revista de estudos demográficos

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FICHA TCNICA:TtuloRevista de Estudos Demogrficos

EditorInstituto Nacional de Estatstica, I.P. Av. Antnio Jos de Almeida 1000-043 LISBOA Portugal Telefone: 21 842 61 00 Fax: 21 844 04 01

Presidente do Conselho DirectivoAlda de Caetano Carvalho

Design, Composio e ImpressoInstituto Nacional de Estatstica, I.P.

Tiragem350 exemplares ISSN 1645-5657 Depsito legal n: 185856/02 Periodicidade Semestral

Preo15,00 (IVA includo)

DIRECO EDITORIAL:Editor Chefe: Maria Jos Carrilho - Instituto Nacional de Estatstica I.P. Editores Adjuntos: Fernando Casimiro - Instituto Nacional de Estatstica I.P. Maria Filomena Mendes - Universidade de vora Conselho Editorial: Alfredo Bruto da Costa - Universidade Catlica, Lisboa Ana Nunes de Almeida - Instituto de Cincias Sociais (ICS), Lisboa Antnio Barreto - Instituto de Cincias Sociais (ICS), Lisboa Fernando Casimiro - Instituto Nacional de Estatstica I.P. Gilberta Rocha - Universidade dos Aores Joaquim Manuel Nazareth - Centro de Estudos da Populao, Economia e Sociedade (CEPESE), Porto Jorge Arroteia - Universidade de Aveiro Karin Wall - Instituto Superior de Cincias do Trabalho e da Empresa (ISCTE), Lisboa Leston Bandeira - Instituto Superior de Cincias do Trabalho e Emprego (ISCTE), Lisboa Maria Filomena Mendes - Universidade de vora Maria Ioannis Baganha - Universidade de Coimbra Maria Jos Carrilho - Instituto Nacional de Estatstica I.P. Secretria: Liliana Martins - Instituto Nacional de Estatstica I.P.Apoio ao cliente

Os pontos de vista expressos nesta publicao so da responsabilidade dos autores e no reflectem necessariamente a opinio do Instituto Nacional de Estatstica. Por questes de arredondamento, os totais de alguns quadros podem no corresponder soma das parcelas.

O INE, I.P. na Internet

808 201 808

www.ine.pt INE, I.P., Lisboa Portugal, 2010 * A reproduo de quaisquer pginas desta obra autorizada, excepto para fins comerciais, desde que mencionando o INE, I.P., como autor, o ttulo da obra, o ano de edio, e a referncia Lisboa-Portugal.

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Apresentao A queda e o adiamento da fecundidade, o aumento da longevidade, a intensidade e diversidade dos fluxos migratrios, o progressivo envelhecimento demogrfico, os novos modelos familiares, a igualdade de oportunidades entre homens e mulheres, os grupos populacionais mais vulnerveis a situaes de pobreza e discriminao integram, de modo directo ou indirecto, a actual agenda poltica nacional e internacional devido s consequncias e aos desafios que colocam s sociedades. Reeditada em Novembro de 2002, depois de um interregno de quase dez anos, a Revista de Estudos Demogrficos (RED) tem, desde ento, dois nmeros anuais, sendo um nmero temtico, o do primeiro semestre, e outro generalista. O nmero 48 da RED inicia-se com uma anlise das caractersticas do espao urbano, nas suas mltiplas dimenses, e as prticas de ordenamento e planeamento do territrio que podem afectar o bem-estar e a sade das populaes. So avaliadas a oferta dos espaos verdes urbanos, em termos de qualidade, segurana, conforto, a sua utilizao e influncia no bemestar e na sade da populao do municpio da Amadora, destacando as possibilidades do Sistema de Informao Geogrfica (SIG).para medir com preciso a adequao da oferta s necessidades da populao. Segue-se um estudo sobre a mortalidade em Portugal, entre 1950 e 2005, focando duas perspectivas sobre a sua evoluo: a hiptese da concentraorectangularizao e a perspectiva, mais recente, da deslocao da mortalidade. O.efeito das diferentes causas de morte na disperso da mortalidade tambm analisado, com base em tbuas abreviadas de mortalidade com eliminao de causas de morte, facto que permite perceber as consequncias da diminuio de cada uma das causas seleccionadas sobre a disperso etria dos bitos. Aborda, tambm, num exerccio exploratrio de anlise a problemtica do declnio da fecundidade, a nvel regional, na sua relao com as condies de trabalho e as polticas de apoio maternidade, do qual ressalta a necessidade de, por um lado, se reflectir sobre contexto scio-demogrfico e sobre as polticas pblicas e polticas locais. e por outro, de articulao das polticas de apoio famlia e as polticas de trabalho, face importncia das variveis scio-econmicas para a explicao da fecundidade. Apresenta, ainda, um estudo histrico da nupcialidade nas freguesias de Conceio-a-Nova e de Santos-o-Velho, ambas de Lisboa, durante o perodo de 1864 a 1890, no qual se identificaram duas formas diferenciadas de sistemas de acesso ao casamento, uma direccionada para os homens e outra para as mulheres, as quais se prendem com a estrutura etria e sexo das populaes estudadas. Finalmente, divulga a situao demogrfica do pas, com base em informao actualizada, destacando as mudanas mais relevantes e os factores que as determinam, sendo este um artigo sistemtico no segundo semestre de cada ano. Os nossos agradecimentos endeream-se aos autores dos artigos que integram este nmero da revista, estendem-se aos membros do Conselho Editorial e a outros especialistas que connosco colaboraram, dando sugestes que permitiram melhorar os trabalhos divulgados. Maria Jos Carrilho Editora Chefe Novembro 2010

4ndice

Artigo 1O papel dos Espaos Verdes Urbanos no bem-estar e sade das populaes The role of Urban Green Spaces in the Health and Well-being of the population Paula Santana Cludia Costa Rita Santos Adriana Loureiro 5

Artigo 2Mortalidade: Compresso, Deslocamento e Causas de Morte (Portugal 1950-2005) Mortality: compression, shifting and causes of death (Portugal:1950-2005) Isabel Tiago de Oliveira 35

Artigo 3Primeira Reflexo Sobre A Fecundidade, As Condies De Trabalho E As Polticas De Apoio Maternidade Numa Perspectiva Regional First approach to fertility, the work conditions and policies to support childbearing at a regional level Maria Lus Rocha Pinto Maria Cristina Sousa Gomes 63

Artigo 4Casar na Lisboa do sc. XIX Duas freguesias em anlise To get married in the nineteenth century Lisbon two parish in analysis 77

Maria Helena Santos Maria Isabel Baptista Snia Cardoso Susana Clemente

Artigo 5A Situao Demogrfica Recente em Portugal The Demographic Changes in Portugal Maria Jos Carrilho Lurdes Patrcio 101

Lista dos artigos divulgadosRevistas de Estudos Demogrficos dos nmeros 32 a 47 Demographic Studies Review from no. 32 to 47 147

Revista de Estudos Demogrficos, n 48

Artig tigo Ar tigo 1_ pgina 5O papel dos Espaos Verdes Urbanos no bem-estar e sade das populaes

Autoras: Paula Santana Centro de Estudos em Geografia e Ordenamento do Territrio da Universidade de Coimbra [email protected] Cludia Costa Departamento de Geografia da Universidade de Coimbra [email protected] Rita Santos Departamento de Geografia da Universidade de Coimbra [email protected] Adriana Loureiro Departamento de Geografia da Universidade de Coimbra [email protected] Resumo: A tarefa de identificar com preciso as caractersticas ambientais que podem influenciar a sade (ou a doena) das populaes e a forma como podem ser medidas e monitorizadas, tornou-se um dos grandes desafios nos fora polticos e acadmicos. A declarao de Alma-Ata, h pouco mais de 30 anos, chamava a ateno para o papel das vrias instituies e sectores de actividade na preveno da doena e promoo da sade, principalmente nos pases de maior vulnerabilidade econmica e social. Reclamava-se a necessidade de expandir a avaliao, o planeamento e as aces de sade pblica para alm do campo restrito do sector da sade. De facto, as caractersticas do espao urbano, nas suas mltiplas dimenses, e as prticas de ordenamento e planeamento do territrio podem afectar positiva ou negativamente o bem-estar e a sade das populaes, sendo to ou mais importantes do que as caractersticas dos indivduos para a compreenso das questes de sade.

The role of Urban Green Spaces in the Health and Well-being of the population

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A oferta de Espaos Verdes Urbanos (EVU) seguros, limpos e confortveis tem impactes na sade, medidos de forma directa, atravs do estado de sade autoavaliado e longevidade e, de forma indirecta, atravs da melhoria da qualidade ambiental. Por exemplo, a proximidade dos EVU s reas residenciais contribui para a melhoria da qualidade do ar, atenua o efeito da poluio e a ilha de calor urbano e proporciona aos residentes um ambiente fsico que incentiva a prtica de actividade fsica, incluindo a marcha. Ainda, a existncia de EVU prximos da residncia e a sua utilizao melhoram a capacidade de concentrao e disciplina das crianas (principalmente do sexo feminino) nas actividades do dia-a-dia, proporcionam o alvio do stress urbano e da fadiga, com consequncias na diminuio da agressividade e da violncia, e influenciam a capacidade de relacionamento com os vizinhos e os sentimentos de pertena a um lugar (bairro, cidade). O propsito deste artigo avaliar a oferta (nos aspectos da qualidade, segurana, conforto, etc.) e a utilizao dos EVU e a sua potencial influncia no bem-estar e na sade individual e comunitria, contribuindo para: i) o avano do conhecimento da associao entre a oferta e a utilizao de EVU e o impacte na sade urbana; ii) o desenvolvimento de novas metodologias de anlise e avaliao dos EVU. So colocadas em destaque as potencialidades do Sistema de Informao Geogrfica (SIG). Esta ferramenta permitiu avaliar com preciso a adequao da oferta s necessidades da populao potencialmente utilizadora, tendo em conta a escala do bairro, freguesia e municpio. Sendo a sade um tema estratgico para o desenvolvimento municipal, regional e nacional, importa desenvolver metodologias que permitam aos decisores polticos e sociedade civil ter acesso a informao adequada s vrias escalas de interveno. Palavras Chave: Planeamento Saudvel, SIG, Espaos Verdes Urbanos, Resultados em Sade, Bem-estar. Abstract The precise identification of the environmental characteristics that can influence health (or sickness) of the populations and the ways of measuring and monitoring them has become one of the great challenges in the political and academic fields. The Alma-Ata Declaration, from about 30 years ago, stressed the role of the various institutions and activity sectors in the prevention of sickness and in the promotion of health, especially in the countries with the higher economic and social vulnerability. The point was the need for expansion of the evaluation, planning and public health acting, beyond the strict health sector. In fact, the features of urban space in its multiple dimensions and the territory planning practices may positively or negatively affect the well-being and the health of the populations, thus being as much or even more important than the characteristics of the individuals in the understanding of health matters. The offer of safe, clean and comfortable Urban Green Spaces (UGS) has impacts on health, directly through its association with the self assessed health status and the longevity and, indirectly, through the improvement of environmental quality. For example, the proximity of UGS to residential areas contributes for improvement in the quality of the air, it reduces the effect of pollution and the urban heat island effect and it also gives residents a physical environment that leads to more physical activity, including walking. Furthermore, the existence of UGS near residences and its use by people improves the concentration and discipline of children (especially girls) in their everyday activities, cutting down urban stress and fatigue, with consequences on the reduction of aggressiveness and violence, thus influencing the ability to get along with your neighbours and the feeling of belonging to a place (neighbourhood, city). The aim of this article is to evaluate the offer (in terms of quality, security, comfort, etc.) and the use of urban green spaces and its potential influence on the well-being and on the individual and community health, contributing for i) the advance in the knowledge about the association between the offer and the use of green spaces and its impact on urban health; ii) the development of new methodologies of analysis and assessment of the green spaces. The focus is also made on the potentialities of the Geographical Information Systems (GIS). This tool has allowed the precise and adequate assessment of the offer in terms of the needs of the potentially user community, taking into account the neighbourhood, parish and municipality. Health being a strategic issue for the municipal, regional and national development, it is relevant to develop methodologies that allow decision-makers and civil society to have access to the adequate information for the different scales of intervention. Key words: Healthy Urban Planning, GIS, Walkable Urban Green Spaces, Health Results, Well-being.

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1. Introduo No incio do sculo XXI, algumas das maiores questes polticas e acadmicas dizem respeito ao ambiente, sustentabilidade, qualidade de vida urbana, ao bem-estar e sade das populaes. Estas preocupaes so tambm o resultado da progressiva urbanizao do espao (em 2008, 50% da populao mundial vivia em cidades) e da aparente contradio entre o papel historicamente desempenhado pelas cidades, enquanto criadoras de riqueza e geradoras de bem-estar, e a actual realidade urbana de pobreza, insegurana e anomia. Nesse sentido, o ordenamento do territrio e o planeamento do espao urbano no deve deixar de associar os aspectos fsicos (infra-estruturas, edificaes, equipamentos, espaos verdes, entre outras) s dimenses imateriais da cidade (percepo da segurana, sentido de pertena, confiana, etc.); pensadas em conjunto, contribuiro para melhorar a qualidade de vida, bem-estar e sade das populaes (Barton & Tsourou, 2000; Kemm, 2006; Frank, et al., 2006, Schipperijn, et al., 2010). De facto, as caractersticas do espao urbano, nas suas mltiplas dimenses, e as prticas de ordenamento e planeamento do territrio, podem afectar positiva ou negativamente o bem-estar e a sade das populaes, sendo to ou mais importantes do que as caractersticas dos indivduos no entendimento das questes de sade e estilos de vida (Jones & Duncan, 1995; Ducan et al., 1999; Barton & Tsourou; 2000; Santana, 2005; Santana, et al., 2007c). Este aspecto deve orientar urbanistas e polticos, tornando-os conscientes das implicaes das suas propostas e decises sobre a qualidade de vida, bem-estar e sade da populao (Weinstein, 1980; Wates & Knevitt, 1987; Ashton, 1992; Tzoulas et al., 2007; Schilling & Logan, 2008). Este objectivo poder ser alcanado se as aces/programas/polticas tiverem uma perspectiva de actuao tendo em conta o ciclo de vida do indivduo (WHO, 1999; 2002:17). Para tal, particularmente importante garantir o acesso a bens e servios de qualidade, a espaos pblicos adequados e com baixos nveis de rudo e poluio, incluindo espaos verdes urbanos (EVU), e proporcionar uma rede de transportes pblicos confortveis, seguros e eficientes. A oferta de EVU seguros, limpos e confortveis, proporcionam aos indivduos um ambiente fsico que incentiva a prtica de actividade fsica, incluindo a marcha (Pikora et al., 2003; Humpel et al., 2004). A utilizao desses espaos potencia a capacidade de concentrao e disciplina das crianas nas actividades do dia-a-dia, principalmente na populao feminina (Taylor et al., 2001), aliviam o stress urbano (Ulrich, 1984; Nielsen & Hansen, 2007) e a fadiga, com consequncias na diminuio da agressividade e da violncia (Kuo & Sullivan, 2001; Doyle et al., 2006), e influenciam at a capacidade de relacionamento com os vizinhos e os sentimentos de pertena a um lugar (bairro, cidade) (Kim & Kaplan, 2004). A relao entre espaos verdes urbanos e a sade pblica constitui-se como uma rea de investigao relativamente recente e justificada pela associao forte que tem vindo a ser identificada e estabelecida de forma directa, entre a oferta de EVU e o bem-estar, a qualidade de vida e a sade das populaes (Macintyre et al., 1993; Diez-Roux et al., 1999; Dunn & Hayes, 2000; Ross, 2000; Nogueira, 2006; Santana et al., 2007c), ou indirecta, atravs da melhoria da qualidade ambiental qualidade do ar e atenuando o efeito da poluio e a ilha de calor urbano (Whitford et al., 2001; Alcoforado & Andrade, 2007; Vasconcelos & Vieira, 2007). Outros autores avaliam, ainda, os impactes dos EVU na sade das populaes, tendo em conta o estado de sade auto-avaliado e a longevidade, aps o controle das caractersticas demogrficas e socioeconmicas dos indivduos (Tanaka et al., 1996; Takano et al., 2002; De Vries et al., 2003; Maas et al., 2006; Santana et al., 2007a; Santana et al., 2008). Desde os anos 70 que se sabe que os servios de sade so insuficientes, por si ss, para obter ganhos em sade. A declarao de Alma-Ata, h pouco mais de 30 anos, chamava a ateno para o papel das vrias instituies e sectores de actividade na preveno da doena e promoo da sade, principalmente nos pases de maior vulnerabilidade econmica e social. De facto, tem-se vindo a verificar ser necessrio expandir a avaliao, o planeamento e as aces de sade pblica para alm do campo restrito do sector da sade. Nesse sentido, a tarefa de identificar com preciso as caractersticas ambientais que podem influenciar a vida humana e a forma como podem ser medidas e monitorizadas, tornou-se um dos grandes desafios nos fora polticos e acadmicos. Para isso tem contribudo a utilizao dos Sistemas de Informao Geogrfica (SIG). Dada a sua capacidade de cruzamento de informao de diversas fontes, que tm em comum a localizao geogrfica, e a considerao de diferentes escalas (Medronho, 1995; Santana, 2005), possvel desenvolver anlises espaciais e temporais fundamentais quer na avaliao quer na explicao de padres e tendncias de procura/utilizao, revelando-se uma ferramenta importante para o Planeamento Urbano Saudvel, nomeadamente na identificao de indicadores de contexto (Rocha et al., 2000; Ribeiro, 2001).

O papel dos Espaos Verdes Urbanos no bem-estar e sade das populaes

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O propsito deste texto avaliar a oferta (nos aspectos da acessibilidade, segurana, conforto, etc.) e a utilizao dos espaos verdes e a sua potencial influncia no bem-estar e na sade individual e comunitria, contribuindo para: i) o avano do conhecimento da associao entre a oferta e a utilizao de espaos verdes e o impacte na sade urbana; ii) desenvolver novas metodologias de anlise e avaliao dos espaos verdes. 1.1 Caso de Estudo Foi seleccionado o municpio da Amadora por, num estudo anterior efectuado na rea Metropolitana de Lisboa (AML) relativo heterogeneidade espacial de um conjunto de determinantes espaciais de bem-estar (baixa escolaridade, emprego no qualificado e desemprego masculino), ter apresentado os valores dos padres de privao material mais baixos e mais altos de toda a rea estudada (Santana et al., 2008). 1.2 Dados e Mtodos Em termos metodolgicos, para dar resposta aos objectivos traados, recorreu-se a cinco etapas principais: 1. avaliao da oferta local de espaos verdes urbanos; 2. avaliao da qualidade dos espaos verdes atravs de indicadores de percepo dos utilizadores; 3. anlise da relao entre a qualidade dos espaos verdes e a motivao de utilizao; 4. Oferta/ Utilizao dos EVU e 5. avaliao dos impactes dos EVU na sade urbana. A informao utilizada inclui: 1. relatrios divulgados pela Cmara Municipal de Amadora localizao de equipamentos, cartografia, ortofotomapas, relatrios, etc. e dados do Instituto Nacional de Estatstica (INE) demogrficos, econmicos, e outros1. 2. dois questionrios realizados em 2007 dirigidos: i) aos residentes no Municpio (N=1174), que permitiu recolher informao relativa a estilos de vida, percepo do lugar e resultados em sade; ii) aos utilizadores (N=205) dos trs maiores parques da Amadora (Parque Central, Parque Aventura e Parque Delfim Guimares), constitudo por quatro conjuntos de questes: a. Aspectos demogrficos e socioeconmicos; b. Frequncia e razo de utilizao de EVU; c. Avaliao da qualidade ambiental dos EVU e d. Estado de sade autoavaliado. Para estudar as caractersticas dos espaos verdes da Amadora, escolheram-se cinco parques/jardins, dos 21 inicialmente identificados, tendo em conta a dimenso e a utilizao. Nos EVU seleccionados foi aplicado um questionrio que considerou nove grupos de variveis: (1) limpeza; (2) proteco; (3) conservao; (4) vegetao; (5) acessibilidade ao espao verde; (6) qualidade das infra-estruturas de recreio; (7) qualidade do espao verde; (8) existncia e qualidade da sinaltica; (9) percepo da segurana. Para a obteno de valores finais, foi utilizada uma ponderao de vrios indicadores em cada uma das variveis, que varia entre 1 e 5. A grelha de levantamento foi adaptada de Foster e outros (2007). A influncia das caractersticas dos parques no modo de utilizao foi estudada atravs do coeficiente de correlao de Spearman, calculado entre a classificao das caractersticas dos parques e a principal motivao do entrevistado para o frequentar (Foster et al., 2007). As relaes descritas so as que revelaram significncia estatstica no teste qui-quadrado de Pearson. Foram construdos cenrios (modelo lgico/causal) que indicam, prospectivamente, as alteraes nas iniquidades em sade evidenciadas na Amadora, pela implementao de aces na componente relativas aos espaos verdes e avaliados os impactes em sade (estado de sade autoavaliado) (Santana et al., 2008). A utilizao dos Sistemas de Informao Geogrfica (SIG) permitiu avaliar: 1. dimenso dos EVU; 2. distncia entre a populao potencialmente utilizadora e os EVU. Foi, ainda, possvel identificar e avaliar as reas (bairros) e as1 A informao estatstica foi desagregada ao nvel da subseco estatstica, por ser a mais prxima da definio de Bairro 2 Esta anlise foi realizada atravs das classes de grupos etrios (0-14 anos, 15-64 anos e mais de 64 anos) e de ncleos familiares (ncleos familiares com filhos de idade inferior a 6 anos). 3 Foram tidas em conta variveis que indicam a precariedade da habitao alojamentos familiares no clssicos e alojamentos familiares de residncia habitual sem retrete. 4 O Coeficiente de Localizao varia entre 0,4 e 2, podendo, em situaes de habitao dispersa em meio rural, ser reduzido para 0,35 e em zonas de elevado valor de mercado imobilirio ser elevado. Os coeficientes a aplicar em cada zona homognea do municpio podem variar conforme se trate de edifcios destinados a habitao, comrcio, indstria ou servios. Na fixao do coeficiente de localizao tem-se em considerao, nomeadamente, as seguintes caractersticas: acessibilidade considerando-se a qualidade e variedade das vias rodovirias, ferrovirias, fluviais e martimas; proximidade de equipamentos sociais, designadamente escolas, servios pblicos comrcio; servios de transportes pblicos; localizao em zonas de elevado valor de mercado imobilirio. O zonamento consiste na determinao das zonas homogneas a que se aplicam localizao o coeficiente de localizao do municpio e as percentagens a que se refere o n. 2 do artigo 45. (Declarao de Rectificao n 4/2004 de 9 de Janeiro ao Decreto-Lei n. 287/2003).

Revista de Estudos Demogrficos, n 48

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populaes (grupos de idade) segundo nveis de acessibilidade aos EVU e adequao aos padres mnimos definidos pela Direco-Geral de Ordenamento do Territrio e Desenvolvimento Urbano (DGOTDU) (Magalhes, 1992). Para apurar a distncia a p entre o centride de cada Bairro e o EVU mais prximo, recorreu-se extenso Network Analyst, da plataforma informtica ArcGIS 9.2 (ESRI), nomeadamente funo Closest Facility. As reas de acessibilidade dos EVU foram construdas com recurso funo Service Area, da mesma extenso, que permitiu identificar nveis de acessibilidade (percurso a p velocidade mdia de 3Km/h) em rede viria, tendo em conta intervalos de anlise: 0-3 minutos, 3-5 minutos, 5-10 minutos e 10-15 minutos. Posteriormente, procedeu-se caracterizao destas reas de acessibilidade, tendo por base informao da subseco estatstica relativa populao2 e alojamentos3 - proveniente dos dados Censitrios de 2001 -, privao sociomaterial (baixa escolaridade, emprego no qualificado e desemprego masculino) e o Coeficiente de Localizao4 proveniente do imposto municipal sobre imveis (Santana et al., 2007c). Na anlise destas dimenses conseguiu-se chegar a uma aproximao da caracterizao das reas de acessibilidade atravs da ponderao da densidade nessas reas (figura 1).art1_fg1

Figura 1

Fluxograma de identificao e caracterizao das reas de acessibilidade aos Espaos Verdes Urbanos

Fonte: Elaborao da autora

O papel dos Espaos Verdes Urbanos no bem-estar e sade das populaes

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Ofer erta erdes 2. A Ofer ta de Espaos Ver des Urbanos A Amadora tem uma estrutura verde de pequena dimenso - no total o municpio possui 67ha de parques verdes e 318,7ha de espao agrcola e florestal passvel de uso pblico. Segundo Tzoulas e outros (2007), o valor global desejvel para a estrutura verde urbana de 40m2/habitante, ratio necessrio ao equilbrio do ecossistema urbano e sade da populao (Bernatzy, 1996). Segundo informao da Cmara Municipal da Amadora, este ndice de 2,3 m2/habitante (2007), o que coloca a Amadora em situao de grande dfice neste tipo de infra-estrutura, sugerindo que os EVU podem ter um impacte reduzido na qualidade de vida e sade da populao (quadro 1). Por outro lado, esta estrutura est concentrada nas freguesias da Mina e Falagueira e no existe no Municpio um parque de grandes dimenses (com rea superior a 5ha) (figura 2). Todavia, este aspecto deve ser avaliado de acordo com a dimenso do territrio da Amadora e a proximidade a outras estruturas desta tipologia (o parque de Monsanto, em Lisboa, por exemplo). Ao nvel da acessibilidade geogrfica aos Espaos Verdes Urbanos da Amadora verificou-se que grande parte dos residentes tem acesso a uma infra-estrutura verde principal, de grandes dimenses, a uma distncia que raramente ultrapassa os 3.000 m (figura 3).art1_qd1

Quadro 1

Padres mnimos definidos pela DGOTDU e a situao existente, segundo as tipologias de espaos verdes urbanos na AmadoraEstrutura Verde Secundria (3ha) at 800m

Recomendado (Direco-Geral do Ordenamento do Territrio e Desenvolvimento Urbano)

10 m2/hab

20 m2/hab

(%) pop. Populao residente na rea de influncia de um parque verde m2/hab. Deficit m2/hab. Populao total no Municpio m /hab. Deficit m2/hab.2

12,2 13,9 1,5 8,5

65,2 2,3 7,7 1,5 8,5

40,9 1,7 18,3 0,7 19,3

Fonte: Elaborado com base em INE, Censos 2001; Cmara Municipal da Amadora, 2003 e Magalhes, 1992

Revista de Estudos Demogrficos, n 48

11art1_fg2

Figura 2

reas de influncia dos principais espaos urbanos do municpio da Amadora

ODIVELAS

SINTRA

Elaborado com base em Instituto Nacional de Estatstica, Censos 2001; Cmara Municipal da Amadora,

LISBOA

OEIRAS

Legenda:Parque Largo da Parreirinha Jardim Ant nio Macedo Parque Central de So Brs Parque Lus Vaz de Cames Jardim da Mina Jardim do Platano Parque Aventura Parque Central Parque Delfim Guimares Jardim "Amadora Este" Parque da Ilha Mgica do Lido Parque T erra da Bonita Parque Goa Parque Urbano Dr. Armando Romo Parque da Fantasia Jardim 25 de Abril Parque Urbano da Buraca Jardim dos Aromas Parque do Zambujal Parque Pinheiro Borges Parque da Ribeira rea de Influncia de 100 metros rea de Influncia de 400 metros rea de Influncia de 800 metros Limite Administrativo - Concelho Edificado Rede Viria 0 1 Km

Fonte: Elaborado com base em Cmara Municipal da Amadora, 2003

O papel dos Espaos Verdes Urbanos no bem-estar e sade das populaes

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Comparando as recomendaes da DGOTDU (Magalhes, 1992) com o espao verde existente no Municpio, verificam-se elevadas discrepncias. Refira-se que mais de metade da populao da Amadora (65,2%) reside a menos de 400m de um espao verde urbano mas quase nenhum dos requisitos da DGOTDU cumprido. Todavia, no que respeita estrutura verde secundria de proximidade habitao (inferior a 100 metros) verificase uma cobertura de 12% da populao e a rea de EVU por habitante de 13,9m2, valores superiores ao estabelecido pela DGOTDU (quadro 1). Ainda utilizando a populao residente, avaliou-se a cobertura de espao verde segundo os padres mnimos estabelecidos pela DGOTDU concluindo-se que, para satisfazer os requisitos mnimos de metros quadrados por habitante, seria necessrio aumentar a oferta de EVU, de 0,5 para 7,4% do espao concelhio. Verifica-se que, em 2007, a populao apenas dispunha de 15% do espao verde que seria desejvel. Todavia, importa considerar, para alm do quantitativo de rea verde urbana, outros indicadores, nomeadamente a acessibilidade geogrfica e as caractersticas do ambiente fsico e social desses espaos. De facto, verificouse que 47,6% da populao reside a menos de 15 minutos de um espao verde (figura 4).

Revista de Estudos Demogrficos, n 48

13art1_fg3

Figura 3

Acessibilidade aos espaos verdes do municpio da Amadora

ODIVELAS

SINTRA

LISBOA

OEIRAS

0

1 Km

Legenda:Distncia a p (3Km/h) do centroide da subseco ao espao Verde mais prximo(em minutos)rede viria sem conexo 0-7 8 - 12 13 - 19 20 - 34 35 - 76 Espaos Verdes Limite Administrativo - Freguesia Limite Administrativo - Concelho

Fonte: Elaborado com base em Cmara Municipal da Amadora, 2003

O papel dos Espaos Verdes Urbanos no bem-estar e sade das populaes

14art1_fg4

Figura 4

Distncia a p (em minutos) das reas de residncia ao espao verde mais prximo

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Legenda: Acessibilidade a p(3Km/h) aos Espaos Verdes (em minutos)0-3 3-5 5 - 10 10 - 15Fonte: Elaborado com base em Cmara Municipal da Amadora, 2003!

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Espao Verde Rede Viria Limite Administrativo - Freguesia

0

1 Km

Revista de Estudos Demogrficos, n 48

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Desagregando a informao segundo grupos etrios, com base nos Censos 2001, verificamos que a populao com mais de 64 anos constitui o grupo com melhor acessibilidade: 52,6% reside a menos de 15 minutos. Cerca de 43% da populao com idades entre os 0 e os 14 anos reside a menos de 15 minutos. Quanto aos EVU com recreio infantil, programados para responder s necessidades de famlias com crianas entre os 0 e os 5 anos, verificou-se que 73,6% dos ncleos familiares com crianas nesta faixa etria residiam na rea de influncia de parques verdes com recreio infantil, ou seja a menos de 100 metros de um equipamento dessa natureza. Quanto tipologia de alojamentos, e especificando os alojamentos de maior vulnerabilidade, as reas de influncia dos EVU cobrem cerca de um quarto dos alojamentos familiares no clssicos e um valor percentual ainda mais elevado de alojamentos familiares de residncia habitual sem retrete (42,4%) (quadro 2 e figura 4).art1_qd2

Quadro 2

Caracterizao das reas de acessibilidade aos espaos verdes da AmadoraPopulao Grupo Etrio Espaos verdes analisados: 21 Pop. Residente Alojamentos Alojamento Familiar de residncia habitual sem retrete

0-14

15-64

+64

no clssicos

Deslocao a p (3Km/h) 0-3min (%) 3-5min (%) 5-10min (%) 10-15min (%)