da escola pÚblica paranaense 2009 · domina para fundamentar a aprendizagem da modalidade culta da...
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O PROFESSOR PDE E OS DESAFIOSDA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE
2009
Versão Online ISBN 978-85-8015-054-4Cadernos PDE
VOLU
ME I
1
A ORALIDADE E A ESCRITA NAS AULAS DE
LÍNGUA PORTUGUESA: um estudo sobre a oralidade e a sua
interferência na escrita dos alunos de 5ª e 6ª série.
ESTER ROMANN DE SOUZA KNAUER/PDE-PR
RESUMO
Este artigo versa sobre um projeto que teve como objetivo investigar a
compreensão de língua oral e língua escrita por alunos das 5ª e 6ª séries do
Ensino Fundamental do Colégio Estadual Segismundo Falarz, na Vila Hauer.
Para tal estudo, busquei a fundamentação teórica pertinente. Percebi,
inicialmente, que os alunos não distinguiam as características das duas
modalidades de língua, deixando marcas da oralidade nos textos produzidos.
Iniciei uma proposta de atividades, que tinha como ponto de partida a
valorização da variação lingüística do educando, o seu linguajar, para depois
partir para a produção textual. A idéia foi partir da linguagem que a criança
domina para fundamentar a aprendizagem da modalidade culta da língua. Após
passar por uma série de atividades práticas, os alunos começaram a perceber
a distinção entre língua oral e língua escrita.
PALAVRAS- CHAVE: Oralidade, escrita e variedade linguística
2
ABSTRACT
This article discusses a project that aimed to investigate the influence of
orality in the writing of students from 5th and 6th grade Segismundo Falarz
State School, in Vila Hauer Elementary School. For this study, I tried reasoning
with the reading in several books. Since students could not differentiate the
orality of writing, leaving his mark on the texts produced. Began a proposal of
activities, which had as its starting point, the appreciation of linguistic variation
of the pupil, their language, and then leave for textual production, because it is
considered that taking into consideration the language that the child masters,
provides a more effective learning. It was found that the student could see the
difference in the large group, but when he produced his texts continued to use
the elements of orality.
1. INTRODUÇÃO
Este artigo tem por meta apresentar os resultados da aplicação e
desenvolvimento de meu projeto de pesquisa como professora no programa
PDE implementado pelo Governo do Estado do Paraná. O trabalho começou a
ser desenvolvido em meados de 2009. Num primeiro momento, desenvolvi um
projeto de pesquisa no âmbito de ensino da disciplina de Língua Portuguesa,
minha especialidade. Em seguida, tendo em vista a bibliografia pesquisada,
desenvolvi um projeto e, logo após, uma unidade didática, analisando o tema
que recortei no projeto, a saber, a oralidade e a escrita. Dando continuidade ao
programa, voltei para a sala de aula e apliquei o material didático desenvolvido
por mim. Este artigo, portanto, fecha o ciclo com as minhas ponderações e
avaliações a respeito dos resultados obtidos.
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A escolha do assunto foi com base nas atividades desenvolvidas pelos
alunos da rede pública que apresentavam textos com problemas relacionados
a marcas de oralidade dentro da escrita. Ao iniciar o trabalho constatei que eles
não possuíam o hábito de diferenciar a oralidade dentro dos seus textos e a
escrita se transformava apenas numa outra forma de falar. Por isso organizei
diferentes atividades para que houvesse um reconhecimento das
características da oralidade. Essas atividades foram realizadas em dupla,
individualmente ou coletivamente, envolvendo os alunos para que realmente
existisse um aprofundamento no assunto.
A minha preocupação, nesse trabalho, foi proporcionar diferentes
momentos de reflexão e de estudo sobre essas diferenciações, valorizando
assim, o conhecimento prévio, auxiliando na transformação da linguagem
coloquial para o uso padrão da língua. Esse estudo permitiu observar com
clareza a evolução e a dimensão do trabalho com a linguagem. Um ensino de
língua materna centrado na reflexão, no desenvolvimento do raciocínio, do
senso crítico, levando os alunos a conseguir maior preparação para enfrentar
os desafios que a transformação da linguagem oral para a escrita exige. Por
isso busquei teorias e atividades que fundamentassem a pesquisa e
valorizassem o texto escrito. Trabalhei com textos que mostrassem a oralidade
e também procurei orientá-los através da reescrita dos seus próprios textos.
Assim, este artigo tem como objetivo mostrar os resultados da
investigação qualitativa decorrentes de atividades e textos produzidos e
pesquisados pelos alunos do Ensino Fundamental, atividades em que eles
buscaram compreender e perceber que existe uma diferença entre as
modalidades de língua, de acordo com as finalidades e situações
comunicativas, ampliando sua competência linguística. Foi pensando em como
a escola deve tratar a dicotomia oral/escrito que desenvolvi este projeto.
2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA: Partindo da oralidade para a
escrita.
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Assumi nessa pesquisa que o texto, oral ou escrito, mais do que uma
unidade de sentido é um “evento discursivo” (Beaugrande, 1997,p.4), uma vez
que as pessoas precisam se comunicar e esta comunicação acontece quando
há entendimento e a interação verbal, realizada numa estrutura conversacional
ou não, é uma “atividade semântica”, isto é, um espaço de significações
(Eggins&Slade, 1997,p.5).
Para entender melhor esse processo, busquei leituras de teorias
lingüísticas que pudessem me auxiliar a encontrar novos caminhos levando
assim, os alunos a aprender a diferenciar a oralidade da escrita com
competência lingüística. O texto escrito, da mesma maneira que a fala, tem sua
própria maneira de se organizar, desenvolver e transmitir informação, pois são
distintos entre si, como afirma Marcuschi:
Embora na modalidade escrita ou na falada, o sistema linguístico seja o mesmo para a
construção das frases, as regras de sua efetivação, bem como os meios empregados,
são diversos e específicos, o que acaba por evidenciar produtos diferentes. (Marcuschi,
1986, p.62)
Existem textos escritos que se parecem com “falas”, dada a presença de
marcas de oralidade e de linguagem popular. Encontramos bastante este tipo
de texto em redações escolares. Para Sapir: “a escrita é o simbolismo visual
da fala” (1921, p.19). Para Fillmore, “A comunicação escrita é derivada da
norma conversacional face a face” (1981, p.153). E para Mattoso Câmara, “A
escrita decorre da fala e é secundária em referência a esta” (1969, p.11).
A passagem da linguagem oral para a escrita depende de uma série de
fatores. Por exemplo, a fala apóia-se nos gestos, nos movimentos do corpo, na
expressividade do olhar, na entonação e nas expressões próprias de cada
pessoa. O texto escrito impõe uma forma mais fixa, nele é necessário respeitar
convenções e regras, além de se comunicar com uma pessoa (o leitor) que
está ausente no tempo e no espaço. Para Mary Kato(2000,p.26),
A fala padrão nada mais é do que a simulação da própria escrita. Esse tipo de
simulação tem se aperfeiçoado através do que Ong (Orality e literacy, 1982) chamou de
tecnologização da fala. Esse autor nos conscientiza para o fato de que meios
tecnológicos, como o telefone, o rádio e a TV (principalmente), sustentam uma
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linguagem oral dependente da língua escrita, o que nos faz supor que, a longo prazo, a
chamada distinção entre linguagem falada e linguagem escrita tenderá a neutralizar-se,
deixando de ser empecilho para o acesso à linguagem prestigiada pela sociedade e,
através dela, à informação. Outro ponto importante no estudo de Brown (1981, p.166-
82) é a sua postura do grau de obediência à norma-padrão como critério definidor das
duas modalidades.
O aluno chega à escola falando, pois a fala é uma habilidade adquirida
antes de se escrever. Consequentemente, as regras gramaticais e textuais da
fala são adquiridas primeiro e formam a base do conhecimento da criança e do
uso da linguagem (KRESS,1982:33). “A linguagem oral é adquirida pela
criança à medida que é envolvida em contextos comunicativos, nos quais a
linguagem é sempre significativa para ela”. Se, por um lado, a criança adquire
a linguagem oral de forma “natural”, o mesmo não se tem dito sobre linguagem
escrita. A aprendizagem desta, normalmente, tem sido vinculada à
escolarização da criança. Não se pode negar que a criança adquire a
linguagem oral de forma não sistemática. No entanto, há que se considerar
que, apesar da forma predominantemente natural da aquisição da linguagem
oral, existem circunstâncias em que a criança pode refletir sobre a linguagem,
como, por exemplo, quando alguém a corrige. Nesses momentos, a criança
está elaborando uma reflexão metalingüística, ao confrontar a sua hipótese
com o que lhe diz o interlocutor.
A escola precisa mediar entre a escrita didática e aquela que a sociedade
usa, porque a fala veio primeiro. Para Délia Lerner(2002,p.14), “A intenção do
educador deve ser a de extrapolar as situações de escrita puramente escolares
e remeter às práticas sociais, para que a aprendizagem seja efetivada”. Com
base nisso, podemos dizer que falamos para nos comunicar em sociedade.
Embora as teorias que explicam a aquisição da língua pela criança possam ser
controversas, é incontestável que o uso da língua interfere profundamente na
nossa maneira de ser e de nos comunicar com os outros, pois ela marca a
nossa característica e é altamente individual. Quando falamos oralmente ao
próximo ou mentalmente a nós mesmos, conseguimos organizar o nosso
pensamento e torná-lo articulado e nítido. Dessa maneira, pode-se dizer, que é
através da linguagem, que nos comunicamos uns com os outros no ambiente
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social. Enfim, a linguagem tem uma função prática imprescindível na vida
humana.
Existem dois tipos de exposição lingüística: a que pode ser falada ou
escrita. Há muito tempo que a civilização deu uma importância extraordinária à
escrita e, muitas vezes, quando nos referimos à linguagem, só pensamos
nesse aspecto. É preciso não perder de vista, que a expressão oral aparece
muito tempo antes da expressão escrita.
Quando estamos escrevendo, a força da oralidade pode marcar a própria
escrita havendo necessidade de um policiamento cada vez mais consciente por
parte do escritor. Como diz Ehrlich(1983,p.495):
“Há uma necessidade de preservar a transmissão participativa do oral, mas há
necessidade também, por parte daquele que já ingressou no mundo dos
letrados, fazer um uso funcional do código escrito para aumentar as
possibilidades de acesso independente à informação”.
Portanto precisei elaborar determinadas atividades para que o aluno
conseguisse fazer essa transição do oral para o escrito e melhorasse sua
percepção dessas diferentes modalidades da linguagem. Kato afirma que
“alguns atos simples, o texto do autor pode ser entendido tanto literal quanto
indiretamente, através de sinais convencionais discursivos ou através do
conhecimento partilhado entre escritor e leitor” (2000,p.48).
Um outro aspecto que pode ser levantado também se refere à efemeridade
da linguagem oral, pois ela desaparece tão logo é produzida; por isso, que a
conversação e a entrevista foram filmadas para que houvesse uma transcrição
da fala para a escrita, podendo assim a linguagem escrita ser preservada no
tempo. O fato de a linguagem escrita durar mais que a linguagem oral, traz a
conseqüência de ser mais conservadora. Para CHAFE, o oral traz, nele
mesmo, a transformação (CHAFE,1985,p.122).
“Pode-se dizer que uma unidade de idéia expressa o que está na memória de
curta duração do falante, ou foco de consciência, no momento em que ela é
produzida. Assim, a unidade de idéia evidencia tanto a natureza quanto a
capacidade da consciência focal. Parece que sob condições normais, um
falante não focaliza, ou não pode focalizar, sua atenção em mais informação do
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que aquela que pode ser expressa em cerca de 6 ou 7 palavras (CHAFE &
DANIELEWICZ, 1987).”
Clark e Havilland, em S.E. Comprehensions(1977,p.4), dizem: “Procure
construir seu enunciado (ou texto) de modo que seu ouvinte (ou leitor) tenha
um e somente um antecedente direto para cada informação dada e que este
seja o antecedente pretendido.” Dessa maneira, o aluno se transformará em
um excelente orador, um leitor assíduo e um escritor completo.
3. APLICAÇÃO E ANÁLISE DOS RESULTADOS DA
IMPLEMENTAÇÃO
As atividades em análise neste artigo foram desenvolvidas em turmas de
quintas e sextas séries do Ensino Fundamental, com alunos cuja idade varia
entre 11 e 16 anos, durante quatro meses: de agosto até novembro de 2010.
Para começar as atividades precisei recorrer às habilidades que são ler,
escrever, falar e escutar – elas nos permitem agir no mundo que nos cerca e
com ele interagir. Colocamos em prática essas habilidades por meio da
linguagem. Por isso, quanto mais conhecermos a linguagem e as inúmeras
possibilidades de usá-la, tanto melhor nos expressaremos e compreenderemos
a expressão do outro.
Ninguém escreve sem ter uma intenção. Escrevemos sempre com um ou
mais objetivos que podem ser percebidos ou não pelos leitores. Entre outras
finalidades, um texto pode servir para informar, documentar, divertir,
emocionar, criticar ou convencer. Escolhemos as ideias, a linguagem e o tipo
de texto que serão empregados. Qualquer atividade deve ser debatida para
que não haja dúvida, quanto a sua realização. Pensando nessas idéias que
criei o texto “Ninando" para mostrar uma variante da língua padrão. Os alunos
puderam perceber uma linguagem diferente. O choque foi grande, pois
estavam acostumados a escrever inconscientemente, usando a oralidade e,
quando tiveram que ler e estudar a poesia, perceberam as palavras diferentes
e falaram que não escreviam assim, mas quando foi pedido que fizessem uma
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produção de texto, as palavras apareceram quase iguais às do poema. Só
assim, confrontando a teoria com a prática, eles perceberam como usavam a
oralidade nos seus escritos.
CONVERSAÇÃO
Era necessário que houvesse uma atividade envolvendo a conversação,
pois a partir daí, é que acontece uma adequação da linguagem, podendo ser
percebida quando os colegas conversam com os outros, pois é através da
conversação que aprendemos a falar, uma vez que a tecnologia permite
também o diálogo entre as pessoas distanciadas espacialmente. O que iniciou
esse distanciamento foi o telefone, que resultou numa série de regras para o
seu uso. Maneiras de cada um se identificar, duração de uma ligação, quem
deve tomar a iniciativa de mudar de assunto e de encerrar uma conversa.
Depois vieram os programas de computador como: ICQ, MSN MESSENGER e
outros, que possibilitaram a ocorrência de uma conversação na modalidade
escrita. Também os CHATS – ou bate-papos via internet, estão produzindo um
conjunto de normas de escrita compartilhadas pelos usuários. São normas
diferentes da ortografia oficial da língua, cheias de abreviações e outros
recursos, que buscam uma maior velocidade na produção escrita e incorporam
novas formas de expressão. Muitos dos alunos estavam usando a linguagem
virtual em seus textos e puderam perceber que existe uma linguagem para
cada situação. A partir dessa conversa os alunos tiveram acesso a um quadro
que mostra as principais abreviações que são usadas nessas salas de bate-
papo e puderam complementar com as suas experiências, depois montaram
um texto para mostrar a linguagem dos “chats” usadas por eles. Também
fizeram uma simulação como se estivessem conversando com o colega
informalmente, assim puderam perceber a linguagem usada por todos na sala.
Através dessa atividade puderam compartilhar com os colegas as suas
experiências, normalmente usadas, nessas salas de bate-papo.
BLZ = Beleza TC = quer Teclar ? VC = Você KDVC = Cadê você? UIN = nº do ICQ
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TB = Também
PCO = Parceiro (em sites de jogos) KKKKK = Gargalhada Fazer CIA = Fazer
Companhia Q = Que
BLZ = Beleza TC = quer Teclar ? VC = Você KDVC = Cadê você? UIN = nº do ICQ
TB = Também
PCO = Parceiro (em sites de jogos) KKKKK = Gargalhada Fazer CIA = Fazer
Companhia Q = Que
[]'s Abraços :-D Alegre :-* Beijo |-O Bocejando ¦ ( Chateado :'-( Chorando (@@)
Espanto :-) Feliz :-)))) Gargalhando :-@ ou : -V Gritando ;-) Piscando o olho :-( Triste
|-) Ficando com sono :-P Mostrando a língua ::-) Uso óculos :-(#) Uso aparelho
dentário X-) Tímido
Abraços :-D Alegre :-* Beijo |-O Bocejando ¦ ( Chateado :'-( Chorando (@@) Espanto
:-) Feliz :-)))) Gargalhando :-@ ou : -V Gritando ;-) Piscando o olho :-( Triste |-)
Ficando com sono :-P Mostrando a língua ::-) Uso óculos :-(#) Uso aparelho dentário
X-) Tímido”
Os alunos chegaram à conclusão que nem todas as pessoas falam da
mesma maneira. As diferenças na fala das pessoas ocorrem devido à classe a
que pertencem, à idade que possuem, à região do país onde elas moram e
outros motivos. Os alunos discutiram que existe uma maneira correta e uma
incorreta de falar. As maneiras de falar não são melhores nem piores, apenas
diferentes. Respeitar o modo de falar de cada pessoa é uma questão de
consciência, uma vez que falar de maneira informal numa situação formal está
errado. Da mesma maneira que falar de modo formal numa situação informal
também está errado. Além disso, conhecer as diferentes formas de linguagem
é necessário para que possamos compreender o assunto tratado.
Vale a pena salientar que há diversas situações de conversações: para
que haja uma conversação é necessário que exista uma interação entre pelo
menos dois falantes, com pelo menos uma troca de papéis; os participantes
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interagem em uma sequência de ações coordenadas, em que cada um leva em
conta a intervenção de temas comuns ao longo da interação.
A conversação requer uma interação cooperativa, onde os falantes mantêm
um determinado assunto. É muito repetido que a conversação é uma arte, e
este dito deve ser levado a sério. Como arte, a conversação não é julgada pela
qualidade informativa, mas sim, pela qualidade dos sentimentos que desperta,
se eles aproximam ou afastam os interlocutores. É interessante evitar modos
que criam antipatia, descobrir e praticar os modos que, ao contrário, induzem
simpatia e felicidade no convívio. Nesse sentido, existem coisas a serem
evitadas na conversação, coisas a valorizar e praticar.
Entre as diversas formas da conversação na sociedade, a de maior
interesse é a informal, pois é a mais utilizada pelos falantes. Passamos a maior
parte do dia conversando informalmente. Na conversação, os participantes se
alternam nos papéis de falante e de ouvinte, cada mudança de interlocutor
corresponde a um papel. Marcuschi (1986,p.19) define nos seguintes termos a
organização da conversação:
A regra geral básica da conversação é: fala um de cada vez. Pois, na
medida em que nem todos falam ao mesmo tempo (em geral um
espera o outro concluir) e um só não fala o tempo todo (os falantes se
alternam), é sugestivo imaginar a distribuição dos turnos entre os
falantes como um fator disciplinador da atividade conversacional.
Com isso, a tomada de turno pode ser vista como um mecanismo-
chave para a organização estrutural da conversação, para a qual
podemos imaginar :
A:fala e pára;
B:toma a palavra, fala e pára;
A: retoma a palavra, fala e pára;
Esse princípio da fala é frequentemente desrespeitado, isso não quer dizer
que não existam regras. Na conversação telefônica, quem faz a ligação tem a
obrigação de se identificar e de verificar se está falando com o interlocutor
desejado e tem prioridade para indicar o tema da conversa.
Quando nos comunicamos oralmente, fazemos uso de um conjunto de
recursos além das palavras: a expressão facial, os gestos, o tom de voz, a
velocidade, a ênfase. Além disso, a conversação está repleta de hesitações,
repetições, pausas, interrupções dos interlocutores, superposições de fala.
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Assim ao registrarmos a conversação, deparamo-nos com vários recursos que
não têm correspondentes no sistema gráfico. Os alunos conversam o tempo
todo e nem se dão conta do que estão dizendo e nem que fazem uso de todos
esses recursos, para que eles pudessem perceber, fizemos algumas filmagens,
mostrando conversas informais, diálogos, entre os colegas da sala. Essas
conversações foram registradas em vídeo e depois mostradas, assim todos
puderam perceber o conjunto de recursos usado na comunicação oral.
Ficou bem claro que é através da conversação que os laços são
estabelecidos, consolidados e modificados.
Num outro momento os alunos foram levados a gravar uma conversa, em
primeiro lugar entre os próprios colegas da sala e, num segundo momento,
entre os familiares, para analisar e ver as diferenças que ocorrem quando
passa da fala para um texto escrito. Após a gravação transcreveram as
conversas usando a tabela abaixo. Perceberam como representar mais
detalhadamente recursos da fala na escrita.
Ocorrências Sinais
1- Indicação dos falantes Os falantes devem ser indicados em linhas, com
letras ou alguma sigla convencional
2- Pausas ...
3-Ênfase MAIÚSCULAS
4-Alongamento de vogal : ( pequeno)
:: (médio)
::: (grande)
5- Silabação -
6- Interrogação ?
7- Segmentos incompreensíveis ou ininteligíveis ()
(ininteligível)
8- Truncamento de palavras ou desvio sintático /
9- Comentário do transcritor (())
10- Citações ""
11- Superposições de vozes [
12- Simultaneidade de vozes [[
13-Ortografia De acordo com a fala dos informantes
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Essa atividade foi válida uma vez que eles puderam perceber a riqueza da
linguagem oral e a dificuldade de expressar os sentimentos no papel.
Para desenvolver diversas estratégias envolvendo a fala e a escrita
foram feitas várias atividades como o estudo da variedade lingüística, uma vez
que a língua não constitui um sistema acabado, mas está em constante
evolução, sofrendo transformação, comprovando assim que a língua não é
usada por todos os seus falantes de modo homogêneo. O uso varia de época
para época, de região para região, de classe social para classe social e assim
por diante. Nem individualmente podemos dizer que o uso seja igual para
todos.
VARIEDADE LINGUÍSTICA
Era necessário mostrar para os alunos que existe uma língua portuguesa
que é usada de diferentes maneiras, oralmente ou por escrito. Essas
diferenças podem se manifestar no vocabulário, na pronúncia, no modo como
organizamos e combinamos as palavras nas frases, etc.
Existem muitas variações, pois nenhuma língua permanece uniforme em
todo o lugar e ainda em um só local apresenta diferenciações de maior ou
menor amplitude. Porém essas variações não prejudicam a língua ou a
consciência daqueles que a utilizam.
A variedade que um indivíduo usa é determinada por quem ele é. Todo o
indivíduo aprendeu a variedade falada em sua comunidade lingüística e essa
variedade é uma das manifestações da língua que ele fala, um de seus
dialetos. As variedades podem ser de cunho geográfico, social e individual, já
que as pessoas usam a língua da maneira que lhes convêm.
Depois da explicação sobre variedade lingüística, os alunos leram o
texto ”O jogo” e refletiram sobre ele, percebendo que nem todos falam da
mesma maneira; também leram e fizeram um estudo da poesia “O namoro”,
onde perceberam a variedade lingüística.
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O quadro abaixo mostra as ocorrências mais freqüentes das variações
lingüísticas na fala, como toda a fala pode ser escrita, isso pode retratá-la.
Abaixo, estão alguns exemplos de como a língua pode variar.
Uso de “r” pelo “l” em final de sílaba e nos grupos consonantais: pranta/planta; broco/bloco.
Alternância de “lh” e “i”: muié/mulher; véio/velho.
Tendência a tornar paroxítonas as palavras proparoxítonas: arve/árvore; figo/fígado.
Redução dos ditongos: caxa/caixa; pexe/peixe.
Simplificação da concordância: as menina/as meninas.
Ausência de concordância verbal quando o sujeito vem depois do verbo: “Chegou” duas moças.
Uso do pronome pessoal tônico em função de objeto (e não só de sujeito): Nós pegamos “ele” na hora.
Assimilação do “ndo” em “no”( falano/falando) ou do “mb” em “m” (tamém/também).
Desnasalização das vogais postônicas: home/homem.
Redução do “e” ou “o” átonos: ovu/ovo; bebi/bebe.
Redução do “r” do infinitivo ou de substantivos em “or”: amá/amar; amô/amor.
Simplificação da conjugação verbal: eu amo, você ama, nós ama, eles ama.
Quando não se tem conhecimento sobre as variações lingüísticas,
normalmente costuma-se considerá-las formas “erradas” de comunicar-se.
Embora qualquer manifestação da língua seja lícita, é preciso que se conheça
a variante formal, ou seja, o padrão culto que a escola irá ensinar. Somente
conhecendo a variedade culta da língua é que se pode ter acesso ao
conhecimento acumulado pela humanidade, por exemplo.
Outro ponto fundamental a considerar é que se o aluno percebe a escrita
como transcrição da fala, em casos como o citado acima. Ao referir-se a essa
questão, CAGLIARI (op.cit. p.31) defende que se a escola distinguisse
claramente os problemas de fala dos problemas de escrita, veria essas escritas
como escritas de fala, e feitas com uma propriedade fonética tão grande que
chega a ser comovente a consciência que as crianças têm do modo como
falam. O professor deve sempre interferir quando perceber que a criança não
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está conseguindo processar a passagem da fala para a escrita, pois há muitos
modos de falar, mas apenas um de escrever.
Após o estudo dos textos, os alunos produziram os seus próprios.
Observaram na sua produção de texto e na de seus colegas a variedade
lingüística da sala e os problemas apresentados em relação ao domínio da
escrita. Na reescrita, foram observadas algumas situações:
- Dificilmente as palavras eram acentuadas como: beija-lo, romantico, ciume,
ate, amazonia, la, voce, entre outras.
- Marcas da oralidade como: pegar ele, levar ela, resoveu, di, encomodar,
arepiado, pessadelo, tubem, agente, fui na casa, ir no, tabom, te do, feis, livos,
chau, tabom, tou, ta, te, nois, parecie, agetado, camioneiro,intão, migo,
dumingo, mami, acustumados, iveja,decha, senviço, nomal,loca, com sigo,
virge, tembe, vo toma banho, a gente vamos, soto, muito, feze se, tambeim,
queto, interomperam, entam, tava, vai ir, poco, tenque, mucho, dinhero, beim,
xau, saindu, atarde, fais, dexa, tamem, baxando, tu tava, vô lava loca, onte,
purinquanto, pravim, tabom, colpa, se encontramo, pêra ai, vaim, e outras.
- Dificuldade em usar letra maiúscula.
- Retirada do r final: trabalha (trabalhar), compra (comprar) e outras.
- Retirada do s final: vamo assisti ele, e outras.
Há algumas situações que decorrem da variedade lingüística e outras da
insegurança em relação à escrita.
A escrita que apresentam é uma reprodução da fala, pois, se alguma
palavra apresenta um determinado fonema (som) que na escrita é
representado por outro grafema (como nos exemplos de /s/ acima citados), a
tendência é escrevê-la de acordo com sua fala, não dominando a convenção.
Todas as palavras foram retiradas das redações dos próprios alunos.
GÍRIA
Quando comecei a questionar os alunos a respeito da gíria, nem todos
sabiam o que significava e muito menos se eles falavam ou não. Então
expliquei o significado do termo: variedade estilística, fala de um determinado
grupo ou situação social. A gíria é um fenômeno tipicamente sociolingüístico,
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que pode ser estudado sob dois modos: a primeira chamada gíria de grupo,
que é um vocabulário de grupos sociais restritos, cujo comportamento se afasta
da maioria, seja pelo inusitado, seja pelo conflito que estabelecem com a
sociedade. São grupos ligados à música, à dança, às diversões, aos esportes,
aos pontos de encontro nos shoppings, à universidade e outros; há os grupos
comprometidos com as drogas e o tráfico, com a prostituição, com o roubo e o
crime e outros, que usam a gíria como uma linguagem secreta, sendo uma
defesa do grupo e, às vezes, configurando posição de superioridade, tendo que
ser mudada, tão logo se torne conhecida por outras pessoas que não
pertencem ao grupo, perdendo assim, a sua verdadeira significação.
A gíria faz parte das mais diferentes situações interacionais. E jovens e
adultos empregam vocábulos gírios, às vezes, nem se dão conta de que o
fazem. Na linguagem falada, a gíria constitui um recurso simples para
aproximar os interlocutores, quebrar a formalidade, forçar uma interação mais
próxima dos interesses das pessoas que dialogam. Essa situação, também,
ocorre na imprensa, onde o envolvimento com o leitor requer que se
empreguem, às vezes, recursos da oralidade.
Na vida urbana moderna, ao lado do rádio e da TV, a imprensa está na
linha de frente das transformações lingüísticas, em particular na luta pela
concorrência das formas populares com as cultas. Depois dessa explicação foi
feita uma pesquisa na sala para ver quais eram as gírias mais usadas e depois
no colégio. Foram dadas algumas gírias como ponto de partida para a
pesquisa.
animal: pessoa muito legal ou agressiva.
avião: mulher bonita.
comer pelas beiradas: chegar de mansinho.
crescer o olho: cobiçar alguma coisa.
dar um gás: fazer alguma coisa rapidamente.
dar um rolê: dar uma volta, passear.
do bem: alguém que é confiável.
ficar: namorar sem compromisso.
firmeza: pessoa legal.
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jaburu: mulher feia.
maneiro: algo bem interessante.
mina: menina, garota.
tigrão: garoto bonito, esperto.
Dar um rolê: passear, sair
Gostosa: mulher bonita, sensual
Porrada: soco, murro
Pipoco: tiro
Mocréia: mulher feia
Bater um fio: fazer um telefonema
Os alunos se reuniram em equipes e foram entrevistar os colegas.
Primeiro os da sala e depois do colégio, para saber qual era o tipo de gíria que
eles usavam com mais frequência e a conclusão foi:
“ fecho - liga – to de boa – truta – na moral – comu – treta – susse – zuera –
oloko – noia – role – baia – soh – abacache – to de face – zuera - pides – grilo
– loko – foi mau, cara – mano – beleza – massa – capais – bera – tirambaço –
mina – brother – galera – nais – roele – puts ferro – me ferrei – hora do rango –
grog – na naio por aí – feixou – sarro – de dá dó – é nois que ta – noiado – nóia
– dorgas – a só – affê – cabaço – loka – grude – se liga – truta – na moral –
comu – treta”
Depois da pesquisa feita, chegou-se à conclusão que no Colégio os
alunos usam o mesmo tipo de gíria, uma vez que houve repetições.
Conseguimos identificar o tipo de gíria falada por aquela comunidade.
A FALA NA ESCRITA
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Fiz também atividades de conversação com o objetivo de estudar a variedade
lingüística e as gírias. Considerei que os alunos já estavam prontos para
identificar a fala na escrita através de textos. Eles leram os textos e tinham que
identificar e retirar as marcas de oralidade fazendo as devidas modificações.
Como diz no primeiro capítulo de seu livro “Da Fala Para a Escrita”, Luís
Antonio Marcushi propõe, antes de tudo, um esclarecimento sobre o tema que
pretende abordar. Ele afirma que muito mais do que apenas uma distinção
entre a “fala e escrita”, é entender que, na verdade, são práticas sociais muito
distintas, cada uma delas com suas possibilidades, necessidades
funcionalidades.
Marcushi deixa muito claro em seu livro o quanto é equivocada a
“supervalorização da escrita” na nossa sociedade, mostrando que “o homem é
um ser que fala e não é um ser que escreve” e que, portanto, a língua se faz no
uso e não por regras predeterminadas.
Sem querer elevar a oralidade a um patamar superior ao da escrita, o autor
explica como ambas têm sua importância e papel social definido e que,
portanto, consistem de dois tipos diferentes de “modalidades de uso da língua”,
não sendo uma nem melhor e nem pior que a outra, apenas que uma é mais
adequada para determinadas situações, enquanto a outra tem diferentes usos.
Desta maneira devemos escolher qual usar mediante a situação
apresentada, como, por exemplo, o âmbito escolar.
Tendo isso em vista, conduzi algumas atividades de reescrita para que os
alunos pudessem perceber as marcas da fala e foram feitas adequações, a fim
de melhorar o entendimento do texto na forma padrão. Essa atividade foi muito
proveitosa, pois puderam perceber as marcas da oralidade como a repetição
do e, uso de daí, repetições de palavras, que poderiam ser substituídas por
sinônimos ou por pronomes, o uso de né?, Fazendo essas modificações para a
linguagem padrão. Observaram-se as dificuldades em relação à escrita dos
educandos e não deixando de valorizar a variedades lingüísticas trazida pelo
convívio familiar.
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LINGUAGEM FORMAL E INFORMAL
Sei que é muito importante distinguir a linguagem formal da informal, uma
vez que as variedades (a variedade padrão, as variedades regionais,
estilísticas) podem se apresentar de modo formal ou informal. O uso da
variedade padrão ou de outra variedade, as expressões regionais, gírias,
jargões e os graus de formalidade e informalidade dependem do contexto, da
situação de comunicação.
A maneira mais elaborada de falar ou escrever é chamada linguagem
formal. A linguagem formal é mais usada na escrita e em situações orais
formais, como palestras, seminários entrevistas de alguns tipos de emprego,
entre outras.
A maneira mais simples e descontraída de falar ou escrever é chamada de
linguagem informal. Nós a usamos quando temos mais intimidade com nosso
interlocutor ou quando queremos nos aproximar dele. Ex: E aí tudo bem?
Podemos usar uma linguagem menos ou mais formal, de acordo com a
situação e a pessoa com quem interagimos.
Os alunos desenvolveram várias atividades com base em textos onde ficou
bem clara essa informalidade em alguns momentos e em outros a formalidade,
como interpretação de texto e algumas situações envolvendo a linguagem
adequada para ser usada em um discurso, um bilhete, uma conversa ou até
mesmo entrevista.
Foram criadas diferentes situações, para que na prática, os alunos,
pudessem perceber o uso da linguagem formal e informal. Essa atividade foi
muito bem aceita, pois eles não percebiam que existia essa diferença e quando
ela deveria ser usada ou não.
ENTREVISTA
O ponto culminante deste material foi a entrevista, pois movimentou o
colégio todo, uma vez que entrevistaram desde os colegas até a diretora, pois
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a entrevista constitui um processo de interação que se constrói com marcas do
empenho dos participantes na negociação da significação. Tal processo não
pode ser avaliado como um simples ato de produzir enunciados a um falante
da mesma língua, e sim como uma forma de organizar a fala para compreender
e se fazer compreender, envolvendo características tanto da fala como da
escrita.
A entrevista é uma conversa entre duas ou mais pessoas, situação em que
algumas questões são levantadas para obterem-se informações. Segundo
Marcuschi(2000):
“Há eventos que parecem entrevistas por sua estrutura geral
de perguntas e respostas, mas distinguem-se muito disso. É o
caso da tomada de depoimento na justiça ou do inquérito
policial. Ou então um exame oral em que o professor pergunta
e o aluno responde. Todos esses eventos distinguem-se em
alguns pontos (em especial quanto aos objetivos e a natureza
dos atos praticados) e assemelham-se em outros”.
Segundo Marcushi, pode-se dizer que o gênero entrevista possui itens gerais
comuns a todos os gêneros entrevista, como a sua estrutura que será sempre
caracterizada por perguntas e respostas, envolvendo pelo menos dois
indivíduos; o papel do entrevistador caracteriza-se por abrir e fechar a
entrevista, fazer perguntas, pedir a palavra ao outro, orientar na transmissão de
informação, introduzir novos assuntos, orientar e reorientar; já o entrevistado
responde e fornece informações pedidas; gênero oral, podendo ser transcrito
para ser publicado em revistas, jornais ou sites.
Portanto é preciso deixar claro que, numa entrevista, os direitos dos
participantes não são os mesmos, pois o entrevistador faz as perguntas e
oferece, em seguida, o turno ao entrevistado. Na verdade, as relações de
poder entre eles, deixa-os em diferentes condições de participação no diálogo,
havendo um direcionamento maior ou menor na interação... (FÁVERO, 2000, p.
80). Segundo Fávero (2000), é possível também ocorrer o inverso, ou seja, o
entrevistado pode dirigir a entrevista. E, em casos menos frequentes, os dois
interagem em situação ideal, sem que haja direcionamento.
Na sua maioria, os tipos de entrevista vão além da interação eu – tu,
pois o ouvinte, telespectador, leitor vai influenciar indiretamente a função do
entrevistador/entrevistado. Por exemplo, se o entrevistador fizer oposição a um
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determinado governo, poderá deixar claro para o público no tipo de perguntas
que fará. Na língua falada o planejamento e a produção são simultâneos, ou
quase. O que não ocorre na escrita, pois essa é passível de inúmeras revisões.
As entrevistas orais (no rádio e TV) mantêm as marcas da oralidade
(hesitações, falsos começos, repetições, paráfrases, etc.). As entrevistas que
são publicadas por escrito acabam sendo despidas dessas marcas.
Outro elemento que precisa passar por análise séria é o par dialógico
Pergunta- Resposta (P-R), levando em conta o contexto de ocorrência e a sua
função sociodiscursiva.
Nem sempre acontece a P seguida de R. Uma pergunta pode ser
sucedida por outra pergunta. Uma entrevista normalmente constitui-se de
vários tópicos. O entrevistador normalmente faz uma P para iniciar a entrevista
e a cada novo tópico uma nova P. As P-R também dão prosseguimento aos
tópicos já iniciados. Às vezes ocorre o desvio do tópico, aí o interlocutor poderá
redirecioná-lo através de uma P. Pode ocorrer também uma P para que haja
mudança no tópico, se o mesmo já está esgotado ou não se quer mais falar
sobre ele. A função básica, principalmente da entrevista jornalística, é a busca
de informações, mas ao considerar o par P-R, Fávero (2000) aponta, ainda,
que se fazem perguntas para obter informações, que podem ser seguidas por
outra P para obter a confirmação dessa informação. Ainda pergunta-se para
obter esclarecimento, principalmente na parte oral da entrevista, pois na escrita
esta parte poderá ser eliminada.
São recorrentes ainda as “perguntas retóricas” feitas apenas para
manter o turno, uma vez que se conhece a resposta. Portanto: o par dialógico
P-R se configura como elemento imprescindível na organização do texto da
entrevista, prestando-se a consolidar ou a modificar as relações entre os
interlocutores (entrevistador, entrevistado, audiência), imprimindo um caráter
vivo ao evento discursivo. (FÁVERO, 2000, p. 96)
Considerar a entrevista como um evento de comunicação e
comunicação oral na sua essência, justifica sua escolha como corpus do
presente trabalho. A intenção aqui não é a de esgotar uma teorização com
relação ao gênero em questão, mas apenas destacar os aspectos mais
relevantes desse evento comunicativo tão presente em todos os setores sociais
da vida moderna.
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Foram trabalhadas, com os estudantes, algumas características como a
postura e a ética do entrevistador. Vasconcelos (2007) nos esclarece quanto ao
respeito sobre o que foi proferido pelo(s) entrevistado(s), ou seja, mesmo que o
material original passe por um processo de editoração, o entrevistador precisa
cuidar para não desvirtuar as informações dadas pelo(s) entrevistado(s). O
autor também nos apresenta algumas outras questões relevantes de serem
estudadas, como: autorização para gravar ou registrar os dados da entrevista;
respeito ao entrevistado e a sua cultura; distância audível entre entrevistado e
entrevistador; adequação do vocabulário; e postura/imagem corporal do
entrevistador. O quadro mostra como fazer a passagem da linguagem oral para
a escrita.
OCORRÊNCIA SINAIS EXEMPLIFICAÇÃO
Segmentos ou palavras
incompreensíveis
ou ininteligíveis
( ) ) bora gente... tenho aula... ( )
daqui
Hipótese do que se ouviu (hipótese) (estou) meio preocupado (com o
gravador)
Truncamento de palavras ou
desvio sintático
/ / eu... pre/ pretendo comprar
Entoação enfática (ênfase) MAIÚSCULA porque as pessoas reTÊM moeda
Alongamento de vogal ou
consoante :(pequeno)
::(médio)
:::(grande)
eu não tô querendo é dizer:: é: o
eu fico
até:: o: tempo todo
Silabação _ Do-minadora
Interrogação ? e o Banco... Central... certo?
Qualquer pausa ... são três motivos... ou três razões
Comentários descritivos do
transcritor ((minúscula)) M.H... é ((rindo))
Comentários que quebram a
seqüência
temática da exposição; desvio
temático
– – – – ... ... a demanda de moeda – –
vamos dar essa
notação – – demanda de moeda
por
motivo...
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Superposição de vozes
[
H28. é... existe... [você...
M33. [pera aí... você acha...
Simultaneidade de vozes [[ mas eu garanto
H28 [[ eu acho é...
Citações “ “ “mai Jandira eu vô dize a Anja”
– Símbolos utilizados na transcrição de textos orais
FONTE: KOCH (1992, p. 73-74); DIONÍSIO (2001, p. 76)
Essas marcas pretendem codificar na escrita certos recurso da linguagem
falada. No entanto, se a entrevista for publicada, deve-se traduzir a linguagem
falada para a linguagem escrita. Esse é um excelente exercício para se
entender a diferença entre as duas modalidades.
Foram organizadas equipes e escolhido o entrevistado; as perguntas
foram elaboradas e a entrevista foi filmada; a escolha das palavras, a maneira
de elaborar as frases foram compreensíveis à pessoa que estava sendo
entrevistada. A apresentação foi feita em forma de vídeo e depois de analisada,
por escrito, eles transcreveram, fazendo referência a várias normas indicadas
pelo quadro que demandam eficiência no uso oral para o escrito da língua.
Após essa atividade, os alunos elaboraram “O jornal da TV”, que é uma
forma de notícia, que foi apresentada em equipe. Foi necessário apresentar a
notícia, pensando nas características de seus espectadores, que eram pessoas
da escola e da comunidade. A linguagem foi clara, objetiva e compreensível,
relatando fato ou acontecimento atual do interesse das pessoas, formando
assim, um vídeo e um jornal. Desse modo, fez-se uma transposição da língua
oral para a língua escrita ao se editar o texto.
A sala foi dividida em equipes, cada uma ficou encarregada de montar,
produzir um jornal. O primeiro passo foi montar as perguntas para fazer a
entrevista. Cada equipe ficou encarregada de entrevistar 3 pessoas, da escola
ou fora dela. Os assuntos seriam relacionados ao momento atual. Eles teriam
que filmar a entrevista e depois passar para os colegas como se fossem
repórteres. Enquanto alguns montavam as entrevistas, os outros membros da
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equipe escolhiam as matérias que seriam colocadas no jornal. Nos dias da
apresentação, os “jornalistas” apresentavam o jornal e os “repórteres”
mostravam as suas entrevistas. Após a apresentação, os alunos perceberam
as marcas da oralidade, uma vez que transcreveram as entrevistas. A atividade
foi válida, pois eles nem sabiam que existia uma diferença tão grande entre a
oralidade e a escrita.
Prosseguindo nesse eixo, foram feitas algumas tentativas de transcrição
conversacional, utilizando os marcadores conversacionais da teoria da Análise
da Conversação (AC), segundo Marcuschi (2006). Partimos, finalmente, para a
retextualização, atividades de escrita que partiram do texto oral ouvido, depois
já transcrito até chegarmos à modalidade escrita culta.
Os alunos quiseram refazer o “laboratório de entrevistas” para comparar as
falas e as superações de dificuldades. Nas posteriores avaliações escritas
expuseram as descobertas feitas com relação às exigências da fala em
momentos mais formais e o quanto das marcas dos textos orais eles levam
para seus textos escritos. Valorizei mais a entrevista, pois foi nela que o aluno
realmente mostrou o que aprendeu. No final tiveram que fazer a transcrição
retirando todas as marcas de oralidade que aprenderam.
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
No decorrer do desenvolvimento das atividades, foi percebido o quanto a
criança trabalha naturalmente com a oralidade e a escrita. Fora do ambiente
escolarizado, os alunos conseguem se expressar com naturalidade e
desenvoltura. Isso mostra como é importante a valorização da oralidade para
que o aluno possa ter segurança no processo de transcrição para a escrita. Por
outro lado, é extremamente útil e necessário refletir sobre a escrita, pois
somente assim os alunos começam a observar as suas características.
Os resultados obtidos foram significativos, porque as atividades
desenvolvidas contribuíram para uma reflexão da prática pedagógica. Buscou-
se sempre como ponto de partida o aspecto de que a escrita funciona como
sistema de representação da linguagem oral das crianças. “É um momento
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transitório de passagem da oralidade para a escrita. (Franchi, 2003). Essa foi
uma mediação necessária porque assim ganharam espaço e se fortaleceram
todas as formas de manifestação na escrita.
Respeitando essa mediação, notou-se nas crianças o gosto e a
confiança na oralidade, mostrando o prestígio de sua arte verbal e não tendo
medo de produzir uma escrita totalmente subjetiva.
Foi necessário esclarecer ao aluno que existem diferentes formas de
usar a língua oral e que essas maneiras são contextualmente definidas. Desse
modo ele poderá monitorar o seu estilo, adequando sua linguagem à
circunstância de fala.
A escrita não consegue reproduzir a fala. Esta tem sua entonação,
timbre, altura, ênfase, pausas e velocidade de enunciação que são parcamente
reproduzidas na escrita pelos diversos sinais gráficos. Essas diferenças
apontam para as diferentes situações de comunicação. Um ato de fala implica,
necessariamente, o contato entre os interlocutores, sendo ele indireto no caso
da escrita. Um ato de fala apóia-se em recursos extralingüísticos como gestos,
expressões faciais, postura, elementos facilitadores de uma comunicação.
Em termos lingüísticos, a língua falada apresenta com mais intensidade
repetição de palavras, emprego de gíria e neologismos, maior uso de
onomatopéias, emprego restrito de certos tempos e aspectos verbais e
colocação pronominal livre. De forma diferente acontece com a escrita, cujo
vocabulário tende a ser mais rico e vocabulário próprio com emprego de
sinônimos, emprego de termos técnicos, vocábulos eruditos, substantivos
abstratos, empregos de tempos verbais como pretérito-mais-que-perfeito e
futuro do pretérito e colocação pronominal de acordo com a gramática.
Em primeiro lugar, a fala é relativamente não-planejável de antemão.
Isso é fruto de sua natureza interacional, pois ela precisa ser planejada e
replanejada localmente, a cada novo “lance” do turno conversacional. Isso
mostra que o texto falado se constitui “em se fazendo”, ou seja, na sua própria
gênese, no processamento de sua construção. Exatamente o oposto do texto
escrito, cuja elaboração requer mais tempo do produtor, que o planeja, faz
rascunhos, revisa, corrige, atualiza. No caso do texto falado, essas operações
são quase que simultâneas à enunciação.
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Na fala, ocorrem freqüentes descontinuidades, derivadas de uma série
de fatores de natureza cognitivo-interacional, justificadas, pois, por razões
relevantes de natureza pragmática. Apesar de suas especificidades, o texto
falado tem como pano de fundo a sintaxe geral da língua.
O texto escrito, de forma diferente do falado, é resultado de uma
produção pensada, planejada, articulada de forma minuciosa. É, portanto, um
produto estático.
Procurou-se, neste trabalho, trazer algumas reflexões que possam levar
a uma renovação metodológica nas aulas de língua portuguesa a fim de que
possam contemplar realmente a prática discursiva da oralidade como conteúdo
estruturante previsto pelas DCEs.
A oralidade e a escrita possuem inter-relações e diferenças, mas muitas
vezes fica difícil estabelecer limites entre elas, portanto sem priorizar nenhuma
das modalidades, ambas devem ter seu lugar dentro da disciplina de Língua
Portuguesa.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS PRETI, Dino. Estudos de Língua Falada: variações e confrontos. 1ª edição. São Paulo. Humanitas, publicações. 1999. CAMARA Jr., J. Mattoso. Manual de expressão oral& escrita. 26ª edição. Petrópolis. Editora Vozes. 2009. PRETI, Dino. Estudos de língua oral e escrita. 1ª edição. Rio de Janeiro. Editora Lucerna. 2006.
MARCUSCHI, L.A. Gêneros textuais: definição e funcionalidade. In. DIONÍSIO, A.P; MACHADO, A.R; BEZERRA, M.A. (Org) Gêneros textuais e ensino. Rio de Janeiro, Lucerna, 2003.