a prática dos professores de rosa. francisco neto

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A prática dos professores de educação física das escolas públicas de Porto Alegre Vicente Molina Neto* Movimento - Ano V - Nº 9 - 1998/2 31

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Page 1: A prática dos professores de ROSA. Francisco Neto

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ASHER, Cécile. Variações de Postura na Crian-ça. São Paulo: Manole, 1976.

BIENFAIT, Marcel. Os desequilíbrios estáticos:fisiologia, patologia e tratamento fisioterápi-co. São Paulo: Summus Editorial, 1995.

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CAILLIET, Rene M. D. Lombalgias: SíndromesDolorosas. São Paulo: Manole, 1979.

DUFOUR, M.; PÉNINOU, G.; NEIGER, H.;GÉNOT, C; LEROY, A.; PIERRON, G. &DUPRE, J. M. Cinesioterapia. Avaliações: téc-nicas passivas e ativas do aparelho locomotor.São Paulo: Panamericana, 1989. V.4.

ESTEVES, Paulo César. A necessidade de implan-tação de propostas fisioterápicas de cunhoprofilático na rede escolar. Revista Fisioterá-pica. v.4, p. 26-33, 1993.

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RASH & BURKE. Cinesiologia e Anatomia Apli-cada. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan,1977.

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SOUZA. Jorge Luiz de. Efeitos de uma escolapostural para indivíduos com dores nas costas.Movimento, n.5, 1996.

AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem a colaboração dosmeninos e do prof. Lauro Ely, coordenador doProjeto Escolinhas Integradas (P.E.I.) -UNISINOS.

UNITERMOS

Avaliação postural; cintura escapular; crianças;medidas angulares.

* Adriane Ferronatto é professora Licenciadaem Educação Física pela UNISINOS. **CláudiaTarragô Candotti é professora Ms. em Ciênciasdo Movimento Humano. Professora do Curso deEducação Física da Universidade do Vale doRio dos Sinos -UNISINOS.***Ronei Pinto Silveira é professor da Escola deEducação Física da Universidade Federal doRio Grande do Sul - UFRGS.

A prática dos professores deeducação física das escolas

públicas de Porto AlegreVicente Molina Neto*

Movimento - Ano V - Nº 9 - 1998/2 Movimento - Ano V - Nº 9 - 1998/2

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Page 2: A prática dos professores de ROSA. Francisco Neto

Resumo

O presente estudo trata da prática docente dos professores das escolas públicas de Porto Alegre. Com

procedimentos metodológicos de caráter predominantemente etnográficos, ouvi 20 participantes, para entender

sua maneira de atuar na escola. O texto resulta, fundamentalmente, da interpretação de seus depoimentos à luz

de referências bibliográficas e da minha experiencia como professor de educação física. A análise das informações

sugere que sua prática docente está relacionada com a organização de seu lugar de trabalho e com as relações

que estabelecem com as demais parcelas da comunidade escolar. Nessa prática, esses professores constróem

estratégias e conhecimentos que lhes caracterizam como práticos reflexivos.

Abstract

The present study examines the teaching practice of teachers of public schools of Porto Alegre, RS. Th rough

predominantly ethnographic methodological procedures, 20 participants were heard so that their way of acting in

school could be understood. The text is the result of interpretation of their statements in light of bibliographical

references as well as the author's own experience as a physical education teacher. The analysis of the information

gathered suggests that the teaching practice of these subjects is related both to the organization of their work place

and to the relations they establish with the remaining sectors of the school community. In this practice, these

teachers build up symbolism, strategies, and knowledge, which characterize them as reflective practitioners.

1.INTRODUÇÃO

Grande parte dos procedimentos, atitu-des e conhecimentos que o professorado deeducação física manifesta na escola públicaaprende fazendo. É toda uma experiência queo caracteriza, ao final, como um prático refle-xivo que desenvolve um conhecimento em suaação docente (Elliot, 1991; Schön, 1992) atra-vés da prática e da experiência acumulada.

Neste trabalho, utilizando procedimen-tos predominantemente etnográficos, isto é,ouvindo as vozes de 20 colaboradores, anali-sando documentos, fazendo observações da suamaneira específica de estar na escola pública,e os acompanhando em seu dia-a-dia de traba-lho, procurei examinar como é a prática doprofessorado de educação física e que relaçõesesse coletivo docente estabelece com as ou-tras parcelas da comunidade escolar.1 Assim,ora privilegiando a descrição, ora a interpreta-ção, tentei reconstruir a perspectiva dos auto-res sobre o seu trabalho na escola.

Sou sensível à idéia de que o trabalho eas atividades corporais são elementos que me-lhor explicitam a maneira como os homens his-toricamente construíram suas relações sociaise sua forma particular de garantir a sobrevivên-cia, adaptar-se ao meio ambiente, reproduzir-se e produzir cultura. Segundo a perspectivamaterialista, o que diferencia os homens dosanimais não é a capacidade de pensar, senão acapacidade de produzir seus meios de vida, fatoque se reflete na sua organização corporal, comotambém é condicionada por esta (Brohm, 1978).

Nesse sentido, as diferentes formas deorganização do trabalho tiveram uma relevân-cia especial porque permitiram aos coletivoshumanos desenvolver formas significativas deperceber o mundo, construir valores e estabe-lecer formas de convivência social. Transpon-do esta idéia ao presente estudo, entendo queas formas de perceber o contexto social e dedar prioridade a certos valores estão fortementerelacionadas à maneira de o professorado deeducação física fazer as coisas.

2.OTRABALHOEASCONDIÇÕESDETRABALHONAESCOLAPÚBLICA

A partir da idéia da divisão do trabalho,pode-se entender a essência das diferençasconstruídas entre os professores de educaçãofísica e os demais coletivos da escola pública.De acordo com esta idéia, a divisão originaldo trabalho ocorreu entre o material e o inte-lectual. Isto é, entre o fazer e o pensar. Segui-ram-se outras diferenciações: o trabalho mas-culino e o feminino; o trabalho e o lazer, as-sim como outras antinomias ainda vigentes.

Também a organização do trabalhoviabilizou as classes sociais, as corporações,as associações e outros coletivos de trabalha-dores que, ao monopolizar técnicas e conheci-mentos, desenvolveram âmbitos de poder erelações de hegemonia frente a outros coleti-vos humanos. Assim, desde a perspectiva his-tórica, pode-se compreender as diversas rela-ções existentes entre diferentes disciplinas docurrículo escolar, e também como foram cons-tituídos determinados "papéis profissionais".

Nessa perspectiva, a escolarização, tantona emergência do capitalismo como nas fasesde sua consolidação, privilegiou aqueles co-nhecimentos e ofícios que, tratando do pen-sar, do explicar e do entender "a essência domundo", promoveram uma teoria moral, e for-mas de educar destinadas a romper com a edu-cação no ofício, processo onde as pessoas sesocializavam e faziam sua aprendizagem.

Assim, com fundamentação filosóficailuminista, a escola se configura na culturaocidental e promove o pensamento e o traba-lho intelectual como categorias ordenadorasdos diferentes ofícios. Portanto, além de esta-belecer formas de controle sobre os hábitosmundanos da população, transformando-seassim em um instrumento de afirmação e cir-culação de determinados interesses de umaclasse social específica, a escola vai preparar,classificar e estratificar a população para ocu-par diferentes posições sociais.

Dessa forma, a divisão do trabalho e arelação entre cultura intelectual e cultura físi-ca são os mesmos fundamentos que oferecem,ao professorado de educação física e ao pro-fessorado em geral, as pautas de preconceitos,procedimentos e atitudes em relação a seu tra-

balho na tradição vigente na escola pública(Bali, 1989; Hargreaves, 1994). Para essa for-ma limitada de ver o ensino, a educação físicatem a "propriedade" da ocupação e desenvol-vimento do corpo, enquanto a "propriedade"da cultura intelectual é de desenvolvimentoexclusivo da razão.

Observando a distinção histórica entreteoria e prática e a relação entre a cultura inte-lectual e a cultura física, proponho a seguintereflexão: É possível que no âmbito da culturaescolar, de base intelectual, o professorado deeducação física seja o representante do traba-lho material?

2.1. O TRABALHO DO PROFESSORADO DE EDUCAÇÃO

FÍSICA: A FALTA DE RECONHECIMENTO

O enfrentamento constante de situaçõesadversas, seu baixo salário mensal e os mate-riais inadequados para desenvolver sua tarefaeducativa caracterizam o trabalho do profes-sorado de educação física nas escolas públi-cas de Porto Alegre. Entretanto, estas circuns-tâncias lhe oferecem a oportunidade de desen-volver um trabalho criativo. Fatos que tambémocorrem em outras disciplinas, mas que, nocaso desse coletivo, adquire outra dimensãoporque raramente são chamados para discu-tir as necessidades, os interesses e os objeti-vos específicos da disciplina.

Os participantes do estudo consideramseu trabalho importante na escola pública,porque têm o privilégio de trabalhar o alunoem sua integralidade, tanto nos aspectoscognitivos, afetivos e psicomotores, comotambém valores e atitudes, mas algumasvezes se estabelecem situações nas escolasque não levam em consideração o seutrabalho nem a sua opinião, como, por exem-plo, no que tange à aprovação e/ou reprova-ção dos alunos nos conselhos de classe, oque lhes oferece argumentos para pensar queseu trabalho não tem valor.

Os professores de educação física en-frentam com freqüência na escola pública re-lações conflitivas com a supervisão pedagógi-ca, setor que articula os objetivos de cada dis-ciplina com o projeto da escola. Seu protestoé que exigem tarefas sem sentido e sem co-nhecimento específico de sua disciplina. En-tretanto, seu maior incômodo se manifesta

Observando adistinção históricaentre teoria eprática e a relaçãoentre a culturaintelectual e acultura física,proponho a se-guinte reflexão: Épossível que noâmbito da culturaescolar, de baseintelectual, oprofessorado deeducação físicaseja o represen-tante do trabalhomaterial?

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O presente estudo trata da prática docente dos professores das escolas públicas de Porto Alegre. Com

procedimentos metodológicos de caráter predominantemente etnográficos, ouvi 20 participantes, para entender

sua maneira de atuar na escola. O texto resulta, fundamentalmente, da interpretação de seus depoimentos à luz

de referências bibliográficas e da minha experiencia como professor de educação física. A análise das informações

sugere que sua prática docente está relacionada com a organização de seu lugar de trabalho e com as relações

que estabelecem com as demais parcelas da comunidade escolar. Nessa prática, esses professores constróem

estratégias e conhecimentos que lhes caracterizam como práticos reflexivos.

Abstract

The present study examines the teaching practice of teachers of public schools of Porto Alegre, RS. Th rough

predominantly ethnographic methodological procedures, 20 participants were heard so that their way of acting in

school could be understood. The text is the result of interpretation of their statements in light of bibliographical

references as well as the author's own experience as a physical education teacher. The analysis of the information

gathered suggests that the teaching practice of these subjects is related both to the organization of their work place

and to the relations they establish with the remaining sectors of the school community. In this practice, these

teachers build up symbolism, strategies, and knowledge, which characterize them as reflective practitioners.

1.INTRODUÇÃO

Grande parte dos procedimentos, atitu-des e conhecimentos que o professorado deeducação física manifesta na escola públicaaprende fazendo. É toda uma experiência queo caracteriza, ao final, como um prático refle-xivo que desenvolve um conhecimento em suaação docente (Elliot, 1991; Schön, 1992) atra-vés da prática e da experiência acumulada.

Neste trabalho, utilizando procedimen-tos predominantemente etnográficos, isto é,ouvindo as vozes de 20 colaboradores, anali-sando documentos, fazendo observações da suamaneira específica de estar na escola pública,e os acompanhando em seu dia-a-dia de traba-lho, procurei examinar como é a prática doprofessorado de educação física e que relaçõesesse coletivo docente estabelece com as ou-tras parcelas da comunidade escolar.1 Assim,ora privilegiando a descrição, ora a interpreta-ção, tentei reconstruir a perspectiva dos auto-res sobre o seu trabalho na escola.

Sou sensível à idéia de que o trabalho eas atividades corporais são elementos que me-lhor explicitam a maneira como os homens his-toricamente construíram suas relações sociaise sua forma particular de garantir a sobrevivên-cia, adaptar-se ao meio ambiente, reproduzir-se e produzir cultura. Segundo a perspectivamaterialista, o que diferencia os homens dosanimais não é a capacidade de pensar, senão acapacidade de produzir seus meios de vida, fatoque se reflete na sua organização corporal, comotambém é condicionada por esta (Brohm, 1978).

Nesse sentido, as diferentes formas deorganização do trabalho tiveram uma relevân-cia especial porque permitiram aos coletivoshumanos desenvolver formas significativas deperceber o mundo, construir valores e estabe-lecer formas de convivência social. Transpon-do esta idéia ao presente estudo, entendo queas formas de perceber o contexto social e dedar prioridade a certos valores estão fortementerelacionadas à maneira de o professorado deeducação física fazer as coisas.

2.OTRABALHOEASCONDIÇÕESDETRABALHONAESCOLAPÚBLICA

A partir da idéia da divisão do trabalho,pode-se entender a essência das diferençasconstruídas entre os professores de educaçãofísica e os demais coletivos da escola pública.De acordo com esta idéia, a divisão originaldo trabalho ocorreu entre o material e o inte-lectual. Isto é, entre o fazer e o pensar. Segui-ram-se outras diferenciações: o trabalho mas-culino e o feminino; o trabalho e o lazer, as-sim como outras antinomias ainda vigentes.

Também a organização do trabalhoviabilizou as classes sociais, as corporações,as associações e outros coletivos de trabalha-dores que, ao monopolizar técnicas e conheci-mentos, desenvolveram âmbitos de poder erelações de hegemonia frente a outros coleti-vos humanos. Assim, desde a perspectiva his-tórica, pode-se compreender as diversas rela-ções existentes entre diferentes disciplinas docurrículo escolar, e também como foram cons-tituídos determinados "papéis profissionais".

Nessa perspectiva, a escolarização, tantona emergência do capitalismo como nas fasesde sua consolidação, privilegiou aqueles co-nhecimentos e ofícios que, tratando do pen-sar, do explicar e do entender "a essência domundo", promoveram uma teoria moral, e for-mas de educar destinadas a romper com a edu-cação no ofício, processo onde as pessoas sesocializavam e faziam sua aprendizagem.

Assim, com fundamentação filosóficailuminista, a escola se configura na culturaocidental e promove o pensamento e o traba-lho intelectual como categorias ordenadorasdos diferentes ofícios. Portanto, além de esta-belecer formas de controle sobre os hábitosmundanos da população, transformando-seassim em um instrumento de afirmação e cir-culação de determinados interesses de umaclasse social específica, a escola vai preparar,classificar e estratificar a população para ocu-par diferentes posições sociais.

Dessa forma, a divisão do trabalho e arelação entre cultura intelectual e cultura físi-ca são os mesmos fundamentos que oferecem,ao professorado de educação física e ao pro-fessorado em geral, as pautas de preconceitos,procedimentos e atitudes em relação a seu tra-

balho na tradição vigente na escola pública(Bali, 1989; Hargreaves, 1994). Para essa for-ma limitada de ver o ensino, a educação físicatem a "propriedade" da ocupação e desenvol-vimento do corpo, enquanto a "propriedade"da cultura intelectual é de desenvolvimentoexclusivo da razão.

Observando a distinção histórica entreteoria e prática e a relação entre a cultura inte-lectual e a cultura física, proponho a seguintereflexão: É possível que no âmbito da culturaescolar, de base intelectual, o professorado deeducação física seja o representante do traba-lho material?

2.1. O TRABALHO DO PROFESSORADO DE EDUCAÇÃO

FÍSICA: A FALTA DE RECONHECIMENTO

O enfrentamento constante de situaçõesadversas, seu baixo salário mensal e os mate-riais inadequados para desenvolver sua tarefaeducativa caracterizam o trabalho do profes-sorado de educação física nas escolas públi-cas de Porto Alegre. Entretanto, estas circuns-tâncias lhe oferecem a oportunidade de desen-volver um trabalho criativo. Fatos que tambémocorrem em outras disciplinas, mas que, nocaso desse coletivo, adquire outra dimensãoporque raramente são chamados para discu-tir as necessidades, os interesses e os objeti-vos específicos da disciplina.

Os participantes do estudo consideramseu trabalho importante na escola pública,porque têm o privilégio de trabalhar o alunoem sua integralidade, tanto nos aspectoscognitivos, afetivos e psicomotores, comotambém valores e atitudes, mas algumasvezes se estabelecem situações nas escolasque não levam em consideração o seutrabalho nem a sua opinião, como, por exem-plo, no que tange à aprovação e/ou reprova-ção dos alunos nos conselhos de classe, oque lhes oferece argumentos para pensar queseu trabalho não tem valor.

Os professores de educação física en-frentam com freqüência na escola pública re-lações conflitivas com a supervisão pedagógi-ca, setor que articula os objetivos de cada dis-ciplina com o projeto da escola. Seu protestoé que exigem tarefas sem sentido e sem co-nhecimento específico de sua disciplina. En-tretanto, seu maior incômodo se manifesta

Observando adistinção históricaentre teoria eprática e a relaçãoentre a culturaintelectual e acultura física,proponho a se-guinte reflexão: Épossível que noâmbito da culturaescolar, de baseintelectual, oprofessorado deeducação físicaseja o represen-tante do trabalhomaterial?

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quando a direção propõe o cumprimento dacarga horária com mais horas-aula. Alegamque, além de um horário carregado de aulas,solicitam-lhes outras tarefas, como, por exem-plo, organizar atividades esportivas e festas naescola, sem propor nenhuma compensação ouamparo institucional para esse trabalho.

2.1.1 Trabalho formal e trabalho real doprofessorado de educação física: entre oexcesso de trabalho e a falta de salário

O sistema educativo, enquanto organi-zação complexa, tem uma estrutura formal, istoé, níveis hierárquicos, organogramas, plano decargos e tarefas típicas de seus funcionários.Admitidos por concurso público, os professo-res ocupam as vagas disponíveis nas escolaspúblicas que melhor atendam seus interessesdocentes e particulares, sob um contrato detrabalho de 20 horas semanais.2 Legalmente épermitido ao professorado acumular dois con-tratos de 20 horas, dando um total de 40 horasde trabalho por semana, podendo ser concen-tradas em um única escola, em duas ou emmais. É possível também unificar esses doiscontratos de trabalho ou matrículas em um sóde 40 horas semanais, o que abre a possibili-dade de ter mais um contrato de trabalho emoutra instância da administração pública paracompletar o máximo de dois permitidos pelasnormas, o que significa que o professoradopode assumir compromissos formais com asdiferentes instâncias da administração numtotal de 60 horas semanais.3

Formalmente, a atividade principal docoletivo é com a hora-aula, isto é, dar aulas desua disciplina no ensino básico. Entretanto, sãoincluídas horas-atividade, a serem utilizadas ematividades extraclasse, reuniões de planejamen-to e conselhos de classe, resultando um grandevolume de trabalho. O que obriga os professo-res a decidirem entre aceitar as exigências des-se compromisso, ou prescindir de suas necessi-dades materiais de sobrevivência digna.

Para encaminhar seu trabalho real, ocoletivo interpreta as normas e negocia acor-dos no interior da escola, principalmente noque se refere à carga horária, e assim, cria con-dições para atender às exigências da adminis-tração, sem submeter-se ao seu controle, e ad-ministrar seu tempo para sobreviver com al-guma qualidade de vida. Por outro lado, supe-rar essa situação difícil tem conseqüências no

trabalho em si, como também nas relações quemantém com as demais parcelas da comuni-dade escolar. A principal interferência é noplanejamento do ensino. Além das aulas nãoseguirem a programação estipulada, tambémo tempo destinado a ela é utilizado pelo pro-fessor, muitas vezes, para cumprir um outrocontrato de trabalho.

O trabalho real do professor de educa-ção física se caracteriza por apresentar, além deum volume extraordinário, tarefas muito varia-das e trato com grupos heterogêneos e numero-sos. Segundo os professores, esse volume detrabalho e a variedade das tarefas são dois ele-mentos que, junto com os baixos salários, osesgotam. Apontam que não é um cansaço físi-co, e sim emocional, que se traduz, em falta depaciência com os alunos. Esse esgotamento e odesgaste diminuem a vontade de o professorinterferir junto ao aluno, com efeitos imediatosna qualidade do seu trabalho. O que deseja amaioria dos professores é trabalhar em um úni-co lugar e ganhar um bom salário, o que nãofazem devido à questão econômica.

Por outro lado, contraditoriamente, é ovolume de trabalho que o incentiva a partici-par de forma significativa em outras ativida-des da vida da escola e a desenvolver estraté-gias criativas e originais para cumprir os com-promissos formais e subverter a ordem e ocontrole do "sistema", como, por exemplo, osentido de humor e a sala dos professores deeducação física.

Essas estratégias garantem aos professo-res uma certa independência de atuação docen-te e tempo livre, já que estão obrigados a umgrande volume de trabalho para ter acesso a umaboa qualidade de vida material. Portanto, a po-lêmica com a carga horária significa, sobretu-do, uma tentativa simbólica de garantir um ní-vel de autonomia frente às diferentes formas decontrole de seu trabalho, já que de acordo comBrohm (1978), a sucção de mais-valia absolutae relativa faz com que as condições de trabalho(ritmo, horários, jornadas de trabalho) se tor-nem mais totalitárias para o trabalhador.

No âmbito do sistema educativo públi-co, não se pode verificar com clareza a ma-terialização da mais-valia, pois, além de serum produto que é consumido no ato de suaprodução, mistura-se à idéia de serviço públi-co prestado pelo Estado. Diferente do que ocor-

re, de acordo com Brohm (1978), no âmbito doesporte de alta competição, ou no âmbito doensino particular, que transforma a educação ematividade lucrativa. Mas há certas evidências nodiscurso da profissionalidade docente. Aomesmo tempo em que os gestores da educaçãotiram do professorado o controle sobre aconcepção e juízo de seu trabalho, transformandoesta em uma tarefa de especialistas, exigem-lhemais eficiência na execução de suas prescriçõeseducativas, além de propor e acrescentar ao seutrabalho novas funções para atender às demandassociais emergentes e à burocracia educativa.Como apontam Apple e Teitelbaun (1991), nãoexiste nada mais contundente na promoção daalienação e do desânimo do professorado que aperda do controle do próprio trabalho. Oprofessorado passa de sujeito a objeto dotrabalho educativo.

De qualquer maneira, o caso do profes-sorado de educação física aponta a uma situaçãoambígua. Pode indicar que a mais-valia se efetuana perseguição do dinheiro e no volume detrabalho, e pode estar indicando que é um âmbitoque ainda resiste ao discurso da racionalidadeeducativa.

3. CARACTERÍSTICASESPECÍFICASDOTRABALHO E

DADISCIPLINA NAESCOLAPÚBLICA

Vários aspectos caracterizam o profes-sorado de educação física dentro do coletivo deprofessores de uma escola: a roupa que usa, osmateriais de trabalho (bolas, apito e outros) e olugar em que realiza sua aula (ar livre). São as-pectos exteriores, que o distinguem do conjuntode professores e, mesmo que contribuam àconfiguração de sua cultura docente, não revelamsua essência. O que caracteriza essencialmente oprofessorado de educação física na escolapública é a qualidade de sua participação nacultura escolar e o fato de trabalhar o corpo,através do corpo e com o corpo dos alunos — omovimento e a cultura corporal. Estas caracte-rísticas são fundamentais porque estão na base desuas estratégias para fazer as coisas, desenvolverconhecimento, acumular experiência erelacionar-se com na comunidade escolar.

3.1 TRABALHAR COM O CORPO, ATRAVÉS DO

CORPO E O PRÓPRIO CORPO

Quando um professor, em aula, coloca-

se diante de seus alunos, um conjunto de per-cepções e de relações professor-aluno se esta-belecem. Em primeiro lugar, utilizando suaspalavras, tu estás à vista de todos. Pode-se dizerque o corpo do professor é objeto de constanteobservação e avaliação por parte dos alunos.Também a recíproca é verdadeira, o professorobserva os corpos dos alunos em movimento, istoé, uma relação direta, o professor não pode"proteger-se" deste olhar atrás de uma mesa detrabalho, nem os alunos podem se esconder atrásda classe. Um e outro têm que se expor, mostrar-se, além disso, com roupas confortáveis.Acostumar-se a essa situação exige tempo e, nofim, esse modo de trabalhar excede a outrosdomínios da situação escolar, como, porexemplo, as relações de gêneros sexuais.

Em aula, além de o aluno estar em movi-mento e com diversas variáveis de ação, tantopara ensinar como para corrigir um movimento,só falar não é suficiente, tem de mostrar como sefaz e principalmente tem de tocar, tanto pro-fessor-aluno como aluno-aluno. Isto possibilitauma proximidade física muito grande e relaçõesmuito autênticas desde o ponto de vista afetivo.

Por outro lado, os alunos gostam da edu-cação física, principalmente os pequenos, porqueé uma atividade própria à sua natureza. Fora daescola, os alunos gostam de jogar e a educaçãofísica faz isso com uma intencio-nalidade.Sublinham os professores que, através de umjogo ou de uma dança, é possível alcançarimportantes objetivos cognitivos no âmbito dedisciplinas como história, geografia, matemáticae outras, além de "boas " atitudes psicológicas esociais. Essa situação também possibilita umarelação afetiva próxima e, ao mesmo tempo, derespeito e consideração muito particular com osalunos e outras parcelas do professorado daescola. A relação positiva com os alunos vem doconteúdo da disciplina, da relação descontraídaque conseguem manter entre si, e do ambienteque compartilham (o pátio da escola). Aconsideração e o respeito dos demais segmentosda escola se devem à capacidade de mobilizaçãoda comunidade escolar e ao esforço que essecoletivo vem fazendo para superar suaslimitações nas questões pedagógicas maisamplas.

Para os professores, o fato de trabalharcom seu corpo e com o dos alunos ajuda aoprofessorado de educação física a se mover em

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quando a direção propõe o cumprimento dacarga horária com mais horas-aula. Alegamque, além de um horário carregado de aulas,solicitam-lhes outras tarefas, como, por exem-plo, organizar atividades esportivas e festas naescola, sem propor nenhuma compensação ouamparo institucional para esse trabalho.

2.1.1 Trabalho formal e trabalho real doprofessorado de educação física: entre oexcesso de trabalho e a falta de salário

O sistema educativo, enquanto organi-zação complexa, tem uma estrutura formal, istoé, níveis hierárquicos, organogramas, plano decargos e tarefas típicas de seus funcionários.Admitidos por concurso público, os professo-res ocupam as vagas disponíveis nas escolaspúblicas que melhor atendam seus interessesdocentes e particulares, sob um contrato detrabalho de 20 horas semanais.2 Legalmente épermitido ao professorado acumular dois con-tratos de 20 horas, dando um total de 40 horasde trabalho por semana, podendo ser concen-tradas em um única escola, em duas ou emmais. É possível também unificar esses doiscontratos de trabalho ou matrículas em um sóde 40 horas semanais, o que abre a possibili-dade de ter mais um contrato de trabalho emoutra instância da administração pública paracompletar o máximo de dois permitidos pelasnormas, o que significa que o professoradopode assumir compromissos formais com asdiferentes instâncias da administração numtotal de 60 horas semanais.3

Formalmente, a atividade principal docoletivo é com a hora-aula, isto é, dar aulas desua disciplina no ensino básico. Entretanto, sãoincluídas horas-atividade, a serem utilizadas ematividades extraclasse, reuniões de planejamen-to e conselhos de classe, resultando um grandevolume de trabalho. O que obriga os professo-res a decidirem entre aceitar as exigências des-se compromisso, ou prescindir de suas necessi-dades materiais de sobrevivência digna.

Para encaminhar seu trabalho real, ocoletivo interpreta as normas e negocia acor-dos no interior da escola, principalmente noque se refere à carga horária, e assim, cria con-dições para atender às exigências da adminis-tração, sem submeter-se ao seu controle, e ad-ministrar seu tempo para sobreviver com al-guma qualidade de vida. Por outro lado, supe-rar essa situação difícil tem conseqüências no

trabalho em si, como também nas relações quemantém com as demais parcelas da comuni-dade escolar. A principal interferência é noplanejamento do ensino. Além das aulas nãoseguirem a programação estipulada, tambémo tempo destinado a ela é utilizado pelo pro-fessor, muitas vezes, para cumprir um outrocontrato de trabalho.

O trabalho real do professor de educa-ção física se caracteriza por apresentar, além deum volume extraordinário, tarefas muito varia-das e trato com grupos heterogêneos e numero-sos. Segundo os professores, esse volume detrabalho e a variedade das tarefas são dois ele-mentos que, junto com os baixos salários, osesgotam. Apontam que não é um cansaço físi-co, e sim emocional, que se traduz, em falta depaciência com os alunos. Esse esgotamento e odesgaste diminuem a vontade de o professorinterferir junto ao aluno, com efeitos imediatosna qualidade do seu trabalho. O que deseja amaioria dos professores é trabalhar em um úni-co lugar e ganhar um bom salário, o que nãofazem devido à questão econômica.

Por outro lado, contraditoriamente, é ovolume de trabalho que o incentiva a partici-par de forma significativa em outras ativida-des da vida da escola e a desenvolver estraté-gias criativas e originais para cumprir os com-promissos formais e subverter a ordem e ocontrole do "sistema", como, por exemplo, osentido de humor e a sala dos professores deeducação física.

Essas estratégias garantem aos professo-res uma certa independência de atuação docen-te e tempo livre, já que estão obrigados a umgrande volume de trabalho para ter acesso a umaboa qualidade de vida material. Portanto, a po-lêmica com a carga horária significa, sobretu-do, uma tentativa simbólica de garantir um ní-vel de autonomia frente às diferentes formas decontrole de seu trabalho, já que de acordo comBrohm (1978), a sucção de mais-valia absolutae relativa faz com que as condições de trabalho(ritmo, horários, jornadas de trabalho) se tor-nem mais totalitárias para o trabalhador.

No âmbito do sistema educativo públi-co, não se pode verificar com clareza a ma-terialização da mais-valia, pois, além de serum produto que é consumido no ato de suaprodução, mistura-se à idéia de serviço públi-co prestado pelo Estado. Diferente do que ocor-

re, de acordo com Brohm (1978), no âmbito doesporte de alta competição, ou no âmbito doensino particular, que transforma a educação ematividade lucrativa. Mas há certas evidências nodiscurso da profissionalidade docente. Aomesmo tempo em que os gestores da educaçãotiram do professorado o controle sobre aconcepção e juízo de seu trabalho, transformandoesta em uma tarefa de especialistas, exigem-lhemais eficiência na execução de suas prescriçõeseducativas, além de propor e acrescentar ao seutrabalho novas funções para atender às demandassociais emergentes e à burocracia educativa.Como apontam Apple e Teitelbaun (1991), nãoexiste nada mais contundente na promoção daalienação e do desânimo do professorado que aperda do controle do próprio trabalho. Oprofessorado passa de sujeito a objeto dotrabalho educativo.

De qualquer maneira, o caso do profes-sorado de educação física aponta a uma situaçãoambígua. Pode indicar que a mais-valia se efetuana perseguição do dinheiro e no volume detrabalho, e pode estar indicando que é um âmbitoque ainda resiste ao discurso da racionalidadeeducativa.

3. CARACTERÍSTICASESPECÍFICASDOTRABALHO E

DADISCIPLINA NAESCOLAPÚBLICA

Vários aspectos caracterizam o profes-sorado de educação física dentro do coletivo deprofessores de uma escola: a roupa que usa, osmateriais de trabalho (bolas, apito e outros) e olugar em que realiza sua aula (ar livre). São as-pectos exteriores, que o distinguem do conjuntode professores e, mesmo que contribuam àconfiguração de sua cultura docente, não revelamsua essência. O que caracteriza essencialmente oprofessorado de educação física na escolapública é a qualidade de sua participação nacultura escolar e o fato de trabalhar o corpo,através do corpo e com o corpo dos alunos — omovimento e a cultura corporal. Estas caracte-rísticas são fundamentais porque estão na base desuas estratégias para fazer as coisas, desenvolverconhecimento, acumular experiência erelacionar-se com na comunidade escolar.

3.1 TRABALHAR COM O CORPO, ATRAVÉS DO

CORPO E O PRÓPRIO CORPO

Quando um professor, em aula, coloca-

se diante de seus alunos, um conjunto de per-cepções e de relações professor-aluno se esta-belecem. Em primeiro lugar, utilizando suaspalavras, tu estás à vista de todos. Pode-se dizerque o corpo do professor é objeto de constanteobservação e avaliação por parte dos alunos.Também a recíproca é verdadeira, o professorobserva os corpos dos alunos em movimento, istoé, uma relação direta, o professor não pode"proteger-se" deste olhar atrás de uma mesa detrabalho, nem os alunos podem se esconder atrásda classe. Um e outro têm que se expor, mostrar-se, além disso, com roupas confortáveis.Acostumar-se a essa situação exige tempo e, nofim, esse modo de trabalhar excede a outrosdomínios da situação escolar, como, porexemplo, as relações de gêneros sexuais.

Em aula, além de o aluno estar em movi-mento e com diversas variáveis de ação, tantopara ensinar como para corrigir um movimento,só falar não é suficiente, tem de mostrar como sefaz e principalmente tem de tocar, tanto pro-fessor-aluno como aluno-aluno. Isto possibilitauma proximidade física muito grande e relaçõesmuito autênticas desde o ponto de vista afetivo.

Por outro lado, os alunos gostam da edu-cação física, principalmente os pequenos, porqueé uma atividade própria à sua natureza. Fora daescola, os alunos gostam de jogar e a educaçãofísica faz isso com uma intencio-nalidade.Sublinham os professores que, através de umjogo ou de uma dança, é possível alcançarimportantes objetivos cognitivos no âmbito dedisciplinas como história, geografia, matemáticae outras, além de "boas " atitudes psicológicas esociais. Essa situação também possibilita umarelação afetiva próxima e, ao mesmo tempo, derespeito e consideração muito particular com osalunos e outras parcelas do professorado daescola. A relação positiva com os alunos vem doconteúdo da disciplina, da relação descontraídaque conseguem manter entre si, e do ambienteque compartilham (o pátio da escola). Aconsideração e o respeito dos demais segmentosda escola se devem à capacidade de mobilizaçãoda comunidade escolar e ao esforço que essecoletivo vem fazendo para superar suaslimitações nas questões pedagógicas maisamplas.

Para os professores, o fato de trabalharcom seu corpo e com o dos alunos ajuda aoprofessorado de educação física a se mover em

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outros ambientes, pois o corpo também fala eao trabalhar com ele, automaticamente o ex-pande. Para esses participantes, quando o pro-fessor de educação física entra num espaço,entra em uma sala, seu corpo entra com ele etambém fala, fato que chama a atenção. Aomesmo tempo, fazem questão de evidenciarcom clareza como o professorado de educa-ção física trabalha e ensina diferente de ou-tros coletivos docentes, mesmo considerando-se professores como os outros.

3.2. O SENTIDO DE SUA PARTICIPAÇÃO

NA ESCOLA PÚBLICA

A participação do professorado de edu-cação física na escola pública se caracteriza,em primeiro lugar, por uma relação de cum-plicidade com o aluno diante do cotidiano es-colar. Dividem um espaço físico indefinido,pouco freqüentado pelos demais professores,onde as atividades desenvolvidas pelos alunosem aula são diferentes da maioria das ativida-des "tradicionalmente" escolares, e muito se-melhantes a seu cotidiano fora da escola.

Por outro lado, essa cumplicidade au-menta ao longo da relação de ensino-apren-dizagem e com a comunicação que se esta-belece. Esta acontece principalmente atravésda linguagem oral e da linguagem corporal(a demonstração das atividades). Ou seja, oprofessor "demonstra" e o aluno vê a tarefaque tem de fazer, e o que ambos fazem é vis-to pelos demais no momento de fazê-lo. Estaintervenção recíproca de aluno e professorna atividade de ensino é imediata, isto é, umpossível erro na execução da atividade didá-tica é questionado no momento em que ocor-re, fato que facilita a intervenção do profes-sorado de educação física no plano das atitu-des que o sistema educativo deseja de seusalunos. Isto, por um lado, pode favorecer umtrabalho alternativo, mas por outro pode ofe-recer argumentos a visões tradicionais do tra-balho do professor de educação física, visõesque vêem na disciplina a essência de sua ati-vidade. Ou seja, através da educação física osujeito pode ter acesso a uma cultura maisampla e desenvolver formas de expressão, oupode cair na alienação. De qualquer maneira,a articulação da linguagem oral e corporal éuma fórmula muito eficiente e um ins-trumento potente demais para não ser consi-derado.

Reforço a importância do trabalho como corpo e da linguagem oral porque são ele-mentos que, além de possibilitar a cumplici-dade com o aluno, definem em grande parte epossibilitam a compreensão do sentido da par-ticipação do professorado de educação físicana escola pública. Como ilustração, lembro ateoria de Foucault (1992) sobre a tecnologiapolítica do corpo, onde as instituições como aescola, as forças militares, os hospitais e ospresídios usam técnicas corporais sutis (as dis-ciplinas e os exercícios) como elementos decoerção e controle do corpo do sujeito.

Cabe lembrar também o que diz NettoMachado (1993) sobre a linguagem oral, emseu estudo sobre a relação entre o discurso orale o discurso escrito desde a perspectiva psi-coanalítica. Usando argumentos lacanianos, aautora enfatiza o discurso escrito como possi-bilidade de análise e de intervenção no sujeitoque aprende. Ao enfatizar a escrita e criticar odiscurso oral, oferece argumentos para enten-der por que a presença do professorado de edu-cação física marca o aluno e que importantespossibilidades educativas tem esse coletivodocente, assim como as responsabilidades quelhe são exigidas. Para essa investigadora nãose pode apagar um discurso oral, pode-se so-mar outro para modificar o primeiro, mas oque está dito, dito está, uma vez que este ab-sorve toda a atenção do ouvinte e está circuns-crito à brevidade do tempo.

O fato de usar mais a comunicação oral(os professores consideram que a comunica-ção espontânea, mesmo sem palavras, é a con-dição fundamental para o professor de edu-cação física seguir na profissão) e não ter anecessidade de estar escrevendo com freqüên-cia em aula, ou não usar os meios didáticosgeralmente usados na escola, proporciona-lhesmelhores condições de observar e dialogar como aluno, como também de participar na vidada escola, em diferentes momentos e diferen-tes espaços, o que lhes oferece a possibilidadede emitir opinião sobre tudo e que, no fim, dis-tingue sua participação na escola.

Por outro lado, a relação próxima comos alunos leva a alguns problemas em suas re-lações com os demais professores, e no con-texto geral da escola, como, por exemplo, umcerto isolamento no ambiente de trabalho euma certa desconfiança de alguns setores daescola.

O isolamento está relacionado com astradições educativas, com os aspectos específicosda disciplina, e também com preconceitos,atitudes e fatos que ultrapassam o sistemaeducativo e que, até então, não foram resolvidossatisfatoriamente. Um exemplo é a visão míticada liderança do professor de educação física, dealguém que tem potencial e capacidade pararelacionar-se com os alunos e com as pessoas,que tem instrumentos para fazer e convencer,mas que só participa de forma limitada nodesenvolvimento de sua missão educativa.Explico que, neste estudo, não considerei aopinião de outras parcelas da comunidade escolarsobre a avaliação que fazem do trabalho docoletivo. Talvez seja um tema para outrasinvestigações. A base de minha interpretação sãoos fatos narrados pelo grupo de participantesdesta investigação.

Assim, considerando que geralmente aorganização do currículo escolar dá mais im-portância ao raciocínio técnico-científico emaximiza a cultura intelectual; considerando queo planejamento das reformas educativas nãorevisou esta situação e que ainda insiste nadivisão do trabalho em intelectual e material, nãoé de estranhar que o sistema educativoreivindique do professorado de educação físicasomente tarefas que exigem controle, disciplina eum caráter compensatorio do cansaço do trabalhointelectual. Considero que aqueles queconcordam com esta forma de pensar não podemqueixar-se do desacordo entre os que ensinamnas escolas e a necessidade dos alunos.

3.2.1. A sala dos professores de educação

física: entre o isolamento e o sentido de

humor

Ao longo da história, é possível verificarque, à medida que um coletivo de pessoas sesente discriminado, ou de fato é segregado,desenvolve estratégias de proteção e sobrevi-vência. Um exemplo conhecido é o das minoriasraciais. Algumas chegam ao extremo de conviverem guetos para preservar seus interesses e suacultura.

No âmbito do sistema educativo, estaquestão da resistência à hegemonia cultural étratada nas etnografías educativas desenvolvidaspor investigadores ingleses sobre as experiênciasescolares de grupos minoritários no sistemaeducativo da Grã-Bretanha. Uma de-

las é a de Grugeon (1995), que aborda o papel dacultura oral das meninas como resistente àhegemonia da cultura masculina nas escolas.Outra é a de Dubberley (1995), que expõe comoo sentido de humor é usado pelos alunos declasse obreira para resistir à cultura de classemédia ressaltada pelo professorado nas aulas.

Na prática do professorado de educaçãofísica, parece acontecer algo semelhante. Osprofessores, ao aspirar ver reconhecida suaimportância docente, e ao mesmo tempo ex-perimentar sinais de desvalorização, constróem ese congregam num espaço onde possam amparar-se. O espaço simbólico desta situação é a sala dosprofessores de educação física. Todos osparticipantes fizeram referência a esse ponto, oracomo sinal de prestígio e valorização na escola,ora como uma questão prática relacionada aosmateriais didáticos, ora como uma questãopolítica, mas nunca como sinal de uma iniciativaprópria de isolamento, mesmo que algumas vezesreconheçam as dificuldades de relacionar-se comoutros professores, pois pela formaçãopedagógica deficiente o professor de educaçãofísica se automarginaliza e assume o discurso deoutras disciplinas ao invés de construir o seu.Entretanto, para a maioria dos professores, oencaminhamento que fica para superar essasituação é que devem participar do maior númeropossível das atividades da escola, expondo seusargumentos e questionando as razões últimas dasdiferentes situações de discriminação queacontecem na escola.

A sala do professorado de educação físi-ca, em relação à dos demais professores, se di-ferencia em muitos aspectos: a) por ser infor-mal e simples, já que num único ambiente es-tão os móveis improvisados, aquecedores deágua para o café e o chimarrão, geladeira, cai-xas com os materiais esportivos ao lado do ar-quivo de documentos e materiais de escritórioe mesa de trabalho coletiva; b) por sua locali-zação na escola (perto dos equipamentos espor-tivos); c) pela presença freqüente dos alunos;d) e por alguns símbolos que refletem a histó-ria da disciplina: a presença obrigatória de umabalança ergométrica que indica seu vínculo como âmbito da prevenção da saúde, como tambémos materiais para as festividades cívicas, ban-deiras do país, do estado e da cidade.

De todas as maneiras, a sala do profes-

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outros ambientes, pois o corpo também fala eao trabalhar com ele, automaticamente o ex-pande. Para esses participantes, quando o pro-fessor de educação física entra num espaço,entra em uma sala, seu corpo entra com ele etambém fala, fato que chama a atenção. Aomesmo tempo, fazem questão de evidenciarcom clareza como o professorado de educa-ção física trabalha e ensina diferente de ou-tros coletivos docentes, mesmo considerando-se professores como os outros.

3.2. O SENTIDO DE SUA PARTICIPAÇÃO

NA ESCOLA PÚBLICA

A participação do professorado de edu-cação física na escola pública se caracteriza,em primeiro lugar, por uma relação de cum-plicidade com o aluno diante do cotidiano es-colar. Dividem um espaço físico indefinido,pouco freqüentado pelos demais professores,onde as atividades desenvolvidas pelos alunosem aula são diferentes da maioria das ativida-des "tradicionalmente" escolares, e muito se-melhantes a seu cotidiano fora da escola.

Por outro lado, essa cumplicidade au-menta ao longo da relação de ensino-apren-dizagem e com a comunicação que se esta-belece. Esta acontece principalmente atravésda linguagem oral e da linguagem corporal(a demonstração das atividades). Ou seja, oprofessor "demonstra" e o aluno vê a tarefaque tem de fazer, e o que ambos fazem é vis-to pelos demais no momento de fazê-lo. Estaintervenção recíproca de aluno e professorna atividade de ensino é imediata, isto é, umpossível erro na execução da atividade didá-tica é questionado no momento em que ocor-re, fato que facilita a intervenção do profes-sorado de educação física no plano das atitu-des que o sistema educativo deseja de seusalunos. Isto, por um lado, pode favorecer umtrabalho alternativo, mas por outro pode ofe-recer argumentos a visões tradicionais do tra-balho do professor de educação física, visõesque vêem na disciplina a essência de sua ati-vidade. Ou seja, através da educação física osujeito pode ter acesso a uma cultura maisampla e desenvolver formas de expressão, oupode cair na alienação. De qualquer maneira,a articulação da linguagem oral e corporal éuma fórmula muito eficiente e um ins-trumento potente demais para não ser consi-derado.

Reforço a importância do trabalho como corpo e da linguagem oral porque são ele-mentos que, além de possibilitar a cumplici-dade com o aluno, definem em grande parte epossibilitam a compreensão do sentido da par-ticipação do professorado de educação físicana escola pública. Como ilustração, lembro ateoria de Foucault (1992) sobre a tecnologiapolítica do corpo, onde as instituições como aescola, as forças militares, os hospitais e ospresídios usam técnicas corporais sutis (as dis-ciplinas e os exercícios) como elementos decoerção e controle do corpo do sujeito.

Cabe lembrar também o que diz NettoMachado (1993) sobre a linguagem oral, emseu estudo sobre a relação entre o discurso orale o discurso escrito desde a perspectiva psi-coanalítica. Usando argumentos lacanianos, aautora enfatiza o discurso escrito como possi-bilidade de análise e de intervenção no sujeitoque aprende. Ao enfatizar a escrita e criticar odiscurso oral, oferece argumentos para enten-der por que a presença do professorado de edu-cação física marca o aluno e que importantespossibilidades educativas tem esse coletivodocente, assim como as responsabilidades quelhe são exigidas. Para essa investigadora nãose pode apagar um discurso oral, pode-se so-mar outro para modificar o primeiro, mas oque está dito, dito está, uma vez que este ab-sorve toda a atenção do ouvinte e está circuns-crito à brevidade do tempo.

O fato de usar mais a comunicação oral(os professores consideram que a comunica-ção espontânea, mesmo sem palavras, é a con-dição fundamental para o professor de edu-cação física seguir na profissão) e não ter anecessidade de estar escrevendo com freqüên-cia em aula, ou não usar os meios didáticosgeralmente usados na escola, proporciona-lhesmelhores condições de observar e dialogar como aluno, como também de participar na vidada escola, em diferentes momentos e diferen-tes espaços, o que lhes oferece a possibilidadede emitir opinião sobre tudo e que, no fim, dis-tingue sua participação na escola.

Por outro lado, a relação próxima comos alunos leva a alguns problemas em suas re-lações com os demais professores, e no con-texto geral da escola, como, por exemplo, umcerto isolamento no ambiente de trabalho euma certa desconfiança de alguns setores daescola.

O isolamento está relacionado com astradições educativas, com os aspectos específicosda disciplina, e também com preconceitos,atitudes e fatos que ultrapassam o sistemaeducativo e que, até então, não foram resolvidossatisfatoriamente. Um exemplo é a visão míticada liderança do professor de educação física, dealguém que tem potencial e capacidade pararelacionar-se com os alunos e com as pessoas,que tem instrumentos para fazer e convencer,mas que só participa de forma limitada nodesenvolvimento de sua missão educativa.Explico que, neste estudo, não considerei aopinião de outras parcelas da comunidade escolarsobre a avaliação que fazem do trabalho docoletivo. Talvez seja um tema para outrasinvestigações. A base de minha interpretação sãoos fatos narrados pelo grupo de participantesdesta investigação.

Assim, considerando que geralmente aorganização do currículo escolar dá mais im-portância ao raciocínio técnico-científico emaximiza a cultura intelectual; considerando queo planejamento das reformas educativas nãorevisou esta situação e que ainda insiste nadivisão do trabalho em intelectual e material, nãoé de estranhar que o sistema educativoreivindique do professorado de educação físicasomente tarefas que exigem controle, disciplina eum caráter compensatorio do cansaço do trabalhointelectual. Considero que aqueles queconcordam com esta forma de pensar não podemqueixar-se do desacordo entre os que ensinamnas escolas e a necessidade dos alunos.

3.2.1. A sala dos professores de educação

física: entre o isolamento e o sentido de

humor

Ao longo da história, é possível verificarque, à medida que um coletivo de pessoas sesente discriminado, ou de fato é segregado,desenvolve estratégias de proteção e sobrevi-vência. Um exemplo conhecido é o das minoriasraciais. Algumas chegam ao extremo de conviverem guetos para preservar seus interesses e suacultura.

No âmbito do sistema educativo, estaquestão da resistência à hegemonia cultural étratada nas etnografías educativas desenvolvidaspor investigadores ingleses sobre as experiênciasescolares de grupos minoritários no sistemaeducativo da Grã-Bretanha. Uma de-

las é a de Grugeon (1995), que aborda o papel dacultura oral das meninas como resistente àhegemonia da cultura masculina nas escolas.Outra é a de Dubberley (1995), que expõe comoo sentido de humor é usado pelos alunos declasse obreira para resistir à cultura de classemédia ressaltada pelo professorado nas aulas.

Na prática do professorado de educaçãofísica, parece acontecer algo semelhante. Osprofessores, ao aspirar ver reconhecida suaimportância docente, e ao mesmo tempo ex-perimentar sinais de desvalorização, constróem ese congregam num espaço onde possam amparar-se. O espaço simbólico desta situação é a sala dosprofessores de educação física. Todos osparticipantes fizeram referência a esse ponto, oracomo sinal de prestígio e valorização na escola,ora como uma questão prática relacionada aosmateriais didáticos, ora como uma questãopolítica, mas nunca como sinal de uma iniciativaprópria de isolamento, mesmo que algumas vezesreconheçam as dificuldades de relacionar-se comoutros professores, pois pela formaçãopedagógica deficiente o professor de educaçãofísica se automarginaliza e assume o discurso deoutras disciplinas ao invés de construir o seu.Entretanto, para a maioria dos professores, oencaminhamento que fica para superar essasituação é que devem participar do maior númeropossível das atividades da escola, expondo seusargumentos e questionando as razões últimas dasdiferentes situações de discriminação queacontecem na escola.

A sala do professorado de educação físi-ca, em relação à dos demais professores, se di-ferencia em muitos aspectos: a) por ser infor-mal e simples, já que num único ambiente es-tão os móveis improvisados, aquecedores deágua para o café e o chimarrão, geladeira, cai-xas com os materiais esportivos ao lado do ar-quivo de documentos e materiais de escritórioe mesa de trabalho coletiva; b) por sua locali-zação na escola (perto dos equipamentos espor-tivos); c) pela presença freqüente dos alunos;d) e por alguns símbolos que refletem a histó-ria da disciplina: a presença obrigatória de umabalança ergométrica que indica seu vínculo como âmbito da prevenção da saúde, como tambémos materiais para as festividades cívicas, ban-deiras do país, do estado e da cidade.

De todas as maneiras, a sala do profes-

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Ou seja, cadaprofessor FAZ O

QUE PODE dentrodas condições

materiais objeti-vas que dispõe, eFAZ O QUE QUERdentro da ampia

faixa de liberdaderelativa obtida na

escola pública.

sorado de educação física é um espaço de pro-teção contra o cansaço docente, e ao mesmotempo lugar onde discutem seus interessesdocentes e pessoais. Ali reforçam sua culturadocente, socializam os professores novatos,produzem um tipo de conhecimento, encon-tram soluções criativas para seus problemas e,sobretudo, contradizem a ordem do sistemaeducativo através de um recurso muito inte-ressante que é o sentido de humor.

Mesmo brigando por suas idéias nãoperdem o bom humor. Ainda que se pense queas brincadeiras tiram a seriedade de seu traba-lho, acontece o contrário, é através delas queeles estabelecem seus limites, sua organizaçãogrupai, expõem e discutem seus argumentos,desafiam e dialogam com seus interlocutores.Reunidos em seu espaço simbólico, na sala dosprofessores de educação física, estabelecemmedidas de controle de uns aos outros. E umaforma do grupo se proteger e ao mesmo tem-po resolver situações irregulares, sem sercorporativista. Estratégia que se desenvolveno fato de que a escola pública, ao mesmo tem-po em que oferece um grande espaço e liber-dade para o desenvolvimento de um trabalhode qualidade, de reflexão crítica e de inova-ções curriculares, também fomenta condiçõesfavoráveis para a omissão e a inércia.

4.COMOFAZEMASCOISAS?

Organizando-se para que a educação fí-sica venha a se constituir em componentecurricular, mas ainda sem a pressão de cum-prir um currículo mínimo obrigatório previstopara cada série do ensino escolar, o professo-rado de educação física geralmente programaos conteúdos de suas aulas seguindo três ori-entações gerais de caráter oficial para cadanível de ensino. Atividades globalizadas até a4a série do ensino fundamental, aprendizagemdesportiva de 5a a 8a série do mesmo nível deensino, e prática desportiva para o ensino mé-dio. Além disso, as atividades programadaspodem ser trabalhadas em aula, dentro da pers-pectiva do rendimento físico ou dentro da pers-pectiva do lazer.4 Dos alunos o currículo exigeum mínimo de freqüência obrigatória deacordo com a legislação vigente.

Com normativas tão amplas, a práticado professorado de educação física nas esco-las públicas de Porto Alegre fica influenciada

por: a) as condições materiais objetivas de cadaescola; b) as preferências de trabalho pessoaisdo professorado; c) o amplo espaço de liber-dade relativa que se dispõe nas escolas.

Quero dizer que, além do conteúdo, todaa participação do professorado de educaçãofísica está condicionada por suas preferênciase idiossincrasias pessoais construídas ao lon-go de sua aprendizagem em ação e atividadesde formação. Ou seja, cada professor FAZ OQUE PODE dentro das condições materiaisobjetivas que dispõe, e FAZ O QUE QUERdentro da ampla faixa de liberdade relativaobtida na escola pública.

4.1. UMA PRÁTICA COM GRANDE LIBERDADE

RELATIVA: O PROFESSORADO FAZ O QUE PODE E

O QUE QUER

Além das condições materiais adversas,este fazer o que pode está vinculado à poucaorientação de caráter pedagógico que recebeda administração para realizar seu trabalhocom os alunos. Possivelmente, em alguns ca-sos — principalmente aqueles que trabalhamem escolas de ensino fundamental —, a poucaorientação recebida é a da licenciatura e tal-vez nas iniciativas próprias de auto-formação.Geralmente trabalham sozinhos e recebempouco apoio institucional. Além disso, as ad-ministrações municipais e do estado, princi-palmente esta última, não oferecem ao profes-sor um trabalho de acompanhamento pedagó-gico. Nessas ocasiões, o professor busca solu-ções para seus problemas do dia-a-dia de aula,recorrendo, de maneira informal, a colegasmais experientes ou em outros ambientes detrabalho.

O fazer o que quer na escola pública estárelacionado em grande parte com a "des-consideração teórica e prática" que existequanto a seu trabalho. Os participantes argu-mentaram que confiam pouco na supervisãopedagógica da escola, e as orientações quechegam da administração não consideram suasnecessidades. Situação difícil de compreender,pois as administrações públicas, geralmente,dispõem de pessoal especializado para aten-der às exigências de orientação e formaçãopermanente do professorado de educação físi-ca. De qualquer maneira, a maioria dos parti-cipantes sublinhou em primeiro lugar que,quando chega até eles alguma orientação da

administração, esta não é a de que precisam e,em segundo lugar, não leva em conta sua práticadocente. Quando chega uma orientação, ou aadaptam, ou a esquecem.

A adaptação das orientações da admi-nistração, como também sua rejeição, constituemuma estratégia de resistência e de autonomia detrabalho. Isto confere uma certa identidade aoprofessorado de educação física entre osprofessores da escola. Nesse sentido, seusargumentos são muito sugestivos. Consideramque o trabalho na escola pública estáessencialmente vinculado ao interesse do pro-fessor, pois se ele não tiver interesse, passa otempo sem que ninguém sinta sua presença, poisé livre para executar o plano que quiser.Acreditam que a própria administração não temclaro seu projeto pedagógico. Entendem que osgovernos tentam passar um significadoideológico, mas tal como está estruturada aeducação, podem dar as ordens, mas não podemter certeza que serão cumpridas ou não. Dentro daliberdade relativa, os professores fazem na sala deaula o que querem fazer. Cada um programa osconteúdos que mais gosta, planeja as estratégiasdidáticas que melhor conhece e que não levemgrande quantidade de tempo para sua preparação,mesmo que nem sempre sejam as mais adequadasao grupo de alunos.

4.1.1. As preferências de trabalho

e a presença de um pensamento machista

Dos conteúdos preferidos, os que mais sedestacaram foram atividades de condicionamentofísico, ginástica geral e esportes coletivos.Também destacou-se uma preferência portrabalhar com alunos de segundo grau e de sexomasculino, preferência que sugere a existência deum pensamento machista no interior do coletivode professores de educação física, que, de certaforma, reproduz algumas das características doesporte de alta performance, isto é, rendimento eeficiência. Este pensamento machista, que éhegemônico no contexto social, manifesta-se deforma considerável nos colaboradores do sexofeminino, e o argumento utilizado para estapreferência é de que as respostas dos meninossão mais rápidas e qualificadas do que as dasmeninas. Para os professores de educação física,trabalhar com os meninos é bom porque elesaceitam e fazem tudo que éproposto na aula, jáas meninas, além da questão da menstruação,são

classificadas como seres cheios de coisinhas,dotadas de um cansaço natural e que reclamamde tudo na aula. A comparação perfor-máticaentre os gêneros, e a qualificação negativadescontextualizada sobre o comportamento dasmeninas, no meu ponto de vista, evidenciam opensamento machista sublinhado no título destaseção.

No plano acadêmico, mesmo que porparte de poucos, percebe-se um esforço no tra-tamento da questão do gênero e a educaçãofísica, como, por exemplo, o número de temáticaespecífica da Revista Brasileira de Ciências doEsporte. Nesse volume, as autoras brasileirasRomero (1994), Taffarel e França (1994),Saraiva-Kunz (1994), Chagas (1994), Soares eGoellner (1994), e Cardoso (1994), além decriticar a ideologia masculina que configura oâmbito da educação física e dos esportes,observam como as diferenças de tratamento entrehomens e mulheres são transferidas a outrosespaços como a escola, a produção científica e osespaços onde se maximiza o culto ao corpo. Estacrítica que se encaixa, majoritariamente, nomarco de uma concepção histórico-crítica daeducação física propõe como estratégia didática àaula de educação física com grupos constituídospor homens e mulheres. Entretanto, esse trabalhoacadêmico não tem a mesma equivalência nasaulas de educação física e no esporte escolar,onde persiste a tendência a separar os alunos porsexo. Estratégia didática que também evidencia acirculação de um pensamento machista entre essegrupo de professores.

4.1.2. Fazer programação escrita: uma

questão polêmica e... feminina?

Fazer planos é possivelmente uma dastarefas pelas quais o professorado de educa-ção física diverge da cultura das escolas. Ocoletivo considera a tarefa de fazer os planosescritos pouco necessária e uma tarefa femi-nina. Consideração que, por um lado, consti-tui uma clara intenção de distinção e autono-mia de trabalho na escola, já que a escrita fa-cilita a tarefa de controlá-los; e por outro, sig-nifica também uma atitude machista, -pois acultura tradicional sexista reserva ao homemo papel de fazer e de empreender a educaçãofísica, e à mulher o papel de contemplar,reflexionar e obviamente, escrever. O fato éque a maioria do professorado de educaçãofísica não gosta de fazer planos. Quando há

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Ou seja, cadaprofessor FAZ O

QUE PODE dentrodas condições

materiais objeti-vas que dispõe, eFAZ O QUE QUERdentro da ampia

faixa de liberdaderelativa obtida na

escola pública.

sorado de educação física é um espaço de pro-teção contra o cansaço docente, e ao mesmotempo lugar onde discutem seus interessesdocentes e pessoais. Ali reforçam sua culturadocente, socializam os professores novatos,produzem um tipo de conhecimento, encon-tram soluções criativas para seus problemas e,sobretudo, contradizem a ordem do sistemaeducativo através de um recurso muito inte-ressante que é o sentido de humor.

Mesmo brigando por suas idéias nãoperdem o bom humor. Ainda que se pense queas brincadeiras tiram a seriedade de seu traba-lho, acontece o contrário, é através delas queeles estabelecem seus limites, sua organizaçãogrupai, expõem e discutem seus argumentos,desafiam e dialogam com seus interlocutores.Reunidos em seu espaço simbólico, na sala dosprofessores de educação física, estabelecemmedidas de controle de uns aos outros. E umaforma do grupo se proteger e ao mesmo tem-po resolver situações irregulares, sem sercorporativista. Estratégia que se desenvolveno fato de que a escola pública, ao mesmo tem-po em que oferece um grande espaço e liber-dade para o desenvolvimento de um trabalhode qualidade, de reflexão crítica e de inova-ções curriculares, também fomenta condiçõesfavoráveis para a omissão e a inércia.

4.COMOFAZEMASCOISAS?

Organizando-se para que a educação fí-sica venha a se constituir em componentecurricular, mas ainda sem a pressão de cum-prir um currículo mínimo obrigatório previstopara cada série do ensino escolar, o professo-rado de educação física geralmente programaos conteúdos de suas aulas seguindo três ori-entações gerais de caráter oficial para cadanível de ensino. Atividades globalizadas até a4a série do ensino fundamental, aprendizagemdesportiva de 5a a 8a série do mesmo nível deensino, e prática desportiva para o ensino mé-dio. Além disso, as atividades programadaspodem ser trabalhadas em aula, dentro da pers-pectiva do rendimento físico ou dentro da pers-pectiva do lazer.4 Dos alunos o currículo exigeum mínimo de freqüência obrigatória deacordo com a legislação vigente.

Com normativas tão amplas, a práticado professorado de educação física nas esco-las públicas de Porto Alegre fica influenciada

por: a) as condições materiais objetivas de cadaescola; b) as preferências de trabalho pessoaisdo professorado; c) o amplo espaço de liber-dade relativa que se dispõe nas escolas.

Quero dizer que, além do conteúdo, todaa participação do professorado de educaçãofísica está condicionada por suas preferênciase idiossincrasias pessoais construídas ao lon-go de sua aprendizagem em ação e atividadesde formação. Ou seja, cada professor FAZ OQUE PODE dentro das condições materiaisobjetivas que dispõe, e FAZ O QUE QUERdentro da ampla faixa de liberdade relativaobtida na escola pública.

4.1. UMA PRÁTICA COM GRANDE LIBERDADE

RELATIVA: O PROFESSORADO FAZ O QUE PODE E

O QUE QUER

Além das condições materiais adversas,este fazer o que pode está vinculado à poucaorientação de caráter pedagógico que recebeda administração para realizar seu trabalhocom os alunos. Possivelmente, em alguns ca-sos — principalmente aqueles que trabalhamem escolas de ensino fundamental —, a poucaorientação recebida é a da licenciatura e tal-vez nas iniciativas próprias de auto-formação.Geralmente trabalham sozinhos e recebempouco apoio institucional. Além disso, as ad-ministrações municipais e do estado, princi-palmente esta última, não oferecem ao profes-sor um trabalho de acompanhamento pedagó-gico. Nessas ocasiões, o professor busca solu-ções para seus problemas do dia-a-dia de aula,recorrendo, de maneira informal, a colegasmais experientes ou em outros ambientes detrabalho.

O fazer o que quer na escola pública estárelacionado em grande parte com a "des-consideração teórica e prática" que existequanto a seu trabalho. Os participantes argu-mentaram que confiam pouco na supervisãopedagógica da escola, e as orientações quechegam da administração não consideram suasnecessidades. Situação difícil de compreender,pois as administrações públicas, geralmente,dispõem de pessoal especializado para aten-der às exigências de orientação e formaçãopermanente do professorado de educação físi-ca. De qualquer maneira, a maioria dos parti-cipantes sublinhou em primeiro lugar que,quando chega até eles alguma orientação da

administração, esta não é a de que precisam e,em segundo lugar, não leva em conta sua práticadocente. Quando chega uma orientação, ou aadaptam, ou a esquecem.

A adaptação das orientações da admi-nistração, como também sua rejeição, constituemuma estratégia de resistência e de autonomia detrabalho. Isto confere uma certa identidade aoprofessorado de educação física entre osprofessores da escola. Nesse sentido, seusargumentos são muito sugestivos. Consideramque o trabalho na escola pública estáessencialmente vinculado ao interesse do pro-fessor, pois se ele não tiver interesse, passa otempo sem que ninguém sinta sua presença, poisé livre para executar o plano que quiser.Acreditam que a própria administração não temclaro seu projeto pedagógico. Entendem que osgovernos tentam passar um significadoideológico, mas tal como está estruturada aeducação, podem dar as ordens, mas não podemter certeza que serão cumpridas ou não. Dentro daliberdade relativa, os professores fazem na sala deaula o que querem fazer. Cada um programa osconteúdos que mais gosta, planeja as estratégiasdidáticas que melhor conhece e que não levemgrande quantidade de tempo para sua preparação,mesmo que nem sempre sejam as mais adequadasao grupo de alunos.

4.1.1. As preferências de trabalho

e a presença de um pensamento machista

Dos conteúdos preferidos, os que mais sedestacaram foram atividades de condicionamentofísico, ginástica geral e esportes coletivos.Também destacou-se uma preferência portrabalhar com alunos de segundo grau e de sexomasculino, preferência que sugere a existência deum pensamento machista no interior do coletivode professores de educação física, que, de certaforma, reproduz algumas das características doesporte de alta performance, isto é, rendimento eeficiência. Este pensamento machista, que éhegemônico no contexto social, manifesta-se deforma considerável nos colaboradores do sexofeminino, e o argumento utilizado para estapreferência é de que as respostas dos meninossão mais rápidas e qualificadas do que as dasmeninas. Para os professores de educação física,trabalhar com os meninos é bom porque elesaceitam e fazem tudo que éproposto na aula, jáas meninas, além da questão da menstruação,são

classificadas como seres cheios de coisinhas,dotadas de um cansaço natural e que reclamamde tudo na aula. A comparação perfor-máticaentre os gêneros, e a qualificação negativadescontextualizada sobre o comportamento dasmeninas, no meu ponto de vista, evidenciam opensamento machista sublinhado no título destaseção.

No plano acadêmico, mesmo que porparte de poucos, percebe-se um esforço no tra-tamento da questão do gênero e a educaçãofísica, como, por exemplo, o número de temáticaespecífica da Revista Brasileira de Ciências doEsporte. Nesse volume, as autoras brasileirasRomero (1994), Taffarel e França (1994),Saraiva-Kunz (1994), Chagas (1994), Soares eGoellner (1994), e Cardoso (1994), além decriticar a ideologia masculina que configura oâmbito da educação física e dos esportes,observam como as diferenças de tratamento entrehomens e mulheres são transferidas a outrosespaços como a escola, a produção científica e osespaços onde se maximiza o culto ao corpo. Estacrítica que se encaixa, majoritariamente, nomarco de uma concepção histórico-crítica daeducação física propõe como estratégia didática àaula de educação física com grupos constituídospor homens e mulheres. Entretanto, esse trabalhoacadêmico não tem a mesma equivalência nasaulas de educação física e no esporte escolar,onde persiste a tendência a separar os alunos porsexo. Estratégia didática que também evidencia acirculação de um pensamento machista entre essegrupo de professores.

4.1.2. Fazer programação escrita: uma

questão polêmica e... feminina?

Fazer planos é possivelmente uma dastarefas pelas quais o professorado de educa-ção física diverge da cultura das escolas. Ocoletivo considera a tarefa de fazer os planosescritos pouco necessária e uma tarefa femi-nina. Consideração que, por um lado, consti-tui uma clara intenção de distinção e autono-mia de trabalho na escola, já que a escrita fa-cilita a tarefa de controlá-los; e por outro, sig-nifica também uma atitude machista, -pois acultura tradicional sexista reserva ao homemo papel de fazer e de empreender a educaçãofísica, e à mulher o papel de contemplar,reflexionar e obviamente, escrever. O fato éque a maioria do professorado de educaçãofísica não gosta de fazer planos. Quando há

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Quando participa

do processopolítico da

escola, sua

participação édecisiva.

necessidade de escrever o planejamento, re-servam essa tarefa às mulheres do grupo, poiselas fazem planos bem bonitos.

Os participantes sustentam que plane-jam de outra forma, selecionando materiais,recursos didáticos e consultando livros quan-do têm algum problema em classe. Os maisexperientes destacam que os anos de práticafazem com que prescindam de escrever por-que, por um lado, as coisas se repetem, masquando começaram na carreira, sim, planeja-vam. Por outro lado, a decisão de não fazerplanos escritos para a aula de educação físicase deve a muitos fatores, tais como: as situa-ções de aula mudam muito, principalmente emfunção do lugar onde as aulas são dadas; asenormes diferenças entre os grupos; o mate-rial de que dispõem no momento da aula; anão existência de um currículo mínimo, já queé considerada uma atividade curricular ao in-vés de disciplina. Para enfrentar este tipo desituação sublinham que o professor já tem pen-sado um plano básico.

Mesmo que a maioria dos participantestenha confirmado que a inexistência de pla-nos escritos não significa que não tenha suasaulas planejadas, é importante destacar que nãohá uniformidade sobre a questão de fazer pla-nos escritos. Destacaram também que, quan-do querem mudar suas estratégias didáticas,recorrem a planos mais detalhados e que essaatitude pode ser considerada uma falha doprofessorado de educação física.

O fato é que, à medida que o coletivorenuncia à sistematização escrita, seu traba-lho de ensinar vai-se caracterizando e sendoidentificado especificamente pelo fazer. Mes-mo que isto lhe cause certos problemas na co-munidade escolar, como a impossibilidade desupervisão, acompanhamento e registros sis-temáticos do seu trabalho, faz mais dinâmicae livre sua atividade docente junto aos alunos,e também dinamiza sua participação na cultu-ra e na micropolítica da escola, já que o pro-fessor tem mais tempo para se dedicar a ques-tões dessa natureza.

4.1.3 Participação política na escola pública

A ampla liberdade relativa de que dis-põem para atuar, o fato de trabalhar de acordocom suas preferências pessoais, a programa-

ção de ensino pouco sistematizada e uma rela-ção muito próxima com o aluno oferecem aosprofessores de educação física possibilidadesde ocupar um espaço político privilegiado nacultura da escola.

Uma considerável parte do professora-do das escolas públicas de Porto Alegre estáprofundamente vinculada as questões sindi-cais, fato que desenvolve nos participantes umaconsciência social e política aguda. Destacoeste ponto porque chama a atenção: Como umcoletivo docente, sobre o qual recaem precon-ceitos negativos relacionados com seu traba-lho educativo, pode estar tão implicado e com-prometido com questões tão relevantes comoa defesa da escola pública e a socialização dosbenefícios sociais, concretamente demonstra-do no exercício da direção sindical e na dire-ção das escolas?

Nesse sentido, observei que os temasque mereceram mais atenção nas discussõesdo professorado participante deste estudo fo-ram os temas políticos e sindicais. Os profes-sores que mais falaram destes temas foram osque tiveram ou tinham experiência adminis-trativa ou militância política. Além disso, es-ses professores me demonstraram um elevadograu de consciência política, ao contrário doque pensam outros segmentos da comunidadeescolar.

A participação política do professora-do de educação física na escola se dá em doisâmbitos, relacionados entre si. O primeiro é oâmbito da administração, quando participa deforma efetiva no processo de decisão que afe-ta a macropolítica da escola, isto é, em proce-dimentos gerais de administração (obras físi-cas, aquisição de equipamentos, serviços a ofe-recer, etc), em objetivos educativos a serembuscados pela escola (participação na elabo-ração do projeto pedagógico), na articulaçãocom a comunidade escolar (campanhasinstitucionais). Esta participação é facilitadae mais efetiva quanto mais democrático e am-plo é o processo de tomada de decisões na es-cola, pois têm um aliado muito importante: oaluno. Quando participa do processo políticoda escola, sua participação é decisiva.

Nas escolas municipais, onde os alunosparticipam atualmente na eleição de diretores,a porcentagem de diretores pertencentes aoprofessorado de educação física é maior que a

das escolas estaduais, onde a eleição de dire-tores pela comunidade escolar foi inviabilizada(Quadros 1, 2, 3). Em vários momentos, tam-bém pude observar a influência política docoletivo de professores de educação física nasescolas onde realizei o trabalho de campo. Umdesses momentos foi quando estava na sala dosprofessores de educação física e entrou umaprofessora que era candidata à diretora da es-cola e solicitou o apoio do grupo de forma in-cisiva. Percebi, no dialogo que mantiveram,que obter o apoio do grupo era importante parasuas pretensões.

O segundo âmbito de participação polí-tica é junto a seus alunos. Sua influência polí-tica sobre o aluno é muito direta (trabalho como corpo e a utilização da linguagem oral); alémdisso, os resultados dessa intervenção ultra-passam o âmbito do puramente escolar e têminfluência no pensamento geral dos alunos.Destacam que talvez o professorado de edu-cação física seja o mais politizado da escola.Sustentam esse pensamento no fato de que, acada dia, o professorado de educação físicaocupa espaços políticos cada vez maiores nasescolas públicas. Os Quadros 1, 2 e 3 mos-

tram a porcentagem de professores de educa-ção física que ocupam cargos de direção nasescolas públicas de Porto Alegre. Sublinho quedividem espaço com o professorado de disci-plinas tradicionais da cultura escolar de baseintelectualista, mesmo que estejam ainda lon-ge da hegemonia política do professorado comformação em pedagogia.

Destaco que na rede municipal, mesmoque o número absoluto de diretores de escolaseja menor que na rede estadual, em termosrelativos, a porcentagem é maior. Isto é, quaseum em cada quatro diretores é licenciado emeducação física, dado que me parece relevan-te considerando que, na data de sua coleta,somente a rede municipal realizava eleiçõesdiretas dos diretores das escolas, pela comu-nidade escolar. Este fato reforça a afirmaçãoque fiz sobre a relação entre o grau democráti-co do processo de tomada de decisões na es-cola e a ocupação do espaço político pelo pro-fessorado de educação física. O fato se confir-ma na porcentagem relativa aos vice-direto-res: enquanto na rede estadual, 7,5% do totalsão licenciados em educação física, na redemunicipal esta porcentagem sobe para 10%.

Quadro 1. Professores de Educação Física que ocupam cargo de diretor e vice-diretor nasescolas municipais -junho de 1995. Escolas regulares de ensino básico.

Diretores Vice-diretores

Educação Física 22,5% 10%

Outros 77,5% 90%

Total 40 escolas

Fonte: SMED/PMPA

Quadro 2. Formação dos diretores de escolas públicas de Porto Alegre - rede estadual junhode 1995.

N° Formação N° Formação

01 Física 10 Estudos sociais01 Moral e Cívica 14 Historia01 Administração de Empresas 16 Matemática

01 Técnicas Agrícolas 16 Educação Física = 6,2% do total

02 Geografia 19 Magistério03 Filosofia 20 Ciências físicas e biológicas06 Educação Artística 23 Não-identificados08 Química 48 Letras

69 Pedagogia

Total = 258 diretores

Fonte: SE/RS

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Quando participa

do processopolítico da

escola, sua

participação édecisiva.

necessidade de escrever o planejamento, re-servam essa tarefa às mulheres do grupo, poiselas fazem planos bem bonitos.

Os participantes sustentam que plane-jam de outra forma, selecionando materiais,recursos didáticos e consultando livros quan-do têm algum problema em classe. Os maisexperientes destacam que os anos de práticafazem com que prescindam de escrever por-que, por um lado, as coisas se repetem, masquando começaram na carreira, sim, planeja-vam. Por outro lado, a decisão de não fazerplanos escritos para a aula de educação físicase deve a muitos fatores, tais como: as situa-ções de aula mudam muito, principalmente emfunção do lugar onde as aulas são dadas; asenormes diferenças entre os grupos; o mate-rial de que dispõem no momento da aula; anão existência de um currículo mínimo, já queé considerada uma atividade curricular ao in-vés de disciplina. Para enfrentar este tipo desituação sublinham que o professor já tem pen-sado um plano básico.

Mesmo que a maioria dos participantestenha confirmado que a inexistência de pla-nos escritos não significa que não tenha suasaulas planejadas, é importante destacar que nãohá uniformidade sobre a questão de fazer pla-nos escritos. Destacaram também que, quan-do querem mudar suas estratégias didáticas,recorrem a planos mais detalhados e que essaatitude pode ser considerada uma falha doprofessorado de educação física.

O fato é que, à medida que o coletivorenuncia à sistematização escrita, seu traba-lho de ensinar vai-se caracterizando e sendoidentificado especificamente pelo fazer. Mes-mo que isto lhe cause certos problemas na co-munidade escolar, como a impossibilidade desupervisão, acompanhamento e registros sis-temáticos do seu trabalho, faz mais dinâmicae livre sua atividade docente junto aos alunos,e também dinamiza sua participação na cultu-ra e na micropolítica da escola, já que o pro-fessor tem mais tempo para se dedicar a ques-tões dessa natureza.

4.1.3 Participação política na escola pública

A ampla liberdade relativa de que dis-põem para atuar, o fato de trabalhar de acordocom suas preferências pessoais, a programa-

ção de ensino pouco sistematizada e uma rela-ção muito próxima com o aluno oferecem aosprofessores de educação física possibilidadesde ocupar um espaço político privilegiado nacultura da escola.

Uma considerável parte do professora-do das escolas públicas de Porto Alegre estáprofundamente vinculada as questões sindi-cais, fato que desenvolve nos participantes umaconsciência social e política aguda. Destacoeste ponto porque chama a atenção: Como umcoletivo docente, sobre o qual recaem precon-ceitos negativos relacionados com seu traba-lho educativo, pode estar tão implicado e com-prometido com questões tão relevantes comoa defesa da escola pública e a socialização dosbenefícios sociais, concretamente demonstra-do no exercício da direção sindical e na dire-ção das escolas?

Nesse sentido, observei que os temasque mereceram mais atenção nas discussõesdo professorado participante deste estudo fo-ram os temas políticos e sindicais. Os profes-sores que mais falaram destes temas foram osque tiveram ou tinham experiência adminis-trativa ou militância política. Além disso, es-ses professores me demonstraram um elevadograu de consciência política, ao contrário doque pensam outros segmentos da comunidadeescolar.

A participação política do professora-do de educação física na escola se dá em doisâmbitos, relacionados entre si. O primeiro é oâmbito da administração, quando participa deforma efetiva no processo de decisão que afe-ta a macropolítica da escola, isto é, em proce-dimentos gerais de administração (obras físi-cas, aquisição de equipamentos, serviços a ofe-recer, etc), em objetivos educativos a serembuscados pela escola (participação na elabo-ração do projeto pedagógico), na articulaçãocom a comunidade escolar (campanhasinstitucionais). Esta participação é facilitadae mais efetiva quanto mais democrático e am-plo é o processo de tomada de decisões na es-cola, pois têm um aliado muito importante: oaluno. Quando participa do processo políticoda escola, sua participação é decisiva.

Nas escolas municipais, onde os alunosparticipam atualmente na eleição de diretores,a porcentagem de diretores pertencentes aoprofessorado de educação física é maior que a

das escolas estaduais, onde a eleição de dire-tores pela comunidade escolar foi inviabilizada(Quadros 1, 2, 3). Em vários momentos, tam-bém pude observar a influência política docoletivo de professores de educação física nasescolas onde realizei o trabalho de campo. Umdesses momentos foi quando estava na sala dosprofessores de educação física e entrou umaprofessora que era candidata à diretora da es-cola e solicitou o apoio do grupo de forma in-cisiva. Percebi, no dialogo que mantiveram,que obter o apoio do grupo era importante parasuas pretensões.

O segundo âmbito de participação polí-tica é junto a seus alunos. Sua influência polí-tica sobre o aluno é muito direta (trabalho como corpo e a utilização da linguagem oral); alémdisso, os resultados dessa intervenção ultra-passam o âmbito do puramente escolar e têminfluência no pensamento geral dos alunos.Destacam que talvez o professorado de edu-cação física seja o mais politizado da escola.Sustentam esse pensamento no fato de que, acada dia, o professorado de educação físicaocupa espaços políticos cada vez maiores nasescolas públicas. Os Quadros 1, 2 e 3 mos-

tram a porcentagem de professores de educa-ção física que ocupam cargos de direção nasescolas públicas de Porto Alegre. Sublinho quedividem espaço com o professorado de disci-plinas tradicionais da cultura escolar de baseintelectualista, mesmo que estejam ainda lon-ge da hegemonia política do professorado comformação em pedagogia.

Destaco que na rede municipal, mesmoque o número absoluto de diretores de escolaseja menor que na rede estadual, em termosrelativos, a porcentagem é maior. Isto é, quaseum em cada quatro diretores é licenciado emeducação física, dado que me parece relevan-te considerando que, na data de sua coleta,somente a rede municipal realizava eleiçõesdiretas dos diretores das escolas, pela comu-nidade escolar. Este fato reforça a afirmaçãoque fiz sobre a relação entre o grau democráti-co do processo de tomada de decisões na es-cola e a ocupação do espaço político pelo pro-fessorado de educação física. O fato se confir-ma na porcentagem relativa aos vice-direto-res: enquanto na rede estadual, 7,5% do totalsão licenciados em educação física, na redemunicipal esta porcentagem sobe para 10%.

Quadro 1. Professores de Educação Física que ocupam cargo de diretor e vice-diretor nasescolas municipais -junho de 1995. Escolas regulares de ensino básico.

Diretores Vice-diretores

Educação Física 22,5% 10%

Outros 77,5% 90%

Total 40 escolas

Fonte: SMED/PMPA

Quadro 2. Formação dos diretores de escolas públicas de Porto Alegre - rede estadual junhode 1995.

N° Formação N° Formação

01 Física 10 Estudos sociais01 Moral e Cívica 14 Historia01 Administração de Empresas 16 Matemática

01 Técnicas Agrícolas 16 Educação Física = 6,2% do total

02 Geografia 19 Magistério03 Filosofia 20 Ciências físicas e biológicas06 Educação Artística 23 Não-identificados08 Química 48 Letras

69 Pedagogia

Total = 258 diretores

Fonte: SE/RS

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Quadro 3. Formação dos vice-diretores — rede estadual -junho de 1995.

Formação N° Formação

Física 33 OutrosQuímica 36 Ciências sociaisGeografia 39 HistóriaArtes 39 Educação Física = 7,5% do total

Não-identificados 66 Ciências físicas e biológicasFilosofia 77 LetrasMatemática 117 PedagogiaMagistério

Total = 518 vice-diretores5

5.APRÁTICAEASRELAÇÕESENTREOPROFESSORADODEEDUCAÇÃOFÍSICAEASPARCELASDACOMUNIDADEESCOLAR

No que se refere às relações interpes-soais e docentes que o professorado de educa-ção física mantém na escola pública, os parti-cipantes destacaram que em geral não têm pro-blemas para relacionar-se. Destacam a quemantém com o aluno como a mais efetiva,interativa e próxima. Segundo os professores,é a opinião mais importante para mudar orumo de seu trabalho.

Entre os professores de educação físi-ca, a relação é próxima e franca, mas nem sem-pre harmoniosa. Existem conflitos latentesreferentes ao conhecimento de cada um, emvolta da questão de liderança e de posiçõespolíticas. Mas o aspecto que mais gera confli-tos nos grupos de educação física está relacio-nado com as estratégias didáticas. Como cadaum faz o que quer dentro de sua liberdade re-lativa, num mesmo grupo convivem com fre-qüência professores muito rigorosos em suasestratégias didáticas e nas atitudes com os alu-nos, com outros que procuram dialogar e aten-der mais ao interesse do aluno. Discutir pro-cedimentos ou avaliar um companheiro de tra-balho são situações conflitivas que, muitasvezes, ocultam problemas relacionados aocorporativismo.

Com relação aos demais professores, àdireção e funcionários da escola, mesmo quecordial, é um relacionamento formal principal-mente conseqüência, como indiquei antes, dascaracterísticas da educação física, sobretudo

pelo lugar onde se desenvolvem suas ativida-des. Mas isto não é regra geral para todos osprofessores. Existem alguns problemas rela-cionados com a direção da escola e outros maissérios com a supervisão pedagógica, especial-mente vinculados com a forma de desenvolvi-mento de seu trabalho.

O que quero sublinhar agora é que a boarelação (em geral) que o professorado de edu-cação física mantém com as demais parcelasda comunidade escolar gera efeitos significa-tivos em sua prática escolar, circunscritos a umdesejo de valorização positiva de seu trabalhodocente na escola. Isso gera uma controvérsiaentre o que pensam do seu trabalho e a avalia-ção geral que a cultura escolar tem sobre aimportância da disciplina.

Como considerei antes, as escolas pú-blicas apresentam problemas graves quanto asuas condições materiais para desenvolver atarefa de socializar o conhecimento públicodisponível. Entretanto, no caso do professorde educação física, soluciona seus problemasde forma criativa, improvisando e criandomateriais ou construindo seus próprios meiose estratégias para dar aulas. Fato que é perce-bido na escola, fazendo que algumas vezes sejachamado para solucionar problemas semelhan-tes em outros ambientes da escola, como, porexemplo, trocar uma lâmpada numa sala deaula, ou providenciar uma instalação especí-fica, ou ainda fazer tarefas administrativas oude mobilização da comunidade escolar.

A freqüência dessas situações, final-mente, conspira contra ele mesmo, lhe desvia

de sua tarefa principal que é dar aulas de edu-cação física a todos os alunos, de socializar oconhecimento público da cultura físico-desportiva disponível e socialmente acumulada.Além do mais, mutila a importância doprofessorado de educação física como docente,como professor reflexivo e como trabalhadorcapaz de desenvolver o projeto pedagógico daescola, rotulando-o como alguém que faz coisas elhe impondo uma categoria de segunda ordem naescola. Situação que facilita o entendimento dainterrogação que fiz ao começar este trabalho.Será o professorado de educação física orepresentante do trabalho material para a culturaescolar de base intelec-tualista?

5.7. QUATRO TIPOS DE PRÁTICAS

DOCENTES DO PROFESSORADO DE EDUCAÇÃO FÍSICA

Durante o trabalho de campo nas escolaspúblicas, ouvindo suas histórias, o relato de suasaulas, percebi, na perspectiva dos professores,que a prática docente do professorado deeducação física converge para quatro categoriasprincipais: práticas de conteúdo, práticascriativas, práticas reflexivo-eman-cipatórias epráticas disciplinadoras.6

a) A prática de conteúdo é aquela onde oprofessorado de educação física, com os meiosmateriais de que dispõe, e de acordo com suaspreferências pessoais, programa os conteúdospossíveis, geralmente esportes coletivos ou aulasde ginástica geral, e os desenvolve usandoestratégias didáticas convencionais e umaconcepção esportiva tradicional. Sua preocupaçãoestá centrada em desenvolver o conteúdoprogramado e que os alunos o aprendam. Sepreocupa pela iniciação desportiva e se envolvepouco na integração de sua disciplina com oprojeto pedagógico da escola, participando poucodas questões escolares mais amplas. É um tipo deprática onde a educação física não incomoda.Trabalho com o material que tem na escola. Douas minhas aulas e fim.(...) levo os guris em várioscampeonatos.

b) A prática criativa também não causacontratempos ao sistema educativo. Diante dascircunstâncias adversas e dos desafios que lheimpõem na escola, sem amparo institucional,busca ajuda em colegas mais experientes e propõealternativas criativas para atender às necessidadesdos alunos e os objetivos da es-

cola. É uma prática de elevado valor pessoal edocente, mas limitada por desconsiderar oquestionamento das razões e os porquês daimposição destas condições e destes desafios. Oprofessor dá suas aulas e, inclusive, colabora comoutras atividades dentro da rotina da escola. Éuma prática docente com elevado grau decompromisso e interação com os alunos, e secaracteriza principalmente pelo ativismo. Alémde conhecimentos específicos, desenvolvesobretudo um conhecimento do como fazer, comosolucionar os problemas de ensino que sãopropostos a ele. Não gosto de falhar com os meusalunos, nem que me entreguem umaresponsabilidade como a banda musical docentro. Nunca toquei de perto um instrumentomusical. Não sabia o que era um bumbo, o queera um surdo, o que era um tarol. Não distinguíaos instrumentos. Não sabia que aqueles paus sechamavam baqueta. Não sabia nada! Mandaramque fizesse a banda. Mas eu não sei nada. Elesdisseram: "Te vira. " (...) Mas aprendi com aprofessora de música o que era dó, ré, mi, fá, sol,la, si, e colei nas teclas. Então ela me deu unslivrinhos, com música... la, do, ré,fá. (...) Se tuolhava na rua a banda passar, achava que eusabia muito de bandas, mas não sabia nada. Nofim de tudo, hoje até tarol eu sei tocar. Tuacredita nisso ?

c) A prática disciplinadora se desenvolvecom mais freqüência no ensino primário.Caracteriza-se pelo exercício da autoridadeinstitucional sobre os alunos, controlando asformas e a circulação dos alunos na escola. Éuma prática que busca educar as atitudes, osvalores e comportamentos do aluno através dadisciplina corporal. Tem forte compromisso coma escola e com socializar os alunos para aadaptação e aceitação das normas institucionais.Está em plena contradição com os desejos dedemocratização pelos quais luta o professoradode educação física. Tem pouca interação com osalunos e desenvolve um conhecimento docontrole e do manejo de grupo, tendo inclusive apretensão de controlar os hábitos de posturacorporal dos alunos. Chego na aula, a primeiracoisa que observo é se os alunos estão sentadoscorretamente. Sua postura, olho a postura, vejose estão sentados corretamente. Faço fila paradescer. Algumas vezes, tenho que fazer elesvoltar para a aula, então faço filas. Sai primeirouma fila, então eles se organizam no corredor.Pego outra fila, até que eles se orientem. Entãodesço com eles, aí faço outra fila, então fazemos

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Quadro 3. Formação dos vice-diretores — rede estadual -junho de 1995.

Formação N° Formação

Física 33 OutrosQuímica 36 Ciências sociaisGeografia 39 HistóriaArtes 39 Educação Física = 7,5% do total

Não-identificados 66 Ciências físicas e biológicasFilosofia 77 LetrasMatemática 117 PedagogiaMagistério

Total = 518 vice-diretores5

5.APRÁTICAEASRELAÇÕESENTREOPROFESSORADODEEDUCAÇÃOFÍSICAEASPARCELASDACOMUNIDADEESCOLAR

No que se refere às relações interpes-soais e docentes que o professorado de educa-ção física mantém na escola pública, os parti-cipantes destacaram que em geral não têm pro-blemas para relacionar-se. Destacam a quemantém com o aluno como a mais efetiva,interativa e próxima. Segundo os professores,é a opinião mais importante para mudar orumo de seu trabalho.

Entre os professores de educação físi-ca, a relação é próxima e franca, mas nem sem-pre harmoniosa. Existem conflitos latentesreferentes ao conhecimento de cada um, emvolta da questão de liderança e de posiçõespolíticas. Mas o aspecto que mais gera confli-tos nos grupos de educação física está relacio-nado com as estratégias didáticas. Como cadaum faz o que quer dentro de sua liberdade re-lativa, num mesmo grupo convivem com fre-qüência professores muito rigorosos em suasestratégias didáticas e nas atitudes com os alu-nos, com outros que procuram dialogar e aten-der mais ao interesse do aluno. Discutir pro-cedimentos ou avaliar um companheiro de tra-balho são situações conflitivas que, muitasvezes, ocultam problemas relacionados aocorporativismo.

Com relação aos demais professores, àdireção e funcionários da escola, mesmo quecordial, é um relacionamento formal principal-mente conseqüência, como indiquei antes, dascaracterísticas da educação física, sobretudo

pelo lugar onde se desenvolvem suas ativida-des. Mas isto não é regra geral para todos osprofessores. Existem alguns problemas rela-cionados com a direção da escola e outros maissérios com a supervisão pedagógica, especial-mente vinculados com a forma de desenvolvi-mento de seu trabalho.

O que quero sublinhar agora é que a boarelação (em geral) que o professorado de edu-cação física mantém com as demais parcelasda comunidade escolar gera efeitos significa-tivos em sua prática escolar, circunscritos a umdesejo de valorização positiva de seu trabalhodocente na escola. Isso gera uma controvérsiaentre o que pensam do seu trabalho e a avalia-ção geral que a cultura escolar tem sobre aimportância da disciplina.

Como considerei antes, as escolas pú-blicas apresentam problemas graves quanto asuas condições materiais para desenvolver atarefa de socializar o conhecimento públicodisponível. Entretanto, no caso do professorde educação física, soluciona seus problemasde forma criativa, improvisando e criandomateriais ou construindo seus próprios meiose estratégias para dar aulas. Fato que é perce-bido na escola, fazendo que algumas vezes sejachamado para solucionar problemas semelhan-tes em outros ambientes da escola, como, porexemplo, trocar uma lâmpada numa sala deaula, ou providenciar uma instalação especí-fica, ou ainda fazer tarefas administrativas oude mobilização da comunidade escolar.

A freqüência dessas situações, final-mente, conspira contra ele mesmo, lhe desvia

de sua tarefa principal que é dar aulas de edu-cação física a todos os alunos, de socializar oconhecimento público da cultura físico-desportiva disponível e socialmente acumulada.Além do mais, mutila a importância doprofessorado de educação física como docente,como professor reflexivo e como trabalhadorcapaz de desenvolver o projeto pedagógico daescola, rotulando-o como alguém que faz coisas elhe impondo uma categoria de segunda ordem naescola. Situação que facilita o entendimento dainterrogação que fiz ao começar este trabalho.Será o professorado de educação física orepresentante do trabalho material para a culturaescolar de base intelec-tualista?

5.7. QUATRO TIPOS DE PRÁTICAS

DOCENTES DO PROFESSORADO DE EDUCAÇÃO FÍSICA

Durante o trabalho de campo nas escolaspúblicas, ouvindo suas histórias, o relato de suasaulas, percebi, na perspectiva dos professores,que a prática docente do professorado deeducação física converge para quatro categoriasprincipais: práticas de conteúdo, práticascriativas, práticas reflexivo-eman-cipatórias epráticas disciplinadoras.6

a) A prática de conteúdo é aquela onde oprofessorado de educação física, com os meiosmateriais de que dispõe, e de acordo com suaspreferências pessoais, programa os conteúdospossíveis, geralmente esportes coletivos ou aulasde ginástica geral, e os desenvolve usandoestratégias didáticas convencionais e umaconcepção esportiva tradicional. Sua preocupaçãoestá centrada em desenvolver o conteúdoprogramado e que os alunos o aprendam. Sepreocupa pela iniciação desportiva e se envolvepouco na integração de sua disciplina com oprojeto pedagógico da escola, participando poucodas questões escolares mais amplas. É um tipo deprática onde a educação física não incomoda.Trabalho com o material que tem na escola. Douas minhas aulas e fim.(...) levo os guris em várioscampeonatos.

b) A prática criativa também não causacontratempos ao sistema educativo. Diante dascircunstâncias adversas e dos desafios que lheimpõem na escola, sem amparo institucional,busca ajuda em colegas mais experientes e propõealternativas criativas para atender às necessidadesdos alunos e os objetivos da es-

cola. É uma prática de elevado valor pessoal edocente, mas limitada por desconsiderar oquestionamento das razões e os porquês daimposição destas condições e destes desafios. Oprofessor dá suas aulas e, inclusive, colabora comoutras atividades dentro da rotina da escola. Éuma prática docente com elevado grau decompromisso e interação com os alunos, e secaracteriza principalmente pelo ativismo. Alémde conhecimentos específicos, desenvolvesobretudo um conhecimento do como fazer, comosolucionar os problemas de ensino que sãopropostos a ele. Não gosto de falhar com os meusalunos, nem que me entreguem umaresponsabilidade como a banda musical docentro. Nunca toquei de perto um instrumentomusical. Não sabia o que era um bumbo, o queera um surdo, o que era um tarol. Não distinguíaos instrumentos. Não sabia que aqueles paus sechamavam baqueta. Não sabia nada! Mandaramque fizesse a banda. Mas eu não sei nada. Elesdisseram: "Te vira. " (...) Mas aprendi com aprofessora de música o que era dó, ré, mi, fá, sol,la, si, e colei nas teclas. Então ela me deu unslivrinhos, com música... la, do, ré,fá. (...) Se tuolhava na rua a banda passar, achava que eusabia muito de bandas, mas não sabia nada. Nofim de tudo, hoje até tarol eu sei tocar. Tuacredita nisso ?

c) A prática disciplinadora se desenvolvecom mais freqüência no ensino primário.Caracteriza-se pelo exercício da autoridadeinstitucional sobre os alunos, controlando asformas e a circulação dos alunos na escola. Éuma prática que busca educar as atitudes, osvalores e comportamentos do aluno através dadisciplina corporal. Tem forte compromisso coma escola e com socializar os alunos para aadaptação e aceitação das normas institucionais.Está em plena contradição com os desejos dedemocratização pelos quais luta o professoradode educação física. Tem pouca interação com osalunos e desenvolve um conhecimento docontrole e do manejo de grupo, tendo inclusive apretensão de controlar os hábitos de posturacorporal dos alunos. Chego na aula, a primeiracoisa que observo é se os alunos estão sentadoscorretamente. Sua postura, olho a postura, vejose estão sentados corretamente. Faço fila paradescer. Algumas vezes, tenho que fazer elesvoltar para a aula, então faço filas. Sai primeirouma fila, então eles se organizam no corredor.Pego outra fila, até que eles se orientem. Entãodesço com eles, aí faço outra fila, então fazemos

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o aquecimento. Depois coloco eles em filanovamente e faço com que eles fiquem senta-dos no chão para explicar a atividade quevamos desenvolver.

d) A prática reflexivo-emancipatória éuma prática onde o professorado de educaçãofísica questiona seu papel e o de sua discipli-na na escola. Usa sua especificidade e sua re-lação com o aluno para propor questões sobrea experiência vivida de ambos, seus limites eas possibilidades de intervenção. Busca sobre-tudo a integração da educação física ao con-junto das práticas educativas do curriculum.Aprofundam sua crítica ao sistema educativoe seus efeitos concretos sobre as diferentesparcelas da comunidade escolar, convertendo-se em um incômodo para grandes parcelas daadministração da escola e do sistema edu-cativo. Também é uma prática que tem um ele-vado grau de compromisso e interação com osalunos, mas que, sobretudo, caracteriza-se pelareflexão de sua ação prática. Desenvolve umconhecimento compartido com os alunos e suacapacidade de escutar, e tem por base o porque fazer. Durante muito tempo, na educaçãofísica as coisas foram muito no grito. Faz pou-co tempo que a educação física se tornou umestudo mais sério. Hoje, é muito diferente, fazuns cinco ou seis anos que noto uma evoluçãomuito grande na educação física.

Essas práticas estão presentes no coti-diano do grupo de professores observado, econstatou-se que um docente não se caracteri-za por um único tipo. O mesmo professor, emdiferentes momentos de seu trabalho, mostramais de um tipo de prática. Acontece que umaé mais comum em um determinado professorque em outro. Além disso, o coletivo, com oacúmulo de experiência, vai mudando suaspautas de intervenção nas escolas. Os três pri-meiros tipos de prática (de conteúdo, criativase disciplinadoras) se caracterizam pela impo-tência diante da estrutura social e do sistemaeducativo. Além disso, geram pouca resistên-cia à concepção educativa vigente. Já a quartaé uma prática emergente neste coletivo, pois atransformação da educação física, nos últimosanos, consistiu em passar do que fazer ao porque fazer. Talvez o conhecimento gerado apartir das práticas do professorado de educa-ção física, cuja orientação seguia fundamen-talmente — usando um conceito habermasiano— o interesse técnico-prático de caráter ins-trumental, esteja atualmente sendo orientado

mais por um interesse emancipador, pois ele fixaa união entre o saber teórico com a práxis da vida(Habermas, 1982).

A maioria dos participantes revelaram aopção por uma prática reflexivo-emancipatória,que de certa forma é contraditória com o estudoanterior que fiz (Molina, 1991), onde observeique entre o professorado de educação física dePorto Alegre existia uma presença majoritária deuma postura pouco crítica com relação à suaprática docente. Fato que me leva a pensar nasseguintes questões: houve mudanças na práticado professorado de educação física nestesúltimos anos? É possível que a contradição sedesenvolva em torno a questões metodológicas?Ambas são possíveis. No estudo anterior, osparticipantes trabalhavam em escolas públicas eparticulares, e agora são provenientes somente deescolas públicas. Se isto tem lógica, cabe dizerque a tese de uma postura pouco crítica não podeser aplicada ao professorado das escolas públicasde Porto Alegre. De qualquer maneira, sãosugestões que deixam o caminho aberto paraoutras investigações. Talvez o problema esteja nainstituição onde se desenvolve a prática docentedos professores de educação física. O certo é quedessas práticas emergem conhecimentos que, emseu conjunto, caracterizam esses docentes comopráticos reflexivos (Schõn, 1992).

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Dados, interpretações e implicações:acordos e desacordos (2ª parte: As

qiestões conceituais)Adroaldo Gaya*

Lisiane Torres**

Marcelo Cardoso***

Entendo que a crítica ê, minimamente, uma exposição de razões teóricas é empíricas de acordos edesacordos (Lovisolo, 1997, p.I)

Desejo acreditar que a promoção consciente do debate em formato acadêmico pode levar na dire-ção tanto de um entendimento mais equilibrado de seu estilo e funções, reduzindo seus custos subjetivos,como para uma progressiva redução dos componentes ideológicos e políticos, acompanhada, de umaexplicitação e autocontrole maior sobre as escolhas valorativas. (Lovisolo, 1997, p. I)

Iniciamos este ensaio comduas citações de Hugo Lovi-solo extraídas de seu artigoDados, interpretações e impli-cações (Movimento, 1997/2). Ofazemos na medida em queinterpretamos nas suas pala-vras uma atitude perante à ci-ência que temos defendido aolongo de nossa experiênciacomo professores de meto-dologia da investigação cien-tífica e pesquisadores na áreada pedagogia do esporte. Ouseja, a ciência constitui-senuma forma de conhecimentoque pretende aproximar-se daverdade e este trajeto pressu-põe, necessariamente, a críti-ca radical, o agir comunicati-vo, a configuração de inter-subjetividades que possambalizar o debate no seio deuma comunidade científica,além, obviamente, do rigormetodológico, da coerêncialógica e da consistência na re-lação entre o discurso e os fa-tos.

Não cremos na possibilida-

de de fazer ciência em peque-nos grupos que se isolam naarrogância de seus discursosmais ou menos herméticos, emreferenciais teóricos absolu-tos, dogmáticos e intolerantes,tantas vezes plenos de certe-zas ideológicas e onde as pa-lavras assumem a força de cre-dos fundamentalistas. Da mes-ma forma, não acreditamos napretensa cientificidade daspalavras que se escondemnum sofisticado texto que, tan-tas vezes, explorando as emo-ções e subjetividades, preten-de nos convencer de uma rea-lidade "virtual" sobre, porexemplo, uma corporeidadeabstrata, metafísica, trans-cendente muito longe de con-vergir com os corpos reais,tantas vezes sofridos, algunsdeles doentes e outros tantosfamintos, quase todos excluí-dos das práticas do esporte eda dança como ocorre com ascrianças e jovens com as quaisnos deparamos em nossa prá-tica pedagógica e científicareferenciada às crianças oriun-

das de populações carentes.Cremos que as palavras deHugo Lovisolo expressam osentimento que compartilha-mos, no modo como devemostratar academicamente a pro-dução do conhecimento cien-tífico.

Da mesma forma, quere-mos explicitar que este deba-te, cuja a parte conclusiva denossa réplica entregamos aosleitores da Movimento, nos foimuito significativo. Lovisolonos fez estudar muito, exerci-tar e rever muitas de nossas"certezas". Mas para além detudo isso, cabe salientar quenosso exercício acadêmico fezaumentar ainda mais nossa re-lação de amizade e respeitoperante ao nosso interlocutor.

1. SOBRE A APTIDÃO FÍSICARELACIONADAÀSAÚDE:

O PARADIGMA DA APTIDÃO FÍSICA

Lovisolo sublinha o fato de

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NOTAS

'É importante ressaltar que, paraMorin {Ciência com consciência),holismo apresenta significado distin-to do sugerido por Capra. Para Morin,holismo significa uma forma dereducionismo, portanto onde se pre-tende delimitar as partes constituintesde um sistema a um todo indivisível.Daí seu conceito de complexidadeorganizacional, onde as partes apre-sentam suas propriedades e funçõesparticulares, mas que, ao mesmo tem-po, podem estruturar-se das maisdiversas formas na relação com as ou-tras constituintes do sistema. No dizerde Morin: assim como não se devereduzir o todo às somas das partes, nãose deve, da mesma forma, reduzir aspartes a um todo sob pena de mi-nimizar suas propriedades estruturais.Em nossa abordagem, o termo ho-lístico, é adotado como sinônimo decomplexidade organizacional, assimcomo justificado por Capra em seulivro A teia da vida às páginas 40 e41.

2Nossos estudos sobre o tema daestruturação da performance (Gayaet ali, 1997; Alves, 1998; Siqueira,1998) em diversos esportes nos temdemonstrado evidência que os mo-delos são diversos se considerarmosfatores como as idades, sexo, es-pecialidade dentro de uma mesmamodalidade esportiva coletiva. Nos-sas observações sugerem, porexemplo, que a estrutura da per-formance (as relações de interaçãoentre os diversos indicadores da apti-dão esportiva) em diversos esportescoletivos de alto rendimento ten-dem a alterar-se futuramente deforma muito significativa. Em al-guns esportes (basquete, voleibol,handebol, futebol e futsal), os atle-tas das categorias infantis e juvenisapresentam uma estrutura antro-pométrica distinta dos atletassêniores. São, em média, mais al-tos, mais pesados, apresentammaior envergadura, etc. Tal fenô-meno aponta para uma mudançarelevante na estrutura da per-formance, o que exigirá sistemas deplanejamento da preparação espor-tiva distintos daqueles consideradosadequados na atual conjuntura.3Ressaltamos que a afirmação deLovisolo partiu da análise de um ou-tro conjunto de gráficos. Tais gráficosapresentavam as curvas comparativasentre nossos estudantes e estudantesde outras populações, o que, de certaforma, permite coerência as suas in-ferências.

UNITERMOS

Aptidão física; saúde.

*Adroaldo Gaya é professor titular

do Departamento de Desportos e

do Mestrado em Ciência do

Movimento Humano da UFRGS.

Doutor em Ciências do Desporto.

**Lisiane Torres é professora da

Rede Municipal de Ensino de Porto

Alegre. Mestre em Ciências do

Movimento Humano da UFRGS.

***Marcelo Cardoso é professor

da Secretaria Estadual de

Educação/RS. Mestre em Ciências

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NOTAS

'O presente texto resulta de uma investigação maisampla realizada em escolas públicas. Devido àscaracterísticas do texto etnográfico, que é dar vez avós dos atores privilegiando o aspecto êmico nainterpretação do cotidiano escolar, e para viabilizarsua publicação na formatação exigida pela revista,incorporei as falas dos atores na narrativa como umtodo, caso contrário o mesmo ficaria muito exten-so. Em alguns momentos, elas aparecem em itálico,a fim de enfatizar um determinado aspecto. Nasobservações realizadas, procurei ver a ação dosprofessores para além das aulas de educação física,já que neste âmbito encontramos inúmeros traba-lhos entre a comunidade de especialistas. Para ummelhor conhecimento das falas dos atores, em todasua extensão, ver: "La cultura docente de losprofesores de educación física de las escuelas pú-blicas de Porto Alegre", Vicente Molina Neto, tesede doutorado, disponível na biblioteca da ESEF/UFRGS.2Há entre os professores outras modalidades decontrato de trabalho, como, por exemplo, de 12,15 e 30 horas semanais, que não são maisutilizadas. Conforme as normas, eles se extinguemcom a aposentadoria de seus ocupantes.3Através de procedimentos administrativos norma-tivos, as administrações públicas tentam impediresses casos em que o professor reúne 60 horas detrabalho. Mas essa ação tem-se revelado insufici-ente porque o professorado, pressionado na basede sua sobrevivência por baixos salarios, descobreformas legais de manter essa situação.4Com a aprovação da lei 9.394/96 (Lei de Diretri-zes e Bases da Educação), a elaboração de um PlanoNacional de Educação e a proposição de ParâmetrosCurriculares Nacionais, além das finalidades daeducação, as questões de mérito dos conteúdos deensino, quanto à sua programação por nível de es-colaridade, estão em fase de revisão pelo Ministérioda Educação e Desporto e em discussão pelas dife-rentes comunidades docentes.5Conforme a organização da escola, o número dealunos e sua tipologia, a escola pode apresentar maisde um vice-diretor. Existem escolas que apresen-tam até quatro vice-diretores.

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6Nesta seção, são apresentados apenas mínimosfragmentos das mais de 30 horas de entrevistas gra-vadas e de mais de 60 dias de observação cotidiananas escolas. Em nenhum momento, tentei consoli-dar hipóteses apriorísticas. Esta tentativa designificado emerge do processo de categorização,amplamente discutido pela bibliografia es-pecializada no âmbito da pesquisa qualitativaparticularmente da recente etnografía educativa.Nesse sentido, tais categorias não tem a pretensãogeneralizadora, emergem e se limitam ao contextoonde se dá a ação desses atores especificamente.Optei por suprimir a descrição do processo meto-

dológico, por entender que o mesmo já é de conhe-cimento da comunidade acadêmica.

UNITERMOS

Prática docente; professor de Educação Física;escola pública.

*Vicente Molina Neto é professor da Escola deEducação Física da Universidade Federal doRio Grande do Sul.

As atividades corporais e espor-tivas e avisibilidade das mulheres na sociedade

brasileira do início deste séculoSilvana Vilodre Goellner*

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