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Desconsideração Inversa da Personalidade Jurídica e Efetividade da Tutela Executiva Trabalhista

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Desconsideração Inversa da

Personalidade Jurídica e Efetividade

da Tutela Executiva Trabalhista

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Alexandre Oliveira Soares

Desconsideração Inversa da

Personalidade Jurídica e Efetividade

da Tutela Executiva Trabalhista

Mestre em Direito Privado (Direito do Trabalho) pela PUC/MG. Especialista em Direito Processual Civil e Direito Civil. Professor do

programa de graduação e pós-graduação em Direito do Centro Universitário Estácio de Sá, Belo Horizonte. Coordenador de Pesquisa do Curso de Direito do Centro Universitário Estácio de Sá. Advogado.

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EDITORA LTDA.

Rua Jaguaribe, 571 CEP 01224-001 São Paulo, SP — Brasil Fone (11) 2167-1101 www.ltr.com.br

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Índices para catálogo sistemático:

Todos os direitos reservados

Produção Gráfica e Editoração Eletrônica: R. P. TIEZZI X Projeto de Capa: FABIO GIGLIO Impressão: PAYM GRÁFICA

Janeiro, 2015

Soares, Alexandre Oliveira

Desconsideração inversa da personalidade jurídica e efetividade da tutela

executiva trabalhista / Alexandre Oliveira Soares. — São Paulo : LTr, 2015.

1. Direito processual 2. Execuções (Direito) 3. Execuções (Direito) —

Brasil I. Título.

14-12422 CDU-347.952:331(81)

1. Brasil : Execução trabalhista : Processo trabalhista 347.952:331(81)

2. Brasil : Processo de execução : Direito do trabalho 347.952:331(81)

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Versão impressa - LTr 5174.2 - ISBN 978-85-361-3207-5Versão digital - LTr 8551.3 - ISBN 978-85-361-3234-1

Agradecimentos

Aos Professores Doutores Márcio Túlio Viana e Luiz Otávio Linhares Renault, pela orientação segura, competente e pelo acolhimento e incentivo.

Ao Professor Doutor Antônio Gomes de Vasconcelos, pela avaliação crítica e sugestões.

Ao Doutor Adolpho Machado Soares, pelo amor paternal, sábios ensinamentos jurídicos e pelos estímulos constantes.

Ao Doutor Pedro Rocha Olguim, pela leitura atenta do texto original e sugestões.

A Mara Paixão e toda sua equipe, pelo profissionalismo na editoração desta obra.

Dedicatória

A Deus!

À Michelle, minha esposa, pelo amor, dedicação, incentivo e cumplicidade.

Aos meus pais, com carinho e gratidão.

Aos meus familiares pelo apoio.

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Sumário

Prefácio ..............................................................................9

Introdução ....................................................................... 15

1. Ação Judicial e Direito Subjetivo na Óptica Romana ...... 19

1.1. Sistemas das legis actiones, per formulas e cognitio extraordinaria ...............................................................20

2. A Execução no Processo Civil Romano .......................... 29

2.1. A execução no sistema das legis actiones ......................... 30

2.2. A execução no sistema per formulas ................................ 31

2.3. A execução no sistema da cognitio extraordinaria .............. 33

3. Execução na Justiça do Trabalho .................................. 34

3.1. Princípios da execução trabalhista ................................... 37

3.1.1. Princípio da igualdade de tratamento das partes ....... 39

3.1.2. Princípio da primazia do credor trabalhista ............... 42

3.1.3. Princípio da utilidade da execução para o credor ....... 43

3.1.4. Princípio da não prejudicialidade do devedor ............ 44

4. Desconsideração Direta da Personalidade Jurídica ........ 47

4.1. Vitória pírrica nas demandas trabalhistas ......................... 47

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4.2. Responsabilidade patrimonial primária do devedor ............. 51

4.3. Responsabilidade patrimonial secundária do devedor ......... 53

4.4. Desconsideração da personalidade jurídica na Justiça do Trabalho ....................................................................... 55

5. Desconsideração Inversa da Personalidade Jurídica ..... 66

5.1. Definição ..................................................................... 66

5.2. Desconsideração inversa da personalidade jurídica e trans-ferência fraudulenta de bens ........................................... 69

5.3. Omissão legislativa e o papel da jurisprudência e da doutrina 75

5.4. Desconsideração inversa da personalidade jurídica e execu- ção trabalhista .............................................................. 90

5.5. Desconsideração inversa da personalidade jurídica e herme- nêutica ...................................................................... 102

5.6. Desconsideração inversa da personalidade jurídica e direito fundamental a uma tutela executiva efetiva .................... 107

5.7. Desconsideração inversa da personalidade jurídica e efeti- vidade da tutela jurisdicional trabalhista ........................ 111

5.8. Desconsideração inversa da personalidade jurídica e reflexos da crise de efetividade da legislação social trabalhista ...... 114

Conclusão ....................................................................... 117

Referências .................................................................... 123

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Prefácio

Algumas pessoas nascem com o dom especial para ensinar e para escrever. Vivem sob o signo de ouro, porque ambos, ensinar e escrever, são virtudes inexcedíveis. Ensino e escrita: vida e luz; sonho e realidade; realização pessoal e amor ao próximo.

A sala de aula e a tela do computador (não mais uma folha de papel em branco) são os espaços do professor e do escritor.

Esses espaços completam-se; intercomunicam-se; são tão pro-fundos quanto vastos; tão desafiadores quanto misteriosos.

Com outras palavras, diria que ensinar e escrever nos afagam, nos acariciam, nos gratificam e nos explicam, se é que a vida tem alguma explicação.

A palavra falada e a palavra escrita são os domínios do mundo da comunicação e do aprendizado. Quem ensina e escreve chega aos limites da liberdade de si próprio, assim como de seus alunos e leitores. Liberdade de si próprio, porque se doou por inteiro; li-berdade alheia, porque ainda que preenchidos alguns vazios, vários outros são deixados, cheios de silêncio, repletos de perguntas sem respostas, para o devaneio, para a reflexão e para o estudo.

Alexandre Oliveira Soares, autor deste livro, intitulado Descon-sideração Inversa da Personalidade Jurídica e Efetividade da Tutela Executiva Trabalhista, é professor e escritor. Por conseguinte, nasceu e vive sob o signo do ouro.

Essas as palavras mais adequadas e pertinentes que, inicial-mente, posso trazer para os leitores a respeito deste interessante, surpreendente e magnífico livro, assim como de seu Autor.

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Entretanto, tenho de acrescentar que o professor Alexandre ensina e escreve como poucos. Ele ensina e escreve encantando, e por meio do encantamento de suas palavras e de seu raciocínio claro e retilíneo, desperta o interesse do aluno e do leitor.

Clarisse Lispector disse uma vez que escrever é uma maldição, mas uma maldição que salva. E explicou que é uma maldição porque obriga e arrasta como um vício penoso do qual é quase impossível se livrar, pois nada o substitui. E é, simultaneamente, uma salvação, segundo ela, porque salva a alma presa que procura reproduzir o irreproduzível.

Guardadas as devidas e necessárias proporções, inclusive quanto ao gênero do livro, o professor Alexandre Oliveira Soares somente se livrou do compromisso de escrever sobre o tema da efetividade da tutela executiva trabalhista, quando percebeu que nenhum outro o substituiria e, a partir de então, passou a ler, a pesquisar, a ler e reler, e pensar e a repensar, para, finalmente, começar a escrever a respeito do tema, sob a vertente da desconsideração da personali-dade jurídica invertida.

Assim eleito e apegado ao tema central de sua dissertação de mestrado, na Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, sob a segura e inigualável orientação do professor Márcio Túlio Viana, o Autor, depois de delimitar os pontos de imputação e de inflexão jurídica, pôs-se a escrever, lentamente, sem pressa, mas com a ne-cessária segurança de alguém que quer fazer doutrina.

Desde o início, sabia que ira trilhar caminho espinhoso, para ten-tar responder a algo que parecia irrespondível, na seara trabalhista, ou como disse Clarisse Lispector, a reproduzir o irreproduzível, isto é, a inversão da desconsideração da personalidade jurídica como um importante mecanismo para a efetividade da execução trabalhista.

A propósito deste difícil e controvertido tema, pensaria eu, an-tes da leitura deste livro, que seria como que encontrar uma alma dentro da própria alma, ou melhor, encontrar dois eus no espelho em que se olha e neles encontrar o mesmo eu, inibindo a transferência fraudulenta de bens com o fito de inviabilizar a execução.

O Autor deste magnífico livro sobre a desconsideração inversa sabia que teria de enfrentar intrincado paradoxo, ainda não tão comum nas execuções trabalhistas, mas a cada dia mais crescente e que evidencia a esperteza dos devedores, que tentam de todas as formas esconder o seu patrimônio, inclusive com a transferência cruzada ou invertida de bens.

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O professor Alexandre não fugiu deste compromisso inicial de desvendar toda esta intrincada questão processual e nos brindou com um livro inigualável, indispensável a todos os operadores do Direito do Trabalho — professores, estudantes, juízes, advogados e procuradores do trabalho.

Pois bem, que a execução é o gargalo do processo trabalhista, todos sabemos, inclusive os milhões de empregados-credores, que obtiveram êxito em reclamação trabalhista e nada ou pouco rece-beram das empresas devedoras.

As causas desse anacronismo da execução são múltiplas; pos-suem inúmeras variantes e crescem na mesma proporção em que se elevam as execuções frustradas, diariamente, nas centenas de varas do trabalho, país afora.

O Autor deste precioso livro é um professor nato; é um pesqui-sador incansável; é jovem doutrinador maduro e consciente de sua responsabilidade. Disciplinado e dedicado, não se assustou e nem recuou com as dificuldades que logo enxergou. Poderia ter seguido outro caminho. Poderia ter escolhido tema mais confortável. Não quis. Preferiu enfrentar o espinhoso tema da execução trabalhista.

Com o fito de verter para o livro todas as suas pesquisas, estudos e ideias, rebelou-se, inicialmente, com as fissuras da lei. Para ele, não existem lacunas, nem vazios legislativos ou jurisprudenciais que não possam ser preenchidos pela interpretação, que nos levem ao interior dos institutos e das normas jurídicas, apresentando soluções para os mais intrincados problemas.

Partindo desta premissa, ele escreveu com maestria, trazendo para dentro do livro a realidade da vida, com a qual preencheu as ausências normativas, demonstrando, cientificamente a viabilidade da desconsideração inversa da personalidade jurídica, para que se atribua maior efetividade às execuções trabalhistas.

Para a elaboração de sua dissertação de mestrado, em cuja defesa obteve a nota máxima, cem “com láurea”, ora transformada em primoroso livro, o professor Alexandre iniciou os seus escritos, vestido da armadura da sabedoria, a partir do estudo da ação judicial e do direito subjetivo sob a óptica romana. Foi à origem; volveu no tempo e revolveu antigos institutos; ressuscitou, corpo e alma, os sistemas das legis actiones, per formulas e cognitio extraordinaria.

Desbravado esse terreno movediço, empunhou novas armas — leituras e mais leituras; pesquisas e mais pesquisas. Dia e noite; noite e dia. Estudou muito. Refletiu mais ainda. Voltou a escrever.

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Desenterrou as questões mais importantes e relevantes da execução no processo romano, que poderiam contribuir para a com-preensão do tema central deste livro.

Superados eventuais desencontros entre o passado e o presente, e pensando no futuro, o Autor abraçou, sem medos, a realidade da execução trabalhista, no Brasil.

Por inúmeras razões, poderia ter dado de ombros ao grande problema do processo trabalhista, que é a falta de efetividade na fase de execução.

Não agiu dessa forma, isto é, não fugiu da batalha, porque não é do seu feitio, nem de sua índole, ou mesmo de sua postura intelectual.

Por mais ininteligível que seja a disciplina normativa da inversão da desconsideração, por mais impalpável que sejam os instrumentos disponíveis, o Autor quis ir ao fundo das questões mais intrincadas a fim de dar uma verdadeira e efetiva contribuição para a doutrina, pensando que a fase decisiva e cruel da execução pode chegar a bom termo pela via da desconsideração inversa da personalidade jurídica.

Para isso, revirou o fundo do poço das mazelas da fraude contra credores, da fraude à execução, e da fraude de execução, não sem antes passar a limpo os princípios da execução trabalhista.

Especificamente, a propósito da execução no processo do tra-balho, o Autor como que se colocou no lugar do outro. Não foi em poema, porém, em crônica que, salvo engano, o poeta Drummond, criou o neologismo verbal “outrar”, que significa ser capaz de se colo-car no lugar do outro e entendê-lo — ou procurar entendê-lo — como se ele fosse você. Em suma: em parte, é sofrer a dor de outrem.

No Brasil, não sei se apenas por herança de um processo burocrático-cartorário, advindo de um sistema romano-germânico burguês, que o processo é, em grande escala, moroso e ineficaz. Todavia, o que sei é que as partes sofrem muito com o processo ju-dicial; sofrem mais com a sua morosidade; sofrem mais ainda com a sua ineficiência.

O professor Alexandre Oliveira Soares assumiu, em parte, essa dor, como se fosse sua e dela fez uma arte, seguindo à risca o con-selho de Schopenhaeur.

O Autor, ao descortinar o tema da desconsideração da perso-nalidade jurídica, fez menção à vitória pírrica ou vitória de Pirro, utilizada para designar uma vitória obtida a alto preço. Potencial-mente prejudicial ao vencedor, porque poderia não ter valido a pena.

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Utilizando-se dessa metáfora, o Autor procura desviar a óptica da vitória sem vitória, para uma vitória com vitória, pelo menos quando a desconsideração inversa da personalidade jurídica permite a loca-lização de bens para a garantia e pagamento do débito processual trabalhista.

Certamente, como professor, doutrinador, advogado e estudioso do Direito e do Processo do Trabalho, o professor Alexandre também está cansado de ouvir que muitos, incontáveis processos trabalhistas se frustram na fase de execução, deixando de entregar ao empre-gado o que é seu.

Uma das inúmeras e significativas contribuições deste livro está no alentado capítulo que versa especificamente sobre a desconside-ração inversa da personalidade jurídica e a respeito da transferência fraudulenta de bens, sob as mais diversas formas e títulos, assim como sob o prisma do direito fundamental que todos nós temos a uma tutela executiva célere e efetiva.

O professor Alexandre fez ciência com este tema nobre e rele-vante. Seguiu o conselho de Fernando Pessoa, para quem “a ciência descreve as coisas como são; a arte como são sentidas, como se sente que devem ser”.

Eis, em rápidas pinceladas, o teor, o conteúdo, o corpo e o espírito, deste grande livro que o leitor tem em suas mãos, e que pode encher os nossos olhos de cintilante esperança. Leia o livro e descubra, com a sua própria sensibilidade jurídica, por que estou dizendo tudo isso.

Luiz Otávio Linhares Renault Professor dos cursos de graduação e pós-graduação da PUC-Minas.

Desembargador do TRT/3ª Região.

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Introdução

Desde quando o Estado avocou para si o monopólio da presta-ção jurisdicional, uma preocupação constante e crescente tem sido a de assegurar a efetividade das decisões judiciais. Isso porque o mero reconhecimento judicial de um direito não é suficiente para a composição integral do fenômeno sociojurídico da lide e não é com-patível com as exigências de um Estado Democrático de Direito que prometeu o acesso à justiça.

Com efeito, atualmente, se reconhece que o direito fundamental ao acesso universal a uma ordem jurídica justa não se exaure na sim-ples jurisdição. Torna-se imprescindível também a jurissatisfação, ou seja, a efetiva entrega do bem jurídico pretendido em juízo, porquanto os indivíduos, regra geral tolhidos do exercício da autodefesa, têm a justa expectativa de que o Estado não apenas declare judicialmente um direito, mas, sobretudo, lhe dê efetividade no plano concreto.

A preocupação hodierna com a efetividade dos direitos reco-nhecidos em provimento judicial não é inédita. Já os romanos se debruçaram sobre essa questão. É por isso que se pode verificar a presença no processo civil romano de ações executivas específicas cujo escopo nuclear era assegurar a efetiva satisfação dos direitos subjetivos reconhecidos nas ações cognitivas.

Tal como os romanos, os processualistas atuais em geral, e espe-cialmente aqueles que se dedicam ao estudo do Direito do Trabalho e do Direito Processual do Trabalho, têm buscado, incessantemente, ferramentas que permitam assegurar a efetividade das sentenças judiciais trabalhistas, para que se possa entregar ao trabalhador demandante tudo aquilo que lhe assegura o direito material.

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A relevância dessa procura ganha novos contornos quando o Tribunal Superior do Trabalho noticia que atualmente há dois milhões e setecentos mil processos solucionados e transitados em julgado, mas que os trabalhadores ainda não receberam seus créditos reco-nhecidos judicialmente, demonstrando que a fase executiva é um dos maiores obstáculos à efetividade da prestação jurisdicional.

Soluções legislativas e processuais têm sido engendradas para tentar solucionar, ou ao menos mitigar, o óbice multifatorial da ine-fetividade executiva dos processos trabalhistas.

Nessa linha de ação, tramita no Congresso Nacional o Projeto de Lei do Senado n. 606/2011, elaborado a partir de propostas apresentadas por uma comissão de Ministros do Tribunal Superior do Trabalho e de magistrados trabalhistas de todas as instâncias (BRASIL, 2011).

Referido projeto propõe uma revisão da execução trabalhista e a aplicação de vários dispositivos do Código de Processo Civil no processo laboral, porquanto se entende que os avanços desse Esta-tuto podem aumentar o grau de efetividade da execução trabalhista (BRASIL, 2011).

Enquanto não se aprova o Projeto de Lei do Senado em comento, a execução trabalhista permanece sob a regência do Decreto-Lei n. 5.452/1943 (Consolidação das Leis do Trabalho), da Lei n. 6.830/1980 (Lei de Execuções Fiscais) e do Código de Processo Civil (CPC), este último aplicável nos casos de omissão legislativa do texto celetista e desde que haja compatibilidade de suas regras supletivas com o processo judiciário trabalhista.

Em decorrência da não positivação dos avanços legislativos referidos, a Justiça do Trabalho, na busca da efetividade da tutela judicial, tem se valido de mecanismos como a desconsideração da personalidade jurídica, em sua forma tradicional e inversa, na ten-tativa de aumentar a satisfação do crédito trabalhista reconhecido em juízo.

Esta obra dedicar-se-á à investigação científica da desconsi-deração da personalidade jurídica em sua forma inversa. Embora muito aplicada pelos regionais trabalhistas e pelo Tribunal Superior do Trabalho, esse instituto carece de um estudo mais acurado de seus fundamentos. Sobre a desconsideração direta da personalida-de jurídica, tratar-se-á apenas do essencial à compreensão de sua forma inversa.

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Nesse diapasão, serão apresentados argumentos constitucionais, infraconstitucionais, doutrinários e jurisprudenciais que buscarão fundamentar e justificar a aplicação da desconsideração inversa da personalidade jurídica na Justiça do Trabalho. Parte-se do fato con-creto de que se vive hoje uma crise de efetividade da tutela executiva trabalhista e da premissa de que esse instituto pode contribuir para a atenuação desse cenário.

Em outras palavras, investigar-se-á a desconsideração inversa da personalidade jurídica no cenário contemporâneo problemático de crise de efetividade dos direitos trabalhistas e da tutela executi-va trabalhista, com o escopo central de se avaliar os fundamentos teóricos desse instituto e de suas possíveis contribuições para a mitigação do déficit de concreção jurídico-normativo da legislação social trabalhista.

O caminho metodológico adotado para a realização da inves-tigação consistirá inicialmente numa avaliação perfunctória do processo civil romano, analisando-se os sistemas das ações da lei (legis aciones), do processo formulário (per formulas) e do processo extraordinário (cognitio extraordinaria), bem como de suas respecti-vas ações executivas específicas, a manus iniectio e a actio iudicati. Com isso, pretende-se evidenciar a preocupação dos romanos com a efetividade das decisões judiciais.

No momento seguinte, será analisada a execução na Justiça do Trabalho sob a perspectiva constitucional do acesso à justiça, do esgotamento da prestação jurisdicional e dos princípios da igualdade de tratamento das partes, da primazia do credor trabalhista, da utili-dade da execução para o credor e da não prejudicialidade do devedor. Nesse ponto, serão debatidos os princípios regentes da execução trabalhista, sua finalidade no contexto processual e a posição de preeminência do credor trabalhista em face do devedor trabalhista.

No instante posterior, a desconsideração da personalidade jurídi-ca será objeto de estudo, tratando-se de sua regência principiológica e legal, de seus fundamentos éticos e jurídicos e dos fundamentos da responsabilidade patrimonial primária e secundária do devedor no ordenamento jurídico brasileiro. Nesse capítulo, também serão analisados os fundamentos jurídicos, a evolução legislativa da apli-cação desse instituto na Justiça do Trabalho e sua importância para a efetividade dos direitos trabalhistas.

Finalmente, será analisada a desconsideração inversa da perso-nalidade jurídica. Primeiro, serão discutidas questões concernentes à

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sua definição, às suas particularidades em face de outras formas de transferência fraudulenta de bens, à omissão legislativa e ao papel da jurisprudência e da doutrina na concepção e na consolidação desse instituto. Depois, serão apresentados e discutidos vários fundamen-tos de índole constitucional, infraconstitucional e principiológica que buscam legitimar a aplicação desse instituto nos domínios do Direito e Processo do Trabalho.

O objetivo do último capítulo é estabelecer interlocuções entre a desconsideração inversa da personalidade jurídica e os princípios éticos e jurídicos da desconsideração tradicional, bem como com a função social da empresa, com o valor social do trabalho, com a proteção constitucional do trabalho, com a dignidade da pessoa humana, com o direito fundamental a uma tutela executiva efetiva e com a instrumentalidade substancial do processo.

Em tempos de déficit de concreção jurídico-normativo da le-gislação social trabalhista e de crise de efetividade das decisões judiciais, a desconsideração inversa da personalidade jurídica pode ser importante instrumento judicial de resistência a esse quadro que cada vez mais se agrava no cenário jurídico brasileiro.

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Ação Judicial e Direito Subjetivo na Óptica Romana

Se fosse poss ível escolher uma ideia-s íntese que revelasse com maior nitidez a maneira pela qual os romanos compreendiam a relação existente entre o direito subjetivo e a

ação judicial, certamente seria aquela contida na afirmativa de que a existência de um direito subjetivo estava condicionada à existência de uma ação judicial que o tutelasse, caso ele fosse desrespeitado.

Para os romanos, a proteção eficiente do direito material melhor se dava por meio da ação judicial. Essa concepção era tão enraiza-da na cultura jurídica romana que os levou a afirmar que para cada direito subjetivo deveria existir uma ação específica, a qual deveria entrar em movimento ofensivo toda vez que o direito subjetivo fosse violado.

Por isso, se verifica, na organização processual romana, um vasto e específico conjunto de ações (actiones), todas elas voltadas à tutela dos correspondentes direitos subjetivos. Por essa razão, também, é que se pode afirmar que a concepção contemporânea genérica de ação (actio) é muito diferente daquela que fora elaborada pelos romanos, porquanto o seu pragmatismo os conduziu à criação de actiones específicas aptas a tutelar de forma individualizada tal ou qual direito subjetivo vitimado por alguma agressão.

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Essa ideia romana de que para cada direito substantivo deveria corresponder uma ação específica tem a virtude de revelar que o aspecto processual era tão importante para os romanos que os levou a adotar uma tese civilística da ação, segundo a qual a ação nada mais era do que um dos elementos essenciais do direito subjetivo, o qual poderia se colocar em movimento em qualquer momento para tutelar o direito subjetivo violado.

Ao contrário do que se verifica na contemporaneidade, os ro-manos concebiam os direitos mais pelo viés processual do que pelo material, o que denota como esse povo dava às actiones uma su-premacia na ordem jurídica vigente, razão pela qual Alves (1999) afirma que o direito romano pode ser compreendido mais como um sistema de ações do que como um sistema de direitos.

Para que se possa melhor compreender a relação das actiones com o direito subjetivo, importante se faz conhecer algumas ca-racterísticas essenciais dos três sistemas de processo civil romano, quais sejam, legis actiones, per formulas e cognitio extraordinaria.

Essa verificação é relevante porque permitirá que depois se faça uma análise das formas de execução das sentenças dos três siste-mas citados, investigação essa essencial porque permitirá desvelar e melhor compreender não apenas as formas e os meios dos processos executivos romanos, mas, sobretudo, os seus fundamentos teóricos e dogmáticos.

1.1. Sistemas das legis actiones, per formulas e cognitio extraordinaria

O estudo dos sistemas de processo civil romano fica menos difícil quando sua análise é precedida da compreensão da provável gênese do processo civil nos povos primitivos. Isso porque, assim fazendo, fica mais fácil identificar as características do processo civil romano.

A história evolutiva do processo civil revela a gradual transição da justiça privada para a justiça pública. O itinerário evolutivo parte do extremo da justiça exercida pelos próprios particulares em direção ao seu polo oposto, que é a justiça distribuída pelo Estado. Segundo Alves (1999), são quatro as fases desse percurso evolutivo, a saber, a justiça privada, o arbitramento facultativo, o arbitramento obriga-tório e a justiça realizada monopolisticamente pelo Estado.

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Na primeira fase, são os próprios particulares que resolvem os conflitos, mediante o emprego da força individual ou grupal, confor-me a dimensão do litígio. Essa forma de justiça privada, baseada na força e na vingança, é precária, unilateral, aleatória e parcial. Essas características fazem da autodefesa a mais primitiva das formas de resolução de conflitos, porquanto permitem que a vitória seja alcan-çada não necessariamente por aquele que é o real titular do direito subjetivo em disputa, mas pelo mais forte.

A justiça privada teve largo emprego no mundo romano como forma de resolução de conflitos. Sempre lembrada como expressivo exemplo dessa primeira fase no âmbito do processo civil romano é a Lei das XII Tábuas. Muito embora essa lei possa ter representado uma conquista para os plebeus, porquanto permitiu que os julga-mentos dos seus litígios com os patrícios realizados por juízes que, via de regra, pertenciam a essa classe, tivessem menor variação, o fato é que ela preconizava a pena de talião, a vingança privada do olho por olho, dente por dente.

As regras três e quatro da Tábua Segunda, que tratam dos julgamentos e dos furtos, bem como as disposições seis e nove da Tábua Terceira, que versam sobre os direitos de créditos, evidenciam os fortes traços e características da justiça privada, presente na Lei das XII Tábuas:

(...)

3. Se alguém cometer furto à noite e for morto em flagrante, o que matou não será punido.

4. Se o furto ocorrer durante o dia e o ladrão for flagrado, que seja fustigado e entregue como escravo à vítima. Se for escravo, que seja fustigado e precipitado do alto da rocha Tarpeia.

(...)

6. Se não pagar e ninguém se apresentar como fiador, que o devedor seja levado pelo seu credor e amarrado pelo pescoço e pés com cadeias com peso máximo de 15 libras; ou menos, se assim o quiser o credor.

(...)

9. Se são muitos os credores, será permitido, depois do terceiro dia de feira, dividir o corpo do devedor em tantos pedaços quantos sejam os credores, não importando cortar mais ou menos; se os credores

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preferirem poderão vender o devedor a um estrangeiro, além do Tibre. (ROSSI, 2010)

Considerando o estágio social, cultural e jurídico em que se encontra o mundo contemporâneo, as regras acima transcritas são repugnantes e inaceitáveis, não só no Brasil, mas também em inú-meros países de tradição democrática.

O arbitramento facultativo caracteriza a segunda fase do proces-so evolutivo do processo civil. Por meio dele, as partes abriam mão da vingança privada como forma resolutiva do conflito e ajustavam que ele seria equacionado por meio do pagamento de uma indeni-zação, a ser estipulada por elas ou por um terceiro — sacerdote, ancião ou outra pessoa pelas partes escolhida, sem a interferência estatal — que fixaria o quantum indenizatório.

Como a própria expressão evidencia, as partes não eram obri-gadas a valer-se dessa forma de resolução dos conflitos, sendo ela apenas facultativa, de modo que a sua não compulsoriedade tinha por consequência favorecer o largo emprego da ainda mais primitiva forma de resolução dos conflitos, a autodefesa.

O arbitramento facultativo também esteve muito presente ao longo de toda a evolução do processo civil romano, porquanto os ár-bitros gozavam de boa reputação no mundo romano, visto que eram tidos como pessoas dotadas de certos predicados que as qualificavam a solucionar os conflitos, como pontua Alves (1999).

A terceira fase surge da necessidade de se tornar a arbitragem facultativa em arbitragem obrigatória, pois a sua não obrigatoriedade dava ensejo ao largo emprego da vingança privada, sendo que essa prática contribuía para o acirramento dos atritos sociais, o que não era desejável.

Assim, o Estado passou a intervir de forma direta nos conflitos, no sentido de obrigar os conflitantes a escolher um árbitro que pu-desse pôr fim aos embates, mediante a fixação de uma indenização por esse terceiro. Em caso de descumprimento da sentença fixada pelo árbitro, o Estado coagia as partes a observar a decisão fixada por ele, ou seja, o Estado passou a garantir a execução da decisão arbitral.

A arbitragem obrigatória pode ser observada no processo civil romano nos sistemas legis actiones e per formulas. Tais siste-mas, inseridos no universo da justiça privada, eram regidos pela

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