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CURSO DO PROF. DAMÁSIO A DISTÂNCIA
DIREITO PROCESSUAL PENAL
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Praça Almeida Júnior, 72 – Liberdade – São Paulo – SP – CEP 01510-010
Tel.: (11) 3346.4600 – Fax: (11) 3277.8834 – www.damasio.com.br
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
MÓDULO I
DIREITO PROCESSUAL PENAL
1. PRINCÍPIOS GERAIS INFORMADORES DO PROCESSO
1.1. Princípio da Imparcialidade do Juiz
O Juiz situa-se entre as partes e acima delas (caráter substitutivo).
Para assegurar sua imparcialidade, a CF estipula garantias (art. 95) e vedações (art.
95, par. ún.) e proíbe tribunais de exceção (art. 5.º, XXXVII).
1.2. Princípio da Igualdade Processual
As partes devem ter, em juízo, as mesmas oportunidades de fazerem valer suas
razões.
No processo penal, esse princípio sofre alguma atenuação, devido ao princípio
constitucional do “favor rei”, segundo o qual o acusado goza de alguma prevalência e
contraste com a pretensão punitiva.
1.3. Princípio do Contraditório
É identificado na doutrina pelo binômio “ciência e participação”.
O Juiz coloca-se eqüidistante das partes, só podendo dizer que o direito preexistente
foi devidamente aplicado ao caso concreto se, ouvida uma parte, for dado à outra o direito
de manifestar-se em seguida.
1.4. Princípio da Ampla Defesa
Implica o dever do Estado de proporcionar a todo acusado a mais completa defesa,
seja pessoal, seja técnica (art. 5.º, LV, da CF/88), seja o de prestar assistência jurídica
integral e gratuita aos necessitados (art. 5.º, LXXIV, CF).
Decorre a obrigatoriedade de se observar a ordem natural do processo, de modo que
a defesa se manifeste sempre em último lugar.
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1.5. Princípio da Disponibilidade e da Indisponibilidade
Disponibilidade é a liberdade que as pessoas têm de exercer ou não seus direitos.
No processo penal, prevalece o princípio da indisponibilidade, pelo fato do crime
ser considerado uma lesão irreparável ao interesse coletivo.
Decorre algumas regras, tais como:
impossibilidade de a autoridade policial arquivar o inquérito policial (art. 17 do
CPP);
o Ministério Público não pode desistir da ação (art. 42 do CPP), nem do recurso
interposto (art. 576 do CPP).
A CF abranda essa regra, ao permitir a transação em infrações de menor potencial
ofensivo. E também nos casos de ação penal privada e ação penal condicionada à
representação ou à requisição do Ministro da Justiça.
1.6. Princípio da Verdade Material ou da Manifestação das Provas
É característico do processo penal.
Consiste no dever de o Magistrado esgotar todas as possibilidades para se alcançar a
verdade real dos fatos, para servir de fundamento na sentença.
Regra: o que não está nos autos, não está no mundo.
1.7. Princípio da Publicidade
É uma garantia de independência, imparcialidade, autoridade e responsabilidade do
Juiz.
Exceção: casos em que o decoro ou o interesse social aconselham que eles não
sejam divulgados.
1.8. Princípio do Duplo Grau de Jurisdição
Consiste na possibilidade de revisão, por via de recurso, das causas já julgadas pelo
Juiz de primeiro grau.
Não é tratado de forma expressa em nenhum texto legal, nem na Constituição.
Decorre da própria estrutura atribuída ao Poder Judiciário pela CF.
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1.9. Princípio do Juiz Natural
Previsto no art. 5.º, LIII, da CF/88, que dispõe que “ninguém será sentenciado senão
pelo Juiz competente”.
Juiz natural é, portanto, aquele previamente conhecido, segundo regras objetivas de
competência estabelecidas anteriormente à infração penal, investido de garantias que lhe
assegurem absoluta independência e imparcialidade.
Decorre também a proibição de criação de tribunais de exceção, art. 5.º, XXXVII,
CF.
1.10. Princípio do Estado de Inocência
Ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado da sentença penal
condenatória (art. 5.º, LVII, da CF/88).
Desdobra-se em três aspectos:
prova: deve ser valorada em favor do acusado quando houver dúvida;
instrução processual: inverte-se o ônus da prova, i. e., o réu não precisa provar
que é inocente, mas sim a acusação precisa fazer prova de que ele é culpado;
no curso do processo: trata-se de entendimento expresso na Súmula n. 9/STJ:
“A exigência da prisão provisória, para apelar, não ofende a garantia
constitucional da presunção de inocência”.
1.11. Princípio do “favor rei”
A dúvida sempre beneficia o acusado.
Alguns recursos são exclusivos da defesa (protesto por novo júri e embargos
infringentes).
Só cabe ação rescisória penal em favor do réu (revisão criminal).
1.12. Princípio da Ação ou Demanda
Indica a atribuição à parte da iniciativa de provocar o exercício da função
jurisdicional.
A jurisdição tem como característica a inércia – impede que o Juiz instaure o
processo por iniciativa própria, visando a manutenção de sua imparcialidade; por 3
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conseqüência, a movimentação da máquina judiciária exige a provocação do interessado.
1.13. Princípio da Oficialidade
Significa que os órgãos incumbidos da persecutio criminis não podem ser privados.
A função penal é eminentemente pública, logo, a pretensão punitiva do Estado deve ser
deduzida por agentes públicos (arts. 129, I, e 144, § 4.º, da CF c.c. art. 4.º do CPP).
Admite-se, como exceção, a ação penal privada, a ação penal privada subsidiária da
pública – quando da inércia do órgão do MP – e a ação penal popular – na hipótese de
crime de responsabilidade praticado pelo Procurador-Geral da República e por Ministros
do STF (arts. 41, 58, 65 e 66 da Lei n. 1.079/50).
1.14. Princípio da Oficiosidade
As autoridades públicas incumbidas da persecução penal devem agir de ofício, sem
necessidade do assentimento de outrem.
Ressalvam-se os casos de ação penal privada (art. 5.º, § 5.º, do CPP) e ação penal
pública condicionada.
Trata-se de um princípio geral relacionado a todas as autoridades que participam do
procedimento criminal, e diferencia-se do princípio do impulso oficial, referente ao
magistrado.
1.15. Princípio do Impulso Oficial
Também denominado princípio do impulso processual, atribui ao Juiz a ativação do
procedimento fase a fase em direção à decisão definitiva. Embora a jurisdição seja inerte, o
processo, uma vez instaurado, terá continuidade até o exaurimento da função jurisdicional.
1.16. Princípio da Verdade Formal ou Dispositivo
Implica na regra de que o Juiz depende da iniciativa das partes, quanto às provas e
às alegações, para fundamentar sua decisão.
É principio próprio do processo civil que vem sendo mitigado, permitindo ao Juiz
uma posição mais ativa, impulsionando o andamento da causa, determinando provas de
ofício e reprimindo condutas abusivas e irregulares. 4
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1.17. Princípio da Persuasão Racional do Juiz
Situa-se entre o sistema da prova legal, em que os elementos probatórios possuem
valor prefixado, e o sistema do julgamento secundum conscientiam, em que o Juiz pode
decidir com base na prova dos autos, mas também sem provas e, até mesmo, contra a
prova.
No princípio da persuasão racional, o Juiz é vinculado às provas e elementos
existentes nos autos, mas sua apreciação não depende de critérios legais preestabelecidos.
A avaliação ocorre segundo parâmetros críticos e racionais.
Esta liberdade não se confunde com arbitrariedade, pois o convencimento do Juiz
deve ser motivado.
1.18. Princípio da Motivação das Decisões Judiciais
Previsto nos arts. 93 da CF e 381 do CPP. Sua finalidade é aferir em concreto a
imparcialidade do Juiz e a legalidade e justiça das decisões.
1.19. Princípio Lealdade Processual
Consiste no dever de verdade, reprovando a conduta da parte que se serve de
artifícios fraudulentos.
A fraude destinada a produzir efeitos no processo penal foi tipificada no art. 347 do
CP.
1.20. Princípio da Economia Processual
Preconiza o máximo resultado na atuação do direito com o mínimo emprego
possível de atividades processuais. São exemplos da aplicação desse princípio os casos de
conexidade e continência (arts. 76 e 77 do CPP).
Corolário da economia processual é o princípio do aproveitamento dos atos
processuais ou da instrumentalidade das formas, em que os atos imperfeitos só serão
anulados se o objetivo não for atingido, pois o que interessa é o objetivo, e não o ato em si
mesmo. Tal regra segue o brocardo pas de nullite´sans grief.
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1.21. Princípio do Promotor Natural
Deflui da norma contida no art. 5.º, inc. LIII ,da CF, em que ninguém será
processado senão pelo órgão do MP com atribuições previamente fixadas e conhecidas.
O STF vedou a designação casuística de promotor pela chefia da Instituição para
promover a acusação em caso específico, pois tal procedimento chancelaria a figura do
chamado “promotor de exceção” (HC n. 67.759/RJ, Rel. Min. Celso de Mello, RTJ
150/123).
2. PRINCÍPIOS INFORMADORES DO PROCESSO PENAL
2.1. Princípio da Verdade Real
É princípio próprio do processo penal, indica que o Juiz deve perscrutar a realidade,
não se conformando com o que é apresentado nos autos (verdade formal). Como exemplo,
pode ser citado o art. 156 do CPP, que permite ao Juiz determinar diligências de ofício para
dirimir dúvida sobre ponto relevante.
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2.2. Princípio da Legalidade
Impõe a observância da lei pelas autoridades encarregadas da persecução penal, que
não possuem poderes discricionários para apreciar a conveniência e oportunidade da
instauração do processo ou do inquérito.
2.3. Princípio da Autoritariedade
Confunde-se com o princípio já analisado no item 1.13. (princípio da oficialidade).
2.4. Princípio da Indisponibilidade
Significa que o órgão do MP não pode desistir (dispor) da ação penal pública, nem
do recurso interposto (arts. 42 e 576 do CPP).
A exceção é encontrada no art. 76 da Lei n. 9.099/95, que trata da transação penal.
Sendo esta aceita pelo réu, afasta a incidência do processo penal.
2.5. Princípio da Iniciativa das Partes
Decorrência do princípio da ação, em que o Juiz não pode iniciar o processo sem a
provocação da parte. São legitimados para a ação penal o MP, nas ações públicas (art. 129,
inc. I, da CF), e o ofendido ou seu representante legal, nas ações privadas ou subsidiárias
da pública (arts. 5.º, LIX, da CF e 29 e 30 do CPP).
2.6. Princípio ne eat judex ultra petita partium
Indica que o Juiz deve ater-se ao pedido feito na peça inaugural, não podendo
pronunciar-se sobre o que não foi requerido.
Não constitui julgamento ultra ou extra petita a permissão trazida pelos arts. 383
(emendatio libelli) e 384 (mutatio libelli) do CPP.
O art. 383 do CPP possibilita ao Juiz dar ao fato definição jurídica diversa da
constante na denúncia ou queixa; e o art. 384 do CPP trata da mudança na acusação,
sempre que os fatos narrados na denúncia ou queixa tiverem de ser modificados em razão
de prova nova surgida no curso da instrução criminal.
2.7. Princípio da Identidade Física do Juiz7
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Dispõe que o Juiz encontra-se vinculado ao processo que presidiu a fase instrutória,
devendo decidi-lo. Este princípio não vigora no processo penal.
2.8. Princípio do Devido Processo Legal
Previsto pelo art. 5.º, inc. LIV, da CF, o due process of law assegura à pessoa o
direito de não ser privada de sua liberdade e de seus bens sem a garantia de um processo
desenvolvido de acordo com a lei.
A expressão “processo” trazida pela norma constitucional engloba não só os
processos judiciais, mas também os procedimentos administrativos e militares.
2.9. Princípio da Inadmissibilidade das Provas Obtidas por Meios Ilícitos
Também previsto no art. 5.º, LVI, da CF/88. A ilegalidade de uma prova pode advir
da contrariedade de uma norma de direito material (sendo chamada de prova ilícita) ou de
direito processual (sendo chamada de prova ilegítima). A Constituição proíbe tanto uma
quanto outra.
A doutrina e a jurisprudência rechaçam as provas ilícitas por derivação (teoria dos
“frutos da árvore envenenada” – fruits of the poisonous tree); são aquelas produzidas a
partir de outra ilegalmente obtida. Exemplos trazidos pelo Prof. Fernando Capez, Curso de
Processo Penal, 6.ª ed., Saraiva, 2001, pág. 31: confissão extorquida mediante tortura;
interceptação telefônica clandestina.
Não se admite, em regra, a prova advinda de práticas ilegais, ainda que lícita em si
mesma. Ex.: informação sobre o local do cativeiro obtida por tortura. Em hipóteses
extremas (como a citada), vem sendo aceita a prova lícita resultante de uma ilegalidade.
2.10. Princípio da Brevidade Processual
Verificando-se uma divergência, deve-se adotar a decisão mais célere, de acordo
com o que normalmente acontece, conforme exemplifica o Prof. Fernando Capez na obra
já citada: na dúvida entre tráfico internacional ou nacional, os autos devem ser remetidos à
justiça estadual; surgindo fato novo, em razão da matéria, modifica-se a competência.
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MÓDULO II
DIREITO PROCESSUAL PENAL
1. EFICÁCIA DA LEI PROCESSUAL NO TEMPO
A lei processual aplicar-se-á desde logo, sem prejuízo dos atos realizados sob a
vigência da lei anterior (art. 2.º do CPP).
Vige, no processo penal, o princípio da aplicação imediata, com a ressalva de que os
atos anteriores serão preservados.
2. EFICÁCIA DA LEI PROCESSUAL NO ESPAÇO
A lei processual penal aplica-se a todas as infrações penais cometidas em território
brasileiro, sem prejuízo das convenções, tratados e regras de Direito Internacional.
Algumas exceções à territorialidade do CPP:
Código Processual Militar;
Código Eleitoral;
Lei de Tóxicos;
Lei de Imprensa;
Lei dos Juizados Especiais Criminais.
3. IMUNIDADES
3.1. Imunidades Diplomáticas
Quem comete crime no Brasil responde por ele no Brasil. Como exceção a essa
regra, temos: Chefe de Governo Estrangeiro, Embaixadores e seus familiares, funcionários
estrangeiros de embaixadas etc.
Admite-se a renúncia à garantia da imunidade diplomática.
3.2. Imunidades Parlamentares
São de duas espécies:
material (absoluta): alcança os Deputados Federais e Senadores, garantindo-lhes a
inviolabilidade por suas palavras, opiniões e votos. Para alguns, trata-se de
causa de exclusão de ilicitude, para outros, causa funcional de isenção de pena. 9
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É irrenunciável. Estende-se também aos Vereadores se o crime foi praticado no
exercício do mandato e na circunscrição do Município;
processual, formal ou relativa: consiste na garantia de não ser preso, salvo por
flagrantes de crime inafiançável. Alcança os Deputados Estaduais, mas não
alcança os Vereadores.
4. INTERPRETAÇÃO DA LEI PROCESSUAL PENAL
4.1. Espécies
4.1.1. Quanto ao sujeito que elabora
Autêntica ou legislativa: feita pelo próprio órgão encarregado da elaboração da
lei. Pode ser:
– contextual: feita pelo próprio texto legal;
– posterior: feita após a entrada em vigor da lei.
Doutrinária ou científica: feita pelos estudiosos e doutores do Direito. Obs.: as
exposições de motivo constituem forma de interpretação doutrinária, uma vez
que não são leis.
Judicial: feita pelos órgãos jurisdicionais.
4.1.2. Quanto aos meios empregados
Gramatical, literal ou sintática: leva-se em conta o sentido literal das palavras.
Lógica ou teleológica: busca-se a vontade da lei, atendendo-se aos seus fins e à
sua posição dentro do ordenamento jurídico.
4.1.3. Quanto ao resultado
Declarativa: há perfeita correspondência entre a palavra da lei e sua vontade.
Restritiva: a interpretação vai restringir o seu significado, pois a lei disse mais
do que queria.
Extensiva: a interpretação vai ampliar o seu significado, pois a lei disse menos
do que queria.
4.2. Interpretação da Norma Processual Penal10
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A lei processual admite interpretação extensiva, pois não contém dispositivo
versando sobre direito de punir.
Exceções: tratando-se de dispositivos restritivos da liberdade pessoal (prisão em
flagrante), o texto deverá ser rigorosamente interpretado. O mesmo quando se tratar de
regras de natureza mista.
5. ANALOGIA
Consiste em aplicar, a uma hipótese não regulada por lei, disposição relativa a um
caso semelhante.
5.1. Fundamento
Ubi eadem ratio, ibi eadem jus (onde há a mesma razão, aplica-se o mesmo Direito).
5.2. Natureza Jurídica
Forma de auto-integração da lei, ou seja, forma de supressão de lacunas.
5.3. Distinção
Analogia: inexiste norma reguladora para o caso concreto, devendo ser aplicada
norma que trata de hipótese semelhante.
Interpretação extensiva: existe norma reguladora do caso concreto, mas esta não
menciona expressamente sua eficácia.
Interpretação analógica: a norma, após uma enumeração casuística, traz uma
formulação genérica. A norma regula o caso de modo expresso, embora
genericamente.
5.4. Espécies de Analogia
In bonam partem – em benefício do agente.
In malam partem – em prejuízo do agente.
6. FONTES DO DIREITO PROCESSUAL PENAL 11
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É de onde provém o Direito.
6.1. Espécies
Material ou de produção: aquela que cria o Direito.
Formal ou de cognição: aquela que revela o Direito. Pode ser:
– imediata: lei;
– mediata: costumes e princípios gerais do Direito.
MÓDULO III
DIREITO PROCESSUAL PENAL
1. INQUÉRITO POLICIAL
1.1. Conceito
É o conjunto de diligências investigatórias realizadas pela polícia judiciária visando
a apuração do crime e sua respectiva autoria.
1.2. Natureza Jurídica
O inquérito policial é procedimento persecutório de caráter administrativo e
natureza inquisitiva instaurado pela autoridade policial.
É um procedimento, pois é uma seqüência de atos voltados a uma finalidade.
Persecutório porque persegue a satisfação do jus puniendi.
Persecução é a atividade estatal por meio da qual se busca a punição e começa
oficialmente com a instauração do inquérito policial. Também conhecido como informatio
delicti.
1.3. Finalidade
Segundo leitura dos arts. 4.º e 12 do CPP, conclui-se que o inquérito visa a apuração
da existência de infração penal e a respectiva autoria para fornecer ao titular da ação penal
elementos mínimos para que este possa ingressar em juízo.
A apuração da infração penal consiste em colher informações a respeito do fato 12
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criminoso. Apurar a autoria consiste em a autoridade policial desenvolver a necessária
atividade visando descobrir, conhecer o verdadeiro autor da infração penal.
1.4. Jurisdição e Competência
O art. 4.º, caput, do CPP usava inadequadamente o termo “jurisdição”.
A Lei n. 9.043, de 9.5.1995, trocou o termo “jurisdição” por “circunscrição” (limites
territoriais dentro dos quais a polícia realiza suas funções).
O parágrafo único do citado artigo dispõe que: “a competência definida neste artigo
não excluirá a de autoridades administrativas, a quem por lei seja cometida a mesma
função”. Porém, a autoridade policial não tem competência, mas sim atribuições.
O termo jurisdição designa a atividade por meio da qual o Estado, em substituição
às partes, declara a preexistente vontade da lei ao caso concreto.
O termo competência deve ser entendido como poder conferido a alguém para
conhecer determinados assuntos, não se confundindo com competência jurisdicional, que é
a medida concreta do Poder Jurisdicional.
A atribuição para presidir o inquérito policial é conferida aos Delegados de Polícia,
com raríssimas exceções (art. 144, §§ 1.º e 4.º, da CF/88), conforme as normas de
organização policial dos Estados. A atribuição pode ser fixada, quer pelo lugar da
consumação da infração (ratione loci), quer pela natureza da mesma (ratione materiae).
A autoridade policial, em regra, não poderá praticar qualquer ato fora dos limites de
sua circunscrição, sendo necessário:
se for em outro país: carta rogatória;
se for em outra comarca: carta precatória;
se for no DF ou em circunscrição diferente, mas dentro da mesma comarca, não
precisa de nenhuma carta (art. 22 do CPP).
1.5. Autoridade Competente para Lavratura do Auto de Prisão em Flagrante
O flagrante deve ser lavrado no local em que se efetivou a prisão. Não havendo
Delegado de Polícia, na circunscrição mais próxima (arts. 290 e 308, ambos do CPP).
Concluído, o flagrante será enviado ao juízo competente, ou seja, devem os atos
subseqüentes ao da prisão serem praticados pela autoridade do local em que o crime se 13
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consumou.
Obs.: tem-se entendido que a falta de atribuição de competência da autoridade
policial não invalida os seus atos, ainda que se tratem de prisão em flagrante, pois a
Polícia, ao exercer a atividade jurisdicional, não se submete à competência jurisdicional
ratione loci. O inquérito policial “é peça meramente informativa, cujos vícios não
contaminam a ação penal” (jurisprudência STF e STJ).
O art. 5.º, LIII, da CF/88 não se aplica às autoridades policiais, visto que estas não
processam nem sentenciam. Não foi adotado pelo referido artigo constitucional o princípio
do Delegado de Polícia Natural.
1.6. Inquéritos Extrapoliciais (art. 4.º, par. ún., do CPP)
Em regra, os inquéritos policiais são presididos por Delegado de Polícia de Carreira
(art. 144, § 4.º, da CF/88), mas o art. 4.º, par. ún., do CPP deixa claro que o inquérito
realizado pela polícia judiciária não é a única forma de investigação criminal.
Excepcionalmente, portanto, há casos em que são presididos por outros que não o
Delegado de Polícia de Carreira. Ex.:
Inquérito judicial por crime falimentar (presidido pelo Juiz);
Comissões Parlamentares de Inquérito (art. 58, § 3.º, da CF/88);
Crime cometido nas dependências da Câmara dos Deputados ou do Senado
Federal (Súmula n. 397 do STF –“O poder de polícia da Câmara dos Deputados
e do Senado Federal, em caso de crime cometido nas suas dependências,
compreende, consoante o regimento, a prisão em flagrante do acusado e a
realização do inquérito”);
Inquérito civil público (presidido pelo representante do MP; tem a finalidade de
promover a ação civil pública, art. 129, III, da CF/88);
Inquérito policial militar.
1.7. Valor Probatório do Inquérito Policial
O inquérito policial tem conteúdo informativo, visa apenas fornecer elementos
necessários para a propositura da ação penal.
Tem valor probatório relativo, pois os elementos de informação não são colhidos 14
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sob a égide do contraditório e da ampla defesa, tampouco na presença do Juiz de Direito.
1.8. Dispensabilidade do Inquérito Policial
O inquérito policial é uma peça útil, porém não imprescindível. Não é fase
obrigatória da persecução penal. Poderá ser dispensado sempre que o MP ou ofendido tiver
elementos suficientes para promover a ação penal.
No art. 12 do CPP a expressão “sempre que” é uma condição.
O art. 27 do CPP refere-se à delatio criminis postulatória, onde qualquer um do
povo poderá fornecer, por escrito, informações sobre o fato e a autoria, indicando o tempo,
o lugar e os elementos de convicção, demonstrando que quando as informações forem
suficientes não é necessário o inquérito policial.
Segundo o art. 39, § 5.º, do CPP, o órgão do MP dispensará o inquérito se forem
apresentados elementos suficientes para a propositura da ação.
O art. 46, § 1.º, do CPP nos alerta para mais uma hipótese de dispensabilidade do
inquérito policial.
1.9. Características do Inquérito Policial
procedimento escrito: conforme demonstra o art. 9.º do CPP;
procedimento sigiloso (art. 20 do CPP): é uma garantia para o indiciado,
resguardando-se, assim, seu estado de inocência (art. 5.º, LVII, da CF/88). O
sigilo não alcança o advogado (Lei n. 8.906/94, art. 7.º, XIII a XV, e § 1.º, do
Estatuto da OAB);
procedimento inquisitivo: não há acusação, não há contraditório; não pode ser
argüida suspeição da autoridade policial (art. 107 do CPP). O art. 14 do CPP diz
que a autoridade policial poderá indeferir qualquer pedido de diligência. O art.
184 do CPP trata de uma diligência que não pode ser indeferida, o exame de
corpo de delito;
oficiosidade: esse princípio se funda no princípio da obrigatoriedade ou
legalidade. Sendo um crime de ação penal pública incondicionada, a autoridade
tem o dever de promover o inquérito policial ex officio, independente de qualquer
espécie de provocação;15
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oficialidade: o inquérito policial é dirigido por órgãos públicos oficiais, no caso,
a autoridade policial.É uma atividade investigatória feita por órgãos oficiais;
indisponibilidade: uma vez instaurado, não pode ser arquivado pela autoridade
policial (art. 17 do CPP), é indisponível;
autoritariedade: é presidido por uma autoridade pública. Trata-se de exigência
constitucional (art. 144, § 4.º, da CF/88).
10. Incomunicabilidade
Destinada a impedir que a comunicação do preso com terceiros venha a prejudicar o
desenvolvimento da investigação.
Mediante despacho fundamentado pelo Juiz a partir da representação da autoridade
policial ou de requerimento do MP, poderá ser decretada a incomunicabilidade do
indiciado pelo prazo de até 3 dias, por conveniência da investigação ou interesse da
sociedade (art. 21 do CPP).
Somente o Juiz pode decretar a incomunicabilidade. O despacho será
fundamentado. A incomunicabilidade não poderá ultrapassar 3 dias. É decretada por
representação da autoridade ou requerimento do MP. Não alcança o advogado.
O Prof. Fernando Capez entende que a incomunicabilidade não foi recepcionada
pela nova ordem constitucional. O art. 21 do CPP foi revogado pela CF de 1988, pois em
seu art. 136, § 3.º, IV, proíbe a incomunicabilidade durante o estado de defesa. Logo, se a
CF proíbe o mais, também proíbe o menos. Em sentido contrário: o Prof. Damásio de Jesus
entende que a proibição está relacionada com crimes políticos ocorridos durante o estado
de defesa.
Predomina o entendimento de que o art. 21 do CPP é inconstitucional. Nos
concursos, porém, devemos considerá-lo constitucional.
1.11. Notitia Criminis
1.11.1. Conceito
É o conhecimento, espontâneo ou provocado, de um fato aparentemente delituoso
pela autoridade policial.16
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1.11.2. Espécies
Notitia Criminis de cognição direta, imediata, espontânea: ocorre quando a
autoridade policial toma conhecimento direto da infração penal por meio de suas
atividades rotineiras. Ex.: policiamento, imprensa, pelo encontro do corpo de
delito ou até pela delação anônima. A delação anônima (apócrifa) é chamada de
notitia criminis inqualificada.
Notitia Criminis de cognição indireta, mediata: quando a autoridade policial
toma conhecimento por meio de alguma comunicação oficial. Também é
chamada de notitia criminis de cognição provocada ou qualificada, quando a
autoridade policial toma conhecimento do fato por requisição do MP ou
autoridade policial. Sendo a comunicação feita por meio de algum ato jurídico de
comunicação formal do delito, temos como exemplo a delactio crimini que é o
requerimento feito pela vítima ou por qualquer um do povo, contendo a narração
do fato com todas as circunstâncias, a individualização do suspeito e a indicação
das provas. É subscrita pelo requerente (notitia criminis qualificada).
A delactio criminis se divide em:
- simples: só comunica o fato;
- postulatória: além de comunicar o fato, postula providências.
Notitia Criminis de cognição coercitiva: ocorre com a prisão em flagrante, em
que a notícia ocorre com a apresentação do autor.
1.12. Início do Inquérito Policial
1.12.1. Nos crimes de ação pública incondicionada
De ofício, mediante portaria ou por despacho do Delegado de Polícia, que
deverá conter o esclarecimento das circunstâncias conhecidas e a capitulação
legal da infração. Necessário sempre para a instauração do inquérito policial, a
existência de justa causa.
Por requisição do Juiz (art. 40 do CPP) ou Promotor de Justiça (art. 129, VIII,
da CF/88 e art. 5.º, II, do CPP). A autoridade policial não pode se recusar a
instaurar o inquérito, pois a requisição tem natureza de determinação, de ordem,
muito embora inexista subordinação hierárquica.17
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
Pela delactio criminis, quando a comunicação de um crime é feita pela vítima ou
qualquer um do povo. Caso a autoridade policial indefira a instauração de
inquérito, caberá recurso ao Secretário de Estado dos Negócios da Segurança
Pública ou ao Delegado Geral de Polícia (art. 5.º, § 2.º, do CPP). A delactio
criminis é mera faculdade conferida ao cidadão de colaborar com a atividade
repressiva do Estado. Contudo, há algumas pessoas que, em razão do seu cargo
ou da sua função, estão obrigadas a notificar no desempenho de suas atividades
(art. 66, I e II, da LCP; art. 45 da Lei n. 6.538/78; arts. 104 e 105 da Lei de
Falências).
1.12.2. Nos crimes de ação pública condicionada
Por representação do ofendido ou de seu representante legal. A representação é
simples manifestação de vontade da vítima ou de seu representante legal, não há
exigência formal para a sua elaboração.
Requisição do Ministro da Justiça, que deve ser encaminhada ao chefe do MP, o
qual poderá, desde logo, oferecer a denúncia ou requisitar diligências à polícia.
1.12.3. Nos crimes de ação privada
Requerimento do ofendido, de seu representante legal ou sucessores, conforme
disposto no art. 5.º, § 5.º, do CPP c.c. os arts. 30 e 31 também do CPP.
Para o Prof. Fernando Capez, o art. 35 do CPP não foi recepcionado pela CF/88,
tendo em vista o art. 226, § 5.º, da CF/88, podendo a mulher casada requerer a instauração
do inquérito policial independentemente de outorga marital. Nada obstante, a Lei n. 9.520,
de 27.11.1997, revoga expressamente a norma contida no art. 35 do CPP.
O art. 19 do CPP dispõe que, nos crime em que não couber ação pública, os autos do
inquérito serão remetidos ao juízo competente.
Obs. 1: O inquérito policial também pode começar mediante auto de prisão em flagrante
nos três casos. Nos crimes de ação pública condicionada e de ação privada, o ofendido
deverá ratificar o flagrante até a entrega da nota de culpa (24h).
Obs. 2: A autoridade policial não poderá instaurar o inquérito policial se não houver justa
causa. Porém, o desconhecimento da autoria ou a possibilidade do sujeito ter agido sob a 18
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
proteção de alguma excludente da ilicitude não impede a instauração do inquérito
MÓDULO IV
DIREITO PROCESSUAL PENAL
Inquérito Policial
1. PROVIDÊNCIAS DA AUTORIDADE POLICIAL
O inquérito policial não tem um procedimento rígido, ou seja, uma seqüência
imutável de atos. O art. 6.º do Código de Processo Penal traz o roteiro pela qual
normalmente se procede.
1.1.Primeira Providência
Dirigir-se ao local do crime e preservar o estado de coisas até a chegada da perícia.
Qualquer alteração no estado de coisas pode comprometer as provas a serem produzidas.
O art. 169 do Código de Processo Penal cuida da chamada perícia de local (esta é a
regra). Exceção: acidente automobilístico em que os veículos devem ser deslocados com a
finalidade de desobstruir a via pública (Lei n. 5.970/73).
1.2.Segunda Providência
Apreender os objetos e instrumentos do crime após liberação pela perícia (art. 11 do
CPP – instrumentos e objetos do crime apreendidos serão anexados ao inquérito policial).
Para essa apreensão, é necessária uma diligência denominada busca e apreensão,
que pode consistir em busca e apreensão domiciliar. Pode ser realizada em qualquer dia,
porém devem ser respeitadas as garantias de inviolabilidade domiciliar (art. 5.º, XI, da
CF/88).
À noite, só se pode entrar no domicílio alheio em quatro situações:
a convite do morador;
flagrante delito;
para prestar socorro;
em caso de desastre.
E durante o dia:19
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
nas quatro situações acima citadas;
mediante prévia autorização judicial, corporificada em instrumento denominado
mandado de busca e apreensão.
Antes, a autoridade policial não precisava de autorização judicial, porém, mesmo
com esta, não podia entrar à noite. Aplicava-se o art. 172 do Código de Processo Civil por
analogia, contudo, em dezembro de 1.994, esse artigo teve sua redação alterada. Não é
mais possível sua aplicação.
Critério físico: dia é o período que medeia entre o romper da aurora e o crepúsculo
solar; entre o nascer e o pôr-do-sol; das 6 às 18h.
Domicílio (art. 150, § 4.º, do CP) é qualquer compartimento habitado; aposento
ocupado por habitação coletiva; compartimento não aberto ao público, onde alguém exerce
profissão ou atividade. Ex.: quarto de hotel, motel.
Escritório de advogado, na parte aberta ao público, não é domicílio, mas sua sala é.
Balcão de bar é domicílio.
Automóvel não é domicílio.
A busca pessoal é aquela feita na própria pessoa. Independe de mandado, bastando a
fundada suspeita. Pode ser realizada a qualquer dia e a qualquer hora, salvo se a pessoa
estiver em seu domicílio.
1.3.Terceira Providência
Ouvir o ofendido e as testemunhas.
Podem ser conduzidos coercitivamente se o ofendido ou a testemunha desatenderem
ao mandado (princípio da autoritariedade – art. 201, par. ún., do CPP). O ofendido e
testemunha podem cometer crime de desobediência (art. 219 do CPP e art. 330 do CP).
A testemunha tem o dever de falar a verdade, sob pena de crime de falso testemunho
(art. 342 do CP). O ofendido, mesmo mentindo, não comete crime de falso testemunho. No
caso do representante do Ministério Público e do Magistrado como testemunhas, estes
podem marcar antecipadamente dia e hora para sua oitiva.
1.4. Quarta Providência20
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Indiciamento: consiste na suspeita oficial acerca de alguém, ou seja, na imputação a
alguém, em inquérito, da prática de ilícito penal, sempre que houver razoáveis indícios de
sua autoria. “É o rascunho da denúncia” (Pitombo). É um ato abstrato, um juízo de valor da
autoridade policial que vai reconhecer alguém como principal suspeito.
O ato seguinte é a identificação criminal, que seguirá as regras da Lei n. 10.054/00.
1.5. Quinta Providência
Reprodução simulada dos fatos (reconstituição). Há duas limitações:
não pode atentar contra a moral e os bons costumes;
não pode atentar contra o direito de defesa.
Se o indiciado, portanto, nega a autoria de um crime, ele não será obrigado a realizar
a reconstituição ou realizá-la de forma diferente do que afirmou.
1.6. Sexta Providência
Encerramento do inquérito policial com o relatório, que é a narração objetiva das
diligências feitas pela autoridade. A autoridade somente pode fornecer a classificação
jurídica do fato, sem emitir qualquer juízo de mérito, e esta não vincula o Ministério
Público.
2. INTERROGATÓRIO
O interrogatório extrajudicial será assinado pelo delegado de polícia, pelo escrivão,
pelo indiciado e por duas testemunhas, podendo se socorrer das testemunhas
instrumentárias - são aquelas que, em vez de deporem sobre os fatos, depõem sobre a
regularidade do procedimento. Exemplo: testemunhas de leitura.
O interrogatório extrajudicial tem valor probatório relativo, só valerá se confirmado
por outros elementos de prova.
A Constituição Federal consagrou o direito de silêncio ao indiciado. A autoridade
policial, portanto, deve informá-lo desse direito (art. 5.º, inc. LXIII, da CF), não podendo
mais adverti-lo de que seu silêncio poderá prejudicar sua própria defesa, conforme art. 186
do Código de Processo Penal, já que este não foi recepcionado pela Constituição Federal.21
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
A autoridade policial não precisa intimar o defensor do indiciado para acompanhar o
ato, muito menos nomear-lhe um.
No interrogatório do indiciado relativamente incapaz (dos 18 aos 21 anos), a
autoridade deverá nomear um curador. Não observada essa regra, a ação penal não será
afetada, pois o inquérito policial é mera peça informativa e seus vícios não maculam
aquela.
Como conseqüência haverá a perda da credibilidade do contraditório. Se houve
prisão em flagrante, esta será relaxada por vício formal.
Se o interrogatório for judicial, a ausência de curador gerará sua nulidade (art. 564,
III, “c”, do CPP). Qualquer pessoa pode ser nomeada curador. A jurisprudência faz, no
entanto, uma restrição em relação aos policiais, pois estes têm interesse na investigação.
A idade do relativamente incapaz a ser considerada é a do dia do interrogatório
(tempus regit actum).
Embora tenha o direito de permanecer calado, o indiciado deverá atender à
intimação e comparecer ao ato, sob pena de condução coercitiva.
3. PRAZO PARA ENCERRAMENTO DO INQUÉRITO POLICIAL
Deve ser encerrado no prazo de 30 dias a partir da instauração (recebimento da
notitia criminis), se o indiciado estiver solto. Não terminado no prazo é possível que a
autoridade policial requeira a prorrogação por mais 30 dias.
Se o indiciado estiver preso, o prazo será de 10 dias, contados da data da efetivação
da prisão, e não se admitirá qualquer prorrogação.
O prazo é de Direito Processual (conta-se a partir do primeiro dia útil seguinte). O
decurso não acarretará a perda do direito de punir, apenas o relaxamento da prisão. A
jurisprudência tem entendido, no entanto, que, embora se trate de prazo processual, como
se cuida da restrição da liberdade, deve ser contado conforme o Direito Penal (conta-se o
dia do começo e exclui-se o do final). É um prazo processual que se conta como penal.
Obs.: Se o inquérito estiver tramitando perante a Justiça Federal, o prazo será de 15
dias, prorrogável por mais 15 se o indiciado estiver preso. Se o indiciado estiver solto, o
prazo é de 30 dias, com a possibilidade de prorrogação por mais 30 dias.
No caso de crime previsto na Lei de Tóxicos, o prazo para conclusão do inquérito 22
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
com o indiciado preso será de 5 dias se o crime estiver previsto nos arts. 15, 16 e 17, e de
10 dias se previsto nos arts. 12, 13 e 14.
No caso de crimes contra a economia popular, o prazo é de 10 dias, estando o
indiciado preso ou não.
4. ARQUIVAMENTO
Só pode ser determinado pelo juiz se houver pedido do Ministério Público. Se o Juiz
discordar do pedido de arquivamento, aplicará o disposto no art. 28 do Código de Processo
Penal, ou seja, remeterá os autos ao Procurador-Geral, que poderá:
designar outro Promotor de Justiça para oferecer a denúncia (princípio da
independência funcional). O Promotor de Justiça designado não pode recusar,
pois quem está denunciando é o Procurador-Geral; e aquele estará apenas
executando (trata-se de delegação);
devolver os autos para diligências complementares;
insistir no arquivamento. Neste caso, o Poder Judiciário não poderá discordar do
arquivamento.
Arquivado o inquérito policial, não poderá ser promovida a ação privada subsidiária
da pública e não cabe recurso contra esta decisão. Porque, arquivado o inquérito, só poderá
ser reaberto com novas provas (Súmula n. 524 do STF).
Exceções (recurso contra decisão de arquivamento):
em casos de crime contra a economia popular, caberá recurso de ofício (art. 7.º
da Lei n. 1.521/51);
no caso das contravenções previstas nos arts. 58 e 60 do Decreto-lei n. 6.259/44,
quando caberá recurso em sentido estrito.
Se o tribunal der provimento a esses recursos, o inquérito policial será remetido ao
Procurador-Geral.
Se o promotor de justiça requerer a devolução dos autos à polícia para diligências
complementares, o juiz deverá, caso discorde, aplicar, por analogia, o art. 28 do Código de
Processo Penal, e não determinar a volta dos autos ao Promotor de Justiça para promover a
denúncia. Se assim fizer, caberá correição parcial.23
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
Não existe arquivamento em ação privada, pois o pedido de arquivamento feito pela
vítima significa renúncia (extinção da punibilidade).
MÓDULO V
DIREITO PROCESSUAL PENAL
1. DA AÇÃO PENAL
1.1. Conceito
Ação penal é o instrumento pelo qual o Estado busca, por intermédio de seu
representante, a imposição de uma sanção para o acusado que pratica ato tipificado como
crime ou contravenção na legislação penal pátria.
1.2. Classificação
Segundo o artigo 100 do Código Penal, que traça diretrizes básicas sobre a
classificação da ação penal, esta pode ser pública ou de iniciativa privada.
1.2.1. Ação penal pública
A ação penal pública tem como titular exclusivo (legitimidade ativa) o Ministério
Público (art. 129, inc. I, da CF/88). Para identificação da matéria incluída no rol de
legitimidade exclusiva do Ministério Público, deve-se observar a lei penal. Se o artigo ou
as disposições finais do capítulo nada mencionar ou mencionar as expressões “somente se
procede mediante representação” ou “somente se procede mediante requisição do Ministro
da Justiça”, apenas o Órgão Ministerial poderá propor a denúncia (peça inicial de toda a
ação penal pública). Vale lembrar que, apesar de a matéria constar no rol de legitimidade
exclusiva do Ministério Público, ante a sua inércia (se o parquet não oferecer a denúncia
no prazo legal), pode o ofendido ou seu representante legal ingressar com ação penal de
iniciativa privada subsidiária da pública (art. 5.º, inc. LIX, da CF/88).
A ação penal pública subdivide-se em ação penal pública incondicionada e ação
penal pública condicionada.
a) Ação penal pública incondicionada24
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
O Ministério Público independe de qualquer condição para agir. Quando o artigo de
lei nada mencionar, trata-se de ação penal pública incondicionada. É regra no Direito Penal
brasileiro.
b) Ação penal pública condicionada
Apesar de o Ministério Público ser o titular de tal ação (somente ele pode oferecer a
denúncia), depende de certas condições de procedibilidade para ingressar em juízo. Sem
estas condições, o Ministério Público não pode oferecer a denúncia.
A condição exigida por lei pode ser a representação do ofendido ou a requisição do
Ministro da Justiça.
Representação do ofendido: Representação é a manifestação do ofendido ou de
seu representante legal, autorizando o Ministério Público a ingressar com a ação
penal respectiva.
Se o artigo ou as disposições finais do capítulo mencionar a expressão
“somente se procede mediante representação”, deve o ofendido ou seu
representante legal representar ao Ministério Público para que este possa
ingressar em juízo. A representação não exige formalidades, deve apenas
expressar, de maneira inequívoca, a vontade da vítima de ver seu ofensor
processado. Pode ser dirigida ao Ministério Público, ao Juiz de Direito ou à
autoridade policial (art. 39 do CPP). Pode ser escrita (regra) ou oral, sendo que,
neste caso, deve ser reduzida a termo.
A representação tem natureza jurídica de condição de procedibilidade.
A vítima (ou seu representante legal) tem o prazo de seis meses da data do
conhecimento da autoria (e não do crime) para ofertar sua representação (art. 38
do CPP). Tal prazo é contado para oferta da representação e não para o ingresso
do Ministério Público com a ação penal, podendo este oferecer a denúncia após
os seis meses. Tal prazo não corre contra o menor de 18 anos, ou seja, após
completar 18 anos, a vítima terá seis meses para representar ao Ministério
Público. Em qualquer caso, tal prazo é de direito material (segue as regras do art.
10 do CP – computa-se o dia do começo e não se prorroga no último dia).
Se a vítima for menor de 18 anos, somente seu representante legal pode 25
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
oferecer a representação. Se maior de 18 e menor de 21 anos, tanto ela como seu
representante legal têm legitimidade, com prazos independentes (Súmula n. 594
do STF), podem oferecer a representação e, caso haja conflito entre os interesses
de ambos, prevalece a vontade de quem quer representar.
Se houver conflito entre o interesse do ofendido e o do seu representante
legal, será nomeado um curador especial, que verificará a possibilidade ou não
da representação.
Segundo o artigo 25 do Código de Processo Penal, pode o ofendido
retratar-se (ou seja, desistir da representação) até o oferecimento da denúncia.
Pode haver a retratação da retratação (a pessoa retira a representação e
depois a oferece de novo – sempre dentro dos seis meses da data do
conhecimento da autoria).
A representação não vincula (obriga) o Ministério Público a ingressar com
a ação; o Ministério Público só oferecerá a denúncia se vislumbrar a
materialidade do crime e os indícios da autoria, senão poderá pedir o
arquivamento do feito.
A representação é autorização para a persecução penal de um fato e não de
pessoas (eficácia objetiva).
Requisição do Ministro da Justiça: requisição é o ato político e discricionário
pelo qual o Ministro da Justiça autoriza o Ministério Público a propor a ação
penal pública nas hipóteses legais.
Se o artigo ou as disposições finais do capítulo mencionar a expressão
“somente se procede mediante requisição do Ministro da Justiça”, para que o
Ministério Público possa oferecer a denúncia, é necessária tal formalidade. Tem
natureza jurídica de condição de procedibilidade e, como a representação, não
vincula o Ministério Público a oferecer a denúncia, este pode requerer o
arquivamento.
A requisição é autorização para a persecução penal de um fato e não de
pessoas (eficácia objetiva).
O Ministro da Justiça não tem prazo para oferecer a requisição, pode fazê-lo
a qualquer tempo (não se sujeita aos seis meses de prazo como na representação).26
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
A lei silencia sobre a possibilidade de retratação. Sobre o assunto, a doutrina
apresenta duas orientações:
segundo o Prof. Damásio de Jesus, entre outros, deve-se aplicar a analogia com o instituto
da representação (art. 25 do CPP), sendo, portanto, possível a retratação;
segundo outra parte da doutrina, a requisição é irretratável, pois o art. 25 do Código de
Processo Penal não prevê tal possibilidade.
2. PRINCÍPIOS DA AÇÃO PENAL PÚBLICA
2.1. Princípio da Oficialidade
Somente o Ministério Público pode oferecer a denúncia (art. 129, I, da CF/88). Esse
princípio extinguiu o chamado procedimento judicialiforme, também chamado de
“jurisdição sem ação” (verificava-se nas contravenções penais - art. 26 do CPP; nas lesões
corporais culposas e no homicídio culposo). Nesses casos, o Juiz, por meio de portaria,
iniciava a ação penal (não havia denúncia por parte do MP).
2.2. Princípio da Obrigatoriedade
O Ministério Público tem o dever, e não a faculdade, de ingressar com a ação penal
pública, quando concluir que houve um fato típico e ilícito. Como o Órgão Ministerial tem
o dever de ingressar com a ação penal pública, o pedido de arquivamento deve ser
motivado (art. 28 do CPP). Esse princípio foi mitigado (restrito) com a entrada em vigor da
Lei n. 9.099/95 (arts. 74 e 76). Antes de oferecer a denúncia, o Ministério Público pode
oferecer a transação, um acordo com o autor do fato - princípio da discricionariedade
regrada.
2.3. Princípio da Indisponibilidade da Ação Penal Pública
Depois de proposta a ação, o Ministério Público não pode dela desistir (art. 42 do
CPP). O artigo 564, inciso III, “d”, do Código de Processo Penal prevê que o Ministério
Público deve manifestar-se sobre todos os termos da ação penal pública. Também foi
mitigado pela Lei n. 9.099/95 (referente a crimes de menor potencial ofensivos e nas
contravenções penais - art. 61), o Ministério Público pode propor ao acusado a suspensão 27
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
condicional do processo, art. 89.
2.4. Princípio da Indivisibilidade
O Ministério Público não pode escolher, dentre os indiciados, qual vai processar.
Decorre do princípio da obrigatoriedade.
2.5. Princípio da Intranscendência
A ação penal não pode passar da pessoa do autor e do partícipe. Somente estes
podem ser processados (não pode ser contra os pais ou representante legal do autor ou
partícipe).
2.6. Observação
Tanto a ação penal pública incondicionada como a condicionada norteiam-se por
tais princípios. Quando se tratar, porém, de ação penal pública condicionada, deve ser
observada a representação do ofendido ou a requisição do Ministro da Justiça (condições
de procedibilidade).
MÓDULO VI
DIREITO PROCESSUAL PENAL
1. AÇÃO PENAL PRIVADA
1.1. Conceito
É a ação proposta pelo ofendido ou seu representante legal.
1.2. Substituição Processual
O Estado é o titular exclusivo do direito de punir. Nas hipóteses de ação penal
privada, ele transfere ao particular a iniciativa da ação, mas não o direito de punir. O
ofendido, portanto, em nome próprio, defende interesse alheio (legitimação extraordinária).
Na ação penal pública, ocorre legitimação ordinária porque é o Estado soberano, por meio
do Ministério Público, que movimenta a ação.28
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
1.3. Espécies de Ação Penal Privada
Ação penal exclusivamente privada: é aquela proposta pelo ofendido ou seu
representante legal, que permite, no caso de morte do ofendido, a transferência
do direito de oferecer queixa ou prosseguir na ação ao cônjuge, ao ascendente,
ao descendente ou ao irmão (art. 31 do CPP).
Ação penal privada personalíssima: é aquela que só pode ser promovida única e
exclusivamente pelo ofendido. Ex.: adultério (art. 240 do CP), induzimento a
erro essencial (art. 236 do CP).
Ação penal privada subsidiária da pública: aquela proposta pelo ofendido ou
por seu representante legal na hipótese de inércia do Ministério Público em
oferecer a denúncia.
1.4. Prazo
Em regra, o prazo para o oferecimento da queixa é de 6 meses a contar do
conhecimento da autoria. É um prazo decadencial, pois seu decurso leva à extinção do
direito de queixa. A decadência não extingue o direito de punir (o que leva tal direito à
extinção é a prescrição e não a decadência). A decadência extingue o direito de ação
(queixa) e o direito de representação (nas ações públicas condicionadas).
Trata-se de prazo de direito material contado de acordo com o Código Penal,
computando-se o dia do começo e excluindo-se o do final; não se prorroga se terminar no
domingo ou feriado. Interrompe-se com o oferecimento da queixa, e não com o seu
recebimento. O recebimento interrompe a prescrição.
No caso da ação privada subsidiária da pública, o prazo decadencial é de 6 meses
também, contudo, conta-se a partir do encerramento do prazo para oferecimento da
denúncia. A decadência do direito de queixa subsidiária não extingue a punibilidade, só
extingue o direito de ação, portanto, o Ministério Público pode oferecer a denúncia a
qualquer tempo – não estando restrito aos 6 meses, pois a ação privada subsidiária da
pública conserva sua parte pública.
1.5. Princípios da Ação Penal Privada
29
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1.5.1. Princípio da conveniência ou oportunidade
O ofendido tem a faculdade, não o dever de propor a ação penal.
1.5.2. Princípio da disponibilidade
O ofendido pode desistir ou abandonar a ação penal privada até o trânsito em
julgado da sentença condenatória, por meio do perdão ou da perempção (arts. 51 e 60 do
CPP, respectivamente). A desistência com a aceitação do ofendido equivale ao perdão.
1.5.3. Princípio da indivisibilidade
O ofendido é obrigado a incluir na queixa todos os ofensores. Não é obrigado a
apresentar a queixa, mas, se o fizer, é obrigado a interpor contra todos (art. 48 do CPP). A
exclusão voluntária na queixa-crime de algum ofensor acarreta a rejeição da peça inicial
em face da ocorrência da renúncia tácita no tocante ao não incluído – esta causa extintiva
da punibilidade comunica-se aos querelados (art. 49 do CPP).
1.5.4. Princípio da intranscendência
Trata-se de princípio constitucional de direito penal que impõe que a ação penal só pode
ser ajuizada contra o autor do fato e nunca contra os seus sucessores.
1.6. Denúncia e Queixa
1.6.1. Requisitos da denúncia (art. 41 do CPP)
Endereçamento: o endereçamento equivocado caracteriza mera irregularidade,
sanável com a remessa dos autos ao juiz competente.
Descrição completa dos fatos em todas as circunstâncias: no processo penal, o
réu defende-se dos fatos, sendo irrelevante a classificação jurídica destes. O que
limita a sentença são os fatos; sua narração incompleta acarreta a nulidade da
denúncia, se a deficiência inviabilizar o exercício do direito de defesa. Na
hipótese de concurso de agentes (co-autoria e participação), é necessária a
descrição da conduta de cada um. Exceções: 30
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
crimes de autoria coletiva (praticados por multidão);
delitos societários (diretores se escondem atrás da pessoa jurídica).
Classificação jurídica dos fatos: não é essencial, pois o réu se defende dos fatos
e não da acusação jurídica (juria novit curia – o Juiz conhece o direito).
O juiz não pode, ao receber a denúncia, dar uma classificação jurídica
diversa da contida na exordial porque a fase correta para isso é a sentença (art.
383 do CPP); o recebimento é uma decisão de mera prelibação, sem o exame
aprofundado da prova; não há ainda prova produzida pelo crivo do contraditório.
Qualificação do denunciado: individualizar quem está sendo acusado. Não
havendo dados para a qualificação do acusado, a denúncia deverá fornecer seus
dados físicos (traços característicos), desde que possível.
Rol de testemunhas: a denúncia é o momento oportuno para o arrolamento das
testemunhas, sob pena de preclusão. Perdida a oportunidade, o rol poderá ser
apresentado aguardando-se que o juiz proceda a oitiva considerando as
testemunhas como suas.
Pedido de condenação: não se exige fórmula sacramental (“peço a
condenação”), basta que fique implícito o pedido. A falta acarreta mera
irregularidade.
Nome, cargo e posição funcional do denunciante: só haverá nulidade quando
essa falta inviabilizar por completo a identificação da autoria da denúncia.
Assinatura: a falta não invalida a peça se não houver dúvidas quanto a sua
autenticidade.
Denúncia alternativa é a descrição alternativa de fatos, de maneira que, não
comprovado o primeiro fato, pede-se a condenação do segundo subsidiariamente (princípio
da eventualidade). A denúncia alternativa é inepta, pois inviabiliza o direito de defesa.
Segundo a Súmula n. 1 das mesas de Processo Penal da USP, a denúncia alternativa não
deve ser aceita.
1.6.2. Requisitos da queixa
São os mesmos requisitos da denúncia, acrescida a formalidade do art. 44 do Código 31
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
de Processo Penal. Na procuração, devem constar o fato criminoso e o nome do querelado.
1.7. Causas de Rejeição da Denúncia ou Queixa
1.7.1. Quando o fato narrado evidentemente não constituir crime
O juiz rejeitará a denúncia quando da leitura do fato concluir que este é atípico ou
que está acobertado por causa de exclusão de ilicitude, porque falta uma condição da ação
– uma verdadeira impossibilidade jurídica do pedido. O art. 43, inc. I, do Código de
Processo Penal faz coisa julgada material (não pode ser oferecida a denúncia novamente).
1.7.2. Quando já estiver extinta a punibilidade do agente
Falta uma condição da ação, que é o interesse de agir. Faz coisa julgada material
(art. 43, inc. II, do CPP).
1.7.3. Ilegitimidade de parte
Quando se verifica impertinência subjetiva da ação (art. 43, inc. III, do CPP).
1.7.4. Quando faltar condição de procedibilidade
Ex.: apresentar a denúncia sem representação quando esta for exigida por lei (art.
43, inc. III, 2.ª parte, do CPP).
1.7.5. Quando faltar justa causa para a denúncia
É preciso um mínimo de lastro da existência do crime ou sua autoria (art. 648, inc. I,
do CPP).
1.8. Renúncia
É a abdicação do direito de oferecer queixa ou representação. Só é possível
renunciar a uma ação penal privada ou a uma ação penal pública condicionada, tendo em
vista que o Ministério Público jamais pode renunciar a qualquer ação pública.
A renúncia é unilateral, ou seja, não depende da aceitação do réu, sendo causa
extintiva da punibilidade. A renúncia, no entanto, é extraprocessual, só poderá existir antes 32
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
da propositura da ação.
Existem duas formas de renúncia:
expressa: quando houver uma declaração assinada pela vítima;
tácita: quando a vítima praticar ato incompatível com a vontade de processar
(ex.: o casamento da vítima com o agressor).
A renúncia concedida a um réu estende-se a todos, ou seja, quando houver vários
réus, a renúncia com relação a um deles, implica, obrigatoriamente, renuncia a todos.
No caso de dupla titularidade para propositura da ação, a renúncia de um titular não
impede a propositura da ação pelo outro.
Não se deve confundir renúncia com desistência, tendo em vista que aquela ocorre
antes da propositura da ação e esta depois da propositura da ação. A única situação de
desistência da ação está prevista no art. 522 do Código de Processo Penal.
1.9. Perdão do Ofendido
É possível somente na ação penal privada, tendo em vista que o Ministério Público
não pode perdoar o ofendido. O perdão obsta o prosseguimento da ação, causando a
extinção da punibilidade. Verifica-se o perdão após o início da ação, pois, tecnicamente, o
perdão antes da ação configura renúncia. Admite-se o perdão até o trânsito em julgado
final.
Existem duas formas de perdão:
expresso: quando houver uma declaração assinada pelo querelante;
tácito: quando o querelante praticar ato incompatível com a vontade de
processar.
O perdão é bilateral, depende sempre da aceitação do querelado. Caso não haja
aceitação, o processo prosseguirá. A aceitação do querelado poderá ser:
expressa: quando houver uma declaração assinada;
tácita: se não se manifestar em três dias.
O perdão concedido a um co-réu estende-se a todos, entretanto, se algum dos co-33
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
réus não o aceitar, o processo seguirá somente para ele. É possível o perdão parcial (p. ex.:
perdoar por um crime e não perdoar por outro), previsão doutrinária, pois a lei não trata a
respeito.
No caso de dupla titularidade, o perdão concedido por um titular, havendo oposição
do outro, não produzirá efeitos, e o processo prosseguirá.
1.10. Perempção
Significa a “morte” da ação penal privada em razão da negligência do querelante.
São hipóteses de perempção:
quando o querelante deixa de promover o andamento do processo por 30 dias
seguidos, a perempção é automática;
quando morre o querelante e nenhum sucessor aparece para dar prosseguimento
à ação, em 60 dias;
quando o querelante deixa de comparecer a ato em que deveria pessoalmente
estar presente;
quando o querelante deixa de pedir a condenação do querelado nas alegações
finais;
quando o querelante é pessoa jurídica que se extingue sem deixar sucessor;
quando morre o querelante na ação penal privada personalíssima.
MÓDULO VII
DIREITO PROCESSUAL PENAL
1. AÇÃO CIVIL EX DELICTO
Ação Civil ex delicto é a ação cível que pode ser proposta pelo ofendido, seu
representante legal ou seus herdeiros em razão da ocorrência de um delito. Sua finalidade é
a obtenção da reparação do dano. Está disposta nos arts. 63 a 67 do CPP. É proposta no
juízo cível contra o autor do crime ou seu responsável civil.
Dispõe o par. ún. do art. 64 do CPP, in verbis: “Intentada a ação penal, o Juiz da
ação civil poderá suspender o curso desta, até o julgamento definitivo daquela”.
Se a ação penal, portanto, ainda estiver em curso, a vítima poderá entrar com a ação 34
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
civil no juízo cível para requerer a indenização. Como poderá ocorrer, no entanto, o
conflito de decisões, o Juiz da ação civil poderá suspender o curso dessa ação até
julgamento final da ação penal.
Em regra, a absolvição do réu no juízo criminal não impede a ação civil de
indenização, que poderá ser proposta quando não tiver sido categoricamente reconhecida a
inexistência material do fato. Também não impedirão a propositura da ação civil:
o despacho de arquivamento do inquérito ou das peças de informação;
a decisão que julgar extinta a punibilidade;
a sentença absolutória que decidir que o fato imputado não constitui crime.
Não cabe ação civil:
quando o Juiz criminal reconhecer a inexistência do fato;
quando o Juiz criminal reconhecer que o sujeito não participou do fato;
quando o Juiz criminal reconhecer uma causa excludente da antijuricidade
(legítima defesa, estado de necessidade, exercício regular de direito ou estrito
cumprimento do dever legal). Nesta hipótese, entretanto, pode haver exceção em
que caiba ação civil nos casos previstos nos arts. 1.519 e 1.520 do CC (estado de
necessidade agressivo quando há ofensa a um inocente) e no art. 1.540 do CC
(legítima defesa real com aberratio ictus, ou seja, erro de alvo cometido pelo
agente do crime).
1.2. Execução Civil
A sentença penal condenatória, com trânsito em julgado, poderá ser executada no
juízo cível, mas como o Juiz criminal não fixa o quantum, é necessário que se faça a
liquidação da sentença. Quando o titular do direito à reparação do dano for pobre (art. 32,
§§ 1.º e 2.º, do CPP), a execução da sentença condenatória (art. 63 do CPP) ou a ação civil
(art. 64 do CPP) será promovida, a seu requerimento, pelo MP.
MÓDULO VIII
DIREITO PROCESSUAL PENAL
Jurisdição e Competência
35
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
1. PRINCÍPIOS GERAIS DA JURISDIÇÃO
Jurisdição é a função por meio da qual o Estado-Juiz aplica o Direito ao caso
concreto.
Características:
Inércia: a jurisdição não age de ofício, depende de provocação das partes, pois,
caso contrário, sua imparcialidade ficaria abalada, ne procedat iudex ex oficio.
Indelegabilidade: a jurisdição não pode ser delegada a nenhum outro órgão. O
Judiciário é um Poder Constituído, que recebeu sua função do Poder
Constituinte, previsto na CF/88. “Não se pode delegar o que se recebeu por
delegação”, dellegatur dellegare non potest.
Investidura: apenas aquele legalmente investido no exercício da função
jurisdicional é que pode exercê-la.
Inevitabilidade: consiste em sujeição do réu ao processo e sujeição de ambas as
partes à decisão.
Inafastabilidade ou indeclinabilidade: a lei não pode excluir a apreciação de
lesão ao Direito. O legislador não pode produzir leis restringindo o acesso ao
Judiciário e o próprio Judiciário não pode deixar de julgar, não pode declinar de
sua função. Está expresso na CF/88 no art. 5.º, inc. XXXV.
Aderência ao território: a jurisdição é reflexo do poder soberano do Estado, atua
dentro do território nacional. Para a jurisdição atuar em outro país, é preciso que
o outro país a aceite. Ex.: carta rogatória.
1.1. Competência
Competência é a medida da jurisdição, é a quantidade de jurisdição cujo exercício é
atribuído por lei a um órgão ou grupo de órgãos. Os arts. 69 e ss. do CPP estabelecem os
critérios de competência. São eles:
I – o lugar da infração;
II – o domicílio ou residência do réu;
III – a natureza da infração;
IV – a distribuição;
V – a conexão ou continência;36
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
VI – a prevenção;
VII – a prerrogativa de função.
Obs.: a conexão e a continência não são critérios de fixação de competência, são
critérios de modificação de competência.
1.2. Determinação da Competência – Foro Competente
Foro é o território dentro do qual determinado órgão judicial exerce sua parcela de
jurisdição.
Âmbito Estadual – 1.ª instância – comarca e 2.ª instância – TJ/TACrim.
Âmbito Federal – 1.ª instância – seção ou subseção judiciária e 2.ª instância – TRF.
1.2.1.Competência pelo lugar da infração (art. 69, I, do CPP)
Usa-se como regra, para fixar a competência, o lugar da infração. O CPP, no art. 70,
utilizou o local onde ocorreu a consumação ou, no caso de tentativa, o lugar em que foi
praticado o último ato de execução. O domicílio do réu é um critério subsidiário que só
será utilizado se for impossível determinar o lugar da infração.
Atenção! Não confundir:
Art. 4.º do CP – Tempo do crime, teoria da atividade – considera-se praticado o crime no
momento da ação ou omissão, ainda que outro seja o momento do resultado. Importante
para identificar a lei penal aplicável ao caso, a idade do agente ao tempo da infração etc.
Art. 6.º do CP – Lugar do crime, teoria da ubiqüidade – considera-se praticado o crime no
lugar em que ocorreu a ação ou omissão, bem como onde se produziu ou deveria produzir-
se o resultado. Importante para identificar se a lei penal brasileira será aplicada ao fato
criminoso. Se a ação ou o resultado ocorreram aqui no Brasil, a lei penal pátria será
aplicada.
Art. 70 do CPP – Lugar do crime para a fixação da competência, teoria do resultado, o local da
consumação será o foro competente para iniciar a ação penal.
1.2.2. Casos especiais
a) Estelionato mediante a emissão de cheque sem fundo (art. 171, § 2.º, VI, do 37
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
CP)
O crime se consuma quando o banco sacado recusa o pagamento. O foro competente
será o do banco sacado que recusou o pagamento do cheque.
É esse o entendimento das Súmulas n. 521 do STF e n. 244 do STJ (1.2.2001).
b) Estelionato (art. 171, caput, CP)
Foro competente: local do prejuízo. Ex.: Adonilza encontra uma folha de cheque na
rua, vai até uma loja e faz uma compra, fazendo-se passar por titular do cheque, o lojista
enganado entrega a mercadoria. O foro competente para a ação penal será o do local do
prejuízo – Súmula n. 48 do STJ.
c) Crimes qualificados pelo resultado (Ex.: art. 129, § 2.º, V, lesão corporal
qualificada pelo resultado aborto)
O local da consumação do resultado agravador será o foro competente para a
propositura da ação penal.
d) Falso testemunho praticado mediante precatória
O foro competente será o Juízo deprecado. O local onde ocorreu a oitiva da
testemunha será o competente.e) Homicídio doloso consumado
A jurisprudência entende que o foro competente será o do local da ação e não do
resultado, pois, dessa forma, o réu será julgado pelos seus pares, além de facilitar a
produção de provas, já que as testemunhas que não residem na mesma comarca onde se
processa a ação não têm obrigação de comparecer.
e) Crime de extorsão mediante seqüestro
Crime permanente, sua fase consumativa se prolonga no tempo. Está consumado o
crime com a privação da liberdade por tempo juridicamente relevante. Ex.: um empresário
seqüestrado em São Paulo é levado para cativeiro em Campinas, depois o cativeiro é
mudado para Americana. A consumação desse crime ocorreu em todos esse lugares. A
competência, nesse caso, fixa-se pela prevenção .
38
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
f) Crime que se consuma na divisa entre duas cidades
O foro competente será qualquer uma das cidades; fixa-se pela prevenção.
g) Tentativa
O foro competente será o do último lugar da execução, onde ocorreu o último ato.
h) Crimes a distância, iter criminis ocorre entre dois países
Ex.: execução no Brasil e consumação em outro país, ou execução em outro país e
consumação no Brasil. Foro competente será o lugar do último ato de execução ou o lugar
onde o crime se consumou ou deveria ocorrer a consumação.
Ex. 1: terrorista envia carta-bomba da Argentina para explodir em São Paulo, sendo
que a explosão não vem a acontecer. O foro competente para propor a ação será São Paulo.
Ex. 2: brasileiro mata empresário em Nova York. A execução e a consumação do
crime ocorreram no exterior, entretanto será julgado pelas leis brasileiras em razão da
extraterritorialidade da lei penal. O foro competente para processar a ação será a Capital do
Estado do último domicílio do réu. Se o réu nunca teve domicílio no Brasil, será
processada a ação no DF.
i) Crime praticado a bordo de embarcação
Embarcação nacional pública: em qualquer lugar que esteja e ocorrer o crime, este
será julgado perante as leis pátrias. Se a embarcação for nacional privada, quando se
encontrar no mar territorial ou em alto mar, os crimes a bordo ocorridos serão julgados
pela lei nacional. O foro competente para propor a ação será o local do porto nacional onde
ocorreu o primeiro atracamento após o crime ou o porto de onde a embarcação saiu do
Brasil para o exterior. Para os crimes cometidos a bordo de aeronave, utiliza-se a mesma
regra da embarcação, sendo que o foro competente para propor a ação será o local do
aeroporto onde ocorreu o primeiro pouso após o crime ou o aeroporto de onde saiu a
aeronave antes do crime.
j) Crimes de competência da Lei n. 9.099/95
A doutrina diverge quanto ao foro competente para processar a ação.
1.ª corrente: Profª. Ada Pellegrini Grinover – foro competente será o local da ação, teoria 39
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
da atividade.
2.ª corrente: Prof. Mirabete – foro competente será o local da ação ou do resultado, teoria
da ubiqüidade.
3.ª corrente: Prof. Tourinho – foro competente será o local do resultado, teoria do
resultado.
Como a competência é relativa, pode-se usar qualquer uma delas.
1.2.3. Domicílio ou residência – critério subsidiário
Conforme o art. 72 do CPP, não sendo conhecido o lugar da infração, a competência
regular-se-á pelo domicílio ou residência do réu. Ex.: uma passageira de um ônibus que
fazia o percurso São Paulo/Bahia, ao desembarcar, percebe que teve sua carteira furtada. O
ônibus esteve o tempo todo em trânsito, não há como precisar o local da infração. A ação
será proposta no local do domicílio ou residência do réu. Se o réu tiver mais de um
domicílio, conforme o art. 72, § 1.º, do CPP, a competência firmar-se-á pela prevenção, e
caso o réu não tenha domicílio certo, ou seja ignorado seu paradeiro, será competente o
Juiz que primeiro tomou conhecimento do fato.
Na ação penal privada, o ofendido poderá preferir o foro do domicílio ou residência
do réu, mesmo quando conhecido o lugar da infração. O critério é optativo, de acordo com
o art. 73 do CPP.
1.3. Natureza da Infração
Conforme a natureza do delito, a ação será julgada por uma determinada justiça
competente.
Organização da Justiça Penal:
Especial – Eleitoral (art. 121 da CF/88) e Militar (art. 124 da CF/88).
Comum – Federal e Estadual (a Justiça Estadual também é conhecida como
residual; para ela resta o que não for da competência das Justiças Eleitoral,
Militar e Federal).
1.3.1. Justiça Eleitoral
STF (Brasília)40
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
Tribunal Superior Eleitoral (Brasília)
Tribunal Regional Eleitoral (capital do Estado)
Juiz Eleitoral (Juízes de Direito da Justiça Estadual)
Tem competência para julgar:
crimes eleitorais definidos no Código Eleitoral;
crimes eleitorais previstos nas leis extravagantes.
1.3.2. Justiça Militar
Superior Tribunal Militar (Brasília – 2.ª instância) e Auditorias Militares (1.ª
instância).
Estadual: Tribunal de Justiça Militar ou Tribunal de Justiça (para os Estados que
não possuem TJM – 2.ª instância) e Auditorias Militares (1.ª instância).
Serão Julgados pela Justiça Militar Federal:
civis que pratiquem crime definido como militar;
integrantes das forças armadas (Exército, Marinha e Aeronáutica) que pratiquem
crime definido como militar.
Serão julgados pela Justiça Militar Estadual (art. 125, § 4.º, da CF/88): os policiais
militares e os bombeiros militares, nos crimes definidos em lei como militares.
Súmula n. 53 do STJ: “Compete à Justiça Comum Estadual processar e julgar civil
acusado de prática de crime contra instituições militares estaduais”.
Crimes Militares:
Propriamente militar ou próprio – aqueles definidos no Código Penal Militar
(Dec.-lei n. 1.001/69), sem equivalente na justiça penal comum. Ex.: motim,
dormir em serviço, insubordinação.
Impropriamente militar ou impróprio – aqueles crimes definidos na legislação
militar com equivalente na lei penal comum. Ex.: estupro, roubo, furto. Se o
crime for praticado pelo militar em serviço, será utilizado o CPM, se o militar
não estiver em serviço, será utilizado o CP.41
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
A Lei n. 9.299/96 alterou a competência da Justiça Militar. Alguns crimes que eram
da Justiça Militar passaram para a competência da Justiça Comum. Antes dessa lei, os
crimes praticados por militar fora do serviço, mas com arma da corporação, eram definidos
como crimes militares; agora, se o militar estiver fora do serviço, com ou sem a arma da
corporação, será julgado pela Justiça Comum Estadual. Os crimes dolosos contra a vida
praticados por militar contra civil durante o serviço também passaram a ser da competência
da Justiça Comum, julgados pelo Tribunal do Júri. Se o militar em serviço pratica crime
definido apenas no CP, será julgado pela Justiça Comum. Ex.: abuso de autoridade – Lei n.
4.898/65.
Súmula n. 6 do STJ: “Compete à Justiça Comum Estadual processar e julgar delito
decorrente de acidentes de trânsito envolvendo viatura militar, salvo se autor e vítima
forem policiais militares em situação de atividade”.
Súmula n. 75 do STJ: “Compete à Justiça Comum Estadual processar e julgar o
policial militar acusado de facilitação de fuga de preso em estabelecimento penitenciário”.
Súmula n. 78 do STJ: “O policial militar será julgado pela Justiça Militar Estadual
de seu Estado, ainda que o crime seja praticado em outro Estado”.
1.3.3. Justiça Federal
Compete à Justiça Federal processar e julgar os casos previstos no art. 109 da
CF/88. O art. 109, IV, da CF/88 trata das infrações penais praticadas em detrimento de
bens ou interesses da União. Conforme a Súmula n. 38 do STJ, as contravenções praticadas
em detrimento de bens ou interesses da União serão julgadas pela Justiça Comum Estadual.
Crimes praticados contra funcionário público federal, quando relacionados com o exercício
da função, são julgados pela Justiça Federal, conforme a Súmula n. 147 do STJ. Os crimes
de tráfico de entorpecentes e de crianças, se internacionais, serão da competência da Justiça
Federal; se internos, a competência é da Justiça Comum. Também compete à Justiça
Federal processar e julgar os crimes a distância previstos em tratado ou convenção
internacional e os crimes praticados a bordo de navio ou aeronave (Atenção! Não é o foro
competente, mas a Justiça competente). As embarcações de pequeno porte são de
competência da Justiça Comum.
42
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
1.3.4. Observações finais
A natureza da infração, portanto, serve para fixar a competência.
Existindo mais de um Juízo igualmente competente, a competência será determinada
pela prevenção ou pela distribuição. Ocorre a prevenção quando um Juízo, antecipando-se aos
demais, pratica algum ato processual ou medida relativa ao processo. Ex.: decretação de prisão
preventiva, determinação de busca e apreensão. Não havendo a prevenção, usa-se a
distribuição, que é o sorteio da ação perante os Juízes competentes, determinando qual atuará
no processo.
MÓDULO IX
DIREITO PROCESSUAL PENAL
1. JURISDIÇÃO E COMPETÊNCIA
1.1. Conexão e Continência
A conexão e a continência (art. 69, inc. V, do CPP) são critérios de modificação da
competência e não de fixação.
O art. 76 do CPP estabelece quando a competência será determinada pela conexão.
Haverá conexão quando existir um liame subjetivo (entre as pessoas) ou objetivo (entre os
delitos) unindo duas ou mais infrações penais. Nesse caso, as ações serão reunidas e
julgadas em conjunto, simultaneus processus.
A conexão pode ser:
Art. 76, inc. I, do CPP – intersubjetiva – quando as infrações houverem sido
praticadas:
– ao mesmo tempo, por várias pessoas reunidas;
– por várias pessoas em concurso, embora diverso o tempo e o lugar;
– por várias pessoas, umas contra as outras (reciprocidade).
Art. 76, inc. II, do CPP – objetiva – quando as infrações houverem sido
praticadas:
– para facilitar ou ocultar outras;
– para conseguir impunidade ou vantagem em relação a qualquer delas.
43
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
A conexão objetiva conseqüencial compreende os casos acima descritos, e a
conexão objetiva teleológica é aquela que ocorre quando um crime é praticado para
facilitar ou assegurar a execução de outro crime.
Art. 76, inc. III, do CPP – instrumental ou probatória:
– quando a prova de uma infração ou qualquer de suas circunstâncias
elementares influir na prova de outra infração; tem fins probatórios.
O art. 77 do CPP estabelece quando a competência será determinada pela
continência.
A continência pode ser:
Art. 77, inc. I, do CPP – subjetiva – quando duas ou mais pessoas forem
acusadas pela mesma infração, configurando-se concurso de agentes. Atenção! –
na conexão intersubjetiva são duas infrações, na continência subjetiva há apenas
uma infração.
Art. 77, inc. II, do CPP – objetiva – nos casos dos artigos:
– art. 70, 1.ª parte, do CP – concurso formal;
– art. 73, parte final, do CP – aberratio ictus (erro na execução);
– art. 74, parte final, do CP – aberratio criminis (resultado diverso do
pretendido).
O art. 78 do CPP determina qual o foro prevalente em caso de conexão e
continência:
I – Competência do Júri e de outro órgão da jurisdição comum: prevalecerá a
competência do Júri. Obs.: se o crime for eleitoral e doloso contra a vida, os processos
serão julgados separadamente, não haverá a reunião de processos, pois a competência de
ambos é fixada na CF/88.
II – Concurso de jurisdições de mesma categoria:
prepondera o local da infração à qual for cominada pena mais grave (reclusão > 44
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
detenção > prisão simples. Se a pena máxima for igual, usa-se a que tem a maior
pena mínima);
sendo iguais as penas, prevalece o local onde foi praticado o maior número de
crimes;
se nenhum desses casos fixar a competência, utiliza-se o critério da prevenção
(ver módulo VIII, item 1.3.4).
III – Concurso entre jurisdições diversas: prevalece a mais graduada. Ex.: TJ e Juiz
singular – prevalece o TJ. Se a conexão for entre crime de competência da Justiça Estadual
e da Justiça Federal, para o Prof. TOURINHO são jurisdições de mesma categoria; para a
jurisprudência, a Justiça Federal é especial em relação à Justiça Estadual. A Súmula n. 122
do STJ decidiu a questão, determinando que: “Compete à Justiça Federal o processo e
julgamento unificado dos crimes conexos de competência federal e estadual, não se
aplicando a regra do art. 78, inc. II, ‘a’, do CPP”.
IV – Concurso entre Jurisdição Comum e Jurisdição Especial (Militar e Eleitoral):
prevalecerá a Especial.
Não serão reunidos os processos para julgamento em conjunto nos casos do art. 79
do CPP:
I – concurso entre jurisdição comum e militar – Súmula n. 90 do STJ – “Compete à Justiça
Estadual Militar processar e julgar o policial militar pela prática de crime militar, e à Comum pela
prática do crime comum simultâneo àquele”.
II – concurso entre Justiça Comum e Justiça da Infância e Juventude.
§ 1.º Superveniência de doença mental a um dos co-réus;
§ 2.º Co-réu revel que não possa ser julgado à revelia (infração inafiançável, não
comparece no Tribunal do Júri, citação por edital) e na cisão do julgamento durante a
sessão plenária do Júri (art. 461 do CPP).
O art. 80 do CPP determina os casos em que a separação dos processos é facultativa,
apesar da conexão e continência:
se as várias infrações forem praticadas em diferentes condições de tempo e 45
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
lugar;
se excessivo o número de acusados ou para evitar o prolongamento do tempo de
prisão provisória;
se, por outro motivo relevante, o juiz julgar conveniente a separação (o juiz tem
discricionariedade para determinar isso).
1.2. Perpetuação da Competência (Perpetuatio Jurisdicionis – art. 81 do CPP)
A vis atractiva, efeito principal da conexão e continência, desloca para a
competência de um mesmo julgador os crimes conexos aos de sua competência. Se o juiz
ou o Tribunal absolver ou desclassificar o crime de sua competência, continuará
competente para o julgamento das demais infrações. Ex.: concurso de agentes – juiz e
escrivão cometem crime de furto. Os dois serão julgados pelo TJ – vis atractiva. Se o juiz
for absolvido, o escrivão continua a ser julgado pelo TJ.
Exceção: no Júri, se o juiz desclassificar, impronunciar ou absolver o acusado, de
maneira que exclua a competência do Júri, remeterá o processo ao juiz competente (art. 81,
par. ún., do CPP).
Os crimes conexos ao do Tribunal do Júri, não dolosos contra a vida, serão julgados
pelo Juiz Presidente e não pelos jurados (posição predominante da jurisprudência).
1.3. Art. 82, CPP – Avocação de Processos
Se, mesmo ocorrendo conexão ou continência, foram instaurados vários processos, a
autoridade prevalente deve avocar para si os processos que corram perante outros juízes, se
ainda não foram julgados em sentença definitiva. Se já houver sentença definitiva, isto é,
julgamento de mérito, a unificação dos processos se dará posteriormente, na execução, para
efeitos de soma ou unificação das penas.
1.4. Art. 83, CPP – Prevenção
Concorrendo dois juízes, igualmente competentes, fixa-se a competência pela
prevenção. Ocorre a prevenção quando um dos juízes anteceder aos outros na prática de
algum ato do processo ou medida referente a esse, ainda que anterior ao oferecimento da
denúncia ou queixa.46
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
1.5. Art. 84, CPP – Prerrogativa de Função
A competência pela prerrogativa de função é do STF e dos Tribunais de Justiça,
relativamente às pessoas que devam, perante eles, responder por crime comum ou de
responsabilidade.
O foro por prerrogativa de função não é privilégio pessoal, mas sim em razão da
função que exerce. Extinguindo-se a função, extingue-se a prerrogativa. A razão da
prerrogativa de função é garantir a sociedade de eventual parcialidade do julgador, que
estaria vulnerável a eventuais pressões.
A Lei n. 8.038/90 dispõe sobre o procedimento para os processos perante o STJ e
STF.
Antes de receber a denúncia ou a queixa, o Tribunal deve notificar a autoridade para
apresentar, em 15 dias, a defesa preliminar. É oportunidade de defesa para a autoridade. O
Tribunal pode, além de receber ou rejeitar a inicial, julgar improcedente a acusação. Não é
possível interposição de recurso visando ao reexame de prova.
Fases do procedimento no Tribunal: 1) oferecimento da denúncia ou queixa; 2)
defesa preliminar; 3) recebimento da denúncia ou queixa, com fundamentação; 4) citação;
5) interrogatório; 6) depoimento; 7) audiência de instrução; 8) diligências; 9) alegações
finais; 10) sentença.
Se a infração for cometida:
Por quem tem prerrogativa de função (ex.: prefeito) e uma pessoa sem qualquer
prerrogativa, ambos serão julgados pelo TJ, pela continência.
Por duas pessoas que têm prerrogativa de função, p. ex., prefeito (TJ) e senador
(STF). São competências fixadas pela CF/88, não podendo ser reunidas para o
julgamento em conjunto, pois a continência prevista no CPP é
infraconstitucional; ocorrerá, portanto, a disjunção.
A competência para oferecer a denúncia é do Procurador-Geral da República (PGR),
quando for competente o STF, e do Procurador-Geral da Justiça (PGJ), quando for
competente o TJ.
Se um agente com prerrogativa de função comete crime doloso contra a vida, terá 47
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
dois foros estabelecidos na CF/88. Prevalece o da prerrogativa de função, pela
especialidade. Se for prerrogativa de função estabelecida em Lei Ordinária, prevalece o
Júri, que é previsto na Constituição.
A Constituição Estadual fixa que a competência para julgar o Vice-Governador será do
TJ. Se Vice-Governador comete crime doloso contra a vida (competência prevista na CF/88),
qual competência prevalece? Há duas posições:
prevalece a competência do Júri, conforme previsto na CF/88;
o STF entende que há um paralelismo entre a regra fixada na Constituição
Estadual e na Constituição Federal. A CF/88 prevê para o Vice-Presidente a
competência do STF, logo, para o Vice-Governador a competência é do TJ.
Vice-Presidente – STF – autoridade federal.
Vice-Governador – TJ – autoridade estadual.
Importante:
A prerrogativa de função vigora enquanto durar o exercício do cargo ou de função,
independentemente do momento em que foi praticado o delito. Ex. 1: uma pessoa pratica
um crime, o processo se inicia perante juiz comum. O infrator, então, é eleito deputado
federal. O processo, já em andamento, será remetido para o STF. Se o processo não alcança
seu fim e acaba o mandato, retorna para o juiz comum. Ex. 2: se um deputado federal,
durante o exercício do mandato, comete um crime, será julgado pelo STF. Se o processo
não alcança seu fim e o mandato acaba, será remetido para o juiz comum.
Ainda que o crime seja praticado em outra unidade da Federação, a competência
continua sendo a do Tribunal que tem competência para julgá-lo.
1.6. Tribunal Competente para Julgar Crimes Comuns
O STF tem competência para julgar em todas as infrações penais (crimes e
contravenções) e em crimes eleitorais:
Presidente e Vice-Presidente da República;
Ministros de Estado;
Ministros de Tribunais Superiores e Tribunal de Contas da União;
Comandantes da Marinha, Exército e Aeronáutica;48
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
Parlamentares federais;
Agentes diplomáticos;
Procurador-Geral da República.
O Advogado-Geral da União não está relacionado no art. 102 da CF/88, mas a
doutrina entende que seu cargo tem a mesma hierarquia dos Ministros de Estado, portanto,
também deve ser julgado pelo STF. Hoje, Medida Provisória já decidiu que tem foro
especial.
O STJ tem competência para julgar em todas as infrações penais, salvo nos crimes
eleitorais (nesse caso, cabe ao TSE apreciar a questão):
Governador;
Desembargadores;
Membros do TRF, TRE e TRT, Tribunal de Contas do Estado, Tribunal de
Contas do Município, MP da União que oficiem perante Tribunais.
O TRF tem competência para julgar em todas as infrações penais, salvo nos crimes
eleitorais:
Juízes federais da área de sua jurisdição;
Juízes do Trabalho;
Juízes militares;
Prefeito Municipal, nos crimes de competência da Justiça Federal;
os membros do Ministério Público da União.
Ao TRE compete julgar, nos crimes eleitorais:
Juízes federais e estaduais;
Membros do MP da União e dos Estados;
Prefeitos, nos crimes eleitorais.
O TJ tem competência para julgar:
Juízes de Direito;49
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
Juízes da Justiça Militar estadual e juízes de Alçada;
Membros do MP estadual, salvo nos crimes eleitorais;
Prefeitos municipais.
Atenção:
Prefeito Municipal:
TJ – crime comum;
TRE – crime eleitoral;
TRF – crimes de competência da Justiça Federal.
Juiz de Direito e MP estadual:
TJ – crime comum;
TRE – crime eleitoral.
Juiz federal:
TRF – crime comum;
TRE – crime eleitoral.
A Constituição Estadual de São Paulo estabelece foro especial no TJ para:
Vice-Governador;
Deputado estadual;
Secretário de Estado;
Procurador-Geral de Estado – PGE;
Comandante-Geral da Polícia Militar;
Delegado-Geral.
Todas essas autoridades, se cometerem crime federal, serão processadas no TRF. É
o entendimento do STF.
Tribunal de Justiça Militar tem competência para julgar em crimes militares –
Constituição Estadual de São Paulo:
Comandante-Geral da Polícia Militar;50
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
Chefe da Casa Militar.
O MP do Distrito Federal atua perante a Justiça Distrital. Se um de seus membros
comete um crime, será julgado pelo TRF da 1.ª Região; isso porque é ramo do MP da
União, apesar de atuar na Justiça Distrital.
1.7. Exceção da Verdade ou Defesa da Verdade (art. 85 do CPP)
Nos processos por crime contra a honra, em que o querelante tiver foro especial no
STF ou no TJ, a esses caberá o julgamento da exceção da verdade. Não cabe a oposição de
exceção da verdade:
Na calúnia:
se o fato imputado a alguém for crime de ação penal privada, e ele não for
condenado;
fato imputado a Presidente da República ou Chefe de Governo estrangeiro;
se, do crime imputado, embora de ação penal pública, o ofendido foi absolvido
por sentença irrecorrível.
A exceção da verdade é questão prejudicial homogênea, pois é anterior ao mérito e
pode ser objeto de processo autônomo.
Deve ser oposta quando da defesa prévia; mas para alguns esse prazo não é fatal,
pois é questão de mérito, e o prazo fatal caracterizaria o cerceamento de defesa. Há
posicionamentos contrários.
Oposta a exceção, o querelante tem dois dias para contestá-la. Poderá arrolar no
máximo oito testemunhas. Se na queixa já tiver arrolado quatro testemunhas, poderá
arrolar mais quatro na contestação da exceção, até completar o número legal. Isso porque,
embora o crime seja punido com detenção, o rito é ordinário.
Conforme o art. 85, do CPP, a exceção será julgada pelo Tribunal competente. Se o
Tribunal julga procedente a exceção, o mérito será julgado improcedente. Se julga
improcedente a exceção, o mérito será julgado procedente ou improcedente. Obs.: o
Tribunal só faz o julgamento da exceção, as testemunhas são ouvidas em 1.ª instância.
Depois de julgar a exceção, o Tribunal devolve o processo para ser julgado, em 1.ª 51
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
instância, o mérito.
MÓDULO X
DIREITO PROCESSUAL PENAL
QUESTÕES E PROCESSOS INCIDENTES
O Código de Processo Penal fala inicialmente das questões incidentes e
posteriormente do processo incidente. Regula, na realidade, apenas uma espécie de
questão incidente, prevista nos arts. 92 a 94 do Código de Processo Penal – as
denominadas questões prejudiciais.
Questões prejudiciais são todas as questões de fato e de direito que, por necessidade
lógica, devem ser analisadas antes da questão principal e podem, em tese, ser objeto de
processo autônomo.
Etimologicamente “prejudicial” significa pre-iudicate, isto é, julgar primeiro. A
questão deve ser julgada em primeiro lugar, antes da questão principal. Ex: um acusado de
bigamia (art. 235 do CP) alega que seu casamento é nulo. A validade ou não do casamento
é a questão prejudicial que deve ser decidida antes do mérito, pois influi diretamente na
decisão.
A questão prejudicial condiciona a questão prejudicada; a prejudicada está
irrecusavelmente subordinada à prejudicial.
Características da questão prejudicial:
Anterioridade lógica: a questão prejudicial é sempre anterior à prejudicada. Não
porque surgiu primeiro na discussão processual, mas por ser logicamente
anterior. Primeiro decide-se ou aguarda-se a decisão da questão incidente e,
posteriormente, julga-se o mérito.
Necessariedade: a questão prejudicial sempre subordina o exame da questão
principal. O mérito não pode ser decidido sem antes enfrentar a questão
prejudicial.
Autonomia: a questão prejudicial sempre pode ser, em tese, objeto de processo
autônomo.
52
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
Questão preliminar é diferente de questão prejudicial. Questão preliminar é toda
alegação que versa sobre pressupostos processuais ou condições da ação. O professor
MIRABETE nos ensina que ambas são espécies do gênero ‘questões prévias’. Apresentam
características em comum: anterioridade lógica e necessariedade. Mas apresentam
diferenças importantes: a questão prejudicial refere-se a direito material e a preliminar
refere-se a direito processual. Também se diferem no tocante à autonomia. Somente as
prejudiciais podem ser objeto de processo autônomo, as preliminares não. Ex: falta de
citação é uma questão preliminar – não se ajuíza processo autônomo para discutir.
Classificação das questões prejudiciais:
a) Quanto ao grau: total ou parcial
A questão prejudicial total é aquela que condiciona a existência da questão principal.
Refere-se a uma das elementares da infração penal. A questão prejudicial parcial se refere a
circunstâncias do tipo penal.
b) Quanto ao caráter: homogênea ou heterogênea
A questão prejudicial homogênea é aquela do mesmo ramo do Direito da questão
principal. A questão prejudicial heterogênea é aquela que pertence a ramo do Direito
distinto da questão principal.
c) Quanto aos efeitos: obrigatória ou facultativa
Obrigatória: é a questão que, uma vez presente, obriga a suspensão do processo
até o julgamento da questão incidental. Sempre versa sobre questão de estado
civil das pessoas.
Facultativa: é aquela que não obriga a suspensão do processo principal, mas há
nela controvérsia de difícil solução. Ex: acusado de crime contra o patrimônio
alega ser o legítimo possuidor. São características da prejudicial facultativa que
não estão presentes na obrigatória: existência de ação civil em andamento;
inexistência de limitação à prova, na lei civil, acerca da questão prejudicial.
53
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
Observações:
Se a prejudicial for obrigatória o processo penal ficará suspenso por tempo
indeterminado. Se facultativa, o juiz deverá estabelecer prazo para suspensão que
poderá ser prorrogado a seu critério.
Durante a suspensão do processo, fica suspenso o prazo prescricional.
Apesar da suspensão do processo, o juiz criminal poderá inquirir testemunhas ou
determinar produção de provas que considere urgente.
A decisão que determina a suspensão do processo por questão prejudicial
comporta recurso em sentido estrito. (art. 581, inc. XVI, CPP). Se a decisão
indefere o pedido de suspensão e a prejudicial for obrigatória, cabe correição
parcial ou habeas corpus; se for questão prejudicial facultativa, o juiz tem
discricionariedade para decidir.
As questões prejudiciais devem causar no juiz dúvida séria e fundada.
2. EXCEÇÕES
Exceção é a defesa indireta do processo penal, que visa extinguir a ação penal ou
retardar seu exercício. Recai sobre os pressupostos processuais ou as condições da ação.
Se a exceção visar extinguir a ação penal, é denominada peremptória. Se visar
retardar seu julgamento, é denominada dilatória.
2.1. Exceção de Suspeição (Dilatória)
Se o juiz da causa se enquadrar em uma das situações de suspeição, previstas no art.
254 do Código de Processo Penal, e não se declarar suspeito espontaneamente, a parte
pode argüir a exceção de suspeição. Se existir alguma causa de impedimento (art. 252 do
CPP) ou incompatibilidade (art. 253 do CPP), também deve ser argüida por meio de
exceção.
A exceção pode ser argüida também contra o membro do Ministério Público e os
sujeitos processuais secundários (perito, intérprete, serventuário da Justiça).
Procedimento da exceção de suspeição: 54
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
Inicia-se por petição em que devem constar os motivos e as provas da suspeição.
Tem legitimidade para argüir: o autor, quando do oferecimento da denúncia ou a
queixa, e o réu (ou seu defensor com poderes especiais), no momento da defesa. Se a
suspeição for superveniente, a parte tem que se manifestar, nos autos, no primeiro
momento em que puder. A parte não argüir no momento oportuno equivalerá a reconhecer
a capacidade moral do juiz.
P: O assistente de acusação tem legitimidade para argüir a suspeição do juiz?
R: O art. 271 do CPP relaciona as funções do assistente e nada fala sobre essa
possibilidade. Para o Professor MIRABETE, o rol é taxativo, não podendo argüir. Para
TOURINHO, o assistente tem interesse processual na imparcialidade do juiz, devendo ser
reconhecida a ele essa possibilidade.
Depois de argüida a suspeição em petição inicial, os autos são encaminhados ao
juiz, que pode reconhecê-la ou não.
Se o juiz reconhece, remete os autos para seu substituto legal, anulando os atos já
praticados. O processo volta a correr perante o novo juiz.
Se o juiz não reconhece, determina a autuação da exceção. O juiz excepto terá três
dias para contestar a exceção, juntando testemunhas e ouvindo testemunhas. Os autos são
remetidos ao TJ, em 24h, para serem julgados pela Câmara Especial.
Caso o TJ decida pela improcedência do pedido, irá indeferir liminarmente a
exceção. Se decidir pela relevância da argüição, determinará o processamento da exceção.
O Tribunal comunicará o excepto e o excipiente, ouvirá as testemunhas arroladas e
julgará, independente de novas alegações.
Se o Tribunal julgar procedente a exceção, remeterá os autos ao substituto legal,
determinará a anulação dos atos já praticados e, se entender que houve erro inescusável
(indesculpável) do juiz excepto, poderá condená-lo nas custas da exceção. Obs: no Estado
de São Paulo a Lei Estadual n. 9452/85 isenta o pagamento de custas no processo penal.
Se o Tribunal de Justiça julgar improcedente, determinará a continuidade normal do
processo e condenará o excipiente ao pagamento de multa, se agiu de má-fé visando
tumultuar o processo.
Súmula n. 234, Superior Tribunal de Justiça: “A participação de membro do MP na 55
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
fase investigatória criminal não acarreta o seu impedimento ou suspeição para o
oferecimento da denúncia.”
Se o Promotor foi testemunha, não pode participar da ação penal.
2.2. Exceção de Suspeição de Jurado
Instalada a sessão de julgamento com 15 jurados no mínimo, 7 formarão o Conselho
de Sentença.
No Júri as partes podem recusar jurados. Podem fazer três recusas peremptórias, isto
é, sem justificação, e poderão recusar tantos quanto necessário, desde que justificado. Se o
juiz não aceitar a recusa, o jurado tomará parte no Conselho de Sentença.
2.3. Suspeição de Autoridade Policial
Conforme determina o art. 107 do Código de Processo Penal, as partes não podem
argüir a suspeição de autoridade policial. Isso porque o inquérito policial é um instrumento
inquisitivo. O próprio delegado, entretanto, poderá declarar-se suspeito.
Atenção! Enquanto se processa a exceção, o processo principal flui normalmente.
Exceção: diante da exceção de suspeição, se a parte contrária considerar relevante a
argüição, o processo será suspenso. Ex.: a defesa concorda que a argüição de exceção de
suspeição feita pelo Ministério Público é plausível, tem fundamento. Sob pena de ser
declarada posteriormente a nulidade dos atos já praticados, o processo será suspenso.
2.4. Exceção de Incompetência do Juízo
O Código não distingue se a incompetência é absoluta ou relativa.
Há dois sistemas para argüir a incompetência do Juízo:
perante o próprio juiz ,e esse declina sua competência;
perante o órgão superior para que esse, decidindo a questão, iniba a participação
daquele juiz no processo e remeta ao juiz competente.
No Brasil, vigora o primeiro sistema. O próprio juiz vai declinar de sua
competência. O art. 109 do Código de Processo Penal determina que, se em qualquer fase 56
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
do processo o juiz reconhecer motivo que o torne incompetente, declará-lo-á nos autos,
haja ou não alegação da parte, prosseguindo-se na forma do artigo anterior.
A incompetência absoluta e a relativa podem ser reconhecidas de ofício pelo juiz.
A incompetência absoluta tem um regime jurídico mais severo por versar sobre
questões de interesse público. A incompetência relativa se preocupa em atender a
conveniência da parte. Ex: o lugar da consumação do delito facilita busca de provas. Não é
só interesse da parte. Há também interesse público.
A exceção de incompetência do Juízo só pode ser argüida pela defesa, pois foi o
autor quem ajuizou a ação perante o Juízo incompetente. Se o Ministério Público percebe
que o processo foi distribuído para um Juízo incompetente, deve pedir a declinação do juiz
e não oferecer a denúncia. Argüirá na condição de fiscal da lei.
A argüição deve ser feita no prazo de três dias da defesa prévia. Se a incompetência
for absoluta, poderá ser feita posteriormente.
Procedimento da exceção de incompetência:
A exceção é autuada em apartado.
Ouve-se o representante do Ministério Público.
juiz decide. Se pela procedência, remete os autos ao juiz competente. Dessa decisão cabe
recurso em sentido estrito (art. 581, inc. III, do CPP). Não interposto recurso, os autos são
remetidos ao juiz competente. Esse novo juiz não é obrigado a concordar com essa
declinação, podendo também ele suscitar o conflito de jurisdição ou competência. Se
decidir pela improcedência, não caberá recurso. Caberá habeas corpus ou argüição em
preliminar de apelação (futuramente).
Conforme o art. 567 do Código de Processo Penal a incompetência do Juízo anula
somente os atos decisórios. Dessa forma somente os atos instrutórios serão ratificados pelo
juiz competente, os atos decisórios serão anulados.
Atenção! A Jurisprudência entende que o recebimento da denúncia ou da queixa
não tem carga decisória; pode, portanto, ser ratificado. Princípio da conseqüencialidade: se
o recebimento da denúncia ou da queixa fosse nulo, todo o processo estaria perdido. A
Jurisprudência, por isso, admite tranqüilamente a ratificação do recebimento da denúncia 57
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
ou queixa.
O recebimento da denúncia ou queixa interrompe a prescrição. Se foi recebida pelo
juiz incompetente e depois ratificada pelo juiz competente, qual interrompe a prescrição?
A ratificação do juiz competente é que interrompe a prescrição. Essa regra aplica-se
para qualquer incompetência, inclusive ratione materiae.
Se a regra de competência violada estiver disposta na Constituição Federal de 1988,
os atos praticados perante o juiz incompetente são considerados inexistentes. Não tem
como ratificar.
A decisão que julga procedente a exceção é recorrível. Cabe recurso em sentido
estrito. Salvo a decisão que decide exceção de suspeição, a qual é irrecorrível.
2.5 Exceção de Ilegitimidade de Parte
São partes ilegítimas em Processo Penal:
Ministério Público, se oferecer denúncia em crime de ação penal privada.
querelante, se oferecer queixa em crime de ação penal pública.
querelante incapaz (a vítima deve ser maior de 18 anos).
Alguém que se diz representante do ofendido em crime de ação penal privada, mas não é.
A ilegitimidade pode ser ad causam ou ad processum. A ilegitimidade ad causam
refere-se a condição da ação, ocorre se o Ministério Público oferece queixa e o querelante
oferece denúncia. A ilegitimidade ad processum ocorre se o querelante é incapaz ou o
representante do ofendido não é o representante legal.Tratando-se de ilegitimidade de
causa ou de processo, o instrumento para argüir é exceção de ilegitimidade.
O reconhecimento da ilegitimidade ad causam acarreta a nulidade absoluta do
processo. O reconhecimento da ilegitimidade ad processum acarreta a nulidade relativa do
processo, admitindo a convalidação, nos termos do art. 568 do Código de Processo Penal.
2.6. Exceção de Litispendência e Coisa Julgada
A exceção de litispendência e coisa julgada baseia-se na proibição de uma mesma
pessoa ser processada mais de uma vez pelos mesmos fatos (nen bis in idem ).
Será argüida a exceção de coisa julgada quando o réu já foi julgado em definitivo
sobre um fato e é proposta nova ação com base no mesmo fato já julgado.
Será argüida exceção de litispendência quando existirem duas ações penais em 58
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
curso, processando o mesmo réu pelo mesmo fato. Se um mesmo fato é apurado em dois
inquéritos penais, não há litispendência.
Instaurado inquérito policial com ação já em curso, sem ser por requisição do juiz
ou do Ministério Público, para colher diligências complementares, caracteriza-se
constrangimento ilegal, sanável por habeas corpus.
Havendo duas ações iguais, uma delas será excluída. Exclui-se a segunda. Para
determinar qual é a primeira ação, usa-se o critério do art. 219, Código de Processo Civil,
examinando em qual delas ocorreu primeiro a citação válida.
O Supremo Tribunal Federal definiu que, se alguém é absolvido como autor, poderá
ser novamente denunciado como partícipe. Desde que não sejam alegados os mesmos fatos
pelos quais já foi acusado; a descrição fática deve ser outra.
Há quem entenda que, se alguém foi absolvido, não pode ser pelo mesmo crime
novamente processado. Leva-se em conta o fato concreto, não importa a conduta descrita;
se foi absolvido pelo fato, não pode novamente ser processado.
Para fins de concurso público, usar a posição do Supremo Tribunal Federal.
3. CONFLITO DE JURISDIÇÃO
O correto seria dizer conflito de competência. A própria Constituição Federal de
1988 fala dessa maneira. O objetivo é preservar o juiz natural. Há dois tipos de conflito de
jurisdição:
Conflito positivo de competência: ocorre quando dois ou mais Juízos ou
Tribunais se consideram ao mesmo tempo competentes para o exame de
determinada causa.
Conflito negativo de competência: ocorre quando dois ou mais Juízos ou
Tribunais se consideram ao mesmo tempo incompetentes para o exame de
determinada causa.
Também ocorre conflito de jurisdição quando houver divergência quando à unidade
de processo, seja sua junção ou sua separação.
O conflito de competência pode ser suscitado:
pelas partes, por requerimento – art. 115, do Código de Processo Penal;59
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
por representação do juiz.
O conflito deve ser suscitado de forma escrita e fundamentado, com cópias da
alegação, art.116, do Código de Processo Penal . O relator recebe o processo, determina
que os Juízos envolvidos prestem informações. Com as informações, colhe o parecer do
Ministério Público em segunda instância (Procurador Geral). O conflito então é julgado.
Para o conflito positivo, o procedimento tem forma própria, por meio de
instrumento que é remetido ao Tribunal. Como o processo continua tramitando, a
suspensão ou não dos atos processuais depende do relator do Tribunal. No conflito
negativo, os próprios autos nos quais se suscita o conflito são encaminhados ao Tribunal. O
processo fica suspenso até a decisão do Tribunal.
Competência para julgar os conflitos:
Cabe ao Supremo Tribunal Federal dirimir conflito envolvendo Tribunais
Superiores. Se envolver o próprio Supremo Tribunal Federal e outro Tribunal,
não há conflito; o Supremo Tribunal Federal dá palavra final. Se o conflito
envolver Tribunais Superiores ou um Tribunal e um juiz , cabe também ao
Supremo Tribunal Federal dirimir. Ex.: Superior Tribunal de Justiça X juiz de 1.º
grau, Superior Tribunal de Justiça X Tribunal Regional Federal.
Cabe ao Superior Tribunal de Justiça dirimir conflito envolvendo Tribunal
Estadual ou Tribunal Regional Federal e um Juízo a ele não vinculado. Ex.:
Tribunal de Justiça de São Paulo X juiz do Rio de Janeiro.
Cabe ao Tribunal Regional Federal dirimir conflitos entre juízes federais da
mesma região. Se for região diferente, cabe ao Supremo Tribunal de Justiça.
Cabe também ao Tribunal Regional Federal julgar conflito entre juiz federal e
juiz estadual com competência federal (ex.: art. 27 da Lei n. 6.368/76) – Súmula
n. 3 do STJ .
Cabe ao Tribunal Regional Eleitoral dirimir conflito envolvendo Juízos eleitorais
do mesmo Estado. De Estados diferentes, cabe ao Tribunal Superior Eleitoral.
Cabe ao Tribunal de Justiça dirimir conflitos entre juízos estaduais do mesmo
Estado e Tribunal de Alçada (no âmbito penal só cabe ao Tribunal de Alçada
Criminal), ou Tribunal e juiz.60
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
Entre Tribunal de Justiça e Tribunal de Alçada Criminal, não há conflito.
Conforme dispõe a Súmula n. 22 do Superior Tribunal de Justiça (“não há
conflito de competência entre o Tribunal de Justiça e Tribunal de Alçada do
mesmo Estado-membro”), a competência é do Tribunal de Justiça.
Cabe ao Tribunal de Alçada Criminal resolver conflitos entre Juízos de primeiro
grau quando for sua a competência recursal.
4. INCIDENTE DE INSANIDADE MENTAL – ART. 149, DO CÓDIGO DE
PROCESSO PENAL
O incidente de insanidade mental é instaurado quando houver dúvida sobre a saúde
mental do acusado. Pode ser instaurado no inquérito policial ou na ação penal, mas
somente é instaurado por ordem judicial.
A perícia psiquiátrica realizada no inquérito policial só pode ser instaurada pelo juiz.
Se o delegado percebe a insanidade, representa à autoridade judiciária o incidente de
insanidade mental, conforme art. 149, § 1.º, do Código de Processo Penal.
O incidente pode decorrer do requerimento das seguintes pessoas:
Ministério Público;
defensor;
curador;
cônjuge, ascendente, descendente e irmão.
Observação: O incidente pode também ser instaurado de ofício.
P: No interrogatório o juiz percebe a insanidade mental do acusado. Seu defensor junta ao
processo a interdição, no cível, do acusado; ainda assim deve-se realizar o incidente de
insanidade mental?
R: O incidente é instaurado quando há dúvida sobre a saúde mental e para verificar se na
época dos atos era o indivíduo imputável ou inimputável, conforme art. 26, par. ún. do
Código Penal. Não basta a doença mental, precisa saber se em virtude dela, ao tempo da
ação ou omissão, era incapaz de entender o caráter ilícito da infração. A interdição no cível
é irrelevante para o processo penal. A perícia penal visa verificar a imputabilidade.
61
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
Procedimento do incidente de insanidade mental:
O incidente é autuado em apartado (art. 153, CPP), o juiz expede portaria de
instauração e nomeia curador. Se já houver processo em andamento, esse ficará suspenso
até julgamento do incidente. Determina o juiz que as partes elaborem quesitos. Com os
quesitos, é realizada a perícia psiquiátrica. O prazo para realização do exame é de 45 dias,
prorrogável por igual período, conforme. art. 150, § 1.º, Código de Processo Penal. As
partes examinam o laudo, se estiver regular, o juiz homologará. A homologação do laudo
não significa concordância. A homologação diz respeito somente quanto aos aspectos
formais. O juiz não está vinculado ao laudo, em razão do princípio do livre convencimento
do juiz.
O laudo pode concluir pela:
imputabilidade;
semi-imputabilidade, cf. art. 151, do Código de Processo Penal;
inimputabilidade, art. 151, do Código de Processo Penal;
doença mental superveniente, cf. art. 152, do Código de Processo Penal.
Se o laudo decidir pela imputabilidade, prossegue o processo que estava suspenso,
dispensando-se o curador que foi nomeado. Se concluir pela semi-imputabilidade, o
processo segue com o curador nos autos. Concluindo pela doença mental superveniente, o
processo continuará suspenso. A prescrição continuará até sobrevir o prazo prescricional
ou sanar a doença mental.
A falta de nomeação de curador gera nulidade absoluta.
MÓDULO XI
DIREITO PROCESSUAL PENAL
1. DA PROVA
1.1. Conceito
Prova é todo elemento trazido ao processo, pelo juiz ou pelas partes, destinado a
62
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
comprovar a realidade de um fato, a existência de algo ou a veracidade de uma afirmação.
Sua finalidade é fornecer subsídios para a formação da convicção do julgador.
1.2. Objeto de Prova
São objetos de prova os fatos principais e secundários capazes de influenciar a
responsabilidade criminal do réu, a aplicação da pena e a medida de segurança. Alguns fatos,
entretanto, não podem ser objetos de prova. São eles:
o direito não pode ser objeto de prova, pois o juiz o conhece; salvo se for direito
consuetudinário, estrangeiro, estadual ou municipal;
os fatos axiomáticos, isto é, aqueles fatos evidentes. O fato axiomático é
diferente do fato notório, que é aquele de conhecimento geral, que faz parte da
história e refere-se a fatos políticos, sociais ou fenômenos da natureza;
os fatos irrelevantes, aqueles incapazes de influenciar a responsabilidade
criminal do réu, no caso concreto.
os fatos sobre os quais incida presunção absoluta iuris et de iure. Ex.: o
inimputável recebe medida de segurança, absolvição imprópria. Tem como
pressuposto a periculosidade, pois a medida de segurança é aplicada apenas aos
réus perigosos. Não há necessidade de perícia para confirmar sua periculosidade.
No Processo Penal, os fatos incontroversos também são objetos de prova; não se
aplica a regra do Processo Civil, pois o que se discute no Direito Penal é o direito à
liberdade.
1.3. Classificação das Provas
Prova Direta: refere-se diretamente ao tema probandu. Ex.: testemunha
presencial, exame de corpo de delito.
Prova Indireta: refere-se indiretamente ao tema probandu. Ex.: álibi apresentado
pelo acusado.
Prova Pessoal: a prova emana de uma pessoa. Ex.: interrogatório,
testemunha.
Prova Documental: a prova é produzida por escrito. Ex.: laudo pericial.63
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
Prova Material: refere-se a objetos. Ex.: instrumentos do crime, arma do crime.
Prova Plena: é a prova que conduz a um juízo de certeza.
Prova Não Plena: é a prova que conduz a um juízo de probabilidade. Para a
decisão de pronúncia, aceita-se a prova não plena, mas para a condenação é
necessária a prova plena.
1.4. Meios de Prova
Meios de prova são os métodos por meio dos quais a prova pode ser levada ao
processo. Os meios de prova podem ser:
nominados: são os documentos, acareações, reconhecimento de pessoas e objetos,
interceptação telefônica, interrogatório. São todos os meios de prova previstos na
legislação;
inominados: são aqueles meios de prova que não estão previstos expressamente
na legislação. Ex.: juntar fita de vídeo, com um programa de TV em que o
acusado aparece, para mostrar aos jurados.
1.5. Sujeitos da Prova
Os sujeitos da prova são as pessoas incumbidas de levar ao juiz os meios de prova.
São as testemunhas, com o depoimento; o réu, com o interrogatório; e o perito, com o
laudo.
1.6. Princípios Relativos à Prova
Princípio da Comunhão da Prova: uma vez trazida aos autos uma prova, ela se
incorpora ao processo. Por essa razão, a prova trazida por uma das partes, pode
ser usada pela parte contrária. Além disso, uma vez admitida a prova, para que a
parte desista dela, deve haver anuência da parte contrária.
Princípio da Audiência Contraditória: à parte contrária sempre deve ser dado o
direito de impugnar a prova produzida pelo ex adverso.
Princípio da Liberdade dos Meios de Prova: no Processo Penal são admitidos
todos os meios de prova, nominados ou inominados, salvo as provas ilícitas ou as
provas ilegítimas.64
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
Prova ilícita é a prova produzida com desrespeito à regra de direito material. Ex.:
confissão mediante tortura. Prova ilegítima é a prova produzida com desrespeito à regra de
Direito Processual. Ex.: exibição em plenário de documento do qual não foi dado ciência à
parte contrária, com pelo menos três dias de antecedência.
Teoria sobre as provas ilícitas: “A árvore dos frutos envenenados”. A prova, ainda
que lícita, mas decorrente de outra prova ilícita, também é considerada ilícita. Ex.: o réu,
mediante tortura, confessa e aponta três testemunhas. Essas testemunhas são chamadas a
Juízo. A oitiva dessas testemunhas, apesar de lícita, será considerada ilícita, pois originou-
se de uma prova ilícita. Não poderá ser aceita.
1.7. Ônus da Prova
O ônus da prova é o encargo que recai sobre as partes, impondo-lhes o dever de
provar algo, sob pena de suportar uma situação processual adversa.
A acusação deve fazer prova da autoria e da materialidade do delito. Deve fazer
prova plena desses elementos. Compete, ainda, à acusação fazer prova do elemento
subjetivo, isto é, do dolo da ação ou do elemento normativo, ou seja, a culpa: provar que o
agente agiu com imprudência, negligência ou imperícia.
A defesa deve provar os fatos impeditivos (excludentes de ilicitude), extintivos
(causas de extinção da punibilidade) ou modificativos (desclassificação ou causas de
diminuição da pena) do direito do autor. A defesa não precisa produzir prova plena, basta o
juízo de probabilidade.
1.8. Sistema de Apreciação da Prova
Sistema Primitivo (hoje já está abandonado). Utilizavam-se dois sistemas: o sistema
religioso e o sistema étnico-pagão. O sistema religioso invocava a divindade para apreciar
as provas, qualquer que fosse o julgamento. No sistema étnico-pagão, a apreciação das
provas era feita de forma empírica, sem qualquer regra.
Sistema Moderno. São três os sistemas modernos:
Sistema da íntima convicção ou da certeza moral do julgador. Nesse sistema, a decisão
ficava a cargo do juiz, que decidia com base em regras, porém, não havia necessidade 65
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
de fundamentação do julgamento. Ensejou abusos.
Sistema da prova legal ou da certeza moral do legislador. Nesse sistema, a lei
preestabelecia os critérios para julgamento. Preestabelecia o valor de cada prova.
Sistema do livre convencimento motivado ou persuasão racional do juiz. Nesse sistema,
o julgador tem liberdade para decidir, porém, com a obrigação de fundamentar seu
julgamento.
No Brasil, o Código de Processo Penal adota o sistema do livre convencimento
motivado. A exceção é para o Tribunal do Júri. Os jurados, quando julgam, não justificam,
sob pena de ser anulado o Júri.
1.9. Provas em Espécie
1.9.1. Provas periciais
A perícia é um exame realizado por quem tem conhecimento técnico, científico ou
artístico. Natureza jurídica: é um meio de prova nominado. Seu valor probatório é idêntico ao
dos demais meios de prova. A perícia pode ser realizada a qualquer momento, desde o
Inquérito Policial até a execução. A perícia realizada no inquérito é determinada pela
autoridade policial, salvo a perícia de insanidade mental, que somente pode ser determinada
pelo juiz. A perícia realizada na instrução processual é determinada pela autoridade judicial.
O perito é um sujeito processual secundário. Não podem ser peritos: os menores de
21 anos, os analfabetos, aqueles sujeitos à interdição temporária de direitos, aqueles que já
se manifestaram sobre o objeto da perícia.
O perito pode ser um funcionário público concursado. É o perito oficial. Ou pode
ser o perito particular, nomeado para fazer uma determinada perícia, chamado de perito
não-oficial ou perito louvado. Em regra, as perícias são feitas pelos peritos oficiais, apenas
em sua ausência é que a perícia é realizada pelo perito louvado.
O perito louvado é nomeado pela autoridade policial ou judiciária. Assim que
assume o encargo, o perito deve prestar o compromisso de bem e fielmente cumprir suas
funções. Deve portar diploma de curso superior, de preferência na área do exame.
As partes não podem interferir na nomeação dos peritos. Não há no Processo Penal a 66
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
figura do assistente técnico. As partes podem requerer, particularmente, uma perícia e
juntá-la aos autos.
Na perícia realizada por precatória, quem nomeia o perito é o juiz deprecado. Salvo na
Ação Penal Privada em que, havendo acordo entre querelante e querelado, a nomeação será feita
pelo juiz deprecante (art. 177 do CPP).
O laudo pericial deve conter: introdução, histórico, informações que antecedem à
perícia, descrição minuciosa do objeto, fundamentação, respostas aos quesitos e conclusão.
Sempre a perícia deve ser realizada por dois peritos.
O juiz, ao apreciar o laudo pericial, não é obrigado a acatá-lo, mas, para afastá-lo,
deve fazê-lo fundamentadamente.
O Exame de Corpo de Delito é o exame pericial obrigatório, destinado a comprovar a
materialidade das infrações penais que deixam vestígios, isto é, infrações não transeuntes. Sua
falta acarreta a nulidade absoluta do processo. Pode ser: direto, quando examina diretamente
os vestígios do crime (ex.: cadáver); ou indireto, quando se analisa outra prova que levará à
mesma conclusão (ex.: os peritos não examinam a vítima, mas a ficha hospitalar).
Excepcionalmente, na falta do corpo de delito, esse exame pode ser suprido pela prova
testemunhal. A confissão nunca supre a falta do exame de corpo de delito.
O Exame Necroscópico é o exame pericial realizado em cadáver. Seu objetivo é
determinar a causa da morte. Só pode ser realizado seis horas após o óbito. Será dispensado
em caso de morte natural ou morte violenta.
Laudo ou exame complementar é qualquer perícia que vise complementar a perícia
anteriormente realizada. No caso de lesão corporal grave, a perícia complementar deve ser
realizada logo depois dos 30 dias da ocorrência do delito.
1.9.2. Interrogatório
Interrogatório é o ato processual por meio do qual o acusado é ouvido pelo juiz.
Envolve o direito de presença e o direito de audiência.
O direito de presença é o direito de acompanhar os atos processuais, e o direito de
audiência é o direito de ser ouvido.
Para o réu presente, o interrogatório é um ato indispensável e sua falta acarreta a
nulidade absoluta. Réu presente sem interrogatório, somente nos casos do Código Eleitoral 67
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
e na Lei de Imprensa, em que o réu só será interrogado se desejar.
O interrogatório é público, oral (salvo para o mudo, o surdo e o surdo-mudo),
personalíssimo, individual e privativo entre o juiz e o réu.
O réu tem o direito constitucional (art. 5, inc. LXIII, da CF/88) de permanecer em
silêncio. Se optar por responder, não estará obrigado a dizer a verdade. Pode mentir sobre
fato. A mentira do réu só será considerada crime se fizer auto-acusação falsa.
Conforme o Provimento n. 84 do Conselho Superior da Magistratura do Estado
de São Paulo, o réu pode ser citado e interrogado por precatória. O interrogatório será
feito pelo juiz deprecado. Válido somente no Estado de São Paulo.
O interrogatório on line ainda é visto com cautelas, pois o interrogado pode estar
sofrendo algum tipo de coação que o juiz pode não perceber. A jurisprudência já aceitou,
excepcionalmente.
No interrogatório do menor de 21 anos, doente mental ou silvícola inadaptado, será
necessária a presença de um curador.
1.9.3. Confissão
A confissão ocorre com a admissão, pelo réu, da autoria dos fatos a ele imputados.
A confissão não é meio de prova, é a própria prova. Não se prova a materialidade do delito
pela confissão. A confissão se refere apenas à autoria. A confissão perante a autoridade
judicial configura uma atenuante.
A confissão pode ser:
simples: o réu admite a autoria de fato único;
complexa: quando o réu admite autoria de fato múltiplo;
qualificada: o réu admite autoria dos fatos a ele imputados, mas alega algo em
seu benefício;
judicial: feita em Juízo;
extrajudicial: qualquer confissão feita fora do Juízo, no Inquérito Policial;
explícita: admite a autoria dos fatos;
implícita: não admite a autoria, mas realiza atos que levam indiretamente à
conclusão que ele é o autor do delito. Ex.: paga indenização à vítima, repara os
danos causados.68
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
A confissão é um ato personalíssimo, livre, espontâneo, divisível (o juiz não é
obrigado a acatar a confissão como um todo, podendo acatá-la parcialmente) e retratável.
Ocorre a confissão delatória quando um co-réu, no interrogatório, imputa a outro
acusado a responsabilidade pela prática do crime.
1.9.4. Prova testemunhal
Testemunha é toda pessoa, estranha ao processo e eqüidistante das partes, chamada
em Juízo para depor sobre os fatos que caíram sobre seus sentidos.
A testemunha pode ser:
direta ou de visu: depõe sobre os fatos que presenciou – teve contato direto;
indireta ou de audito: depõe sobre os fatos que tomou conhecimento por
terceiros – ouviu dizer;
própria: presta depoimento acerca do tema probandu, do fato objeto da prova;
imprópria ou instrumentária: é a testemunha chamada a presenciar a prática de
atos processuais ou pré-processuais;
referida: são aquelas citadas no depoimento de outra testemunha; serão ouvidas
como testemunhas do Juízo;
informante: são as testemunhas que não prestam compromisso;
numerária: testemunha que entra no cômputo legal;
extra-numerária: não entra no cômputo legal. São as referidas, informantes,
testemunhas que nada souberam a respeito dos fatos.
Características da prova testemunhal:
retrospectividade: é uma declaração retrospectiva, depõe sobre fatos passados;
oralidade: a prova testemunhal é oral, exceto para o surdo, o surdo-mudo e
o mudo. Podem responder por escrito: o Presidente e o Vice-Presidente da
República, os Senadores, os Deputados Federais, os Ministros de Estado, os
Governadores, os Secretários de Estado, os Prefeitos, os Deputados
Estaduais, os Membros do Judiciário, os Membros do Tribunal de Contas da
União e os Membros do Tribunal Marítimo.
A testemunha não pode trazer o depoimento por escrito, sendo permitida a consulta 69
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
a apontamentos. O depoimento da testemunha deve ser objetivo, não deve emitir opiniões
pessoais.
As testemunhas são notificadas por mandado. O preso e o militar são notificados por
requisição. O sistema de inquirição das testemunhas é o presidencialista: apenas o juiz faz
as perguntas às testemunhas; salvo no plenário do Júri, em que a inquirição das
testemunhas é direta, e a acusação e a defesa podem fazer perguntas.
A testemunha tem o dever de:
comparecer: se o desrespeitar, a testemunha pode ser conduzida coercivamente,
pode responder por crime de desobediência e pagar multa fixada pelo juiz.
depor e dizer a verdade: algumas pessoas, como cônjuge, ascendente,
descendente e irmão do réu, são, por lei, dispensadas de depor. Elas têm a
obrigação de comparecer, mas não de depor. Se vierem a depor, não prestam
compromisso.
Algumas pessoas, em razão da função (atividade de natureza pública), ofício (atividade
manual), ministério (atividade de cunho eclesiástico ou assistencial) ou profissão (atividade
predominantemente intelectual) são proibidas de depor. Poderão depor, se forem desobrigadas
do sigilo e quiserem depor.
As informantes são as testemunhas que não prestam compromisso e não têm a
obrigação de dizer a verdade. São os menores de 14 anos e os deficientes mentais.
MÓDULO XII
DIREITO PROCESSUAL PENAL
1. INTERROGATÓRIO
1.1. Conceito
Interrogatório é o ato processual pelo qual o acusado é ouvido pelo juiz sobre a
imputação contra ele formulada. O interrogatório possibilita ao acusado o exercício de
autodefesa.
A natureza jurídica do interrogatório é matéria controversa. O Código de Processo
Penal tratou o interrogatório como verdadeiro meio de prova. Já para a doutrina, o 70
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
interrogatório tem caráter misto, é meio de prova e também meio de defesa, pois o acusado
pode exercer sua autodefesa.
O princípio constitucional da ampla defesa (art. 5.º, inc. LV, da CF/88) constitui-se
de: defesa técnica, que é aquela realizada pelo defensor do acusado, pelo causídico; e
autodefesa, que é ato exclusivo do acusado.
A autodefesa pode ser renunciada pelo acusado. Constitui-se a autodefesa de: direito
de presença, que é o direito do acusado acompanhar a realização dos atos processuais,
depoimentos das testemunhas; e direito de audiência, que é o direito do acusado ser
ouvido, participando da formação do livre convencimento do juiz. O réu também tem a
garantia constitucional de permanecer calado em seu interrogatório, sem que qualquer
sanção lhe seja aplicada.
O interrogatório do réu presente é ato indispensável. Sua falta acarretará a nulidade
absoluta do processo. Exceção: poderá haver processo de réu presente sem interrogatório
nos crimes constantes do Código Eleitoral e da Lei de Imprensa. Para o réu revel (citado
pessoalmente que não comparece nem constitui advogado), o interrogatório será
dispensado. Se comparecer no decorrer da instrução, espontaneamente ou preso, será
interrogado.
Para o interrogatório, é indispensável a citação do réu.
O art. 188 do Código de Processo Penal estabelece o roteiro das perguntas que
devem ser feitas no interrogatório.
1.2. Características do Interrogatório
Ato público.
Ato processual oral. Exceções: para o surdo, as perguntas serão feitas por escrito
e respondidas oralmente; para o mudo as perguntas serão feitas oralmente e
respondidas por escrito; para o surdo-mudo as perguntas e as respostas serão
feitas por escrito. Se o réu for estrangeiro ou surdo-mudo e analfabeto, será
nomeado um intérprete que funcionará também como curador.
Ato personalíssimo. Só o réu pode ser interrogado. Havendo defensor
constituído, esse deverá ser notificado a comparecer; não havendo, será
nomeado um dativo para o réu.71
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
Ato individual.
Ato privativo entre juiz e réu. As partes não podem fazer reperguntas. O
defensor poderá, entretanto, zelar pela regularidade formal do processo. Para o
menor de 21 anos, a presença do curador é indispensável, sob pena de nulidade.
1.3. Momento do Interrogatório
Como regra, o momento do interrogatório é posterior à citação e anterior à defesa
prévia. Mas como o Código de Processo Penal não fixou prazo, entende-se que o
interrogatório pode ser realizado a qualquer momento. É ato não preclusivo. Pode realizar-
se inclusive após a sentença, desde que antes do trânsito em julgado. Assim, se o réu
comparecer em Juízo antes do trânsito em julgado e manifestar o desejo de ser ouvido, o
juiz deverá interrogá-lo. Caso já exista apelação, o julgamento deverá ser convertido em
diligência para que o réu seja ouvido, sob pena de cerceamento da defesa. Em situações
excepcionais, entende-se ser o interrogatório – após a sentença – facultativo, dispensável
quando, por exemplo, for possível antever a absolvição do acusado.
Caso o juiz entenda necessário, o réu já interrogado poderá ser novamente
interrogado.
No procedimento da Lei n. 9.099/95, o momento do interrogatório é posterior à
oitiva das testemunhas.
1.4. Direitos do Réu no Interrogatório
O réu, durante o interrogatório, tem o direito de permanecer em silêncio, conforme
art. 5.º, inc. LXIII, da Constituição Federal de 1988. O réu que responde ao interrogatório
não está obrigado a dizer a verdade, poderá mentir sem sofrer qualquer sanção. A mentira
do réu no interrogatório só será considerada crime se fizer auto-acusação falsa, conforme
art. 341 do Código Penal.
O réu ainda tem o direito de entrevistar-se com seu advogado antes do
interrogatório. Esse direito vem previsto no Pacto de San José da Costa Rica, do qual o
Brasil é signatário.
1.5. Interrogatório por Precatória72
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
O provimento CXCI (1984) do Conselho Superior da Magistratura de São Paulo
possibilita a realização de interrogatório por precatória, pois, no processo penal, não vige o
princípio da identidade física do juiz. O provimento vige somente no Estado de São Paulo.
No tocante ao interrogatório on line, sistema de vídeo conferência, a doutrina questiona sua
validade pela ausência física de um juiz, pois o interrogado poderá estar sofrendo alguma
coação e essa não ser percebida. A jurisprudência o admite excepcionalmente.
1.6. Interrogatório do Menor de 21 anos
Se o réu for menor, o interrogatório será feito na presença de um curador. A omissão
gera nulidade relativa, devendo ser demonstrado o prejuízo, sob pena de convalidação. A
idade do menor deverá ser considerada na data da realização do ato e não na do
cometimento da infração penal. A Súmula n. 352 do Supremo Tribunal Federal dispõe que
não é nulo o processo penal por falta de nomeação de curador ao réu menor que teve a
assistência de defensor dativo. A idade do acusado é provada por meio de documento
hábil, como a certidão de nascimento ou a carteira de identidade. Não haverá nulidade do
processo se o réu mentir acerca de sua idade. Também será necessário a nomeação de
curador para o interrogatório do silvícola inadaptado e do doente mental.
2. CONFISSÃO
2.1. Conceito
Confissão é a admissão pelo réu da autoria dos fatos a ele imputados em um
processo penal. A confissão refere-se à autoria do fato. A materialidade do delito não é
objeto da confissão. A confissão feita perante a autoridade judicial configura atenuante
genérica, art. 65, III, “d”, do Código Penal. A confissão não é mais considerada a rainha
das provas; ao magistrado caberá apreciar a confissão em consonância com as demais
provas produzidas.
2.2. Espécies de Confissão
Simples: quando o réu admite a autoria de fato único, atribui a si a prática de
infração penal.
Qualificada: quando o réu admite a autoria dos fatos a ele imputados, mas alega 73
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
algo em seu benefício, opõe um fato modificativo ou impeditivo, por exemplo:
excludente de antijuridicidade, culpabilidade.
Complexa: quando o réu admite a autoria de fato múltiplo.
Judicial: é a confissão prestada perante o juiz competente, no próprio processo.
Extrajudicial: é a confissão prestada no Inquérito Policial, ou fora dos autos da
ação penal.
Explícita: quando o acusado reconhece espontaneamente ser o autor da infração.
Implícita: quando o acusado procura ressarcir o ofendido dos prejuízos causados
pela infração.
2.3. Características da Confissão
A confissão é ato personalíssimo do réu. É ato livre e espontâneo.
A confissão é um ato retratável, isto é, o acusado pode desdizer a confissão
prestada. A confissão é ainda um ato divisível, isto é, o juiz poderá cindir a confissão feita
pelo acusado, acatando-a em parte ou no todo.
2.4. Confissão Ficta
A confissão ficta ou presumida não se verifica no processo penal, em virtude da
verdade real que norteia o processo penal. Ainda que o processo corra à revelia do réu, não
haverá presunção de veracidade dos fatos alegados pela acusação.
2.5. Confissão Delatória ou Chamada de Co-Réu
Ocorre quando um réu, no interrogatório, imputa a terceiro a responsabilidade pela
prática do crime, além de confessar sua própria participação. No tocante a imputação a
terceiro, seu valor equivale à prova testemunhal, havendo a possibilidade de reperguntas
pelas partes.
MÓDULO XIII
DIREITO PROCESSUAL PENAL
1. DOS SUJEITOS PROCESSUAIS74
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
Os sujeitos processuais dividem-se em principais e secundários. Principais são
aqueles cuja ausência torna impossível a existência ou a complementação da relação
jurídico-processual: são o juiz e as partes. O juiz é o sujeito processual imparcial e as
partes são os sujeitos processuais parciais, representados pela acusação, que é o Ministério
Público ou o querelante, e pela defesa, que é o réu ou o querelado. Secundários são aqueles
que não são indispensáveis ao processo, mas que nele intervêm de alguma forma: são os
órgãos auxiliares da justiça, os serventuários, os peritos e os intérpretes.
O assistente de acusação é também chamado de parte contingente, pois não é um
integrante necessário da relação jurídico-processual.
1.1. Juiz
O juiz exerce o papel de maior relevo no processo. A lei confere-lhe os poderes
necessários para zelar pelo processo e solucionar a lide. Para tanto, são necessários alguns
pressupostos processuais subjetivos relativos à função de juiz. São eles:
Investidura: a jurisdição só pode ser exercida por quem tenha sido regularmente
investido na autoridade de juiz, atualmente pela aprovação em concurso público
de provas e títulos, observando-se nas nomeações a ordem de classificação (art.
93, inc. I, da Constituição Federal).
Imparcialidade: o juiz deve estar, no processo, acima e eqüidistante das partes,
super et inter partes. Se presentes algumas das causas de suspeição (art. 254 do
Código de Processo Penal), impedimento (art. 252 do Código de Processo
Penal) ou incompatibilidade (art. 253 do Código de Processo Penal), o juiz
deverá ser afastado do processo. Nos casos de impedimento, o juiz tem algum
vínculo com uma das partes; são causas graves que afetam a imparcialidade,
acarretando a inexistência do ato realizado pelo juiz impedido. Na suspeição, o
juiz tem interesse no resultado do processo. Esta gera a nulidade absoluta do
processo. Para parte da doutrina, o rol que trata do impedimento e da suspeição,
por ser restritivo de direitos, é um rol taxativo que não pode ser ampliado.
Obs: O Código de Processo Civil, em seu art. 135, par. ún., permite que o
magistrado se afaste da causa argüindo motivo de foro íntimo. O Código de Processo Penal
não faz essa previsão. Poderá, mesmo assim, o juiz do processo penal fazê-lo?75
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
R: Sim. No processo penal, o juiz também pode declinar de sua atuação por motivo
de foro íntimo.
Competência: o juiz deve ser o competente para julgar a lide, segundo as regras
de competência previstas na Constituição Federal e no Código de Processo
Penal.
1.2. Acusador
O acusador, no processo penal, é representado pelo Ministério Público, no caso da
ação penal pública, e pelo querelante (ofendido ou seu representante legal), no caso de
ação penal privada ou ação penal subsidiária da pública. O Ministério Público atuará
sempre no processo penal, seja como parte na ação penal pública, seja como custus legis,
isto é, fiscal da lei na ação penal privada.
Conforme o art. 68 do Código de Processo Penal, o Ministério Público também tem
legitimidade para promover a ação civil ex delicto em nome do ofendido. Nesse caso, o
Ministério Público atua como substituto processual.
A Constituição Federal, no art. 129, relaciona as funções institucionais do
Ministério Público e prevê, no § 2.º, que essas funções só podem ser exercidas por
integrantes da carreira. A Constituição Federal vedou a possibilidade do promotor ad hoc,
isto é, a nomeação de uma pessoa que faça as vezes do promotor para algum ato
processual.
O Ministério Público, porque exerce a acusação pública, possui algumas
peculiaridades, como a possibilidade de impetrar habeas corpus e de recorrer em favor do
réu; além disso, seus membros estão sujeitos à disciplina das suspeições e impedimentos,
entre outras. Uma vez que atuam em nome da instituição e não em nome próprio, podem
ser substituídos no curso do processo, proibindo-se, entretanto, designações discricionárias
feitas pelo Procurador-Geral de Justiça.
Os membros do Ministério Público não se encontram subordinados, quer ao Poder
Executivo, quer ao Judiciário, possuindo total independência.
1.3. Acusado
O acusado é aquele contra quem se dirige a pretensão punitiva. É o sujeito passivo 76
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
da relação jurídico-processual. O acusado deve ser identificado com o nome e com os
demais dados. O Código de Processo Penal permite a propositura da ação penal somente
com a descrição das características físicas do indivíduo.
É necessário que o acusado tenha capacidade para ser parte (sujeito de direitos e
obrigações) e capacidade para estar em juízo em nome próprio, o que advém com a idade
de 18 anos. Ao acusado menor de 21 anos, será nomeado curador, que poderá ser advogado
ou outra pessoa idônea. Se o acusado teve a assistência de defensor dativo, a falta de
curador não anula o processo, conforme a Súmula n. 352 do Supremo Tribunal Federal.
Não podem ser acusadas as pessoas que dispõem de imunidade parlamentar ou
diplomática.
O acusado que, citado pessoalmente, não comparecer ao interrogatório, será
considerado revel.
A Constituição Federal previu a possibilidade de a pessoa jurídica ser o sujeito
passivo da infração penal nos casos de crime contra a economia popular, contra a ordem
econômica e financeira e nas condutas lesivas ao meio ambiente.
A Constituição Federal prevê uma série de garantias ao acusado no processo penal,
entre as quais:
o direito ao respeito à integridade física e moral;
o direito ao devido processo legal;
o direito ao contraditório e à ampla defesa, que inclui a autodefesa e a defesa técnica
feita por defensor;
o direito ao silêncio.
O acusado poderá, sem o defensor: impetrar habeas corpus, interpor recurso,
interpor revisão criminal, pagar fiança arbitrada pelo juiz e argüir suspeição.
1.4. Advogado
O defensor não é sujeito processual, mas sim o representante do acusado, que age
em nome e no interesse dele. Exerce a defesa técnica do acusado, que é tão importante e
indisponível que poderá ser exercida ainda que contra a vontade do representado ou mesmo
na sua ausência. No processo penal, o contraditório e a ampla defesa são efeitos. A ciência 77
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
e a participação são necessárias.
A ampla defesa, no processo penal, constitui-se de autodefesa, feita pelo próprio
acusado no interrogatório, e de defesa técnica, desempenhada por pessoa legalmente
habilitada, o advogado (art.133 da Constituição Federal).
Se o acusado não possuir defensor constituído, também chamado de procurador, o
juiz irá nomear-lhe um defensor, chamado de defensor dativo. Se o acusado possuir
habilitação técnica, ele mesmo poderá defender-se.
A constituição do defensor faz-se por meio de outorga de procuração com cláusula
ad judicia. A constituição do defensor pode ser também apud acta, isto é, o próprio
acusado em seu interrogatório indica quem é seu defensor.
Para a realização de alguns atos no processo, o defensor precisa de poderes
especiais, como poderes para argüir a suspeição, argüir falsidade de documento e
concordar com perdão do querelante.
Conforme entendimento do Supremo Tribunal Federal, o defensor dativo não tem a
obrigação de recorrer, mas, se o acusado interpuser recurso, o defensor dativo tem a
obrigação de arrazoar o recurso.
A intimação do defensor dativo é feita pessoalmente e a intimação do defensor
constituído é feita por publicação na imprensa oficial. A Lei n. 1.060/50, art. 5.º, § 5.º,
que trata da assistência judiciária, prevê o prazo em dobro para o defensor público. A
jurisprudência estende a prerrogativa do prazo em dobro ao defensor dativo e aos
advogados com convênio na Procuradoria-Geral do Estado.
A falta do defensor, ainda que motivada, não implica adiamento do ato processual,
devendo o juiz nomear ao réu um substituto ad hoc para o ato.
1.5. Assistente do Ministério Público
O assistente de acusação é parte contingente no processo. Podem intervir no
processo, como assistentes do Ministério Público, o ofendido, seu representante legal, ou,
na falta, o cônjuge, ascendente, descendente ou irmão do ofendido, por intermédio de
advogado, para reforçar a acusação e acautelar a reparação civil. Atualmente tem sido
admitida a intervenção como assistente da(o) companheira(o) do ofendido.
Atenção: O Estado pode intervir como assistente da acusação?78
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
Para os Profs. TOURINHO e MIRABETE, o Estado não pode intervir, pois o
Ministério Público já defende o interesse público. Não há necessidade de o Estado
participar como assistente da acusação.
Para o Prof. VICENTE GRECO, é possível a intervenção do Estado, pois o
Ministério Público, quando atua, defende interesse público primário (sociedade), e o
Estado, quando se habilita como assistente da acusação, vai defender interesse público
secundário (patrimonial).
O Decreto-lei n. 201/67, que trata da responsabilidade dos prefeitos, prevê
expressamente a possibilidade de o Estado atuar como assistente da acusação.
O assistente da acusação intervém em todos os termos da ação penal, logo, não toma
parte do inquérito policial e da execução. Intervém a partir do recebimento da denúncia até
o trânsito em julgado da decisão. Intervém no processo no estado em que ele se encontra;
assim, não pode pretender a renovação de atos processuais sobre os quais já ocorreu a
preclusão.
O Ministério Público será ouvido previamente sobre a admissão do assistente.
Manifesta-se sobre a legalidade. No tocante à avaliação pelo Ministério Público acerca da
conveniência ou oportunidade para a intervenção do assistente, existem duas posições:
Para os Profs. TOURINHO e MIRABETE, o Ministério Público somente examina a
legalidade da intervenção.
Para os Profs. MAGALHÃES NORONHA e TORNAC, além da legalidade, o
Ministério Público pode manifestar-se sobre a conveniência e a oportunidade da
intervenção do assistente.
Atualmente vigora a primeira posição.
Da decisão que admite ou não o assistente de acusação não cabe recurso, podendo,
entretanto, ser impetrado mandado de segurança ou correição parcial.
Qual o real interesse do assistente de acusação em ingressar no processo penal?
Para o Prof. TOURINHO, a intervenção do assistente fundamenta-se
exclusivamente em interesse na obtenção de uma sentença penal condenatória, que será um
título executivo judicial a ser executado no juízo cível, reparando os danos decorrentes do
ato ilícito.79
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
Para uma segunda posição, dominante na doutrina e na jurisprudência, além do
interesse citado acima, o assistente também tem o interesse de auxiliar o Ministério Público
na busca da realização da justiça. Um dos principais expoentes dessa corrente é o Prof.
VICENTE GRECO.
Em razão dessa questão, levanta-se uma nova polêmica:
Se, no processo, foi aplicado ao réu o sursis penal e o Ministério Público se
conforma, o assistente de acusação poderá recorrer, interpondo apelação?
Novamente surgem duas posições:
Para o Prof. TOURINHO, o assistente já alcançou seu objetivo, a sentença penal
condenatória, restando executá-la no juízo cível.
Para o Prof. VICENTE GRECO, o assistente quer também a realização da justiça, a
correta aplicação da lei ao caso concreto, podendo, portanto, interpor apelação.
O art. 271 do Código de Processo Penal relaciona os poderes do assistente no
processo penal. É um rol taxativo:
Propor meios de prova. O assistente poderia arrolar testemunhas, já que esse é
um meio de prova?
O momento para a acusação arrolar testemunhas de acusação é no oferecimento da
denúncia, e o assistente intervém no processo após o recebimento da denúncia, quando,
portanto, já ocorreu a preclusão. Há, no entanto, duas posições:
Para o Prof. TOURINHO, o momento para arrolar testemunhas já precluiu,
não sendo possível posteriormente propor tal meio de prova.
Para o Prof. MIRABETE, é possível, desde que dentro do número legal de
testemunhas que serão ouvidas, ou não, a critério do juiz.
Requerer perguntas às testemunhas, sempre posteriores às do Ministério
Público.
Aditar o libelo, usando o prazo de 48h por analogia.
Oferecer alegações finais, sempre posteriores às do Ministério Público.
Participar dos debates orais.
Arrazoar seus próprios recursos e os recursos interpostos pelo Ministério
Público. Pode também oferecer contra-razões aos recursos da defesa. O Código
de Processo Penal só permite ao assistente de acusação interpor recurso de 80
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
apelação no procedimento do júri e no juízo singular e recurso em sentido
estrito contra decisão de impronúncia e que julga extinta a punibilidade.
Conforme a Súmula n. 210 do Supremo Tribunal Federal, o assistente pode
recorrer, inclusive extraordinariamente (e especial), contra acórdãos que
julguem apelação ou recurso em sentido estrito. Da decisão concessiva de
habeas corpus, o assistente de acusação não pode recorrer, conforme a Súmula
n. 208 do Supremo Tribunal Federal. O prazo para o assistente interpor recurso
em sentido estrito é de 5 dias, se ele já estiver habilitado nos autos, ou de 15, se
não estiver habilitado, pois, nesse caso, não é intimado da decisão. O termo
inicial para o assistente interpor recurso é supletivo e inicia-se no primeiro dia
subseqüente ao término do prazo do Ministério Público. Se o Ministério Público
já interpôs recurso, não cabe ao assistente propor novamente. Se o Ministério
Público só recorreu de parte da decisão, o assistente pode recorrer da parte não
recorrida.
Atenção: O co-réu pode ser assistente de acusação? Ex: lesões corporais recíprocas.
Não há, nesse caso, legítima defesa. Ambos são denunciados pelo mesmo delito. Serão ao
mesmo tempo réu e vítima. Um deles poderá habilitar-se como assistente de acusação?
O art. 270 do Código de Processo Penal dispõe que o co-réu no mesmo processo não
poderá intervir como assistente do Ministério Público, concluindo-se, portanto, pela
impossibilidade da intervenção do co-réu como assistente da acusação. A doutrina,
entretanto, observa a seguinte possibilidade: no processo, um deles é absolvido, o
Ministério Público conforma-se com a decisão e esta transita em julgado, enquanto o outro
é condenado e apela de sua decisão. Aquele que foi anteriormente absolvido
posteriormente pode intervir como assistente da acusação, pois não é mais co-réu.
O assistente que não tiver legítimo interesse ou que perturbar deliberadamente a
acusação poderá ser afastado. O assistente que faltar injustificadamente a um ato do
processo não será intimado dos demais.
81
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
MÓDULO XIV
DIREITO PROCESSUAL PENAL
1. DA PRISÃO E DA LIBERDADE PROVISÓRIA
1.1. Conceito
Prisão consiste na privação da liberdade de locomoção, mediante clausura,
decretada por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, ou
decorrente de flagrante delito. Conforme o art. 5.º, inc. LXI, da Constituição Federal,
ninguém será preso senão em flagrante delito, ou por ordem escrita e fundamentada de
autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime
propriamente militar, definidos em lei.
A prisão será efetuada sem o respectivo mandado somente nos casos de prisão em
flagrante, transgressão militar, durante estado de sítio e no caso de recaptura do evadido.
O Código Eleitoral prevê que, 5 dias antes e 48h depois do dia da eleição, não
podem ser cumpridos mandados judiciais de prisão processual. Tal disposição visa
assegurar o exercício do direito político. Podem, entretanto, ser efetuadas as prisões em
flagrante e as decorrentes de sentença penal condenatória com trânsito em julgado.
1.2. Espécies
As espécies de prisão são:
Prisão Penal ou Prisão com Pena. É a prisão decorrente de sentença penal
condenatória transitada em julgado, irrecorrível.
Prisão Processual, Provisória ou Cautelar. É a prisão decretada no curso do
processo. Como tem natureza cautelar, precisam estar presentes o fumus boni
iuris e o periculum in mora para ser decretada. São espécies de prisão
processual:
prisão em flagrante;
prisão preventiva;
prisão temporária;
prisão para apelar;
prisão por sentença de pronúncia.
82
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Prisão Civil. A Constituição Federal não permite a prisão civil por dívida,
salvo a do responsável pelo inadimplemento voluntário e inescusável de
obrigação alimentícia e a do depositário infiel, conforme art. 5.º, inc. LXVII, da
Constituição Federal.
Prisão disciplinar. É a prisão para as transgressões militares e os crimes
propriamente militares.
Prisão administrativa. Com a Constituição Federal de 1988, a autoridade
administrativa não pode mais aplicar a pena de prisão, sendo necessária a
decretação pelo Poder Judiciário, respeitando-se o devido processo legal.
1.3. Mandado de Prisão
O Código de Processo Penal, nos arts. 285 e ss., trata do mandado (ordem) de
prisão. Conforme dispõe esse diploma, a autoridade judicial que ordenar a prisão expedirá
o respectivo mandado, que será lavrado pelo escrivão e assinado pela autoridade
competente. Além de designar pelo nome ou sinais característicos a pessoa a ser presa, o
mandado mencionará a infração penal que motivou a prisão, declarará o valor da fiança, se
afiançável o delito, e será dirigido a quem tenha qualidade para executá-lo. O mandado
será apresentado em duplicata, e o preso passará recibo em uma das vias. A execução do
mandado será realizada em qualquer dia e horário, guardadas as disposições sobre
inviolabilidade de domicílio. Na prisão em flagrante, não há inviolabilidade de domicílio.
Exemplo: guardar entorpecentes em casa é um crime permanente, sua consumação se
prolonga no tempo. A prisão em flagrante pode ocorrer a qualquer momento.
1.4. Prisão em Domicílio e em Perseguição
A prisão decorrente de mandado deve respeitar a inviolabilidade do domicílio,
prevista no art. 5.º, inc. XI, da Constituição Federal. O mandado de prisão só poderá ser
cumprido durante o dia, compreendido o interregno das 6 às 18h. Alguns entendem que o
direito ao cumprimento do mandado de prisão se inicia com a aurora e se encerra com o
crepúsculo. Nesse período, a prisão pode ser efetuada ainda que sem o consentimento do
morador, podendo o executor arrombar as portas se preciso, conforme art. 293 do Código
de Processo Penal. O morador que se recusar a entregar o réu oculto em sua casa cometerá 83
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o crime de favorecimento pessoal, art. 348 do Código Penal. Estão excluídos o cônjuge,
ascendente, descendente e irmão (cadi) do réu.
Durante a noite, o mandado de prisão só será cumprido se houver concordância do
morador. A recusa, nesse caso, não configura crime, é um exercício regular do direito. Se
não houver concordância do morador, como cautela, as saídas devem ser vigiadas,
tornando a casa incomunicável. Ao amanhecer será efetuada a prisão.
No caso de perseguição, passando o réu para outra Comarca, o executor da prisão
poderá prendê-lo onde o alcançar, apresentando-o imediatamente à autoridade policial
local, que lavrará o auto de prisão em flagrante, se for o caso, e providenciará sua remoção
para apresentação ao juiz que determinou a prisão.
1.5. Prisão Especial
Algumas pessoas, em razão de sua função, cumprirão a prisão processual em celas
especiais ou quartéis – tal prisão só vigora até a sentença condenatória definitiva. É
assegurado: alojamento condigno, alimentação, recreio, uso de vestuário próprio,
assistência do advogado, assistência religiosa, assistência médica particular, visita de
parentes e amigos em horário previamente fixado, visita de parentes próximos durante o
expediente, sem horário determinado, recepção e transmissão de correspondência
livremente, salvo casos especiais, e transporte diferenciado. O art. 295 do Código de
Processo Penal relaciona aqueles que têm direito à prisão especial. Além desses, há outros
previstos em leis especiais também.
Se não houver estabelecimento adequado, poderá ser concedido o regime de prisão
provisória domiciliar, na própria residência, de onde o preso não poderá se afastar sem
prévio consentimento judicial.
Conforme art. 86, § 3.º, da Constituição Federal, o Presidente da República não
estará sujeito à prisão enquanto não sobrevier sentença condenatória transitada em julgado.
1.6. Prisão em Flagrante
A palavra ‘flagrante’ vem do latim, significando ‘queimar’. Flagrante delito é o
crime que ‘ainda queima’, isto é, que está sendo cometido ou acabou de sê-lo. A prisão em
flagrante é uma medida restritiva da liberdade de natureza processual e cautelar. Consiste 84
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na prisão – independente de ordem escrita e fundamentada de juiz competente – de quem é
surpreendido enquanto comete ou acaba de cometer a infração penal. Aplica-se também à
contravenção.
1.6.1. Espécies de flagrante
Flagrante próprio: é o flagrante propriamente dito, real ou verdadeiro. O agente
é preso enquanto está cometendo a infração penal ou assim que acaba de
cometê-la– art. 302, incs. I e II, do Código de Processo Penal.
Flagrante impróprio: é o flagrante irreal ou “quase-flagrante”. O agente é
perseguido logo após cometer o ilícito, em situação que faça presumir ser ele o
autor da infração– art. 302, inc. III, do Código Penal.
Flagrante presumido: é o flagrante ficto ou assimilado. O agente do delito é
encontrado, logo depois, com papéis, instrumentos, armas ou objetos que fazem
presumir ser ele o autor do delito– art. 302, inc. IV, do Código de Processo
Penal.
Flagrante compulsório: as autoridades policiais e seus agentes têm o dever de
efetuar a prisão em flagrante, não possuindo qualquer discricionariedade.
Flagrante facultativo: é a faculdade que qualquer um do povo tem de efetuar ou
não a prisão em flagrante, conforme os critérios de conveniência e oportunidade.
Flagrante preparado ou provocado: é o delito de ensaio, delito de experiência,
delito putativo por obra do agente provocador. Ocorre quando alguém, de forma
insidiosa, provoca o agente à prática de um crime e, ao mesmo tempo, toma
providências para que ele não se consume. No flagrante preparado, o policial ou
terceiro induz o agente a praticar o delito e o prende logo em seguida, em
flagrante. O Supremo Tribunal Federal considera atípica a conduta, conforme a
Súmula n. 145.
Flagrante esperado: essa hipótese é válida. O policial ou terceiro esperam a
prática do delito para prender o agente em flagrante. Não há qualquer
induzimento.
Flagrante prorrogado: é o flagrante previsto no art. 2.º, inc. II, da Lei n.
9.034/95, que trata das organizações criminosas. O policial tem a 85
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
discricionariedade para deixar de efetuar a prisão em flagrante no momento da
prática delituosa, tendo em vista um momento mais importante para a
investigação criminal e para a colheita de provas. Só é possível nesses crimes.
Flagrante forjado: é o flagrante maquinado, fabricado ou urdido. Policiais ou
terceiros criam provas de um crime inexistente para prender em flagrante.
Exemplo: o policial, ao revistar o carro, afirma ter encontrado drogas, quando na
verdade foi ele quem colocou a droga dentro do carro, visando a incriminação.
Apesar da dificuldade de sua prova, quando ela se dá é considerado crime
inexistente, e o policial responde por abuso de autoridade.
O flagrante em crime permanente pode ocorrer enquanto não cessar a permanência
do delito. No tocante ao flagrante em crime habitual, surgiram duas correntes:
A primeira entende que o crime habitual exige a reiteração de condutas, logo,
não cabe a prisão em flagrante.
A segunda afirma que, se já existe prova da habitualidade, pode ocorrer a prisão
em flagrante.
A ação penal privada não impede a prisão em flagrante, desde que o ofendido
autorize a lavratura do auto ou a ratifique no prazo da entrega da nota de culpa, ou seja, em
24h.
Não podem ser presos em flagrante:
Menor de 18 anos (menor é apreendido).
Diplomatas estrangeiros.
Presidente da República.
Agente que socorre a vítima de trânsito– art. 301 da Lei n. 9.503/97.
Aquele que se apresenta espontaneamente à autoridade após o cometimento
do delito. Nada impede, entretanto, que lhe seja decretada a prisão preventiva,
se necessário.
Podem ser presos em flagrante apenas nos crimes inafiançáveis:
membros do Congresso Nacional;86
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deputados estaduais;
magistrados;
membros do Ministério Público;
advogados no exercício da profissão.
A autoridade policial competente, para lavrar o auto de prisão, será aquela do local
onde se efetivou a prisão. Se for local diferente de onde ocorreu o delito, os autos devem
ser posteriormente para lá remetidos a fim de instauração do inquérito policial e
propositura da ação penal. Se se desrespeitar essa regra, o auto será válido, haverá mera
irregularidade.
No caso de infração militar, o auto de prisão em flagrante é lavrado pela autoridade
oficial militar. Nos crimes cometidos no interior da Câmara ou do Senado, a Mesa da
Câmara ou outra autoridade competente, designada no regimento interno, lavrará o auto.
Se o fato foi praticado contra autoridade ou em sua presença, ela própria, desde que
investida de suas funções, poderá lavrar o auto.
Como o prazo para a entrega da nota de culpa ao preso é de 24 horas, por dedução
lógica, o prazo para lavratura do auto também é de 24 horas.
Etapas da prisão em flagrante
Comunicação ao preso de seus direitos, dentre eles os de permanecer em
silêncio no interrogatório. Deve-se também comunicar sua família ou seu
advogado sobre a prisão. O direito do preso é o de comunicar e não o de ser
assistido.
Iniciam-se as oitivas do condutor do preso e depois, no mínimo, de duas
testemunhas. Na falta de uma testemunha, o próprio condutor poderá ser a
testemunha. Não havendo testemunhas, devem ser ouvidas duas testemunhas
que presenciaram a apresentação do preso à autoridade policial – são as
testemunhas instrumentárias. Se for possível, ouve-se também a vítima.
Interrogatório do preso. Segue os mesmos requisitos do interrogatório
judicial. Se o acusado for menor de 21 anos, ser-lhe-á nomeado um curador, sob
pena de relaxamento do flagrante.87
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Após 24 horas, deve ser entregue ao preso a nota de culpa, que é o
instrumento que informa ao preso os motivos da prisão. Deve ser assinado pelas
testemunhas. A falta da nota de culpa também acarreta o relaxamento da prisão.
Encerrada a lavratura do auto, a prisão é comunicada ao juiz, que dará vistas
ao Ministério Público. Com essa comunicação, a autoridade policial se
desincumbe da sua obrigação.
Prisão Preventiva
A prisão preventiva é uma prisão processual de natureza cautelar. Pode ser
decretada desde o inquérito policial até antes do trânsito em julgado da sentença penal
condenatória. Como é exceção, só pode ser decretada quando demonstrado o fumus boni
iuris e o periculum in mora.
Será decretada a requerimento do Ministério Público, por representação da
autoridade policial, ou de ofício pela autoridade judicial, tanto em ação penal pública como
em ação penal privada.
Se o Ministério Público, ao invés de oferecer a denúncia, devolver os autos para
diligências complementares, não poderá ser decretada a preventiva, pois não estão
caracterizados os indícios da autoria – falta o fumus boni iuris.
A apresentação espontânea do acusado não impede a decretação da preventiva.
A decisão que denega o pedido de prisão preventiva comporta recurso em sentido
estrito, conforme art. 581, inc. V, do Código de Processo Penal. A decisão que concede
pedido de prisão preventiva comporta o pedido de habeas corpus.
A prisão preventiva não pode ser decretada nas infrações penais em que o réu se
livra solto.
Pressupostos para decretação da prisão preventiva:
Fumus boni iuris: Prova da materialidade e indícios de autoria.
Periculum in mora:
Garantia da Ordem Pública (GOP): Visa impedir que o agente, solto,
continue a delinqüir ou acautelar o meio social. Maus antecedentes e
reincidência evidenciam provável prática de novos delitos. Também cabível 88
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quando o crime se reveste de grande violência e crueldade.
Conveniência da Instrução Criminal (CIC): Visa impedir que o agente
perturbe ou impeça a produção de provas.
Garantia da Aplicação da Lei Penal (GALP): Há iminente risco de o
acusado fugir, inviabilizando a aplicação da lei penal. Cabível principalmente
nos casos do agente não ter residência fixa ou ocupação lícita.
Garantia da Ordem Econômica (GOE): Foi introduzida pela lei antitruste
(Lei n. 8.884/94), visando coibir graves crimes contra a ordem econômica,
ordem tributária e o sistema financeiro.
Só se admite a decretação da preventiva nos crimes dolosos:
punidos com reclusão;
punidos com detenção, se o acusado for vadio ou de identidade duvidosa;
se o réu foi condenado por outro crime doloso em sentença transitada em
julgado.
Prisão Temporária
A prisão temporária não está prevista no Código de Processo Penal, mas na Lei n.
7.960/89. Suas principais características são:
Somente é decretada durante o inquérito policial.
Nunca pode ser decretada de ofício, somente por requerimento do Ministério
Público ou representação da autoridade policial.
Tem prazo determinado. Esgotado o prazo, o acusado deve ser solto. Em regra,
o prazo é de 5 dias, prorrogáveis por mais 5 em caso de extrema e comprovada
necessidade. Nos crimes hediondos e assemelhados (Lei n. 8.072/90), o prazo é
de 30 dias prorrogáveis. Apesar de ter prazo predeterminado, pode ser revogada
antes disso.
É uma prisão de natureza cautelar, só tem razão de ser quando necessária. Após
esgotado o prazo, o acusado pode continuar preso, se houver a conversão da
prisão temporária em prisão preventiva.89
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O art. 1.º da Lei n. 7.960/89 determina os requisitos necessários para a decretação da
prisão temporária. São eles:
quando imprescindível para as investigações do inquérito policial;
quando o indiciado não tiver residência fixa ou não fornecer elementos
suficientes para sua identificação;
quando houver fundadas razões– provas de o agente ser autor ou ter
participado dos seguintes crimes:
atentado violento ao pudor;
crimes contra o sistema financeiro nacional;
extorsão;
extorsão mediante seqüestro;
estupro;
epidemia com resultado morte;
envenenamento de água potável ou de substância alimentícia ou medicinal,
qualificados por morte;
genocídio;
homicídio doloso;
quadrilha ou bando;
roubo;
rapto violento;
seqüestro ou cárcere privado;
tráfico de drogas.
O rol do art. 1.º, inc. III, da Lei n. 7.960/89 é taxativo, mas não se esgota ali; a Lei
n. 8.072/90 o complementa.
Os requisitos do art. 1.º, incs. I a III, são alternativos ou cumulativos?
Posições:
Uma primeira corrente, sustentada pelos Profs. TOURINHO e MIRABETE, afirma
que os requisitos são alternativos.
Uma segunda, sustentada pelo Prof. SCARANCE, estabelece que os requisitos são
cumulativos e que todos devem estar presentes para que seja decretada a 90
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
temporária. Inviabiliza, na prática, a aplicação da lei..
Uma terceira corrente, sustentada pelo Prof. VICENTE GRECO FILHO, entende
que os requisitos são alternativos, porém, o juiz só poderá decretar a prisão
temporária se presentes os fundamentos da preventiva (GOP, GOE, GALP,
CIC).
Uma quarta, sustentada pelos Profs. DAMÁSIO DE JESUS e MAGALHÃES GOMES
FILHO, sustenta que, como em toda prisão cautelar, devem estar presentes o
fumus boni iuris e o periculum in mora. Na temporária, o periculum in mora é o
requisito do art. 1.º, incs. I ou II, da Lei n. 7.960/89; e o fumus boni iuris é o
requisito do art. 1.º, inc. III, da Lei 7.960/89. O juiz, portanto, no caso concreto,
vai decretar a temporária se estiverem presentes:
o inc. III combinado com o inc. I;
o inc. III combinado com o inc. II.
É a posição dominante e acolhida pela jurisprudência.
MÓDULO XV
DIREITO PROCESSUAL PENAL
1. DA PRISÃO E DA LIBERDADE PROVISÓRIA (TOMO II)
1.1. Prisão por Sentença Condenatória Recorrível (Prisão para Apelar)
O art. 393, inc. I, do Código de Processo Penal dispõe que um dos efeitos da
sentença condenatória recorrível é ser o réu preso ou conservado na prisão, seja no caso de
infrações inafiançáveis, seja nas afiançáveis – enquanto não prestar fiança. O art. 594 do
Código de Processo Penal dispõe que o réu não poderá apelar sem estar recolhido à prisão
ou prestar fiança, salvo se for primário e de bons antecedentes– assim reconhecido na
sentença condenatória– ou condenado por crime de que se livre solto. Em virtude desses
dispositivos, são requisitos da prisão por sentença condenatória recorrível:
Condenação, por sentença condenatória recorrível, a pena privativa de liberdade não
suspensa e não substituída (inexistência de sursis penal ou pena alternativa).
91
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Ser o réu reincidente ou primário de maus antecedentes. Se for primário e de bons
antecedentes poderá apelar em liberdade.
Ser a infração for inafiançável ou, se afiançável, não tiver sido paga.
A prisão por sentença condenatória recorrível não é decretada no caso de infrações
em que o réu se livra solto, em que não é aplicada pena privativa de liberdade ou quando o
máximo da pena privativa de liberdade não exceder a 3 meses (art. 321 CPP).
1.1.1. Regras específicas
A Lei n. 8.072/90 (crimes hediondos), no art. 2.º, § 2.º, e a Lei n. 9.613/98 (lavagem
de capitais), no art. 3.º, determinam que o juiz decidirá, fundamentadamente, se o réu
apelará em liberdade ou não.
A Lei n. 6.368/76 (tóxicos), no art. 35, e a Lei n. 9.034/95 (organizações
criminosas), no art. 9. º, vedam a possibilidade de o réu apelar em liberdade.
Na visão da doutrina, o réu só poderá ser preso por força de sentença condenatória
recorrível quando o encarceramento se mostrar necessário. Isso ocorre quando presentes os
fundamentos da prisão preventiva (fumus boni iuris, que é a sentença condenatória
recorrível; e o periculum in mora, garantia da ordem pública, garantia da ordem
econômica, conveniência da instrução criminal, garantia da aplicação da lei penal).
Deve-se compatibilizar essa prisão com o princípio do estado de inocência. Só os
requisitos do art. 594 do Código de Processo Penal não podem determinar a prisão, pois
seria execução provisória da pena.
Quanto à jurisprudência, há duas posições:
Parte dela aplica o art. 594 do Código de Processo Penal in totum.
Para outra parte, o tratamento depende de como o réu respondeu o processo, se
preso ou solto. Se durante o processo o réu estava solto, não há porquê prendê-lo
para recorrer da sentença. Se estava preso durante o processo, não há razão para
soltá-lo;ele permanecerá preso, ainda que primário e com bons antecedentes.
1.2. Prisão por Pronúncia
O art. 408 do Código de Processo Penal dispõe que o juiz, se convencido da 92
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
existência do crime e de indícios de que o réu seja o seu autor, deverá pronunciá-lo,
indicando os motivos do seu convencimento. Conforme o § 1.º, a sentença de pronúncia
indicará o dispositivo legal em cuja sanção for julgado incurso o réu, e o recomendará na
prisão em que se achar, ou expedirá ordem para sua captura. Dispõe o § 2.º que, se o réu
for primário e de bons antecedentes, poderá o juiz deixar de decretar-lhe a prisão ou
revogá-la, caso já se encontre preso.
Em virtude desses dispositivos, são pressupostos para que o réu seja preso por
sentença de pronúncia:
réu pronunciado;
réu reincidente, ou primário com maus antecedentes;
ser o crime inafiançável ou, se afiançável, o réu não ter pago fiança (nos
crimes dolosos contra a vida, são afiançáveis o infanticídio, art. 123 do CP, e o
aborto provocado pela gestante ou com seu consentimento, art. 124 do CP);
a prisão ser necessária para não violar o princípio da presunção de inocência.
Para a doutrina, são necessários os requisitos da prisão preventiva. Para a
jurisprudência, se permaneceu solto durante o processo, continuará em liberdade.
Se já estava preso durante o processo, permanecerá preso, ainda que primário e
com bons antecedentes.
1.3. Liberdade Provisória
Aplica-se a liberdade provisória para a prisão em flagrante (salvo se houver
irregularidade ou nulidade que enseje o relaxamento da prisão em flagrante), para a prisão
por pronúncia (art. 408, § 2.º, do CPP) e para a prisão para apelar (sentença condenatória
recorrível, art. 594 do CPP). Para a prisão preventiva e para a temporária, pede-se a
revogação da prisão.
A liberdade provisória é uma contra-cautela que vigora até o trânsito em julgado da
decisão final, quando haverá a execução da pena, aplicada no caso de condenação, ou a
liberdade definitiva, no caso de absolvição.
A Liberdade Provisória é obrigatória nas infrações penais em que o réu se livra
solto– as apenadas exclusivamente com multa e as apenadas com pena privativa de
liberdade que não exceda 3 (três) meses (art. 321, incs. I e II, do CPP).93
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
A Liberdade Provisória é permitida nas infrações em que há o pagamento de fiança.
De acordo com o art. 322 do Código de Processo Penal, são afiançáveis as infrações
punidas com detenção ou prisão simples (fiança concedida pelo juiz ou pela autoridade
policial) ou punidas com reclusão cuja pena não exceda 2 (dois) anos (fiança concedida
somente pela autoridade judicial e fundamentadamente).
A Súmula n. 81 do Superior Tribunal de Justiça dispõe que, em caso de concurso
material, para se determinar a afiançabilidade ou não no caso concreto, as penas devem ser
somadas.
Até 1977, obtinha-se a liberdade provisória somente mediante o pagamento de
fiança. Em 1977, a Lei n. 6.416 acrescentou um parágrafo único ao art. 310 do Código de
Processo Penal, criando-se a possibilidade da obtenção da liberdade provisória sem fiança,
sempre que estiverem ausentes os motivos da prisão preventiva, até mesmo nos crimes
inafiançáveis.
São inafiançáveis conforme os arts. 323 e 324 do Código de Processo Penal:
crimes punidos com reclusão, em que a pena mínima for superior a dois anos;
contravenções de mendicância e vadiagem;
crimes dolosos punidos com pena privativa de liberdade, se o réu for reincidente;
crimes punidos com reclusão e que provoquem clamor público, ou que tenham sido
cometidos com violência contra a pessoa, ou que envolvam grave ameaça;
quebra de fiança anteriormente concedida, ou infringência de obrigação imposta;
prisão por mandado do juiz cível – disciplinar, administrativa ou militar;
o réu estiver no gozo de suspensão condicional da pena ou de livramento
condicional;
quando presentes os motivos que autorizam a preventiva.
Nesses casos, o juiz deverá fazer o seguinte raciocínio: se o réu estivesse solto,
haveria motivos para ser decretada a prisão preventiva?
Se houver motivos, não se concede a liberdade provisória.
Se não houver motivos, concede-se a liberdade provisória.
A liberdade provisória independente de fiança criou, na prática, uma situação
injusta. Se não é o caso de prisão preventiva e o delito é afiançável, a liberdade provisória 94
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
somente poderá ser concedida mediante o recolhimento de fiança. Se o delito é
inafiançável, a liberdade provisória poderá ser concedida sem qualquer pagamento. Ex.: o
juiz recebe um processo de furto simples, cuja pena é de 1 (um) a 4 (quatro) anos e que
admite a fiança. Arbitrada e paga a fiança, é concedida a liberdade provisória. Em outro
processo de roubo simples, com a pena de 4 (quatro) a 10 (dez) anos de reclusão – em pena
mínima superior a 2 (dois) anos não cabe fiança –, conclui o juiz que, se o réu estivesse
solto, não seria o caso de decretação da prisão preventiva e, então, concede também a
liberdade provisória. Percebe-se uma injustiça da lei: no crime menos grave há o
pagamento de fiança; no mais grave, não. Na prática, por razões de política criminal, o
juiz, verificando o preenchimento dos requisitos, concede a liberdade provisória
independente do pagamento de fiança em ambos os processos.
A Lei n. 8.035/90 determinou que, nos crimes contra a economia popular e de
sonegação fiscal, a liberdade provisória somente será concedida mediante recolhimento de
fiança.
A liberdade provisória é vedada:
nos crimes hediondos e assemelhados, salvo em caso de tortura que, apesar
de inafiançável, admite a liberdade provisória;
no art. 7.º da Lei n. 9.034/95, que trata das organizações criminosas;
no art. 3.º da Lei n. 9.613/98, que trata da lavagem de bens e capitais.
P.: A vedação da liberdade provisória é inconstitucional?
R.: Não, pois a Constituição prevê que “ninguém será levado à prisão ou nela
mantido quando a lei admitir a liberdade provisória com ou sem o pagamento de fiança”,
logo, nos casos em que a lei não admita a liberdade provisória, pode-se vedá-la.
1.4. Fiança
Fiança é a caução destinada a garantir o cumprimento das obrigações processuais
por parte do réu. Sua natureza jurídica é a de caução. Pode ser prestada pelo acusado ou
por terceiro em seu favor, nas modalidades de depósito ou hipoteca.
São infrações inafiançáveis, além das previstas nos arts. 323 e 324 do Código de
Processo Penal:95
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
o crime de racismo, o crime hediondo, prática de tortura, tráfico ilícito de
entorpecentes, terrorismo e a ação de grupos armados civis e militares contra a
ordem constitucional e o estado democrático de direito;
a contravenção de aposta em corrida de cavalo fora do hipódromo (art. 9.º, §
2.º, da Lei n. 7.291/84);
os crimes contra o sistema financeiro, se estiver configurada situação que
autorize a prisão preventiva (art. 31 da Lei n. 7.492/86);
os crimes contra a fauna (art. 34 da Lei n. 5.197/67).
A autoridade policial pode arbitrar a fiança nas infrações punidas com detenção e
prisão simples; nos demais casos, compete ao juiz (art. 322, do CPP).
1.4.1. Obrigações do réu sob pena de quebramento da fiança
Comparecimento a todos os atos processuais a que for intimado.
Obrigação de comunicar ao Juízo qualquer mudança de endereço.
Não se ausentar da Comarca por mais de 8 dias sem autorização do juiz.
A fiança é cabível desde o inquérito policial até o trânsito em julgado da sentença.
Consistirá no depósito de bens, valores, pedras preciosas, títulos da dívida pública
ou na hipoteca de imóvel.
1.4.2. Valor da fiança
O valor da fiança será fixado pela autoridade, conforme o disposto no art. 325 do
Código de Processo Penal (questão do concurso n. 172 da magistratura!). Será de 1 (um) a
5 (cinco) salários mínimos quando a pena privativa de liberdade for de até 2 (dois) anos; de
5 (cinco) a 20 (vinte) salários mínimos quando a pena privativa de liberdade for de, no
máximo, 4 (quatro) anos; de 20 (vinte) a 100 (cem) salários mínimos quando a pena
privativa de liberdade for superior a 4 (quatro) anos.
Conforme a situação econômica do réu, o valor da fiança pode ser reduzido até o
máximo de dois terços ou aumentada até o décuplo (art. 325, § 1.º, incs. I e II, do CPP).
Para determinar o valor da fiança, será levado em consideração:
natureza da infração;96
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
condições pessoais de fortuna e vida pregressa do acusado;
circunstâncias indicativas da periculosidade do agente;
importância provável das custas do processo até o final do julgamento.
1.4.3. Reforço da fiança
Poderá ser necessário o reforço da fiança, nos casos previstos pelo art. 340 do
Código de Processo Penal; não sendo reforçada, a fiança ficará sem efeito e o réu será
recolhido à prisão. Será exigido o reforço quando:
por engano, for tomada a fiança em valor insuficiente;
houver inovação na classificação do delito;
houver depreciação do objeto da fiança.
Se o juiz verificar que é impossível ao réu prestar fiança, por motivo de pobreza,
poderá conceder-lhe a liberdade provisória, sujeitando-o ao cumprimento das obrigações,
que, se não cumpridas, acarretarão a revogação do benefício, conforme o art. 350 do
Código de Processo Penal. Esse dispositivo é anterior ao surgimento da possibilidade da
liberdade provisória sem fiança.
As atenuantes e as agravantes não são levadas em conta para a fixação da fiança,
pois não alteram o mínimo e o máximo da pena.
1.4.4. Cassação da fiança
A fiança será cassada quando se verificar, posteriormente, que não era cabível. Se a
fiança foi concedia por autoridade policial, compete a juiz cassá-la; se foi concedida por
juiz, será cassada por tribunal mediante recurso da acusação.
1.4.5. Quebra da fiança
Haverá quebra da fiança nos seguintes casos:
quando o réu descumprir suas obrigações processuais;
quando o réu estiver, mediante fiança, no gozo da liberdade provisória e
praticar nova infração penal.
São conseqüências do quebramento da fiança:97
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
perda da metade do valor da fiança;
obrigação de recolher-se à prisão;
impossibilidade de concessão de nova fiança no mesmo processo.
Quando o réu deixar de recolher-se à prisão, sendo isso necessário, perderá todo o
valor depositado a título de fiança.
O recurso adequado para as decisões sobre fiança será o recurso em sentido estrito
(art. 581, incs. V e VII), decisão que concede, cassa, julga inidônea, decreta o seu
quebramento, nega, arbitra e declara perdido o seu valor.
O Ministério Público não precisa ser ouvido para concessão de fiança; deverá,
contudo, ser intimado da decisão, para interpor recurso se achar necessário.
Se o réu não for condenado, o valor da fiança lhe será restituído, deduzido eventual
montante declarado perdido.
Se o réu for condenado, o valor da fiança será destinado ao pagamento das custas
processuais (no Estado de São Paulo não há custas processuais no processo penal), ao
pagamento de multa criminal e ainda pode ser revertido no pagamento de indenização civil
ex delicto.
Nas infrações penais de competência do Juizado Especial Criminal, não se imporá
prisão em flagrante nem se exigirá fiança, se o autor do fato for imediatamente
encaminhado ao Juizado ou assumir o compromisso de a ele comparecer (art. 69, par. ún.,
da Lei n. 9.099/95).
MÓDULO XVI
DIREITO PROCESSUAL PENAL
1. CITAÇÃO
1.1. Conceito
A citação é o ato processual por meio do qual é oferecido ao acusado conhecimento
oficial acerca do teor da acusação, abrindo-se oportunidade para que ele produza sua
defesa, triangularizando-se, assim, a relação jurídico-processual. Até o momento anterior à
citação, a relação era angular (autor e juiz).
98
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
É determinada pelo juiz e cumprida pelo Oficial de Justiça.
A falta de citação no processo penal causa nulidade absoluta do processo (art. 564,
III e IV, do CPP), pois contraria os princípios constitucionais do contraditório e da ampla
defesa. Exceção: o art. 570 do Código de Processo Penal dispõe que se o réu comparece
em juízo antes de consumado o ato, ainda que para argüir a ausência de citação, sana a sua
falta ou a nulidade. Nesse caso, o juiz ordenará a suspensão ou o adiamento do ato.
O Código de Processo Penal tratou da citação em um título próprio, compreendendo
os arts. 351 ao 372.
A citação pode ser de duas espécies:
citação pessoal;
citação ficta (por edital).
No processo penal não há citação ficta por hora certa. A citação ficta é somente a
editalícia.
1.2. Diferença entre Citação, Intimação e Notificação
Citação é o ato processual por meio do qual se chama a juízo o réu para comparecer
e defender-se.
Intimação, segundo o Prof. Mirabete, é a ciência dada à parte, no processo, da
prática de um ato, despacho ou sentença.
Notificação é a convocação para o comparecimento ou a prática de ato futuro.
O Código de Processo Penal não diferencia intimação e notificação, referindo-se a
uma quando deveria aludir a outra.
1.3. Quem Deve Ser Citado
Somente o acusado pode ser citado, ainda que seja menor de 21 anos ou
mentalmente enfermo, a citação não poderá ser feita na pessoa do representante legal.
Exceção: se já houver sido instaurado incidente de insanidade mental e a perturbação for
conhecida do juízo, a citação se fará na pessoa do curador do acusado.
Se a perturbação mental ainda não for conhecida do juízo, mas o Oficial de Justiça a
constata por ser aparente, deverá certificar a ocorrência no verso do mandado, a fim de que
o juiz possa determinar a instauração do incidente de insanidade mental.
As pessoas jurídicas deverão ser citadas na pessoa de seu representante legal.99
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
1.4. Conseqüências do Não-atendimento à Citação
O réu regularmente citado, pessoalmente ou por edital, mas com defensor
constituído que não comparece, permanecendo inerte ao chamado, pratica a “contumácia”,
ausência injustificada.
O efeito da contumácia é a revelia. O processo prosseguirá sem a presença do
acusado que, citado ou intimado, deixou de comparecer ou, no caso de mudança de
endereço, não comunicou o novo endereço ao juízo (art. 367 do CPP).
Em virtude do princípio da verdade real, sobre ele não recairá a presunção de
veracidade quanto aos fatos que lhe forem imputados. O réu poderá retornar ao processo a
qualquer momento, independente da fase em que esteja.
1.5. Efeitos da Citação Válida
No processo penal, o único efeito da citação válida é o de completar a relação
jurídica processual. Com ela se instaura o processo e passam a vigorar todos os direitos,
deveres, ônus e princípios que regem o processo penal.
A citação válida no processo penal não torna prevento o juízo, não interrompe a
prescrição e não induz à litispendência.
1.6. Citação Real ou Pessoal (espécies e comentários)
1.6.1. Citação pessoal
A citação pessoal é aquela realizada na própria pessoa do réu por meio de mandado
citatório, carta precatória, carta rogatória, carta de ordem e requisição. Há a certeza da
realização da citação.
A citação por mandado (prevista nos arts. 352 ao 357 do CPP) é cumprida por
Oficial de Justiça. Destina-se à citação do réu em local certo e sabido dentro do território
do juiz processante. O mandado de citação indicará o nome do juiz, do qual emanou a
ordem; o nome do réu ou querelante; sua residência, se for conhecida; o fim para que é
feita a citação; o juízo; o lugar, o dia e a hora em que o réu deverá comparecer; a
subscrição do escrivão e a rubrica do juiz.100
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
O Oficial de Justiça deverá ler ao citando o mandado e entregar-lhe a contrafé, na
qual são mencionados dia e hora da citação, ato que o Oficial deverá declarar na certidão,
bem como a aceitação ou recusa do réu.
A citação pode ser realizada em qualquer tempo, dia e hora, inclusive domingos e
feriados, durante o dia ou à noite. Não se deve, todavia, proceder à citação: de doente,
enquanto grave o seu estado; de noivos, nos três primeiros dias de bodas; de quem estiver
assistindo ato de culto religioso; de cônjuge ou outro parente de morto (consangüíneo ou
afim, em linha reta ou colateral, em segundo grau) no dia do falecimento e nos sete dias
seguintes.
Entre a citação e o interrogatório deve haver um prazo mínimo de 24 horas.
1.6.2. Citação por requisição
A citação por requisição é destinada à citação do militar e do preso. É feita mediante
ofício requisitório expedido pelo juiz ao comandante (chefe de serviço), no caso da citação
do militar, ou ao diretor do estabelecimento prisional, no caso do preso, requisitando sua
apresentação em juízo, no dia e hora designados, cabendo a esses e não ao Oficial de
Justiça a citação.
A requisição deve conter os mesmos requisitos do mandado de citação.
Se o militar ou o preso se encontrar em outra comarca, o juiz processante expedirá
carta precatória, cabendo ao juiz deprecado a expedição do ofício requisitório. Conforme a
Súmula n. 351 do Supremo Tribunal Federal, se o réu estiver preso na mesma Unidade da
Federação do juiz processante, será nula sua citação por edital, sendo válida, portanto, a
citação por edital do réu preso em outra Unidade da Federação diversa daquela do juiz
processante.
1.6.3. Citação por carta precatória
A citação por precatória destina-se à citação do réu que está em lugar certo e sabido,
porém fora da jurisdição do juiz processante (art. 353 do CPP). A precatória indicará o juiz
deprecante e o deprecado, suas respectivas sedes, o fim da citação e o juízo do lugar, dia e
hora em que o réu deverá comparecer.
A principal característica da citação por precatória no processo penal é o seu caráter 101
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
itinerante (art. 355, § 1.º, do CPP). Se o juiz deprecado verificar que o réu se encontra em
território sujeito à jurisdição de um terceiro juiz, a este remeterá os autos para a efetivação
da citação, desde que haja tempo.
1.6.4. Citação por carta rogatória
A citação por carta rogatória destina-se à citação do réu que se encontra em lugar
certo e sabido, mas no estrangeiro ou em legações estrangeiras (embaixadas).
Anteriormente, o réu que estava no estrangeiro era citado por edital. Hoje, com a Lei
n. 9.271/96, a citação é pessoal, através de rogatória. Exceção: se o Estado estrangeiro se
recusar a cumprir a rogatória do Brasil, o réu será citado por edital. Nesse caso, considera-
se que ele está em local inacessível (art. 363, I, do CPP).
Como o trâmite da rogatória é demorado, o Código de Processo Penal autoriza a
suspensão do processo e do curso do prazo prescricional até a efetivação da citação (art.
368 do CPP).
1.6.5. Citação por carta de ordem
A citação por carta de ordem tem disciplina idêntica à da citação por precatória. É
expedida por um órgão superior para ser cumprida por órgão inferior. Em geral são
determinadas pelos tribunais nos processos de sua competência originária. Ex.: o TJ pede
para o juiz de primeira instância cumprir um mandado citatório de um réu residente em sua
comarca e que goze de prerrogativa de foro.
1.6.6. Citação do funcionário público
O funcionário público será citado por mandado (atenção: somente são citados por
requisição o preso e o militar), mas é necessária a expedição de um ofício ao chefe da
repartição onde o citando trabalha, notificando-o do dia, hora e lugar em que o funcionário
deverá comparecer (art. 359 do CPP). Visa possibilitar a continuidade do serviço público,
providenciando-se a substituição do funcionário. A falta da expedição desse ofício não
invalida a citação. Se o citando for magistrado, deverá ser comunicado ao Presidente do
Tribunal de Justiça; se for membro do Ministério Público, deverá ser comunicado ao 102
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
Procurador-Geral de Justiça.
1.7. Citação por Edital ou Ficta e a Lei n. 9.271/96
A citação por edital é medida excepcional, só sendo utilizada quando frustradas as
possibilidades de citação pessoal, por ser impossível localizar o réu (art. 361 do CPP).
Será feita a citação por edital nos seguintes casos:
quando réu está em lugar incerto e não sabido (“LINS”), o prazo será de 15 dias;
quando for incerta a pessoa do réu a ser citada, o prazo será de 30 dias (art. 363,
inc. II, do CPP);
quando o réu estiver se ocultando para não ser citado, o prazo será de 5 dias (art.
362 do CPP);
quando o réu estiver em lugar inacessível, em virtude de epidemia, de guerra ou
por outro motivo de força maior, o prazo será de 15 a 90 dias (art. 363, inc. I, do
CPP).
O edital será afixado na porta do juízo e será publicado na imprensa, onde houver.
A Lei n. 9.271/96 trouxe grandes inovações para a citação editalícia. Anteriormente,
se o réu citado por edital não comparecesse nem constituísse advogado, o processo tinha
prosseguimento normal. Muitas vezes, o réu nem tomava conhecimento de que fora
processado e condenado à revelia. A lei alterou o art. 366 do Código de Processo Penal e
determinou que se o réu citado por edital não comparecer nem constituir advogado, o
processo ficará suspenso e também será suspenso o prazo prescricional (atenção: se o réu
foi citado pessoalmente e não comparecer nem constituir advogado, será decretada sua
revelia).
O juiz, mesmo aplicando o art. 366 do Código de Processo Penal, se presente os
motivos, poderá decretar a prisão preventiva do acusado. Poderá também determinar a
produção das provas consideradas urgentes. Se o fizer, nomeará um defensor dativo.
O processo e o prazo prescricional ficarão suspensos por prazo indeterminado até
que o réu seja encontrado. Como a Lei n. 9.271/96 não estabeleceu um limite máximo para
a suspensão do prazo prescricional, poderia ser criado no caso concreto um crime
imprescritível. Somente a CF pode, no entanto, prever crimes imprescritíveis (que são o
racismo e a ação de grupos armados civis ou militares contra o Estado Democrático de 103
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
Direito e a Ordem Constitucional – art. 5.º, incs. XLII e XLIV).
Para compatibilizar a Lei n. 9.271/96 com a Constituição Federal, a doutrina
concluiu que o juiz deverá, nos processos em que aplicar o art. 366 do Código de Processo
Penal, estabelecer um prazo máximo para a suspensão da prescrição, que deverá
corresponder ao prazo da prescrição da pretensão punitiva em abstrato, conforme a tabela
do art. 109 do Código Penal. Essa posição é a predominante na jurisprudência e tem como
um de seus expoentes o Prof. Damásio de Jesus.
Essa regra do art. 366 do Código de Processo Penal é híbrida, isto é, tem
dispositivos de direito processual (quando trata da suspensão do processo) e dispositivos de
direito penal (quando trata da suspensão do prazo prescricional). Em normas híbridas, a
parte que trata de direito material comanda a retroatividade ou não da norma, pois afeta o
direito do Estado de punir. Nesse caso, como a norma estabelece uma situação pior para o
réu, ela não se aplica aos processos existentes antes de sua publicação, pela proibição da
reformatio in pejus.
Da decisão que aplica o art. 366 do Código de Processo Penal cabe recurso em
sentido estrito por analogia ao art. 581, inc. XVI, do Código de Processo Penal. Há
acórdãos entendendo que interposta a apelação, essa poderá ser recebida em razão do
princípio da fungibilidade.
1.8. Intimação
Intimação é o conhecimento dado à parte de um ato já praticado no processo.
Conforme o art. 370 do Código de Processo Penal, nas intimações dos acusados,
testemunhas e demais pessoas que devam tomar conhecimento de qualquer ato, serão
observadas as regras previstas para as citações. A intimação também pode ser feita pelo
escrivão – o que não é permitido nas citações – por despacho em petição que servirá de
mandado, por termos nos autos, pela publicação no órgão oficial e pelo correio.
As intimações judiciais são duplas, ou seja, é necessária a citação do réu e de seu
defensor dativo ou constituído, permitindo-se a intimação dos advogados pela imprensa
oficial.
A intimação do defensor nomeado, do réu, das testemunhas e do Ministério Público
será pessoal (art. 370, § 4.º, do CPP). 104
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
As intimações poderão ser realizadas no curso das férias forenses, pois os prazos
correm da data da intimação. Conforme a Súmula n. 310 do Supremo Tribunal Federal,
quando a intimação tiver lugar na sexta-feira ou a publicação com efeito de intimação for
feita nesse dia, o prazo judicial terá início na segunda-feira imediata, salvo se não houver
expediente, caso em que começará no primeiro dia útil que se seguir.
MÓDULO XVII
DIREITO PROCESSUAL PENAL
1. SENTENÇA
Conceito
Sentença em sentido estrito é a decisão que julga o mérito da causa.
1.2. Classificação das Decisões em Processo Penal
As decisões em processo penal classificam-se em:
a) Despachos: são os atos judiciais sem carga decisória, incapazes de trazer
prejuízo às partes e que determinam a marcha do processo. Os despachos, em
regra, são irrecorríveis; excepcionalmente admite-se correição parcial ou mesmo
habeas corpus.
b) Decisões interlocutórias:
simples: resolvem questões incidentes no processo sem ingressar no mérito da
causa, como, por exemplo, concessão de liberdade provisória e relaxamento da
prisão em flagrante. As decisões interlocutórias simples são, via de regra,
irrecorríveis; porém, se houver previsão no art. 581 do Código de Processo
Penal, caberá recurso em sentido estrito.
mistas:
- não-terminativas: encerram uma fase, uma etapa processual, sem pôr fim ao
processo. Ex.: decisão de pronúncia.
- terminativas: encerram o processo sem julgamento do mérito. Ex.: decisão
de impronúncia.105
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
As decisões interlocutórias mistas (assim como as sentenças terminativas de mérito)
são recorríveis. É cabível o recurso em sentido estrito se estiver previsto no rol do art. 581
do Código de Processo Penal, ou apelação, caso prevista no art. 593 do Código de Processo
Penal.
c) Sentenças:
terminativa de mérito: é a decisão que julga o mérito sem condenar ou absolver
o réu, como, por exemplo, extinção da punibilidade. É recorrível via recurso em
sentido estrito, ou apelação;
absolutória:
- própria: julga improcedente a pretensão punitiva e não impõe qualquer
sanção penal;
- imprópria: proferida para o réu inimputável, não acolhe a pretensão
punitiva, mas reconhece o cometimento da infração penal e impõe medida
de segurança (art. 386, par. ún., inc. III).
O juiz, ao absolver o réu, deverá mencionar na parte dispositiva a causa,
reconhecendo (art. 386 do CPP):
- a inexistência do fato;
- a ausência de prova da existência do fato;
- o fato não constituir infração penal (ser atípico);
- não haver prova do réu ter concorrido para a infração penal;
- existir circunstância que exclua o crime ou isente o réu de pena;
- não existir prova suficiente para a condenação.
condenatória: julga procedente no todo, ou em parte, a pretensão punitiva.
As sentenças absolutórias e as condenatórias são apeláveis. Exceção ao recurso
cabível contra a absolvição sumária do Tribunal do Júri é o em sentido estrito.
Quanto ao sujeito, as sentenças podem ser:
subjetivamente simples: sentença proferida por órgão monocrático, juiz de
primeiro grau;
subjetivamente plúrima: sentença proferida por órgão colegiado homogêneo, 106
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
tribunais;
subjetivamente complexa: sentença proferida por mais de um órgão, como o
Tribunal do Júri, que decide o crime e a autoria, e o juiz, que decide a pena a ser
aplicada.
Chama-se sentença suicida aquela cuja fundamentação conflita com o dispositivo.
1.3. Requisitos da Sentença
a) Requisitos intrínsecos:
relatório: deve conter o nome e a qualificação das partes, a exposição sucinta da
acusação e da defesa e o resumo dos atos incidentes processuais. É a maneira de
se comprovar que o juiz examinou o processo e tem conhecimento de seu
conteúdo. O relatório é imprescindível, pois assegura o contraditório. Sua falta
acarreta a nulidade absoluta da sentença. A exceção encontra-se na Lei n.
9.099/95, que admite sentença proferida sem relatório.
fundamentação: é uma obrigação constitucional a fundamentação das decisões
(art. 93, inc. IX, da CF). A fundamentação da sentença relaciona-se com o
princípio da apreciação da prova (livre convencimento motivado, ou a persuasão
racional do juiz). A fundamentação garante a atuação equilibrada e imparcial do
juiz, controla a legalidade das decisões e garante que os argumentos da partes
foram examinados. A sentença sem fundamentação é nula, salvo a do Tribunal
do Júri – o veredicto é absolutamente sigiloso não podendo ser fundamentado.
Fundamentação per relatione ocorre quando o julgador, em sua decisão, adota como
razões de decidir a fundamentação utilizada em manifestação anterior no processo. Ex.:
quando o Tribunal adota a fundamentação do juiz de primeiro grau. Alguns doutrinadores
criticam essa possibilidade, afirmando que nesse caso é como se não houvesse
fundamentação. O Supremo Tribunal Federal e a jurisprudência, no entanto, aceitam essa
prática. O julgador pode utilizar as razões do Ministério Público se este atuou como custos
legis.
107
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
dispositivo: contém a substância da sentença, o julgamento da pretensão
punitiva. Extrai-se do dispositivo os limites objetivos da coisa julgada.
A pretensão punitiva pode ser julgada procedente no todo ou em parte
(condenatória), ou improcedente (absolutória). Mesmo a pretensão punitiva sendo julgada
improcedente, muitas vezes verifica-se o interesse recursal, como no caso da absolvição
imprópria em que se impõe medida de segurança ou no caso da absolvição própria para
evitar uma ação civil ex delicto (quando não fundamentada nos incs. I, IV e V do art. 386
do CPP).
A sentença sem dispositivo é inexistente. Também é inexistente a sentença
elaborada por juiz sem jurisdição (em férias, licenciado, afastado, aposentado).
b) Requisitos extrínsecos: são a publicação e a intimação da sentença.
A publicação da sentença é uma formalidade de suma importância; enquanto não for
publicada, a sentença não pode ser considerada como um ato processual. A publicação da
sentença ocorre:
com a entrega da sentença ao escrivão do cartório;
quando proferida em audiência como no Tribunal do Júri, no momento de sua
leitura.
A sentença penal tem o efeito de interromper a prescrição, o que ocorre na data da
sua publicação.
Após a publicação da sentença, segue-se a intimação das partes.
A intimação do Ministério Público e do defensor dativo é pessoal.
A intimação do querelante e do assistente de acusação é feita pessoalmente ou na
pessoa do advogado. Se nenhum deles for encontrado no lugar da sede do Juízo, a
intimação acontecerá por edital com prazo de 10 dias (art. 391 do CPP).
A intimação da sentença deverá ser feita pessoalmente ao réu e seu defensor. Se não
forem encontrados, serão intimados por edital.
A regra trazida no art. 370, §§ 1.º e 2.º, do Código de Processo Penal (intimação do
defensor constituído pela imprensa) não é verificada para a sentença, que possui disposição 108
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
específica no art. 392 do Código de Processo Penal.
A fluência do prazo recursal se inicia a partir da última intimação (do réu ou de seu
defensor), ou, se por carta precatória, da juntada da carta cumprida aos autos. O prazo do
edital será de 90 dias se a pena privativa de liberdade imposta for igual ou superior a um
ano, e de 60 dias nos demais casos. O prazo da apelação correrá após o término do prazo
fixado no edital.
1.4. Princípio da Correlação
Exige que, entre a sentença e o pedido, haja uma correlação, não admitindo decisões
de modo diverso, além ou aquém (extra, ultra ou citra petita) do que consta na denúncia
ou queixa.
Trata-se de uma garantia fundamental da defesa, que oferece resistência àquilo que
foi descrito na peça inicial.
Tal princípio decorre da inércia da jurisdição, que limita o julgador aos termos da
provocação. Se desbordar essa restrição, o juiz estará violando a imparcialidade.
1.5. Emendatio Libelli e Mutatio Libelli
A emendatio libelli, prevista no art. 383 do Código de Processo Penal, ocorre
quando a denúncia ou a queixa descreve perfeitamente o fato concreto de determinado
crime, mas dá a ele classificação jurídica diversa. Ex.: a denúncia narra um furto mas
classifica o delito como roubo. O juiz, então, na sentença, pode “emendar” a denúncia ou
queixa, dando ao fato definição jurídica diversa da que consta na exordial, mesmo que, em
conseqüência, tenha de aplicar pena mais grave. Não ofende a ampla defesa do réu, que se
defende dos fatos e não da classificação jurídica do delito.
A mutatio libelli, art. 384 do Código de Processo Penal, ocorre quando o juiz, na
sentença, reconhece a possibilidade de dar ao fato descrito na inicial nova caracterização –
não se trata de classificação jurídica diversa, mas sim de modificação (mutatio) dos fatos
narrados na acusação, em virtude de:
provas produzidas nos autos;
circunstância elementar não contida explícita ou implicitamente na denúncia ou
na queixa ( exs.: qualificadoras, causas de aumento e diminuição, agravantes e 109
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
atenuantes).
A nova classificação do fato pode ensejar uma pena menor, igual ou maior que a
anteriormente prevista.
Se a pena for menor ou idêntica à anterior deve-se observar o disposto no art. 384,
caput, do Código de Processo Penal. O juiz deve baixar os autos para a manifestação da
defesa, que no prazo de 8 dias deverá produzir provas, podendo arrolar até 3 testemunhas.
Se a pena for maior que a anterior, deve ser observado o art. 384, par. ún., do
Código de Processo Penal. O juiz deve baixar os autos para o Ministério Público aditar a
denúncia no prazo de 3 dias (usa-se por analogia o prazo do art. 46, § 2.º, do CPP). Em
seguida, abre-se o prazo de 3 dias para a defesa se manifestar, arrolar até 3 testemunhas, e
requerer a produção de provas.
No art. 384, caput, do Código de Processo Penal, o prazo da defesa é maior porque
impõe a produção da prova; no parágrafo único, o prazo é menor porque serve apenas para
a parte requerer a produção das provas.
1.5.1. Observações sobre a mutatio libelli
Se o promotor perceber que é caso de aditamento, pode aditar a qualquer
momento, não precisando esperar o juiz se manifestar na sentença.
O juiz, ao baixar os autos para o Ministério Público aditar a denúncia e a defesa
se manifestar, deve ser cauteloso para não antecipar o julgamento. Ex.: não pode
afirmar “não foi furto, foi roubo”. O juiz também não pode ser lacônico a ponto
de não indicar às partes a razão pela qual aplica o art. 384, par. ún., do Código
de Processo Penal, devendo, por exemplo, dizer: “... baixem-se os autos nos
termos do art. 384, par. ún., do CPP, em virtude das declarações prestadas a
fls...”
Se o Ministério Público recusa-se a aditar a denúncia, deve ser usado por
analogia o art. 28 do Código de Processo Penal (que determina a remessa dos
autos ao Procurador-Geral).
P.: O art. 384, par. ún., do Código de Processo Penal aplica-se também à ação penal 110
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
privada?
R.: O art. 384, caput, do Código de Processo Penal é aplicável à ação penal privada.
O parágrafo único do Código de Processo Penal aplica-se à queixa na ação penal privada
subsidiária da pública; quanto à ação penal privada propriamente dita, a doutrina diverge:
- Sim, aplica-se por analogia, já que o processo penal permite a
utilização da analogia (Prof. Tourinho).
- Não, não se aplica porque a lei exclui essa possibilidade. Não foi
esquecimento do legislador, foi omissão proposital. Se fosse possível a
aplicação do parágrafo único do art. 384 do Código de Processo Penal à ação
penal privada, estar-se-ia admitindo a possibilidade de o juiz obrigar o
querelante a aditar a queixa, ampliando a acusação, o que seria incompatível
com o princípio da disponibilidade da ação penal privada. O juiz não pode
obrigar o ofendido a iniciar a ação, nem a aditar a queixa. O querelante, por
iniciativa própria, pode fazê-lo, mas não pela aplicação do art. 384, par. ún., do
Código de Processo Penal.
Se durante a instrução descobre-se que o autor praticou outros crimes, além do
descrito no processo, ou que mais pessoas concorreram para a prática do delito, não se
aplica o art. 384 do Código de Processo Penal; será preciso nova acusação, que pode ser
feita:
- com o oferecimento de nova denúncia;
- com o aditamento da denúncia, realizando-se nova citação,
interrogatório, defesa prévia, audiência de instrução, diligências, alegações
finais e sentença.
1.5.2. Súmulas
Súmula n. 453 do Supremo Tribunal Federal: proíbe a aplicação do art. 384,
caput, e parágrafo único do Código de Processo Penal, em segunda instância.
Visa garantir o duplo grau de jurisdição. Se o Tribunal reconhecesse e
condenasse pelo outro delito, estaria suprimindo o primeiro grau de jurisdição.
Súmula n. 160 do Supremo Tribunal Federal: o Tribunal não pode reconhecer 111
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
de ofício, em prejuízo da defesa, nulidade não argüida no recurso da acusação,
mesmo que seja nulidade absoluta. Ex.: processa-se por furto e, durante a
instrução, apura-se que o delito cometido foi roubo. O Tribunal percebe que era
caso da aplicação do art. 384 do Código de Processo Penal, mas, como ninguém
argüiu:
não pode manter a condenação por furto;
não pode condenar por roubo, pois violaria o princípio da correlação;
não pode aplicar o art. 384 do Código de Processo Penal, pois violaria o duplo
grau de jurisdição;
não pode anular a sentença porque não pode reconhecer de ofício nulidade
prejudicial à defesa que não foi argüida pela acusação.
O Tribunal, então, deverá absolver o réu, instaurando-se novo processo para o crime
de roubo, se esse ainda não prescreveu.
Se, por exemplo, o réu foi processado por dano simples (ação penal privada) e
durante a instrução verifica-se que o bem não era particular, e sim público o dano torna-se
qualificado e a ação penal pública incondicionada. Pela modificação da natureza da ação
penal, o processo não deveria ter sido instaurado por queixa, mas sim por denúncia. A
solução é anular a ação penal desde o início pela ilegitimidade ad causae.
1.6. Efeitos da Sentença
Os efeitos da sentença variam conforme sua natureza.
1.6.1. Sentença absolutória (art. 386, par. ún., do CPP)
Será o réu posto em liberdade, se for o caso.
As penas acessórias provisoriamente aplicadas serão cessadas.
Se cabível, será aplicada medida de segurança.
1.6.2. Sentença condenatória (art. 393 do CPP)
Ser o réu preso ou conservado na prisão nas infrações inafiançáveis, ou nas
afiançáveis enquanto não prestar fiança.112
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
Ser o nome do réu lançado no rol dos culpados.
São também efeitos da sentença condenatória os previstos nos arts. 91 e 92 do
Código Penal.
MÓDULO XVIII
DIREITO PROCESSUAL PENAL
1. DO PROCESSO E DO PROCEDIMENTO
Processo é o conjunto dos atos processuais interligados pelo vínculo da relação
jurídica processual.
Procedimento é a uma seqüência de atos processuais, com ordem lógica, dirigida à
prolação da sentença.
O Código de Processo Penal divide o processo em:
Comum: constituído de regras gerais aplicáveis sempre que não houver
disposição em contrário, abarca os procedimentos ordinário e sumário.
Especial: afasta-se do procedimento comum, engloba o procedimento nos crimes
funcionais, falimentares, contra a honra, contra a propriedade imaterial, o
procedimento do Júri, procedimentos previstos nas leis de abuso de autoridade
(Lei n. 4.898/65), Lei de Economia Popular (Lei n. 1.521/51), Lei de Tóxicos
(Lei n. 6.368/76) e Lei de Imprensa (Lei n. 5.250/67).
Obs.: para parte da doutrina, que diverge da classificação do Código de Processo
Penal, o procedimento do Júri é comum e o procedimento sumário é especial.
1.1. Procedimento Ordinário
O procedimento ordinário é cabível para todos os crimes punidos com reclusão,
ressalvadas as hipóteses de procedimento especial.
Visão geral:
recebimento da denúncia ou queixa;
citação do réu;
interrogatório do réu;113
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
defesa prévia (prazo de 3 dias);
audiência de oitiva das testemunhas de acusação;
audiência de oitiva das testemunhas de defesa;
diligências (art. 499 do CPP – prazo de 24 horas);
alegações finais (art. 500 do CPP – prazo de 3 dias);
sentença (prazo impróprio de 10 dias).
1.1.1. Recebimento da denúncia ou queixa
No recebimento da denúncia ou queixa, o juiz deve verificar se estão presentes os
seguintes requisitos (art. 41 do CPP):
exposição do fato criminoso;
qualificação do acusado;
classificação do crime;
rol de testemunhas.
O momento para a acusação arrolar as testemunhas é a denúncia.O número
máximo de testemunhas é oito. As que excederem esse número poderão ser ouvidas como
testemunhas do Juízo, a critério do juiz.
O juiz não fundamenta o recebimento da denúncia ou da queixa, pois não há carga
decisória nesse ato. Além disso, se fundamentasse, correria o risco de antecipar o
julgamento.
Em algumas hipóteses, entretanto, é necessária a fundamentação. Conforme a
Súmula n. 564 do Supremo Tribunal Federal, o despacho que recebe a denúncia nos crimes
falimentares e nos crimes de competência originária dos tribunais exige fundamentação.
Nesses procedimentos se estabelece um contraditório prévio ao recebimento da exordial,
permitindo a lei que a ação penal seja julgada improcedente no despacho liminar (na fase
do recebimento).
O recebimento da denúncia ou queixa não enseja a interposição de qualquer recurso.
Ao contrário, se o juiz rejeitar essas peças, cabe a interposição de recurso em sentido
estrito, conforme o art. 581, inc. I, do Código de Processo Penal. No caso de não existir 114
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
justa causa para a ação penal, é cabível o habeas corpus.
A Lei de Imprensa (Lei n. 5.250/67), no entanto, prevê que do recebimento da
denúncia ou da queixa cabe o recurso em sentido estrito. Do despacho que rejeita a
denúncia cabe apelação no prazo de 5 dias. A Lei n. 9.099/95 prevê que do despacho que
rejeita a denúncia cabe apelação no prazo de 10 dias.
A denúncia será rejeitada parcialmente se ao réu for imputado mais de um crime e o
juiz receber a denúncia apenas com relação a um deles.
1.1.2. Citação
A citação do militar e do preso é feita por requisição. O funcionário público é citado
por mandado com expedição de ofício, sendo notificado o chefe da repartição. O réu que
não for encontrado para ser citado pessoalmente será citado por edital, suspendendo o
processo e o curso da prescrição (art. 366 do CPP).
Obs.: sobre o tema citação rever o Módulo XVI.
1.1.3. Interrogatório
A principal característica do interrogatório é a judicialidade, ou seja, o ato é
privativo do juiz. Admite-se a realização do interrogatório por carta precatória, conforme
provimento do Conselho Superior da Magistratura de São Paulo. Tratando-se de réu preso,
o interrogatório deve realizar-se em 8 dias. Se o réu não comparecer ao ato, será
considerado revel. O juiz nomeará defensor dativo tanto ao réu que não comparecer ao ato
como ao réu que comparecer mas não indicar advogado.
O efeito da revelia é a não-intimação do réu para os demais atos do processo.
Não há contraditório nesse ato. Terminado o interrogatório, abre-se o tríduo para
defesa prévia.
1.1.4. Defesa prévia
Na defesa prévia não há o ônus da impugnação específica como no Processo Civil.
O prazo é de 3 dias. Nesse ato deverão ser arroladas as testemunhas de defesa, no máximo
oito para cada fato criminoso e para cada réu, e ser requeridas as diligências necessárias. O 115
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
defensor público goza da prerrogativa do prazo em dobro. Em razão do princípio da ampla
defesa, se a defesa prévia não for apresentada no prazo, a jurisprudência, por
complacência, aceita a apresentação posterior.
Início do prazo da defesa prévia:
réu sem advogado: a partir da notificação da nomeação de um advogado dativo;
réu que se apresenta com advogado: a partir do interrogatório, se o advogado dele
participou;
réu com advogado que não participou do interrogatório: a partir da intimação do
defensor para a apresentação da defesa prévia (intimação pela imprensa).
A defesa prévia tem por finalidade:
arrolar testemunhas de defesa;
requerer diligências;
formular pedidos;
juntar documentos (de acordo com o art. 400 do CPP, é possível juntar
documentos em qualquer fase do processo).
A defesa prévia é o último momento para:
argüir exceção de suspeição;
argüir exceção de incompetência relativa.
A defesa prévia é peça de apresentação facultativa. Mas, se não for apresentada por
falta de oportunidade, há nulidade absoluta.
1.1.5. Audiência de oitiva de testemunhas
A ordem de oitiva das testemunhas é a seguinte:
testemunhas de acusação;
testemunhas de defesa.
A inversão dessa seqüência gera nulidade se ficar demonstrado o prejuízo para a
parte – a nulidade é relativa, pois depende da demonstração do prejuízo.
As testemunhas que se encontram fora da comarca serão inquiridas por carta
precatória. A precatória não suspende o processo e é estabelecido prazo para o seu
cumprimento.116
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
A Súmula n. 155 do Supremo Tribunal Federal determina que causa nulidade
relativa a não intimação das partes acerca da expedição da carta precatória: basta que o juiz
comunique às partes a expedição da carta; não será preciso comunicar a data marcada para
a oitiva da testemunha; à parte incumbe acompanhar seu trâmite.
Se a testemunha, em seu depoimento, refere-se a uma terceira pessoa, essa pode ser
ouvida como testemunha do Juízo (testemunha referida).
Em uma mesma audiência podem ser ouvidas todas as testemunhas presentes, desde
que respeitada a ordem de oitiva: primeiro acusação, depois defesa.
As testemunhas não encontradas podem ser substituídas no prazo de 3 dias.
1.1.6. Diligências
O art. 499 do Código de Processo Penal impõe o prazo de 24 horas para que a
acusação e depois a defesa requeiram as diligências. As partes podem nessa fase reiterar o
pedido de diligência não-realizada ou não-concedida.
O assistente do Ministério Público pode manifestar-se, nessa fase, após a
manifestação do promotor.
O Código de Processo Penal determina que o prazo do art. 499 corre para a defesa
em cartório, independente de intimação. A jurisprudência, todavia, não aplica essa regra
por considerar que viola o princípio do contraditório, da ampla defesa e da isonomia entre
as partes.
1.1.7. Alegações finais
O prazo para a apresentação das alegações finais é de 3 dias – art. 500 do Código de
Processo Penal. Cabe aqui um alerta: não confundir com as alegações do Júri, cujo prazo é
de 5 dias (art. 406 do CPP).
A ordem para a apresentação das alegações finais é: primeiro a acusação, depois a
defesa.
A apresentação das alegações finais é obrigatória para o Ministério Público, em
razão do princípio da indisponibilidade da ação penal pública. Mas o promotor não é
obrigado a pedir a condenação do réu, porque tem independência funcional e age conforme
sua convicção. Se o promotor não apresenta as alegações finais, o juiz utiliza o art. 28 do 117
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
Código de Processo Penal por analogia – remete os autos ao procurador-geral para que
apresente ou designe outro promotor para apresentar a peça.
O querelante não é obrigado a apresentar alegações finais, mas a sua não-
interposição traz conseqüências, quais sejam:
se a ação penal é privada, ocorre a perempção;
se a ação penal é privada subsidiária da pública, o Ministério Público reassume
a titularidade da ação.
A apresentação das alegações finais pela defesa é obrigatória, salvo no
procedimento do Júri. Para não ocorrer nulidade processual é preciso que seja dada a
oportunidade de apresentação da peça (princípio do contraditório e da ampla defesa). O
juiz deve intimar, ainda que pessoalmente, o defensor e o réu para se manifestarem sobre a
ausência das alegações. Se a defesa é omissa, o juiz nomeia defensor dativo para suprir sua
falta.
Nas alegações finais devem ser argüidas as nulidades relativas; é o último momento
para essa argüição, sob pena de sanar o vício, conforme o art. 571 do Código de Processo
Penal. (Obs.: esse artigo é de alta incidência nos concurso do Ministério Público).
A inversão da ordem de apresentação das alegações finais gera a nulidade absoluta,
por violar o princípio do contraditório.
1.1.8. Sentença
Sentença é o ato processual pelo qual o juiz põe fim ao processo, decidindo ou não o
mérito da causa.
(Obs.: para maior aprofundamento rever o Módulo XVII).
O prazo para a sentença é de 10 dias, mas é prazo impróprio. O juiz pode, antes da
sentença, determinar diligências adicionais.
1.1.9. Prazos
Como regra, o prazo do procedimento ordinário é de 81 dias, compreendendo o
período que vai do inquérito policial até o encerramento da prova de acusação. No caso do
réu preso, os prazos não podem ser excedidos sob pena de constrangimento ilegal, 118
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
possibilitando a impetração do habeas corpus. Não se considera excesso de prazo se
houver justo motivo como, por exemplo, pluralidade de réus, exame de insanidade mental,
retardamento causado pela própria defesa (Súmula n. 64 do STJ).
2. PROCEDIMENTO SUMÁRIO
O procedimento sumário previsto nos arts. 531 e ss. do Código de Processo Penal
aplica-se a todos os crimes apenados com detenção, excluindo-se aqueles que possuem
procedimento especial e as infrações penais de menor potencial ofensivo.
O procedimento sumário é idêntico ao procedimento ordinário até a audiência de
oitiva das testemunhas de acusação (recebimento da denúncia ou queixa, citação,
interrogatório, defesa prévia, audiência de oitiva das testemunhas de acusação).
Após essa audiência, o juiz profere um despacho saneador, em que verifica se há
nulidade a ser sanada e diligência importante a ser realizada, designando em seguida data
para audiência de instrução, debates e julgamento. Esse despacho não tem caráter de
decisão interlocutória.
Na audiência de instrução são ouvidas as testemunhas de defesa, ocorrem os debates
orais (cada parte tem 20 minutos, prorrogáveis por mais 10) e o julgamento.
Os debates podem ser substituídos por memoriais, sendo a sentença prolatada em 5
dias (prazo impróprio); havendo debates orais, a sentença será proferida em audiência.
O número de testemunhas para o procedimento sumário é de no máximo cinco.
3. JUIZADOS ESPECIAIS CRIMINAIS (Lei n. 9.099/95)
Os Juizados Especiais Cíveis e Criminais foram instituídos pela Lei n. 9.099/95.
Contrariando os princípios da indisponibilidade e da obrigatoriedade que norteiam a ação
penal pública, essa lei introduziu no sistema penal o princípio da oportunidade ou da
conveniência para o início ou prosseguimento da ação penal, com propostas de suspensão
do processo, composição dos danos e penas alternativas.
O processo perante o Juizado Especial orienta-se também pelos critérios da
oralidade, informalidade, economia processual e celeridade, visando sempre à reparação
dos danos sofridos e à aplicação de pena não-privativa de liberdade.
Uma importante alteração trazida pela lei foi a de que as ações penais, nos crimes de 119
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
lesão corporal leve e culposa, passam a depender de representação no prazo decadencial de
6 meses.
A Lei n. 9.099/95 traz normas mistas ou híbridas, ou seja, que possuem ao mesmo
tempo natureza processual e material. Nesses casos deve prevalecer o cunho penal da
norma, retroagindo quando for mais favorável ao acusado. São normas mistas :
renúncia tácita ao direito de queixa ou representação, na hipótese de composição
dos danos civis (quando a ação penal for pública condicionada à representação,
ou privada);
proposta de pena restritiva de direitos ou multa, feita pelo Ministério Público
(transação penal);
proposta de suspensão condicional do processo, quando do oferecimento da
denúncia;
representação nos crimes de lesão corporal leve e culposa.
O art. 90 da Lei dos Juizados Especiais traz a seguinte redação: “As disposições
desta Lei não se aplicam aos processos penais cuja instrução já estiver iniciada.”
Ocorre, porém, que na lei encontram-se algumas disposições penais benéficas, e o
art. 5.º, inc. XL, da Constituição Federal prevê: “A lei penal não retroagirá, salvo para
beneficiar o réu”. Verifica-se que o art. 90 da Lei n. 9.099/95 viola o referido preceito
constitucional.
O Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil intentou Ação Direta de
Inconstitucionalidade (n. 1719) e o Supremo Tribunal Federal, interpretando o art. 90 da
Lei dos Juizados conforme a Constituição, definiu o alcance da expressão disposições
contida na norma. As disposições da lei que não se aplicam aos processos penais com
instrução iniciada são as normas materiais que agravam a situação do réu e as normas
processuais. Os dispositivos benéficos contidos no sistema dos Juizados Especiais devem
ser aplicados aos processos cuja instrução já estiver iniciada – por força do art. 5.º, inc. XL,
da Constituição Federal.
Ao Juizado Especial Criminal compete processar e julgar as contravenções e os
crimes cujas penas máximas não excedam 1 ano – são os denominados crimes de menor
potencial ofensivo –, exceto aqueles que tenham procedimento especial (artigo 61 da Lei n. 120
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
9.099/95).
A Lei n. 10.259, de 12.7.2001, criou os Juizados Especiais Criminais na Justiça
Federal, competente para julgar feitos de competência da Justiça Federal relativos às
infrações de menor potencial ofensivo (artigo 2.º, “caput”). Essa lei ao conceituar infrações
de menor potencial ofensivo o faz no parágrafo único do artigo 2.º: “Consideram-se
infrações de menor potencial ofensivo, para os efeitos desta lei, os crimes a que a lei
comine pena máxima não superior a dois anos, ou multa.”
Observe-se que a Lei n. 9.099/95 fixa a pena máxima cominada aos crimes em
quantidade não superior a um ano e a Lei n. 10.259/01 determina que a pena máxima não
pode ser superior a dois anos.
As duas leis conceituam “infração de menor potencial ofensivo”. Diante dessa
afirmação, surge a questão: a Lei n. 10.259/01 derrogou a Lei n. 9.099/95? Entendemos
que sim. Essa é a posição do Professor Damásio de Jesus. Se esse entendimento não for
adotado, poderão ocorrer na prática, em prejuízo de princípios constitucionais, alguns
absurdos. Citamos como exemplo o crime de paralisação do trabalho (artigo 201 do
Código Penal) o qual é de competência Federal quando o fato atinge a organização do
trabalho como um todo (art. 109, inc. VI, da CF). Quando individual, a competência é da
Justiça Comum. Não se acatando a nossa posição, o crime mais grave, que atinge a
coletividade, seria considerado de menor potencial ofensivo, enquanto o crime menos
lesivo, por atingir somente um indivíduo, teria qualificação de maior potencial ofensivo.
A Lei n. 9.099/95 ao conceituar crime de menor potencial ofensivo, excepciona os
casos em que a lei prevê procedimento especial. A Lei n. 10.259/01 silencia a respeito
dessa exceção. Assim, a lei nova, além de ampliar o rol dos delitos de menor potencial
ofensivo por meio da elevação da pena máxima abstrata cominada ao crime, estende mais
ainda o conceito de infrações de menor potencial ofensivo, pois não traz a exceção da lei
anterior. Entendimento diverso acarretaria situações de desigualdade jurídica, como por
exemplo o crime de abuso de autoridade, previsto na Lei n. 4.898/65, o qual tem rito
processual especial: o crime seria de menor potencial ofensivo se o autor fosse autoridade
federal, e de maior potencial ofensivo se tratando de autoridade estadual.
Em suma, entendemos que o parágrafo único do artigo 2.º da Lei n. 10.259/01
derrogou o artigo 61 da Lei n. 9.099/95, devendo ser considerados delitos de menor 121
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
potencial ofensivo aqueles aos quais a lei comine, no máximo, pena detentiva não superior
a dois anos, ou multa, ainda que tenham procedimento especial.
Cumpre ressaltar que o Procurador-Geral de Justiça do Estado de São Paulo
recomendou aos integrantes do Ministério Público, por meio do Aviso n.º 74/02, de
6.2.2002, a não incidência da Lei dos Juizados Federais Criminais no âmbito estadual.
Utilizando-se a teoria da atividade, é competente o Juizado do local da execução do
ato criminoso (art. 63 da Lei n. 9.099/95). Para alguns doutrinadores, o foro competente é o
do local da consumação. A divergência não tem relevância tendo em vista tratar-se de
competência territorial, que, por ser relativa, não acarreta nulidade.
Afasta-se a competência do Juizado Especial quando não obtida a citação pessoal do
réu (porque a Lei n. 9.099/95 não prevê a citação por edital) e quando a complexidade ou
as circunstâncias do caso indicarem a necessidade de deslocamento da causa à Justiça
Comum.
Não há inquérito policial nesse procedimento: a autoridade policial lavra apenas um
termo circunstanciado e encaminha ao Juizado o autor do fato e a vítima. Se o autor do
fato for imediatamente encaminhado ao Juizado, ou prestar o compromisso de a ele
comparecer, não será imposta prisão em flagrante, nem se exigirá fiança (art. 69, parágrafo
único, da Lei n. 9.099/95). A Lei n.º 10.455, de 13 de maio de 2002, alterou a redação do
parágrafo único, conferindo ao juiz a possibilidade de determinar, como medida de cautela,
o afastamento do autor do fato de seu lar, domicílio ou local de convivência com a vítima,
em casos de violência doméstica.
3.1. Procedimento
3.1.1.Audiência preliminar
Se o autor da infração e a vítima foram encaminhados de imediato, junto com o
termo circunstanciado, ao Juizado:
- realiza-se a audiência preliminar;
- se, por qualquer razão, não for possível a realização da audiência, designa-
se uma determinada data, da qual saem cientes as partes.
Se o autor do delito não for encaminhado, junto com o termo circunstanciado, à
Secretaria do Juizado (cartório), ao recebê-lo, o juiz designará data para 122
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
audiência preliminar e mandará intimar as partes.
O art. 68 da Lei dispõe que na intimação do autor do delito deve constar a
necessidade de comparecimento com advogado, com a advertência de, na falta desse, ser
nomeado dativo.
No dia designado, devem estar presentes (art. 72):
- o representante do Ministério Público;
- o autor do fato e a vítima – se menores, acompanhados de seus responsáveis;
- o juiz;
- os advogados das partes.
As fases na audiência preliminar dependem da ação penal prevista para o delito
cometido.
a) Se o crime for de ação privada (dano simples)
a.1.Tentativa de composição civil dos danos
Se vítima e autor do delito chegarem a um acordo, esse é submetido à
homologação do juiz – que pode não homologar se o entender desfavorável à
vítima.
Homologado o acordo, automaticamente ocorrerá renúncia ao direito de queixa e
extinção da punibilidade – art. 74, parágrafo único.
Se o autor da infração não honrar sua parte no acordo, o procedimento criminal não
pode ser reaberto (porque houve extinção da punibilidade), restando à vítima execução
civil do acordo homologado (que é título executivo judicial - art. 584, inc. III, do CPC).
Se infrutífera a composição civil, a advogado da vítima oferecerá queixa
imediatamente de forma oral ou, se preferir, poderá apresentá-la por escrito em
momento posterior – desde que dentro de prazo decadencial.123
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
Pelo texto legal, não cabe transação na ação penal privada; entretanto, a
jurisprudência vem admitindo essa possibilidade.
O art. 104, par. ún., do Código Penal, dispõe que a reparação civil do dano não obsta
a ação penal, mas no Juizado é diferente: havendo acordo, a conseqüência automática é a
renúncia ao direito de queixa.
b) Se o crime for de ação pública condicionada à representação
b.1. Tentativa de composição civil
Se frutífera, implica renúncia ao direito de representação e extingue a
punibilidade.
É hipótese de renúncia (instituto exclusivo da ação privada) aplicável na ação penal
pública.
Se infrutífera, a vítima pode oferecer representação oral, reduzida a termo, ou
posteriormente, dentro do prazo decadencial.
Oferecida a representação na audiência, o Ministério Público deve analisar as
provas existentes no termo circunstanciado:
- se não há indícios suficientes, o promotor deve requerer o arquivamento do
feito;
- se o promotor entender que há necessidade de novas diligências para
complementação da prova (art. 77, § 2.º), requererá o envio dos autos à
Justiça Comum para requisição de inquérito policial;
- se o promotor verificar que existem provas para o oferecimento da
denúncia, antes de fazê-lo analisará se é possível a transação penal.
Presentes os requisitos da transação, o Ministério Público deve fazer a proposta
de aplicação de pena de multa ou restritiva de direitos (especificando seu valor
ou a espécie de restritiva).
- se o autor da infração aceitar a proposta, será submetida à homologação do
juiz.124
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
P.: Pode o juiz alterar o acordo feito entre as partes?
R.: Como regra, não; porém existe exceção: quando em abstrato for prevista apenas
multa para aquela infração penal, o juiz pode reduzir o valor pela metade (art. 76, § 1.º).
Homologado o acordo, será aplicada a pena avençada. Se o juiz não homologar a
transação, por entender ser caso de denúncia, a lei é omissa, e aplica-se por analogia o art.
28 do Código de Processo Penal.
Se o autor da infração não aceita a proposta do Ministério Público, é oferecida
denúncia oral, reduzida a termo – não pode ser apresentada por escrito porque a
lei não a prevê como queixa.
P.: Em que hipóteses é oferecida a denúncia?
R.: Quando não estão presentes os requisitos para transação; quando o autor do
delito recusa a proposta de transação; quando o autor da infração, intimado para audiência
preliminar, não comparece nem justifica sua ausência.
O fato de o autor da infração ter aceitado a transação não implica reconhecimento de
culpa; portanto, se a vítima quiser ser indenizada, precisará ingressar com ação de
conhecimento na esfera civil.
A transação não retira a primariedade do autor do delito e não constará de certidões
para serem utilizadas extrajudicialmente.
Requisitos para transação (art. 76, § 2.º ):
- que o autor da infração não tenha sido condenado pela prática de crime à pena
privativa de liberdade (portanto, em caso de contravenção, qualquer que seja a
pena, cabe transação se preenchidos também os demais requisitos);
- que o acusado não tenha sido beneficiado por outra transação penal, no prazo de
5 anos;
- requisitos subjetivos: personalidade do agente, conduta social etc., suficientes à
adoção da medida.
125
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
c) Se o crime for de ação pública incondicionada
Tentativa de composição civil, mesmo sendo ação pública incondicionada,
porque vale como título judicial evitando a discussão no cível.
Havendo homologação ou não, passa-se para fase de transação, porque, por ser
ação pública incondicionada, mesmo ocorrendo acordo, a punibilidade não se extingue.
3.1.2.Disposições comuns
Se o agente estava presente na audiência, recebe uma cópia da denúncia ou queixa e
com isso estará citado, com ciência de que deve comparecer à próxima audiência com
advogado, sob pena de ser-lhe nomeado dativo.
P.: É possível a citação do acusado antes do recebimento da denúncia ou queixa?
R.: Sim, no Juizado Especial.
Se o acusado não estava presente na audiência preliminar, será citado por mandado,
na forma da legislação comum.
Se não for encontrado para citação pessoal, os autos serão remetidos para a Justiça
Comum para citação por edital, que não é prevista pela Lei dos Juizados.
3.1.3.Audiência de instrução, debates e julgamento
Se o autor da infração não compareceu à audiência preliminar e comparece nessa,
devem ser observadas as regras da audiência preliminar (composição cível, transação), com
todas as suas conseqüências.
Fora dessa hipótese:
- é dada a palavra ao advogado do réu para, oralmente, sustentar a rejeição da
denúncia ou queixa;
- o juiz recebe ou rejeita a denúncia ou queixa;
- oitiva da vítima;
- oitiva das testemunhas da acusação, arroladas na denúncia;
- oitiva das testemunhas da defesa, que o réu levará à audiência independente de
intimação ou das quais apresentará rol em cartório, com 5 dias de antecedência,
para serem intimadas; o número máximo de testemunhas é três, conforme
dispõe a parte civil da lei; porém, alguns doutrinadores entendem ser cinco, de 126
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
acordo com o procedimento sumário; outros, oito, utilizando analogia com o
procedimento comum ordinário;
- interrogatório do réu;
- debates orais, por 20 minutos, prorrogáveis por mais 10;
- sentença.
3.1.4.Recursos
Os recursos são julgados por Turmas Recursais compostas por juízes de primeiro
grau, na forma estabelecida na legislação estadual.
A lei trata apenas da apelação e dos embargos de declaração. Porém, não é por esse
motivo que só cabem esses dois recursos: os demais também são aplicados (recurso em
sentido estrito, recurso especial, mandado de segurança, habeas corpus etc.). A lei apenas
citou os dois para trazer regras específicas para eles.
Não cabe recurso especial porque esse é cabível de decisão de tribunal (art. 105, inc.
III, da CF), e o recurso no Juizado é julgado por Turma Recursal (art. 82 da Lei dos
Juizados Especiais). Esse é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça
consubstanciado na súmula 203.
Da decisão que rejeita a denúncia ou queixa e da sentença de mérito cabe apelação.
O prazo é de 10 dias, e as razões acompanham a interposição.
Os embargos de declaração possuem prazo de 5 dias, e a interposição suspende o
prazo para interposição de outros recursos.
3.2. Observações Finais
Aplicada pena de multa na sentença, se o condenado não pagar, cabe execução,
persistindo a polêmica da competência para execução da multa.
P.: Aplicada pena de multa na transação penal, se o autor da infração não pagar, o
que deve ser feito?
R.: A questão é divergente:
- executa-se a multa;
- com o descumprimento do acordo por parte do acusado, o Ministério Público
também pode descumpri-lo, oferecendo a denúncia para prosseguimento do 127
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
processo, porque a homologação da transação fez apenas coisa julgada formal.
Há julgado nos dois sentidos.
P.: E, se na transação for aplicada pena restritiva de direitos, como executá-la?
R.: Nesse caso, a única solução é o oferecimento da denúncia.
P.: A lesão leve passou a ser delito de ação penal pública condicionada. Como ficam
as vias de fato – contravenção cuja ação penal é pública incondicionada?
R.: As vias de fato constituem infração menos grave do que a lesão leve; logo, a
ação passou a ser também pública condicionada à representação. Fundamento, analogia in
bonam partem.
P.: Se o promotor denunciar, classificando o fato como tentativa de homicídio, e o
Júri desclassificar para lesão corporal leve, como proceder?
R.: Transitando em julgado a desclassificação, designa-se audiência preliminar para
que sejam cumpridas as fases previstas na Lei dos Juizados Especiais.
P.: E, se tiver ocorrido decadência, caberá decurso do prazo de 6 meses para
representação?
R.: Duas posições:
- a vítima perde o direito de representar;
- a vítima não pode ser prejudicada; cabe a representação, e o prazo de 6 meses
tem início com a intimação da vítima da desclassificação do delito.
MÓDULO XIX
DIREITO PROCESSUAL PENAL
Procedimentos Especiais
1. PROCEDIMENTO DOS CRIMES FUNCIONAIS
O procedimento dos crimes funcionais é aplicado a todos os crimes em que a
condição de funcionário público funcione como elementar ou circunstância do tipo penal.
Ex.: o Título XI, Capítulo I, do Código Penal aborda os crimes praticados por funcionário
público contra a Administração Pública, e o Capítulo IV trata dos crimes praticados contra
as finanças públicas.
O procedimento dos crimes funcionais segue o rito ordinário após o recebimento da 128
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
denúncia ou queixa subsidiária; a peculiaridade que o torna especial é a possibilidade de o
funcionário apresentar defesa preliminar antes do recebimento da peça inicial.
Para tanto, o acusado é notificado com prazo de 15 dias para se defender (art. 514
do CPP). Se não for encontrado, ser-lhe-á nomeado defensor dativo para exibir a resposta
preliminar.
O próprio acusado pode apresentar a defesa preliminar, mesmo não sendo advogado.
Descumprida essa formalidade prévia, a nulidade é relativa (anulam-se os atos
seguintes mediante comprovação de prejuízo). Essa é a orientação do Supremo Tribunal
Federal. Nada obstante, consigna-se a posição minoritária do Professor Tourinho a favor da
existência de nulidade absoluta pela violação do contraditório e da ampla defesa.
O objetivo da defesa preliminar é evitar que ocupantes de cargos públicos sejam
alvo de acusação infundada, tendo aplicação apenas aos crimes funcionais afiançáveis (são
inafiançáveis o excesso de exação e a facilitação do contrabando e descaminho – arts. 316,
§ 1.º, e 318, do CP).
P.: Há algum meio para garantir a apresentação da defesa preliminar?
R.: Sim, pela correição parcial, caso o juiz não conceda a oportunidade para a sua
apresentação.
P.: Se o funcionário público, aposentado ou exonerado, for processado por um fato
que praticou enquanto exercia a função de funcionário público, terá direito a defesa
preliminar?
R.: O entendimento atual é no sentido de não ter direito à defesa preliminar, em
razão da revogação da Súmula n. 394 do Supremo Tribunal Federal. A súmula não se
refere a esse procedimento, mas o fundamento de sua revogação é o mesmo dessa questão.
A súmula determinava que: “Cometido o crime durante o exercício funcional,
prevalece a competência especial por prerrogativa de função, ainda que o inquérito policial
ou a ação penal sejam iniciados após a cessação daquele exercício”.
Com o cancelamento dessa súmula, os fatos ocorridos durante a existência do foro
especial são processados após o término dessa prerrogativa na primeira instância e não no
foro especial, pois este existe em razão da função que a pessoa desempenha (do cargo), não 129
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
se tratando de um privilégio individual.
Ex.: se um funcionário público pratica um crime durante o exercício de sua função,
mas só vem a ser processado quando já estava aposentado ou exonerado, não será adotado
o procedimento que permite a defesa preliminar, mas sim o procedimento comum.
Verificado o concurso de agentes no crime, os co-autores e partícipes, que não
sejam funcionários públicos, não serão notificados para a apresentação da defesa
preliminar – pois não possuem essa faculdade.
Conforme entendimento do Supremo Tribunal Federal, o recebimento da denúncia
ou da queixa deve ser fundamentado. Isso porque os crimes funcionais têm o contraditório
antecipado na defesa preliminar. Trata-se de exceção, pois, em regra, no despacho que
recebe ou rejeita a denúncia ou a queixa não há fundamentação.
Recebida a denúncia ou a queixa, o acusado é citado – seguindo-se o procedimento
ordinário.
2. CRIMES CONTRA HONRA (ARTS. 519 A 523 DO CPP)
Trata-se de procedimento subsidiário previsto para os crimes contra honra, cuja ação
penal é privada. O art. 519 do Código de Processo Penal ratifica ao descrever que o rito
será observado no processo “para o qual não haja outra forma estabelecida em lei
especial”. Ex.: crimes cometidos pela imprensa, Lei n. 5.250/67; pessoas que gozam de
foro especial pela prerrogativa de função, se a competência for do Superior Tribunal de
Justiça ou do Supremo Tribunal Federal, Lei n. 8.038/90.
Apesar do Título II, Capítulo III, do Código de Processo Penal, referir-se somente à
calunia e à injúria, esse procedimento também é aplicável à difamação pela utilização da
analogia (art. 3.º do CPP).
O emprego da analogia pressupõe a omissão involuntária do legislador, porque se a
omissão foi proposital, não cabe o uso do instituto. A lacuna do art. 519 do Código de
Processo Penal não foi espontânea; o Código Penal em vigor na época em que o Código de
Processo Penal foi criado era o de 1890, e previa os crimes contra honra em dois artigos,
encontrando-se a difamação descrita no parágrafo do tipo da calúnia (como sua espécie e
não como crime autônomo).
Em regra, os crimes contra a honra são de ação penal privada, iniciando-se 130
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
mediante queixa-crime. Exceções:
a ação penal será pública incondicionada se da injúria real resultar lesão
corporal.
será pública condicionada à representação nos crimes contra a honra de
funcionário público, em razão de sua função.
será pública condicionada à requisição do Ministro da Justiça nos crimes contra
a honra do Presidente da República ou de Chefe de Governo estrangeiro.
2.1. Peculiaridades do Procedimento dos Crimes Contra a Honra
a) Audiência de reconciliação (ou conciliação): o objetivo dessa audiência é que
autor e réu se reconciliem (art. 520 do CPP).
Deve ocorrer após o oferecimento da denúncia e antes do seu recebimento.
O juiz ouvirá cada uma das partes isoladamente; percebendo a possibilidade de
conciliação, chamará as partes e seus advogados e tentará o acordo na audiência, que, se
frutífero, será homologado. O querelante assinará termo de desistência da ação com a
conseqüente extinção da punibilidade.
Não havendo acordo, será frustrada a conciliação e o juiz chamará à conclusão os
autos para receber ou não a queixa.
Recebida a queixa, apesar de o crime ser o de detenção, adota-se o procedimento
ordinário.
P.: Qual a causa extintiva da punibilidade para a hipótese de conciliação?
R: Não é a renúncia, porque essa ocorre quando o querelante não exerce seu direito
de oferecer a queixa, e no caso em estudo já houve o oferecimento da exordial. Também
não é a perempção, pois a ação penal ainda não se iniciou. Portanto, a causa extintiva da
punibilidade é a desistência – que não está prevista no rol do art. 107 do Código Penal, mas
esse é exemplificativo e não taxativo (art. 522 do CPP).
Para grande parte da doutrina, a falta da audiência de reconciliação gera nulidade
absoluta.
O não-comparecimento do querelado à audiência preliminar indica desinteresse na 131
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
conciliação. Não acarreta sanção; o juiz passa a analisar se é caso de receber ou rejeitar a
queixa.
O não-comparecimento do querelante, posição minoritária, gera a perempção, pois
deixa de comparecer a um ato fundamental (art. 60 do CPP). Esse entendimento é falho,
pois ainda não houve o recebimento da queixa, e, assim, não há que se falar em perempção.
Posição majoritária na doutrina, na jurisprudência e no Superior Tribunal de Justiça, indica
desinteresse na conciliação.
b) Exceção da verdade (art. 523 do CPP): é a possibilidade do querelado provar que
o alegado é verdadeiro. Admite-se nos crimes de calúnia, salvo o expresso no art. 138, §
3.º, do Código Penal:
se, constituindo o fato crime de ação penal privada, o ofendido não foi
condenado por sentença irrecorrível;
se o fato é imputado a qualquer das pessoas indicadas no inc. I do art. 141 do
Código Penal (Presidente da República ou Chefe de Governo Estrangeiro);
se do crime imputado, embora de ação pública, o ofendido foi absolvido por
sentença irrecorrível.
Também é cabível nos crimes de difamação, quando a vítima for funcionário
público, por fato relativo a suas funções (art. 139, par. ún., do CP).
O momento da apresentação da exceção da verdade é o mesmo da defesa prévia (art.
395 do CPP – logo após o interrogatório ou no prazo de três dias).
O querelante tem dois dias para contestar, podendo arrolar testemunhas, desde que
com esse novo rol não se ultrapasse o número legal. Ex.: na queixa foram arroladas quatro
testemunhas; poderá o querelante na contestação da exceção da verdade oferecer mais
quatro testemunhas.
Todas as testemunhas, inclusive as da exceção da verdade, serão ouvidas durante a
audiência de instrução.
O juiz, antes de analisar o mérito, na própria sentença decide a exceção da verdade.
Obs.: parte da doutrina sustenta que o prazo da exceção da verdade não é fatal em
nome da ampla defesa. Ainda que apresentada após o lapso previsto no art. 395 do Código 132
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de Processo Penal, poderá ser aceita e julgada na sentença.
Atenção: conforme determina o art. 85 do Código de Processo Penal, se o querelante
for pessoa que goze de foro especial, a exceção da verdade será julgada pelo tribunal
competente para processar originariamente o querelante. Ex.: querelante é deputado
federal; torna-se vítima de calúnia e oferece queixa na primeira instância. O querelado
apresentará a exceção da verdade que será julgada no Supremo Tribunal Federal. Obs.: a
exceção da verdade é processada e instruída na primeira instância e remetida para o
tribunal competente apenas para o julgamento.
c) Pedido de explicações em Juízo (art. 144 do CP): é uma medida preliminar,
utilizada quando a ofensa é equívoca, dúbia. Ex.: alguém se referindo a uma moça diz que
ela é muito cara. Essa frase possibilita duplo entendimento: ou a moça é muito especial,
com valiosas qualidades, ou é uma meretriz que cobra caro por seus trabalhos.
A situação que conduz ao duplo entendimento, permite o pedido de explicações em
Juízo, que não é obrigatório. Visa esclarecer as dúvidas para que a queixa fique bem
fundamentada.
Ajuizado o pedido de explicações, o autor da frase é notificado para prestar
esclarecimentos. Com ou sem as respostas, os autos do pedido são entregues ao requerente.
O juiz é um intermediário, não analisa o mérito. Configura um elemento a mais para
o exame da justa causa para o recebimento da queixa.
O prazo de seis meses para oferecer a queixa é peremptório e decadencial; não se
suspende nem se interrompe com o ajuizamento do pedido de explicações.
O pedido de explicações torna prevento o Juízo.
O querelado somente será condenado na ação penal privada, nunca no pedido de
explicações em Juízo.
3. PROCEDIMENTO NOS CRIMES FALIMENTARES
Os crimes falimentares classificam-se em:
antefalimentares: a conduta se realiza anteriormente à sentença declaratória de
falência;
pós-falimentares: a conduta se verifica após a sentença declaratória de falência. 133
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
O crime falimentar prescreve em dois anos, a contar do encerramento da falência
(art. 199 da Lei n. 7.661/45). A Súmula n. 147 do Supremo Tribunal Federal determina
que: “A prescrição do crime falimentar começa a correr da data em que deveria estar
encerrada a falência, ou do trânsito em julgado da sentença que a encerrar ou que julgar
cumprindo a concordata”.
Mas quando deveria se encerrar a falência?
Conforme a regra do art. 132, §1.º, da Lei n. 7.661/45, a falência deve encerrar-se
em dois anos, a contar da data de sua declaração.
A prática de crime falimentar é apurada no inquérito judicial presidido pelo próprio
juiz da falência, baseado na exposição circunstanciada apresentada pelo síndico da
falência. A exposição é instruída com o laudo do perito, encarregado de examinar as
escriturações do falido. Podem requerer a instauração do inquérito judicial o síndico ou
qualquer credor interessado.
O falido terá o prazo de cinco dias para contestar as alegações do inquérito judicial.
Encerrado esse prazo, os autos serão conclusos ao juiz que, em 48 horas, deferirá a
produção de provas.
Realizadas as provas, os autos serão remetidos ao Ministério Público que, no prazo
de cinco dias, poderá oferecer a denúncia ou requerer o apensamento dos autos aos autos
da falência, arquivando o inquérito judicial. Se o juiz não concordar com o apensamento,
remeterá as peças ao Procurador-Geral, para os fins do art. 28 do Código de Processo
Penal.
Quaisquer dos credores ou mesmo o síndico poderá oferecer a queixa subsidiária,
caso o Ministério Público não ofereça nem requeira sem apensamento dentro do prazo. Se
o Ministério Público oferecer a denúncia, o seu recebimento deve ser fundamentado sob
pena de nulidade (Súmula n. 564 do STF).
Os autos, então, serão remetidos ao Juízo criminal, onde a ação penal prosseguirá
pelo rito ordinário, independentemente de ser o crime de reclusão ou de detenção. No
Estado de São Paulo, por força da Lei Estadual n. 3.947/83, o Juízo da falência tem
competência universal, inclusive para o julgamento dos crimes falimentares. O
recebimento da denúncia impede a concessão da concordata suspensiva.134
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
Diverge a doutrina com relação à natureza jurídica da sentença declaratória da
falência. O Professor Fernando Capez elenca os entendimentos:
“1.ª) é elementar do tipo falimentar, segundo José Frederico Marques;
2.ª) Nelson Hungria entende que é condição objetiva de punibilidade (adotada);
3.ª) Trata-se de condição de procedibilidade, embora em alguns casos possa
constituir elementar do tipo. Como exemplo, os arts. 186, inc. III, e 189, inc. II, ambos da
Lei de Falências.
4.ª) Segundo Mirabete, trata-se de ‘condição objetiva de punibilidade quanto aos
crimes antefalimentares, e pressuposto quanto aos crimes pós-falimentares, excluídos os
crimes em que é a quebra elemento do próprio fato típico’.”
4. PROCEDIMENTO DOS CRIMES CONTRA A PROPRIEDADE IMATERIAL
Os crimes contra a propriedade imaterial são os que ferem os direitos autorais (arts.
184 e 185 do CP) e os direitos da propriedade industrial (Lei n. 9.279/96).
São, em regra, crimes de ação penal privada, pois processam-se mediante queixa;
porém, também há previsão de ação penal pública, de acordo com o art. 186 do Código
Penal.
O procedimento desses crimes varia, conforme o delito deixe ou não vestígios.
Se o crime deixar vestígios, crime não-transeunte, a denúncia ou a queixa será
recebida se instruída com o exame pericial dos objetos que constituam o corpo de delito
(art. 525 do CPP).
O autor deve comprovar seu direito à ação (art. 526 do CPP). Para tal deve requerer,
antes da queixa ou da denúncia, a busca e apreensão e perícia, apresentando os quesitos.
A diligência será realizada por dois peritos do Juízo, que farão a vistoria e apreensão
de objetos suficientes para a prova da infração. Caso o laudo seja contrário aos interesses
do autor, este poderá impugná-lo.
Encerradas as diligências, o juiz homologa o laudo pericial sem examinar o mérito.
Homologado o laudo, o autor será intimado para, em 30 dias, oferecer a queixa-crime
instruída com a perícia, sob pena de sua ineficácia.
Com o recebimento da denúncia, passa-se para o rito ordinário.
Se o crime não deixar vestígios, crime transeunte, o rito será o ordinário, ainda que a 135
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pena seja a de detenção.
5. PROCEDIMENTO NOS CRIMES DE COMPETÊNCIA ORIGINÁRIA DOS
TRIBUNAIS
Algumas pessoas, em razão do cargo que ocupam, se cometerem uma infração
penal, devem ser processadas e julgadas originariamente nos tribunais, na instância
superior. Trata-se de uma prerrogativa da função. Ex.:
Prefeito é processado e julgado no Tribunal de Justiça;
Governadores, Desembargadores, membros do Tribunal de Contas dos
Estados, entre outros, são julgados no Superior Tribunal de Justiça;
Presidente da República, Vice-Presidente, membros do Congresso
Nacional e o Procurador-Geral da República são julgados pelo Supremo
Tribunal Federal.
O rito é previsto na Lei n. 8.038/90: oferecida a denúncia ou a queixa perante o
tribunal competente, o acusado é notificado para apresentar uma resposta prévia antes do
recebimento da petição inicial.
O relator do tribunal pedirá dia para que o tribunal decida sobre o recebimento ou
não da denúncia ou da queixa, ou ainda sobre a improcedência da acusação (art. 6.º da lei).
Recebida a denúncia ou a queixa, passa-se para o interrogatório do acusado, a defesa
prévia (com prazo de cinco dias), a instrução etc., observando-se o procedimento comum.
O julgamento será na forma prevista no regimento interno de cada tribunal.
Obs.: para maior aprofundamento sobre esse tema é interessante rever o módulo
VIII, que trata da competência.
MÓDULO XX
DIREITO PROCESSUAL PENAL
Do Procedimento do Júri
1. HISTÓRICO136
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O Procedimento do Júri, apesar de estar disposto no Código de Processo Penal na
parte do procedimento comum, é um rito especial.
Tem a sua origem na Magna Carta , os homens deveriam ser julgados pelos seus
pares. No Brasil, surgiu na lei de 18.6.1822, que criava o julgamento pelo Júri para os
crimes de imprensa. Depois, a Constituição Imperial de 1824 passou a prevê-lo como um
órgão do Poder Judiciário e ampliou sua competência para julgar causas cíveis e criminais.
A Constituição de 1891 manteve o Júri como instituição soberana.
O “período obscuro do Tribunal do Júri” foi o de 1937; a Constituição Federal de
1937 não se manifestou a respeito do instituto, o que tornou possível a um decreto (o Dec.
n. 167) suprimir a soberania dos veredictos do Júri. Tal decreto permitiu que os tribunais
alterassem o julgamento do Júri. Atualmente, se o Júri condena, o Tribunal não pode, ao
rever a decisão, absolver. Esse princípio suprimido foi restabelecido na Constituição de
1946 e, a partir de então, não mais deixou de ser previsto.
2. O JÚRI NA ATUAL CONSTITUIÇÃO FEDERAL
O Constituição Federal prevê o Júri em seu art. 5.º, inc. XXXVIII. É um dos direitos
e garantias individuais de todas as pessoas. Desse dispositivo, extrai-se os quatro princípios
fundamentais da instituição do Júri, quais sejam : plenitude de defesa; sigilo nas votações;
soberania dos veredictos; competência mínima para julgamento dos crimes dolosos contra
a vida, tentados ou consumados.
a) Plenitude de defesa
A plenitude de defesa significa mais que a ampla defesa e ocasiona os seguintes
reflexos:
O advogado tem liberdade para elaborar a defesa do réu, podendo alegar o que
melhor lhe aprouver, ainda que sem aparo jurídico. Ex.: na tréplica, o advogado
alega que o crime foi praticado há 11 anos; depois disso, o réu arrumou um
emprego, teve sete filhos, tornou-se líder comunitário etc.
Se o juiz constata que a defesa desenvolvida em plenário é inepta, pode
dissolver o conselho de sentença declarando o réu indefeso (art. 497, inc. V, do
CPP).137
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O juiz deve quesitar, além das alegações desenvolvidas pela defesa técnica,
aquelas alegadas pelo réu em sua autodefesa, mesmo que incompatíveis. Ex.: o
réu, no seu interrogatório em plenário, alega que agiu em legítima defesa. O
defensor considera que é difícil convencer os jurados da legítima defesa e então
sustenta outra tese; alega que o réu não conhece o instituto da legítima defesa,
argumenta que as qualificadoras não existiram e que há um privilégio. O juiz irá
quesitar as duas defesas alegadas: legítima defesa e privilégio. Obs.: esse
entendimento não é unânime, mas é o dominante.
b) Sigilo nas votações
Trata-se de princípio informador específico do Júri; a ele não se aplica o disposto no
art. 93, inc. IX, da Constituição Federal (princípio da publicidade).
O Código de Processo Penal prevê várias maneiras de manter o sigilo nas votações,
cabendo citar, entre outras:
Incomunicabilidade dos jurados: os jurados não podem emitir qualquer opinião
sobre o processo. Podem conversar entre eles, desde que não seja sobre o caso.
Os jurados são impedidos de se comunicar com qualquer terceiro estranho ao
processo. A comunicação dos jurados com o mundo externo ocorre somente
através do oficial de justiça.
O julgamento é feito em sala secreta: isso evita que uma das pessoas que esteja
no plenário perceba qual foi o voto dos jurados e, também, qualquer tipo de
constrangimento.
O julgamento feito pelos jurados tem por base a íntima convicção: Assim, não
há fundamentação da decisão. É exceção à regra do livre convencimento
motivado.
c) Soberania dos veredictos
Conceito do Professor. José Frederico Marques: “A soberania consiste na
impossibilidade dos juízes togados se substituírem aos jurados na decisão da causa.”
O mérito no Júri é decidido exclusivamente pelos jurados. Como todo princípio, não
é absoluto, ou seja, encontra limitações. 138
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O art. 593, inc. III, “d”, do Código de Processo Penal, permite a apelação das
decisões do Júri quando consideradas manifestamente contrárias às provas dos autos. A
apelação é julgada pelo tribunal. Se o tribunal der provimento à apelação, determina a
realização de novo julgamento. O tribunal não decide o mérito. A apelação com esse
fundamento só pode ser interposta uma vez.
“Na revisão criminal a mitigação desse princípio é ainda maior, porque o réu,
condenado definitivamente, pode ser até absolvido pelo tribunal revisor, caso a decisão
seja arbitrária. Não há anulação nesse caso, mas absolvição, isto é, modificação direta do
mérito da decisão dos jurados.”1
Observações: 1. A absolvição sumária ocorre quando provado excludente de
ilicitude ou de culpabilidade. Nesse caso, o réu não vai a Júri, e sim o juiz togado julga o
mérito.
2. A revisão criminal é a ação rescisória de coisa julgada penal.
Sempre em favor do réu, nunca pro societate. No caso de Júri, interposta a revisão
criminal, ela será julgada por 10 desembargadores (normalmente o recurso é julgado por
três) e os juízes togados decidirão o mérito nesse caso.
Esses dois casos são as limitações da soberania dos veredictos, já que nenhum
princípio é absoluto. Os veredictos do Júri são soberanos apenas e tão-somente enquanto
garantirem o direito de liberdade do cidadão.
d) Competência mínima para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida
tentados ou consumados
Os crimes dolosos contra a vida são:
- homicídio (art. 121 do CP);
- induzimento, instigação ou auxílio a suicídio (art. 122 do CP);
- infanticídio (art. 123 do CP);
- aborto provocado pela gestante ou com seu consentimento e aborto provocado
por terceiro (arts. 124 a 126 do CP).
Esses são os crimes de competência do Júri; todavia, este pode vir a ter sua
1 CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 7.ª ed. São Paulo: Saraiva, 2001.139
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competência ampliada por lei ordinária. Já existe uma lei ordinária ampliando: o art. 78,
inc. I, do Código de Processo Penal prevê que também é da competência do Júri o
julgamento dos crimes conexos com os crimes do Júri.
Atenção:
1. A competência para julgar o latrocínio é do juiz singular, pois é um crime contra
o patrimônio ( Súmula n. 603 do STF).
2. A competência para julgar o genocídio (crime contra a humanidade) é do juiz
singular da justiça federal.
3. O policial militar, que pratica crime doloso contra a vida, ainda que em serviço,
será julgado pelo Júri.
3. ORGANIZAÇÃO DO JÚRI
O Júri é um órgão da justiça comum. Pode ser o Júri estadual ou federal.
A competência do Júri federal é para julgamento de:
crimes dolosos contra a vida de funcionários públicos federais, em razão de suas
funções;
crimes dolosos contra a vida praticados a bordo de navio ou aeronave.
3.1. Características do Júri
São as seguintes as características do Júri:
Colegiado: o Júri é composto por um juiz togado e 21 jurados leigos.
Atenção: 21 jurados formam o tribunal do Júri; 15 jurados presentes, no mínimo,
instalam a sessão de julgamento; 7 jurados formam o conselho de sentença.
Heterogêneo: é composto por órgãos de natureza distinta, juiz togado e jurados
leigos.
Horizontal: não há hierarquia entre os jurados e o juiz-presidente do Júri. O que
existe são divisões de competência.
Temporário: os jurados são sempre renovados.140
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Compete ao juiz-presidente organizar a lista geral dos jurados, baseado em
informações fidedignas ou conhecimento pessoal (art. 439 do CPP). Normalmente, o juiz
requer listas com nomes em repartições públicas, sindicatos de classes, empresas.
No mês de novembro de cada ano, o juiz publica uma lista provisória com o nome
dos jurados que irão atuar no próximo ano. A quantidade de nomes varia entre 80 a 500,
conforme a necessidade de julgamento. Na segunda quinzena de dezembro, o juiz publica a
lista definitiva (art. 439, par. ún., do CPP).
Enquanto a lista não é definitiva, qualquer pessoa pode impugná-la. O juiz decide
sobre aquele pedido de exclusão de nome da lista. Se o juiz indefere o pedido e inclui o
nome, aquele que argüiu a exclusão pode interpor recurso em sentido estrito no prazo de 20
dias (normalmente o recurso em sentido estrito tem prazo de cinco dias), conforme o art.
581, inc. XIV, e art. 586, par. ún., ambos do Código de Processo Penal.
Da lista definitiva são sorteados os 21 nomes que formarão o tribunal do Júri, sendo
renovados a cada reunião periódica. O sorteio é realizado em audiência pública e um
menor de 18 anos realiza o sorteio (presume-se a pureza do menor).
As qualidades da pessoa para ser jurado são as seguintes:
ser brasileiro (nato ou naturalizado);
estar no gozo dos direitos políticos;
ser maior de 21 anos;
ser residente na comarca onde acontecerão os julgamentos;
ter notória idoneidade moral.
A lei prevê expressamente nos arts. 434 e 436, par. ún., do Código de Processo
Penal aqueles que são isentos do serviço do Júri. Entre eles estão os maiores de 60 anos, os
que já exerceram a função de jurado por um ano, ministros de confissão religiosa, parteiras,
entre outros.
Um cidadão convocado a prestar o serviço do Júri, não estando no rol dos isentos,
não pode recusar-se a essa obrigação. Poderá, todavia, por razões de convicção filosófica,
política ou de crença religiosa, invocar em seu favor a denominada escusa de consciência.
O art. 435 do Código de Processo Penal ( determina que aquele que alega escusa de 141
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
consciência para não prestar o serviço do Júri perde os direitos políticos) não foi
recepcionado pela Constituição Federal, estando, portanto, revogado.
Segundo a Constituição Federal, aquele que invoca escusa de consciência para se
livrar de obrigação a todos imposta, deverá prestar um serviço social alternativo. Havendo
a recusa da prestação alternativa, ocorrerá a perda dos direitos políticos (arts. 5.º, inc. VIII,
e . 15, inc. IV, da CF/88). Essa obrigação alternativa deve ser prevista em lei; porém, ainda
não existe lei que regulamente essa obrigação.
O exercício efetivo da função de jurado, segundo o art. 437 do Código de Processo
Penal, é considerado um serviço público relevante. O jurado terá as seguintes
prerrogativas:
presunção de idoneidade moral;
prisão especial em caso de crime comum até o julgamento definitivo;
preferência em igualdade de condições em concorrências públicas.
Os jurados poderão ser responsabilizados criminalmente por concussão, corrupção e
prevaricação.
4. JUDICIUM ACCUSATIONIS
O procedimento do Júri é bifásico ou escalonado. É o procedimento mais solene do
Código de Processo Penal.
A primeira fase do Júri é denominada sumário da culpa ou judicium accusationis.
Inicia-se com o recebimento da denúncia ou da queixa (ação penal privada subsidiária da
pública) e termina com o trânsito em julgado da pronúncia. Essa fase tem por objetivo
verificar a admissibilidade da acusação e verificar se há requisitos mínimos para a
acusação. Os atos dessa fase são quase os mesmos do procedimento ordinário,
apresentando poucas diferenças. São eles:
recebimento da denúncia ou da queixa;
citação do réu;
Interrogatório;
defesa prévia;
oitiva das testemunhas de acusação e de defesa (número máximo de oito).
alegações finais (art. 406 do CPP).Aqui atenção: o prazo é de cinco dias para 142
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cada parte.
P.: As partes são obrigadas a apresentar as alegações do Júri?
R.: O Ministério Público é obrigado a apresentar as alegações devido ao princípio
da indisponibilidade da ação penal. A defesa não tem obrigação de apresentar,
podendo preferir falar sobre o mérito apenas em plenário (é técnica de defesa). No
rito ordinário as partes são obrigadas a apresentar as alegações finais por ser a
última oportunidade de manifestação antes da sentença. No Júri, essa não é a última
manifestação.
Obs.: nessa fase fica proibida a juntada de qualquer documento pelas partes. Novo
documento só será apresentado posteriormente no libelo ou nas contra-razões do
libelo (art. 406, § 2.º, do CPP).
Sentença: nessa fase do processo podem ser proferidos quatro tipos de decisão:
- decisão de pronúncia;
- decisão de impronúncia;
- desclassificação;
- absolvição sumária (depende de reexame necessário é condição de eficácia).
Todas essas decisões podem ser impugnadas através do recurso em sentido estrito
(art. 581, incs. II, IV e VI, do CPP).
4.1. Pronúncia
Trata-se da decisão que entende existir prova da materialidade e indícios suficientes
de autoria. Julga admissível a acusação, submetendo o réu a julgamento pelo Tribunal do
Júri.
“Na fase da pronúncia vigora o princípio in dúbio pro societate, uma vez que há
mero juízo de suspeita, não de certeza. O juiz verifica apenas se a acusação é viável,
deixando o exame mais acurado para os jurados. Somente não serão admitidas acusações
manifestamente infundadas, pois há juízo de mera prelibação”.2
2 CAPEZ, Fernando. Op. cit.143
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Essa decisão, na verdade, não é uma sentença, pois não julga o mérito. Tem a
natureza jurídica de decisão interlocutória mista não-terminativa. O Código de Processo
Penal fala em sentença porque a decisão de pronúncia deve seguir os mesmos requisitos da
sentença (relatório, fundamentação e dispositivo).
O dispositivo da decisão de pronúncia contém o julgamento da admissibilidade da
acusação, da pretensão punitiva (ex.: “... julgo admissível a acusação e pronuncio o réu.”).
A fundamentação não precisa analisar com profundidade o mérito da causa como na
fundamentação da sentença, sob pena de influenciar na decisão dos jurados. Deve ter uma
linguagem comedida e cautelosa para pronunciar, sem referir-se a culpado ou inocente,
pois levaria à nulidade da decisão.
São efeitos da pronúncia:
Submeter o réu a julgamento pelo Júri.
Fixar a classificação jurídica do fato.
Obs.: o art. 416 do Código de Processo Penal permite a mudança da classificação
quando ocorrer circunstância superveniente que altere a mesma. Ex.: o réu é pronunciado
por tentar matar a vítima. A vítima que estava na UTI vem a falecer. O réu deverá ser
julgado por homicídio consumado. Altera-se a pronúncia.
Interromper a prescrição. A Súmula n. 191 do Superior Tribunal de Justiça
determina que a pronúncia é causa interruptiva da prescrição ainda que ocorra a
desclassificação do crime pelo Júri. Essa súmula veio pacificar os
entendimentos, pois alguns defendiam que se os jurados desclassificassem para
o procedimento comum ordinário,onde nada interrompe a prescrição, muitas
vezes o crime já estaria prescrito.
Decretação da prisão, se for o caso (art. 408, § 2.º, do CPP).
Não há mais o lançamento do nome do réu no rol dos culpados. O dispositivo que
determinava essa providência não foi recepcionado pela Constituição Federal em razão do
princípio da presunção de inocência.
O juiz, na pronúncia, pode excluir a qualificadora incluída na denúncia se for
manifestamente improcedente, arbitrária ou se não houver qualquer prova nos autos sobre
ela.
P.: Se a denúncia foi oferecida por homicídio simples, e na instrução apura-se que 144
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
há uma qualificadora, o juiz pode incluir essa qualificadora na pronúncia?
R.: São duas as posições. Para parte da doutrina o juiz pode incluir a qualificadora
na pronúncia aplicando o art. 384 do Código de Processo Penal, mutatio libelli sob pena de
violar a ampla defesa. Já o Supremo Tribunal Federal entende que o juiz pode incluir
qualificadora na pronúncia, independentemente da aplicação do art. 384 do Código de
Processo Penal, por força da regra específica prevista no art. 408, § 4.º, do Código de
Processo Penal.
Essa regra acima analisada também se aplica nas hipóteses de desclassificação de
crime doloso menos grave contra a vida para outro crime doloso mais grave contra a vida.
Ex.: desclassificação de infanticídio para homicídio.
Ao juiz é vedado manifestar-se na pronúncia sobre:
causas de aumento de pena;
causas de diminuição de pena;
circunstâncias agravantes;
circunstâncias atenuantes.
As causas de aumento de pena só serão incluídas no libelo. As circunstâncias
agravantes vão ser incluídas no libelo ou nos debates durante a sessão de julgamento.
A única agravante que deve constar na pronúncia é a reincidência, pois irá interferir
na prisão ou na liberdade do réu.
Conforme dispõe a Súmula n. 21 do Superior Tribunal de Justiça, pronunciado o
réu, fica superada a alegação de excesso de prazo na instrução criminal.
A intimação da decisão de pronúncia varia conforme a situação do réu:
Se o réu está preso, será intimado pessoalmente.
Se o réu está solto, será intimado pessoalmente. Caso não seja encontrado, a
intimação será feita por edital, dependendo da natureza da infração:
- Se o crime é afiançável, a intimação será feita por edital.
- Se o crime é inafiançável, o réu só pode ser intimado pessoalmente. Ficando
o réu em local incerto e não sabido o processo ficará parado até que aquele
seja localizado. Nesse caso, ocorre a chamada crise de instância, isto é, há o
estancamento da marcha processual. Nesse caso, o juiz pode decretar a 145
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prisão preventiva do réu para assegurar a aplicação da lei penal.
4.2. Impronúncia
A decisão de impronúncia julga inadmissível a acusação. Não há prova da
materialidade e nem o menor indício de autoria. A decisão de impronúncia tem natureza
jurídica de decisão interlocutória mista terminativa. Não julga o mérito.
Essa decisão só faz coisa julgada formal. Surgindo novas provas, o processo poderá
ser reaberto se o crime ainda não prescreveu.
Exceção: a decisão de impronúncia fará coisa julgada material nos seguintes casos:
atipicidade do fato (o fato narrado não constitui crime);
comprovação da inexistência material do fato (não houve crime).
No que se refere à competência para o julgamento dos crimes conexos em caso de
desclassificação, há dois entendimentos na doutrina. Alguns defendem que todos os delitos
passarão para a esfera do juiz togado, pois, se o Júri reconhece que não tem competência
para julgar o crime principal, seria um contra-senso que decidisse os demais. Outros
afirmam que, mesmo ocorrendo a desclassificação, o Júri continuaria competente para
julgar os crimes conexos ante o disposto no art. 81, caput, do Código de Processo Penal.
4.3. Despronúncia
É a decisão judicial que revoga uma decisão de pronúncia. Pode ocorrer se houver
interposição de recurso e o tribunal revogar a decisão ou se o próprio juiz da causa, no
juízo de retratação, voltar atrás e impronunciar o réu.
4.4. Desclassificação (art. 410 do Código de Processo Penal)
A desclassificação ocorre quando o juiz do Júri se convence de que o réu não
cometeu um crime doloso contra a vida, e sim cometeu um crime diverso, da competência
do juiz singular.
Se o juiz tiver dúvida entre tentativa de homicídio ou lesão corporal, deverá
pronunciar o réu e deixar que o Júri decida se houve ou não o animus necandi, isto é,
intenção de matar. Visa preservar-se, assim, a competência constitucional do Júri. Se o Júri
decidir que o réu não teve intenção de matar, o processo será remetido ao juiz competente.
O Júri não se manifesta sobre agravantes ou qualificadoras, nem menciona para qual delito 146
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o crime foi desclassificado, caso se manifeste acerca disso, não estará vinculando o juiz,
que será competente.
Atenção: se o juiz do Júri desclassifica o crime e as partes não recorrem (é cabível
recurso em sentido estrito), a decisão transita em julgado e o processo é remetido ao juiz
singular.
Se o juiz singular, ao receber o processo, concluir que o juiz do Júri se equivocou, e
que o réu deveria ter sido pronunciado, qual medida deve tomar? O juiz para o qual o
processo foi remetido nada poderá fazer. Não pode suscitar conflito de competência, pois a
decisão de desclassificação já transitou em julgado. Se ele se convencer que era mesmo o
crime doloso contra a vida, ainda que tentado, deverá absolver o réu.
A desclassificação é decisão interlocutória mista não terminativa.
4.5. Absolvição Sumária
É a absolvição do réu pelo juiz em razão de estar comprovada a existência de causa
de exclusão da ilicitude (ex.: legítima defesa) ou da culpabilidade (ex.: inimputabilidade).
É uma sentença, pois nela há o julgamento do mérito. Faz coisa julgada material.
Para ter eficácia deve ter o reexame necessário.
A Súmula n. 423 do Supremo Tribunal Federal determina que, enquanto não houver
o recurso de ofício, a absolvição não transita em julgado.
P.: se o Juiz tem certeza da excludente de culpabilidade (há laudo que comprova a
inimputabilidade do réu) e tem dúvida sobre a excludente de ilicitude (há dúvida quanto à
legítima defesa) ele deve absolver ou pronunciar o réu?
R.: O Juiz não pode reconhecer a legítima defesa e absolver o réu no sumário da
culpa, pois esta não restou provada. Deverá pronunciar o réu, pois o Júri pode reconhecer a
legítima defesa e absolver o réu. Se o juiz no sumário da culpa reconhecer a excludente de
culpabilidade terá de dar a absolvição imprópria, impondo ao réu uma medida de
segurança. No caso dele pronunciar, o réu terá uma chance de o Júri reconhecer a legítima
defesa e o absolver; ou, na pior das hipóteses, será condenado e receberá uma medida de
segurança pela inimputabilidade já comprovada.
A segunda fase do Júri é denominada juízo da causa ou judicium causae. Inicia-se 147
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com o oferecimento do libelo e termina com a sessão de julgamento. Essa fase julga o
mérito, ou seja, verifica a culpabilidade do acusado.
Obs.: o Módulo XXI tratará desse tema.
MÓDULO XXI
DIREITO PROCESSUAL PENAL
Do Procedimento do Júri
1. JUDICIUM CAUSAE
1.1. Desaforamento
A segunda fase do procedimento do júri, após a sentença de pronúncia, é o juízo da
causa ou judicium causae, o qual inicia-se com o oferecimento do libelo pela acusação.
Durante essa fase é possível que ocorra o pedido de desaforamento (art. 424 do
CPP). Desaforamento é o deslocamento da competência territorial do júri. Somente a
sessão de julgamento é que se desafora. Os demais atos são praticados na Comarca onde
corre o processo.
É impossível o pedido de desaforamento durante o sumário da culpa, pois nessa fase
ainda não há certeza de que haverá julgamento pelo júri. Só a pronúncia transitada em
julgado dá a certeza do julgamento pelo júri.
O desaforamento deve ser sempre para a Comarca mais próxima, desde que nela não
existam os mesmos motivos que ensejaram o desaforamento. Assim, por exemplo, um
crime que causou revolta em toda uma região, não adianta desaforar para uma cidade
vizinha.
São causas do desaforamento:
a) motivos de ordem pública;
b) dúvida a respeito da imparcialidade dos jurados (Atenção: a dúvida não é sobre a
imparcialidade do juiz – essa enseja exceção de impedimento ou suspeição);
c) risco à segurança do réu;
d) quando, passado um ano do recebimento do libelo, o julgamento não tiver se
realizado.
148
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Tem legitimidade para pleitear o desaforamento:
qualquer das partes, por requerimento;
o juiz, por representação; salvo no último caso (d), em que só as partes podem
requerer.
O pedido é formulado no Tribunal de Justiça; a Câmara Criminal com competência
para julgar os recursos do júri irá decidir, ouvindo sempre o Procurador-Geral de Justiça.
O desaforamento pode ser pedido até um dia antes da sessão do julgamento. Por não
ter efeito suspensivo, deve ser requerido o quanto antes.
P.: Concedido o pedido de desaforamento, é possível requerer um segundo
desaforamento?
R.: Sim. É possível novo desaforamento desde que, na nova Comarca, surjam novos
motivos.
Reaforamento é a volta do julgamento para ser realizado pelo Júri da Comarca de
origem, sendo necessário que ali tenham desaparecido os motivos que provocaram o
desaforamento e que novos motivos (problemas que não mais existem na de origem)
tenham surgido na Comarca para onde o julgamento fora remetido. Portanto, em tese,
admite-se o retorno do julgamento para a Comarca de origem.
1.2. Libelo
O libelo é a “peça inaugural do judicium causae, consistente em uma exposição
escrita e articulada do fato criminoso, contendo o nome do réu, as circunstâncias
agravantes e todas as demais que influam na fixação da sanção penal. (...) O libelo é
composto de três partes: introdução, articulado e pedido. Na introdução, consta a menção
ao processo-crime, a designação do acusador, pelo seu cargo, e o nome do réu (exemplo:
‘Por libelo-crime acusatório, diz a Justiça Pública, por seu Promotor de Justiça infra-
assinado, nos autos do processo-crime 428/90, que move contra o réu Ernestino de Souza,
o seguinte: (...)’). No articulado, o fato criminoso e suas circunstâncias vêm expostos em
artigos sintéticos e objetivos (exemplo: ‘Que provará: 1) que o réu efetuou disparos de
arma de fogo contra a vítima, produzindo-lhe os ferimentos descritos no laudo de fls.; 2)
que esses ferimentos foram a causa da morte da vítima; 3) que o réu é reincidente’). No
pedido, a acusação deve requerer a procedência da ação, com o recebimento do libelo e a 149
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
condenação do acusado pelo júri, como incurso no tipo incriminador, pelo qual foi
pronunciado (exemplo: ‘Isto posto, requeiro seja o presente libelo recebido, e o réu levado
a julgamento perante o júri, como incurso no art. 121, caput, do Código Penal, a fim de ser
condenado’)”3.
O libelo é oferecido pela acusação (Ministério Público) somente contra o réu que foi
intimado da decisão de pronúncia. A pronúncia só transita em julgado após a intimação do
réu.
O libelo é totalmente vinculado à pronúncia. Isto é, no libelo o Ministério Público
não pode alterar a classificação jurídica do crime constante na pronúncia. “A pronúncia
condiciona o libelo”. Também não pode o Ministério Público incluir, no libelo,
qualificadora que não conste da pronúncia. Se a acusação não concorda com a pronúncia,
deve recorrer, mas não inovar no libelo.
O Ministério Público pode incluir agravantes no libelo.
P.: Se o Ministério Público não incluir no libelo as agravantes, pode fazê-lo em
momento posterior?
R.: No dia do julgamento, nos debates, a acusação pode alegar as agravantes, mas
não as causas de aumento da pena.
O libelo é uma peça articulada, ou seja, deve ser escrita na forma de artigos. Se
houver mais de um crime na pronúncia, deverá ser elaborada uma série de artigos para
cada crime. Se houver mais de um réu, deve ser realizado um libelo para cada réu.
No libelo, a acusação vai requerer a juntada de documentos, as diligências ainda não
realizadas e apresentar o rol de testemunhas, no máximo cinco, que serão ouvidas em
plenário.
P.: Se o Ministério Público não juntar documentos no libelo, pode requerer a juntada
posteriormente?
R.: Sim. No processo penal é possível a juntada de documentos a qualquer
momento, cientificando a parte contrária. O limite temporal no judicium causae à juntada
3 CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 7.ª ed. São Paulo: Saraiva, 2001. p. 580150
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de documentos é dado pelo art. 475 do Código de Processo Penal. Segundo esse
dispositivo, os documentos a serem exibidos em plenário devem ser juntados e
comunicados à parte contrária com antecedência de, pelo menos, três dias do julgamento.
As testemunhas podem ser arroladas em caráter de imprescindibilidade. A parte que
arrolou a testemunha com esse caráter pode se recusar à realização do julgamento se essa
não comparecer. O julgamento será adiado. Para desistir de testemunha imprescindível no
julgamento, deve haver anuência da parte contrária.
O não-comparecimento da testemunha arrolada em caráter de imprescindibilidade
não impedirá a realização do julgamento, nos seguintes casos:
se a testemunha estiver em lugar incerto e não sabido;
se a testemunha residir em Comarca diversa da jurisdição do Júri.
Prazo para o oferecimento do libelo:
cinco dias (a contar da intimação pessoal para o oferecimento) para o Ministério
Público, na ação penal pública;
dois dias para o querelante, tanto no caso de queixa subsidiária quanto no de
queixa exclusivamente privada.
Se o Ministério Público não oferece o libelo, o juiz não pode mais nomear promotor
ad hoc para apresentá-lo, já que essa figura desapareceu com a Constituição Federal de
1988. Hoje, o juiz utiliza o art. 28 do Código de Processo Penal, por analogia.
Se o querelante não oferecer o libelo, ocorre o seguinte:
na ação penal exclusivamente privada – a perempção;
na ação penal privada subsidiária da pública – o Ministério Público reassume a
ação.
(Observação: pode haver libelo em ação exclusivamente privada, em caso de
litisconsórcio ativo entre querelante e Ministério Público.)
O fenômeno do lançamento do libelo ocorre quando o querelante, na ação penal
privada subsidiária da pública, apresenta o libelo intempestivamente, fora do prazo legal. O
Código de Processo Penal determina que ele seja lançado dos autos (art. 420 do CPP), quer
dizer, seja excluído dos autos. Os autos serão remetidos ao Ministério Público.151
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
Oferecido o libelo, esse será examinado pelo juiz, que poderá ou não recebê-lo.
Caso não o receba, o juiz deverá notificar o Ministério Público para que apresente outro em
48 horas (art. 418 do CPP).
Recebendo o libelo, o juiz, nesse mesmo despacho, deve determinar a entrega de
cópia ao réu em três dias e notificar a defesa para apresentar a contrariedade ao libelo, no
prazo de cinco dias.
A falta da entrega da cópia do libelo ao réu e da notificação para a apresentação da
contrariedade gera nulidade, evidentemente relativa (art. 564, inc. III, “f”, do CPP),
segundo entendimento do Professor Fernando Capez4.
1.3. Contra Libelo
O contra libelo segue as mesmas regras do libelo. Deve ser apresentado no prazo de
cinco dias. A defesa deve requerer a juntada de documentos, a realização de diligências e
apresentar o rol de testemunhas, em número máximo de cinco, que irão depor em plenário.
As testemunhas da defesa também podem ser arroladas em caráter de imprescindibilidade.
Para a defesa é uma peça de apresentação facultativa, assemelhando-se à defesa
prévia. Deve ser dada a oportunidade de apresentação, mas, caso a parte não apresente, não
causa nulidade, porque pode ser uma técnica da defesa só se manifestar em plenário.
1.4. Saneador
Apresentados o libelo e o contra libelo, o juiz determina a realização das diligências
necessárias. Após isso, profere um despacho saneador e marca a data para a sessão de
julgamento.
2. JULGAMENTO EM PLENÁRIO
A sessão de julgamento em plenário é composta pelas seguintes fases:
instalação da sessão;
formação do Conselho de Sentença;
atos instrutórios;
debates;
4 Op. cit. p. 583.152
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
julgamento.
2.1. Instalação da Sessão
Presente o Ministério Público, no dia e na hora designados para a reunião do júri, o
juiz-presidente da sessão verifica se a urna contém as cédulas com os nomes dos 21 jurados
sorteados, e determina que o escrivão faça a chamada. Declarará instalada a sessão se
comparecerem no mínimo 15 jurados. Caso contrário, convoca nova sessão para dia útil
imediato (art. 442 do CPP).
O juiz anuncia o processo que será submetido a julgamento e ordena ao porteiro que
apregoe as partes e as testemunhas.
Observação: Esse é o momento para a argüição de nulidade relativa, ocorrida após a
pronúncia sob pena de convalidação (art. 571, inc. V, do CPP). Se ocorrer nulidade após
esse momento, deverá ser argüida imediatamente a sua ocorrência, sob pena de preclusão
(art. 571, inc. VIII, do CPP).
Apregoado o réu e esse comparecendo, o juiz pergunta-lhe o nome, idade e se tem
advogado. Deverá nomear-lhe curador – se for menor e não o tiver – e defensor, se for
maior. Nesse caso, o julgamento será adiado para o primeiro dia desimpedido.
2.1.1. Ausências
a) Se o réu regularmente intimado não comparece
Ausência justificada: o julgamento é adiado.
Ausência injustificada:
- se a infração for inafiançável, o julgamento somente se realiza com a
presença do réu e, nesse caso, o juiz pode decretar a prisão preventiva para
assegurar a aplicação da lei penal;
- se a infração for afiançável, o julgamento será realizado à revelia do réu.
b) Se o advogado não comparece
Ausência justificada: o julgamento é adiado.
Ausência injustificada: o juiz deverá adiar a sessão de julgamento, 153
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
nomear por cautela um advogado dativo e oficiar à OAB o ocorrido. Se no dia
do novo julgamento o antigo advogado comparecer, é ele quem participa do
julgamento.
c) Se o Ministério Público (acusação) não comparece
Ausência justificada: o julgamento é adiado.
Ausência injustificada: o juiz deverá adiar a sessão de julgamento, oficiar ao
Procurador-Geral da Justiça e comunicar ao substituto automático do promotor.
Não há mais a figura do promotor ad hoc.
d) Se o querelante não comparece
Ausência justificada: o julgamento é adiado.
Ausência injustificada: ocorre a perempção, em caso de ação penal
exclusivamente privada, ou o Ministério Público reassume a titularidade, em
caso de ação penal subsidiária da pública.
e) Se o assistente de acusação não comparece
Sua ausência nunca provoca o adiamento da sessão.
f) Se a testemunha não comparece
Se arrolada em caráter de imprescindibilidade: adia o julgamento, salvo se
estiver em local incerto e não sabido ou for de fora da terra.
Se arrolada sem caráter de imprescindibilidade: não adia o julgamento, mas
pode sofrer condução coercitiva, multa e processo-crime por desobediência.
g) Se o jurado não comparece
Ausência injustificada: sujeita-se ao pagamento de multa.
2.2. Formação do Conselho de Sentença
O juiz, após verificar que se encontram na urna as cédulas relativas aos jurados
presentes, realizao sorteio de sete deles para formarem o conselho de sentença (art. 457 do 154
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
CPP).
Antes do sorteio, o juiz adverte os jurados dos impedimentos do Júri. No mesmo
conselho de sentença, são impedidos de servir marido e mulher, ascendente e descendente,
sogro e genro ou nora, irmãos, cunhados durante o cunhadio, tio e sobrinho, padrasto ou
madrasta e enteado. Também advertirá sobre as incompatibilidades legais por suspeição –
parentesco com o juiz, promotor, advogado, réu ou com a vítima (art. 458 do CPP).
Caso exista impedimento por parentesco, servirá ao júri aquele que houver sido
sorteado em primeiro lugar.
Conforme a Súmula n. 206 do Supremo Tribunal Federal, é nulo o julgamento
ulterior por júri do qual participe jurado que tenha tomado parte em julgamento anterior
do mesmo processo.
Na medida em que as cédulas vão sendo abertas, a defesa, e depois a acusação,
podem recusar os jurados sorteados. Recusa motivada, isto é, com fundamento em
impedimento ou suspeição, as partes podem fazer quantas recusas forem necessárias. Já a
recusa imotivada ou peremptória, isto é, sem qualquer justificativa ou fundamento, cada
parte só tem direito a três.
A recusa de jurado pode provocar a cisão do julgamento. Existindo dois ou mais
réus, com diferentes defensores, se um defensor aceita um jurado e o outro o recusa,
havendo aceitação desse jurado pela acusação (Ministério Público), o julgamento será
cindido. Só haverá o julgamento de um réu; o outro réu terá seu julgamento adiado.
Se o jurado, aceito por um defensor e recusado por outro, também for rejeitado pelo
Ministério Público, será excluído, e não haverá cisão do julgamento.
Escolhidos os sete jurados, o juiz faz a seguinte exortação: “Em nome da lei,
concito-vos a examinar com imparcialidade essa causa e a proferir a vossa decisão,
conforme a vossa consciência e os ditames da Justiça.” Os jurados prometem e estarão
compromissados. A partir desse momento, passa a vigorar a incomunicabilidade dos
jurados.
A incomunicabilidade não significa mudez. Os jurados podem conversar entre si,
desde que não seja sobre o processo. Não podem conversar com terceiros estranhos ao
processo; a comunicação com o mundo exterior ocorre somente via oficial de justiça. Tal
medida visa garantir o sigilo das votações.155
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2.3. Atos Instrutórios
O juiz-presidente inicia os trabalhos com o interrogatório do réu. Nesse
interrogatório, além do juiz-presidente, os jurados também podem fazer perguntas ao réu.
Em seguida, o juiz elabora um relatório do processo, com os fatos, as provas e as
conclusões das partes. É um resumo de todo o processo e destina-se aos jurados (art. 466
do CPP). Se requerida pelas partes, ou por jurado, o escrivão fará a leitura das principais
peças do processo (art. 466, § 1.º, do CPP). A leitura deve ser feita sem qualquer
entonação.
Inicia-se a oitiva das testemunhas. Primeiro, são inquiridas as testemunhas de
acusação e a vítima, se o crime foi tentado. O juiz, os jurados, a acusação (parte que
arrolou) e a parte contrária fazem as perguntas. Segue-se a inquirição das testemunhas de
defesa. O juiz, os jurados, a defesa (parte que arrolou) e a parte contrária fazem as
perguntas. As partes fazem a inquirição da testemunha diretamente.
Após ser inquirida, a testemunha deve permanecer incomunicável até o final do
julgamento, salvo se for dispensada pelas partes. Isso porque o Código de Processo Penal
permite a reinquirição da testemunha a qualquer momento, até na tréplica.
2.4. Debates
Terminada a inquirição das testemunhas, o promotor lerá o libelo e os dispositivos
da lei penal em que o réu se acha incurso e produzirá a acusação. Concluída a acusação, o
defensor terá a palavra, para a defesa. O tempo será de duas horas para cada parte.
Havendo mais de um réu, o tempo será acrescido em uma hora.
Encerrada a fala da defesa, o juiz indagará à acusação se fará uso da réplica. Em
caso positivo, a defesa terá direito a tréplica. O tempo será de 30 minutos para cada um.
Havendo mais de um réu, o tempo será acrescido em mais 30 minutos.
A defesa não pode inovar sua tese no momento da tréplica devido ao princípio do
contraditório. Se inovar, essa tese não será quesitada.
Se a acusação for composta pelo promotor e pelo assistente de acusação, eles
deverão combinar entre si a distribuição do tempo. Não havendo acordo, o juiz marcará o
tempo de cada um, não excedendo o limite previsto em lei.156
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Apartes são as intervenções que uma parte faz na fala da outra. Não estão previstos
em lei. Segundo a jurisprudência, são possíveis desde que exista concordância do orador o
aparte seja de forma cordial e não vise atrapalhar o orador.
2.5. Julgamento
Após os debates, o juiz pergunta aos jurados se eles estão habilitados a julgar ou se
precisam de mais esclarecimentos (art. 478 do CPP). Esses esclarecimentos devem
relacionar-se somente com matéria de fato.
Em seguida, o juiz lê os quesitos e explica a significação legal de cada um. Indaga
se os jurados têm algum requerimento ou alguma reclamação a fazer. O juiz, então,
anuncia que vai se proceder ao julgamento, determina que o réu seja retirado e convida os
demais circunstantes a deixarem a sala.
O juiz, os jurados, o promotor, o advogado, o escrivão e dois oficiais de justiça
dirigem-se à sala secreta. Os jurados passam à votação dos quesitos sob a presidência do
juiz. O jurado vota sim ou não, sem qualquer discussão ou fundamentação, em razão do
sigilo das votações. Se a resposta a qualquer dos quesitos estiver em contradição com outra
já proferida, o juiz, explicando aos jurados em que consiste a contradição, submeterá
novamente à votação os respectivos quesitos. O veredicto apura-se por maioria.
2.6. Quesitação
(Atenção: assunto muito perguntado na fase oral!)
Quesitação é o questionário; são as perguntas feitas pelo juiz aos jurados, que
deverão responder sim ou não. É elaborado com base no libelo, no contra libelo, no
interrogatório e nos debates. Como no júri vige a defesa plena, todas as teses devem ser
quesitadas, ainda que incompatíveis. Haverá um questionário para cada réu, e uma série de
quesitos para cada crime.
Conforme a Súmula n. 156 do Supremo Tribunal Federal, é causa de nulidade
absoluta do julgamento a falta de quesito obrigatório. Também a Súmula n. 162 do
Supremo Tribunal Federal determina que é causa de nulidade absoluta do julgamento se os
quesitos da defesa não precederem os quesitos das agravantes (a jurisprudência também
inclui as qualificadoras).157
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A ordem dos quesitos ocorre da seguinte forma:
Os relativos ao fato principal, ao fato imputado ao réu (autoria e materialidade).
Os relativos à letalidade. (Exemplo: "As lesões efetuadas pelo réu foram letais,
causaram a morte?" ou ânimo homicida do réu (se o crime foi tentado).
Os relativos às teses de defesa (Súmula n. 162 do STF). Todas as teses devem
ser quesitadas, na seguinte ordem:
- teses que podem levar à desclassificação;
- teses relativas às excludentes de ilicitude (nesse caso, deve haver quesito
sobre a existência ou não do excesso doloso ou culposo);
- se alegada a legítima defesa, cada requisito deve ser quesitado,. como, por
exemplo, "O réu defendia direito próprio? Defendia-se de agressão injusta?
Utilizou-se dos meios necessários?".
- teses sobre o privilégio.
Os relativos à existência de qualificadoras.
Os relativos à existência de causas de aumento ou diminuição.
Os relativos à existência de agravantes e atenuantes.
Observações:
Ainda que não se alegue a existência de circunstâncias atenuantes, o juiz deverá
elaborar um quesito genérico da atenuante, sob pena de nulidade absoluta.
Exemplo: "Existe alguma atenuante em favor do réu?".
Se os jurados reconhecerem que o réu agiu em legítima defesa, o juiz deve fazer
os quesitos sobre o excesso. Se os jurados reconhecerem a existência do
excesso, surgem dois caminhos:
- reconhecem o excesso culposo: desclassificam o delito para homicídio
culposo;
- reconhecem o excesso doloso: continua o homicídio doloso. O juiz
prossegue nos quesitos.
Se os jurados reconhecerem a existência de privilégio, ficam prejudicados os
quesitos referentes às qualificadoras subjetivas. Reconhecido o privilégio, 158
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somente podem ser formuladas perguntas sobre as qualificadoras objetivas.
No crime de aborto é necessário elaborar um quesito autônomo a respeito da
existência da gravidez. No crime de infanticídio é necessário elaborar um
quesito autônomo sobre a existência do estado puerperal.
Em se tratando de concurso de agentes no crime de homicídio, o primeiro
quesito será elaborado de forma não-individualizada. Exemplo: "Terceira
pessoa efetuou os disparos?". A participação do réu só será indagada no quesito
seguinte, de forma detalhada. Exemplo: "O réu é o mandante do crime? O réu é
o autor intelectual do delito? O réu teve contribuição para a consumação do
delito?".
2.7. Desclassificação no Júri
Se os jurados desclassificam o crime, o julgamento desse crime competirá ao juiz-
presidente do júri (arts. 74, § 3.º, e 492, §2.º, do CPP).
A desclassificação pode ser:
própria: ocorre quando os jurados desclassificam a infração sem estabelecer a
tipificação do fato; o juiz-presidente tem liberdade para definir a infração e
julgar o fato;
imprópria: ocorre quando, na desclassificação pelos jurados, fica estabelecido o
enquadramento do fato, cabendo ao juiz-presidente apenas a aplicação da pena.
Exemplos de desclassificação:
Quesito: O réu agiu com imprudência?
R: Sim.
Agiu com culpa, homicídio culposo. Desclassificação imprópria, ao juiz resta
aplicar a pena.
Quesito: O réu iniciou a sua conduta visando um resultado que não se consumou por
circunstâncias alheias à sua vontade?
R: Não.
O réu não tinha o animus necandi (dolo de matar). Desclassificação própria, o juiz 159
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vai tipificar a conduta e aplicar a pena.
P.: Se o júri absolve o réu de crime doloso contra a vida, a quem compete julgar os
crimes conexos?
R.: Na doutrina predomina o entendimento que os crimes conexos serão julgados
pelo júri. Se houve absolvição é porque os jurados conheceram o mérito. Se foram
competentes para julgar o crime doloso, também o são para julgar os crimes conexos.
Ocorre a perpetuatio jurisdiciones (art. 81 do CPP). Na jurisprudência, a questão é mais
dividida. Há tendência a serem julgados pelo juiz-presidente em razão de aplicação
analógica do art. 492, § 2.º, do Código de Processo Penal.
a) Desclassificação no júri para a infração de menor potencial ofensivo
Exemplo: tentativa de homicídio, desclassificada para lesão corporal dolosa leve ou
lesão corporal culposa. Segundo a doutrina, deve-se aguardar o trânsito em julgado
da desclassificação e remeter o processo ao Juizado Especial Criminal (art. 98 da
CF/88). Há precedentes do Supremo Tribunal Federal acolhendo essa posição.
b) Desclassificação de crime militar
Exemplo: no júri, o advogado, sem negar a autoria, sustenta que não houve dolo
eventual, mas sim culpa imprópria. O crime de homicídio culposo praticado por militar em
serviço é da competência da justiça militar. A justiça comum é incompetente para julgar
esse delito. Deve o juiz aguardar o trânsito em julgado da desclassificação e remeter o caso
para a justiça militar, sob pena de violar regra constitucional de competência.
2.8. Sentença
“Encerrada a votação e assinado o termo referente às respostas dos quesitos, o juiz
deverá proferir a sentença.
No caso de absolvição, o juiz deve colocar o réu imediatamente em liberdade, salvo
se estiver preso por outro motivo.”5
5 CAPEZ, Fernando. Op. cit. p. 590160
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2.9. Atribuições do Juiz-presidente na Sessão de Julgamento (art. 497 do CPP)
(Observação: é obrigatória a leitura desse artigo antes de uma prova.)
As atribuições do juiz-presidente na sessão de julgamento são:
regular os debates. Para isso o Código de Processo Penal lhe concede o poder de
polícia;
interromper a sessão de julgamento, por tempo razoável, para repouso ou
refeição dos jurados;
dissolver o conselho de sentença, caso constate que o réu está indefeso;
resolver todas as questões de direito que não dependam do julgamento dos
jurados (exemplos: preliminares, eventuais nulidades invocadas (quando o réu
completa 70 anos, o prazo da prescrição cai pela metade);
determinar de ofício, ou a requerimento, a realização de diligências
consideradas imprescindíveis. Essas diligências, de preferência, devem ser
realizadas de imediato, sem dissolver o conselho de sentença; se não for
possível, deve dissolver o conselho e marcar novo júri.
MÓDULO XXII
DIREITO PROCESSUAL PENAL
1. DAS NULIDADES
1.1. Conceito
Nulidade é a sanção cominada pelo ordenamento jurídico ao ato praticado em
desrespeito às formalidades legais.
Ao estabelecer as formalidades, o legislador quer garantir que o réu tenha ciência da
acusação, que seja citado regularmente e que esteja sendo a ele oferecida a oportunidade
de defesa. São normas de Direito Público.
O Código de Processo Penal, em seus artigos 563 a 573, trata das nulidades.
(Atenção: é obrigatória a leitura desses artigos antes da realização das provas.)
O artigo 564 do Código de Processo Penal apresenta o rol das nulidades; todavia,
algumas nulidades relativas constantes desse rol, em razão da Constituição Federal de 161
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1988, estão desatualizadas – deveriam ser nulidades absolutas. Além disso, as hipóteses de
nulidades deveriam ser verificadas, no caso concreto, pelo juiz.
As nulidades podem ser absolutas ou relativas. Ao lado delas, existem algumas
situações em que o vício é tão grave que gera a inexistência do ato. Em outras situações, o
desatendimento da formalidade é incapaz de gerar qualquer prejuízo ou anular o ato, pois
trata-se de mera irregularidade.
1.2. Diferenças entre Nulidades Absolutas e Relativas
1.2.1. Quanto ao fundamento
A nulidade absoluta ocorre quando a regra violada houver sido instituída para
resguardar, predominantemente, o interesse público.
A nulidade relativa ocorre quando a regra violada houver sido instituída para
resguardar, predominantemente, o interesse das partes.
Sempre que ocorrer a violação a um princípio constitucional, a nulidade será
absoluta. Para alguns autores, se a ofensa for muito grave, o ato será inexistente.
1.2.2. Quanto ao prejuízo
A nulidade relativa exige demonstração do prejuízo.
Na nulidade absoluta, o prejuízo é presumido.
1.2.3. Quanto ao momento de argüição
A nulidade relativa deve ser argüida no momento oportuno, sob pena de preclusão.
Cada procedimento tem um momento último para a argüição. Conforme o artigo 571 do
Código de Processo Penal, as nulidades devem ser argüidas nos seguintes momentos:
Procedimento Ordinário: até as alegações finais (inciso II).
Procedimento do Júri: as que ocorrerem no sumário da culpa, até as alegações
do Júri (inciso I); as que ocorrerem posteriormente, depois de anunciado o
julgamento e apregoadas as partes (inciso V); e as do julgamento em plenário,
logo depois que ocorrerem (inciso VIII).162
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A nulidade absoluta pode ser reconhecida a qualquer tempo e em qualquer grau de
jurisdição. Exceção: conforme a Súmula n. 160 do Supremo Tribunal Federal, “é nula a
decisão do tribunal que acolhe, contra o réu, nulidade não argüida no recurso da acusação,
ressalvados os casos de recurso de ofício”.
1.2.4. Quanto ao interesse
As nulidades relativas dependem de provocação pela parte interessada, no momento
oportuno.
As nulidades absolutas não precisam de provocação; o próprio juiz pode reconhecer
de ofício, salvo a exceção da Súmula n. 160 do Supremo Tribunal Federal.
1.3. Inexistência e Irregularidade
Inexistência é a sanção mais grave que pode ser cominada a um ato processual. Para
a doutrina, não se trata de ato processual inexistente, mas sim de um não-ato ou ato
processual atípico por não se enquadrar no modelo legal.
Ocorre quando o ato não reúne elementos essenciais para existir. É a violação
frontal da regra constitucional que gera a inexistência. Ex.: um processo por crime eleitoral
que tramitou na Justiça Militar.
Para o Professor Tourinho, a violação de qualquer regra constitucional que trate de
competência torna o ato inexistente. Já, para a jurisprudência, trata-se de nulidade absoluta.
Característica própria da inexistência: se o ato for inexistente, não produz efeitos,
independente de declaração judicial.
Na nulidade absoluta o ato produz efeitos até que seja declarado nulo. Enquanto isso
não ocorrer, produz efeitos.
Exemplos:
sentença sem relatório: nulidade absoluta;
sentença sem fundamentação: nulidade absoluta;
sentença sem dispositivo: inexistente;
sentença proferida por juiz em férias ou aposentado: inexistente, por não ter 163
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jurisdição;
sentença proferida por juiz suspeito: nulidade absoluta;
sentença proferida por juiz impedido: inexistente.
Ocorre irregularidade sempre que a formalidade desrespeitada for considerada
inócua. Tal desrespeito é incapaz de gerar prejuízo, seja para a acusação, seja para a
defesa. O ato produz seus efeitos normalmente.
Exemplos: falta de leitura do libelo no início da fala da acusação; falta de
compromisso pelo perito louvado ou particular (o perito oficial é funcionário e, ao tomar
posse, já assume esse compromisso); oferecimento de denúncia fora do prazo legal (5 dias
para o réu preso e 15 para o solto) acarreta o relaxamento da prisão em flagrante, mas a
denúncia em si é válida.
2. PRINCÍPIOS DAS NULIDADES
2.1. Prejuízo
Não há nulidade se não houver prejuízo (artigo 563 do CPP). Esse princípio aplica-
se à nulidade relativa, na qual precisa ser demonstrado o prejuízo, pois, na nulidade
absoluta, esse é presumido.
No processo penal, a falta de defesa acarreta a nulidade absoluta e a defesa
deficiente produz nulidade relativa (ver a Súmula n. 523 do Supremo Tribunal Federal).
Exemplo: réu não tem defensor constituído e o juiz não nomeia um defensor dativo, ou
esse é nomeado e nada faz no processo; ; o réu fica indefeso, acarretando nulidade
absoluta.
2.2. Interesse
Ninguém pode alegar nulidade que só interesse à parte contrária (artigo 565 do
CPP). Esse princípio só se aplica à nulidade relativa, pois a absoluta pode ser alegada por
qualquer pessoa.
Ninguém pode argüir nulidade para a qual tenha concorrido ou dado causa. Como
exceção o Ministério Público pode argüir nulidades que interessem somente à defesa.164
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
2.3. Instrumentalidade das Formas
Não se declara a nulidade de ato que não influiu na apuração da verdade real e na
decisão da causa (artigo 566 do CPP) e também de ato que, apesar de praticado de forma
diversa da prevista, atingiu sua finalidade (artigo 572, inciso II, do CPP).
2.4. Causalidade ou Conseqüencialidade
Segundo o artigo 573, § 1.º, do Código de Processo Penal: “A nulidade de um ato,
uma vez declarada, causará a dos atos que dele diretamente dependam ou sejam
conseqüência”. Todos os atos visam a sentença; os atos processuais são entrelaçados entre
si. Assim, se um ato é nulo, os demais que dele dependam também o serão.
O juiz deve declarar expressamente quais são os atos contaminados.
A Professora Ada Pellegrini Grinover estabelece duas regras úteis para saber se há
contaminação dos atos subseqüentes:
A nulidade dos atos da fase postulatória, como regra, anula todo o processo.
Exemplo: nulidade na denúncia, citação.
A nulidade de atos da fase instrutória, via de regra, não contamina os demais
atos da mesma fase processual. Exemplo: laudo elaborado por um só perito.
Observação: tribunal reconhecer a nulidade relativa, ela deve ser apresentada nas
alegações finais (artigo 500 do CPP). Apenas será anulada a sentença; a inquirição de
testemunhas não precisa ser anulada.
2.5. Convalidação
Todas as nulidades no processo penal admitem convalidação, até mesmo as
absolutas. Somente as nulidades relativas precluem se não argüidas no momento oportuno.
Entretanto, existem outras formas de convalidação além da preclusão. O Código de
Processo Penal elenca três formas de convalidação:
Ratificação: prevista no artigo 568 do Código de Processo Penal. É uma maneira
de se convalidar a nulidade decorrente de ilegitimidade de parte. Se a parte
legítima comparecer e ratificar os atos anteriormente praticados, a nulidade se 165
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
convalida.
A ilegitimidade pode ser: ad causae ou ad processum.
- Ilegitimidade ad causae: Exemplo: o Ministério Público oferece denúncia em
crime de ação penal privada.
- Ilegitimidade ad processum: Exemplo: a queixa na ação penal privada é
apresentada pela vítima menor de 21 anos ou por um terceiro que não é o representante
legal da vítima.
A ratificação só é possível na ilegitimidade ad processum tratando-se essa de
nulidade relativa.
Suprimento: de acordo com o artigo 569 do Código de Processo Penal “As
omissões da denúncia ou da queixa, ... poderão ser supridas a todo o tempo,
antes da sentença final.” É a maneira de se convalidar possíveis omissões
constantes na denúncia ou na queixa.
Substituição: segundo o artigo 570 do Código de Processo Penal é a maneira de
convalidar nulidades da citação, intimação ou notificação. Exemplo: réu
processado é procurado em um dos seus endereços, mas não é encontrado. Em
vez de procurá-lo nos demais endereços, o juiz ordena a citação por edital. No
dia do interrogatório, o réu comparece para argüir a nulidade da citação.
Convalesce o vício e é aberto novo prazo para apresentação da defesa. A medida
deveria ter sido realizada de uma forma, mas foi substituída por outra.
3. NULIDADES EM ESPÉCIE
O artigo 564 do Código de Processo Penal apresenta os seguintes casos de nulidade:
I – Por incompetência, suspeição ou suborno do juiz;
Incompetência
Competência é a medida da jurisdição.
A competência em razão da jurisdição (comum ou especializada), da hierarquia e da
matéria, assim como a competência recursal, são hipóteses de competência absoluta,
imodificáveis pelas partes (questões de ordem pública). A não-observância dessas regras
de competência acarreta nulidade absoluta do processo; o vício não se convalida, podendo
ser reconhecido a qualquer tempo, de ofício, independentemente da demonstração do 166
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prejuízo.
A competência em razão do foro territorial, por ser relativa, depende de argüição da
parte, sob pena de preclusão, com a prorrogação da competência. Nesse caso, o vício é
sanável.
Sendo reconhecida a incompetência relativa, serão anulados apenas os atos em que
exista decisão de mérito.
Suspeição e suborno do juiz
O impedimento no processo penal é gerador de inexistência e não somente de
nulidade dos atos praticados. A suspeição acarreta a nulidade absoluta do ato. O juiz deve
declarar-se suspeito ou impedido quando for o caso; se não o fizer, o vício pode ser argüido
por qualquer das partes (artigo 112 do CPP). “Não aceitando a argüição, o juiz mandará
autuar em apartado a petição; dará a sua resposta dentro de três dias, podendo instruí-la e
oferecer testemunhas, e, em seguida, determinará sejam os autos da exceção remetidos,
dentro de vinte e quatro horas, ao juiz ou tribunal a quem competir o julgamento (CPP,
artigo 100). Julgada procedente a exceção de suspeição, ficarão nulos todos os atos
praticados (CPP, artigo 101)”6.
O suborno ou peita é a pratica dos crimes de concussão (artigo 316 do CP),
corrupção passiva (artigo 317 do CP) e corrupção ativa (artigo 333 do CP). Também é
causa geradora da nulidade absoluta do ato.
II – Por ilegitimidade de parte;
A ilegitimidade pode ser:
Ad Causam: o autor não é o titular da ação ajuizada, ou o réu não pode integrar a
relação jurídica processual (por ser inimputável, ou por não ter evidentemente
concorrido para a prática do fato típico e ilícito). O vício jamais se convalida
nesse caso; trata-se de nulidade absoluta e insanável.
Ad Processum: é a falta da capacidade postulatória do querelante (exemplo: o
querelante leigo assina sozinho a queixa-crime), ou é sua incapacidade para estar
em Juízo (exemplo: o ofendido, menor de 18 anos, ajuíza a ação privada sem
estar representado por seu representante legal). Essa nulidade pode ser sanada
6 CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 7.ª ed. São Paulo: Saraiva, 2001. p. 624.167
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
pela ratificação dos atos processuais (artigo 568 do CPP). Configura nulidade
relativa.
III – Por falta das fórmulas ou dos termos seguintes;
Falta do preenchimento dos requisitos no oferecimento da denúncia ou queixa
(artigo 41 do CPP), na representação do ofendido ou na requisição do Ministro
da Justiça.
Falta de exame de corpo de delito nos delitos não-transeuntes, isto é, aqueles que
deixam vestígios. “A jurisprudência não tem pronunciado essa nulidade ante a
falta do exame de corpo de delito, direto ou indireto, optando por absolver o réu,
por insuficiência de provas. Entendemos, contudo, que, mesmo não tendo sido
realizado o exame pericial, caso sua elaboração ainda seja possível, deve o juiz
determiná-la, nos termos dos artigos 156, parte final, e 502 do Código de
Processo Penal, ao invés de simplesmente proferir a decisão absolutória, sob
pena de ser nula a sentença, nos termos do artigo 564, III, “b”. Nesse sentido:
STF, RT 672/388”7.
Falta de nomeação de defensor ao réu presente, que não o tiver, ou ao ausente, e de
curador ao réu menor de 21 anos (artigo 261 do CPP). O entendimento
dominante é o de que a falta de nomeação de curador causa nulidade relativa;
no entanto, o Superior Tribunal de Justiça já se manifestou em sentido contrário.
A falta de nomeação de defensor configura nulidade absoluta.
Falta de intervenção do Ministério Público em todos os termos da ação penal
pública ou subsidiária.
Falta ou nulidade de citação do réu para se ver processar. A falta ou nulidade da
citação ficará sanada desde que o interessado compareça antes de o ato
consumar-se (artigo 570 do CPP). A citação em hora certa, no processo penal, é
causa de nulidade absoluta.
Falta do interrogatório do acusado.
Falta de concessão de prazo para a defesa prévia, para o oferecimento de alegações
finais, ou para a realização de qualquer ato da acusação ou da defesa.
7 CAPEZ, Fernando. Op. cit. p. 632.168
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Falta de sentença.
São causas de nulidade no procedimento do Júri:
a) Falta, omissão ou irregularidade na sentença de pronúncia, no libelo ou na
entrega de cópia do libelo ao réu.
b) Falta de intimação do réu para julgamento no Júri.
c) Falta de intimação de testemunhas arroladas no libelo ou na contrariedade.
d) Presença de pelo menos 15 jurados para a constituição do Júri.
e) Falta ou irregularidade no sorteio dos jurados.
f) Quebra na incomunicabilidade dos jurados.
IV – Por omissão de formalidade que constitua elemento essencial do ato.
Formalidade essencial é aquela sem a qual o ato não atinge a sua finalidade.
Exemplo: a denúncia que não descreve o fato com todas as suas circunstâncias.
Pelo princípio da instrumentalidade das formas, não se anula o processo por falta de
formalidade irrelevante.
Observação: contra a decisão que anula o processo no todo ou em parte, em virtude
de nulidade relativa ou absoluta, cabe recurso em sentido estrito (artigo 581, inciso XIII, do
CPP).
MÓDULO XXIII
DIREITO PROCESSUAL PENAL
Recursos
1. RECURSOS
1.1. Introdução
O Professor Fernando Capez8 ensina que: “recurso é a providência legal imposta
ao juiz ou concedida à parte interessada, consistente em um meio de se obter nova
apreciação da decisão ou situação processual, com o fim de corrigi-la, modificá-la ou
8 CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 7.ª ed. São Paulo: Saraiva, 2001. p. 384.169
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
confirmá-la. Trata-se do meio pelo qual se obtém o reexame de uma decisão”.
1.2. Características
O recurso é meio voluntário; é extensão do direito de ação. O Poder Judiciário só
atua se provocado. Ao prolatar a sentença, o órgão jurisdicional entrega a prestação
tornando-se inerte. Logo, para que volte a apreciar a questão, deve ser provocado
novamente com a interposição de um recurso. A inércia da jurisdição é a garantia da
imparcialidade.
O princípio da voluntariedade do recurso é mitigado pelo recurso de ofício (recurso
obrigatório, recurso necessário), ou seja, o juiz deve interpor recurso da decisão.
A natureza jurídica do reexame necessário é uma condição de eficácia da decisão,
não transitando em julgado a sentença em que tiver sido omitido.
O artigo 574 do Código de Processo Penal estabelece: “Os recursos serão
voluntários, excetuando-se os seguintes casos, em que deverão ser interpostos de ofício,
pelo juiz:
I – da sentença que conceder habeas corpus;
II – da que absolver desde logo o réu com fundamento na existência de
circunstância que exclua o crime ou isente o réu de pena, nos termos do artigo 411."
Há outras hipóteses de cabimento de recurso de ofício, além das mencionadas no
artigo 574 do Código de Processo Penal:
sentenças absolutórias referentes aos crimes contra a economia popular ou
a saúde pública;
despachos que determinarem o arquivamento dos autos do inquérito
policial referentes a esses crimes;
indeferimento in limine da revisão pelo relator que dará recurso para as
câmaras reunidas ou para o tribunal (artigo 625, § 3.º, do Código de Processo
Penal);
decisão que conceder a reabilitação.
170
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
1.3. Classificação dos Recursos
1.3.1. Quanto ao conteúdo
Total ou pleno: quando se questiona toda a decisão. O órgão ad quem reexaminará
toda a decisão.
Parcial ou restrito: quando se questiona apenas parte da decisão. Será reexaminada
pelo tribunal apenas a parte impugnada.
1.3.2. Quanto às fontes informativas
Constitucionais: previstos pela Constituição Federal com a finalidade de levar
aos tribunais superiores o conhecimento ou a defesa dos direitos fundamentais do
indivíduo.
Legais: previstos no Código de Processo Penal e nas leis processuais especiais.
Regimentais: instituídos nos regimentos dos tribunais.
1.3.3. Quanto à motivação
Ordinário: é o recurso que visa à defesa de um direito subjetivo. Baseia-se no mero
inconformismo.
Extraordinário: é o recurso que possui requisitos próprios, como, por exemplo,
protesto por novo júri.
Pressupostos Recursais
Pressupostos recursais são os requisitos de admissibilidade que o recurso deve
possuir.
1.4.1. Pressupostos objetivos
a) Cabimento
O recurso deve estar previsto em lei.
b) Adequação
Não basta que o recurso esteja previsto em lei; é necessário que seja adequado à 171
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
decisão que se deseja impugnar. Esse pressuposto confere lógica ao sistema recursal.
Cada decisão, em regra, só comporta um recurso, em face da aplicação do princípio
da unirrecorribilidade das decisões. Esse princípio, da irrecorribilidade das decisões, é
mitigado por algumas exceções legais, como, por exemplo, protesto por novo júri pelo
crime doloso contra a vida e apelação pelo crime conexo; interposição simultânea de
recurso extraordinário ao Supremo Tribunal Federal e de recurso especial ao Superior
Tribunal de Justiça.
P.: Qual a conseqüência para a parte que interpõe recurso incorreto?
R.: O recurso, ainda que inadequado, pode ser recebido e conhecido pelo princípio
da fungibilidade. É exceção ao princípio da adequação (artigo 579 do Código de Processo
Penal). Portanto, o recurso, mesmo equivocado, deve ser oferecido dentro do prazo correto
e que não esteja de má-fé o recorrente.
c) Regularidade formal
O Código de Processo Penal estabelece a forma segundo a qual o recurso deve ser
interposto. São formalidades legais para o recurso ser recebido. Ex.: a apelação pode ser
interposta por petição ou por termo nos autos.
d) Tempestividade
O recurso deve ser interposto no prazo legal. Os prazos começam a correr a partir do
primeiro dia útil após a intimação, e, conforme prevê a Súmula n. 310 do Supremo
Tribunal Federal: “quando a intimação tiver lugar na sexta-feira, ou a publicação com
efeito de intimação for feita nesse dia, o prazo judicial terá início na segunda-feira
imediata, salvo se não houver expediente, caso em que começará no primeiro dia útil que
se seguir”.
No caso de carta precatória, o prazo é contado a partir da juntada da carta aos autos
do processo.
e) Ausência de fatos impeditivos ou extintivos do direito de recorrer172
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
Fatos impeditivos são aqueles que impedem a interposição do recurso ou seu
recebimento, quais sejam:
Renúncia: é ato de disposição, ou seja, abre-se mão do direito de recorrer. É diferente
de deixar escoar o prazo sem interpor recurso. Na renúncia há manifestação expressa
nesse sentido.
O Ministério Público não pode renunciar.
A renúncia antecipa o trânsito em julgado.
P.: Em sentença condenatória, o defensor e o réu têm de ser intimados da sentença e
ambos podem interpor recurso. Se houver divergência de vontades, um deles quer
renunciar e o outro não, qual prevalece?
R.: Na doutrina, prevalece entendimento de que a vontade do acusado deve
prevalecer sobre a do defensor. Na jurisprudência, sustenta-se que prevalece a vontade
técnica do defensor. Há, no entanto, entendimento que sustenta prevalecer a vontade
daquele que quer recorrer, com base na garantia da ampla defesa.
Não recolhimento à prisão nos casos previstos em lei (artigo 594 do Código de
Processo Penal).
Fatos extintivos são fato supervenientes à interposição do recurso:
Desistência: é ato de disposição, porém sempre posterior à interposição do recurso.
O Ministério Público não pode desistir dos recursos interpostos (artigo 576 do
Código de Processo Penal).
Deserção: ato de abandonar o recurso. Pode ocorrer pelo não pagamento das custas
processuais (artigo 806, § 2.º, do Código de Processo Penal).; ou pela fuga do réu no
caso de apelação, sempre quando for negada a possibilidade de apelar em liberdade.
1.4.2. Pressupostos subjetivos
a) Legitimidade
A legitimidade refere-se às partes legítimas para interposição do recurso (artigo 577 173
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
do Código de Processo Penal).
b) Interesse jurídico
O interesse deriva da sucumbência. A sucumbência ocorre sempre que a parte teve
frustrada alguma expectativa legítima. Estabelece o parágrafo único do artigo 577 do
Código de Processo Penal: “não se admitirá, entretanto, recurso da parte que não tiver
interesse na reforma ou modificação da decisão”.
2. APELAÇÃO
2.1. Conceito
O Professor Fernando Capez9 ensina que apelação é: “recurso interposto da sentença
definitiva ou com força de definitiva, para a segunda instância, com o fim de que se
proceda ao reexame da matéria, com a conseqüente modificação parcial ou total da
decisão”.
2.2. Classificação
2.2.1. Quanto à extensão
Ampla ou plena: devolve o conhecimento pleno de toda a matéria decidida.
Restrita, limitada ou parcial: impugna tópicos da sentença; pede-se apenas o
reexame de parte da decisão.
O que fixa a extensão da apelação é o ato de interposição. Caso isso não ocorra
entende-se que a apelação foi total.
2.2.2. Quanto ao procedimento
Ordinária: ocorre nos casos de apelação de crimes punidos com reclusão (artigo
613 do Código de Processo Penal).
Sumária: ocorre nas contravenções e nos crimes punidos com detenção.
9 Op. cit. p. 403.174
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
2.3. Hipóteses de Cabimento da Apelação
2.3.1. Decisões proferidas por juiz singular
São hipóteses em que cabe a apelação:
decisões definitivas de condenação ou absolvição;
decisões definitivas, ou com força de definitivas, proferidas por juiz singular nos
casos não previstos no artigo 581 do Código de Processo Penal, pois a apelação
tem caráter subsidiário;
P.: Todas as decisões condenatórias e absolutórias são apeláveis?
R: O fato de serem apeláveis não significa que são sinônimos de recorríveis. Todas
as decisões condenatórias e absolutórias são recorríveis, mas nem todas apeláveis. A
decisão de absolvição sumária no júri é recorrível mediante recurso em sentido estrito e
não apelação (artigo 581, inciso VI, do Código de Processo Penal).
2.3.2. Decisões proferidas pelo júri (artigo 593, inciso III, §§ 1.º a 3.º, do Código de
Processo Penal)
Nas decisões proferidas pelo júri, a apelação é cabível se prevista em uma das
hipóteses do inciso III do artigo 593 do Código de Processo Penal:
Nulidade posterior à pronúncia: a nulidade posterior, se relativa, o momento de
arguição é imediatamente depois de anunciado o julgamento e apregoada as
partes. Se o tribunal reconhecer a nulidade anula o ato e todos os demais dele
decorrente (artigo 571, inciso VI, do Código de Processo Penal). Se a nulidade
relativa tiver ocorrido durante o julgamento, o protesto deve ser feito logo após
a sua ocorrência, sob pena de ser convalidada (artigo 571, inciso VIII, do
Código de Processo Penal).
Decisão contrária à letra expressa da lei ou à decisão dos jurados.
Quando houver erro ou injustiça na aplicação da pena ou medida de
segurança.
Decisão dos jurados manifestamente contrária a prova dos autos: decisão
arbitrária. Essa apelação só é cabível uma vez.
2.4. Artigo 593, § 4.º, do Código de Processo Penal175
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
Quando de parte da decisão for cabível apelação e de outra parte for cabível recurso
em sentido estrito, o único recurso cabível será a apelação, ainda que se recorra somente de
parte da decisão. A apelação absorve o recurso em sentido estrito.
2.5. Apelação na Lei n. 9.099/95
Hipóteses de cabimento:
sentença do procedimento sumaríssimo;
sentença homologatória da transação penal;
rejeição da denúncia ou da queixa no procedimento sumaríssimo.
O prazo dessa apelação é de 10 dias para a interposição e apresentação das razões de
apelação.
2.6. Efeitos da Apelação no Código de Processo Penal
Os efeitos da apelação no Código de Processo Penal são:
Devolutivo (tantum devolutum quantum appellatum): o Judiciário irá
reexaminar a decisão; devolve-se o conhecimento da matéria à instância
superior.
Suspensivo: efeito que impede que a decisão proferida produza efeitos, que seja
eficaz. Obsta os efeitos da sentença.
Regressivo: efeito que permite ao próprio órgão prolator da decisão reexaminá-
lo. Permite o juízo de retratação. A apelação do Código de Processo Penal não
tem efeito regressivo.
Extensivo: todos os recursos nos processos penais têm esse efeito (artigo 580 do
Código de Processo Penal). A decisão proferida no recurso interposto por um
co-réu beneficia os demais que não recorreram, salvo se o recurso for fundado
em motivos de ordem pessoal.
2.7. Reformatio in Pejus
A reformatio in pejus é a situação na qual o réu tem a sua situação prejudicada em
razão de recurso exclusivo da defesa. A reformatio in pejus é proibida com base no 176
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
princípio do “tantum devolutum quantum appellatum”, segundo o qual só é devolvido ao
tribunal o pedido recursal. O tribunal só pode reexaminar o que foi pedido. Ex.: a defesa
recorre pedindo a absolvição. O tribunal nega a absolvição e coloca uma agravante.
O artigo 617 do Código de Processo Penal proíbe expressamente a reformatio in
pejus.
2.7.1. Reformatio in pejus indireta
Segundo ensinamento do Professor Fernando Capez10: “anulada sentença
condenatória em recurso exclusivo da defesa, não pode ser prolatada nova decisão mais
gravosa do que a anulada. Por exemplo: réu condenado a um ano de reclusão apela e obtém
a nulidade da sentença; a nova decisão poderá impor-lhe, no máximo, a pena de um ano,
pois do contrário o réu estaria sendo prejudicado indiretamente pelo seu recurso. Este é o
entendimento pacífico do STF (RTJ 88/1018 e 95/1081).
(...)
Obs.: No caso de a sentença condenatória ter sido anulada em virtude de recurso da defesa,
mas, pelo vício da incompetência absoluta, a jurisprudência não tem aceitado a regra da
proibição da reformatio in pejus indireta (...)”.
2.7.2. Reformatio in pejus no júri
A lei que proíbe a reformatio in pejus (artigo 617 do Código de Processo Penal) não
pode prevalecer sobre o princípio constitucional da soberania dos veredictos.
Anulado o júri, em novo julgamento, os jurados poderão proferir qualquer decisão.
Se o réu foi pronunciado e condenado por homicídio simples, a defesa interpõe
apelação. O tribunal dá provimento e anula o primeiro julgamento. No segundo julgamento
o júri condena por homicídio qualificado. Houve reformatio in pejus, a pena aumentou só
por recurso da defesa, e, no caso, reformatio in pejus indireta.
2.8. Reformatio in Mellius
A reformatio in mellius ocorre quando o tribunal melhora a situação do réu em
recurso exclusivo da acusação.
10 Op. cit. p. 419.177
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
Parte da doutrina sustenta que é possível a reformatio in mellius, com base no
próprio artigo 617 do Código de Processo Penal, que apenas proíbe a reformatio in pejus.
2.9. Processamento da Apelação
O prazo para a interposição da apelação, segundo o Código de Processo Penal, como
regra é de cinco dias, salvo para o assistente de acusação não-habilitado, pois o Supremo
Tribunal Federal manteve posicionamento no sentido de que o prazo é de cinco dias, a
contar da intimação, para assistente habilitado, e 15 dias, após o vencimento do prazo para
o Ministério Público apelar, para o não-habilitado.
A apelação é interposta por termo ou petição, no juízo que proferiu a decisão. Ele
fará o exame do preenchimento dos pressupostos recursais. Se o juiz denegar a apelação ou
a julgar deserta, caberá recurso em sentido estrito (artigo 581, inciso XV, do Código de
Processo Penal).
Interposta a apelação, o apelante e, depois dele, o apelado terão o prazo de oito dias
cada um para oferecer razões (exceto nos processos de contravenção em que o prazo será
de três dias).
Após a apresentação das razões ou contra-razões do Ministério Público, se houver
assistente, este arrazoará, no prazo de três dias.
Se a ação penal for movida pelo ofendido, o Ministério Público oferecerá suas
razões, em seguida, pelo prazo de três dias.
Com as razões ou contra-razões, podem ser juntados documentos novos.
O artigo 576 do Código de Processo Penal estabelece que: “O Ministério Público
não poderá desistir de recurso que haja interposto”.
Inexiste juízo de retratação na apelação.
É praticamente pacífico que a apresentação tardia das razões de apelação não
impede o conhecimento do recurso.
2.10. Artigo 600, § 4.º, do Código de Processo Penal
O § 6.º do artigo 600 do Código de Processo Penal estabelece que: “Se o apelante
declarar, na petição ou no termo, ao interpor a apelação, que deseja arrazoar na superior 178
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
instância serão os autos remetidos ao tribunal ad quem onde será aberta vista às partes,
observados os prazos legais, notificadas as partes pela publicação oficial”.
O apelante pode requerer a apresentação das razões no tribunal.
MÓDULO XXIV
DIREITO PROCESSUAL PENAL
1. DOS RECURSOS (II TOMO)
1.1. Recurso em Sentido Estrito (art. 581 e ss. do CPP)
O recurso em sentido estrito é interposto em primeira instância e classifica-se em:
Recurso em sentido estrito pro et contra: o recurso é cabível em ambas as
hipóteses de sucumbência. Exemplos: artigo 581, inciso IV, do Código de
Processo Penal - da pronúncia ou impronúncia; artigo 581, inciso X, do Código
de Processo Penal - da decisão que concede ou nega habeas corpus.
Recurso em sentido estrito secundum eventum litis: o recurso só é admitido em
uma das hipóteses de sucumbência. Ex.: artigo 581, inciso I, do Código de
Processo Penal - da decisão que rejeita a denúncia ou a queixa (se houver
recebimento, não cabe recurso).
1.1.1. Hipóteses de cabimento
O artigo 581 traz o rol de cabimento do recurso em sentido estrito. Esse rol é
taxativo?
A doutrina e a jurisprudência tradicionais consideram esse rol como taxativo. De
uns tempos para cá está ocorrendo uma leve flexibilização na interpretação do rol do artigo
581 do Código de Processo Penal. Isso porque esse diploma é de 1941, e o rol do recurso
em sentido estrito não acompanhou as mudanças por ele sofridas. Tal fato vem motivando
o entendimento de que, ainda que o rol seja taxativo, admite-se a interpretação extensiva e
a aplicação analógica.
Ex.: A jurisprudência majoritária entende ser cabível recurso em sentido estrito da
179
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
decisão que suspende o processo nos termos do artigo 366 por analogia ao inciso XVI do
artigo 581, ambos do Código de Processo Penal.
Segundo o rol do artigo 581 do referido diploma, caberá recurso, no sentido estrito,
da decisão, despacho ou sentença:
I) Que não receber a denúncia ou a queixa
Se o juiz recebe a denúncia, cabe habeas corpus. Se rejeita, cabe recurso em sentido
estrito.
Rejeitada denúncia de crime previsto na Lei n. 9099/95 cabe apelação no prazo de
dez dias.
Tratando-se de crime previsto na Lei n. 5.250/67, se o juiz recebe a denúncia ou a
queixa, cabe recurso em sentido estrito; se rejeita, cabe apelação no prazo de cinco dias.
É necessário intimação do acusado para apresentar contra-razões, no caso do recurso em
sentido estrito, pelo fato do juiz não receber a denúncia?
O Código de Processo Penal não exige essa providência. Houve quem sustentasse a
aplicação do Código de Processo Civil subsidiariamente, pois, antes da reforma do Código
de Processo Civil em 1994, o acusado era intimado para contra-razoar. Hoje, com a
reforma do Código de Processo Civil, não se aplica mais essa regra.
II) Que concluir pela incompetência do juízo
Nesse caso, o juiz reconhece de ofício a incompetência.
“Para parte da doutrina, da sentença que desclassifica o crime de competência do
Júri, para crime não doloso contra a vida, cabe recurso em sentido estrito com base nesse
fundamento, pois o juiz está, na verdade, concluindo pela incompetência do Júri.”11
III) Que julgar procedentes as exceções, salvo a de suspeição
A decisão a respeito da exceção de suspeição é irrecorrível. As exceções podem ser
de: litispendência, coisa julgada e ilegitimidade de parte.
Esse inciso trata de recurso em sentido estrito secundum eventum litis. Só são
recorríveis as decisões que julgarem procedentes as exceções.
IV) Que pronunciar ou impronunciar o réu
11 CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 7.ª ed. São Paulo: Saraiva, 2001.180
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
V) Que conceder, negar, arbitrar, cassar ou julgar inidônea a fiança, indeferir
requerimento de prisão preventiva ou revogá-la, conceder liberdade provisória ou
relaxar a prisão em flagrante
A cassação ocorre quando se verifica que a fiança anteriormente concedida não era
cabível.
Fiança inidônea é aquela prestada – por engano – em quantia insuficiente ou cujo
valor se depreciou com o tempo, havendo necessidade de ser reforçada, sob pena de ficar
sem efeito.
Atenção: lembre-se que em 90% dos casos referentes à fiança o recurso cabível é o
recurso em sentido estrito. E, nos casos de prisão e liberdade provisória, lembre-se que só
cabe o recurso em sentido estrito quando a acusação for sucumbente; se a defesa for
sucumbente não cabe.
VI) Que absolver o réu sumariamente
Trata-se da única sentença absolutória que não é apelável.
VII) Que julgar quebrada a fiança ou perdido o seu valor
A quebra da fiança ocorre quando (arts. 328 e 341 do CPP):
o réu descumpre as obrigações às quais se submete;
pratica outra infração penal na vigência do benefício.
Artigo 343 do Código de Processo Penal: “O quebramento da fiança importará a
perda de metade do seu valor e a obrigação, por parte do réu, de recolher-se à prisão,
prosseguindo-se, entretanto, à sua revelia, no processo e julgamento, enquanto não for
preso”.
A perda do valor se dá quando o réu condenado não se recolhe à prisão (art. 344 do
CPP).
VIII) Que decretar a prescrição ou julgar, por outro modo, extinta a punibilidade
IX) Que indeferir o pedido de reconhecimento da prescrição ou de outra causa 181
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
extintiva da punibilidade
Exceção: durante a fase de execução, o recurso cabível será o agravo (art. 197 da
LEP).
X) Que conceder ou negar a ordem de habeas corpus
Atenção: o dispositivo refere-se somente à decisão do juiz de primeirainstância.
Normalmente, o habeas corpus é julgado no tribunal. Do acórdão denegatório de habeas
corpus proferido pelos Tribunais Regionais Federais e pelos tribunais dos Estados cabe
recurso ordinário para o Superior Tribunal de Justiça. Se a sentença concede o habeas
corpus, há o reexame necessário.
XI) Revogado pela Lei de Execução Penal
XII) Revogado pela Lei de Execução Penal
XIII) Que anular o processo da instrução criminal, no todo ou em parte
XIV) Que incluir jurado na lista geral ou desta o excluir
Atenção: nesse caso, o prazo para interposição do recurso em sentido estrito é de 20
dias. A legitimidade é de qualquer do povo. O órgão competente para o julgamento é o
presidente do Tribunal de Justiça.
XV) Que denegar a apelação ou julgar deserta
XVI) Que ordenar a suspensão do processo, em virtude de questão prejudicial
XVII) Revogado pela Lei de Execução Penal
XVIII) Que decidir o incidente de falsidade
É a decisão – definitiva – que julga o incidente de falsidade documental.
O recurso em sentido estrito disposto nesse inciso é pro et contra.182
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
XIX ao XXIII) Revogados pela Lei de Execução Penal
XXIV) Esse inciso já estava revogado pela Lei de Execução Penal. Atualmente, em
virtude da Lei n. 9.268/96, nem o juiz das execuções pode proferir decisão convertendo a
multa em prisão.
1.1.2. Efeito do recurso em sentido estrito
a) Devolutivo: todos os recursos têm esse efeito; a decisão é reapreciada.
b) Suspensivo: como regra, o recurso em sentido estrito não possui efeito
suspensivo, salvo o artigo 584 do Código de Processo Penal. Assim, o recurso em sentido
estrito terá efeito suspensivo se interposto contra:
decisão que denegue conhecimento à apelação ou a julgue deserta;
decisão que declare perdido o valor da fiança;
decisão de pronúncia apenas no tocante ao julgamento do réu pelo júri;
decisão que determine quebra da fiança somente no tocante a perda da metade de seu
valor.
c) Regressivo: o recurso em sentido estrito permite ao órgão prolator da decisão que
se retrate.
d) Extensivo: o recurso em sentido estrito possui esse efeito (art. 580).
1.1.3. Processamento do recurso em sentido estrito
O prazo para interposição do recurso em sentido estrito, em regra, é de cinco dias
(art. 586 do CPP). Exceções:
15 dias, no caso de recurso contra pronúncia interposto pelo assistente de
acusação não-habilitado nos autos;
20 dias, contra a decisão que inclui ou exclui jurado da lista-geral (art. 586, par.
ún., do CPP).
Se o recurso em sentido estrito não for recebido, contra essa decisão é cabível a 183
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
carta testemunhal.
Se o recurso em sentido estrito for recebido, intima-se o recorrente para apresentar
as razões e o recorrido para apresentar as contra-razões.
O juiz vai então reexaminar sua decisão podendo mantê-la ou se retratar. Caso ele
mantenha a sua decisão, o recurso sobe para o tribunal competente; caso ele se retrate,
intima as partes da nova decisão.
O prazo para a apresentação das razões, contra-razões e retratação é sempre de dois
dias.
Em segunda instância o recurso em sentido estrito segue o rito da apelação sumária.
O prejudicado com a retração pode interpor recurso cabível no prazo de cinco dias e
o recurso subirá diretamente ao tribunal, independentemente de razões ou contra-razões
(art. 589, par. ún., do CPP).
A nova decisão pode não ser impugnada por recurso em sentido estrito.
Ex.: se o juiz indefere um requerimento de prisão preventiva, oMinistério Publico
interpõe recurso em sentido estrito. O juiz retrata-se e defere a prisão. As partes são
intimadas. A defesa só pode impetrar habeas corpus, mas não recurso em sentido estrito.
O recurso em sentido estrito poderá subir nos próprios autos do processo ou em
autos apartados. Nesse último caso, faz um instrumento que será examinado pelo tribunal.
O recurso em sentido estrito sobe nos próprios autos nos seguintes casos (art. 583 do
CPP):
quando interpostos de ofício;
nos casos do artigo 581, incisos I, III, IV, VI, VIII e X;
quando o recurso não prejudicar o andamento do processo.
2. PROTESTO POR NOVO JÚRI (ARTS. 607 E 608 DO CPP)
O protesto por novo júri possui as seguintes características:
é um recurso exclusivo das decisões do júri;
é um recurso exclusivo da defesa;
só pode ser interposto uma vez;
é um recurso que dispensa a fundamentação;184
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
é interposto perante o juiz-presidente julgado por ele mesmo.
Hipótese de cabimento: o protesto por novo júri será cabível sempre que houver
condenação a uma pena de reclusão igual ou superior a 20 anos por um só crime, segundo
entendimento da doutrina e da jurisprudência .
Obs. : cabe protesto por novo júri quando a pena imposta for em grau de apelação?
Está em vigor o artigo 607, § 1.º, do Código de Processo Penal?
Pelo artigo 607, § 1.º, do Código de Processo Penal não cabe o protesto por novo
júri quando a pena imposta for em grau de apelação. Esse artigo faz, todavia, uma remição
expressa ao artigo 606 do mesmo diploma, artigo esse revogado desde 1948. Em razão
disso, a posição dominante entende que a revogação expressa do artigo 606 do Código de
Processo Penal produziu a revogação tácita do artigo 607, § 1.º. A posição minoritária
(Professor Tourinho) afirma que o artigo 607, § 1.º, está em vigor, pois sua regra é
compatível com os demais dispositivos do Código de Processo Penal: quando da revogação
do artigo 606 do Código de Processo Penal a regra nele contida foi deslocada para o artigo
593 do Código de Processo Penal; logo, onde está escrito artigo 606, leia-se artigo 593 e
parágrafos do Código de Processo Penal. Para tal corrente não se trata de revogação, mas
sim de uma remição não atualizada.
2.1. Concurso de Crimes
Atenção: assunto muito abordado em concursos públicos.
Concurso material: se a pena igual ou superior a 20anos resultar de concurso
material, não será cabível protesto (as penas devem ser consideradas isoladamente para o
protesto).
Crime continuado e concurso formal: se a pena igual ou superior a 20 anos resultar
de concurso formal e crime continuado, admite-se o protesto. Entende-se que em tais
situações prevalece a unidade da conduta ou a ficção legal.
2.2. Processamento
O prazo de interposição é de cinco dias.
É interposto perante o juiz-presidente. O juiz-presidente pode admitir o protesto ou 185
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
indeferi-lo.
Se o juiz admite o protesto, desde logo marca novo júri. Não há apresentação de
razões ou contra-razões.
No novo julgamento não poderão fazer parte do Conselho de Sentença os jurados
que já tenham tomado parte no julgamento anterior (art. 607, § 3.º, do CPP). A Súmula n.
206 do Supremo Tribunal Federal estende essa regra a qualquer caso de novo julgamento.
Da decisão que indefere o protesto, qual a medida cabível?
São duas as posições:
Carta Testemunhável: esse recurso destina-se a promover o reexame do recurso
indeferido.
Habeas Corpus: corrente defendida pelos Professores Vicente Greco e
Frederico Marques. Essa corrente entende não ser cabível a carta testemunhável
pelo fato do seu rito ser o mesmo do recurso indeferido. No protesto, a carta
seria interposta no próprio juízo e por ele mesmo analisado. Para ser
reexaminado pelo órgão superior é necessário impetrar habeas corpus.
2.3. Artigo 607, § 2.º, do Código de Processo Penal
O pedido de protesto por novo júri provocará a revisão da decisão. Dessa forma ele
invalida qualquer outro recurso interposto, mesmo que seja recurso da acusação.
2.4. Artigo 608 do Código de Processo Penal
O protesto suspende a apelação até que haja o segundo julgamento. Isso acontece se
o réu for condenado por outro crime que não caiba protesto. Após a decisão do segundo
julgamento, julga-se a apelação.
Atenção: nesse caso, a defesa poderia apenas interpor o protesto, aguardar o novo
julgamento e depois apelar de tudo?
Não, porque se assim fizer, o crime em que não cabe o protesto transitará em
julgado; por isso a necessidade de se interpor o protesto e a apelação.
3. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO
O artigo 382 do Código de Processo Penal trata dos embargos de declaração contra 186
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
a sentença. São os chamados “embarguinhos”.
Os artigos 619 e 620 do Código de Processo Penal tratam dos embargos de
declaração contra acórdão.
É possível a interposição dos “embarguinhos” também contra decisão interlocutória.
Toda decisão, sentença ou acórdão para ser impugnada por embargos de declaração
tem de ser omissa, contraditória, ambígua ou obscura.
O prazo para interposição dos embargos de declaração é de dois dias. Interposto os
embargos de declaração, aplica-se o Código de Processo Civil subsidiariamente, isto é,
interrompe-se o prazo dos demais recursos.
P.: É necessário a oitiva da parte contrária nos embargos de declaração?
R.: A jurisprudência dominante estabelece que a oitiva da parte contrária é
providência desnecessária, salvo quando os embargos tiverem caráter infringente, isto é,
efeito modificativo.
P.: Os embargos de declaração podem ter efeito modificativo?
R.: Sim, principalmente nos casos em que os embargos de declaração visarem sanar
omissão.
P.: Cabe embargos de declaração de embargos de declaração?
R.: Sim, desde que o segundo embargo vise suprir omissão da decisão do primeiro
embargo.
P.: Qual o recurso cabível quando o juiz não acolhe os embargos?
R.: Embargos em primeira instância: a parte deve argüir em preliminar de apelação
o equívoco da sentença. Embargos em segunda instância: contra acórdão, cabe agravo
regimental.
3.1. Embargos de Declaração na Lei n. 9.099/95
Os embargos de declaração serão opostos nesse caso, no prazo de cinco dias.
Opostos por escrito ou oralmente. Nesse caso, os embargos de declaração suspendem o 187
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
prazo para os demais recursos.
4. EMBARGOS INFRINGENTES E EMBARGOS DE NULIDADE
Embargos de nulidade é o nome dado aos embargos infringentes quando a
divergência for relativa à decretação ou não de nulidade processual.
Os embargos só têm cabimento contra acórdão não unânime.
O voto vencido pode divergir total ou parcialmente. Se for parcial, somente quanto
ao tópico em que ocorreu a divergência serão interpostos os embargos.
A divergência se apura quanto à conclusão do voto e não quanto a sua
fundamentação.
No processo penal, os embargos infringentes configuram recurso exclusivo da
defesa. Assim, se dois votos absolvem e um voto condena o réu, a acusação foi
sucumbente e não cabe embargos infringentes.
Atenção: é necessário que o acórdão se refira ao julgamento de uma apelação ou
recurso em sentido estrito.
Não cabe embargos infringentes de decisão não unânime em habeas corpus.
Processamento:
interposição em 10 dias;
oitiva do querelante ou do assistente de acusação se houver – também em 10 dias;
parecer do Procurador-Geral de Justiça;
parecer do relator;
parecer do revisor.
O relator e o revisor não podem ter participado do primeiro julgamento.
O relator e o revisor do primeiro julgamento podem modificar a sua decisão. Isso
porque a turma julgadora é composta de cinco desembargadores: três desembargadores que
proferiram a primeira decisão e o relator e o revisor. Dessa forma, podem manter ou
reformar a primeira decisão. Logo, os embargos infringentes têm efeito regressivo, diante
da possibilidade da mudança de voto de quem já votou.
188
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4.1. Embargos Infringentes nos Tribunais Superiores
No Superior Tribunal de Justiça não cabe embargos infringentes. Nesse tribunal,
só cabem embargos de declaração e divergência.
No Supremo Tribunal Federal há embargos infringentes no âmbito penal no
prazo de 15 dias. Cabe em três casos:
acórdão não unânime em ação penal julgada procedente;
acórdão que julga improcedente revisão criminal;
acórdão denegatório de recurso criminal ordinário (art. 102, inc. II, da CF).
5. CARTA TESTEMUNHÁVEL
A carta testemunhável surgiu na época do Brasil-Colônia: duas testemunhas
comprovavam que o recurso havia sido interposto.
As partes são chamadas :
testemunhante: parte que interpõe a carta.
testemunhado: juízo que indeferiu o seguimento, o processamento do recurso.
É cabível quando for denegado seguimento a recurso, não importando o motivo da
denegação.
Tem caráter residual. Só será cabível se não existir nenhuma outra medida
expressamente prevista para isso.
Exemplos:
Decisão denega apelação: interpõe-se recurso em sentido estrito;
Decisão denega recurso em sentido estrito: interpõe-se a carta testemunhável;
Decisão denega protesto por novo júri: para alguns, cabe a carta testemunhável;
para outros o habeas corpus;
Decisão denega embargos de declaração em primeira instância: preliminar de
apelação;
Denega embargos de declaração em segunda instância: agravo regimental;
Agravo em Execução: carta testemunhável.
5.1. Processamento
O prazo para a interposição da carta testemunhável é de 48 horas. Conta-se o prazo 189
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de minuto a minuto. O termo inicial para a interposição é a partir da intimação
desfavorável. Na prática, é impossível determinar o minuto inicial. Contam-se dois dias.
É interposto perante o escrivão. O escrivão é quem forma o instrumento. Trata-se de
função burocrática. Se ele se omite, fica sujeito a uma pena funcional de suspensão por 30
dias.
Formando o instrumento, o escrivão deve entregar a carta ao testemunhante. Após
isso, segue-se o rito do recurso indeferido. No tribunal, segue-se o rito da apelação
sumária.
Chegando ao tribunal, o disposto no Código de Processo Penal permite que o
mesmo, caso dê provimento à carta, admita o recurso indeferido e o julgue no mérito,
desde que a carta esteja devidamente instruída. É economia processual. O próprio tribunal
pode julgar no mérito.
Obs.: fim dos recursos no processo penal. A seguir estão algumas ações
impugnativas de decisão.
6. REVISÃO CRIMINAL
Os processualistas mais antigos, baseados no Código de Processo Civil, o
chamavam de recurso sui generis. Mas não é um recurso. É uma ação impugnativa
autônoma. Instaura-se nova relação jurídica processual com o seu ajuizamento. Não tem
prazo de interposição. Seu pressuposto é a decisão transitada em julgado.
É ação rescisória de coisa julgada penal, mas difere da ação rescisória civil.
Ação rescisória:
- prazo – preclusivo – 2 anos;
- pode ser ajuizada pelo autor, pelo réu ou por terceiros prejudicados.
Revisão Criminal:
- não há prazo para interposição;
- só pode ser ajuizada pela defesa;
- é sempre pró-réu.
190
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Se houve erro judicial que beneficiou o réu e transitou em julgado, essa decisão não
pode ser rescindida.
No pólo ativo figura o próprio réu pessoalmente (não precisa de advogado) ou o
procurador do réu (alguém em seu nome). Não é necessário procuração com poderes
especiais. Se o réu já faleceu, podem ingressar o cônjuge, o ascendente, o descendente ou o
irmão do mesmo. Nesse último caso, tutela-se o status dignitatis, isto é, a honra, a moral do
réu.
Para assegurar o status dignatis é possível entrar com revisão criminal:
quando o réu já faleceu;
quando o réu já cumpriu a pena.
P.: Se, no curso da revisão criminal, o réu morre quem assume a ação?
R.: O Código de Processo Penal estabelece que o presidente do tribunal deve
nomear um curador para prosseguir na ação. Esse curador pode ser o cônjuge, ascendente,
descendente ou irmão.
P.: O Ministério Público pode figurar no pólo ativo?
R.: Há polêmica na doutrina quanto ao assunto. Para a Professora Ada Pellegrini
Grinover, sim. Mas a posição dominante na doutrina e na jurisprudência é a de que não. O
Ministério Público pode impetrar habeas corpus, mas não revisão criminal.
Ao Ministério Público cabe ocupar o pólo passivo na revisão criminal em defesa da
coisa julgada.
P.: Quais são os fundamentos possíveis da revisão criminal? Qual é a causa de
pedir?
R: Conforme o artigo 621 do Código de Processo Penal são fundamentos:
a) Quando a decisão for contrária à letra expressa da lei ou contrária à evidência dos
autos. Nesse caso, a contrariedade precisa ser marcante, facilmente perceptível.
Atenção: se no final do julgamento da revisão criminal não se chega a uma certeza,
tendo-se apenas uma probabilidade da inocência, qual a solução?
Na revisão criminal vigora o princípio do in dubio pro societati. Na dúvida, a 191
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revisão será julgada improcedente.
Não cabe revisão criminal quando houver uma mudança na interpretação dos
tribunais. A contrariedade é somente a texto expresso de lei.
b) Quando a decisão se fundar em depoimentos, documentos ou exames falsos.
Devem ser comprovadamente falsos. Exige-se a prova pré-constituída da falsidade do
depoimento, documento ou exame.
P.: Como o requerente consegue uma prova pré-constituída?
R.: É possível que o autor dos crimes (do falso testemunho) tenha sido condenado.
Junta-se a cópia da decisão, da condenação ou por meio de justificação criminal. Segue o
rito do Código de Processo Civil. É com base nele que no Juízo Penal a justificação é
ajuizada.
c) Quando surgirem provas novas de inocência do réu ou causa de diminuição de
pena.
O pedido da revisão criminal é a rescisão da coisa julgada ou a correção da injustiça.
O tribunal possui juízo rescindente e rescisório.
Obs.: quando se reconhece na revisão criminal alguma nulidade processual o
tribunal limita-se a rescindir a coisa julgada. O processo é anulado. O juiz de primeiro grau
retomará o processo. Haverá nova sentença, salvo se ocorreu a prescrição.
P.: E a reformatio in pejus?
R.: A nova sentença não pode ser mais gravosa para o réu do que a sentença
rescindida. É a proibição da reformatio in pejus indireta.
P.: Sempre é possível o pedido de indenização por erro judiciário?
R.: Em alguns casos não. O autor da revisão precisa pedir expressamente. Não é um
efeito da revisão. Não é possível o pedido de indenização nos seguintes casos:
quando o réu de alguma forma colaborou na produção do documento falso;
quando o réu colaborou com a ocultação da prova.192
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Se o autor da ação limitar-se a pedir a diminuição da pena, nada impede que o
tribunal, se for o caso, absolva-o. Mas cabe ressaltar que no julgamento da revisão vigora o
princípio in dubio pro societati.
P.: É possível o ajuizamento de segunda revisão criminal?
R.: O ajuizamento só será possível se tiver outro fundamento.
Obs.: não cabe revisão criminal de decisão de pronúncia. Não há coisa julgada
material.
6.1. Competência
Cada tribunal é competente para o julgamento de seus próprios julgados. Se a
decisão condenatória transitou em julgado na primeira instância, a revisão criminal deve
ser ajuizada no tribunal que tem competência recursal para aquela matéria.
6.2. Procedimento
A revisão criminal é uma ação. Inicia-se com o oferecimento da petição inicial,
acompanhada da certidão do trânsito em julgado e de algum documento que comprove as
alegações do autor. A prova é sempre pré-constituída, conforme o artigo 625, § 1.º, do
Código de Processo Penal.
É encaminhada ao presidente do tribunal, o qual pode indeferi-la liminarmente. Se
não indeferir, ele encaminha a um relator; este também pode indeferi-la liminarmente.
O Procurador-Geral dá um parecer em dez dias. É uma contestação defende a coisa
julgada.
A revisão volta para receber os pareceres do relator e do revisor, no prazo de dez
dias para cada. Segundo o Superior Tribunal de Justiça, o relator e o revisor não podem ter
proferido nenhuma decisão no processo originário.
A revisão é julgada.
6.3. Recursos
Do indeferimento liminar da revisão criminal cabe recurso inominado – em São 193
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Paulo esse recurso é o agravo regimental.
Do acórdão que julga a revisão criminal cabe recurso especial ou recurso
extraordinário.
Obs.: cabe embargos infringentes do acórdão não-unânime que julga revisão
criminal?
Segundo o Código de Processo Penal não cabe. Exceção: cabe na revisão criminal
julgada improcedente pelo Supremo Tribunal Federal.
P.: Cabe revisão criminal para rescindir sentença absolutória?
R.: Sim, no caso de absolvição imprópria.
P.: É requisito para a revisão criminal o prévio recolhimento do réu à prisão?
R.: Não, não é uma condição.
P.: A revisão criminal tem efeito suspensivo, isto é, suspende a execução da pena?
R.: Não. O ajuizamento da revisão criminal não suspende a execução da pena. Mas,
segundo os Professores Magalhães Noronha, Scarance e Ada Pellegrini Grinover, é
possível a aplicação subsidiária do artigo 273 do Código de Processo Civil, isto é, a
antecipação de tutela.
P.: A revisão criminal tem efeito extensivo? Por exemplo: três indivíduos são
condenados por homicídio. Um deles prova que o fato não ocorreu. Estende-se para os
demais?
R.: Sim, aplica-se o artigo 580 do Código de Processo Penal na revisão criminal.
7. HABEAS CORPUS (“Traga-me o Corpo”)
O habeas corpus teve sua origem na Magna Carta da Inglaterra, em 1215,
promulgada pelo Rei João Sem-Terra.
Momentos importantes desse instituto:
Habeas Corpus Act: período de consolidação do habeas corpus em 1679.
No Brasil: o habeas corpus teve sua origem:194
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implícita na Constituição Federal de 1824;
expressa em 1832 no Código de Processo Criminal;
em textos constitucionais, a partir da Constituição de 1891, artigo 72, § 22.
7.1. Teoria Brasileira do Habeas Corpus
Rui Barbosa percebeu que o ordenamento jurídico brasileiro precisava ampliar o
âmbito de atuação do habeas corpus, para garantir ao cidadão a defesa de abusos anormais
que impusessem mácula a direitos individuais de outro que não o de locomoção.
O Supremo Tribunal Federal reconheceu expressamente, naquela época, a “teoria
brasileira do hábeas corpus” desenvolvida por Rui Barbosa, reconhecendo-o como meio
hábil para a defesa de outros direitos ameaçados por ilegalidade ou abuso de poder.
Essa teoria que vigorou até 1926, quando uma emenda constitucional passou a
limitar o habeas corpus.
Atualmente, o habeas corpus está previsto no artigo 5.º, inciso LXVIII, da
Constituição Federal.
O artigo 142, § 2.º, da Constituição Federal, restringe a abrangência do habeas
corpus para as punições disciplinares militares. Sobre essa disposição, que já existia em
outras constituições, Pontes de Miranda sustenta a não possibilidade desse remédio
constitucional discutir o mérito da punição, mas poderá ser impetrado para questionar:
a existência do poder hierárquico daquele que determinou a punição sobre o
punido;
a existência do poder disciplinar no caso concreto;
se o ato censurado é ou não ligado à função militar;
se a pena imposta é suscetível de ser aplicada disciplinarmente.
7.2. Disciplina do Habeas Corpus (Arts. 647 a 667)
O habeas corpus não é recurso; não tem prazo para a sua interposição; não é
obrigatório sua existência em um processo. É ação constitucional de caráter penal e
procedimento especial.
A Constituição Federal de 1988 institui duas espécies de habeas corpus:
habeas corpus preventivo ou salvo conduto: não houve dano consumado, 195
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havendo risco futuro de se sofrer uma coação.
habeas corpus repressivo ou liberatório: visa combater o dano à liberdade de
locomoção, coação ou violência que se encontram consumados.
7.3. Partes
As partes no habeas corpus são:
Impetrante: pessoa que pede a ordem. Pode ser qualquer pessoa (física ou
jurídica, com ou sem capacidade civil plena). Não precisa ser advogado, em
razão da importância do direito a ser tutelado.
P.: E o Ministério Público pode impetrar habeas corpus?
R.: Sim, a teor dos artigos 127 da Constituição Federal e 654 do Código de Processo
Penal.
O Juiz de Direito não pode impetrar habeas corpus nos processos de sua
competência.
Paciente: pessoa em nome de quem se pede a ordem.
Autoridade coatora: pessoa responsável por determinar a ordem ilegal ou
abusiva; é o pólo passivo do habeas corpus. A autoridade coatora será sempre
aquela responsável pela ordem e não a que se limitou a executar o ato.
P.: Admite-se habeas corpus contra ato de particular?
R.: Posição dominante admite a impetração contra ato de particular. Ex.: contra
diretor de hospital que se recusa a liberar o paciente que não tem recursos para pagar a
conta.
7.4. Rito do Habeas Corpus
A impetração do habeas corpus se faz por meio de petição inicial, que deverá conter
os seguintes requisitos mínimos:
nome do paciente;
descrição da atual ou futura violência ou coação à liberdade de locomoção;
petição escrita em língua portuguesa;196
_____________________________________________________________________________ MÓDULOS
assinatura do impetrante ou de alguém a seu rogo;
documentos que comprovem os fatos alegados.
7.5. Hipóteses de Cabimento (Art. 647/648 do CPP)
P.: O rol do artigo 648 do Código de Processo Penal é taxativo ou exemplificativo?
R: Discussão sem razão de ser, pois o rol do artigo 647 do Código de Processo Penal
é suficientemente amplo para abranger várias situações.
São hipóteses de cabimento do habeas corpus:
Quando não houver justa causa: haverá justa causa sempre que a persecução
penal possuir fundamentos fáticos e jurídicos.
Sempre que alguém estiver preso por mais tempo que a lei permita: dispositivo
que vale para prisão penal e para prisão processual.
Quando quem ordenar a coação não tiver competência para fazê-lo.
Quando houver cessado o motivo que autorizou a coação.
Quando não for alguém admitido a prestar fiança, nos casos em que a lei a
autoriza.
Quando o processo for manifestamente nulo: a nulidade deve ser manifesta.
Quando extinta a punibilidade. Ex.: instaura-se inquérito policial para apurar
crime prescrito.
P.: É possível o impetrante alegar em habeas corpus alguma hipótese e o tribunal
conceder por outra?
R.: Sim. O tribunal pode até conceder habeas corpus de ofício, não estando
vinculado à alegação.
7.6. Competência
7.6.1. Competência do Supremo Tribunal Federal
Quando a autoridade coatora for Tribunal Superior.
Quando forem pacientes as seguintes pessoas: Presidente da República e Vice-
Presidente; Ministros de Estado, dos Tribunais Superiores, do Tribunal de
Contas da União; comandantes da Marinha, Exército e Aeronáutica; deputados 197
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federais e senadores; Procurador-Geral da República e chefes de missão
diplomática.
7.6.2. Competência do Superior Tribunal de Justiça
Quando a coação partir de tribunal sujeito à sua jurisdição ou de Ministros de
Estado ou Comandante-Geral da Marinha, Exército e Aeronáutica.
Obs.: sempre que o habeas corpus envolver comandante do Exército ou Ministro de
Estado, sendo paciente, a competência será do Supremo Tribunal Federal, mas se forem
autoridade coatora, a competência será do Superior Tribunal de Justiça.
Quando o coator ou paciente for autoridade sujeita à jurisdição: Governador do
Estado (o vice-governador não) ou do Distrito Federal; desembargador;
membros do Tribunal Regional Federal, Tribunal Regional do Trabalho,
Tribunal de Contas do Estado, Tribunal de Contas do Município; membros do
Ministério Público da União que oficie perante tribunais.
7.6.3. Competência do Tribunal Regional Federal
Quando o paciente ou coator for juiz federal, juiz do trabalho ou membro do
Ministério Público Federal de primeira instância.
7.6.4. Competência do Tribunal de Justiça
Quando forem pacientes ou coator: prefeito municipal; vice-governador;
secretários de Estado; deputados estaduais; membros do Ministério Público
Estadual; Juiz de Direito (nos casos de sua competência recursal); Delegado-
Geral de Polícia; Procurador- Geral do Estado; Comandante-Geral da Polícia
Militar; Juiz de Alçada, Auditor da Justiça Militar.
7.7. Os Recursos no Habeas Corpus
Sentença que concede habeas corpus em primeiro grau: recurso de ofício (art.
574, inc. I, do CPP) e recurso em sentido estrito (art. 581, inc. X, do CPP).
Habeas Corpus por Tribunal: recurso ordinário, se denegatória a decisão ( arts.
102, inc. II e 105, inc. II, da CF e Lei n. 8.038/90). 198
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8. MANDADO DE SEGURANÇA NA ÁREA CRIMINAL
O mandado de segurança encontra-se previsto nos incisos LXIX e LXX do artigo 5.º
da Constituição Federal.
Desde seu surgimento discutia-se a possibilidade de cabimento contra ato
jurisdicional. Hoje não há dúvida: é cabível contra aquele ato jurisdicional para o qual não
se previu recurso.
Ex.: pedido de habilitação do assistente de acusação negado; decisão que determina
a apreensão de objetos não relacionados ao crime, para garantir as prerrogativas do
advogado.
E se o ato for recorrível? Segundo a Lei do Mandado de Segurança não será cabível.
É válida essa restrição?
Não. Essa restrição não é aplicada. Prevalece o entendimento de que o mandado de
segurança poderá ser impetrado contra ato jurisdicional que admita recurso, sempre que o
recurso não possuir efeito suspensivo, pois, nesse caso, a interposição do recurso não
impede que a decisão produza seus efeitos, de tal forma que não obsta a consumação da
lesão a direito líquido e certo em virtude de ilegalidade ou abuso de poder.
Cabe também o Mandado de Segurança para obter efeito suspensivo em agravo
interposto contra decisão que em sede de execuções concede livramento condicional ou
progressão de regime sem o preenchimento dos requisitos legais ou para obter efeito
suspensivo contra a concessão de liberdade provisória em crime hediondo.
8.1. Direito Líquido e Certo
Após grande discussão doutrinária, chegou-se ao consenso de que a expressão
“direito líquido e certo” deve ser tomada no sentido processual, para indicar direito
apurável sem necessidade de dilação probatória. Disso decorre a exigência de prova pré-
constituída do direito para que se cogite a concessão de mandado de segurança.
8.2. Partes
São legitimados para impetrar o mandado de segurança a pessoa física ou jurídica -
e, até, ente despersonalizado - titular do direito líquido e certo ameaçado ou violado pela
ilegalidade ou abuso de poder. Normalmente, no processo penal, esse remédio será 199
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utilizado pela acusação – pois a defesa pode fazer uso do habeas corpus.
O órgão do Ministério Público pode impetrar mandado de segurança perante
tribunais.
No pólo passivo, segundo a doutrina dominante, encontra-se a pessoa jurídica de
direito público a cujo quadro pertence a autoridade coatora.
8.3. Competência
Como se trata de mandado de segurança em face de ato jurisdicional, a competência
será sempre dos tribunais – originariamente.
8.4. Procedimento
Prazo para impetração: 120 dias contados da ciência do ato impugnado.
A petição inicial deve atender aos requisitos dos artigos 282 e 283 do Código de
Processo Civil e estar munida da prova pré-constituída do direito do impetrante.
O tribunal pode ou não conceder a liminar.
A autoridade coatora será notificada para prestar informações no prazo de 10
dias.
O órgão do Ministério Público deve apresentar parecer em 5 dias – atua como
custos legis.
8.5. Liminar
A lei do mandado de segurança assegura a possibilidade de concessão de liminar ao
impetrante sempre que a ameaça ao direito líquido e certo for atual e objetiva (art. 70, inc.
II).
Obs.: a notificação da autoridade coatora para apresentação das informações tem
valor de citação.
Atenção: o Supremo Tribunal Federal entende que o mandado de segurança, quando
impetrado pelo Ministério Público contra decisão favorável a defesa, deverá também
requerer e o tribunal determinar a citação do réu como litisconsórcio necessário. Sem isso,
o Supremo Tribunal Federal anula o mandado de segurança.
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Fim.
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