ficha informativa- padre antónio vieira e oratória

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FICHA INFORMATIVA UNIDADE: SERMÃO de Santo António aos Peixes PORTUGUÊS – 11.º ANO CONCEITOS IMPORTANTES E A RETER DISCURSO: exposição metódica sobre um assunto ORATÓRIA: visa a eloquência, a arte de falar bem e de deleitar com as palavras, técnicas discursivas RETÓRICA: arte de convencer o interlocutor através da oratória (não há comprometimento na busca da verdade nem na sua demonstrável probabilidade DISCURSO LÓGICO: axioma resultante é tido como verdadeiro DISCURSO DIALÉTICO: obter a máxima probabilidade de certeza e veracidade (tese e antítese síntese) PREGAÇÃO: divulgação da palavra de Deus, do Evangelho e de Cristo; o objetivo do pregador é mudar algo..., divulgar uma determinada ideia conducente a uma mudança em função de um ideal de vida... PREGAR É SEMEAR SERMÃO: discurso religioso feito num púlpito PARÁBOLA BÍBLICA: narração alegórica que encerra algum preceito de moral ou verdade importante (mandamento religioso, ensinamento, dever ou regra) PREGAR É SEMEAR O padre António Vieira chegou a São Luís do Maranhão, para reiniciar a missão, em janeiro de 1653. A sua equipa era composta por doze missionários, oito padres e quatro irmãos. Um dos seus sonhos era o de restaurar a missão da serra de Ibiapaba, para onde conseguiu enviar os primeiros padres em 1656 e onde ele foi pessoalmente em 1660. A missão de São Francisco Xavier de Ibiapaba foi uma das suas mais queridas missões, a mais estratégica de todas no seu plano de unificação do território da colónia, num dos espaços mais complicados de todo o norte do Brasil. A história da missão foi escrita por ele mesmo após a visita: Relação da Missão da Serra de Ibiapaba. Quando subia a serra, o padre António Vieira ficou deslumbrado com a beleza natural que dela se avistava: por cima das nuvens que o faziam imaginar o céu, avistava a costa de Camocim e de Jericoacoara (o buraco das tartarugas). Ele não podia imaginar que a história do futuro daquela missão seria ainda mais trágica do que a do passado, com guerras e chacinas que transformariam a região num caos de ódio e de sangue. VIEIRA PREGADOR MARIA LUCÍLIA GONÇALVES PIRES * Recordando a vasta obra de Vieira e a forma como foi recebida e apreciada ao longo destes três séculos, facilmente se verifica que os Sermões são o título principal da sua glória literária. Os seus textos oratórios (cerca de 200 sermões) chegaram até nós, não na forma em que foram pronunciados, mas, quase todos, na forma que o seu autor lhes quis dar ao preparálos para a impressão, tarefa a que dedicou os últimos vinte anos da sua longa vida. O primeiro dos volumes que assim prepara, recuperando o que da sua pregação restava no que chama os seus "borrões" (textos completos, fragmentos de sermões, planos, esboços, etc.) é publicado em 1679. Nos anos seguintes, primeiro em Lisboa, depois (a partir de 1681) na Baía, prossegue este trabalho, publicando sucessivamente mais onze volumes. O último (o 12.º) é enviado para Lisboa para ser impresso já depois da morte do seu autor. O que é que faz deste conjunto de sermões uma obraprima literária e do seu autor o mais afamado pregador português, gozando em vida de grande prestígio não só em Portugal, mas também em Espanha e Itália? Em primeiro lugar, destaquese a profunda ligação entre o texto da maior parte dos sermões e as circunstâncias concretas, históricas, em que são pregados. O sermão é para Vieira não apenas uma forma de edificação moral e espiritual, mas também um instrumento de intervenção na vida política e social, uma arma que maneja com destreza em defesa das grandes causas a que se dedicou. Através dos sermões de Vieira podemos acompanhar o desenrolar dos principais acontecimentos e problemas da sociedade portuguesa (e brasileira) do século XVII: a guerra com a Holanda em terras do Brasil, em textos como o do "Sermão de Santo António, havendo os holandeses levantado o sítio posto à Baía" (1638) ou o "Sermão pelo bom sucesso das nossas armas contra as da Holanda" (1640); a Restauração e a subsequente guerra com a Espanha, no "Sermão dos Bons Anos" ou no "Sermão de Santo António tendose reunido cortes", pregados em 1642; a preocupação com a situação económica do país em guerra com a Espanha e as propostas para sanar essa situação no "Sermão de S. Roque" (1644); a dura e prolongada luta em defesa dos índios do Maranhão contra os colonos que pretendiam escravizálos no chamado "Sermão das tentações" (1653) ou no "Sermão da Epifania" (1662). Para fazer da sua palavra um meio eficaz de intervenção e atuação, Vieira recorre naturalmente às técnicas que a Retórica (disciplina fundamental no curriculum escolar e na formação intelectual dos homens da época) sistematizara e codificara. De um dos seus sermões (o "Sermão da Sexagésima", o mais conhecido, aquele que o autor escolheu para abrir o

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 FICHA  INFORMATIVA  

 UNIDADE:  SERMÃO  de  Santo  António  aos  Peixes  

PORTUGUÊS  –  11.º  ANO      

CONCEITOS  IMPORTANTES  E  A  RETER  DISCURSO:  exposição  metódica  sobre  um  assunto  ORATÓRIA:  visa  a  eloquência,  a  arte  de  falar  bem  e  de  deleitar  com  as  palavras,  técnicas  discursivas  RETÓRICA:  arte  de  convencer  o  interlocutor  através  da  oratória  (não  há  comprometimento  na  busca  da  verdade  nem  na  sua  demonstrável  probabilidade  DISCURSO  LÓGICO:  axioma  resultante  é  tido  como  verdadeiro  DISCURSO  DIALÉTICO:  obter  a  máxima  probabilidade  de  certeza  e  veracidade  (tese  e  antítese  -­‐  síntese)  PREGAÇÃO:  divulgação  da  palavra  de  Deus,  do  Evangelho  e  de  Cristo;  o  objetivo  do  pregador  é  mudar  algo...,  divulgar  uma  determinada  ideia  conducente  a  uma  mudança  em  função  de  um  ideal  de  vida...  PREGAR  É  SEMEAR  SERMÃO:  discurso  religioso  feito  num  púlpito  PARÁBOLA  BÍBLICA:  narração  alegórica  que  encerra  algum  preceito  de  moral  ou  verdade  importante  (mandamento  religioso,  ensinamento,  dever  ou  regra)  PREGAR  É  SEMEAR    

 O  padre  António  Vieira  chegou  a  São  Luís  do  Maranhão,  para  reiniciar  a  missão,  em  janeiro  de  1653.  A  sua  equipa  era  

composta   por   doze  missionários,   oito   padres   e   quatro   irmãos.  Um  dos   seus   sonhos   era   o   de   restaurar   a  missão   da   serra   de  Ibiapaba,   para   onde   conseguiu   enviar   os   primeiros   padres   em   1656   e   onde   ele   foi   pessoalmente   em   1660.   A  missão   de   São  Francisco  Xavier  de  Ibiapaba  foi  uma  das  suas  mais  queridas  missões,  a  mais  estratégica  de  todas  no  seu  plano  de  unificação  do  território   da   colónia,   num   dos   espaços  mais   complicados   de   todo   o   norte   do   Brasil.   A   história   da  missão   foi   escrita   por   ele  mesmo  após  a  visita:  Relação  da  Missão  da  Serra  de  Ibiapaba.  

Quando  subia  a  serra,  o  padre  António  Vieira  ficou  deslumbrado  com  a  beleza  natural  que  dela  se  avistava:  por  cima  das  nuvens  que  o   faziam   imaginar  o  céu,  avistava  a  costa  de  Camocim  e  de  Jericoacoara   (o  buraco  das  tartarugas).  Ele  não  podia  imaginar  que  a  história  do   futuro  daquela  missão   seria   ainda  mais   trágica  do  que  a  do  passado,   com  guerras   e   chacinas  que  transformariam  a  região  num  caos  de  ódio  e  de  sangue.  

VIEIRA  PREGADOR    

MARIA  LUCÍLIA  GONÇALVES  PIRES  *  Recordando  a  vasta  obra  de  Vieira  e  a  forma  como  foi  recebida  e  apreciada  ao  longo  destes  três  séculos,  facilmente  se  

verifica  que  os  Sermões  são  o  título  principal  da  sua  glória  literária.  Os  seus  textos  oratórios  (cerca  de  200  sermões)  chegaram  até  nós,  não  na  forma  em  que  foram  pronunciados,  mas,  quase  todos,  na  forma  que  o  seu  autor   lhes  quis  dar  ao  prepará-­‐los  para  a   impressão,   tarefa   a  que  dedicou  os  últimos   vinte  anos  da   sua   longa   vida.  O  primeiro  dos   volumes  que  assim  prepara,  recuperando  o  que  da  sua  pregação  restava  no  que  chama  os  seus  "borrões"  (textos  completos,  fragmentos  de  sermões,  planos,  esboços,  etc.)  é  publicado  em  1679.  Nos  anos  seguintes,  primeiro  em  Lisboa,  depois  (a  partir  de  1681)  na  Baía,  prossegue  este  trabalho,  publicando  sucessivamente  mais  onze  volumes.  O  último  (o  12.º)  é  enviado  para  Lisboa  para  ser  impresso  já  depois  da  morte  do  seu  autor.  

O   que   é   que   faz   deste   conjunto   de   sermões   uma   obra-­‐prima   literária   e   do   seu   autor   o   mais   afamado   pregador  português,  gozando  em  vida  de  grande  prestígio  não  só  em  Portugal,  mas  também  em  Espanha  e  Itália?  

Em   primeiro   lugar,   destaque-­‐se   a   profunda   ligação   entre   o   texto   da   maior   parte   dos   sermões   e   as   circunstâncias  concretas,  históricas,  em  que  são  pregados.  O  sermão  é  para  Vieira  não  apenas  uma  forma  de  edificação  moral  e  espiritual,  mas  também  um  instrumento  de  intervenção  na  vida  política  e  social,  uma  arma  que  maneja  com  destreza  em  defesa  das  grandes  causas   a  que   se  dedicou.  Através  dos   sermões  de  Vieira  podemos  acompanhar  o  desenrolar  dos  principais   acontecimentos  e  problemas  da  sociedade  portuguesa  (e  brasileira)  do  século  XVII:  a  guerra  com  a  Holanda  em  terras  do  Brasil,  em  textos  como  o  do  "Sermão  de  Santo  António,  havendo  os  holandeses  levantado  o  sítio  posto  à  Baía"  (1638)  ou  o  "Sermão  pelo  bom  sucesso  das  nossas  armas  contra  as  da  Holanda"  (1640);  a  Restauração  e  a  subsequente  guerra  com  a  Espanha,  no  "Sermão  dos  Bons  Anos"  ou  no  "Sermão  de  Santo  António  tendo-­‐se  reunido  cortes",  pregados  em  1642;  a  preocupação  com  a  situação  económica  do  país  em  guerra  com  a  Espanha  e  as  propostas  para  sanar  essa  situação  no  "Sermão  de  S.  Roque"  (1644);  a  dura  e  prolongada  luta  em  defesa  dos  índios  do  Maranhão  contra  os  colonos  que  pretendiam  escravizá-­‐los  no  chamado  "Sermão  das  tentações"  (1653)  ou  no  "Sermão  da  Epifania"  (1662).  

Para   fazer   da   sua   palavra   um  meio   eficaz   de   intervenção   e   atuação,   Vieira   recorre   naturalmente   às   técnicas   que   a  Retórica   (disciplina   fundamental   no   curriculum   escolar   e   na   formação   intelectual   dos   homens   da   época)   sistematizara   e  codificara.  De  um  dos  seus  sermões   (o  "Sermão  da  Sexagésima",  o  mais  conhecido,  aquele  que  o  autor  escolheu  para  abrir  o  

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primeiro   volume  dos   que   publicou)   fez   Vieira   uma   espécie   de   sucinto   tratado   de  Retórica,   um   sermão  que   pretende   ensinar  como  pregar  um  sermão  que  seja  de  facto  um  discurso  persuasivo,  capaz  de  convencer  e  converter  os  ouvintes.  É  certo  que  no  domínio   das   técnicas   retóricas   Vieira   não   é   propriamente   um   inovador:   utiliza   fundamentalmente   os   processos   que   a   escola  ensinava,  na  senda  dos  tratados  clássicos  de  Aristóteles,  Cícero  e  Quintiliano,  tratados  que  alguns  autores,  nomeadamente  no  século   XVI,   tinham   adaptado   aos   objetivos   específicos   da   oratória   cristã.   Mas   se   as   técnicas   são   comuns   a   quase   todos   os  oradores   da   época,   a   forma   de   as   pôr   em   prática,   essa   revela   o   génio   inconfundível   de   Vieira,   o   seu   inigualável   talento   de  arquitetar   argumentos,   explorar   conceitos,   trabalhar   as   palavras.   Palavras   que   são   utilizadas   não   só   nas   suas   capacidades  semânticas  (e  Vieira  é  exímio  na  arte  de  tirar  partido  da  polissemia  das  palavras),  mas  também  na  sua  materialidade  fónica  e  até  mesmo  no   seu   aspeto   gráfico.   Todos   estes   elementos   são  mobilizados   na   construção   de   um  discurso   engenhoso,   construído  segundo  uma  lógica  que  é,  frequentemente,  mais  verbal  que  racional.  Discurso  que  pretende  captar  e  persuadir  os  destinatários,  levando-­‐os  a  tomar  atitudes  muito  concretas.  Mas  um  discurso  que  tem  também,  por  vezes,  uma  clara  e  assumida  função  lúdica.  O  que  não  significa  que  Vieira  caia  no  jogo  de  palavras  gratuito  e  inconsequente:  é  que,  tal  como  S.  Francisco  Xavier  em  honra  de  quem  prega  15  sermões,  também  ele  sabe  "usar  bem  do  jogo",  fazendo  dos  artifícios  retóricos  tão  apreciados  no  seu  tempo  uma  utilização  equilibrada  ao  serviço  da  função  específica  de  cada  um  dos  seus  sermões.  Há  nestes  sermões  um  vigor,  uma  energia,  que  decorre  da  sua  forte  personalidade,  sem  dúvida,  e  do  seu  magistral  domínio  dos  processos  oratórios  vigentes  na  época;  mas  que   decorre   sobretudo   da   sua   capacidade   de   moldar   a   linguagem   como   um   material   plástico,   fazendo-­‐a   construir   os   mais  diversos  efeitos  pragmáticos,  numa  concretização  perfeita  do  ideal  retórico  de  "arte  de  bem  dizer  para  persuadir".  

No  prólogo  do  primeiro  volume  dos  seus  Sermões  Vieira  lamenta  que  os  textos  escritos  que  assim  chegam  aos  leitores  sejam  textos  sem  vida,  uma  vez  que  lhes  falta  a  voz  que  os  animou  no  momento  da  pregação:  "sem  a  voz  que  os  animou,  ainda  ressuscitados  são  cadáveres".  Mas  creio  que  os  leitores  dos  sermões  de  Vieira  não  podem  deixar  de  discordar  desta  afirmação  do   autor.   Os   seus   sermões   apresentam-­‐se-­‐nos   como   textos   plenos   de   vida.   Basta   recordarmos   a   veemência   com   que   no  chamado  "Sermão  das   tentações"   (1ª.  Dominga  da  Quaresma  de  1653)  verbera  os  colonos  do  Maranhão  por  escravizarem  os  índios.  Depois  de   ter   citado  um  versículo  de   Isaías  que   traduz  assim:   "Brada,  pregador,  e  não  cesses;   levanta  a   tua  voz  como  trombeta,  desengana  o  meu  povo,  anuncia-­‐lhe  os  seus  pecados  e  dize-­‐lhe  o  estado  em  que  estão",  continua:  "Cristãos,  Deus  me  manda  desenganar-­‐vos,  e  eu  vos  desengano  da  parte  de  Deus.  Todos  estais  em  pecado  mortal;  todos  viveis  e  morreis  em  estado  de  condenação,  e  todos  vos  ides  direitos  ao  inferno.  Já  lá  estão  muitos,  e  vós  também  estareis  cedo  com  eles,  se  não  mudardes  de  vida."  E  a  desumana  exploração  de  que  os   índios  eram  vítimas  exprime-­‐a  nesta  exclamação  de   impressionante  visualismo:  "Ah  fazendas  do  Maranhão,  que  se  esses  mantos  e  essas  capas  se  torceram,  haviam  de  lançar  sangue!"  Recordo  outro  exemplo:  o  "Sermão  pelo  bom  sucesso  das  nossas  armas  contra  as  da  Holanda",  um  sermão  em  que  Vieira  resolve  pregar  a  Deus  para  o  convencer  a  proteger  os  portugueses  da  Baía,  sitiados  pelos  hereges  holandeses.  Ao  longo  de  todo  o  texto  o  orador  assume  a  atitude  de  quem  exige  de  Deus  aquilo  a  que  tem  direito,  recorrendo  à  súplica,  à  ameaça,  e  até  mesmo  à  ironia  e  ao  sarcasmo,  numa  pseudo-­‐aceitação  do  que  demonstra  ser  uma  injustiça  divina:  

"Mas  pois  vós,  Senhor,  o  quereis  e  ordenais  assim,  fazei  o  que  fordes  servido.  Entregai  aos  holandeses  o  Brasil,  entregai-­‐lhes   as   Índias,   entregai-­‐lhes   as   Espanhas   (que   não   são   menos   perigosas   as   consequências   do   Brasil   perdido),   entregai-­‐lhes  quanto  temos  e  possuímos  (como  já   lhes  entregastes  tanta  parte),  ponde  em  suas  mãos  o  mundo;  e  a  nós,  aos  portugueses  e  espanhóis,   deixai-­‐nos,   repudiai-­‐nos,   desfazei-­‐nos,   acabai-­‐nos.   Mas   só   digo   e   lembro   a   Vossa   Majestade,   Senhor,   que   estes  mesmos  que  agora  desfavoreceis  e  lançais  de  vós,  pode  ser  que  os  queirais  algum  dia  e  que  os  não  tenhais  (...)  Abrasai,  destruí,  consumi-­‐nos  a  todos;  mas  pode  ser  que  algum  dia  queirais  espanhóis  e  portugueses  e  que  os  não  acheis.  Holanda  vos  dará  os  apostólicos   conquistadores   que   levem   pelo  mundo   os   estandartes   da   cruz;   Holanda   vos   dará   os   pregadores   evangélicos   que  semeiem  nas  terras  dos  bárbaros  a  doutrina  católica  e  a  reguem  com  o  próprio  sangue;  Holanda  defenderá  a  verdade  de  vossos  sacramentos   e   a   autoridade   da   Igreja   Romana;   Holanda   edificará   templos,   Holanda   levantará   altares,   Holanda   consagrará  sacerdotes  e  oferecerá  o  sacrifício  de  vosso  santíssimo  Corpo;  Holanda,  enfim,  vos  servirá  e  venerará  tão  religiosamente  como  em  Amsterdão,  Meldeburbo  e  Flisinga  e  em  todas  as  outras  colónias  daquele   frio  e  alagado   inferno  se  está   fazendo   todos  os  dias."   Através   destes   sermões   continua   a   fazer-­‐se   ouvir   a   voz   veemente   e   harmoniosa   do   seu   autor:   nas   suas   diversas  tonalidades,   nas   suas   alterações   rítmicas,   na   sua   organização   melódica,   no   seu   ritmo   encantatório   que   prende   tanto   pela  musicalidade   da   frase   como  pelos   argumentos   expendidos.   Em  muitos   dos   seus   sermões  Vieira   desenhou  o  modelo   ideal   do  pregador  e  apontou  figuras  que  personificam  esse  ideal.  O  protótipo  do  pregador  segundo  Vieira  encarna  em  pessoas  como  S.  Paulo,   S.   João  Batista   ou   Santo  António   -­‐   homens  que  usaram  a  palavra   para   converterem  os   homens  para  Deus.   Com  estas  figuras   prototípicas   se   identificou   Vieira:   nos   seus   sermões   apresenta-­‐se   como   apóstolo   dos   gentios,   tal   como   S.   Paulo;   à  imitação  de  Santo  António,  também  ele  resolve  pregar  aos  peixes  para  dar  lições  aos  homens;  tal  como  S.  João  Batista,  define-­‐se  como   "voz  que   clama".  A  motivação  profunda  deste   clamor  é  de  natureza  espiritual   e  política:  dois   vetores  que,   longe  de   se  oporem,  se  combinam  na  sua  mundividência,  se  associam  na  sua  atuação,  se  harmonizam  na  sua  ideologia  messiânica.  Uma  vida  e  uma  obra  unificadas  na  sua  diversidade  pelo  ideal  de  construção  do  reino  de  Deus  na  terra,  esse  glorioso  Quinto  Império  que  persistentemente  esperou  e  anunciou  até  ao  fim  dos  seus  dias.  

*  Professora  Catedrática  da  Faculdade  de  Letras  da  Universidade  de  Lisboa.    

       

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SERMÃO    

Proferido  na  cidade  de  São  Luís  do  Maranhão  em  1654,  na  sequência  de  uma  disputa  com  os  colonos  portugueses  no  Brasil,  o  Sermão  de  Santo  António  aos  Peixes  é  um  documento  de  exímia  uma  habilidade  oratória  e  poder  satírico.    

Com  uma  construção   literária  e  argumentativa  notável,  o  sermão   louva  algumas  virtudes  humanas  e,  principalmente,  censura   com   severidade   os   vícios   dos   colonos.   Este   sermão   (alegórico)   foi   pregado   três   dias   antes   de   Padre   António   Vieira  embarcar  para  Portugal,  para  obter  uma  legislação  justa  para  os  índios.  

 Todo  o  sermão  é  uma  alegoria,  porque  os  peixes  são  a  personificação  dos  homens.      

Estrutura  do  Sermão    O  sermão  encontra-­‐se  dividido  em  capítulos:  •  1.  Introdução  (Exórdio/Exordium)  -­‐  capítulo  I  •  2.  Desenvolvimento  (Exposição  e  Confirmação)  -­‐  capítulos  II  a  V  •  3.  Conclusão  (Peroração  ou  Epílogo)  -­‐  capítulo  VI  

 Exórdio        Introdução  —  Padre  António  Vieira  expõe  o  tema  e  as  questões  centrais  que  vai  defender,  bem  como  o  plano  estrutural  do  seu  sermão.  

Apresenta  o  conceito  predicável,  “Vós  sois  o  sal  da  Terra”,  e  explica  as  razões  pelas  quais  a  terra  está  tão  corrupta.  Ou  a  culpa  está  no  sal  (pregadores),  ou  na  terra  (ouvintes).  Se  a  culpa  está  no  sal,  é  porque  os  pregadores  não  pregam  a  verdadeira  doutrina,  ou  porque  dizem  uma  coisa  e  fazem  outra  ou  porque  se  pregam  a  si  e  não  a  Cristo.  Se  a  culpa  está  na  terra,  é  porque  os  ouvintes  não  querem  receber  a  doutrina,  ou  antes  imitam  os  pregadores  e  não  o  que  eles  dizem,  ou  porque  servem  os  seus  apetites  e  não  os  de  Cristo.  

Ao  apresentar  o  conceito  predicável,  Padre  António  Vieira  introduz  o  tema  do  sermão,  mas  apesar  de  tudo  desvia-­‐se  do  tema  e  preocupa-­‐se  apenas  com  a  razão  pela  qual  a  terra  está  corrupta,  partindo  do  princípio  de  que  a  culpa  é  dos  ouvintes.  O  sermão  é  proferido  no  dia  de  Santo  António,  aproveitando  assim  o  exemplo  deste.  Santo  António  não  obtinha  resultados  da  sua  pregação   e   em   vez   de   desistir   resolveu   pregar   aos   peixes.   Assim   se   viu   Padre   António   Viera,   sem  obter   resultados,   resolveu  igualmente  pregar  aos  peixes.  

O   orador   vai   louvar   as   virtudes   dos   peixes   (em   geral   e   em   particular)   e   em   seguida   repreendê-­‐los   (em   geral   e   em  particular).  

 SÍNTESE:  Neste   capítulo,   Padre   António   Vieira   critica   a   humanidade,   que   está   cada   vez  mais   corrupta,   e   os   pregadores   que,   havendo  tantos,   não   conseguem  alcançar   os   seus   objetivos.  Utiliza   as   expressões   “sal”   para   os   pregadores   e   “terra”   para   os   ouvintes.  Exceção   para   Santo   António,   que   Vieira   admira   bastante   e   do   qual   aborda   a   história   ocorrida   com   este   em   Arimino,   onde  pregava  aos  hereges  e  foi  alvo  da  tentativa  de  apedrejamento  por  parte  destes.    

 Capítulo  II  -­‐  Louvoures  das  virtudes  dos  peixes  em  Geral    Exposição—  Vieira  inicia  a  exposição  com  uma  pergunta  retórica:  “Enfim,  que  havemos  de  pregar  hoje  aos  peixes?”  e  de  seguida  indica  a  estrutura  do  sermão:  “dividirei,  peixes,  o  vosso  Sermão  em  dois  pontos:  no  primeiro  louvar-­‐vos-­‐ei  as  vossas  atitudes,  no  segundo  repreender-­‐vos-­‐ei  os  vossos  vícios”  (ll.  23-­‐24).    O  capítulo  II  apresenta  os  louvores  aos  peixes  em  geral.  (1.º  momento  da  exposição)  Estas  qualidades  são,  por  antítese,  os  defeitos  dos  homens.    •  São  obedientes  (obediência),  ouvem  e  não  falam  "aquela  obediência,  com  que  chamados  acudistes  todos  pela  honra  de  vosso  Criador  e  Senhor"  "ouvem  e  não  falam"    •  Foram  os  primeiros  animais  a  serem  criados    "vós  fostes  os  primeiros  que  Deus  criou"    •  São  os  mais  numerosos  e  os  mais  volumosos  "entre  todos  os  animais  do  mundo,  os  peixes  são  os  mais  e  os  maiores"  ��������  

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•  Não  são  domesticáveis,  presos,  virgens  "só  eles  entre  todos  os  animais  não  se  domam  nem  domesticam"    SÍNTESE  -­‐  Bons  ouvintes  /  obedientes;  -­‐  Primeira  criação  de  Deus;  -­‐  Melhores  do  que  os  homens;  -­‐  Livres,  puros,  longe  dos  homens.      Capítulo  III  -­‐  Louvores  aos  peixes  em  Particular      (considerado  por  alguns  autores  ,  o  1.º  momento  da  confirmação)  O  capítulo   III  é   igualmente  de   louvor  aos  peixes,  mas  agora  de  carácter  particular.  Padre  António  Vieira  nomeia  quatro  peixes  para  mostrar  a  relação  entre  o  homem  e  o  divino.  Todos  estes  louvores  que  Padre  António  Vieira  faz  aos  peixes  são  antíteses  dos  defeitos  dos  homens.    •  Peixe  de  Tobias:  Tem  umas  entranhas  e  um  coração  que  expulsam  os  demónios  e  simboliza  o  poder  purificador  da  palavra  de  Deus.  Cura  a  cegueira  "(...)  sendo  o  pai  de  Tobias  cego,  aplicando-­‐lhe  o  filho  aos  olhos  um  pequeno  do  fel,  cobrou  inteiramente  a  vista;"  Expulsa  os  demónios  "(...)  tendo  um  demónio  chamado  Asmodeu  morto  sete  maridos  a  Sara,  casou  com  ela  o  mesmo  Tobias;  e  queimando  na  casa  parte  do  coração,  fugiu  dali  o  demónio  e  nunca  mais  tornou;"    •  Rémora:  Peixe  que  quando  se  agarra  e  um  navio  tem  força  suficiente  para  o  conduzir  sozinha.  Simboliza  o  poder  da  palavra  do  pregador  –  guia  das  almas.  Um  peixe  pequeno  mas  que  tem  muita  força.    "(...)  se  se  pega  ao  leme  de  uma  nau  da  índia  (...)  a  prende  e  amarra  mais  que  as  mesmas  âncoras,  sem  se  poder  mover,  nem  ir  por  diante."  "Oh  se  houvera  uma  rémora  na  terra,  que  tivesse  tanta  força  como  a  do  mar,  que  menos  perigos  haveria  na  vida,  e  que  menos  naufrágios  no  mundo!"  "(...)  a  virtude  da  rémora,  a  qual,  pegada  ao  leme  da  nau,  é  freio  da  nau  e  leme  do  leme"    •  Torpedo:  Produz  descargas  eléctricas  para  se  defender;  faz  tremer  o  braço  do  pecador.  Simboliza  o  poder  da  palavra  de  Deus  (de  fazer  tremer  os  pecadores  que  pescam  na  terra  tudo  quanto  encontram).    "Está  o  pescador  com  a  cana  na  mão,  o  anzol  no  fundo  e  a  bóia  sobre  a  água,  e  em  lhe  picando  na  isca  o  torpedo,  começa  a  lhe  tremer  o  braço.   Pode  haver  maior,  mais   breve  e  mais   admirável   efeito?  De  maneira  que,   num  momento,   passa   a   virtude  do  peixezinho,  da  boca  ao  anzol,  do  anzol,  à  linha,  da  linha  à  cana  e  da  cana  ao  braço  do  pescador."    •  Quatro  Olhos:  Tem  dois  pares  de  olhos,  uns  para  cima  e  outros  para  baixo.  Simboliza  o  dever  dos  cristãos  em  tirar  os  olhos  da  vaidade  terrena,  olhando  para  o  céu  sem  esquecer  o  inferno.  Este  peixe  vê  para  cima  e  para  baixo.  Representa  a  capacidade  de  distinguir  o  bem  do  mal  (céu/inferno),  a  vigilância  e  a  providência.  "Esta  é  a  pregação  que  me  fez  aquele  peixezinho,  ensinando-­‐me  que,  se  tenho  fé  e  uso  da  razão,  só  devo  olhar  direitamente  para   cima,   e   só  direitamente  para  baixo:  para   cima,   considerando  que  há  Céu,   e  para  baixo,   lembrando-­‐me  que  há   Inferno."  (Senão  por  amor  a  Deus  (cima),  então,  por  repúdio  ao  inferno  (baixo)).    

Virtudes  dos  Peixes    PEIXE  DE  TOBIAS  -­‐  o  fel  sara  a  cegueira;  -­‐  o  coração  lança  fora  os  demónios;  RÉMORA  -­‐  tão  pequeno  no  corpo  e  tão  grande  na  força  e  no  poder;    TORPEDO  -­‐  descarga  elétrica  que  faz  tremer  o  braço  do  pescador;    QUATRO-­‐OLHOS  -­‐  dois  olhos  voltados  para  cima  para  se  vigiarem  das  aves;  -­‐  dois  olhos  voltados  para  baixo  para  se  vigiarem  dos  peixes.  

   

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   SÍNTESE  Todos  estes  elogios  que  o  Padre  António  Vieira  tece  aos  peixes  são  o  contraponto  dos  defeitos  dos  homens,  evidenciando  assim  os  vícios  destes.  Os  quatro  peixes,  o  Santo  Peixe  de  Tobias,  a  rémora,  o  torpedo  e  o  quatro-­‐olhos  possuem  características  que  na  sua  totalidade  se  podem  identificar  com  as  principais  virtudes  de  Santo  António.        Capítulo  IV  -­‐  Repreensões  aos  peixes  em  Geral    (considerado  por  alguns  autores  ,  o  2.º  momento  da  exposição)  

Padre   António   Vieira   acusa   os   peixes   de   se   comerem   uns   aos   outros,   recorrendo   a   um   exemplo   dos   homens   para  explicar  o  que  eles  faziam.  Assim,  os  homens  praticam  antropofagia  social   (escravatura/exploração).  O  orador  estabelece  uma  comparação  entre  a  antropofagia  ritual  dos  Tapuias  (índios  brasileiros)  e  a  antropofagia  social  dos  homens,  considerando  esta  última  mais  grave  que  a  anterior  já  que  nem  os  mortos  escapam.  Mas  o  mais  grave  é  serem  os  grandes  a  comerem  os  pequenos  (são  precisos  muitos  pequenos  para  alimentar  um  grande).  Acusa-­‐os  igualmente  de  cegueira,  vaidade  e  maldade.     Estas  repreensões  são  feitas  com  o  objetivo  de  mudar  os  homens,  ou  pelo  menos  para  os  fazer  pensar.      Capítulo  V  -­‐  Repreensões  aos  peixes  em  Particular    (considerado  por  alguns  autores  ,  o  2.º  momento  da  confirmação)  De  carácter  particular,  Padre  António  Vieira  apresenta  quatro  exemplos  de  peixes  que  se  referem  a  tipos  comportamentais.    

 •  Roncador  que  simboliza  os  arrogantes  Peixes  pequenos  e  que  emitem  um  som  grave,  são  sempre  facilmente  pescados  e  apesar  de  serem  pequenos  têm  muita  língua  («É   possível   que   sendo   vós   uns   peixinhos   tão   pequenos,   haveis   de   ser   as   roncas   do  mar?»).   Representam   a   arrogância   e   o  orgulhoso.  Encontramos  esse  comportamento  em  personagens  como  S.  Pedro,  Golias,  Caifás  e  Pilatos,  em  contraste  com  Santo  António  que  tinha  saber  e  poder,  mas  não  se  vangloriava.      •  Pegador  que  simboliza  os  oportunistas  Pequenos  peixes  que  se  fixam  a  peixes  grandes  ou  ao  leme  dos  navios  («Pegadores  se  chamam  estes  de  que  agora  falo,  e  com  grande  propriedade,  porque  sendo  pequenos,  não  só  se  chegam  a  outros  maiores,  mas  de  tal  sorte  se  lhes  pegam  aos  costados,  que   jamais   os   desferram.»).   Representam   o   oportunismo,   o   parasitismo   social   e   a   subserviência.   Uma   vez   que   vivem   na  dependência  dos  grandes  e  morrem  com  eles,  Vieira  argumenta  que  os  grandes  morrem  porque  comeram,  os  pequenos  morrem  sem   terem   comido.   Na   humanidade,   encontramos   os   seguidores   de   Herodes.   Santo   António   «pegou-­‐se»   apenas   a   Cristo   e  seguiu-­‐O.      •  Voador  que  simboliza  os  ambiciosos  Peixes   de   grandes   barbatanas   que   saltam   para   fora   de   água   como   se   voassem.   Representam   o   defeito   da   presunção   e   da  ambição  desmedida  e  desse  modo,  porque  não  se  contentam  com  o  seu  elemento,  são  pescados  como  peixes  e  caçados  como  aves  («Dizei-­‐me,  voadores,  não  vos  fez  Deus  para  peixes?  Pois  porque  vos  meteis  a  ser  aves?  [...]  Contentai-­‐vos  com  o  mar  e  com  nadar,   e   não   queirais   voar,   pois   sois   peixes.»)   .   Simão  Mago   e   Ícaro   exemplificam-­‐no   entre   os   homens.   Por   contraste,   Santo  António  tinha  sabedoria  e  poder,  mas  não  se  vangloriou.    •  Polvo  (o  pior  de  todos)  que  simboliza  os  traidores  e  os  hipócritas.    Detentor  de  um  «capelo»,   tentáculos,   corpo  mole  e  podendo  camuflar-­‐se,  é   considerado  um  hipócrita  e   traidor  pois  utiliza  a  capacidade  mimética   (varia  a  sua  coloração  e  a  sua   forma,  de  acordo  com  o  meio  em  que  se  encontra)  para  atacar  os  peixes  desprevenidos   («E  debaixo  desta   aparência   tão  modesta,   ou  desta  hipocrisia   tão   santa   [...]   o  dito  polvo  é  o  maior   traidor  do  mar.»).  Entre  os  homens,  encontramo-­‐lo  em  Judas.  Mais  uma  vez,  por  contraste,  Santo  António  foi  sincero  e  verdadeiro  -­‐  nunca  enganou.      

Defeitos  dos  Peixes    

RONCADORES  -­‐  embora  pequenos  roncam  muito  (simbolizam  a  arrogância  e  a  soberba);    PEGADORES  -­‐   sendo   pequenos,   pregam-­‐se   nos   maiores,   não   os   largando  mais   (simbolizam   o  parasitismo);    

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VOADORES  -­‐   sendo   peixes,   também   desejam   ser   aves   (simbolizam   a   presunção/vaidade   e   a  ambição);  POLVO  -­‐  com  a  aparência  de  santo,  é  o  maior  traidor  do  mar  (simboliza  a  traição).  

 SÍNTESE  O   sermão   é,   pois,   todo   ele   feito   de   alegorias,   simbolizando   os   vícios   dos   colonos   do   Brasil   ("peixes   grandes   que   comem   os  pequenos")  em  vários  peixes:  o   roncador   (o  orgulhoso),   voador   (o  ambicioso),  pegador   (o  parasita)  e  o  polvo   (o   traidor,  mais  traidor  que  o  próprio  Judas).      Capítulo  VI  –  Peroração  ou  Epílogo      

Conclusão  —  o   pregador   visa   um  desfecho   forte,   de  modo   a   impressionar   o   auditório   e   levá-­‐lo   a   pôr   em  prática   os  conselhos  recebidos.  

Neste   capítulo,   o   orador   retoma   os   pregadores   referidos   no   conceito   predicável,   servindo-­‐se   dele   próprio   como  exemplo   alegando   que   não   está  a   cumprir   a   sua   função.   Alega   também  que   ele   (homens)   e   os   peixes,   nunca   vão   chegar   ao  sacrifício   final,   uma   vez   que   os   peixes   já   vão  mortos   e   os   homens   “vão  mortos   de   espírito”.   Padre   António   Vieira   diz   que   a  irracionalidade,  a  inconsciência  e  o  instinto  dos  peixes,  são  melhores  do  que  a  racionalidade,  o  livre  arbítrio,  a  consciência,  ou  o  entendimento  e  a  vontade  do  homem.    

Conclui,  depois,  fazendo  um  apelo  aos  ouvintes  e  louvando  Deus,  tornando  esta  última  parte  do  sermão  um  pouco  mais  familiar,  para  que  se  estabeleça  de  novo  a  proximidade  entre  os  ouvintes  e  o  orador.