tendências e desafios na prática docente

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Ensino da Fsica: tendncias e desafios na prtica docenteCLECI WERNER DA ROSA LVARO BECKER DA ROSA Universidade de Passo Fundo, Brasil

IntroduoDiscutir o ensino da Fsica na educao bsica (ensino mdio), na perspectiva da prxis pedaggica do professor de Fsica, requer a princpio uma reflexo sobre os propsitos a que a educao se prope. Desde as sociedades antigas at as contemporneas, a educao como processo de mediao sistematizado, recebe a denominao de educao escolar, apoiando suas bases em aes intencionais. Os contedos escolares decorrentes dos conhecimentos historicamente acumulados pela humanidade passam a ser um dos elementos integrantes desta ao intencional, mas no nico, encontrando no ato didtico-pedaggico um importante aliado. Rays (2000) mostra que a ao pedaggica escolarizada, quando consciente, no poder, pois, distanciar-se da inteno poltica do tipo de ser humano que a educao pretende promover, para que no incorra na arbitrariedade pedaggica e poltica do ato educativo (p.14). Continua o autor enfatizando que a dimenso poltica da ao educativa esta presente mesmo antes do professor proferir sua aula, pois se apresenta desde o momento do planejamento, na elaborao dos objetivos, na seleo dos contedos, na escola metodolgica e nos processos de avaliao. Desta forma, no h como dissociar a ao pedaggica da intencionalidade, uma vez que ela est presente em cada etapa deste processo pedaggico. Vrios pesquisadores da educao tm dedicado seus trabalhos a investigar a ao educativa, mostrando que as intenes da prtica educativa so abrangentes e que avanam alm do processo de transmisso dos contedos. A dimenso social do ato de ensinar tem merecido destaque em vrias pesquisas desenvolvidas nestes ltimos sculos, apontando para a necessidade de que os profissionais da educao (professores e pesquisadores) tenham conhecimento desse processo para no correr o risco de faz-lo de forma inconsciente. A incluso no planejamento das atividades docentes ou mesmo das pesquisas educacionais, de questes relacionadas s dimenses sociais, as diferentes formas de agir e pensar perante as necessidades emergenciais da sociedade moderna, passa a ser obrigatrio, j que falar em educao falar em sociedade. A prpria Constituio Brasileira enfatiza esta indissolubilidade ao mencionar que a educao responsabilidade da famlia, da escola e da sociedade, evidenciando o trip que sustenta o processo de formao dos indivduos. Mesmo havendo um consenso na relao biunvoca entre educao e sociedade, tal como se apresenta no mundo contemporneo, os especialistas da educao tm apresentado divergncias em seus

Revista Iberoamericana de Educacin (ISSN: 1681-5653)n. 42/7 25 de mayo de 2007 E DITA : Organizacin de Estados Iberoamericanos para la Educacin, la Ciencia y la Cultura (OEI)

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trabalhos por considerarem as bases epistemolgicas, sociolgicas e filosficas do processo educacional sob diferentes enfoques. Tal situao passa a ser mais evidente quando o assunto gira em torno dos propsitos a que o ensino escolar se prope. A expresso ensinar para qu? Assume o carro chefe das discusses, evidenciando que, mesmo perante as inmeras pesquisas e avanos nas chamadas cincias da educao, a questo continua em aberto. O processo, por mais complexo que possa parecer, sempre mediado por instrumentos e mtodos que associam o ato de ensinar ao de aprender, que, em regra geral, no so decorrncias espontneas, mas sim favorecidos no ambiente escolar. A ao pedaggica requer acima de tudo profissionais comprometidos com o que Saviani (1996) considera saberes que todo educador deve dominar: o saber atitudinal, relacionado ao domnio da disciplina, pontualidade, organizao, entre outros; o saber crticocontextual, referente ao retrato sociocultural da sociedade na qual a tarefa educativa se insere; o saber didtico-curricular, associado ao domnio das formas de organizao e realizao da atividade educativa; e os saberes especficos e pedaggicos, referentes aos conhecimentos especficos que integram cada disciplina curricular e as teorias educacionais relacionadas ao processo ensino-aprendizagem. A percepo crtica das diferentes realidades que esto associadas ao ato de ensinar torna-se fundamental para que o educador, consciente de suas responsabilidades e de sua importncia no processo, planeje sua ao pedaggica. A ele cabe associar os princpios da educao, enquanto processo fundamental do cultivo da racionalidade atravs do desenvolvimento do pensamento, ao corpo de conhecimentos especfico que compe cada disciplina escolar. O professor, enquanto centro deste processo, deve tomar conscincia dos implicativos e procedimentos que envolvem tanto a organizao da sociedade em si, como do prprio sistema educacional.

Ensinar para qu?Esta pergunta nos aponta para um grande desafio, principalmente neste novo milnio. Jacques Delores, presidente da Comisso Internacional sobre a Educao para o sculo XXI, defende que a educao tem por funo essencial o desenvolvimento contnuo dos indivduos e das sociedades, como um dos meios mais importantes e que as polticas educativas so uma estrutura privilegiada de pessoas, de relaes entre os indivduos e entre os grupos e naes. Historicamente, temos consolidado o processo educativo na perspectiva do que Engels no sculo XIX j criticava, mostrando que a transmisso do conhecimento na escola caminhava na perspectiva de tcnicas de produo, restringindo o aprendizado reproduo destas tcnicas. Para Engels, tal situao estaria provocando a alienao destes indivduos, que, por no entrarem em contato com o conhecimento na forma de produo deste conhecimento, apresentavam pouca ou nenhuma chance de participar do seleto grupo que elabora tal conhecimento, limitam-se a serem apenas reprodutores de tcnicas. Adorno, em 1967, chama a ateno para os fins a que a educao se prope, mostrando que a educao no deve ser associada modelagem de pessoas, nem mesmo reduzir-se mera transmisso de contedos. preciso que ela atue no sentido da emancipao dos indivduos, atravs da formao de uma conscincia verdadeira. Para o autor a possibilidade de emancipao dos indivduos d-se pela educao, atravs do conhecimento, mas ao mesmo tempo aponta dois grandes obstculos: a pressoRevista Iberoamericana de Educacin (ISSN: 1681-5653)

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feita pela sociedade contempornea que acaba induzindo um obscuramento no desenvolvimento da conscientizao dos indivduos ante os acontecimentos sociais e polticos; e a necessidade que os jovens tm de se adaptarem ao mundo, sob o risco de serem excludos dos grupos sociais. O grande questionamento para Adorno no est na questo de que a educao seria necessria, mas para onde a educao deve conduzir. (Adorno, 2003). Ainda sob o ponto de vista da Teoria Crtica, da qual Adorno representante, o poder da educao escolarizada na sociedade moderna se apresenta como forma de submisso dos indivduos a padres culturais reduzidos a bens de consumo (comportamento, hbitos, costumes...), formando sujeitos dependentes, com personalidades fragilizadas e susceptveis de modismos. O desafio, no entender dos frankfurtianos (Escola de Frankfurt, bero da Teoria Crtica), a conscientizao por parte de todos, mas, principalmente, dos educadores do poder dominador e destruidor do conhecimento. A prxis educacional deve estar vinculada formao humana, social e cientfica dos sujeitos de modo que estes possam equipar-se para se orientar no mundo sem, entretanto, perder suas qualidades pessoais, mas, sim, vinculando-as s questes sociais. (Adorno, 2003). A crena de que a educao escolar o mecanismo pelo qual os indivduos promovem sua liberdade, caminho na busca da emancipao, aponta uma dicotomia. De um lado h os que acreditam na emancipao como aquela vinculada liberdade, livre de ideologias, permitindo posicionamentos crticos e sujeitos esclarecidos; de outro lado, h os que fundamentam o poder emancipatrio dos indivduos, nas bases do poder do conhecimento, vinculando a liberdade do sujeito ao domnio desse conhecimento, seja ele estritamente especializado ou, em termos mais contemporneos, globalizado. O primeiro j foi mencionado nos pargrafos anteriores e apresenta forte contribuio da Teoria Crtica. O segundo aspecto vinculase aos princpios neoliberais da sociedade capitalista moderna. Os autores que defendem a liberdade como decorrente do conhecimento, do papel que este conhecimento representa no desenvolvimento das naes, principalmente perante os avanos cientficos e tecnolgicos, apontam para a necessidade de que o processo de ensino escolarizado sofra mudanas e rompa com os modelos tradicionais de ensino. Neste novo milnio necessrio, no entender destes pesquisadores, que a escola assuma o papel de formadora de um profissional competente e habilitado e que esteja preparado para ser absorvido o mais rpido possvel pelo mercado de trabalho. No Brasil, as Diretrizes Educacionais, assim como os Parmetros Curriculares Nacionais, so evidncias claras e concretas desta nova viso sobre os fins a que nossa educao escolarizada se prope. Na mdia, freqentemente, deparamo-nos com slogans, associando a aprovao no vestibular como indicativo classificatrio das instituies de ensino. As escolas que mais aprovam nos concursos vestibulares so classificadas como as melhores instituies de ensino. Entretanto, sabemos que a situao no bem assim, o vestibular um parmetro apenas relacionado ao domnio momentneo do conhecimento, sem que isto implique em aprendizado significativo dos conceitos, alm de que ele no avalia todo o processo de formao humana, social e tica dos indivduos. Entretanto, no podemos desprezar em sua totalidade a posio destes tericos que defendem arduamente o domnio do conhecimento como condio sine qua non para a emancipao dos indivduos (aqui o sentido de emancipao difere do sentido atribudo pelos frankfurtianos), j que a ruptura que eles defendem para o processo ensino-aprendizagem neste novo sculo tem sua validade, principalmente, se considerarmos o ensino da Fsica na escola de ensino mdio sempre to preso e arraigado aos algoritmos

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matemticos, com decorebas de frmulas e conceitos, pouco relacionados realidade do educando. A defesa por um ensino mais voltado para a aprendizagem da busca da informao do conhecimento por parte do aluno, para que ele descubra por si prprio, ou pelo menos para que no haja necessidade de que se decore listas interminveis de nomes e datas que em nada contribuiro para a formao destes indivduos. Carlos Seabra (1994), em palestra proferida no Congresso do Educador-94, sintetiza essa viso funcional do ensino, mencionando que a sociedade globalizada aponta para mudanas significativas na escola bsica, no havendo mais espaos para que se priorize a simples absoro das informaes, j que o volume de conhecimento aumenta assustadoramente neste novo sculo, sendo impossvel que os jovens memorizarem to expressivo volume de conhecimentos. Para ele, ao invs de tentar se apropriar dessa gama imensa de contedos necessrio que se aprenda a navegar por ela, mostrando, tambm, que a interdisciplinaridade contribui para a interao entre os conhecimentos das diferentes reas, permitindo ao estudante interagir com as informaes que antes eram esparsas e, assim, construir seu prprio conhecimento. O autor destaca que ao profissional do futuro (e o futuro j comeou) cabe a tarefa de aprender, mencionando que executar tarefas repetitivas caber aos computadores e robs, ao homem compete ser criativo, imaginativo e inovador. Finaliza Seabra, devemos repensar o gap que existe entre a escola e a empresa, assim como entre os ricos e miserveis, entre a produo e a felicidade, como desafio na construo de uma sociedade humanista e democrtica. Nesse processo, a educao tem papel determinante, como aponta Adam Schaff (apud Seabra), a educao contnua h de ser um dos mtodos (talvez o principal) capazes de garantir ocupaes criativas s pessoas estruturalmente desempregadas. Perante essa complexa questo do ensinar para qu, um novo aspecto merece ser considerado na discusso e de certo modo poder encontrar pontos em comum com as posies dicotmicas mencionadas nos pargrafos anteriores: ensinar a pensar. Sem querer recuperar a polmica instaurada atravs do resgate das vertentes mencionadas, podemos amenizar tais discursos se considerarmos que os fins em que a educao escolar pode e deve estar centrada vinculada construo de mecanismos que favoream ao estudante experimentar e desenvolver o pensamento. Este pode ser considerado como elemento fundamental para a emancipao dos indivduos e um dos propsitos a que o processo ensinoaprendizagem deve dar prioridade, buscando uma forma verdadeira e correta de pensar.

Objetivos do ensino da Fsica na escola bsica (ensino mdio)Andre Tiberghien identifica no sistema educacional francs a problemtica do ensino da Fsica semelhante ao encontrado no sistema brasileiro. O estudo do pesquisador francs est relacionado aos propsitos a que o ensino da Fsica se destina na educao bsica, especificamente no ciclo final dessa etapa, o que em nosso sistema pode ser identificado como ensino mdio. Para ele, um dos maiores problemas do ensino obrigatrio o reconhecimento dos objetivos gerais e especficos do ensino da Fsica que permitam responder s diferentes finalidades do processo de formao dos indivduos, tanto no que diz respeito ao social, ao cultural e ao profissional (neste sentido, a escolha do curso superior). Sob esta diversidade de propsitos ao que o ensino mdio est vinculado, surgem questes como: se existem objetivos gerais comuns que possam responder a essas diferentes finalidades; se o saber cientfico e as prticas de pesquisa em Fsica so suficientes para servir de referncia ao ensino, respondendo a esses

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objetivos gerais; quais os autores que podem servir de referncia. Em outras palavras, como podemos construir um dur do ensino, que comporte tais elementos considerados necessrios e teis para o educando, sejam quais forem as suas opes posteriores. Tiberghien mostra que, diferentemente do que ocorre em matemtica, na Fsica a existncia de um ncleo comum pouco reconhecida socialmente. Em matemtica, esse ncleo sofre certas oposies quanto ao seu contedo, mas quanto possibilidade de sua existncia h consenso social. O caso da Fsica diferente, j que seu ensino na escola bsica recente. Este talvez seja argumento suficiente para justificar a falta de consenso social sobre quais elementos possam servir de referncia no momento de compor o ensino dessa disciplina na escola bsica. A situao aponta para a necessidade de explicar as finalidades do ensino da Fsica na educao bsica, particularmente no ensino mdio, j que a seleo dos contedos, a metodologia utilizada, o enfoque abordado, entre outros elementos que constituem a ao pedaggica do professor, esto apoiados nessas finalidades e objetivos que so estabelecidos para este nvel de ensino. Mais quais seriam esses objetivos? Tiberghien ao tentar responder essa pergunta mencionou algumas questes que podem guiar nossa anlise. Para ele: a) O objetivo estaria vinculado ao ensino da disciplina como forma de domnio dos seus conceitos e fenmenos, proporcionando a formao de especialistas em Fsica, a chamada lgica interna da disciplina; b) A Fsica seria ensinada como um instrumento para outros fins dados explicitamente; por exemplo: formar cidados esclarecidos, conscientes, etc...; c) Ou ainda, ensinar Fsica teria por objetivo obter xito nos exames vestibulares, que so concebidos por criao interna do sistema. O autor acrescenta que uma anlise mais especfica das finalidades propostas nos programas atuais de Fsica nas escolas evidencia a lgica descrita acima, pois no quadro dos objetivos gerais da educao, o ensino da Fsica nas escolas construdo para responder s exigncias como: a) Constituir a formao comum que os estudantes recebem como forma de cultura geral, de apropriao de conhecimentos, de desenvolvimento de qualidades associadas observao, anlise, imaginao e habilidade manual; b) Embasamento para aqueles que desejam se orientar na direo da aquisio de uma qualificao profissional determinada, permitindo que, no momento oportuno, tais estudantes apresentem uma bagagem cientfica indispensvel para a pretenso dos estudos especficos. O diagnstico aponta para uma preocupante situao ao constatar que a finalidade do ensino da Fsica na escola bsica ainda parece no estar bem explicitada para os especialistas em educao. Pesquisadores da rea do ensino de cincias (Fsica) tm evidenciado a necessidade de que tais objetivos sejam claramente apontados e definam em melhor proporo o ensino dessa disciplina.

O processo ensino-aprendizagem: a contribuio da psicologiaA psicologia, atravs das teorias de aprendizagem, oferece um importante vis pelo qual podemos refletir o ensino da Fsica, principalmente na perspectiva das dificuldades apresentadas pelos estudantes na compreenso dessa cincia. Mesmo que a referncia da psicologia sejam estudos voltados para o processo de aprendizagem, atravs das teorias de aprendizagem, importante destacar que a nosso ver, elas acabam influenciando outros aspectos relacionados ao ensino, como as estratgias e metodologias utilizadas no ensino, bem como influenciam os materiais instrucionais elaborados e empregados no ensino.Revista Iberoamericana de Educacin (ISSN: 1681-5653)

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Assim, discutir o ensino da Fsica no exime da necessidade de refletir o papel que as teorias de aprendizagem vm exercendo nessa rea. Silva (2004) menciona que o sistema educacional brasileiro na metade do sculo XX, estava sob forte influncia do sistema americano de educao, segundo o qual as escolas estavam eram vistas como empresas, em que elas especificavam as caractersticas de seu produto e que resultados pretendiam obter, estabelecendo mtodos para obt-los de forma precisa. Nesse sentido, falava-se em priorizar resultados no sistema educacional, impregnando essa viso nos diferentes mecanismos que envolvem o processo ensinoaprendizagem, desde os materiais instrucionais como os livros-didticos e manuais de ensino (muito freqentes na poca) at os mtodos de ensino utilizados em sala de aula. O termo vigente na poca, nos Estados Unidos, e conseqentemente no Brasil, era a instruo programada, o reforo positivo, cujos enfoques dominaram o ensino nas diferentes disciplinas curriculares, inclusive no ensino da Fsica. A situao esteve presente no sistema educacional brasileiro nas dcadas de 1960 e 1970, nos quais muitos dos professores que atuam hoje no ensino, principalmente nas universidades brasileiras, tiveram sua formao. A teoria de aprendizagem que imperava nos sistema educacional foi proposta por Skinner, psiclogo americano, que apoiava seus pressupostos na valorizao dos mecanismos que resultariam no comportamento observvel dos indivduos, no considerando o que ocorre na mente desses indivduos. Para ele, a aprendizagem ocorre devido ao reforo, repetio, desta forma o ensino deveria criar condies para que as respostas fossem dadas inmeras vezes. Ao professor cabia a tarefa de proporcionar tais mecanismos de reforo, criando situaes de repetio tantas vezes quantas fossem necessrias at que o aluno exibisse o comportamento desejado (Moreira, 1999). Esse enfoque foi usado de forma quase unnime no ensino da Fsica naquela poca, pois as estratgias e metodologias utilizadas pelos professores estavam essencialmente condicionadas a criar mecanismos de respostas e a repeti-las tantas vezes quantas fossem necessrias. A presena de Skinner ainda forte no ensino da Fsica, podendo ser identificada nas apostilas e livros didticos de Fsica que apresentam um modelo de exerccio resolvido e a seguir uma lista interminvel de outros, favorecendo a aprendizagem por repetio, por reforo. Entretanto, o mtodo skinneriano de ensino e de aprendizagem, acabou sendo questionado ainda na dcada dos 70, permitindo que novas teorias de aprendizagem fossem pesquisadas e vinculadas ao ensino da Fsica, principalmente no final dessa dcada e inicio dos anos 80. Os principais fundamentos para esses estudos direcionaram-se para a valorizao dos processos mentais, relacionando-se a construo do conhecimento s denominadas teorias de aprendizagem construtivistas. No ensino da Fsica, comeam a aparecer trabalhos vinculados s teorias de Jean Piaget, David Ausubel e Lev Vygotsky, entre outros, como forma de propor alternativas para o processo ensino-aprendizagem. Esse novo enfoque no campo da psicologia permanece presente ainda hoje, sofrendo pequenas variaes, mas sempre tendo como referncia o processo de construo do conhecimento. A aprendizagem, dentro desse enfoque, centra-se no educando, na sua capacidade de ler e interpretar o mundo, ultrapassando a nfase dada pelos behavioristas, como Skinner, segundo o qual a importncia estaria na capacidade do aluno para dar respostas. Entretanto, essa alternativa apresentada pelos pesquisadores, trouxe vrias interpretaes de acordo com o terico considerado, apontando elementos diferentes para o processo ensino-aprendizagem da Fsica. Neste sentido, os autores passaram a ser estudados e associados ao ensino desta cincia, sob diferentes enfoques, tendo sempre como elemento central a capacidade do aluno de aprender a aprender, de construir seu prprio conhecimento.

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As contribuies de Jean Piaget ao ensino ocorreram de diferentes formas, dentre as quais necessrio destacar a influncia de seu pensamento na elaborao e organizao curricular do sistema educacional brasileiro, cujo referencial passou a ser os perodos de desenvolvimento mental. A presena dos estudos piagetianos na estrutura do ensino brasileiro, remeteu o ensino da Fsica s sries mais avanadas, pois, de acordo com Piaget, essa cincia necessitava do pensamento formal, etapa presente nos estudantes a partir dos doze anos de idade, aproximadamente. Assim, a Fsica passou a integrar os currculos na etapa final do ensino fundamental, pois na perspectiva de vrios pesquisadores apoiados nos trabalhos de Piaget, antes seria difcil que o aluno estivesse em condies de construir e elaborar os conceitos relacionados Fsica. Fortemente imbudas desse pensamento piagetiano, Kamii e Devries (1985), apontam a inviabilidade de ensinar conceitos cientficos de Fsica na etapa inicial de escolarizao, pois a criana nessa idade, no estaria em condio de compreender tais conhecimentos, pelo menos no da mesma maneira que o adulto, cujo pensamento formal j estaria desenvolvido. Nas palavras das autoras: ...a educao cientfica basicamente descarrega sobre as crianas o contedo organizado do adulto (p. 21). Outras teorias de aprendizagem aparecem neste perodo, sempre buscando favorecer o processo de aprendizagem dos estudantes, direcionando o foco de suas pesquisas para os processos que permitam aos estudantes se apropriarem do conhecimento. Ausubel e Novak so outros autores que merecem ser destacados nessa retrospectiva histrica, pois representam importantes referenciais para o processo ensinoaprendizagem da Fsica. Os fundamentos das teorias propostos pelos autores, principalmente por Ausubel, apresentavam a associao da aprendizagem ao significado de organizao e integrao do material na estrutura cognitiva do aprendiz. Para Ausubel, o fator isolado que mais influencia a aprendizagem aquilo que o aluno j sabe, cabendo ao professor identific-lo e ensinar de acordo (MOREIRA, 1999). O conceito central desta teoria a aprendizagem significativa, conforme menciona Moreira: trata-se de um processo por meio do qual as novas informaes relacionam-se com um aspecto especificamente relevante da estrutura de conhecimento do indivduo, ou seja, este processo envolve a interao da nova informao com uma estrutura de conhecimento especfica, a qual Ausubel define como conceito subsunor, ou simplesmente subsunor, existente na estrutura cognitiva do indivduo, (1999, p. 153). No ensino da Fsica, Ausubel citado como referncia, j que muitos dos exemplos expostos pelo autor nas suas obras estavam freqentemente vinculados ao processo de aprendizagem dos contedos da Fsica. Essa identificao de Ausubel com a aprendizagem dos conceitos e fenmenos da Fsica, levou vrios pesquisadores desta rea de ensino a considerarem a teoria ausubeliana nos seus estudos. Moreira, por exemplo, apoiou suas pesquisas na aprendizagem significativa, idia decorrente da teoria ausubeliana, possibilitando uma importante reflexo no ensino da Fsica no Brasil nos ltimos anos. O pesquisador atravs de seus estudos e publicaes delineou uma nova perspectiva para o ensino da Fsica, tendo como referncia a aprendizagem significativa, segundo a qual h necessidade de se considerar a existncia de informaes na estrutura cognitiva do aprendiz para que as novas informaes sejam apoiadas nessas estruturas. Moreira (1999) ilustra a situao mencionando que os conceitos de campo e fora, por exemplo, j existem na estrutura cognitiva do aluno, e que devero servir de ncora (subsunores) para as discusses sobre os conceitos de fora e campo nas suas diferentes variaes. Estas informaes que j existem pode ser uma simples idia mesmo intuitiva, lembra Moreira, porm, na medida em que os novos conceitos forem sendo aprendidos de maneira significativa, resultar num crescimento e na elaborao dos conceitos subsunores iniciais, isto , os conceitos de fora e campo ficariam mais elaborados, mais inclusivos e mais capazes de servir de subsunores para as novas informaes relativas a fora e campo, ou correlatos (1999, p. 154).Revista Iberoamericana de Educacin (ISSN: 1681-5653)

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Recentemente os trabalhos de Vygotsky chegaram ao Brasil e passaram a influenciar estudos na rea do ensino da Fsica. Os princpios que fundamentam a teoria de Vygotsky esto associados influencia do social no processo de aprendizagem, diferenciando-se de outros construtivistas, como Piaget, por acrescentar o contexto social e cultural no qual o aprendiz est inserido, como fator determinante na sua aprendizagem, principalmente quando relacionado aprendizagem escolar. Um dos pilares que sustenta a teoria vygotskyana e que influencia a opo por sua adoo nos estudos relacionados ao ensino da Fsica a assero de que os processos mentais superiores do indivduo tm origem em processos sociais (Moreira, 1999). Como decorrncia desta viso, o processo de formao de conceitos (fundamental para a aprendizagem escolar) sofre influncia direta do meio social e cultural no qual o indivduo est inserido. Neste sentido, os conhecimentos prvios que os alunos trazem para a escola so elementos primordiais para a discusso e posterior apropriao pelos educandos dos conhecimentos cientficos (prprios do ambiente escolar). Faz-se necessrio acrescentar que a teoria de Vygotsky mostra uma aproximao com as teorias crticas de educao, apresentando suas razes no marxismo. Considerando o novo dimensionamento que vem sendo dado ao ensino nestes ltimos anos, o qual aponta para a necessidade de que o conhecimento desenvolvido em ambiente escolar avance mais no sentido de proporcionar uma formao crtica e humana dos indivduos. Vygotsky, desta forma, passou a ser mencionado com freqncia nas pesquisas relacionadas educao, de um modo geral, e ao ensino da Fsica, de um modo particular.

O processo ensino-aprendizagem: a dimenso epistemolgicaDo ponto de vista da construo do conhecimento cientfico, a histria da cincia tem mostrado que o ensino da Fsica sofre mudanas significativas no seu percurso, dependendo das bases nas quais os pesquisadores buscam seus fundamentos. A reflexo sobre o processo de produo das teorias na Cincia requer, primeiramente, discutir o que se entende por Cincia. De acordo com Aurlio Ferreira (1988), cincia conhecimento; conjunto organizado de conhecimentos relativos a um determinado objeto, especialmente os obtidos mediante a observao, experincia dos fatos e um mtodo prprio; soma dos conhecimentos humanos considerados em conjunto. Na perspectiva de Ernest Cassirer, cincia criao humana, aspecto da humanidade do homem. Entretanto, no se trata de definir cincia, mas de compreender sua constituio e sua operacionalizao. Nessa perspectiva, discute-se o processo de produo do conhecimento cientfico de modo a evidenci-lo como uma atividade humana historicamente contextualizada e que se faz presente no processo ensino-aprendizagem. Ao longo da histria, percebem-se correntes de pensamento diferentes, concorrendo na busca por validar esse conhecimento cientfico, entre as quais duas tm se destacado: o empirismo e o racionalismo. Tais correntes filosficas tm liderado o rol de ensaios produzidos nos ltimos anos no que concerne ao ensino da Fsica. Alguns pesquisadores tm procurado fundamentar seus trabalhos em pressupostos relacionados produo do conhecimento, justificando que as estratgias de ensino, a metodologia utilizada na ao pedaggica, identifica-se com questes epistemolgicas associadas s concepes que o professor tem da Cincia. Assim, ensinar Cincia (Fsica) a partir dos pressupostos da construo ou reconstruo dos conhecimentos cientficos reconhecer a importncia da histria da Cincia na evoluo do pensamento humano.

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O empirismo, enquanto concepo epistemolgica, pressupe que a origem do conhecimento uma experincia sensvel (Severino, 2000). Ele est fortemente ligado aos trabalhos de Francis Bacon no sculo XVI e XVII, que considerava a observao e os sentidos as nicas fontes efetivas do conhecimento, caracterizando-se por fundar todo conhecimento sobre os dados sensoriais. Preconizava o mtodo indutivo segundo o qual se parte da observao de uma situao particular para, posteriormente, generaliza-lo, tendo a idia principal girando em torno da neutralidade dessa observao. Segundo essa corrente de pensamento, a Fsica no tem status de certeza absoluta, como afirma Japiass (1981): O esprito s pode estabelecer entre coisas, relaes provveis, vale dizer, relaes susceptveis de serem confirmadas por uma observao repetida, sem que tenhamos a certeza de que sejam universais e necessrias (p. 8). Assim, necessrio que sejam realizadas vrias observaes sobre um mesmo fenmeno, pois a regularidade na repetio indicativa da existncia de uma propriedade geral que poder levar formulao de uma teoria. A segunda corrente filosfica, o racionalismo, preconiza a razo como sendo a fonte de validade do conhecimento. Segundo Japiass (1981), o mundo obedece a leis simples, redutveis s matemticas e, portanto, cognoscveis apenas como raciocnios lgicos (p. 8). Descartes foi o responsvel pela difuso dessa idias no sculo XVI e XVII, sendo conhecido pelas famosas afirmaes: Jamais devemos admitir alguma coisa como verdadeira a no ser que a conheamos evidentemente como tal e Penso, logo existo. Ele tinha como meta a busca de uma verdade primeira que no pudesse ser posta em dvida, considerando que o nico modo de se construir Cincia e tambm sabedoria de vida era seguindo a razo, tal qual pode ser visto nos detalhamentos da Matemtica. Por mais que as correntes filosficas do empirismo e do racionalismo concorram entre si, h de se considerar pontos em comum entre elas. Conforme Hokheimer e Adorno (1991), ainda que as diferentes escolas interpretem os axiomas de diferentes maneiras, a estrutura da cincia unitria sempre a mesma (p. 6). Tomando-se por referncia o sculo XX, pensadores no campo da epistemologia e da filosofia direcionaram seus estudos na tentativa de buscar uma compreenso epistemolgica da produo do conhecimento segundo a perspectiva racionalista, cada um sob a sua ptica, compartilhando entre si que o conhecimento fruto da interao no neutra entre sujeito e objeto. A anlise epistemolgica realizada por distintos filsofos da cincia, tem apontado para uma nova dimenso na compreenso da Cincia, envolvendo aspectos de compreenso dos problemas do conhecimento. Neste sentido, a Fsica moderna exigiu uma nova viso epistemolgica diferente daquelas associadas Cincia clssica, de carter positivista, que tem na neutralidade do sujeito um dos pressupostos bsicos (Delizoicov, 2002). necessrio envolver o sujeito no percurso das observaes e interpretaes, como prev a Fsica moderna. Dentre os principais epistemlogos do sculo XX, que analisam o conhecimento sob estas diferentes facetas, trs nos chamam a ateno por serem particularmente importantes para o ensino da Fsica, sendo inclusive mencionados em diversos trabalhos relacionados ao ensino desta cincia. Thomas S. Kuhn, Karl Popper e Gaston Bachelard discutem a natureza do conhecimento humano, sob a perspectiva da interao no neutra entre sujeito e objeto e, ainda, estabelecem relaes com o processo ensino-aprendizagem da Fsica, mesmo que cada um interprete o ato gnosiolgico sua maneira, assumindo posturas epistemolgicas distintas, mas igualmente centradas na inconsistncia do pressuposto da neutralidade epistemolgica do sujeito. Thomas Kuhn, fsico e epistemlogo, prope uma nova viso da Cincia, sendo precursor das idias acerca do desenvolvimento cientfico. Para ele, no existia observao neutra de um fenmeno, pois toda

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observao antecedida por uma teoria. Props a existncia de perodos de cincia normal no qual o trabalho cientfico se desenvolveria conforme parmetros estabelecidos em funo do contexto que o conhecimento da poca permitiria, ou seja, a Cincia normal no visava fazer emergir novos fenmenos, ao contrrio, ela estaria dirigida para responder queles fenmenos e teorias previamente estabelecidos. Em outras palavras, o perodo de Cincia normal desenvolvido a partir de paradigmas. Paradigma considerado o conceito fundamental da teoria kuhniana, cujo significado foi esclarecido por Kuhn no posfcio da sua obra Estrutura das revolues cientficas, de 1969. Segundo Kuhn, o termo paradigma tem um duplo sentido: um geral e outro restrito. Geral no sentido de designar crenas, valores, tcnicas partilhadas pelos membros de uma comunidade especfica; restrito por referir-se s solues de problemas como os encontrados em uma situao restrita, aqueles que normalmente os alunos encontram ao realizarem atividades sem o auxlio do professor encarando um novo problema (situaes de laboratrio ou provas, por exemplo) como se fosse conhecido. Tais paradigmas, sejam no sentido geral seja no restrito, so substitudos medida que um novo paradigma seja estabelecido, proporcionando perodos de transio, o que Kuhn denominou revoluo cientfica. Com isso, o autor mostrou que as teorias emergem aps o fracasso de outras, evidenciando a necessidade de que a cincia seja constantemente revista, desprovendo-a, pois, da idia de conhecimento cumulativo e linearizado. Karl Popper, filsofo austraco, props que todo conhecimento passvel de correes, sendo, assim, provisrio. Para ele, uma teoria nunca empiricamente verificvel no sentido de que seja considerada correta. Considera que uma nica constatao experimental pode ser suficiente para derrubar uma teoria, entretanto essa jamais pode ser estabelecida em funo de observaes, por maior que seja o nmero delas. Toda observao antecipada por uma prvia teoria, portanto, no neutra. Popper acreditava que todo conhecimento cientfico criado, inventado, construdo com objetivo de descrever, compreender e agir sobre a realidade: Desde a ameba at Einstein, o crescimento do conhecimento sempre o mesmo: tentamos resolver novos problemas e obter, por um processo de eliminao, algo que se aproxime da adequao em nossas solues experimentais (Popper, 1975, p. 239). Nesse sentido, Popper mostrou que a cada novo conhecimento existe um anterior, do qual foram extradas questes investigativas na busca por respostas sobre a realidade. Gaston Bachelard, cientista e filsofo francs, crtico da concepo empirista, discute o conhecimento cientfico com base nos conceitos de ruptura e obstculos epistemolgicos. Por ruptura ele entende a descontinuidade que ocorre entre o conhecimento comum (primeiro) e o conhecimento cientfico (elaborado); essa ruptura exige a superao de obstculos epistemolgicos, que, por sua vez, esto relacionados com perturbaes geradas pelo conhecimento, representando uma resistncia ao prprio conhecimento, so inerentes ao ato de conhecer. A opinio considerada por Bachelard o primeiro obstculo porque a opinio pensa mal e um obstculo epistemolgico se incrusta no conhecimento no questionado (Bachelard, 1983, p. 148). Para este autor, o progresso do conhecimento cientfico deve ser constantemente corrigido, no em funo de experincias malsucedidas, mas como princpio fundamental que sustenta e dirige o conhecimento, sendo responsvel por impulsionar os avanos e conquistas da Cincia. Os obstculos podem, assim, ser compreendidos atravs de uma dupla ao: como freio e motor do progresso no desenvolvimento interno da Cincia. Com esta retomada nos trabalhos dos epistemlogos, ressalta-se a importncia para a prtica pedaggica do professor, especificamente de Fsica, da reflexo em torno da natureza do conhecimento cientfico, mostrando a sintonia que deve haver entre o processo ensino-aprendizagem e as concepes

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Ensino de Fsica: tendncias e desafios na prtica docente

sobre a natureza do conhecimento. As pesquisas desenvolvidas nestes ltimos anos relacionadas ao ensino da Fsica, tm apontado para a necessidade de considerar o aluno enquanto sujeito ontolgico e epistmico, como destaca Delizoicov (2002), ... a localizao do aluno, relativamente aos domnios espacial, temporal e cultural, implica o fato de ele estar interagindo com um meio mais amplo do que o escolar e exige que no o consideremos, do ponto de vista da cognio, como uma tabula rasa que vai interagir com objetos do conhecimento somente na perspectiva da educao escolar (p. 186).

O processo ensino-aprendizagem: aspectos didtico-metodolgicosDiscutir a ao pedaggica do professor envolve necessariamente discutir aspectos didticometodolgicos do processo ensino-aprendizagem. Neste sentido, faz-se meno didtica das cincias como vis freqentemente utilizado nas pesquisas no ensino da Fsica, nestes ltimos anos, pois fornecem um insight de como se efetiva o processo de ensino-aprendizagem no mbito da sala de aula, j na esfera do professor. Por considerar que as estratgias de ensino, assim como a metodologia utilizada na abordagem dos contedos, pertencem aos domnios do professor, como discute Chevallard (1991), na didtica francesa, a pesquisa no ensino da Fsica tem direcionado seus enfoques para o uso de estratgias de ensino que facilitem a compreenso dos conceitos e fenmenos da Fsica. Ou seja, as metodologias freqentemente utilizadas pelos professores no ensino, nos diferentes nveis de escolaridade, apontam na direo de contriburem para o processo ensino-aprendizagem. Recorrendo a histria das pesquisas e das investigaes relacionadas ao ensino e aprendizagem da Fsica, constatasse uma tendncia em fundament-las teoricamente segundo elementos relacionados psicologia cognitivista, principalmente no campo das teorias construtivistas, a concepo epistemolgica da Cincia e a modelos didticos baseados na relao entre os conhecimentos cientficos e os conhecimentos prvios dos alunos. Porm, Astolfi e Develay (1995) relacionam a ao pedaggica do professor a questes vinculadas sua epistemologia, que diferente da epistemologia da Cincia, embora ligada a ela, pois estaria relacionada ao conjunto de crenas e valores que direcionam a didtica do professor. A idia desses autores oferece elementos importantes e promissores na investigao e na anlise da ao pedaggica docente, principalmente no mbito dos processos de abordagem didtica dos contedos. Diante da situao que de autonomia do professor, a sua posio epistemolgica sofre uma associao com questes de cunho didtico, mas no com a didtica geral, que na perspectiva de Nerici (1989) entendido como conjunto de recursos destinados a direcionar a aprendizagem do educando, mas com a didtica das cincias. Esta por sua vez, ocupa-se de questes mais especificas dos saberes de referncia, da sua estrutura, sua epistemologia e sua histria (Astolfi e Develay, 1985, p.10). Na epistemologia da prtica educativa, pode ser identificado o conjunto de valores e crenas que direcionam o professor a uma viso pessoal da Cincia a ser ensinada. Nesse sentido, Joshua e Dupen (1993) mostram que o ensino da Fsica tem a dimenso da Fsica do professor diferente daquela do fsico. Decorrendo da as distores que vo sendo constatadas no ensino escolar.

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