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O LIVRO DIGITAL: CATEGORIZAÇÃO, QUALIFICAÇÃO DAS INTERFACES E METADADOS Anderson Francisco Floriani Voltolini UFSC, Design - PIBIC [email protected] Berenice Santos Gonçalves UFSC, Departamento de Expressão Gráfica [email protected] Alexsandro Stumpf Editora Argos [email protected] Deglaucy Jorge Teixeira UFSC - Programa de Pós Graduação em Design [email protected] Resumo Este artigo trata da especificidade do livro digital. A abordagem destaca a relevância do processo de categorização do livro para a qualificação das interfaces, para a elaboração dos metadados e para fase de disponibilização e aquisição nas livrarias. Assim, a partir de fundamentação, adotou-se um método analítico e descritivo que visou identificar e sistematizar as principais categorias adotadas no setor editorial. Tal análise considerou instituições tradicionais e livrarias digitais. Posteriormente, foram apresentados três exemplos de livros científicos em formato ePub, relacionando-se o uso dos recursos hipermidiáticos e os elementos adotados para categorização. Os resultados mostram que atualmente não há unidade na forma de categorização do livro digital, fato que interfere na adequação dos recursos gráficos e interativos deste, na aquisição por parte do usuário e na credibilidade do produto final. Palavras-chave: livro digital, categorização, metadados, interface. Abstract This paper deals with the specificity of digital books considering the importance of the categorization process in interfaces, preparation of metadata and for provision and acquisition stage in bookstores. To this end, it was adopted an analytical method involving traditional institutions and digital libraries for identification of key categories adopted in publishing

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O LIVRO DIGITAL: CATEGORIZAÇÃO,

QUALIFICAÇÃO DAS INTERFACES E METADADOS

Anderson Francisco Floriani Voltolini UFSC, Design - PIBIC

[email protected]

Berenice Santos Gonçalves UFSC, Departamento de Expressão Gráfica

[email protected]

Alexsandro Stumpf Editora Argos

[email protected]

Deglaucy Jorge Teixeira

UFSC - Programa de Pós Graduação em Design [email protected]

Resumo

Este artigo trata da especificidade do livro digital. A abordagem destaca a relevância do processo de categorização do livro para a qualificação das interfaces, para a elaboração dos metadados e para fase de disponibilização e aquisição nas livrarias. Assim, a partir de fundamentação, adotou-se um método analítico e descritivo que visou identificar e sistematizar as principais categorias adotadas no setor editorial. Tal análise considerou instituições tradicionais e livrarias digitais. Posteriormente, foram apresentados três exemplos de livros científicos em formato ePub, relacionando-se o uso dos recursos hipermidiáticos e os elementos adotados para categorização. Os resultados mostram que atualmente não há unidade na forma de categorização do livro digital, fato que interfere na adequação dos recursos gráficos e interativos deste, na aquisição por parte do usuário e na credibilidade do produto final. Palavras-chave: livro digital, categorização, metadados, interface.

Abstract

This paper deals with the specificity of digital books considering the importance of the categorization process in interfaces, preparation of metadata and for provision and acquisition stage in bookstores. To this end, it was adopted an analytical method involving traditional institutions and digital libraries for identification of key categories adopted in publishing

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world. Also, were analyzed three examples by identifying the use of hypermedia resources and categories. The results show that there is no unity in the form of categorization, a fact that affects in the adequacy of graphical and interactive resources in books, the acquisition by the user and the credibility of the final product. Keywords: digital book, categorization, interface.

1. Introdução

Os livros digitais ou e-books (eletronic books) estão se tornando cada vez mais

populares no cenário atual. Segundo informações divulgadas pela Association of

American Publishers (2013), no ano de 2012, a venda de e-books cresceu 45% em

relação ao ano anterior e já corresponde a 20% do montante de vendas das editoras.

A popularização de notebooks, smartphones, tablets e e-readers está

possibilitando a distribuição da informação de forma mais acessível e propondo novas

experiências de leitura. Isso requer uma reavaliação do processo editorial e da criação

de conteúdo. Nesta perspectiva cabe a área de design compreender este novo

processo de produção e aproveitar os novos potenciais das plataformas digitais para a

produção e distribuição de conteúdo.

Frente ao cenário exposto, este artigo propõe investigar a complexidade do

processo de categorização dos livros digitais. O referido processo está envolvido

desde a etapa de concepção do livro até sua distribuição nas livrarias. Assim, ao longo

deste texto, busca-se demarcar a relevância da categorização na concepção do livro

digital tendo em vista a segmentação do setor editorial e a qualidade dos recursos

gráficos e interativos a ser empregada. Ressalta-se, ainda, a importância das

categorias na fase de publicação e distribuição da obra demarcando que todos esses

fatores influenciam na busca e aquisição do livro por parte do público-alvo.

2. O livro digital: formatos e potencialidades

Para Procópio (2010, p. 21) “entre a cultura do manuscrito e a do texto impresso, o

livro passou por diversas transformações, mas em toda sua história nada é comparado

à Revolução dos e-Books”. A cada dia novos dispositivos que potencializam o acesso

ao livro são criados. Os aparelhos eletrônicos que possibilitam a leitura dos livros

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digitais, como os dispositivos dedicados1 à leitura e os tablets estão em constante

aperfeiçoamento por parte dos seus desenvolvedores.

Entre os diversos formatos de arquivos de livros eletrônicos, o mais popular ainda

é o formato PDF (Portable Document Format), isso porque ele pode ser lido em

diversas plataformas e mantém a mesma configuração visual dos livros impressos em

papel. Entretanto, outro formato que vem ganhando visibilidade é o formato ePub,

inicialmente chamado de OeB (Open eBooK). Este formato permite com que o texto se

ajuste à interface de diferentes dispositivos. Procópio (2010, p. 139), comenta que “o

formato mais convergente, mais padronizado, apesar de algumas questões, sem

dúvida alguma, é o formato ePub.” Outro formato existente é o “app”, elaborado a

partir de linguagem de programação específica para ser executado em determinado

sistema operacional. Diante de tantos formatos, aplicativos e dispositivos de leitura, os

profissionais da área editorial precisam se informar sobre a especificidade da

construção gráfica dos livros digitais.

Os recursos hipermidiáticos, associados a dispositivos eletrônicos de fácil

portabilidade, resultam em uma interação diferenciada da praticada em livros em papel

ou em computadores tradicionais. Para envolver o usuário no processo de leitura do

livro digital, o design de hipermídia ganha espaço ao trazer, à tela desses dispositivos,

elementos que promovem a interação e a navegação do público leitor de forma

significativa.

Para garantir que essa interação seja realmente satisfatória ao leitor, é necessário

estudar os critérios que determinam a qualidade de um livro digital hipermidiático. Só

assim pode-se produzir livros que atendam as necessidades e expectativas dos seus

respectivos públicos. Um livro de ficção em seu formato eletrônico não terá o mesmo

“apelo” interativo que um livro didático ou infantil. Essa compreensão é necessária

para direcionar o projeto visual do livro tendo em vista os recursos multimídia

adequados à categoria editorial e a plataforma em que será disponibilizado.

O livro é feito para ser lido e o projeto visual precisa está adequado tanto ao

conteúdo quanto à sua classificação. Nesse sentido é fundamental o que profissional

de design de livros compreenda o atual cenário editorial, bem como as limitações e

potencialidades dos diferentes formatos.

3. Categorias adotadas no meio editorial

1 Esses dispositivos, chamados e-readers precisam de aplicativos que possibilitem a abertura

dos formatos de livros digitais. “Para acessar uma obra digital, o leitor precisa de um software ou aplicativo especial chamado reader” (PROCÓPIO, 2010, p. 27). Os readers, por sua vez, necessitam estar habilitados para a leitura dos formatos disponíveis no mercado, e que não são poucos.

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O processo de categorização é indispensável para o acesso ao conhecimento a partir

da recuperação de informações em um sistema organizado. Assim, o termo

categorização, adotado neste artigo é entendido como um ato de ordenação,

agrupamento ou distribuição em categorias na perspectiva de uma ordem e método

(ANDRADE, 2011).

Tradicionalmente, a classificação bibliográfica é responsável pela disposição dos

documentos em estantes e arquivos de forma sistemática e lógica. O Sistema

Internacional de Bibliografia, denominado Federação Internacional de Documentação,

criou o sistema de organização universal conhecido como CDU. A Classificação

Decimal Universal – CDU – é uma linguagem de informação para indexação e

recuperação utilizada por profissionais da informação com o objetivo de identificar

documentos por assunto independente do suporte as quais estão inseridas. A

responsabilidade de manutenção e atualização da CDU no Brasil é a IBICT, membro

da federação Internacional de Documentação (ANDRADE, 2011).

A CDU divide o conhecimento científico em dez classes principais com

desdobramentos em dez seções e as mesmas, são novamente divididas em dez

subclasses:

0. Generalidades - Ciência e conhecimento. Organização. Informática. Informação

1. Filosofia. Psicologia

2. Religião. Teologia

3. Ciências Sociais

4. Classe Vaga

5. Ciências Puras - Matemática. Ciências Naturais

6. Ciências Aplicadas – Medicina. Tecnologia

7. Artes. Recreação. Entretenimento. Desporto

8. Linguística. Língua. Literatura

9. História. Geografia. Biografia

3.1 Outras formas de categorização no âmbito do livro digital

Preocupados com a inserção do livro digital no Brasil e visando contemplar os diversos

segmentos do mercado editorial brasileiro, a Comissão do Livro Digital, formada por

representantes da Câmara Brasileira do Livro – CBL – publicou em 2009 as

potencialidades do livro digital tendo em vista os gêneros de publicação. Assim,

segundo o CBL:

(i) livros científicos, técnicos e profissionais (CTP) — o potencial de impactos é médio para as editoras é alto para as livrarias e distribuidoras;

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(ii) obras gerais (livros literários, religiosos, de arte etc.) — enxerga-se um potencial de impactos baixo para as editoras e alto para as livrarias e distribuidoras. (iii) livros didáticos — segmento fortemente influenciado pelas políticas públicas para a Educação; o potencial de impactos é alto para as editoras, médio para as livrarias e baixo para as distribuidoras; (iv) livros infantis — potencial de impactos alto em toda a cadeia produtiva do livro: editoras, livrarias e distribuidoras. Sofre a concorrência de outras formas de entretenimento e apresenta um potencial de convergência de mídias. (CÂMARA BRASILEIRA DO LIVRO, 2009).

Essa divisão em quatro categorias principais buscava orientar, de forma mais

clara, o potencial interativo dos livros digitais tanto para quem precisa produzir o livro

quanto para quem irá distribuí-lo.

Observa-se no item “i”, por exemplo, que os livros científicos, técnicos e

profissionais tendem a ter um impacto de produção médio se comparados aos itens

“iii” e “iv”, de livros didáticos e infantis, respectivamente. Ou seja, o potencial interativo

desses dois últimos segmentos é grande, o que resulta em mais trabalho para se

produzir essas interações, gerando, assim, um impacto relativamente alto para as

editoras. Ao analisar o segmento de obras gerais, item “ii”, percebe-se que se está

diante de vários subgêneros de publicações. Haverá livros literários ou de arte que não

necessitam de recursos interativos, por outro lado, haverá aqueles em que as

interações vão potencializar ainda mais o envolvimento dos leitores com o texto ou

com as imagens.

Entretanto, as potencialidades do livro vão muito além das supracitadas. Neste

sentido, Toraci (2011, p. 8) argumenta que, além de possibilitar a divisão da obra em

partes, seria necessário “[...] criar um novo gênero capaz de apresentar a linguagem

dissertativa numa estrutura hipermidiática”. Ao citar consagrados autores que apontam

para as novas narrativas digitais, como Chartier, Manovich, Murray, Gosciola e

Palácios, Toraci (2011, p. 4) enfatiza as “possibilidades artísticas trazidas pela leitura

não-linear, pela interatividade e pelo uso das múltiplas formas de linguagem (texto,

áudio, vídeo, fotografia) para composição do conteúdo em hipertexto.”.

Ainda, segundo Toraci (2001, p. 11):

[...] a concepção de uma linguagem digital multiforme e interativa para a disseminação do conhecimento científico poderá potencializar características valorizadas pela ciência e materializadas pelas estruturas em hipermídia.

Além das abordagens institucionais que visam à categorização dos livros,

iniciativas de empresas privadas vêm ganhando visibilidade no mercado de e-books.

Um exemplo é o prêmio Publishing Innovation Awards, que desde 2011 premia os

melhores e-books em diversas categorias. A empresa promotora do prêmio, a Digital

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Book World, leva em consideração vários aspectos de navegação e usabilidade para

determinar a qualidade da produção de livros digitais inovadores, que utilizam recursos

hipermidiáticos em detrimento a uma leitura mais interativa.

O e-book Suffle: an e-novel, de James T. Raydel, ganhador do prêmio na

categoria ficção no ano de 2012 utiliza-se da metáfora do tocador de música iPod.

Neste e-book, desde o começo da interação, o leitor pode escolher a sequência de

capítulos em que lerá o livro, assim como escolhe uma música em seu tocador de

música. Todas as histórias estão inter-relacionadas e a cada fim de capítulo o leitor

pode decidir como a história seguirá, escolhendo o próximo capítulo de leitura,

removendo assim o aspecto linear da narrativa.

Figura 1: Capa e página interna do livro Shuffle: an e-novel. Ganhador do premio Publishing Innovation Awards, na categoria ficção em 2013. Disponível em:

<https://store.vook.com/storefronts/book/shuffle-an-e-novel.html>. Acesso em 03 de junho de 2013.

As categorias utilizadas para a premiação do Publishing Innovation Awards em 2013

foram: e-book de ficção, e-book não ficção, e-book infantil, e-book de

referência/acadêmico, e-book melhorado, app de ficção, app não ficção, app juvenil,

app referência/acadêmico, app de quadrinhos, auto-publicação, primeiro em e-book e

projeto de transmedia. Pela descrição das categorias, percebe-se que o prêmio

contempla apenas livros publicados em formato ePub, Kindle (extensão mobi/azw) e

Apps. Descarta o formato PDF, pois seus recursos interativos não são compatíveis

com aparelhos e-readers ou tablets2. Como as categorias para avaliação são divididas

2 Segundo informações da Digital Book Words (2012), o concurso busca premiar livros digitais

focados em melhorar a experiência de leitura no século XXI. Para isso foram definidos 13 critérios a serem avaliados por meio de um check-list elaborado por profissionais das áreas de produção editorial e de conteúdos digitais. Os critérios têm como base a inovação, o design, a usabilidade, o conteúdo e a hierarquia da informação. Disponível em:

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em gêneros de publicação, esses critérios são analisados de forma específica para

cada gênero, mas ressalta-se que esses critérios vêm se renovando a cada edição,

mostrando que este ainda está em fase de adequação.

Na iniciativa de contornar a variedade de categorias editoriais, a BISG, Book

Industry Study Group3, elaborou uma lista de temas para a classificação de livros, a

BISAC Subject Heading (BOOK INDUSTRY STUDY GROUP, 2013), onde são

definidos 51 temas para o enquadramento das publicações.

Em trabalho semelhante, a BIC, Book Industry Communication4, define 24

temáticas para a categorização de livros, e desde 2012 trabalha em uma proposta

para o desenvolvimento de um projeto de classificação global e multilíngue que

utilizará as temáticas já definidas pela BIC, adaptando-se para as necessidades

regionais. O projeto já conta com a participação de diversos países, e tem como

objetivo melhorar a interoperabilidade e troca de dados entre as nações (BOOK

INDUSTRY COMMUNICATION, 2011).

Entretanto, apenas uma definição concisa das categorias não supre de forma

completa os problemas de classificação das publicações. É um processo que depende

da elaboração das informações catalográficas de forma correta no processo de

produção do livro e cabe também às livrarias respeitarem padrões definidos na

categorização das publicações no espaço de venda ao consumidor.

3.2 Categorias adotadas pelas livrarias digitais

Para este estudo, consideraram-se as categorias utilizadas por três das maiores

livrarias digitais que possuem livros em português, a saber: a iBookstore da Apple, a

Amazon e a Google Play.

Segundo informações coletadas no início de 2013 pela editora Simplíssimo

(REVOLUÇÃO EBOOK, 2013) estão disponíveis hoje mais de 25 mil e-books em

português, sendo a iBookstore e a Amazon possuidoras do maior catálogo, com quase

18 mil e-books e 15 mil respectivamente. A Google Play, apesar de possuir acervo

<http://www.publishinginnovationawards.com/dbw-presents/digital-bookworld-presents>. Acesso em 22 de maio de 2013. 3 A Book Industry Study Group é uma associação comercial americana para a definição de

boas práticas, pesquisa e padrões técnicos relacionados à livros. Foi fundada a mais de 35 anos e trabalha juntamente com editoras, distribuidoras e livrarias para o estudo e melhoria do setor do comércio de livros. Tem como associados grandes empresas como Amazon, Barnes & Noble e Kobo, além de diversas instituições de ensino e órgãos governamentais americanos. Disponível em: <http://www.bisg.org/about/book-association.php>. Acesso em 03 de junho de 2013. 4 Organização inglesa semelhante à BISG, financiada por associações de editores e livreiros

para promover a definição de padrões e procedimentos no mundo do livro. Disponível em: <http://www.bic.org.uk/58/About-BIC/>. Acesso em 03 de junho de 2013.

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menor, aproximadamente 12 mil e-books, possui uma abrangência bastante

significativa, considerando a base de dispositivos compatíveis com sistema

operacional Android.

As categorias encontradas nas livrarias analisadas foram as mais distintas, com

22 classificações na iBookstore, 29 na Amazon e apenas 6 na Google Play. Nota-se

que nas lojas que possuem mais tradição no comércio de livros, digitais ou não, há

uma definição de classificação mais completa, enquanto na Google Play, temas

diversos são incluídos em uma mesma categoria.

No quadro a seguir são listadas as principais categorias em cada loja e

destacando-se as que apresentam temas recorrentes:

Quadro 1: Comparativo de categorias nas lojas iBookstore, Amazon e Google Play. Fonte: iTunes Store. Disponível em: <https://itunes.apple.com/br/genre/livros/id38?mt=11>. Amazon.

Disponível em: <http://www.amazon.com.br/>. Google Play. Disponível em: <https://play.google.com/store/books>. Acessos em 22 de maio de 2013.

iBookstore Amazon Google Play

Ficção Artes, filmes e fotografia Auto-Ajuda

Biografia Artesanato, casa e estilo de

vida Biografias & Autobiografias

Artes e entretenimento Autoajuda e desenvolvimento

pessoal Ficção

Computadores e internet Computação, internet e mídia

digital Religiões

Esportes e atividades ao ar livre

Esportes

Estilo de vida e casa Fantasia, horror e ficção

científica

Ficção científica e fantasia Ficção histórica

História HQs e mangás

Humor História

Negócios e finanças pessoais Infantis e infanto-juvenis

Política e atualidades Negócios e economia

Quadrinhos e graphic novels Política

Referência Referência

Religião e espiritualidade Religião

Romance Romance

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A partir da análise das categorias adotadas pelas livrarias mencionadas percebe-

se que não há uniformização na forma de apresentação do conteúdo, levando ao autor

ou responsável pela publicação do livro, escolher de modo intuitivo o que lhe parecer

mais indicado, considerando uma categoria que se enquadre dentro de cada loja. Esta

apresentação difusa dificulta, sobretudo, o processo de aquisição do livro por parte do

usuário leitor, pois livros de temas semelhantes podem ser categorizados

separadamente conforme a loja escolhida, cabendo ao comprador compreender as

especificidades de cada livraria digital.

3.3 A relevância dos metadados para o livro digital

A categoria do livro também é explicitada em seus metadados. Metadados podem ser

definidos como “dados sobre os dados”, ou seja, informações que facilitem a

identificação e busca de recursos informacionais, seja ele em ambientes digitais ou

não. No contexto atual, com o crescimento exponencial de materiais digitais, o bom

uso de metadados se torna essencial para garantir os meios adequados de

organização da informação (CASTRO; SANTOS, 2007, p.16).

Os metadados em um livro digital são parte essencial para a identificação do

conteúdo e das informações editoriais e, segundo Duarte (2011, p.22), “fundamentais

para que os sistemas de indexação e catalogação, como os sistemas de busca em

bibliotecas digitais, possam organizá-los e encontra-los”. Sem uma classificação

correta em uma livraria digital, o livro está sujeito a enfrentar dificuldades de vendas,

pois o consumidor pode não compreender o tema ou a área da publicação.

Segundo estudo realizado pela BISG (2012), quase 100% dos editores teve a

experiência de ter os metadados de livros alterados entre o ponto de criação da

publicação e a venda em livrarias online. A pesquisa sugere que muitos editores não

possuem o conhecimento para a elaboração dos metadados, e que não conseguem

identificar em que passo da produção (na editoração, no conversor para e-book, no

distribuidor ou na livraria digital) os dados foram modificados (GREENFIELD, 2012).

A pesquisa explicita, ainda, que a maioria dos editores novatos na publicação de

livros digitais utiliza sistemas automatizados de criação de metadados, e somente um

terço dos editores consultados realizam a revisão manual destas informações, o que

leva à venda de livros sem as informações necessárias e corretas para a sua

classificação.

Os metadados aplicáveis a e-books são os mais diversos, de maneira que existem

formatos de metadados, ou seja, estruturas padronizadas de composição. Porém,

como cita Castro e Santos (2007), muitos desses formatos são desenvolvidos de

maneira que não respeitam as lógicas estabelecidas na Biblioteconomia.

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Entretanto, mesmo em estruturas diferentes de padronização de metadados,

algumas informações são essenciais para a boa classificação de uma obra, são elas:

número identificador (ISBN), título, língua, autor (es), direitos autorais, editor, data e

uma breve descrição do conteúdo do livro, na forma de um resumo da obra. A imagem

a seguir mostra um exemplo de como os metadados são codificados nos arquivos

fonte de um e-book:

Figura 2: Codificação dos metadados do e-book CSS and Documents, de Eric A. Mayer (2012).

3.4 A interface dos livros digitais: recursos hipermidiáticos e

categorização

No livro digital a interface5 é o espaço que faz a mediação da leitura e da

interação. Para Passos e Moura (2007, p. 22), em ambientes digitais “esse espaço é

constituído por elementos gráficos, sonoros, estáticos e dinâmicos, relacionados entre

si e com o seu conteúdo informacional.” No livro digital a qualidade da interface

dependerá das variáveis que determinarão o processo de leitura, o nível de interação

e qualidade da experiência como um todo. Mas é também a interface do livro que

comunica a área de conhecimento a qual pertence e a sua credibilidade no contexto

do sistema editorial.

Levando em consideração as potencialidades do livro digital, tanto no formato

ePub, quanto no formato app, ainda são poucos os títulos que podem ser

considerados com bom nível de recursos aplicados ao layout e estruturação do

5 Segundo Bonsiepe (1997, p. 10) “é a interface que faz a mediação da interação entre o

usuário e o objeto [material ou imaterial] e ela deve ‘conversar’ com o usuário mostrando a ele como interagir com o objeto” Para o autor, a construção dessa interface é de competência do Design, área responsável por adaptar o objeto às características físicas e cognitivas do usuário.

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conteúdo, tais como animações, áudio, vídeo, tipografia avançada, narração de texto.

Evidentemente, que já se observa um cenário em transição. O livro interativo tende a

mudar hábitos de leitura e conquistar novos leitores.

Frente ao exposto, para a análise de exemplos, procurou-se títulos científicos de

e-books a partir das livrarias citadas no quadro 1, objetivando identificar: a) o formato,

b) o uso de recursos visuais e hipermidiáticos que possam enriquecer com a

experiência de leitura, e c) o uso dos dados catalográficos.

Figura 3: Capa e seção interna do livro Design e Planejamento: aspectos tecnológicos, organizado por Marizilda Menezes e Luis Paschoarelli, Editora Unesp, 2009, (versão para

iPad).

Figura 4: Capa e seção interna do livro Heurísticas de jogabilidade: usabilidade e entretenimento em jogos digitais, de Ana Regina Mizrahy e Renato Hildebrand, Marketing

Aumentado, 2013, (versão para iPad).

Os dois títulos apresentados nas figuras 3 e 4 “Design e Planejamento” e “Heurísticas

de jogabilidade” são livros científicos de estudo na área do Design. São edições

publicadas em formato ePub que tem como característica a o texto fluído e adaptativo

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conforme dispositivo de leitura, controle de fontes, tamanho de letra e utilização

recursos hipermidiáticos.

Apesar das possibilidades de utilização de novas tecnologias de apresentação do

conteúdo nesta área, nota-se que não houve uma preocupação por parte dos editores

em tornar o material mais rico em recursos. Nota-se que são reproduções dos livros

impressos para o meio digital, ofertados em formato ePub. Há hierarquização de

conteúdo através do controle de tipografa, entretanto não há utilização de links,

recursos de áudio ou animações, ambos apresentam imagens, porém no livro Design

e Planejamento são aplicadas somente em tons de cinza.

Apesar da limitação no uso dos recursos midiáticos, há uma preocupação em

apresentar os dados catalográficos, considerando as informações editoriais

apresentados de forma objetiva, o que contribui para uma organização clara do

segmento. Tal aspecto é assegurado pela editora que mantém critérios editorias que

acompanham a publicação.

Figura 5: Imagens do Atlas de Parasitologia Médica, de Lucas Santos. (versão para iPad).

Em outro oposto está o exemplo descrito na figura 5. A edição, em formato

exclusivo para o software iBooks (IBA), tem como maior destaque o uso dos recursos

hipermidiáticos, como vídeos, imagens e destaques com pop-ups informativos.

Entre os recursos utilizados podemos citar: os recursos de ampliação das

imagens, que possibilitam ver destaques de elementos apresentados; o recurso de

pop-up onde em específicos locais das imagens, ao se pressionar, uma janela é

exibida contendo maiores informações daquele elemento; e o recurso de vídeos. É

uma obra que evidencia as possibilidades interativas deste segmento, enriquecendo o

material com mídias que contribuam com o entendimento do conteúdo.

Em contrapartida, a edição é trabalhada com layout fixo, não ajustável a diversos

formatos de tela, restringindo o alcance da publicação. Apesar do conteúdo dinâmico e

interativo, a publicação se omite de apresentar muitas das informações catalográficas

básicas, como editora, ano, entre outros, o que contribui para uma descaracterização

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do conteúdo, da categoria a que pertencem e que comprometem a credibilidade da

publicação.

4. Considerações finais

Tendo em vista o tema aqui tratado, ressalta-se que o processo de categorização

do livro digital ainda é complexo. Desde a fase de concepção, a noção de

pertencimento do livro a uma determinada categoria auxilia a equipe de design a tomar

decisões de projeto e a qualificar suas interfaces. Outro fator fundamental a ressaltar é

a necessidade de elaboração dos metadados ainda em fase de projeto, uma vez que

estes também influenciarão todo o processo de busca do produto final.

Nesse sentido, a comparação sobre as categorias adotadas nas livrarias digitais

evidenciou que estas não adotam modelos propostos pelas instituições tradicionais e

órgãos de regulamentação, fato que vem a contribuir para a descaracterização das

publicações em lojas diferentes e confundir o leitor.

A análise de exemplos mostrou que muitos dos livros que empregam recursos

interativos e hipermidiáticos em suas interfaces não declaram as fontes de autoria dos

conteúdos, dos recursos (tais como vídeos, gráficos e imagens interativas) e nem os

dados catalográficos tradicionais. Assim, observa-se que, no atual contexto do design

do livro digital, deve-se buscar uma nova postura, que inclua as especificidades de um

produto digital, avançando na adoção de diferentes recursos, mas garantido e

assegurando a inclusão das categorias e dos metadados, fator que muito contribui

para a qualidade, credibilidade e consolidação do livro digital.

Referências

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