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A laicidade em uma sociedade pós-secular
Rodrigo Coppe Caldeira
Sérgio Murilo Rodrigues
Resumo
A modernidade prometeu o fim das religiões. No entanto, a
promessa não se cumpriu e vemos hoje tanto um aumento
significativo no número de crentes na população mundial, quanto
da influência política das religiões na esfera pública. A questão
colocada é: Quais são as relações entre o processo de
secularização, o cristianismo, o princípio da laicidade, e a
formação do Estado moderno? Tendo em vista tal questão, e em
busca de bibliografia sobre o tema, deparamo-nos com dois
filósofos alemães, que pensaram o tema: Jürgen Habermas, mais
conhecido entre nós, e Ernst-Wolfgang Böckenförde, pouco estudado
ainda no Brasil. Esta comunicação traz os primeiros passos nesse
campo minado e assinalado por inúmeras interfaces entre a
história, sociologia, filosofia, direito e, por que não, a
própria teologia, já que o debate, por exemplo, em torno de
conceitos como “natureza” e “graça”, milenar fundamentais na
cosmovisão cristã, chega até os dias atuais trazendo em seu
centro a discussão em torno das possibilidades daquilo que foi
chamado um dia de “homem emancipado”. Assim, busca-se nessa Doutorado em Ciência da Religião pela Universidade Federal de Juiz de Fora. Professor do IFTDJ da PUC Minas. Email: [email protected] Mestre em Filosofia pela Universidade Federal de Minas Gerais. Professor do IFTDJ da PUC Minas. Email: [email protected]
2
comunicação: apresentar o problema de fundo, trazer a
contribuição específica de Böckenförde sobre o debate em torno do
surgimento do Estado secular, a interpretação habermasiana sobre
o tema.
Palavras-chave: Habermas. Böckenförde. Laicidade. Esfera
pública. Política.
1. Introdução
Uma das contemporâneas e centrais discussões acerca das
religiões relacionam-se com a reflexão em torno de seu lugar no
espaço público dos Estados constitucionais liberais. O debate,
certamente não é novo1, mas sua importância cresce à medida que o
paradigma da secularização passou a ser questionado e as novas
configurações sociais e dos humores emergiram no mundo com o fim
da Guerra Fria e a crise das metanarrativas. Partindo dessa nova
conjuntura, decidimos pesquisar os autores que se debruçam sobre
o tema, e construímos uma pergunta norteadora: quais as relações
entre o processo de secularização, o cristianismo, o princípio da
laicidade, e a formação do Estado moderno?
Tendo em vista tal norte, e em busca de bibliografia sobre o
tema, deparamo-nos com dois filósofos alemães, que pensaram o
tema: Jürgen Habermas, mais conhecido entre nós, e Ernst-Wolfgang
Böckenförde, pouco estudado ainda no Brasil. Anteriormente1 Max Weber, por exemplo, trata em sua Sociologia do Direito da emergência doselementos que darão forma ao direito moderno ocidental, apontando para o lugardo processo de secularização do Estado como fundamental, e o lugar da religiãocristã nesse processo. Cf WEBER, Max. Economia e sociedade. v. 2. Brasília:UNB, 1999, p. 1-153.
3
tivemos contato com a perspectiva de Böckenförde no debate entre
Joseph Ratzinger e Jürgen Habermas publicado no país como Dialética
da secularização. O texto foi também publicado em Entre Naturalismo e
Religião (2007). O filósofo de Frankfurt partia de uma questão do
jurista alemão para iniciar sua intervenção: “Será que o Estado
liberal secularizado se alimenta de pressupostos normativos que
ele próprio não é capaz de garantir?” (HABERMAS; RATZINGER, 2007,
p. 23). Eis uma das questões de fundo de Böckenförde, a de pensar
os fundamentos da validade das normas do Estado liberal das
comunidades políticas que agrega e mantém “sob custódia”. As
reflexões de Böckenförde relacionam-se com o debate mais geral
sobre o lugar da religião no Estado moderno, seu papel e atuação
nas instituições democráticas, seus limites e possibilidades como
agente político.
Esta comunicação traz os primeiros passos nesse campo minado
e assinalado por inúmeras interfaces entre a história,
sociologia, filosofia, direito e, por que não, a própria
teologia, já que o debate, por exemplo, em torno de conceitos
como “natureza” e “graça”, milenar fundamentais na cosmovisão
cristã, chega até os dias atuais trazendo em seu centro a
discussão em torno das possibilidades daquilo que foi chamado um
dia de “homem emancipado”. Assim, busca-se nessa comunicação:
apresentar o problema de fundo, trazer a contribuição específica
de Böckenförde sobre o debate em torno do surgimento do Estado
secular, a interpretação habermasiana sobre o tema.
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É mister reafirmar a importância desse debate atualmente.
Num mundo “pós-secularizado”, como se costuma dizer, a presença
das religiões na esfera pública e no debate político é
inconteste. É preciso maior reflexão sobre as relações entre a
religião e a política no cenário do Estado democrático de
direito, especialmente na contemporaneidade, já que se observa
marcante presença de grupos religiosos buscando participar de
maneira mais incisiva nos processos democráticos. A constatação
de que aparece um mundo “pós pós-metafísico”, no qual as
tradições religiosas desempenham papel de partners legítimos dos
debates políticos.
2. O Problema
Na história do mundo ocidental, o surgimento da modernidade
significou uma marcante mudança na maneira pela qual as pessoas
viviam e pensavam. Até então, as tradições religiosas detinham o
papel fundamental de fornecer as visões de mundo legitimadoras de
sentido para o mundo. Com a modernidade ocorre um processo de
secularização ou dessacralização do mundo, ou seja, a substituição do
pensamento religioso por um pensamento racional iluminista.
Segundo Habermas, (1990, p.13), o processo de secularização levou
à desintegração das concepções religiosas de mundo promovendo uma
profanização das sociedades modernas.
Para Max Weber (1864-1920), a progressiva racionalização da sociedade
ocorreu com o predomínio da ação racional no que respeita aos fins em
5
detrimento dos outros tipos de ação2, com a burocratização
eficiente do Estado e com a autonomia das três principais esferas
axiológicas, a saber, ciência, moral e arte (ROUANET, 1987,
p.209). Ora, para ocorrer a racionalização, necessitava-se de um
processo de secularização e por sua vez, o processo de
secularização era provocado pela a racionalização social. Com
isso, as visões de mundo religiosas iam perdendo seu poder
legitimador e sendo substituídas por outras caracterizadas por
uma racionalidade aparentemente isenta de valores religiosos3.
O progresso da ciência provoca o desenvolvimento de uma
visão de mundo centrada na razão humana e na sua capacidade de
explicar todos os fatos através de conexões causais que só
poderiam ocorrer em um mundo desencantado. Segundo José Carlos de
Souza,
A matematização e a quantificação da natureza provocaram umprofundo impacto na autocompreensão do homem ocidental e deseu mundo. O mecanismo da física newtoniana colocou emxeque a antiga concepção do mundo como um cosmos sagrado. O
2 Segundo Weber, a ação social pode ser classificada em quatro tipos: 1. Racionalno que respeita aos fins: determinada por expectativas de comportamento tantode objetos do mundo exterior como de outros homens, e utilizando essasexpectativas como ‘condições’ ou ‘meios’ para a realização de fins própriosracionalmente medidos e perseguidos. 2. Racional no que respeita aos valores:determinada pela crença consciente no valor – ético, estético, religioso ou dequalquer outra forma como seja interpretado – próprio e absoluto de umadeterminada conduta, sem relação alguma com o resultado, ou seja, pelo simplesmérito desse valor. 3. Afetiva: especialmente emotiva, determinada por afetosou estados sentimentais atuais e 4. Tradicional: determinada por um costumeentranhado (WEBER, 1983, p.75-76).3 Utilizamos o termo aparentemente, porque hoje sabemos que esse processo não seconcretizou de forma plena. Continuamos a construir mitos, como o da própriarazão, da ciência e do Estado (CASSIRER, 2003), no entanto, não resta dúvidas deque a ideia de um mundo racional secular libre de qualquer pensamento mítico-religioso domina o imaginário social.
6
atomismo subjacente a um universo mecânico desafia aspressuposições básicas de uma teologia da história (SOUZA,2005, p.34).
O sucesso prático da ciência, bem com seu uso nos processos
de industrialização desenvolvidos pelo capitalismo, difundiu a
visão de mundo secular-científica pela população em geral,
abarcando até mesmo os religiosos.
A ciência começa a exercer sua influência sobre a própriareligião, e a extensão dessa influência pode ser mais bemapreciada quando consideramos que o discurso religiosopassa a se referir a supostas evidências “científicas” comofundamentação de sua própria atividade (SOUZA, 2005, p.48).
Todos os projetos iluministas defenderam a total substituição
do pensamento religioso pela racionalidade científica. Ele foi
aparentemente bem sucedido, na medida em que as tradições
religiosas perdem gradativamente o seu espaço na esfera pública,
passando a ter uma atuação apenas privada.
No entanto, não foi isso o que aconteceu. As tradições
religiosas não desapareceram, mas se reconfiguraram nos novos
espaços sociais. 4 E, pelo contrário, o fenômeno religioso se
expandiu 5 e voltou a assumir, desde a última década do século
XX, uma posição de destaque na política.
No entanto, o mundo acadêmico e grupos que defendem uma
agenda liberalizante de costumes têm preferido simplesmente reafirmar
4 HERVIEU-LEGER, D. O peregrino e o convertido. A religião em movimento.Petrópolis: Vozes, 2008.5 Cf CASANOVA, José. Public religions in the modern world. Chicago: Universityof Chicago Press, 1994.
7
a necessidade de um Estado laico considerando a esfera pública da
política como um lugar inapropriado para religiosos. Trata-se de
uma compreensão muito restrita da laicidade do Estado e sua
relação com as religiões. Nessa compreensão, o Estado democrático
não daria voz aos cidadãos religiosos, o que não corresponde às
garantias e direitos de um Estado democrático liberal. Para
Habermas, “independientemente de su peso en términos numéricos, las comunidades
religiosas pueden obviamente reclamar un “sitio” en la vida de las sociedades
modernas” (HABERMAS, 2008, p.7).
É perfeitamente possível a existência de um Estado laico com
a participação política de religiosos, inclusive nos cargos
eletivos. Isso não significa abandonar a ideia de uma sociedade
democrática secular, mas, talvez, fosse mais adequado o termo pós-
secular. Sociedades regidas em suas orientações gerais por normas
não-religiosas (não sacralizadas), mas convivendo de forma
interativa com os valores religiosos (sagrados).
Habermas em seu livro A constelação pós-nacional (1998) argumenta
a favor de uma cultura democrática pós-nacional, ou seja, um pensamento
democrático não limitado pelos interesses nacionais de um Estado
tradicional com as suas fronteiras bem delimitadas. O filósofo
pensa em cidadãos capazes de vínculos de solidariedade com outros
cidadãos não importando o país de origem deles, em outras
palavras, uma consciência de solidariedade cosmopolita.
Ora, as tradições religiosas formam não somente uma
comunidade de crentes, mas também uma comunidade moral, que
compartilha uma concepção de bem moral e por derivação um código
8
de conduta. Elas criam laços de solidariedade em torno de uma visão-
de-mundo sem fronteiras nacionais. Nesse sentido, as comunidades
morais religiosas possuem um importante papel no aspecto da
motivação para a ação solidária e a criação de vínculos sociais.
Se as tradições religiosas possuem uma grande capacidade de
gerar uma consciência de solidariedade universal, elas igualmente
possuem uma grande capacidade de gerar violência, pois o discurso
religioso teria uma grande dificuldade para aceitar a contra-
argumentação. Uma das características dos discursos religiosos é
a fidelidade excludente. O discurso assume o compromisso de agir
ativamente para a expansão de uma crença específica e no combate
a todas as crenças diferentes dela. A fidelidade a uma tradição
religiosa exclui a possibilidade de reconhecimento de outras
tradições religiosas, bem como de tradições não-crentes.
Assim, Habermas defende um processo de mútuo aprendizado entre
as tradições seculares e as tradições religiosas. Esse processo é
atualmente favorecido pelo fato de vivermos em uma sociedade pós-
secular, na qual diferentes comunidades religiosas convivem com uma
estrutura jurídica, política e social secular, participando
ativamente desta estrutura. As tradições religiosas podem
aprender com a estrutura argumentativa da democracia que valoriza
o contraditório e as tradições seculares podem aprender sobre
comunidades morais solidárias.
A expressão “pós-secular” foi cunhada com o intuito deprestar às comunidades religiosas reconhecimento públicopela contribuição funcional relevante prestada no contextoda reprodução de enfoques e motivos desejados. Mas não é
9
somente isso. (...) Na sociedade pós-secular impõe-se aideia de a “modernização da consciência pública” abrange,em diferentes fases, tanto mentalidades religiosas comoprofanas, transformando-as reflexivamente. Neste caso,ambos os lados podem, quando entendem, em comum, asecularização da sociedade como um processo de aprendizagemcomplementar, levar a sério, por razões cognitivas, as suascontribuições para temas controversos na esfera pública(HABERMAS, 2007, p.126).
Em uma sociedade pós-secular as tradições religiosas voltam
a ter força política, só que agora submetidas às regras comuns a
todos na esfera pública. Valores morais6 de tradições religiosas
são assumidos pela tradição cultural como pressupostos de ação
correta mesmo por parte de não crentes.
No Brasil percebemos que representantes de diversas
comunidades religiosas se fazem presentes em veículos de
comunicação de massa que atingem indistintamente milhares de
crentes e não crentes Muitos líderes religiosos, nos últimos
anos, passaram a pleitear o fórum público para o exercício do
poder secular, tendo assento nas câmaras de vereadores,
deputados, senadores e em cargos do executivo. São os chamados
políticos religiosos, que uma vez eleitos irão legislar e administrar
bens públicos.
A questão que se coloca é acerca do lugar e da legitimidade
de um representante de uma comunidade religiosa assumir uma
representação política na esfera pública através da via
eleitoral. Será ele capaz de representar o interesse público ou,
preso à fidelidade excludente, se reduzirá a representar interesses
teológicos de sua tradição religiosa? 6 E não valores teológicos
10
3. O nascimento do Estado secular
Um ponto que se desdobra desse importante debate sobre o
lugar das religiões na esfera pública nos Estados liberais é
aquele que se refere aos fundamentos filosóficos e religiosos da
formação dos pressupostos que sustentaram as suas garantias
centrais. As relações entre o surgimento do Estado moderno e seus
pressupostos e a religião cristã é uma importante faceta dessa
reflexão.7
Tomamos como referência principal para o caso as reflexões
construídas por Ernest-Wolfgang Böckenförde sobre a temática.
Como não poderia ser diferente, Böckenförde situa o processo de
secularização no mundo ocidental, especialmente sua relação com o
cristianismo e a emergência do Estado moderno, que entende como
forma de orientação política que se desenvolveu na Europa, do
século XIII ao final do século XVIII8. Para o filósofo, tal
processo seria um aspecto histórico-constitucional da formação do
Estado, ou seja, pensar a formação do Estado moderno
necessariamente implicaria um olhar analítico desse processo.
(BÖCKENFÖRDE, 2010)
7 Entre outros lembrabmos: ALEXANDER, Frank S.; WITTE, John. Christianity andlaw. An Introduction. New York: Cambridge University Press, 2008; TIERNEY,Brian. Religion, law and the growth of constitutional thought. 1150-1650. NewYork: Cambridge University Press, 1982. TIERNEY, Brian. Foundations of theconciliar theory. New York: Cambridge University Press, 1968; BERMAN, HaroldJ. Law and revolution. The formation of the Western Legal Tradition.Cambridge: Harvard University Press, 1983. 8 Cf ELIAS, Norbert. O processo civilizatório. Rio de Janeiro: Zahar, 2001.
11
O autor também chama atenção para uma outra faceta desse
complexo processo: o destacamento do ordenamento político da sua
determinação e formação espiritual-religiosa, a sua
“mundanização” no sentido da saída de um mundo político-religioso
unitário e preexistente em vista de uma sua finalidade e
legitimação concebida em sentido mundano, e, enfim, a separação
do ordenamento político da religião cristã, e de qualquer
religião determinada, como próprio fundamento e fermento. Este
desenvolvimento também entra no desenvolvimento do Estado. Sem
ele não se pode entender tal processo.
O autor afirma que quando se fala em secularização em
relação ao nascimento do Estado, se pensa, muitas vezes, na dita
declaração de neutralidade em relação às questões de verdade
religiosa, que vem pronunciado e traduzida na prática por muitos
homens e pensadores políticos para encontrar um novo fundamento
universal do ordenamento político, para além e independentemente
da religião, ou de uma religião determinada. Segundo Böckenförde
(2007), o reconhecimento estatal da liberdade de confissão como
primeiro direito fundamental dos cidadãos, não foi o início
daquele processo, mas uma etapa.9
De maneira introdutória, Böckenförde diz que o conceito de
secularização foi originalmente utilizado na linguagem jurídica
para indicar a subtração de um bem, de uma propriedade, do
controle eclesiástico, sendo documentado pela primeira vez nos
9 Um interessante estudo sobre a relação da Igreja Católica Romana e osdireitos humanos pode ser encontrado em MENOZZI, Daniele. Chiesa e dirittiumani. Legge naturale e modernità politica dalla Rivoluzione francese ainostri giorni. Bologna: Il Mulino, 2012.
12
tratados da Paz de Westfália no século XVII, para indicar a
liquidação dos bens eclesiásticos. Depois da apropriação por
Napoleão dos bens da Igreja no início do século XIX em França, a
palavra, nos ambientes eclesiásticos, passa a ter conotação
negativa, como usurpação, uma ilegítima emancipação do controle
da Igreja. De qualquer forma, o filósofo afirma que o início do
processo de secularização teria origens remotas, como a conhecida
Luta das Investiduras (1057-1122), quando se fundamenta a antiga
unidade político-religiosa da orbis christianus, e nasce a distinção e
separação entre espiritual e mundano que até o momento é um tema
fundamental da história européia. (p.35). Dessa forma, para
Böckenförde, a modernidade não ‘rompe’ com o cristianismo, mas
este último a influencia desde os primórdios, desde a luta em
torno das Investiduras. (Gregório VII, século XI, bases da
Reforma Gregoriana, Dictatus Papae – 27 proposições que tratam da
autoridade, competência e poderes do papa.10
Como afirma o filósofo, toda a importância da Luta das
Investiduras como processo de secularização deve ser lida
considerando a unidade da res publica christiana, que vem por ela
dissolvida. O cristianismo se apresentava como a base reconhecida
do ordenamento político, carregado de formas sacrais e
religiosas, tal ordenamento abraçava todos os setores da vida,
não ainda distinto em “espiritual” e “mundano”, “Igreja” e
“Estado”. Afirma o filósofo:
10 Berman (1983) defende posição semelhante, quando fala da "origem da tradiçãolegal do Ocidente na revolução papal" com a Reforma de Cluny e do Dictatus Papae.
13
O “Império” vive assinalado pela teologia cristã dahistória e da espera escatológica. “Imperador e papa nãoeram representantes do ordenamento espiritual e mundano,mas se encontravam ambos dentro da mesma ecclesia comotitulares de diversas funções (ordines), onde o imperador,enquanto chefe e defensor da cristandade, era uma pessoaconsagrada e santificada pelo papa [...] ambos viviam a respublica christiana como unidade político-religiosa (2010,p.36).
Assim, na prática jurídica e na vida cotidiana se trata de
um mundo unitário, assumindo a fé a forma de um vínculo político-
religioso e jurídico. Segundo Böckenförde (2007), o íntimo
princípio que possibilitou essa luta e que teve implicações para
além de um simples conflito de poder foi a separação entre o
espiritual e o mundano. Elaborada pela teologia nos seus inícios,
tal separação se torna a verdadeira arma intelectual na Luta das
Investiduras. Os titulares do ofício espiritual reivindicaram a
si tudo quanto se ligava à espiritualidade, à santidade, à
sacralidade e à ecclesia. O imperador é expulso dessa nova ecclesia,
no que tange o espaço espiritual, e vem relegado à mundanidade;
não era mais uma pessoa consagrada, mas um leigo como todos os
outros crentes. A expressão desse novo ordo foi o Dictatus papae. O
ordenamento político enquanto tal é expulso da esfera
sacramental, sendo como afirma Böckenförde (2007),
“dessacralizado e secularizado”. E mais: “aquilo que era
entendido como uma desvalorização, para bloquear a pretensão de
domínio do imperador no campo da ecclesia, tornou-se, na inelutável
dialética dos processos históricos, uma emancipação.” (p. 38). Ao
fixar a relação entre o espiritual e o mundano, de qual agora
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tudo dependia, o espiritual podia e devia, em uma sociedade
obviamente cristã, afirmar a própria superioridade: o soberano do
mundo cristão, e como tal submetido aos mandamentos do
cristianismo, sobre cuja interpretação e observância é tarefa do
poder espiritual.
Para o filósofo alemão, buscando por séculos, a partir da
Luta das Investiduras, afirmar a supremacia eclesiástica, o papado
contribuiu substancialmente a fazer com que os titulares do poder
mundano descobrissem a autonomia. Essa seria uma primeira fase do
processo de secularização, somada a um segundo momento, aquela
inaugurada pela Reforma protestante. Segundo Böckenförde (2010),
Dessas guerras de religiões resultou, se se prescinde dasua evolução na Espanha, a segunda fase da secularização, oEstado da estrutura puramente mundana e política; com seunascimento se teve também a decisão de separação em linhade princípio entre religião e política. (p.42)
A distinção entre o “espiritual” e o “mundano”, empregada
inicialmente entre os papas a fim de motivar a supremacia
eclesiástica, desenvolvia-se agora a sua eficácia em direção ao
primado e a supremacia da política. Böckeförde (2010) cita como
exemplo do período o Edito de Nantes (1598), que permitia que um
indivíduo poderia ser cidadão do reino e gozar de todos os
direitos civis mesmo que não pertencesse a “verdadeira religião”
(p.44). Dali em diante os calvinistas franceses poderiam
professar sua fé, mesmo que a religião oficial do Estado
continuasse o catolicismo. O edito assim foi a primeira tentativa
no história de reconhecer duas religiões em um mesmo Estado. A
15
constatação de Böckenförde (2010) é a de que a solução teórica
sobre a relação entre o poder espiritual e o poder mundano, entre
religião e política, encontra a sua mais clara expressão teórica
na doutrina do Estado de Thomas Hobbes. Para Hobbes, somente a
natureza das necessidades humanas – já que estamos na seara do
jusnaturalismo – a salvaguarda dos bens elementares à vida,
referentes à existência material; a vocação religiosa do homem, a
religião como bem da vida humana não estava incluída. Em Hobbes
vem claramente expressa, segundo Böckenförde (2010), a finalidade
puramente secular do Estado, orientado para as coisas do mundo e
independente da religião. Para o filósofo alemão, a motivação do
Estado em Hobbes, não procede da fé cristã, nem dela depende, se
encontrando no terreno da pura natureza das necessidades e da
razão.
O Estado saído das guerras religiosas e prefigurado no
pensamento de Hobbes aparecerá na Revolução Francesa,
especificamente na Declaração do homem e do cidadão11, como corps social e
sua razão de ser e legitimidade não tem como base um desejo
divino, nem uma finalidade que vise a verdade, mas tem como
referimento a liberdade pessoal singular e a autodeterminação dos
indivíduos. A religião é relegada a ser uma questão de cunho
privado, de interesse de cada indivíduo, não sendo assim uma
questão que componha o ordenamento estatal em quanto tal. A
liberdade religiosa é um valor do Estado moderno e contém não
somente o direito de a professar privada ou publicamente, mas
11 Cf BRANDÃO, Adelino. Os direitos humanos. Antologia de textos históricos.São Paulo: Landy, 2007.
16
também de não professar nenhuma. “A medida na qual a liberdade
religiosa é realizada indica a medida de secularidade do Estado”,
diz Böckenförde (2007, p.49).
Questão importante para o filósofo é aquela que se interroga
sobre em qual medida a dessacralização do ordenamento político,
completada com o nascimento do Estado moderno, significa também
uma “descristianização”. A resposta, afirma, depende
essencialmente da interpretação teológica e histórico-filosófica
que se faz do processo de secularização. Outra pergunta, mais
fundamental que a primeira, de acordo com Böckenförde (2007), é a
seguinte: de que vive o Estado, aonde encontra a força que o
sustenta e garante a homogeneidade e as intrínsecas virtudes
regulativas da liberdade, das quais necessita como força
vinculante, já que a religião não é e nem pode ser? A eticidade
se pode fundar e manter em via intramundana e secular, o Estado
pode edificar-se sobre uma “moral natural”? Em qual medida os
povos reunidos em um Estado podem viver somente da garantia da
liberdade do indivíduo, sem um vínculo unificador pré-existente a
esta liberdade? (p.52). Dessas questões surge, então, a afirmação
de Böckenförde da qual partiram Habermas e Ratzinger em seu
famoso debate: “o Estado liberal, secularizado, vive de
pressupostos que ele não pode garantir por si mesmo”. (2007,
p.53).
Se é certo para o filósofo que o Estado laico de nossos dias
é um Estado secularizado, resultado de um longo processo
17
histórico, e que o direito à liberdade religiosa é um de seus
princípios centrais, nesse ponto aparece um problema. Como diz,
o motivo está no fato de que, via de regra, as confissõesreligiosas não se limitam a venerar Deus nas formas daliturgia e do culto, mas abraçam também mandamentos emáximas para as condutas da vida e os comportamentos domundo. Estes preceitos penetram na convivência entre oshomens, mas podem diferir das disposições de lei vigente nacomunidade política. O que prevalece então? Tem precedênciaa liberdade religiosa ou o ordenamento jurídico geral? (Fée direito, segundo Ernest-Wolfgang Böckenförde, IHU)
Para Böckenförde, o ordenamento estatal deve garantir o
espaço à liberdade religiosa e confessional também em “âmbitos e
negócios mundanos que não tem imediato caráter religioso-
cultural, na medida em que isto seja compatível com as exigências
fundamentais da convivência comum, que devem ser salvaguardadas
em cada caso. (direito aos dias festivos, aos jejuns e
prescrições, costumes relativos ao vestuário). (Fé e direito,
segundo Ernest-Wolfgang Böckenförde, IHU).
Numa troca de correspondência com Joseph Ratzinger, a
questão de um Estado ideologicamente neutro aparece. As perguntas
são em torno dos fundamentos desse Estado laico, se é possível
prescindir de suas raízes culturais, portanto religiosas.
Böckenförde pergunta e responde:
O Estado secularizado liberal, de onde tira e conserva noscidadãos e cidadãs, hoje e no futuro, aquela medida desenso pré-jurídico de comunhão e de ethos mantenedor que éindispensável para uma próspera convivência precisamentenum ordenamento liberal? Nenhum Estado pode fundar-sesomente numa concentração de poder e no exercício da
18
constituição, embora estes sejam irrenunciáveis; devetambém executar ações positivas que assegurem alegitimidade, e necessita dos comportamentos graças aosquais as pessoas prestam obediência prevalentementevoluntária. E seria igualmente uma ilusão pensar que umordenamento estatal possa viver da concessão da liberdadeindividual auto-referencial se um vínculo unificador quecomunique um sentimento de “nós” e pré-exista a estaliberdade (Fé e direito, segundo Ernest-WolfgangBöckenförde, IHU).
Se há uma solução dada por Böckenförde, além dessa última
constatação, o que não se constata inicialmente como hipótese de
trabalho, é necessário aprofundamento na investigação e
interpretação de seus mais importantes textos.
4. A proposta de Jürgen Habermas
Diante da realidade multicultural das sociedades
contemporâneas, com diversas tradições religiosas tendo que
conviver no mesmo espaço geográfico e político, somente o Estado
laico é capaz de garantir a liberdade religiosa. A laicidade
implica que os poderes estatais se expressem de modo neutro
quanto à imagem religiosa do mundo e, desta forma, não
privilegiam nenhuma tradição religiosa específica.
Simultaneamente, o Estado autoriza e garante aos cidadãos poderem
escolher praticar qualquer religião que esteja dentro dos limites
da legalidade jurídica.
Habermas defende a tese da legitimidade da participação
política na esfera pública de religiosos e que não podemos exigir
que eles para isso abandonem as suas crenças religiosas.
19
(...) o Estado liberal que protege de igual modo todas asformas religiosas de vida, não pode obrigar os cidadãosreligiosos a levarem a cabo, na esfera pública política,uma separação estrita entre argumentos religiosos e não-religiosos quando, aos olhos deles, esta tarefa podeconstituir um ataque à sua identidade pessoal (HABERMAS,2007, p.147).
No entanto, Habermas observa que o Estado de direito
democrático legitimado pela sociedade pode exigir que os
ocupantes de cargos políticos, inclusive, os religiosos, façam um
uso público da razão em suas argumentações políticas. No debate
político público, os cidadãos não necessitam conhecer12 e muito
menos concordar com os dogmas teológicos específicos de uma
determinada religião. Esses dogmas são fundamentais para a
comunidade particular que compartilha aquela crença religiosa, mas
eles não podem ser impostos como regra geral para todas as
diferentes comunidades religiosas e não religiosas.
No uso público da razão, o discurso deverá ser orientado por
uma racionalidade compreensível a todos e não apenas para os
membros da comunidade do orador13. De forma que todos, sem
exceção, possam analisá-lo, criticá-lo e assumir uma tomada de
posição lúcida e consciente. O político-religioso deverá assumir
o compromisso de usar publicamente a razão, sob a pena de
desqualificar-se para o jogo democrático e com isso, criar uma12 É importante, certamente, conhecer as diferentes comunidades religiosas quecompõem a nossa sociedade, pois assim será mais fácil exercermos a tolerânciaessencial para uma sociedade multicultural como as contemporâneas. Mas não é,de maneira nenhuma, um pré-requisito para o exercício da cidadania.13 É importante observar que o uso público da razão é um pré-requisito para a ação política de todos os grupos e não apenas dos religiosos.
20
barreira para que suas idéias e posições sejam compreendidas e
debatidas. Sem o uso público da razão, o político-religioso fere
a democracia naquilo que ela tem de mais sagrado, o debate livre
entre os pares a partir do princípio da falibilidade (os participantes
do discurso devem pressupor que podem estar errados e devem estar
dispostos a mudarem suas posições aceitando os argumentos dos
outros). Desta forma, políticos que assumem mandatos públicos ou
se candidatam a eles devem somente utilizar argumentos racionais
públicos e criticáveis nas discussões acercas de questões morais
na esfera pública.
Não só a relação entre crentes e não crentes deve acontecer
em um ambiente democrático, no qual o Estado laico garanta a
liberdade religiosa, como também é fundamental que a relação
entre crentes de distintas tradições religiosas ocorra nesse
ambiente, pois ele é o lugar privilegiado para a resolução de
conflitos de forma não-violenta. Cabe às tradições religiosas
tomarem a iniciativa de buscarem o diálogo entre si, sob a
garantia do Estado laico, para demarcarem os limites justos de
uma ação social que inclui as outras tradições.
O que significa o ressurgimento da religião para uma sociedade amplamente
secularizada? Com essa pergunta Habermas inicia uma conferência em
2007 na cidade do México (HABERMAS, 2008, p.3-4). A conclusão que
ele chega é que por vários motivos as religiões não se
extinguiram com a secularização e a modernização da sociedade.
Elas aprenderam a conviver com esses dois processos tão próximos
um do outro. Aprendizagem é a palavra chave para Habermas:
21
No trato com tradições religiosas, inclusive árabes, afilosofia constatou, reiteradas vezes, que é possível obterimpulsos inovadores a partir do momento em que se consegueseparar, no cadinho de discursos fundamentadores, conteúdoscognitivos de suas cascas originariamente dogmáticas(HABERMAS, 2007, p.161).
Podemos aprender muito com as tradições religiosas e elas
também precisam estar abertas ao aprendizado contínuo de novas
concepções de bem viver.. Muitos dos conflitos religiosos, para
não dizer todos, são resultados de déficits de aprendizagem, que
ocorrem quando os grupos se recusam a aprender algo com o outro.
Neste sentido a participação política dos religiosos na esfera
pública, quando orientada para este mútuo aprendizado, é
extremamente saudável para as sociedades modernas seculares e
multiculturais.
Pienso que la autocomprensión posmetafísica de la razónpuede no solamente servir de base a procesos de aprendizajemutuos, sino que también puede ayudar a salvar la distanciaentre el pathos religioso y el secular comprometiéndose conun discurso intercultural acerca de principios comunes dejusticia política para la sociedad mundial multicultural(HABERMAS, 2008, p.18).
5. Conclusões
O lugar que deve ocupar as religiões nas novas configurações
políticas e culturais no mundo ocidental ainda é uma questão
aberta, mesmo que possamos partir da proposta de Habermas para
uma primeira aproximação à problemática. Certamente outros
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autores precisarão ser estudados para que possamos construir
novas reflexões sobre o tema.
Algumas perguntas surgiram no decorrer da pesquisa que gerou
esse texto, e que remetem a outros problemas. Como se concretiza
o uso público da razão sugerido por Habermas, já que o conceito
"razão" tem seus limites epistemológicos? É possível separar,
razão, moral e religião no debate público? Quais de fato são as
diferenças epistêmicas entre aqueles que recorrem a elementos
religiosos para defenderem sua posição política num determinado
debate e aqueles que recorrem, em suas palavras, a "argumentos
seculares"? Os argumentos seculares também não podem, por sua
vez, fundamentarem-se em perspectivas que partam de uma noção
específica sobre o que é o "bem viver"? Não defendem também uma
cosmovisão particular, podendo inclusive ser denominadas como
"religiões ateísta", como diz Ronald Dworkin (2013)? Defender uma
perspectiva política não pressupõe um ideia daquilo que seja o
"bem", como as "religiões teístas"?
As questões nos conscientizam da complexidade do tema e
remete a outros autores importante que delas tratam, como John
Rawls, Michael J. Perry, Kent Greenawalt. O debate sobre o tema é
marcado, geralmnte, por lugares-comuns e é um imperativo
construirmos mais questões a fim de aprofundarmos não só
teoricamente, mas também a partir de pesquisas de campo.
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