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XLV CONGRESSO DA SOBER "Conhecimentos para Agricultura do Futuro" “ESTRADA DO COLONO”: A LEITURA DO CONFLITO NA ÓTICA DA POPULAÇÃO LINDEIRA E ALGUMAS CONSIDERAÇÕES TÉCNICAS. ROMILDA DE SOUZA LIMA; JOSÉ FLÁVIO CÂNDIDO-JR. UNIVERSIDADE ESTADUAL DO OESTE DO PARANÁ, CAMPUS:FRANCISCO BELTRÃO E CASCAVEL, PR, BRASIL. [email protected] APRESENTAÇÃO ORAL AGRICULTURA, MEIO AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL “ESTRADA DO COLONO”: A LEITURA DO CONFLITO NA ÓTICA DA POPULAÇÃO LINDEIRA E ALGUMAS CONSIDERAÇÕES TÉCNICAS. Grupo de Pesquisa: Número 6 - Agricultura, Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável: Coordenação: Flávio Borges Botelho - UNB Resumo A “Estrada do Colono”, como é comumente conhecida, tem sido motivo de conflito a alguns anos, envolvendo de um lado os moradores do entorno do Parque Nacional do Iguaçu - PNI, apoiados por alguns representantes políticos regionais, e de outro lado os gestores do referido Parque, o IBAMA e ainda pesquisadores e ambientalistas. O conflito se dá em relação à proibição de acesso ao referido trecho que compreende uma área de 18 km, ligando o município de Serranópolis do Iguaçu a Capanema. Este trecho foi aberto ilegalmente pelos moradores do entorno em 1953 e fechado definitivamente em 1986 por uma Liminar Federal. Devido ao fechamento o local foi invadido algumas vezes na tentativa de sua reabertura, acirrando o conflito entre as partes e causando impactos negativos à fauna e flora da referida UC. Este trabalho tem por objetivo apresentar dados, e ao mesmo tempo discuti-los, referentes a uma pesquisa realizada em novembro de 2005 com moradores do entorno da denominada “Estrada do Colono”. Foram realizadas 208 entrevistas semi-estruturadas com moradores da área, selecionados aleatoriamente. Cada roteiro foi composto por 08 tópicos. Neste trabalho será dada ênfase às questões nas quais os autores destacaram como sendo mais interessantes e instigantes no que concerne ao campo da investigação científica a que se propuseram os mesmos. Palavras-chaves: Parque Nacional do Iguaçu, Lindeiros, Estrada do Colono, conflito. Abstract Londrina, 22 a 25 de julho de 2007, Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural 1

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XLV CONGRESSO DA SOBER "Conhecimentos para Agricultura do Futuro"

“ESTRADA DO COLONO”: A LEITURA DO CONFLITO NA ÓTICA DAPOPULAÇÃO LINDEIRA E ALGUMAS CONSIDERAÇÕES TÉCNICAS .

ROMILDA DE SOUZA LIMA; JOSÉ FLÁVIO CÂNDIDO-JR.

UNIVERSIDADE ESTADUAL DO OESTE DO PARANÁ, CAMPUS:FR ANCISCOBELTRÃO E CASCAVEL, PR, BRASIL.

[email protected]

APRESENTAÇÃO ORAL

AGRICULTURA, MEIO AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO SUSTEN TÁVEL

“ESTRADA DO COLONO”: A LEITURA DO CONFLITO NA ÓTICA DAPOPULAÇÃO LINDEIRA E ALGUMAS CONSIDERAÇÕES TÉCNICAS .

Grupo de Pesquisa: Número 6 - Agricultura, Meio Ambiente e DesenvolvimentoSustentável: Coordenação: Flávio Borges Botelho - UNB

ResumoA “Estrada do Colono”, como é comumente conhecida, tem sido motivo de conflito a algunsanos, envolvendo de um lado os moradores do entorno do Parque Nacional do Iguaçu - PNI,apoiados por alguns representantes políticos regionais, e de outro lado os gestores do referidoParque, o IBAMA e ainda pesquisadores e ambientalistas. O conflito se dá em relação àproibição de acesso ao referido trecho que compreende uma área de 18 km, ligando omunicípio de Serranópolis do Iguaçu a Capanema. Este trecho foi aberto ilegalmente pelosmoradores do entorno em 1953 e fechado definitivamente em 1986 por uma Liminar Federal.Devido ao fechamento o local foi invadido algumas vezes na tentativa de sua reabertura,acirrando o conflito entre as partes e causando impactos negativos à fauna e flora da referidaUC. Este trabalho tem por objetivo apresentar dados, e ao mesmo tempo discuti-los,referentes a uma pesquisa realizada em novembro de 2005 com moradores do entorno dadenominada “Estrada do Colono”. Foram realizadas 208 entrevistas semi-estruturadas commoradores da área, selecionados aleatoriamente. Cada roteiro foi composto por 08 tópicos.Neste trabalho será dada ênfase às questões nas quais os autores destacaram como sendo maisinteressantes e instigantes no que concerne ao campo da investigação científica a que sepropuseram os mesmos.

Palavras-chaves: Parque Nacional do Iguaçu, Lindeiros, Estrada do Colono, conflito.

Abstract

Londrina, 22 a 25 de julho de 2007,Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural

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XLV CONGRESSO DA SOBER "Conhecimentos para Agricultura do Futuro"

The “Settler's road” as it is known commonly, it has been reason conflict the some years for,involving of a side the bordering residents, with the help of regional political and on anotherside the managers of the National Park of Iguaçu - PNI, IBAMA and still researchers andenvironmentalists. The conflict feels in relation to the access prohibition to the referredpassage that understands an area of 18 km, tying the municipal district of Serranópolis ofIguaçu the Capanema. This passage was opened illegally by the bordering residents of PNI in1953 and closed definitively in 1986 by a Federal Threshold. Due to the closing the place itwas invaded some times in the attempt of its reopening, having incited the conflict among theparts and causing negative impacts to the fauna and flora of referred UC. This work has forobjective to present data, and at the same time to discuss them, regarding a researchaccomplished in November of 2005 with residents of the I spill of the denominated “Settler'sroad”. 208 interviews were accomplished half-structuralized with residents of the area,randomly selected. Each itinerary was composed by 08 subjects. In this work emphasis willbe given to the subjects in which the authors highlighted how being more interesting andinstigantes in what concerns to the field of the scientific investigation the one that intendedthe same ones.

Key Words: National Park of Iguaçu, bordering residents, “Settler's road”, conflict.

1. INTRODUÇÃO

Este trabalho tem por objetivo apresentar dados, e ao mesmo tempo discuti-los,referentes a uma pesquisa realizada em novembro de 2005 com moradores do entorno dadenominada “Estrada do Colono”. Foram realizadas 208 entrevistas semi-estruturadas commoradores da área. Os entrevistados foram selecionados aleatoriamente. Cada roteiro foicomposto por 08 tópicos. Neste trabalho será dada ênfase aos aspectos nos quais os autoresdestacaram como sendo mais interessantes e instigantes no que concerne ao campo dainvestigação científica a que se propuseram os mesmos. O interesse em realizar entrevistascom o público selecionado, deve-se ao fato de essa estrada representar motivos de conflitoentre gestores do Parque Nacional do Iguaçu - PNI, pesquisadores da área ecológica e apopulação do entorno da mesma, que contam com apoio de políticos da região. De um lado,os dois primeiros grupos alegam, ao apresentarem informações técnicas comprobatórias, quea reabertura da estrada poderá causar impactos de amplitude considerável à biodiversidadelocal. De outro lado encontram-se os moradores do entorno que defendem a reabertura daestrada alegando ser esta uma importante linha de acesso a outros municípios, já que com seufechamento a distância se ampliou em quase 200 km. Os mesmos alegam, ainda, que ofechamento propiciou o afastamento das famílias por dificultar as visitas e ao mesmo tempoimpedir intercâmbios culturais, sociais e até mesmo econômicos.

Diante do impasse instalado e devido ao fato de que há poucos registros das falas dosmoradores em trabalhos técnico-científicos, estando registradas principalmente em jornais,considerou-se interessante investigar a partir de uma pesquisa com esse público, sobre suasmotivações pela reabertura da estrada, bem como buscar entender a sua percepção a respeitodo PNI e sua importância para as comunidades locais.

1.1. A opção metodológica

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A entrevista semi-estruturada, técnica utilizada durante a pesquisa, é muito utilizadatambém em Diagnóstico Rápido Participativo (DRP)1.

Entende-se que o processo de análise e interpretação da fala dos entrevistados, é umadas maiores dificuldades em pesquisa de campo, uma vez que é necessário levar emconsideração que nessas falas não está registrado apenas o presente, o vivenciado, mastambém o passado idealizado, as projeções futuras, a busca pela valorização dos símbolos queidentifica o ator social envolvido. Em se tratando de um tema envolvendo conflito, que fazparte de um imaginário coletivo, há ainda que se entender que os sujeitos (entrevistado eentrevistador) fazem parte de uma construção social, onde cada um já tem definido previamente o ser favorável ou desfavorável ao objeto de conflito. Por isso, conformerecomendado por Velho (1994) é tão importante aceitar o desafio de transformar o “familiar”em “exótico” no sentido de criar um estranhamento e maior fluidez na análise empírica. Essedesafio vale, sobretudo, pelo fato de as entrevistas terem sido realizadas por estudantesuniversitários, do curso de Ciências Biológicas, alguns dos quais, moradores do entorno daárea de conflito.

2. A ESTRADA DO COLONO

Mapa 1 – Localização da “Estrada do Colono”

1O DRP surgiu na década de 80, sendo uma evolução de outros métodos, como por exemplo, o Rapid RuralAppraisal (DRR) e é amplamente utilizado em programas/projetos de cooperação técnica internacional. Aentrevista semi-estruturada, por sua vez, permite realizar discussões informais sobre um tema, mas é baseadanuma lista flexível de tópicos. Os inquiridos podem ser moradores comuns ou informantes chave e oentrevistador tem um papel ativo, por ter a possibilidade de ampliar o leque das questões visando esclarecer emelhor compreender o contexto (SOUZA LIMA, 2003).

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Fonte: Secretaria de Estradas e Transportes – PARANÁ. Mapa Rodoviário 2003 In: BONASSA (2004).

2.1. A origem da estrada e a trajetória de conflitos

Na tentativa de acompanhar o que vinha ocorrendo no país, incentivado pelo GovernoGetúlio Vargas, a partir da década de 1950, no movimento denominado “Marcha para oOeste” que tinha como objetivo a conquista e o desbravamento do interior - uma vez que até adécada de 40, quase toda a população brasileira se concentrava no litoral - o Governo doParaná também incentivou a colonização do Oeste do estado. Foi neste contexto que foicriada a “Estrada do Colono”.

Inicialmente ligava Foz do Iguaçu-Guarapuava, que acompanhava o limite norte do ParqueNacional do Iguaçu, até a margem do rio. Só alguns anos depois foi aberto o trecho quecontinuava a partir do rio Iguaçu e chegava até Capanema, então uma vila em início deimplantação, e acabou por se conectar com as vias de acesso que vinham do sul(AMBIENTE BRASIL) . Disponível em:http://www.ambientebrasil.com.br/composer.php3?base=./natural/index.html&conteudo=./natural/artigos/ecolono.html., acessado em17/09/2006).

A estrada do Colono corta o Parque Nacional do Iguaçu, considerada uma ZonaIntangível, numa extensão de 18 Km, ligando o município de Serranópolis do Iguaçu a

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Capanema. A referida estrada foi aberta, ilegalmente, pelos moradores do entorno entre 1953e 1955, aproximadamente quinze anos após a criação do Parque.

Em 1986, em cumprimento a uma Liminar Federal, ela foi fechada pela PolíciaFederal. Ainda no mesmo ano a população local, incluindo políticos da região e empresárioslocais, realizou uma ampla manifestação na tentativa de sua reabertura, criando-se assim, umdos primeiros conflitos entre técnicos do extinto Instituto Brasileiro de DesenvolvimentoFlorestal (IBDF), ambientalistas e os moradores do entorno. Porém, em 1997, dez anos apóster sido fechada, houve a primeira invasão da estrada por moradores da região, apoiados pelaAssociação de Integração Comunitária Pró-Estrada do Colono - AIPOPEC. Neste mesmo anoa Liminar que determinou o seu fechamento foi cassada pelo Presidente do Tribunal RegionalFederal de Porto Alegre, e a estrada foi reaberta para uso e nessa fase uma comissãoenvolvendo deputados e prefeitos da região, apresentou proposta para a utilização do trecho.As propostas consistiam no seguinte:

Controle de tráfego com guaritas, impedindo a passagem de veículos e cargas que possamoferecer riscos ao parque; manutenção da estrada; interrupção do tráfego à noite; limite develocidade e cobrança de pedágio para quem trafegar pela estrada (Revista deInformação – Oeste, 1997. p.19).

Assim que sua abertura foi decretada, “uma frota de máquinas iniciou o trabalho emritmo acelerado na área, limpando, fazendo terraplanagem e cascalhamento da estrada, apesardo mau tempo que fazia na época” (Revista de Informação – Oeste, 1997. p.19). A estradaficou aberta para uso até 2001, quando foi novamente fechada por Decreto Federal ematendimento a uma Ordem Judicial. Imediatamente após o seu fechamento, o IBAMA, iniciouum plano de reflorestamento do trecho. Depois disso, várias outras campanhas foramrealizadas em prol de sua reabertura. A última dessas manifestações, com ocupação da estradapelos moradores ocorreu em 03 de outubro de 2003. O processo de ocupação ocorreu durantea noite.

Vindos do município de Serranópolis do Iguaçu (PR), os invasores cortaram a linhatelefônica e destruíram o posto de fiscalização do Ibama localizado no Parque, anunciando aintenção de reconstruir pontes e desmatar a vegetação que recobre os 18 km da estrada(Agir Azul na Rede). Disponível em:http://www.agirazul.com.br/fsm4/_fsm/colono.htm. Acessado em 16/09/2006).

A estrada permaneceu ocupada por uma semana. A população desocupou o local apósDecisão Judicial Federal de fechamento da mesma. Neste mesmo período a Polícia Federalacatou ainda a ordem da justiça de destruir a balsa utilizada durante a ocupação para travessiado Rio Iguaçu. Esse evento ocasionou, na época, confronto entre a população e a polícia, hajavista que a população levou a balsa para o centro do município de Capanema, para que amesma se transformasse em um símbolo da luta pela reabertura da estrada.

2.2. Impactos da Reabertura da Estrada

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Segundo Urban (2002), existem espécies ao longo do trecho da estrada que seencontram em ameaça de extinção no estado do Paraná, como por exemplo, o Jaracatiá “quesofre interferência causada pela estrada e pelo efeito de borda instalado ao longo de sua áreamarginal” (p.106). Segundo a autora, a estrada também gera impactos aos sistemas aquáticospróximos, comprometendo a fauna de peixes.

“ O córrego Quilômetro Oito, no trecho à montante da estrada, registra a maior riqueza deespécies da fauna aquática entre todos os pontos amostrados durante a execução do Plano deManejo e deve ser alvo de medidas especiais quanto a sua conservação. Em períodoschuvosos, ocorre a transformação de grande quantidade de partículas sólidas, provenientesda pista de rodagem, para dentro do referido córrego e de outros cursos d’água atravessadospela Estrada do Colono. Desse modo, os rios apresentam, em trechos onde rio e estradacorrem paralelos, drásticas modificações na coloração da água, turbidez e natureza do leito”(p.106-107).

A cada vez que a estrada foi ocupada, impactos negativos foram observados. Naultima delas foram abertas clareiras na mata, que está em fase de regeneração, causando,ainda, afastamento dos animais silvestres e alteração em seu comportamento e rotina.

3. METODOLOGIA, APRESENTAÇÃO A ANÁLISE DOS DADOS

Conforme esclarecido anteriormente, foram realizadas 208 entrevistas com moradoresdo entorno da estrada do colono escolhidos aleatoriamente, abrangendo, sobretudo, apopulação de Serranópolis do Iguaçu. Os entrevistados apresentaram faixa-etária, grau deinstrução e ocupação diferenciadas.

3.1. Faixa etária, escolaridade e ocupação

A divisão da faixa etária registrada foi a seguinte: 51% dos entrevistados tinhamacima de 37 anos e 49% entre 16 a 37 anos de idade. É interessante ressaltar que a maioriados entrevistados sempre viveu na região de entorno e de acordo com os dados é possívelafirmar que a maioria foi testemunha da abertura ilegal da estrada ocorrida em 1953, sendoque 40 % deles têm idade a partir de 50 anos.

Como a primeira ocupação da estrada e reabertura ocorreu em 1997, também é

possível afirmar que a maioria dos entrevistados lembra-se do fato, e alguns até mesmopodem ter participado desta ocupação, ocorrido há apenas nove anos atrás.

A maior parte dos entrevistados (de 16 a 50 anos) possuía o ensino fundamental emédio completo ou em conclusão. No público acima de 50 anos predominou o ensinofundamental completo e incompleto.

Em relação a ocupação dos entrevistados, 58% eram autônomos, 28% agricultores,23% funcionários do setor privado, 16% funcionários públicos, 21% do lar. O percentualenvolvendo aqueles que ainda estudam é de 33%, sendo que destes a maioria possui umaocupação geradora de renda.

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3.2. Fechamento da estrada como fator prejudicial a família e ao município doentrevistado

Ao serem questionados neste aspecto, 84% responderam afirmativamente, 15%respondeu negativamente e apenas 1% não soube dizer. Dos que respondeu “sim”, a maiorparte (58%) se encontra na faixa etária acima de 37 anos. Ainda neste tópico, 32% dos queafirmaram que o fechamento da estrada os prejudicou estão aqueles que têm ocupação comoautônomos. Dentre aqueles que responderam “não”, também se encontram os trabalhadoresautônomos e ainda os estudantes. Interessante observar que o grupo dos comerciantes, querepresentou 17% do total de entrevistados, praticamente 97% deles respondeuafirmativamente a esta questão. O comércio dos municípios do entorno da estrada tem sidoapontado nos discursos (políticos e moradores do entorno), como o setor econômico maisprejudicado pelo fechamento da estrada, conforme pode ser observado abaixo.

3.2.1. De que forma o fechamento ocasionou em prejuízo?

O prejuízo ao comércio e ao desenvolvimento dos municípios contou com odepoimento de 81,7% dos entrevistados. Dentre esses, a maioria era formada por comerciantee trabalhador autônomo. Os mesmos disseram que os principais problemas acarretados foramo aumento dos custos com o frete, ao mesmo tempo em que caiu o movimento do comércio,uma vez que a população ficou “isolada” e ainda que o fechamento da estrada foi responsávelpela estagnação do desenvolvimento da região, inibindo a instalação de empresas e micro-indústrias na região.

Ainda, nesta questão, 33,7% também citou como um dos prejuízos, o distanciamentodos parentes que moravam em cidades vizinhas e até mesmo no Rio Grande do Sul e SantaCatarina. A maior parte dos entrevistados que citou esse aspecto possui idade acima de 47anos e é composto basicamente pelos agricultores aposentados e aquele público comocupação do lar. Esse resultado não gera surpresa, uma vez que a população acima de 50 anosapresenta, até por questões culturais e de tradição, o hábito de visitar os parentes com maisfreqüência. Ainda nesta questão é importante ressaltar que houve entrevistados que citaram asduas situações: prejuízo econômico e distanciamento dos parentes.

3.3. Motivo do Fechamento da Estrada

Nesta questão, parte dos entrevistados citou duas possibilidades e parte citou apenasuma. As respostas foram as seguintes: 33 % responderam que as razões para o fechamento sãoambientais, 39% que são razões de ordem política e 28% disseram não saber a razão dofechamento. No aspecto político alguns disseram que os “prefeitos, vereadores e o IBAMA,não chegaram a um acordo”. Também alguns disseram “ter ouvido falar”, através de“comentário do povo”, que houve mau uso do recurso do pedágio por uma prefeitura que oadministrava, não repassando parte desse recurso ao IBAMA e que por isso a estrada foifechada.

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Esses dados sinalizam que há falta de informação correta chegando até a população,uma vez que somente 33% dos entrevistados têm o conhecimento correto do fechamento queé a questão ambiental. Se isso corresponde a realidade, precisa ser melhor explorado pelosetor técnico do PNI e pelas administrações municipais no sentido de deixar a populaçãoinformada sobre as reais razões para a impossibilidade de se manter a estrada aberta, sob orisco de propiciar que a falta de informação venha a justificar um discurso que incentive aocupação da área novamente, baseando-se em discursos que podem na realidade estar semfundamentação.

A maioria dos entrevistados que respondeu ser a questão ambiental o principal motivodo fechamento afirmou que esta informação lhes foi repassada através dos meios decomunicação, mas a maioria deles (65%) não se lembra como teve acesso à informação.

3.4. Contra ou a Favor da Reabertura da Estrada do Colono

Do total de entrevistados, 95% se posicionaram favoravelmente a abertura da estrada,2,9% se mostrou contrário e 1,9% não opinou.

3.4.1. Quanto à justificativa dada

Houve mais de uma resposta por parte de alguns entrevistados neste aspecto e asrespostas ficaram divididas da seguinte forma:

Justificativas apresentadas para serem favoráveis (do total de 95% queresponderam ser favoráveis)

• Desenvolvimento dos municípios: 77,3%• Visitar os parentes: 10%• Direito de ir e vir: 9,0%• Para a população participar da proteção do parque: 6,9%

Justificativas dadas para serem contrários (do total de 2,9% que responderamser contrários)

Neste tópico a maioria argumentou ser contra a abertura justificando que a violênciapode aumentar nos municípios pela “facilidade de bandidos conseguirem acesso pela estrada,inclusive como rota de fuga”. A segunda argumentação dada por um menor número deentrevistados foi o fato de acreditarem que a estrada impacta negativamente o meio ambientelocal.

3.5. Maiores beneficiados com a abertura da estrada

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Nesta questão também houve mais de uma resposta. Segundo os entrevistados osmaiores beneficiados seriam nesta ordem:

• População e comercio do entorno (gerando desenvolvimento): 93 %• Parque e o meio ambiente: 4%• Não souberam responder: 2, 5 %

Conforme já destacado no item 3.2.1, um dos argumentos mais utilizados nosdiscursos seja de políticos seja dos moradores do entorno, e os dados desta pesquisacomprovam isso, é o fato de que o fechamento da estrada causou uma espécie de inércia nodesenvolvimento econômico regional e têm como esperança que a sua reaberturaproporcionaria uma melhoria substancial no que tange a esse aspecto. No entanto, essapremissa é pouco provável de ser verdadeira, haja vista, que dados do IBGE e de estudosfeitos por pesquisadores da agricultura familiar e do desenvolvimento rural e de estudo doterritório do Oeste e Sudoeste do Paraná têm mostrado como característica dessa região, é quenas últimas três décadas, a diminuição da população rural tem representado um agravantedesse processo aliado ao apontamento, ainda em fase de estudos mais recentes, de ospequenos agricultores (agricultores familiares) do entorno estarem vendendo suaspropriedades para grandes produtores, sobretudo, aqueles interessados em ampliar a áreacultivada com soja, tornando assim a região no caminho de uma área de concentração deterras e de uma região de monocultura, o que poderá vir a desestabilizar a agricultura familiarcom sua identidade de uma produção menos impactante ao meio ambiente, por ser possível deinvestir na produção de orgânicos, atividade esta benéfica e mais sustentável para o entornodo PNI. No entanto, não há apontamentos de que essa redução da população rural na regiãoesteja ligada ao fechamento da estrada do colono e sim a uma questão de política econômicanacional e global.

Por outro lado, Dias (2006), aponta que o fechamento da estrada impossibilitou umaligação geográfica estratégica com Medianeira e Foz do Iguaçu via BR 277, municípios estesde importância turística que se destaca nacionalmente. Neste caso, uma vez a estrada estandoaberta seria mais um atrativo turístico, podendo sim vir a ser uma fonte, alternativa, geradorade renda e de emprego para os municípios do entorno do parque, sobretudo, para Capanema eSerranópolis do Iguaçu.

3.6. Percepção sobre impactos ambientais negativos no período em que a estradapermaneceu aberta

O objetivo desta questão foi investigar se os moradores do entorno perceberam osdanos causados à biodiversidade de PNI durante o período em que a mesma permaneceuaberta e enumerar quais foram esses impactos percebidos. Neste caso, 89% dos entrevistadosdisseram que não acreditam ter havido nenhum dano ao meio ambiente com a ocupação eabertura da estrada, e as razões mais utilizadas por eles, neste caso, foi o fato de nunca teremvisto animais atropelados na estrada. Houve ainda argumentos de que mesmo sem a utilizaçãoda estrada pessoas entram no PNI para caçar e coletar palmito e, ainda, que os animais sãoatropelados mais na rodovia do que na referida estrada quando esteve aberta para uso público.Outra argumentação utilizada pelos entrevistados é o fato de haver em grande parte doentorno muitas lavouras de soja e outras atividades agrícolas onde o uso de agrotóxico é

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imenso e tem causado poluição nos rios e que as pulverizações de agrotóxico são levadas pelovento prejudicando plantas e animais que habitam o local.

Do total de entrevistados apenas 6,7% entendem que com a estrada aberta a facilidadede acesso ao interior do parque é maior e que isso pode sim, causar alguns impactos com afacilidade para caça e extração do palmito, além de facilitar o atropelamento de animais ecausar poluição pelos escapamentos dos carros. O restante, 3,8% não soube responder a estaquestão.

3.7. Sugestões da População para o Impasse

Neste item foi perguntado ao entrevistado se o mesmo tinha uma proposta, umasolução que acreditava ser importante para resolver o impasse. As propostas foramenquadradas conforme a seguir:

• Abertura da Estrada, porém com estabelecimentos de regras: com guarita, tráfegosomente durante o dia, criação de túneis e passarelas para animais, acompanhado deum constante trabalho de educação ambiental, implantação de trilhas ecológicas paraturismo: 89 %

• Estrada aberta nos moldes de antes: 5%• Deixar a estrada fechada: 2,9%• O restante não soube ou não quis responder a esta questão.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

O resultado do trabalho realizado aponta para alguns fatores importantes e comoconclusões serão destacados aqueles considerados mais relevantes para a contribuição aodebate.

Primeiramente sinaliza a confirmação de que a população lindeira do PNI, da área deabrangência da “Estrada do Colono”, se sente lesada com o seu fechamento, em todos osaspectos. Culturais e Sociais – devido à ampliação da distância entre os municípios e adificuldade para manter contato entre os parentes. Econômicos – porque acreditam que aregião ficou empobrecida e estagnada com o fechamento da estrada. No primeiro caso, essajustificativa é plausível, pois realmente os laços de parentesco podem ter sido impactados e éimportante destacar que a manutenção desses laços de “visitas” aos parentes foi destacadapelos entrevistados com idade superior a 50 anos.

No entanto, no aspecto econômico não há dados suficientes que comprovem que ofechamento da estrada tenha sido a responsável pela atual estagnação econômica queporventura esteja sendo registrada nos municípios envolvidos. Conforme discutidoanteriormente (após o item 3.5), dados de pesquisas tem apontado que os municípios dointerior da região Oeste e Sudoeste Paranaense têm enfrentado dificuldades no que tange aosavanços no desenvolvimento regional, devido à diminuição da população rural e a baixasiniciativas em prol do desenvolvimento de uma agricultura alternativa, que possa impulsionara agricultura familiar como atividade prioritária e mantenedora das condições de reproduçãoeconômica e social da população rural. Além disso, não se tem percebido efetivo estímulo àimplantação e manutenção de uma agricultura de produção sustentável, como o investimentoem produção orgânica, por exemplo, exceto em casos isolados do município de Capanema.

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Assim sendo, a população está mal informada sobre as reais causas da estagnação econômicada região, o que a torna vulnerável ao discurso político que se utiliza de falsas premissas paracolocar a população na “frente de batalha” pela reabertura da estrada.

No aspecto ambiental, a população acredita não haver impacto negativo àbiodiversidade a partir da reabertura da estrada. No entanto, sua percepção é baseada nasituação imediata e naquilo que é visto, conforme já foi demonstrado. Citaram por exemplo, ofato de não ver animais atropelados e, ou, árvores sendo cortadas por parte da população. Noentanto, ficou claro que os mesmos não têm a percepção daqueles impactos não vistos(aqueles descritos no Plano de Manejo). O que se justifica, pois são informações técnicas e deacesso do conhecimento de áreas técnicas e muitas vezes muito específicas e restritas à áreados pesquisadores da fauna e da flora.

Deixamos registradas duas sugestões tanto para os gestores do PNI, quanto para osdirigentes dos municípios do entorno da “Estrada do Colono”:

• Informar a população corretamente a respeito da real situação dos municípios nocontexto do desenvolvimento regional, permitindo-as visualizar que a reabertura daestrada em muito pouco poderia contribuir para o desenvolvimento local e regional.Neste caso, através de um excelente projeto de Ecoturismo. Além de informar apopulação, promover políticas públicas e coloca-las em ação de maneira que a regiãoencontre seu caminho; investimento na agricultura familiar sustentável no sentido deimpedir a venda das pequenas propriedades em prol da ampliação dos cultivos dasgrandes lavouras consumidoras de agrotóxico.

• Longo trabalho de educação ambiental, fornecendo, inclusive, informações técnicasonde mostrem claramente que os impactos negativos da estrada não estão apenasnaquilo que é visto “a olho nu”, mas naqueles efeitos que muitas vezes estão ocultos,mas que terão efeitos a médio e longo prazo.

5. REFERÊNCIAS

AGIR AZUL NA REDE, EcoAgência. Disponível emhttp://www.agirazul.com.br/fsm4/_fsm/colono.htm . Acessado em 16/09/2006. BONASSA, T. L. 2004. Estrada do Colono - ações e práticas discursivas na relação dohomem com a natureza no Parque Nacional do Iguaçu. UFPR. Curitiba. Dissertação deMestrado. 139 p.DIAS, E. S. 2006. Desenvolvimento Regional e Conservação Ambiental: a “estrada docolono” como via de (des)integração do Oeste –Sudoeste Paranaense. UNESP. PresidentePrudente. Tese de Doutorado.OESTE - REVISTA DE INFORMAÇÃO. 1997. Ano XII, nº 124. Maio/Junho. Cascavel. 34p.SOUZA LIMA, R. 2004. Diagnóstico Rural (Rápido) Participativo: proposta metodológicapara trabalhos em assentamentos e comunidades rurais. Mini-Curso – In: PLEIN, C., et al.

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(orgs.) Interdisciplinaridade no Contexto Universitário. Francisco Beltrão: UNIOESTE.p.53-58.URBAN, T. 2002. Parque Nacional do Iguaçu: caminho aberto para a vida. Curitiba: RedeNacioanal Pró-Unidades de Conservação, Rede Verde de Informações Ambientais. 112 p.VELHO, G. 1994. Individualismo e Cultura: notas para uma antropologia da sociedadecontemporânea. Rio de Janeiro: Zahar. 131p.

Agradecimentos: Aos acadêmicos do curso de Ciências Biológicas da Universidade Estadualdo Oeste do Paraná – Cascavel, que realizaram as entrevistas.

Londrina, 22 a 25 de julho de 2007,Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural

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