sarcoma metastÁtico em mandÍbula: relato de … · peça evidenciou adenocarcinoma metastático....

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1 SARCOMA METASTÁTICO EM MANDÍBULA: RELATO DE CASO METASTATIC SARCOMA IN THE JAW - A CASE REPORT Alexandre de O. Bridi 1 , Ana Cláudia G. A. Koubik 2 1 Pós-graduando do Curso de especialização em Radiologia Odontológica e Imaginologia da Universidade Tuiuti do Paraná (Curitiba-PR). 2 Profª MSc e Orientadora do Curso de Especialização em Radiologia Odontológica e Imaginologia da Universidade Tuiuti do Paraná (Curitiba-PR). Endereço para correspondência: Alexandre de O. Bridi – [email protected] RESUMO: Metástase na região maxilofacial é uma ocorrência extremamente rara, entretanto, é de grande significado clínico, pois sua aparição pode ser o primeiro indicativo de um tumor maligno ainda não descoberto em um sítio primário distante ou a disseminação de um tumor conhecido. Lesões metastáticas podem imitar infecções odontogênicas e outras condições patológicas na cavidade oral que podem levar ao diagnóstico tardio pelo clínico desatento. O objetivo do presente estudo foi realizar uma breve revisão de literatura sobre metástase na região maxilofacial e relatar um caso de sarcoma endometrial de alto grau metastático em mandíbula. Ressalta-se a relevância do caso apresentado por se tratar de ocorrência extremamente rara, mas de grande significado clínico. PALAVRAS CHAVE: metástase neoplásica; neoplasias maxilomandibulares; neoplasia, metástase ABSTRACT: Metastasis to the maxillofacial region is an extremely rare occurrence, however, are of great clinical significance, as their appearance may be the first indication of an undiscovered malignancy at a distant primary site or the first evidence of dissemination of a known tumor. Metastatic lesions may mimic odontogenic infections and other disease conditions in the oral cavity in presentation leading to late diagnosis by the unwary clinician. The aim of this study was to perform a brief review of literature on metastasis in the maxillofacial region andreport a case of high-grade endometrial sarcoma metastatic in jaw. We emphasize the importance of the case presented because it comes to extremely rare occurrence, but of great clinical significance. KEYWORDS: neoplasm metastasis; jaw neoplasms; neoplasms, second primary

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SARCOMA METASTÁTICO EM MANDÍBULA: RELATO DE CASO

METASTATIC SARCOMA IN THE JAW - A CASE REPORT

Alexandre de O. Bridi1, Ana Cláudia G. A. Koubik2

1 Pós-graduando do Curso de especialização em Radiologia Odontológica e Imaginologia da Universidade Tuiuti do Paraná (Curitiba-PR).

2 Profª MSc e Orientadora do Curso de Especialização em Radiologia Odontológica e Imaginologia da Universidade Tuiuti do Paraná (Curitiba-PR).

Endereço para correspondência: Alexandre de O. Bridi – [email protected]

RESUMO:

Metástase na região maxilofacial é uma ocorrência extremamente rara, entretanto, é de grande significado clínico, pois sua aparição pode ser o primeiro indicativo de um tumor maligno ainda não descoberto em um sítio primário distante ou a disseminação de um tumor conhecido. Lesões metastáticas podem imitar infecções odontogênicas e outras condições patológicas na cavidade oral que podem levar ao diagnóstico tardio pelo clínico desatento. O objetivo do presente estudo foi realizar uma breve revisão de literatura sobre metástase na região maxilofacial e relatar um caso de sarcoma endometrial de alto grau metastático em mandíbula. Ressalta-se a relevância do caso apresentado por se tratar de ocorrência extremamente rara, mas de grande significado clínico. PALAVRAS CHAVE : metástase neoplásica; neoplasias maxilomandibulares; neoplasia, metástase

ABSTRACT:

Metastasis to the maxillofacial region is an extremely rare occurrence, however, are of great clinical significance, as their appearance may be the first indication of an undiscovered malignancy at a distant primary site or the first evidence of dissemination of a known tumor. Metastatic lesions may mimic odontogenic infections and other disease conditions in the oral cavity in presentation leading to late diagnosis by the unwary clinician. The aim of this study was to perform a brief review of literature on metastasis in the maxillofacial region andreport a case of high-grade endometrial sarcoma metastatic in jaw. We emphasize the importance of the case presented because it comes to extremely rare occurrence, but of great clinical significance. KEYWORDS: neoplasm metastasis; jaw neoplasms; neoplasms, second primary

2

1 INTRODUÇÃO

Metástase na região maxilofacial é

uma ocorrência extremamente rara. A

maioria dos pesquisadores concordam

que apenas 1% de todos os novos casos

de câncer diagnosticados na cabeça e

pescoço são metástase de outros sítios,1

entretanto, são de grande significado

clínico pois sua aparição pode ser o

primeiro indicativo de um tumor maligno

ainda não descoberto em um sítio

primário distante ou a disseminação de

um tumor conhecido do seu sítio

primário.2

Em 22% a 30% dos casos a

manifestação metastática oral é o

primeiro sinal de lesão maligna e cerca

de 67% dos casos a lesão metastática é

detectada ao mesmo tempo da lesão

primária.3 A idade e o sexo do paciente

podem ser importantes indicativos para a

possível localização da lesão primária.4

Carcinomas são os tipos de tumores

mais frequentes a causarem metástase

na boca e maxilares,5 embora carcinoma

metastático da mandíbula seja uma lesão

rara e incomum.6

Os casos mais frequentes de

tumores metastáticos em mulheres têm

como sítio primário a mama, rim, região

coloretal, órgãos genitais e glândula

tireoide e em homens, pulmão, próstata,

rim e região coloretal. A mandíbula é

afetada mais frequentemente que a

maxila, com predileção pelas áreas

distais aos caninos, incluindo o corpo e o

ramo.7

Lesões metastáticas podem imitar

infecções odontogênicas e outras

condições patológicas na cavidade oral

que podem levar ao diagnóstico tardio

pelo clínico desatento.8 A falta de

evidências radiográficas e sintomatologia

não excluem a possibilidade de

existência de lesão metastática. A

alteração da sensação tátil na região do

lábio inferior e queixo em um paciente

aparentemente sadio devem alertar o

profissional para a possibilidade de

existência de uma lesão metastática e

uma investigação adequada deve ser

conduzida.2

O objetivo do presente estudo foi

realizar uma breve revisão de literatura

sobre metástase na região maxilofacial e

relatar um caso de sarcoma endometrial

de alto grau metastático em mandíbula.

2 REVISÃO DE LITERATURA

McClure et al.1 (2013) fizeram uma

análise dos prontuários dos pacientes

atendidos no departamento de cirurgia

oral e maxilofacial da Universidade de

Maryland, durante o período de 1990 a

3

2005, que tiveram metástase maxilofacial

confirmada por exame histopatológico.

Durante o período estudado 1221

pacientes foram identificados com câncer

de boca e destes, 26 tinham metástase

na região maxilofacial (2,1%). As idades

variaram de 45 a 87 anos. Os tumores de

origem mais comuns foram pulmão,

mama e colo do útero. Muitos pacientes

apresentaram sintomas múltiplos. As

lesões mandibulares representaram 69%

do total. Em 62% dos pacientes o

diagnóstico de lesões metastáticas foi o

primeiro indicativo de malignidade. Em

pacientes com diagnóstico de lesão

maligna a média de tempo para

aparecimento de metástase foi de 31,5

meses. Vários tipos de tratamento foram

propostos (cirurgia, quimioterapia,

radioterapia, entre outros). 75% dos

pacientes com diagnóstico de metástase

na região maxilofacial morreram no

intervalo de quatro meses do diagnóstico

desta metástase independente do

tratamento. Os autores concluíram que: -

a maior incidência das metástases se dá

no sexo masculino em idades entre 45 e

87 anos - os tumores primários de

pulmão e de mama estão entre os mais

comuns - os tumores metastáticos dos

maxilares são indicativos de tumores

extremamente agressivos visto a taxa de

mortalidade dos pacientes após a

descoberta da metástase.

Bodner et al.2 (2006) apresentaram

oito casos de tumores metastáticos nos

ossos maxilares de pacientes tratados no

Departamento de Cirurgia Oral e

Maxilofacial do Centro Médico

Universitário – Soroka – Israel durante o

período de 1996 a 2004. Foi feita uma

análise de gráficos, com atenção para a

demografia dos pacientes, presença de

sintomas, história de outros tumores,

achados clínicos e radiográficos,

histopatologia e tratamento. Dos oito

pacientes analisados, cinco eram

mulheres. As idades variaram de 44 a 80

anos. Sete casos ocorreram na

mandíbula e um na maxila. O local do

tumor primário foram o pulmão (2 casos),

a mama (2 casos), o reto, a tireoide, o

útero e a glândula parótida (1 caso cada).

Os aspectos clínicos relevantes foram:

aumento de volume do tecido mole (5

casos), parestesia do lábio inferior (2

casos) lesão periapical (1 caso). O

protocolo de tratamento foi quimioterapia

(3 casos) quimio e radioterapia (2 casos),

cirurgia e quimioterapia (1 caso) e

cuidado de suporte (2 casos). Os

pacientes foram acompanhados desde o

momento da descoberta da lesão

metastática até o seu falecimento (o

período variou de 1 a 91 meses). A causa

morte em todos os casos foi metástase

generalizada.

Gomes et al.3 (2009) relataram o

caso de uma mulher de 51 anos de idade

que procurou atendimento no

4

departamento de clínica médica do

Hospital de Barão de Lucena em 2006,

queixando-se de aumento de volume

palpável no crânio e mandíbula do lado

esquerdo, sem dor, com dois meses de

evolução inicialmente na mandíbula.

Relatava fraqueza, falta de apetite, perda

brusca de peso, dor no quadril direito,

mas sem febre, tosse ou dispneia. Havia

sido fumante durante 30 anos e era

hipertensa controlada. Sua capacidade

pulmonar estava dentro dos limites da

normalidade. Apresentava assimetria

facial decorrente de nódulo indolor do

lado esquerdo da mandíbula. Foram

realizados exames radiográficos onde se

pôde observar lesões osteolíticas no

crânio e cristas ilíacas. Na radiografia de

mandíbula nada pode ser observado.

Devido ao aumento de volume na

mandíbula, a paciente foi submetida a

uma tomografia computadorizada da face

onde se observou, além de novas lesões

no crânio, lesões osteolíticas na região

retromolar e côndilo do lado direito. A

paciente apresentava anemia e foi feito

reposição de sangue. Uma biopsia

incisional foi realizada na lesão de

mandíbula sob anestesia geral da

paciente. O exame histopatológico da

peça evidenciou adenocarcinoma

metastático. A análise imunohistoquímica

não evidenciou a origem do tumor. Foram

identificados outros sítios metastáticos

em vértebras e coluna cervical. O

tratamento foi paliativo até o falecimento

da paciente.

Muttagi et al.4 (2011) fizeram um

levantamento dos dados dos pacientes

atendidos durante o período de 2000 a

2005 no Tata Memorial Hospital (são

atendidos em média 2082 casos de

tumor primário na cavidade oral por ano)

a fim de estimar a incidência de tumores

metastáticos nos ossos da face. Somente

os casos com metástase confirmada e

informações como local do tumor

primário, tratamento prévio,

histopatologia, ossos envolvidos, tempo

entre descoberta do tumor e

aparecimento de metástase, achados

clínicos tratamento e prognóstico,

biopsia, imunohistoquímica e achados

clinico-radiográficos de envolvimento dos

ossos da face foram incluídos. Os dados

foram tabulados e analisados. Foram

encontrados 19 casos que preencheram

todos os requisitos para fazerem parte do

trabalho. As idades variaram de 4 meses

a 69 anos. A maioria dos tumores era de

origem epitelial. O sítio primário variava

de acordo com a idade. A mandíbula foi o

osso mais afetado, principalmente na

região de corpo. Dor e parestesia foram

achados comuns. Pode-se observar

também trismo, assimetria facial e

envolvimento de tecido mole. Foi

observado que a partir do diagnóstico de

tumor metastático nos ossos da face os

pacientes tiveram, em média, mais 6

5

meses de vida.

Daley et al.5 (2011) compararam

38 casos de tumores metastáticos de

pacientes canadenses com pacientes dos

serviços de odontologia da Universidade

do Oeste Ontario, Londres, durante o

período de 1992 e 2010 e os arquivos do

departamento de patologia do Centro de

Ciências da Saúde de Londres, Ontario,

durante o período de 2002 e 2010, a fim

de observar se a prevalência dos

tumores primários e metastáticos seguem

um padrão ou diferem nas diferentes

regiões. Os dados como idade, sexo,

local da metástase, presença de um sítio

conhecido de tumor primário e

características radiográficas foram

retirados da ficha de biópsia. Pacientes

com casos de linfomas prévios não foram

considerados metastáticos e foram

descartados. Foi observado que a média

de idade dos pacientes canadenses foi

de 69,6 ± 12 anos (de 32 a 88 anos).

58% dos pacientes eram do sexo

masculino. A etnia dos pacientes não

constava dos registros, mas sabe-se (de

acordo com o senso de 2006) que a

população de Ontario é

predominantemente de brancos

descendentes de europeus com mais de

200 etnias. 55% dos pacientes tinham um

tumor primário conhecido no momento da

detecção da metástase; nenhum tinha

sarcoma. 79% dos pacientes tinham mais

de 60 anos e 3% menos de 50. 53% dos

casos se localizaram em mandíbula, com

o restante se distribuindo em gengiva,

mucosa alveolar, mucosa jugal, mucosa

do palato duro, língua e pele. As

manifestações clínicas incluíram dor

aumento de volume, perdas dentárias,

mas algumas lesões eram

assintomáticas. A manifestação clínica

mais comum foi parestesia do lábio

inferior. Os pesquisadores concluíram

que as características clínicas e

radiográficas dos pacientes das

diferentes regiões geográficas são

bastante semelhantes. A maior

frequência de lesões metastáticas dos

maxilares está nos pacientes com mais

de 50 anos. A predileção é pela região de

mandíbula. Há uma tendência à

igualdade na distribuição por sexo. No

entanto quando comparado o tipo de

tumor que causou a metástase na região

oral pôde-se perceber grandes diferenças

dependendo da localização geográfica.

Os tumores de próstata foram os que

causaram mais metástase nos

canadenses, mas isso não se repetiu em

outras populações.

Bigelow et al.6 (1953) descreveram

o caso de uma mulher branca e solteira

de 79 anos com aumento de volume no

lado direito. Ela relatou estar há 5 meses

com perda de sensibilidade na região do

mento. Dois meses após uma massa

consistente, indolor, se desenvolveu na

região central do ramo mandibular. Nos

6

próximos 3 meses a massa foi

aumentando e endurecendo, causando

dificuldade de abertura de boca. Quatro

anos antes havia sido removido um

carcinoma de mama. Dois anos mais

tarde linfonodos axilares com lesão

metastática foram removidos. A lesão do

lado direito da mandíbula, medindo

aproximadamente 6x6x6cm, estava

extremamente endurecida e integrada ao

osso. A pele e mucosa ao redor não

apresentavam alterações. A lesão foi

removida com margem de segurança e

encaminhada para exame

histopatológico. O exame histopatológico

mostrou que a lesão se estendia para o

tecido fibroso e muscular adjacente. A

aparência era típica de um carcinoma de

origem da glândula mamária.

Em um relato de caso, Poulias et

al.7 (2011) citam o caso em que uma

mulher de 55 anos foi encaminhada pelo

oncologista para a verificação de lesão

dolorosa na região retromolar do lado D.

O diagnóstico presuntivo era de

osteorradionecrose. A história médica

revelava mastectomia radical do lado E.

Ao exame intraoral observou-se edema

difuso da mucosa envolvente do 2º e 3º

molares a qual era macia e tenra à

palpação com sinais de inflamação. Os

dentes em questão apresentavam

mobilidade, além de placa bacteriana e

cálculo salivar. Severo problema

periodontal também estava associado.

Havia alteração de sensibilidade do nervo

alveolar inferior. Foi realizado radiografia

panorâmica, periapical e TC cone beam

da região onde observou-se perdas

ósseas compatíveis com os problemas

periodontais. Realizou-se biópsia da

região onde percebeu-se tratar de

metástase do tumor de mama. O

tratamento com bifosfonato continuou e a

radioterapia da região retromolar direita

foi realizada paliativamente. Houve

melhora do quadro e até o

acompanhamento de 2 anos não houve

sinais de recorrência.

Adebayo et al.8 (2004) analisaram

retrospectivamente os tumores

metastáticos dos maxilares do Hospital

Universitário AhmaduBello – Kaduna do

período de 1979 a 1998. Dos 415

tumores malignos da cavidade oral, seis

(1,4%) eram de origem metastática. A

idade dos pacientes variava de 13 a 60

anos e quatro eram do gênero feminino.

O tipo de tumor mais comum encontrado

foi adenocarcinoma e a predileção de

localização foi a mandíbula. Cinco dos

seis pacientes relatados nesse trabalho

apresentavam algum tipo de

sintomatologia como edema, dor e

mucosa ulcerada. A maior parte dos

pacientes já havia passado por algum

tipo de tratamento odontológico em

função do problema, como extração de

dentes com mobilidade, tentativa de

drenagem e antibioticoterapia. Pôde-se

7

evidenciar que metástase na cavidade

oral é incomum entre os nigerianos,

entretanto, um exame cuidadoso deve

ser realizado sempre que houver

suspeitas clínicas a fim de se estabelecer

um correto diagnóstico e

consequentemente um correto

tratamento.

Sasaki et al.9 (2008) relataram o

caso de uma paciente do sexo feminino,

54 anos, que apresentou parestesia e

edema após extração dentária do lado

direito da mandíbula. A radiografia

panorâmica mostrou área de esclerose

óssea na região onde foi feita a extração.

Uma biópsia da gengiva mostrou tratar-

se de um adenocarcinomamucinoso

metastático, de origem desconhecida. A

paciente foi submetida a uma tomografia

computadorizada com 18F-

fluorodeoxiglicose que demonstrou um

tumor de ovário com múltiplos pélvicos e

paraaorticos linfonodos infartados. Uma

ressonância evidenciou, claramente, a

presença de um câncer no ovário. Foi

realizada a remoção do lado direito da

mandíbula, com dissecção funcional do

pescoço, e remoção do ovário do lado

esquerdo. O exame histopatológico da

peça removida confirmou o diagnóstico

de metástase gengival de

adenocarcinomamucinoso de ovário.

Células neoplásicas se infiltraram no

osso. A paciente foi tratada com o auxilio

de quimioterapia.

Ertas et al.10 (2010) apresentaram

o caso de Uma mulher de 36 anos que

compareceu ao departamento de cirurgia

oral e maxilofacial da Universidade

Ataturk, com queixa de dor na região

posterior da face do lado esquerdo,

trismo, edema, dureza à palpação,

dormência na região anterior da

mandíbula e posterior do lado esquerdo.

O exame intra-oral mostrou edema

endurecido na região posterior do corpo

da mandíbula, além de linfonodos

imóveis e endurecidos. Ao exame

radiográfico panorâmico observou-se

nítida diferença entre o aspecto do

trabeculado ósseo do lado esquerdo e

direito. Sítios de defeitos osteolíticos

difusos foram observados na maxila,

mandíbula e assoalho da órbita na

Tomografia Computadorizada. A paciente

relatava ter removido um tumor de mama

há dois anos e realizado quimioterapia.

Uma biopsia incisional foi realizada sob

anestesia local. O exame histopatológico

evidenciou a presença de lesão

metastática do câncer de mama. A

paciente foi submetida a uma cintilografia

de corpo inteiro, onde se observou

acúmulo do isótopo no lado esquerdo da

mandíbula, assoalho da órbita , maxila,

osso parietal esquerdo, osso ilíaco, e

vértebras torácicas e cervicais. A

paciente foi encaminhada para

tratamento oncológico.

Em um relato de caso realizado

8

por Tiwari et al.11 (2007), uma mulher de

45 anos com queixa de distensão

abdominal, perda de apetite, e

desconforto abdominal à 3 meses

procurou o ginecologista local. Foi feito

uma ultrassonografia e pélvis e abdômen,

onde se constatou a presença de uma

massa que foi totalmente removida

cirurgicamente. A histopatologia mostrou

tratar-se de Adenocarcinoma Cístico

Papilar Mucinoso em ambos os ovários.

Quimioterapia foi indicada, mas não

realizada. Três meses após observou-se

distensão abdominal com problemas

digestivos. Ao exame observou-se

apenas presença de fluidos. Foi feito o

teste CA 125 que indicou uma piora do

quadro. Foi iniciado quimioterapia com

uma ótima resposta. No entanto, cinco

meses após, com dores abdominais, foi

feito uma radiografia lombar, onde se

observou uma metástase na vértebra L2.

Outros exames mostraram

comprometimento do fígado também. A

paciente foi submetida a quimioterapia e

radioterapia paliativa, tendo um benefício

significativo da sintomatologia.

Mason et al.12 (2005) relataram o

caso de um paciente de 73 anos do sexo

masculino, que foi encaminhado para o

Departamento de Otorrinolaringologia do

centro médico da Universidade de

Pitsburgo para avaliação de uma massa

na glândula parótida direita. O aumento

de volume foi percebido pelo paciente

dois meses antes da consulta com seu

médico, aumentou de tamanho durante o

período de tratamento e começou com

sintomatologia dolorosa. O primeiro

tratamento foi antibioticoterapia, a qual

não obteve efeito. O paciente era cego

(devido a retina pigmentosa bilateral),

portador de artrite cervical severa,

fumante e etilista. A saúde geral do

paciente era boa, embora ele parecesse

mais velho do que realmente era. Foi

realizada uma TC, onde se pode

observar um tumor destrutivo do ramo e

cabeça da mandíbula do lado direito. O

tumor invadiu a fossa pterigo-palatina,

músculos pterigoideos e fossa média do

crânio. Não havia linfoadenopatias.

Tomografia de pélvis e abdômen

evidenciou uma massa de 5 cm no colon

sigmoide, metástase nos dois rins e

hiperplasia da próstata. A biopsia

mandibular mostrou se tratar de um

adenocarcinoma do colon

moderadamente diferenciado. Devido ao

estado avançado da doença nenhum

tratamento foi indicado e o paciente

faleceu no asilo.

Teshigawara et al.13 (2006)

publicaram o caso de uma mulher de 76

anos de idade, a qual ingressou no

departamento de estomatologia e cirurgia

maxilofacial do Hospital Universitário de

Gunma, em função de edema do lado

esquerdo da mandíbula e dor. A paciente

relatava perda de sensibilidade do lado

9

afetado há aproximadamente 10 meses e

nesse período a doença mostrou

progressão. Ao exame tomográfico

observou-se uma lesão osteolítica do

lado esquerdo da mandíbula. Foi

realizada uma biópsia incisional com um

exame histopatológico subsequente, que

revelou se tratar de uma neoplasia

maligna aparentemente metastática. Uma

tomografia de corpo inteiro com emissão

de F-18 fluorodeoxyglicose – pósitron,

revelando uma alta captação no lado

esquerdo da mandíbula e no fígado. A

tomografia abdominal mostrou duas

lesões no lóbulo anterior direito do

fígado. A biópsia do fígado mostrou se

tratar de um carcinoma hepatocelular de

moderada diferenciação, idêntico ao da

mandíbula. A tomografia e cintilografia

óssea não evidenciaram outros sítios

tumorais. O caso tinha complicações por

o paciente apresentar cirrose e infecção

pelo vírus da hepatite C. Edema, dor e

sangramento impediam a paciente de se

alimentar. Foi optado pelo tratamento

radical cirúrgico. Após a remoção do

tumor a alimentação e higiene oral do

paciente melhoraram muito. Após 9

meses de tratamento o tumor no fígado

estava controlado e não havia sinais de

novas metástases.

Antunes et al.14 (2008) fizeram

uma análise das metástases

encontradas em 10 pacientes atendidos

no ambulatório de Cirurgia de Cabeça e

Pescoço do Centro de Oncologia do

Hospital Universitário Oswaldo Cruz da

Universidade de Pernambuco durante o

período de janeiro de 1980 a dezembro

de 2000 a fim de se traçar um perfil das

referidas patologias. Dos 190 casos

registrados de tumores de cabeça e

pescoço, 10 eram neoplasias

metastáticas dos maxilares. Foram

observados casos em pacientes de 13 a

75 anos e sem predileção por gênero. O

trabalho mostrou uma igualdade de

prevalência das metástases entre a

maxila e a mandíbula. A localização

primária da neoplasia foi principalmente

próstata e glândula tireoide.

Bertani et al.15 (2009) revisaram a

literatura relativo às metástases dos

maxilares, publicados entre 1987 e 2006

e evidenciaram que as lesões

metastáticas atingem tanto tecidos moles

quanto tecidos duros em pessoas,

principalmente, do sexo masculino com

idade entre 50 e 60 anos. A maior

incidência de metástases se dá na

mandíbula. As origens das metástases,

em grau decrescente de incidência são

mama, pulmão, rim, intestino, tireoide e

próstata. Os sinais e sintomas relatados

com maior frequência foram: dor,

tumefação, parestesia, mobilidade

dentária, ulceração e fratura patológica.

No mesmo artigo, os autores relataram o

caso de um paciente do sexo masculino

de 59 anos submetendo-se a

10

quimioterapia para um carcinoma de

próstata. Cintilografia acusou aumento de

volume do lado direito da mandíbula.

Associado a isso o paciente apresentava

dor e dificuldade de alimentação. Foi

confirmada a lesão metastática que tinha

a próstata como origem.

3 RELATO DE CASO

Paciente sexo feminino, 67 anos,

compareceu a clínica privada na cidade

de Guaíba/RS, no mês de setembro de

2012, para avaliação de lesão dolorosa

na região de corpo mandibular do lado

esquerdo. Havia sido medicada com

antimicrobiano, pois profissionais de

odontologia que a atenderam

previamente suspeitaram se tratar de um

abscesso periapical de origem

endodôntica. Durante a anamnese a

paciente relatou ter sido diagnosticado,

no mês de setembro de 2011, um tumor

uterino (Sarcoma Endometrial

Indiferenciado de Alto Grau). O mesmo

foi removido cirurgicamente e iniciou-se

um tratamento concomitante com

radioterapia. O exame histopatológico

das peças removidas evidenciou que a

lesão fora removida em sua totalidade,

pois apresentava margens livres.

Ao exame intra bucal observou-se

aumento de volume na região

submandibular do lado esquerdo,

endurecido à palpação. Foi feito uma

punção aspirativa da lesão com resultado

negativo. Os quatro dentes

remanescentes na cavidade bucal

apresentavam cárie, com mobilidade e

problemas de origem periodontal.

Solicitou-se uma tomografia

computadorizada Cone Beam de

mandíbula. No exame tomográfico ficou

evidente a existência de uma lesão

hipodensa de limites indefinidos e

aspecto infiltrativo observada em

reconstrução panorâmica (figura 1 – C) e

em cortes parasagitais (figura 1 – B) em

corpo mandibular do lado esquerdo

estendendo-se da região do 33 até 37 e

de rebordo alveolar à cortical basal de

mandíbula, causando rompimento das

corticais ósseas vestibular e lingual com

ausência de expansão óssea, melhor

visualizado nos cortes sagitais e axiais.

Notou-se nos cortes axiais na região

envolvida aumento de volume do tecido

mole (Figura 1 - A). Com a evidência da

lesão decidiu-se realizar uma biópsia

incisional. O exame histopatológico

confirmou a característica neoplásica

maligna indiferenciada de alto grau, onde

se observou a proliferação de células,

mostrando marcado hipercromatismo e

pleomorfismo, com arranjo alveolar em

alguns pontos (Figura 2). A paciente foi

encaminhada ao serviço de oncologia do

hospital Fêmina de Porto Alegre, onde já

se encontrava em tratamento em virtude

dos problemas ginecológicos. Decidiu-se

11

realizar um diagnóstico

imunohistoquímico da peça removida da

região mandibular preparada em bloco de

parafina. O perfil imunohistoquímico foi

compatível com sarcoma do estroma

endometrial de alto grau – metastático. A

partir desse momento a paciente voltou

ao tratamento oncológico, quando

passou por outros exames de imagem

(Cíntilografia Óssea e Tomografia

Computadorizada), onde possíveis outros

focos de metástase foram encontrados

pelo corpo. A paciente veio a falecer em

janeiro de 2013 em decorrência da

doença.

A

B

C Figura 1: Cortes axiais (A), parasagitais

(B) e reconstrução panorâmica da TC

(C).

Figura 2: Imagem da lâmina do exame

histopatológico.

4 DISCUSSÃO

Os autores dos trabalhos

analisados em nossa revisão bibliográfica

são, praticamente, unânimes ao

concordarem que o aparecimento de

lesões metastáticas nos tecidos e ossos

da face são achados extremamente

raros.1- 4,6-10,13-15 Embora a maior parte

dos autores concordem que a incidência

varia de 1% 1-4,7-9,10, 13,14 a 3%2,4,13 ou 8% 10 dos tumores diagnosticados na cabeça,

há quem ache extremamente difícil

quantificar, pois a metástase,

normalmente, é a manifestação de um

quadro bastante avançado e um número

desconhecido de pacientes morrem sem

investigação da existência de metástases

ocultas.4,5

Metástases de tumores de origem

epitelial são muito mais frequentes que

os de tumores de origem

mesenquimal.1,3-5.

12

Embora as metástases tumorais

ocorram com igual frequência em ambos

os sexos, o sítio primário da lesão varia

para homens e mulheres.3

As lesões metastáticas de pulmão e

mama são as mais frequentes.1- 3, 10 Já

outros autores verificam que a tireoide é

o local de origem evidenciado mais

vezes.4,8,14 A frequência relativa das

lesões metastáticas na boca e ossos

gnáticos refletem tendências atuais e

variações geográficas na incidência de

câncer em uma dada população,

observação que não foi contestada em

nenhum outro estudo analisado.5

Autores concordam que o sítio de

maior prevalência das metástases é a

mandíbula,1-10,13,15 podendo ocorrer com

mais frequência em região posterior em

função da maior vascularização em área

de tecido hematopoiético.5-8 Entretanto,

Antunes14, em seu estudo retrospectivo

de análise de 10 casos de metástases,

mostrou que a incidência foi de 50% na

maxila e 50% na mandíbula, indo de

encontro com a maior parte dos achados

bibliográficos.

A dor, o edema facial e gengival,

além da parestesia, são achados comuns

na maioria dos pacientes.1,4-7,12,13 Pode

ser observado também fraqueza,

anorexia, perda de peso,3 linfoadenopatia

cervical,8 úlcera, trismo9 e fratura

patológica.8,9 A paciente do caso relatado

no presente artigo apresentava edema

gengival e facial, parestesia do lábio

inferior esquerdo, dor, perda de apetite e

fraqueza. No caso relatado no artigo de

Gomes et al.3 (2009) o paciente não

apresentava dor, o que não é usual,

porém Daley et al.5 (2011) afirma que

algumas lesões podem ser

assintomáticas.

Embora não seja relatado na

maioria dos estudos, o diagnóstico final é

o exame histopatológico. Através dele

podemos evidenciar o tipo celular e,

muitas vezes, saber o sítio de origem em

função da morfologia das células. Utiliza-

se também a análise imunohistoquímica

a fim de confirmar o diagnóstico de lesão

metastática. No caso da paciente do

presente estudo foi realizada uma biópsia

incisional que confirmou a característica

neoplásica da lesão, mas foi a análise

himunohistoquímica que comprovou se

tratar de uma metástase do tumor de

endométrio previamente diagnosticado.

McClure et al.1 (2013) perceberam,

em seu estudo, que 50% dos pacientes

foram submetidos a remoção cirúrgica do

tumor, mas que o modo mais comum de

tratamento é o paliativo e a radioterapia.

Para Gomes et al.3 (2009) e Bigelow et

al.6 (1953) a excisão cirúrgica é o melhor

tratamento, se as condições gerais do

paciente permitirem. Bigelow et al.6

(1953) diz que, em seus estudos, 6 dos

19 casos analisados receberam apenas

tratamento paliativo, enquanto somente

13

os casos em que o paciente poderia

melhorar sua qualidade de vida foram

operados. Já para Poulias et al.7 (2011) o

tratamento das lesões metastáticas deve

ser paliativo e deve incluir radio e

quimioterapia, além de terapia com

hormônios. Segundo eles, intervenção

cirúrgica raramente deve ser executada.8

afirma que o tratamento de escolha para

lesão metastática de tireóide é a remoção

da glândula e radioterapia.

O tempo médio de vida após o

diagnóstico de lesão metastática varia de

4 meses, segundo estudo de McClure et

al.1 (2013) a 2 anos conforme

Teshigawara et al.13 (2006).

5 CONCLUSÃO

As metástases tumorais nos ossos

gnáticos são ocorrências extremamente

raras, sendo as do estroma endometrial

ainda menos frequentes. Apesar da

raridade as lesões metastáticas podem

ter aspecto clínico e radiográfico muito

semelhantes a várias outras lesões

císticas e tumorais, portanto, devemos

estar atentos às particularidades dos

pacientes a fim de não negligenciarmos a

existência de possíveis tumores, sejam

eles primários ou provenientes de outros

sítios.

14

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