorno mental, criaram a Sosintra, que quer dizer Sociedade de Serviços Gerais para Inte-gração Social pelo Trabalho. É interessante, em 1978, essa preocupação da inclusão social, na época em que era discutida toda a questão do movimento nacional da luta antimanicomial e da reforma psiquiátrica.

É muito emocionante estarmos aqui neste momento, a convite do doutor Pedro Gabriel, que fazia parte da Sosintra, dando orientações técnicas. Estamos desde 1978 tentando essa inclusão. Agora, vemos, em nível nacional, que a evolução é inexorá-vel. Temos uma política nacional voltada para a economia solidária e a inclusão.

Professor, aproveitando o gancho da companheira sobre o Projeto Tamar, gostaria que o senhor fi zesse uma explanação sobre como o senhor vê as ONGs entrando nesse fi lão e, às vezes, confundindo e tonteando a questão da economia solidária, a participação de membros dessas ONGs criando alguma coisa, dando dinheiro, facilitando até a inclusão patrimonial. Como é essa questão atualmente das coope-rativas e das ONGs.

Paul Singer

A sua pergunta é factual, e eu não sei realmente responder. Quando eu estive em São Paulo, no Congresso de Caps, eu vi alguns depoimentos de parentes, de pais, etc., de sofredores psíquicos, e eu fi quei muito impressionado. Creio que os senhores dão uma demonstração de solidariedade humana imensamente importante. Espero que os senhores possam participar, aliás, devem participar.

José de Souza De Paula

Professor, como o senhor falou, sem a conscientização da família nesse processo ideológico e político, eu também vejo uma grande complicação.

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Paul Singer

Eu concordo. Creio que a presença dos familiares solidários, e vamos além dos familiares, dos amigos, eventualmente, vem do modelo italiano, que é o que mais vejo como exitoso, quer dizer, ao lado das pessoas que têm impedimentos psicológi-cos ou físicos, o que seja, que haja outros que não tenham esses impedimentos, mas que queiram estar lá por solidariedade e também para ganhar a vida. Não há porque fazer guetos uniformes, ou seja, cada cooperativa de um segmento. Então, a presença das pessoas integrando as cooperativas, na minha opinião, seria magnífi ca. Talvez, outras formas de dar apoio também, mas, sobretudo, ao integrar, pessoas que têm essa disponibilidade, obviamente, dariam uma ajuda extremamente importante.

Pedro Gabriel Delgado

Creio que já conseguimos fazer um primeiro aquecimento, que foi muito bom. O conjunto de questões que surgiram aqui já é material sufi ciente para darmos se-guimento de uma maneira muito produtiva a essa ofi cina.

Agradeço a presença de todos os senhores, a presença do nosso conferencista, o professor Paul Singer, da equipe da Secretaria de Economia Solidária, a todas as ex-periências, às pessoas que chegaram agora no fi nal. Quero fazer um apelo quanto à pontualidade, de modo que todos estejam aqui, principalmente quem, na parte da manhã, vai coordenar, que é o Fábio, o guardião da pontualidade. Teremos o Fábio coordenando seis experiências para dar um panorama. Um dos critérios utilizados foi uma certa sustentabilidade, experiência que já exista há algum tempo, e não mui-to mais do que isso, porque não temos ainda um mapeamento muito preciso. Essas experiências servirão para trazer os subsídios da prática concreta para esse debate. Teremos agora um coquetel, e amanhã estaremos aqui às nove horas. Agradeço a todos os senhores.

3.2 Mesa-redonda: 23 de novembro de 2004 “Experiências de Geração de Renda e Trabalho em Saúde Mental” e “Agências de Apoio e Fomento”

Coordenador: Fábio SanchezSENAES/MTE

Teremos agora uma Mesa para relatar um pouco as experiências de geração de renda e trabalho em saúde mental. Eu queria convidar para compor a Mesa e contar um pouco a experiência: a Tereza Monnerat, Assessora da Coordenação de Saúde Mental do município do Rio de Janeiro; a Rosemeire Aparecida, da Coordenação de Saúde Mental da Prefeitura de Belo Horizonte; a Luciana Cristina de Alcântara,

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da Cooperativa Cândido de São Paulo; a Carmem Vera Passos Ferreira, GerAção-Poa de Porto Alegre; a Silvia Maria de Oliveira Mendes, da Trabalharte de Juiz de Fora; e a Vera Pazos, do NUSAMT.

Estamos prevendo fazer o relato das experiências, cada um terá mais ou menos 15 minutos para relatar. Como disse ontem o Pedro Gabriel, essas experiências fo-ram convidadas para serem expostas sem nenhum grande critério anterior. Um dos objetivos do Seminário é articularmos as políticas de geração de renda e de saúde mental, tanto as políticas públicas, como os movimentos. Isso não começa agora; já temos um percurso, representado por essas experiências que estão aqui. Por isso, temos a idéia que elas relatem um pouco a sua história, o caminhar que tiveram até aqui, para podermos refl etir um pouco e, a partir daí, começarmos a articular mais as ações.

Previmos esses 15 minutos para o relato das experiências também a fi m de abrir para o debate depois, para que outras que estejam aqui também possam utilizar a fala, contar e problematizar um pouco o seu percurso. Então, vou pedir para a Tere-sa começar com a exposição.

Teresa MonneratCoordenação de Saúde Mental da Secretaria de Saúde do Rio de Janeiro/RJ

Bom-dia a todos. Quero parabenizar os Ministérios da Saúde e do Trabalho/Se-cretaria Nacional de Economia Solidária, por essa oportunidade que nós ansiamos há muitos anos – podermos discutir coletivamente uma política nacional sobre o tema.

Represento o Município do Rio de Janeiro, uma cidade com seis milhões de ha-bitantes. Em nossa rede, temos atualmente 13 Caps em funcionamento, três grandes institutos oriundos do Ministério da Saúde, 16 SRTs e dispositivos ambulatoriais. Com relação aos projetos de trabalho e geração de renda, temos implementados 60 projetos, com cerca de 500 usuários participando.

Dentre esse universo de projetos, temos: artesanatos, feiras – 17, bijouterias – 6, cantinas – 6, agrícolas – 2, livraria e editora – 2, cosmético – 1, brechó – 7, reci-clagem e artesanato de papel – 8, alimentos – 7, silk screen – 2, marcenaria – 1, e programas de capacitação para o trabalho – 1, mas permanentemente temos novos projetos.

Em primeiro, vou abordar algumas questões, para podermos contextualizar os projetos em que tive participação direta. Entendendo a complexidade da cidade – no caso do Rio de Janeiro, uma grande cidade, com situações sociais muitíssimo complexas – onde os usuários têm que circular e viver. Muitos egressos das institui-ções totais, com dez de anos de internação, outros que restringiam suas vidas à casa familiar. Hoje, trabalhamos no sentido de que essa clientela participe da vida da ci-dade, entendendo esta cidade como espaço dinâmico, espaço de interação entre as

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pessoas e resultado das ações de diferentes setores, que apresenta diversos níveis de confl itos, marcando a própria dinâmica da inclusão e da exclusão social.

Nesse contexto, as políticas sociais têm papel relevante e estratégico, pois devem direcionar suas ações para diminuir as desigualdades existentes na cidade, deven-do, para tanto, observar as regras que regem o mercado, a inserção social local e a singularidade da clientela-alvo.

A atual política de saúde mental propõe ações que propiciam a redução de li-mitações, oferecendo oportunidades em diferentes áreas, com o objetivo de manter essa clientela na comunidade com a melhor qualidade de vida possível.

A nossa população-alvo – usuários de saúde mental – se encontra em grande des-vantagem no mercado de trabalho, pois não cumprem os requisitos mínimos que o mercado exige, nem o perfi l profi ssional que buscam os empregadores. Quando vemos um jornal, as exigências para entrar no mercado, a experiência profi ssional, carga horária, etc., confi rmamos que esta clientela não entra nesse mercado, ou melhor, esse mercado não está colocado para ela. Os insucessos apontados para as inserções tradicionais – busca de trabalho no mercado formal –, apontam no sentido de revermos essas ações tradicionais.

Apresento duas experiências. Os senhores receberam o panfl eto sobre uma das ex-periências, que é a Cooperativa da Praia Vermelha, da qual eu participei diretamente, a Denise Correia, que está presente, também. Iniciou-se em 1996, nas dependências do Instituto Pinel, em Botafogo, na zona sul do Rio. Além de propor a preparação e venda de produtos alimentícios, coloca também a questão de cidadania. Elegemos a Amazônia como o tema da Cooperativa – sugestão de um familiar acreano ligado aos movimentos em defesa da Floresta Amazônica – que muito colaborou na articu-lação com o Governo do Acre e a Cooperativa de Xapuri, o que contribui muito em diversos sentidos, porque possibilitou criar uma rede solidária no Rio com a questão da loucura e do meio-ambiente. Tivemos a imensa satisfação de receber a visita do vice-governador do Acre, índios da fl oresta, mulheres quebradoras de coco, então, periodicamente, recebíamos alguma visita, e esses usuários que estavam discutindo a produção dos produtos alimentícios – biscoito de castanha do Brasil, sorvete, bolo de cupuaçu – estavam discutindo também a situação da Amazônia, da preservação de nossas fl orestas. A senadora Marina Silva esteve conosco em vários eventos. Por-tanto, todos esses parceiros contribuíram para aumentar a rede de relacionamento e de participação comunitária. Por exemplo, em toda entrega da medalha Chico Mendes pelo Grupo Tortura Nunca Mais, temos espaço garantido de participação, com a venda dos produtos da Cooperativa, como também o Conselho Regional de Engenharia e de Arquitetura se aproximou de nós, abriu um quiosque dentro das suas dependências para vender os nossos produtos.

A assessoria da Incubadora Tecnológica Cooperativas Populares, da Universida-de Federal do Rio de Janeiro, sob a coordenação de Gonçalo Guimarães, permitiu

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avanços importantes, tanto na produção, formulação de preços e nos processos de comercialização, como no campo das ações políticas, com ênfase na participação nos Fóruns Populares de Cooperativas Populares, onde tínhamos assento junto com as demais cooperativas populares da cidade.

Essa rede, que foi uma rede solidária, deu nova dinâmica, o tema “meio ambiente” favoreceu uma nova inserção na cidade, facilitando também discutirmos os direitos dos usuários em novo contexto. Todos os participantes – técnicos, usuários e familia-res – fi caram muito motivados para discutir a questão do meio ambiente, participar de feiras e eventos. Verifi camos a importância de elegermos um tema ligado à cida-de e à qualidade de vida, para, somado às propostas da política de saúde mental, favorecer a inserção de nossos usuários na vida comunitária.

Em nossa experiência, verifi camos uma questão com a qual temos de investir muito que é a da capacitação para o trabalho. Na Praia Vermelha, e creio que em todos os outros projetos, há uma capacitação permanente. Discute-se assiduidade, pontualidade, regras, manejo do dinheiro, todo aquele mundo que rege o mercado, discutimos dentro das reuniões.

Sentimos a necessidade no Município do Rio de elaborar um programa visando à capacitação. Elaboramos um projeto muito interessante que foi apresentado pela Coordenação de Saúde Mental à Secretaria Municipal de Trabalho.

O projeto, denominado Deixa Comigo, com duração de seis meses, contou com a participação de 33 usuários. Eles receberam durante o período do projeto, bolsa de R$ 100,00 por mês. Foram dois meses de capacitação visando a introduzir às “regras do mundo do trabalho”, com ofi cinas, com a questão da higiene pessoal, de manejo de dinheiro, etc. Tiveram dois meses de preparação de empreendimento, onde cada um fez um projeto de microempreendimento, de forma coletiva ou individual, detalhado com custos, habilidades exigidas, maquinários e/ou equipamentos necessários. Na última etapa, participaram de estágio nos Comitês de Trabalhos Solidários, que são unidades, principalmente órgãos de governo, associações, ou ONGs que abrem um espaço para estágio sob supervisão. Então, essas pessoas estagiaram por dois meses nesse ambiente de trabalho como recepcionista, ofi cineiros, auxiliar administrativo, dentre outros. Foi uma experiência muito enriquecedora e de enorme sucesso. No fi nal do período de estágio, todos os 33 participantes do projeto permaneciam, isto é, não houve evasão, além de receberem elogios pela assiduidade e pontualidade. A escolha do local para estágio foi realizada, atendendo ao perfi l profi ssional de cada usuário participante, por exemplo, tinha um rapaz que era universitário e gostava muito de ler, então, foi estagiar na Biblioteca Municipal, onde ele catalogava livros, organizava arquivos, etc., os que tinham formação pedagógica foram trabalhar como educadores no Cemase, Centros Sociais da Prefeitura, com crianças. O que tinha experiência em artesanato, fazia móveis com material reciclado, especialmente gar-rafas pet, estagiou no centro de programa de idosos e, um dia, ele me disse que ti-

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nha fi cado emocionado quando tinha visto o seu nome num cartaz anunciando um curso que ele ia dar de reciclagem de garrafas pet.

A totalidade dos projetos de empreendedorismo foi apresentada à coordenação do Fundo Carioca – programa que fornece matéria prima e/ou equipamentos de trabalho para os participantes dos projetos de capacitação da Prefeitura. Cada projeto deve-rá apresentar uma proposta de orçamento de até R$ 800,00; a proposta é analisada e, se aprovada receberá a doação do equipamento. Como retribuição da doação, o benefi ciário deverá prestar algum serviço solidário para sua comunidade.

Houve um projeto muito interessante e que foi aprovado prontamente. Não sei se os senhores conhecem aparelhos de alto-falantes em lojas populares, para divulga-ção das mercadorias. Esse usuário tem uma voz bem forte, mora no bairro da Zona Oeste da cidade, que é uma zona com muito comércio popular. Então, ele ganhou o equipamento e prevê receber aproximadamente R$ 65,00 por dia nas lojas de va-rejo que pretende atuar. Esse é um exemplo de sucesso. Outros projetos ainda estão com difi culdades de aprovação.

Então, sugiro que a capacitação para o trabalho seja tema da discussão na parte da tarde – a necessidade de se implementar projetos para preparação da clientela para o mundo do trabalho. Essa população esteve sempre muito tutelada, muito ins-titucionalizada, precisamos pensar as diferentes formas de capacitação; poderemos oferecer a essa clientela, novas oportunidades de inserção profi ssional.

Fábio Sanchez

Eu vou passar a palavra para a Luciana Cristina. Peço desculpas à Teresa, pois estou sendo rigoroso com o tempo para podermos dar um espaço depois para os debates.

Luciana Cristina de AlcântaraCooperativa Cândido – Campinas/SP

Primeiramente, quero agradecer a oportunidade de estar aqui representando a mi-nha cidade, que é Campinas, em São Paulo, e os serviços de saúde mental e os pro-jetos de geração de renda que temos lá. Outros colegas de Campinas também estão aqui participando do evento. Quero agradecer aos idealizadores, aos organizadores e aos realizadores do evento, além dos senhores que estão aqui ouvindo.

Falarei da experiência do local onde trabalho, o Serviço de Saúde Dr. Cândido Ferreira, que é um dos serviços de saúde mental de Campinas. Ele é constituído por unidades assistenciais e uma dela é o Núcleo de Ofi cinas e Trabalho (NOT). Coordeno uma de suas ofi cinas, a ofi cina agrícola. É dessa experiência específi ca que falarei, e não de forma abrangente, sobre os projetos da Prefeitura como um todo.

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Armazém das Ofi cinas é a marca dos produtos que temos nas ofi cinas. O NOT existe desde 1990. O Cândido aderiu à reforma psiquiátrica nessa época, quando foram criados alguns equipamentos diferenciados do modelo convencional. Um de-les foi o das residências terapêuticas, e o NOT também surgiu nessa época, como uma unidade assistencial. Nós produzíamos, mas não tínhamos uma marca. Com o crescimento das ofi cinas e o aprimoramento dos produtos, vimos que, para estar no mercado e ser competitivo, seria preciso uma marca. Assim, a equipe entrou numa campanha para vermos que marca teriam os nossos produtos. Foi feita uma seleção de nomes, e Armazém das Ofi cinas foi a marca escolhida porque reunia todas as ofi cinas do NOT.

O Cândido é considerado como modelo pela Organização Mundial da Saúde desde 1993, pelo modo de tratamento diferenciado que oferece. Tem um convênio de co-gestão com a Prefeitura desde 1990. É nesse mesmo período que a inserção do Cândido na reforma psiquiátrica acontece. Essa parceria com a Prefeitura foi um dos fatores que alavancou os projetos que o Cândido desenvolve.

Em média, atendemos mil usuários por dia no Cândido, distribuídos em todas as unidades assistenciais, que são os equipamentos substitutivos, Caps, Centro de Con-vivência, Núcleos de Atenção à Crise, Moradias, dentre outros. Eu separei o Núcleo de Ofi cinas e Trabalho da Associação Cornélia Vlieg porque ele é uma das unidades assistenciais do Cândido. Há evolução de prontuários, a equipe de saúde mental é multiprofi ssional, temos psicólogos, assistentes sociais, terapeutas ocupacionais, essa parte é assistencial. Há atendimentos individuais e/ou grupais, atendimento a familiares e outros procedimentos de caráter terapêutico-assistencial. E a Associa-ção Cornélia, formada pelos usuários do NOT, profi ssionais e familiares, viabiliza a questão administrativa, fi nanceira e comercial das Ofi cinas.

O NOT surgiu no período anterior à data de criação da Associação onde são de-senvolvidas atividades profi ssionalizantes tanto para a equipe, quanto para os usu-ários que participam do projeto. Seus objetivos são: contribuir para a inclusão de pessoas portadoras de transtornos mentais e promover e viabilizar projetos de gera-ção de renda, estimular a inserção no mercado de trabalho e a formação, por meio da educação, para o trabalho.

Quando a Associação Cornélia foi criada, se imaginava e se idealizava que os usuários seriam preparados para o trabalho e que sairiam para o mercado prontos para conseguirem um emprego, retomar uma outra qualidade de vida com o que aprenderam no NOT, porém, observou-se que isso não estava acontecendo, pois além de demorar muito para os usuários saírem, pois não tinham muita espontanei-dade em expressar sua vontade de sair e que se sentiam prontos para o mercado, havia o problema do desemprego. Enfi m, percebeu-se que, aqueles que iam, volta-vam depois de algum tempo. Ficavam inseguros e com medo sobre o que fazer em caso de surtos ou crises no local de trabalho. Teve um usuário que conseguiu uma

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vaga numa multinacional em Campinas. Ele pedia ajuda, pois estava com medo de que acontecesse alguma coisa errada na entrevista. Ao observar essa realidade, mu-dou-se o enfoque e começou-se a trabalhar com a idéia do cooperativismo. Quan-do percebemos que a saída dos usuários para o mercado de trabalho era muito di-fícil, mudamos a trajetória e começamos a pensar em formas mais organizadas de trabalho com a população atendida, uma forma adaptada de trabalho para atender à demanda deles. Começamos a trabalhar os conceitos de cooperativismo, com o objetivo de, no futuro, formar uma ou várias cooperativas.

Há a parceria entre a Associação e o Cândido Ferreira. A primeira presta serviços para o Cândido, logo, os usuários prestam serviços para o próprio hospital. Na co-zinha do hospital, por exemplo, tem funcionários que são usuários. É um projeto de parceria. Na limpeza, na higiene do hospital, também tem usuários que trabalham pela ofi cina, em parceria com o hospital.

Há um convênio com a Secretaria de Assistência Social de Campinas, por inter-médio de um projeto que atende pessoas em situação de rua. A cada seis meses, 11 pessoas em situação de rua vão para as ofi cinas para serem inseridas no ambiente de trabalho, com geração de renda. Durante seis meses eles recebem uma bolsa-mora-dia da Secretaria de Assistência Social, com o que alugam uma casa ou pagam uma pensão para saírem da rua. Depois que termina esse período, eles permanecem nas ofi cinas. A maioria continua no projeto, continua pagando seu aluguel, cuidando da sua vida, enfi m, transformam realmente as suas vidas.

Há uma subvenção da Secretaria de Assistência Social também. Eles doam R$ 2.000,00 anuais à Associação para serem gastos em insumos, em materiais perecíveis.

Nas ofi cinas, atendemos a 230 usuários, divididos em 12 ofi cinas. A mais nova é a Ofi cina de Ladrilho Hidráulico, que foi acoplada à de Construção Civil. Essa Ofi cina de Construção Civil também presta serviço nas residências terapêuticas do Cândido e na manutenção predial do próprio hospital. Cada Ofi cina é coordenada por um profi ssional da saúde mental, seja psicólogo, terapeuta ocupacional, assisten-te social, enfermeiro, nutricionista. Os monitores são as pessoas que acompanham as atividades de produção. Na marcenaria, por exemplo, temos um marceneiro; na serralheria, um serralheiro. Nas outras Ofi cinas, como a de Mosaico, por exemplo, a monitora não tinha uma formação específi ca, então, foi capacitada para monito-rar os usuários.

Todos os usuários são encaminhados pelos Serviços de Saúde Mental de Campinas, e o projeto terapêutico individual pode ser compartilhado pelas equipes. Por exemplo, os usuários dos Caps são encaminhados para a ofi cina, numa fase do tratamento, em que se encontram estabilizados, iniciam o projeto de reabilitação profi ssional e são inseridos na geração de renda obtendo mais qualidade de vida, e as equipes ou os técnicos discutem juntos sobre como fazer, sobre qual ofi cina será melhor, etc. Tem usuário que não sabia pegar ônibus para ir da sua casa até o Cândido, então, ava-

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liou-se se algum familiar irá ensiná-lo a pegar ônibus ou se seria alguém da equipe. Assim, na medida do possível, fazemos essa parceria com as equipes dos centros de saúde, enfi m, com todas as equipes que encaminham usuários.

A Associação funciona nos moldes cooperativistas, o que é um desafi o, pois per-cebemos que o caminho não era preparar pessoas para competirem no mercado de trabalho, mas mudar a lógica. Ao invés de pensarmos que a pessoa iria fi car apta para competir no mercado de trabalho, percebemos que era o produto que deveria ser competitivo, que deveria ter qualidade e ele que deveria ir para o mercado.

Abrimos vagas para todos os usuários, e não apenas para os mais aptos, porém não há lugar para os casos mais complexos e mais graves nas ofi cinas porque o ritmo de produção é muito rápido. Entretanto, recebemos desde o caso mais grave até o caso mais apto. É um grupo heterogêneo. Atendemos psicóticos e dependentes químicos, e, geralmente, os dependentes são bem mais autônomos para as atividades.

Começamos a trabalhar com a idéia do cooperativismo. Montamos o estatuto, já foi aprovado pelo Ocesp, mas esbarramos naqueles três problemas que foram discu-tidos ontem pelas colegas Maria e Marta. A Maria falou do fato de que, quem recebe bolsa-auxílio ou é aposentado, não pode ser cooperado porque perde o direito ao benefício ou à aposentadoria. A Marta também lembrou da questão da carga tribu-tária, que é exatamente igual à da cooperativa convencional. A cooperativa social, na verdade, não tem nenhuma vantagem por ser social. Legalmente, ela competirá em nível de igualdade com a cooperativa convencional, no funcionamento não. Ela tem que ser adaptada à população, e nós sabemos que é uma população com ca-racterísticas próprias que deve ser respeitada, do contrário, não consegue estar no projeto. E o terceiro problema encontra-se no fato de que pessoas que não estão em tratamento na saúde mental só podem pertencer à cooperativa como voluntários, não podem se tornar cooperados.

Os usuários participam das decisões, da avaliação, faz-se a distribuição da receita de acordo com a freqüência, produtividade e desempenho dos usuários. Eles todos acompanham esse processo, fazemos uma roda com os presentes e conversamos sobre o que está acontecendo.

As Ofi cinas também são espaços terapêuticos e de formação para o trabalho. En-tendemos que, para o produto ser competitivo, se o usuário for capaz somente de pintar, ele vai ter que ser o melhor naquilo que consegue fazer. Por exemplo, mesmo que ele seja capaz somente de pintar, ele poderá participar, porque cada produto tem sua etapa de construção.

O Sebrae oferece capacitação para a questão administrativa e para a confecção dos produtos. Uma designer, do Sebrae, trabalhou com os usuários, dando a noção do desenvolvimento do produto, da harmonia, das cores, do acabamento, do que é um produto de bom gosto, etc. Eles estavam em atividades nas Ofi cinas de Artesanato.

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Na Ofi cina Agrícola, em parceria com a Secretaria de Saúde de Campinas, te-mos um projeto de fi toterapia, o Programa de Fitoterapia de Campinas. Nas ofi ci-nas, produzimos as ervas medicinais e mandamos a matéria-prima para a Prefeitura. As plantas medicinais não podem ser contaminadas. Os senhores podem imaginar trabalhar isso com essa população de portadores de transtornos psíquicos. O traba-lho de capacitação tem que ser delicado e rigoroso. Fizemos parceria com a Cati de Campinas, com o Instituto Agronômico, com o Grupo de Desenvolvimento Ru-ral Sustentável e Segurança Alimentar e Ceasa–Campinas, com as instituições afi ns para treinar os usuários. Estamos tendo um curso de olericultura orgânica para dez usuários que estão nesse projeto da fi toterapia. As Ofi cinas funcionam de segunda a sexta, das 7h às 16h, com plantão nos fi nais de semana e nos eventos. Todos os usu-ários recebem uma bolsa-ofi cina, que varia de R$ 30,00 a R$ 500,00, dependendo da atividade e da avaliação que é feita.

Agora vamos aos desafi os. Dentre eles, aumentar as vagas para novos usuários. Hoje, atendemos 230. No ano de 2000, tinha uma estatística do IBGE que dizia que Cam-pinas tinha 13 mil pessoas portadoras de transtorno mental. No projeto do Cândido de geração de renda, atendemos somente 230. Signifi ca que tem um grande número de pessoas esperando por espaços alternativos de tratamento. Como os senhores ouvi-ram, a bolsa varia entre R$ 30,00 e R$ 500,00. O ideal é que a bolsa mais baixa seja de pelo menos um salário mínimo. Acreditamos que para ampliar a oferta de ofi cinas de trabalho na cidade seria interessante que o SUS fi nanciasse esse tipo de projeto em maior escala. Ainda, estabelecer parcerias com outros setores, como é a proposta desse evento, de estar com o Ministério do Trabalho, da Economia Solidária, dentre outros. Também, a mudança na legislação. Sabemos que se a legislação e os tributos não fo-rem adequados, vamos esbarrar neles.

Os produtos das Ofi cinas são: Vitral Plano, Velas Artesanais, Gráfi ca, Serralheria, Mar-cenaria, Agrícola, Culinária. As Ofi cinas têm uma característica interessante no sentido de que elas foram criadas de modo que umas produzissem matérias-prima para as ou-tras. A Serralheria, por exemplo, faz o pé de uma mesa, a Marcenaria faz o tampo, e o Mosaico faz a decoração desse. Ao se vender um produto, benefi cia-se as ofi cinas que participaram da produção das peças.

Para terminar, gosto muito da resposta de Freud, já velho e no término de sua vida, a uma pergunta que lhe fi zeram: “O que é ser normal?” Com toda a complexidade de sua obra e toda a sua sapiência, respondeu: “Ser normal é a pessoa que ama e que trabalha”. Ele sabia que, para ter a capacidade de amar e de trabalhar, precisa-mos de uma estrutura muito grande, que vem desde quando nascemos. Então, não é fácil, não é pouco, amar e trabalhar. Termino com essa impactante frase de Freud: “Ser normal é a pessoa que ama e que trabalha”.

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Fábio Sanchez

Vou passar a palavra para a Carmem da GerAção-Poa de Porto Alegre.

Carmem Vera Passos FerreiraGerAção-POA – Porto Alegre/RS

Quero cumprimentar a todos e agradecer a possibilidade de estarmos neste even-to, estar compondo esta Mesa, trazendo a experiência que estamos estabelecendo em Porto Alegre e, também, dialogar sobre as demais experiências. Como dizia uma colega com quem eu conversava hoje pela manhã, sermos um pouco “esponjas” no sentido de estarmos assimilando a experiência dos outros e vendo como podemos contribuir com as nossas.

Eu vou falar da GerAção-Poa. Este foi um nome escolhido democraticamente pelos usuários no sentido de gerar a ação. Ele é um serviço da Secretaria Municipal de Saú-de, da Prefeitura de Porto Alegre. Insisto em dizer que é um serviço, mas ele ainda não é um serviço credenciado. Apesar de não ser ainda um serviço, é um núcleo do Caps, mas trabalha de uma forma completamente independente.

Para pensarmos como foi constituída, principalmente, essa parceria entre saúde mental e saúde do trabalhador, que é o diferencial do nosso trabalho, precisamos fa-zer um breve histórico. Em 1990, no seio da reforma psiquiátrica e do movimento da luta antimanicomial, criamos em Porto Alegre o primeiro serviço de saúde mental da rede municipal, a Pensão Nova Vida, que se deu com o descredenciamento do INSS de uma moradia protegida que acontecia na cidade. Tanto o estado como o municí-pio acabaram assumindo a administração desse serviço, e a rede foi sendo composta a partir dele. Então, a Ofi cina inicia como uma ofi cina de geração de renda, ainda nesse núcleo de moradia protegida.

Nesse meio tempo, surgiu também em Porto Alegre o Centro de Referência de Saúde do Trabalhador. Também é formado o Cais Mental Centro (Centro de Atenção Integral à Saúde Mental, como são denominados alguns Caps em Porto Alegre) com um nú-cleo de profi ssionais da Pensão Nova Vida, e a ofi cina começa a se defrontar com um problema de manter uma ofi cina de trabalho dentro de uma moradia protegida, não só atendendo aos usuários da própria moradia, mas também da rede que já estava se for-mando. Víamos, por exemplo, que estava no horário da Ofi cina, mas que alguém não tomara seu banho, ou lavara sua roupa, ou priorizava um atendimento. Começamos, então, a buscar na cidade um outro lugar que fosse mais marcado pelo trabalho e que pudesse acolher esse projeto.

Em 1996, fi rmamos um convênio com o Centro de Reabilitação Profi ssional do INSS que, na época, estava com a sua equipe de recursos humanos bem defi citária e bus-cava, assim, profi ssionais que pudessem, segundo eles, fazer a avaliação profi ssional e a troca da lateralidade. Bancamos que iríamos atender realmente a clientela da saúde

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do trabalhador junto com a clientela da saúde mental, mas com um plano terapêutico traçado por nós. Se nesse plano incluísse troca de lateralidade ou avaliação profi ssio-nal, nós faríamos. Nós compramos a briga, e como eles estavam precisando, de fato de recursos humanos, conseguimos fi car nesse serviço até o ano de 2000, com essa parceria. Primeiro, trabalhávamos num grande porão, depois fomos “promovidos” para o segundo andar, um lugar mais arejado. Foi uma batalha constante, mas fortaleceu o que fazemos até hoje no sentido de trabalharmos com essas duas clientelas.

Quando nós rompemos esse convênio por interesse nosso, no ano de 2000, e fomos para um prédio próprio, continuamos a atender a clientela da saúde mental e da saúde do trabalhador, agora encaminhada somente pelo Centro de Referência de Saúde do Trabalhador. Hoje, a nossa equipe é formada por profi ssionais tanto da saúde mental quanto da saúde do trabalhador. Agora, estamos num prédio próprio, que depois vou mostrar aos senhores, um lugar privilegiado, no bairro Moinhos de Vento, um bairro de classe média de Porto Alegre, um prédio próprio municipal, uma conquista que conseguimos nesse meio tempo.

Em 1998, foi o ano que nos vimos num enfrentamento. Éramos um serviço, ou um núcleo do Caps, ou éramos uma cooperativa? No serviço, nas etiquetas dos nos-sos produtos, colocávamos Cooperativa de Expressão e Arte, nome que tinha sido escolhido pelos usuários na época. Mas até onde fi cava a nossa atuação enquanto serviço, e onde começa a Cooperativa? Foi aí que resolvemos buscar uma assesso-ria na Universidade Federal do Rio Grande do Sul. A partir daí, começamos a en-tender a questão da economia solidária e buscamos na cidade algum núcleo que trabalhasse com este vies. Fizemos, então, em 1998, um convênio com a Secretária Municipal de Produção, Indústria e Comércio (SMIC), que trabalha com o Núcleo de Economia Solidária.

O objetivo é mais do que geração de renda, mas trabalhar com a reinserção so-cial realmente, priorizar a escuta de forma coletiva, porque em todos os projetos a questão de poder pensar nos produtos, por exemplo, tudo é feito de uma forma bem coletiva com os usuários, para permitir a refl exão sobre a vivência do trabalho. As-sim, conseguimos ter uma parceria com a saúde do trabalhador e, também, com o Núcleo da Economia Solidária, para podermos refl etir um pouco mais quanto a essa questão. Também, a questão de trabalharmos não somente com a geração de renda, mas com a autonomia, com a criação e a discussão.

Esses pontos foram para pensar a questão da saúde (e creio que nem é preciso explicar muito), na sua interface com a inclusão e com o trabalho, vendo o trabalho como possibilitador de um reconhecimento social. Grande parte da nossa clientela vem de uma relação com o trabalho que é de adoecimento e de dor. Trabalhamos com uma clientela composta por usuários com LER (lesões por esforços repetitivos). É im-portante pensarmos nessa questão do trabalho, refl etir sobre isso e não retornar a um trabalho alienado e alienante, que muitos desses usuários vivenciaram até então.

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Essa fala da Ana Pitta nos acompanha realmente há algum tempo para refl etir-mos sobre isso que eu disse. Muitas vezes, vemos o usuário, tanto da saúde men-tal, quanto da saúde do trabalhador, que adoeceu pelo processo de trabalho, tentar impor de novo o seu ritmo de trabalho anterior dentro da Ofi cina, aquilo que lhe causou a dor ou o adoecimento. Então, é algo para a qual estamos atentos, é parte do nosso cotidiano.

No início, foi um desafi o muito grande, trabalharmos com essa clientela, princi-palmente, porque em 1996/1997 trabalhávamos muito com pessoas que eram aci-dentadas do trabalho, e não tanto com LER/DORT. Então, atendíamos pacientes com amputações sérias, o que gerava um preconceito também. Trabalhávamos isso mui-to cotidianamente, tanto na saúde mental, quanto na saúde do trabalhador. Foi um desafi o, penso que conseguimos vencer, mas isso quando retorna temos que parar tudo, conversar e refl etir um pouco mais sobre essa questão do preconceito.

O público-alvo são os usuários encaminhados por toda a rede de atenção de Por-to Alegre, não só o Caps, ao qual somos ligados, e também por alguns hospitais que temos convênio e pelo Centro de Referência de Saúde do Trabalhador. Recebemos a comunidade por meio dos cursos de capacitação, tanto na área da economia soli-dária, quanto na inserção pelo trabalho, ou o específi co de serigrafi a, e também na Ofi cina de Expressão e Arte, que é um espaço mais aberto, que não tem o intuito de gerar renda, mas é um espaço de expressão e de criação.

Colocamos que a Ofi cina de Geração de Renda, quando acolhemos e conversamos com os usuários, é um espaço de passagem. Alguns usuários permanecem durante algum tempo conosco na Ofi cina, tempo sufi ciente para buscarem novas formas de inserção pelo trabalho. Por exemplo, alguns vão para as incubadoras de economia solidária, outros têm o desejo de inserção no mercado formal. É um período em que eles podem estar se fortalecendo, pensando qual é o projeto de trabalho individual de cada um, e como vamos poder auxiliar nesse. Tivemos um usuário que partici-pou conosco das Ofi cinas, depois passou para o grupo de economia solidária, mas o desejo dele era realmente se inserir no mercado formal. Nesse meio tempo, ele acabou o curso que estava fazendo, prestou um concurso para um banco, e hoje ele está trabalhando. Nós acompanhamos todo esse processo, depois o período proba-tório. Às vezes, ele tem crise e retorna, mas conseguiu fi car estável no banco. Esse era o projeto de trabalho dele.

Em cada uma das Ofi cinas temos uma organização que é feita pelos próprios usuários. Em cada uma delas temos o livro-caixa, o livro de controle de estoque, o livro de presença e um responsável por essa atividade. São no máximo dez usuá-rios em cada Ofi cina, coordenados por dois profi ssionais. Não conseguimos contar ainda com monitores, temos apenas um de uma parceria que temos com uma ou-tra instituição. Essa é uma grande demanda no sentido de que contemos com mais monitores nas Ofi cinas.

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Toda a distribuição da renda, a verifi cação de que material precisa ser comprado, o local onde vai ser comprado, a pesquisa de mercado, a análise se o produto tem inserção no mercado ou se é preciso modifi car, é feito coletivamente. Por exemplo, temos uma Ofi cina de Cartões, ofi cina que originou o projeto da Ofi cina de Geração de Renda, e os próprios usuários se deram conta que os produtos não estavam mais sendo comercializados. Era um produto lindo, maravilhoso, mas hoje tem o correio eletrônico, tem o telefone, meios muito mais rápidos de comunicação. Então, resol-veram criar um outro produto, com a mesma técnica. Promovemos essa discussão, e eles estão criando outros produtos nas ofi cinas.

O que temos hoje? A Ofi cina de Bijuteria, que trabalha basicamente com produ-tos reciclados da natureza. O pessoal está trabalhando com semente de jacarandá, uma árvore típica da região de Porto Alegre, para dar um diferencial para esse pro-duto. Temos a Ofi cina de Cartões e Embalagens, que iniciou o projeto; a Ofi cina de Papel Reciclado, onde o pessoal está trabalhando agora com a fi bra do papiro, para agregar um valor a esse produto. Próximo à ofi cina, está o Parque Moinhos de Ven-to, que nos cede o papiro, e estamos assim agregando um valor a esse papel. Temos também a Ofi cina de Culinária.

Quando o usuário vem para o serviço ele é acolhido, e temos três critérios básicos. Um deles é que ele tenha o desejo de retornar ao mercado de trabalho. Notamos que, algumas vezes, é muito mais o desejo do profi ssional que está encaminhando do que o próprio usuário. Temos então que avaliar e conversar com esse profi ssional, para que se possa, antes de pensar numa ofi cina de trabalho, pensar em outros projetos. Prosseguindo, que ele tenha o desejo de se inserir, que ele tenha autonomia ou possa vir a ganhar esta autonomia, com o acompanhamento que possa estar sendo feito. Da mesma forma que a colega falou, tanto pelos profi ssionais da ofi cina, como do local que o encaminhou. Isto para que possa circular pela cidade porque as ativida-des da ofi cina também são feitas fora, e não só no espaço que temos lá. O terceiro critério é que ele mantenha a inserção na rede de atenção. Trabalhamos muito com a interconsulta, vamos estar muito em parceria com o profi ssional e o serviço que encaminhou, para vermos de que maneira conseguimos qualifi car o nosso trabalho e a nossa atenção.

Eu esqueci uma das Ofi cinas, que é a Ofi cina de Serigrafi a. O usuário passa pelo acolhimento e vai ser encaminhado para uma dessas Ofi cinas. Se for, então, o desejo desse usuário, ele vai poder trabalhar nos grupos de economia solidária. A Ofi cina faz a incubação de alguns grupos de gestão solidária. Trabalhamos muito em parce-ria com o Núcleo de Economia Solidária da SMIC.

Essa incubação dos grupos é bem interessante. Começamos agora e pensamos em formar uma associação só com Seriação, que é um grupo que já trabalha há algum tempo com serigrafi a. Recuamos um pouco, e a idéia é que possamos formar essa associação agora, com três grupos: o seriação; o da bijuteria; e o da culinária, que é

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o gera gula. A Ofi cina de Expressão e Arte, que ainda é dentro da Ofi cina, mas a partir do próximo ano será na Secretaria Municipal da Cultura.

Os grupos que temos: o Grupo Refl exão, para trabalho e convivência, grupo feito no Centro de Referência; o Grupo de Produção, para aquele usuário que ainda não tem condições de estar numa incubação, mas trabalha com mais autonomia; o Grupo de Comercialização, formado por aqueles usuários que produzem nas ofi cinas ou nas incubadoras, e que comercializam esses produtos nas lojas da economia solidária, que é a questão da inserção real na economia solidária, a inclusão no mercado.

Enquanto as fotos vão sendo mostradas, vou falar um pouco das nossas metas. Te-mos uma meta de tentar cadastrar a ofi cina como um serviço independente. Já fi ze-mos esse movimento, recuamos um pouco porque era necessário uma outra equipe, mas estamos fazendo novamente esse encaminhamento esta semana para vermos se é possível. E também pensar na formalização dessa associação, dessa cooperativa, assim como os outros trabalhadores também já falaram, e pensando na inserção pelo mercado formal, que é o desejo de alguns usuários. Já conversamos com o Sindicato dos Comerciários no sentido de pensarmos algum projeto de inclusão dos usuários no mercado formal.

Eu não falei, mas fazemos muitos eventos fora, muitos passeios, para Gramado, para zoológico. Vemos também fotos das lojas em que colocamos. Como qualquer grupo da economia solidária, assumimos as escalas nessas lojas, e a inserção foi por intermédio do Fórum Metropolitano e o Fórum de Porto Alegre de Economia Solidária.

Eu gostaria de colocar que essa foto é muito simbólica, porque é de um trabalho de um usuário da ofi cina, que nos foi encaminhado com um caso de depressão. Era um rapaz que tinha abandonado a faculdade. Com o trabalho que nós fomos fa-zendo em parceria com a equipe que o atendia, ele se descobriu pela arte. Fez um curso na Casa do Artesão, com quem temos um convênio. Hoje, ele está pintando maravilhosamente bem (esse é o pôr-do-sol do Guaíba), voltou para a Faculdade de Física, participa das lojas, do Fórum de Economia Solidária, e acredito que é um exemplo vivo da positividade do nosso projeto.

Fábio Sanchez

Obrigado, Carmem. Vou passar agora para a Sílvia, da Trabalharte de Juiz de Fora.

Sílvia Maria de Oliveira MendesTrabalharte – Juiz de Fora/MG

Bom-dia a todos e a todas. Quero agradecer o convite para estar aqui hoje e dizer que estou representando um grupo de mais ou menos 50 pessoas vinculadas direta-

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mente à Trabalharte, que é uma cooperativa que se insere no Caps Casa Viva de Juiz de Fora, do qual eu também faço parte. Eu sou assistente social da equipe, mas ulti-mamente tenho me dedicado à assessoria da Trabalharte, juntamente com uma grande companheira, a Ilka, que é psicóloga e também faz parte da equipe do Caps.

A Trabalharte é uma associação pró-saúde mental e sua criação foi devido à in-satisfação, tanto de familiares, quanto de trabalhadores e usuários do Caps, preocu-pados fundamentalmente com a questão de geração de trabalho e renda para essas pessoas. Em outubro de 1999, começamos a conversar com a Intecoop, que é a In-cubadora Tecnológica de Cooperativas Populares da Universidade Federal de Juiz de Fora, no sentido de estarem incubando essa iniciativa. Daí para frente seguiu-se todo o trabalho de assessoria técnica em várias áreas, que fi zeram com que a idéia de geração de trabalho e renda pudesse realmente se desenvolver.

O contexto de criação da Trabalharte apontava muitas defi ciências e muitas dis-torções na concepção que orientava a organização do serviço de saúde mental no município. O crescimento da Cooperativa se deve principalmente às parcerias que pudemos criar ao longo desses anos. O Caps de Juiz de Fora tem dez anos de fun-cionamento e, nesses últimos anos, houve um sucateamento por conta de um esva-ziamento dos recursos da saúde mental. O gestor apostou numa economia desses recursos para investimento em outras áreas da saúde, o que está causando desassis-tência e uma grande defi ciência, porque a lógica dos serviços de hoje é uma orga-nização hierarquizada e burocratizada.

A Cooperativa tem legitimado iniciativas de reabilitação psicossocial dentro do Caps. A Trabalharte hoje conta com 38 usuários e familiares do Caps, mas está aber-ta a todos os usuários da rede de saúde mental. Como não temos uma organização que favoreça a comunicação entre os serviços, fi camos restritos àquelas pessoas que estão sendo assistidas no Caps.

Os produtos são confeccionados e pintados em ofi cinas que funcionam dentro do próprio Caps. Temos produção de bolsas e embalagens, principalmente. O interes-sante desses produtos é que todo trabalho de pintura é feito de uma forma bastante personalizada. Por maior que seja a saída dos produtos, cada um é feito individual-mente pelos cooperados.

Estamos neste momento atendendo uma encomenda de uma loja, na verdade, uma indústria que confecciona vestuário. É a segunda encomenda que nos fazem de bolsas. Estas são colocadas à venda na rede de lojas que a confecção tem na cidade. Estamos produzindo agora 80 bolsas para a Caricatura.

No cotidiano, como eu disse, as atividades têm favorecido a reabilitação. Cons-truímos com essas parcerias uma extensa rede de participação. Os cooperados são incluídos em muitas atividades fora do Caps, principalmente pela inserção na Inte-coop. Nas relações e convivências fora do Caps, vemos uma mudança muito gran-de no que se refere aos preconceitos. A inserção das pessoas nas reuniões das quais

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participamos fora do espaço do Caps faz um deslocamento bastante interessante da forma como as pessoas abordam os assuntos e se inserem nas discussões. Discutimos muito a questão de conjuntura, a questão de mercado, e tem uma participação inte-ressante dos cooperados, mesmo dos mais graves. Não é todo mundo, mas aqueles que se destacam, que vemos realmente que têm toda a capacidade para acompanhar, é algo muito motivante. A grande maioria fi ca bem aquém, com uma participação bastante limitada, mas algumas pessoas nos surpreendem. Assim, vemos que muita coisa tem mudado, tanto fora quanto dentro do Caps. Têm sido debatidos assuntos nas Assembléias e nas reuniões, que dizem respeito principalmente a esse contexto extra-Caps. Vemos uma mudança nesse sentido.

Com relação ao contrato atual com a Caricatura, estamos produzindo 80 bolsas, 20 de cada cor (azul, amarela, rosa e verde). Alguns cooperados se indispõem com relação às exigências da moda dizendo que não vão pintar, que não querem fazer fl or, mas que querem fazer outra coisa. Isso acontece realmente. Às vezes, eles estão pintando aquilo que é pedido e, de repente, desenham outra coisa. Tem toda uma ne-cessidade de estarmos fazendo algumas intervenções, às vezes até retirando essa pes-soa, deixando-a de fora daquela etapa, porque não podemos impor dessa forma.

O nosso principal produto são as bolsas. O nosso principal problema é a infra-estrutura defi ciente. O fato das máquinas não serem nossas nos preocupa, porque, se nos faltarem, a Trabalharte corre o risco de desaparecer.

O processo de trabalho tem revelado algumas peculiaridades que mostram al-gumas difi culdades, principalmente no que diz respeito à adaptação às tarefas que vamos elaborando a partir das encomendas que recebemos. Os instrumentos de in-tervenção são basicamente as reuniões semanais de trabalho, que são os espaços que temos para discussão e resolução dos problemas que surgem nesse cotidiano. Todos os impasses são remetidos ao grupo. Também são feitas intervenções durante as ati-vidades das ofi cinas de trabalho. As ofi cinas são monitoradas por estagiários da UFJF nas áreas de Artes, Psicologia e Serviço Social. O objetivo das reuniões é oferecer o espaço para discussão e decisão, estabelecendo-se o processo de trabalho para cada encomenda que é feita. O nível de participação nas discussões e decisões da maioria dos cooperados é defi ciente, apesar do estímulo à mesma. Entretanto, a participação de outros, em menor número, é muito importante. O estabelecimento do processo de trabalho é peculiar a cada nova produção decorrente das vendas. Inicia-se nos con-tatos com os clientes para os quais são apresentados modelos elaborados com o fi m de demonstração. Um dos maiores problemas que temos é um espaço físico muito restrito, que é também o espaço do Caps. Às vezes, isso gera algumas difi culdades. A avaliação do grupo de cooperados considera que alguns de seus integrantes já não necessitam freqüentar o Caps. Esses se benefi ciariam de maneira mais adequada de um centro de convivência. Por isso, a Trabalharte tem um projeto de criação de um centro de convivência para o qual tem buscado fi nanciamento.

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A capacidade criativa de todos os envolvidos é sempre estimulada, pois é neces-sário que tenhamos sempre novos modelos a oferecer. Muitas vezes o cliente suge-re modelos que adequamos às modalidades de produção existentes, sendo que o principal valor agregado é a produção artística em pintura, feitas uma a uma, inde-pendente do número a ser produzido. Isto quer dizer que os materiais, as técnicas e as criações variam, às vezes, de acordo com a exigência do cliente. Tem aconte-cido de alguns cooperados manifestarem insatisfação diante dessa imposição, pois muitas vezes a criação deve se restringir ao uso de determinadas cores e padrões. O que observamos é que o grupo caminha na direção do consenso priorizando o interesse econômico.

A produção dos artigos envolve a organização dos grupos de trabalho: compras, costura, pintura e arremate. A cada uma dessas funções corresponde uma remune-ração cujo valor é calculado em relação à outra, estabelecendo-se a valorização das funções mais complexas e importantes. O cálculo da remuneração é feito a partir de uma planilha do programa Excel, elaborada por um técnico da Intecoop, de fun-damental importância. A remuneração é feita considerando-se as horas trabalhadas dentro de cada função. No grupo de costura geralmente são familiares que costu-ram, sendo que temos um único usuário que trabalha nessa ofi cina, mas ele é muito ausente. A pintura nos tecidos é feita por grandes artistas da Trabalharte, do Caps; algumas dessas pessoas expuseram trabalhos fora do País. Na verdade, o que deu origem a essa produção de bolsas foi justamente essa brilhante expressão artística de algumas pessoas vinculadas ao Caps. Um problema que não temos conseguido contornar vem em conseqüência da variação do estado de saúde dos cooperados, que causa uma variação na capacidade produtiva e, com isso, também da renda obtida com a produção.

Geralmente, levamos às empresas algumas propostas e alguns produtos, com o objetivo de demonstração. Na verdade, o grande movimento de comercialização dos produtos da Trabalharte tem sido no atacado. Uma das difi culdades com a qual lidamos é o fato de o produto ter que se adequar ao mercado, ao mercado da moda, principalmente. Então, a liberdade de criação que havia antes no ateliê de artes, hoje é controlada para atender a esse mercado. Essa é uma das contradições com as quais temos lidado.

Na minha opinião, o mais importante no nosso trabalho são as parcerias. Como não podemos contar com uma cooperativa inserida numa rede de saúde mental, o que nos restou foi construir uma rede social, além de contar com o apoio da Intecoop.

Desde o inicio das atividades a Trabalharte conta com apoio de outras institui-ções, técnicos, empresas e pessoas. As parcerias com instituições e grandes empre-sas locais têm garantido um mercado consumidor que possibilita vendas no atacado e varejo.

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As grandes instituições parceiras são a universidade, por meio do processo de incubação, a Rede de Economia Solidária de Juiz de Fora (Rejuf), que se caracteriza mais como um movimento das cooperativas. Na verdade, a inserção na Rejuf trouxe como conseqüência a inserção no Fórum Regional e no Fórum Mineiro de Economia Solidária, o que possibilitou a inserção da Trabalharte nas atividades desenvolvidas por esses movimentos, sendo garantida a inclusão dos cooperados nas discussões que vêm se processando, integrando trabalho, formação e qualifi cação. Estamos nesse processo desde o início da criação da Secretaria de Economia Solidária.

Uma outra instituição parceira é a Associação de Artesãos de São Mateus, que também é uma cooperativa. Essa parceria tem permitido que participemos de uma feira semanal no bairro São Mateus. Também temos produtos na loja dessa Associa-ção. Temos parcerias com empresas: a Belgo Mineira regularmente adquire bolsas e embalagens no atacado. Em dezembro, vamos entregar 250 bolsas. A Daimmler Chrysler, que é a Mercedes Benz, também faz compras, mas de forma menos sis-temática que a Belgo. Desde 2002 esta empresa vem adquirindo regularmente, no atacado, produtos da Trabalharte que são utilizados como embalagens e brindes. Temos ainda a Caricatura. Como eu disse, é uma indústria da moda que, na verda-de, tem feito uma parceria muito interessante, mas destaco um problema que traz a questão da não valorização do trabalho: sempre que negociamos com a Caricatura, o preço fi ca sempre muito aquém do merecido valor. O maior valor agregado ao nosso produto é a produção artística, que é feita de forma personalizada. Às vezes, são utilizados retalhos de tecidos que são pintados e transformados em bolsas.

Como disse antes, temos lidado com muitas contradições. Talvez aqui consiga-mos discutir alguma coisa, ir além de apontá-las. Os problemas são, principalmente, gerados pelo modelo assistencial adotado pelo município. Com grande freqüência, temos internação dos nossos usuários por não haver outra forma de tratamento; a in-fra-estrutura da Trabalharte é bastante defi ciente. Crescemos a ponto de precisarmos hoje de um local próprio para funcionamento. Todo o maquinário com o qual tra-balhamos é cedido, não é da Trabalharte. Creio que essa política de fi nanciamento, que foi citada aqui ontem, é urgente. É preciso que seja criado um fundo para poder dar sustentação a trabalhos como esse.

Penso que o grande valor da Cooperativa e desse trabalho é o fato de estarmos sobrevivendo num contexto totalmente desfavorável. Não contamos com apoio no nível municipal. Realmente, não temos um investimento, qualquer que seja, de apoio a esse trabalho. Recentemente, cadastramos todos os artesãos da Cooperativa no Sebrae, que está desenvolvendo um programa piloto em Juiz de Fora, o Programa Sebrae para o Desenvolvimento do Artesanato Local. Com isso, virá uma série de outras coisas, atividades de treinamento em designer, como a companheira falou, e fi camos muito surpresos com a participação que essas pessoas podem fazer. O grande problema é que está sendo exigida uma contribuição de cada artesão. Esta-

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mos tentando negociar essa questão, pois parece que existe uma parceria do Sebrae com o Banco do Brasil, e nós vamos tentar que essa parceria cubra esses gastos. O Sebrae realiza rodadas de negociações, onde são colocados juntos compradores e produtores, uma possibilidade de sermos inseridos nessa programação. O Sebrae está desenvolvendo hoje no estado de Minas Gerais um trabalho muito interessante, em parceria com a Secretaria de Desenvolvimento Econômico.

Basicamente, era isso que eu queria falar e acrescentar que, mesmo com a defi -ciência da assistência em saúde mental no município, estamos conseguindo reali-zar um trabalho legal. Ficamos preocupados com essa defi ciência da infra-estrutura, mas estamos levando. Na minha opinião, os cooperados são os grandes batalhadores nessa história. As situações de resistência à adequação às demandas, que às vezes surgem no ambiente, na convivência, têm sido superadas por um interesse muito grande pelo trabalho. Obrigada.

Fábio Sanchez

Obrigado, Sílvia. Vou passar a palavra para a Vera Pazos, do NUSAMT.

Vera PazosNUSAMT (Núcleo de Saúde Mental e Trabalho) – Secretaria de Trabalho e Renda do Rio de Janeiro/RJ

Bom-dia a todos. Gostaria de dizer que estou aqui representando a Secretaria de Trabalho e Renda do Estado do Rio de Janeiro, por meio do NUSAMT. Quero para-benizar o Ministério da Saúde e o Ministério do Trabalho, por aproximar a econo-mia psíquica dos usuários da economia solidária. Creio que há um bom encontro aí. Agradeço também a oportunidade de estarmos aqui mostrando a forma como nos estruturamos e o que pudemos fazer durante esse tempo, porque não tivemos, absolutamente, nenhum implemento ou recurso e foi com base no desejo dos téc-nicos que tudo começou.

O grupo é, predominantemente, técnico. Ele se tornou NUSAMT a partir de 2001 e reúne profi ssionais e instituições conveniadas: Secretaria de Estado de Saúde/RJ, Secretaria Municipal de Saúde/RJ, Instituto Franco Basaglia (IFB), Associação Casa Verde, o Ipub/UFRJ e a Escola de Serviço Social da UFRJ (parcerias em processo de formalização), as associações de usuários da Rede de Saúde Mental, como a Amo-cais – Associação dos Amigos do Cais, do Instituto Philippe Pinel, a Apacojum, que é a Associação dos Parentes e Amigos do Complexo Juliano Moreira, a Aufacaps, que é a Associação dos Usuários, Familiares e Amigos do Caps Pedro Pelegrino, de Campo Grande, e a Aufacep – Associação de Usuários, Familiares e Funcionários do Centro Psiquiátrico Rio de Janeiro.

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Na verdade, formamos uma rede institucional solidária. Somos um grupo de tra-balho, um grupo que senta para pensar as estratégias, a legislação, e também pro-duzir projetos de geração de trabalho e renda para os usuários, respeitando sempre as potencialidades dos mesmos.

Dentre as conquistas, até agora, agregamos diversas parcerias. Temos, também, a presença de algumas instituições que participam das nossas reuniões, que se inte-ressam pelo trabalho, acabam aderindo ao grupo e, aos poucos, vão também, pen-sando na possibilidade do convênio.

Temos, ainda, um Balcão de Oportunidades e Projetos. Inclusive, vamos fazer um seminário interno no próximo dia 25 de novembro, para avaliação do trabalho. É interessante, porque pensamos que um seminário interno deveria preceder este, mas, na verdade, aconteceu o contrário. Então, vamos discutir uma série de coisas nesse seminário interno, a partir dessa revolução que a Economia Solidária está fa-zendo na nossa vida institucional.

Outra conquista foi a aprovação da Lei Estadual n.° 4.323, parece que ela vai ser estudada por um dos grupos de trabalho na parte da tarde. Essa Lei foi também cons-truída pelo grupo de trabalho do NUSAMT. Ela teve um dos artigos vetados, que era um artigo que pretendia ter uma cota para transtorno mental, mas houve um proble-ma, os Conselhos dos Defi cientes entraram com uma representação, por causa da nomenclatura da Lei. Na verdade, foi uma questão de redação e interpretação.

Dentre os desafi os, a conscientização da sociedade e do empresariado. Creio que esse é um ponto de difi culdade do projeto, porque todas as tentativas de “furar” o capitalismo são sempre complicadas, principalmente levando a termo a questão da responsabilidade social. Como o professor Singer falou ontem, essa é uma questão complicada. Outro desafi o é a implementação das Políticas Públicas de Trabalho e Saúde Mental no nosso estado. Temos essa proposta.

Eu trouxe o Caput da lei, no eslaide, mais para mostrar aos senhores que, o pro-grama do Núcleo de Saúde Mental e Trabalho (NUSAMT), está incluído no texto da lei. Isso nos dá o reconhecimento como um programa de governo e muda toda uma proposição no sentido de buscarmos recursos e fazermos projetos. Estamos com projetos já aprovados na Secretaria de Integração do Estado, mas ainda não tivemos os recursos enviados.

O NUSAMT começou na Ouvidoria do Trabalho pela necessidade de se ter alguma política para os trabalhadores com transtorno mental, que apareciam nas Agências de Trabalho e Renda do Estado, para fazer o cadastramento no Programa de Inter-mediação de Mão-de-Obra (IMO). A Setrab/RJ tem diversas inserções da IMO, são quase 50 postos no estado e capta vagas das empresas, para os trabalhadores cadas-trados no Sine. Inclusive, é uma política do Sistema Nacional de Emprego do MTE presente em todo País, em parceria com os governos dos estados.

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Por outro lado, os usuários dos serviços de Saúde Mental representavam uma po-pulação excluída do mercado de trabalho. Montamos, então, um trabalho, para que pudéssemos ter tanto o encaminhamento por parte dos trabalhadores que apareciam nessas agências, como também, pela via da saúde mental, pudéssemos formular polí-ticas. Dessa maneira, o balcão seria essa via dupla: de encaminhamento aos Serviços de Saúde Mental dos trabalhadores que necessitam dessa ajuda, ou fazendo a inser-ção e pensando políticas de trabalho e renda para os usuários de saúde mental.

Os conveniados mantêm um representante, o que é bastante importante, tanto para o desenvolvimento dos projetos, como para o atendimento do trabalhador ou do usuário. Esse balcão é feito com um plantão técnico, então, é preciso ter um téc-nico em saúde mental, que pode ser um psiquiatra, psicólogo, assistente social ou terapeuta ocupacional. O convênio mantém essa representação como algo impor-tante, porque é esse técnico que vai estar lá na frente atendendo a esse trabalhador ou usuário. É um ponto de destaque do projeto.

Dentre os critérios de encaminhamento pelos Caps e pelos Serviços de Saúde Mental, o usuário deverá estar avaliado pela equipe técnica que o acompanha, jun-tamente com os representantes da instituição no NUSAMT, que farão o encaminha-mento conjunto em formulário próprio. O usuário que vier encaminhado, sem os procedimentos anteriores será reenviado à instituição de tratamento, para que isso seja providenciado.

Essa é outra questão: este terceiro ponto (no eslaide), de que ele deverá ser acom-panhado pelo técnico responsável do NUSAMT antes, durante e depois do enca-minhamento ao mercado de trabalho. Esse acompanhamento gera a necessidade da presença do técnico. Então, além de estar dando esse plantão e contribuindo no atendimento do trabalhador, ele também vai estar acompanhando o próprio usuário em todo o percurso a caminho da autonomia.

Para que os usuários possam participar do programa do NUSAMT é necessário que estejam integrados aos grupos de trabalho na instituição de tratamento, onde são abordados temas e difi culdades do mundo do trabalho.

Os usuários inscritos, enquanto candidatos a participarem dos projetos e/ou en-caminhamentos ao mercado de trabalho, deverão estar com suas documentações trabalhistas em dia e terem um representante do NUSAMT como referência, porque se aparecer uma oportunidade para o candidato, ele pode estar ser avaliado e en-caminhado ao balcão dos “ditos normais”, ou seja, podem estar sendo vistas essas possibilidades para eles também.

Temos um formulário de inscrição no programa, em que buscamos dados sobre o trabalhador/usuário que nos procura. São dados de perfi l, do histórico do trabalha-dor: o que ele já fez, o que ele pretende fazer, o que ele pretende estudar e como ele quer retomar sua vida produtiva. A partir dessas fi chas, são feitas entrevistas indi-viduais, as pessoas conversam e contam suas histórias. Temos 103 inscritos no NU-

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SAMT e fi zemos uma tabulação dessas fi chas para termos uma idéia de como são essas pessoas e o que buscam.

Por exemplo, o sexo masculino é predominante (79%), talvez pela questão dos homens estarem culturalmente mais impulsionados, ainda hoje, a procurar e arranjar emprego, do que as mulheres. A maioria está em idade produtiva (78% na faixa de 18 a 45 anos). O estado civil foi um dado interessante, porque a maioria (81%) é de solteiros, o que é compreensível, tendo em vista as difi culdades de relacionamento.

Quanto à escolaridade, o gráfi co fi ca mais dividido, com mais pessoas no ensi-no fundamental incompleto (26%), mas também temos pessoas com nível superior (completo 11%), com ensino médio completo (23%).

Na experiência de trabalho, consideramos estágio, trabalho protegido, trabalho formal, trabalho informal, qualquer tipo de trabalho foi considerado nesse gráfi co. Então, 89% tiveram essa experiência. Em relação ao tempo que estão afastados do mercado de trabalho formal, acima de cinco anos temos uma faixa de 56%. Esse é um dado interessante, porque signifi ca que muito trabalho vai ser necessário com esse pessoal, levando em consideração que, hoje, estar afastado do mercado de tra-balho por um ano, já é algo crítico.

Quanto às instituições de tratamento que encaminham, 73% são conveniadas e 25% não conveniadas, contando que, dentre essas não conveniadas encontra-se o Ipub/UFRJ, que está em vias de fi rmar convênio com a Setrab. Aparecem 2% sem tratamento que são encaminhados aos Serviços de Saúde Mental.

Vemos agora os percentuais das instituições que encaminharam e instituições que participaram, por exemplo, os Centros de Atenção Psicossocial (Caps) participaram com 9% dos encaminhamentos, o Centro Psiquiátrico do Rio de Janeiro com 22%, o Instituto Municipal Nise da Silveira com 18%, o Instituto Municipal Philippe Pinel com 21%, a Associação Casa Verde com 0 %.

Neste eslaide, trazemos um panorama das iniciativas de reinserção durante todo esse tempo. São projetos que foram saindo a partir das conversas do grupo do NUSAMT, fazendo laços com empresas.

A coordenadora do Projeto Coco Verde, no IMPP, Denise Correia, está aqui presente. É um projeto desenvolvido pela Amocais, no Instituto Municipal Philippe Pinel.

É uma história engraçada porque foi uma captação feita pela internet. Foi descober-ta uma empresa (Coco Verde Ltda.) que trabalhava com carrocinhas de coco e que já fazia um trabalho social com ex-presidiários. Foi feita uma proposta, para que fossem incluídos nesse projeto os transtornos mentais. Assim, conseguimos implantar. Essa empresa tinha um projeto voltado ao meio ambiente, entregava o coco, buscava as cascas do coco para fazer xaxim, enfi m, tinha toda uma preocupação ecológica.

Conseguimos a doação de duas carrocinhas de coco, que funcionam desde 2002, uma na porta do Pinel, e a outra no campus do Ipub, com coordenação da represen-tante do Ipub. Passaram 29 pessoas por esse projeto.

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Houve capacitação para que as pessoas soubessem manusear as carrocinhas. Esse projeto está em andamento até hoje. Talvez, a Denise possa falar mais tarde, nas ofi -cinas, sobre como esse projeto funciona.

Na Cooperativa da Praia Vermelha, houve uma inserção de oito cooperativados para a fabricação de alimentos. Eles fi zeram cursos de cooperativismo, com apoio da incubadora da COPPE/UFRJ.

Outras 12 pessoas chegaram a fazer o curso de manuseio da carrocinha de sor-vete Kibon. Houve um problema: eles tiveram medo de fi car com as carrocinhas nas ruas e acabaram desistindo.

Com a revista Ocas tivemos três participantes que não se identifi caram com o projeto, por ser voltado para quem está “saindo das ruas”.

Na Cooplims, que é uma cooperativa de serviços de limpeza, há uma pessoa que está trabalhando há dois anos e meio, desde que foi inserida por esse projeto.

Na Cooperativa de Serviços de Construção Civil e Naval (Coopcon), também houve quatro pessoas trabalhando e as Ofi cinas de Geração de Renda do Centro Psiquiátri-co Rio de Janeiro estão em pleno vapor (41 pessoas participaram das ações).

Neste último eslaide, trouxemos relatos dos usuários nos grupos de trabalho. Como falei antes, são formados grupos nas instituições de tratamento, para ser de-cidido o que vai ser feito, dividir as responsabilidades, planejar o trabalho, etc. Em cada uma das instituições conveniadas são feitos esses tipos de grupo. Cada grupo se organiza de forma diversa.

Nesse primeiro relato: “Depois que comecei a freqüentar a Ofi cina, já sei até os nomes dos colegas. Fui exercitando a memória, acho que meu cérebro estava enro-lado, como se fossem fi os, que estão sendo puxados agora”.

O paciente produz uma metáfora do cérebro como um circuito, uma máquina, em que se vão puxando e desenrolando os fi os, com o trabalho.

No segundo relato, trata-se de um paciente que falava o tempo inteiro com seres imaginários. Alguém perguntou se ele não estava mais falando com esses seres ima-ginários, e ele respondeu: “Agora eu trabalho, só converso à noite. Estou ocupado”. É interessante, mostra que o trabalho pode fazer uma inserção na presença incessante do delírio, quer dizer, fazendo um corte, um hiato.

O terceiro relato: “Eu mudei de lugar, já pago o leite da minha fi lha”, mostra tam-bém o trabalho, numa situação de ajudar o sujeito a poder mudar de posição em relação à família e ter, assim, um lugar diferente, como ele mesmo nomeia.

Agradeço a atenção de todos.

Fábio Sanchez

Agradeço novamente à Vera e passo a palavra para a Rosemeire, com o último relato, da Coordenação de Saúde Mental da Prefeitura de Belo Horizonte.

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Rosemeire Aparecida da SilvaCoordenação de Saúde Mental da Secretaria de Saúde de Belo Horizonte/MG

Obrigada a todos, obrigada pelo convite. Sem dúvida, esse é um momento impor-tante e inaugural de uma discussão tão esperada, que certamente não será esgotada nesse momento. Teremos muito que trabalhar ainda, pelo que já pudemos vislumbrar a partir de ontem à noite. Eu vou pedir licença aos senhores, porque eu me organizo melhor quando escrevo e então eu lerei. Vou começar fazendo uma refl exão e tra-zendo a refl exão que tem orientado o nosso trabalho em Belo Horizonte.

Antes, porém, eu queria dizer que Belo Horizonte chegou tardiamente aos projetos de trabalho. Só iniciamos essa experiência a partir de 1999 com o movimento social. Então, foi no vácuo de resposta do poder público que uma experiência começou a se organizar na cidade, a partir do processo de qualifi cação profi ssional, do qual temos extraído tudo que essa experiência tem nos ensinado e de onde temos ousado sonhar dar novos passos. Foi daí que, em alguns anos, fomos surtando coletivamente, deli-rando muito, e uma parte desse delírio hoje já tem uma forma bastante interessante no sentido de podermos perceber seus efeitos, seus contornos e sua potência.

É uma experiência inicial, é uma experiência decidida dos usuários e que enten-do ser importante para a nossa discussão para ampliar o horizonte dos problemas que se colocam para nós.

No romance A Caverna, José Saramago nos faz acompanhar a angústia vivida por um trabalhador que vê pouco a pouco, porém, não lentamente, desaparecer o seu ofício. Aos 64 anos, o oleiro Cipriano Algor concluirá com tristeza que, nos tempos que correm, também as pessoas encontram-se expostas ao mesmo risco e podem ter o mesmo destino que suas artesanais louças de barro, que é o descarte. O chefe de um setor de compras de um grande shopping center lhe diz o seguinte: “Como tudo na vida, o que deixou de ter serventia, deita-se fora, incluindo as pessoas. Eu mesmo serei deitado fora quando já não servir”. Poderiam chegar a essa mesma conclusão e à mesma desesperança e ceticismo vários outros trabalhadores cujas profi ssões fo-ram eliminadas, ou encontram-se em vias de extinção. Bancários, oleiros, gráfi cos e tantos outros assistiram, nas últimas décadas, à destruição de suas profi ssões, per-dendo, assim, a sua inscrição no mundo do trabalho. Postas à margem, ou descarta-das, encontra-se em todo mundo um bilhão de pessoas, ou seja, um terço da força humana mundial que trabalha. No Terceiro Mundo, nosso caso, este número salta para dois terços, e as relações do trabalho são bastante precarizadas.

O capitalismo neoliberal, agenciador desse processo, faz retornar situações tidas até bem pouco tempo como superadas pelo desenvolvimento econômico. Vemos ressurgir, em especial e de modo mais contundente nas chamadas economias perifé-ricas, regiões mais pobres do mundo, o trabalho infantil, o trabalho escravo, a preca-rização das relações como um dos efeitos do processo de globalização econômica,

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processo que explora e expropria trabalhadores em determinados cantos do planeta para tornar mais ricos os grandes capitais. As riquezas produzidas são concentradas novamente em poucas mãos. Os grandes grupos se agigantam e fazem desaparecer do mapa, os pequenos e médios produtores e tudo que destoa do padrão produtivo. Não há lugar nessa lógica para as produções singularizadas, como não há para o tra-balhador que não seja mero complemento da máquina que produz e reproduz, sem qualquer traço de reconhecimento, como fruto do seu trabalho. São criadas formas velozes de fazer circular mercadorias e o próprio capital, ao mesmo tempo em que é promovido o empobrecimento aviltante dos trabalhadores, constituindo o que al-guns autores chamam de sociedade dos excluídos, ou dos precarizados.

A potência destrutiva do capital moderno atinge leis, trabalhadores, indústrias e meio ambiente com impiedade e cinismo. Insistir em falar de trabalho na reforma psiquiátrica hoje é, portanto, um desafi o. Nós nos encontramos diante de um cená-rio que é absolutamente desfavorável. A reestruturação produtiva nos atravessa e cria obstáculos ao nosso projeto de inclusão social dos loucos pelo trabalho, pois retoma e aprimora os processos de exclusão, alcançando agora novos sujeitos. São os jovens em busca do primeiro emprego, são os desempregados de longa duração, as mulheres, os negros, os índios, entre outros que passam a compor a massa dos novos inválidos, produzida pelo mercado contemporâneo. Conjuntura perversa, sem dúvida, que deve ser considerada e tomada como um problema a ser debatido cotidianamente dentro das experiências de recriação do trabalho para portadores de sofrimento mental. No nosso caso, na saúde mental, entendemos que, além de discutir todas as implicações e os efeitos dessa conjuntura, ainda precisamos realizar um outro percurso crítico, um outro debate quanto às nossas concepções, às concepções que referenciam o nosso campo em relação ao tema trabalho.

Nesse tema, ainda percebemos, como em todos os outros, na clínica e nas várias intervenções da saúde mental, traços da cultura de invalidação e tutela, que prescre-ve a ocupação sem sentido como modo possível e único de produção para os ditos loucos. A política de inclusão no direito ao trabalho, invenção que ora buscamos for-malizar, terá que deter-se criticamente sobre a longa história de consolidação do mito da incapacidade produtiva para criar algo que se diferencie no espaço, no território onde a mesma virá a se inscrever, mas também, e principalmente, em substância.

Não vou me deter aqui sobre as diferentes terapias pelo trabalho, que vou deixar para a minha amiga Fernanda Nicácio tratar. Eu queria apenas destacar algo que entendo como motivo para tomarmos essas práticas como um ponto a ser criticado. Identifi camos em todas essas terapias, seja a laborterapia, a ergoterapia, e mesmo a discussão sobre o trabalho assistido, que permanece aquilo que o manicômio funda, que é a noção da cura pelo trabalho e o compromisso com essa mesma lógica.

Ao invés de fazer essa discussão agora, eu queria trazer uma outra discussão e uma outra articulação como forma de também estar abordando a discussão do tra-

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balho entre nós. Proponho que investiguemos a articulação entre capitalismo e ma-nicômio, essas duas invenções da era moderna destinadas a excluir.

Para Marx, o trabalho é o que humaniza o homem. Por essa via, nos distinguimos de todas as formas não humanas de vida. Nos processos de produção, construímos e desen-volvemos laços de cooperação social, intervimos sobre a natureza e produzimos cultura, ou seja, o trabalho, assim como a linguagem, é um processo de singularização e subjetivação. Desde a instauração do capitalismo, no entanto, este se encontra submetido a cifras e signi-fi cados criados por esse modo de produção. Dentre os diversos fenômenos característicos do capitalismo, quero destacar dois, que é a exclusão e o estranhamento, para trabalhar esse nexo que estou propondo.

Intrínseca e constitutiva ao modelo capitalista, a exclusão é o destino reservado pelo capitalismo para a parte da classe trabalhadora. A uma parcela do contingente excluído, aquela julgada como incapaz – caso dos portadores de sofrimento mental –, é proposta a assistência e a invalidação social subjetiva como destino e forma de reprodução social. A outra parcela restante, também excluída, deverá compor o exército social de reserva de mão-de-obra. Pedra fundamental para o capitalismo, a ela – à exclusão –, se associam numa articulação de sentidos tornada hegemônica sobre o valor e sentido do trabalho, conceitos como: mais-valia, lucro, propriedade privada, fetichismo, estranhamento, dentre outros.

Pela mais-valia, o capital extrai o seu lucro, por meio do estabelecimento de uma di-ferença entre força de trabalho investida por um trabalhador e o que lhe paga o patrão, proprietário dos meios de produção. O estranhamento, ou alienação permitirá ao capital estabelecer uma outra operação, tão poderosa e efi caz quanto a primeira, na qual o tra-balhador é roubado mais uma vez e, desta vez, em algo não mensurável, mas igualmente importante: o capitalismo rouba do trabalhador o sentido do seu trabalho. Nessa operação, o sentido do trabalho se transforma, passa de via de realização da existência para ser uma mera forma de subsistência. A lógica que lhe dá sentido preconiza o ter, a capacidade de possuir e produzir, como superior ao ser.

Ricardo Antunes, citando Marx, diz que: no capitalismo (...) a força de trabalho torna-se, como tudo, uma mercadoria, cuja fi nalidade

vem a ser a produção de mercadorias. O que deveria ser a forma humana de reali-zação do indivíduo reduz-se à única possibilidade de subsistência do despossuído. Desfi gurado, o trabalho torna-se meio e não primeira necessidade” de realização humana. (...) o trabalhador decai a uma mercadoria e à mais miserável mercadoria, torna-se um ser estranho a ele, um meio da sua existência individual.(...) O trabalho como atividade vital, verdadeira, desaparece: a individualidade se torna estranhada a tal ponto, que esta atividade se torna odiosa, um suplício e, mais que atividade, aparência dela; por conseqüência, é também uma atividade puramente imposta e o único que me obriga a realizá-la é uma necessidade extrínseca e acidental, não a necessidade interna e necessária.1

1 Informação verbal, citando idéias de Karl Marx

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O manicômio, outra das invenções modernas, também nasce sob o signo da exclusão e é, provavelmente, uma das suas formas mais bem acabadas. Como o capitalismo, também é produtor de estranhamento e anulação. A exclusão é sua forma substantiva, seu outro nome. Foucault nos lembra que o hospital psiquiátri-co, baluarte da lógica manicomial, nasce não como um lugar de cuidado médico da loucura, e sim como espaço de exclusão, determinada, entre outras coisas, pela obrigação geral ao trabalho, e que a incapacidade para o trabalho, como a Luciana se referiu citando Freud, é um dos critérios de defi nição do que signifi ca ser louco no mundo ocidental.

Do mesmo modo que no capitalismo, a exclusão no manicômio também é es-trutural. Espaço de desumanização, de transformação de gente em coisa que, assim como o capitalismo, esvazia e retira dos homens e do trabalho sua potência criati-va e transformadora, faz os primeiros seres doentes, e o segundo mera obrigação, sacrifício ou norma destinada a limitar e restringir a liberdade. No interior do asilo, o trabalho ajudará a compor a identidade negativa e patológica da loucura, forjada pelo discurso racional, alcançando, no decorrer dessa história, estatuto de dispositivo terapêutico. Da percepção de um ritmo diferenciado de produção dos portadores de sofrimento mental, é edifi cado o mito da incapacidade para o trabalho, que inscrito na lei, no caso no Código Civil, serve para infantilizar e reduzir os chamados loucos, negando-lhes o direito à expressão de seu potencial produtivo.

Concluirmos que tal idéia, a da incapacidade para o trabalho, é no mínimo um engano, nos leva à pergunta sobre qual concepção e organização do trabalho bus-ca o projeto antimanicomial. Trata-se de mera busca da garantia da subsistência? De produção massifi cada? De uma obrigação a ser imposta aos usuários como uma regra do tratamento e medida da avaliação da cura? Ou de uma construção mais ousada e também mais difícil, que busca empreender condições de vida e produ-zir espaços geradores de sentidos e signifi cados novos para a existência individual e coletiva? Queremos dar emprego, aliás, quase inexistente hoje aos nossos usuá-rios, ou, junto com eles, construir o direito de trabalhar, criando engrenagens que propiciem o exercício da produção, da geração de renda, mas também de inscrição subjetiva? Empreendimentos que contribuam, assim como serviços substitutivos, para desconstruir a arquitetura manicomial, experimentando conjuntamente novas possibilidades de vida? Eu entendo que a segunda opção é a que mais se ajusta aos nossos propósitos.

Para um projeto que tenha liberdade como causa e conseqüência, como é o pro-jeto antimanicomial, é estranha toda forma de negação e opressão da diferença, sendo-lhe familiar e cotidiano o exercício da criação. É neste ponto preciso da cria-ção que podemos encontrar as saídas capazes de superar os obstáculos postos pela psiquiatria entre o trabalho e o portador de sofrimento mental.

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O modelo cooperativista e associativista, fundamento dos projetos de economia solidária e signifi cante, que ora nomeia a luta e a força de resistência dos excluídos pelo mercado, propõe uma organização do trabalho que opta por acolher e incluir diferenças, permitindo o estabelecimento de uma produção a partir de princípios aniquilados pelo capitalismo, como a solidariedade e a cooperação. Diferentemen-te do manicômio e de suas terapias pelo trabalho, onde este é puro simulacro, fal-seamento da realidade, aqui, na discussão e no campo da economia solidária, a instituição de ritmos diferenciados, ou a inadequação à norma e à disciplina, não implicam anulação do direito de trabalhar e de produzir. Sua forma de organizar, distribuir e gerir o trabalho, e o modo de conceber e tratar a diferença apresenta, na nossa compreensão, pontos de semelhança com a lógica instituída pelo projeto antimanicomial.

Quando decidimos construir unidades produtivas com os nossos usuários, que são guiadas por tais princípios, estamos buscando meios de organizar a nossa ca-pacidade de produzir, queremos com isso gerar renda para garantir nossos direitos de cidadão, sem, contudo, nos reduzirmos ao que o capitalismo diz que podemos ser: simples mercadoria. Almejamos, e aí reside nossa ousadia, construir lugares que possam comportar nossos corpos, idéias, desejos, habilidades, gostos e sonhos, numa trama que diversifi ca lugares e condições, de modo a fazer caber sempre e mais di-ferentes e singulares modos de produzir a vida. Buscamos ser protagonistas da nossa própria história ao assumirmos a gestão de processos que envolvem dinheiro, com-pras, vendas, lucros, dívidas, criação, metas, produtos e qualidade, mas também, e principalmente, o cuidado com o outro, o respeito à diferença e à solidariedade.

Apontamos a falência do manicômio como dispositivo cultural para lidar com a diferença, ao mesmo tempo em que ensaiamos possibilidades reais de contrapor a lógica de exclusão do capitalismo, tentando resgatar para o nosso fazer, sentido e, principalmente, prazer.

A Suricato, um nome inventado e uma derivação de suricate, que é o nome de um pequeno animal africano, conhecido como o mamífero mais solidário do pla-neta, foi escolhido pelos usuários para batizar a Associação que hoje organiza esses projetos de trabalho, que faz o laço entre os diferentes grupos de produção que fo-ram criados nesse processo, de 1999 até agora. A Suricato é a Associação de Traba-lho e Produção Solidária. É um efeito e uma criação de um processo de pesquisa e experimentação que conduziu usuários e técnicos rumo a uma outra travessia. Eles passaram, especialmente os usuários, mas, ao seu lado, certamente os técnicos, da condição de usuários do serviço para empreendedores de projetos de trabalho e gestores de uma experiência. Eles provocaram o poder público a defi nir o seu lugar e a sua responsabilidade frente a isso.

Antes de falar da Secretaria, é importante dizer que são três grupos de produção. O grupo de marcenaria que trabalha prioritariamente com restauro de móveis. Uti-

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lizamos todos os cacos de móveis do poder público. Fazemos o processo de coleta daquilo que está jogado no lixo da Prefeitura. Temos o grupo de mosaico, que co-meçou com uma experiência bem mineira, que era a de fazer lapidação de pedras. Enfrentamos uma série de obstáculos com esse mercado, que era um mercado mar-ginal, no sentido moral, pois tem uma série de contravenções nesse mercado. Assim, acabamos tendo que recuar.

Aproveitando essa experiência, acabamos chegando no mosaico, que é algo bem recente em Minas e que tem possibilitado um escoamento grande da produção, por-que aproveitamos muito das habilidades e do potencial artístico e criativo dos usuá-rios na criação dessas peças. Temos ainda o grupo de costura, que começou fazendo bolsas e hoje produz uma série de coisas. Temos um processo de articulação dessa produção em rede. Como outros grupos, a marcenaria trabalha em conjunto com o mosaico que, por sua vez, trabalha em conjunto com a costura. Vamos agora traba-lhar conjuntamente na implantação de uma cozinha comunitária, com um quarto grupo. Vamos ter 75 pessoas trabalhando. Esse grupo vai produzir refeições para os serviços de saúde mental, onde os usuários fazem permanência/dia.

Além disso, essa experiência conta hoje com uma articulação de uma rede de parceiros, da qual a Secretaria é uma das parceiras, talvez a mais constante. Temos ONGs, o Instituto Marista de Solidariedade, o movimento do Graal no Brasil e o Fórum Mineiro de Saúde Mental como um dos nossos parceiros. Da parte do poder público, temos parceria hoje com a Saúde, com a Secretaria de Abastecimento e com a Secretaria de Planejamento, por intermédio da Gerência de Desenvolvimen-to Econômico.

A Secretaria toma a decisão e opta por criar um processo de incubação daquelas experiências que os usuários já vinham realizando, incrementando esses grupos de produção, oferecendo aos grupos de produção recursos para eles poderem se sus-tentar, tanto recurso fi nanceiro, quanto de infra-estrutura. O recurso fi nanceiro é a menor parte, isso eu posso dizer aos senhores. Pela Secretaria, pagamos hoje dois monitores, e temos um subsídio que vem dessas ONGs que nos apóiam.

O processo de cada grupo é bastante distinto e é permeado pela delicada defi -nição do principal produto a ser trabalhado em cada grupo. A renda obtida ainda é pequena, especialmente quando a ela não está agregado nenhum outro benefício. Quando o usuário tem um benefício, essa renda tem um outro sentido e um outro valor. Na minha opinião, esse é um ponto para pensarmos nesse debate como pode-mos introduzir as chamadas bolsas como um disparador da geração de renda desde o início dessas experiências.

Eles funcionam em regiões distintas da cidade, que tem dois milhões e meio de habitantes, em espaços públicos que estavam ociosos e junto de outras experiên-cias. Então, estamos desde o mercado até um centro comunitário, ou um prédio que estava completamente abandonado, e vamos usando a estratégia do MST, que

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é ocupar, resistir e produzir, e não saímos de jeito nenhum. Ao lado dos usuários, em alguns lugares, temos empreendedores de outras experiências de economia so-lidária, temos feirantes, o comércio tradicional, o que enriquece muito a inserção dos usuários na cidade.

Percebemos nesses anos que, de algo que era uma contingência, na ausência do poder público, alguma coisa se organiza e permite que elaboremos uma metodologia de trabalho. Nesses anos, é possível dizer que foi sendo organizada outra forma de pensar essa questão entre os usuários e o grupo de técnicos na cidade. O trabalho perde aquela característica de indicação terapêutica e passa a ser uma opção e um risco tomados pelo usuário, sustentados em parceria com alguns técnicos e outras pessoas na cidade.

Fazer disso hoje, que é o nosso debate, dessas ações ainda tão isoladas, e uma ação ainda restrita à atividade militante de algumas pessoas no campo da reforma, uma política pública, é um salto necessário e desejado, mas um salto rumo a um território pouco conhecido para nós, o que vai exigir que estabeleçamos com clare-za entre nós e nossos parceiros, prioritariamente a Secretaria de Economia Solidária, alguns pontos para que o rigor e o alcance dessa proposta não se percam entre as dúvidas que serão inevitáveis.

Entendemos que uma política de trabalho para os loucos se produz em conseqü-ência e como efeito da ética libertária, que inspira e sustenta a reforma psiquiátrica. Deve ser, a um só tempo, instrumento de inclusão no trabalho e de intervenção cul-tural. A mudança do lugar dos loucos na cultura importa tanto quanto a sustentação da sua vida fora da instituição, ou seja, a política deve ser potente para produzir efeitos concretos e sensíveis na vida dos loucos e na percepção da sociedade sobre a loucura. Sua efetiva implantação exigirá o investimento de recursos fi nanceiros, técnicos, de infra-estrutura, etc., capazes de dar forma aos sonhos e ampliar sua potência e abrangência; requererá a defi nição de linhas de fi nanciamento que as-segurem a realização de ações de qualifi cação técnica, da capacitação para gestão; necessitará de recursos que subsidiem a produção e a comercialização, até que os grupos atinjam a sustentabilidade fi nanceira. Enfi m, a criação dessas redes de pro-dução necessitarão de incentivos sociais que contraponham a cultura assistencialista e apostem no risco e na capacidade de empreendimento desses e de outros coletivos de excluídos do mundo do trabalho.

O direito ao trabalho para o portador de sofrimento mental, em nossa incipiente experiência, se materializa, cotidianamente, por meio do movimento de muitas mãos, pela potência das idéias construídas no e pelos coletivos e pelo pulsar de nossos corações e, nos inseriu: usuários, técnicos e gestores de saúde mental, monitores, parceiros e voluntários; em uma luta política que não é apenas nossa, mas de toda a classe trabalhadora que neste momento histórico precisa reencontrar e recompor sua identidade de classe.

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Para nós, e para outros que como nós sonham com arranjos de sociedade ainda pouco visíveis, o direito ao trabalho é conquista e construção cotidiana. Divergindo de leis estabelecidas, desobedecendo à ordem vigente, que nos quer colocar à margem, colocamo-nos dentro, sem, no entanto, perder as marcas que nos são próprias.

Para concluir, retorno à poesia. Saramago orientou nossa refl exão sobre a dureza do presente. Encontramos na

poesia de Zeca Baleiro um certo alento. Segundo ele, “(...) faz milagre, quem crê que faz milagres. Como transformar lágrima em canção”. Num tempo em que os deuses parecem distantes e o mercado se arvora a ser deus, decidindo o destino e os desejos dos homens e do planeta, algo precisa acontecer para mudar o rumo da história. Um milagre, talvez!

Não estamos tratando, por certo, do milagre dos santos, posto que este depende da vontade divina e a ela é submetido. Mas de um milagre possível de ser operado pelos homens: o milagre da vontade e do desejo. O milagre revelado pelas construções erguidas sobre solos solidários, que de quase nada, como é o caso dos trabalhadores sem-terra e dos catadores de materiais recicláveis, fazem surgir novas condições e perspectivas de vida. O milagre de saber ver além do que o olho da razão é capaz de captar, para escutar a verdade do desejo de cada um de nós: primeiro exercício antimanicomial de transcendência. Um acontecimento improvável que contraria o que esteve até então estabelecido como verdade científi ca e norma social e que en-quanto tal exige de quem testemunha, fi delidade.

Se dele fomos capazes, e fomos, o processo da Reforma Psiquiátrica, dá prova disso; certamente, poderemos ir mais além, mantendo-nos fi éis à visada que fundou o coletivo antimanicomial. Entendemos que a razão se equivocou, que o homem mesmo quando louco, não perde sua humanidade e não pode ser subtraído em sua cidadania. Parte da transformação já se fez. E, com régua e compasso antimanicomiais em mãos seremos capazes de traçar rotas, inventar caminhos e construir condições de possibilidade para que a vida possa acontecer, para todos, em liberdade e plena de sentido.

Vou deixar para o debate algumas outras questões. Estou fi nalizando, porque já extrapolei (e muito) o tempo. Obrigada.

Fábio Sanchez

Obrigado, Rosemeire. Eu queria parabenizar pelo cumprimento do tempo da Mesa e me desculpar se por um acaso amputei algumas das apresentações. Fui um pouco rigoroso para poder dar um espaço para que outras experiências e colocações fossem feitas no debate pelos participantes.

Tivemos aqui o relato de experiências diversas, em lugares diversos, programas governamentais, creio que três das experiências estão ligadas às políticas públicas municipais, e três com vínculos também, algumas com políticas públicas, mas que são associações, cooperativas, grupos organizados com os usuários. Dos relatos, eu

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tentei fazer uma pequena sistematização de pontos que foram levantados. Eu vou apenas citar e depois passar a palavra.

Foi colocado o relacionamento com outros parceiros, principalmente, e outras temáticas; foram colocadas pela Tereza temáticas ligadas à questão da cidadania e a outros temas. Também a qualifi cação para o trabalho, com ênfase, mais do que essa qualifi cação, o acompanhamento permanente desses grupos. Foi apresentada inclusive, em várias das experiências, a questão da incubagem, o acompanhamento de incubadoras de cooperativas e de empreendimentos solidários. A questão do fi -nanciamento e crédito para os empreendimentos, difi culdades de infra-estrutura, de inserção no mercado, de padronização do produto, as questões legais, que já foram levantadas desde ontem, diferentes questões ligadas à legislação, questões legais de formalização, a questão de benefi ciários de outros benefícios, sobre como isso fi ca com a cooperativa. Também, a opção da economia solidária como alternativa de inclusão pelo trabalho, mas levantado ainda que não deve ser uma obrigação, mas uma opção dada àqueles que escolhem por participar, a relação com redes e fóruns de economia solidária, o relacionamento com outras políticas, políticas de bolsas, enfi m, elenquei alguns temas somente para dar subsídio aos trabalhos na parte da tarde.

Vou agora passar a palavra para as pessoas, não só para perguntas, mas também para outras colocações e para problematização de outras experiências. Temos pouco mais de uma hora para aprofundarmos um pouco mais esse tema.

Vitória Maria BarbosaCoordenação de Saúde Mental da Secretaria de Saúde de Campina Grande/PB

Bom-dia. Meu nome é Vitória, sou da Paraíba, Campina Grande. Primeiro, eu queria parabenizar porque todas as vezes que venho nesses eventos são sempre momentos bastante fecundos para conhecermos práticas, toda essa diversidade. São sempre grandes oportunidades para conhecermos o que é a reversão de um modelo. Na verdade, eu fi co sempre muito cheia de questões quando participo de eventos como este, porque a frente que se abre nessa proposta de reinserção social, que eu nem concordo muito com o nome, porque, às vezes, essa inserção nunca ocorreu, mas eu diria nessa clínica de inclusão. Eu fi co pensando em quantas frentes um trabalhador de saúde mental precisa abrir para dar conta disso. Lembro que, no Congresso Nacional de Caps, Pedro Delgado falou em três vertentes, que seriam a vertente ética, a estética e a épica. Então, eu penso que essas três abrem muitas ou-tras para nós, tornando-se sempre um grande desafi o. Antes de eu me dirigir à Mesa para tirar algumas dúvidas, eu também me preocupo, dentre todas essas frentes que se abrem, se não haveria uma suplantação – não sei se esse termo seria adequado –. Eu queria que a senhora explicasse melhor se essa espécie de tutoria não impediria uma autonomia maior desse usuário, se essa presença do técnico é sempre constan-te, digamos impositiva ou condicionada a isso.

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A senhora de Juiz de Fora, logo no início de sua fala, levantou um tópico que eu não consegui apreender bem, sobre as distorções, que seria uma das motivações que teriam levado. Obrigada.

Participante(não identificado)

Eu queria completar, em cima do que a Vitória passou para a Vera e, na verda-de, direcionar para a Mesa como um todo. Falamos muito dessas iniciativas, e nós, como técnicos, estamos sempre alavancando isso junto aos usuários. Eu queria le-vantar para a Mesa a questão da autonomia desses usuários no projeto de participa-ção deles. Eu sou assistente social, faço parte de um Caps e faço parte também do movimento da luta antimanicomial.

Então, estamos fazendo algumas reuniões no sentido de que o núcleo da luta antimanicomial possa puxar essa discussão em termos de associação, para poder trabalhar mais essa questão da participação. Não é no sentido de quantidade, mas uma participação efetiva, para que o trabalho se consolide além de nós, técnicos, que realmente os usuários se apropriem disso como algo seu; que fi quemos juntos, mas que não sejamos os verdadeiros atores desse processo. Eu queria perguntar para a Mesa, nessas iniciativas que foram relatadas, parabenizando a todos, como tem sido esse cotidiano, como é essa participação, se ela é realmente garantida, se os usuários estão em frente.

Em relação ao movimento de familiares também, porque, historicamente, sabe-mos dos familiares que vão e que, às vezes, fazem acontecer. A Vitória direcionou um pouco para a Vera, mas penso que podemos direcionar para a Mesa sobre como vem sendo esse desafi o.

Fábio Sanchez

Tem a proposta da Tereza de vir mais de uma pergunta. Quero também fazer uma correção. Estamos propondo meia hora de debate, e não uma hora, para acabarmos mais cedo e anteciparmos um pouco a parte da tarde. Então, vamos fazer um bloco de perguntas até o meio-dia.

Sandra Aparecida da S. Rocha RibeiroOficina de Artesanato do Caps AD de Maringá/PR

Meu nome é Sandra. Eu queria, de forma geral, direcionar para a Mesa. Eu vim pelo Caps AD, álcool e outras drogas, uma clientela um pouco mais diferenciada, não muito, mas com suas peculiaridades. Estou percebendo que há muito encami-nhamento no sentido das cooperativas e das associações. A minha preocupação diz

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mais respeito às ofi cinas dentro do Caps, dentro do serviço. É uma produção peque-na, não temos grandes escalas, não temos grande fl uxo. Então, eu vim bem sedenta para levar mais informações e poder direcionar aquele vôo curto que damos ali, mas é um vôo e temos produção, temos material, temos a experiência dos nossos pacien-tes, mas, no momento, não caracteriza para vôos tão grandes. A minha questão era mais ofi cina terapêutica dentro dos Caps.

Cláudia Márcia Vieira GusmãoAssociação Arnaldo Gilberti – Curitiba/PR

Meu nome é Cláudia, sou de Curitiba. Eu queria falar para a Rosemeire que com-partilho da sua idéia em relação à questão do trabalho alienado, mas também fi quei com uma questão colocada ontem pelo professor Paul, no sentido de que estamos dentro do sistema e, em todos os momentos, devemos nos perguntar, no fundo, sobre como trabalhar com essas relações. É um sistema capitalista e as pessoas que atende-mos ainda querem ser inseridas nesse sistema. Dentro dessa relação, eu queria pedir um esclarecimento em relação a uma lei do Rio de Janeiro, pois não entendi bem se, dentro da lei, foi um grupo que buscou vetar essa cota para o portador de trans-torno mental. Na minha opinião, essa é uma das discussões que precisamos buscar dentro dessa parceria que temos com a economia solidária, com as Secretarias, com alguns grupos que hoje estão mais fi rmados enquanto grupos, que estão buscando aparatos legislativos; já existem cotas que os portadores de necessidades especiais já têm, e tentar fi rmar junto com eles, que já tem uma luta muito mais avançada, a meu ver, do que a nossa que está apenas começando. Assim, tentarmos realmente unir esforços. Eu não entendi se esse veto foi em função dos grupos que estavam lá organizados, qual foi o entendimento.

Em Curitiba, tivemos a oportunidade de um trabalho que está sendo ofertado pelo Banco do Brasil, que foi oferecido aos portadores de necessidades especiais. Batalhamos e conseguimos incluir para que as pessoas que estão em tratamento de transtorno mental fi zessem o curso. Então, temos pessoas que estão hoje lá, estão sendo incluídas, fi zeram o curso e estão trabalhando. Assim, temos que munir um pouco essas frentes.

Participante(não identificado)

Dentro ainda dessa lei do portador de defi ciência, nós encontramos um outro entrave. Um grupo veio nos procurar em Curitiba, na nossa Associação e o Caps, oferecendo serviço porque estavam precisando de pessoas portadoras de defi ciên-cia. Quando souberam que era transtorno mental, a empresa (um grande grupo de supermercados) não aceitou porque não estava dentro da lei e não pode entrar nas

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cotas. Isso nos chamou muito a atenção, já que o próprio portador de defi ciência não está querendo nos incluir, quer dizer, os excluídos dos excluídos. Gostei muito do exemplo da lei estadual. Estamos tentando esse caminho no Paraná, estamos co-meçando, é uma idéia, porque estamos vendo que o portador de transtorno mental está sem cobertura nenhuma, sem proteção legal nenhuma. Mesmo no Ministério Público, se formos procurar a defesa dos direitos individuais do portador, não há Promotoria de “PPD”, nem de Saúde, que possa dar essa cobertura.

Fábio Sanchez

Mais duas intervenções, depois passamos para a Mesa.

Maria Cristina de MacedoInstituto Municipal Nise da Silveira – Rio de Janeiro/RJ

Eu sou Cristina, coordeno dois projetos de geração e trabalho no Instituto Muni-cipal Nise da Silveira, o antigo Centro Psiquiátrico Pedro II. Estamos desenvolvendo esse trabalho há cinco anos, e eu vim aqui muito na expectativa de discutir alguns impasses que encontramos no meio do caminho. Em primeiro lugar, quero parabeni-zar todos pelas experiências, porque quem trabalha com esse enfoque de trabalho e geração de renda, é tirar leite de pedra, sabemos que é uma estrutura muito grande e que, muitas vezes, não temos apoio governamental, nem da sociedade, no sentido de acolher a demanda desses projetos. Eu queria discutir algumas questões de con-ceito para podermos subsidiar a discussão que virá depois nos grupos.

Com a melhoria terapêutica, sabemos que não havia outra saída para nós, que trabalhamos com a clínica, que não fosse a inclusão social, e a inclusão social se dá de várias formas. Uma delas é o trabalho. Não é a única, mas é um fator importan-tíssimo na questão da inclusão social. Agora, o trabalho não pode estar desvincula-do da vida do sujeito, nem da sua história. Esse é um dos pontos com o qual temos que nos preocupar quando pensamos num trabalho.

Ontem, o professor Paul Singer falou na questão do trabalho protegido e do não protegido. Eu também tenho umas encrencas com o trabalho protegido, mas penso que, no nosso campo, ainda é necessário passarmos por essa etapa.

A segunda questão é não perder o processo de experimentação da criatividade, porque eu penso que é a nossa grande habilidade quando lidamos com pessoas que passaram por um rompimento com a questão do trabalho formal. A maioria dessas pessoas que hoje estão adoecidas veio do mercado de trabalho, sejam elas como empregados domésticos, etc., elas têm uma experiência no trabalho. Essa experiên-cia foi interrompida com a doença, e para retomar isso, na minha opinião, devemos pensar no sentido de manter um pouco da experimentação desse retorno ao traba-lho, respeitando esse ritmo que já não é mais um ritmo capitalista, já não é mais um

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risco da exigência do mercado, já não é mais uma série de coisas que aqueles que lidam com isso, principalmente com a clínica, sabem que não vão alcançar. Tam-bém tenho essa preocupação de acabarmos ocupando um espaço que, na realidade, não é ocupado por eles. Então, vamos muito mais à frente do que eles de fato estão acompanhando o processo.

Uma outra coisa é que deve haver uma rede, que talvez possa ser pactuada aqui, uma rede que seja democrática e que dê acesso a serviços, pequenos ou grandes. Alguns serviços já estão há muito tempo nessa tentativa, há dez anos. Campinas, por exemplo, é um serviço conhecido, o Rio está tentando se estruturar de alguma maneira para poder organizar sua rede de serviços, mas mesmo assim, de qualquer maneira, é necessário que essa rede tenha acesso a todas as informações. Principal-mente para quem está conhecendo, nem sempre sabe o caminho das pedras. Temos que pactuar essa iniciativa aqui para que essa informação se democratize. Do con-trário, o fórum vai fi car sem sentido de trazer o pessoal do Brasil todo em função de alguma coisa que seja mais coletiva.

Eu senti pelas falas das pessoas que os serviços mais estruturados, principalmen-te o de Campinas, receberam bastante subsídio para terem a sua implantação. Ou-tros, não. Tenho uma preocupação no sentido desse impasse que estou vivendo. Por exemplo, estou no Senai, procurando curso para capacitação para eles, tenho uma editora, então, preciso capacitá-los para que eles possam dar conta do trabalho que eles têm de fazer. Eles perguntam sobre qual é a contrapartida do governo, que tipo de divulgação vai ter a sua ação social. Hoje, já não se faz mais ação social só pela questão social. Então, creio que podemos discutir essas contrapartidas aqui. Até con-seguir montar essa estrutura de uma política mais voltada para essa área, já temos mecanismos mais simples que possam dar acesso aos serviços que estão precisando desses subsídios.

Agora, eu queria colocar uma questão para a Mesa, depois dessa refl exão, que é a questão da sustentabilidade. Seria possível para esses serviços se sustentarem se não tiverem a lógica capitalista? Ou deveríamos ir por um caminho mais alter-nativo, que talvez respeitasse mais as habilidades e a criatividade que é própria da nossa clientela? Precisamos ver qual o caminho que vamos escolher. Talvez os dois, não sei. Talvez alguns serviços prefi ram esse enfoque mais capitalista, onde a pessoa vai produzir, mas o sujeito não vai estar acompanhando o processo como um todo. Ele vai participar de pequenas etapas desse processo. Ou, ainda, escolheremos um caminho em que esse processo vai ser com a participação mais ativa da clientela, talvez com menos renda, porque entendo que nem todo trabalho gera renda; todo trabalho gera saúde, mas renda, nem todos. Temos que saber escolher qual o cami-nho que queremos seguir aqui. A minha questão para a Mesa é essa.

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Neli Maria Castro de AlmeidaCampo de Intervenção de Paracambi – RJ

Sou Neli de Almeida, do Rio de Janeiro, trabalho no Instituto Franco Baságlia, que é uma ONG que atua no campo da saúde mental. Temos algumas interfaces com a questão da geração de renda. Queria parabenizar muito a Mesa, foi espetacular ouvir as experiências. Creio que esse Seminário vai ser uma espécie de marco zero para realmente mapearmos os nossos problemas principais, para que possamos des-lanchar melhor nesse campo da geração de renda.

Tenho duas questões gerais para apresentar à Mesa. Uma delas é que, atualmen-te, por conta da minha experiência no campo de intervenção na Casa de Saúde Dr. Eiras, de Paracambi, que é um macrohospital, um grande manicômio. Atualmente, são em torno de 900 pacientes. Então, estou muito sob o impacto dessa experiên-cia, são pessoas que foram desapropriadas de tudo na vida, sobretudo da questão de seu lugar no mundo, e o trabalho pode ser um eixo importante para a defi nição desse sentido da vida.

A minha primeira pergunta vai nesse sentido: como essas diversas experiências ligadas ao trabalho dialogam com as experiências de desconstrução dos manicô-mios? Sobretudo porque hoje estamos num momento importante de intervenção do poder público em sete grandes manicômios do Brasil. A minha pergunta é essa, sobre como essas experiências trabalham, interrogam e dialogam com essa experiência de desconstrução, mais especifi camente com os pacientes dessas instituições.

A outra questão se relaciona (e o disparador foi um pouco a fala da Rose) ao fato de que é muito importante problematizar a questão do trabalho nesse campo do ca-pitalismo. Quando falamos de trabalho, sabemos que estamos falando de uma coisa muito central na produção do sistema capitalista. Sabemos também que o trabalho estabelece relações duras conosco, com o outro, com o mundo. Então, a minha per-gunta vai, primeiro, para enfatizar o que me parece de suma importância sabermos exatamente com o que estamos lidando ao falarmos de trabalho, ao falarmos de produção, ao falarmos de modo de produção, sobre que via queremos, pensando na emancipação desse sujeito, se estamos reproduzindo dentro dos nossos serviços esses nexos de alienação. Então, é importante essa interrogação permanente, que vai ter uma infl uência direta no nosso trabalho. A minha pergunta vai nesse sentido, que é minha grande preocupação.

Muitas vezes, trabalhamos com o conceito de autonomia como um critério sele-tivo. Então, os pacientes mais capazes são o nosso público-alvo. Pensamos em de-terminadas ofi cinas. Essa concepção de autonomia como ponto de partida, como seleção, cria uma distorção, porque criamos uma exclusão dentro da exclusão. Eu me pergunto se poderíamos trabalhar a autonomia como um ponto de chegada, e não como um ponto de partida. Assim, nos tornaríamos mais generosos e começaríamos

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a colocar a nossa cabeça a pensar para incluir os pacientes graves. Talvez possamos ir por esse caminho, quando a Cristina fala da criatividade. A minha última pergunta é essa: qual o melhor conceito de autonomia dentro da nossa prática?

Fábio Sanchez

Teremos mais duas perguntas, mas vou pedir que sejam mais rápidas, para termos tempo para as respostas.

Participante(não identificado)

Eu já fui contemplada nas perguntas, mas queria colocar mais alguma coisa. A questão de aceitar estar dentro do sistema passa muito por essa falta de refl exão do que estamos reproduzindo com o nosso trabalho. Isso gera uma certa aceitação, um pouco o que o professor Paul Singer falou ontem nesse sentido de, por já aceitar as coisas mais fáceis, termos a necessidade de uma demanda imediata, acabamos re-produzindo e aceitando que as outras pessoas aceitem estar dentro desse sistema. Então, é muito mais fácil aceitar do que lutar contra. A alternativa é sempre aceitar. A minha pergunta já foi contemplada nas duas últimas.

Alcione C. A. da SilvaVerso Cooperativa de Psicologia – SP

Meu nome é Alcione, sou cooperada da Cooperativa de Psicologia. Na realida-de, eu queria colocar uma questão, mas eu queria rapidamente introduzir o porquê. É uma questão relativamente óbvia, e entendo que o debate permite clarifi car um pouco essa obviedade.

Na minha opinião, foi muito corajosa a fala da Rosemeire de, nesse momento, em que as pessoas vêm aqui trocar experiências, discutir e querer saber um pouco mais sobre esse processo de geração de renda, quase querendo levar uma propos-ta pronta, um ponto a mais para avançar nos seus lugares de trabalho, ela trouxe o questionamento sobre a noção de trabalho. Talvez, se pudermos dar conta de fazer essa discussão, é fundamental para pensarmos o que é esse laço social que estamos querendo produzir por meio dessas associações e cooperativas, mas ela também aponta para outra questão, que uma pessoa falou, sobre autonomia.

São duas dimensões que foram apontadas do capitalismo, onde operar uma trans-formação no sujeito como objeto é apagar esse desejo. A meu ver, aparece um de-sejo da equipe de que esse trabalho aconteça, e aí vale questionar qual é o gancho, qual é a produção de sentido que isso tem na vida dos usuários, se não é para in-fantilizar, fazer qualquer coisa e vender, etc., que lugar isso tem na vida dessa pes-

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soa. Eu fi quei muito curiosa, porque gosto dos dois temas, e me chamou a atenção o motivo das pessoas terem escolhido o cooperativismo. É uma provocação que eu vou fazer, porque a vida em cooperativa não é fácil para ninguém. É um momento em que a participação da pessoa é fundamental para que a coisa aconteça, a dela, a do colega, com capacidade para ouvir uma opinião diferente, discutir, fazer reu-niões, fi car numa pré-tarefa que, às vezes, não consegue chegar no objetivo, seja de gerar renda diretamente, etc. Tem também o envolvimento político de discutir. Não é qualquer geração de renda. Na minha opinião, foi um cuidado interessante que o professor teve ontem de situar isso para nós, no sentido de que não é somente uma opção para os excluídos, mas tem um contexto ideológico e político que abriga uma noção de trabalho e de homem, que vai contra o capitalismo, como a senhora co-locou muito bem.

Quanto à questão da autonomia, creio que é muito relevante. Somos um grupo de profi ssionais que se formou na universidade e temos difi culdade em ser autôno-mos também, de propor projetos, encaminhar esses projetos e fazer a coisa aconte-cer. Muita gente também aprendeu a falar em grupo. Somos um grupo da Universi-dade de São Paulo, supostamente muito bem formados, mas a vida no coletivo nos ensinou a falar. Então, só atentar para esse caráter da autonomia e da participação, que é uma coisa que, historicamente, não temos espaços de participação pública. Assim, não é uma condição de quem está saudável ou de quem está doente; é um aprendizado constante para quem está em cooperativa.

A minha pergunta é: por que estão pensando em fazer uma cooperativa com esses trabalhadores, considerando essa dimensão que eu trouxe? Obrigada.

Fábio Sanchez

Preciso passar as palavras, porque já estamos esticando o horário. À tarde também teremos tempo para outras colocações.

José de Souza De Paula

De Paula, do Rio, da Associação de Familiares, que os senhores já conhecem. Primeiro, queria parabenizar a Mesa, todo o coletivo. Realmente, cheguei aqui com uma perspectiva e saio com outra. Além de familiar, eu trabalho na área profi ssional, na área jurídica, e tenho apenas uma recomendação: coloquem sempre na equipe multidisciplinar (e falo isso desde 1990) a fi gura do advogado, para desmontar todo o arcabouço jurídico-conservador que tem em torno disso. Hoje, temos parceiros importantes no Ministério Público, na Defensoria Pública e nos profi ssionais da área do direito. Então, sem o desmonte desse arcabouço tradicional e terrível do Judiciário brasileiro, nós não vamos conseguir muita coisa. Assim, peço aos companheiros pro-fi ssionais da área técnica que olhem sempre, na equipe multidisciplinar, a presença

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do advogado, não só para defender os direitos civis dos familiares e dos usuários, como também o desmonte da própria legislação, que é conservadora e arcaica.

Fábio Sanchez

Obrigado. Vou passar a palavra, então, pela ordem, para a Teresa.

Teresa Monnerat

Vou tentar responder o que eu consegui anotar. Perguntaram sobre como é o coti-diano dos projetos, como é a participação dos técnicos. Nos projetos que eu vivenciei e que eu tenho acompanhado, é muito forte a participação dos técnicos. Creio que temos uma liderança muito forte, até porque misturamos muito a questão da assistência com a do projeto de geração de renda. Temos um papel, a identidade do psicólogo. Em contrapartida, a dos usuários é muito mais branda. O movimento de familiares poderia estar colaborando muito. Não precisa ser o familiar do paciente porque, às vezes, fi ca complicado, mas temos participação de familiar de outra clientela num projeto da Praia Vermelha, o que ajudou bastante e foi muito interessante.

A questão de ofi cina terapêutica é essencial. Creio que o foco desse encontro é a ofi cina de trabalho e geração de renda. Por isso, estamos ouvindo muito sobre o projeto, que é um projeto muito mais de inclusão social do que um projeto ligado à questão da clínica. Essa questão vai aparecer nos grupos e vamos discuti-la. No Rio de Janeiro, debatemos muito essa questão do perfi l de determinada ofi cina, se é terapêutica, se é ofi cina de renda. É algo realmente polêmico e que merece uma discussão.

Em relação à questão do manicômio que a Neli colocou, acredito que seja uma responsabilidade muito grande de todos nós. Temos no Rio de Janeiro a Colônia Juliano Moreira, que tem representantes aqui e tem uma história de desconstrução pelo trabalho, mas temos que fi car muito alertas porque é um trabalho dentro de um grande asilo, é um trabalho de faz de conta, aquele trabalho que conhecemos nas décadas de 70/80 na nossa formação. É aquele trabalho para ocupar o tempo, para não perturbar o outro.

Temos que fazer, isso é uma obrigação de todos nós, é uma estratégia que temos de utilizar, mas com alerta para não repetirmos a história pelo menos da minha formação.

Quanto à autonomia como ponto de partida ou como ponto de chegada, tive uma proposta muito grande quando fundamos a Praia Vermelha, para não fazer exclusão por exclusão. Lá, todos que se tratam podem se inscrever. O processo é seletivo por si só. Para entrar na Praia Vermelha, fazemos um curso de cooperativismo durante três tardes. Apenas o fato da pessoa suportar, se organizar no tempo, sentar numa sala e participar, já mostra que está organizada para o trabalho. Assim, todos podem fazer o curso, mas vão participar ou não do projeto.

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Quanto ao que é cooperativismo, na nossa experiência, não formalizamos a co-operativa porque não valia a pena, mas funcionamos como tal. O importante é a prática. É um projeto de co-responsabilidade, onde co-responsabilizamos as pessoas que estão juntas. Apesar da presença do técnico ser muito forte, temos uma co-res-ponsabilidade em tudo, no dinheiro, nas sobras, no que fazer, no que investir, nas planilhas, etc. É muito democrático e, ao meu ver, dá voz a esses usuários. Poderíamos falar mais, mas como não quero me estender, só isso já é rico para esse grupo.

Luciana Cristina de Alcântara

Vou tentar resumir algumas idéias. Na verdade, eu queria inclusive dar algumas dicas da prática da minha equipe e do que temos visto lá. Falando um pouco sobre a suplantação da clínica, discutimos isso interminavelmente e ainda discutimos de vez em quando na equipe, mas chegamos ao consenso de que a geração de renda é necessária e que o trabalho é um direito. Então, nessas iniciativas que temos, não estamos fazendo caridade, nem favor para ninguém. Estamos construindo a possibi-lidade de que esse direito do trabalho seja exercido por essa população.

O que chamamos de clínica e o que chamamos de terapêutico? Creio que é isso que devemos discutir, e não se o trabalho é terapêutico, se a geração de renda é te-rapêutica ou não, porque a maioria da população que nós atendemos nas políticas públicas é predominantemente uma população pobre, socialmente excluída do tra-balho, principalmente na saúde mental, que já vemos até os excluídos dos excluí-dos. Assim, a geração de renda é necessária. Temos, na verdade, que discutir o que é terapêutico. Chegou um momento da vida da pessoa e do seu tratamento no qual o que ela precisa é de dinheiro no bolso, precisa pagar aluguel, sair da rua, precisa comer, precisa vestir, precisa se sentir útil, se sentir gente, porque ela já alcançou a estabilização do tratamento e, agora, precisa de outro passo, que é a geração de renda.

Complementando a Teresa, por que escolhemos cooperativismo? Claro que o modelo do cooperativismo se assemelha muito mais com a nossa idéia e o nosso desejo de participação dos usuários no processo de trabalho, pois é democrático. Eles podem opinar, a distribuição da renda é de acordo com a produção, com a fre-qüência, enfi m, mas tem uma questão principal, pelo menos no nosso caso, que foi como iríamos resolver a questão legal do trabalho na saúde mental. Eu não sei como é em outras experiências, mas já tivemos várias experiências de usuários ou fami-liares de usuários entrando com processo jurídico contra nossa iniciativa, dizendo que eram funcionários, que cumpriam horário, que assinavam livro de ponto, o que é verdade, porque eles assinavam freqüência para poderem receber a bolsa no fi nal do mês. No entanto, é um projeto terapêutico. Fica esse paradoxo. Para eles, eles são trabalhadores e querem seus direitos trabalhistas.

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Luciana Cristina de Alcântara

Não ganhou, porque tem aquela parte de evolução de prontuário, do técnico da saúde, de estar dentro de um serviço de saúde mental, mas para resolvermos essa questão legal, a lei do cooperativismo permite que tenhamos essa iniciativa. Acre-dito que o cooperativismo é uma evolução dentro da saúde mental. Não fi camos com aquela questão do assistencialismo, é realmente a questão do trabalho que está na lógica.

Sobre a participação, a Nicéia, do Espírito Santo, perguntou sobre como fi ca a questão da participação dos técnicos junto aos usuários, como fi ca a participação dos usuários para não fi car suprimida. Eu penso, como Paul Singer falou, no sentido de que não devemos fazer guetos no cooperativismo. Na minha opinião, devemos ter grupos heterogêneos, sim. Uma cooperativa é uma empresa (ponto fi nal). Para uma empresa ir para frente, ela precisa ter uma boa administração, precisa saber ne-gociar, precisa saber vender, precisa saber produzir. Se ela não tiver esse olhar para o mercado, não vai para frente.

Para a população que nós atendemos, a meu ver, é muito rico quando tem a par-ticipação de outras pessoas que podem contribuir com saberes, não que necessaria-mente vá suprimir a participação do cooperado, do usuário. Ao contrário, vai com-plementar. É como foi falado, no sentido de que alguns familiares também querem participar da cooperativa para sobrevivência, para ganharem dinheiro realmente. Tem muita gente desempregada, não é somente o usuário, que também pode participar do cooperativismo. Assim, penso que deve ser uma construção dessa heterogenei-dade, mas que seja complementar, que consiga chegar no objetivo, que é a geração de renda para todo mundo que participa.

Sobre o capitalismo, fi zemos o curso de incubadora de cooperativas em Campi-nas. Ali nos foi dito que o capitalismo está longe de acabar, que é muito forte, está aí, e o subproduto do capitalismo é a exclusão social. Vamos ter que lidar com essa realidade. Umas das respostas a esse subproduto do capitalismo, que é a exclusão social, são as nossas iniciativas, a criação de ofi cinas, de associações e de coopera-tivismo. É isso que vai responder a essa população que vai fi cando à margem, que vai sobrando e fi cando sem função na sociedade.

Quanto à seleção do público, que o público-alvo são os mais aptos e mais ca-pacitados. Eu fi z um trabalho recentemente e, lendo Ana Pita, ela fala que o fi nan-ciamento desse tipo de iniciativa na saúde é muito escasso, muito pequeno, então, vemos que são serviços pequenos, às vezes, iniciativas dentro do Caps, pequenas realmente, porque começam com pouco recurso. Numa cidade do tamanho de Cam-pinas, que tem mais de 1 milhão de habitantes, temos diagnosticado o número de 13 mil doentes mentais, e ter um serviço como o Cândido Ferreira e as iniciativas da Prefeitura agora, oferecendo vagas para 230 pessoas, representa muito pouco.

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O que acontece, então? Tem lista de espera nas ofi cinas. Às vezes, dependendo da função que tem dentro da ofi cina, o critério é a habilidade do usuário, sim. Se na marcenaria está faltando um usuário que entenda alguma coisa de marcenaria, não é possível chamar aquele usuário mais grave, para quem vai ser preciso ensinar todo o processo, ele pode não conseguir cortar a madeira. Assim, temos que chamar aquele apto. É uma questão na qual a necessidade impõe a seleção. Por isso, a necessidade de ampliarmos as iniciativas.

Uma dica para a pessoa que falou das ofi cinas do Caps. Gostei muito da idéia do Paul Singer ontem, que falou o seguinte: por que não criar cooperativas que com-plementem outras? Uma cooperativa de venda, por exemplo. Em Campinas, temos uma loja imensa, Armazém das Ofi cinas. Todos os projetos sociais de Campinas po-dem levar os produtos para serem vendidos lá. Alguns projetos são bem pequenos, com um grupo de cinco pessoas que produzem bonequinhas e levam lá. O produto sendo vendido, 10% para a loja, para mantê-la funcionando, e o resto da renda é revertido. Dessa forma, é possível fazer parcerias para os usuários e para a manu-tenção da ofi cina. Tem que fazer essa divisão, do contrário, não criamos a sustenta-bilidade. Obrigada.

Fábio Sanchez

Antes de passar a palavra, só vou pedir o seguinte: disciplinar o tempo é sempre uma tarefa difícil, mas precisávamos acabar para podermos antecipar à tarde a de-manda que foi colocada. Eu vou passar para as últimas palavras, pedindo que sejam bem rápidas. Peço desculpas por esse disciplinamento, mas ele é necessário. Passo a palavra para a Carmem.

Carmem Vera Passos Ferreira

Vou procurar não responder o que já foi respondido. Pensando nessa questão da autonomia, na ofi cina, quando digo que é um espaço de passagem, creio que de-vemos pensar que é um espaço de passagem singular para cada usuário que passa lá. Temos alguns que estão na ofi cina de trabalho até hoje, e sabemos que eles vão conseguir permanecer nas ofi cinas de trabalho, que eles estão incluídos aí. Outros usuários vão conseguir estar nas ofi cinas de trabalho e nos grupos de produção mais autônomos. Ótimo, pois vão conseguir, enquanto outros vão conseguir entrar nos grupos de incubação de gestão solidária. Devemos pensar bastante nesses níveis di-ferenciados de inclusão no trabalho. Isso é interessante.

Uma outra questão que discutimos muito, talvez porque tenhamos começado dentro de uma moradia, é se cabe dentro da área física de um Caps uma ofi cina de trabalho, ou se já não é um passo a mais, se já não precisamos criar as ofi cinas de trabalho – e temos sido muito fi rmes nisso – num espaço diferenciado, que é o es-

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paço de mercado de trabalho. Assim, estaríamos conseguindo fazer esse corte do que é da assistência e o que é do trabalho, considerando, é óbvio, que uma ofi cina de geração de renda é terapêutica. Não é isso que estou dizendo, mas entendo que devemos pensar um pouco mais. Essa é uma discussão que precisamos fazer.

Na questão da desconstrução do manicômio, o que temos feito? Porto Alegre tem um grande hospital, o Hospital Psiquiátrico São Pedro, que tem projetos de geração de renda, principalmente para a clientela que é moradora. Temos um vínculo direto com o Hospital na questão da assessoria para alguns grupos, mas também recebe-mos usuários do Hospital nas nossas ofi cinas. Assim, conseguimos levar para dentro do Hospital também um pouco desse trabalho que estamos fazendo nas ofi cinas de geração de renda.

Voltando à questão da autonomia, é importante pensarmos que os nossos usuários fazem a escala de plantão nas lojas da economia solidária, e os produtos precisam ter uma boa qualidade para estarem nas lojas. Quando poderíamos pensar há um tempo que um usuário de um serviço de saúde mental pudesse fazer um plantão e se responsabilizando não só por seus produtos, mas de todos os outros grupos da economia solidária, pudesse prestar contas no fi nal do dia sobre isso, pudesse levar para a ofi cina, para dividir com o seu grupo, aquele dinheiro que foi arrecadado com as vendas, pudesse dar conta do controle de estoque? É claro que vamos estar acom-panhando tudo isso, mas é importante que ele possa estar ocupando esse espaço.

Para fi nalizar, temos muito essa preocupação, se não, já teríamos uma cooperati-va ou uma associação formada. Queremos que esse processo seja muito trabalhado no cotidiano e que eles possam se unir. Avaliamos que agora o grupo está preparado para isso, então, estamos pensando na questão da formalização da associação. Por que cooperativa? Para podermos pensar um pouco no resgate desse trabalho, que é mais democrático e mais solidário.

Fábio Sanchez

Eu perguntei para a Vera, para a Silvia e para a Rosemeire se elas se importavam em deixar para responder as perguntas na parte da tarde, nos grupos de trabalho, porque já ultrapassamos bastante o tempo. Quero agradecer a presença de todos. À tarde, continuaremos os debates.

Rita Martins

Quero informar que os grupos de trabalho ocorrerão agora à tarde. Esses grupos vão ser coordenados por Tânia, Neli e Marcela. Teremos duas salas, na porta de cada uma colocaremos a lista dos participantes. Cada grupo será composto por 23 par-ticipantes, duas experiências dessa Mesa, um representante da Saúde Mental e um representante da Senaes. Como expliquei ontem, é para pensarmos em propostas,

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pensarmos no que estamos fazendo lá na ponta, como é o processo de geração de renda, o que está acontecendo. Cada grupo terá um relator, esse relator fará um mi-nidocumento, somente com os pontos a serem discutidos na plenária fi nal.

2.a Parte – Tarde

3.3 Mesa-redonda: “Direito ao trabalho e produção da autonomia: Saúde Mental e Economia Solidária”

Coordenador: Valmor SchiochetSENAES/MTE

Vamos retomar os trabalhos. Para quem não me conhece, sou Valmor, da Secretaria Nacional de Economia Solidária do Ministério do Trabalho, da equipe do Professor Singer. Ontem à noite, tivemos uma ponderação um pouco mais conceitual sobre saúde mental e economia solidária, em particular com a participação do professor falando da economia solidária. Hoje de manhã, tivemos um painel com o conjunto de experiências de políticas públicas e de iniciativas que envolvem atores diferen-ciados na busca dessa relação entre saúde mental e geração de trabalho e renda, em particular a economia solidária como uma forma de organização desse processo.

Pensamos em duas atividades para hoje à tarde. Uma seria passarmos a discu-tir um pouco melhor essa articulação, do ponto de vista da construção da política pública e da mobilização da sociedade civil em torno desses dois eixos. Pensamos em compor uma Mesa para trabalhar a experiência da política de saúde mental do Ministério da Saúde, a política de economia solidária da Secretaria Nacional de Economia Solidária, duas falas também representando o processo de organização e mobilização da sociedade civil em torno desses dois temas, para os senhores a já clássica luta antimanicomial, e para nós, o movimento da economia solidária.

Convido Fernanda Nicácio, professora do Curso de Terapia Ocupacional da USP e militante do movimento na luta antimanicomial. Chamo também a Oscarina Cami-lo, que faz parte de uma cooperativa de Psicologia em São Paulo e da Coordenação do Fórum Brasileiro de Economia Solidária, que vai falar sobre a experiência. Passo a palavra para a Fernanda, sendo 15 minutos para a fala de cada um. O Pedro fala logo após a Fernanda, ele falará sobre a política.

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3.3.1 Reforma psiquiátrica, direito ao trabalho e emancipação

Fernanda Nicácio Docente do Curso de Terapia Ocupacional do Departamento de Fisioterapia, Fonoaudiologia e Terapia Ocupacional da Faculdade de Medicina da USP – São Paulo/SP

Boa-tarde a todos. Inicialmente, quero agradecer o convite para participar dessa mesa-redonda, cumprimentar a comissão organizadora pela realização desse evento e, sobretudo, saudar esse encontro entre atores e militantes da economia solidária e da reforma psiquiátrica, porque entendo que esse encontro é um sonho que vem sendo acalentado por tantos de nós há muitos anos nas práticas de transformação da realidade.

Para iniciar, gostaria de marcar uma das singularidades do processo de reforma psiquiátrica: a possibilidade de pensar a construção de políticas públicas a partir das experiências locais. Essa é uma riqueza que, muitas vezes, não colocamos de uma forma mais explícita, mas é uma riqueza desse processo, no qual a formulação das políticas tem como base a construção das experiências locais.

Nesse tempo restrito de 15 minutos, vou buscar fazer algumas articulações entre o campo da reforma e o da discussão do direito ao trabalho pensando no horizonte da produção de emancipação. A idéia de trazer alguns momentos do processo de reforma – e peço a contribuição de todos os colegas no debate – é no sentido de ar-ticular esse diálogo com os atores da economia solidária. Ao mesmo tempo, eviden-temente, não será possível refl etir sobre o conjunto do processo da reforma. Assim, vou marcar somente algumas passagens que possam propiciar esse diálogo.

No Brasil, convencionou-se denominar de reforma psiquiátrica o processo ini-ciado no fi nal dos anos 70 produzido, sobretudo, a partir da articulação do Movi-mento de Trabalhadores de Saúde Mental. Inscrito no singular contexto da sociedade brasileira daquele período, quando diversos movimentos, compondo o processo de redemocratização do País, se expressavam em múltiplas dimensões, o Movimento, depois organizado com diversas formulações, se confi gurará como principal ator e sujeito político do processo da reforma.

Para Sader, a emergência dos movimentos sociais populares naquele período re-dimensionou a ação política tradicional. O autor opera com a expressão “a entrada de novos personagens em cena” considerando que, com a experiência do cotidiano, produziram discursos inovadores, práticas de criação de direitos, diferentes lugares políticos, novas relações com espaços públicos. Enfatizo essa discussão porque con-sidero que essas questões têm acompanhado o processo de reforma no cenário na-cional, um processo animado e com intensa participação de trabalhadores, usuários, familiares, pessoas da sociedade civil e instituições de uma forma geral.

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É claro que, ao longo de todos esses anos, desde o fi nal da década de 70 até os nossos dias, o processo de reforma apresentou um conjunto de diversos desdobra-mentos, de acordo, inclusive, com os projetos e com as possibilidades político-ins-titucionais, mas o esforço de síntese impede de poder refl etir mais sobre essas ques-tões nesse momento. Gostaria, então, de marcar algumas questões fundamentais. A primeira diz respeito a um momento que considero um momento de ruptura, uma ruptura epistemológica, uma ruptura política: foi quando o Movimento de Traba-lhadores de Saúde Mental propôs, em 1987, a insígnia Por uma sociedade sem ma-nicômios. Esse momento produziu uma profunda transformação nas trajetórias até então delineadas e indicou uma forma inovadora de pensar a questão da loucura no contexto e nas relações sociais, delineando um novo campo ético-político para o processo de transformação da atenção psiquiátrica: a afi rmação dos direitos de cidadania das pessoas com a experiência do sofrimento psíquico.

Fortemente marcadas por uma das perspectivas dos processos de reforma psiquiá-trica, a perspectiva teórica da desinstitucionalização, as discussões então realizadas indicaram uma ruptura e articularam-se novas idéias como a desconstrução do ma-nicômio, a construção da cidadania e o direito à diversidade. Nos anos posteriores, em particular, a partir da implantação do Sistema Único de Saúde, foram produzidas novas proposições para todo o campo e penso que algumas questões têm marcado esse processo.

Em primeiro lugar, a produção de um amplo conjunto de experiências locais e a construção, marcadamente desde 1991, de uma nova política nacional de saúde mental. Uma outra questão muito importante, que não será possível aprofundar nes-se momento, foi o debate sobre o projeto de lei que atravessou toda a década de 90 e que, certamente, foi um forte potencializador das discussões da reforma em todo o País. Outra questão a ser salientada é o próprio percurso de construção do Movi-mento Nacional de Luta Antimanicomial que se ampliou na década de 90 e, nesse processo, produziu e potencializou a participação de usuários e familiares, repre-sentando um protagonismo absolutamente diverso. Organizadas em associações, entraram em cena as pessoas com as suas experiências concretas de vida, com seus depoimentos sobre as instituições psiquiátricas, com suas expectativas em relação à reforma. Assinalo essa questão porque entendo que revela uma outra singularidade do processo da reforma: o debate transcendeu os limites do campo técnico.

Para sintetizar, podemos dizer que a implementação de diversas experiências locais, a aprovação de leis municipais, estaduais e a lei nacional, a ampliação e a vitalidade do movimento social, a potencialização do protagonismo e da contratu-alidade dos usuários e dos familiares e a construção de uma rica produção teórica, são algumas das expressões da riqueza do percurso da reforma.

Ao mesmo tempo, exatamente pelo muito que fi zemos, sabemos o muito que te-mos a fazer. Esse rigor, evidentemente, não está negando os avanços do processo, in-

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clusive porque compreendo que a riqueza da reforma é exatamente que, no seu pró-prio caminhar, são produzidas novas necessidades, como essa – o direito ao trabalho – que hoje estamos discutindo. Nessa perspectiva, não entendo a reforma como um processo específi co ou uma prática especialista, mas, necessariamente, um proces-so que implica transformar os modos de pensar e agir em saúde e, ao mesmo tempo transcender o campo da saúde e, dessa forma, inscrever a necessidade de produção de novos diálogos com diversos atores da construção de políticas públicas que bus-cam efetivamente construir direitos e enfrentar as profundas desigualdades sociais.

Podemos pensar a reforma a partir de diversas dimensões, dentre as quais a afi r-mação do direito de cidadania das pessoas com transtornos mentais. Essa propo-sição da reforma exige uma profunda transformação da relação de tutela e coloca em cena uma nova forma de compreender a problemática da loucura. Nesse sen-tido, o processo coloca em discussão as concepções de terapêutico e, também, do que entendemos como produção de saúde e implica, necessariamente, olhar para o conjunto da cidade.

Em relação ao direito ao trabalho, é necessário, inicialmente, refl etir sobre o signi-fi cado da afi rmação da cidadania das pessoas com transtornos mentais. Cidadania e loucura foram termos que, histórica e socialmente, se produziram como nitidamente separados, o que foi assumido como natural pelo saber psiquiátrico. Diversos auto-res, dentre os quais Foucault e Castel, discutem a emergência do saber psiquiátrico e a refl exão sobre esse processo elucida que a construção do olhar para o louco pauta-se no que deve ser isolado, tutelado, que é perigoso e, sobretudo, de menos valia. Ao articular, então, loucura e cidadania, a proposição da reforma inscreve-se no contexto das políticas públicas que visam à extensão de direitos, mas, ao mesmo tempo, não se circunscreve à extensão de direitos, uma vez que o louco não é um cidadão e, dessa forma, a reforma coloca algo absolutamente novo.

Pedro Gabriel Delgado refere-se a essa entrada em cena dos loucos como ci-dadãos, como um enigma teórico, um imprevisível político. Em suas palavras: “O cidadão louco, contudo, é uma contradição em seus próprios termos, verdadeiro paradoxo, se tomarmos a existência do direito na pólis pelo paradigma da razão, do qual o louco, ‘alienado’, está fora” (As Razões da Tutela, 1992). Uma das possíveis interpretações desse imprevisível político é a de que se refere à ruptura com a velha ordem de institucionalizar a diversidade, anulando-a como pólo de confl ito. Nessa visada, considero que no cotidiano das práticas do processo de reforma psiquiátrica está colocada uma questão central: a necessidade de produção de um novo lugar social para a experiência da loucura.

Basaglia nos dizia que o louco é, antes de tudo, um homem sem direitos e sem valor social. E, se estamos enunciando algo radicalmente novo – a cidadania das pessoas com a experiência do sofrimento psíquico –, necessariamente essa afi rma-ção implica colocar em questão a vida nas cidades.

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Considero que é fundamental pensar a discussão do direito ao trabalho inscrita nos processos de construção de direitos e, nessa perspectiva, temos muitos desafi os. Daquilo que pude conhecer das cooperativas de Trieste, experiência que considero que pode contribuir muito na nossa discussão, enfatizo um desses desafi os: a com-plexa construção de itinerários, claro que não compreendidos na forma de etapas, mas dos processos de usuário, usuário trabalhador e cooperado.

E aqui coloca-se novamente a discussão, presente também no período manhã, em relação à compreensão dos itinerários de produção de emancipação e de au-tonomia, de ampliação da contratualidade social, ou do que tem sido denominado atualmente de empoderamento. Essa é uma discussão fundamental para nós que buscamos construir esses processos com pessoas que são vistas e percebidas nas re-lações sociais como pessoas de menos valia e, nessa visada, constitui questão central na discussão do direito ao trabalho.

Para exemplifi car, podemos dizer que um dos desafi os na experiência santista foi o de operar, ou, melhor, romper com uma visão de autonomia articulada à auto-su-fi ciência. Nessa perspectiva de compreensão de autonomia, acabamos trabalhando com uma visão de habilidades como atributos individuais. Mas, a partir de diversos autores, podemos pensar a autonomia como relacional, como relacionada às redes múltiplas de pertencimento.

Um outro desafi o extremamente importante é o da superação da lógica do tra-balho protegido. Certamente, existem, entre nós, diferentes formas de compreensão dessa questão que merecem ser discutidas e aprofundadas. Compreendo o trabalho protegido em relação à “lógica do assistido” e considero que não é simples superar essa lógica.

Para fi nalizar, queria dizer que é um prazer esse diálogo com os atores da eco-nomia solidária e que, certamente, o contexto atual, já abordado hoje de manhã, coloca sempre, e mais ainda quando nos debruçamos sobre a discussão do direito ao trabalho, a necessidade de aprofundar a refl exão. Considero que a riqueza que temos tido nas práticas cotidianas é o sentido de compartilhar os projetos de vida dos usuários que voltam a se reapropriar de suas vidas; e é, sobretudo essa riqueza que possibilita seguir caminhando e encontrando novos parceiros nesse processo de buscar desconstruir a lógica binária que opõe capacidade e incapacidade, desenvol-vimento e distribuição de riqueza, razão e loucura. Obrigada.

Valmor Schiochet

Obrigado, Fernanda. Eu vou passar para a Oscarina. Combinamos aqui de pri-meiro deixar a sociedade civil falar e, depois, teremos a fala da política pública. A Oscarina vai falar um pouco da experiência do Fórum Brasileiro de Economia Soli-dária. Como os senhores vão perceber, é um movimento bem mais recente do que o movimento que, possivelmente, todos os senhores estiveram envolvidos ao longo

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dessa história, também recente, mas já com avanços importantes do ponto de vista das políticas públicas, do acesso aos direitos, e assim por diante.

3.3.2 Uma outra economia acontece

Oscarina CamilloCooperativa de Psicologia – Coop Mútua-Ação – Santo André/SPCoordenação do Fórum Brasileiro de Economia Solidária (FBES)

Boa-tarde a todas e a todos. Agradeço muitíssimo o convite para fazer parte des-sa mesa. É uma satisfação muito grande falar de duas paixões: a Psicologia e a Eco-nomia Solidária. Primeiro, porque falar de economia solidária é falar do signifi cado do trabalho associado, e segundo, que pode ser uma opção, uma vez que eu tive a oportunidade de trabalhar no mercado formal, e depois optei pelo trabalho associa-do realmente como opção de vida.

Fui convidada para falar sobre o Fórum Brasileiro de Economia Solidária (FBES) como uma instância de organização do movimento de economia solidária. Inicial-mente, é importante ressaltar que houve uma trajetória de discussões, e o surgimento do Fórum Brasileiro teve início nessas discussões para depois falar sistematicamente do que seria economia solidária no Brasil, porque antes do FBES já existiam coope-rativas, associações e tudo o mais, utilizando pouco a terminologia economia soli-dária. A partir do Fórum Social Mundial, houve a constituição de um GT brasileiro para sistematizar as discussões acumuladas sobre essa questão. A partir dessa sis-tematização, tivemos várias plenárias para construir uma plataforma, uma carta de princípios da economia solidária. Foi construída também, neste coletivo, uma carta ao presidente Lula, em que nós pontuávamos a importância de criar uma instância que desse conta da necessidade da organização do movimento, no sentido de ter um organismo público, do Estado, que reforçasse essa visibilidade para dentro do governo enquanto segmento da economia brasileira.

Foi a partir disso que tivemos, às vésperas da III Plenária, a criação da Senaes. Na terceira plenária de economia solidária, instalamos o Fórum Brasileiro de Eco-nomia Solidária. A partir dessa instalação, foi tirada uma coordenação, da qual faço parte, e também saíram alguns encaminhamentos para dar organicidade para esse movimento, como fortalecimento dos fóruns estaduais e regionais, propiciando o intercâmbio de práticas e experiências que já vinham de um longo tempo e que, depois da organização dos fóruns, os estados que não tinham fórum tiveram todo o acompanhamento via Senaes para a criação dessas instâncias de organização como ponte de interlocução com o Estado na construção de políticas públicas.

Recentemente, em agosto, tivemos um marco histórico que foi a realização do I Encontro Nacional de Empreendimentos de Economia Solidária. Dentro desse mo-vimento já existem as redes de gestores e incubadoras, e nós empreendimentos da

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economia solidária, precisávamos dar uma visibilidade para o que era o movimento como um todo. Assim, tivemos esse espaço, esse momento de construção do I En-contro Nacional de Empreendimentos de Economia Solidária, em que reunimos mais de duas mil pessoas. Foi bastante signifi cativo para os representantes do movimento, foi um momento bastante gratifi cante e importante porque tivemos a oportunidade além de avançar no acúmulo que já temos da plataforma da economia solidária, pudemos ver e mostrar a riqueza que existe por esse Brasil afora em termos de ini-ciativas de organização enquanto trabalho associado.

Nesse processo todo, há duas semanas, tivemos como desdobramento uma ma-ratona de ofi cinas, passamos seis dias discutindo políticas públicas para a economia solidária, na qual tivemos a oportunidade de saber o que existe de acúmulo enquanto GT de marco jurídico, GT de fi nanças solidárias, além da possibilidade quase con-creta de constituição do Conselho Nacional de Economia Solidária (CNES). Discuti-mos também a possibilidade, dentro da constituição do CNES e de se constituir um Pronaes, um programa nacional de economia solidária, que seria, a exemplo do que existe para a agricultura familiar, o Pronaf, ter um Pronaes para promover a susten-tabilidade e apoiar o início dos empreendimentos.

Nas ofi cinas, tivemos a oportunidade de levantar alguns pontos que são funda-mentais para o movimento no que se refere à articulação. Em primeiro lugar, a for-ma como o movimento está hoje no processo de interlocução com o governo, na negociação para fora do empreendimento, em segundo lugar, o I Encontro Nacional, que mostrou o fortalecimento, a visibilidade, a identidade do movimento, porque organizamos e trouxemos a Brasília empreendimentos de todas as regiões brasileiras. Nas ofi cinas, vimos a necessidade também de uma preparação dos grupos a partir do fortalecimento dos fóruns estaduais e regionais, para que possamos nos articular lá fora, com o Estado, com o poder público, a fi m de dar organicidade e sustentabi-lidade para o movimento, precisamos avançar na questão de legislação, existe uma série de problemas, os tributos são altos, etc.

Dentro das questões discutidas, apontamos alguns eixos norteadores para essas ações daqui para frente. Existe um termo de referência para o Centro Público de Economia Solidária. Esse é um ponto que pretendemos ver nos nossos locais, nas nossas comunidades, se é Centro de Referência de Economia Solidária, se é Casa da Economia Solidária, se é Central de Comercialização, enfi m, o que será isso. É um espaço que pretendemos que seja de formação, comercialização, balcão de ne-gócios, enfi m, deve ser um espaço grande, com infra-estrutura, entendemos que os equipamentos públicos podem servir a essa organização e possibilitar a expansão da economia solidária.

Dentro disso, também a perspectiva da realização de uma Conferência Nacional de Economia Solidária, é uma oportunidade para criarmos o estatuto da economia solidária, dar uma consistência maior, porque existe acúmulo sufi ciente para isso.

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Uma conferência nacional daria uma consistência que, na vida cotidiana dos em-preendimentos percebemos que existe, mas enquanto movimento, não temos esse documento que mostre essa consistência, essa vida já tão longa.

Uma outra questão também é com relação a papéis. Vemos que, dentro do mo-vimento, somos vários atores sociais envolvidos no movimento e percebemos que em algumas situações, esses papéis acabam se misturando, se confundindo. Sabe-mos que o movimento social é mutante, mutável, está sempre agregando gente. É um movimento aberto, e essa fronteira entre o que é do grupo, é do movimento e o que é poder público, acaba fi cando um tanto confuso. Nesse sentido, fi rmamos a importância de garantir o protagonismo dos produtores da economia solidária, de-marcado no I Encontro Nacional, onde foi feita uma tabulação das presenças nesse evento. Vemos que a defi nição desses papéis é bastante importante.

Nesse momento, para o fortalecimento do Fórum Brasileiro enquanto espaço de arti-culação do movimento da economia solidária, nós empreendimentos, vemos que a rela-ção com o Estado está posta quando falamos das políticas públicas, do marco jurídico, das fi nanças solidárias, das possibilidades de darmos conta do que seria essa fi nança solidária. Além disso, falamos de microcrédito e de cooperativa de crédito, e mostramos que temos uma participação bastante efetiva e presente em todas essas frentes.

Também está acontecendo o mapeamento da economia solidária, entrando um novo ator nessa história, que são as DRTs. Com essa nova parceria estamos fazendo esse mapeamento da economia solidária para dar a visibilidade numérica, para apa-recermos no PIB, porque sabemos que o nosso potencial, a nossa produção, além da produção de novos valores nas relações de trabalho, também produzimos valores numéricos que fazem diferença.

Agora falarei da Mútua-Ação, cooperativa de psicologia da qual sou sócia fun-dadora, como exemplo de trabalho associado. É importante falar um pouco dessa experiência como trabalho associado porque, até agora, falamos de experiências da saúde mental e de geração de renda, e na Mútua-Ação somos psicólogas e psicólo-gos atuando dentro da economia solidária. A sociedade está acostumada ao produto como resultado e o trabalho do psicólogo dentro do processo de organização fi ca quase invisível, acaba sendo um trabalho mais ou menos de “formiguinha”. Eu cos-tumo dizer que o trabalho da psicóloga e do psicólogo se materializa muitas vezes numa tese, num artigo. No trabalho cotidiano ele fi ca diluído porque o processo resulta em novas relações, em novas possibilidades para as pessoas, e isso é uma coisa que fi ca meio submersa.

Para fi nalizar essa questão do trabalho associado, sabemos que estar em coope-rativa é um desafi o cotidiano, porque essa fronteira tênue entre o “eu” e o “nós”, entre o indivíduo e o grupo é muito sutil, vivemos esse dilema do “eu” e do “nós” a todo instante e o movimento da economia também vive isso numa dimensão muito maior. Obrigada.

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Valmor Schiochet

Obrigado, Oscarina. Passo a palavra para o Pedro.

3.3.3 Proposta de criação de uma Rede Nacional de Saúde Mental e Economia Solidária

Pedro Gabriel Delgado

Boa-tarde a todos. Vou tentar ser breve. Na III Conferência Nacional de Saúde Mental, cujo relatório é este que todos os senhores conhecem (as pessoas do mo-vimento da economia solidária talvez não tenham ainda tanta familiaridade com o relatório), apareceu com muita clareza a proposta de buscar junto ao governo a criação de apoios para que essas experiências de geração de renda, inserção pelo trabalho, etc., pudessem ser menos fugazes e heróicas e se tornassem, de fato, um componente mais forte, mais permanente no processo de reforma.

Lembro-me de uma reunião da Conferência, muito interessante e muito bonita, com quase 80 usuários-delegados, realizada com a organização da Conferência, com um tema aberto aos usuários para discutirem com a organização da Conferência. Pratica-mente, o assunto que dominou a fala de quase todos eles foi a questão de que todas as experiências de inclusão pelo trabalho e de geração de renda eram muito precárias, eram experiências muito frágeis, muito difíceis de manter. Os usuários participavam daquela angústia dos próprios técnicos, que foi relatada um pouco hoje na parte da manhã, no sentido de que isso ainda é muito pequeno, muito frágil, que acaba com um sopro ou quando uma só pessoa que sustenta aquela experiência deixar de se dedicar a ela. Em poucos lugares, na verdade, essas experiências foram de fato organicamente ligadas ao programa geral de saúde mental, sendo em geral isoladas, etc.

Foi mencionado inclusive um exemplo aqui, chamo a atenção das pessoas no sentido de que é um caso absolutamente atípico, de uma cidade cuja administração tem se colocado na contramão da reforma psiquiátrica, e na qual a experiência da cooperativa é, na verdade, aquela que marca a existência da reforma, muito mais do que aquelas que contam com apoio governamental, naquele município.

O segundo ponto que apareceu na III Conferência Nacional, e é muito interessan-te, presente no Relatório Final, fala com muita clareza na idéia de criação de redes e explora bastante, nessa discussão coletiva, daquela vastíssima ofi cina que fi zemos há alguns anos aqui em Brasília, a questão da criação de redes no campo da saúde mental. O dispositivo da rede é alguma coisa que permite avançar na reforma, seja rede de usuários, rede de associações de familiares, rede de associações de amigos da reforma, rede de associações de ofi cinas de produção de arte, etc., enfi m, essa idéia do dispositivo da rede social como dispositivo importante na consolidação do processo social da reforma.

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Vamos falar de trabalho e de rede, trabalhar a rede. A idéia de rede no campo da saúde mental já teve outros signifi cados. Do mesmo modo que a Fernanda men-cionou, até o conceito de trabalho, no campo da saúde mental, andou signifi cando coisas muito restritas, andou convivendo inclusive com métodos muito autoritários de tratamento. Na verdade, as grandes colônias de alienados utilizavam o concei-to do trabalho assistido e do trabalho protegido também como sua justifi cativa, por exemplo, as colônias agrícolas. Isso foi considerado, no início do século passado, um avanço em relação aos hospícios tradicionais. Também a noção de rede, num outro contexto, nos anos 60, foi uma noção tomada de forma reducionista no campo da saúde mental comunitária, especialmente no modelo norte-americano, com aquela idéia de que rede é alguma coisa que os trabalhadores sociais da então chamada “psiquiatria comunitária” vão à sociedade e constróem, de modo a poder inserir os usuários em redes sociais que eles não têm, como se houvesse uma tecnologia de criação de redes sociais para as pessoas que não têm rede social.

Na verdade, o conceito que aparece aqui é uma rede mais dotada de signifi ca-do, uma aproximação de experiências concretas de construção de uma sociedade mais justa. Não é uma tecnologia, como é a noção de rede, digamos, na psiquiatria comunitária dos anos 70. Não é “o social de um mundo sem social”, como disse Castel das pretensões normativas da saúde mental. Então, trata-se de um outro tra-balho, de uma outra noção de trabalho no campo da saúde mental, e também de uma outra noção de rede nesse mesmo campo. Trabalho e rede, portanto, são duas palavras que vêm sendo trabalhadas. Minha fala é sobre a constituição de uma rede de economia solidária e saúde mental. Como tecer uma rede das experiências con-cretas de cooperativas, geração de renda, inclusão pelo trabalho. De que rede e de que trabalho falamos. O emprego do trabalho para recuperar as pessoas, para fazer com que o alienado volte à razão, está em Pinel. Aliás, Pinel foi também o primeiro psicólogo e o primeiro terapeuta ocupacional. Essa afi rmação é do Robert Castel, d’A Ordem Psiquiátrica, não vou usá-la sozinho. É no sentido de que, ao propor o tratamento moral, Pinel pensava que podia fazer mudar a experiência trágica da alienação com tecnologias de inclusão social.

Estou satisfeito com o que já foi dito pela Fernanda de que não se trata de tecno-logias de produção da inclusão social para pessoas que não se incluem na sociedade por conta da experiência trágica da loucura, mas trata-se, isto é o principal, de cons-truir ativamente uma nova forma de sociedade, capaz de abrir espaço para pessoas que são tomadas como aquelas que devem fi car do lado de fora da vida cotidiana.

Da mesma maneira, a economia solidária também propõe uma rediscussão, que não é uma rediscussão ingênua, nem dogmática, do tema da inclusão no mercado, das formas de viabilização da sobrevivência em condições adversas, sendo a vida no capitalismo uma condição adversa. Como o Paul Singer estava falando ontem, o mercado capitalista é estruturalmente excludente. Creio que, até por essa visão que

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a economia solidária traz, de travar esse debate, como mencionei ontem, digamos construtivo, mesmo sendo radical, com essas condições adversas do mercado, um mercado que não inclui, mas exclui, por isto mesmo, entre a economia solidária e a reforma psiquiátrica existe uma vocação cooperativa inevitável. Cooperativa é uma palavra que circula entre nós. Há uma vocação dessa cooperação, uma coope-ração que devemos construir de uma forma cada vez mais conseqüente. Na minha opinião, é uma das possibilidades melhores que temos que explorar em relação aos caminhos futuros da reforma psiquiátrica.

Quando, no Fórum Social Mundial de 2003, foi anunciada a criação da Secretaria de Economia Solidária no novo governo, vários companheiros do campo da saúde mental estavam lá, e todos nós já víamos aquela como uma grande possibilidade para o campo da saúde mental, como abertura de caminhos para esse campo. Por isso mesmo, a busca de parceria direta com essa Secretaria se deu desde o início. Quero registrar aqui o esforço do próprio Doutor Gastão Wagner, quando ainda na Secretaria-Executiva do Ministério, buscando essa articulação com o professor Paul Singer, dado que, de fato, esta aparecia para nós, no campo da saúde mental, como uma articulação promissora, extremamente promissora, que poderia remover certas limitações aparentemente incontornáveis no esforço que era feito em cooperativas, trabalho protegido, inclusão pelo trabalho, ofi cina de geração de renda, etc., dando um salto em termos de qualidade e de sustentabilidade dessas experiências.

Creio que a idéia da constituição dessa rede como uma articulação construída ativamente, sustentada diariamente, onde estejam presentes as instituições da so-ciedade civil e o governo, deve ser um dos produtos dessa ofi cina que estamos fa-zendo aqui, alguma coisa que amarre de fato sociedade e Estado num compromisso comum, o compromisso de seguir essa vocação cooperativa entre as duas políticas públicas, uma vocação cooperativa entre a reforma psiquiátrica e a política pública da economia solidária. Trata-se igualmente de uma associação, como foi visto ante-riormente, entre os movimentos sociais que sustentam e embasam esses dois tipos de políticas.

Entendo que nascemos de uma mesma matriz, utópica, independentemente de leituras, interpretações, conceitos, etc., independente de fi liações até; há quem pre-fi ra um tipo de leitura, quem prefi ra outro; independente inclusive de etiquetas de grupos, etiquetas no sentido de que pertence ao movimento tal, ou ao grupo tal, ou a uma articulação que diz isso ou aquilo, diferenças que existem tanto no nosso campo, como também no campo da economia solidária, porque existem em todo movimento social.

Ontem, ao responder à pergunta de uma colega, o Paul Singer citou uma dessas polêmicas, muito interessante, como ele disse, do campo da economia solidária. Fa-lou-se na questão do consumo consciente, em que a pessoa vai comprar determinados produtos porque são, por exemplo, produtos da reforma psiquiátrica, da luta utópica

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por uma sociedade sem manicômios. Utópica é uma palavra positiva. Ela é negativa para quem é do mercado; para quem é de uma outra economia. Essa palavra “utópica”, para nós, é carregada de positividade, agrega valor, e não o contrário. A questão foi citada como exemplo de uma corrente nos debates da economia solidária. Do mesmo modo que existe corrente entre nós, existem correntes também no campo da econo-mia solidária, e é bom que existam, porque em todo movimento humano, em todo movimento social, vão ocorrer diferenças de opinião e divergências. O fundamental é que ambos os movimentos nascem de uma matriz comum, matriz que podemos situar, na verdade, como disse a Oscarina, nessa vontade de mudar a sociedade de modo que ela possa ser uma sociedade mais generosa, mais inclusiva, mais solidária. Essa é a matriz que nos interessa. De fato, a reforma psiquiátrica não é uma tecnolo-gia de montar serviços de saúde mental, mas um movimento social de transformação profunda e concreta das concepções sobre a loucura e sobre a diferença.

Tendo em vista a limitação do tempo, vou falar agora rapidamente, em dois ou três tópicos, sobre como anda a reforma, para pensarmos como ir adiante a partir de agora, como deverá ser a etapa seguinte.

Em relação à questão da mudança do modelo, da redução dos leitos hospitala-res, no atual governo, já tivemos uma redução de mais de quatro mil leitos. Estamos prevendo, na planifi cação de 2005, a redução de três mil leitos. É um número bas-tante expressivo e signifi cativo, um número possível também, porque sabemos que a redução de leitos tem que ser acompanhada da criação de alternativas para a vida dessas pessoas. Além do que, à medida que os leitos vão sendo reduzidos, estamos tendo hoje nos hospitais psiquiátricos um número, proporcionalmente, cada vez maior daqueles pacientes com maior tempo de permanência, os pacientes de longa permanência, para os quais o esforço da reintegração social, nosso, deles e de seus familiares, se for o caso, é maior do que com os demais pacientes, que sofreram por tempo menor o impacto da vida asilar. Então, quanto mais tempo passa, mais difícil, na verdade, o trabalho de reintegração social.

Quanto à questão da ampliação da rede, tenho dito e penso que é uma coisa que devemos ter em mente: o problema principal da democratização da assistência em saúde mental no Brasil é o da democratização do acesso. O Paul Singer falou ontem na televisão, não sei se os senhores viram, na TV Nacional, justamente mencionando os dados do próprio Ministério da Saúde, de que existe um número muito grande de brasileiros que precisam de atendimento regular e freqüente, em saúde mental. São cinco milhões, os números são nossos. Precisamos, assim, garantir que eles sejam atendidos. Portanto, a questão principal não é a redução do equipamento manico-mial e a mudança do modelo, mas fazer essa mudança para garantir a assistência, para garantir o atendimento das pessoas que necessitam. Do contrário, caímos no reducionismo, na simples redução dos leitos. Na verdade, temos que construir. É uma coisa que retorna, como um bumerangue, para nós próprios.

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Dissemos que o problema principal é a acessibilidade. Agora, vem a sociedade, muito corretamente, e algumas instituições científi cas, talvez com outros interesses, para dizer que não estamos garantindo o acesso. Vêm, inclusive, instituições interna-cionais, que começam a dizer que o Brasil tem que garantir o acesso. Ora, enquanto havia a predominância absoluta do modelo manicomial, ninguém falava de acesso. Ou existia o abandono dentro do manicômio, ou o abandono fora do manicômio. A partir do momento em que começamos a criar rede, começa a fi car visível que essa rede tem que aumentar, tem que ser uma rede maior. Este, portanto, é o nosso desafi o, ampliar essa rede.

Temos, ainda, 18 cidades com mais de 200 mil habitantes no Brasil que não têm Caps. Temos 70 cidades com mais de 100 mil habitantes que não têm Caps. Temos que, muito rapidamente, fazer com que essas cidades maiores tenham o seu equipa-mento. Estou falando no Caps, porque é o equipamento estratégico da ampliação do acesso em saúde mental. Isso vale também para o aumento das residências terapêu-ticas, para o programa De Volta para Casa, que é um programa que está aquém da sua capacidade de ofertar um recurso de inclusão social, para outros dispositivos.

Queria falar também sobre a questão de álcool e outras drogas. Este governo tem tentado trabalhar a questão de álcool e outras drogas, com essas duas referências fundamentais, dos direitos do cidadão, inclusive o cidadão que consome droga, e da democratização do acesso. Do mesmo modo que o eixo do nosso trabalho na reforma psiquiátrica é o direito do usuário, o direito do paciente, da mesma forma o direito do usuário de drogas. Em função dessa discussão de colocar no centro a questão do direito, obviamente, é preciso mudar a concepção e mudar também as formas de organização dos serviços. Estamos trabalhando com a discussão, no Bra-sil, da proposta de redução de danos. É possível que consigamos fazer agora a regu-lamentação da redução de danos, que começou em Santos, com David Capistrano, mas ainda é feita no Brasil num certo marco de marginalidade, ainda colocando sob ameaça os redutores de danos.

Não sei se os senhores estão acompanhando, mas hoje saiu um editorial muito negativo no Jornal O Estado de São Paulo, que não é um jornal muito a favor das grandes transformações sociais, é verdade. Foi um editorial muito duro contra a idéia da redução de danos e contra essa “aventura”, como está no editorial, em que o governo vai “se meter”. Para meu gosto, o governo vai entrar nessa aventura de tomar a redução de danos como uma linha da política para drogas, portanto uma linha da política do nosso campo da saúde mental. Não existe outro campo para as drogas na saúde pública, senão o campo da saúde mental. Do mesmo modo quan-do colocamos a linha do fi m dos manicômios como a linha justa para uma política democrática de atenção em saúde mental, a redução de danos, porque baseada nos direitos e na democracia, parece ser de fato a linha justa para essa questão da polí-tica de álcool e drogas.

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Essa foi uma preocupação que o Paul Singer teve desde o início das primeiras con-versas. Ele sempre perguntava se, quando falávamos em ofi cina de geração de renda e inclusão social das pessoas com transtornos mentais, também estávamos falando dos usuários de drogas, se também estávamos falando dessas pessoas, que também são pessoas excluídas, aí com outro componente de exclusão, que é a criminali-zação do consumo. Respondemos para ele que sim, que igualmente essas pessoas podem se benefi ciar das iniciativas de inclusão social por meio do trabalho. Aliás, ele falou ontem também que deveríamos pensar, o que é muito interessante, o de-bate italiano mostra isso, que não devem ser as cooperativas apenas de um grupo de pessoas, para um tipo de segmento. Quanto mais heterogêneo, misturado, como é a sociedade como um todo e a experiência humana, que é toda misturada, melhor. Nesse sentido, creio que devemos pensar que essa rede tem que se ampliar cada vez mais para outros grupos de excluídos. Não pode ser uma rede de experiências apenas com pessoas com transtornos mentais.

Finalmente, estamos discutindo a proposta de um fundo capaz de criar uma pos-sibilidade de apoio mais regular a essas iniciativas. Talvez a constituição desse fundo não seja a primeira etapa, como estávamos conversando ontem, mas sim buscar li-nhas de fi nanciamento por meio da cooperação entre os dois Ministérios. Este pode ser um caminho a ser tirado aqui, buscando, de fato, linhas concretas de fi nancia-mento para dar sustentabilidade, longevidade e vigor a essas experiências que estão sendo trazidas a esta ofi cina. É preciso também melhorar a nossa cartografi a, quer dizer, aperfeiçoar o mapeamento dessas experiências. Aqui é apenas um começo e devemos criar, talvez, uma descrição mais densa e mais competente dessas inú-meras experiências que existem pelo Brasil de geração de renda e de inclusão pelo trabalho para os pacientes.

Penso, também, que não devemos fi car muito preocupados em superar alguns conceitos com os quais vínhamos trabalhando. Por exemplo, o conceito de traba-lho protegido. Estou de acordo com a observação que a Fernanda começou a fazer, mas entendo também que a nossa questão principal é avançar com essas experiên-cias. Não vamos fazer cavalo de batalha com questões conceituais, na medida que a própria expressão “trabalho protegido” é uma expressão que construiu uma certa história, e que essas experiências de inclusão no trabalho são vistas como experi-ências de fato, onde o paciente tem um certo acompanhamento, um certo grau de proteção que é dada pela instituição onde ele se trata e pelo Estado, ou pela orga-nização não-governamental, ou associação à qual ele pertença.

Como linha geral, era isso. Para completar, queria apenas dizer que o processo de reforma psiquiátrica, embora esteja indo de uma forma aparentemente correta, é um processo frágil, um processo que tem que se sustentar em cada lugar e a cada mo-mento. Foi mostrado aqui que, na verdade, ele é muito sensível a diversas variações do ponto de vista da política, da gestão, etc. Então, essa rede, de economia solidária

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e saúde mental, também é uma forma de adensar a legitimidade social do processo de reforma psiquiátrica, porque ele não pode se fazer só com os meios convencionais da gestão do Estado, no âmbito do SUS. Ele tem que ir muito além disso, porque é muito maior, na verdade, é mais do que uma política de saúde, ele é uma política mais ampla, que se dá, de fato, no campo das transformações sociais. Obrigado.

3.3.4 Políticas Públicas e Economia Solidária: possibilidades de interface com a Saúde Mental

Valmor Schiochet

A fala do Pedro contextualiza e não precisamos repetir coisas que, desde ontem, estão fi cando mais evidentes, no sentido de que fazemos parte do mesmo processo, temos os mesmos desafi os e, de alguma maneira, sintetizo que nós somos sujeito e resultado da luta recente pela democratização, expansão e extensão de conquistas e direitos. Com a crise da década de 90, mudança do padrão de desenvolvimento dessa cidadania, creio que estende esse desafi o para campos que, na década de 80, não estavam muito claros do ponto de vista das perspectivas emancipatórias.

Eu queria dizer que a economia solidária é produto desses dois movimentos, o movimento de expansão da democracia e da luta pela cidadania no Brasil, de or-ganização da sociedade, em que conceitos de direito, autonomia, visibilidade de sujeitos, estão presentes; mas é também produto da crise na qual a nossa sociedade se enfi ou na década de 90, o que gerou processos de exclusão no mundo do traba-lho, que vai não só atingir setores, atores e pessoas que já tinham difi culdade, mas o núcleo duro da organização do mundo do trabalho, que eram os trabalhadores assalariados já existentes, o fenômeno do desemprego. Isso muda o padrão de dis-cussão a respeito do mundo do trabalho no Brasil.

Eu queria aproveitar a minha fala, a partir do diálogo de ontem e de hoje de ma-nhã, e dizer que tem alguns temas nos quais nós, da Secretaria Nacional, estamos metidos e precisaríamos fazer um balanço do quanto esses temas e esse envolvi-mento podem ser uma ponte, uma contribuição para toda essa política que está no contexto da reforma psiquiátrica. Quero pedir desculpas desde já porque eu devo estar usando conceitos que não são os conceitos mais adequados da construção da luta específi ca dos senhores.

Uma das questões importantes a ser colocada é que a política pública de econo-mia solidária é uma experiência praticamente inexistente. Tivemos uma experiência de dois anos na França, no governo socialista, com a criação de uma Secretaria de Economia Solidária, mas terminou o governo socialista Jospin e terminou a Secre-taria também. É mais a economia solidária expressando o movimento da sociedade do que propriamente experiência de política pública. Portanto, temos difi culdades, do ponto de vista de construção do que seria uma política pública para a econo-

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mia solidária. Estamos num processo de experimentação bastante recente no Brasil. As experiências começaram a ter visibilidade nos espaços municipais, em algumas administrações, principalmente no campo democrático popular, que desafi adas a desenvolver políticas no contexto da crise do desemprego e da precarização, vão identifi car na economia solidária uma potencialidade de construir programas e ações municipais nessa perspectiva.

Uma experiência mais importante foi a do Governo do Rio Grande do Sul, nos quatro anos do Olívio Dutra, que foram, de fato, por meio de um programa de apoio à auto-gestão, gerados 25 mil postos de trabalho, com apoio à recuperação de empresas, a organizações cooperativas e associativas de trabalhadores, nos vários espaços e setores de produção.

Uma outra experiência importante é a experiência que está sendo construída em São Paulo, que vincula a economia solidária ao programa de transferência de renda e, portanto, há uma articulação nessa perspectiva. Temos outras experiências, hoje já temos uma rede de gestores públicos da economia solidária, em que esse processo de experimentação de políticas municipais e estaduais se soma a essa experimen-tação de uma política nacional por intermédio da Secretaria Nacional de Economia Solidária.

Temos percebido que, no governo federal hoje, a economia solidária não se res-tringe à política pública de apoio e de fortalecimento à economia solidária de uma Secretaria, da Secretaria que Lula criou para atender a uma demanda do movimento que vai, de forma muito recente, se articulando e gerando um processo de visibi-lidade em busca de sua identidade e também construção de um projeto de desen-volvimento nacional, no qual a autonomia e a auto-gestão dos trabalhadores e das pessoas são fundamentais.

A economia solidária está presente no conjunto de outras políticas setoriais e so-ciais do governo. Têm ações de apoio à economia solidária no MDS, no Ministério do Desenvolvimento Agrário, no Ministério de Minas e Energia, no Ministério do Meio-Ambiente, então, a economia solidária aparece para as políticas públicas com um elemento estruturante de um conjunto de políticas muito diversas.

Qual é o desafi o da Secretaria, que ela se coloca nesse âmbito? É ser um espa-ço também articulador dessas iniciativas governamentais, que não foram iniciativas originadas na própria Secretaria, na Senaes, nem todas iniciativas do movimento da economia solidária. O que estamos percebendo é que a dinâmica da economia solidária, ou da resistência da sociedade de busca de alternativas e de aprofunda-mento do processo democrático no Brasil, na organização econômica com bases democráticas, é mais ampla do que uma vontade de governo, é mais ampla do que um movimento específi co.

Na minha opinião, compreender isso é importante. A economia solidária está nas comunidades indígenas, está nos assentamentos de reforma agrária, está na recupera-ção de grandes empresas, por meio da organização auto-gestionária dos trabalhado-res. O que estamos descobrindo é que está presente também nessa luta específi ca do

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ponto de vista da luta antimanicomial, mas que faz parte de um contexto mais geral. O que percebemos hoje de manhã foi isso, ou seja, a economia solidária enquanto forma de organização dos usuários, das pessoas, é uma forma de organização pos-sível. Para muitos de nós, não só uma forma de organização possível, mas desejável, e, para outros, uma forma de organização necessária. Então, estamos entre esses três elementos de possibilidades de construção dessa relação entre a economia solidária e a política na qual mais diretamente os senhores estão envolvidos.

A questão é que nós estamos no contexto de forte precarização dessas iniciativas, mas esse contexto de precarização vale para toda a economia solidária que, em sua base econômica, é uma economia precária, porque é uma economia de resistência, é uma economia de luta dos setores de trabalhadores excluídos dos setores popu-lares. Assim, não poderia ser diferente. A questão é como fortalecê-la. Na minha opinião, o Estado está desafi ado a encontrar instrumentos de fortalecimento dessas iniciativas.

Alguns elementos que temos atuado, que penso que podem dialogar com a expe-riência dos senhores. Um diz respeito ao processo de formação e incubagem desses empreendimentos. Uma coisa que nós temos aprendido na economia solidária é que não é possível fazer a separação do técnico profi ssional do trabalhador, embora isso gere uma contradição importante nos empreendimentos. Há uma busca de identidade do trabalhador do empreendimento como sujeito do processo. Agora, também há uma luta no sentido de reconhecer que profi ssionais são trabalhadores, que também estão lutando e conquistando seu espaço por meio da economia solidária, com o exem-plo da Cooperativa de Psicólogos. É uma forma de organização de uma atividade de trabalho e de uma atividade econômica. Então, não é possível separar muito o que é usuário, o que é trabalhador, quem está lá participando, e assim por diante.

Em todos os casos, a experiência no Brasil tem desenvolvido uma metodologia importante de apoio a esses empreendimentos, cujos relatos apareceram aqui hoje de manhã, que envolveram um ator importante na sociedade brasileira nesse processo, que são as universidades, com as incubadoras tecnológicas de cooperativas populares. Temos o exemplo de Juiz de Fora, do Rio de Janeiro e de São Paulo, além de outros exemplos. É uma experiência com a qual precisamos aprender e precisamos, como poder público, apoiar e fortalecer essas experiências, porque elas permitem dialogar com demandas e expectativas que são geradas na política da saúde mental.

Temos apostado um pouco nisso também. O Programa Nacional de Economia Solidária tem recolocado uma parceria do Ministério do Trabalho, Finep, Fundação Banco do Brasil, que é o Pró-Link, um programa de apoio às incubadoras tecnológi-cas universitárias. O que nós precisamos combinar é que o plano de trabalho dessas incubadoras benefi ciadas com esses fundos inclua as ações de apoio à política pú-blica, ou aos usuários da política de saúde mental. Entendo que é um caminho que poderíamos fortalecer.

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Por outro lado, temos uma outra invenção que apareceu aqui hoje de manhã, que são as incubadoras no âmbito da própria política municipal. Temos a experiência de Belo Horizonte e a de Porto Alegre como experiências específi cas da política de saú-de. São duas experiências que devemos promover e aprender com elas, no sentido inclusive de articular melhor, porque também percebemos que as realidades políti-cas e sociais são diferentes. Então, precisamos trabalhar com essa diversidade. Uma ação que entendo importante é sobre como poderíamos apoiar essas iniciativas de incubagem, seja de prefeituras, seja das universidades e sua ação mais específi ca no programa de saúde mental.

O que nós também aprendemos na fala da companheira de Juiz de Fora é de que é possível formalizar, é possível legalizar, mesmo nas bases legais que temos hoje. Então, a construção de uma rede nos facilita a socializar experiências de como é pos-sível, no quadro da legislação existente, formalizarmos e avançarmos na organização desses empreendimentos dos usuários da política de saúde mental. É claro que preci-samos juntar forças para construir um novo marco jurídico para a auto-organização dos trabalhadores, a auto-organização econômica, e estender para além da bandeira do direito ao trabalho aquilo que, para nós, é uma bandeira específi ca da bandeira solidária, que é o direito ao trabalho associado. Sentimos que esse é um avanço do ponto de vista da luta em torno do mundo do trabalho.

Quanto à questão do marco jurídico, nesse caso, como o professor colocou on-tem, estamos numa bola dividida, tanto porque as forças em torno dos interesses na mudança da lei estão muito diversifi cadas, quanto o núcleo de força em torno da legislação existente é muito forte e tem presença forte no governo federal. Então, não temos uma correlação de forças que, neste momento, nos coloque com facilidade uma mudança no marco jurídico que envolve o cooperativismo. Na minha opinião, a relação dos dois movimentos e a articulação de forças sociais em torno disso podem construir uma correlação de forças em que possamos ter um marco jurídico mais adequado do ponto de vista das nossas expectativas, mas isso vai implicar capaci-dade de mobilização, capacidade de articulação, elaboração de proposições que sejam aglutinadoras do movimento, que possam enfrentar uma força ainda bastante importante da sociedade brasileira de resistência a mudanças.

Fizemos várias reformas nos últimos anos, mas duas reformas não foram feitas, a reforma sindical, que está sendo feita agora, e a reforma do cooperativismo, que nem está na agenda para ser feita. Assim, temos um desafi o importante, mas que não é uma ação mais imediata. Precisamos construir uma relação de força.

Uma outra questão importante diz respeito a crédito, a fundos, a recursos. Pare-ce-me estar claro que a política de saúde não pode bancar a política de organização econômica desses empreendimentos. Então, precisamos constituir uma ação que dê conta disso. Agora, isso também remete a todos os outros empreendimentos da eco-nomia solidária, ou seja, há uma agenda dos outros empreendimentos da economia

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solidária para a construção de linhas de crédito, ou fundos de mais fácil acesso, para trabalhadores pobres organizados economicamente de forma associada.

Como temos avançado nesse sentido? Creio que o governo este ano, depois de ter apostado no ano passado na “bancarização” dos pobres e percebido o limite dessa política, está lançando neste fi nal do mês uma política de apoio ao microcrédito, não enquanto pequeno crédito, mas é uma metodologia de crédito assistido, na qual entendemos que a economia solidária poderá ser mais amplamente benefi ciada, na medida em que é um crédito que vai ser operado pelos Bancos do Povo, cooperativas de crédito, organizações de fundos mais próximos da realidade das comunidades e menos, mesmo que sejam bancos públicos, dos sistemas fi nanceiros.

Por outro lado, junto com o BNDES, estamos construindo um fundo específi co para empreendimentos solidários, por meio do fundo de combate à pobreza, com mediação da Caixa Econômica. O que precisamos ver é se uma política de crédito aos empreendimentos associados, cooperados, pequenos ou médios, é sufi ciente ou se precisamos ter um fundo específi co, e o que justifi ca a especifi cidade desse fundo do ponto de vista do apoio aos empreendimentos de economia solidária que, para nós, são empreendimentos de economia solidária, os que foram relatados aqui hoje de manhã, que precisam de aporte de recursos fi nanceiros para comprar as máqui-nas de costura, que hoje são doadas, o que dá instabilidade e cria problemas, além de outros elementos para dar essa infra-estrutura e esse apoio. Outra questão que precisamos decidir é que tipo de crédito, porque crédito sempre tem um retorno, ou outras formas de apoio econômico efetivo.

Esses são desafi os, mas quero dizer que, como a economia solidária nos desafi a a encontrar formas de fi nanciamento para pobres e miseráveis organizados economi-camente em associações e cooperativas, e assim por diante, temos tentado encontrar alguns caminhos das pedras, mas precisamos ver se esses caminhos que estamos en-contrando são adequados ou não para as especifi cidades da política dos senhores, no sentido mais específi co da saúde mental.

Para fi nalizar, a questão da formação, que é importante. Quando criamos a Se-cretaria, decidimos não criar um plano nacional de formação para a economia so-lidária, mesmo porque o governo, dentro do Ministério do Trabalho, fez toda uma reformulação do Planfor, com a constituição do Plano Nacional de Qualifi cação, com uma nova metodologia, conteúdos, fugindo do conceito de empregabilidade, com novas bases, e assim por diante. Uma questão importante é de que nós precisamos, na economia solidária, disputar os recursos e nos organizarmos para isso dentro do Plano Nacional de Qualifi cação, que é fundamentalmente gerido pelas Comissões Estaduais de Trabalho e Emprego e por Comissões Municipais, onde temos muni-cípios com mais de um milhão de habitantes. Já ouvi relatos aqui de experiências dessa relação entre a política de saúde mental e a Política de Qualifi cação, com re-curso da qualifi cação.

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Entendemos que isso é insufi ciente. Precisamos ter uma rede de formação para que os profi ssionais, para que os técnicos e para quem atua com os usuários da po-lítica possam se benefi ciar também da compreensão da economia solidária. Estamos tentando desenvolver um programa que nós chamamos de formação de agentes de desenvolvimento porque, ao nosso ver, não é possível fortalecer a economia solidá-ria sem inseri-la no processo de desenvolvimento local, territorial. Entendemos que muitos desses agentes públicos, que são servidores públicos, profi ssionais que atuam na organização desses empreendimentos, também são agentes de desenvolvimento. Portanto, poderíamos pensar uma ação de formação específi ca em economia solidá-ria e desenvolvimento para esses agentes e, obviamente, coordenar isso.

Para terminar, pois já passei do meu tempo, e esse foi o direito que tive como coordenador, quero dizer que precisamos aprender mutuamente muitas coisas. Nós precisamos aprender muito com o processo dos senhores, mas, dada a nossa iden-tidade, tanto dentro do governo, da Secretaria de Economia Solidária, como a Co-ordenação da Saúde Mental, quanto do ponto de vista da sociedade civil, não é por acaso que a experiência das incubadoras, do Fórum do Cooperativismo Popular do Rio de Janeiro, no qual a Cooperativa Praia Vermelha está inserida, creio que são elementos que mostram que nós temos coisas a serem construídas e estamos dispos-tos a construí-las de forma conjunta. Obrigado.

Voltando à condição de coordenador, para irmos para o trabalho de grupo, vou propor no máximo cinco questões, para que possamos ir para os grupos às 16 horas e termos ainda um tempo de plenária depois.

Vitória Maria Barbosa

Sou Vitória, de Campina Grande, Paraíba. Repetindo um pouco o que eu falei de ma-nhã, esse encontro causou uma efervescência muito grande em mim, desde a palestra que o professor Singer fez no Congresso Caps, uma efervescência teórica, de dúvidas e de idéias. Quando Oscarina expôs na apresentação dela sobre Mútua-Ação, ela falou sobre os princípios de uma nova ordem econômica. Essa nova ordem econômica, pelos princípios que tinham lá, não difere muito dos princípios da democracia, que é o que esperamos viver. Ontem, o professor Singer falou na economia solidária ressaltando que ela tinha um aspecto mais transcendente ideológico, de sonho, e que não era capitalismo. Isso me preocupou um pouco no sentido de que, se vivemos num sistema capitalista e se ele diz que essas experiências são cada vez mais colocadas no âmbito da marginalidade exatamente porque vão de encontro a esse sistema, como poderemos coexistir sem que haja essa ruptura? Afi nal, penso que o capitalismo está muito longe de ser extinto. Até que ponto podemos levar a termo esse cunho ideológico?

Sua fala, Valmor, foi mais objetiva hoje e me esclareceu algumas coisas que, talvez pela especifi cidade das ofi cinas, fi caram muito próximas a essa questão de economia

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solidária e cooperativa. A sua fala mostrou que é muito maior essa questão da economia solidária. Na saúde mental, isso fi ca ainda mais específi co para nós, porque temos que discutir o que é terapêutico, o que é o sujeito, o que é sentido, como fi ca toda essa questão. Nesse aspecto, quero parabenizá-lo quando o senhor fala nessa questão da rede de formação. Realmente, precisamos entender melhor isso tudo.

Como sugestão, quando o senhor fala no fundo, nos recursos, no faturamento, que todo mundo chega nesse ponto, eu queria saber, inclusive junto ao Pedro, se esse fundo também não poderia vir do faturamento dos Caps, que cai no Fundo Nacio-nal de Saúde e, muitas vezes, não é direcionado para as políticas de saúde mental. Gostaria de saber se haveria algum caminho, se um Caps tivesse um projeto nesse sentido, se poderia ser pactuado que um percentual do faturamento dos Caps fosse destinado para isso.

José de Souza De Paula

De Paula, da Sosintra. Pedro, eu gostaria que o senhor tirasse uma dúvida. Há 30 anos, como eu já falei, no trabalho protegido, a Ivete sempre comentava que seria remunerado, não competitivo. Hoje, nesta discussão atual, eu queria que o senhor nos clareasse, principalmente para a Sosintra, familiares e usuários, se o trabalho protegido é uma coisa concreta hoje, se é possível avançar. Apesar do trabalho as-sistido dentro do contexto da economia solidária, do novo empresário, do serviço público, se podemos retomar o trabalho protegido.

Neli Maria Castro de Almeida

Tem uma questão que eu venho pensando desde ontem à noite, mais uma vez reforçando que o Seminário está trazendo muitas questões interessantes e urgentes, sendo muito rico de fato. Trabalhamos com um conceito de saúde mental muito amplo. Creio que as nossas práticas evidenciam de fato que estamos imersos nesse campo dos direitos dos usuários e temos feito essa prática valer, mesmo com grandes difi culdades. Realmente, temos nos empenhado muito em trabalhar com a clínica ampliada. O próprio nome dos Centros de Atenção Psicossocial (Caps), já aponta para esse campo, que é um campo com muitos impasses também.

A minha questão é: embora trabalhemos com esse conceito ampliado de clínica, os nossos recursos não são ampliados; eles são muito específi cos, eles são, stricto senso, recursos da assistência. É recente a experiência das residências e moradias, o que conseguiu ampliar um pouco a direção desses recursos. Esses recursos para residências terapêuticas já vêm nesse sentido de trabalhar o eixo da moradia. Para esses eixos do trabalho e do lazer, de fato, fi camos sem esses recursos, essas rubri-cas, o que cria realmente um impasse. Eu queria enfatizar que, embora essas ofi ci-nas de geração de renda sejam experiências muito incipientes, elas são, ao mesmo

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tempo, muito potentes. É um paradoxo, porque são frágeis, de fato, vão no sopro, mas trazem em si um germe de potência que é uma coisa incrível, até por conta de suas próprias difi culdades, elas se dão à base de um esforço imenso.

Eu queria falar, por exemplo, da experiência que nós tivemos no Encontro de Caps, em que trabalhamos aquela grande ofi cina de artes plásticas, que também produziu uma exposição de artes plásticas, gerando uma seleção em âmbito nacional. Foi muito impressionante como as ofi cinas responderam de uma forma muito rápida para entregar os desenhos e os quadros. Eu fi quei muito impressionada com aquilo, porque fala de uma certa organização muito interessante desse campo. Então, eu queria problematizar isso. Embora as ofi cinas sejam incipientes, elas são muito potentes. Como podemos, então, avançar na ampliação dessas rubricas para fi nanciar essas experiências?

Marcos Flávio Queiroz BresciaPsicólogo da Prefeitura Municipal de Belo Horizonte/MG

Meu nome é Marcos, sou psicólogo de Belo Horizonte. Puxando a frase da colega de potencialidade, eu queria discutir um pouco, principalmente com a Fernanda, a questão da potencialidade clínica no caso do trabalho. Hoje de manhã, foi falado um pouco sobre isso, mas foram apenas pinceladas sobre o tema, e eu queria reto-mar um pouco sobre como fi caria essa interface da clínica e do trabalho. Primeiro, no momento anterior à inserção no trabalho, a importância da clínica é que, a meu ver, é na clínica que é feito o resgate da história de vida de cada indivíduo, de cada usuário, e mais importante que o resgate de vida é o resgate da história laboral de cada um. Só aí, a partir desse resgate, o trabalho vai assumir um signifi cado singular para cada um. Além disso, quem tem experiência de consultório, temos essa proposta positiva da inserção laboral, mas, muitas vezes, os pacientes, os usuários, nos trazem experiências extremamente negativas de inserção no trabalho, como o trabalho con-tribuiu para o adoecimento mental, ou difi culta uma melhora em termos clínicos.

No momento posterior a essa inserção nos locais de trabalho, com esses progra-mas de geração de trabalho e renda, como essa inserção tem um impacto na con-dução da clínica, no sentido de uma potencialidade clínica. É claro que devemos tomar o cuidado de não repetir experiências de simplesmente ocupar os pacientes, de simplesmente dar algo para eles fazerem, mas, ao mesmo tempo, de acordo com uma fala que foi feita hoje mais cedo, o objetivo último do trabalho é sempre ceder a esse indivíduo a possibilidade de comprar sua roupa, comprar sua alimentação, circular pela cidade. Eu pergunto até que ponto isso também não é terapêutico, até que ponto isso não tem um impacto profundo na clínica – comprar sua roupa, ter seu alimento, ter sua moradia, ter sua independência fi nanceira. Quando falamos da questão da contratualidade, desse aumento do poder contratual, pensamos um pouco nesse impacto clínico. Creio que fugir da discussão clínica dessa questão empobrece, muito, a discussão de inserção no programa de geração de renda e trabalho.

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Aparecida Moreno P. da SilvaAssociação Maringuense de Saúde Mental – Maringá/PR

Boa-tarde. Sou de Maringá, Paraná. Coordeno dois serviços, um deles é um Caps, e vim pela associação da qual também sou membro, Associação Maringuense de Saúde Mental. Pensei muito antes de falar porque primeiro, especifi camente, não é a discussão desta ofi cina, mas, em segundo lugar, penso que tem tudo a ver. Tivemos uma luta muito grande nos últimos três anos, ampliamos e montamos quatro servi-ços. A Associação é composta de usuários e familiares, já existe há três anos, e nos ajudou muito na reestruturação do serviço de saúde mental de Maringá. No entanto, passamos por algumas difi culdades. O município incentivou todas as implantações. Temos um Caps Ad, esse Caps II e mais dois outros serviços, um de emergência e um Centro de Convivência, além de um ambulatório e um grande hospital que te-mos reduzido leitos, com uma difi culdade muito grande, pois está tendo bastante briga em Maringá.

A minha pergunta é a seguinte: nós, trabalhadores em Caps, temos as ofi cinas. Recebemos o recurso do governo federal, mas Maringá está em gestão plena. Esse dinheiro “some”, ele não é específi co. Assim, é preciso manter essas ofi cinas dentro do Caps. Pedimos material, aí, vem licitação durante seis meses, tomada de preço, etc. Não sei se isso é comum em todos os municípios, mas se quisermos levar para alguma ofi cina com produção boa e com qualidade, temos que sair rifando, ven-dendo, temos que “plantar bananeira” para conseguirmos algo, porque o dinheiro “some”.

No caso da aids, percebemos que o dinheiro é casado, mas no nosso caso não é um dinheiro casado. Então, isso é uma difi culdade dentro do serviço público. Agora, enquanto Associação, nós também temos ofi cina dentro da Associação Maringuense de Saúde Mental que não está em relação com o nosso Caps, é separada, é levada por usuário, é o usuário que coordena e que vende.

A outra difi culdade: estamos discutindo aqui sobre uma possível, ou talvez futu-ra, verba e incentivo. Eu me pergunto o seguinte: se esse incentivo também cair no fundo municipal de saúde, ninguém vai ver nada também, do mesmo jeito que hoje não vemos o de Caps. Para levarmos um serviço de Caps, não está fácil. Então, não existe uma forma do governo federal cobrar dos municípios que esse dinheiro seja investido naquilo para que ele foi destinado? Essa é a minha pergunta.

Pedro Gabriel Delgado

Vou responder o que entendo ter sido dirigido a mim. A Vitória fez mais do que uma colocação, mas a que diz respeito diretamente a mim é semelhante ao comen-tário da colega de Maringá. A Vitória fala: “Não seria possível também, com esses recursos que são repassados para o Caps, parte disso constituir um fundo para a

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questão de apoio a essas ofi cinas?” No que depender de mim, isso se viabilizaria. Essa questão da gestão dos recursos é um problema que temos no campo da gestão da saúde de uma maneira geral. Foi bom os senhores terem referido o tema aqui de novo, porque, mais uma vez, vamos retomar essa questão no Ministério da Saúde e, mais uma vez, vamos tentar debater esse tema na Comissão Intergestora Tripartite para tentar criar um mecanismo que, de fato, amarre o uso dos recursos para a ges-tão dos Caps. Isso não depende apenas de uma decisão do gestor federal. O SUS é tripartite, e nós quisemos e lutamos para que ele fosse assim. Então, a decisão precisa ser apoiada na Tripartite e conselhos de saúde. Sugiro que todos os senhores que são dos municípios procurem o Cosems estadual, para que o Conasems possa ter uma posição clara a favor dessa posição que já apresentamos na Tripartite.

Queria apenas dizer que admito que o problema existe e é uma questão que es-tamos enfrentando há algum tempo. O repasse fi nanceiro não necessariamente fi ca, pelo menos num primeiro momento, no campo da saúde mental. Depois ele retor-na, por meio dos mecanismos de gestão. Essa é uma discussão complexa, porque o argumento da Tripartite é que não se pode fazer isso para todas as áreas da Saúde, que isso tiraria a autonomia da gestão municipal. Na minha opinião, a autonomia é sempre relativa. Também, como a reforma psiquiátrica é uma questão de mudança de modelo e há uma transição, precisamos ter mecanismos que assegurem um real investimento nas iniciativas de transição. Isso vale para o recurso dos Caps, mas, principalmente, para aqueles recursos que estão saindo dos hospitais psiquiátricos, com a redução contínua e regular dos leitos, de modo a que possam permanecer no campo da saúde mental.

A Neli também falou da questão de recursos fi nanceiros. Vamos sair daqui com uma idéia de que é preciso, de fato, gerar apoio fi nanceiro para essas iniciativas. Aí, essa questão deve ser tomada como problema e vamos buscar soluções para ela. A meu ver, não devemos, apesar do que foi apontado, nos contentar em que esse fi nanciamento saia da área da Saúde, como foi dito aqui. É preciso realmente criar recursos que sejam de fora do campo da saúde, mas os da saúde também podem ser aplicados nesse sentido.

De Paula, sobre a questão do trabalho protegido, apenas para dizer o que penso sobre isso. Entendo que esse conceito de trabalho protegido tem uma boa história no campo da saúde mental. O trabalho no campo da experiência manicomial, dos asilos, para quem discute essa questão, desde o Pinel, como mencionei, no trata-mento moral, onde estava presente o trabalho, até o Simon. Durante muito tempo, o trabalho foi pensado como alguma coisa que fosse interno às práticas terapêuticas no marco asilar. A questão que o outro colega está trazendo, embora não tenha sido dirigida a mim, é sobre que potencialidades clínicas ele tem fora do marco asilar, fora do marco da tutela, fora do marco da adaptação e desse trabalho dentro do asilo. Penso que o trabalho protegido ainda é um conceito interessante e signifi ca que, na

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verdade, essas associações, e a Sosintra é exemplar nesse sentido, servem de apoio para que essas pessoas recuperem uma vida laboral, ou retornem a uma possibilidade de inserção pelo trabalho, de uma maneira que seja apoiada pela instituição.

Fora do Brasil, mesmo em países que sequer discutem a economia solidária, como os Estados Unidos, por exemplo, a questão de trabalho protegido para pessoas com transtornos mentais, a partir de associações da sociedade, tipo ONGs, é uma experiência bastante freqüente, no sentido de que as organizações acompanham a inserção laboral, parecido um pouco com a experiência do NUSAMT, um pouco como o que foi apresentado aqui de manhã. São organizações sociais, em geral de voluntários, que acompanham também todas as vicissitudes da relação com o em-pregador, do processo de trabalho e tudo mais. Eu não jogaria fora esse conceito, de trabalho protegido, porque, na verdade, estamos num momento de inaugurar um novo período, precisamos debater mais. Só jogaria fora, de fato, certas ilusões de que o trabalho em si é terapêutico. Creio que o trabalho em si não é muita coisa. O trabalho é sempre um trabalho concreto, em condições objetivas, assalariado ou não, tutelado ou não, etc. Não existe o trabalho em si, porém, ele pode ser um re-curso importante, mas pelo processo e pelo que se faz com o produto dele. Penso que não podemos nos dar ao luxo de perder algumas experiências históricas que são relevantes na nossa área.

Fernanda Nicácio

Apenas mais uma questão na discussão apresentada por Neli, que é muito impor-tante. Creio que devemos pensar realmente nessas formas de recursos. Hoje, isso já é uma necessidade. Como a pessoa viaja, como vai ao cinema, como passeia, etc.? Isso já está colocado como necessidade no cotidiano do conjunto das novas práticas.

Outra questão: nesses processos, pelo menos nas experiências que pude participar, tem uma necessidade de percursos que poderíamos chamar de percursos formativos. Muitas vezes, não apenas de qualifi cação profi ssional, porque estamos trabalhando com um grupo de pessoas que foram muito desapropriadas de acesso cultural. Por exemplo, na experiência da Cooperativa Paratodos em Santos, foi muito importante a discussão do projeto de alfabetização. São muitas as necessidades para esses per-cursos formativos e, por exemplo, trago uma indagação: poderíamos pensar também em bolsas trabalho? Como seria a implementação dessa proposição que considero uma estratégia interessante, e que poderia ser importante, inclusive nesse sentido de ampliação de recursos?

Em relação à discussão que o senhor estava colocando, é uma discussão muito interessante e bastante complexa. Não sei se teremos tempo para aprofundar, mas eu queria colocar duas questões. A primeira, para esclarecer: quando refi ro a necessi-dade de superar a concepção de trabalho terapêutico, estou me referindo a essa dis-cussão que o Pedro estava apontando, no sentido de que, a concepção de “trabalho

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terapêutico” é do tratamento moral. Essa concepção tinha um sentido muito claro naquele momento, na organização da sociedade, no signifi cado que o trabalho es-tava assumindo. Considero que é importante pensar e discutir essa questão porque é muito forte no nosso campo a “disciplina para o trabalho”.

Em relação ao trabalho protegido, como coloquei anteriormente, considero que exis-tem diferentes formas de trabalho protegido. Sem nenhuma intenção de abrir a polê-mica em torno às palavras, enfatizo a necessidade de refl exão sobre essas duas formas – “trabalho terapêutico” e “trabalho protegido” – porque, a meu ver, podem ser obstá-culos nas nossas práticas. Quando assinalo a questão do trabalho protegido, refi ro-me à “lógica do assistido”, na qual o usuário não participa de, não se apropria de. Não tenho dúvida de que várias pessoas que estão presentes nesta Ofi cina utilizam a denomina-ção de “trabalho protegido” de uma outra forma e, também por esse motivo, considero necessário aprofundar essa discussão. A “lógica do assistido” é muito forte, não apenas para nós na nossa organização social, é muito forte para os próprios usuários, é muito forte no contexto das relações sociais.

Para exemplifi car, na refl exão sobre a experiência santista considero que foi funda-mental o processo de superação dessa lógica, que denomino de armadilhas do trabalho protegido. Novamente assinalo que não estou me referindo às experiências que se deno-minem dessa forma e que estão trabalhando em outra direção, mas assinalando o quanto é difícil realmente pensar e participar do mercado, não do mercado apenas enquanto produtos, mas dos usuários participarem das trocas sociais. Isso não é fácil de conquistar e não é fácil, inclusive, considerando o poder contratual e o poder cultural.

Em relação a uma outra colocação que é muito interessante, tenho buscado pensar o terapêutico como produção de autonomia. Dentre as diferentes dimensões que essa perspectiva coloca, implica, por exemplo, não compreender o tratamento e a reabi-litação como dois momentos e duas instâncias separadas ou, ainda, a reabilitação como um momento posterior ao tratamento. Assinalo essa questão porque considero que essa forma de pensar é um obstáculo. A partir da compreensão de terapêutico como produção de autonomia, podemos pensar novas estratégias, transformação de conceitos e é necessário marcar que essa visão é muito diferente da concepção de trabalho terapêutico.

Oscarina Camillo

Eu queria falar sobre a questão ideológica no que se refere ao trabalho associado. Vou aproveitar um neologismo, que é no “fazejamento”, o fazer planejando, do tra-balho associado, que percebemos a mudança mesmo desse paradigma. Vivemos num mundo capitalista, em que o modelo é a expropriação do saber. Isso está posto.

Dentro de um projeto de vida em que a escolha é a participação, a gestão co-letiva, a tomada de decisão a partir de consensos é uma construção que depende de muita energia, e eu penso que vale a pena. Quando colocamos que o trabalho

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associado vai para essa perspectiva de uma nova ordem econômica, é no sentido de pensar a organização do trabalho a partir de uma visão de humano, uma visão holística, em que o poder do capital está posto no nosso mundo, mas dentro do que concebemos como trabalho associado, ao menos dentro da Mútua-Ação, onde te-mos essa perspectiva, esse saber é nosso e nós produzimos outros saberes a partir da nossa prática. Isso está posto nas várias experiências das cooperativas. Essa propos-ta de que os meios de produção, a forma de organização do trabalho, a separação entre o que é “eu” e o “outro”, não necessariamente é possível no mercado formal de trabalho, onde fazemos aquilo que está posto pela organização, o que está ex-presso pelas regras, o que está posto pelo sistema. Dentro de uma cooperativa, nós criamos as nossas regras e fazemos acontecer de acordo com aquilo que experien-ciamos e vivenciamos como mais saudável. Então, a mudança ideológica é tênue, mas acredito que seja possível.

Valmor Schiochet

Vou fazer apenas dois comentários. Não faço parte da tradição da discussão dos temas que os senhores colocaram, tipo trabalho protegido. Como eu venho das Ci-ências Sociais, quando os senhores estavam falando, me veio à mente que o capital é protegido, a propriedade é protegida. Só existe capitalismo porque existe proteção do capital e proteção da propriedade. Então, nós precisamos, enquanto sociedade, ter mecanismos fundamentais de proteção dos trabalhadores, das trabalhadoras, dos pobres, independente da condição deles. Essa é a condição de emancipação, uma sociedade que protege os seres humanos prioritariamente, em vez de proteger os capitais, proteger a propriedade, proteger as coisas. Às vezes fi camos com receio de fazer uma discussão muito específi ca e não percebemos que o capitalismo não é competitivo; ele é protegido. Existe um arcabouço institucional de proteção das bases do capitalismo, da exploração capitalista, e gera exclusão. Às vezes, fi camos com medo de fazer certas discussões que dizem respeito aos trabalhadores, aos po-bres, às pessoas marginalizadas e excluídas. Sei que não é a discussão, por isso que já fi z a pauta inicial.

A segunda questão que eu queria colocar é a seguinte: das experiências apresen-tadas aqui hoje de manhã, entendemos que são experiências de economia solidá-ria. Portanto, são opções dentro de uma política, pensadas especifi camente dentro da política da saúde mental, que encontram na economia solidária uma perspectiva emancipatória para os usuários da política de saúde mental. Esse é um elemento fundamental da economia solidária, enfatizado pelo professor ontem. A economia solidária é uma opção, a livre adesão é um princípio da economia solidária. Portan-to, essa ponte entre saúde mental e economia solidária pressupõe uma compreen-são clara desse elemento da opção também, seja por motivos terapêuticos, seja por motivos ideológicos.

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Não sei quais são os elementos constitutivos da opção dos usuários e dos pro-fi ssionais por essa forma de organização. Se a opção for a economia solidária, do ponto de vista de constituição de uma ação efetiva de organização dos usuários, temos um conjunto de desafi os que vamos precisar construir na sociedade e dentro do Estado. A meu ver, podemos seguir um pouco nessa perspectiva de como vamos avançando na construção e na consolidação dessa opção, considerando que têm muitas outras opções. Se for ideológica, econômica, terapêutica, esse é um debate a ser feito. Agora, sem essa livre adesão, nós comprometemos o princípio que fun-damenta a economia solidária enquanto forma de organização.

São 16 horas e vamos fechar essa parte. Temos um lanche na parte de fora, de-pois vamos para os grupos. A organização dos grupos já está predisposta na recep-ção e também nas salas. Nos grupos, vamos basicamente discutir três questões. A primeira questão é uma avaliação a partir da experiência dos senhores da situação dos usuários quanto à geração de renda, ou seja, consolidar um pouco um balanço dessa relação dos usuários da política de saúde mental e geração de renda. Uma segunda questão faz parte mais desse balanço mais específi co, sobre quais são as formas de organização da geração de renda que são construídas dentro desse pro-cesso e o papel dos Caps nisso. Um terceiro elemento para a conversa nos grupos é a apresentação de propostas, elementos e ações que podem constituir uma políti-ca que articule saúde mental e economia solidária. Então, vamos fazer um pouco o balanço da situação, depois, quais sãos as formas de geração de renda encontradas e o papel dos Caps nisso, e terceiro, elementos que possam constituir uma política que articule saúde mental e economia solidária. Vamos combinar o retorno para o plenário às 17h15.

3.4 Relatórios dos Grupos de Trabalho

Coordenador: Valmor SchiochetSenaes/MTE

Vamos retomar os trabalhos. A nossa proposta agora é vermos o que as relatoras conseguiram sistematizar a partir do trabalho dos grupos e apresentar para a plenária. Depois, vamos ver alguma proposição de complementação ao relato, e abrimos para comentários e aprofundamento de alguns dos temas que apareceram aqui. Como é uma ofi cina, obviamente, estamos apenas fazendo um levantamento de elementos para análise, para subsídios, para tirarmos encaminhamentos mútuos, vamos dizer assim, para que possamos aprofundar o debate que tivemos a oportunidade de fazer aqui ontem à noite e hoje. Portanto, esperamos não ter um ponto de maior polêmica nesse processo. Ainda teremos um fechamento da nossa atividade com o professor Singer e o Pedro.

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A atividade de hoje está toda sendo gravada e, portanto, disso vai sair um relatório mais substantivo dos conteúdos, mas o relato dos grupos vai ser sistematizado num documento mais sucinto. Na próxima semana, a Rita prometeu que já vai ser possível encaminhar para todos os senhores um relato inicial das atividades dessa ofi cina.

Eram três questões, uma principalmente de diagnóstico da situação dos usuários; depois, as experiências que tivemos na área de geração de renda, suas formas, sua institucionalidade e, terceiro, elementos para compor uma política pública que articule melhor a saúde mental e a economia solidária. Ao invés de trabalharmos de forma se-parada, como as coisas vão estar meio imbricadas, pelo menos essa foi a experiência que eu tive no grupo, proponho que pudesse ser um relato único de cada grupo.

Grupo III

Coordenação: Marcela LucenaCoordenadora de Saúde Mental da Secretaria de Saúde de Recife/PE

Relatora: Maria Alves de LimaNúcleo de Projetos Especiais da Organização Social De Volta pra Casa – Santo André/SP

Confesso que quando assumi essa tarefa de fazer o relatório do grupo, pensei que pudesse ser um pouco mais fácil, mas, pelo calor da discussão, a tarefa não foi nada fácil, haja vista a situação dos relatores que os senhores estão vendo aqui.

Anotamos rapidamente as idéias fi nais propostas a partir da discussão do grupo. De antemão, peço desculpas aos parceiros de grupo, mas podem me ajudar no que eu estiver colocando.

Na discussão, apareceu bastante a questão, por exemplo, da formação dos grupos de cooperativas. Uma das propostas do grupo é de que trabalhos nessa linha não se restringissem ao fomento de formação de cooperativas dos usuários da saúde mental, mas que trabalhássemos numa perspectiva da ampliação, que é a questão realmente da integração mais ampla com setores outros e dentro dessa idéia da cooperativa, do espírito realmente da agregação. Então, que isso fosse muito mais amplo.

A questão da normatização, a questão ligada à legislação, que temos falado bas-tante desde ontem, que trabalhássemos na perspectiva de uma busca de normati-zação, inclusive para outras formas de organização de empreendimentos coletivos solidários.

Uma das preocupações também trazidas no grupo foi em relação à questão de que pudéssemos aprofundar idéias no sentido de pensar estratégias para garantir uma renda mínima. Alguns termos já foram usados em algum momento, que pudéssemos tentar algo como bolsa trabalho, auxílio, algum outro título por essa linha, mas apa-receu no grupo uma proposta nesse sentido, que pensássemos algo nessa linha.

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Também, que buscássemos fazer nos municípios um mapeamento de todos os projetos já existentes ligados à questão da geração de renda, para que sirva real-mente de elemento e de instrumento para um trabalho muito mais amplo na linha da integração dos diversos setores, dos diversos órgãos de governo envolvidos com essa questão. Ainda, a busca da realização de um fórum intersetorial ligado à ge-ração de renda, tanto fórum nacional, como fóruns regionais, para criar esse maior fortalecimento da construção de redes.

Foi colocado como algo importante nesse processo e que não percamos nunca de vista a garantia da participação ativa dos usuários e de outros setores da socieda-de na discussão dessas questões ligadas ao trabalho e à geração de renda. Então, a garantia justamente dessa participação ativa.

Na questão do processo de formação, que muito foi falado, que pensássemos tam-bém na inclusão do tema da economia solidária como um tema que faça parte dos processos de formação. Também, a questão da qualifi cação e formação dos usuários para o trabalho foi algo que apareceu bastante.

Uma das questões bastante colocadas como importantes e como um dos grandes entraves foi a busca de recursos que possam dar sustentabilidade a esses tipos de ações. Uma das propostas foi que um desses recursos pudesse vir por meio do FAT. Também, a criação de um termo de compromisso entre os diversos Ministérios para fi nanciamento desse tipo de projeto.

Foi discutida uma proposta ligada à necessidade de regulamentação da profi ssão de artesão, levando-se em conta ser uma área bastante buscada. Outra proposta foi a criação de um colegiado que envolva não só o Caps, mas também todos os serviços da rede de atenção básica, no sentido de pensarmos a criação de políticas públicas na questão da geração de renda.

Valmor Schiochet

Algum complemento ao relato? Não. Então, a Luciana vai falar agora.

Grupo I

Coordenação: Tânia GrigoloÁrea Técnica de Saúde Mental/Dape/SAS/MS

Relatora: Luciana Cristina de AlcântaraCooperativa Cândido – Campinas/SP

Começamos a discussão partindo de três eixos, três pautas de discussão, e eu me baseei por aí para organizar a apresentação para os outros grupos. No primeiro pon-to, fi zemos uma avaliação sobre como estão os projetos de geração de renda a partir

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das experiências ouvidas nesses dois dias de evento. Observamos que, no geral, as iniciativas de geração de renda nascem de dentro de um Caps, ou têm parceria com os Caps, mas sempre nascem de dentro de um serviço de saúde mental.

Outra coisa que observamos é que existem várias experiências de associativismo e nenhuma cooperativa social. Tinha a Cooperativa Paratodos, mas foi modifi cada. O que temos são cooperativas em formação, mas formalmente legalizada, não tem nenhuma.

Outro aspecto observado nos relatos gerais é que tem precariedade de recursos fi nanceiros em todos os projetos e carência na capacitação, seja dos técnicos, seja dos usuários, nesse aspecto do ambiente do trabalho.

Outro eixo que discutimos foram as formas de geração de renda encontradas e relatadas aqui. Observamos que existem as ofi cinas terapêuticas profi ssionalizantes, as associações, as cooperativas em formação. Dentro das associações, têm os dife-rentes modos de produção, os diferentes produtos.

O terceiro ponto que discutimos foi sobre quais elementos entendemos importantes para juntar a saúde mental com a economia solidária, quais as propostas de política nacional para juntar essas duas instâncias. Fizemos algumas sugestões nesse sentido: a criação de um grupo de discussão, inicialmente eu tinha pensado inclusive na legis-lação da cooperativa social, mas isso pode se estender para as outras ações também, mas que seja criado um grupo de discussão com pessoas que participam dos proje-tos de geração de renda, que já estão no meio do caminho. Então, que tenha repre-sentantes desses projetos, e que as novas diretrizes dessas políticas nacionais sejam discutidas com esse grupo, com quem está vivenciando o processo, se possível, até com a inclusão de usuários nesse grupo de discussão.

Outro ponto foi que a economia solidária poderia fomentar essas iniciativas de geração de renda. Sabemos que não é somente a saúde mental que tem carência de trabalho. Outras áreas da sociedade têm muita carência de trabalho, e a economia solidária poderia fomentar a intersetorialidade. Não só a saúde mental e a econo-mia solidária possam apoiar esse tipo de projeto, mas que outros Ministérios, outras Secretarias e outros parceiros possam compor a idéia da geração de renda para essa população excluída. Continuando, que sejam criados fundos públicos de fi nancia-mento para a criação de novos projetos, novas ofi cinas, novas associações, e que haja fundo também para assessorias. A maioria dos projetos tem carência de assessoria que não são da saúde. Que tenha fundo também para a capacitação dos usuários, dos trabalhadores, fundo para a divulgação dos projetos, campanhas de marketing, esse tipo de coisa.

Outra discussão que surgiu no grupo é se vale a apena fazermos uma regulação do cooperativismo social. Como já foi muito mudado, vermos se vale a apena ou não regulamentarmos. Essa é uma discussão que esse grupo de trabalho pode fazer. Se optarmos pelo não, no sentido de que não vamos discutir e que não vale a pena

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regulamentar a cooperativa social, uma pergunta minha seria sobre qual é a saída para regulamentar o trabalho na saúde mental, para não termos o problema que te-mos tido de processos judiciais contra a associação dos usuários, requerendo direitos trabalhistas.

Outra sugestão é que a economia solidária pudesse promover uma campanha pu-blicitária de divulgação nacional dos projetos sociais de geração de renda, com a idéia de mostrar os projetos que temos, de mostrar que está tendo uma mobilização nessa área. O que queremos com isso? Ganhar credibilidade da sociedade, da população, dos compradores, dos clientes. A partir do momento que eles vêem que são proje-tos sérios, que têm apoio do governo, que tem gente séria promovendo, eles vão ter mais confi ança, vão reconhecer os projetos sociais. Foi sugerida uma idéia de colocar um selo para identifi car que o governo apóia tais projetos. Isso vai ajudar para irmos contra a situação de marginalização da inserção dos produtos no mercado, como o Paul Singer falou ontem aqui. A inserção no mercado desses produtos sociais ainda é muito marginal, ainda é muito pequena. Acreditamos que uma divulgação desses projetos sociais pode ajudar na inserção desses produtos no mercado, pode aumentar a credibilidade e ampliar a inserção desses produtos.

Quanto à discussão da cooperativa social, se formos discutir que vale a pena, pre-cisamos discutir a carga tributária, a questão de isenção de impostos e como vai ser a inserção de pessoas que tenham aposentadoria ou benefícios. Obrigada.

Grupo II

Coordenação: Neli Maria Castro de AlmeidaCampo de Intervenção de Paracambi/RJ

Relatora: Alcione C. A. da SilvaVerso Cooperativa de Psicologia – SP

Vou pedir desculpas desde já, porque fi z anotações corridas. Pensei que teria um pouco mais de tempo para sistematizar. Peço, então, que o grupo me ajude nos pontos.

Para percorrer rapidamente, na verdade, o que propusemos foi falar sobre os três pontos, mas, à medida que as pessoas foram falando, naturalmente, o ponto três, de desenvolvimento de uma política pública, foi mais enfatizado, com as pessoas trazendo mais idéias, fazendo algumas relações com o que dizia respeito ao ponto um e ao ponto dois. Nesse sentido, não estão muito claros nesse momento os pon-tos um e dois.

De maneira geral, ouvimos algumas experiências de pessoas também ligadas ao Caps ou associações que saíram do Caps. São experiências pilotos, algumas bem recentes. Foi possível perceber que a comunidade tem sido muito convocada a par-

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ticipar. Por exemplo, a pessoa que fazia o crochê e foi convocada para dar o curso. Nesse sentido, ao mesmo tempo em que há uma preocupação com o usuário, quer dizer, que isso deve incidir para ele, as pessoas também deram falta de uma agenda produzida pelo próprio usuário. Inclusive, uma pessoa falou que fi zeram uma ofi cina sobre histórias de trabalho e descobriram que algumas pessoas chegaram a estudar, uma pessoa que trabalhava como oleiro e foi dar aula de inglês, outras coisas que não estavam contempladas em ofi cinas. Essa ilustração resume uma questão que uma pessoa colocou para o grupo. Conseguimos escutar o que é trabalho para essas pessoas, sabemos entender o que eles estão falando com o trabalho, nesse sentido, ela apontou uma necessidade de compreender o trabalho para o usuário, conside-rando as particularidades.

Dentro ainda dessa relação de geração de renda, foram discutidos pontos críticos sobre apropriação do trabalho pelo usuário, qual concepção de sujeitos nesse tipo de implementação e que tipo de implementação é produzida a partir desses pontos de vista. A própria geração de renda é uma questão. Como lidar com geração de renda e saúde mental? São experiências muito diversas de geração de renda.

Na relação com o Caps, apareceram duas idéias muito interessantes sobre o seu papel. Houve um momento breve de uma pré-conclusão, mas foram duas idéias dis-tintas. Uma discussão foi se o Caps é um lugar de passagem e deve permanecer as-sim, o que quer dizer um desdobramento dos lugares de geração de trabalho serem fora do Caps, até fi sicamente, quer dizer, o que é o trabalho do Caps dentro desse contexto de geração de renda. Um outro ponto é que está havendo um esvaziamento da função quando são criadas as associações, se a geração de renda é para acontecer dentro do Caps ou não, se ela deve ganhar a cidade, como alguém falou, se deve abrir as portas para toda a comunidade que queira participar.

As pessoas também falaram de várias parcerias que os Caps têm feito, desde uni-versidades, instituições privadas, a própria comunidade, como eu falei. Dentro dessa questão, também surgiu o seguinte: se o ponto não seria fortalecer a rede inteira e considerar, talvez, o Caps com uma função dentro dessa rede.

Quanto ao mais evidente como proposta de formatação de uma política públi-ca tenha sido, as pessoas falaram da necessidade de uma formação. O nosso grupo apontou desde uma formação política para os usuários, a uma formação e qualifi -cação da equipe e dos usuários. Lembramos o processo de incubagem e que essa formação deve ser continuada, sendo acompanhada até o momento do então grupo poder fi car autônomo e independente.

Foi apontada também a necessidade de um mapeamento de todas essas experi-ências de geração de renda, bem como a necessidade de fazer um recurso público protegido, que a verba fosse “casada” para a saúde mental. Alguém falou que não era somente uma questão da verba, mas também dos aparelhos, dos prédios, dos terrenos, etc., que isso possa ser melhor aproveitado.

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Na verdade, foram ditas muitas coisas, mas uma idéia semelhante a que os senho-res trouxeram foi formar um grupo de trabalho que esteja voltado a conhecer melhor essa articulação de economia solidária e saúde mental, sendo assim, entender melhor que debate é esse que a economia solidária traz para poder dar asas para inventar os trabalhos dentro da saúde mental. Esse GT teria como função, num primeiro mo-mento, organizar as questões para promover um debate; num segundo momento, porque não há um esclarecimento propriamente desse passo da economia solidária, como vai realmente se dar e como fazer essa articulação com o usuário. Uma pessoa sugeriu incluir os usuários nessa discussão também, pois diz respeito a eles.

O campo legal também foi lembrado, a questão dos benefícios; também a criação de um fundo, uma tentativa de bolsa. Além disso, pensar em outras fontes de fi nan-ciamento. Alguém colocou que a saúde não pode fi nanciar tudo e que seria preciso pensar um outro jeito de investir.

Vou fi nalizar colocando um desejo que apareceu no sentido de que os debates prossi-gam pela internet, pois muitas coisas não puderam ser ditas, as pessoas tiveram que falar rapidamente sobre suas experiências. Então, que fossem formados grupos e que pudésse-mos criar uma rede de debate contínuo para aproveitar esses momentos de encontro.

Neli Maria Castro de Almeida

Para complementar, como uma diretriz, pensamos em ter um segundo encontro ampliado de ofi cinas terapêuticas e de ofi cinas de geração de renda, um encontro mais ampliado junto com a economia solidária, para termos mais tempo e espaço para construir essas questões dentro do campo. Geralmente, os encontros de Caps não promovem essas discussões da ponta. Então, pensamos nessa diretriz de ter um encontro maior, ampliado, junto com a economia solidária, para discutirmos pro-priamente as questões das ofi cinas de geração de renda e também as terapêuticas. Com isso, surgiu a idéia, então, de criarmos um grupo de trabalho para pensarmos de uma forma mais ampla também esse próprio encontro.

Rita Martins

Sobre esse grupo via internet, já estamos planejando ainda para essa semana. Tam-bém estamos planejando um relatório preliminar desse evento com essas propostas que tiramos daqui. Prometemos para a semana que vem, vamos ver se será possível, mas a intenção é que saia na semana que vem.

Sobre a fala da Neli, cheguei a comentar com algumas pessoas, não está fechada, mas temos uma proposta de fazer no ano que vem ofi cinas regionais. Precisamos dis-cutir melhor com o pessoal da Senaes para vermos como conformar essas ofi cinas, se serão ofi cinas de capacitação, se serão ofi cinas de discussão, etc.

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As pessoas falaram muito de mapeamento. Quero dizer que estamos realizan-do um mapeamento. A nossa primeira ação nessa área de geração de renda é um mapeamento, que continua, e eu gostaria que as pessoas o multiplicassem. Há um questionário que está correndo, e eu pediria que esse questionário fosse repassado. A partir desse mapeamento, também tiramos algumas conclusões iniciais, porque o mapeamento ainda não está fechado, não tem nem dois meses.

Uma das conclusões que temos percebido, na evolução histórica de algumas experiências, é que elas realmente começam no Caps, que é um serviço estratégico para a nossa rede, como ofi cinas terapêuticas, vão se desenvolvendo como ofi cina de geração de renda e trabalho, até formarem cooperativas, associações. Consegui-mos ver, em algumas delas, o que é a nossa meta e o nosso ideal, que é conseguir chegar à autonomia, se deslocar, sair da estrutura Caps e ter essa autonomia.

Outra questão é o fato de não ser um grupo homogêneo. Não são grupos só de usuários; são grupos formados por familiares, usuários, pessoas da comunidade e técnicos. Então, são grupos mistos. Creio que é uma proposta unânime, todas as pessoas têm falado nisso. Acompanhei o grupo da Marcela, e as pessoas falaram dessa questão de ter esse grupo heterogêneo.

Valmor Schiochet

Vamos abrir agora para esclarecimentos. Parece-me que não existe contradição entre as propostas, mas uma agregação quanto ao grupo de trabalho, foi pensado tanto do ponto de vista da legislação, especifi camente das cooperativas sociais, mas também foi pensado na elaboração das políticas, dos encaminhamentos daqui para frente. Nas outras proposições, me parece que não existe contradição, apenas coi-sas que estão em aberto. Foi importante os grupos colocarem também determinadas questões. Portanto, proponho não abrirmos o debate sobre determinadas questões porque, de fato, elas precisam ser ainda aprofundadas. Deixo a palavra aberta para algum comentário a respeito das proposições feitas.

Vou encerrando essa parte e vou fazer um acréscimo, um desafi o que coloco para os senhores em cima do movimento que estamos fazendo no interior da política da economia solidária no Fórum Brasileiro de Economia Solidária. O primeiro desa-fi o: nós também estamos fazendo um levantamento nacional de empreendimentos econômicos solidários e de entidades de apoio. Gostaríamos muito que os empre-endimentos dos usuários, que foram objeto da nossa discussão hoje, pudessem fa-zer parte também do nosso processo de reconhecimento da economia solidária no Brasil. Então, vamos acertar aqui um pouco essa metodologia de mapeamento. Os empreendimentos de economia solidária, no próximo ano, deverão ser incorpora-dos numa metodologia de visita que vamos proporcionar a cada empreendimento, para que tenhamos um melhor conhecimento sobre esses empreendimentos, do

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ponto de vista da gestão, da produção, da sua relação com outros grupos, e assim por diante.

Outro desafi o que não apareceu aqui, e não poderia aparecer, mas que é impor-tante para nós, é a integração e a articulação das experiências dos empreendimentos com os Fóruns Estaduais de Economia Solidária já existentes, nos quais o conjun-to de organizações e de entidades de apoio à economia solidária pode ser mobili-zado também para dialogar com os senhores e enfrentar conjuntamente uma série de questões que não apareceram aqui, mas no grupo apareceram, por exemplo, a questão de legislação, de defi nição de estratégias na formalização, dentre outras. Essa é uma luta mais ampla e mais coletiva. Então, esse é um desafi o que deixamos para os senhores. Depois, na rede que vamos construir de comunicação eletrônica, podemos passar informações sobre os Fóruns Estaduais de Economia Solidária às entidades. Nas Delegacias Regionais do Trabalho, temos pessoas que passaram por um processo de formação em economia solidária e, portanto, podem também ser uma interação nos estados. Temos gestores públicos, prefeituras, rede de incubadoras tecnológicas, temos um conjunto de atores que, a meu ver, podem ir se integrando nesse processo sem depender de que Senaes e Ministério da Saúde façam as coisas. É um desafi o que fi ca e, talvez possamos avançar nessa perspectiva.

Queria agradecer aos relatores. Peço que depois organizem melhor o material e nos enviem. Estamos encerrando essa fase, com a presença do professor Singer e do Pedro Gabriel. Vou convidá-los para comporem a Mesa e fazerem o fechamento da nossa ofi cina. Fiquem à vontade para mandar, via internet, comentários de avaliação sobre essa ofi cina, pois não tivemos oportunidade de fazer uma dinâmica de avalia-ção, então, seria importante os senhores remeterem a avaliação sobre experiência, que me parece ser inicial também nessa perspectiva.

Pedro Gabriel Delgado

O professor Singer vai fazer o encerramento formal do nosso Fórum. Primeiro, queria reiterar o agradecimento pela presença de todas as senhoras e senhores, pelo esforço que sei que fi zeram para estar aqui. Agradeço à equipe toda da Secretaria de Economia Solidária, sob a coordenação do professor Paul Singer. Quero dizer que, de fato, estamos abrindo um campo de trabalho que já vinha sendo construído, como fi cou claro aqui, mas estamos abrindo agora um espaço no plano da política pública, como ação de governo, uma articulação que vai apoiar essas iniciativas que estão sendo desenvolvidas em todos os lugares.

Da minha parte, penso que essa é a reforma psiquiátrica no rumo certo, é a refor-ma psiquiátrica mostrando que é uma política complexa, necessariamente interse-torial, uma política de inclusão social, que deve ser criativa, de fato ousada e tem a obrigação de colocar no debate da saúde mental, no campo da saúde pública, novos conceitos, novos signifi cados e novos valores. Isso já é um saldo positivo também

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dessa ofi cina, e penso que construímos uma agenda de longo prazo que, na minha opinião, será muito produtiva, embora algumas coisas sejam de curto prazo.

Creio que começa aqui também, senão uma cooperativa, pois sei que a coopera-tiva não é exatamente a única solução, nem a melhor, mas um esforço cooperativo e conjunto de duas políticas públicas, que nasceram realmente de uma matriz comum e que têm muito o que trocar para construir uma sociedade melhor, onde todas as pessoas possam ter o direito a uma vida mais digna, mais justa, mais próxima dos ideais de felicidade.

Essa ofi cina também estabelece com os senhores, da minha parte, um compro-misso de que este tema seja, a partir de agora, um item da agenda do Ministério da Saúde, com o contato permanente e sob a coordenação compartilhada da Secretaria de Economia Solidária, e que possa ser uma agenda na qual se incorpore realmente o apoio fi nanceiro, com inclusão no planejamento orçamentário do próximo ano, que seja alguma coisa substantiva e que possa fazer com que essas experiências se sustentem e se multipliquem.

A partir de agora, estamos nos articulando numa rede que deve se manter como uma rede aberta para outras experiências, mas que não perca esse liame e essa li-gação que estabelecemos aqui.

Na minha opinião, como primeira ofi cina, cumpriu os seus objetivos, e espero que, com outros desdobramentos, possamos fazer com que essa idéia da associação entre saúde mental e economia solidária passe a ser uma idéia atraente para todas as pessoas que lidam nesse campo da saúde mental.

Especialmente, quero agradecer mais uma vez ao professor Paul Singer, que tem apoiado, desde que assumiu essa Secretaria, essas idéias de juntar as duas políticas públicas no rumo da emancipação, da autonomia e da felicidade das pessoas. Obri-gado a todos os senhores. Passo a palavra para o Paul Singer.

Paul Singer

Vou começar pelas últimas palavras do Pedro. Sinto que há uma grande comuni-dade, eu diria, do ponto de partida humanista geral, entre o que os senhores da saúde pública e nós estamos procurando fazer, mas precisamos explicitar isso melhor.

Uma das coisas que eu queria propor seria organizarmos seminários pelo Brasil inteiro, em que os senhores nos ensinem a questão da saúde mental. Tenho certeza que, com o Franco Baságlia, a visão do que é saúde e doença mental deve ter muda-do muito, mas nós não somos do campo. Assim como podemos contribuir passando aos senhores as idéias, a experiência histórica e os objetivos da economia solidária, os senhores têm igualmente importantes coisas a nos ensinar. Se nós não aprender-mos, não vai haver uma verdadeira colaboração de igual para igual. Então, vamos trocar saberes. Penso que esse é um dos fundamentos.

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Vou tocar em vários pontos que o doutor Pedro já tocou, apenas para deixar cla-ra uma posição, que vamos depois negociar entre nós. Na minha opinião no que se refere a fi nanciamento, temos que fi nanciar duas coisas distintas. Uma é o trabalho de incubação. Não é possível dizer nesse momento que forma vai tomar, se vai ser um fundo, se vai ser alguma coisa diferente, mas esse é o nosso compromisso. Vamos arranjar esse dinheiro para que essas atividades que começamos hoje a colaborar ativamente possam prosseguir e se intensifi car.

Uma segunda coisa que deve ser fi nanciada são as próprias cooperativas ou asso-ciações. Isso não deve ser, a meu ver, a fundo perdido. Isso deve ser sob a forma de empréstimos, eventualmente com juros muito baixos, eventualmente no início sem juros, ou até com subsídios, e com prazos de carência generosos, mas eu entendo que deveria ser para devolver, e não dado. Do ponto de vista moral, do ponto de vista da dignidade das pessoas que estão começando a trabalhar e a se auto-sustentar, parece-me que isso é mais correto. Para isso, existe hoje, já em estado bem adiantado, um projeto de lei para um programa de microcrédito no nosso País. Está sendo adiado, mas deve acontecer no fi m desse mês. O Presidente irá assinar. Dentro desse pro-grama, haverá um programa de fi nanciamento também de cooperativas. Posso estar enganado, mas me parece, nesse momento, que o programa geral de cooperativas deve incluir as nossas, essas que nós vamos formar. A meu ver, não há necessidade de criar uma linha específi ca. Se eu estiver enganado, cria-se a linha.

Uma das coisas que eu queria urgir é que os senhores formem, dentro dos prazos democráticos, para não atropelar ninguém, uma agência de fomento de economia solidária para egressos de manicômio, enfi m, o nome que os senhores queiram cha-mar. Do contrário, não temos como fi nanciar essa atividade. No momento, é tudo muito informal. Creio que os senhores todos pertencem a quadros de Caps, ou algo assim, mas precisamos ter, como já tem a “Anteag”, a “Unisol”, Caritas, e várias agências, ou uma ONG, o nome que os senhores queiram, que possa mandar um projeto, fazer um orçamento, receber o dinheiro e prestar contas. Esse parece um detalhe burocrático idiota, mas se não fi zermos isso, fi camos nas boas intenções e não conseguimos realizar.

Um pouco mais adiante, talvez ainda seja cedo, valeria a pena criar também uma associação de cooperativas que incluam doentes mentais e outras pessoas com de-fi ciência, eventualmente, pessoas que, por causa da idade, estão incluídas, jovens, velhos, enfi m, isso poderia conformar uma associação de cooperativas, assim como usuários de drogas.

Era basicamente isso que eu queria dizer aos senhores. O Pedro já agradeceu a todos, eu também agradeço a todos. Penso que demos um passo fundamental e não creio que vamos parar a partir daí. Não vai ser possível parar; então, vamos em frente.

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Como resultado deste encontro, foi publicada a Portaria GM/MS n.º 353, de 7 de março de 2005, que constitui o Grupo de Trabalho Economia Solidária e Saúde Mental. A seguir o documento na íntegra.

3.5 Portaria Interministerial n.o 353, de 7 de março de 2005

Edição Número 45 de 08/03/2005Ministério da Saúde Gabinete do Ministro

PORTARIA INTERMINISTERIAL Nº 353, DE 7 DE MARÇO DE 2005

Institui o Grupo de Trabalho de Saúde Mental e Economia Solidária e dá outras providências.

O MINISTRO DE ESTADO DA SAÚDE e O MINISTRO DE ESTADO DO TRABA-LHO E EMPREGO, no uso das atribuições que lhes são conferidas pelo art. 87, pa-rágrafo único, inciso I, da Constituição, e

Considerando as atribuições da Secretaria Nacional de Economia Solidária, do Ministério do Trabalho e Emprego, que busca construir a política nacional de forta-lecimento da economia solidária e da autogestão, estimular a criação, a manutenção e a ampliação de oportunidades de trabalho e renda, por meio de empreendimentos autogestionados, organizados de forma coletiva e participativa, bem como colabo-rar com outros órgãos de governo em programas de desenvolvimento e combate ao desemprego e à pobreza;

Considerando as diretrizes da política nacional de saúde mental, que busca cons-truir um efetivo lugar social para os portadores de transtornos mentais, por intermédio de ações que ampliem sua autonomia e melhora das condições concretas de vida;

Considerando as diretrizes gerais de ambas as políticas, Economia Solidária e Reforma Psiquiátrica, que têm como eixos a solidariedade, a inclusão social e a ge-ração de alternativas concretas para melhorar as condições reais da existência de segmentos menos favorecidos; e

Considerando as deliberações da I Ofi cina Nacional de Experiências de Geração de Renda e Trabalho de Usuários de Serviços de Saúde Mental, realizada na Univer-sidade de Brasília, nos dias 22 e 23 de novembro de 2004, convocada pelos Minis-térios da Saúde e do Trabalho e Emprego, resolvem:

Art. 1º Fica instituído o Grupo de Trabalho de Saúde Mental e Economia Solidá-ria, a ser composto por representantes (um titular e um suplente) das instituições e instâncias abaixo, sob coordenação da primeira:

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I - Ministério da Saúde; II - Ministério do Trabalho e Emprego; III - Colegiado Nacional de Coordenadores de Saúde Mental; IV - Rede de Gestores de Políticas Públicas de Fomento à Economia Solidária; V - Fórum Brasileiro de Economia Solidária; VI - Rede de Experiências de Geração de Renda e Trabalho em Saúde Mental; e VII - Usuários de Saúde Mental inseridos em Experiências de Geração de Renda e

Trabalho vinculados a Serviços de Saúde Mental.Parágrafo único. O Grupo de Trabalho ora instituído poderá convidar outros mi-

nistérios e instituições para participar de suas atividades de acordo com os temas que serão objeto de discussão e proposição.

Art. 2º O Grupo de Trabalho de Saúde Mental e Economia Solidária terá as se-guintes atribuições: I - propor e estabelecer mecanismos de articulação entre as ações das políticas

de saúde mental e economia solidária; II - elaborar e propor agenda de atividades de parceria entre as duas políticas; III - realizar mapeamento das experiências de geração de renda e trabalho, coo-

perativas, bolsa-trabalho e inclusão social pelo trabalho, realizadas no âmbito do processo de reforma psiquiátrica;

IV - propor mecanismos de apoio fi nanceiro para as experiências de geração de renda e trabalho;

V - propor atividades de formação, capacitação e produção de conhecimento na interface saúde mental e economia solidária, bem como do marco jurídico adequado;

VI - estabelecer condições para a criação de uma Rede Brasileira de Saúde Mental e Economia Solidária; e

VII - propor mecanismos de parceria interinstitucional, no âmbito nacional e inter-nacional.

Art. 3º Fixar o prazo mínimo de 15 (quinze) dias úteis para que o coordenador do Grupo de Trabalho convoque seus membros para as reuniões.

Art. 4º Estabelecer o prazo de 2 (dois) meses, a partir da publicação desta Portaria, para que os titulares das instituições e instâncias relacionadas no artigo 1º indiquem seus respectivos membros, titulares e suplentes.

Art. 5º Estabelecer o prazo de seis 6 (seis) meses, prorrogáveis uma única vez, para o Grupo de Trabalho apresentar suas conclusões aos dois Ministérios.

Art. 6º Esta Portaria entra em vigor na data de sua publicação.HUMBERTO COSTA Ministro de Estado da SaúdeRICARDO BERZOINI Ministro de Estado do Trabalho e Emprego

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4 A T r a j e t ó r i a d o M o v i m e n t o d a E c o n o m i a S o l i d á r i a n o B r a s i l: d o F ó r u m S o c i a l M u n d i a l ( F S M ) a o F ó r u m B r a s i l e i r o d a E c o n o m i a S o l i d á r i a ( F B E S )

Em torno do espaço e da agenda do Fórum Social Mundial destacam-se fortes elementos constitutivos da recente trajetória da economia solidária no Brasil:

4.1 A constituição do Grupo de Trabalho Brasileiro da Economia Solidária

Criado em 2001 para articular e mediar a participação nacional e das redes in-ternacionais da Economia Solidária no I FSM, o GTBrasileiro constituiu-se por orga-nizações e redes de uma diversidade de práticas e segmentos da economia popular solidária: campo, cidade, práticas diminutas, práticas complexas, igreja, bases popu-lares, bases sindicais, universidades, movimentos sociais populares, práticas gover-namentais, práticas de apoio ao crédito, práticas de redes de informação, vínculos às bases nacionais, vínculos às redes internacionais.

As 12 Entidades e Redes Nacionais de Fomento que em momentos e níveis dife-rentes participam do GTBrasileiro são: Rede Brasileira de Socioeconomia Solidária (RBSES); Instituto Políticas Alternativos para o Cone Sul (Pacs); Federação de Órgãos para a Assistência Social e Educacional (Fase); Associação Nacional dos Trabalha-dores de Empresas em Auto-Gestão (Anteag); Instituto Brasileiro de Análises Sóciais e Econômicas (Ibase); Cáritas Brasileira; Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST/Concrab); Rede Universitária de Incubadoras Tecnológicas de Cooperativas Populares (ITCPs); Agência de Desenvolvimento Solidário (ADS/CUT); Unitrabalho; Rede Brasileira de Gestores de Políticas Públicas da Economia Solidária; Associação Brasileira de Instituições de Microcrédito (Abicred).

Ao fi nal de 2002, o GTBrasileiro deparou-se com a vitória de Lula.

4.2 A carta ao governo Lula e a I Plenária Nacional da Economia Solidária

A carta ao Lula propondo a criação de uma Política de Apoio à Economia Solidá-ria foi reforçada e ampliada na I Plenária Nacional que iniciou o debate sobre uma Plataforma, uma Carta de Princípios e a criação de um Fórum Nacional da Economia Solidária. As negociações junto ao governo Lula avançaram positivamente.

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4.3 A II Plenária Nacional no FSM – 2003 e as decisões de mobilizações pelo País

O governo Lula anuncia no Fórum Social Mundial de 2003 (FSM–2003) o com-promisso de criar a Secretaria Nacional da Economia Solidária sob a direção do pro-fessor Paul Singer. A II Plenária Nacional, realizada durante o FSM, decide mobili-zar as bases estaduais, até então com poucos Fóruns e articulações estaduais, para o debate sobre a IDENTIDADE (Carta de Princípios), a PLATAFORMA de LUTAS, o CARÁTER e a COMPOSIÇÃO do Fórum a ser criado. Foram 18 estados que realiza-ram suas plenárias preparatórias.

4.4 A III Plenária Nacional cria o FBES para duas tarefas: a mediação e a mobilização

Com mais de 800 representantes, delegados das 18 plenárias estaduais, a III Ple-nária Nacional cria o FBES, com a incumbência de articular e mobilizar as bases da economia solidária pelo País, em torno de uma Carta de Princípios e uma Plataforma de Lutas, ali aprovadas, e de fazer a interlocução junto ao governo, em especial junto à recém-criada Secretaria Nacional da Economia Solidária (Senaes). Esta assumiu a Plataforma de Lutas como parte de seu Plano de Governo. A III Plenária defi ne tam-bém a composição e o funcionamento do FBES.

4.5 O I Encontro Nacional dos Empreendimentos da Economia Solidária (agosto de 2004)

O I Encontro Nacional de Empreendimentos da Economia Solidária reuniu 2.500 representantes, agora de todos os estados brasileiros, onde foram criados fóruns ou comissões pró-fóruns estaduais. Em alguns estados, a ampliação do fórum consiste em estruturar fóruns sub–regionais e municipais. É assegurada a participação majo-ritária dos empreendimentos.

4.6 A Economia Solidária no centro do FSM – 2005

No FSM–2005 a Economia Solidária foi desafi ada para gerir o abastecimento, a comercialização, a moeda social, as rodadas de negócios, a campanha pelo consu-mo consciente, contra os produtos nocivos das transnacionais, e a realizar os debates articulados entre as redes nacionais e internacionais. Por isso diz-se que não só um outro mundo é possível, mas uma outra economia acontece!

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4.7 Estrutura e funcionamento do Fórum Brasileiro da Economia Solidária

O Fórum Brasileiro de Economia Solidária estrutura-se fundamentalmente na ar-ticulação entre três segmentos do movimento de ES: empreendimentos solidários, entidades de assessoria e fomento, e gestores públicos.

A sua principal instância de decisão é a Coordenação Nacional, que consiste nos representantes das entidades e redes nacionais de fomento (GTBrasileiro), além de três representantes por estado que tenha um Fórum Estadual de Economia Solidária. Destes três representantes por estado, dois são empreendedores e um é assessor ou gestor público. A Coordenação Nacional reúne-se duas vezes ao ano.

O Conselho Interlocutor faz a interlocução do movimento de ES com a Secretaria Nacional de Economia Solidária, e consiste em uma parte da Coordenação Nacio-nal: as entidades e redes nacionais de fomento e um representante de cada estado (deve ser um empreendedor).

Para dar suporte aos trabalhos do FBES, propiciar a comunicação entre as instâncias e operacionalizar reuniões e eventos, há uma secretaria executiva, apoiada por uma comissão de acompanhamento composta por membros da Coordenação Nacional.

Existem ainda Grupos de Trabalho (GTs) que se conformam conforme a demanda de ações específi cas do FBES, e para o avanço na implantação da Plataforma da ES. Os GTs são: Mapeamento, Finanças Solidárias, Marco Legal, Comunicação, Políticas Públicas, Relações Internacionais e Produção, Comercialização e Consumo.

Para mais informações sobre o FBES, acessar o endereço eletrônico: www.fbes.org.br.

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5 A N E X O S

Anexo A - Instituições que participaram da Oficina de Geração de Renda e Trabalho de Usuários de Serviços de Saúde Mental – 22 e 23 de novembro de 2004

UF Município Instituições

AM Manaus Secretaria Municipal de SaúdeDF Brasília Área Técnica de Saúde do Trabalhador/Dape/SAS/MSDF Brasília Área Técnica de Saúde Mental/Dape/SAS/MSDF Brasília CabessaDF Brasília Coordenação de Saúde Mental – CosamDF Brasília InversoDF Brasília Secretaria de Estado da SaúdeDF Brasília Senaes – Ministério do TrabalhoDF Brasília SER Clínica de Saúde MentalDF Brasília UnBDF Brasília UniversoDF Brasília Verso Cooperativa de PsicologiaES Vitória Secretaria Municipal de Saúde

GO Aparecida de Goiânia Secretaria Municipal de SaúdeGO Goiânia Secretaria Municipal de SaúdeMA São Luís Secretaria Municipal de SaúdeMG Araçuaí CapsMG Belo Horizonte Prefeitura de Belo HorizonteMG Belo Horizonte Secretaria Municipal de SaúdeMG Conselheiro Lafaiete CapsMG Juiz de Fora Intecoop / UFJFMG Juiz de Fora PrefeituraMG Montes Claros Secretaria Municipal de SaúdeMG Uberlândia Conselho do Serviço de SaúdeMT Cuiabá Secretaria Municipal de SaúdePA Belém Consultoria – Área Técnica de Saúde Mental/Dape/SAS/MSPE Floresta ONG EcoterraPE Recife Coordenação Municipal de Saúde MentalPE Recife PrefeituraPE Recife Secretaria Municipal de SaúdePE Recife UFPEPR Curitiba Associação Arnaldo GilbertiPR Curitiba Centro Psiquiátrico MetropolitanoPR Curitiba Secretaria Estadual de SaúdePR Francisco Beltrão Caps

continua

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PR Londrina Caps Infanto-juvenilPR Maringá CapsPR Maringá Secretária Municipal de SaúdeRJ Nova Friburgo Fundação Municipal de SaúdeRJ Rio de Janeiro Cooperativa da Praia VermelhaRJ Rio de Janeiro Coordenação Municipal de Saúde MentalRJ Rio de Janeiro IFB – Instituto Franco BaságliaRJ Rio de Janeiro Instituto Municipal de Assistência à Saúde MentalRJ Rio de Janeiro Instituto Municipal Nise da SilveiraRJ Rio de Janeiro IPP – Instituto Municipal Philippe PinelRJ Rio de Janeiro NUSAMT – Secretária Municipal de Trabalho e RendaRJ Rio de Janeiro Papel PinelRJ Rio de Janeiro Secretaria Municipal de SaúdeRJ Rio de Janeiro SosintraRJ Rio de Janeiro – Bangu Caps Lima BarretoRS Pelotas Secretaria Municipal de SaúdeRS Porto Alegre Secretaria Municipal de SaúdeSC Florianópolis Coordenação Municipal de Saúde MentalSP Campinas Centro de Convivência “Portal das Artes”SP Campinas PrefeituraSP Campinas Serviço de Saúde Dr. Cândido FerreiraSP Mogi das Cruzes Associação de Loucos pela VidaSP Santo André FBES – Fórum Brasileiro de Economia SolidáriaSP Santo André Núcleo de Projetos Especiais da Secretaria Municipal de SaúdeSP Santo André Organização Social “De Volta para Casa”SP Santos Consultoria – Área Técnica de Saúde Mental/Dape/SAS/MSSP São Paulo Centro de Convivência “Tear das Artes”SP São Paulo USP

continuação

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Anexo B - Mapeamento Preliminar das Iniciativas de Geração de Renda e Trabalho em Saúde Mental

UF Município Organizações Produtos/serviços Endereço Telefone E.mail

BA SalvadorOfi cina de Mosaico e Biscuit

Móveis e Artigos de Decoração

Pça. XV de Novembro, s/n.º, Terreiro de Jesus, CEP: 40025-010

(71) 3321-4888 [email protected]

DF Brasília Cabessa ArtesanatoEPNB KM4 Granja do Riacho Fundo, CEP: 70000-000

(61) [email protected]

ES VitóriaTenda Criativa

Camisetas Pintadas, Panos de Prato e Panos de Bandeja

R. José de Carvalho, s/n.º, Ilha de Santa Maria CEP: 29040-230

GO GoiâniaBeleza e Culinária

Cursos de Capacitação em Beleza e Culinária

Av. Manchester, 200, Chácara 2, Jardim Novo, CEP: 74703-010

(62) 524-1804 [email protected]

MA São LuísTrabalhar é Viver

Serviço de Lava-jatoR. Viveiros de Castro, 26/ Apeadouro, CEP

(98) 3222-9828

MG AraçuíOfi cina de Artesanato em Gesso

Artesanato em Gesso

R. Antônio Tanure, 239, Esplanada, CEP: 396000-000

(33) [email protected]

MG AraçuíOfi cina de Imã de Geladeira

Imãs de GeladeiraR. Antônio Tanure, 239, Esplanada, CEP: 396000-000

(33) [email protected]

MG BarbacenaAssociação Arte & Vida

Produtos Artesanais (Bolsas, Velas, Bijouterias, Produtos Alimentícios)

R. Padre Manoel Rodrigues, 237, Bom Pastor, CEP: 36200-654

(32) 3339-2194/33392143

[email protected]; [email protected]

MGBelo Horizonte

Cozinha Industrial

Alimentos em Geral

R. Além Paraíba, 917 -a- Bomfi m, CEP: 31210-120

(31) 3428-9811 [email protected]

MGBelo Horizonte

Suricato - Associação de Trabalho e Produção Solidária

Gestão da Política de Geração de Renda e Trabalho, Marcenaria, Mosaico, Costura e Culinária

R. Hermínio Alves, 11 Sala 209, Floresta, CEP:

3224-2386/3277-6684/3277-9780/3277-7793

[email protected]

MG Betim

Projeto de Geração de Renda da Saúde Mental de Betim

Apoio à Formação de Unidades Produtivas de Outras Formas de Geração de Renda e Trabalho

Av. Gabriel Passos, 393, Decamão, CEP: 32510-560

(31) 3532-3144 [email protected]

MG Betim

Unidade Produtiva de Costura “Quinta Estação”

CosturaAv. Gabriel Passos, 393, Decamão, CEP: 32510-560

(31) 3532-3144 [email protected]

MG Betim

Unidade Produtiva de Culinária “K Delicia”

AlimentosAv. Gabriel Passos, 393, Decamão, CEP: 32510-560

(31) 3532-3144 [email protected]

MG Catas AltasOfi cinas de Artesanato

ArtesanatoPça. Monsenhor Mendes, Centro, CEP: 35969000

(31) 38327115/38327101

continua

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MG Congonhas Força da MenteArtesanato de Produtos Alimentícios

Av. Jk, 2039, Centro, CEP: 36415-000

(31) 3731-1002/3732-2206

[email protected]

MGConselheiro Lafaiete

Projeto faça seu Artesanato

Artesanato e Alimentos

R. Pedro Camargos, 240, São Sebastião CEP: 36400-000

(31) 3769-2662 [email protected]

MG CurveloOfi cina de Cerâmica

CerâmicaPça. Voluntários da Pátria, 115, Centro, CEP: 35790-000

(38) 3722-6831

MG CurveloOfi cina de Culinária

Lasanhas, Panquecas e Salgados Congelados

Pça. Voluntários da Pátria, 115, Centro, CEP: 35790-000

(38) 3722-6831

MG DivinópolisOfi cina de Fuxico

Peças para Vestuários

Av. Governador Magalhães Pinto, 1.215, Espírito Santo CEP: 35500-000

(37) [email protected]

MG IpatingaAssociação Loucos por Você

Camisas, Silc-screen, Artesanato

R. Aleijadinho, 335, Cidade Nova CEP: 35162-352

(31) 3825-8537 [email protected]

MG Itaúna

Centro de Convivência de Saúde Mental Dr. Peri Tupinambás

Artesanato, Ofi cina de Velas, Bijouteria, Fuxico, Cartões, Mosaico, Cerâmica e Pintura

R. Godofredo Gonçalves, 220, Centro, CEP: 35680-047

(37) [email protected]; [email protected]

MG Juiz de Fora Trabalharte Bolsas, Sacolas, Embalagens, Telas e Cerâmicas

R. Benjamin Constant, 984, Centro, CEP: 36015-400

MG Ponte NovaAfussam de Ponte Nova

Colagem, Bijouteria, Pintura e Bordado

R. Copacabana, 478, Copacabana, CEP: 35430-052

(31) 3881-1685 [email protected]

MG Três MariasOfi cina de Culinária

Culinária Diet e Light

R. do Contorno, 29, Jk CEP: 39205000

(38) 3754-7483/3754-3019

[email protected]

MG Três PontasOfi cina de Tapete

Tapetes, Almofadas, Pano de Prato

R. Osvaldo Campos Reis, São Francisco de Assis, CEP: 37190-000

(35) [email protected]; [email protected]

MG UberlândiaTrabalhando Adoidado

CapacitaçãoR. Jurandir André de Oliveira, 163, Sta Luzia, CEP: 38408-788

(34) [email protected]

MSCampo Grande

Ofi cina de Artesanato e Alimentos

Artesanato e Alimentos

R. Itambé, 2.939, J. Vitrine CEP: 79004-423

(67) 314-3055 R3098

[email protected]

PBCampina Grande

Brechó no CapsRoupas e Acessórios Usados

Getúlio Vargas, 673, Centro CEP: 58108-125

(83) 333-2562 [email protected]

PE Floresta EcoterraCurso de Informática

Pça. Cel Fausto Ferraz, 154, Centro, CEP: 56400-000

PE Recife

Associação dos Usuários e Técnicos do Caps Esperança

Artesanato, Cursos, Treinamentos e Promoção de Eventos

R. José Carvalheira, 415, Tamarineira CEP: 50051-080

(81) 3269-8017 [email protected]

PR CuritibaAssociação Arnaldo Gilberti

Artesanatos em Madeira e Tecido

R. 21 de Abril, 90, Alto da XV, CEP: 80520-000

PR CuritibaAssociação Nise da Silveira

Cursos e BazarAv. Marechal Floriano Peixoto, 2.236, Bairro Rebolças, CEP: 80230-110

(41) 332-7254 [email protected]

PR CuritibaOfi cina de Artesanato

ArtesanatoCel. Roche Pedra Pires, 475, Vila Izabel CEP: 82240-510

(41) 340-2181 [email protected]

continuação

continua

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PR CuritibaOfi cina de Artesanato

Artesanato e Artes em Geral

R. Nilo Peçanha, 1.552, Bom Retiro, CEP: 80520000

(41) 352-3011 R. 224

[email protected]

PR CuritibaOfi cinas de Trabalho

ArtesanatoTravessa João Prosdócimo, 139, Alto da XV, CEP: 80000-220

(41) 264-6462 [email protected]

PRFrancisco Beltrão

Associação de Usuários de Familiares do Caps Dr. Wap

ArtesanatoR. Antônio Carneiro Neto, 380, Alvorada, CEP: 85601-090

(46) 524-8395/524-7525

[email protected]

PR JoinvilleOfi cina de Capacitação

CapacitaçãoR. Eugênio Moreira, 400, Anita Garibaldi, CEP: 89202-100

(47) [email protected]

PR LondrinaProjeto Sala de Espera

ArtesanatoR. Joá, 46, Vila Nova, CEP: 86025-770

(43) 3329-5731

PR MaringáOfi cina de Artesanato

Artesanato Av. Centenário, 495, Zona 08, CEP: 87050-040

(44) [email protected]

PR Maringá Projeto Girassol ArtesanatoAv. Cerro Azul, 1.370, Zona 2, CEP: 87010-000

(44) 262-1690 [email protected]

RJNova Friburgo

Ofi cina de Pipas e Móbiles

Pipas e MóbilesAv. Comte Bitencourt, 142, Centro, CEP: 22713-374

RJRio de Janeiro

Arte, Horta e Cia

Horta e Jardinagem, Produtos Artesanais, Almoços e Coquetéis, Venda de Livros e Serviço de Cantina

R. Sampaio Corrêa, s/n.º, Jacarepaguá CEP: 22713-370

(21) 24465177 R. 237

[email protected]

RJRio de Janeiro

Ateliê tem Gente Pintando

Artes Plásticas, Óleo sobre Tela, Aquarela

Av. Venceslau Brás, 65 Botafogo CEP: 22290-140

(21) 2542-3049 R. 2103/2104/2113

[email protected]

RJRio de Janeiro

Bazar

Utensílios Domésticos, Roupas, Sapatos, Bolsas, Cinto e Armarinho

Estrada de Inhoaíba, Campo Grande, CEP: 23063-010

(21) 3402-8132

RJRio de Janeiro

Bazar - Cooperativa Mãos à Obra

Exposição e Venda de Roupas Usadas Doadas

R. Senador Camará, 224, Santa Cruz, CEP: 23515-020

(21) 3157-5723/3156-9046

[email protected]; [email protected]

RJRio de Janeiro

Bazar na PraçaVenda de Roupas Usadas

Pça. Major de Melo, 13 Fds Pam Carlos Alberto Nascimento, Campo Grande, CEP: 23045-400

(21) [email protected]

RJRio de Janeiro

BrechóVenda de Roupas Usadas

R. Ramiro Magalhães, 521, Engenho de dentro, CEP: 20730-460

(21) 3111-7489

RJRio de Janeiro

Brechó Etc. & Tal

Roupas e Acessórios Usados e Objetos Produzidos pela Ofi cina do CAD/IPUB

Av. Venceslau Brás, 71/fds Botafogo CEP:22290-290

(21) 2295-3449 R. 239

RJRio de Janeiro

Cantina - Ofi cina de Culinária

Produção e Venda de Alimentos

R. Ramiro Magalhães, 521, Engenho de Dentro, CEP: 20730-460

(21) 3111-7490/7489

continuação

continua

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RJRio de Janeiro

Cantina Arte Paladar

Quentinhas, Produtos de Padaria e Confeitaria, Coffee Break e Buffet

Instituto Municipal Nise da Silveira R. Ramiro Magalhães, 521 - Engenho de Dentro CEP: 20730-460

(21) 3111-7452/7454/7457

[email protected]

RJRio de Janeiro

Cantina Flor do Rio

Gêneros Alimentícios Industrializados

Estrada Rodrigues Caldas 3.400, Taquara CEP:22713370

(21) 2456-7573/2446-5177 R. 269

[email protected]

RJRio de Janeiro

Cantina Ofi cina das Delícias

Refeições, Lanches e Bebidas

Estrada Rodrigues Caldas 3.400, Taquara CEP:22713370

(21) 2456-7543 [email protected]

RJRio de Janeiro

Espaço Aberto à Produção (Eap)

Bijouterias, Pinturas em Tecidos, Arranjos de Flores de Meia de Seda

R. Ribeiro Dantas, 571, Guilherme da Silveira-bangu CEP: 21870-17

(21) 3331-8500/0587 R. 256

[email protected]

RJRio de Janeiro

Espaço e Arte Papel Reciclado

Instituto Municipal Nise da Silveira R. Ramiro Magalhães, 521 - Engenho de Dentro CEP: 20730-460

(21) 3111-7452/7454/7457

RJRio de Janeiro

Harmonia Mix

Venda de Alimentos, Artesanatos, Bijouteria, Biscuit, Sabonete e Estacionamento

Pça. Cel Assunção, s/n.º, Saúde, CEP: 20220-480

(21) 2233-5518 [email protected]

RJRio de Janeiro

Jóias da Amazônia

Bijouterias com Sementes da Amazônia

Estrada de Inhoaíba, Campo Grande, CEP: 23063-010

(21) 2503-2223 [email protected]

RJRio de Janeiro

Ofi cina de ArtePotes de Argila, Estamparias

Av. Paranapuã, 435, Freguesia, Ilha do Governador, CEP: 2191001

(21) 3402-8132 [email protected]

RJRio de Janeiro

Ofi cina de Artesanato

ArtesanatoEstrada Rodrigues Caldas 3400, Taquara CEP: 22713370

(21) 2456-7543 [email protected]

RJRio de Janeiro

Ofi cina de Artesanato

Bijouterias e Pinturas em Panos de Prato

Pça. Major de Melo, 13 Fds Pam Carlos Alberto Nascimento, Campo Grande, CEP: 23045-400

(21) [email protected]

RJRio de Janeiro

Ofi cina de Artesanato - Cooperativa Mãos à Obra

Confecção de Roupas, Bijouterias, Objetos Artesanais Diversos

R. Senador Camará, 224, Santa Cruz, CEP: 23515-020

(21) 3157-5723/3156-9046

[email protected]; [email protected]

RJRio de Janeiro

Ofi cina de Bijouteria

BijouteriasR. Venceslau Brás, 71, Fds, Botafogo, CEP: 22290-140

(21) 2895-9549 R. 239

RJRio de Janeiro

Ofi cina de Bijouteria

BijouteriasEstrada de Inhoaíba, Campo Grande, CEP: 23063-010

(21) 3402-8132

RJRio de Janeiro

Ofi cina de Bijouteria

BijouteriasR. Ramiro Magalhães, 521, Engenho de Dentro, CEP: 20730-460

(21) 3111-7490/7489

RJRio de Janeiro

Ofi cina de Bijouteria

Bijouterias em Geral

R. Dois de Fevereiro, 785, Engenho de Dentro, CEP: 20730-450

(21) 3111-7512 [email protected]

RJRio de Janeiro

Ofi cina de Bijouteria

BijouteriasAv. Venceslau Brás, 71/fds Botafogo CEP: 22290-290

(21) 2610-1360/2295-9549 R239

graç[email protected]

continua

continuação

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125S a ú d e M e n t a l e E c o n o m i a S o l i d á r i a : I n c l u s ã o S o c i a l p e l o T r a b a l h o

RJRio de Janeiro

Ofi cina de Bijouteria do Grupo de Mulheres Uta - Trasmutação

BijouteriasAv. Venceslau Brás, 65 Botafogo CEP:22290-140

(21) 2542-3049 R. 2044-2045

[email protected]

RJRio de Janeiro

Ofi cina de Chocolate

Chocolate, Bombons e Pirulitos

R. Capitão Aliatar Martins, 231, Irajá, CEP: 21220-660

(21) 2481-2036/2481-2110

RJRio de Janeiro

Ofi cina de Costura e Bijouteria

Roupas e Bijouterias

R. Ramiro Magalhães, 521, Engenho de Dentro, CEP: 20730-460

(21) [email protected]

RJRio de Janeiro

Ofi cina de Culinária

Alimentos em Geral

Estrada de Inhoaíba, Campo Grande, CEP: 23063-010

(21) 3402-8132

RJRio de Janeiro

Ofi cina de Culinária

Alimentos em Geral

R. Ribeiro Dantas, 571, Bangu, CEP: 21870-170

(21) [email protected]

RJRio de Janeiro

Ofi cina de Culinária - Cooperativa Mãos À Obra

Biscoitos, Doces, Salgados em Geral

R. Senador Camará, 224, Santa Cruz, CEP: 23515-020

(21) 3157-5723/3156-9046

[email protected]; [email protected]

RJRio de Janeiro

Ofi cina de Marcenaria do Cais

Móveis e Artigos de Decoração

Av. Venceslau Brás, 65 Botafogo CEP:22290-140

(21) 2542-3049

RJRio de Janeiro

Ofi cina de Pintura

QuadrosAv. Venceslau Brás, 71/fds Botafogo CEP:22290-290

(21) 2295-9549

RJRio de Janeiro

Ofi cina de Puffs de Garrafas Pet

Puffs de Garrafas Pet

R. Ramiro Magalhães, 521, Engenho de Dentro, CEP: 20730-460

(21) 3111-7490/7489

RJRio de Janeiro

Ofi cina de Reciclagem

Objetos de Decoração e Utilidades

R. Dois de Fevereiro, 785, Engenho de Dentro, CEP: 20730-450

(21) [email protected]

RJRio de Janeiro

Ofi cina de Sabonete e Velas

Sabonetes e VelasR. Capitão Aliatar Martins, 231, Irajá, CEP: 21220-660

(21) 2481-2036/2481-2110

RJRio de Janeiro

Ofi cina de Sucata

Pastas para Eventos, Porta- Cartão, Cadernos, Blocos e Agendas

R. Capitão Aliatar Martins, 231, Irajá, CEP: 21220-660

(21) 2481-2036/2481-2110

RJRio de Janeiro

Ofi cina de Trabalho - Bolsa Trabalho

Prestação de Serviços e Capacitação dos Usuários para o Trabalho

Av. Venceslau Brás, 71/fds Botafogo CEP: 22290-290

(21) 2610-1360/2295-9549 R239

graç[email protected]

RJRio de Janeiro

Ofi cina do Fazer

Bijouterias

Av. Paranapuã, 435, Freguesia, Ilha do Governador, CEP: 21910-001

(21) [email protected]

RJRio de Janeiro

Papel Pinel

Objetos de Artesanais em Papel e Tecido, Reciclagem de Papel

Av. Venceslau Brás, 65 Botafogo CEP: 22290-140

(21) 25423049 R. 2087

[email protected]

RJRio de Janeiro

Projeto Bolsa Usuário

Atividades de Estágio Remunerado

R. Ribeiro Dantas, 571, Guilherme da Silveira-Bangu CEP: 21870-170

(21) 3331-8500/0556 R256

[email protected]

RJRio de Janeiro

Projeto Coco Verde

Venda de Água de Coco

Av. Venceslau Brás, 65, Botafogo CEP: 22290-140

(21) 2542-3049 R. 2034

[email protected]

RJRio de Janeiro

Projeto Deixa Comigo

Capacitação para o Trabalho

Itinerante (21) 2503-2225 [email protected]

continua

continuação

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126 S a ú d e M e n t a l e E c o n o m i a S o l i d á r i a : I n c l u s ã o S o c i a l p e l o T r a b a l h o

RJRio de Janeiro

Projeto Feira Livre - Saindo para o Trabalho

Artesanato Variado

R. Dr. Leal, 706, Engenho de Dentro, CEP: 20730-460

(21) 3111-7455

RJRio de Janeiro

Se Meu Armário Falasse

Roupas, Sapatos e Acessórios

R. Ribeiro Dantas, 571, Guilherme da Silveira-Bangu CEP: 21870-170

(21) 3331-8500/0587 R256

[email protected]

RJRio de Janeiro

Shoppinel

Venda de Produtos Feitos nas Ofi cinas de Marcenaria, Velas e Bonecas, além de Roupas e Acessórios Doados

Av. Venceslau Brás, 65 Botafogo CEP: 22290-140

(21) 2542-3049 R. 2103/2104/2113

[email protected]

RJRio de Janeiro

Silk-screenCamisetas para Eventos

R. Capitão Aliatar Martins, 231, Irajá, CEP: 21220-660

(21) 2481-2036/2481-2110

RJRio de Jeneiro

Ofi cina de Bijouteria

Colar, PulseirasR. Filomena Nunes, 299, Olaria, CEP: 21021-380

(21) 2590-3892

RJRio dejaneiro

Brechó

Tratamento das Peças de Vestuários e Venda

Av. Paranapuã, 435, Freguesia, Ilha do Governador, CEP: 2191001

(21) 3402-8132 [email protected]

RS BagéOfi cinas de Criação Coletiva

ArtesanatoR. Marechal Floriano, Centro CEP: 96400-970

(53) 247-32487 [email protected]

RSCaxias do Sul

Gerando Arte Artesanato em EvaPlácido de Castro, 733, Exposição, CEP: 95084-370

(54) [email protected]

RS PanambiOfi cinas de Artesanato

ArtesanatoR. Paissandú, 49, Centro CEP: 98280-000

(55) 3375-5050

RSPorto Alegre

Geração-Poa

Artesanato, Assessoria, Incubação de Grupos de Gestão Solidária, Campo de Estágio

Av. Mariante, 500, Rio Branco CEP: 90430-100

(51) [email protected]

SC Florianópolis

Associação dos Usuários do Caps Ponta do Coral

ArtesanatoR. Rui Barbosa, 713, Fds, Agronômica CEP: 88025-301

(48) 2289-0909/228-5074

SC Joinville

Repart-associação de Recuperação Pelo Trabalho

Artesanato e Trabalho Formal

R. Antonieta de Barros, 14 Floresta CEP: 88025-310

(47) [email protected]

SE AracajuOfi cina de Artesanato

ArtesanatosR. Firmino Fontes, s/n.º, Atalaia Velha CEP: 49000-000

(79) 3179-4621 [email protected]

SP CampinasCasa das Ofi cinas

Artesanato e Culinária

R. Tiradentes, 882 Centro CEP: 13023-191

(19) [email protected]

SP CampinasCestaria de Jornal d Revista

Cestas, Lixeiras, Pastas, Porta- Canetas e Porta- CD´s

R. Antônio Prado, 430, CEP: 13106-042

(19) [email protected]

SP CampinasCosturando Imaginação

Cortinas, Almofadas, Aventais, Panos de Prato e Cachecóis

R. Antônio Prado, 430, CEP: 13106-042

(19) [email protected]

SP CampinasEspaço Ateliê e Arte

PinturasR. Antônio Prado, 430, CEP: 13106-042

(19) [email protected]

continuação

continua

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127S a ú d e M e n t a l e E c o n o m i a S o l i d á r i a : I n c l u s ã o S o c i a l p e l o T r a b a l h o

SP CampinasOfi cina Agrícola - Not

Horta e Jardinagem / Limpeza de Chácaras

R. Antônio Prado, 430, CEP: 13106-042

(19) 3258-7599/ 3758-8603

armazemofi [email protected]

SP CampinasOfi cina de Artesanato e Papel Reciclado

Artesanato, Papel Reciclado, Pães e Doces

Av. Maria Luiza Pompeu de Camargo, 199, J Campineiro CEP: 13582-270

(19) [email protected]

SP CampinasOfi cina de Construção - Not

Reformas e Manutenção

R. Antônio Prado, 430, CEP: 13106-042

(19) 3258-7599/ 3758-8603

armazemofi [email protected]

SP CampinasOfi cina de Culinária - Not

Produção de Doces, Salgados e Pães / Organização de Festas e Eventos

R. Antônio Prado, 430, CEP: 13106-042

(19) 3258-7599/ 3758-8603

armazemofi [email protected]

SP CampinasOfi cina de Marcenaria - Not

Luminárias, Porta- Velas em Bambu e Brinquedos

R. Antônio Prado, 430, CEP: 13106-042

(19) 3258-7599/ 3758-8603

armazemofi [email protected]

SP CampinasOfi cina de Mosaico - Not

Tampos de Mesa, Aparadores e Objetos de Decoração

R. Antônio Prado, 430, CEP: 13106-042

(19) 3258-7599/ 3758-8603

armazemofi [email protected]

SP CampinasOfi cina de Reciclagem de Papel - Not

Reciclagem de Papel

R. Antônio Prado, 430, CEP: 13106-042

(19) 3258-7599/ 3758-8603

armazemofi [email protected]

SP CampinasOfi cina de Serralheria - Not

Estruturas de FerroR. Antônio Prado, 430, CEP: 13106-042

(19) 3258-7599/ 3758-8603

armazemofi [email protected]

SP CampinasOfi cina de Velas - Not

Velas Artesanais e Decorativas

R. Antônio Prado, 430, CEP: 13106-042

(19) 3258-7599/ 3758-8603

armazemofi [email protected]

SP CampinasOfi cina de Vitrais - Not

Abajures, Lustres, Porta-Velas e Vitrais

R. Antônio Prado, 430, CEP: 13106-042

(19) 3258-7599/ 3758-8603

armazemofi [email protected]

SP CampinasOfi cina de Vitral Plano - Not

Vitrais Planos para Portas e Janelas

R. Antônio Prado, 430, CEP: 13106-042

(19) 3258-7599/ 3758-8603

armazemofi [email protected]

SP CampinasOfi cina Gráfi ca - Not

Artesanato em Papel

R. Antônio Prado, 430, CEP: 13106-042

(19) 3258-7599/ 3758-8603

armazemofi [email protected]

SP Campinas Portal das Artes ArtesanatoR. Boaventura de Lemos, 590, CEP: 13100-135

(19) [email protected]

SP CampinasProjeto de Parceria - Not

Trabalho Formal (Empresas/instituições)

R. Antônio Prado, 430, CEP: 13106-042

(19) 3258-7599/ 3758-8603

armazemofi [email protected]

SP Campinas Salão de Beleza Cortes de CabeloR. Antônio Prado, 430, CEP: 13106-042

(19) [email protected]

SP CampinasTear das Artes - Mania por Recheio

Venda de Pastéis, Refrigerante e Salgados

R. Benedito Roberto Barbosa, 11, Pq. Universitário CEP: 13056-460

(19) 3266-8006/3266-5656

[email protected]

SP CampinasTear das Artes - Primeiro Emprego

Desenvolvimento de Atividades na Brinquedoteca / Biblioteca do Centro de Convivência Tear das Artes com Crianças da Comunidade

R. Benedito Roberto Barbosa, 11, Pq. Universitário CEP: 13056-460

(19) 3266-8006/3266-5656

[email protected]

SP CampinasTear das Artes - Renda Mínima

Pães, Salgados e Doces

R. Benedito Roberto Barbosa, 11, Pq. Universitário CEP: 13056-460

(19) 3266-8006/3266-5656

[email protected]

continuação

continua

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128 S a ú d e M e n t a l e E c o n o m i a S o l i d á r i a : I n c l u s ã o S o c i a l p e l o T r a b a l h o

SP Campinas Viver BemCrochê, Fuxico, Pintura e Reciclável

R. das Castanheiras, 47, Vila Boa Vista CEP: 13065-430

(19) 3245-2662/3245-1259

[email protected]

SP Diadema

Bazar do Espaço Fernando Ramos da Silva

Artesanato e Quadros

Av. 7 de Setembro, 18, Vila Nova Conceição, CEP: 09912-010

(11) [email protected]; [email protected]

SPMogi das Cruzes

Loucos pela Vida

Culinária, Bazar e Reciclagem

R. Princesa Isabel de Bragança, 411, Centro, CEP: 08710-460

(11) 47277065 [email protected]

SP PiracicabaOfi cinas de Geração de Renda

Papel Reciclado, Mosaico, Tear, Móveis com Pátina

R. Bela Vista, 665, Vila Independência CEP: 13400-100

(19) 34333148/34113707

[email protected]

SP SantosProjeto Lixo-limpo

Coleta Seletiva de Lixo do Município

R. Alexandre Martins, 129 - Aparecida, CEP: 11025-201

(13) 3238-0195 [email protected]

SP SantosProjeto Produção e Vendas

Venda de Artesanatos em Mosaico e Reciclados / Biscoitos, Doces e Salgados

R. Alexandre Martins, 129 - Aparecida, CEP: 11025-201

(13) 3238-0195 [email protected]

SP SantosProjeto Sabor Saúde

Três Treillers de Venda de Lanches, Doces e Salgados

R. Alexandre Martins, 129 - Aparecida, CEP: 11025-201

(13) 3238-0195 [email protected]

SP Santos Projeto Terra

Jardinagem, Cultivo e Venda de Mudas, Plantas e Ervas Medicinais e Temperos

R. Alexandre Martins, 129 - Aparecida, CEP: 11025-201

(13) 3238-0195 [email protected]

SP São PauloAssociação Anima

Fabricação e Comercialização de Batatas Fritas

R. Dr. Cândido Espinheira, 616, Perdizes, CEP: 05004-000

(11) 3672-2000/3622-9044/3872-6221

[email protected]; [email protected]

SP São PauloBrechó Arca da Fuzarca e Sebo Sebáceo

Roupas, Objetos Usados

R. Dr. Cândido Espinheira, 616, Perdizes, CEP: 05004-000

(11) 3672-2000/3622-9044/3872-6221

[email protected]; [email protected]

SP São Paulo

Cooperativa Inventando Arte- Agulhas e Linhas

Roupas, Bolsas e Decoração

R. Dr. Cândido Espinheira, 616, Perdizes, CEP: 05004-000

(11) 3672-2000/3622-9044/3872-6221

[email protected]; [email protected]

SP São PauloOfi cina de Artes

Artes em Geral

R. 24 de Maio, 116 - 4.º andar - Salas 36 E 37, República, CEP: 01041-000

(11) 3337-6049 [email protected]

SP São Paulo

Ofi cina de Culinária - Associação Anima

Bolachas, Bombons e Outros

R. Dr. Cândido Espinheira, 616, Perdizes, CEP: 05004-000

(11)-3672-2000/622-9044/3872-6221

[email protected]; [email protected]

continuação

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129S a ú d e M e n t a l e E c o n o m i a S o l i d á r i a : I n c l u s ã o S o c i a l p e l o T r a b a l h o

Anexo C - Entidades de Assessoria e Fomento à Economia Solidária

Nome UF Entidade/Empreendimento Endereço Postal CEP Endereço Eletrônico Telefone

REPRESENTANTES DOS ESTADOS:

Antonio Messias Nogueira de Souza

AC

Colônia de Pescadores Profi ssionais e Amadores de Feijó - 2-04

Rua Pedro Alexandrino, 396, Bairro Bela Vista CEP:69960-000 Feijó – AC

[email protected]

Contato DRT:Maria.Raimunda: (68) 223-2601/ 9971-0011/ 223-3578

Carlos Omar da Silva

AC

Associação de Serviços e Produtos Estrela da Terra (Aspet)

Rua 3 de Junho, 216 – Bairro Alto Alegre

[email protected]

(68) 3228-0852/9972-6787

Francisca Maria Lima Matias

ACRede Acreana de Jovens em Ação (Reaja)

Conjunto Habitasa Q-E c.12/575, Rua Peru – Bairro Cerâmica

69900-270 [email protected](68) 223-5870/9984-6541

Jairo José Silva ALCáritas Arquidiocesana

Conjunto João Sampaio I, Quadra 33 n.º 76 – Tabuleiro dos Martins – Maceió

[email protected](82) 332-2391/ 9982-7450/223-5648

Martiene Alves da Silva

ALConj. Guriatã, Q. 9, n.º 12 – Tabuleiro do Pinto – Maceió

57075-030(82) 352-3494/8816-2247

Meiryvania Vieira da Silva

ALRua São Nicolau, 81 – Bairro Brasília – Arapiraca

57313-130 [email protected](85) 530-3002/8809-0211

Gielyzandra Cruz da Silva

AM FucapiRua Almerom Caminha, 112 – Conj. Jardim Petrópolis

69067-200 [email protected]

(92) 9984-5135/663-7875/611-1235/614-3018

Janiel Oliveria Cundes

AMMov. Com. Vida Esperança

Rua 1, n.º 12 – Monte Sinai – Manaus

69093-263 [email protected](92) 645-9955/8132-2950

João Batista Dutra Prestes

AMEcoturismo Solidário

Rua Jaith Chaves, s/n.º – Vila da Felicidade – Porto da Ceasa

[email protected]

(92) 615-3362/91664813

Antonio Luís Silva Santos

AP Talher AmapáAv. Felipe Camarão, 1.247 – Buritizal – Macapá

68902-060 [email protected](96) 224-3641/9118-2869

Edson do Carmo Costa

AP Artesanato TucumãRua Goiabeira, n.º 256 – Bairro Brasil Novo – Macapá

60900-000 (96) 8111-0381

Maria Dorama Cardoso

AP

Associação das Mulheres Negras da Ilha Redonda/Pastoral da Criança

Rua Luiza Picanço, 33 – Bairro São Lázaro – Macapá

(96) 251-6161 (orelhão), 251-2611(vizinha)

Débora Nunes BA Unifacs [email protected](71)337-1131/203-2592/203-2572

Ivonete de Oliveira Silva

BA

Grupo de Economia Solidária da Bahia (GEP) – Vitória da Conquista

[email protected], [email protected]

(77)423-3049/9963-5007

Luciene Cruz de Andrade

BAFórum de Cooperativas Populares

Rua Cristiane, 176E – Tancredo Neves – Salvador

[email protected]

(71)462-1289, 9945-3443

Maria Eliane Rodrigues de Sousa

CE FundasolRua Coronel João Correa, 3.880 – Granja Lisboa – Fortaleza

(85) 3245-1785

Francisco José de Lima Santiago

CEAssociação Santo Dias

Av. Nossa Senhora de Lourdes, 54 – Santa Fé – Fortaleza

[email protected], [email protected]

(85) 3274-5059

continua

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130 S a ú d e M e n t a l e E c o n o m i a S o l i d á r i a : I n c l u s ã o S o c i a l p e l o T r a b a l h o

Raimundo Filho dos Santos

CERua Tenente José Vicente, 303 – Bairro São Sebastião – Itapipoca

(88) 3631-3620

Domingos Olimpio

DF [email protected]

(61) 501-3131/9945-2274

Maria de Lourdes Oliveria

DF [email protected]

(61) 348-8160/369-2544/8146-0478

Naida Varela DF Pátria [email protected]/[email protected]

(61) 347-3136/380-2972

Edson Machado Ferreira

ES Projeto [email protected]

(27) 3251-4486, 3328-2833

Francisnei Freitas do Nascimento

ESRua Finlândia, 28, QD. 1 – Setor Europa – Bairro Cidade Continental

29163-520 [email protected], [email protected]

(27) 3328-8787/ 342-3610/ (27) 8814-5453

Valdemir Anchesqui

ESRua Di Cavalcante, 6 – Cond. Maison du Soleil – Interlagos III – Vila Velha

[email protected]

(27) 9987-8487/3382-3710

Angelo Cavalcante

GO

Dona Maria Cecília Figueiredo, quadra 14, lote 17, Conjunto Caiçara Goiânia

[email protected]

(62) 5242-304/9933-8330

Nelson Gomes de Moraes

GO

Conselho de Desenvolvimento de Joanápolis e Região

Rua João Gomes, quadra F, lote 12 – Distrito de Joanópolis

75157-000 [email protected](62) 9605-2623/9995-2623

Sônia Lopes Faria

GOAssociação do Banco do Povo

Rua P-13, n.º 9, ap. 6 – Setor dos funcionários – Goiânia

74543-260 [email protected] (62) 9986-2255

Manoel Conceição Santos

MA

Centru – Central de Cooperativas Agroextrativistas do Maranhão (CCAMA)

Rua Brasil, 794 – Bairro Nova Imperatriz – Imperatriz

65907-330 [email protected](99) 3525-3880/3527-3384

Manoel Rodrigues de Souza

MA

Cooperativa dos Pequenos Produtores de Esperantinópolis (Coopaesp)

[email protected]

(99)642-2152/ 2061

Valdener Pereira Miranda

MA Assema ComércioRua Ciro Rego, 218 – Centro – Pedreiras

[email protected]

(99) 3642-2152/ (98) 9966-1773

Paulo Cesar Lacerda de Oliveira

MG FMEPSRua Edmir Leão, 198 – Arcadia – Contagem – MG

[email protected]

(31) 3352-1495, 9638-9052

Rodrigo Pires Vieira

MG Cáritas [email protected]

(31)3412-8743/9783-8957

Vanderli Pereira Pinheiro

MG ApatRua Conselheiro Torres, 598 – Centro – Tombos

36844-000 [email protected] (32) 375-1174

Getulio Raimundo de Lima

MS [email protected], [email protected]

(67) 325-6560/9995-1143

Sebastiana Almire de Jesus

MSSindicato dos Artesãos de Mato Grosso do Sul

Rua Guaraí, 1.315 – Bairro Guanandi – Campo Grande

79086-270 [email protected](67) 385-8083/ 9973-3715

Vandelis Mamedis

MSAldeia Buriti – Sidrolândia

(67) 2431298, 243-1228/99243699

Clovis Vailant MT Unemat Av. São João, 1.095 – Bairro Cavalhada – Cáceres

78200-000 [email protected](65)96145176/ 661-5030/625-8738

Nicolau Priante Filho

MTCooperativa Coorimbatá

R. dos Eucaliptos, quadra 15, casa 7 – Jardim das Palmeiras – Cuiabá

78080-130 [email protected](65)661-5030/ 9962-0047/615-8738

continuação

continua

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131S a ú d e M e n t a l e E c o n o m i a S o l i d á r i a : I n c l u s ã o S o c i a l p e l o T r a b a l h o

Wilton Figueiredo Seixas

MT

Programa de Inclusão Social Mãos Amigas (Prisma)

Comunidade de São Pedro – Bairro Alvorada – Cuiabá

78048-690 [email protected] (65) 642-2638

Crispim Lemos Wanderley

PA

Associação de Empreendedores de Marituba (ADSMAR)

Rua Boa Vista,1.240 – Centro – Marituba

[email protected]

(91) 256-3440/8811-1270 Fax:2563706

Joana Mota Palheta

PAFórum de Empreendedores Populares

Rua Presidente Dutra, Alameda Mota, n.º 2 – Bairro Taperuá – Belém

[email protected], [email protected]

(91)258-3195/9632-2138

Wilson Pereira Costa

PARua São Miguel, Praça São Francisco, 75 – Cremação – Belém

66045-410 [email protected](91) 246-6202 R. 222/8806-5791

Angela Maria Metri Tejo

PB UnitrabalhoRua Antonio Joaquim Pequeno, 170 – Campina Grande

58108-085 [email protected] (83) 333-2869

Maria Ivanise Gonçalves de Lima

PB Espaço de Criação

Rua José Clemente Azevedo, 146 – Bairro Malvinas – Campina Grande

58108-303 [email protected] (83) 339-1867

Luiz Damazio de Lima

PBFeira Agroecológica da Várzea Paraibana

Assentamento Padre Gino Sapé

58340-000 (83) 9994-0640

Karla de Goes Ferraz Gonçalves

PERua Engenheiro Teófi lo de Freitas, 30, ap. 1.801 – Derby

52010-190 (81) 9997-2524

Lenivaldo Marques da Silva Lima

PE Harmonia CatendeRua B, n.º 5 – Bairro São José Palmares

55540-000 [email protected](81) 3673-1527/ 9986-7485

Rosana Oliveira Pontes de Souza

PE Av. 30 de Outubro, 621 – Jardim São Paulo – Recife

50790-130 [email protected](81)3423-2800/9141-0811

Durval Gomes de Moura

PI Obra Kolping(86) 9975-0688/222-2031

Maria dos Remédios Silva Lima

PI (86) 231-5908

Tania Mendes Freitas Barbosa

PIUnião das Mulheres Piauienses

Rua Venceslau Braz, 5.275 – Bairro Lourival Parente – Teresina

64022-350 [email protected](86) 222-6077/9994-6396

José Selvino de Abreu

PRCooperativa de Produção de Amidos

Rua Minas Gerais, 2.330 – Bairro Vila Rica – Santa Helena

85892-000 [email protected](45) 268-3181/268-3770

Lourdes Marchi PR Cefuria

[email protected], [email protected]/ [email protected]

(41) 3013-5660/349-5653 Fax: 322-8487

Valter Antonio Maier

PR Universidade [email protected], [email protected]/9927-9407 Fax:310-2732

Ary Moraes RJ Quilombo da SerraR. Prefeito Sebastião Teixiera, 94, ap. 105 – Bairro Várzea – Teresópolis

25953-200 [email protected] (21) 2643-2013

Josinete Maria Pinto ou Adriana Bezerra Cardoso

RJ CedacRua Benjamim Constant, 108 – Bairro Glória – Rio de Janeiro

Márcia Cristina Lima

RJPlaneta dos Bonecos – AGP

Rua São Petersburgo, n.º 15 – Bairro Bangu – Rio de Janeiro

21862-000(21) 9275-4954/3331-2698

Ana Lucia dos Santos

RNCooperativa Sumambé

Rua Romualdo Fontoura, 64 – Centro – Santo Antônio

59255-000 (84) 282-2984

continuação

continua

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Simone Lima da Silva

RNAssociação de Mulheres L.G

Rua Bela Vista, 115 – Distrito Diogo Lopes – Macau

[email protected](84) 521-9167/9038-9264

Sudineide Joaquim Alves

RN Grupo Colmeia

Walter Duarte Pereira, Condomínio Colina dos Flamboyants, ap. 201, bloco 19 – Bairro Capim Macio – Natal

59082-470 [email protected](84) 217-2783/ 8822-5210

Edmar de Paula Monteiro

RO

Cooperativa Agroambiental de Rondônia (Cootraron)

Av. Rio Madeira, Bairro Agenor de Carvalho

[email protected]

(69) 581-2823/9217-4039

Maria Dalvani de Souza

RO CoopaçaíR. Mirador, 2.158 – Conj. Rio Guaporé – Castanheira – Porto Velho

78900-000 [email protected](69) 227-0120/ 216-8800/ 9283-4515

Urias Sergio Dutra

RO

Cooperativa dos Produtores Rurais Organizados para Ajuda Mútua (Coocaram)

Rua Vilagran Cabrita, 794 – Bairro Urupá – Ji–Paraná

78962-560 [email protected](69) 421-3513/9966-1172

Elenir Maruai RRPastoral Indígena da Cidade (PIC)

Rua Rio São Francisco, 425 – Bairro Bela Vista – Boa Vista

[email protected]

(95) 628-3888/623-1284

Joeldiléia Silva Rocha

RRRua Governador Aquirino Mota Duarte, 42 – Jardim das Copaíbas – Boa Vista

Virlândia (DRT) (95) 623-9612/9611

Virlandia Lacerda Diniz Alcoforado

RR DRTAvenida Major Williams, 1.549 – Centro – Boa Vista

69301-110 [email protected] (95) 623-1284

Adiles Oliveira da Silva

RSProjeto Coesperança Santa Maria

[email protected]

(55) 221-1713/9976-7857

José Inácio Konsen

RS Camp [email protected](51) 3233-4101/9991-5886 Fax:3231-7523

Nelsa Ines Fabian Nespolo

RSCooperativa Univens

Rua Esperança, 25 – Sarandi – Porto Alegre

[email protected]

(51) 3364-1298, (51) 9834-6879

Idalina Maria Boni

SC Fio Nobre Itajaí fi [email protected](47) 246-4134/ 9132-7244

Sandra A S Schlichting

SCCáritas Santa Catarina

[email protected] oripa.org.br

(48) 9968-9390Telefax: 2248776,

Silvio Antonio Diehl

SC IpagriLinha Olímpio – Guaraciaba

[email protected]

(49) 645-0133/ 645-0159 R. 24

Aldemira de Gois Santos

SERua São Cosme Colônia, 13, n.º 207, Lagarto–Se

(79) 271-1306

Laudice Lima dos Santos

SE

Bordadeiras da Comunidade de Piebetá Monte Serrat

Rua D3, n.º 2524, Bairro Piabetá – Nossa Senhora do Socorro – Monte Sinai

[email protected]

(79) 256-1907

Wladimir Sergio Souza

SE Drt [email protected], [email protected]

(79) 211-3053/9978-0683

Edgar Aparecido de Moura

SPFrente Parlamentar de São Paulo

Rua Custódio Martins, 190 – Jardim Elba – São Paulo

03980-010 [email protected](11) 388-6658/6642/9295-1053

Oscarina Camillo

SPCooperativa de Psicólogos Mútua-Ação

Rua Carijós, 3.113 – Jardim Progresso – Santo André

[email protected], [email protected]

(11) 4972-5696/ 4427-5941/9358-4508

Walmir José de Almeida

SP Cooperinca [email protected] (11) 4399-9077

Edina Ferreira da Silva

TOCooperativa de Trabalho e Moradia de Palmas

[email protected]

(63) 224-5314/9207-7302

Erivelton da Silva Santos

TO [email protected]

(63) 3218-6021/8407-1186

continuação

continua

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133S a ú d e M e n t a l e E c o n o m i a S o l i d á r i a : I n c l u s ã o S o c i a l p e l o T r a b a l h o

Ivon Wilson da Silva

TO

Cooperativa Cultural do Tocantins (Coopercult)

108 Sul, Al. 2, lote 62 – Centro – Palmas

77001-875 [email protected] (63) 3026-7133

REPRESENTANTES DE ENTIDADES NACIONAIS:Ademar Bertucci

DF Cáritas Brasileira

Benedito Anselmo Martins de Oliveira

MGRede de Incubadoras

Rede de Incubadoras [email protected] (35) 3826-6585

João José Correa – Suplente: Rosemary Gomes

PA Fase Fase [email protected](91) 9112-2458/4005-3763

João Roberto Lopes

RJ Ibase Ibase [email protected] (21) 3509-0660

Luiz Humberto Verardo

SP AnteagRua Mauá, 36 – Bairro da Luz – São Paulo

[email protected] ou [email protected];.br

(11) 3313-5426/ 4230

Marcos Arruda – Suplente: Ruth Nunes Spindola

RJ Pacs [email protected]

(21) 9382-5819/ 2210-2124

Maria da Conceição Almeida

SE Unitrabalho Rua José Alves das Neves, 20 – Bairro Luzia – Aracaju

49045-380 [email protected] (79) 9977-9020

Maria Eunice Wolf

SP ADS/CUT ADS/[email protected]

(11) 2108-9218 (51) 9973-4039

Maria Lucia MG Rede de [email protected]/[email protected]

(31) 3277-4046/9187-0891

Sandra Magalhães

CERede de Socio- economia Solidária

Rede Socio- economia Solidária

[email protected](85) 9955-6877/9603-1437

continuação

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EDITORA MSCoordenação-Geral de Documentação e Informação/SAA/SE

MINISTÉRIO DA SAÚDE

(Normalização, revisão, editoração, impressão, acabamento e expedição)SIA, Trecho 4, Lotes 540/610 – CEP: 71200-040Telefone: (61) 3233-2020 Fax: (61) 3233-9558

E-mail: [email protected] page: http://www.saude.gov.br/editora

Brasília – DF, julho de 2005OS 0661/2005

A coleção institucional do Ministério da Saúde pode ser acessadagratuitamente na Biblioteca Virtual do Ministério da Saúde:

http://www.saude.gov.br/bvs

O conteúdo desta e de outras obras da Editora do Ministério da Saúdepode ser acessado na página:

http://www.saude.gov.br/editora