questões de alexis de tocqueville
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Análise comparativa de Tocqueville referente a Revolução Francesa: porque ocorreu na França e não na Inglaterra.TRANSCRIPT
UNIVERSIDADE PARANAENSE – UNIPAR
HISTÓRIA – CAMPUS CASCAVEL
MARCOS SOARES DASILVA
SUZANE DO PRADO
QUESTÕES DE ALEXIS DE TOCQUEVILLE
CASCAVEL
2015
MARCOS SOARES DASILVA
SUZANE DO PRADO
QUESTÕES DE ALEXIS DE TOCQUEVILLE
Trabalho apresentado a disciplina de História Contemporânea, como parte dos requisitos para avaliação parcial do curso de Graduação em Licenciatura em História da Universidade Paranaense – UNIPAR.
Professora: Gisele Silva Santos
CASCAVEL
2015
PORQUE OS DIREITOS FEUDAIS SE TORNARAM MAIS ODIOSOS AO POVO
DA FRANÇA QUE EM QUALQUER OUTRO LUGAR.
Tocqueville principia evidenciando que o objetivo real da revolução era abolir
os direitos feudais e as instituições da Idade Média e neste sentido afirma que ela
não explode nos países onde estas instituições estavam mais conservadas, mais
fortes, inclusive onde a opressão sobre o povo era maior, mas ao contrário, ela
eclode nos locais onde esta opressão era menor e o povo, pelo menos um parte
dele, já havia conseguido um pedaço de terra. Refletindo sobre a vida do camponês
na França ele afirma:
O camponês ia e vinha onde queria, comprava vendia, negociava como o queria. Os últimos vestígios da servidão só se notavam numa ou duas províncias do leste que eram províncias conquistadas; tinham desaparecido do resto do país e sua abolição remontava a uma época tão longínqua que a sua própria data já fora esquecida. (TOCQUEVILLE, 1997, p. 71)
Eric J. Hobsbawm analisando o período menciona a concorrência
internacional entre Grã-Bretanha e França, onde a primeira já se destacava pela
política externa pelos interesses da expansão capitalista e a segunda não era uma
potência como ela. No entanto a França era a mais poderosa e mais típica das
velhas monarquias absolutas. Assim, “o conflito entre a estrutura oficial e os
interesses estabelecidos do velho regime e as novas forças sociais ascendentes era
mais agudo na França do que em outras partes. (HOBSBAWM, 2001, p. 73).
Tocqueville, escreve sobre a revolução francesa antes da influência marxista
que viria posteriormente enquanto Hobsbawm bebe diretamente desta fonte daí a
diferença nas possíveis origens da revolução colocada por cada um. O primeiro foca
na terra e o segundo no momento de transição econômica que está ocorrendo.
Hobsbawm vê na ascensão da burguesia ávida por uma maior expansão comercial e
maiores lucros um choque crucial com o regime vigente. Uma alteração no modo de
produção já havia se iniciado muitos antes, as forças de produção já haviam se
modificado substancialmente e ocasionava um processo de alteração das relações
de produção. Em relação a isso é pertinente mencionar, nesta mesma ótica, a
análise de Modesto Florenzano (1981, p. 18) “o fim da servidão e o aparecimento de
uma economia e burguesia mercantis, com predomínio do capital comercial, não são
incompatíveis com o feudalismo, pelo menos até um certo ponto”.
Alexis de Tocqueville afirma que entre as causa principais da revolução está
“o camponês que tornara-se proprietário de terras e, por outro lado, que escapara
por completo ao governo do seu senhor.” (TOCQUEVILLE, 197 , p. 75). Inicialmente
soa-nos um tanto estranha esta afirmação mas o autor informa que na França pré-
revolução já havia acontecido uma divisão de terras e mesmo após ela, a maioria
das terras do clero que foram confiscadas e vendidas, foram compradas por
pessoas que já possuíam outras terras, ou seja, o quadro não se alterou
significativamente. Segundo Tocqueville a causa principal do ódio aos direitos feudal
é justamente este apego a terra que se possibilitou ao proprietário plebeu: “o amor
do camponês pela sua propriedade rural é extremo e acendem-se nele todas as
paixões que a posse do solo desperta.” (TOCQUEVILLE, 1997, p. 72)
O que mais revoltava eram as cobranças injustas de impostos perpétuos
sobre a terra. A partir do momento em que o camponês se torna proprietário e
escapa do governo o senhor feudal, e passa a pagar impostos que o governo
cobrava de seu senhor, se esse camponês continuasse sobre o jugo de seu senhor
estaria livre das cobranças de altos encargos sobre a terra que agora possui. “O
feudalismo continua sendo a maior de todas as nossas instituições civis que deixou
de ser uma instituição política. Assim reduzida provocava muito mais ódio”.
(TOCQUEVILLE, 1997, p. 76)
COMO A DESTRUIÇÃO DA LIBERDADE POLÍTICA E A SEPARAÇÃO DAS
CLASSES FORAM A CAUSA DE QUASE TODAS AS DOENÇAS QUE MATARAM
O ANTIGO REGIME.
Tocqueville inicia o capítulo fazendo um paralelo entre Inglaterra e França as
vésperas da revolução. Ressalta que, apesar da aristocracia inglesa ser mais altiva
que a francesa, conseguiu se familiarizar com as classes que considerava inferiores,
com o objetivo de se manter no poder. Esta “flexibilidade” da aristocracia ocorreu
devido à certa liberdade política que se mantinha na Inglaterra, ao contrário do que
ocorria na França. Segundo o autor, a perda da liberdade política na França foi
crucial para a separação das classes.
Se os ingleses, a partir da Idade Média, tivessem perdido como nós a liberdade política (...), é muito provável que cada uma das diferentes classes que compõem sua aristocracia teria sido colocada à parte — como aconteceu na França e até certo ponto no resto do continente — e que juntas, ter-se-iam separado do povo. (TOCQUEVILLE, 1997, p. 117)
Explanando sobre a questão das isenções de impostos que ocorriam nos
dois países, informa que na Inglaterra do século XVIII é o pobre que goza de
isenções de impostos enquanto na França é o rico: “Lá, a aristocracia tomou a si os
encargos mais pesados para que lhe permitissem governar; aqui reteve até o fim a
isenção de imposto para consolar-se de ter perdido o governo!” (TOCQUEVILLE,
1997, p. 117). Desta forma, esta “defesa” que o aristocrata inglês faz ou pobre, o
mantem no poder. Como isso não ocorre na França, as classes tornam-se cada vez
mais isoladas e descontentes. O autor é enfático quando diz que a covardia da
nobreza francesa em permitir a taxação do terceiro estado, desde que continuasse
isenta, foi o princípio “de quase todos os vícios e quase todos os abusos que
revolveram o antigo regime durante o resto da sua vida e acabaram causando
violentamente sua morte” (TOCQUEVILLE, 1997, p. 118).
Soma-se a isso o fato de que o plebeu proprietário de terras precisava pagar
a impostos feudais ao nobre vizinho, o que Tocqueville (1997) refere-se como direito
de feudo-franco que, segundo o autor, passou a ser cobrado de forma veemente no
século XVIII. Também, por consequência da perda da liberdade política, a
aristocracia passa a lançar mão dos recursos que lhe restavam: “aumentou nível de
exploração sobre os camponeses e açambarcou todas as carreiras compatíveis com
a sua condição (exército, diplomacia, ministérios, etc.)” (FLOREZANO, 1981, p. 21).
A disparidade entre as classes, a questão dos impostos e a perda da liberdade
política dos nobres, também é evidenciada por Eric J. Hobsbawm:
As 400 mil pessoas aproximadamente que, entre os 23 milhões de franceses, formavam a nobreza, a inquestionável "primeira linha" da nação, (...). Elas gozavam de consideráveis privilégios, inclusive de isenção de vários impostos (mas não de tantos quanto o clero, mais bem organizado), e do direito de receber tributos feudais. Politicamente sua situação era menos brilhante. A monarquia absoluta, (...), tinha destituído os nobres de sua independência política e responsabilidade e reduzido ao mínimo suas velhas instituições representativas "estados" e parlements. (HOBSBAWM, 2001, p. 74):
A aristocracia queria maior influência política com o objetivo de se manter no
poder e por isso, após a morte de Luís XIV, buscou reativar os antigos tribunais com
o intuito de influenciar diretamente as leis. “De modo que, ao longo do século XVIII,
a nobreza em geral e a aristocracia em particular havia conseguido monopolizar
para si todo o aparelho do Estado, da Igreja e do Exército.” (FLORENZANO, 1981,
p. 23). Assim podia enrijecer a “casta” aristocrática mantendo os direitos e privilégios
advindos do feudalismo e a isenção de impostos ao mesmo tempo em que tentava
impedir a ascensão da burguesia tanto em seu seio como no Estado, por meio dos
cargos públicos.
Neste mesmo momento a burguesia se fortalecia e aumentava o seu
número. Esta burguesia em ascensão, via na aristocracia um objetivo a ser
alcançado, esta almejava se integrar às fileiras daquela, e a partir daí incluir-se nas
mesmas práticas, ou seja, abandonar as atividades mercantis e industriais passando
a usufruir dos mesmos privilégios da aristocracia. Mas “mesmo a rica e poderosa
burguesia financeira que fazia empréstimos ao Estado tinha dificuldade em penetrar
as fileiras da aristocracia.” (FLORENZANO, 1981, p. 23).
. Assim havia uma “queda de braço” entre aristocracia e burguesia. A
primeira se dizia superior alegando que possuía, por nascimento, aquilo que o
burguês tentava conseguir a duras penas. O burguês, por sua vez, tinha para com
ela uma atitude que era um misto de inveja e desprezo, agindo também na
contramão do objetivo da aristocracia, exigindo que o Estado abrisse as portas aos
cargos públicos. Estas questões distanciavam cada vez mais não só aristocracia e
burguesia em ascensão, mas também o campesinato, pelos motivos que já citamos,
conforme evidencia Hobsbawm:
...a nobreza não só exasperava os sentimentos da classe média por sua bem-sucedida competição por postos oficiais, mas também corroía o próprio Estado através da crescente tendência de assumir a administração central e
provinciana. (...) tentaram neutralizar o declínio de suas rendas usando ao máximo seus consideráveis direitos feudais para extorquir dinheiro (ou mais raramente, serviço) do campesinato. (...) Conseqüentemente [sic], a nobreza não só exasperava a classe média mas também o campesinato. (HOBSBAWM, 2001, p. 75):
Desta forma, conforme esclarece Florenzano (1981), a burguesia,
inicialmente interessada em se integrar ao Estado Absolutista, o serviu. No entanto,
sem abandonar este desejo, passa a ser influenciada por ideias iluministas que
revelavam as contradições do Antigo Regime e, como este não tinha capacidade de
realizar as reformas que a burguesia exigia, esta começa a se entusiasmar com o
liberalismo econômico que lhe permitiria tais reformas.
Por consequência, a partir da metade dos séculos XVIII, este feudalismo
modificado entra em crise e a expansão da indústria possibilita o desenvolvimento
de uma burguesia industrial que será atraída pelo acúmulo de capital e, com o intuito
de estabelecer o liberalismo econômico, se voltando contra a aristocracia e a
monarquia absolutista. Assim, esta separação de classe, na visão de Tocqueville, foi
o crime da antiga realeza e criou um ambiente propício para a revolução que
eclodiria e tonaria extinto o antigo regime.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
TOCQUEVILLE, A. de. O Antigo Regime e a Revolução. 4 ed. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1997.
FLORENZANO, M. As revoluções burguesas. São Paulo: Brasiliense, 1981.
HOBSBAWM, E. J. A era das revoluções: Europa 1789-1848. 15 ed. Rio de
Janeiro: Paz e Terra, 2001.