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Trabalho de Conclusão de Curso
A PERCEPÇÃO DOS PROFESSORES SOBRE O PROGRAMA BOLSA FAMÍLIA
NO MUNICÍPIO DE SÃO GABRIEL DO OESTE – MS
Ivane Salete Damm Tonetto1
Daiani Damm Tonetto Riedner2
Resumo
Esse artigo é resultado de uma pesquisa realizada no Curso de Especialização em Educação,
Pobreza e Desigualdade Social e teve como objetivo avaliar a percepção dos professores
sobre o Programa Bolsa Família no município de São Gabriel do Oeste – MS. A técnica
utilizada foi o questionário fechado e também foi realizada uma pesquisa documental. A
pesquisa nos permitiu conhecer um pouco a percepção dos professores sobre o Programa
Bolsa Família e sobre os alunos beneficiários. Em suma, os dados apontam que prevalecem
as visões estereotipadas sobre os pobres, a pobreza e sobre os alunos beneficiários do
Programa Bolsa Família.
Palavras-chave: Professores; Programa Bolsa Família; Pobreza.
1 INTRODUÇÃO
Este artigo é resultado do Trabalho de Conclusão de Curso realizado no Curso de
Especialização em Educação, Pobreza e Desigualdade Social. A finalidade desse curso foi
provocar o debate e a reflexão no que diz respeito aos processos de educação que envolve a
pobreza e extrema pobreza.
Nessa perspectiva, essa pesquisa teve como objetivo conhecer e a analisar a percepção
dos professores sobre a condicionalidade da frequência escolar e sua influência na
permanência e no desempenho das crianças beneficiárias do PBF (Programa Bolsa Família)
no município de São Gabriel do Oeste. Nessa direção, também buscamos conhecer a
1 Aluna do Curso de Especialização em Educação, Pobreza e Desigualdade Social. 2 Professora do Curso de Pedagogia do CPAN/UFMS e orientadora do trabalho.
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percepção dos professores sobre o Programa Bolsa Família e sobre os alunos beneficiários do
Programa Bolsa Família.
O interesse pela pesquisa se deu pelas vivências da pesquisadora no trabalho da escola
e contato com os professores nas escolas que possuem maior número de beneficiários do
PBF. Um dos principais motivos para o desenvolvimento da pesquisa é para compreender o
olhar do professor sobre os alunos que são beneficiários do Programa Bolsa Família.
No primeiro momento da pesquisa, foi realizada uma revisão de bibliografia, a fim de
conhecer as pesquisas que analisaram a percepção dos professores sobre o Programa Bolsa
Família. As buscas foram realizadas no Google Scholar com as palavras-chave: Bolsa família
e Professores. Nenhum trabalho resultante dessa busca apresentava alguma relação com
nosso objeto de pesquisa. No entanto, encontramos alguns trabalhos que nos ajudaram a
compreender o Programa Bolsa Família e sua relação com o desempenho dos alunos na
escola, mas não especificamente sobre a percepção dos professores sobre o desempenho dos
alunos.
Os Programas de transferência de renda são recentes no Brasil que visa de uma forma
lenta responder a uma histórica dívida com o povo pobre e que são uma classe que é a
maioria, porém sofrem árduas divisões e pressões por a minoria de uma classe social que é
privilegiada por possuir poder econômico social e simbólico.
Nas pesquisas ainda podemos constatar que responsáveis pelo recebimento do
Programa Bolsa Família são maioria mulheres, brancas, solteiras ou separadas, com baixa
escolaridade e excluídas do mercado de trabalho.
Na pesquisa de Felicetti e Trevisol (2012), as famílias relatam que conseguem
comprar alimentos, roupas, calçados, material escolar, mesmo o valor sendo pouco elas
parcelam as compras em pequenos valores. No que se refere aos professores, eles indicam
que não sabem até que ponto pode ser considerado uma melhora o benefício as famílias, sua
percepção é de que as famílias se acomodam e procuram ter mais filhos para aumentar a
rendas. As famílias que conhecem algumas vêm suprir a necessidade básica, outras os pais
ficam com o dinheiro e gastam em bares e levando para casa apenas um salgadinho.
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No segundo momento da pesquisa construímos o questionário a ser aplicado aos
professores das escolas com maior concentração de beneficiários do Programa Bolsa Família.
Escolhemos o questionário, pois essa técnica de pesquisa dispensa a presença do pesquisador.
E diante das dificuldades em tratar da temática e a não disposição dos professores em
colaborar com as entrevistas, o questionário foi a forma mais viável para perscrutar os
objetivos da pesquisa.
O quadro abaixo mostra a relação de escolas públicas do município de São Gabriel do
Oeste com o respectivo quantitativo de alunos beneficiários do Programa Bolsa Família. Os
dados são dos alunos do Ensino Fundamental I e II, que tem a obrigação de cumprir 85% de
presença na escola e fazem referência ao período de junho e julho de 2016.
Quadro 1 – Quantitativo de beneficiários por escolas
Escola Dependência
Administrativa
Qnt. Alunos
Escola Municipal Senador Filinto Muller Municipal 23
Escola Municipal Ênio Carlos Bortolini Municipal 53
EE São Gabriel Estadual 62
EE DorcelinaFolador Estadual 69
EE Bernardino Ferreira Da Cunha Estadual 70
Escola Municipal Armelindo Tonon Municipal 77
Escola Municipal Pingo De Gente Municipal 81
EE Prof Creuza Aparecida Della Coleta Estadual 132
Escola Municipal Nilma Gloria Gerace
Gazineu
Municipal 257
Fonte: Sistema Presença. Secretaria Estadual de Educação de Mato Grosso do Sul.
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Fizemos contato com quatro escolas que possuem o maior número de beneficiários.
Solicitamos à direção a autorização para entregar o questionário aos professores, mas nem
todos aceitaram colaborar devido às atividades que estavam desenvolvendo na escola. Ao
todo entregamos 61 questionários e tivemos o retorno de 14 questionários. O questionário era
composto por vinte e uma questões abertas e fechadas, organizado em três partes, a saber:
Parte I – Sua atuação na escola; Parte II – Sobre o Programa Bolsa Família – PBF; e Parte III
– Sobre a vida escolar dos beneficiários do Programa Bolsa Família.
A tabela abaixo mostra o quantitativo de questionários entregues e recebidos em cada escola
que aceitou participar da pesquisa
Tabela 1 – Escola participantes da pesquisa
ESCOLA Questionários
entregues
Questionários
recebidos
EE Prof Creuza Aparecida Della Coleta 12 3
Escola Municipal Nilma Gloria Gerace Gazineu 18 8
Escola Municipal Pingo De Gente 14 1
Escola Estadual São Gabriel 17 2
Total 61 14
Organização: As autoras.
O terceiro momento da pesquisa foi destinado à organização, sistematização e análise dos
dados. O artigo está organizado da seguinte forma: no tópico “O Programa Bolsa Família e
suas condicionalidades” apresentamos um breve histórico do PBF, suas características e
condicionalidades; no tópico “O Programa Bolsa Família no Município de São Gabriel do
Oeste” contextualizamos o programa no município em que a pesquisa foi realizada; no tópico
“A percepção dos professores sobre o Programa Bolsa Família e a condicionalidade da
frequência” apresentamos e discutimos o que os professores pensam sobre o programa e a
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condicionalidade da frequência; e no último tópico “A percepção dos professores sobre os
alunos beneficiários do Programa Bolsa Família e sua permanência e desempenho na escola”
trabalhamos com os dados referentes às expectativas dos professores com relação à
permanência e desempenho dos alunos beneficiários na escola.
2 O PROGRAMA BOLSA FAMÍLIA E SUAS CONDICIONALIDADES
O Programa Bolsa Família tem por finalidade o alívio imediato da pobreza. Porém
algumas regras são impostas para quem é beneficiário no que se refere à saúde e educação.
São as chamadas condicionalidades do Bolsa Família.
A principal condicionalidade do PBF está relacionada à frequência escolar, sendo
assim é preciso que as crianças e adolescentes frequentem a escola. E a escola é responsável
pelo registro da frequência. Há quem pense que o programa apenas transfere renda para as
famílias sem nenhuma exigência às mesmas.
Segundo Silva e Lima (2010, p. 28), o PBF pode ser considerado “[...] na sua
caracterização e na sua dimensão quantitativa o maior programa social implantado no Brasil
pela abrangência geográfica, pelo total de famílias atendidas e pelo significativo montante de
recursos nele colocado.”
O PBF concebe o enfrentamento da fome e da pobreza a partir de três
dimensões, a saber: promoção do alívio imediato da pobreza por meio da
transferência direta de renda; o reforço ao exercício de direitos sociais
básicos nas áreas de Saúde e Educação por meio do cumprimento das
condicionalidades; e a implementação de programas complementares para
desenvolver a autonomia financeira das famílias. (OLIVEIRA; SANTOS,
2012, p. 3).
No que se refere as condicionalidades do PBF para a educação, é exigida a matrícula
nas escolas públicas e a frequência escolar. Através dessa condicionalidade, a educação
ganha centralidade no Programa Bolsa Família (OLIVEIRA; SANTOS, 2012).
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O autor também aponta que os estudos têm mostrado que a transferência de renda
permite que as crianças frequentem à escola com continuidade e essa é uma garantia para que
elas possam superar a pobreza.
[...] por envolver fortes aspectos simbólicos, a falta de acesso à educação é
um fator poderoso na determinação das situações de exclusão. Além disso,
dependendo de como se vive a escolaridade, a garantia de acesso, por si só,
não leva a inclusão social; a qualidade da aprendizagem, as condições de
socialização no ambiente escolar podem, ao mesmo tempo que incluem
alguns, contribuir para excluir outros, tanto objetivamente, pelas
oportunidades diminuídas ou negadas, como subjetivamente, pela vivência
de experiências de rejeição social e de não reconhecimento de identidade.
(CAMPOS, 2003, p. 24).
As condicionalidades do PBF são compromissos assumidos pelo poder público e pelas
famílias beneficiárias nas áreas de Saúde e Educação. O objetivo principal é elevar o grau de
efetivação de direitos sociais por meio do acesso aos serviços sociais básicos de saúde,
educação e assistência social. As famílias que não acessam os serviços sociais básicos são
mais vulneráveis. As condicionalidades do Programa Bolsa Família foram pensadas como um
mecanismo para promover o acesso dos brasileiros mais pobres a direitos básicos nas áreas de
Saúde e Educação e contribuir para a redução da pobreza entre as gerações.
As condicionalidades são os compromissos assumidos tanto pelas famílias
beneficiárias do Bolsa Família quanto pelo poder público para ampliar o
acesso destas famílias a seus direitos sociais básicos. Por um lado, as
famílias devem assumir e cumprir estes compromissos para continuar
recebendo o benefício. Por outro, as condicionalidades responsabilizam o
poder público pela oferta dos serviços públicos de saúde, educação e
assistência social. (CAMPELLO; NERI, 2013, p. 274)
No Brasil, o governo estabeleceu uma linha que separa pobreza e a pobreza extrema.
Em situação de extrema pobreza estariam as famílias que têm renda mensal per capita de até
R$ 77,00 por pessoa e em situação e pobreza, famílias com renda mensal per capita de até R$
154,00.
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É difícil dizer que quem recebe R$ 80,00 encontra-se em situação melhor
que quem recebe só R$ 77,00, assim como é complicado afirmar que quem
recebe R$ 160,00 não seria pobre. Da mesma maneira, a presença ou a
ausência de políticas públicas específicas e de serviços públicos afetam
profundamente a vida das camadas mais vulneráveis da população. [...]
(PINZANI; REGO, 2014, p. 19).
A definição oficial de pobreza e extrema pobreza usada pelo Estado brasileiro é dada
segundo o Decreto nº 5.209, de 17 de setembro de 2004, e suas alterações posteriores. Esse
decreto regulamenta a Lei nº 10.836, de 9 de janeiro de 2004, a qual criou o Programa Bolsa
Família. (ARROYO, 2014).
As principais condicionalidades que os beneficiários do PBF precisam cumprir dizem
respeito ao acompanhamento da saúde e da educação. As famílias beneficiárias do PBF são
acompanhadas pelo Sistema Único de Saúde (SUS).O SUS garante o direito à saúde às
famílias beneficiarias, e tem como responsabilidade acompanhar e manter o controle das
famílias na saúde.
O SUS ainda controla o calendário básico de vacinação, o acompanhamento de
crescimento e desenvolvimento das crianças menores de sete anos, o calendário de pré-natal
das gestantes, a assistência pós-parto e também a vigilância nutricional.
No que diz respeito à educação, a condicionalidade do PBF tem como objetivo responder
ao compromisso do MEC no Programa Bolsa Família, acompanhando a frequência escolar e
diagnosticando as razões da baixa ou não frequência, com o intuito de enfrentar a evasão e
estimular a permanência e a progressão educacional de crianças e jovens em situação de
vulnerabilidade social. As ações3 são:
Monitorar a frequência escolar de estudantes incluídos no Programa Bolsa Família,
que deve ser de 85%, no mínimo, para crianças e adolescentes de 6 a 15 anos e de
75% para jovens de 16 e 17 anos, que recebem o Benefício Variável Jovem (BVJ);
3Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/pet/194-secretarias-112877938/secad-educacao-continuada-223369541/17451-acompanhamento-da-frequencia-escolar-de-criancas-e-jovens-em-vulnerabilida>. Acesso em: 7 ago. 2016.
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Realizar a gestão do Sistema Presença, que recebe os registros da frequência escolar e
dos motivos de baixa frequência, realizados pelas secretarias estaduais e municipais
de educação;
Consolidar dados e disponibilizá-los ao Ministério do Desenvolvimento Social e
Combate a Fome (MDS) a fim de subsidiar a gestão do Programa Bolsa Família
(PBF).
A condicionalidade exigida na educação tem auxiliado na queda dos índices de
infrequência e evasão dos alunos beneficiários.
[...] Também, poucos profissionais ainda ressaltaram o possível potencial da
condicionalidade de educação nos aspectos relacionados à aprendizagem do
aluno beneficiário. Para esse grupo, a condicionalidade contribui na medida
em que o aluno está mais assíduo, refletindo na melhoria do rendimento
escolar e na participação deste nas aulas. (OLIVEIRA, 2015, p. 13786).
No âmbito da nossa pesquisa, os profissionais entrevistados consideram que as
condicionalidades impostas aos pais apenas os obriga a justificar as faltas dos filhos para não
perder o benefício, mas que a frequência por si só não garante melhorias no aprendizado dos
alunos, pois a condicionalidade cobra somente a frequência dos alunos.
3 O PROGRAMA BOLSA FAMÍLIA NO MUNICÍPIO DE SÃO GABRIEL DO
OESTE
São Gabriel do Oeste é um município situado no interior do estado de Mato Grosso do
Sul na região Centro-Oeste. Em 10 de maio de 1973, BalduínoMafissoni e outros adquiriram
a Fazenda Rosada. Em visita à propriedade verificaram que a rodovia, Campo Grande-
Cuiabá, se encontrava bem adiantada e resolveram implantar um novo povoado. Com a ajuda
de Gabriel Abraão deram andamento ao projeto. A primeira casa construída pertenceu a
Ângelo Brizot. O povoado foi elevado a distrito pela lei nº 3.784, de 30/09/1976 e o
município criado pela lei nº 74, de 12 de maio de 1980.
O município originou-se do desmembramento dos municípios de Bandeirantes,
Camapuã, Coxim, Rio Negro e Rio Verde de Mato Grosso. As principais atividades
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econômicas da cidade são: comércio, indústria, agricultura, suinocultura e pecuária.
(BARROS, p. 146).
Quadro 2 – Características da população
Faixas de População Nº de pessoas
População residente 22.203
População residente - Homens 11.200
População residente - Mulheres 11.003
População residente alfabetizada 18.847
População residente que frequentava creche ou escola 6.387
Organização: As autoras.
O Índice de Desenvolvimento Humano (IDHM) em São Gabriel do Oeste é 0,729, em
2010, o que situa esse município na faixa de Desenvolvimento Humano Alto (IDHM entre
0,700 e 0,799). A dimensão que mais contribui para o IDHM do município é Longevidade,
com índice de 0,850, seguida de Renda, com índice de 0,751, e de Educação, com índice de
0,608.
Tabela 2 - Índice de Desenvolvimento Humano Municipal e seus componentes -
Município - São Gabriel do Oeste - MS
IDHM e componentes 1991 2000 2010
IDHM Educação 0,306 0,492 0,608
% de 18 anos ou mais com fundamental completo 25,28 37,52 51,09
% de 5 a 6 anos na escola 48,99 74,32 88,09
% de 11 a 13 anos nos anos finais do fundamental regular seriado
ou com fundamental completo
50,42 78,56 84,52
% de 15 a 17 anos com fundamental completo 22,97 43,70 57,71
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% de 18 a 20 anos com médio completo 11,86 28,50 35,45
IDHM Longevidade 0,689 0,775 0,850
Esperança de vida ao nascer 66,34 71,47 76,01
IDHM Renda 0,691 0,748 0,751
Renda Per Capita (em R$) 587,89 839,53 855,21
Fonte: PNUD, Ipea e FJP.
Organização: As autoras.
As proporções de crianças e jovens frequentando ou tendo completado determinados
ciclos indica a situação da educação entre a população em idade escolar do estado e compõe o
IDHM Educação. No município, a proporção de crianças de 5 a 6 anos na escola é de
88,09%, em 2010. No mesmo ano, a proporção de crianças de 11 a 13 anos frequentando os
anos finais do ensino fundamental é de 84,52%; a proporção de jovens de 15 a 17 anos com
ensino fundamental completo é de 57,71%; e a proporção de jovens de 18 a 20 anos com
ensino médio completo é de 35,45%. Entre 1991 e 2010, essas proporções aumentaram,
respectivamente, em 39,10 pontos percentuais, 34,10 pontos percentuais, 34,74 pontos
percentuais e 23,59 pontos percentuais.
O Atlas do Desenvolvimento Humanos no Brasil4 também apresenta o indicador
Expectativa de Anos de Estudo, que sintetiza a frequência escolar da população em idade
escolar. Mais precisamente, indica o número de anos de estudo que uma criança que inicia a
vida escolar no ano de referência deverá completar ao atingir a idade de 18 anos. Entre 2000
e 2010, ela passou de 9,68 anos para 9,09 anos, no município.
A renda per capita média de São Gabriel do Oeste cresceu 45,47% nas últimas duas
décadas, passando de R$ 587,89, em 1991, para R$ 839,53, em 2000, e para R$ 855,21, em
2010. Isso equivale a uma taxa média anual de crescimento nesse período de 1,99%. A taxa
média anual de crescimento foi de 4,04%, entre 1991 e 2000, e 0,19%, entre 2000 e 2010.
4 Disponível em: <http://www.atlasbrasil.org.br/2013/>.
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A proporção de pessoas pobres, ou seja, com renda domiciliar per capita inferior a R$
140,00 (agosto de 2010), passou de 27,00%, em 1991, para 15,51%, em 2000, e para 4,91%,
em 2010. A evolução da desigualdade de renda nesses dois períodos pode ser descrita através
do Índice de Gini5, que passou de 0,67, em 1991, para 0,68, em 2000, e para 0,54, em 2010.
Isso indique a desigualdade de renda tem diminuído ao longo dos anos no município.
Tabela 3 - Renda, Pobreza e Desigualdade - Município - São Gabriel do Oeste - MS
1991 2000 2010
Renda per capita (em R$) 587,89 839,53 855,21
% de extremamente pobres 6,97 4,89 1,58
% de pobres 27,00 15,51 4,91
Índice de Gini 0,67 0,68 0,54
Fonte: PNUD, Ipea e FJP
Disponível em:
<http://atlasbrasil.org.br/2013/pt/perfil_m/s%C3%A3o%20gabriel%20do%20oeste_ms>.
No Município São Gabriel Do Oeste, o total de famílias inscritas no Cadastro Único
em maio de 2016 era de 5.311. A tabela abaixo mostra a faixa de renda per capita dessas
famílias.
Tabela 4 – Famílias Inscritas no Cadastro Único em Maio de 2016
Número de
famílias
Faixa de Renda Per Capita
574 R$77,00;
5 É um instrumento usado para medir o grau de concentração de renda. Ele aponta a diferença entre os rendimentos dos mais pobres e dos mais ricos. Numericamente, varia de 0 a 1, sendo que 0 representa a situação de total igualdade, ou seja, todos têm a mesma renda, e o valor 1 significa completa desigualdade de renda, ou seja, se uma só pessoa detém toda a renda do lugar.Disponível em: <http://atlasbrasil.org.br/2013/pt/perfil_m/s%C3%A3o%20gabriel%20do%20oeste_ms>.
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504 R$77,00 e R$ 154,00
1.976 R$ 154,00 e meio salário mínimo
2.257 Acima de meio salário mínimo
Fonte: Secretaria de Assistência Social de São Gabriel do Oeste.
Organização: As autoras.
O PBF beneficiou no mês de julho de 2016 o total de 933 famílias, representando uma
cobertura de 102,1% da estimativa de famílias pobres no município. As famílias recebem
benefícios com valor médio de R$ 160,15 e o valor total transferido pelo governo federal em
benefícios às famílias atendidas alcançou R$ 149.417,00 no mês.
Em relação às condicionalidades, o acompanhamento da frequência escolar, com base
no bimestre de março de 2016, atingiu o percentual de 94,8%, para crianças e adolescentes
entre 6 e 15 anos, o que equivale a 937 alunos acompanhados em relação ao público no perfil
equivalente a 988. Para os jovens entre 16 e 17 anos, o percentual atingido foi de 84,9%,
resultando em 118 jovens acompanhados de um total de 139.
Já o acompanhamento da saúde das famílias, na vigência de dezembro de 2015, atingiu 85,6
%, percentual equivale a 546 famílias de um total de 638 que compunham o público no perfil
para acompanhamento da área de saúde do município.
4 CARACTERIZAÇÃO DAS ESCOLAS E A PERCEPÇÃO DOS PROFESSORES
SOBRE O PROGRAMA BOLSA FAMÍLIA E A CONDICIONALIDADE DA
FREQUÊNCIA
Nesse tópico vamos apresentar e discutir os dados obtidos através dos questionários
que foram respondidos por quatorze professores de quatro escolas do município de São
Gabriel do Oeste – MS.
As escolas que aceitaram participar da pesquisa ficam situadas na zona urbana da
cidade. A escola Nilma Glória Gerace Gazineu situada no bairro Jardim Gramado possui um
quadro de cinquenta professores atuantes, oitocentos e oitenta e dois alunos devidamente
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matriculados e frequentes totalizando o atendimento de trinta e duas turmas, incluindo, pré-
escolar, ensino fundamental dos anos iniciais (1º ao 7º ano) e uma turma de EJA.
A Escola Municipal Pingo de Gente fica situada no Bairro Primo Maffissoni contendo
um quadro de quarenta professores, setecentos e dezoito alunos frequentes, totalizando vinte
e quatro turmas, incluindo pré-escola, ensino fundamental dos anos iniciais (1º ao 7º ano).
A Escola Estadual São Gabriel tem um quadro de sessenta professores, mil e doze
alunos frequentes, totalizando quarenta e uma turmas, do sexto ano do ensino fundamental ao
terceiro ano do ensino médio, uma turma de normal médio e quatro turmas de EJA.
A Escola Estadual Professora Creuza Aparecida Della Coleta tem um quadro de
quarenta e nove professores atuantes, setecentos e vinte oito alunos frequentes em vinte e oito
turmas.
São escolas bem conceituadas no município por serem as maiores escolas em espaço
físico e também com maior número de alunos frequentes, além de desempenhar um papel
importante na vida dos alunos como incentivo, projetos que fazem a diferença na socialização
entre os colegas, promovendo mudanças de hábitos e a valorização da participação das
famílias na escola.
No que diz respeito à condicionalidade da frequência dos alunos na escola os
professores participantes da pesquisa indicam que ela não é suficiente, pois é necessário mais
participação e interesse dos pais na vida escolar dos filhos. Algumas famílias são conscientes
e responsáveis pelos seus filhos, porém há outros grupos familiares que não se preocupam
com o desenvolvimento do filho na escola, falta um relacionamento entre pais e filhos,
portanto pode-se considerar que “contribuição educacional” não resolve a falta de interesse
do aluno no estudo.
Alguns professores apontam que o acompanhamento escolar é uma questão de
princípios e não de falta de condições. Muitos alunos desistem e não aparecem na escola nem
para buscar o relatório do seu filho, deixando assim evidente de que realmente não é
suficiente o PBF, o que falta é interesse dos pais em participar da vida escolar dos filhos, em
quanto isso não acontecer nada vai resolver a evasão escolar e, alguns professores tem a visão
apenas que a condicionalidade é para manter alunos matriculados, frequentes na escola,
Trabalho de Conclusão de Curso
carteira de vacinação em dia, obrigatoriamente os pais devem participar das reuniões e
entregas de boletins para não perder o benefício e não pelo prazer de participar da vida
escolar do filho.
Perguntamos se a escola desenvolve projetos para atendimento das crianças
beneficiárias do Programa Bolsa Família no contra turno do período de aula. Nove
professores responderam que não há projetos específicos para os alunos do Programa Bolsa
Família. Um professor respondeu afirmando que na escola há projetos, porém eles são
desenvolvidos com todos os alunos e não especificamente para os alunos beneficiários do
Programa Bolsa Família. Os demais professores responderam que não sabiam e que não
tinham conhecimentos se a escola desenvolve ou não projetos para os beneficiários.
Quando perguntamos se os professores sabiam qual o valor médio que é recebido por
cada família beneficiária, sete professores não responderam e disseram não fazer ideia do
valor. Oito professores chutaram uma média que varia de mais ou menos R$ 70,00 a R$
250,00 por família e outros acham que esse valor é por criança. Realmente pode-se constatar
através da pesquisa que os professores realmente desconhecem o Programa Bolsa Família.
No que diz respeito à opinião dos professores sobre o recebimento do benefício pelas
famílias pobres e extremamente pobres, alguns professores responderam que se o benefício
realmente é destinado a famílias pobres e extremamente pobres é bem investido o dinheiro do
Programa Bolsa Família, porque para quem realmente precisa todo dinheiro é bem-vindo,
porém indicam que o PBF precisa de um acompanhamento pelo governo para saber como a
família que recebe investe este dinheiro. Outros professores destacaram apenas que acham
importante e outros ainda disseram que o benefício ajuda no desenvolvimento da criança e no
cuidado da família com as crianças.
O fato de a maioria dos professores acharem que o governo precisa controlar a forma
com que as famílias gastam o dinheiro do benefício nos remete ao estudo realizado por
Oliveira (2015), que também buscou identificar as percepções dos atores escolares sobre o
PBF e seus beneficiários. Ela aponta que:
Trabalho de Conclusão de Curso
[...] os beneficiários de um Programa de transferência de renda como o PBF
são interpretados a partir de um protótipo, onde se espera que estes utilizem
esse dinheiro, para os fins que idealizamos quando se pensa em um
Programa voltado para uma população pobre. Assim, é legítimo, por
exemplo, o gasto em alimentação. Por outro lado, quando nos voltamos à
condicionalidade de educação, os profissionais da área também idealizam
um arquétipo, que seria o investimento essencialmente em artigos escolares.
(OLIVEIRA, 2015, p. 13782).
Dessa forma, os investimentos que fogem aos gastos com alimentação ou material
escolar para as crianças é percebido como uso indevido do dinheiro.
Essa questão pode ser explicada também a partir da percepção que os professores têm
sobre o Programa Bolsa Família ser uma ajuda ou um direito das famílias. Dez professores
responderam que o benefício é uma ajuda. Três professores responderam que é um direito das
famílias e um respondeu que não sabia. É perceptível que a maioria dos professores
desconhece os direitos no que se refere aos seus alunos pobres e extremamente pobres.
Sobre o conhecimento dos professores a respeito das condicionalidades, apenas três
professores responderam que não sabiam quais eram. Onze professores responderam que as
crianças precisas ser assíduas na escola, os pais precisam participar nas reuniões escolares e
entregas de boletins, manter a carteira de vacinação em dia, ter renda per capita inferior a ¹/4
de salário mínimo, CAD – único atualizado e frequentar reuniões do Programa Bolsa Família.
De uma maneira geral, é perceptível que a maioria dos participantes da pesquisa conhecem as
condicionalidades do programa.
5 A PERCEPÇÃO DOS PROFESSORES SOBRE OS ALUNOS BENEFICIÁRIOS DO
PROGRAMA BOLSA FAMÍLIA E SUA PERMANÊNCIA E DESEMPENHO NA
ESCOLA
Dos quatorze participantes da pesquisa, nove professores responderam não conhecer
entre os seus alunos quais são beneficiários do PBF, três responderam que conhecem apenas
alguns e quatro responderam conhecer todos os alunos beneficiários do Programa Bolsa
Família.
Trabalho de Conclusão de Curso
Quando perguntamos se os professores de que forma eles acreditavam que o
Programa Bolsa Família contribui para a educação das crianças em situação de
vulnerabilidade social, cinco professores disseram que acreditam que o recebimento do
benefício ajuda no desenvolvimento da criança e cinco professores responderam que não
acreditam que ajuda no desenvolvimento, pois muitas famílias usam esse benefício para
outros fins e não com a criança. Dentre as demais respostas destacamos as seguintes falas:
Quanto mais as famílias passam por necessidades menos condições tem de
ajudar seus filhos, dessa forma conseguem dar para as crianças até mesmo
por serem "obrigadas" muitas vezes a darem esse suporte. (Professor 2).
Parcialmente, pois algumas famílias são conscientes e responsáveis pelo seu
filho, porém há outros grupos familiares que não se preocupam com o
desenvolvimento do estudante. Portanto contribuição educacional é questão
princípio e não falta de condições. (Professor 3).
Sim, uma vez que há famílias em situação de extrema necessidade, que esse
"dinheiro" faz toda a diferença. (Professor 5).
Em algumas situações sim, em outras a família usa para comprar bebida
alcoólica e tabaco, ao invés de investir em alimentação, educação e
vestuário. (Professor 6).
Não, muitas vezes o dinheiro recebido pelo o aluno não é gasto com ele e
para a família é mais uma fonte de renda. (Professor 7).
Gostaria que ajudasse muito, mas no meu ponto de vista a família distorce o
benefício e se aproveita da situação, não se tornando parte presente e atuante
na educação e vida escolar de seu filho (a). (Professor 9).
Não, pois não ensina trabalhar e viver dignamente. Aprende a viver com
miséria e acha "normal". (Professor 10).
Para algumas famílias sim outras acabam acomodadas e condicionadas para
receber o benefício. (Professor 11).
Não, não acredito que contribua para educação, mas que contribua para
erradicar a fome e a miséria. (Professor 12).
Trabalho de Conclusão de Curso
Sim, porque como um dos critérios é a assiduidade as famílias fazem com
que os filhos frequentem as aulas. (Professor 14).
Nos relatos acima percebemos uma tendência dos professores a desacreditar que o
recebimento do benefício pelas famílias possa ajudar de alguma forma na educação das
crianças. Apenas dois professores indicam essa importância, um deles acredita que a
frequência na escola pode fazer a diferença e outro que o dinheiro que a família recebe é
muito importante para a educação das crianças.
Na percepção dos professores participantes da pesquisa, o principal benefício do
Programa Bolsa Família para a educação das crianças é a obrigatoriedade da frequência
escolar. Depois vem o acompanhamento da saúde da criança, em seguida o dinheiro que a
família recebe e por último os benefícios secundários que a família tem direito. Apenas um
professor não respondeu.
Perguntamos também a opinião dos professores no que diz respeito ao uso do dinheiro
do Programa Bolsa Família. O gráfico abaixo mostra o que os professores indicaram como
sendo a destinação correta do dinheiro do benefício.
Gráfico 1 – Uso do benefício do PBF na percepção dos professores
Organização: As autoras.
Quando perguntamos oque os professores acham que precisa ser melhorado ou
modificado no Programa Bolsa Família, a maioria foi unânime em dizer que deve melhorar a
fiscalização do recebimento do benefício pelas famílias, para que somente as famílias que
realmente precisem recebam o benefício. A fala do Professor 1 é
Alimentação
Pagamento de contas de água e/ouluz
Material escolar
Vestuário das crianças
Qualquer necessidade da família
Trabalho de Conclusão de Curso
O governo deve oferecer emprego, cursos para mulheres aprender cuidar de
uma casa, aprender cozinhar. Homens cursos profissionalizantes para mão
de obra que falta. Vamos fazer esse povo trabalhar, só o trabalho edifica o
homem. Não sou a favor de paternalismo. (Professor 1).
O curioso é que esse mesmo professor afirmou que o PBF é um direito das famílias. É
o que Oliveira (2015, p. 13780) aponta como “[...] efeito-preguiça do Programa que ao invés
de garantir condições de trabalho, acabava levando as famílias a se acomodarem com o
recebimento do benefício”. Como se as famílias beneficiárias fossem todas pessoas
preguiçosas, que não tem vontade de ter uma renda superior ao benefício que o PBF oferece.
A tentação da mentalidade preconceituosa e muito grande na operação
ideológica de imputar aos que considera desiguais, e, frequentemente,
inferiores a ela, atributos negativos gerais tendentes à homogeneização das
condutas perante determinados fatos. No caso, em especial, quando se trata
de pessoas pobres, lidando com dinheiro, ainda mais provenientes de uma
transferência estatal de renda, imediatamente são acionados mecanismos
mentais ideológicos desqualificadores dos pobres. Atribui-se impunemente a
“eles” identidades negativas como se fossem dados da natureza: os pobres
são assim, fazem isso ou aquilo, sentem as coisas de tal maneira. A
diferença situacional para a mentalidade preconceituosa constitui razão
suficiente e para a fala estandardizada sobre o outro. (REGO; PINZANI,
2014, p. 198).
Sobre a vida escolar dos beneficiários do Programa Bolsa Família, especificamente
sobre o rendimento escolar dos alunos tentamos captar informações sobre a vivência dos
professores nesse aspecto. Um dos professores, além de assinalar a resposta, que era de uma
questão fechada, escreveu a seguinte observação “A maioria dos alunos beneficiários não
possuem vontade de estudar”. (Professor 3). O gráfico abaixo mostra a classificação.
Trabalho de Conclusão de Curso
Gráfico 2 – Percepção sobre o rendimento escolar dos alunos beneficiários
Organização: As autoras.
Quando perguntamos sobre o rendimento dos alunos beneficiários do PBF em
comparação aos demais alunos, dez professores responderam que os alunos beneficiários não
apresentam diferença de rendimento. Em contrapartida, três responderam que os alunos
beneficiários apresentam rendimento escolar. E um professor assinalou que o rendimento não
tem nenhuma relação com programas de transferência de renda.
Procuramos compreender também qual a percepção dos professores sobre os pontos
fortes e fracos no que diz respeito à participação dos alunos beneficiários nas atividades
escolares, desempenho e possibilidades de avanço nos estudos, levando em consideração as
vivências deles em sala de aula.
Quadro 2 – Percepção dos professores sobre a participação dos alunos na escola
Pontos fortes dos alunos beneficiários (no
que eles são melhores):
Pontos fracos dos alunos beneficiários
(no que eles precisam melhorar)
São alunos como os demais. Pois inteligência
todos tem, Deus nos deu, então são normais
com dificuldades. São alunos normais.
Dependendo da família ficam acomodados
e não se preocupam em melhorar na vida
para não perder o direito.
Os alunos beneficiários do PBFCONSEGUEM acompanhar asatividades propostas.
Os alunos beneficiários do PBF TEMDIFICULDADE para acompanhar asatividades propostas
Os alunos beneficiários do PBF NÃOconseguem acompanhar asatividades propostas.
Trabalho de Conclusão de Curso
Gostam de participarem das atividades da
escola de projetos. Se sobressaem em
lideranças e articulações.
Responsabilidade e comprometimento com
a escola e educação, principalmente os pais
de alunos.
Acredito que o fato de ser beneficiário não os
torna melhores, o importante é o interesse de
cada um.
Auto estima baixa. Pai preso. Fome.
Descalço. Mal vestido ou sujo. Sem
material.
Melhora na alimentação e na frequência. Maior interesse. Valorizar o estudo. Ter
responsabilidade.
Não vejo essa diferença, PBF não pode ser
muleta.
Acompanhamento da vida escolar do
aluno. Reposição do material.
Não sei se na maioria, mas são crianças que
se expressam com facilidade.
Estímulos, são pouco estimuladas quando
precisam fazer algo diferente da sua
realidade, mas não são todos.
Organização: As autoras.
A maioria dos professores indicou que apenas a mãe acompanha a vida escolar do/s
filho/se participam regularmente das atividades propostas pela escola, fato que reforça ainda
mais a importância de o benefício ser pago preferencialmente às mulheres.
Em muitas sociedades, a pobreza é considerada o resultado de uma falha
moral dos indivíduos, ou até de uma culpa por parte dos próprios pobres,
culpa em razão da sua preguiça, incompetência, indolência e assim por
diante. Em suma, os pobres são definidos como compradores incompetentes
e consumidores imprudentes. Por conseguinte, devem estar distantes do
dinheiro, ou submetidos a controles rígidos sobre o modo como vão gastá-
lo. (REGO; PINZANI, 2014, p. 224).
Quando perguntamos sobre os pontos fracos dos alunos beneficiários, nosso interesse
era de caráter pedagógico e não sobre a índole dos beneficiários. E algumas respostas
apontaram justamente para essa questão, como nessa fala “Dependendo da família ficam
acomodados e não se preocupam em melhorar na vida para não perder o direito.” (Professor
1).
Trabalho de Conclusão de Curso
Sobre a possibilidade que o Programa Bolsa Família tem em contribuir para evitar a
evasão escolar, a maioria dos professores acredita que o PBF contribui pouco para evitar a
evasão escolar.
Gráfico 3 – Percepção dos professores sobre o Programa Bolsa Família e evasão escolar
Organização: As autoras.
No que diz respeito às expectativas dos professores sobre o sucesso escolar dos alunos
beneficiários, perguntamos se eles acreditam que os alunos terão sucesso na finalização dos
estudos e condições para ingressar e finalizar o ensino superior ou técnico. Consideramos
importante destacar a fala dos professores nessa questão que foi aberta.
Depende da família, se há incentivo para os estudos; se há sonhos ou se está
bom ser o que é só ganhar uma ajuda para não passar fome. (Professor 1).
Apesar de torcer para isso, a realidade demonstra ao contrário logo após não
receberem mais o benefício, os alunos se desligam da escola. (Professor 2).
O sucesso do estudante independe de ser ou não participante de projetos
beneficiários. (Professor 3).
Sim, independente da classe social todos tem condições de alcançar suas
metas, basta querer e ter um suporte (família, escola...). (Professor 4).
Acho pouco provável, pois acredito que por traz há também outros
empecilhos para que estes alunos possam seguir seus estudos. (Professor 5).
O PBF contribui paraevitar a evação escolar
O PBF contribuiPOUCO para evitar aevação escolar
O PBF NÃO contribuipara evitar a evaçãoescolar
Trabalho de Conclusão de Curso
Creio que não, pois a evasão está cada vez maior. (Professor 6).
Sim, pois o sucesso depende do interesse de cada aluno. (Professor 7).
Tem, só depende deles e da família. (Professor 8).
O que dizer, pois não sei quais são meus alunos que recebem o benefício,
mas no geral acredito que a grande maioria vai chegar ao final com uma
participação e comprometimentos dos pais com sua educação. (Professor 9).
Não, provavelmente ao completar 18 anos irão para o mercado de trabalho.
(Professor 11).
Sim, acredito que terão sucesso. (Professor 12).
Difícil dizer mas acredito que todos são capazes, mas algumas coisas podem
atrapalhar esse processo. (Professor 14).
Apenas quatro professores acreditam que os alunos beneficiários não conseguirão
finalizar seus estudos e seguir com o ensino superior ou técnico. E entre os professores que
acreditam no sucesso dos alunos, a maioria coloca a responsabilidade pelo sucesso em cima
do próprio aluno ou de suas famílias, como se apenas a vontade de prosseguir fosse suficiente
para isso, quando sabemos que as questões sociais, econômicas e culturais em que esses
alunos estão inseridos interferem diretamente no sucesso ou no fracasso da escolarização.
Perguntamos aos professores o que eles acreditam ser o principal fator que privilegia
o rendimento escolar do aluno beneficiário do Programa Bolsa Família. O gráfico abaixo
representa essa percepção dos professores.
Trabalho de Conclusão de Curso
Gráfico 4 – Fatores que privilegiam o rendimento escolar na visão dos professores
Organização: As autoras.
A maioria dos professores participantes da pesquisa acredita que a frequência escolar
pode ser um dos pontos mais favoráveis ao rendimento escolar dos alunos beneficiários do
PBF, como se a condicionalidade da frequência pudesse intervir no clico de pobreza, em
longo prazo. No entanto, a pesquisa de Oliveira (2015) nos alerta que
[...] o “sucesso” escolar não depende invariavelmente apenas da maior
presença do aluno em sala de aula. Isso porque, maior inserção no sistema
escolar não equivale necessariamente a melhorias no que tange a
aprendizagem dos alunos, tampouco garante a continuidade da trajetória
escolar destes. Sendo assim, os reflexos da condicionalidade no próprio
rendimento escolar são questionáveis, uma vez que esta não é uma questão
meramente individual. (OLIVEIRA, 2015, p. 13779).
A pesquisa de Oliveira (2015) também indicou que poucos profissionais ressaltaram o
possível potencial da condicionalidade de educação nos aspectos relacionados à
aprendizagem do aluno beneficiário. Essa condicionalidade contribui para que o aluno seja
mais assíduo, o que pode refletir na melhoria do rendimento escolar e na participação do
aluno nas aulas. Mas temos clareza que a presença não é suficiente, ainda mais quando
reconhecemos que há inúmeros fatores que podem limitar o desempenho e participação dos
A frequência escolar.
A prática pedagógica doprofessor.
A participação dafamília na vida escolardo aluno.
Trabalho de Conclusão de Curso
alunos, principalmente no que diz respeito ao capital econômico, cultural e social das famílias
em que eles estão inseridos.
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O senhor... Mire veja: o mais importante e bonito, do mundo, é isto: que as
pessoas não estão sempre iguais, ainda não foram terminadas – mas que elas
vão sempre mudando. Afinam ou desafinam. Verdade maior. É o que a vida
me ensinou.
Guimarães Rosa - Grande Sertão: Veredas (1994, p. 24).
A pobreza é a falta de condições básicas (não só econômicas, mas sociais e culturais)
que possam garantir uma vida digna e justa e se reflete na educação através de problemas na
aprendizagem e no convívio social na escola. Vivenciamos na escola diariamente o
preconceito de alunos e professores com a realidade da pobreza, o que faz com que os alunos
pobres sejam tratados como desajustados e muitas vezes como incapazes de acompanhar as
atividades escolares. Para Oliveira e Soares (2013, p. 21), os principais fatores associados à
repetência dos alunos pobres estão “[...] nas escolas menos estruturadas e que dependem
administrativamente dos municípios e estados. Percebe-se, ainda, que os domicílios menos
favorecidos trazem os piores retornos para suas crianças, mas que o PBF tem ajudado essas
famílias a garantir melhores condições para seus filhos.”
Concordamos com Rego e Pinzani (2014), quando afirmam que a pobreza não deve
ser considerada a partir de uma perspectiva somente econômica, como a falta ou insuficiência
de renda. No entanto, o “[...] aspecto econômico ligado à presença de uma renda regular
permanece uma condição imprescindível para a saída da miséria.” (REGO; PINZANI, 2014,
p. 152). E aqui entra a importância de um programa de transferência de renda como o Bolsa
Família.
É importante destacar que o PBF permite uma autonomização das famílias, mas que a
transferência de renda não as tira da condição de pobres, mas permite que as famílias possam
voltar seus esforços para outras atividades que não seja a necessidade básica imediata de
Trabalho de Conclusão de Curso
sobrevivência, que é a alimentação. Elas ganham autonomia ao se tornarem responsáveis pela
maneira como o dinheiro da bolsa é usado.
Nesse sentido, impõe-se examinar cuidadosamente o modo como fatores
estruturais como a cultura, a religião, a vida social e a condição feminina
constituem influências importantes na forma de usar o dinheiro, alocá-lo na
economia doméstica e, com isso, conferir-lhe significados específicos. Isso
nos remete a considerar a dimensão simbólica do dinheiro. (REGO;
PINZANI, 2014, p. 198).
Nossa pesquisa permitiu conhecer um pouco da percepção dos professores sobre o
Programa Bolsa Família e, mesmo apresentando um recorte pequeno desses profissionais,
ficou claro que eles conhecem pouco o programa e menos ainda os alunos beneficiários.
A principal reflexão que os dados nos permitiram vislumbrar é que os professores
parecem desconsiderar as peculiaridades culturais e sociais nas quais esses alunos estão
inseridos, que podem influenciar de forma direta a participação e o desempenho desses
alunos na escola.
Percebemos que a questão econômica é mais evidente para os professores, pois o
Programa Bolsa Família ainda é visto com preconceito não só pelos professores, mas pela
sociedade como um todo. Rego e Pinzani (2014) apontam que os pobres são acusados de
preferir viver do dinheiro da bolsa ao invés de trabalhar ou de fazer filhos para ganhar mais
dinheiro do governo e ainda de usar dinheiro para comprar o que não “deve”. “Essas
acusações estereotipadas provêm, na maioria dos casos, de pessoas que não dispõem de
informações sobre o programa (sobre o valor da bolsa, por exemplo, que com certeza não
poderia substituir um salário regular).” (REGO; PINZANI, 2014, p. 225).
A realização dessa pesquisa confirmou o que vivemos diariamente no convívio com
os professores, que na sua maioria, demonstram essa visão estereotipada sobre os pobres,
sobre a pobreza e sobre os alunos beneficiários do PBF. Essa realidade se confirma com a
dificuldade que encontramos em convencer os colegas professores a participarem de uma
pesquisa sobre o Programa Bolsa Família. Na verdade, a realização do curso já foi motivo de
chacota, pois ouvimos muitos professores zombando do tema e dizendo que não queriam ser
especialistas em “pobreza”.
Trabalho de Conclusão de Curso
7 REFERÊNCIAS
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Curso de Especialização Educação, Pobreza e Desigualdade Social. Florianópolis: UFSC,
2014.
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REGO, Walquiria Leão; PINZANI, Alessandro. Vozes do bolsa família: programa bolsa
família uma década de inclusão e cidadania. São Paulo: Editora Unesp, 2014.
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