construcao democracia casimiro

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A Construo da Democracia Sntese histrica dos grandes momentos da Cmara dos Deputados, das Assemblias Nacionais Constituintes do Congresso Nacional

Casimiro Neto

2003

CMARA DOS DEPUTADOS

Casimiro Neto

A Construo da DemocraciaSntese Histrica dos Grandes Momentos da Cmara dos Deputados, das Assemblias Nacionais Constituintes e do Congresso Nacional 180 Anos (1823 2003), de Representao Parlamentar 182 Anos (1821 2003), e de 15 Anos da Promulgao da Constituio Federal de 1988

Centro de Documentao e Informao Coordenao de Publicaes BRASLIA 2003

CMARA DOS DEPUTADOS DIRETORIA LEGISLATIVA Diretor: Afrsio Vieira Lima Filho CENTRO DE DOCUMENTAO E INFORMAO Diretora: Nelda Mendona Raulino COORDENAO DE PUBLICAES Diretora: Maria Clara Bicudo Cesar COORDENAO DE ESTUDOS LEGISLATIVOS Diretora: Dirce Benedita Ramos Vieira AlvesAuxiliar de Pesquisa, Leitura e Reviso: Carmen Amlia Pereira dAlmeida Dias e Joo Mrio Dias Fotografias: Luiz Antonio Ribeiro, Armando Sampaio Lacerda e Jorge Luiz Vieira Serejo Ilustraes: Allan de Lana Frutuoso, Claudio Augusto Lisboa Gonalves e Joo Mrio Pereira dAlmeida Dias Capa: Cosme Rocha Fotografias e ilustraes do acervo do Centro de Documentao e Informao da Cmara dos Deputados. Todos os direitos desta edio reservados Cmara dos Deputados As idias contidas nesta obra expressam a opinio do autor e no as da instituio parlamentar. Cmara dos Deputados Centro de Documentao e Informao CEDI Coordenao de Publicaes CODEP Anexo II, trreo Praa dos Trs Poderes 70160-900 Braslia (DF) Telefone: (61) 318-6865; fax: (61) 318-2190 [email protected]

SRIE Temas de interesse do Legislativo n. 5Dados Internacionais de Catalogao-na-publicao (CIP) Coordenao de Biblioteca. Seo de Catalogao. Silva Neto, Casimiro Pedro da. A construo da democracia : sntese histrica dos grandes momentos da Cmara dos Deputados, das assemblias nacionais constituintes e do Congresso Nacional .../ Casimiro Neto. Braslia : Cmara dos Deputados, Coordenao de Publicaes, 2003. 751 p. (Srie temas de interesse do Legislativo ; n. 5) ISBN 85-7365-317-5 1. Poder Legislativo, histria, Brasil. 2. Cmara dos Deputados, histria, Brasil. I. Ttulo. II. Srie. CDU 342.532(81)(091) ISBN 85-7365-317-5

democracia um ideal em permanente dinamismo, que se transforma e aperfeioa num incessante desenvolvimento, que no lhe permite conquistas pacficas e definitivas. Cada posio alcanada, reclama uma constante renovao de esforos, de trabalhos e de sacrifcios. Mais do que uma tcnica de governo, mais do que uma concepo de vida, a democracia um conjunto de valores reais, que do sentido existncia, enobrecem as coletividades e valorizam o homem. Desgraados dos povos que deixarem sufocar no seu corao e apagar no seu esprito a chama do amor democracia. Estaro irremissivelmente condenados ignomnia da escravido e sero conduzidos, no como criaturas humanas, iluminadas por um esprito imortal, mas como rebanhos, sem alma e sem conscincia.DEPUTADO TANCREDO DE ALMEIDA NEVES (MG) 18/09/51 Plenrio da Cmara dos Deputados Sesso Solene. Comemorao do quinto aniversrio de promulgao da Constituio Federal de 1946.

A

Homenagem

Enquanto houver, neste Pas um s homem sem trabalho, sem po, sem teto e sem letras, toda a prosperidade ser falsa.(TANCREDO DE ALMEIDA NEVES)

Canto o crepsculo da tarde / e o claro da linda aurora canto aquilo que me alegra / e aquilo que me apavora e canto os injustiados / que vagam no mundo afora.(PATATIVA DO ASSAR)

Aos esfarrapados do mundo e aos que neles se descobrem e, assim descobrindo-se, com eles sofrem, mas, sobretudo, com eles lutam.(PAULO FREIRE Professor, educador e pensador)

Em nome de quem venho Venho em nome dos pequenos, / dos prias dos humildes. Em nome do oprimido contra o opressor; / do pobre contra o rico; do pequeno contra o grande. / Venho em nome daquele que no tm lar; daqueles que no tm lenol; / daqueles que tm sede de amor; daqueles que nunca tiveram uma benfazeja e carinhosa mo a suavizar a agonia; daqueles que vivem no dio perene.(OTVIO BRANDO, in A Plebe, 2 de outubro de 1920)

Isso no pode continuar assim. Enquanto houver um irmo brasileiro, ou uma irm brasileira, passando fome, teremos motivos de sobra para nos cobrir de vergonha.(LUIZ INCIO LULA DA SILVA Plenrio do Congresso Nacional 1/01/2003 Posse e compromisso constitucional como Presidente da Repblica)

Sumrio

Lista de Ilustraes pg. 9 Apresentao Deputado Joo Paulo Cunha Presidente da Cmara dos Deputados pg. 13 Prefcio Ministro Nelson Jobim Vice-Presidente do STF pg. 15 Consideraes do Autor pg. 17 Introduo pg. 21 Antecedentes da Histria Legislativa do Brasil Independente pg. 23 Deputados, Procuradores e Delegados do Reino Americano s Cortes Gerais, Extraordinrias e Constituintes da Nao Portuguesa pg. 47 Primeiro Imprio pg. 83 Incio da Histria Legislativa do Brasil Independente pg. 111 Primeira Legislatura pg. 153 Perodo Regencial Regncia Provisria pg. 173 Perodo Regencial Regncia Trina Permanente pg. 179

Perodo Regencial Regncia do Senador Diogo Antonio Feij pg. 187 Perodo Regencial Regncia do Senador Pedro de Arajo Lima (PE) pg. 191 Segundo Imprio pg. 201 Abolio da Escravatura pg. 259 Primeira Repblica (15/11/1889 a 16/7/1934) pg. 283 Segunda Repblica (16/7/1934 a 10/11/1937) pg. 389 Terceira Repblica (10/11/1937 a 18/9/1946) pg. 409 Quarta Repblica (18/9/1946 a 9/4/1964) pg. 427 Quinta Repblica (9/4/1964 a 5/10/1988) pg. 485 Sexta Repblica (5/10/1988) pg. 617 Sntese Histrica dos Dirios da Cmara dos Deputados pg. 677 Sntese Histrica dos Anais da Cmara dos Deputados pg. 711 Consideraes Finais pg. 723 Posfcio pg. 731 Comentrios pg. 735 Referncias pg. 748

Lista de Ilustraes

Pg. Quadro/Ilustrao n 1 e 1/A Jornada dos Mrtires Antnio Parreiras Museu Mariano Procpio Juiz de Fora MG. Tiradentes ante o carrasco Rafael Falco Comisso de Constituio e Justia Cmara dos Deputados ............................................................................. Quadro/Ilustrao n 2 A chegada da Famlia Real e comitiva na cidade do Rio de Janeiro ....................................................................... Quadro/Ilustrao n 3 O plenrio das Cortes Gerais, Extraordinrias e Constituintes da Nao Portugueza. O Deputado Antonio Carlos Ribeiro de Andrada Machado e Silva (SP) diante do pronunciamento insolente das galerias e assediado de apartes querendo abafar sua voz que defendia os mais legtimos interesses do Brasil, afirma impavidamente, em tom solene, que faz emudecer, desde logo, a gritaria: Silncio! Aqui desta tribuna at os reis tem que me ouvir. ....................... Quadro/Ilustrao n 4 e 4/A O Palcio e Capela das Necessidades litografia colorida de Martins Lopes. Lisboa. (Sec. XIX). Pintura da luneta colocada sobre a mesa da Presidncia da Sala das Sesses da Assemblia da Repblica Portuguesa. Foi pintada por Veloso Salgado e representa os Constituintes de 1821, em sesso plenria no Palcio das Necessidades, na Sala da Livraria do Convento. As figuras so retratos de 50 constituintes, focando a tela o momento em que usa da palavra o Deputado Fernandes Toms ................................................. Ilustrao n 5 e 5/A O Imperador D. Pedro I ............................

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Quadro/Ilustrao n 6 e 6/A A Abadessa do Convento da Lapa (Bahia), Joanna Anglica de Jesus (A mrtir da independncia do Brasil) e a reunio dos Procuradores Gerais das Provncias do Brasil na cidade do Rio de Janeiro ....................................................................... 92-93 Ilustrao n 7 Interior do edifcio da Cadeia Velha aps a reforma para instalao da Assemblia Geral Constituinte e Legislativa de 1823 .................................................................................................. Quadro/Ilustrao n 8 8/A e 8/B Os irmos Andradas: Jos Bonifcio de Andrada e Silva, Antnio Carlos Ribeiro de Andrada Machado e Silva e Martim Francisco Ribeiro de Andrada .........................

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Pg. Quadro/Ilustrao n 9 O Deputado Antonio Carlos Ribeiro de Andrada Machado e Silva reverenciando o soberano do mundo e o poder de persuaso inerente aos canhes da artilharia imperial .. Quadro/Ilustrao n 10 e 10/A Sesso Plenria da Assemblia Geral Constituinte e Legislativa de 1823 .......................................... Quadro/Ilustrao n 11 O Deputado s Cortes Gerais, Extraordinrias e Constituintes da Nao Portuguesa, Jornalista Cypriano Jos Barata de Almeida .............................................................................. Quadro/Ilustrao n 12 O Presidente da Cmara, Deputado Jos da Costa Carvalho, depois Marqus de Monte Alegre ............... Quadro/Ilustrao n 13 O Presidente da Cmara, Deputado Martim Francisco Ribeiro de Andrada .............................................. Quadro/Ilustrao n 14 O Regente Diogo Antnio Feij .....

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Quadro/Ilustrao n 15 e 15/A O Deputado Francisco G Acaiaba de Montezuma, Visconde de Jequitinhonha e o Deputado Honrio Hermeto Carneiro Leo, Marqus do Paran ................................189-190 Quadro/Ilustrao n 16 e 16/A O Presidente da Cmara, Deputado Joaquim Marcelino de Brito e o Imperador D. Pedro II decnio de 1850 .......................................................................................199-200 Quadro/Ilustrao n 17 e 17/A O Presidente da Cmara, Deputado Henrique Pereira de Lucena, Baro de Lucena e a Princesa Imperial Regente D. Isabel Cristina Leopoldina Augusta Micaela Gabriela Rafaela Gonzaga de Bragana e Bourbon ..................................269-270 Quadro/Ilustrao n 18 e 18/A Proclamao da Repblica: o Marechal Manoel Deodoro da Fonseca deixando o ministrio logo aps a demisso dos membros do 36 Gabinete Visconde de Ouro Preto e o Chefe do Governo Provisrio Marechal Manoel Deodoro da Fonseca ....281-282 Quadro/Ilustrao n 19 A cerimnia de posse e compromisso constitucional do Presidente da Repblica Marechal Manoel Deodoro da Fonseca ......................................................................................... Quadro/Foto n 20 e 20/A O Presidente da Assemblia Nacional Constituinte (1933/1934), Deputado Antnio Carlos Ribeiro de Andrada e o Governo Provisrio 24/10 a 3/11/1930 ...............................

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Quadro/Foto n 21 e 21/A O Presidente da Cmara Deputado Pedro Aleixo e o Presidente da Repblica Getlio Dornelles Vargas .....407-408 Quadro/Foto n 22 22/A 22/B 22/C e 22/D O Presidente da Assemblia Constituinte, Senador Fernando de Melo Viana, assina a Carta de 1946 no plenrio lotado da Cmara dos Deputados; Mesa da Assemblia Constituinte de 1946; Palcio Tiradentes Sede da As-

Pg. semblia Constituinte de 1946; o Presidente da Cmara, Deputado Honrio Fernandes Monteiro e o Presidente da Repblica Marechal Eurico Gaspar Dutra ..................................................................................423-426 Quadro/Foto n 23 23/A 23/B 23/C e 23/D O Presidente da Cmara, Deputado Paschoal Ranieri Mazzilli; o Presidente da Repblica Juscelino Kubitschek de Oliveira; Visita s obras do edifcio do Congresso Nacional; Sesso Solene do Congresso Nacional em Braslia e Manifestao popular em frente do Congresso Nacional ..................453-454 Quadro/Foto n 24 e 24/A O Presidente, em exerccio, da Cmara, Deputado Afonso Celso Ribeiro de Castro e o Presidente da Repblica, Joo Belchior Marques Goulart ...............................................483-484 Quadro/Foto n 25 e 25/B O Presidente da Cmara, Deputado Adauto Lcio Cardoso e o Presidente da Repblica, Marechal 508 Humberto de Alencar Castello Branco ..................................................... Quadro/Foto n 26 26/A 26/B e 26C O Presidente da Cmara, Deputado Jos Bonifcio Lafayette de Andrada; o Presidente da Repblica, Marechal Artur da Costa e Silva; visita do Presidente Costa e Silva ao Gabinete do Vice-Presidente Pedro Aleixo e o VicePresidente da Repblica, Pedro Aleixo ......................................................541-542 Quadro/Foto n 27 27/A 27/B 27/C O Presidente da Cmara, Deputado Marco Antnio de Oliveira Maciel, com o Ministro do Planejamento e Coordenao Geral, Joo Paulo dos Reis Velloso e o Deputado Jos Alencar Furtado; o Presidente da Repblica, Generalde-Exrcito Ernesto Geisel; o Presidente da Cmara, Deputado Marco Antnio de Oliveira Maciel, cumprimenta o Presidente dos Estados Unidos da Amrica do Norte, Jimmy Carter (1977-1981), quando de sua visita ao Congresso Nacional no dia 30 de maro de 1978 ....................563-564 Quadro/Foto n 28 28/A e 28/B O Dr. Tancredo de Almeida Neves; o Presidente da Cmara, Deputado Ulysses Silveira Guimares e o Presidente da Repblica, Jos Sarney Costa .........................................584-586 Quadro/Foto n 29 e 29/A Plenrio da Assemblia Nacional Constituinte e o Presidente da Assemblia, Deputado Ulysses Silveira 616 Guimares e a Constituio Cidad ........................................................... Quadro/Ilustrao n 30 O Presidente da Repblica Luiz Incio Lula da Silva e o Vice-Presidente Jos Alencar Gomes da Silva. Deslocamento para cerimnia de posse e prestao do compromisso 663 constitucional no Congresso Nacional no dia 1 de janeiro de 2003 ..... 664 Quadro/Ilustrao n 31 A diversidade partidria .................... Galeria dos Presidentes da Cmara dos Deputados Repblica ...........................................................................................................665-675

Pg. Quadro n 32 Capa do Dirio da Cmara dos Deputados do dia 17 de abril de 2003 (180 anos da Primeira Sesso Preparatria da Assemblia Geral, Constituinte e Legislativa do Imprio do Brasil, realizada no dia 17 de abril de 1823) .............................................................. Quadro n 33 Capa do primeiro volume de Anais da Assemblia Geral Constituinte e Legislativa de 1823. Neste volume registrase, dentre outras, a Primeira Sesso Preparatria da Assemblia Geral, Constituinte e Legislativa do Imprio do Brasil, realizada a 17 de abril de 1823 ......................................................................................................

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Apresentao

Democracia: um ideal em construo

Construo da Democracia, de Casimiro Neto, ilustra a bibliografia histrico-poltica nacional com uma brilhante sinopse do desempenho parlamentar no Brasil ao longo de quase dois sculos. Quando se comemoram 180 anos de histria do Parlamento brasileiro, ressalte-se como nos d a conhecer o historiador o importante papel do Legislativo como centro de debates, frum em que se discutem as grandes questes da nacionalidade. Na Cmara dos Deputados, sentimos bater cada vez mais fortemente o corao do Brasil. Afinal, somos a Casa do Povo, e assim nos dizemos no por estratgia retrica, mas porque verdadeiramente nos sentimos a instituio em que devem ter voz, de maneira livre e democrtica, os interesses do povo, os sentimentos do cidado, os reclamos da opinio pblica. Como no poderia deixar de ser, o nus que nos incumbe diretamente proporcional grandeza do encargo. Expomo-nos a protestos e a crticas, a calnias e a difamaes, sem que abdiquemos da responsabilidade de construtores da democracia, de promotores da justia, de defensores da liberdade. No outra a essncia deste A Construo da Democracia, com que Casimiro Neto nos reporta a luta que, h 180 anos, empreende a Cmara dos Deputados pela democracia que se deve ao povo brasileiro. Democracia da qual, certa vez, o jornalista Carlos Castello Branco deu irretocvel definio: o equilbrio entre ordem e liberdade, entre autoridade e legalidade a prpria essncia do regime democrtico, que jamais aspirou a dar direitos sem atribuir deveres, que nunca permitiu, em tese, distribuir franquias sem a contrapartida das responsabilidades. A Cmara dos Deputados sente-se, pois, orgulhosa em trazer a pblico A Construo da Democracia, de Casimiro Neto, obra que se destaca entre as mais relevantes da historiografia brasileira e engrandece a Casa a que temos a honra de pertencer. Agosto de 2003. Deputado JOO PAULO CUNHA Presidente da Cmara dos Deputados

A

Prefcio

O relato dos acontecimentos e da sistemtica de funcionamento do Parlamento demonstra a importncia da Democracia. Revela os diversos acontecimentos histricos e marcantes os quais a Ptria se viu a enfrentar. Mudanas necessrias, e outras, nem tanto, mas que por isso no deixam de ter a devida importncia no processo de desenvolvimento de um povo. Nessa linha de raciocnio, o autor, servidor pblico da Cmara dos Deputados, demonstra toda a sua experincia de pesquisador. Mostra-se apaixonado por aquilo que faz, atitude que enobrece a Instituio e a atividade a qual ele se disps a efetuar servir ao pblico, ao povo, Nao. uma Obra precursora da mentalidade voltada ao questionamento, que sempre ser atual, pois caracterstica primaz da atualidade a perenidade que se apresenta nesses registros. Em cada pgina verifica-se uma homenagem s idias dos grandes homens e aos momentos histricos do Parlamento. A sntese est nas pginas com que o autor relembra o Deputado Ulysses Guimares. Reproduz, do Dr. Ulysses esta a forma com que sempre nos dirigimos a ele e sobre ele : (...) o tempero do tempo a tmpera duradoura da lei. O tempo no perdoa com o que se faz sem ele, na genial advertncia de Joaquim Nabuco. substancial o tempo na elaborao das boas leis, para que elas durem com o tempo. Tambm nas leis, o tempo o exerccio da cidadania. Eis a razo institucional pela qual o Legislativo tenha geralmente duas Casas como instncias de reflexo. (...) Senadores ou Deputados, no somos legisladores exclusivos. O povo o legislador supremo, criticando, sugerindo, aplaudindo ou condenando as matrias em causa no Parlamento. As palavras aqui alinhavadas no englobam nem representam o alcance que a Obra representar para a histria e a literatura legislativa.

E

sta obra engrandece toda a Nao, a comear por seu ttulo.

mister que o leitor se debruce sobre essas pginas de vvida e real histria do Legislativo Brasileiro. certo que ela se alar ao patamar dos grandes acontecimentos descritos em seu texto, rumo ao futuro. Junho de 2003. Ministro NELSON JOBIM Vice-Presidente do STF

Consideraes do Autor

o dia 29 de agosto de 1821 os deputados constituintes da Provncia de Pernambuco desembarcam em Lisboa, prestam juramento e tomam assento nas Crtes Geraes, Extraordinrias e Constituintes da Nao Portugueza. Inicia-se o primeiro captulo de uma das mais belas pginas parlamentares na construo da democracia brasileira. A partir da comeam a chegar e a tomar posse os demais constituintes das outras provncias do Brasil. O que deveria ser um entrave aos propsitos brasileiros devido difcil travessia do Atlntico; s incertezas da terra desconhecida; aos conflitos de interesses, materiais e polticos, entre Brasil e Portugal; e uma assemblia com ampla maioria portuguesa com propsitos recolonizadores, serve de estmulo aos representantes das provncias. A tudo isso soma-se a defesa veemente e altiva dos interesses do Reino Americano, com arrebatados pronunciamentos que tocam por vezes o extremo da audcia. Destaca-se nestes embates, sobranceira, a figura do Constituinte Antnio Carlos Ribeiro de Andrada Machado e Silva (SP). Este na sesso do dia 22 de maio de 1822, diante do pronunciamento insolente das galerias e assediado de apartes querendo abafar sua voz que defendia os mais legtimos direitos de sua Ptria, afirma impavidamente, em tom solene, que faz emudecer, desde logo, a gritaria: Silncio! Aqui desta tribuna at os reis tm que me ouvir. Em sntese, esta a proposta desta obra. O trabalho de reunir as proposies e pronunciamentos de grande repercusso nacional, publicados nos Anais e Dirios da Cmara dos Deputados, das Assemblias Nacionais Constituintes e do Congresso Nacional, destaca e deixa claro a efetiva participao dos deputados no processo histrico brasileiro. Longe est o intento de fantasiar esta ou aquela passagem histrica no registrada nas publicaes oficiais. Em alguns fatos registrados a preocupao foi a de se ater s informaes colhidas de diversas pessoas e servidores da Casa que acredito idneas e que presentes assistindo e acompanhando a pesquisa muito enriqueceu as pginas ora apresentadas. Por problemas de espao e pela linha editorial proposta, no possvel transcrever todos os pronunciamentos e atos legislativos dos grandes momentos da Cmara dos Deputados ou das Assemblias Nacionais Constituintes. So momentos dramticos, vivenciados na plenitude do processo histrico brasileiro e outros de grande patriotismo vividos pelos deputados ou pelos constituintes dentro ou fora do Parlamento.

N

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Casimiro Neto

Todos eles, de um modo ou de outro, contribuiram com sua cota de sacrifcio e de bem querer por este imenso Brasil, discutindo a liberdade ou, falta desta, as mazelas e as conquistas de dias melhores para o povo brasileiro, na busca permanente da construo e reconstruo da democracia. Os pronunciamentos ou propostas, inseridas ou no nesta obra, no desmerecem ningum, pelo contrrio engrandecem o Parlamento e ressaltam um fato histrico pela fora das idias. Peo desculpas, e rendo homenagens a todos queles que bem souberam colocar os fatos na tribuna e discuti-los em plenrio. Vale a pena repassar a histria atravs dos discursos, pronunciamentos, debates e discusses ocorridos no Plenrio das Assemblias Constituintes, da Cmara dos Deputados, do Senado Federal e do Congresso Nacional. Conhecer os grandes oradores, a retrica, a perorao, vivenciar em sua plenitude a construo da democracia brasileira. Fatos pitorescos, fatos que nos levam a plena indignao, fatos que nos fazem sorrir, fatos que orgulham os cidados e o Brasil. Por isso acredito que o objetivo foi alcanado incentivar o debate e a pesquisa, reviver a histria parlamentar, dela tirar lies exemplares e muito aprender. Tudo que o Parlamento foi, fez, pensou, discutiu, debateu ou aprovou est magicamente preservado nas pginas dos Anais e Dirios da Cmara dos Deputados, das Assemblias Nacionais Constituintes, do Senado Federal, e do Congresso Nacional. Magicamente, porque foi graas ao trabalho dos servidores que nos antecederam, em pocas remotas, sem meios tecnolgicos apropriados, que tudo fizeram para a preservao da nossa histria legislativa. Neste momento cabe a ns, em homenagem a estas abnegadas pessoas e valorizao do Parlamento, continu-lo para as geraes futuras. Esta obra o resultado de longas horas de pesquisa dedicadas ao atendimento ao cidado e da vontade, sobre todos os aspectos aqui enfocados, em divulgar os trabalhos legislativos e as atividades dos representantes do povo das provncias e depois dos estados brasileiros, ao longo de 180 anos aps a Independncia do Brasil, completados a 17 de abril de 2003, de 182 anos de representao parlamentar a completar no dia 29 de agosto deste mesmo ano, e de 15 anos da promulgao da Constituio Federal de 1988 que estaro sendo completados em 5 de outubro de 2003. A construo da nossa democracia foi rdua e com muitas interrupes. Por isso, sem o resgate da nossa histria legislativa, como teremos contato com o nosso passado, com o conhecimento do que se construiu e do que se fez por este imenso Brasil? Como haveremos de receber, com orgulho, a herana das conquistas acumuladas pelas geraes anteriores? Sem isto, como valorizar a instituio da qual fazemos parte? Os fatos, os partidos e as aes individuais de cada deputado retratam o Parlamento, compem a sua histria e do a dimenso exata do seu valor. Sendo assim, para transcrio dos pronunciamentos e proposies, fiz a opo de usar a grafia original conforme os registros taquigrficos inseridos nos

A Construo da Democracia

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Anais e Dirios da Cmara dos Deputados, das Assemblias Nacionais Constituintes, e do Congresso Nacional. Existem alguns erros grficos nestas publicaes, mas no poderia assumir o risco da correo sob pena de, criminosamente, estar deturpando o que est escrito no documento impresso. Acredito que, ao respeitar a escrita original, estou aguando a busca e o conhecimento dos fatos histricos, alm de tornar a leitura mais vivenciada, mais dinmica, mais empolgante. Procurei inserir neste trabalho o conhecimento e a vivncia de alguns anos dedicados exclusivamente pesquisa parlamentar o mais procurado, o mais questionado, o mais polmico. Certamente estou cometendo erros e omisses, o que natural num trabalho de tamanha empreitada, porm inaceitvel numa obra de pesquisa. Por isso me coloco a inteira disposio para futuras inseres ou correes que se fizerem necessrias. Ao trmino desta obra j est em andamento a sua reviso. As crticas e sugestes sero sempre objeto de anlise, inseres e soma de novos conhecimentos, mas, desde j, com humildade, o meu pedido de desculpas por possveis erros, lapsos e omisses. Parafraseando Dom Francisco Manuel de Mello escritor portugus , relembro que os maiores pecados (erros) eu os castiguei, os menores vs os vdes e castigareis. Conto com a indulgncia dos leitores. Neste ponto a lio de Rafael Bluteau est presente quando nos ensina que nenhum autor est obrigado a esgotar a matria de que trata; nem se deve envergonhar se, entre as muitas coisas que sabe, ignora algumas.

Introduo

os pases regidos por uma constituio democrtica, a opinio pblica o principal elemento de fora, de negociao e tambm a essncia em que se devem apoiar os poderes do Estado. Os representantes do povo, a quem so confiados o governo, para que bem possam administrar o bem pblico, devem se inspirar nos sentimentos da Nao e ter a preocupao constante de ir receber nas fontes populares a boa gua, lmpida e transparente, que revigora e fortifica a suas aes e a promulgao dos grandes atos pblicos. A Constituio Federal de 1988, consagra, em seu artigo 1, pargrafo nico, o princpio da soberania popular pelo qual todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente. o seu porto seguro. Este gesto de humildade e reconhecimento sabedoria popular justifica-se porque o parlamentar de gabinete e o governante enclausurado j no fazem sentido na democracia contempornea e que na lio de Acio Neves da Cunha (PSDB-MG) aprisionada em suas rotinas e divorciada da vontade popular, a representao serve ao esvaziamento da poltica, descrena em seus atores e, por decorrncia, ao enfraquecimento da democracia. Expondo seus atos e suas decises luz da publicidade, e provocando sobre eles as apreciaes da tribuna, do cidado, das entidades representativas e dos meios de comunicao, imprime-se-lhes, afinal, o cunho de uma resoluo geralmente aceita e qual no faltou a sano do Pas, que nas sbias palavras do Deputado Ulysses Silveira Guimares (PMDB-SP) o povo o legislador supremo, criticando, sugerindo, aplaudindo ou condenando as matrias em causa no Parlamento, bem como os seus autores. Os cidados no podem ser surpreendidos e alarmados por decises imaturas, muito menos instantneas, e que de acordo com a Deputada Luiza Erundina de Sousa (PSB-SP) ao contrrio do que se poderia supor, a diviso do poder com o povo, fonte e origem do poder, contribuir, certamente, para que a representao se legitime e se fortalea ainda mais, pois democracia representativa e democracia direta so dois pilares que sustentam o edifcio da Democracia e da Cidadania. O Deputado Antonio Pereira Pinto (ES) em sua introduo aos primeiros volumes dos Anais Parlamentares deixou escrito que: Relativamente vulgarisao dos debates do corpo legislativo os resultados polticos que se colhem so de todo o ponto dignos da mais seria atteno, por meio della o povo inteiro assiste, por assim dizer, s deliberaes do parlamento. O orador no se dirige s assembla de que faz parte, mas por seu intermedio ao mundo inteiro.

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Casimiro Neto

A publicidade converteu-se em um dos mais poderosos instrumentos do governo parlamentar. O povo consultado pelo parlamento, e concorre para a adopo ou condemnao das leis que nelle so propostas, e desse modo as mesmas leis no so leis emquanto a approvao publica no as tem sanccionado. Assim o entendero perfeitamente os fundadores do Imperio, manifestando logo na Assembla Constituinte e depois no principio da legislatura de 1826 todo o empenho pela publicao dos actos e dos debates parlamentares, cogitando e com justa razo que era esse o meio efficaz de dar realce, e prestigio s suas deliberaes. A Assemblia Geral, Constituinte e Legislativa precisava divulgar os seus trabalhos, que, conforme as palavras do Deputado Cndido Jos de Arajo Vianna, Visconde e Marqus de Sapuca (MG), torn-se necessrio para que a nao convenientemente se instra dos trabalhos dos seus representantes e julgue do fervor com que estes sustento os interesses publicos na rdua e difficil tarefa da organisao de lei fundamental, e das mais leis e reformas urgentes que a seus desvelos se acho confiadas. No momento da Independncia do Brasil, vrias provncias se encontravam em mos de governantes portugueses, tornando difcil congregar num s pensamento o ideal de uma nova Nao. A afirmao da independncia, alm de uma forte poltica de unificao interna, necessitava tambm do apoio externo, j que o Pas no poderia sobrevevir isolado das outras naes. Por isso, a informao considerada estratgica para a sua consolidao e precisava ser divulgada junto aos cidados brasileiros, residentes estrangeiros, dissidentes e, acima de tudo, reconhecida pela Nao Portuguesa e por outros pases, principalmente, Inglaterra, Estados Unidos da Amrica do Norte, Frana e ustria. A publicao dos grandes atos pblicos e polticos da Nao brasileira requer urgncia e imprescindvel. Os jornalistas e a imprensa da poca tornam-se grandes aliados do Parlamento e do Governo imperial, contribuindo imensamente, atravs dos seus peridicos e folhas, na propagao das idias democrticas do novo pas. A eles, no podemos esquecer, devemos a transcrio integral das sesses parlamentares e a preservao destas primeiras pginas da nossa histria legislativa.

A Construo da Democracia

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Antecedentes da Histria Legislativa do Brasil Independente

Rainha D. Maria I, filha de D. Jos I e de D. Mariana Vitria, nasceu em 17 de fevereiro de 1734, na cidade de Lisboa e casou-se em 1760 com o tio, Prncipe D. Pedro, que mais tarde tomou o nome de D. Pedro III. Bonita e elegante, com ares de doura e pureza, foi criada num ambiente austero e triste, tendo uma educao extremamente religiosa. Sobe ao trono portugus, em 16 de julho de 1777, por morte de D. Jos I, seu pai. demitido o Sr. Sebastio Jos de Carvalho e Mello, Conde de Oeiras e Marqus de Pombal, todo poderoso ministro da Corte portuguesa e considerado um ateu, cessando, assim, sua influncia na poltica lusitana. Em 1780 condenado ao desterro. Em 5 de janeiro de 1785 D. Maria I, atravs de Carta Rgia, manda extinguir todas as fbricas e manufaturas de l, algodo, linho, seda, ouro, prata, e quebrar a martelo todos os teares das indstria de tecidos no Brasil, exceto a de pano grosso para sacarias ou roupas de escravos. Com a Carta Rgia de 5 de julho de 1802 chega-se ao cmulo de proibir aos governadores o recebimento, em audincia, de pessoas vestindo roupas feitas com tecidos no fabricados ou exportados de Lisboa. A morte do seu marido, em 1786; a do seu seu filho e herdeiro do trono, Prncipe D. Jos, irmo mais velho de D. Joo, em 1788; a do seu mestre confessor; o temor dos efeitos que a Revoluo Francesa de 1789 pudessem trazer a Portugal, causando-lhe a perda do trono; e, principalmente, por sua rgida educao religiosa, o pavor de perder, tambm, sua alma so considerados os principais fatores que levaram a rainha a apresentar sintomas de alienao mental. Ofcio recebido por Cypriano Ribeiro Freitas, Ministro de Portugal, em Londres, datado de 4 de fevereiro de 1792, e escrito pelo Ministro dos Estrangeiros, Lus Pinto de Sousa Coutinho, atesta seu princpio de melancolia e insnia mental. Em julho de 1799 considerada louca, oficialmente. Faleceu, na cidade do Rio de Janeiro, em 20 de maro de 1816. D. Joo VI, batizado com o nome de Jos Maria Francisco Xavier de Paula Lus Antnio Domingos Rafael de Bragana e Bourbon, o Clemente, 28 Rei de Portugal, 24 Rei dos Algarves, Rei do Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves, Imperador Titular do Brasil, Regente do Reino de Portugal durante o impedimento de sua me, a Rainha Senhora D. Maria I, Prncipe

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da Beira e do Brasil, Duque de Bragana, Duque de Guimares, Duque de Barcelos, Marqus de Vila Viosa, Conde de Arraiolos, Conde de Ourm, Conde de Barcelos, Conde de Faria e de Neiva, Conde de Guimares, Senhor da Serenssima Casa do Infantado, Magestade. Era filho de D. Maria I e de D. Pedro III. Nasceu na cidade de Lisboa, no Real Pao da Ajuda, em 13 de maio de 1767. Casa-se, em 1785, com Dona Carlota Joaquina de Bourbon, filha de Carlos III e irm de Carlos IV, rei da Espanha e torna-se, oficialmente, Prncipe Regente, em julho de 1799, apesar de j governar, em nome de sua me, impossibilitada de exercer sua funo no Reino, desde 10 de fevereiro de 1792. aclamado rei do Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves, em 6 de fevereiro de 1818, no Rio de Janeiro, e neste mesmo dia expede decreto de indulto aos presos do reino do Brasil. a primeira e nica vez que um monarca europeu assumir o trono em uma Corte nos trpicos. Faleceu, na mesma cidade em que nasceu, no Pao Real da Bemposta, a 10 de maro de 1826. D. Pedro I, Imperador do Brasil e Rei de Portugual, o terceiro filho do Prncipe Regente D. Joo, mais tarde D. Joo VI, e da Princesa Real D. Carlota Joaquina Teresa Cayetana de Bourbon y Bourbon. Nasceu o primeiro imperador do Brasil no Real Pao de Queluz, em Lisboa, a 12 de outubro de 1798, sendo batizado com o nome de Pedro de Alcntara Francisco Antnio Joo Carlos Xavier de Paula Miguel Rafael Joaquim Jos Gonzaga Pascoal Cipriano Serafim de Bragana e Bourbon. Falecendo seu irmo mais velho, o Prncipe D. Antnio de Bragana e Bourbon, em 1801, e sendo o primognito da famlia real a infanta D. Maria Teresa de Bragana e Bourbon, passou o infante D. Pedro de Alcntara a ser o herdeiro da coroa portuguesa, com o ttulo de Prncipe da Beira. Casa-se, em 6 de novembro de 1817, na cidade do Rio de Janeiro, com a Arquiduquesa dustria, Maria Leopoldina Josefa Carolina Francisca Fernanda Beatriz de Habsburgo-Lorena, nascida em Viena a 22 de janeiro de 1797, filha do Imperador Francisco II, da Alemanha e 1 da ustria, Rei da Hungria e da Bohemia, e da Imperatriz D. Maria Theresa Carolina de Bourbon-Npoles, sobrinha da Rainha Maria Antonieta, e irm da Imperatriz D. Maria Luiza, segunda esposa do Imperador Napoleo Bonaparte. Em 1819 nasce a primeira filha do casal, D. Maria da Glria Joana Carlota Leopoldina Paula Izidora Micaela Rafaela Gonzaga de Bragana e Habsburgo. Com a morte da Imperatriz Leopoldina, no dia 11 de dezembro de 1826, casa-se, em segundas npcias, com a Princesa D. Amlia Augusta Eugnia Napoleo de Beauharnais e Leuchtenberg no dia 16 de outubro de 1829. O Imperador D. Pedro I faleceu no dia 24 de setembro de 1834, com 36 anos incompletos, no Real Pao de Queluz, no mesmo quarto em que nascera o Salo D. Quixote. O Brasil deve-lhe a independncia e Portugal a liberdade. 1788-1789. Conspirao da Inconfidncia Mineira. Experincia histrica brasileira em matria constituinte, de liberdade e de independncia, ocorrida na Capitania de Minas Gerais. Homens destemidos e apaixonados pelo

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Brasil, revoltados com a poltica colonialista portuguesa, idealistas, inspirados, tambm, em pensamentos, livros e publicaes da poca sobre as mudanas constitucionais de ento e sobre os ltimos acontecimentos no mundo, comeam a questionar, debater e propor uma nova realidade nacional. O sculo XVIII, na Europa, tempo de grande agitao poltica e filosfica. Um clamor de liberdade para todos, em todos os assuntos, em todos os cantos e recantos, espalha-se pelo continente europeu. As novas idias alastram-se rapidamente.Os homens passam a debater um conceito at ento indiscutvel: que os reis governavam por determinao divina. Inicia-se a luta contra as tiranias. O homem deve ser livre, deve poder pensar o que quiser. Essas idias revolucionam tambm o Novo Mundo. A declarao de Independncia dos Estados Unidos da Amrica no dia 4 de julho de 1776 redigida por Thomas Jefferson, um dos membros mais importante do Segundo Congresso Continental em Philadelphia, devido sua popularidade e lucidez de seu estilo literrio , assinada pelos representantes de nove das treze colnias, que se haviam insurgido contra a Inglaterra para a definitiva conquista de sua liberdade. declarada, solenemente, a igualdade dos homens, e que entre os seus direitos inalienveis estavam o da vida, da liberdade, e da busca da felicidade. No texto, o redator incorpora a sua filosofia iluminista, inspirada nas idias avanadas dos pensadores franceses e ingleses. Diz a declarao em seu prembulo: So verdades indiscutveis para ns: que todos os homens nascem iguais; que a todos concebeu o Criador certos direitos inalienveis, entre os quais esto o da vida, liberdade e a busca da felicidade; que os homens, para assegurarem esses direitos, constituram governos, cujos justos poderes emanam do consentimento dos governados. Que, toda vez que uma forma de governo contraria esses fins, um direito do povo alter-la ou aboli-la e instituir um novo governo, basendo seus fundamentos em princpios tais e organizando seus poderes de tal forma, que a eles parea contribuir mais eficazmente para sua segurana e felicidade. A declarao, na verdade, estipula o direito das colnias a se tornarem Estados livres e independentes, desligados de qualquer compromisso de obedincia Coroa britnica, com a qual rompe toda unio poltica. A primeira constituio norte-americana aprovada sob o nome de Articles of Confederation and Perpetual Union. Os Artigos da Confederao s entra em vigor em 1781, com a anuncia do ltimo Estado a subscrev-la Maryland. Em 1787, sob a presidncia de George Washington e a presena de figuras notveis como Hamilton, Madison, Franklin e outros grandes lderes, reune-se em Philadelphia uma conveno federal 5 Congresso Continental , incumbida de elaborar a Constituio definititiva que votada no dia 17 de setembro de 1787. Aprovada a Carta poltica, foi a mesma levada a ratificao dos Estados-Membros, passando a vigorar em 1789, poca em que se constitui o primeiro governo federal, tendo frente George Washington (17891797), o qual nomeia para seus auxiliares, dentre outros, Hamilton, Jefferson e o General Henry Knox, respectivamente, Secretrio da Fazenda, do Interior e Exterior, e da Guerra. Posteriormente, no Primeiro Congresso Federal,

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com a presena, dentre outros, de Patrick Henry e Samuel Adams, acrescida do Bill of Rights (declarao de direitos), com dez emendas aprovadas conjuntamente em 1791, asseguradoras de vrias prerrogativas individuais, como a liberdade de palavra, de imprensa, de religio, de petio, de reunio, de ser julgado o criminoso por jri local com recursos para Cortes superiores, garantias para a pessoa, domiclio, etc. Esta Constituio americana coloca em prtica o princpio da separao dos poderes, formulado por Locke e Montesquieu. O episdio da Inconfidncia Mineira em Minas Gerais transcorre entre a revoluo americana, sua posterior constituio e a revoluo francesa com a tomada da Bastilha no dia 14 de julho de 1789, que derruba o antigo regime e proclama os Direitos Universais do Homem e do Cidado, aprovados a 26 de agosto deste mesmo ano. A soberania encarnada pela nao, da qual todo governante no passa de mandatrio. A lei a expresso da vontade geral; e o respeito indiscutvel e obrigatrio ordem legal fica assegurado pela separao dos poderes. o direito da pessoa fazer tudo aquilo que no prejudica o outro. A Inconfidncia Mineira comea, precisamente, no ano de 1788. a primeira expresso constituinte de uma nova conscincia poltica nacional, que se confunde com a noo especfica de Estado, de Estado Nacional, de Estado independente e de Estado soberano. Estes inconfidentes, por sugesto de Alvarenga Peixoto, colheram do incio de um verso do poeta latino Virglio escrito em Roma entre 42 e 39 a.C , na sua primeira cloga das Buclicas, quando o personagem Ttiro ante a pergunta de Melibeu: E que to poderosa causa tiveste de ver Roma? responde: A liberdade, que, embora tardia, voltou a face, afinal, e olhou para mim, negligente em conquistar seu favor, quando via a barba tombar cada vez mais branca sob a navalha. Favoreceu-me enfim, aps longo tempo veio, depois de tornar-se minha senhora Amarlis, e libertar-me de Galatia. Pois sim, confessarei enquanto meu corao era prisioneiro de Galatia, nem tinha esperana de liberdade, nem cuidado do peclio. Em vo os currais produziam vtimas numerosas, em vo comprimia no cincho pingues queijos para a ingrata cidade: jamais a destra voltava para casa cheia de dinheiro. a adaptao para a expresso mxima da liberdade que sonhavam: Libertas: quae sera tamen A liberdade, que, embora tardia, ou ainda, Ainda que tarde, a liberdade. Delatados pelo Coronel Joaquim Silvrio dos Reis, e depois pelo Tenente-Coronel Baslio de Brito Malheiro do Lago e pelo Mestre-de-Campo Incio Correia Pamplona, o Alferes Joaquim Jos da Silva Xavier, por alcunha Tiradentes, que fora tropeiro, minerador e cirurgio feito prisioneiro no dia 10 de maio de 1789. Seguem-se vrias prises de outros inconfidentes, postos a ferros e incomunicveis. Comea a devassa, inqurito rigoroso para julgar os acusados de sedio, um crime infame, segundo a Coroa portuguesa. Passam a ser interrogados. No Rio de Janeiro, mantidos em celas individuais, s se avistando com seus interrogadores ou com os delatores com quem eram acareados, os inconfidentes aguardam a sentena durante trs

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longos anos. Em trs interrogatrios, Tiradentes tudo nega. Mas no dia 18 de janeiro de 1790, durante o quarto interrogatrio, confessa a conspirao. No quer, entretanto, que seu ato seja intil e, frustrado em libertar sua ptria, tenta ao menos salvar seus companheiros assumindo toda a responsabilidade nos acontecimentos. Em setembro de 1791 encerram-se os interrogatrios e em outubro terminam as investigaes. No dia 18 de abril de 1792, os cinco rus padres recebem a sentena. No dia seguinte, 19, so lidas as sentenas dos rus civis e militares, que condenam doze deles a pena capital. Digno e sereno, Tiradentes ouve a sua condenao e diz ao seu confessor Frei Raimundo de Penaforte: Se Deus me ouvisse, s eu morreria e no eles. E, como se Deus atendesse ao apelo, no dia seguinte, numa nova deciso, baseada em carta de clemncia da Rainha D. Maria I a Piedosa ou a Louca, essas condenaes, exceto a do Alferes Joaquim Jos da Silva Xavier, so comutadas em desterro perptuo na frica. Dez vidas eu daria, se as tivesse, para salvar as deles confessa. Portugal est enfraquecido economicamente, atrasado em relao aos novos tempos, j no o grande descobridor dos mares. A luta entre o reacionarismo intelectual, o absolutismo monrquico e as idias filosficas, estticas e polticas do iluminismo leva a uma rpida substituio de valores, assusta os governantes e vem da toda a exploso monrquica e absolutista contra os mentores e intelectuais do movimento. Um dos atos da Rainha D. Maria I, em sua real demncia, justamente a assinatura da sentena de morte pelo crime de sedio dada a Tiradentes, o mais popular dos inconfidentes, que assumiu total responsabilidade nos acontecimentos. Heri, torna-se o mrtir deste grande episdio e da independncia brasileira. Em 21 de abril de 1792, s onze horas e vinte minutos, no Largo da Lampadosa, no Rio de Janeiro, morre enforcado o heri, sem medo, de todo um povo. O mrtir da independncia brasileira tem sua cabea cortada e seu corpo esquartejado em quatro partes, salgado e distribudo em postes no caminho que levava Vila Rica. Sua descendncia considerada infame, a casa onde morava foi arrasada e salgada, para que nunca mais ali se construsse, tendo em seu lugar se erguido um pilar, recordando a culpa do abominvel ru, na nsia medieval de calar vozes e pensamentos. A violncia no intimida os brasileiros e ao contrrio do esperado pelos dominadores, semeia idias e sentimentos de liberdade e de independncia da Coroa portuguesa. Na morte, vence Tiradentes. Menos de dois anos depois o Governo portugus inicia uma nova devassa, desta vez no Rio de Janeiro, na denominada Conjurao Fluminense. A Sociedade Literria do Rio de Janeiro, fundada em 6 de junho de 1786, dissolvida com alarde como centro da conspirao. So presos e seqestrados os livros e papis do poeta e professor de Retrica Manuel Incio da Silva Alvarenga e do bacharel Mariano Jos Pereira da Fonseca, depois Marqus de Maric, entre outros. o temor rebelio que se alastrava. O processo inicia-se em 11 de dezembro de 1794 e se arrasta at o dia 14 de maio de 1796. Sem nenhuma culpa formada, depois de trs anos de encarceramento, so soltos.

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As idias de liberdade esto disseminadas. Na manh de 12 de agosto de 1798 aparecem afixados, em diversos recantos da cidade de Salvador, na Bahia, inmeros folhetos anunciando a chegada da liberdade e concitando o povo revolta, enquanto na praa principal da cidade, o povo dava vivas liberdade e morras aos preconceitos e tirnia. a primeira revoluo social no Brasil. So lavradores, alfaiates e soldados os artfices da Conjurao Baiana ou Conspirao dos Alfaiates, gente humilde, quase todos mulatos, envolvendo aproximadamente 676 pessoas sob a liderana do alfaiate Joo de Deus do Nascimento. A maioria delas no pode ser localizada pela Governo portugus durante a represso. Nesta revolta j se nota a influncia da Revoluo Francesa, com a divisa Liberdade, Igualdade e Fraternidade. O movimento fracassa, mas o Estatuto dos Trabalhadores confeccionado por Cypriano Jos Barata de Almeida, Manoel Faustino dos Santos (o Lira) e Joo de Deus do Nascimento, assinala o advento de um novo tempo ao Brasil. Forca, degrdo e crcere so o resultado da rebelio para esses homens. Dos rus, 34 ao todo, a represso portuguesa enforca quatro: Joo de Deus do Nascimento e seus imediatos, os soldados Lucas Dantas do Amorim Torres e Lus Gonzaga das Virgens, e o liberto Manoel Faustino dos Santos (o Lira). A cada instante torna-se mais difcil aos colonizadores portugueses impedir que as idias de independncia se alastrem pelo Brasil. E, em cada novo pensamento rebelde, em cada gesto de desobedincia poltica, em cada desejo de liberdade estava a sombra de um homem enforcado. O Alferes Jos Joaquim da Silva Xavier, vulgo Tiradentes, mostrara o caminho. No se pode deixar de citar a figura de Jos Joaquim Maia (RJ), brasileiro do Rio de Janeiro, estudante de medicina na Universidade de Montpellier, na Frana, que dois anos antes da Inconfidncia Mineira procurou e foi recebido por Thoms Jefferson, um dos construtores da independncia dos Estados Unidos e que fora designado embaixador da nova repblica em Paris no ano de 1785. Do pronunciamento do Deputado Brgido Fernandes Tinoco (PSD-RJ), na sesso de 11 de maro de 1946, transcrevo as seguintes palavras: A desigualdade de classes, a injustia da crte, a independncia dos Estados Unidos e o esprito de reforma que invadia todo o mundo civilizado, portanto, geraram a Inconfidncia mineira. O primeiro inconfidente foi Jos Joaquim Maia, nascido na choupana de um pobre artezo, sob o cu da capital do Brasil. Culto, inteligente, a sua entrevista com Jefferson, em que analisou a situao social do Brasil, marca a existncia de um realizador, de um grande idealista. Nas cartas de 2 de outubro e 21 de novembro de 1786, dirigidas a Jefferson, nas quais se assina Vendek, j o notvel Maia solicitava um auxlio extremo da brilhante nao americana, narrando-lhe que a ptria gemia em atroz escravido, os homens no tinham liberdade, o trabalho era aviltante e os usurpadores pisavam o solo ptrio rasgando as leis da natureza e da humanidade.

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Quadro/Ilustrao n 1 Jornada dos Mrtires Antnio Parreiras Museu Mariano Procpio Juiz de Fora MG

Quadro/Ilustrao n 1/A Tiradentes ante o carrasco Rafael Falco Comisso de Constituio e Justia Cmara dos Deputados

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7 de maro de 1808. Dez horas. Chegada da famlia real (a rainha, o prncipe, sua esposa, e os filhos) e de sua comitiva formada pelo aparelho burocrtico-administrativo e pela elite cortes cidade do Rio de Janeiro. recebida com grandes festas. Haviam aportado na Bahia no dia 22 de janeiro de 1808, e ali permanecem por mais de um ms, at o dia 26 de fevereiro. A frota lusitana, composta de quinze embarcaes, transportando a famlia real e a corte portuguesa com aproximadamente quinze mil pessoas, partira de Lisboa, escoltada pela armada inglesa sob o comando do Almirante Sir Sidney Smith, em 29 de novembro de 1807. Vinte e quatro horas depois, o General (francs) Jean-Andoche Junot, com a vanguarda de sua tropa, chega capital portuguesa. A invaso napolenica, em territrio portugus, pela fronteira de Segura, na Beira Baixa, ocorrera em 17 de novembro de 1807, para aplicar a deciso do Tratado Franco-Espanhol de Fontainebleau de 27 de outubro, que decidiu a partilha de Portugal. Com a inteno de impor a todos os pases da Europa sua poltica contrria Inglaterra e buscando golpear de morte o comrcio ingls, o Imperador Napoleo Bonaparte (1804-1815), que tomara o poder na Frana em 1799 e se tornara ditador com o ttulo de primeiro-cnsul, decreta, no ano de 1806, o Bloqueio Continental. O decreto probe os demais pases do continente europeu de estabelecer quaisquer relaes comerciais com os portos ingleses. No dia 7 de janeiro de 1807, a Gr-Bretanha, por meio de Ordens do Conselho, declara os portos franceses e os das suas colnias em estado de bloqueio, proibindo os navios de qualquer pavilho de aportarem nestes portos. a luta da terra contra o mar. Portugal, pas tradicionalmente aliado Gr-Bretanha e dependente do comrcio ingls, busca a todo custo manter sua neutralidade frente a poltica internacional francesa, transgredindo as exigncias feitas pelo Imperador (francs) Napoleo Bonaparte (1804-1815). Segundo as regras do Bloqueio Continental, Portugal fica obrigado a fechar seus portos aos navios ingleses, alm do confisco dos bens e a priso dos sditos britnicos residentes em terras lusitanas. Ou Portugal rompe com a Inglaterra, ou eu desmorono sobre Portugal declara o Imperador (francs) Napoleo Bonaparte (1804-1815). No dia 11 de agosto de 1807, Portugal intimado pelo governo francs a cortar as relaes com a GrBretanha. As coisas se complicam. Se o Prncipe Regente D. Joo cede ao que lhe impe a Frana, rompendo com a Inglaterra, que o mar, arrisca-se a perder a futurosa nao americana, que , para Portugal, a razo de um grande imprio alm-mar. Se no cede, ver a invaso do reino pelas tropas francesas. A deciso difcil e demorada. No h outra sada. Nem a neutralidade. No h como romper com a Inglaterra, antiga aliada e protetora. Descontente com a recusa de Portugal em obedecer s normas decretadas pelo seu governo, o Imperador (francs) Napoleo Bonaparte (18041815) declara a deposio da Casa de Bragana e ordena a invaso do territrio portugus. Ao Princpe Regente D. Joo restam duas alternativas:

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entregar-se humilhao de ser prisioneiro ou procurar refgio alm-mar, onde tambm soberano. No dia 22 de outubro realizada uma Conveno entre Portugal e a Gr-Bretanha sobre a transferncia para o Brasil da monarquia portuguesa e sobre a ocupao da ilha da Madeira por tropas inglesas. No dia 16 de novembro a frota britnica chega foz do Tejo. A idia de uma mudana da Corte portuguesa para o Brasil no era nova, nem abstrata. J se havia pensado na criao de um Grande Imprio do outro lado do Atlntico. Se por terra o General (francs) Jean-Andoche Junot domina a invaso, pelo mar o oceano era ingls e a Gr Bretanha lhe protegeria a fuga. Sob presso do exrcito francs, a 27 de novembro o embarque da Famlia Real para o Brasil tem de ser feito s pressas e em confuso, sob chuva persistente e montona, em uma manh enevoada e triste. A esquadra inglesa sob o comando do Almirante Sir Sidney Smith faz a proteo do frota real. Para o Brasil, o resultado da mudana da Corte lusitana passa a ter, em todos os sentidos, uma transformao histrica. A poltica estrangeira de Portugal, que era essencialmente europia, torna-se de repente americana. A colnia brasileira, como que antevendo o futuro que lhe ia sorrir, ao contrrio de Lisboa, em uma manh clara, fresca e dourada de sol, recebe-os com festas, com alegria na alma. Os menores gestos e trejeitos da real comitiva fazem a multido delirar e a todos encantam. Uma srie de atos administrativos so lavrados pelo Prncipe Regente D. Joo e postos logo em execuo. Tanto para dar emprego aos amigos que acompanham a Famlia Real, como para organizar um governo de fato, pois que baldadas eram as esperanas de breve regresso s terras lusitanas. iniciado um perodo de grandes transformaes e adaptaes, com a criao de reparties novas e encargos at ento desconhecidos no ambiente pacato e provinciano do Rio de Janeiro. De passagem por Salvador, na Bahia, em 22 de janeiro de 1808, antes de aportar no Rio de Janeiro, o Prncipe Regente convencido pelos seus conselheiros da necessidade de abrir nossos portos s naes amigas, o que se efetua pela Carta Rgia de 28 de janeiro de 1808. A produo brasileira subira de valor devido ao bloqueio napolenico e o Rio de Janeiro transforma-se num grande centro comercial de primeira ordem. Prejudicial aos ingleses, estes comeam a fazer presso para anular os efeitos desse decreto. Vitoriosos em suas pretenses, em 19 de janeiro de 1810, assinado tratado comercial com a GrBretanha, o que vem a se tornar um verdadeiro monoplio para este pas com efeitos nocivos para o Brasil, e que perduraram por longo tempo, onde os produtos inglses s esto sujeitos a 15 por cento de tarifas alfndegrias. J para as outras naes continentais, para entrar nas terras do Reino Americano, todas as mercadorias pagam 24 por cento de direitos de consumo, inclusive os produtos portugueses. Conseguem tambm a autorizao para manter em terras brasileiras, como havia em Portugal, um juiz seu, ingls, para julgar as causas em que fossem parte os sditos de sua majestade britnica.

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Quadro/Ilustrao n 2 A chegada da Famlia Real e comitiva na cidade do Rio de Janeiro

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13 de maio de 1808. expedido decreto, com a rubrica do Prncipe Regente, D. Joo VI, que cra a Impresso Rgia. Tem como objetivo a publicao de todos os atos normativos e administrativos da Crte portuguesa instalada no Brasil. Por ocasio da vinda da Famlia Real para o Brasil, o Sr. Antnio de Arajo, depois Conde da Barca, manda acondicionar no poro da Nau Meduza, integrante da frota real, os prelos que haviam sido comprados da Inglaterra para implantao de uma grfica na Secretaria de Estado dos Negcios Estrangeiros, e da Guerra, em Lisboa. Mais tarde, na Provncia do Rio de Janeiro, esse parque grfico passou a denominar-se Typographia Nacional, tendo como objetivo a impresso e publicao das leis, decretos e resolues da Assemblia Geral Legislativa, e dos atos oficiais e despachos do Governo Imperial. 10 de setembro de 1808. Comea a circular o primeiro jornal impresso no Brasil, a Gazeta do Rio de Janeiro (1808-1822). Posteriormente, o peridico A Idade dOuro do Brazil (1811-1823) e a revista O Patriota (1813-1814) e outros iniciam a imprensa no Brasil. No primeiro nmero da Gazeta do Rio de Janeiro, o editor, Frei Tibrcio Jos da Rocha, informa que ser publicado uma vez por semana; porm, logo no segundo nmero avisa que ser publicado duas vezes por semana. Mais tarde, no entanto, passa a ser publicado trs vezes por semana. interessante notar que o primeiro anncio brasileiro que saiu neste jornal no seu primeiro nmero dizia o seguinte: Esto no prelo as interessantes obras seguintes: Memmoria historica da invaso dos Francezes em Portugal no anno de 1807. Observaes sobre o Commercio Franco do Brazil. A Gazeta do Rio de Janeiro existiu at 31 de dezembro de 1822. De carter oficioso, limita-se publicao de atos oficiais, e transcrio de notcias estrangeiras. No encontram eco em suas pginas, as efervescncias democrticas e os agravos da sociedade, visto que est debaixo da censura imediata das autoridades. Nesse dia comemorado o Dia da Imprensa. Deixando de aparecer em 1823, a Gazeta do Rio de Janeiro cedia o seu lugar ao Dirio do Governo. Afirmando o carter oficioso do novo peridico, uma portaria de 2 de janeiro de 1823, referendada por Jos Bonifcio de Andrada e Silva, ordena a expedio de circulares s reparties pblicas, para que remetessem, regularmente, redao daquela folha ,todo o expediente que tivesse cabimento no Dirio. Pouco antes se havia afirmado a utilidade, para o pblico, de passar a Gazeta a um bem organizado Dirio do Governo. Na concesso de favores definiam-se, porm, obrigaes. Ficava a redao do Dirio debaixo da imediata inspeo do Ministro e Secretrio de Estado dos Negcios Estrangeiros, que nomearia pessoa hbil para rever as matrias que os redatores oportunamente lhe submetessem a exame e aprovao, como convm ao crdito de uma folha desta natureza. Estava instalada a censura e o controle total do que seria publicado. O edital do Intendente-Geral de Polcia Paulo Fernandes Viana, de 30 de maio de 1809, explcito: os que publicarem

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qualquer escrito sem exame e licena sero presos na cadeia pblica e pagaro de pena duzentos mil ris. interessante notar que o poema impresso pelo Frei Gregrio Jos Viegas, em 1807, foi a primeira composio tipogrfica na colnia, depois de 1747. Entretanto, a imprensa j se instalara em 1539 no Mxico; em 1583 no Per; e em 1630 nos Estados Unidos da Amrica. Em Portugal ela tivera ingresso no ano de 1465. Era o temor do reino ao rgo de difuso, semeador da liberdade de pensamento. Vale registrar, que as notcias sem censura s podiam ser lidas no Correio Braziliense ou Armazem Literario, considerado o primeiro jornal brasileiro, porm publicado em Londres, Inglaterra. O primeiro nmero de 1 de junho de 1808 e vai circular at dezembro de 1822, com um total de 175 nmeros em 29 volumes. Foi impresso na Oficina de W. Lewis, com periodicidade mensal, e trazia na primeira pgina a epgrafe Na Quarta parte nova os campos ara, e se mais mundo houvra la chegara. Camoens, c. VII. e. 14.. Seu redator Hiplito Jos da Costa Pereira Furtado de Mendona escreve no primeiro nmero: Introduco. O individuo, que abrange o bem geral duma sociedade, vem a ser o membro mais distincto della: as luzes, que elle espalha, tiram das trevas, ou da illuza, aqueles, que a ignorancia precipitou no labyrintho da apathia, da inepcia, e do engano. Ninguem mais util pois do que aquelle que se destina a mostrar, com evidencia, os acontecimentos do presente, e desenvolver as sombras do fucturo. Informa tambm, logo no primeiro nmero, o seguinte: Resolvi lanar esta publicaa na capital inglesa dada a dificuldade de publicar obras periodicas no Brazil, j pela censura prvia, j pelos perigos a que os redactores se exporiam falando livremente das aces dos homens poderosos. O Correio Braziliense exerceu imensa influncia sobre os acontecimentos no s no Brasil como em Portugal, desde os seus primeiros nmeros, pela crtica aos atos da realeza lusitana. Tanto foi que acabou sendo proibida a entrada do peridico nos domnios portugueses, sob as mais severas penas. Em 1821 e 1822 foi este jornal o porta voz das aspiraes de liberdade que agitavam o Reino Americano. 24 de setembro de 1810. Espanha. Expedio das Resolues das Cortes Constituintes Espanholas reunidas na Ilha de Leo, no porto de Cadiz. Por esforo patritico da Junta Central que havia preparado a campanha da libertao peninsular do domnio napolenico, nasce depois a clebre Constituio de 1812. Esta Constituio imposta aos Bourbons da dinastia espanhola, que depois, em 1814, revogada por Fernando VII, quando dissolve essas Cortes. Mas, em 1820, a revoluo constitucional triunfa novamente com o golpe militar liderado pelos Generais Quiroga, Riego e Miranda e faz o rei catlico reconvocar as ento interrompidas Cortes Legislativas, restabelecer e jurar a Constituio de Cadiz de 1812, no dia 7 de maro de 1820. Esses fatos provocaram em Portugal quase idnticos sucessos polticos, como era de se prever, dada a vizinhana dos dois pases e a fora expansiva

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das idias liberais. Origina-se, ento, do exemplo espanhol, a convocao das Crtes Geraes, Extraordinrias e Constituintes da Nao Portugueza, em 1820, para dar monarquia lusitana uma lei fundamental do Estado, fixando-se nesta, a uma s vez, no s os direitos e deveres dos cidados, como ainda os limites e atribuies dos diversos poderes da nao soberana. Esse Estatuto ou Carta Poltica de 1820, em Portugal, quase que uma cpia ou arremedo da Constituio Espanhola de 1812 e serve tambm para estudo, debate e final promulgao, em 30 de setembro de 1822, da Constituio Poltica da Nao Portuguesa. 18 de junho de 1815. O Imperador (francs) Napoleo Bonaparte (1804-1815) derrotado pelas tropas sob o comando de Duque de Wellington na clebre Batalha de Waterloo. Forado a renunciar ao trono exilado e segue preso, em um navio ingls, para a ilha de Santa Helena. Morre no dia 5 de maio de 1821. 16 de dezembro de 1815. O Brasil elevado a Reino Unido junto a Portugal e Algarves. No ano seguinte, em 1816, so unidas em um s escudo as trs armas de Portugal, Brasil e Algarves, sendo mantida a mesma bandeira. 6 de maro de 1817. Revoluo Pernambucana. Movimento revolucionrio de carter republicano e liberal. Seu objetivo criar no Nordeste brasileiro uma repblica livre do domnio portugus e da hegemonia polticoeconmica do Rio de Janeiro e do Sul do Imprio. O movimento estende-se Paraba e ao Rio Grande do Norte, onde tambm se formam juntas provisrias de governo. a mais espontnea, a mais desorganizada e a mais simptica de todas as nossas revolues. Suas causas internas tem fundamentos espirituais e materiais; as externas, no peso dos tributos exigidos do povo para sustentar a guerra de conquista no Prata, e na manuteno da pesada mquina administrativa que o Prncipe Regente D. Joo, trouxera da Europa. A zona mais produtiva do Pas sofre uma verdadeira asfixia tributria. Os pesados tributos se avolumam de ano para ano e esgotam a populao. Outros fatores se somam a estes: atraso no pagamento da tropa e a carestia geral resultante da grande seca de 1816, que abala at as classes mais abastadas. A revoluo tem como participantes mais destacados o comerciante Domingos Jos Martins, os religiosos Joo Ribeiro Pessoa de Melo Montenegro e Miguel Joaquim de Almeida (Padre Miguelinho), Jos Incio Ribeiro de Abreu e Lilma (Padre Roma), os Capites Jos de Barros Lima (por alcunha Leo Coroado) e Domingos Teotnio Jorge. O governo da revoluo composto por uma Junta Governativa, que pretende representar todas as classes. H ainda um Conselho de Estado formado pelos homens mais cultos da Provncia, entre os quais est o Ouvidor de Olinda (PE) e Desembargador da Relao da Bahia Antnio Carlos Ribeiro de Andrada Machado e Silva, irmo de Jos Bonifcio de Andrada e Silva. Foi precursor deste movimento o

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Padre Manoel de Arruda Cmara, que funda no ano de 1800 uma sociedade secreta o Arepago de Itamb , para propagao das novas idias. descoberta e dissolvida ainda em 1802. Aps a proclamao da Repblica, cria-se uma bandeira prpria, so abolidos os impostos pagos ao Rio de Janeiro, bem como os monoplios, as insenes de direitos e favores especiais; o soldo dos militares so aumentados e os padres passam a ser remunerados pela Repblica. Publicada, a Lei Orgnica enviada s cmaras municipais de todas as comarcas de Pernambuco. Esta lei fixa as limitaes do Governo Provisrio da nova Repblica, consagra as liberdades de opinio e de imprensa, os direitos individuais, e proibe ataques a religio catlica. Os portugueses que vivem no Nordeste do Brasil sero reconhecidos como patriotas se aderirem ao regime. maneira da Revoluo Francesa, declara-se abolido o tratamento cerimonioso pelo de patriota, igualando-se perante a lei todos os membros da nova repblica. Proscrevem-se os ttulos de nobreza e privilgios de classe, O Governo Provisrio envia emissrios s capitanias vizinhas em busca de adeso e tambm a Londres, Washington e Buenos Aires para angariar apoio poltico causa revolucionria e reconhecimento da nova repblica. O Imprio lusitano est ameaado. D. Marcos de Noronha e Brito, Conde dos Arcos, Governador da Baha, manda, para combater o governo revolucionrio, fortes contingentes armados, os quais dominam logo a Paraba e o Rio Grande do Norte. Pernambuco, embora resistindo valentemente, no tem como se opor ao avano das tropas do Governo Imperial. Os emissrios revolucionrios enviados Bahia e ao Cear, respectivamente, os Padres Jos Incio Ribeiro de Abreu e Lilma (Padre Roma) e Jos Martiniano de Alencar so presos. Sumariamente fuzilado o principal emissrio da revoluo o Padre Jos Incio Ribeiro de Abreu e Lima (Padre Roma) , o temor se apodera dos criadores da Repblica. Sucedem-se as prises do frade carmelita, Frei Joaquim do Amor Divino Caneca, de Miguel Joaquim de Almeida (Padre Miguelinho) e de todos os chefes do movimento. O movimento dura aproximadamente 76 dias e vai at o dia 20 de maio de 1817. A vingana e a represso real violenta e impiedosa. instalado um tribunal de julgamento. So seqestrados os bens dos implicados e condenados morte vrios revolucionrios. Estes, depois de mortos, tem suas mos cortadas, decepadas as cabeas e os membros esquartejados. Tantas so as barbries do tribunal, que o prprio Prncipe Regente D. Joo VI suspende as execues, e determina a formao de outro tribunal constitudo por dois desembargadores do Pao e dois da Casa de Suplicao. Este tribunal, porm, revela-se to brbaro quanto o primeiro. A Cmara de Recife, ante tanta selvageria, resolve pedir ao Prncipe Regente D. Joo que conceda anistia aos demais implicados, j agora os de menor participao, com raras excees. A brbara represso s diminui com a expedio da Carta Rgia de 6 de agosto de 1817 que concede anistia, perdoa alguns presos e suspende defini-

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tivamente as devassas. No dia 6 de fevereiro de 1818, dia da coroao de D. Joo VI como rei de Portugal, Brasil e Algarves expedido decreto de indulto aos presos do reino do Brasil e o processo suspenso. Alguns rus so libertados e os restantes so enviados para as prises da Bahia, entre os quais esto Antnio Carlos Ribeiro de Andrada Machado e Silva e o frade carmelita, Frei Joaquim do Amor Divino Caneca. O fato que, desbaratado o governo rebelde, Antnio Carlos Ribeiro de Andrada Machado e Silva entrega-se voluntariamente justia. Fica preso com ferros aos ps e ao pescoo, em um calabouo, no qual entrava muito pouco a luz do dia. Somente na derradeira semana de novembro do ano seguinte, sofre o primeiro interrogatrio. aconselhado que devia pedir clemncia real, ao que responde: Perdo? S peo a Deus! Do Rei quero justia!. Melhoradas mais tarde as condies dos presos, passa, ento, a ministrar aulas aos companheiros de infortnio. Esta recluso em uma masmorra, na cidade de Salvador (BA), vai durar quase quatro anos. Os que no morrem no crcere ou no recebem o perdo real so libertados em 1820. Restitudo liberdade com a aclamao de novo regime constitucional no reino lusitano em agosto de 1821, eleito deputado pela Provncia de So Paulo s Crtes Geraes, Extraordinrias, e Constituintes da Nao Portugueza. As crueldades do Governador Lus do Rgo Barreto continuam e trazem desespero e dio ao povo pernambucano, gerando, em menos de quatro anos, a Revoluo Pernambucana de 1821, no menos violenta e ameaadora da integridade nacional. Analisando a origem social e a profisso dos inconfidentes, dos revolucionrios fluminenses de 1794, dos revolucionrios baianos de 1798 e dos revolucionrios pernambucanos de 1817, verifica-se a predominncia de ofcios e atividades identificadas como sendo as da classe mdia e a ausncia da elite abastada. 24 de agosto de 1820. Tem incio a Revoluo Constitucionalista do Porto. Aps a missa, o regimento de artilharia anuncia com 21 tiros a revoluo que exige a elaborao de uma Constituio, cuja falta a origem de todos os nossos males. O descontentamento geral dos portugueses e o entusiasmo com que a Espanha acolheu o juramento da Constituio de Cadiz pelo rei, a 7 de maro de 1820, induziram os liberais do Porto revolta. No dia 15 de setembro de 1820, a Junta Provisria faz jurar, em Portugal, uma Constituio provisria sob os moldes da espanhola, at ser redigida a definitiva. Em 17 de setembro a guarnio de Lisboa adere e o movimento vence sem resistncia. A Junta Provisional Revolucionria liberta os presos, inclusive os de 1817; convoca as primeiras eleies de Portugal, para as Crtes Geraes, Extraordinrias, e Constituintes da Nao Portugueza; proclama a soberania da Nao sobre o rei e intima-o a retornar incontinente a Lisboa. Destaca-se que o nome Crtes Gerais tradio em Portugal, desde as mais antigas reunies de representantes de classes.

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Movimento com idias nitidamente liberais arrebata adeptos entusisticos em todas as partes do reino lusitano. At ento, Portugal estivera sob o regime de monarquia absolutista. No pregam a repblica nem mesmo a substituio da monarquia, a despeito de haver o Rei D. Joo VI abandonado a Nao, em fuga precipitada para o Brasil; ao contrrio, referem-se a ele com expresses de respeito, simpatia e dedicao. O motivo claro. A nao lusitana do ps-guerra (napolenica) passa a viver em crise profunda. A econmica, devido a abertura dos portos do Brasil s outras naes, liberdade industrial no reino americano e s ms vindimas; a social, devido mortandade e imigrao; a poltica, devido ausncia do rei, restaurao da Constituio de Cadiz na Espanha, ao desenvolvimento das idias liberais difundidas por toda a Europa a partir da Revoluo Francesa de 1789 e da Revoluo Espanhola em 1810; a ideolgica, devido s idias francesas no governo portugus; a militar, devido ao comando ingls no Exrcito. O fermento das idias revolucionrias estava latente em Portugal, desde 1817. Comeara ali o onipotente governo militar do Marechal (ingls) Guilherme Carr Beresford, que afoga em sangue o movimento libertrio encabeado em Lisboa pelo Tenente-General Gomes Freire de Andrade e os envolvidos sendo presos. Sem uma Constituio estavam todos fartos dos intolerveis excessos e vexames a que os submetia a ditadura militar. O aumento da importao dos gneros de primeira necessidade, a comear pelo trigo; o fechamento de fbricas; a concorrncia inglesa; e os operrios famintos fazem com que a penria atinja seu extremo. Esgotado inteiramente, o Errio no paga aos funcionrios pblicos e nem restitue os depsitos. misria soma-se a humilhao, porque, entre tantas adversidades, a gloriosa nao se acha reduzida colnia do Brasil, constitudo o centro da monarquia, por abrigar o soberano. O Sindrio, grupo de letrados, militares e burgueses do Porto, decide seguir o exemplo da Revoluo Constitucionalista Espanhola de 9 de maro de 1820. H necessidade da volta de D. Joo VI para Portugal. As eleies, em Portugal, terminam no dia de Natal de 1820. As Crtes Gerais, Extraordinrias, e Constituintes da Nao Portugueza compostas, to somente, de 74 deputados eleitos pela nao lusitana, e que se achavam em Lisboa, com excluso dos representantes, ainda ausentes ou no eleitos, de outros domnios ultramarinos da Amrica, frica e sia, reunem-se, pela primeira vez, em sesso preparatria de verificao de poderes e de redao da frmula de juramento dos deputados, na cidade de Lisboa. A reunio acontece na reformada e bem disposta, Sala da Livraria, do Palcio Real antigo Convento das Necessidades , no dia 24 de janeiro de 1821. No dia 26 tem lugar a solene instalao do Congresso Constituinte que s vai encerrar os seus trabalhos legislativos no dia 4 de novembro de 1822, dia em que os constituintes do por finda a sua misso. A Constituio Portuguesa votada a 12 de julho e promulgada a 30 de setembro de 1822. Encerrados os traba-

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lhos constituintes, o Parlamento portugus continua, em sesso ordinria, at o dia 2 de junho de 1823. Vale ressaltar que a Sala da Livraria do Convento oratoriano descrita por Jos Baptista de Sousa escritor portugus , em sua obra: De Westminster a So Bento: A aprendizagem do parlamentarismo em Almeida Garrett, como um (...) espao pequeno e estreito, mas muito iluminado, bem ao gosto da poca e semelhante s Cmaras dos Deputados em Paris ou dos Lordes em Westminster. Para alm do recinto destinado aos deputados, a sala dispunha, ainda, de local para os membros do Governo, a um nvel mais inferior, e as tribunas para os diplomatas. No Brasil, a Provncia do Gro-Par a primeira a receber as notcias da Revoluo do Porto, como igualmente a primeira a aderir, em 1 de janeiro de 1821, ao Pacto Constitucional que viesse a ser elaborado pelas Cortes Gerais. Em seguida a Bahia e as outras provncias aderem ao movimento revolucionrio. No Rio de Janeiro, as primeiras informaes, vagas ainda, sobre a Revoluo de 24 de agosto de 1820, chegam pelo bergantim Providncia, aqui aportado no dia 17 de outubro desse mesmo ano. Mas o fato que, somente em fevereiro de 1821, obteve o Rei D. Joo VI, em retardada correspondncia oficial de Lisboa, sob despacho do brigue de guerra Infante D. Sebastio, confirmao definitiva da vitria dos liberais do Porto e de todos os fatos desenrolados no velho continente entre agosto e outubro de 1820, inclusive a anistia aos militares. Desde o primeiro momento dos trabalhos legislativos das Cortes Gerais, Extraordinrias e Contituintes da Nao Portuguesa, cujas sesses se prolongam, com vrias interrupes, por sete meses, o moderado representante portugus, Deputado Pereira do Carmo, lembra que deviam expedir ordens para a eleio de deputados nos domnios ultramarinos, a fim de que fossem estes diretamente representados nas Cortes. Aconselha, inclusive, que enquanto durassem as eleies na Amrica e outras possesses de alm-mar, e no pudessem vir tomar assento os deputados eleitos, deliberasse o Congresso sobre a escolha provisria de cidados idneos naturais do Brasil e das outras colnias asiticas e africanas, desde que residentes ou, ento, presentes em Portugal, para que assim no deixassem o Reino Americano e os demais domnios da monarquia de ter efetiva representao parlamentar na Corte Constituinte. A prudente indicao do Deputado Constituinte (portugus) Pereira do Carmo provoca vivo debate, em vrios dias de sesso, sendo afinal rejeitada. De modo que, em relao ao Brasil, sob o capcioso argumento de outros deputados de que nem mesmo sabia o Congresso Constituinte se o Reino Americano aceitara a revoluo, aderindo ao sistema poltico das Cortes e se queria continuar ligado ao Reino de Portugal. Com estes argumentos pretendem os parlamentares lusitanos firmar o absurdo princpio de que podiam legislar, revelia de outras colnias, sobre as suas necessidades e interesses, e organizar a Constituio poltica que tinha de reger todos os Estados da Co-

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roa, dos quais j a esse tempo era o Brasil o mais rico e importante pela sua populao e recursos de toda a ordem. Todavia, a partir do momento em que o Rei D. Joo VI tomou conhecimento oficial da revoluo portuguesa, quase s vsperas de seu regresso a Portugal, entendeu de bom alvitre que em todas as capitanias brasileiras, desde que oficialmente denominadas provncias, se fizessem as eleies para deputados quelas Cortes, (...) em conformidade dos systema hespanhol adoptado pelo governo provincial do Reino Unido. Cabe a seu filho, o Prncipe Regente D. Pedro, expedir ordens para que tais eleies se realizassem, nas provncias brasileiras do Sul (Rio de Janeiro, So Paulo, Minas Gerais) que mais diretamente obedeciam ao governo do Rio de Janeiro, enquanto que, por instrues emanadas de Lisboa, outras provncias do Norte (Bahia, Maranho, Par) elegeriam os seus deputados. Algumas outras poucas provncias espontaneamente tratavam de eleger seus representantes s Cortes, sem esperar determinaes expressas, tal o entusiamo que nelas havia por esse ensaio da sua nova vida poltica, no sistema representativo. 18 de fevereiro de 1821. Palcio do Rio de Janeiro. O Rei D. Joo VI est em dvida entre ir e ficar, entre o grupo palaciano liberalizante, de D. Pedro de Sousa Holstein, Duque de Palmela, e do absolutista, da Rainha D. Carlota Joaquina, nascida Carlota Joaquina Teresa Cayetana de Bourbon y Bourbon. Pensa em mandar seu filho Pedro de Alcntara para Portugal, a fim de consolidar o regime constitucional e tomar medidas que se ajustassem a realidade brasileira. expedido decreto, com a rubrica do Rei D. Joo VI, determinando que D. Pedro de Alcntara, Prncipe Real do Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves, v a Portugal (o que no se concretiza); convoca os procuradores das cidades e vilas principais, que tem juzes letrados, tanto do Reino do Brasil, como das Ilhas dos Aores, Madeira e Cabo Verde que forem eleitos, para, em Junta de Crtes, se tratar das leis constitucionais que se discutem nas Crtes de Lisboa, a fim de assentarem as bases constitucionais que atendam as condies peculiares da Amrica portuguesa e cria, tambm, uma comisso encarregada de preparar os trabalhos de que se devem occupar os mesmos procuradores. Grifado pelo compilador. a nossa primeira convocao de uma representao poltica dentro do territrio brasileiro. 23 de fevereiro de 1821. Palcio do Rio de Janeiro. expedido decreto, com a rubrica do Rei D. Joo VI, nomeando os membros da commisso encarregada de preparar as leis constitucionais de que trata o decreto de 18 de fevereiro, do mesmo anno. A deciso tomada no dia 18 de fevereiro de 1821 no agrada s tropas portuguesas, pois querem que o Rei D. Joo VI v a Portugal e jure a Constituio tal como for feita pelas Cortes. Em 26 de fevereiro a tropa portuguesa, reunida no largo do Rossio, fora-o a jurar uma Constituio que ainda no foi escrita.

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7 de maro de 1821. Palcio do Rio de Janeiro. expedido Decreto, com a rubrica do Rei D. Joo VI, com o seguinte teor: Tendo-se dignado a Divina Providencia de conceder aps uma to devastadora guerra o suspirado beneficio da paz geral entre todos os Estados da Europa; e de permittir que se comeassem a lanar as bases da felicidade da Monarchia Portugueza, mediante o ajuntamento das Crtes Geraes, extraordinariamente congregadas na Minha muito nobre e leal Cidade de Lisboa, para darem a todo o Reino Unido de Portugal, Brazil e Algarves uma Constituio Politica conforme aos principios liberaes, que pelo incremento das luzes se acham geralmente recebidos por todas as Naes: (...) Cumpria pois que cedendo ao dever, que Me impz a Providencia, de tudo sacrificar pela felicidade da Nao, Eu Resolvesse, como tenho resolvido, transferir de novo a Minha Crte para a cidade de Lisboa, antiga Sde e bero original da Monarchia; a fim de alli cooperar com os Deputados Procuradores dos Povos na gloriosa empreza de restituir briosa Nao Portugueza aquelle alto gro de explendor, com que tanto se assignalou nos antigos tempos: E deixando nesta Corte ao Meu muito amado e prezado filho, o Principe Real do Reino Unido, Encarregado do Governo Provisorio deste Reino do Brazil, emquanto nelle se no achar estabelecida a Constituio Geral da Nao. E para que os Meus Povos deste mesmo Reino do Brazil possam, quanto antes, participar das vantagens da Representao Nacional, enviando proporcionado numero de Deputados Procuradores s Crtes Geraes do Reino Unido; em outro Decreto, da data deste, Tenho dado as precisas determinaes, para que desde logo se comece a proceder em todas as Provincias eleio dos mesmos Deputados na frma das Instruces, que no Reino de Portugal se adoptaram para esse mesmo effeito, passando sem demora a esta Crte os que successivamente forem nomeando nesta Provincia, a fim de Me poderem accompanhar os que chegarem antes da Minha sahida deste Reino; Tendo Eu alis providenciado sobre o transporte dos que depois dessa poca, ou das outras Provincias do Norte houverem de fazer viagem para aquelle destino. Palacio do Rio de Janeiro aos 7 de Maro de 1821. Com a rubrica de Sua Magestade. Grifadopelo compilador.

Neste mesmo dia de 7 de maro expedido outro decreto com a rubrica do Rei D. Joo VI, com o seguinte teor: Havendo Eu Proclamado no Meu Real Decreto de 24 de Fevereiro proximo passado a Constituio Geral da Monarchia, qual foi deliberada, feita e accordada pelas Crtes da Nao a esse fim extraordinariamente congregada na Minha muito nobre e leal Cidade de Lisboa: E cumprindo que de todos os Estados deste Reino Unido concorra um proporcional numero de Deputados a completar a Representao Nacional: Hei por bem ordenar que neste Reino do Brazil e Dominios Ultramarinos se proceda desde logo nomeao dos respectivos Deputados, na frma das Instruces, que para o mesmo effeito foram adoptadas no Reino de Portugal, e que com este Decreto baixam, assignadas por Ignacio da Costa Quintella, Meu Ministro e Secretario de Estado dos Negocios do Reino; e aos Governadores e Capites Generaes das differentes Capitanias, se expediro as necessarias ordens, para fazerem effectiva a partida dos ditos Deputados custa da Minha Real Fazenda. O mesmo Ministro e Secretario de Estado o tenha assim entendido e faa executar. Palacio do Rio de Janeiro em 7 de Maro de 1821. Com a rubrica de Sua Magestade.

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Instruces para as eleies dos Deputados das Crtes, segundo o methodo estabelecido na Constituio Hespanhola, e adoptado para o Reino Unido de Portugal, Brazil e Algarves, a que se refere o Decreto acima. Grifado pelo compilador. Seguem as instrues assinadas pelo Ministro e Secretrio de Estado dos Negcios do Reino Ignacio da Costa Quintella, com 5 captulos e 103 artigos. Os captulos esto assim distribudos: Captulo I Do modo de formar as Cortes Artigos da Constituio espanhola. Captulo II Da nomeao dos deputados das Cortes. Captulo III Das juntas eleitorais de freguezias. Captulo IV Das juntas eleitorais das comarcas. Captulo V Das juntas eleitorais de Provncia. Nestas instrues esto inseridas as adaptaes necessrias realidade portuguesa. considerada a nossa primeira lei eleitoral. Tem por base a Constituio Espanhola de Cadiz de 1812 e as Ordenaes do Reino, que o primeiro Cdigo Eleitoral a viger no Brasil, as quais foram elaboradas em Portugal, no fim da Idade Mdia, e utilizadas at 1828. Em seu Livro Primeiro, Ttulo 67, as Ordenaes determinavam o procedimento para se efetivar eleies. O processo eleitoral muito complicado, fazendo-se indireto e em quatro graus, segundo o mtodo e as instituies adotadas pela Constituio Espanhola de Cadiz de 1812, por cujos dispositivos os cidados domiciliados e residentes no territrio da respectiva freguesia, reunidos nas juntas ou assemblias paroquiais, nomeavam compromissrios, sendo por estes imediatamente escolhidos os eleitores da parquia; e por estes, eram designados os eleitores da comarca, que, dentro de curto prazo, acorriam capital da provncia para ali elegerem os deputados. Para ser eleitor paroquial, de comarca, e deputado das Cortes necessrio ser cidado, morador e residente no domiclio declarado, estar em exerccio dos seus direitos, e ser maior de 25 anos. No podem ser eleitos deputados das Cortes, os Conselheiros de Estado; todas as pessoas que ocupam empregos da Casa Real; os estrangeiros, ainda que tenham carta de cidado passada pelas Cortes; e nenhum funcionrio pblico, nomeado pelo Governo, pela mesma provncia em que exercer as suas funes. Pelas instrues mandadas adotar no Brasil, tomado por base o censo demogrfico de 1801, que dava ao nosso pas uma populao livre de 2.323.386 habitantes, devendo corresponder representao de cada grupo de 30.000 almas (exceto escravos) 1 deputado, ou fosse, um total de 76 representantes para aquela cifra de habitantes livres do Brasil. Quanto aos subsdios dos deputados s Crtes Geraes, Extraordinrias, e Constituintes, convocadas em Lisba assim est escrito: Aos Deputados se ho de dar 4$800 por dia desde aquelle, em que se puzerem em marcha para a Capital, os quaes sero pagos pelo Erario, conforme a Resoluo da Junta Preparatria das Crtes. O resultado da eleio paroquial depende absolutamente da mesa eleitoral e vai perdurar ao longo do Imprio. Seu poder e arbtrio no conhecem limites; sua formao a mais irregular, e as conseqncias so as desordens

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e as demasias eleitorais. No h nenhuma qualificao anterior dos votantes. A Mesa aceita os votos de quem quer e recusa outros, a pretexto da falta de condies legais. Mas dentre todas as dificuldades encontradas, so escolhidos duzentos e cinqenta representantes, e destes, so eleitos noventa e sete deputados (inclusive suplentes), procuradores e delegados para representarem o Reino Americano junto s Crtes Geraes, Extraordinrias, e Constituintes, convocadas em Lisba. 10 de maro de 1821. Lisboa. Palcio da Regncia. expedido Decreto das Cortes Gerais Extraordinrias e Constituintes da Nao Portuguesa que d s bases da Constituio Poltica da monarquia portugueza. 23 de maro de 1821. Palcio do Rio de Janeiro. Resolvida a volta de D. Joo VI expedida a Deciso do Governo n 13 pelo Ministro e Secretrio de Estado dos Negcios do Reino, Igncio da Costa Quintella, que comunica a retirada de Sua Majestade para Portugal, e determina que, sem perda de tempo, se faam as eleies dos deputados para representarem o Reino do Brazil nas Crtes Geraes, Extraordinrias, e Constituintes convocadas em Lisba. Grifado pelocompilador.

7 de abril de 1821. O Rei D. Joo VI faz publicar um edital por onde se convocam, extraordinariamente, os eleitores que devem eleger os brasileiros representantes do Brasil nas Cortes Portuguezas. No Rio de Janeiro reune-se a primeira assemblia de eleitores realizada no Brasil, em um prdio h pouco inaugurado, na Praa do Comrcio, no dia 21 de abril, s quatro horas da tarde, tendo Jos Clemente Pereira (portugus, mas brasileiro de corao) como secretrio e entre outros escrutinadores Joaquim Gonalves Ledo (RJ) e Janurio da Cunha Barbosa (RJ). Nesta primeira reunio, ao final, faz-se chegar ao Rei D. Joo VI um documento, atravs de uma comisso, onde declaram que at chegar a Constituio que h de vir de Lisboa, os povos do Brasil tero que se reger, somente, pela Constituio espanhola. Continuando a tumultuada reunio ao longo da noite de 21 para 22, esta encerrada por ordem do Prncipe Regente D. Pedro , com as tropas portuguesas cercando o edifcio e dissolvendo a tiros a assemblia de eleitores e os cidados desarmados que delas participavam como observadores. Jos Clemente Pereira, carinhosamente apelidado de Z Pequeno, e outros participantes da assemblia so feridos. H algumas mortes. No se sabe quem ordenou a violncia, mas o povo carioca, no dizer dos cronistas da poca, afixa um cartaz com a seguinte inscrio: Aougue do Bragana. 22 de abril de 1821. Palcio da Boa Vista. expedido decreto, com a rubrica do Rei D. Joo VI, que annula o Decreto datado de hontem que mandou adoptar no Reino do Brazil a Constituio Hespanhola. expedido tambm outro decreto que manda proceder a devassa contra os sediciosos e amotinadores da

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Praa do Commercio do Rio de Janeiro do dia 21 deste mez e outro que encarrega o Governo Geral do Brazil ao Prncipe Real do Reino Unido de Portugal, Brazil e Algarves, D. Pedro de Alcntara. Nesse mesmo decreto o Prncipe Regente D. Pedro constitudo Regente e Lugar-Tenente do Rei. As eleies para as Cortes Constituintes se do com atraso no Brasil e obedecem ao decreto e s instrues expedidas em 7 de maro 1821. Todas as provncias brasileiras existentes fazem a escolha de seus representantes para as Crtes Geraes, Extraordinrias, e Constituintes da Nao Portugueza. So eleitos 97 deputados (inclusive suplentes), procuradores e delegados pelas provncias do Imprio do Brasil. Apenas 53 deputados comparecem s Cortes Constituintes, sendo dez (10) representantes de Pernambuco; oito (8), da Bahia; seis (6), do Rio de Janeiro; seis (6), de So Paulo; quatro (4), do Cear; trs (3), de Alagoas; trs (3), da Paraba do Norte; trs (3), do Gro-Par; dois (2), do Maranho; dois (2), do Rio-Negro (Amazonas); dois (2), do Piau; um (1), do Rio Grande do Norte; um (1), de Santa Catarina; um (1), do Esprito Santo; e um (1), de Gois. Alguns s comparecem ou j residiam em Lisboa, mas no tomam posse. Vrios so portugueses, por nascimento ou opo, e outros brasileiros conservadores e liberais. A esse tempo, as Provncias do Amazonas, Sergipe e Paran ainda no estavam efetivamente constitudas. A primeira (Capitania e Comarca do Rio Negro) teve sua representao unida com a da Provncia do Par; a segunda (Capitania e Comarca de Sergipe dEl-Rey) ficou envolvida na representao baiana; e a terceira (Comarca de Curytiba, dependente da Provncia de So Paulo) s foi elevada categoria de provncia brasileira no segundo reinado. O Rio de Janeiro foi a provncia que primeiro procedeu as eleies para as Crtes Gerais, mas os primeiros deputados constituintes do Brasil a desembarcarem em Lisboa so os da Provncia de Pernambuco, que prestam juramento e tomam assento em Crtes, no dia 29 de agosto de 1821, sete meses aps instalados os trabalhos constituintes. O primeiro representante brasileiro a fazer uso da palavra foi o Monsenhor Francisco Moniz Tavares, na sesso de 30 de agosto, seguindo-se-lhe Manuel Zefirino dos Santos, e Pedro de Arajo Lima, na sesso de 31 do mesmo ms. No dia 10 d