letramento digital e a prÁtica dos professores a ... · letramento digital e a prÁtica dos...

21
Universidade Federal de Pernambuco NEHTE / Programa de Pós Graduação em Letras CCTE / Programa de Pós Graduação em Ciências da Computação - 1 - LETRAMENTO DIGITAL E A PRÁTICA DOS PROFESSORES – A PERSPECTIVA DO PORTAL DO PROFESSOR DO MEC Luciana Mazur 1 (UFMG) Priscila de Resende 2 (UFMG) Valéria Castro 3 (UFMG) Resumo: Tendo em vista o conceito de letramento como a condição que adquire quem reflete sobre o uso social da leitura e da escrita, hoje, falamos de letramentos, no plural, considerando que tal uso está em constante expansão. Neste trabalho, o nosso objetivo é analisar o que os professores estão propondo para que o letramento digital aconteça nas escolas. Essa análise incidiu sobre as atividades sugeridas no Espaço da Aula, um dos links do Portal do Professor do MEC, destinado aos docentes da educação básica. Selecionamos duas aulas publicadas no Portal acerca do gênero e- mail e investigamos aspectos relativos às concepções de linguagem, de letramento, de aprendizagem e de gêneros digitais. Nessa análise, observamos que o Espaço da Aula permite ao professor a inclusão das novas tecnologias às práticas pedagógicas e, em consequência, favorece a avaliação e reavaliação de suas propostas de ensino. Palavras-chave: letramento digital, portal do professor, espaço da aula. Abstract: Considering the concept of literacy as the condition that reflects on who acquires the social use of reading and writing, today, we speak of literacies, on plural, since such use is constantly expanding. In this work, our objective is to analyze what is proposed by the teachers to effect the digital literacy in schools. This analysis was focused on proposals for digital literacy suggested in “Espaço da Aula”, one of the links of the MEC’s Teacher Portal (Education Ministry), directed at teachers of basic education. We selected two lessons about e-mail gender, posted on the Portal, and discussed aspects regarding conceptions of language, literacy, learning and digital genres. In this analysis, we observe that the Space of Classroom allows to teachers the inclusion of new technologies and pedagogical practices, therefore, favors the evaluation and re-evaluation of their teaching. Palavras-chave: digital literacy, MEC’s Teacher Portal, Space of Classroom.

Upload: truongdiep

Post on 20-Jan-2019

220 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Universidade Federal de Pernambuco NEHTE / Programa de Pós Graduação em Letras CCTE / Programa de Pós Graduação em Ciências da Computação

- 1 -

LETRAMENTO DIGITAL E A PRÁTICA DOS PROFESSORES – A PERSPECTIVA DO PORTAL DO

PROFESSOR DO MEC

Luciana Mazur1 (UFMG) Priscila de Resende2 (UFMG)

Valéria Castro3 (UFMG)

Resumo: Tendo em vista o conceito de letramento como a condição que adquire quem reflete sobre o uso social da leitura e da escrita, hoje, falamos de letramentos, no plural, considerando que tal uso está em constante

expansão. Neste trabalho, o nosso objetivo é analisar o que os professores estão propondo para que o letramento digital aconteça nas escolas. Essa análise incidiu sobre as atividades sugeridas no Espaço da Aula, um dos links do Portal do Professor do MEC, destinado aos docentes da educação básica. Selecionamos duas aulas publicadas no Portal acerca do gênero e-mail e investigamos aspectos relativos às concepções de linguagem, de letramento, de aprendizagem e de gêneros digitais. Nessa análise, observamos que o Espaço da Aula permite ao professor a inclusão das novas tecnologias às práticas pedagógicas e, em consequência, favorece a avaliação e reavaliação de suas propostas de ensino. Palavras-chave: letramento digital, portal do professor, espaço da aula. Abstract: Considering the concept of literacy as the condition that reflects on who acquires the social use of reading and writing, today, we speak of literacies, on plural, since such use is constantly expanding. In this work, our objective is to analyze what is proposed by the teachers to effect the

digital literacy in schools. This analysis was focused on proposals for digital literacy suggested in “Espaço da Aula”, one of the links of the MEC’s Teacher Portal (Education Ministry), directed at teachers of basic education. We selected two lessons about e-mail gender, posted on the Portal, and discussed aspects regarding conceptions of language, literacy, learning and digital genres. In this analysis, we observe that the Space of Classroom allows to teachers the inclusion of new technologies and pedagogical practices, therefore, favors the evaluation and re-evaluation of their teaching. Palavras-chave: digital literacy, MEC’s Teacher Portal, Space of Classroom.

Universidade Federal de Pernambuco NEHTE / Programa de Pós Graduação em Letras CCTE / Programa de Pós Graduação em Ciências da Computação

- 2 -

Introdução

Nosso objetivo, neste artigo, é analisar o Espaço da Aula, link disponível no

Portal do Professor do MEC, para observar como os professores da Educação Básica

estão incluindo o letramento digital nas práticas escolares. O Portal do Professor do

MEC trata-se de um recurso disponibilizado pelo poder público federal, criado para

ser um espaço virtual de trocas e formação docente. O Espaço da Aula caracteriza-

se, principalmente, por conter roteiros de aulas e planejamentos que incluem as

novas tecnologias digitais no ensino.

Nas últimas décadas, as formas de interação e comunicação humanas se

alteraram de maneira contundente. De todas as modalidades comunicativas, a

internet vem gerando mudanças profícuas nas relações sociais e na forma de

aprender, gerando o que Silva (2010) denominou de a “emergência de uma cultura

da interatividade”. Essa interatividade, favorecida pela comunicação em rede,

possibilita aos usuários não só receber e compartilhar informações, mas manipulá-

las, fazer comentários, integrá-las aos seus conhecimentos e, em alguns casos,

modificá-las.

A disseminação de conhecimento e a participação ativa dos professores em

práticas discursivas no ambiente digital sugerem novos modelos de formação, de

construção de aprendizagens colaborativas, de diálogo e de reconquista da atuação

docente. Que contribuições para a formação docente os modelos de aula oferecidos

podem trazer para o desenvolvimento do letramento digital dos alunos? Como esses

modelos podem transformar as ações em sala de aula? Como o portal pode se

constituir fonte de diálogo, de reflexões e de qualificação do trabalho didático?

Essas perguntas nortearam a nossa opção de analisar o Espaço da Aula do

Portal do Professor do MEC. Pelos limites de tempo e espaço impostos pelo artigo,

elegemos duas aulas de língua portuguesa como objeto de investigação, as quais

descrevem uma situação de uso do e-mail para alunos do Ensino Fundamental. A

escolha se justifica pelo menos por duas razões. A primeira, é que temos como

Universidade Federal de Pernambuco NEHTE / Programa de Pós Graduação em Letras CCTE / Programa de Pós Graduação em Ciências da Computação

- 3 -

intenção analisar de que forma os professores estão incluindo os gêneros textuais

emergentes em suas práticas cotidianas nos processos de ensino e aprendizagem da

linguagem. A segunda razão é que, de acordo com os Parâmetros Curriculares

Nacionais (PCN), apud Azeredo (2007, p. 35), “Ao longo dos oito anos do ensino

fundamental, espera-se que os alunos adquiram progressivamente uma

competência em relação à linguagem que lhes possibilite resolver problemas da

vida cotidiana, ter acesso aos bens culturais e alcançar a participação plena no

mundo letrado”.

Na tentativa de elucidar os princípios teóricos que referendaram nossa

avaliação, passaremos a descrever as concepções de linguagem, de letramento e de

aprendizagem que subsidiaram a análise das duas aulas selecionadas.

Concepção de linguagem

Ao preparar uma aula de língua portuguesa ou planejar uma situação de

ensino, qualquer professor se coloca diante de alguns dilemas – que habilidades

pretendo desenvolver em meus alunos ao propor esta atividade? Quem são os meus

alunos, como aprendem, a partir de que condições? Que textos eleger, que

aspectos considerar sobre esses textos? Todos estes questionamentos serão

traduzidos na situação didática construída pelo professor quando tem a intenção de

levar os alunos a adquirir determinados conhecimentos. A situação didática nada

mais é do que a forma como o professor concebe e apresenta os conteúdos1. O que

vai fundamentar a sua elaboração serão os conceitos atribuídos ao objeto de

conhecimento (língua materna), a quem aprende e como aprende (aluno) e a quem

ensina e como ensina (o professor).

1 De acordo com Kleiman (2007), quando se pretende um ensino da língua na perspectiva do letramento, a definição do

conteúdo deve ser orientada pelas práticas sociais a que os sujeitos, alunos aprendentes, estejam inseridos. “Quando o conteúdo (qualquer que seja) não constitui o elemento estruturante do currículo, a pergunta que orienta o planejamento das atividades didáticas deixa de ser “qual é a sequência mais adequada de apresentação dos conteúdos linguísticos, textuais ou enunciativos?” porque o professor, com conhecimento pleno dos conteúdos do ciclo e ciente de sua importância no processo escolar, passa então a fazer uma pergunta de ordem sócio-histórica e cultural: “quais os textos significativos para o aluno e sua comunidade?”(KLEIMAN, 2007, P.6).

Universidade Federal de Pernambuco NEHTE / Programa de Pós Graduação em Letras CCTE / Programa de Pós Graduação em Ciências da Computação

- 4 -

Durante muitas décadas, o ensino da língua materna esteve centrado num

modelo pedagógico que priorizava (ou ainda prioriza) a forma e a função – análise

sintática, análise morfológica, análise lógico-gramatical etc. Percebia-se, assim,

conforme ressalta Marin (2008), certa distância entre os sujeitos e os objetos de

aprendizagem, distância entre a língua de uso e a língua objeto de conhecimento,

entre o ensinante, portador de saberes, e o aprendente, cujos saberes prévios

eram ignorados ou pouco valorizados.

Atualmente, uma prática de ensino que reconheça a língua como um produto

social e histórico, sujeita a mudanças ao longo do tempo e dos espaços sociais onde

é lida, ouvida, falada e escrita, parece ser a condição para a formação de sujeitos

letrados. Nessa perspectiva, a língua (gem) deve ser entendida como uma prática

discursiva, por meio da qual os sujeitos, parceiros de troca, interagem, têm acesso

à informação, expressam seus pontos de vista, partilham saberes, produzem e se

inserem em uma cultura. De acordo com Marin2 (2008), “la teoria de la lengua que

se propone es la que la concibe como discursividad o como textualidad, es decir,

como instrumento de comunicación [...]”.

Produzir linguagem significa produzir discurso. Ao dizer algo para alguém,

seja oralmente ou por escrito, fazemos escolhas, ainda que possam ser

inconscientes, influenciadas pelas condições implícitas ou explícitas da situação em

que o ato de comunicação se realiza. Quando interagimos discursivamente, os

espaços internos e externos são ativados e colocamos nossos conhecimentos,

intenções, opiniões, convicções, afinidade, familiaridade, posição social e

hierárquica na situação comunicativa. “Um ato de linguagem pressupõe uma

intencionalidade – a dos sujeitos falantes, parceiros de trocas”, como diz

Charaudeau, 2007, p.17.

Se entendemos a linguagem verbal como uma atividade comunicativa, nos

valemos da ideia de que nos comunicamos por meio de discursos ou textos, que são

2 A teoria da língua que se propõe é aquela que a concebe como discursividade ou textualidade, isto é, como instrumento de

comunicação em suas dimensões discursiva, textual e linguística. (tradução das autoras)

Universidade Federal de Pernambuco NEHTE / Programa de Pós Graduação em Letras CCTE / Programa de Pós Graduação em Ciências da Computação

- 5 -

produzidos em situações diversas e reais e condicionam os interlocutores a eleger o

que dizer, como dizer e como organizar o que dizem.

Nesse sentido, ensinar a lingua(gem) na escola é melhorar as competências e

os desempenhos dos usuários de uma língua, ou seja, o objetivo deveria ser sempre

o de desenvolver a competência comunicativa.

Letramento e Alfabetização – perspectivas conceituais

Muito se discute, nos últimos tempos, sobre o papel da escola em relação ao

ensino (desenvolvimento) das práticas de leitura e escrita. Nisso estão imbricados

os conceitos e aplicações dos termos: alfabetização e letramento. Alguns autores

como Kleiman (1995), Tfouni (1995) e Britto (2004) definem letramento como uma

prática social da leitura e da escrita; já a alfabetização estaria voltada para o

processo de domínio de uma técnica, conforme esclarece o trecho a seguir:

(...) diferentemente de alfabetização, cujo sentido mais frequente está associado ao ensino-aprendizagem do sistema de escrita (que, no caso das línguas ocidentais, é alfabético), letramento remeteria para um movimento mais geral, que se relaciona com a percepção da ordem escrita, de seus usos e objetos, bem como de ações que uma pessoa ou um grupo de pessoas faz com base em conhecimentos e artefatos da cultura escrita. Sendo assim a noção de alfabetizado implica uma condição do tipo tudo ou nada, a de letramento (ou de alfabetismo) sugere uma multiplicidade de níveis e graus, em função do quanto o indivíduo realiza com seus conhecimentos de escrita. (BRITTO, 2004, p. 9)

Soares (2006), igualmente, propõe uma distinção entre alfabetização e

letramento, considerando-os processos distintos, de naturezas essencialmente

diferenciadas, embora interdependentes e indissociáveis. Alfabetização traduz-se

pelo ensino-aprendizagem restrito e limitado das habilidades básicas de leitura e

de escrita. Letramento, por sua vez, refere-se ao resultado do desenvolvimento da

ação contínua, não linear, multidimensional e ilimitada, para além desta

aprendizagem básica do saber ler e escrever, adquirindo, dessa forma, um grupo

social ou um indivíduo inserido nas práticas de letramento escolar ou não, um novo

Universidade Federal de Pernambuco NEHTE / Programa de Pós Graduação em Letras CCTE / Programa de Pós Graduação em Ciências da Computação

- 6 -

estado ou uma nova condição nos aspectos cultural, social, político, linguístico,

psíquico.

Atualmente, portanto, ainda de acordo com Soares (2006), devemos falar de

letramentos, no plural, e o termo deve ser entendido tanto no sentido de diversas

linguagens e escritas, quanto no sentido de múltiplos níveis de habilidades,

conhecimentos e crenças no campo de cada língua.

Letramento digital

Entre as diferentes propostas de letramento, uma das mais comentadas na

atualidade é a que se refere ao letramento digital, que deve ser entendido como

um conjunto de técnicas materiais e intelectuais, de práticas, de atitudes, de

modos de pensamento e valores que se desenvolvem juntamente com o

crescimento das tecnologias de informação. O ciberespaço, por assim dizer,

configura-se como sendo um novo meio de comunicação que surge da interconexão

mundial dos computadores.

A capacidade de uso do computador (bem como dos outros recursos

tecnológicos equivalentes) como uma ferramenta (de trabalho, de estudo, de

informação, de entretenimento, entre outros), principalmente de comunicação no

dia a dia, e o domínio das operações que possibilita realizar são elementos que

caracterizam um letrado digital.

Assim sendo, torna-se difícil para alguém que não tenha um domínio do

universo letrado imergir no universo tecnológico, pois este exige um domínio de

suas linguagens específicas. Quando nos referimos à net, por exemplo, as

informações e os conteúdos são disponibilizados sob a forma de hipertextos – os

quais, ao serem acessados, convidam o leitor a fazer uma leitura não-linear, não-

sequenciada, tendo a possibilidade de ir para outros espaços discursivos (sites),

acessando outros conteúdos e informações através de links que tenham ligação com

o primeiro conteúdo acessado.

Universidade Federal de Pernambuco NEHTE / Programa de Pós Graduação em Letras CCTE / Programa de Pós Graduação em Ciências da Computação

- 7 -

O letramento digital, portanto, implica o domínio de habilidades específicas

para navegar na internet e interagir em seus diversos espaços. As práticas e os

eventos de letramento digital são assim mediados por um conjunto de gêneros

digitais que instigam o sujeito a lançar mão de novos processos cognitivos

ajustáveis à dinâmica de interação desse espaço.

Concepções de aprendizagem

Apesar da crescente difusão e disseminação dos espaços digitais de

comunicação e interatividade, o desafio da educação ainda consiste em incorporar

os usos das novas mídias em suas práticas escolares e empreender esforços para

que elas resultem em melhorias concretas no ensino e na aprendizagem.

Considerando que as mudanças advindas da constante evolução tecnológica

alteram comportamentos, formas de comunicação e aquisição de conhecimentos,

premente se faz relacionar o uso da informática, como ferramenta pedagógica, às

concepções de aprendizagem.

O letramento digital implica o domínio de técnicas e habilidades para acessar,

interagir, processar e desenvolver multiplicidade de competências na leitura das

mais variadas mídias. Um indivíduo letrado digitalmente necessita de habilidade

para construir sentidos a partir de textos que mesclam palavras que se conectam a

outros textos. Ele precisa, também, ter capacidade para localizar, filtrar e avaliar

criticamente informações disponibilizadas eletronicamente e ter familiaridade com

as normas que regem a comunicação com outras pessoas por meio dos sistemas

computacionais.

Sob a ótica da teoria construtivista de Jean Piaget, o desenvolvimento das

estruturas cognitivas e as transformações qualitativas da mente humana se dão

numa interação dialética entre o indivíduo e o meio. Segundo Piaget (1988), a

capacidade de transformação das estruturas cognitivas decorre do fato de se

conhecer um objeto a ponto de agir sobre ele e transformá-lo, aprendendo os

Universidade Federal de Pernambuco NEHTE / Programa de Pós Graduação em Letras CCTE / Programa de Pós Graduação em Ciências da Computação

- 8 -

mecanismos dessa transformação vinculados com as ações transformadoras. Nesse

contexto, “ao formalismo dos conceitos trabalhados na escola, deveriam ser

acrescidas situações concretas para que o pensamento lógico se processasse na

criança até o período de abstração” (PIAGET, 1986).

Podemos afirmar, pois, que a escola e o professor têm o papel de propiciar

situações e meios que favoreçam a aprendizagem ao trazer os gêneros digitais para

a sala de aula. É preciso que mobilizem os alunos no sentido de que estes captem

os estímulos do meio e os processem, tendo sua estrutura cognitiva modificada em

função dos novos conhecimentos.

Nesse ambiente propício ao pensamento lógico, caberia ao professor o uso da

mediação. Segundo Vygotsky, a ação mediada de outra pessoa, para que haja a

apropriação do conhecimento (professores, colegas), é que permite que este seja

construído. Vygotsky afirma que a mediação é fator determinante para a

aprendizagem:

[...] a distância entre o nível de desenvolvimento real, que se costuma determinar através da solução independente de problemas, e o nível de desenvolvimento potencial, determinado através da solução de problemas sob a orientação de um adulto ou em colaboração com companheiros mais

capazes” (VYGOTSKY, 1996, p. 97).

Essas duas teorias, o construtivismo de Piaget e a mediação sócio-

interacionista de Vygotsky, nos dão suporte para pensar o letramento digital numa

visão diferente da teoria comportamentista de aprendizagem em que o ensino se

dá unicamente por transmissão e o professor ocupa papel essencial, uma vez que é

ele quem transmite as ideias (estímulos) aos alunos, “‘dá a lição’, imprime-a em

arquivadores do conhecimento e pede, em troca, que os alunos usem a sua

atividade mental para acumular, armazenar e reproduzir informações. (SANTOS;

PRAIA, 1992 p.13).

Universidade Federal de Pernambuco NEHTE / Programa de Pós Graduação em Letras CCTE / Programa de Pós Graduação em Ciências da Computação

- 9 -

Gêneros digitais

O ensino, de forma geral, deve ter o texto como instrumento de trabalho no

cotidiano escolar, pois a leitura e a escrita são fatores fundamentais para a

inclusão social e a inserção do aluno no mundo letrado.

[...] gêneros textuais são fenômenos históricos, profundamente vinculados à vida cultural e social [...] contribuem para ordenar e estabilizar as atividades comunicativas do dia a dia. [...] Caracterizam-se como eventos textuais altamente maleáveis, dinâmicos e plásticos. Surgem emparelhados a necessidades e atividades sócio-culturais, o que é facilmente perceptível ao se considerar a quantidade de gêneros textuais hoje existentes em

relação a sociedades anteriores à comunicação escrita. (MARCUSCHI, 2005, p. 19).

Os gêneros textuais são oriundos de situações e fatos sociais que acontecem

dentro e fora do ambiente escolar, nas situações cotidianas que evocam sua

existência. São formas de como organizamos nossa vida, conforme esclarece

Bazerman (2006, p. 31) ao dizer que “gêneros são o que nós acreditamos que eles

sejam. Gêneros emergem nos processos sociais”.

Como o espaço de escrita está intimamente relacionado aos gêneros textuais,

entendemos que de novos espaços de escrita possivelmente emergem novos

gêneros, como os digitais, por exemplo, os quais carregam em si múltiplas semioses

e um hibridismo entre a modalidade oral e a escrita.

No contexto educacional, entretanto, o uso do computador e a familiaridade

desses novos gêneros pelos professores têm sido questões a serem pesquisadas e

estudadas. As ferramentas computacionais que envolvem a prática de leitura e

escrita dos discursos chamados de eletrônicos requer conhecimento e formação,

que ainda são precários nas atividades diárias dos professores, de modo geral.

Universidade Federal de Pernambuco NEHTE / Programa de Pós Graduação em Letras CCTE / Programa de Pós Graduação em Ciências da Computação

- 10 -

Metodologia

À luz dos subsídios teóricos mencionados, selecionamos duas aulas do Espaço

da Aula, do Portal do Professor do MEC. O nosso objetivo é fazer uma análise sobre

as práticas de leitura e escrita em ambientes digitais e verificar o que os

professores estão propondo (por isso o Espaço Aula do Portal do MEC) para que o

letramento digital aconteça em sala de aula. Para tanto, como introdução,

optamos por fazer uma breve descrição do Portal do Professor.

As contribuições do portal do professor do MEC para o letramento

digital de professores e alunos

O Portal do Professor, inaugurado em 2008, tem como propósito preencher

uma lacuna no processo de formação dos educadores. Elaborado pelo MEC em

parceria com o Ministério da Ciência e Tecnologia, o Portal reúne, em uma

interface na web, notícias, cursos, vídeos, blogs, softwares de jogos, chats, fóruns,

modelos e sugestões de aulas de todas as disciplinas e para todos os níveis de

ensino da Educação Básica, links para sites educativos e vários outros recursos para

os professores.

Esse espaço de informação, de trocas, de intercâmbio comunicacional,

favorecido pelo hipertexto digital do portal, constitui um modelo de formação

docente para o nosso tempo. Pode não dar conta de toda a complexidade da

educação, mas representa um caminho para fomentar nos educadores uma visão

mais crítica, participativa e investigativa do seu fazer pedagógico.

Universidade Federal de Pernambuco NEHTE / Programa de Pós Graduação em Letras CCTE / Programa de Pós Graduação em Ciências da Computação

- 11 -

Descrição do Portal

O Portal do Professor, conforme mencionado, trata-se de um ambiente digital

que integra um conjunto de recursos, em um só ambiente, favorecendo

aprendizagens colaborativas e acesso a diferentes informações.

A navegabilidade inclui, na tela inicial, um menu (índice) que dá acesso ao

espaço da aula; ao jornal do professor; aos conteúdos multimídias; a cursos e

materiais; à interação e colaboração; e aos links que direcionam para outros sites

de teor educativo.

Incentivar a participação de nossos professores em comunidades virtuais dirigidas a propósitos educacionais propicia espaços para a criação de sinergias favorecendo um sentimento de pertencimento à classe docente, a produção de conhecimento e troca de experiências, como apontam vários autores. De fato, Hunter (2002) identifica uma comunidade virtual ‘como um grupo de pessoas que interagem entre si, aprendendo com o trabalho das outras e proporcionando recursos de conhecimento e informação ao grupo, em relação a temas sobre os quais há acordo de interesse mútuo’. (BIELSCHOWSKY; PRATA, 2010, p.3).

Como o nosso interesse neste artigo é analisar o Espaço de Aula e observar as

recomendações dos professores para integrar o letramento digital em suas práticas

escolares, deixaremos os outros links e passaremos a descrever esse ambiente com

mais detalhes.

No Espaço da Aula, os professores podem publicar roteiros e planos,

elaborados individual ou coletivamente, utilizar uma ferramenta tecnológica para

construir esses roteiros, incluir recursos multimídias próprios do portal ou de outras

fontes em suas aulas, comentar os roteiros e planos sugeridos, utilizar os roteiros

prontos ou adequá-los às suas necessidades e contextos educativos. Além disso,

podem fazer download das aulas ou imprimi-las.

As aulas são desenhadas a partir de um referencial sugerido pelo portal e

devem cumprir determinados critérios de elaboração como título, objetivos de

Universidade Federal de Pernambuco NEHTE / Programa de Pós Graduação em Letras CCTE / Programa de Pós Graduação em Ciências da Computação

- 12 -

aprendizagem, período de realização, pré-requisitos de aprendizagem, estratégias,

recursos complementares e avaliação.

Não há restrição para publicação de aulas, pois basta fazer uma inscrição

prévia no Portal e pode-se ter acesso ao link para produção do roteiro. Embora não

se tenha a obrigatoriedade de seguir determinada teoria de aprendizagem e de

ensino para produzir as aulas, no próprio portal há algumas recomendações sobre

as propostas de ensino e aprendizagem que pressupõem bases teóricas discutidas

na atualidade.

De acordo com Bielschowsky; Prata (2010), as aulas submetidas para

publicação passam por um comitê editorial e são retornadas ao professor autor,

quando consideradas incompletas, para reelaboração e novo envio. Os critérios que

autorizam ou não sua publicação não estão claros, pois caracterizá-las como

incompletas pode significar apenas que elas não cumpriram todos os itens

recomendados.

Tanto as buscas pelas aulas como sua catalogação são também definidas pelo

segmento educacional a que se destinam, à série ou ano do ciclo, à disciplina

curricular e aos conteúdos que contemplam.

A seguir apresentaremos os passos metodológicos de duas aulas selecionadas

do Espaço da Aula, com vistas a podermos compreender o que os professores estão

propondo para que o letramento digital aconteça dentro da escola.

O gênero e-mail em análise

As aulas escolhidas abordam o gênero e-mail. Como se trata de uma

recomendação pública, referendada pelo MEC, órgão de referência nacional,

optamos por descrever aspectos relacionados à concepção de linguagem e

aprendizagem adotadas e a possibilidade de desenvolver o letramento digital.

Tentamos não emitir nenhum juízo de valor em nossa análise, mas expressar as

diferentes maneiras de abordar um mesmo tema. Também, por questões éticas,

Universidade Federal de Pernambuco NEHTE / Programa de Pós Graduação em Letras CCTE / Programa de Pós Graduação em Ciências da Computação

- 13 -

não incluimos os nomes dos autores. A diferença nas datas de postagem das aulas

foi uma opção para verificar o que há de inovador em relação ao uso do

computador em sala de aula.

Aula 1 - O e-mail como gênero textual em sala de aula

Atividade (link):

<http://portaldoprofessor.mec.gov.br/fichaTecnicaAula.html?aula=12202>

disponível em www.portaldoprofessor.mec.gov.br. Acesso em: 30/05/2012.

Ano da publicação: 2009

Conceitos e gêneros: internet, bilhete, carta e e-mail.

Nível de Ensino: Ensino Fundamental Inicial – Língua Portuguesa

Descrição: ao desenvolver as atividades desta aula, as autoras pretendem que os

alunos reconheçam o e-mail como novo meio de comunicação social e identifiquem

sua estrutura e função social. Inicialmente, propõem uma conversa sobre a internet

e suas possibilidades e fazem uma exposição sobre a semelhança entre o e-mail e a

carta. Após esta etapa, os alunos leem e escrevem e-mails em folha de papel ou no

computador. São sugeridas 3h/a, de 50min.

Uso da tecnologia: computador com acesso à internet, data show, folhas de papel.

Concepção de linguagem: a escolha de um gênero discursivo sugere que a

linguagem é entendida como comunicação. O texto é tomado como base para o

processo de ensino e considera uma situação específica de uso. Apesar disso, no

desenvolvimento da aula há um distanciamento da perspectiva da linguagem como

prática social e interativa. O que se observa é que o e-mail (o gênero discursivo

eleito) é um pretexto para o ensino da língua. O e-mail é tratado como uma

remidiação da carta e dos bilhetes e ressalta-se a importância dos alunos já terem

tido contato prévio com esses dois gêneros para aprenderem sobre o novo gênero

emergente. Aqui, o gênero digital não é considerado como uma nova forma de

interação social e, portanto, utilizado com propósitos e características distintas do

Universidade Federal de Pernambuco NEHTE / Programa de Pós Graduação em Letras CCTE / Programa de Pós Graduação em Ciências da Computação

- 14 -

ambiente impresso. As autoras sugerem a revisão e a reescrita do e-mail, e, nesse

caso, pode-se observar uma tentativa de tratar a escrita como um processo,

sugerindo alguns procedimentos próprios do ato de escrever (planejar, escrever,

revisar, reescrever).

Concepção de aprendizagem: ao longo das aulas coexistem propostas

fundamentadas em diferentes teorias pedagógicas. A perspectiva mais evidente é

de uma prática condutista, levando a crer que o aluno aprende por assimilação de

conteúdos informados pelo professor ou pelo material didático apresentado. Tanto

na proposta de leitura quanto na de escrita percebem-se orientações bastante

diretivas que oferecem poucas possibilidades para o aluno assumir diferentes

interpretações e perspectivas sobre o gênero textual em questão ou limitam as

condições de produção do texto. Também aparecem nas propostas intenções

didáticas de cunho construtivista. Há uma tentativa de fazer uma aproximação do

que os alunos já sabem com o novo conhecimento que se quer ensinar. Por

exemplo, quando se propõe uma análise de diferentes estruturas do gênero e-mail,

sua formatação e suas características linguísticas. Ainda assim, vê-se fortemente

um tratamento didático artificializado, em que a recontextualização para o

universo escolar não representa uma experiência significativa para o aluno.

Contribuições para o letramento digital: a tentativa de levar para a sala de aula

um gênero digital pode contribuir para que os alunos saibam de sua existência e

reconheçam uma nova forma de comunicação. Eles poderão aprender um pouco

sobre as técnicas do uso computacional como acessar a internet, criar uma conta

de e-mail, conhecimentos necessários para a inserção na cultura digital.

Entretanto, na perspectiva do letramento, muitas lacunas precisariam ser

preenchidas em relação à prática social e interativa característica do gênero –

propósitos, formato, elementos discursivos, etc.

Observações: a proposta inicial da aula apresenta uma explicação do professor

sobre o e-mail como uma possibilidade comunicativa da internet. Essa exposição

parece considerar o endereço eletrônico como a única vantagem dos computadores

Universidade Federal de Pernambuco NEHTE / Programa de Pós Graduação em Letras CCTE / Programa de Pós Graduação em Ciências da Computação

- 15 -

estarem interligados. Também se faz uma comparação entre o e-mail e a carta em

relação ao tipo de linguagem adotada, aos interlocutores envolvidos, à

textualidade. Após criar a conta de e-mail no computador, os alunos recebem três

modelos impressos de e-mails, mas não há especificação das estratégias de ensino

para esta atividade, exceto a diferença de linguagem empregada. Não explicita,

por exemplo, aspectos relacionados aos elementos discursivos fixos (Assis, 2007) – o

cabeçalho (“Para”, “De”, “Assunto”, “Data” ou “Enviada em”); as relações entre o

texto oral e o texto escrito; as funções; os propósitos; etc. Finalmente, as autoras

pedem que os alunos escrevam dois e-mails, usando uma folha de papel. O

primeiro, para o prefeito da cidade, convidando-o para um dado evento na escola.

O segundo, para um colega da sala, informando-o que tal dia não haverá aula e por

qual motivo. É nesse ponto que há um estranhamento: uma vez que o e-mail é

gênero digital, qual a necessidade de ler e escrever em folha de papel? As autoras,

no entanto, recomendam que a atividade escrita não deve descartar o manuseio do

computador. Esta situação retrata uma condição que ainda parece recorrente nas

instituições educativas, a de que o impresso representa a única possibilidade de

ensino reconhecida, mesmo quando se trata de um gênero digital. Como se para

aprender no digital fosse preciso, primeiro, aprender a usar o impresso.

Roteiro 2 – UCA: o gênero e-mail direto do computador

Atividade (link):

<http://portaldoprofessor.mec.gov.br/fichaTecnicaAula.html?aula=32958>

Disponível em www.portaldoprofessor.mec.gov.br. Acesso em: 30/05/2012.

Ano da publicação: 2011

Conceitos e gêneros: e-mail, internet e seus usos, texto informativo.

Nível de ensino: Ensino Fundamental Inicial – Língua Portuguesa

Descrição: a proposta da aula é que os alunos reconheçam a importância do e-mail

em situações práticas que envolvem o seu uso. A partir de uma sondagem inicial

Universidade Federal de Pernambuco NEHTE / Programa de Pós Graduação em Letras CCTE / Programa de Pós Graduação em Ciências da Computação

- 16 -

sobre a utilização do e-mail pela turma, os alunos criam suas próprias contas de e-

mail, assistem vídeo/animação sobre o desenvolvimento da comunicação no

mundo, conhecem uma cartilha com instruções de como usar a internet com

responsabilidade e produzem e-mails para trocar entre colegas e professora.

Uso da tecnologia: computador com acesso à internet, laptop UCA, softwares

Kword e Mozilla Firefox.

Concepção de linguagem: nesta atividade há uma clara fundamentação da

linguagem como um ato comunicativo. Em todas as situações propostas pode-se

observar o uso da linguagem em suas dimensões cognitiva, sócio-histórica,

discursiva e linguística. Tanto no ensino da leitura quanto no ensino da escrita

aparecem estratégias e metodologias que levam o aluno a desenvolver uma

competência comunicativa: interpretar e compreender diferentes textos,

associando imagens, som, movimento, texto escrito; selecionar informação a partir

de determinados propósitos; integrar informações em diferentes textos sobre o

mesmo tema – intertextualidade; escrever um texto considerando os parceiros de

troca; construir um texto bem organizado de acordo com o gênero eleito;

reconhecer os aspectos intencionais e argumentativos na elaboração do texto;

utilizar conhecimentos linguísticos e discursivos na elaboração do e-mail. Todas

essas abordagens, explícitas nas orientações da atividade, pressupõem uma

transposição didática que aproxima o aluno das reais situações de uso da

linguagem, promovendo aprendizagens significativas e duradouras.

Concepção de aprendizagem: as orientações didáticas apresentadas denotam que

as autoras fundamentaram o seu trabalho em uma concepção construtivista

sociointeracionista. Professor e alunos formam uma comunidade de aprendizagem,

na qual as interações, as trocas, o pensamento reflexivo são levados em

consideração. Procura-se evidenciar os conhecimentos prévios dos aprendizes e

suas opiniões frente aos assuntos propostos, demonstrando que a aprendizagem não

acontece do mais fácil para o mais difícil, mas a partir da articulação entre os

velhos conhecimentos com o conhecimento novo. A formação de grupos produtivos,

Universidade Federal de Pernambuco NEHTE / Programa de Pós Graduação em Letras CCTE / Programa de Pós Graduação em Ciências da Computação

- 17 -

envolvendo alunos com habilidades distintas sobre o uso do computador, também

demonstra que a aprendizagem se realiza a partir da interação entre os parceiros.

Nas aulas apresentadas pode-se perceber uma clara tentativa de promover um

ambiente de aprendizagem colaborativo no qual todos os atores envolvidos têm

oportunidade de expressar suas ideias, compartilhar seus saberes, posicionar-se

frente às propostas.

Contribuições para o letramento digital: a proposta apresentada pode contribuir

de forma significativa para o letramento digital dos alunos. As autoras procuraram

integrar diferentes mídias como a impressa, o vídeo, o computador, a internet,

proporcionando aos alunos o desenvolvimento de habilidades leitoras e de

construção de sentidos múltiplos. As diferentes metodologias e os diversos recursos

utilizados durante as aulas, com a utilização das multimídias pode contribuir para

que os alunos aprendam, além da técnica, novas representações e conceitos sobre

os gêneros, sobre a leitura e a escrita, sobre as novas formas de interação

humanas.

Observações: inicialmente, as professores sugerem fazer uma enquete com os

alunos para identificar aqueles que têm conta de e-mail e aqueles que não têm.

Importante mencionar que a partir disso, observa-se uma intenção clara de

promover parcerias nas quais os mais experientes vão ajudar os menos experientes

(quem já tem e-mail vai auxiliar os alunos que não têm). Para mobilizar o grupo,

sugere-se o vídeo “Navegar é preciso”, que faz uma analogia entre a imagem e o

texto oral sobre os sentidos assumidos pela palavra navegar quando se fala de

internet e em outro contexto, como o mar. É muito interessante porque as

associações podem favorecer processos inferenciais complexos, compreensões

distintas sobre um mesmo texto, e processamentos cognitivos que, quando

compartilhados, podem levar a interpretações mais ajustadas. O vídeo “Uso

responsável da internet” apresenta uma cartilha para que os alunos tomem

consciência dos riscos da internet e de como eles podem desenvolver a criticidade,

a atitude responsável e autônoma frente a determinadas situações. O gênero e-

Universidade Federal de Pernambuco NEHTE / Programa de Pós Graduação em Letras CCTE / Programa de Pós Graduação em Ciências da Computação

- 18 -

mail é tratado como uma possibilidade de interação entre os parceiros (colegas de

classe) meio pelo qual eles poderão trocar informações, conversar, enviar texto

para o professor, receber retorno de suas solicitações. O texto não é um pretexto

para se aprender sobre o gênero, mas uma condição necessária e contextualizada

para aprender a linguagem, as técnicas próprias do ambiente (selecionar o assunto,

eleger os destinatários, enviar com cópia para alguém). Apesar da riqueza da

atividade, em relação à produção do e-mail, propriamente dito, não há orientações

muito explícitas sobre como fazer, principalmente sobre o uso da linguagem

adotada, sobre os elementos discursivos, sobre a característica estrutural do

gênero. Talvez boa parte dos alunos já tivesse conhecimentos anteriores sobre os

e-mails, mas ainda assim, orientações dessa natureza seriam importantes para

outros professores poderem utilizar a aula como referência.

Considerações finais

A análise das duas aulas, objeto deste artigo, ainda que seja insuficiente para

entender que tipo de influência o Espaço da Aula do Portal do Professor do MEC

pode trazer para o contexto da sala de aula, para a melhoria da aprendizagem dos

alunos e para o letramento digital, permite-nos algumas reflexões acerca das

possibilidades que aprendizes envolvidos em aulas virtuais podem ter sobre os

gêneros digitais que circulam em sociedade e que não podem ser desconsiderados

da prática de letramento nos tempos atuais.

Atividades como as propostas, ainda que apresentem lacunas como as

abordadas ao longo dessa análise, permitem a ampliação das interações em sala de

aula (aluno/aluno – aluno/professor), e constituem oportunidade de os alunos

experimentarem os avanços tecnológicos no ambiente escolar e de ampliarem sua

prática de leitura e escrita. Além disso, a interação on-line é geradora de reflexão

e se torna oportunidade de os alunos mais tímidos se posicionarem. Nota-se

Universidade Federal de Pernambuco NEHTE / Programa de Pós Graduação em Letras CCTE / Programa de Pós Graduação em Ciências da Computação

- 19 -

também que os exercícios propostos estimulam reflexões acerca do uso da

linguagem em contextos diversificados.

Importante se faz ressaltar que o Portal do Professor do MEC coloca em

evidência a necessidade de a escola articular os diversos saberes com que o

indivíduo se relaciona. Não se pode desconsiderar que o grande desafio de criar um

ambiente atrativo para o aluno, de forma que ele possa dominar os instrumentos

culturais que fazem parte de seu contexto social, é um dos focos do Portal.

A maneira como as aulas sugeridas são aplicadas nas escolas, como elas

integram os currículos, o que define a escolha do professor, que posturas

pedagógicas ele assume ao seguir determinados roteiros são questões ainda sem

respostas e que merecem muitas e profundas investigações. A essas questões

somam-se outras igualmente importantes como a familiaridade dos professores com

o ambiente digital, as habilidades para navegar pelos hipertextos digitais, para

selecionar informações relevantes, para agir criticamente frente às informações.

Porém, não se pode negar que o Espaço da Aula é um suporte que permite, no

mínimo, que o professor perceba que a tecnologia precisa ser inserida às práticas

pedagógicas e, em consequência, avalie e reavalie sua prática de ensino,

procurando favorecer um ambiente de aprendizagem dinâmico, contextualizado e

significativo. E, o mais importante, repense concepções de letramento, de aluno e

de professor.

Referências Bibliográficas ASSIS, J.A. Ensino e da escrita e tecnologia digital: o e-mail como objeto de estudo e de trabalho na sala de aula. In: COSCARELLI, Carla Viana; RIBEIRO, Ana Elisa (Orgs.). Letramento digital: aspectos sociais e possibilidades pedagógicas. 2.ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2007. 248 p. p. 209-236. AZEREDO, José Carlos. A quem sabe ensinar a leitura e a escrita? In: PAULIUKONIS, M. A. L.; GAVAZZI, S. (Orgs.). Da língua ao discurso: reflexões para o ensino. 2.ed. Rio de Janeiro: Lucerna, 2007. 192 p. p. 30-42. BAZERMAN, Charles. Gêneros textuais: tipificação e interação. 2.ed. São Paulo: Cortez, 2006. 151 p.

Universidade Federal de Pernambuco NEHTE / Programa de Pós Graduação em Letras CCTE / Programa de Pós Graduação em Ciências da Computação

- 20 -

BIELSCHOWSKY, C.E.; PRATA, C.L. Portal Educacional do Professor do Brasil, 2009. Disponível em: <http://portaldoprofessor.mec.gov.br/storage/materiais/0000013441.pdf> Acesso em: 10 mai. 2012. BRITTO, Luis. P.L. Sociedade de Cultura Escrita, Alfabetismo e Participação. In: RIBEIRO, Vera Mazagão. Letramento no Brasil, Reflexos a partir do INAF 2001. 2.ed. São Paulo: Global. 2004. 287 p. MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO DO BRASIL (MEC). Portal do Professor. Brasília, Distrito Federal, Brasil, 2008. Disponível em < http://portaldoprofessor.mec.gov.br > Acesso em 15/05/2012. CHARAUDEU, Patrick. Uma análise semiolinguística do texto e do discurso. In: PAULIUKONIS, M. A. L.; GAVAZZI, S. (Orgs.). 2.ed. Da língua ao discurso: reflexões para o ensino. Rio de Janeiro: Editora Lucerna, 2007. 192 p. p. 11–29. COSTA, M. A.; DUQUE, P. H. Cognitivismo, corporalidade e construções: novas perspectivas nos estudos da linguagem. Cadernos de Letras da UFF – dossiê Linguagens em diálogos, Niteroi, nº 42, p. 87–108, 2011. KLEIMAN, Ângela. Modelos de Letramento e As Práticas de Alfabetização na Escola. In: KLEIMAN, Ângela. 1.ed. Os Significados do Letramento: uma Nova Perspectiva Sobre a Prática Social da Escrita. Campinas, SP: Mercado de Letras, 1995. 294 p. p. 15-61. ______ Letramento e suas implicações para o ensino da língua materna. Signo, Santa Cruz do Sul, v.32, nº 53, p.1-25, 2007. MARCUSCHI, Luiz Antônio. Gêneros textuais: definições e funcionalidade. In: DIONISIO, Ângela Paiva; MACHADO, Anna Rachel; BEZERRA, Maria Auxiliadora (Orgs.). Gêneros textuais e ensino. 4. ed. Rio de Janeiro: Lucerna, 2005. 232 p. p. 19-36. MARÍN, Marta. Lingüística y Enseñanza de La lengua. 2.ed. Buenos Aires: Aique Grupo Editor, 2008. 304 p. PIAGET, Jean. Seis Estudos de Psicologia. Rio de Janeiro: Forense, 1986. 146 p. ______. Biologia e Conhecimento. 2.ed. Petrópolis: Vozes,1996. 432 p. ______. Psicologia e Pedagogia. Rio de Janeiro: Forense Universitária,1988. 184 p. SANTOS, M. E.; PRAIA, J. F. Percurso de mudança na Didáctica das Ciências: sua fundamentação epistemológica. In: CACHAPUZ, F. (Org.). Ensino das Ciências e Formação de Professores: projecto MUTARE 1. Aveiro: Universidade de Aveiro, 1992. p. 7-34. SILVA, Marco. Sala de aula interativa. 5.ed. São Paulo: Edições Loyola, 2010. 259 p. SOARES, Magda Becker. Letramento: um tema em três gêneros. 2.ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2003. 99 p. TFOUNI, Leda. V. Letramento e Alfabetização. 6.ed. São Paulo: Cortez, 1995.103 p. VALENTE, José Armando. Diferentes usos do Computador na Educação. Campinas: Gráfica Central da Unicamp, 1993. Disponível em: <

Universidade Federal de Pernambuco NEHTE / Programa de Pós Graduação em Letras CCTE / Programa de Pós Graduação em Ciências da Computação

- 21 -

http://www.nied.unicamp.br/publicacoes/separatas/Sep1.pdf> Acesso em 02/07/2008. VYGOTSKY, L.S. A Construção do Pensamento e da Linguagem. São Paulo: Martins Fontes, 2001. 520. P. ______. A Formação Social da Mente. São Paulo: Ícone; EDUSP, 1996. 224. p.

1 Luciana Cristina Santos MAZUR, Mestre em Língua Portuguesa

Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC-MINAS) [email protected] 2 Priscila de RESENDE, Mestranda

Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) [email protected]

3 Valeria Ribeiro de Castro ZACHARIAS, Mestranda

Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) [email protected]