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UNIVERSIDADE TECNOLÓGICA FEDERAL DO PARANÁ PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM TECNOLOGIA A EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS NO MUNICÍPIO DE CURITIBA SOB A ÓTICA DE GÊNERO E TECNOLOGIA SIVONEI KARPINSKI HIDALGO Dissertação apresentada como requisito parcial para a obtenção do grau de Mestra em Tecnologia, na Linha de Pesquisa Tecnologia e Trabalho. Programa de Pós-Graduação em Tecnologia da Universidade Tecnológica Federal do Paraná. Orientadora: Profª. Drª. Marilia Gomes de Carvalho CURITIBA 2007

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UNIVERSIDADE TECNOLÓGICA FEDERAL DO PARANÁ

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM TECNOLOGIA

A EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS NO MUNICÍPIO DE CURITIBA

SOB A ÓTICA DE GÊNERO E TECNOLOGIA

SIVONEI KARPINSKI HIDALGO

Dissertação apresentada como requisito parcial para

a obtenção do grau de Mestra em Tecnologia, na

Linha de Pesquisa Tecnologia e Trabalho. Programa

de Pós-Graduação em Tecnologia da Universidade

Tecnológica Federal do Paraná.

Orientadora: Profª. Drª. Marilia Gomes de Carvalho

CURITIBA

2007

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SIVONEI KARPINSKI HIDALGO

A EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS NO MUNICÍPIO DE CURITIBA

SOB A ÓTICA DE GÊNERO E TECNOLOGIA

Dissertação apresentada como requisito parcial para

a obtenção do grau de Mestra em Tecnologia, na

Linha de Pesquisa Tecnologia e Trabalho. Programa

de Pós-Graduação em Tecnologia da Universidade

Tecnológica Federal do Paraná.

Orientadora: Profª. Drª. Marilia Gomes de Carvalho

CURITIBA

2007

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VANTAGENS DA SABEDORIA

A sabedoria exalta seus filhos e se desvela pelos que a procuram.

Quem ama a sabedoria, ama a vida; e os que a procuram desde a aurora serão

repletos de alegria. Quem a possui herdará a glória; e para onde

quer que vá, o Senhor o abençoará. Quem a venera presta culto ao Santo; pois o

Senhor ama os que amam a sabedoria. Quem escutar, julgará as nações, quem a

ela se dedicar viverá tranqüilo. Se alguém nela confiar há de obtê-la em

herança; e seus descendentes conservarão sua posse.

No princípio ela o acompanhará por caminhos tortuosos, trazendo-lhe medo e temor; causar-lhe-á incomodo com sua

disciplina até poder fiar-se nele, e o experimentará com seus preceitos.

A seguir, retornará diretamente para ele, alegrando e revelando-lhe seus segredos.

Se, porém, se desviar, a sabedoria o abandonará, e o entregará à sua

própria ruína. Observa o momento oportuno e guarda-te do mal, sem envergonhar-te de ti mesmo. Não sejas parcial contra ti mesmo, nem te

intimides para a tua ruína. Não deixes de falar quando necessário e

não escondas a tua sabedoria por vã glória, pois é pelo raciocínio que se reconhece a

sabedoria e pelas palavras da língua a instrução.

Não contradigas a verdade, mas sente vergonha da tua ignorância.

Não tenhas pudor de confessar teus pecados e nem te oponhas à

correnteza do rio. Não te deixes rebaixar diante do insensato,

nem sejas parcial em favor do poderoso. Luta até a morte pela verdade e o Senhor

Deus combaterá por ti.

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AGRADECIMENTOS

À Marilia Gomes de Carvalho, por sua inestimável e corajosa orientação, pelo incentivo constante, pelo permanente apoio intelectual desde o início e a cada momento desse trabalho. Por nossa amizade.

Aos colegas do GeTec (Grupo de Estudos e Pesquisas sobre Relações de Gênero e Tecnologia) pela oportunidade de, juntos, desfrutarmos de momentos de sabedoria e companheirismo, especialmente, à Lindamir, Marilia, Cris, Ronaldo, Nanci, Guilherme e tantos outros.

Aos professores, funcionários e Coordenação do Programa de Pós-Graduação em Tecnologia da UTFPR, pelo apoio e por tudo que aprendi em cursos e em nosso convívio cotidiano.

À Prof.ª Drª. Sônia Chaves Haracemiv, Prof.ª Drª.Taís de Moura Tavares e Profº. Dr. Domingos Leite Lima Filho, pelas recomendações e críticas construtivas apresentadas no Exame de Qualificação que muito contribuíram para o prosseguimento e conclusão da dissertação.

À pesquisadora Drª. Cristina Tavares da Costa Rocha por contribuir na composição da banca de defesa.

À Profª. Drª. Ângela Maria Hidalgo pelas sugestões e empréstimos de tantos livros.

Ao Fórum Paranaense de EJA pelas importantes discussões ao longo desses últimos anos em especial a partir da proposição e efetivação do I EPEJA (Encontro Paranaense de Educação de Jovens e Adultos) sonhado, idealizado, gestado e realizado por todos nós. Em especial à Cida Zanetti, Roseane, Wagner, Edmilson, Rô e tantos outros que conosco travam batalhas cotidianas para que o Fórum de EJA, importante conquista dos educadores do Paraná, seja plural e propositivo de ações que visem contribuir na elaboração de políticas públicas para a educação de jovens, adultos e idosos.

À Prefeitura Municipal de Curitiba e à Secretaria Municipal de Educação pelo apoio concedido. Fato que demonstra que esta gestão

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se preocupa com a formação e incentiva a qualificação constante de seus profissionais.

Às coordenadoras da EJA e responsáveis pelo GED (Sistema de Gestão Educacional) Vera Cleide e Rita do Núcleo Portão, Delma e Roberto do Núcleo Pinheirinho, Julina e Joana do Núcleo do Bairro Novo, Noeli e Regina do Núcleo do Cajuru, Marilvani e Regina do Núcleo Boa Vista, Marlene e Maria de Lurdes do Núcleo Santa Felicidade, Rose e Teresa do Núcleo CIC, Gisele e Solange do Núcleo do Boqueirão, pelo empenho junto ao GED na busca dos dados quantitativos.

Às colegas de trabalho e caminhada na EJA, Profª Lúcia, Profª Leo e Profª Dinaci com as quais tive o prazer de conviver, planejar, estudar e discutir ações que buscavam a aprendizagem dos nossos alunos e alunas na Escola Municipal Augusta Glück Ribas e, principalmente, por sabermos que fizemos a diferença na história de vida de muitos dos alunos e alunas que por lá passaram.

A todas as escolas municipais e seus vice-diretores que gentilmente cederam espaço para que, seguindo nossos critérios, as entrevistas pudessem acontecer.

Às professoras e ao professor que foram entrevistados e nos receberam com entusiasmo, carinho e atenção e deixaram registrado – talvez as palavras digitadas não conseguiram expressar - a paixão com que falaram da EJA e o brilho em seus olhos.

Aos alunos e alunas da EJA, motivo fundamental do nosso trabalho, a quem esperamos que nosso esforço seja de algum modo significativo. Em especial às mulheres que ao voltar aos bancos escolares relataram que o estudo abriu suas mentes.

Aos meus pais Luciano e Albina pelo empenho que sempre fizeram para que os filhos estudassem e a meus irmãos Sidinei, Sildônei e Lucio pela amizade.

Ao meu amado esposo Angelo e a meus amados filhos Angelo Junior e Caroline que, muitas vezes privados de minha maior atenção e companhia, retribuíram, sempre e a cada instante, com carinho e incentivo.

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“Em nossos dias já ninguém duvida de que a história do mundo deve ser reescrita de tempos em tempos. Esta necessidade não decorre, contudo, da descoberta de numerosos fatos até então desconhecidos, mas do nascimento de opiniões novas, do fato de que o companheiro tempo que corre para a foz chega a pontos de vista de onde pode deitar um novo olhar sobre o passado...” (GOETHE).

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SUMÁRIO

LISTA DE FIGURAS........................................................................................... xi

LISTA DE QUADROS......................................................................................... xii

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS............................................................. xiii

RESUMO.............................................................................................................. xvi

ABSTRACT......................................................................................................... xvii

1 INTRODUÇÃO................................................................................................. 19

2 PERCURSO METODOLÓGICO DA PESQUISA............................................ 24

2.1 OS ASPECTOS QUANTITATIVOS E QUALITATIVOS: OU AS

ENCRUZILHADAS DA PESQUISA DE CAMPO..................................................

24

3 A GLOBALIZAÇÃO E AS TRANSFORMAÇÕES NO MUNDO DO

TRABALHO, DA TECNOLOGIA E DA EDUCAÇÃO...........................................

37

3.1 A GLOBALIZAÇÃO E AS TRANSFORMAÇÕES NO MERCADO DE

TRABALHO..........................................................................................................

37

3.2 O CONCEITO DE TECNOLOGIA................................................................... 40

3.3 A GLOBALIZAÇÃO E AS TRANSFORMAÇÕES NO TRABALHO

FEMININO............................................................................................................

44

3.3.1 O Conceito de Gênero................................................................................. 52

3.3.2 A Questão de Gênero na Educação e na Escola........................................ 54

4 A EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS NO BRASIL E EM CURITIBA...... 57

4.1 PRIMEIRAS CONFIGURAÇÕES DA EDUCAÇÃO DE JOVENS E

ADULTOS NO BRASIL........................................................................................

58

4.2 MOVIMENTOS SOCIAIS, GOVERNO MILITAR E EDUCAÇÃO.......... ........ 62

4.3 O ESTADO NEOLIBERAL E AS MUDANÇAS NA EDUCAÇÃO.................. 66

4.4 A EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS EM CURITIBA........................... 71

4.4.1 Histórico da Educação de Jovens e Adultos ofertada pelo Município de Curitiba................................................................................................................

71

4 4.2 Em busca de uma proposta para a educação de jovens e adultos............ 74

4.4.3 Configuração do Programa de Educação de Jovens e Adultos no Município de Curitiba...........................................................................................

79

4.5 POLÍTICAS PÚBLICAS PARA A EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS............................................................................................................

84

4.5.1 Documentos Oficiais que tratam da Educação de Jovens e Adultos no

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Brasil.................................................................................................................... 84

4.5.2 Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação de Jovens e Adultos ou o Parecer CNE/CEB nº 11/2000.....................................................................

88

4.5.3 Diretrizes Curriculares Nacionais: a Resolução CNE/CEB Nº 1/2000........ 93

4.5.4 O Plano Nacional de Educação: Lei 10.172/2001 e suas Considerações sobre a Educação de Jovens e Adultos..............................................................

95

4.6 POLÍTICA DE EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS: ONDE ESTÁ O GÊNERO NO CONTEXTO DAS POLÍTICAS EDUCACIONAIS?.......................

99

5 O GÊNERO NO CONTEXTO ESCOLAR DA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS EM CURITIBA: RESULTADOS DA PESQUISA DE CAMPO..........

103

5.1 CARACTERIZANDO O UNIVERSO PESQUISADO..................................... 103

5.1.1. Os Aspectos Quantitativos e Qualitativos.................................................. 109

5.2 O CONTEXTO DA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS EM CENA: CARACTERIZANDO OS/AS ENTREVISTADOS/AS..........................................

115

5.2.1 Caracterização das Coordenadoras da Educação de Jovens e Adultos.... 115

5.2.2 Caracterização do/as Professor/as da Educação de Jovens e Adultos..... 118

5.2.3 Caracterização dos Alunos e Alunas entrevistados/as............................... 119

5.3 CONHECENDO A REALIDADE DE GÊNERO NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS DE CURITIBA.................................................................

127

5.3.1 Motivos para se matricular na escola: A diferença de gênero.................... 128

5.3.1.1 Motivos que levaram os homens para a escola...................................... 128

5.3.1.2 Motivos que levaram as mulheres para a escola.................................... 132

5.3.1.3 A pertinência da Educação de Jovens e Adultos para a vida de homens e mulheres.............................................................................................

137

5.4 AS PERCEPÇÕES DE GÊNERO NA ESCOLA OU A PERCEPÇÃO DE SI E DO OUTRO......................................................................................................

142

5.4.1 As percepções das alunas sobre as mulheres e os homens..................... 142

5.4.2 As percepções dos alunos sobre os homens e as mulheres.................... 147

5.4.3 As percepções dos alunos e alunas sobre o/as professor/as.................... 151

5.4.4 Como as professoras e o professor percebem os alunos e as alunas da Educação de Jovens e Adultos...........................................................................

154

5.5 IMPACTOS DA APRENDIZAGEM ESCOLAR PARA O TRABALHO DE HOMENS E MULHERES: O QUE É APRENDIDO NA EDUCAÇÃO DE

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JOVENS E ADULTOS FAZ DIFERENÇA NO COTIDIANO DO TRABALHO?... 160

5.6 AS PERCEPÇÕES DOS PROTAGONISTAS DESTA PESQUISA SOBRE TECNOLOGIA.....................................................................................................

164

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................................................. 169

REFERÊNCIAS................................................................................................... 177

APÊNDICE A – INSTRUMENTO PARA ENTREVISTA SEMI-ESTRUTURADA COM A GERENTE DA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS NA SECRETARIA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO............................

188

APÊNDICE B – INSTRUMENTO PARA ENTREVISTA SEMI-ESTRUTURADA COM AS COORDENADORAS DA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS NOS NÚCLEOS REGIONAIS......................................

189

APÊNDICE C – ROTEIRO PARA ENTREVISTA COM ALUNOS E ALUNAS DA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS......................................................

190

APÊNDICE D – INSTRUMENTO PARA ENTREVISTA SEMI-ESTRUTURADA COM PROFESSORES/AS QUE TRABALHAM COM EJA...

192

ANEXO A.......................................................................................................... 193

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LISTA DE FIGURAS

FIGURA 1 – MAPA DA CIDADE DE CURITIBA......................................................104

FIGURA 2 – REGIONAL BAIRRO NOVO................................................................105

FIGURA 3 – REGIONAL PINHEIRINHO..................................................................105

FIGURA 4 – REGIONAL FAZENDINHA/PORTÃO..................................................106

FIGURA 5 – REGIONAL CARMO/BOQUEIRÃO.....................................................106

FIGURA 6 – REGIONAL SANTA FELICIDADE.......................................................107

FIGURA 7 – REGIONAL BOA VISTA......................................................................107

FIGURA 8 – REGIONAL CIC (CIDADE INDUSTRIAL DE CURITIBA)....................108

FIGURA 9 – REGIONAL CAJURU...........................................................................108

FIGURA 10 – REGIONAL MATRIZ..........................................................................109

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LISTA DE QUADROS

QUADRO 1 - EVOLUÇÃO DO NÚMERO DE ESCOLAS, TURMAS E MATRÍCULAS DA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS NA REDE MUNICIPAL DE ENSINO DE CURITIBA – 1991/2005..............................................................................................82

QUADRO 2 - TOTAL DE MATRICULAS POR NÚCLEO NAS REGIONAIS DA EDUCAÇÃO QUE OFERTAM EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS....................83

QUADRO 3 - MATRICULA POR SEXO NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS DO MUNICÍPIO DE CURITIBA FASE I E FASE II...................................................110

QUADRO 4 - MATRICULA POR SEXO NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS DO MUNICÍPIO DE CURITIBA – FASE I.................................................................113

QUADRO 5 – NÚMERO DE MULHERES MATRICULADAS POR NÚCLEO REGIONAL NA FASE I.............................................................................................114 QUADRO 6 – NÚMERO DE HOMENS MATRICULADOS POR NÚCLEO REGIONAL NA FASE I................................................................................................................114 QUADRO 7 – DADOS DAS COORDENADORAS DA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS NOS NÚCLEOS REGIONAIS................................................................116 QUADRO 8 – DADOS DO PROFESSOR E DAS PROFESSORAS ENTREVISTADOS DA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS.............................118

QUADRO 9 - DADOS DOS ALUNOS ENTREVISTADOS.......................................120

QUADRO 10 - DADOS DAS ALUNAS ENTREVISTADAS......................................121

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ABEP Associação Brasileira de Estudos Populacionais

ANDE Associação Nacional de Educação

ANDES Associação Nacional de Docentes do Ensino Superior

ANPED Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação

APED Ações Pedagógicas Descentralizadas

BID Banco Interamericano de Desenvolvimento

BIRD Banco Internacional para a Reconstrução e o Desenvolvimento

BM Banco Mundial

BNDES Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social

CD Compact Disc

CEB Câmara de Educação Básica

CEDES Centro de Estudos de Educação e Sociedade

CEE Conselho Estadual de Educação

CES Centros de Estudos Supletivos

CIC Cidade Industrial de Curitiba

CLT Consolidação das Leis Trabalhistas

CMAE Centro Municipal de Atendimento Especializado

CMEI'S Centro Municipal de Atendimento a Educação Infantil

CNDM Conselho Nacional dos Direitos da Mulher

CNE Conselho Nacional de Educação

CEPAL Comissão Econômica para a América Latina e Caribe

COHAB Companhia de Habitação

CONEJA Conselho Nacional de Educação de Jovens e Adultos

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CONFITEA Conferência Internacional de Educação de Jovens e Adultos

EJA Educação de Jovens e Adultos

ENEJA Encontro Nacional de Educação de Jovens e Adultos

EPEJA Encontro Paranaense de Educação de Jovens e Adultos

EUA Estados Unidos da América

FGTS Fundo de Garantia por Tempo de Serviço

FHC Fernando Henrique Cardoso

FMI Fundo Monetário Internacional

FNDE Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação

FUNDEB Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação

FUNDEF Fundo de Manutenção e Desenvolvimento Ensino Fundamental e Valorização do Magistério

FNEP Fundo Nacional do Ensino Primário

GED Sistema de Gestão Educacional

GETEC Grupo de Estudos e Pesquisas sobre Relações de Gênero e Tecnologia

HAPRONT Habilitação de Professores Não Titulados

IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

IDA Associação de Desenvolvimento Internacional

INEP Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas

LDB Lei de Diretrizes e Bases

LDBEN Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional

MEB Movimento de Educação de Base

MEC Ministério da Educação e Cultura

MOBRAL Movimento Brasileiro de Alfabetização

ONU Organização das Nações Unidas

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ONG'S Organizações Não Govenamentais

PAC'S Posto Avançado do Centro de Estudos Supletivo

PAF Programa de Alfabetização Funcional

PAS Programa Alfabetização Solidária

PEA População Economicamente Ativa

PEI Programa de Educação Integrada

PCN'S Parâmetros Curriculares Nacionais

PMC Prefeitura Municipal de Curitiba

PNAD Pesquisa Nacional por Amostra a Domicílio

PNE Plano Nacional de Educação

PNQ Plano Nacional de Qualificação

PNUD Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento

PROEJA Programa de Integração da Educação Profissional Técnica de Nível Médio ao Ensino Médio na Modalidade de Educação de Jovens e Adultos

PRONERA Programa Nacional de Reforma Agrária

PLANFOR Plano Nacional de Qualificação do Trabalhador

RAAAB Rede de Apoio a Ação Alfabetizadora no Brasil

RIT Regime Integral de Trabalho

SECAD Secretaria da Educação Continuada da Alfabetização e Diversidade

SEED-PR Secretaria de Estado da Educação do Paraná

SME Secretaria Municipal da Educação

UNE União Nacional dos Estudantes

UNESCO Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura

UNICEF Fundo das Nações Unidas para a Infância

UFPR Universidade Federal do Paraná

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UTFPR Universidade Tecnológica Federal do Paraná

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RESUMO

O objetivo desta pesquisa foi caracterizar a Educação de Jovens e Adultos nas escolas municipais de Curitiba sob a perspectiva dos protagonistas do processo educacional frente às questões de gênero e tecnologia. Assim, foi possível traçar o perfil destes e identificar os motivos que levaram homens e mulheres a retomar os estudos, conhecendo, a partir de seus relatos, as relações de gênero presentes no espaço escolar, destacando a influência da escola no cotidiano e no trabalho. Foi possível também, conhecer as percepções que atribuem à tecnologia. Utilizamos abordagens e análises interpretativas, priorizando o método qualitativo. Foram utilizados como técnica de pesquisa para a coleta de dados, informações quantitativas, a análise documental e as entrevistas semi-estruturadas. Contextualizamos a EJA dentro do fenômeno das transformações no mundo do trabalho, na tecnologia, na educação e nas questões de gênero. Apresentamos um breve histórico da EJA no Brasil e em Curitiba a fim de compreender as políticas públicas para esta modalidade de ensino e para as questões de gênero. A pesquisa apontou um significativo número de mulheres retomando os estudos. Os motivos para a volta ao estudo na EJA são diferentes para homens e mulheres e esta modalidade de ensino, representa um espaço onde as desigualdades de gênero, herança do poder masculino se manifestam, embora apontem uma pré-disposição à mudança. As percepções sobre as relações de gênero oscilaram entre as manifestações tradicionais marcadas por desigualdades e relações de poder e as mudanças que vêm acontecendo no âmbito social. A EJA é pertinente à vida de homens e mulheres, pois cumpre algumas das exigências sociais fundamentais ao empoderar os sujeitos com a tecnologia da leitura e da escrita que lhes possibilita a inclusão na sociedade. A tecnologia perpassou transversalmente as categorias que emergiram das entrevistas, nas múltiplas dimensões e significados que esse termo envolve e esteve presente nos motivos que fazem os/as alunos/as retornar à escola, pois é pertinente à vida e ao mundo de hoje; nas percepções de gênero enquanto fato dicotômico, pois os artefatos vistos como tecnológicos, para os homens estão na esfera pública e para as mulheres na esfera privada e, enquanto tecnologia para o letramento, causa impactos no trabalho tanto do gênero feminino quanto do gênero masculino.

Palavras-chave: Educação de Jovens e Adultos; Gênero; Trabalho; Tecnologia. Áreas de conhecimento: Educação; Educação de Jovens e Adultos; Gênero;

Trabalho e Tecnologia.

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ABSTRACT

The objective of this research was to characterize Youth and Adult Education in Curitiba’s Municipality schools from the perspective of the educational process protagonists, in relation to genre and technology issues. It was possible to draw their profile, and identify these men and women’s motives to go back to school. Based on their own voices, it was also possible to identify genre relations present in school, showing up school influence on daily life and work. It was also possible to know their perceptions about technology. We used interpretative analysis and approaches, with priority on qualitative methods. Quantitative data, document analysis and semi-structured interviews were used as research techniques for data collection. EJA (Youth and Adult Education) was contextualized in the changing phenomenon of the working environment, in technology, education and genre discussions. We briefly followed EJA history in Brazil and Curitiba, in order to contextualize and to understand the public policy for this teaching modality and for genre issues. The research showed a significant number of women going back to studies. The reasons to go to EJA are different among men and women and this teaching modality represents a space where genre inequality and heritage of male power are manifested, although it shows a pre-disposition to change this. The perceptions about genre relations varied between the traditional manifestations of inequality and power relations and the changes which have been happening in the social sphere. EJA is pertinent to men and women’s lives because it fulfills some of the main social demands through empowerment of people with the reading and writing technologies which give them the chance to inclusion in society. The technology has been among the categories which came out of interviews, in the multiple dimensions and meanings which this term involves and it has been present in the reasons which make students go back to school, for it is pertinent to life and world nowadays, in the perceptions of gender as a dichotomist fact, for the tools seen as technological are in the public sphere for men and in the private sphere for women. As technology for literacy, it causes impact in the work for both genres. Key words: Youth and Adult Education; Genre; Work; Technology. Knowledge Areas: Education; Youth and Adult Education; Genre; Work and Technology.

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- 19 -

1. INTRODUÇÃO

A década de 1990 marcou um período de profundas transformações no modo

de produção capitalista e que podem ser associadas ao aprofundamento da crise

econômica no Brasil. Foram implementadas reformas, desde as do Estado, até as

educativas. Os processos de reestruturação produtiva, consideradas por Harvey

(1994), como mudanças no modo de regulação, implicam alterações no modo de

vida sob o sistema capitalista.

Nos processos de organização da produção, os princípios do “taylorismo-

fordismo” foram, não de forma homogênea, substituídos pelos princípios do “regime

de acumulação flexível”, assim como no conceito e mecanismos de organização e

intervenção estatais, os princípios do “Estado Keynesiano” são subsumidos pelos do

Estado Mínimo, neoliberal.

Na educação, essa política se concretizou através de ações que destacaram

a competitividade no setor, a ampliação da oferta de escolarização, prioritariamente

de educação básica, dentre outras, principalmente a partir do modelo de parceria,

com associações da sociedade civil, trabalho voluntário, etc, fato este que vai

apontando a atuação dos governos que adotaram a política do “Estado Mínimo”.

A diminuição do espaço público e sua substituição por espaços e ações da

iniciativa privada se configuram e o Banco Mundial se constitui como o grande

articulador dessas reformas (KRUPPA, 2001).

Essas ações, somadas à tendência de privatização, se aceleraram na

tentativa de atrelar a educação à lógica do mercado com o discurso de incentivo à

qualidade total e às iniciativas que, claramente, enfocavam a competitividade e a

produtividade.

Assim, desenvolveram-se estratégias que visavam remodelar o sistema

educacional. Sob a orientação do Banco Mundial, no novo contexto em que as

relações com o trabalho passavam pelas atividades intelectuais, o domínio dos

diferentes saberes, linguagens, práticas e modos de vida presentes nas relações

sociais e produtivas passaram a ser considerados como decisivos na determinação

da inclusão/exclusão (Banco Mundial In: LIMA FILHO, 2003).

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- 20 -

Essas transformações generalizadas no mercado de trabalho têm tido como

resultado, segundo Antunes (1995, p.41), o desemprego estrutural que atinge o

mundo em escala global.

Desencadeiam-se processos de flexibilização das leis trabalhistas e de

precarização do trabalho de modo mais intenso nos mais diferentes níveis:

especialmente o/a trabalhador/a com menor escolaridade e conseqüentemente

menor qualificação, tem sido o mais atingido. É nesse mundo do trabalho precário

que a grande maioria de homens e mulheres que freqüentam a Educação de Jovens

e Adultos estão inseridos/as e onde a falta de qualificação, demanda exigida pelas

novas tecnologias impostas pela sociedade atual, faz com que o/a aluno/a deposite

na escola a esperança de melhorar de vida. Em síntese, “quanto mais avança o

processo urbano-industrial, mais se desloca a exigência da expansão escolar”

(SAVIANI, 1994, p. 156).

Essa exigência passou a ser extremamente valorizada, sendo considerada

ponto de partida para o ingresso em qualquer tipo de trabalho produtivo, mesmo os

considerados mais simples. Com isso a procura pela escola teve um crescimento

generalizado e não foi diferente na EJA (Educação de Jovens e Adultos) em

Curitiba, que está também inserida no processo de transformação descrito

anteriormente.

Com 16 anos de experiência no Ensino Fundamental, aproximadamente 2

anos com educação popular e paralelamente a estes, 12 anos de prática em sala de

aula com Educação de Jovens e Adultos, sentíamos necessidade de buscar

elementos teóricos que pudessem explicar as mudanças que percebíamos na

sociedade, na educação e, particularmente, no cotidiano da escola de EJA.

Uma das questões, que mais nos intrigava na Educação de Jovens e Adultos,

era a presença de um significativo número de mulheres, particularmente no 1º

segmento do Ensino Fundamental Supletivo, especificamente de 1ª a 4ª séries,

nesta última década. Assim, partindo das reflexões em torno de nossa própria

experiência, encontramos uma problemática que veio a se constituir no tema e

objeto de nossa pesquisa.

Perguntávamos: por que essas mulheres não teriam estudado antes? Que

fato estaria impulsionando esse retorno feminino à escola? Existiria diferença entre

os motivos que levam os homens e as mulheres a retomarem os estudos? As

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exigências do mercado de trabalho provocariam esse retorno aos bancos escolares?

Estariam relacionados à falta de conhecimento tecnológico?

Esses questionamentos nos inquietaram de tal forma que resultaram em um

projeto de pesquisa, a fim de elucidar essa realidade, perpassando pelo eixo

tecnologia, gênero e educação. Deste modo, estabelecemos como objetivo principal,

caracterizar a Educação de Jovens e Adultos nas escolas municipais de Curitiba,

sob a perspectiva dos protagonistas do processo educacional, frente às questões de

gênero e tecnologia.

Objetivos específicos:

a) Traçar o perfil dos/as protagonistas da Educação de Jovens e Adultos

atendidos pela Secretaria Municipal de Curitiba em uma abordagem de gênero;

b) Identificar quais são os motivos que levam homens e mulheres a se

matricularem na EJA da Rede Municipal de Educação de Curitiba;

c) Conhecer, a partir das vozes dos/as protagonistas, as formas de relação

existentes no espaço escolar quanto às questões de gênero;

d) Destacar, a partir das vozes dos alunos e alunas, a influência da escola na

sua vida cotidiana e no trabalho;

e) Conhecer as percepções que os/as protagonistas da EJA em Curitiba,

atribuem à tecnologia presente em seu cotidiano.

Acreditando que não se pode construir nada sozinho/a, e que este trabalho foi

resultado da realidade presente na EJA, das reflexões dos estudos, das orientações

e principalmente da visão dos/as protagonistas desse processo, justifica-se nesse

momento em nossa pesquisa, a adoção da 1ª pessoa do plural (“Nós”), e da opção

pela escrita no feminino e masculino pois a norma gramatical, pode refletir uma

invisibilidade em relação ao gênero, porque sob nossa ótica, ignora os papéis

socialmente diferenciados, as responsabilidades e as capacidades de mulheres e

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homens, assim como não considera os diferentes impactos que o contexto sócio-

econômico e cultural exercem sobre um/a ou outro/a.

Essa pesquisa primou por uma abordagem e análise interpretativas,

priorizando o método qualitativo. Utilizamos como técnica de pesquisa a coleta de

dados, a análise documental e as entrevistas semi-estruturadas. No início da

pesquisa a coleta de dados foi quantitativa, porém sua análise e interpretação foram

qualitativas.

Sobre a técnica de entrevistas semi-estruturadas, Nascimento (2002, p. 06)

citando Selltiz diz que: “é bastante adequada para a obtenção de informações

acerca do que as pessoas sabem, crêem, esperam, sentem ou desejam, pretendem

fazer, fazem ou fizeram, bem como acerca de suas explicações ou razões a respeito

das coisas precedentes”.

Essa técnica nos permitiu, pelo uso de questões mais abertas, perceber como

os/as alunos/as, os/as professores/as constroem as percepções de feminino e

masculino; quais os motivos alegados que levam homens e mulheres a se

matricularem na EJA, sob a ótica de professores/as e alunos/as; como percebem a

tecnologia na escola e no cotidiano; e em que medida essas tecnologias do espaço

público e privado têm impulsionado mulheres e homens ao ensino formal.

Assim, o primeiro capítulo trata da introdução dessa dissertação e o segundo

capítulo refere-se ao percurso traçado pela pesquisa quanto aos recursos

metodológicos e os instrumentos utilizados para a coleta de dados, a pesquisa

bibliográfica e a análise documental. Trazemos também informações sobre como foi

o contato e os ambientes onde a pesquisa foi realizada, assim como sobre os/as

sujeitos/as que participaram das entrevistas.

No terceiro capítulo, contextualizamos a Educação de Jovens e Adultos

dentro do fenômeno da globalização dando uma visão ampla, ainda que sem

aprofundar, sobre as transformações ocorridas no mundo do trabalho e

conseqüentemente da Educação. A globalização gerou alterações no mercado de

trabalho, produziu novas demandas para a educação e, portanto, deu diferentes

contornos às políticas públicas, entre elas, as educacionais, incluindo a modalidade

de Educação de Jovens e Adultos. Tratamos das transformações que sofreram as

questões de gênero e tecnologia no mercado de trabalho e no âmbito da educação.

Neste momento autores/as como: LIMA FILHO, HARVEY, CANCLINI, ANTUNES,

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BLACKMORE, BLAY, HIRATA, LOURO, CARVALHO, dentre outros/as, constituíram

a base teórica deste capítulo.

No quarto capítulo, historiamos a EJA no Brasil e em Curitiba a fim de

contextualizá-la para melhor compreender as políticas públicas atuais para esta

modalidade de educação e a configuração que estas assumem a partir da década

de 90. Esta análise está acompanhada de uma interpretação das questões de

gênero na educação e na escola, objetivo de nossa pesquisa. Utilizamos como

referência autores como: BEISIEGEL, PAIVA, DI PIERRO, HARVEY, BRUNO,

TORRES, SAVIANI, LIMA FILHO, HARACEMIV, SOARES, CHILANTE, HADDAD,

MURARO, ROSEMBERG, dentre outros/as que estão no centro dos debates.

No quinto capítulo apresentamos os resultados alcançados pela pesquisa de

campo, mediante a sistematização e as análises feitas a partir dos dados

quantitativos e qualitativos obtidos e, principalmente, das categorias que emergiram

das entrevistas semi-estruturadas.

O sexto e último capítulo, foi destinado às considerações finais, às indicações

para futuras pesquisas e de possíveis intervenções na realidade da Educação de

Jovens e Adultos do município de Curitiba.

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2 PERCURSO METODOLÓGICO DA PESQUISA

Neste capítulo, apresentamos o percurso traçado pela pesquisa quanto aos

recursos metodológicos e os instrumentos utilizados para a coleta dos dados

quatitativos, a pesquisa bibliográfica e a análise documental, bem como o contato e

os ambientes onde a pesquisa de campo foi realizada, assim como os/as sujeitos/as

que dela participaram.

2.1 OS ASPECTOS QUANTITATIVOS E QUALITATIVOS: OU AS

ENCRUZILHADAS DA PESQUISA DE CAMPO

A pesquisa desenvolvida priorizou uma abordagem e análise interpretativa

qualitativa para cumprir o principal objetivo proposto: caracterizar os protagonistas

da Educação de Jovens e Adultos nas escolas municipais de Curitiba sob a

perspectiva do processo educacional frente às questões de gênero e tecnologia.

Como instrumentos de pesquisa foram utilizados documentos oficiais, banco de

dados do Inep, dados da SME-PMC. Os procedimentos de pesquisa foram a coleta

de dados documentais, diário de campo e as entrevistas semi-estruturadas.

Assim, o percuso metodológico levou em conta a relação entre a teoria e a

realidade. Portanto, os condicionantes históricos, o entendimento das múltiplas

relações sociais e as mediações que condicionam o processo de uma pesquisa

dessa natureza foram considerados.

Para que essa pesquisa pudesse ser realizada, num primeiro momento, era

necessário que os dados gerais de matrículas na Educação de Jovens e Adultos,

fossem separados por sexo, dado ainda não disponível no sistema escolar da Rede

Municipal de Curitiba, e imprescindível à definição dos/as pesquisados/as para

contemplar os objetivos propostos.

Diante deste fato, preparamos um material em forma de quadro, que seria

enviado a todas as escolas municipais de Curitiba que ofertassem EJA, no caso 118

escolas, para sabermos, então, quantos eram os homens matriculados e quantas

eram as mulheres matriculadas. No entanto, este material não chegou a ser

utilizado, pois naquela ocasião, percebemos junto à Gerência da EJA, que aquele

não era o momento adequado para o envolvimento desta numa pesquisa junto às

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secretarias das escolas por ser um período de transição política.

Argumentou-se também, que seria um trabalho muito exaustivo de nossa

parte ter os dados de todas as escolas que ofertam EJA, que as secretárias do

diurno, já que o período noturno raramente tem secretárias provavelmente não se

envolveriam numa pesquisa de EJA e por essa razão teríamos poucos retornos de

dados. Esta estratégia foi, portanto, abandonada.

Passamos a nos debruçar na questão teórica para que iluminasse nossa

prática, em um trabalho de revisão bibliográfica, que pela falta de publicação nesta

modalidade de ensino, fez com que essa busca por material teórico fosse

comparada a uma garimpagem onde se buscam pedras preciosas. A precariedade

dos dados também foi constatada pelo Relatório Síntese do IV ENEJA / Rio –

Encontro Nacional de Educação de Jovens e Adultos (1999) ao demonstrar que há

escassez de pesquisas para a EJA e por Haddad (2002) que faz uma análise da

produção brasileira sobre a EJA, no período de 1986 a 1998, em dissertações e

teses, revelando que faltam materiais, de natureza teórico-filosófica, que abordem a

EJA, num sentido mais amplo, permitindo uma visão nacional, fato que é ainda

refletido e sentido por nós neste momento.

Na revisão teórica abordamos a história da Educação de Jovens e Adultos no

Brasil a partir da década de 30, pois é nessa época que tem início a configuração de

um sistema público de educação básica no Brasil e a EJA começa a trilhar o seu

espaço. Procuramos fazer isso, considerando no contexto nacional e internacional a

influência que tiveram os aspectos: político-econômicos, tecnológicos, e as

representações de gênero no conjunto das modificações sociais, por entendermos,

que essas dimensões não ocorrem de forma isolada, são ao mesmo tempo

dependentes e interdependentes, ou seja, estão imbricadas numa espiral

multidimensional.

Do mesmo modo, buscamos na teoria entender no atual modo de produção

capitalista as dimensões do trabalho frente à globalização e à reestruturação

produtiva e suas implicações para o/a trabalhador/a, bem como as demandas que

conseqüentemente são geradas para a educação nos diferentes níveis de ensino e

nesse contexto, particularmente a trajetória da mulher na educação.

Outro ponto teórico, que nos detemos, ainda que de forma breve, foi a

questão do trabalho da mulher no Brasil, numa tentativa de entendê-lo

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historicamente e assim situar a mulher no mercado de trabalho atual e sua inserção

na modalidade de educação de jovens e adultos.

Na pesquisa documental, tomando como base os quatro principais

documentos que propõem a política nacional de Educação de Jovens e Adultos, a

partir de 1990, e que configuraram a EJA nos dias atuais, analisamos a presença de

questões referentes às relações de gênero nestes documentos.

Os documentos oficiais utilizados foram:

a) Seção V, do capítulo V, da LDBEN 9394/96; que estabelece as Diretrizes e

Bases da Educação Nacional;

b) Parecer CNE/CEB nº 11/2000; que apresenta um relatório sobre a EJA;

c) Resolução CNE/CEB nº 1/2000; que apresenta as Diretrizes Curriculares

para a Educação de Jovens e Adultos e;

d) Lei 10.172, de 09 de janeiro de 2001; que apresenta o Plano Nacional de

Educação.

Além destes documentos oficiais, que propõem as políticas públicas de EJA,

procuramos através de documentos da SME (Secretaria Municipal de Educação) e

da análise teórica de HARACEMIV (2002) contar a história da Educação de Jovens

e Adultos do município de Curitiba desde seu início em 1970 com o Mobral, a

criação de um programa próprio no início da década de 90 até sua atual

configuração.

Assim, na busca de cumprir a orientação teórica-metodológica e fundamentar

a pesquisa, procuramos considerar os aspectos que marcam o período de

transformações do modo de produção capitalista, associadas ao aprofundamento da

crise econômica onde é implementada uma série de reformas, desde as reformas do

Estado até as educativas que implicam alterações no modo de vida na sociedade

capitalista e nas relações sociais. De modo particular, como isso passa a afetar o

cotidiano das pessoas que freqüentam a EJA.

Mesmo trabalhando com a questão teórica a pesquisa de campo também se

figurou como personagem principal em nosso trabalho e em muitas encruzilhadas o

caminho que escolhíamos nos fez usar o retorno e recomeçar. Como a teimosia é a

arma mais poderosa do pesquisador seguíamos adiante e entre tantas idas e vindas,

ao Departamento de Logística e Estatística, à Gerência de Educação de Jovens e

Adultos na SME (Secretaria Municipal de Educação), às escolas, aos Núcleos

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Regionais e às infindáveis buscas na internet, finalmente descobríamos a chave do

que parecia ser o início de nossa tarefa.

No site do Ministério da Educação e Cultura (MEC), descobrimos que, a partir

de 2005 todas as escolas precisavam cadastrar, no Censo Escolar, seus alunos

matriculados por sexo, cor, raça e ano de nascimento. Isso, em todos os níveis de

escolaridade, inclusive para a EJA. Essa informação mudava por completo nossa

rota de trabalho e foi sem sombra de dúvida uma das pérolas a que nos referimos

anteriormente. De posse dessa nova informação fomos à SME (Secretaria Municipal

de Educação), novamente, ao Departamento de Logística e Estatística, lá

recebemos a informação de que esse trabalho só seria possível se fôssemos a cada

um dos núcleos regionais onde, segundo o referido departamento, haveria uma

pessoa responsável pelas informações do GED (Gestão de Informação Educacional)

e que este/a funcionário/a teria acesso, mediante senha, às informações que cada

uma das escolas disponibilizou, cumprindo então, a exigência feita pelo MEC.

Voltamos ao departamento que atende a EJA, onde nos foram prontamente

disponibilizados os nomes das coordenadoras e das pessoas responsáveis pela

GED de cada um dos Núcleos Regionais de Educação, em Curitiba.

Como o núcleo Matriz não oferta a Educação de Jovens e Adultos,

trabalhamos com oito Núcleos Regionais, pois nossa pesquisa, num primeiro

momento buscava representar, numericamente o total de alunos e alunas

matriculados/as nas 118 escolas municipais de Curitiba, que efetivamente oferecem

esta modalidade de ensino à comunidade.

Nestes oito núcleos fizemos a coleta de dados quantitativos, das 118 escolas

com EJA, considerando o número de matrículas por sexo. Para esta fase da

pesquisa, o primeiro passo foi agendarmos por telefone nossa visita a cada um dos

núcleos. A grande maioria nos recebeu com muito entusiasmo, sedentos, pelas

respostas que nossa pesquisa pudesse apontar para a EJA. Outros, inicialmente

apresentaram certo receio, afinal, entrávamos num espaço para coletar dados, onde

em meio a tantos funcionários trabalhando apenas uma pessoa lida com o sistema

de cadastro de alunos e, em geral, cuida de mais de vinte escolas. Desta forma, no

início, quando contávamos da nossa intenção de pesquisa as pessoas nos diziam

que este dado de matrículas por sexo na EJA, era impossível de se conseguir, pois,

não existia. Com a perspicácia que fomos aprimorando enquanto pesquisadora,

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apontávamos que no site do MEC (Ministério da Educação e Cultura) se mencionava

este dado, mas que nós, via internet, não tínhamos acesso, ou não tínhamos

descoberto o caminho do acesso.

Assim, os dados foram se delineando num caminho de muitas encruzilhadas,

não só para nós, pelas infindáveis idas e vindas aos oito núcleos, mas, também para

a pessoa que lidava com este sistema, pois para se ter acesso, além do uso de

senha pessoal era necessário adentrar escola por escola, em cada segmento,

modalidade de ensino, ano, período e fase, para gerar visualização e impressão,

atentando, ainda, para o fato de que a escola deveria ofertar EJA, que era o foco da

pesquisa. Como a maioria dos núcleos regionais atende a mais de vinte escolas, era

um trabalho que demandava tempo, mesmo com o acesso a artefatos tecnológicos,

como pen drive1, cd ou mesmo disquete, que nos permitiriam gravar os dados e que

diminuiriam, consideravelmente, o trabalho de agregar e analisar os dados,

eliminando pelo menos a digitação. Porém, não foi possível a utilização destes

recursos, porque ao sugerirmos um desses artefatos para coletar os dados

percebíamos nas pessoas responsáveis por este sistema, medo e apreensão em

fornecê-los. Ainda que tivéssemos percorrido os caminhos legais para pesquisa,

através de carta registrada pela instituição de pós-graduação e tido permissão da

SME para realizar essa busca de dados, nem sempre o acesso a todos os caminhos

burocráticos foi fácil.

Na primeira visita que fazíamos ao núcleo, falávamos da intenção da

pesquisa e esclarecíamos o que exatamente precisávamos e, geralmente,

deixávamos agendado o retorno para buscar o material com os dados. Também

oferecíamos o papel sulfite, nem sempre aceito pelos núcleos, para a impressão do

material e colocávamos à disposição a divulgação dos resultados de nossa

pesquisa.

Como dependíamos do trabalho, nesse caso voluntário, dos funcionários que

trabalham com o GED (Sistema de Gestão Educacional) e que para cada um dos

núcleos tem apenas uma pessoa, tivemos algumas “viagens perdidas”, pois o

levantamento dos dados muitas vezes não estava pronto no dia combinado.

1 Pen drive é um tipo de memória flash, um hd portátil, é de acesso mais rápido e fácil que um CD (compact disc) ou disquete, serve para guardar arquivos, ouvir música (alguns tocam mp3) e são conectados ao computador pela porta USB e entram como se fosse uma unidade de rede, não necessitam de formatação e podem ser gravados e desgravados milhares de vezes.

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Passamos então a telefonar para confirmar se os dados já estavam

disponíveis antes de nos encaminharmos até os núcleos. Com isso evitávamos a

perda de tempo, pois os núcleos estão estrategicamente em pontos diferentes da

cidade de Curitiba, justamente para atender à comunidade local, o que para nós

significava atravessar a cidade e mesmo com o Ligeirinho2, levar em torno de uma

hora e meia para chegar até um núcleo. As ligações se revelaram uma estratégia,

pois eram também uma suave forma de pressão.

Já nos primeiros retornos percebemos que a grande maioria das escolas que

ofertavam EJA, não havia feito o cadastramento de seus alunos em 2005, ainda que

fosse uma exigência do MEC. Este fato nos levou a reconsiderar e delinear nossa

pesquisa à fonte de dados de 2006, e assim sendo, esperar que as escolas fizessem

o cadastramento dos alunos.

Tendo descoberto qual das encruzilhadas nos levaria aos dados,

dependíamos agora do trabalho das secretarias das escolas municipais, que

priorizam o cadastramento, no censo escolar, dos alunos do ensino fundamental

regular. Deste modo, demoramos mais tempo do que o que havíamos previsto para

cumprir esta fase, fundamental para a pesquisa.

Enquanto aguardávamos os dados quantitativos fomos agendando,

previamente, e realizando com as coordenadoras da EJA as entrevistas semi-

estruturadas, cujo roteiro encontra-se em anexo sob o nome de apêndice B,

começando por Cajuru e Boa Vista, em seguida Portão e Pinheirinho, depois

Boqueirão e Bairro Novo e, estrategicamente, deixamos para o final os núcleos do

CIC e Santa Felicidade em razão de que estes se encontravam em período de

transição de coordenadoras e, portanto, se suas coordenadoras fossem novas na

função, provavelmente, ainda não estariam ambientadas com o trabalho na

Educação de Jovens e Adultos, e pouco contribuiriam para a pesquisa.

Os ambientes dos núcleos regionais são semelhantes, no sentido de terem

muitas pessoas trabalhando, em funções e setores diferentes, porém dividindo o

mesmo espaço físico. Às vezes separados em salas mais individualizadas, outras

vezes, por biombos e/ou armários num espaço coletivo, dividido em setores.

As entrevistas das coordenadoras foram gravadas, com o consentimento das

2 Nome dado ao ônibus que faz poucas paradas e faz parte do sistema integrado de transporte da cidade de Curitiba.

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entrevistadas e levaram de quarenta minutos a uma hora e meia de duração. Eram

agendadas com antecedência, dentro das possibilidades de horário disponibilizado

pelas coordenadoras. As primeiras entrevistas foram feitas no período da tarde.

Como o espaço físico em muitos núcleos é coletivo, separado apenas por biombos

ou mesas e armários, geralmente éramos interrompidas pelas burocracias do dia-a-

dia como dúvidas, papéis para assinar, telefone tocando e mesmo pessoas

conversando.

Deste modo, passamos a sugerir o período da noite para realizar as

entrevistas, pois teoricamente neste horário haveria, consideravelmente, menor

número de pessoas nos núcleos. Ainda assim, por várias vezes o telefone

interrompeu. Geralmente vice-diretoras, que são na escola as responsáveis pela

EJA, solicitando alguma coisa, esclarecendo dúvidas, passando enfim informações

sobre o trabalho.

Algumas coordenadoras sugeriam o vespertino como o período mais

adequado para realizarmos as entrevistas e mesmo suas casas. Dessa forma,

algumas entrevistas foram feitas no local de trabalho das coordenadoras, ainda que

com inúmeras interrupções nos permitiram conferir de perto como é o trabalho das

coordenadoras tanto durante o período diurno quanto no noturno. Outras duas

entrevistas foram realizadas na casa das coordenadoras.

Estas entrevistas com as coordenadoras da EJA se constituíram, nesse

momento, na principal fonte de referência para a definição das escolas a serem

pesquisadas. Ao encerrar uma entrevista, assim que possível, anotava no diário de

campo detalhes observados no contexto e nem sempre expresso em palavras,

considerados importantes à pesquisa, como por exemplo em relação a receptividade

das pessoas, ao ambiente e por vezes os possíveis significados de gestos, silêncios

e expressões faciais.

Com o rigor e cuidado, que evidentemente se deve ter, os dados nos foram

disponibilizados, por todos os Núcleos Regionais da Rede Municipal de Curitiba, que

ofertam a educação de jovens e adultos. Um fato que facilitou esta etapa da

pesquisa é o de conhecermos muitas pessoas, em virtude da nossa experiência e

principalmente pelos 16 anos de trabalho na Rede Municipal de Educação. Isto fez,

toda a diferença, pois houve um grande empenho das coordenações de EJA,

principalmente porque nossa pesquisa se propunha a desvendar algumas das

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questões que permeiam e instigam os profissionais que lidam com a EJA, e porque,

de fato existe a necessidade de se pesquisar mais sobre os alunos e alunas.

Finalizada essa primeira fase da coleta de dados, que nos gerou,

aproximadamente, 200 páginas de material impresso durou quatro meses e nos

rendeu alguns dias de trabalho com a companheira calculadora, delineamos

quantitativamente as matrículas de alunos e alunas da Educação de Jovens e

Adultos, das 118 escolas que o Município de Curitiba mantém, nas fases I e II que

respectivamente correspondem ao ensino supletivo fundamental de 1ª a 4ª séries e

de 5ª a 8ª séries. Embora nosso objetivo estivesse definido pela fase I, optamos por

divulgar também os dados da fase II, já que tivemos acesso a eles.

Destas 118 escolas com EJA, quatro atendem a fase II e pela investigação

que fizemos junto às coordenações de EJA nos núcleos regionais e nas visitas feitas

a estas escolas constatamos que o público atendido é majoritariamente de jovens na

faixa de 15 e 16 anos que por uma série de motivos estão no supletivo com o

objetivo de adiantar o processo escolar.

Na fase seguinte, com base na sistematização e análise dos dados

quantitativos coletados, nos objetivos que norteavam nossa pesquisa e, ainda, nas

entrevistas semi-estruturadas, realizadas com as coordenadoras da EJA, nos oito

núcleos regionais, selecionamos seis núcleos regionais para a realização da

pesquisa.

A escolha dos núcleos para a pesquisa nas escolas ocorreu da seguinte

forma: selecionamos o Pinheirinho com o maior número de mulheres matriculadas;

o Bairro Novo, núcleo com o maior número de alunos, no total, matriculados na

EJA, além de ser a região mais populosa de Curitiba; o Núcleo do Boqueirão, um

dos que detém o maior número de escolas, que ofertam EJA, o núcleo da CIC,

considerada uma das regiões de subúrbio, onde a violência estaria mais evidente;

Cajuru, por ser um dos núcleos que mais cresceu, em número de escolas nos

últimos anos, justamente, segundo a coordenadora, porque o Mutirão das Letras

apontou em 2003 o Jardim Acrópole como a região com o maior índice de

analfabetos em Curitiba, e Santa Felicidade que pertence à região norte da cidade,

considerada uma região nobre e, portanto, de maior nível sócio-econômico e ainda,

com o menor número de alunos/as matriculados/as.

Dessa forma, os núcleos alvo da pesquisa foram: Bairro Novo, Boqueirão,

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Cajuru, Pinheirinho, CIC (Cidade Industrial de Curitiba) e Santa Felicidade, assim,

estariam representados 75% dos núcleos que ofertam a Educação de Jovens e

Adultos, na cidade de Curitiba e que são mantidos pela Prefeitura Municipal de

Curitiba com estrutura física, material didático e profissionais da área da educação.

Dos seis núcleos regionais selecionados, e a partir das entrevistas realizadas

nos Núcleos Regionais, com as coordenadoras da EJA, e ainda, através das

observações e conversas informais com chefes dos referidos núcleos, selecionamos

seis escolas, das muitas indicadas pelas coordenadoras, que atendessem ao

seguinte critério: ofertar a fase I, respectivamente, 1º período, que corresponde a 1ª

e 2ª séries e 2º período, que corresponde a 3ª e 4ª séries, do ensino fundamental.

Nesse contexto, o recorte foi feito na seguinte perspectiva, seis núcleos

regionais para a pesquisa, e, assim sendo, seis escolas, que nos foram indicadas

pelas coordenadoras da EJA, uma para cada núcleo, que representassem a fase I,

que corresponde ao ensino fundamental de 1ª a 4ª séries, mantidos pela Prefeitura

Municipal de Curitiba.

Fizemos um total de 41 entrevistas semi-estruturadas sendo: 03 com

gerentes3 da EJA da SME (Secretaria Municipal de Educação) 08 coordenadoras da

Educação de Jovens e Adultos em cada regional; 06 com professores/as que atuam

na EJA e 24 entrevistas com alunos e alunas.

Exceto as entrevistas das gerentes da EJA na SME, todas as outras foram

gravadas, com o consentimento dos/as entrevistados/as e tiveram duração de 40 a

90 minutos.

Com as escolas selecionadas com base nos critérios descritos acima o

recorte da pesquisa estava definido. Assim, munida de gravador, fitas cassete,

pilhas, roteiro de entrevistas e uma aguçada curiosidade, fomos a campo.

Antes de iniciar a pesquisa de campo nas escolas, foi necessário testar o

procedimento metodológico. Com essa finalidade, realizamos uma pesquisa piloto

numa Escola da Rede Municipal de Educação de Curitiba. A escola que

3 Ao iniciarmos a pesquisa, ainda em 2005, buscamos a Gerência da Educação de Jovens e Adultos e entrevistamos a pessoa que naquele momento respondia pela EJA. Como recentemente havia tido eleições municipais, o período de transição trouxe uma nova gerente que permaneceu no cargo em torno de um ano e também foi entrevistada por nós. Assim, entrevistamos também a atual coordenadora da EJA, porém a deixamos para o final, propositalmente, dessa forma, a contribuição à pesquisa foi maior. Portanto, fizemos três entrevistas semi-estruturadas com as pessoas que nos últimos dois anos gerenciaram a EJA em Curitiba.

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escolhemos, assim como a grande maioria das escolas municipais, está localizada

na região sul de Curitiba, próxima a uma área relativamente nova e populosa,

conhecida como Bairro Novo. No teste piloto entrevistou-se uma aluna, um aluno e

uma professora da Educação de Jovens e Adultos, pois a partir deste momento este

seria nosso universo de pesquisa mais precioso.

Transcritas essas entrevistas nos reunimos com a orientação e fizemos

pequenos ajustes quanto à forma de questionar, principalmente no que dizia respeito

à postura da pesquisadora, de fazer uma espécie de bloco de perguntas que de

certa forma permitisse que o/a entrevistado/a falasse livremente e contasse sua

história, com o mínimo de intervenções possíveis, de nossa parte.

Com isso, aprendíamos na prática que o procedimento metodológico aliado à

técnica de entrevistas semi-estruturadas, foi adequado a esse tipo de pesquisa, pois

nos permitiu, de certa forma adaptar questões ou retomá-las de maneira diferente,

quando foi necessário, para que o/a entrevistado/a pudesse se sentir à vontade

durante a entrevista, permitindo que obtivéssemos informações sobre como as

pessoas vivem, o que pensam e sentem. Ajustes feitos, e principalmente, clareza de

como fazer a entrevista, voltávamos a campo, agora, com a curiosidade de

pesquisadora ainda mais aguçada.

Foram feitas entrevistas semi-estruturadas (ver roteiros em apêndices) com

um/a professor/a de cada escola e com alunos e alunas da Educação de Jovens e

Adultos.

Entrevistamos um professor contemplando a visão de um profissional homem,

pois segundo as coordenadoras, apenas dois homens trabalham com EJA; foram

entrevistadas também cinco professoras representando o magistério, que no Ensino

Fundamental, comprovadamente também em Curitiba, é feminino, além de 08

alunos e 16 alunas.

Todas as idas até às escolas foram agendadas previamente, via telefone. Na

primeira visita que fazíamos discutíamos com a direção e com as professoras a

melhor forma e melhores horários para minimizar os transtornos de entrada e saída

de alunos/as nas salas de aula. Mesmo com horário agendado, por vezes,

ocorreram alguns impedimentos para a realização de entrevistas como dispensa de

alunos/as para Semana de Estudos dos/as professores/as que ocorrem em épocas

diferentes em alguns núcleos. Em outra escola houve o roubo da fiação elétrica e os

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alunos/as tiveram que ser dispensados/as durante três dias para que fosse

novamente instalada.

Ainda que tenhamos tentado minimizar os transtornos nas escolas, em

algumas delas causamos certa euforia porque muitos/as alunos/as, principalmente

mulheres, queriam ser entrevistadas. Em alguns casos tivemos que limitar e

infelizmente não entrevistar todos/as os/as que manifestavam o desejo de participar.

No núcleo de Santa Felicidade, por exemplo, nos vimos pressionada a

entrevistar um aluno de 17 anos, que pelos critérios que previamente havíamos

estabelecido não estaria sendo pesquisado porque não fazia parte do foco de

análise. Além do fator idade era aluno especial, com Síndrome de Down que, neste

momento, não fazia parte no nosso objeto de pesquisa.

Este fato poderia ter sido omitido, porém não o fizemos por duas razões: a

primeira, porque foi um fato que ocorreu durante o percurso da pesquisa, portanto

ele faz parte da nossa trajetória. A segunda, porque este aluno se faz presente, no

momento em que estamos no seu reduto escolar conversando com a diretora, com a

professora e com outros/as alunos/as realizando entrevistas. Afinal, estamos

conversando com tantas pessoas e por que não com ele? Assim para que ele não

se sentisse discriminado, também por nós, o entrevistamos, como os/as outros/as

alunos/as. É fato que a entrevista demorou bem mais tempo que a de seus colegas,

pois o aluno tem certa dificuldade de fala, mas sua alegria e euforia contagiantes e

indescritíveis pelo simples fato de ter sido entrevistado, compensou nosso trabalho.

Também é importante frisar que esta não fará parte dos resultados e das análises e

que não foi somada no cômputo total de entrevistas realizadas.

Os espaços onde as entrevistas com os docentes foram realizadas, nas

escolas, por vezes a sala dos professores, sala de aula vazia ou sala de pedagogos,

pois agendávamos com os professores/as antes do início das aulas porque

geralmente estes trabalham na mesma escola durante o dia e já ficam para o

período da noite ou vêm direto de outras escolas e às vezes chegam mais cedo.

Em relação às entrevistas todas as professoras e o professor mostraram

entusiasmo para com a pesquisa e de nossa parte asseguramos que suas

identidades seriam preservadas. Das seis escolas pesquisadas, cujos nomes

também não serão revelados em apenas uma a direção, no caso a vice-direção que

administra o turno da noite, durante a entrevista com a professora entrou por várias

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vezes na sala onde estávamos, movida talvez pela curiosidade, abriu e fechou

arquivos, usou o telefone, ainda que em sua sala houvesse telefone.

Em outra escola, a última entrevista, iniciou com a professora na sala de aula

antes do horário da entrada de alunos/as e terminou na cozinha da escola, isto

porque naquele dia, em razão da mudança do calendário da semana pedagógica,

havia sido antecipada uma festa para os alunos/as da EJA e nossa entrevistada

estava encarregada de fazer o “crentão”4. Depois dessa entrevista, claro fizeram

questão que ficássemos na festa, conversamos informalmente com alunos e,

principalmente, alunas que sem dúvida são a maioria em todas as escolas e

percebemos o carinho e mesmo gratidão ao se dirigirem às professoras.

Em relação às entrevistas com os/as alunos/as como o número de matrícula

de mulheres é maior que o número de matrícula de homens, fato também

comprovado nas visitas às escolas, foram feitas 16 entrevistas semi-estruturadas,

com alunas numa faixa etária entre 28 e 68 anos, e 08 entrevistas semi-

estruturadas, com alunos numa faixa etária entre 19 e 57 anos, num total de 24

entrevistas semi-estruturadas. Nesse sentido, todas as faixas etárias dos/das

alunos/as da EJA foram contempladas, na perspectiva de caracterizar o público

atendido pela Rede Municipal de Curitiba e assim, responder aos objetivos que

foram propostos.

Faz-se necessário observar que desconsideramos os/as alunos/as na faixa

etária de 14 a 17 anos, pois estes não eram focos da pesquisa, fato que será

analisado no capítulo dos resultados, ainda que de forma breve.

As entrevistas com alunos e alunas aconteceram geralmente antes do horário

das aulas. Algumas vezes, quando a escola era muito longe, os alunos/as perdiam

parte da aula para nos conceder a entrevista, mas, ainda assim, faziam-no com

grande entusiasmo.

Houve escolas em que os professores indicaram os alunos e as alunas para

serem entrevistados/as, em outras, nós explicávamos para a turma do que se

tratava a pesquisa e as pessoas que demonstravam interesse eram entrevistadas,

tomando o cuidado para o critério de contemplar todas as faixas etárias que estão

presentes na EJA, exceto as já citadas e justificadas anteriormente neste texto.

4 Segundo a professora o “crentão” não tem álcool e tem esse nome porque é um como um quentão de festa junina com os mesmos ingredientes só que leva suco de uva no lugar do vinho.

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Enquanto eram realizadas as entrevistas com os/as alunos/as no período da

noite, durante o dia trabalhávamos na organização da tabela com os dados

numéricos referentes às matrículas das 118 escolas com EJA coletados nos

núcleos.

Pouco antes de finalizar a pesquisa de campo iniciamos a transcrição das

entrevistas. Para cada hora de fita cassete gravado levou-se aproximadamente três

horas na sua transcrição. Dessa forma, chegamos ao final da pesquisa de campo

com quatorze fitas gravadas e há que se considerar que a partir da primeira

gravação, ainda no teste piloto, passamos a utilizar o processo “modo lento’’5 de

gravação. Sendo assim, todas as demais entrevistas foram feitas utilizando este

processo.

Finalizadas as transcrições começava a tarefa de elaborar um quadro de

análise tomando como base as categorias que emergiriam das entrevistas à luz dos

objetivos da pesquisa. Este quadro nos permitiu observar com maior clareza as

entrevistas, definindo assim as categorias de análise que formaram a base para a

escrita do capítulo dos resultados contendo a síntese deste.

No próximo capítulo contextualizamos a EJA dentro do fenômeno da

globalização e das transformações no mundo do trabalho, da tecnologia e da

educação confluindo para gênero, enquanto foco polarizador deste panorama,

porque esses interferem no cotidiano do/a aluno/a.

5 Este processo que alguns gravadores cassetes dispõem, permite que a gravação seja feita em modo lento com isso há uma significativa economia de fitas cassete.

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3 A GLOBALIZAÇÃO E AS TRANSFORMAÇÕES NO MUNDO DO TRABALHO, DA TECNOLOGIA E DA EDUCAÇÃO

Neste capítulo, nosso objetivo é contextualizar a Educação de Jovens e

Adultos dentro do fenômeno da globalização dando uma visão ampla, ainda que

sem aprofundar, sobre as transformações ocorridas no mundo do trabalho, da

tecnologia e conseqüentemente da Educação. Assim, estaremos caracterizando a

globalização como uma das etapas do processo de mundialização do modo de

produção capitalista, relacionando-a aos atuais processos de reestruturação

produtiva e de reformas do Estado. A globalização gerou alterações no mercado de

trabalho, produziu novas demandas para a educação e, portanto, deu diferentes

contornos às políticas públicas, entre elas as educacionais, incluindo a modalidade

de educação de jovens e adultos. Nesse contexto, as questões de gênero no

mercado de trabalho, de tecnologia e de educação também sofreram impactos que

serão aqui considerados.

3.1 A GLOBALIZAÇÃO E AS TRANSFORMAÇÕES NO MERCADO DE TRABALHO

O modo de produção capitalista, dadas suas contradições centrais6, sofreu

crises de superprodução, acompanhadas permanentemente por processos de

reestruturação na organização da produção. A transição do taylorismo-

keynesianismo para o regime de acumulação flexível, acompanhada pela mudança

no padrão de intervenção do Estado de Bem-Estar Social para Estado Mínimo,

devem ser pensadas, de “maneira que não se perca de vista o fato de que as regras

básicas do modo capitalista de produção continuam a operar como forças

plasmadoras invariantes do desenvolvimento histórico-geográfico” (HARVEY, 1992,

p. 117).

As atuais mudanças caracterizam-se, portanto, em radicais alterações no

regime de regulação que exige a correspondência entre condições de produção e de

reprodução de assalariados. A materialização do regime de acumulação na forma de

6 Marx (1999) assinala como contradição central do modo de produção capitalista, o caráter coletivo da produção social, associado à sua apropriação individual. Esta característica do capitalismo gera concentrações, polarização social e engendra uma outra contradição do sistema: organização extrema no seio das indústrias e anarquia no seio da sociedade. Estes dois fatores promovem um crescente aumento da produção, não acompanhada pela capacidade de consumo da sociedade. Estas crises de superprodução do sistema são acompanhadas por estratégias de superação das mesmas, alterando o padrão de organização da produção, do consumo e de intervenção do Estado.

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normas, hábitos interiorizados, que garantam correspondência entre o esquema de

reprodução e os comportamentos individuais, correspondem ao modo de

regulamentação. Envolve, portanto “complexas inter-relações, hábitos, práticas

políticas e formas culturais que permitem que um sistema capitalista altamente

dinâmico e, em conseqüência, instável adquira suficiente semelhança de ordem para

funcionar de modo coerente...” (HARVEY, 1992, p.117).

Portanto, houve um período de profundas e rápidas mudanças no interior do

modo de produção capitalista cujas transformações envolveram novas formas de

socialização do/a trabalhador/a e, com isso, novos elementos de controle e de

convencimento, foram agregados pelas diversas instituições sociais, dentre elas as

educacionais.

Se até o início da década de 70 predominou o modo de regulação fordista-

keynesiano7 como resposta à crise mundial de superprodução de 1929, no mundo

atual, frente à nova crise, desenvolveu-se o chamado regime de acumulação

flexível8. Como parte do mesmo processo, as teses neoliberais de enxugamento do

Estado passam a reconfigurar as políticas educacionais da década de 90, visando

principalmente o enxugamento dos gastos do Estado via desenvolvimento de um

“quase-mercado educacional”9 e de desenvolvimento do Terceiro Setor.

A globalização e a conseqüente mundialização da produção associada à

revolução micro-eletrônica, também chamada de revolução informacional, vêm

carregadas de significados, passando a afetar a sociedade como um todo, seja no

âmbito do mundo do trabalho, seja nas dimensões das relações simbólicas e

ideológicas (LIMA FILHO, 2004). 7 Harvey (1992) indica que o fordismo, para além do taylorismo e dos princípios de separação entre concepção e execução do trabalho, relacionou a estratégia de produção em massa com o consumo em massa, caracterizando-se, portanto em um novo sistema de reprodução da força de trabalho, que correspondeu a uma nova política de controle do trabalho e a um novo tipo de sociedade “democrática, racionalizada, modernista, populista” (p. 121). O fordismo como regime de acumulação plenamente acabado, consolidou-se no período pós-guerra com a constituição do Estado Keynesiano, que assumiu uma variedade de obrigações, dentre elas, o investimento em políticas públicas, vitais para o crescimento da produção e do consumo. 8 A acumulação flexível, para Harvey (1992), caracteriza-se pela flexibilidade dos processos e dos mercados de trabalho, produtos e padrões de consumo, que marca um confronto com a rigidez do fordismo. A ampliação da capacidade de mobilidade e flexibilidade do mundo capitalista, aliada à desregulamentação e inovação financeira, tornaram as políticas Keynesianas inflacionárias, na medida em que aumentaram as despesas públicas e congelaram sua capacidade fiscal. 9 Essa expressão, utilizada por Pablo Gentili (1994), coloca que esse modelo capitalista vai definindo a formação de um mercado educacional que se enfatiza a qualidade total como numa empresa. Assim, já em fins da década de 80, os discursos da qualidade vão imprimindo aos debates e também às propostas educacionais, um sentido mercantilista.

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A dimensão desse novo modelo de produção chamado de acumulação

flexível é a de desemprego, contratos temporários, desregulamentação dos direitos

trabalhistas, transferência da mão-de-obra assalariada para o setor de serviços e

para a economia informal (HARVEY, 1992).

A análise que Hobsbawm (1995) faz, sustenta que o problema do

desemprego estrutural surge como principal conseqüência da transformação do

sistema de produção da “Era de Ouro” pela revolução tecnológica. Explica que as

altas tecnologias tornaram o componente humano de produção mais caro que o

componente mecânico. Por menor que seja o custo de reprodução do trabalho

humano, mesmo reduzido ao mínimo necessário para manutenção dos seres

humanos vivos, seu desempenho e produtividade não são interminavelmente

duráveis como o da maquinaria, ou seja, seres humanos não foram eficientemente

projetados para um sistema capitalista de produção (HOBSBAWN, 1995).

O mercado de trabalho transfere para o indivíduo a responsabilidade por

manter-se empregado e, segundo Canclini (2003), o mundo globalizado tem

aprofundado as desigualdades com as turbulências financeiras e é neste mundo do

trabalho precário, turbulento e desigual que a imensa maioria de homens e mulheres

estão inseridos/as, ou passam a compor uma outra categoria, a dos que pretendem

nele entrar e buscam na escola uma forma de estarem aptos às exigências desse

novo mercado.

Já no final do século XX, a produção flexível baseada em inovações

tecnológicas e principalmente através de novas formas de gestão da produção e do

trabalho, traz em seu bojo conseqüências como: a subcontratação, o aumento do

trabalho feminino e infantil no setor informal sem acesso a direitos trabalhistas, a

exclusão de jovens e idosos/as do mercado de trabalho e, além disso,

responsabilizam o/a indivíduo/a pela incapacidade de manter-se empregado.

A precarização do trabalho e o desmantelamento do Estado Social

promovidos no bojo do processo da globalização fundamentam como exigência

técnica, a competitividade. Este fato empurra as empresas para a terceirização,

portanto as atividades que são mantidas nas empresas de origem funcionam com

trabalhadores/as flexíveis (BECK, 1999).

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3.2 O CONCEITO DE TECNOLOGIA

Em um contexto no qual as relações de trabalho passam pelas atividades

mediadas pela tecnologia, o domínio de diferentes saberes, linguagens, práticas e

modos de vida torna-se decisivo para a inclusão ou exclusão do ser humano na

sociedade. Atualmente a tecnologia é uma dessas palavras que a mídia se

encarrega de alardear ao lançar produtos e serviços que teoricamente facilitam o

dia-a-dia das pessoas. Com esse argumento, tais produtos propiciam maior

eficiência, agilidade, rapidez, praticidade e conforto, tudo mediado pela tecnologia.

Um produto ou serviço tecnologicamente avançado parece ter maior credibilidade e

é mais bem aceito e consumido pela sociedade.

A visão sobre a tecnologia tem estado restrita a concepções utilitaristas,

principalmente pela expansão do consumo globalizado, ou seja, tem-se atribuído à

tecnologia um significado instrumental que envolve, segundo o senso comum,

principalmente as máquinas.

Se, por um lado, a tecnologia tem melhorado as condições de vida de muitas

pessoas, estimulado nos países periféricos um modelo econômico, estruturalmente

concentrador de riqueza e, em decorrência, desempregador; por outro lado,

enquanto propriedade privada e subordinada à lógica do modo de produção

capitalista, a tecnologia tem gerado exclusão e miséria e arranhado perigosamente

os limites da própria sobrevivência da espécie humana (FARACO, 1998, p.07).

Entretanto, essas concepções utilitaristas não são as únicas presentes nas

discussões acerca do universo tecnológico. Outras visões manifestam-se, sobretudo

no meio acadêmico, na procura de pensar a tecnologia de forma mais ampla e

profunda, apresentando conceitos que contemplam também as dimensões sócio-

culturais.

Para o autor Rui Gama, por exemplo, "a tecnologia moderna é a ciência do

trabalho produtivo", embora o referido autor considere a tecnologia atrelada ao

capitalismo, visto que é por meio deste que se realiza o trabalho produtivo, ou seja,

“o trabalho que produz um valor de mercadoria” é o que garante a acumulação do

capital. Esse autor esclarece ainda que “apesar da participação crescente da

tecnologia na produção de mercadoria, ela não é a mercadoria” (GAMA, 1987, p.

85).

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Essa visão amplia os horizontes das reflexões acerca do tema. A tecnologia

assim concebida não é mais somente instrumental, mas passa a contemplar

dimensões sócio-culturais envolvidas na sua produção. Porém, tal concepção

centraliza a tecnologia como um fenômeno que se manifesta na sociedade moderna

que se caracteriza pela existência do trabalho produtivo. Isto restringe a

possibilidade de pensar que a tecnologia está presente também em outros tipos de

organização social que não se moldam pela lógica capitalista, pois toda época

histórica tem a sua tecnologia correspondente visto que o processo de

humanização, por si só, já tráz a produção de instrumentos que viabilizam o trabalho

por meio de um conhecimento que pode ser considerado tecnológico, já que implica

na solução de desafios permanentemente enfrentados pelo grupo (CARVALHO,

2003).

A tecnologia para Carvalho:

perpassa todas as formações sociais, porque na produção das condições materiais de vida, necessárias a qualquer sociedade, é imprescindível a criação, apropriação e manipulação de técnicas que carregam em si elementos culturais, políticos, religiosos e econômicos, constituintes da concretude da existência social. Deste ponto de vista, tecnologia está intrinsecamente presente tanto numa enxada quanto num computador (2003, p. 20).

Nesse sentido, o conceito de tecnologia passa a ser o conhecimento utilizado

na criação ou aperfeiçoamento de produtos e serviços que contemplam

praticamente todas as atividades humanas desde as mais simples como a

introdução do pão de fôrma aos hábitos cotidianos às mais complexas, como essa e

a concepção, dentre os vários conceitos, que adotamos nesta pesquisa.

Marx citado por Bastos (1998) aponta a tecnologia como uma das forças

produtivas que, juntamente com a força de trabalho, garante a produção de

mercadorias em maior quantidade e em menor tempo. Portanto, a sua

comercialização proporciona a acumulação ampliada do capital e a reprodução do

capitalismo. Historicamente, o homem construiu sua evolução através do trabalho e

das forças de produção. Contudo, progressivamente as forças produtivas cortam o

vinculo com o trabalho, que vai se convertendo em mercadoria, ou seja, uma

execução de tarefas. Com esse novo modelo há um aprofundamento da divisão

social do trabalho e a introdução dos valores de troca em substituição aos valores de

uso.

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Com isso, o capitalismo, historicamente, vai se fortalecendo ao expropriar do

ser humano a totalidade do processo de produção através do parcelamento imposto

pela divisão social do trabalho que torna o trabalhador alienado porque desvaloriza o

trabalho do ser humano e, para o capitalismo, representa o barateamento do custo

da produção e, conseqüentemente, a acumulação. O parcelamento do trabalho

separou quem pensa de quem faz, como se o trabalho físico não demandasse

nenhum tipo de esforço intelectual.

Em sua reflexão, Bastos (1998) envolve a dimensão da educação com a

tecnologia. Sua preocupação não é somente conceituar tecnologia, mas propiciar

uma interpretação de educação tecnológica que aborde questões relacionadas aos

aspectos humanos, sociais, históricos, econômicos e culturais, pois para ele, são

elementos fundamentais e esclarecedores da maneira como os homens criam

tecnologia e com ela se relacionam. Esse autor define tecnologia como:

... a capacidade de perceber, compreender, criar, adaptar, organizar e produzir insumos, produtos e serviços. Em outros termos, a tecnologia transcende a dimensão puramente técnica, ao desenvolvimento experimental ou à pesquisa em laboratório; ela envolve dimensões de engenharia de produção, qualidade, gerência, marketing, assistência técnica, vendas, dentre outras, que a tornam um vetor fundamental de expressão da cultura das sociedades (BASTOS, 1998, p. 32).

A educação tecnológica conforme Bastos (1998) é uma das possíveis

alternativas para que todos tenham acesso aos benefícios da tecnologia.

Ao assumir novos papéis a escola precisa construir a sabedoria com senso

crítico desenvolvendo a capacidade de “leiturização do mundo” e as relações de

gênero, devem ser parte constitutiva deste processo de formação humana, porque o

processo tecnológico que envolve as questões de gênero altera o jeito de ver o

mundo, marcado por teorias, métodos e aplicações. A educação é assim um

exercício de aprendizagem que significa ruptura nos segredos do saber fazer, que

exige compreensão e interpretação dos artefatos (BASTOS, 2003).

Saviani (1994) enfatiza que “se a máquina viabiliza a materialização das

funções intelectuais no processo produtivo, a via para se objetivar a viabilização das

funções intelectuais na sociedade foi a escola”.

Maggie Brasil in Mascarenhas (2005, p.12), esclarece que “o capitalismo se

mantém porque gerou uma cultura da acumulação e a educação, em seu sentido e

em suas modalidades, pode servir de elo mediador para os processos de

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acumulação ao reproduzir idéias e valores que reforçam a reprodução ampliada do

capital”.

Para que esse processo se efetive, as tecnologias de comunicação e

informação darão o suporte necessário às empresas que processam seus dados 24

horas por dia e, assim, cobrem o espaço econômico mundial (BRUNO, 1998).

Nesse sentido, para se ter um crescimento cada vez mais rápido e eficaz e

assim atender as demandas impostas por essa forma de produzir houve uma

crescente incorporação do conhecimento científico à tecnologia (CARVALHO, 2003).

Portanto, se a tecnologia é uma das características desse modo de produção

capitalista, não podemos deixar de considerar que atualmente o conhecimento

científico é essencial para o desenvolvimento tecnológico. No entanto, Carvalho

(2003) apresenta uma proposta que tem por objetivo ampliar essa concepção em

outras dimensões. Para tanto a autora enfatiza que:

Propõe-se ampliar esta concepção para inserir outras dimensões que nem sempre são consideradas quando se fala em tecnologia. O sentido proposto aqui extrapola, portanto, a mera instrumentalidade que a vê direcionada apenas para o mercado, para considerá-la mais profundamente levando em conta todas as dimensões que estão implícita ou explicitamente presentes em sua produção ( CARVALHO, 2003, p. 20).

Esta pesquisa tomou como referência essa perspectiva ampla do conceito de

tecnologia, tendo clareza de que no contexto de uma sociedade capitalista o papel

da tecnologia adquire uma importância extremamente significativa, não podendo

perder de vista que essas mudanças tecnológicas exigem uma compreensão crítica

e, portanto, mais profunda de como ela se insere nas diferentes dimensões da

sociedade (CARVALHO, 2003).

Se entendermos que a tecnologia permeia as sociedades nas mais diversas

dimensões como a econômica, a política e a cultural, dentre outras, e que para se

ter acesso aos benefícios que essa sociedade tecnológica pode oferecer e ao

mesmo tempo corresponder às exigências sociais que são impostas, é necessário

dominar os instrumentos da cultura letrada como a leitura e a escrita, e na atual

sociedade sem essa tecnologia, seja quando ela está presente no domínio da

decodificação dos signos lingüísticos da placa do ônibus, seja quando ela está

presente querendo ou não somos obrigados a conviver com ela. Dessa convivência,

da possibilidade de acesso e da capacidade de se relacionar com esse

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conhecimento tecnológico presente no cotidiano da esfera pública e da privada,

dependerá a inclusão ou a exclusão do/a trabalhador/a.

Dessa maneira, parece haver um razoável consenso de que é necessário

elevar o nível educacional de toda a população, especialmente daquelas pessoas

que tiveram seus direitos negados, como as mulheres, que hoje retornam aos

bancos escolares na busca de uma qualificação profissional ou de um trabalho

desvinculado da esfera doméstica.

3.3 A GLOBALIZAÇÃO E AS TRANSFORMAÇÕES NO TRABALHO FEMININO

O trabalho da mulher, historicamente, tem sido desvalorizado, por isso cabe

historiar, ainda que brevemente, o trabalho feminino brasileiro10 no espaço público

chegando ao contexto da reestruturação produtiva.

O trabalho industrial no Brasil em todo século XIX e XX se fez com a mão-de-

obra feminina e masculina. A visibilidade do trabalho feminino estava nos

movimentos sindicais e nas lutas operárias, e não nos dados censitários, que

contam numericamente que houve a participação da mulher (BLAY, 1978, p.137).

Os jornais de 1874 publicavam notícias “incentivando menores e mulheres a

trabalharem em fábricas”, pois estas eram consideradas “escola de trabalho” para os

“filhos e filhas do povo livre”. O Correio Paulistano é outro jornal que, em 1875,

anunciava emprego para mulheres na indústria fabril, mas é o movimento sindical da

época que vai mostrar as precárias condições de trabalho dessas mulheres (BLAY,

1978, p. 137).

Num país essencialmente agrícola como o Brasil, por volta de 1850, existiam

cerca de 50 indústrias, mas mesmo antes das indústrias já se tinha uma produção

de tipo manufatureiro que Singer, citado por Blay (1978, p. 135) considera que “a

magnitude desse empreendimento industrial não deveria ser tão reduzida como se

possa imaginar e que seria enganoso supor que todos os produtos manufaturados

10 Para aprofundar esse tema, sugerimos: Mulheres e Trabalhadoras: presença feminina na constituição do sistema fabril. Maria V. J. Pena, 1981. Trabalho Domesticado: A mulher na indústria paulista. Eva Alterman Blay, 1978, Mulher Brasileira: opressão e exploração. Heleieth Saffioti1984.

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consumidos pelo mercado interno fossem importados”. Para Blay:

o processo de industrialização se dá por um crescimento quantitativo dos estabelecimentos industriais e pela diferenciação dos ramos da produção. Inicialmente, os principais produtos são alimentos, tecidos, calçados e vestuário. Depois, amplia-se a indústria mecânica, metalúrgica, química e farmacêutica. Finalmente desenvolvem-se a construção de meios de transporte e a indústria eletrônica (1978, p. 136).

As indústrias brasileiras mais antigas são a têxtil e a alimentícia onde a mão

de obra feminina era significativa. Em 1901, operárias e crianças somavam juntas

72,74% da mão-de-obra da indústria têxtil brasileira. Ganhavam menos que os

homens para desenvolverem a mesma tarefa, (não muito diferente de hoje),

trabalhavam entre 12 e 14 horas na fábrica e muitas ainda costuravam em casa

perfazendo um total de 18 horas de trabalho por dia. Com tudo isso, ainda eram

“consideradas incapazes física e intelectualmente” (BLAY, 2001).

As mulheres na indústria têxtil foram sendo substituídas por mão-de-obra

masculina. Com isso, o trabalho feminino foi redirecionado para casa e para os

serviços domésticos revitalizando seu papel de esposa e mãe, ficando ainda como

exército de reserva ou ocupando as posições mais baixas na hierarquia fabril.

Nesse breve histórico foi possível perceber que a mulher das classes sociais

mais pobres, assim como hoje, sempre trabalhou especialmente em serviços menos

qualificados.

Sempre que há exigência por uma qualificação mais especifica, ou seja,

técnica, o gênero masculino é quem assume o comando dos postos de trabalho.

Desse modo, as mulheres ainda optam por trabalhos com os quais se possa

conciliar uma modesta carreira e o desenvolvimento de alguns papéis domésticos.

Nesse sentido, Saffioti (1984, p. 97) já pontuava: “parece universal o

fenômeno de concentração progressiva da força de trabalho feminina no setor de

serviços à medida que as economias se tornam mais complexas”.

Segundo Leite (1993), o processo de modernização na indústria brasileira tem

três momentos: o primeiro com início no final da década de 70, ainda no “período do

milagre brasileiro”, com altas taxas de crescimento econômico, a constituição de um

parque industrial e conseqüentemente um mercado de trabalho urbano. O segundo

iniciou-se em meados dos anos 80, período em que o Brasil enfrentava altas taxas

de inflação e grande instabilidade econômica, quando foi difundido o emprego de

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novas tecnologias e novas formas de gestão da produção inspirados principalmente

no modelo japonês de produção. O terceiro momento teve início nos anos 90, em

meio ao aprofundamento da crise econômica e à abertura voltada ao mercado

externo. Assim, buscando serem competitivas com o mercado internacional, as

empresas entram na era da qualidade total, da terceirização e, portanto, da

reestruturação produtiva.

A intensificação da reestruturação produtiva – do taylorismo/fordismo para a

acumulação flexível concomitante com a incorporação de alta tecnologia à produção,

gerou um alto nível de investimento na produção. Em contrapartida trouxe

desemprego para o trabalhador (ANTUNES, 1995).

Posthuma (1993) relata, em pesquisa desenvolvida numa autopeça, que

quase foi triplicado o investimento em qualificação para a capacitação operacional e

administrativa. Numa análise semelhante, Leite e Shiroma (1995), citadas por

Santos, (2006) in Frigotto e Ciavatta, (2006, p.197) apontam os pesados

investimentos, feitos por uma empresa, em cursos de natureza mais comportamental

do que técnico, no sentido de desenvolver no trabalhador um espírito cooperativo

baseado na máxima de que “ele necessita tanto da empresa como a empresa dele e

que o crescimento de um significa o crescimento do outro”.

Nesse sentido, existe também, por parte das empresas, a necessidade de

formação de um novo trabalhador flexível, polivalente. Isso, efetivamente, gera

demandas para a educação e a escola vive um raro paradoxo. Nas palavras de

Pablo Gentili (1994), “dela não se espera nada, e dela se espera tudo”.

Delineia-se uma nova configuração do mercado de trabalho que Harvey

(1994) define como caracterizada por três níveis: um “núcleo central”, composto por

um número restrito de trabalhadores com alto nível de qualificação e remuneração;

outros dois níveis, chamados de “periféricos”: um primeiro nível, composto por

trabalhadores em tempo integral, de nível técnico, em maior número em relação ao

do núcleo central e facilmente descartáveis pelo sistema; e um segundo nível

periférico que reúne a grande maioria de trabalhadores, com contratos temporários e

sub-empregados, com baixa remuneração e qualificação.

No âmbito das grandes empresas que incorporam as novas formas de

organizar a produção, advindas da tecnologia, a diminuição dos postos de trabalho

exige um pequeno número de trabalhadores polivalentes, com capacidade para

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compreender o processo de trabalho na sua totalidade, além de terem iniciativa e

'relativa' autonomia para resolverem os problemas em equipe. Com essas

exigências fica evidente que se impõe a estes trabalhadores níveis mais elevados de

formação.

Por isso, a disputa pelas vagas de emprego está mais acirrada e, portanto, a

maioria da população que detém baixa escolaridade busca outras alternativas para

se inserir na economia; desta forma a escola passa a ser uma das alternativas de

conquista de trabalho, fato este, que tem gerado as demandas no aumento de

matrículas para a educação de jovens e adultos.

Como vimos, as grandes transformações no mundo produtivo absorveram a

mão-de-obra feminina nas indústrias, principalmente têxtil. Essa conquista, vista pelo

viés do capital, significou uma forma de baratear os salários pois a diferença salarial

entre mulheres e homens chegava a 60%. Ainda que tenhamos clareza de que essa

trajetória faz parte de um processo histórico longo e árduo de emancipação

feminina, pode-se dizer que só no século XX, segundo Muraro (1995), com a

emergência da sociedade de consumo, o movimento feminista ganha repercussão e

as mulheres ampliam sua integração ao sistema produtivo, estabelecendo um novo

modelo de participação social e também de relações produtivas.

Para Harvey:

embora seja verdade que a queda da importância do poder sindical reduziu o singular poder dos trabalhadores brancos do sexo masculino nos mercados do setor monopolista, não é verdade que os excluídos desses mercados de trabalho – negros, mulheres, minorias étnicas de todo tipo – tenham adquirido uma súbita paridade (exceto no sentido de que muitos operários homens e brancos, tradicionalmente privilegiados foram marginalizados, unindo-se aos excluídos). Mesmo que algumas mulheres e algumas minorias tenham tido acesso a posições mais privilegiadas, as novas condições do mercado de trabalho de maneira geral reacentuaram a vulnerabilidade dos grupos desprivilegiados, como no caso das mulheres (HARVEY, 1992, p.145).

Nesse sentido, “a transformação da estrutura do mercado de trabalho teve,

como paralelo, mudanças de igual importância na organização industrial” (Harvey,

1992, p.145). Um exemplo disso é a subcontratação organizada que oportuniza

pequenos negócios e por vezes permite que tipos de trabalhos domésticos e

antigos, como o artesanal, renasçam (HARVEY, 1992).

Delineou-se, com a transição para a acumulação flexível, uma revolução no

papel das mulheres, (de modo algum progressista), tanto no mercado, quanto no

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processo de trabalho justamente quando o movimento feminista lutava por uma

maior consciência e por melhores condições de trabalho (HARVEY,1992).

As implicações que a reestruturação produtiva trouxe para o trabalho feminino

em relação às inovações tecnológicas dizem respeito à introdução de robôs, ou seja,

houve uma automatização significativa em diferentes setores industriais e de

serviços exercendo influência maior sobre os empregos ocupados por mulheres.

Com isso, reduziram-se os empregos femininos, justamente porque as mulheres

estavam nos setores onde os trabalhos manuais e, portanto pouco qualificados,

foram eliminados. Dessa forma, passou-se a contratar um técnico masculino para

vigiar o robô e assumir o setor onde antes trabalhavam vinte mulheres. Outra

implicação é o deslocamento de trabalho dos países centrais para os países

periféricos, como por exemplo, os centros de telemarketing em que trabalham

mulheres da Argélia, Ásia ou América Latina para empresas dos países centrais

(HIRATA, 2005).

Para Scott (1995), as mulheres tiveram sua história contada separada da dos

homens, pois a história das mulheres diz respeito ao sexo, à família, separada da

história política e econômica, isso porque na sociedade androcêntrica o homem

pertencia à esfera pública e a mulher à esfera privada, reproduzindo assim as

desigualdades de gênero nas diversas formas de discriminação e estratégias de

poder e dominação. Este fato foi aceito, durante muito tempo pela sociedade e,

muitas vezes, ainda é visto como modelo natural de comportamento a ser seguido.

Bourdieu (1996), em seus escritos sobre a dominação masculina,11 observa

que esta se eternizou, fazendo com que se perca de vista que faz parte de um

processo histórico e como tal é passível de mudanças.

Assim, enquanto os meninos soltavam pipas e brincavam de carrinho fora da

casa, as meninas brincavam de casinha cuidando de bonecas e, principalmente,

cuidavam dos irmãos menores. Essa divisão caracterizou e continua caracterizando

o espaço do homem e da mulher, reforçados e cristalizados na escola e no mercado

de trabalho, ou naquilo que Freitag (1984) citando Althusser chama de aparelhos

ideológicos do Estado. A mulher, hoje, tem assumido também, o papel de provedora,

11 “Conceito de Pierre Bourdieu que se refere ao ato pelo qual os grupos dominantes impõem, como se fosse universal, sua cultura particular sobre os grupos dominados, ocultando que na origem desta imposição está um ato de força, ou seja, violência propriamente dita” (SILVA, 2000, p.111).

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na busca pela sobrevivência, ainda que acumulando o trabalho público com o

doméstico.

Embora a participação feminina no mercado de trabalho tenha dado

pequenas mostras de aumento, verificamos que isso tem ocorrido em espaços

geralmente precários e de direitos também precários, sem mencionar o viés sexista

que exclui as mulheres ditas “do lar”, consideradas inativas porque, ao trabalho

doméstico não se agrega valor. É um trabalho invisível (a menos que não esteja

feito), em geral porque o gênero feminino prefere e porque culturalmente assim lhe

foi ensinado fazer as tarefas da casa quando os filhos estão na escola e os maridos

trabalhando.

Foram educadas para que quando alguém chegasse, seja da família ou visita,

tudo estivesse limpo, em ordem, no seu devido lugar. Com isso, culturalmente o

gênero feminino transformou um trabalho árduo em invisível, menosprezado e de

pouco valor. O homem continua com a obrigação de provedor e, como isso já não é

possível nesse modelo de sociedade neoliberal capitalista, a mulher tem assumido

não só o papel de provedora do lar, mas, muitas vezes, também o de reprodutora

das relações de opressão.

Nessa relação dialética fica difícil, ainda hoje, conciliar o acesso ao fim das

desigualdades ainda presentes na divisão sexual do trabalho, já que esta divisão

atende justamente as imposições históricas do capital através dos símbolos

culturais, determinando aos homens o espaço público e às mulheres o espaço

privado, com as tarefas domésticas. Com essa contradição histórica, a mulher

assumiu a dupla jornada. Hoje há quem fale em tripla jornada de trabalho, pois além

do trabalho para a sobrevivência, à mulher está reservado o trabalho com a casa e o

cuidado com os filhos. Há ainda, os que sugerem uma quádrupla jornada, a de servir

o outro.

Hirata é enfática ao afirmar que enquanto não acontecer a divisão sexual das

tarefas domésticas igualitariamente, estaremos falando em duplas, triplas,

quádruplas jornadas de trabalho, ou seja, nas palavras da autora:

a única maneira de superar a divisão do trabalho existente hoje seria uma divisão igualitária do trabalho doméstico e do trabalho com o cuidado com as crianças entre homens e mulheres, no interior da família, entre o casal. Enquanto existir uma situação de assimetria, em que as mulheres fazem trabalho doméstico e profissional e os homens só fazem o

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profissional, enquanto existir essa divisão, acho que é impossível superar a desigualdade e a discriminação no mercado de trabalho em relação às mulheres (HIRATA, 2005. p.11).

Se por um lado a reestruturação produtiva traz para o trabalho feminino

implicações como a diminuição dos empregos porque as mulheres ocupam os

postos de trabalho que não exigem qualificação técnica (qualificação esta que

historicamente tem sido vista como masculina), por outro lado, pesquisas

INEP/MEC, (2003) têm apontado uma maior concentração feminina em alguns

níveis e modalidades de ensino, fato que pode ser um indício de que as mulheres

estão estudando mais que os homens.

Como vimos, o gênero feminino foi sendo excluído do processo de

reestruturação produtiva porque ficou fora do mercado de trabalho tido como

qualificado. No caso da EJA, tudo indica que, além disso, as mulheres também

ficaram fora da escola por uma série de razões, mas principalmente porque os pais,

e aqui nos referimos ao gênero masculino, não permitiam que filhas mulheres

estudassem, pois o destino das mulheres devia ser o casamento, ter filhos e se

ocupar dos afazeres domésticos cabendo ao homem o papel de provedor da família.

Essa cultura androcêntrica tem dado algumas mostras de mudança, embora seus

efeitos ainda se façam presentes na sociedade.

Em um momento em que a globalização se afirma, na expressão de

Blackmore, (2004, p. 91) “com tendências homogeneizadoras e diferenciadoras”

pesquisadoras como Louro (2001); Hirata, (2003 e 2005); Casagrande et. al (2003),

afirmam ser importante que o tema das relações entre gênero e educação esteja

presente em diferentes espaços sociais em especial no âmbito escolar onde também

são construídas as identidades de homens e mulheres. Parece-nos importante em

particular na Educação de Jovens e Adultos quando trabalhadores e trabalhadoras

buscam, através da educação, inserir-se no mercado de trabalho cada vez mais

globalizado.

Segundo Blackmore:

A questão de gênero está notavelmente ausente das principais discussões sobre a globalização, assim como de textos a respeito de políticas sobre reformas e reestruturação educacional. O foco da globalização freqüentemente está nas dimensões econômica, política, cultural e estética, em vez de na ecológica, social ou ética, e na formação de novas identidades étnicas, de raça e classe, mas não na de gênero. Ainda assim, a questão de

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gênero é central a todos os processos de globalização e à maneira como se enxerga a globalização (2004, 92).

Este mesmo autor destaca que em países de língua inglesa, mesmo com

níveis educacionais elevados, as mulheres estão em desvantagens. Existe ainda

uma predominância de uma classe média profissional anglo-saxônica e masculina

que, num contexto de reestruturação produtiva onde se exigem novos padrões

econômicos atrelados a uma constante desindustrialização, homens considerados

bem sucedidos estão perdendo vagas de “status” e gerência.

É neste cenário que a prestação de serviços assume seu lugar na história e

passa a ser cada vez mais feminilizada, mas com isso difundiu-se um discurso de

crise da masculinidade que vem reforçar ainda mais a competitividade entre homens

e mulheres ao invés de favorecer a busca pela igualdade e solidariedade.

Para Carvalho (2002), será mais fácil enfrentar as mudanças nas relações

sociais do mundo atual:

Quando homens e mulheres assumirem novos modelos de relações de gênero, menos dicotômicas e mais relacional, menos rígidas e mais flexíveis, onde os papéis de cada um na esfera pública ou privada, não estejam pré-estabelecidos, mas que sejam definidos de acordo com as possibilidades e disponibilidades de cada um. [...] Assim, compreender a realidade social mais ampla com seu modelo capitalista, neoliberal e excludente é fundamental para que tanto homens quanto mulheres percebam que o desemprego é estrutural, sócio-economicamente determinado e não resultado de uma incompetência pessoal (2002, p.28). Nesse sentido, a perspectiva relacional de gênero elimina a oposição

privilegiando a relação e colabora na “desconstrução de conceitos autoritários e

dominadores” permitindo a reconstrução através de “relações mais justas e

igualitárias onde respeito e compreensão mútuos são a referência” (CARVALHO,

2002, p.27-28).

Essas relações só poderão ser realmente mais justas e igualitárias quando

todos os seres humanos, homens e mulheres, tiverem dominado os códigos da

modernidade, pois a incorporação da ciência ao processo produtivo envolve a

exigência da disseminação dos códigos formais, ou seja, do código da escrita. O

domínio da escrita se converte, assim, numa necessidade generalizada

(SAVIANI,1994, p. 152). Por isso, acreditamos que essa necessidade generalizada

tem-se intensificado, ainda mais, com o processo de globalização, especialmente a

partir dos anos 90.

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3.3.1 O Conceito de Gênero

O conceito de gênero surge nos anos 80, após o movimento feminista

ocidental contemporâneo, na busca de deslocar a percepção da diferença entre

homens e mulheres do campo biológico para uma visão ampliada, na qual se

considera que os lugares do masculino e do feminino na sociedade são produtos

das estruturas sociais históricas. Portanto, o conceito de gênero apresenta um

enfoque histórico-social, e diferencia-se do sexo: o uso de “gênero” enfatiza todo um

sistema de relações que pode incluir o sexo, mas não é diretamente determinado

por ele, nem determina diretamente a sexualidade (Scott, 1995), ou seja, nas

palavras de Vieira (2003) o conceito de gênero passa a ser utilizado para mostrar a

existência da construção e organização social da relação entre os sexos.

Na academia, o termo “gênero” surgiu em substituição ao termo “Mulher”,

num momento em que o movimento feminista buscava desnaturalizar a condição da

mulher na sociedade, bem como, adentrar em alguns ramos da ciência, onde os

estudos sobre as mulheres não eram bem aceitos. Simião argumenta que: “era

preciso encontrar conceitos que permitissem diferenciar aquilo que as mulheres

tinham de natural, permanente, e igual em todas as épocas e culturas (o sexo)

daquilo que dava base para a discriminação e, por ser socialmente construído,

variava de sociedade para sociedade e podia mudar com o tempo (o gênero)”

(SIMIÃO, 2000, p. 4-5).

Ao considerar o gênero uma construção social que representa e reproduz

relações de poder, pode-se dizer que os papéis e/ou funções atribuídas a homens e

mulheres variam dependendo da cultura, do ambiente social, enfim, da sociedade na

qual as pessoas estão inseridas. Isto não se pode perder de vista, pois se o gênero

é social e culturalmente construído, também pode ser modificado (SCOTT, 1995).

Para Carvalho (2003, p. 16) é a perspectiva histórica e cultural que permite

perceber que as diferenças de gênero não são definitivas nem estáticas, elas se

transformam, não só com o processo histórico, mas também na medida em que as

necessidades sociais assim impõem.

Esse caráter social da cultura implica em que se interprete as suas

manifestações individuais a partir da ótica sociológica que fornece o fundamento

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teórico-metodológico para o seu entendimento. Um aspecto enfatizado por Geertz

(1978) na interpretação das culturas e das práticas culturais é que estas são

fenômenos simbólicos cujos significados são dados pelas pessoas que os vivem e

deles compartilham. Cultura é, portanto, um fenômeno social construído através de

relações sociais vividas em práticas cotidianas e experiências socialmente

compartilhadas (GEERTZ, 1978).

Se antes, o ambiente da mulher era predominantemente doméstico, onde lhe

cabia a espera, a passividade, a doçura e suas virtudes eram essencialmente

associadas à beleza e bondade, essa passividade tirava-lhes as características de

cidadã. Agora, inserida num contexto de transformações sociais, político-

econômicas e culturais essa mulher atua na esfera pública e em função do ambiente

de trabalho, começa uma trajetória acadêmica cujos sonhos estão envoltos em

questões como sobrevivência, inserção social e qualidade de vida. Isso ocorre,

segundo Bruschini (2000), porque a queda na taxa de fecundidade modificou

também a identidade feminina.

Para Schienbinger (2001, p. 45), o termo gênero “é mais propriamente usado

para referir-se a um sistema de signos e símbolos denotando relações de poder e

hierarquia” enquanto sexo pode ter muitos significados dentre eles “referir a biologia

[macho ou fêmea] de um indivíduo”. As relações de poder e hierarquia também

podem se manifestar dentro do mesmo gênero quando mulheres exercem sua

dominação sobre outras mulheres, ou quando homens dominam outros homens, por

exemplo.

A conceituação de gênero constante nos PCN’s é o “conjunto das

representações sociais e culturais construídas a partir da diferença biológica dos

sexos” (1998, p. 320) o que vem de encontro com os teóricos de gênero aqui

referenciados.

Para esta pesquisa o conceito de gênero que utilizamos foi o da autora Scott

(1995) que enquanto categoria de análise é constitutivo das relações sociais,

portanto, das interações recíprocas entre os sujeitos que trazem as marcas de sua

história e de sua cultura e, por isso, expressam também relações de poder. Assim

entendemos que a visão de apenas um dos gêneros estaria incompleta, pois:

A sociedade moderna, nesse sentido, tem acentuado as diferenças, bem como concentrado esforços para valorizar, a justo título os papéis da mulher em busca de igualdade de direitos,

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da integração e todas as dimensões da cidadania e do resgate do patamar da justiça, vilipendiado historicamente através de séculos. No entanto, as questões de gênero não se restringem ao feminismo e às correntes feministas, que ao exacerbarem certos aspectos dos valores e direitos da mulher dificultam a visão do todo e das relações integradas entre os dois sexos (BASTOS In CARVALHO, 2003, p. 10).

Por isso a educação e, em particular nos parece imprescindível que a

Educação de Jovens e Adultos caminhe no sentido do relacional, pois a força do

gênero está no relacional e não do dicotômico.

3.3.2 A Questão de Gênero na Educação e na Escola

Historicamente a escola tem sido apontada por teóricos como Althusser

(1985), Bourdieu e Passeron (1982), Apple (2002), enquanto estabelecimento

institucional privilegiado de transmissão diferenciada, tanto de conhecimento como

de valores, contribuindo tanto para a reprodução social como para a modificação das

relações sociais capitalistas.

Porém a escola ocidental moderna separou adultos de crianças, católicos de

protestantes, ricos de pobres, meninos de meninas e foi concebida para atender

alguns, não todos. Mas, há algum tempo a escola tem sido reivindicada por

aqueles/as que historicamente lhe tinham sido negada. Esses grupos acabam

trazendo transformações à instituição chamada escola, por isso, “ela precisou ser

diversa na organização de currículos, prédios, docentes, regulamentos, avaliações

que iriam explícita ou implicitamente “garantir” e – também produzir – as diferenças

entre os sujeitos” (LOURO, 2001, p.57).

Silva e Carvalho mostram que “a educação brasileira sempre foi marcada por

diferenças de gênero, embora não tenha se restringido a elas, pois a classe social, a

raça, a etnia ou mesmo o fato de morar em uma área urbana ou rural foram fatores

que contribuíram para gerar distinções no processo educativo” (2003, p. 51).

Atualmente, as questões de gênero perpassam as diferentes dimensões da

sociedade porque a crise estrutural também provocou modificações no trabalho e na

família e, conseqüentemente, em todas as relações sociais que envolvem o ser

humano. Essas mudanças para Apple (2002), se refletem no processo de trabalho,

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na cultura e na legitimidade. Com isso, a educação e a escola têm sido alvo de

muitas críticas e, para este autor,

sob vários aspectos, essa crítica tem sido salutar, uma vez que tem aumentado a nossa sensibilidade para o importante papel que as escolas - e o currículo explícito e o currículo oculto no seu interior – exercem na reprodução de uma ordem social estratificada que continua sendo provavelmente iníqua em termos de classe, raça e gênero (APPLE 2002, p. 26).

Para Forquim (1993), a escola lida com alguns aspectos da cultura

selecionados por serem reconhecidos como podendo ou devendo dar lugar a uma

transmissão deliberada mais ou menos institucionalizada.

No Brasil, são os Parâmetros Curriculares Nacionais - PCN’s (1998) que em

seus temas transversais prevêem, ou de certa forma instituem, a discussão das

questões de gênero no ambiente escolar.

Louro (2001), ao apontar a escola como ambiente não-neutro, refere-se a ela

também como ambiente de construção e de manutenção de diferenças, distinções,

desigualdades... Para esta autora, a escola delimita espaços e se utiliza de códigos

e símbolos para informar o lugar e o que cada um pode ou não fazer. Assim, a

escola tem, em geral, começado pela fila que alunos e alunas fazem para entrar na

sala de aula onde existe a fila de meninos e a fila de meninas e nela o lugar de cada

um/a. Tudo vai sendo encaminhado de forma “natural” ainda que se construa

culturalmente. Essas e outras pequenas coisas vão determinando e “fazendo

sentido” e constituindo os distintos sujeitos. É importante que se perceba esses

detalhes na escola, mas para isso:

os sentidos precisam estar afiados para que sejamos capazes de ver, ouvir, sentir, as múltiplas formas de constituição dos sujeitos implicados na concepção, na organização e no fazer cotidiano escolar. O olhar precisa esquadrinhar as paredes, percorrer os corredores e salas deter-se nas pessoas, nos seus gestos, e falas, as sinetas e os silêncios; é necessário sentir os cheiros especiais; cadências e ritmos marcando os movimentos de adultos e crianças (LOURO, 2001, p.59).

Foucault, em Vigiar e Punir citado por Louro (2001, p. 62-63), mostra que:

a disciplina “fabrica” indivíduos: ela é a técnica específica de um poder que toma os indivíduos ao mesmo tempo como objetos e como instrumentos de seu exercício. Não é um poder triunfante (...); é um poder modesto, desconfiado, que funciona a modo de uma economia calculada, mas permanente. Humildes modalidades, procedimentos menores, se os compararmos aos rituais majestosos da soberania ou aos grandes aparelhos de Estado.

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Na educação de adultos existe, segundo Di Pierro, Jóia e Ribeiro (2001) um

consenso de que os currículos precisam incluir “certos desafios éticos, políticos ou

práticos da vida social contemporânea, relacionados ao exercício da moderna

cidadania”. Meios de informação e comunicação, diversidade étnico-racial e

multiculturalismo, meio ambiente e qualidade de vida, relações sociais de gênero e

direitos da mulher são quatro temas relevantes para figurar nos currículos da

Educação de Jovens e Adultos.

Em síntese é na escola, e aqui nos referimos especificamente a EJA, que

encontramos uma multiplicidade de indivíduos/as com experiências de vida,

expectativas, realidades cotidianas, diversidade cultural e faixa etária as mais

diversas; Se as questões de gênero perpassam todos os setores da sociedade,

também, no ambiente escolar elas se manifestam e dependendo do

encaminhamento que tiverem podem, como diz Louro (2001), reforçar as diferenças

e desigualdades ou contribuir na busca de uma sociedade mais democrática e,

portanto, mais justa para alunos e alunas.

No próximo capítulo abordamos a história da EJA no Brasil e em Curitiba,

desde sua implantação até os dias atuais, com o objetivo de contextualizar o

universo da pesquisa bem como compreender as políticas educacionais atuais.

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4 A EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS NO BRASIL E EM CURITIBA

Neste capítulo apresentamos um breve histórico da Educação de Jovens e

Adultos no Brasil12, a partir da década de 30, porque é a partir dessa época que

começa a se consolidar no Brasil um sistema público de educação, e a partir de

então, a Educação de Jovens e Adultos, muito lentamente, começa a se configurar

enquanto educação, apontando, no contexto nacional e internacional, a influência

que tiveram nos aspectos que interessam ao nosso objetivo: a economia, a

tecnologia e as representações de gênero no conjunto das modificações sociais.

Fazemos isto com a finalidade de contextualizar a EJA historicamente, pois como

todo e qualquer fenômeno social ela é também um produto da sociedade que se

modifica de acordo com as circunstâncias históricas.

Dessa forma o leitor/a irá se deparar com um texto que procurou articular

acontecimentos nacionais e internacionais caracterizando os fatos considerados

mais relevantes ao objeto de estudo proposto.

Acompanhando esse contexto, traçamos o percurso histórico da EJA

mediando e relacionando esses aspectos com a questão da temática do trabalho.

Esta relação se justifica na medida em que, o nosso objeto de estudo, ou seja, o/a

aluno/a adulto/a estudante da EJA em Curitiba busca escolaridade em função das

exigências do novo mercado que tem supervalorizado a certificação como premissa

para concorrer a uma vaga no mercado de trabalho. Essas exigências se

comprovam todos os dias no caderno de classificados para empregos; para citar

apenas um dos inúmeros exemplos, tem-se exigido para ser gari, o ensino médio e,

para fazer salada (lavar e cortar verduras e legumes) em restaurante, o ensino

fundamental completo, ou seja, a 8ª série.

Historiamos também a EJA em Curitiba e com base em documentos oficiais,

apresentamos a configuração que a Educação de Jovens e Adultos assume, a partir

da década de 90 até os dias atuais, bem como uma análise sobre a presença de

questões referentes às relações de gênero nestes documentos, buscando

compreender as políticas atuais.

12 Para aprofundamento sobre a história da Educação de Jovens e Adultos no Brasil ver Celso Rui Beisegel, Estado e educação popular. São Paulo: Pioneira, 1974. Vanilda Pereira Paiva, Educação Popular e Educação de Adultos (1984).

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4.1 PRIMEIRAS CONFIGURAÇÕES DA EDUCAÇÃO DE JOVENS E

ADULTOS NO BRASIL

A partir de 1930, tem início a consolidação de um sistema público de

educação básica no Brasil e a Educação de Jovens e Adultos começa a trilhar seu

espaço. Naquele momento, no governo do Presidente Getúlio Vargas, o país

passava por grandes transformações geradas pelo processo de industrialização, e

um significativo crescimento da população urbana, conseqüência da crise de 29, da

baixa do preço do café, da dificuldade de importar bens manufaturados; estes

acontecimentos favoreceram a expansão da indústria brasileira e logo, a educação

passa a ser considerada sinônimo de progresso e desenvolvimento da nação, pois o

domínio da leitura e da escrita era visto como imprescindível para o entendimento e

execução das emergentes tecnologias de produção industrial.

Assim, a ação do Estado nacionalista articulado com a industrialização

começou a fomentar iniciativas importantes para a indústria como a criação do

Conselho Federal do Comércio Exterior (1934), a Coordenação da Mobilização

Econômica (1942), o Conselho Nacional de Política Industrial (1944) e a Comissão

Mista Brasil-Estados Unidos para o Desenvolvimento Econômico. Houve ainda a

implantação de indústrias de base tecnológica, como por exemplo: Companhia Vale

do Rio Doce, Fábrica Nacional de Motores, Siderúrgica Nacional e de indústrias de

geração de energia elétrica como a Companhia Elétrica de São Francisco

(MENDONÇA, 2000).

Ainda no governo Vargas, em fevereiro de 1932, foi decretada a Lei Eleitoral

que convocava eleições para uma Assembléia Constituinte no ano seguinte. Essa lei

instituía importantes novidades como o voto secreto, a Justiça Eleitoral (com o

objetivo de coibir abusos freqüentes na República Velha) e a extensão do voto para

as mulheres13, uma significativa conquista que merece destaque.

No texto da Constituição de 1934, já se reconhecia, no artigo 149, “a

educação como direito de todos que deveria ser ministrada pela família e pelos

poderes públicos”, e o artigo 150 estabelecia a obrigatoriedade do “ensino primário

13 No ano seguinte, também merece destaque, a eleição de uma única mulher para a Assembléia Nacional Constituinte, a médica Carlota Pereira de Queirós.

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integral, gratuito e de freqüência obrigatória extensiva aos adultos” (Constituição de

1934 apud PARECER nº 11 de 2000). Portanto, a lei já apontava a necessidade de

oferecer educação para os adultos, porém, só a partir dos anos 40, o governo

federal traçava as diretrizes educacionais para todo o país garantindo a extensão do

ensino a diversos setores e também aos adultos.

Merecem destaque, em razão de sua importância nacional, durante as

décadas de 40 e 50, a criação do Fundo Nacional de Ensino Primário (FNEP) em

1942, do Serviço de Educação de Adultos e da Campanha de Educação de Adultos,

ambos em 1947, da Campanha de Educação Rural iniciada em 1952 e da

Campanha Nacional de Erradicação do Analfabetismo em 1958, além de iniciativas

nos níveis estadual e local (DI PIERRO et. al, 2001).

Ainda que tenha sido criado em 1942, o Fundo Nacional de Ensino Primário

(FNEP) passa a funcionar, efetivamente, somente a partir de 1946 e segundo Paiva

(1983) e Beisiegel (1992), considera-se este fato o marco inicial de uma política

pública de educação de adultos apreciada dentro do espectro da instrução básica

popular.

No final de 1943, entrava em vigor a Consolidação das Leis Trabalhistas

(CLT) criada no governo Vargas, para assegurar os direitos dos trabalhadores, tais

como: férias remuneradas, estabilidade no emprego e jornada de oito horas diárias.

A economia brasileira passava então por profundas transformações saindo de uma

base essencialmente agrícola, para se tornar cada vez mais industrial.

No contexto internacional, depois de 1940, o modelo de organização e gestão

de trabalho, chamado de Taylorista/Fordista, implanta-se na Europa e no Japão com

mais firmeza (Harvey 1999). Este modelo de organização e gestão do processo de

trabalho estava vinculado a uma racionalização que buscava a divisão do trabalho,

com o parcelamento das tarefas e a separação entre quem pensa e quem executa o

trabalho. Ford aperfeiçoou o sistema de Taylor, enfatizando as técnicas e

introduzindo a linha de montagem que tinha como objetivo ampliar a produção e o

consumo, buscando movimentos precisos e gestos ritmados através de uma rígida

divisão do trabalho; isso resultou numa perda de autonomia e de iniciativa da classe

operária no âmbito da produção e as tarefas passaram a ser fragmentadas,

repetitivas e definidas previamente pela gerência, além de uma rígida disciplina do

trabalho coletivo, e do controle da produção.

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No cenário nacional vivia-se a efervescência política da redemocratização,

com o fim da Era Vargas14; a Segunda Guerra Mundial recém terminara e a

Organização das Nações Unidas (ONU), fundada em 1945, alertava para a

necessidade de integrar os povos, visando a paz e a democracia. Com isso, a

educação de adultos ganhou destaque posto que, a pretensão era universalizar a

educação básica, até porque o governo central brasileiro precisava de sustentação,

portanto era urgente aumentar as bases eleitorais, integrar a população imigrante

recente e incrementar a produção (RIBEIRO, 1997, p. 19).

Assim, a identidade da educação de adultos começou a ser definida em 1947,

como campanha de massa. O caráter exemplar dessa Campanha Nacional de

Educação de Adultos deveu-se à liderança de Lourenço Filho que lutou por uma

política governamental que valorizasse a educação de adultos/as enquanto

instrumento fundamental na elevação dos níveis educacionais da população. Essa

campanha promoveu o debate e a reflexão sobre o analfabetismo e o

reconhecimento de que o/a adulto/a com seus saberes e capacidades, era um ser

produtivo, pois até então o/a adulto/a analfabeto era visto como incapaz e

causador/a do atraso econômico, social e cultural do país. Ainda que essa

campanha tenha gerado debate e reflexão sobre a temática em questão, no entanto,

não chegou a produzir nenhuma proposta metodológica específica para a

alfabetização de adultos/as nem a um paradigma pedagógico próprio para essa

modalidade de ensino. Mesmo assim, os efeitos positivos da educação dos/as

adultos/as sobre a educação das crianças, ambas componentes indissociáveis de

um mesmo projeto de elevação cultural dos cidadãos, foram destacados por

Lourenço Filho (DI PIERRRO et.al, 2001).

Ainda no ano de 1947, o Ministério da Educação produziu um material

didático específico para o ensino da leitura e da escrita para adultos/as pelo método

silábico, onde as palavras-chave eram selecionadas e organizadas a partir de suas

características fonéticas. Essa campanha perde força ao final dos anos 50, sofrendo

várias críticas em especial ao caráter superficial, devido ao curto período da

14 O período em que o Presidente Getúlio Vargas governa o Brasil, ocorre de 1930 a 1945. Após ser interrompido por um golpe militar, Getúlio retorna ao poder de 1950 a 1954. A chamada Era Vargas, marcou uma época de grandes transformações sociais e econômicas, sendo uma fase de acelerado crescimento econômico, sob um regime autoritário (D'Araujo, 1998).

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alfabetização, método inadequado para adultos, além de deficiências administrativas

e financeiras, fatos estes que convergiram para uma nova visão, apontada no

Segundo Congresso de Educação de Jovens e Adultos de 1958, quando já

emergiam as idéias de Paulo Freire. Esse congresso salientou também a

importância da educação elementar para a população em idade escolar, sendo

justificado pela idéia de que a população adulta não possuía grandes perspectivas.

Nesse sentido, Beisiegel cita que:

A Campanha Nacional de Erradicação do Analfabetismo marcou o início de uma nova etapa nas discussões sobre a ação educativa da União junto às massas iletradas. Seus organizadores entendiam que a mera alfabetização do adulto não tinha significado. Toda a prioridade seria dada à educação de crianças e jovens para quem a educação ainda pudesse significar alterações de perspectivas existenciais (BEISEIGEL, 1998, p. 220).

Mas, no fim da década de 50, com a influência da política desenvolvimentista

populista, a educação dos adultos passa a ser parte do esforço para o

desenvolvimento econômico do país, pois este crescimento econômico estava

exigindo, para a sociedade moderna, pessoas capazes de se iniciar profissional e

tecnicamente. Salientava-se, ainda, que a modernidade precisaria de

trabalhadores/as capazes de ler, escrever e compreender os valores morais e

políticos da cultura brasileira (PAIVA, 1987, p. 207-208).

É ainda nessa década, com o desenvolvimento do capitalismo e com a

crescente industrialização da agricultura, que se intensifica a “expulsão” da

população rural rumo aos grandes centros urbanos. Esta população não encontrava

trabalho imediato nos setores já estabelecidos (indústria, comércio), e em

subempregos sobrevivia, favorecendo em dobro a expansão do capitalismo que

tinha um verdadeiro “exército de reserva industrial fato que contribuía para a

diminuição dos salários e dificultava a organização dos trabalhadores” (KOWARICK,

1977 citado por MENDONÇA e FONTES,1988, p. 16).

Em síntese, o país começava a fazer uma estreita ligação entre educação,

escola e trabalho percebendo sua importância decisiva para o desenvolvimento

econômico.

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4.2 MOVIMENTOS SOCIAIS, GOVERNO MILITAR E EDUCAÇÃO

No cenário da década de 60, a pedagogia de Paulo Freire critica a educação

bancária15 e inspira os principais programas de alfabetização e educação popular

com a proposta de alfabetizar conscientizando, partindo do princípio de que “a leitura

de mundo precede a leitura da palavra”. Tinha como objetivo levar o/a educando/a a

assumir-se como sujeito/a de sua aprendizagem antes mesmo de aprender a

escrever, pois os materiais didáticos faziam parte do cotidiano dos/as alunos/as e a

intenção era problematizar esse cotidiano a partir de uma metodologia popular,

libertadora e emancipadora. Portanto, os/as analfabetos/as deveriam, seguindo essa

proposta, ser reconhecidos/as como homens e mulheres produtivos/as que

possuíam uma cultura (FREIRE, 2002).

Freire, então, passou a direcionar experiências de educação de adultos/as

organizadas pelos programas do Movimento de Educação de Base (MEB), do

Movimento de Cultura Popular do Recife, ambos iniciados em 1961, dos Centros

Populares de Cultura da União Nacional dos Estudantes (UNE), dentre outras

iniciativas, seja regional ou local.

O Estado populista brasileiro, no início dos anos 60, em meio à crise

econômica, tornou-se incapaz de prestar atendimento às reivindicações populares

por reformas sociais. Nesse período, o Brasil viveu a efervescência política e cultural

e essas experiências evoluíam no sentido da organização de grupos populares

articulados a sindicatos e outros movimentos sociais, crescendo “a mobilização do

proletariado e das massas urbanas e camponesas por reformas de base (agrária,

solo urbano, direitos sociais, universalização de saúde e educação, salários reais,

controle sobre capitais estrangeiros etc.)” (LIMA FILHO e ARAUJO, 2005, p. 32).

Por esses motivos, o objetivo de Freire era realizar uma educação de

adultos/as crítica, voltada à transformação social e não apenas à adaptação da

população a processos de modernização advindos do processo industrial, portanto,

o diálogo como princípio educativo tinha como objetivo levar o/a educando/a a

assumir-se enquanto sujeito/a de sua aprendizagem, como ser capaz e responsável,

15 Educação bancária na concepção de Paulo Freire é a que torna a educação um ato de depositar, onde os educandos são os depositários e o educador o depositante. Assim a educação nesta visão é o ato de depositar, de transferir, de transmitir valores e conhecimentos (FREIRE, 2002).

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que também produz cultura e transforma o mundo. Esse movimento altamente

questionador da ordem capitalista foi visto como ameaçador:

a multiplicação dos programas de alfabetização de adultos, secundada pela organização política das massas, aparecia como algo especialmente ameaçador aos grupos direitistas; já parecia não haver mais esperança de conquistar o eleitorado [...] a alfabetização e educação das massas adultas pelos programas promovidos a partir dos anos 60 aparecia como um perigo para a estabilidade do regime, para a preservação da ordem capitalista. Difundindo novas idéias sociais, tais programas poderiam tornar o processo político incontrolável por parte dos tradicionais detentores do poder e a ampliação dos mesmos poderia até provocar uma reação popular importante a qualquer tentativa mais tardia de golpe das forças conservadoras (PAIVA,1983, p.259).

Se, de um lado, o pacto populista alimentou a efervescência política e cultural,

por outro lado, o quadro político, econômico e social que se formava, no período

1961-64, com disputas partidárias, greves, inflação e conspirações revelava a

estreita ligação entre estes elementos para o desfecho do golpe militar

(MENDONÇA e FONTES, 1988).

Devido a esse contexto, em 1964, o Plano Nacional de Alfabetização que

contava com forte participação de estudantes, sindicatos e grupos diversos,

estimulados pela efervescência política da época, foi interrompido meses depois,

com o golpe militar. Estes grupos de diferentes movimentos sociais passaram a

sofrer repressões; iniciaram-se intervenções policiais nos sindicatos, com prisão de

líderes sindicais e cassação de direitos políticos. Estava, portanto, instalada a

repressão que significou o desmantelamento, através da violência, de todas as

formas de organizações e a sujeição de intelectuais que pudessem significar

qualquer oposição ao regime ditatorial. Muitos intelectuais, políticos e artistas foram

exilados nesse período, inclusive Paulo Freire que foi exilado no Chile e continuou a

desenvolver sua proposta de alfabetização nesse país, e mais tarde, em países

africanos.

O chamado Golpe Militar, ocorrido em abril de 1964, representou a destruição

de importantes conquistas dos/as trabalhadores/as como: o direito à greve, às

formas de organização popular, às associações de camponeses, às associações

estudantis etc. E o pós-64 representou, segundo Mendonça e Fontes (1988), a

afirmação da hegemonia do grande capital, consubstanciada na aliança entre

empresariado, tecnocratas e militares na gestão de um modelo econômico

concentracionista e progressivamente internacionalizado advindo, portanto, a

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desnacionalização da economia brasileira, o conseqüente endividamento do Brasil e,

por conseguinte, a concentração de renda.

No contexto nacional e internacional, as décadas de 50 e 60 marcaram o

início do processo de internacionalização da economia com as empresas

transnacionais (Bruno, 1998)16. As empresas chamadas de transnacionais ignoram e

ultrapassam o princípio da nacionalidade. Essa nova estrutura se mantém localizada

acima das fronteiras nacionais, desagregando e corroendo o poder dos Estados

desde essa época. Para a educação esse rearranjo de poder tem interferido e

redimensionado a gestão de sistemas de ensino, como veremos adiante.

Foi durante o governo militar, que foi lançado, em 1967, o MOBRAL,

Movimento Brasileiro de Alfabetização17 que se expandiu durante a década de 70. O

MOBRAL passou a controlar as iniciativas para alfabetização de adultos/as e se

diversifica na atuação e na tentativa de sobreviver, seguindo as orientações das

agências internacionais ligadas à Organização das Nações Unidas, em especial a

Unesco, que vinham propondo, desde o fim da II Guerra Mundial, o combate ao

analfabetismo e a universalização de uma educação elementar como estratégia de

desenvolvimento sócio-econômico e manutenção da paz.

O MOBRAL, segundo Amaral (2002), buscou provocar entusiasmo popular,

mas ainda assim, recebeu críticas da UNESCO que julgava as campanhas de

massa uma estratégia ineficiente para reduzir os índices de analfabetismo, pois tinha

como concepção e finalidade, “a erradicação da chaga social que era a existência de

analfabetos”, considerada causa do desemprego. Durante sua existência, este

movimento trouxe poucos avanços para a população, fato constatado por Paiva

(1983), já que, em 15 anos, dos quarenta milhões de analfabetos/as apenas 10%

foram alfabetizados/as.

Paralelamente a esse movimento, mesmo reprimidos pela ditadura do

governo, e ainda que, clandestinamente, pequenos grupos dedicados à educação 16 Essa autora diferencia empresa multinacional, internacional e transnacional. Para ela a multinacional indica uma multiplicidade de nacionalidades em inter-relação que atua em várias economias nacionais a partir de sua sede. A internacional designa o inter-relacionamento entre várias nações, mas corporifica o princípio da nacionalidade. A transnacional não inter-relaciona nações, fato que envolve um padrão de divisões e cortes transversais e de associações inteiramente novos. Na ótica desta autora, é mais exato na atualidade trabalhar-se com o termo transnacional ao referir-se às grandes empresas que até recentemente eram chamadas de multinacionais (BRUNO, 1998, p. 17-19). 17 Para aprofundar sobre a institucionalização do MOBRAL, indicamos Bárbara Freitag, pag. 91 a 92 e pag. 119 a 124 (MOBRAL e ensino supletivo). 1984. 5ª edição. Escola, Estado e Sociedade.

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popular e alguns movimentos sociais continuaram alfabetizando criticamente,

seguindo os princípios de Paulo Freire.

A pesquisa realizada por Bastos, em 1986, analisando o aspecto político do

ensino supletivo na legislação, no período de 1970 a 1972 considera que:

A análise crítica mostrou que o governo defendia uma posição de integração dos excluídos no sistema escolar, mas, ao apresentar uma solução legal para integrá-los, entrou em contradição, pois a legislação do ensino supletivo criou um sistema paralelo, independente e inferior ao sistema regular de ensino. Essa contradição corresponde ao projeto político dos anos 70. O ensino supletivo tal como está institucionalizado pela legislação, acabou se tornando um mecanismo de exclusão, na medida em que não permite o reingresso ao sistema regular de ensino (BASTOS apud HADDAD, 2000, p. 89).

Ainda sobre este aspecto, Freitag indica que o supletivo, além de colaborar na

“manutenção do mito de uma sociedade democrática, é parte essencial de uma

sociedade excludente” e que “o sistema educacional institucionalizou na práxis a

própria relação de classes, reproduzindo-a também ao nível da sociedade civil”

(1984, p. 124).

A partir da década de 1970, mundialmente as desigualdades sociais se

aprofundam e são resultantes do que HARVEY (1999) chama de tendência da

divisão do setor monopolista em setor competitivo que gerou tensões sociais e fortes

movimentos dos que estavam sendo excluídos, porque a raça, o gênero e a origem

étnica vinham influenciando quem tinha ou não acesso a emprego. Esses

movimentos surgiram inicialmente na Europa e EUA, com reflexos no Brasil.

Nesse contexto de intensificação das desigualdades sociais, entre 70 e 80, a

reestruturação econômica e o reajuste social e político desencadeiam o que Harvey

(1999) chama de acumulação flexível quando tem início um processo de busca por

novas tecnologias de automação, de novos mercados e linhas de produtos em

regiões onde o controle do trabalho aconteceria mais facilmente (HARVEY, 1999,

p.137). No Brasil a incorporação desse modelo de acumulação flexível tem

coexistido com o modelo fordista/taylorista.

Também a partir dessa época, o Banco Mundial se torna um dos principais

financiadores do setor social e passa a monitorar o processo de ajustes estruturais

como o “principal articulador político entre os países, suplantando, em prestígio, a

atuação de outras agências internacionais ligadas à Organização das Nações

Unidas (ONU)” (OLIVEIRA, 2000, p. 109).

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Na educação, Bruno (1998) corrobora com Oliveira e enfatiza que as atuais

propostas de formulação do ensino apresentadas pelas políticas educacionais são

gestadas no bojo do processo de reestruturação produtiva a partir da

transnacionalização das estruturas que foram desencadeadas pela globalização.

Essas questões estão aprofundadas no terceiro capítulo deste trabalho

4.3 O ESTADO NEOLIBERAL E AS MUDANÇAS NA EDUCAÇÃO

Na década de 80, com a abertura política no Brasil, aquelas pequenas

experiências da sociedade civil que foram resistindo clandestinamente ao regime

militar, em torno da alfabetização vão se ampliando e, em 1985, o Mobral cedeu

lugar à Fundação EDUCAR (Fundação Nacional para a Educação de Jovens e

Adultos) que passou, com relativa descentralização de suas atividades, a dar apoio

financeiro e técnico às iniciativas de governos, entidades civis e empresas

conveniadas.

Se, por um lado, percebemos que o governo começava a transferir para a

sociedade a responsabilidade educativa da população, por outro lado, ampliou-se a

concepção de alfabetização enquanto processo que exige certo grau de

continuidade e sedimentação de modo que o adulto detenha um maior domínio da

cultura letrada, além da incorporação do princípio pedagógico da realidade vivida

pelos alunos como ponto de partida para a prática educativa.

Os anos 80 marcam também um período de críticas ao modelo de Estado –

crise do Estado do Bem Estar Social – abrindo espaço para a ascensão do

neoliberalismo com suas políticas de desmonte do Estado que se refletem ainda

hoje em políticas governamentais que estimulam a sociedade civil a desenvolver

ações sociais, no lugar da responsabilidade e intervenção do Estado, na tentativa de

diminuir os prejuízos impostos à classe trabalhadora (TREIN e CIAVATTA, 2006).

Esses programas de ajustes econômicos neoliberais foram a condição

imposta para a renegociação das dívidas dos países latino-americanos (MORAES,

2000, p.33). Assim, não somente o Brasil, mas outros países da América Latina

passaram, no desfecho da década de 80, a pôr em prática as recomendações do

Banco Mundial em relação à reforma do sistema previdenciário, à revisão do sistema

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tributário, à flexibilização dos monopólios, à concentração dos recursos para a

educação básica, dentre outras (SOARES, 1998 p. 37).

No cenário nacional, em relação às mulheres foi criado, em 1985, o Conselho

Nacional dos Direitos da Mulher. Com a abertura dada pelos governos pós-ditadura

e, principalmente, com a luta por seus direitos, participação política e social, as

mulheres, agora como sujeitos políticos, começaram a se inserir em diversos

espaços públicos com maior intensidade.

Em 1987, o CNDM (Conselho Nacional dos Direitos da Mulher), juntamente

com organizações da sociedade civil e ONGs uniram-se para defender direitos civis

iguais para os gêneros que se tornou conhecido como o “lobby do batom”. Esse

Conselho foi vinculado ao Ministério da Justiça e no final do segundo governo FHC,

em 2002, foi criada a Secretaria de Estado dos Direitos da Mulher, sendo estipulado,

como prioridades para esta Secretaria, o combate à violência contra a mulher, a

participação da mulher no cenário político do país e sua inserção no mercado de

trabalho (PINTO, 2006).

Segundo essa autora, as atividades dessas instituições levaram aos

seguintes direitos legais, expressos no Código Civil:

[...] o direito de as mulheres tomarem decisões sobre a casa, com os tribunais decidindo em caso de conflito; a supremacia dos homens nas questões familiares foi eliminada; o direito de a mulher casada declarar separadamente o imposto de renda e de ter os filhos como dependentes para as deduções do imposto de renda; a eliminação do direito de o homem impedir que as suas esposas trabalhem em quaisquer circunstâncias; os mesmos direitos para os filhos tidos fora do casamento e aqueles gerados no matrimônio assim como os mesmos direitos para os parceiros que aqueles dos casamentos formais; o direito à licença-paternidade paga; a violência sexual como um crime contra os direitos humanos em oposição ao crime moral, implicando assim em penalidades mais duras para os que cometem crimes sexuais, além dos direitos trabalhistas e previdenciários terem sido expandidos para as(os) empregadas(os) domésticas(os) (PINTO, 2006)18.

Durante esse período destacamos ainda, na área educacional, a criação de

instituições como: a ANDES (Associação Nacional de Docentes do Ensino Superior),

ANPED (Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação),

CEDES (Centro de Estudos de Educação e Sociedade) e ANDE (Associação

Nacional de Educação) que contribuíram para novos estudos e propostas

educacionais dando origem a uma abundante produção pedagógica de autores

18 Disponível em < http: // www.scielo.com.br> acesso em 28 set. 2006.

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como Demerval Saviani, José Carlos Libâneo, Moacir Gadotti dentre outros que, sob

o olhar de Casério (2003) começam a responder teoricamente, e vão norteando a

construção da educação brasileira19.

Consideramos esse período que acabamos de historiar, ainda que de forma

breve, uma época de contestação e principalmente de busca por mudanças,

decorrentes do aprofundamento das mudanças econômicas, sociais e culturais que

reclamavam políticas públicas, sobretudo com a abertura política, que permitiu o

surgimento e a organização de diferentes movimentos sociais.

No cenário nacional, a política inaugurada na década de 90 pelo governo de

FHC, deu continuidade à política econômica que foi gestada, ainda, nos anos 80, em

meio à crise do Estado que buscava o ajuste econômico, mantendo a abertura de

exportações, a privatização de grandes empresas estatais e outras iniciativas

visando a inserção do país no contexto de uma economia globalizada (VIEIRA,

2000, p. 171).

O Governo Federal, que até então, sempre tinha sido a principal instância de

apoio financeiro, extinguiu a Fundação Educar no início dos anos 90 e a educação

de adultos passa a ser assumida por alguns Estados, municípios e organizações da

sociedade civil. Isso se deu com dificuldades, pois a prioridade dos Estados e

municípios era a educação das crianças e adolescentes, fato que não deixava de ser

importante. Porém, com a falta de apoio financeiro do Governo Federal, a EJA

passou a figurar como um sistema de ensino paralelo ao de educação básica,

justamente no ano de 1990, definido pela Organização das Nações Unidas para a

Educação e Cultura (UNESCO) como Ano Internacional da Alfabetização.

Ainda nesse ano, em Jomtiem, Tailândia, aconteceu a Conferência Mundial

de Educação para Todos20, que apontava para a realidade mundial do analfabetismo

de pessoas jovens e adultas, com mais de 960 milhões de adultos/as analfabetos/as

19 Esses autores sistematizam uma rica produção pedagógica: Moacir Gadotti escreve sobre a Pedagogia Dialética, José Carlos Libâneo, sobre a Pedagogia Crítico-Social dos Conteúdos e Demerval Saviani sobre a Pedagogia Histórico-Crítica. 20 Conferência Mundial de Educação para Todos foi um grande evento financiado pela Organização das Nações Unidas para a Educação e Cultura (UNESCO), pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), e co-patrocinado pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) e pelo Banco Mundial; aconteceu na Tailândia, em 1990, onde participaram 155 países, centenas de organizações da sociedade civil. Em decorrência desse evento formou-se o EFA- 9: países com maior número de analfabetos e maiores déficits no atendimento de escolaridade obrigatória, que elaborariam planos decenais de educação para todos. Faziam parte: Indonésia, México, China, Paquistão, Índia, Nigéria, Egito, Bangladesh e Brasil (BRASIL, PNE, 2001 p.14).

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em nível mundial – dos quais dois terços eram mulheres – destacando ainda, índices

do reduzido tempo de escolarização básica e evasão escolar de crianças e

adolescentes.

Segundo a Declaração Mundial de Educação para Todos (UNICEF,1991)

mais de um terço dos adultos do mundo não têm acesso ao conhecimento em

material impresso e novas habilidades tecnológicas que poderiam melhorar a

qualidade de vida e ajudá-los a perceber e se adaptar às mudanças sociais e

culturais. Mais de 100 milhões de crianças e incontáveis adultos não terminam o

ensino básico, além de outros milhões que, apesar de concluir o ensino básico, não

conseguem deter conhecimentos e habilidades essenciais mínimas para utilização

cotidiana.

Com base nessa realidade, que incluía e ainda inclui também o Brasil, foram

definidas pelo Governo Federal Brasileiro, mediante acordo com as agências

internacionais de financiamento BM (Banco Mundial) e FMI (Fundo Monetário

Internacional), as políticas educacionais que passaram a considerar a educação um

dos principais determinantes da competitividade entre países, considerando,

também, imprescindíveis os ajustes da economia brasileira às exigências da

reestruturação global da economia, às mudanças no modelo produtivo e aos

avanços tecnológicos já sentidos e prenunciados (MONLEVADE; SILVA, 2000).

Esses mesmos organismos bilaterais e multilaterais passaram a desestimular

abertamente o investimento em educação de adultos. Lamentando essa situação,

Torres assinala que:

Tudo isso é preocupante não só pelo abandono educativo de jovens e adultos enquanto tais, mas também pela visão estreita que tal descuido revela em relação à própria meta (considerada prioritária) da universalização da educação primária infantil. Deixar de lado a educação de adultos é ignorar mais uma vez o ponto de vista da demanda educativa, a importância da família como suporte fundamental para o bem estar e a aprendizagem infantil, e, em última instância, como fator relevante nas condições de aprendizagem no meio escolar. Educar os adultos-pais e mães de família e os adultos-comunidade é indispensável para o alcance da própria Educação Básica para Todas as Crianças, e educar os adultos professores é condição sine qua non para expandir e melhorar as condições de ensino (TORRES, 1999, p. 20).

No cenário mundial, as transformações do capitalismo no final do século XX

tornaram evidentes a reestruturação capitalista e as mudanças decorrentes dessa

forma de produzir. Com a concentração da produção e do capital ocorre a fusão

entre o capital bancário e o industrial que resulta no capital financeiro, ou seja, na

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entrada da fase imperialista, vista como globalização ou mundializacão do capital

(CHESNAIS, 1996). Essa fase de estímulo à produção flexível, baseada em

inovações tecnológicas e principalmente através de novas formas de gestão da

produção e do trabalho, trazem implicações como a subcontratação e o aumento do

trabalho no setor informal. Além de excluírem jovens, idosos, homens e mulheres

adultos com baixa escolaridade do mercado de trabalho, transferem a

responsabilidade de manter-se empregado para o próprio indivíduo, pois é o

emprego que tem determinado o lugar social do ser humano e, como hoje muitos

não o têm, são excluídos.

O fim da sociedade do emprego é proclamado, a crise do trabalho na

sociedade torna-se visível, entra em cena a flexibilização de todos os direitos

trabalhistas, historicamente conquistados pelos trabalhadores e trabalhadoras. Com

isso, amplia-se a exclusão social e, portanto, a precarização do trabalho.

Pochmann, em entrevista concedida à revista Educação, em março de 2002,

diz: “nos anos 90, as ocupações que mais cresceram no país foram as de

empregada doméstica, vendedor ambulante, profissionais de limpeza e, por último

as de segurança”. De certa forma, isso explica a divisão internacional do trabalho,

que em países com alto nível de novas tecnologias exige maior capacitação do

trabalhador e em países com menor índice de investimento em novas tecnologias,

como é o caso também do Brasil, se precarizam as condições de trabalho e se

elevam os índices de desemprego.

Ainda que se proclame o fim do trabalho, este não perde sua centralidade. O

que tem ocorrido, e se configurou durante os últimos séculos, que trabalho é igual a

emprego e o problema disso é que, como o próprio MARX (1999, p. 69), dizia,

“transformou-se em trabalhador assalariado: o médico, o jurista, o padre, o poeta, o

homem da ciência”. Então, precisamos enfatizar que tipo de trabalho é esse que

terá seu fim. O trabalho entendido como emprego que se tem ou não se tem, de fato

podemos dizer que perde sua força, mas a categoria trabalho, enquanto atividade

humana, sempre existiu e continuará existindo.

A EJA pode representar um indício desse fato, pois as demandas geradas para

ela, nesta década de 2000 revelam as exigências de uma sociedade na qual as

mudanças tecnológicas têm exigido não somente a escolarização para o ingresso no

mercado de trabalho como também exigem um aumento no patamar de cultura no

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conjunto da comunidade; para poder participar dessa sociedade, o/a cidadão/ã

precisa do processo de escolarização que comporta o processo completo de leitura

e escrita que é a base do letramento.

4.4 A EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS EM CURITIBA

Parece-nos pertinente traçar, ainda que brevemente, a história da Educação de

Jovens e Adultos em Curitiba a partir da década de 70, justificado na medida em que

é a partir dessa década que se configura um programa de educação de jovens e

adultos do Governo Federal de maior abrangência, pelo menos em termos de

território e que se chamou Mobral. Para isso, usamos fontes documentais e

principalmente a análise da pesquisadora Haracemiv (2002). Apresentamos também

uma breve caracterização da EJA na Curitiba atual, assim como alguns dados

estatísticos sobre o tema com o objetivo de caracterizar o universo pesquisado.

4.4.1 Histórico da Educação de Jovens e Adultos ofertada pelo Município de

Curitiba

A análise documental feita nos relatórios anuais da SME – Curitiba revelou

que a Educação Básica de Jovens e Adultos na Rede Municipal de Curitiba teve

início em 1970 com a criação da Comissão Municipal do MOBRAL instalada por

decreto da Prefeitura Municipal de Curitiba, que até 1974 trabalhava apenas com

turmas de alfabetização. Essa comissão era composta por professores da Rede

Municipal de Ensino, além de outras pessoas nem sempre ligadas à educação.

A partir de 1974, e até 1982, iniciam-se também turmas de Educação

Integrada chamadas de PEI (Programa de Educação Integrada) e em 1983 são

criadas turmas de pós-alfabetização chamadas de PAF (Programa de Alfabetização

Funcional), que tinham como objetivo dar continuidade ao processo de

alfabetização. Para ser monitor dessas turmas, a Prefeitura fazia chamadas pelo

rádio, jornal e televisão e os interessados inscreviam-se na SME (Secretaria

Municipal de Educação) e eram então selecionados pelos seguintes critérios: ser

estudante de 2º grau ou de Curso Superior, morar próximo aos Postos de

Alfabetização e ter disponibilidade para o trabalho no período da noite.

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Os chamados Postos de Alfabetização funcionavam nas escolas municipais

que, nessa época, eram todas na periferia da cidade de Curitiba e, portanto,

consideradas de difícil acesso e geralmente o atendimento aos alunos era feito no

período noturno.

O relatório da Comissão Municipal do MOBRAL da SME (Secretaria Municipal

de Educação) de Curitiba no ano de 1983, aponta críticas e sugestões para o ano

seguinte que comporiam a história da EJA em Curitiba, pois apontavam para uma

metodologia de ação comunitária.

Em relação aos aspectos positivos, o relatório descreve que “investiu-se o

necessário para a melhoria dos recursos físicos encontrados, visando proporcionar

aos envolvidos no processo, as condições mínimas que favorecessem a

produtividade” (HARACEMIV, 2002, p. 66).

Quanto aos aspectos negativos, segundo Haracemiv (2002), esse relatório,

explicitava que houve falha nos recursos humanos:

Infelizmente não houve, ainda, uma ampliação da visão de equipe, em sua totalidade (...). Entretanto, consideramos positivo, dentre as críticas, o trabalho de rastreamento realizado nas classes, na tentativa de eliminar 'alunos fantasmas' e alunos participantes de programas não a eles destinados, como o caso de alunos já alfabetizados matriculados em classes de alfabetização (HARACEMIV, 2002, p. 66).

Nesse momento, o Brasil e conseqüentemente Curitiba, viviam em clima de

transição no regime político, fato evidenciado no relato da coordenadora, no referido

relatório:

Todos os esforços realizados visando ao aprimoramento dos envolvidos em nossos Programas/Projetos só trarão o resultado desejado a longo e médio prazo, pois acreditamos que as pessoas não se libertarão do processo de repressão por que passaram, sem reflexões e debates (RELATÓRIO DA COMISSÃO DO MOBRAL DA SME- CURITIBA, 1983, s.p.).

Esse relatório enfatizava ainda uma metodologia comunitária que se “encaixa

nas diretrizes educacionais deste período”, pois incentiva a participação da

comunidade local de acordo com seus interesses; assim, para essas novas

diretrizes eram desenvolvidos projetos específicos para cada localidade (Idem, 1993,

s.p.).

Portanto, para trabalhar com o adulto, passou-se a reconhecer como

premissa “o processo educativo desenvolvido a partir dos conhecimentos,

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habilidades e atitudes inerentes à cultura local, e dessa forma, possibilitando sua

ampliação em abrangência e complexidade, ou seja, é o processo que leva à

transformação da pessoa e do grupo, na medida em que pode viabilizar maior

participação na sociedade” (BRASIL. MEC, 1983, p.3).

Em 1984, sob a responsabilidade de professores integrantes do quadro

próprio do magistério, foi criada a Divisão do Ensino Supletivo do Departamento de

Ensino da Secretária Municipal de Educação (SME) cuja coordenação coube à

Professora Sonia Maria Chaves Haracemiv, no período de 1984 a 1986 quando

foram implantados 90 postos de alfabetização e onde foram mantidos os princípios

básicos de organização, legitimados no Brasil em 1982, ao definir o MOBRAL

enquanto órgão de educação destinado ao atendimento da Educação Supletiva.

Assim, a partir de 1984, o MOBRAL vai sendo descentralizado e são

implementados planos Estaduais de Educação de Adultos baseados nos parâmetros

da realidade sócio-cultural-econômica de cada Unidade da Federação. Além disso, o

MEC define que “os diversos conhecimentos técnicos necessários ao diagnóstico,

planejamento, implementação e avaliação das ações deveriam estar a serviço das

comunidades, num processo contínuo de capacitação que implicaria, também, uma

aquisição, pelo nível técnico de conhecimento próprio a cada realidade” (1983, p.3),

ficando evidente uma preocupação pela formação dos/as que trabalham com

Educação de Adultos/as.

Então, com a descentralização, em 1984 foi feita uma parceria entre a

Secretaria Estadual de Educação (SEED), a Secretaria Municipal de Educação

(SME) e a Universidade Federal do Paraná (UFPR). Essa parceria permitiu a

implantação de um programa chamado HAPRONT (Habilitação de Professores Não

Titulados) e tinha como objetivo formar o/a professor/a leigo/a que atuava na Rede

Municipal de Ensino, com titulação de Magistério de nível 2º grau; esse curso era

ministrado à distância, por módulos instrucionais desenvolvidos por professores/as

da instituição parceira de nível superior, sendo a avaliação acompanhada pelo

Primeiro Núcleo de Ensino de Curitiba.

Segundo dados do Arquivo Geral – SME de Curitiba, não houve desistência

nem repetência nesse curso, pois os módulos eram repostos à medida que fosse

necessário, respeitando o ritmo de cada um; 250 professores concluíram o

HAPRONT.

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Com isso, para trabalhar com a educação de adultos, passou-se a exigir

escolarização mínima de 2º grau, além de disponibilidade para os cursos de

treinamento.

No ano de 1986, aconteceu em Curitiba, o I Encontro Municipal de Educação

de Adultos e, nesse momento, afirmava-se que:

as práticas da educação popular representavam a vontade de se criar espaços autônomos, espaços nos quais o manejo de poder se realizasse numa crescente relação entre iguais (...) A busca por formas educativas de caráter participativo, de reflexão coletiva da prática dos próprios autores, do desenvolvimento de relações, da solidariedade entre os membros, a superação dos dogmatismos e preconceitos” (HARACEMIC, 2002, p. 67).

Nesse encontro, apontava-se, como urgente e necessário, despertar a

consciência crítica, pois já não era possível pensar em educação sem pensar no ser

humano. Além disso, sugeria-se como necessário fazer um estudo filosófico-

antropológico, pois o ser humano era visto como um ser de relações.

Portanto, segundo o relatório, só o desenvolvimento de uma consciência

crítica poderia transformar a realidade, e isso, foi visto como algo urgente a se

conquistar. A justificativa valia-se de argumentos fortes, ou melhor, sólidos: “A

sociedade alienada não tem consciência de seu próprio existir. Um profissional

alienado é um ser sem autenticidade, seu pensar não está comprometido consigo

mesmo, não é responsável” (HARACEMIC, 2002, p. 67).

Nos relatos das palestras dos encontros municipais de 1986, 1987, 1988,

1989, assim como nos conteúdos e metodologias dessa época, encontra-se a

influência da obra de Paulo Freire, inegavelmente percebida, como é possível

constatar no título do projeto da Divisão de Ensino Supletivo da Prefeitura Municipal

de Curitiba: “Venha conosco, você vai ler o Mundo”. É neste contexto que Curitiba

fica sendo conhecida no Brasil todo como “Trincheira das Idéias”; desde então isso

tem sido usado como justificativa para se ter profissionais habilitados ao ensino de

adultos.

4. 4.2 Em busca de uma proposta para a educação de jovens e adultos

Uma pesquisa realizada pelo IBGE a nível nacional (Instituto Brasileiro de

Geografia e Estatística) e PNAD (Pesquisa Nacional por Amostra a Domicílio), em

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1990, mostra uma população no Brasil de 17.732.629 habitantes analfabetos;

destes, 37% com idades entre 15 e 39 anos. Nessa mesma faixa etária, no Paraná,

no início dessa década, as pesquisas apontavam 42% de analfabetos.

A idéia de uma proposta própria para a educação de jovens e adultos já vinha

amadurecendo e com a divulgação desses dados, a SME (Secretaria Municipal da

Educação) elaborou, em 1990, uma proposta para atender a população analfabeta

de Curitiba que, em grande parte, segundo a SME, habitava as regiões periféricas

da cidade.

Em 1991 foi criado o Programa de Educação Básica para Jovens e Adultos/as

que recebeu aprovação, para atuar em caráter experimental, do Conselho Estadual

do Paraná através do Parecer nº 01/91 e da Deliberação nº 05/91.

A concepção da EJA, neste momento, estava voltada para um aluno/a

trabalhador/a historicamente situado, ou seja, considerado no seu contexto social,

político e econômico e no qual a escola estava inserida. Essa política educacional

combatia a imagem do/a aluno/a trabalhador/a analfabeto/a como um/a indivíduo/a

fracassado/a e valorizava sua competência para participar na sociedade

(PROPOSTA DE EDUCAÇÃO BÁSICA DE JOVENS E ADULTOS – SME –

CURITIBA, 1992).

Ainda em 1992, essa proposta pedagógica de educação de jovens e adultos

foi considerada de alta qualidade e de grande importância pelo INEP (Instituto

Nacional de Estudos e Pesquisas) e, em 1993, recebeu a aprovação legal do

Conselho Estadual de Educação, com o Parecer 162/93, sendo implementada nas

escolas da Rede Municipal de Ensino.

Nos pressupostos teórico-metodológicos desse programa, o aluno passava a

ser visto como sujeito de sua práxis, portanto, o trabalho era o quadro de referência

para o pensamento e a ação do educando jovem e adulto, posto que o trabalho

configura sua principal atividade de vida.

A pedagogia histórico-crítica de Dermeval Saviani (1991), parte da prática,

teoriza-se sobre ela e volta-se à prática para transformá-la; era esse o

embasamento, naquele momento, do processo educativo. Dessa forma, o intuito era

ofertar para a classe trabalhadora um conteúdo significativo que lhe permitisse: “a

elevação cultural e a inserção como cidadão atuante na sociedade, no exercício

pleno da cidadania”, ou seja, proporcionar “uma visão crítica do mundo e da

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sociedade”. Isso deveria ocorrer “também, pelo resgate da história pessoal e familiar

de cada um” (PROPOSTA DE EDUCAÇÃO BÁSICA DE JOVENS E ADULTOS,

SME - CURITIBA, 1992, p.9).

Percebemos, ainda, na análise documental da SME (Secretaria Municipal de

Educação) que a base das reflexões estava apoiada no materialismo histórico:

faz-se necessário entender que esses alunos são indivíduos historicamente situados, pertencentes a um segmento da sociedade que é a classe trabalhadora. Este programa pretende formar um indivíduo que possa fazer inferências significativas na prática social, transformando-a conscientemente. É imprescindível que ele domine conteúdos que lhe possibilitem agir criticamente no mundo, conteúdos esses que abranjam as leis da natureza e da sociedade, resultantes da produção humana, enquanto totalidade, indispensáveis para o exercício da cidadania. A apropriação crítica do conhecimento é que permitirá que se desencadeie o processo de superação do senso comum apresentado pelo aluno. O saber deve ser reapropriado pela classe trabalhadora, para que ela recupere, sob a forma sistematizada, o saber que seu trabalho lhe possibilitou. Este programa atende a demanda da escolarização de jovens e adultos que vivem o conflito do tempo para estudar, e a venda da sua força de trabalho para a sua sobrevivência (PLANO DE TRABALHO SME - CURITIBA, 1995, p. 2).

Entre meados de 1992 e 1995, os/as professores/as da EJA, foram

convocados para avaliar o material didático chamado de UT's (Unidades Temáticas),

utilizado por alunos/as nas escolas municipais. Esse material passou por avaliações,

algumas alterações e foi reimpresso.

Merece destaque, ainda neste período, os inúmeros cursos de capacitação e

aperfeiçoamento para os/as professores/as21 e uma constante preocupação no

sentido de ampliar a oferta da Educação de Jovens e Adultos nas escolas

municipais.

A partir de 1995, os Relatórios Anuais da Secretaria Municipal de Curitiba

refletem o processo de globalização que vinha se implantando no país e que

visivelmente aparece destacado nos objetivos dos relatórios, como por exemplo:

“utilizar recursos tecnológicos com vistas ao avanço globalizado na educação; e

implantar ações criativas, simples e efetivas, para a otimização da estrutura

administrativa e dos insumos ao processo pedagógico, viabilizando o ensino de

qualidade” (PMC; CURITIBA. Secretaria Municipal de Educação e Cultura, 1996. s.

p.).

21 Para saber mais sobre o perfil do professor da Educação de Jovens e Adultos do Município de Curitiba, consultar Haracemiv, 2002.

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O discurso da qualidade na educação, bem como, a otimização dos recursos,

a ampliação do acesso, a flexibilização e adequação de horários, o material didático

e a capacitação de professores com estímulo à modalidade, a distância, e a

parceria, dentre outros recomendados pelo Banco Mundial (TORRES, 1996) passam

a ser incorporados e assumidos, também, pela Secretaria Municipal de Educação.

Nesse contexto, a meta presente nos documentos da SME passa a ser

preparar os cidadãos para a participação num mundo em permanente

transformação. Para atingir essa meta foi implantado um conjunto de ações entre as

quais se destacaram o Projeto de Aceleração de Estudos22, o Projeto Fazendo

Escola23 e o Projeto Digitando o Futuro24.

Durante a década de 90, percebemos nos Relatórios Anuais da SME, que a

ampliação do número de escolas que ofertam Educação de Jovens e Adultos,

Educação Permanente, e a implantação e operacionalização de convênios e

parcerias com empresas, além de inúmeros cursos para capacitação dos/as

professores/as dessa modalidade de ensino, são uma preocupação constante e

também reflexo das políticas educacionais implementadas pelas agências

internacionais de financiamento.

A partir de 2000, passou a ser oferecida pela Secretaria Municipal de

Educação, em período diurno, uma série de programas como: Hora da

EJA25,Alfabetizando com Saúde26, Aprender do Servidor27, Aprender Digital28, além

de Brasil Alfabetizado que é um programa do Governo Federal.

22 Teve como objetivo adequar às questões de defasagem idade/série; ocorreu no período de 1998 a 1999. 23 Projeto desenvolvido em parceria com instituições de nível superior tinha como objetivo instigar o/a professor/a enquanto pesquisador/a. Para isso os/as professores/as faziam um projeto para aplicação e desenvolvimento na unidade escolar em que atuavam e se aprovado recebiam uma bolsa auxílio em dinheiro durante o período da vigência do projeto, além de orientação da instituição de nível superior que teria selecionado o referido projeto. Hoje o Projeto Fazendo Escola tem o nome de Universidade – Escola. 24 Teve início em 1997 com a implementação de laboratórios de informáticas nas Escolas Municipais de Curitiba. 25 Esse projeto é realizado através de parcerias com empresas, instituições religiosas, fundações e organizações da sociedade civil, ou por voluntários que desenvolvem o trabalho em espaços alternativos. 26 É desenvolvido em parceria com a Secretaria Municipal de Saúde em espaços dos Postos de Saúde atendendo parte da demanda de adultos com mais de 50 anos. 27 Prepara servidores que não concluíram o Ensino Fundamental (4ª série). Este programa em parceria com a Secretaria Municipal de Recursos Humanos tem turmas no próprio local de trabalho dos servidores e funciona com professores/as da Rede Municipal de Ensino. Assim, estes/as servidores/as fazem o Exame de Equivalência, que é uma prova para certificar que o/a indivíduo/a está apto/a a prosseguir os estudos a partir da 5ª série.

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Outro programa da SME de destaque é o Programa de Educação

Permanente que em período noturno, oferta à comunidade diversos cursos nas mais

variadas áreas, desde mecânica básica, língua espanhola, balé, artesanato e

música, com o intuito de proporcionar uma educação continuada ao longo da vida.

O Censo do IBGE de 2000 revelou que a cidade de Curitiba tinha 12% de

pessoas com menos de 4 anos de estudos e que são consideradas analfabetas

funcionais, porque sabem ler e escrever, mas não conseguem fazer uso dessa

leitura e escrita nas práticas sociais de seu dia-a-dia, ou seja, não estão na condição

de letramento como descrito no item políticas públicas para a Educação de Jovens e

Adultos.

Hoje, segundo a SME (Secretaria Municipal de Educação), Curitiba tem 3,4%

de analfabetos/as. Para levantar quem são e onde estão esses analfabetos, em

2005, o Projeto Ler é um Direito instituiu várias ações, dentre elas que todos os/as

estudantes, (aproximadamente 117 mil), da Rede Municipal de Educação, levassem

para casa formulários para serem preenchidos com um pequeno cadastro das

pessoas que não sabiam ler e escrever. Esses dados ainda estão sendo analisados

pela SME.

28 Propicia o acesso às novas tecnologias de informação e comunicação e oferece noções básicas de gestão de empresas; atende especificamente as escolas com EJA Fase II (5ª a 8ª séries) e escolas que mantêm Ensino Fundamental com Ciclo IV (7ª e 8ª séries).

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4.4.3 Configuração do Programa de Educação de Jovens e Adultos no

Município de Curitiba.

O programa de Educação de Jovens e Adultos da Secretaria Municipal de

Curitiba é uma categoria organizacional que compõe a estrutura da educação

nacional. Destina-se ao atendimento de jovens acima de 15 (quinze) anos e

adultos/as que não tiveram acesso à escolarização, referente às Fases I e II do

Ensino Fundamental (correspondendo de 1ª a 4ª séries, na fase I e de 5ª a 8ª séries

na fase II), na idade apropriada ou que iniciaram a escolarização, mas não tiveram a

possibilidade de continuá-la, conforme consta na Proposta Pedagógica da Educação

de Jovens e Adultos – Fase I.

Mantido pelo município de Curitiba, esse programa é relativamente recente

tendo iniciado suas atividades com a aprovação da Proposta Preliminar de

Educação Básica de Jovens e Adultos da Secretaria Municipal de Curitiba através

da Deliberação nº 005/91, do CEE-PR (Conselho Estadual de Educação do Paraná)

em 08 de fevereiro de 1991. É oficializada, por este mesmo conselho, em 1993, com

o Parecer 162/93 quando a Proposta Pedagógica de Educação Básica de Jovens e

Adultos passou a integrar o sistema Estadual de Ensino, o que ocorre, ainda em

2007, porque a Rede Municipal de Educação não dispõe de um Conselho Municipal

de Educação.

A EJA integra, portanto, o Ensino Fundamental e recebe verbas do FNDE

(Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação), segundo a gerência da EJA.

Além disso, outros recursos são conseguidos via projetos específicos junto ao

Governo Federal. O PEJA (Programa de Educação de Jovens e Adultos) é outro

recurso do Governo Federal, destinado a municípios com EJA. Estes recursos do

PEJA são aplicados em material didático para o/a aluno/a, ou seja, principalmente

na reprodução das Unidades Temáticas elaboradas pela equipe da Secretaria

Municipal de Curitiba e para a capacitação docente. Essa capacitação ocorre nas

diversas áreas do conhecimento.

Ainda, segundo a gerência, outras necessidades da Educação de Jovens e

Adultos, como professores/as e lanches, por exemplo, e toda a infra-estrutura

necessária ao funcionamento de um turno com aulas são disponibilizadas pela

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Prefeitura Municipal de Curitiba, em cada unidade escolar que oferta ensino

supletivo.

Nos Núcleos Regionais que oferecem a modalidade EJA, há uma pessoa com

a função de Coordenação de Educação de Jovens e Adultos. As escolas da Rede

Municipal atendem a EJA, no período noturno das 19h às 21h e 45 minutos com

classes de 1º e 2º períodos (1º período equivale a 1ª e 2ª séries e 2º período

equivale a 3ª e 4ª séries respectivamente), chamados de Fase I.

Quatro escolas atendem também a Fase II que corresponde ao 3º e 4º

períodos (3º período equivale a 5ª e 6ª séries e o 4º período equivale a 7ª e 8ª séries

respectivamente).

Hoje, existem turmas de alfabetização em escolas da Rede Municipal de

Educação no período diurno que atendem em geral aposentadas/os, chamados/as

carinhosamente de vovôs e vovós da EJA, donas de casa que preferem ir durante o

dia para a escola também por medo da violência urbana.

O responsável pela EJA, nas escolas, é o/a vice-diretor/a que tem a função de

acompanhar desde a matrícula até as questões rotineiras como: providenciar o

material didático-pedagógico para os/as professores/as, pois, normalmente estes

materiais estão guardados, até verificar e fazer a documentação dos/as alunos/as.

Na Proposta Pedagógica da Educação de Jovens e Adultos da Secretaria

Municipal de Educação de Curitiba, Fase I, consta que, para se atender as reais

necessidades de uma clientela adulta, buscou-se um programa inovador que

apresenta as seguintes características estruturais e funcionais:

1. Não seriação, o programa está estruturado em dois períodos

correspondentes ao Ciclo I e ao Ciclo II do Ensino Fundamental;

2. Não reprovação, o aluno é aprovado em cada unidade temática

vencida respeitando-se, assim, o processo de construção do

conhecimento;

3. Apoia-se em material específico composto de 22 (vinte e duas)

Unidades Temáticas;

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4. Freqüência vinculada ao conteúdo; expressa em carga horária no

trabalho com o material de apoio (Unidades Temáticas);

5. Não desistência no programa, tendo em vista que o aluno poderá

retornar, a qualquer momento, os estudos do ponto em que parou;

6. Sem calendário determinado para o início e término do curso. A

freqüência é vinculada ao conteúdo expressa em carga horária, no

trabalho com o material de apoio (Unidades Temáticas) e outros

recursos didáticos;

7. Permite transferência para outro sistema de ensino e vice-versa.

Conforme a Proposta Pedagógica da EJA – Fase I, a organização curricular

está estruturada por disciplina (unidades temáticas) que correspondem às disciplinas

de Base Nacional comum exigida para a oferta de EJA, que são: Língua Portuguesa,

Matemática, História, Geografia, Ciências Naturais, Artes e recentemente

incorporada a disciplina de Educação Física.

As turmas são organizadas com um mínimo de 15 alunos/as freqüentando e

quando houver uma freqüência de 30 alunos/as ou mais, a escola poderá abrir uma

nova turma e solicitar à Secretaria Municipal de Educação mais um/a professor/a.

Existe a possibilidade de abrir tantas turmas quantas forem necessárias para

atender a demanda, assim como, se diminuir o número de alunos/as o número de

turmas também diminui e os/as alunos/as que continuam na escola agregam-se a

outras classes, ainda que sejam multiseriadas29.

O quadro 1, a seguir, nos permite visualizar a configuração da Educação de

Jovens e Adultos, bem como a evolução das matrículas e a conseqüente ampliação

do número de turmas e de escolas desde sua implantação em 1991 até 2005.

29 São chamadas de classes multiseriadas turmas que agregam mais de uma série, por exemplo, 1ª e 2ª séries, ou mesmo, de 1ª a 4ª séries.

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QUADRO 1 - EVOLUÇÃO DO NÚMERO DE ESCOLAS, TURMAS E MATRÍCULAS DA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS NA REDE MUNICIPAL DE ENSINO DE CURITIBA – 1991/2005.

ANO Nº DE ESCOLAS Nº DE TURMAS Nº DE ESTUDANTES

1991 36 85 2.975

1992 41 106 2.961

1993 51 110 2.841

1994 57 126 2.564

1995 74 176 4.644

1996 77 198 5.597

1997 82 232 6.707

1998 83 240 7.206

1999 85 233 7.176

2000 89 243 6.435

2001 103 245 7.156

2002 104 260 7.674

2003 107 259 7.246

2004 120 372 9.279

2005 122 325 8.148

FONTE: Secretaria Municipal da Educação de Curitiba. Departamento de Planejamento e Informações – Fluxo Escolar, 1991 a 2005 (março).

Observamos que de 1991 até 1994, mesmo com o aumento no número de

escolas ofertando a EJA, há uma gradativa diminuição no número de alunos/as. Já

em 1995, o número de alunos/as volta a ter um aumento significativo, demonstrado

também pelo número de turmas que em 1994 era de 126 e em 1995 passa a ser de

176 representando um total de 40 novas turmas.

Segundo o quadro 1, nesses 14 anos de EJA, há uma diminuição de turmas

de 1998 para 1999 com uma diferença de sete turmas e de 2002 para 2003 com

uma turma a menos. No ano de 2004, há um aumento significativamente

considerável com 113 novas turmas, com mais de dois mil alunos/as ingressando na

EJA em Curitiba.

Em 2005, temos 122 escolas ofertando EJA em Curitiba e uma baixa de 47

turmas, uma considerável diminuição, neste caso diminuiu também o número de

alunos/as que em 2004 era de 9.279 e em 2005 passou a ser de 8.148, ou seja, uma

diminuição de mais de mil alunos/as. É importante considerar que muitos destes

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concluem a EJA, e uma interessante pesquisa seria acompanhar estes egressos por

alguns anos e verificar que mudança a EJA trouxe para suas vidas.

Outro fato que devemos atentar é o de que a EJA, do município de Curitiba,

oferece desde 1989, o Exame de Equivalência quatro vezes por ano. Este exame

tem como objetivo regularizar a vida escolar de pessoas que estudaram, mas que

não têm documento comprobatório em nível de 1ª a 4ª séries. Assim, o que ocorre

com bastante freqüência é que o/a aluno/a se matricula na EJA faz o que chamam

de “dar uma revisada” e em seguida realiza o teste de equivalência. Dessa forma,

estes/as alunos/as entram e saem, rapidamente, das estatísticas de matriculados/as.

Para além disso, observamos por este quadro que mesmo com o notável

crescimento de escolas o número de turmas se manteve na média de três por

escola. Isso reflete que a expansão da EJA, evidencia também, que Curitiba assim

como o Brasil, ainda está longe de garantir o acesso e principalmente, a

permanência de seus cidadãos e cidadãs na escola.

Em agosto de 2005 temos a seguinte configuração em relação ao total de

matrículas na Educação de Jovens e Adultos na Rede Municipal de Educação.

QUADRO 2 - TOTAL DE MATRICULAS POR NÚCLEO NAS REGIONAIS DA EDUCAÇÃO QUE OFERTAM EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS

NÚCLEOS Nº DE ESCOLAS COM EJA TOTAL DE ALUNOS

BAIRRO NOVO 13 1.616

BOA VISTA 20 802

BOQUEIRÃO 17 881

CAJURU 17 1.150

CIC 14 1.379

PORTÃO 09 695

PINHEIRINHO 18 1.238

SANTA FELICIDADE 10 372

TOTAL 118 8.133

FONTE: Secretaria Municipal da Educação de Curitiba. Departamento de Planejamento e

Informações (julho/agosto-2005).

A EJA, em fim de julho/início de agosto de 2005, apresenta um total de 8.133

alunos/as matriculados/as, sendo o Núcleo Regional do Bairro Novo o que detém o

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maior número de matrículas, seguido pelo Núcleo Regional do CIC, Pinheirinho e

Cajuru, todos com mais de mil alunos/as. Os núcleos regionais Boqueirão e Boa

Vista têm uma média de oitocentos/as alunos/as, seguidos pelo Portão com

aproximadamente 700 matrículas e a Regional Santa Felicidade com 372 matrículas,

o menor número da rede. Essa é a realidade da EJA em 2005.

Tendo apresentado a EJA, no Brasil e em Curitiba, numa perspectiva histórica

e na atualidade, no próximo item abordamos os documentos oficiais que

implementaram as políticas de EJA, bem como fazemos uma análise das questões

de gênero presentes nestes documentos.

4.5 POLÍTICAS PÚBLICAS PARA A EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS

Neste tópico, apresentamos com base em documentos oficiais, a

configuração que a Educação de Jovens e Adultos assume, a partir da década de 90

até os dias atuais, bem como uma análise sobre a presença de questões referentes

a relações de gênero nestes documentos.

Para isso, tomamos como base os quatro documentos que propõem a política

nacional de Educação de Jovens e Adultos, citados abaixo, e a análise de

pesquisadoras como Chilante (2005) e Rosemberg (2001).

4.5.1 Documentos Oficiais que tratam da Educação de Jovens e Adultos no

Brasil

É importante frisar que até 1990, a EJA, no Brasil, vinha se desenvolvendo

com medidas instauradas através de projetos e campanhas mantidos pelo governo

Federal, como vimos anteriormente. Ao extinguir a Fundação Educar, que respondia

por essa modalidade de ensino, o governo Federal passa a descentralizar essa

responsabilidade aos Estados e Municípios. Com todos os entraves e limitações que

possam estar presentes nestes documentos, eles se constituíram uma referência,

pois é nessa época que surgem os principais documentos que implementaram as

políticas públicas de Educação de Jovens e Adultos. No entanto ressaltamos que na

década de 90 a EJA esteve à margem das agendas das reformas educacionais e,

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segundo Di Pierro, et. al. (2001, p. 323), isso mostra que a política econômica do

governo de FHC foi dotar os “sistemas educativos de maior eficácia com o menor

impacto possível nos gastos do setor público”.

Assim os quatro documentos que propõem a política nacional de Educação

de Jovens e Adultos são:

1. Seção V, do capítulo V, da LDBEN 9394/96; que estabelece as Diretrizes e

Bases da Educação Nacional;

2. Parecer CNE/CEB nº 11/2000; que apresenta um relatório sobre a EJA;

3. Resolução CNE/CEB nº 1/2000; que apresenta as Diretrizes Curriculares

para a EJA e;

4. Lei 10.172, de 09 de janeiro de 2001; que apresenta o Plano Nacional de

Educação.

Para proceder à análise desses documentos, buscamos na Constituição

Federal de 1988, concebida no momento político que explica uma constituição

chamada de cidadã, e nos textos que nesta se referem à educação, quais sejam,

artigos 205 a 213 que determinam os direitos dos cidadãos e os deveres do Estado

para com estes.

Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.

Art. 208. O dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia de: ensino fundamental obrigatório e gratuito, inclusive para aqueles que não tiveram acesso em idade própria.

Em meados de 1980, houve marcantes debates, com destaque para as

proposições à constituinte, que prosseguem com a articulação de diversos grupos

ligados à educação com o objetivo de discutir e estruturar a nova LDB (Lei de

Diretrizes e Bases da Educação) que estaria em tramitação no Congresso Nacional.

Segundo Lima Filho (2002, p.152), “a tramitação da LDB no Congresso Nacional

ensejou a disputa de diferentes concepções educacionais que refletiam distintos

projetos de sociedade”.

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Lima Filho (2002), corroborando com as críticas de SAVIANI (1997) sobre a

nova LDB e o contexto de sua tramitação, acentua que, desde o início das

discussões até a aprovação do projeto Darcy/MEC, houve conflitos profundos entre

a política de governo que diretamente articulava-se com o ideário neoliberal e o

modelo que a sociedade civil pensava.

A tramitação da LDB no Congresso Nacional ocorreu entre 1988 e 1995,

quando diferentes manobras articuladas, segundo LIMA FILHO (2003, p. 152) “com

grupos privados e com a participação do próprio MEC”, desconsideram o projeto

construído com a participação da sociedade civil30 e aprovaram o substitutivo

Darcy/MEC em dezembro de 1995.

Assim, o primeiro documento, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação

Nacional – LDB nº 9.394/96, que analisamos – determina, em relação a EJA, que:

Art. 4º O dever do Estado com educação escolar pública será efetivado mediante a garantia de: I- ensino fundamental, obrigatório e gratuito, inclusive para os que a ele não tiveram acesso na idade própria; (...) VI- oferta de ensino noturno regular, adequado às condições do educando; VII- oferta de educação escolar regular para jovens e adultos, com características e modalidades adequadas às suas necessidades e disponibilidades, garantindo-se aos que forem trabalhadores as condições de acesso e permanência na escola. (...) Art. 37 A educação de jovens e adultos será destinada àqueles que não tiveram acesso ou continuidade de estudos no ensino fundamental e médio na idade própria. § 1º Os sistemas de ensino assegurarão gratuitamente aos jovens e aos adultos, que não puderam efetuar os estudos na idade regular, oportunidades educacionais apropriadas, consideradas as características do alunado, seus interesses, condições de vida e de trabalho, mediante cursos e exames. § 2º O Poder Público viabilizará e estimulará o acesso e a permanência do trabalhador na escola, mediante ações integradas e complementares entre si. Art. 38 Os sistemas de ensino manterão cursos e exames supletivos, que compreenderão a parte nacional comum do currículo, habilitando ao prosseguimento de estudos em caráter regular.

30 O Projeto da sociedade civil, PL 1258/88 depois de passar por diferentes comissões e relatorias chegou ao Senado Federal com a denominação PL-C 101/93 onde permaneceu por mais dois anos em tramitação. No entanto, este projeto foi atropelado pelo Projeto Darcy Ribeiro, transformando-se na Lei nº 9394/96, por imposição do Executivo, mesmo com inúmeras manifestações contrárias organizadas por: grupos sindicais, acadêmicos, partidários e populares. Para maiores esclarecimentos sobre a tramitação e aprovação da LDB, ver ainda: (Hage, 1990; Vieira, 1990; Pino, 1997; Saviani, 1997; dentre outros).

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§ 1º Os exames a que se refere este artigo realizar-se-ão: I no nível de conclusão do ensino fundamental, para os maiores de quinze anos;

II no nível de conclusão do ensino médio, para os maiores de dezoito anos;

Sobre o conteúdo da lei em relação ao que foi proposto no substitutivo Jorge

Hage, a posição de Saviani (1997), foi a de que houve, no texto legal, um recuo no

que diz respeito aos direitos dos/as trabalhadores/as porque o substitutivo previa

horas de estudo durante a jornada de trabalho, condições para recepção de

programas de tele-educação no local de trabalho, além de redução de jornada de

trabalho em uma ou duas horas sem redução de salários, na perspectiva de

assegurar o acesso e a permanência do/a trabalhador/a na escola.

Ao ignorar essas condições fundamentais para os/as trabalhadores/as, lei

9394/96 deixa claro seu caráter de suplência superficialmente breve que estaria

apenas amenizando os índices de analfabetismo do país em lugar de oferecer uma

formação integral.

Outro aspecto, destacado por Saviani (1997); Haddad (1997); Soares (2002)

dentre outros/as autores/as foi o caráter “marcadamente minimalista” da LDB,

induzindo as regulamentações mediante medidas tópicas e pontuais. Aqui, faz-se

necessário lembrar que, a partir de meados da década de 90, o Governo Federal

propõe ações de caráter compensatório dentre as quais se destacam: o (PAS)

Programa Alfabetização Solidária; o (Pronera) Programa Nacional de Reforma

Agrária, de caráter diferente, pois, este surge movido pelas pressões sociais; o

(Planfor) Plano Nacional de Qualificação do Trabalhador, que é substituído pelo

(PNQ) Plano Nacional de Qualificação em julho de 2003, mas que é implementado

de fato a partir de 2004; o Programa Recomeço e, atualmente o Programa Brasil

Alfabetizado (DI PIERRO; GRACIANO, 2003). Esses programas se estabelecem ou

se estabeleceram nos moldes do regime de parceria31

A autora Rummert (2002, p. 119), por exemplo, alerta para o conteúdo

“marcadamente flexível” da nova LDB/96 na qual se percebe a estreita ligação entre 31 A palavra parceria, para Maria Clara Di Pierro, incorporou-se ao vocabulário desta modalidade de ensino porque passou a definir “a relação contratual estabelecida entre os governos estaduais e fundações privadas”, para “designar convênios mantidos por governos municipais ou estaduais com organizações comunitárias”. Consideram-se também parceiras “redes de educação comunitária lideradas por igrejas e aquelas capitaneadas pelos serviços sociais da indústria e do comércio” (2001, p. 327).

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a lógica das políticas relacionadas à educação, em especial à EJA, na relação

custo/benefício.

Di Pierro (2000, p. 113-114) evidencia, também, o caráter “flexível” em

relação à EJA, especialmente no que diz respeito à aceleração de estudos. Sobre o

documento LDB, a autora destaca a frustração que as pessoas que trabalham com a

EJA tiveram, pois este apresenta “lacunas, incoerências, estreiteza conceitual, falta

de inventividade e funcionalidade aos interesses privados do ensino”.

Arelaro e Krupa (2002, p.97) também destacam que a Lei 9394/96 não trouxe

melhorias significativas porque no contexto da lei somente dois artigos abordam a

EJA.

Um outro aspecto ressaltado pelo CONEJA, 1996 (In: HADDAD, 1997) e por

SOARES (2002) diz respeito à indefinição da redação final da LDB, quanto à idade

para ingresso na EJA, fato que possibilita diferentes interpretações e permite que os

Conselhos Estaduais de Educação estabeleçam a correção de fluxo ou a adequação

idade/série do sistema escolar. Além disso, esses/as autores/as interpretam a

questão do rebaixamento da idade mínima para 14 e 16 anos em detrimento dos 15

e 18 anos previstos, anteriormente, para ensino fundamental e médio

respectivamente, para os exames supletivos, como uma desobrigação do Estado

frente às responsabilidades que lhe cabe quanto a “oferta do ensino universal e de

qualidade”.

4.5.2 Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação de Jovens e Adultos

ou o Parecer CNE/CEB nº 11/2000

O segundo documento de nossa análise é o Parecer CNE/CEB nº 11/2000

que apresenta um relatório sobre a EJA. O parecer é de autoria de Carlos Alberto

Jamil Cury e, em relação aos aspectos legais, propõe estabelecer as Diretrizes

Curriculares Nacionais para a Educação de Jovens e Adultos, orientando para o

resgate da dívida social, historicamente acumulada, a um significativo número de

jovens e adultos que não tiveram acesso à escolarização na idade adequada. O

parecer propõe assumir a tarefa de estender o acesso ao ensino fundamental

enquanto direito público para todas as pessoas, independente de sua faixa etária.

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O parecer separa “alfabetizados/as e analfabetos/as, letrados/as e

iletrados;as” apontando que estes conceitos expressam um “novo divisor entre

cidadãos”. Relata-se nesse documento, a concepção da professora Magda Becker

Soares (1998) sobre esses conceitos, diferenciando alfabetização e letramento. Para

essa autora, tornar-se alfabetizado/a, ou seja, aprender a ler e escrever significa

adquirir uma tecnologia, de codificar, isto é escrever em língua escrita e, de

decodificar, ou seja, ler a língua escrita. Porém, isso não é suficiente, é preciso

atingir o letramento.

Então, alfabetizado/a nomeia aquele/a que apenas aprendeu a ler e escrever,

não aquele/a que adquiriu o estado ou a condição de quem se apropriou da leitura e

da escrita (SOARES, p. 19, apud BRASIL, 2000 p. 4).

Letramento é, portanto, o estado ou a condição de quem não só sabe ler e

escrever, mas exerce as práticas sociais de leitura e escrita que circulam na

sociedade em que vive associando-as com as práticas sociais de interação oral

(SOARES, 2004).

Portanto, “não basta apenas saber ler e escrever, é preciso também saber

fazer uso do ler e do escrever, saber responder às exigências de leitura e de escrita

que a sociedade faz continuamente...” (SOARES, 1998, p. 20 apud. BRASIL, 2000,

p. 4).

Outra concepção expressa neste parecer é a da professora Leda Tfouni para

quem os sistemas de escrita são um produto cultural, a alfabetização e o letramento

são processos de aquisição de um sistema escrito. (TFOUNI, p. 9 apud. BRASIL,

2000, p. 4)

Nesse sentido, vale lembrar, neste emaranhado de definições que:

É importante compreender que é a letramento que se estão referindo os países desenvolvidos quando denunciam, como têm feito com freqüência, índices alarmantes de illiteracy (Estados Unidos, Gra-Bretanha, Austrália) ou de illetrisme (França) na população; na verdade, não estão denunciando, como se costuma crer no Brasil, um alto número de pessoas que não sabem ler e escrever (fenômeno a que nos referimos nós, brasileiros, quando denunciamos o nosso ainda alto índice de analfabetismo), mas estão denunciando um alto número de pessoas que evidenciam não viver em estado ou condição de quem sabe ler e escrever, isto é, pessoas que não incorporaram os usos da escrita, não se apropriaram plenamente das práticas sociais de leitura e de escrita: em síntese, não estão se referindo a índices de alfabetização , mas a níveis de letramento (Soares, 2004 p.22 ). (grifos no original)

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Em relação ao trabalho com a EJA, segundo o Parecer, deve-se considerar a

flexibilidade de horário e de proposta curricular que poderá atender, mediante

módulos, aliada às experiências da vida cotidiana dos/as alunos/as, além de

combinar ensino presencial e não–presencial, tendo como finalidade a busca da

alfabetização e/ou a complementação dos estudos num projeto mais amplo de

cidadania que permita inserção profissional e, com isso, a busca da melhoria das

condições de vida (BRASIL, 2000).

Chilante (2005), em sua análise, afirma que o Parecer desconsidera a

situação precária em que essa modalidade de educação é atendida, ocasionada

fundamentalmente pela falta de recursos como a não contabilização das matrículas

pelo Fundef32 (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental) e

pela inexistência de cursos para a formação de docentes específicos para EJA.

Assim, o Parecer deixa a responsabilidade de “ressituar os componentes

curriculares do ensino fundamental e médio de jovens e adultos” às escolas e aos

professores/as.

Sobre a formação docente, o Parecer CNE/CEB 11/2000 ressalta que além

da formação específica a qualquer professor/a, o/a profissional que atua na EJA

deve ter uma qualificação para trabalhar com pessoas jovens e adultas e orienta que

se deve buscar essa profissionalização através da graduação superior e da

especialização, considerando as características e os objetivos desta modalidade de

ensino e a fase à qual cada educando se encontrar (BRASIL, 2000, p. 76-77).

Torres (1996, p. 135), ao analisar as mudanças nas políticas educacionais do

Banco Mundial, aponta que este recomenda investimentos no sentido de melhorar o

32 O Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental (Fundef) foi criado pela Lei 9.424/96, e o veto do Presidente da República Fernando Henrique Cardoso, para a inclusão das matrículas de EJA no cômputo da distribuição de recursos oferecidos pela referida lei traz, para esta modalidade de ensino, grandes prejuízos. O aluno da EJA passa a ser visto, pelos gestores públicos, como despesa. O Censo Escolar feito pelo Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Anísio Teixeira) mostra que as matrículas de EJA migraram para o Ensino Fundamental Noturno, principalmente de 1998 a 2000, justamente porque assim, era possível computar essas matrículas e, portanto receber os recursos. Com a implantação do Programa Recomeço, que libera recursos para as redes públicas com matrícula comprovada em EJA, se verifica entre 2000 e 2003 um significativo aumento no número de matrículas na Fase II. Hoje o Programa Recomeço é chamado de Fazendo Escola e tem a mesma função, ou seja, dispor de recursos financeiros específicos para redes públicas com matrícula comprovada em EJA. Para saber mais, ver Censo Escolar no sítio do Inep: www.inep.gov.br

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conhecimento dos professores, “privilegiando a capacitação em serviço sobre a

formação inicial e estimulando as modalidades a distância”.

Sobre a institucionalidade da EJA, o Parecer CNE/CEB nº 11/2000 (Conselho

Nacional de Educação e da Câmara de Educação Básica, respectivamente) relata

que:

A nova formulação legal da EJA no interior da educação básica, como modalidade do ensino fundamental e sua inclusão na ótica do direito, como direito público subjetivo, é uma conquista e um avanço cuja efetivação representa um caminho no âmbito da colaboração recíproca e na necessidade de políticas integradas (BRASIL, 2000, p. 72).

Por isso, “a oferta dessa modalidade é obrigatória pelos poderes públicos, na

medida em que os jovens e adultos queiram fazer uso do seu direito público

subjetivo” (BRASIL, 2000, p. 72).

O texto do Parecer 11/2000 teoricamente contempla os aspectos legais e

históricos, desde sua estrutura em cursos e exames, às formas de atendimento

presenciais, semi-presenciais e a distância, considerando os espaços públicos e

privados, estabelecendo que a EJA deve cumprir as funções de reparação,

equalização e qualificação, conforme citado em BRASIL, 2000:

Reparação- colocar os cidadãos em condição de igualdade perante a Lei, reparando um direito não usufruído anteriormente.

Equalização – garantir condições de acesso e permanência na escola, possibilitando aos indivíduos novas inserções no mundo do trabalho, no convívio social, nos espaços da estética e na abertura de novos canais de participação.

Qualificação – é considerada equivalente à perspectiva de educação permanente, cuja tarefa é propiciar a todos/as atualização de conhecimentos por toda a vida, princípio este fundamentado no texto do Relatório Jacques Delors para a UNESCO, com base nas ações da Comissão Internacional Sobre Educação para o Século XXI publicado no Brasil em 1998.

A Função Reparadora é justificada, no Parecer 11/2000, pelo alto número de

analfabetos/as e, enquanto dívida social está atrelada à inclusão, já que o

analfabetismo é considerado uma das causas das desigualdades sociais as

instituições da sociedade civil são chamadas para reparar esta dívida. Portanto, a

idéia central dessa função é a inclusão do/a aluno/a da EJA na vida cidadã e o

acesso ao mercado de trabalho. A Câmara da Educação Básica (CEB) reconhece

que esses problemas são de ordem histórico-social, mas transfere para a escola e

para o indivíduo a responsabilidade, ou seja, a culpa é individual e não social

(CHILANTE, 2005).

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A Função Equalizadora é atribuída à EJA, para garantir às pessoas que não

tiveram acesso, e/ou por alguma razão não concluíram sua escolaridade, a

possibilidade de um novo ponto de partida para a igualdade de oportunidades. A Lei

parte do princípio de dar mais oportunidades aos que mais precisam, porém, nos

documentos sobre política educacional percebe-se um deslocamento do conceito de

igualdade para eqüidade, fato que, no contexto das políticas neoliberais, dos anos

90, corresponde à desregulamentação do direito, possibilitando diferentes

tratamentos, o que justifica a existência de desigualdades, pois, seria fruto das

escolhas pessoais e necessárias para o bom funcionamento do mercado

(CHILANTE, 2005).

A Função Qualificadora tem como empreitada levar a todos/as a atualização

de conhecimentos por toda a vida trazendo os conceitos de competência e

habilidade e associando-se ao chamado século do conhecimento, visando a

constituição de pessoas versáteis e, portanto, aptas a mudanças. Assim o/a

trabalhador/a individual é tido como desqualificado/a sendo valorizado apenas

quando seu trabalho específico fizer parte do coletivo. A idéia central aqui é de

educação permanente que recupera a teoria do capital humano na concepção

individualista, o que significa que o fato de aumentar as condições de

empregabilidade não garante lugar no mercado de trabalho.

Analisando esse documento, percebemos que a funcionalidade da EJA está,

na verdade, restrita à ação supletiva do Estado, que tem destinado poucos recursos

e transferido para a sociedade civil parte da tarefa de escolarizar jovens e

adultos/as, fato que contribui com a ilusão de democratização do poder público e

constitui-se na verdade na desobrigação do Estado perante a sociedade.

Ao nos determos na análise histórica da EJA e dos documentos que

estabelecem as políticas educacionais percebemos que estes seguem os princípios

do neoliberalismo, que orientam para a criação de novas regras e

desregulamentação econômica; privatização de empresas estatais; diminuição da

interferência do Estado em negócios privados; contenção de gastos públicos;

reforma fiscal dentre outros.

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4.5.3 Diretrizes Curriculares Nacionais: a Resolução CNE/CEB Nº 1/2000

Neste documento, abordaremos os artigos que consideramos relevantes ao

objeto de nosso trabalho, na tentativa de que estes possam iluminar a pesquisa em

seus dados colhidos da realidade, no caso as escolas da Rede Municipal de Curitiba

que ofertam a Educação de Jovens e Adultos. Portanto, nos ateremos aos aspectos

que dizem respeito ao primeiro segmento do ensino fundamental.

Assim sendo, o terceiro documento sob nossa análise, que propõe a política

nacional da EJA, é a Resolução do Conselho Nacional de Educação e Câmara de

Educação Básica, CNE e CEB respectivamente. Foi aprovado no dia 05 de julho de

2000, ficando conhecido como Resolução CNE/CEB nº 1/2000 e institui as Diretrizes

Curriculares Nacionais de acordo com as referências do Parecer 11/2000, ratificado

pelo Ministro da Educação. Essa resolução apresenta, em seus 25 artigos, as

normatizações para a EJA em todas as suas modalidades, portanto do ensino

fundamental ao ensino médio. As instituições que ofertam EJA devem

obrigatoriamente observar essas normas não só na oferta, mas na estrutura

curricular também, considerando a peculiaridade dessa modalidade de educação

(Art. 1º).

Do mesmo modo, em seu artigo 2º, essa Resolução sujeita a EJA aos artigos

4º e 5º da LDB-1996 que, respectivamente, tratam da gratuidade e do direito à

educação. Note-se aqui, que se assegura, enquanto direito, apenas o Ensino

Fundamental de 7 a 14 anos “em primeiro lugar”, atendendo posteriomente os

demais níveis e modalidades. Portanto, a EJA, conforme a Emenda Constitucional

14/96, que retirou as expressões “obrigatória e gratuita” ficou desprezada.

Nesse sentido, a Emenda 14 suprime a obrigatoriedade do poder público em

relação ao Ensino Fundamental para os que não tiveram acesso na idade adequada,

além de suprimir o compromisso de erradicar o analfabetismo no prazo de 10 anos e

de vincular recursos financeiros para esta finalidade. Essa mesma Emenda criou o

FUNDEF (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de

Valorização do Magistério), que vetou a possibilidade de contabilizar as matrículas

dos cursos de EJA. Ou seja, não era prioridade, do então Governo Federal,

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presidido por Fernando Henrique Cardoso, a alocação de recursos para essa

modalidade de ensino fundamental.

Além de inviabilizar a inclusão da demanda de educação de jovens e adultos

no financiamento da educação básica, esse veto evidencia o descaso para esta

modalidade de ensino (ZANETTI, 1998).

O documento CNE/CEB nº 1/2000, em seu artigo 2º, menciona ainda, os

artigos 37 e 38 da LDB, que abordam especificamente a EJA como descrito

anteriormente no tópico sobre a LDB, além do artigo 87, que particularmente trata do

ensino profissional em nível técnico quando este se tornar viável.

A Resolução, no artigo 5, aborda a questão curricular e o modelo pedagógico

da EJA, relatando que estes devem obedecer às diretrizes curriculares do Parecer

CNE/CEB 11/2000 e, no caso do Ensino Fundamental, o Parecer da CEB 15/98 que

guia este sistema de ensino, orienta que se façam adaptações nos programas de

EJA, segundo os critérios de eqüidade, diferença e proporcionalidade.

No Art. 6º percebemos uma tendência à flexibilização, ao permite a cada

sistema que ofertar a modalidade EJA, definir a duração e a estrutura dos cursos, e

podemos dizer privatização, fato que tem se mostrado efetivamente nas mais

variadas formas de organização como o espaço escolar e o extra-escolar, além do

público e do privado33, ou ainda, em forma de parcerias com empresas, ONG's e

sociedade civil34.

O referido artigo cita que: “cabe a cada sistema de ensino definir a estrutura e

a duração dos cursos da EJA, respeitadas as diretrizes curriculares nacionais, a

identidade desta modalidade de educação e o regime de colaboração entre os entes

federativos” (CNE/CEB nº 1/2000, Art. 6º).

Nos Art. 7º e 8º desta Resolução, determina a obrigatoriedade do ensino

fundamental de sete a quatorze anos com idade mínima para exames supletivos

33 No aspecto privado a EJA tem apresentado características de aligeiramento com propagandas de conclusão de 1º e 2º graus em 60 dias. 34 No caso da EJA, as parcerias têm sido estabelecidas com empresas, organizações não-governamentais, sindicatos, comunidades ligadas a igrejas que desenvolvam atividades de alfabetização de adultos tendo como parceiro, ou não, o Estado, o Município. A sociedade civil, pode e tem sido também vista como o cidadão que contribui com campanhas como, por exemplo: “Adote um Aluno”.

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fundamental em 15 e 18 anos completos para o ensino médio, seguindo aos

princípios estabelecidos pela LBD.

Segundo os Art. 10º e 15º, cabe ao poder público o acompanhamento do

credenciamento e da avaliação das instituições que aplicarão os exames supletivos,

porém, chama a atenção o Art. 22º da Resolução CNE/CEB n. 1/2000:

Art. 22. Os estabelecimentos poderão aferir e reconhecer, mediante avaliação, conhecimentos e habilidades obtidos em processos formativos extra-escolares, de acordo com as normas dos respectivos sistemas e no âmbito de suas competências, inclusive para a educação profissional de nível técnico obedecidas as respectivas diretrizes curriculares nacionais.

Em se tratando de EJA, esse novo elemento de que trata o artigo 22 permite

a certificação de habilidades e conhecimentos adquiridos em processos formativos

extra-escolares, via exames aplicados por instituições de ensino credenciadas e

autorizadas. Com isso, no caso do Paraná, assistiu-se a uma explosão de escolas

privadas, dada a flexibilidade permitida à EJA, nos documentos que regulamentam

essa modalidade de ensino, fato que acabou determinando um filão de mercado

educacional.

Função da EJA é caracterizada pela suplência, pois a concepção de ensino

de jovens e adultos, expressa nas normatizações, refere-se à alfabetização. Fato

que caracteriza o ensino fundamental e médio como possibilidade de adequação

idade-série, correção de fluxo e, portanto, aligeiramento de certificação.

4.5.4 O Plano Nacional de Educação: Lei 10.172/2001 e suas Considerações

sobre a Educação de Jovens e Adultos

O documento que analisamos, é o quarto de nossa lista, trata-se do Plano

Nacional de Educação (PNE), que foi aprovado como lei em janeiro de 2001, ficando

conhecido como Lei 10.172/2001. Tem como finalidade orientar as esferas Federal,

Estadual e Municipal de acordo com a Declaração Mundial de Educação para

Todos, estabelecendo as diretrizes, objetivos e metas por um período de dez anos e

enfatiza os “recursos financeiros limitados” (BRASIL, 2001, p. 35).

Antes da aprovação dessa lei, foram enviados ao Congresso Nacional dois

projetos, um da sociedade civil que ficou conhecido como o PNE da Sociedade

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Brasileira e foi articulado junto aos sindicatos, aos estudantes e instituições

acadêmicas, e consolidado no II Congresso Nacional de Educação, e, outro, do

executivo. Os projetos tramitaram no Congresso Nacional durante os anos de 1998,

1999 e 2000, sendo aprovado o projeto do executivo no dia 09 de janeiro de 2001.

O quadro de Valente e Romano (2002) compara estas duas propostas:

PNE - PROPOSTA DA SOCIEDADE PNE - PROPOSTA DO MEC

Erradicação do analfabetismo: 50% da população, em 10 anos. 100% de atendimento no Ensino Fundamental, via Ensino Supletivo presencial, em 10 anos.

Assegurar as quatro séries iniciais para 50% da população de 15 anos e mais, em 5 anos. Universalizar o atendimento dessa faixa etária, em 10 anos. Ênfase na educação a distância.

Portanto, o PNE aprovado em 2000 procurou assegurar, minimamente, as

quatro séries iniciais para 50% da população de 15 anos ou mais, em cinco anos em

detrimento da proposta de erradicação do analfabetismo de 100% da população em

10 anos e 100% de atendimento no ensino supletivo presencial em 10 anos

(BRASIL, 2001).

Com isso, o PNE enfatiza a oferta gradativa do ensino fundamental de oito

séries, mas tem como base a priorização de ações de alfabetização e para isto,

chama a sociedade civil organizada para colaborar na erradicação do analfabetismo,

afirmando que só o financiamento público não é suficiente.

Valente e Romano (2002) avaliam que o PNE mostrou-se um descaso e uma

falta de compromisso em relação à erradicação do analfabetismo ao deixar, no

governo de FHC, para o Programa de Comunidade Solidária desencadear, através

de um movimento de solidariedade, a diminuição das desigualdades regionais e os

índices de analfabetismo.

Haddad (2000), ao analisar a Proposta da Sociedade e a Proposta do

Executivo, considerou que elas não são tão diferentes na questão das metas

quantitativas e do montante de financiamento. No entanto, nos objetivos da proposta

do Executivo as metas são restritas à alfabetização e ao Ensino Fundamental de 1ª

a 4ª séries, além de enfatizarem a educação a distância, os prazos foram dilatados

em metas longas que neutralizaram as possibilidades de avanços.

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Em seu capítulo específico sobre a EJA, o PNE aponta a existência de 16

milhões de analfabetos no Brasil, revelando uma “profunda desigualdade regional”

na oferta de educação para as pessoas analfabetas ou que não concluíram sua

escolarização. Estes se concentram nas regiões mais pobres do país e nas faixas

etárias mais avançadas. Mesmo com universalização do ensino básico, não é

somente uma questão regional, porque há, conforme o parecer, uma “reposição dos

estoques de analfabetos”, assim, para reduzir o analfabetismo é necessário,

segundo esse documento, “agir ativamente tanto sobre o estoque existente quanto

sobre as futuras gerações” (BRASIL, 2001, p.70 – 71).

OPNE requer “um esforço nacional, com entre a União, os Estados e o

Distrito Federal, os Municípios e a sociedade organizada” (BRASIL, 2001, p.74).

Ao estabelecer as diretrizes para a EJA, o PNE (Plano Nacional de Educação)

expressa que são levadas em consideração as “profundas transformações que vêm

ocorrendo em escala mundial” em relação ao “avanço científico e tecnológico” e o

“fenômeno da globalização” que tem influenciado e determinado a “reorganização do

mundo do trabalho” (BRASIL, 2001 p. 73).

A educação, segundo o documento em questão, já não é restrita a um período

da vida das pessoas, agora ela é vista como concepção ampliada de “educação ao

longo da vida35”.

Nesse sentido, em suas diretrizes essa lei cita que:

... há de se iniciar com a alfabetização. Mas, não basta saber ler e escrever. Para inserir a população no exercício pleno da cidadania, melhorar sua qualidade de vida e de fruição do tempo livre, e ampliar suas oportunidades no mercado de trabalho, a educação de jovens e adultos deve compreender no mínimo, a oferta de uma formação equivalente às oito séries iniciais do ensino fundamental (BRASIL 2001, p.73).

Para atender a esse direito público subjetivo da Educação de Jovens e

Adultos, e assim, cumprir o artigo 208 da Constituição que prevê como direito a

oferta gratuita do ensino fundamental, pelo Estado, a todas as pessoas que não

35 Esse conceito de educação ao longo da vida e de educação permanente está presente no documento-base da Conferência Mundial de Educação para Todos e no Relatório Jacques Delors para a UNESCO o qual cita que: Uma educação permanente, realmente dirigida às necessidades das sociedades modernas não pode continuar a definir-se em relação a um período particular da vida _ educação de adultos, por oposição à dos jovens, por exemplo, _ ou a uma finalidade demasiado circunscrita _ a formação profissional, distinta da formação geral. Doravante, temos de aprender durante toda a vida e uns saberes penetram e enriquecem os outros (p. 89).

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tiveram acesso na idade apropriada, o PNE, salienta que os sistemas responsáveis

pela EJA devem considerar a possibilidade de “conceder incentivo financeiro” às

experiências que obtêm êxito, como bolsas de estudo. “Por isso, compete aos

poderes públicos disponibilizar os recursos para atender a essa educação” (BRASIL,

2001, p.73).

Ao mesmo tempo em que o PNE afirma ser responsabilidade do poder

público o financiamento da EJA no ensino fundamental, no parágrafo seguinte, o

documento afirma que:

Para atender a essa clientela, numerosa e heterogênea no que se refere a interesses e competências adquiridas na prática social, há que se diversificar os programas. Neste sentido, é fundamental a participação solidária de toda a comunidade, com o envolvimento da sociedade civil, diretamente envolvidas na temática (BRASIL, 2001, p.73), (grifo nosso).

Convoca-se a sociedade para dar conta do atendimento, pois segundo esse

documento os recursos públicos não são suficientes para garantir a erradicação do

analfabetismo.

Então, o que observamos em relação ao Plano Nacional de Educação, nos

objetivos e metas número 1, 2, 3, 4, 5 e 8, em anexo, é a prioridade na alfabetização

para a EJA buscando associar essa modalidade de ensino às parcerias entre

governo e sociedade civil.

Temos, então, um novo direcionamento com estes quatro documentos

evidenciando aonde chega a política do “Estado Mínimo”36 no Brasil para área a

social, tendo este processo um forte impacto na formulação de políticas públicas

para a educação, em especial a educação de jovens e adultos que funcionava, até

então, como um sistema de ensino paralelo ao chamado Ensino Regular por causa

da falta de recursos financeiros, acabou incluída na educação básica.

Sobre a responsabilidade e, portanto, o papel do Estado, Robert Cox (Apud

IANNI, 1993, p.24) afirma:

O papel dos Estados era concebido como o de um aparato protetor das economias nacionais [...] de modo a garantir adequados níveis de emprego e bem-estar nacionais. A prioridade do Estado era o bem-estar. Nas últimas décadas, a prioridade modificou-se, no sentido de adaptar as economias nacionais às exigências da economia mundial. O Estado está se tornando uma correia de transmissão da economia mundial à economia nacional.

36 Intervenção mínima que o Estado faz sobre a economia com o objetivo de reduzir custos e deixar a economia agir livremente.

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Para HIDALGO (2004), o fenômeno da globalização e a conseqüente

necessidade de o país entrar para o mercado mundial foram acompanhados de um

processo de descentralização das políticas públicas, quando se tenta delegar para o

Estado o papel de coordenador dessas políticas, enquanto a comunidade local deve

assumir a execução buscando parcerias.

No caso da EJA, as parcerias têm acontecido com acordos entre os poderes

públicos, estaduais, federais e municipais, com empresas, sindicatos ou Ong’s,

como a Alfabetização Solidária. Isso faz com que se mantenha o caráter de

suplência, contradizendo o relato do PARECER 11/2000, que teoricamente

posiciona a EJA enquanto modalidade de ensino, portanto como direito, e não de

caráter compensatório. Estaria este fato evidenciando que o poder público está

seguindo as orientações das agências internacionais? Elas representam as

principais agências financiadoras de países em desenvolvimento e tem na

expressão de Lima Filho (2002), numa “adesão negociada”, sido articuladoras das

propostas educacionais, justamente porque atrelam a educação ao desenvolvimento

social e à garantia de estabilidade do sistema capitalista mundial.

4.6 POLÍTICA DE EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS: ONDE ESTÁ

O GÊNERO NO CONTEXTO DAS POLÍTICAS EDUCACIONAIS?

O conceito de gênero é relativamente recente no Brasil. Talvez essa possa

ser uma justificativa para a pouca evidência desse tema nos documentos legais que

propõem a política de EJA, no Brasil. Porém, as mulheres vêm mostrando, há algum

tempo, que as linhas do poder da sociedade estão estruturadas também pelo

androcentrismo.

Ainda, a ciência tem uma postura que se reflete como eminentemente

masculina, por isso observamos que os documentos que implementam a política de

EJA, a partir da década de noventa, refletem os estereótipos da sociedade

capitalista e apresentam na construção destes, os dilemas e contradições próprios

da construção do processo social. Em geral, caracterizam o processo histórico do

ser humano sem distinção de gênero, porém utilizando referências masculinas.

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Portanto, na perspectiva dos documentos oficiais que propõem as políticas

públicas para a educação de jovens e adultos, a desigualdade aparece, de forma

mais explicita, em relação à cor, raça e sexo. Para este último, os documentos dão

conta de afirmar a garantia de acesso, assegurando, ainda que teoricamente, a

igualdade.

Para ROSEMBERG (2001), há um rico acervo de dados nos Censos

Educacionais, mas a divulgação destes realizada pelo Inep/MEC, separados por

sexo é bastante precária. Essa aparente neutralidade, refletida nos documentos

analisados, precisa ser questionada e pesquisada, pois os estudos feministas e,

mais recentemente, os estudos de caráter relacional do gênero revelam que a

igualdade entre homens e mulheres não pode ser obtida apenas através da

igualdade de acesso.

ROSEMBERG (2001) ao fazer um balanço das políticas educacionais dos

anos 90, enfatiza que:

O governo brasileiro, em consonância com as organizações multilaterais e tendências hegemônicas do movimento de mulheres, interpreta que a igualdade de oportunidades no sistema educacional reduz-se aos indicadores de acesso e permanência, esquecendo-se de outras dimensões da educação que refletem, sustentam e criam desigualdades de gênero: o sistema educacional participando da formação do/a cidadão/ã; o sistema educacional como mercado de trabalho e de consumo; o sistema educacional interpondo dificuldades para o prosseguimento da escolaridade de mulheres e homens a segmentos sociais subalternos (2001, p.155).

Ressaltamos que, no Plano Nacional de Educação, o que se refere às

questões de gênero e à orientação para a implementação de políticas direcionadas à

escolarização das mulheres foi justificado no documento (BRASIL, 2001, p. 73), por

auxiliar na “diminuição do surgimento de novos analfabetos”.

Assim, o documento citado, enfatiza que:

Há milhões de trabalhadores inseridos no amplo mercado informal, ou à procura de emprego, - sobretudo as mulheres – envolvidas com tarefas domésticas. Daí a importância da associação de políticas de emprego e proteção contra o desemprego à formação de jovens e adultos, além de políticas dirigidas para as mulheres, cuja escolarização tem, ademais, um grande impacto na próxima geração, auxiliando na diminuição do surgimento de novos analfabetos (PNE/BRASIL, 2001, p.73).

Como vimos, faz-se necessário expressar que a idéia de escolarizar a mulher

não é nova e que, ganhou destaque nos anos 90, na Conferência Mundial de

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Educação para Todos em Jomtiem, na Tailândia, onde se revelou que dos 960

milhões de analfabetos no mundo, dois terços eram mulheres.

Em documentos produzidos pelo Banco Mundial, como o de 1995, chamado

Prioridades e Estratégias da Educação, aponta a educação das mulheres como

forma de aliviar a pobreza em países considerados periféricos, como o Brasil. Outro

documento que afirma a necessidade de se juntar o debate sobre educação aos

debates sobre as questões de gênero, é a Declaração de Hamburgo, de 1997.

Entretanto, se por um lado o Plano Nacional de Educação aponta como

importante as “políticas dirigidas para mulheres”, em nenhum momento ele expressa

como isto deveria acontecer; por outro lado, sugere que a responsabilidade pela

contínua “renovação dos estoques de analfabetos” é da mulher.

Ao concluir a análise sobre os documentos que implementam as políticas

públicas para a educação de jovens e adultos na década de 90, observamos que há

a interferência das agências internacionais de financiamento, orientando para as

questões de gênero, o que é justificado como condição de acesso a melhores

condições de vida, portanto, de “aliviamento da pobreza”.

Tem-se testemunhado, segundo Mayo (2004), a disseminação de um

discurso hegemônico na educação de adultos, essencialmente técnico-racional que

enfoca primariamente aquilo que “funciona”. Essa mesma ideologia neoliberal tem

fundamentado também, a legislação educacional brasileira, refletindo uma

preocupação com o mercado e o fornecimento de uma mão de obra “flexível” e

“adaptável”. Essa força de trabalho deve desenvolver, portanto a capacidade de

aprender e reaprender, para ser uma categoria empregável numa época de

globalização intensa, quando os capitais financeiros ignoram as fronteiras.

Gramsci, citado por Mayo (2004), refere-se à educação e à educação de

adultos como a chave contra a hegemonia e justamente aí se encontra o desafio de

empreender estratégias para uma educação de adultos que transforme a sociedade

e reflita um compromisso muito mais amplo, a prática da educação transformadora.

Portanto, o nosso país, em relação às legislações, à sociedade em geral e em

especial, à educação de jovens e adultos, tem muito a aprender de sua interlocução

e convivência com instâncias das organizações e movimentos populares e com os

métodos desenvolvidos pela educação popular, delineados pelas diversas entidades

que atuam nesse meio: movimentos de mulheres, movimentos ecológicos,

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movimentos em prol da moradia popular, movimentos étnicos, movimentos

partidários e sindicais, movimentos que discutem as questões de gênero,

movimentos que defendem as liberdades e preferências sexuais, dentre outros

(Ireland, 2004, p.44), (grifos nosso).

As considerações a que se chega com essa análise, é a de que as políticas

educacionais no Brasil, e no caso específico da EJA, precisam ser mais estudadas.

Isto, necessariamente, deve ocorrer num contexto multidisciplinar para que haja uma

cadência entre as pesquisas. Somente dessa forma, a nosso ver, todas as ciências

e, com isso, as áreas de pesquisa, e fundamentalmente, os alunos e alunas seriam

contemplados em suas necessidades.

Rosemberg, (2001), no balanço que faz sobre as políticas educacionais nos

anos 90 revela que:

O que existe é um profundo desconhecimento sobre a situação de homens e mulheres e sobre as dinâmicas do masculino e do feminino no sistema educacional além de equívocos de interpretação compartilhados, infelizmente, por correntes progressistas e conservadoras, por exemplo, por tendências do Movimento de Mulheres e pelo Banco Mundial (ROSEMBERG, 2001, p.196).

Ao percorrer a história da EJA no Brasil, procurando articular os

acontecimentos nacionais e internacionais mais relevantes ao foco desta pesquisa,

com a intenção de compreender, no sistema educacional, as políticas públicas para

esta modalidade de ensino, mais especificamente no que diz respeito às questões

de gênero, tudo indica urgência e necessidade de um aprofundamento teórico sobre

a reforma educacional da década de 90 que leve em consideração a questão de

gênero pois o que existe, na expressão de Rosemberg (2001), “é um profundo

descompasso entre a situação de homens e mulheres”.

No próximo capítulo foram abordados os resultados alcançados pela pesquisa

de campo.

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5 O GÊNERO NO CONTEXTO ESCOLAR DA EDUCAÇÃO DE JOVENS E

ADULTOS EM CURITIBA: RESULTADOS DA PESQUISA DE CAMPO

Neste capítulo apresentamos a caracterização do universo pesquisado e os

resultados quantitativos e qualitativos da pesquisa de campo, ou as “pérolas” às

quais nos referimos anteriormente, ou seja, os dados sistematizados e analisados

numa abordagem interpretativa que priorizou o aspecto qualitativo, mediante a

sistematização e as análises feitas a partir dos dados quantitativos e dos dados

obtidos nas entrevistas semi-estruturadas, com base nas categorias de maior

significância para os objetivos propostos.

5.1 CARACTERIZANDO O UNIVERSO PESQUISADO

Na rede municipal de Curitiba, existem atualmente, 167 escolas que atendem

o Ensino Fundamental Básico, destas 118, ofertam a EJA e estão distribuídas nos

Núcleos Regionais, respectivamente: BAIRRO NOVO, BOA VISTA, BOQUEIRÃO,

CAJURU, PINHEIRINHO, PORTÃO, SANTA FELICIDADE, MATRIZ e CIC, este

último, recentemente criado. Estes núcleos compõem uma estrutura descentralizada

da Prefeitura Municipal de Curitiba nas nove Administrações Regionais37, que

também são conhecidas como Ruas da Cidadania38. Dessas nove Administrações

Regionais, Bairro Novo e Boa Vista são administradas por mulheres.

No mapa pode-se observar a delimitação de cada Regional e os desenhos

caricaturados das Regionais mostram em que local da cidade estão localizadas.

37 Administrações Regionais são espécies de subprefeituras, encarregadas dos bairros de cada uma das nove regiões em que Curitiba está administrativamente subdividida. “As Administrações Regionais identificam e estabelecem prioridades; promovem formas e métodos de execução de projetos comunitários; desenvolvem o planejamento local de modo compatível com as condições e a legislação vigente, de forma a instrumentalizar as ações concretas definidas pela municipalidade; promovem a interligação do planejamento local ao planejamento da cidade como um todo. Acompanham, de maneira integrada, as ações das secretarias municipais dentro de suas áreas-limites, e participam da organização de seus serviços. Apresentam alternativas de obras e serviços que satisfaçam as perspectivas da administração e da população. Fornecem à comunidade informações e atendimentos, dentro dos limites de sua competência, ou os encaminham aos órgãos competentes” (Informações disponíveis em www.curitiba.pr.gov.br acessado em 16 de nov. 2006). 38 A Rua da Cidadania é o símbolo da descentralização administrativa. É ponto de referência e encontro para o usuário dos serviços públicos municipais, no âmbito regional, atendendo às necessidades e aos direitos do cidadão no comércio, no lazer e nos serviços. Seus núcleos oferecem serviços nas esferas municipal, estadual e federal.

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FIGURA 1 - MAPA DA CIDADE DE CURITIBA COM A DISTRIBUÍÇÃO DOS NOVE NÚCLEOS

REGIONAIS DA EDUCAÇÃO DE CURITIBA NAS RUAS DA CIDADANIA

FONTE: Disponível em <http//www.curitiba.pr.gov.br/educação> Acesso em: 10 jul. 2006.

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Os Núcleos Regionais da Educação estão alocados nas Ruas da Cidadania

que seguem um mesmo padrão de estrutura física que é o caso dos núcleos do

Bairro Novo, Pinheirinho, Boqueirão, Portão, Santa Felicidade e Boa Vista como se

percebe nas fotos.

FIGURA 2 - REGIONAL BAIRRO NOVO

FONTE: Disponível em <http//www.curitiba.pr.gov.br/educação> Acesso em: 10 jul. 2006.

FIGURA 3 - REGIONAL PINHEIRINHO

FONTE: Disponível em <http//www.curitiba.pr.gov.br/educação> Acesso em: 10 jul. 2006.

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FIGURA 4 - REGIONAL FAZENDINHA/PORTÃO

FONTE: Disponível em <http//www.curitiba.pr.gov.br/educação> Acesso em: 10 jul. 2006.

FIGURA 5 - REGIONAL CARMO/BOQUEIRÃO

FONTE: Disponível em <http//www.curitiba.pr.gov.br/educação> Acesso em: 10 jul. 2006.

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FIGURA 6 - REGIONAL SANTA FELICIDADE

FONTE: Disponível em <http//www.curitiba.pr.gov.br/educação> Acesso em: 10 jul. 2006.

FIGURA 7 - REGIONAL BOA VISTA

FONTE: Disponível em <http//www.curitiba.pr.gov.br/educação> Acesso em: 10 jul. 2006.

As Regionais do CIC, Matriz e Cajuru onde se encontram os outros três

Núcleos Regionais de Educação têm uma estrutura física diferente dos demais como

se percebe nas próximas imagens:

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FIGURA 8 - REGIONAL CIC (Cidade Industrial de Curitiba)

FONTE: Disponível em <http//www.curitiba.pr.gov.br/educação> Acesso em: 10 jul. 2006.

FIGURA 9 - REGIONAL CAJURU

FONTE: Disponível em <http//www.curitiba.pr.gov.br/educação> Acesso em: 10 jul. 2006.

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FIGURA 10 - REGIONAL MATRIZ

FONTE: Disponível em <http//www.curitiba.pr.gov.br/educação> Acesso em: 10 jul. 2006.

Estas são todas as Regionais de Curitiba, onde fizemos a coleta de dados

quantitativos referente às matrículas dos/as alunos/as da EJA, e as entrevistas semi-

estruturadas com as pessoas que coordenam, especificamente, a Educação de

Jovens e Adultos em cada Núcleo da Educação descentralizado nas regionais, ou

Ruas da Cidadania como são conhecidas na cidade, com exceção da Matriz, que

não atende o ensino supletivo para a EJA. Todavia, oferta à comunidade a

Educação Permanente.

5.1.1 Os Aspectos Quantitativos e Qualitativos

Como o objetivo principal de nossa pesquisa era caracterizar a Educação de

Jovens e Adultos nas escolas municipais, sob a perspectiva dos/as protagonistas do

processo educacional, frente às questões de gênero e tecnologia, num primeiro

momento, nossos dados referem-se às matrículas da EJA, numa abordagem

quantitativa.

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Assim os dados que foram coletados nos oito Núcleos Regionais de Curitiba,

organizados no quadro 3 revelam as matrículas dos/as alunos/as da Educação de

Jovens e Adultos desagregados por gênero e por Núcleo Regional, no primeiro

segmento do Ensino Fundamental Supletivo de Curitiba.

QUADRO 3 - MATRÍCULA POR SEXO NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS DO MUNICÍPIO DE CURITIBA FASE I E FASE II

NÚCLEOS REGIONAIS

Fase I mulheres

Fase I Homens

Fase II Mulheres

Fase II homens

Total por Núcleo

Regional

BAIRRO NOVO 452 217 278 408 1355

BOA VISTA 370 178 548

BOQUEIRÃO 548 233 781

CAJURU 306 165 113 165 749

CIC 550 225 139 195 1109

PINHEIRINHO 632 385 1017

PORTÃO 230 133 125 178 666

SANTA FELICIDADE 271 133 404

TOTAL 3359 1669 655 946 6629

Fonte: Dados resultados de pesquisa nos NREs (Núcleos Regionais de Educação). Março a julho/

2006.

Se compararmos o quadro 3 com o quadro 2, apresentado no quarto capítulo,

onde temos o total de matrículas em agosto de 2005, sem estarem separados por

sexo observa-se uma diferença numérica em relação ao total de alunos

matriculados. Isto porque nem todas as escolas tinham, até o momento do

fechamento desta pesquisa, realizado o cadastro dos alunos e alunas junto ao

Censo Escolar do MEC.

Mesmo assim o quadro 3 nos permitiu caracterizar os alunos e as alunas da

Educação de Jovens e Adultos, atendidos/as pelo município de Curitiba numa

abordagem de gênero.

Confirmamos, com base nos dados coletados, que o público atendido pela

Educação de Jovens e Adultos, da Secretaria Municipal de Educação de Curitiba na

Fase I, ou seja, de 1ª a 4ª série é majoritariamente feminino.

O Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas (Inep/MEC), 2005 e autoras

como Hirata (2005) e Rosemberg (2001), vêm apontando, em outros níveis e

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modalidades de ensino que as taxas de escolarização são mais altas na população

feminina. Nossos dados indicam que na Educação de Jovens e Adultos em Curitiba

isso também vem acontecendo.

Considerando a Fase I e a Fase II temos, nos oito núcleos regionais, um total

de 6.629 alunos matriculados, sendo 4.024 mulheres e 2.615 homens.

Outro fato que observamos neste quadro, refere-se aos dados da Fase II, nos

quatro Núcleos Regionais, portanto em quatro escolas, que ofertam a EJA de 5ª a 8ª

séries. Esses dados expressam uma inversão, comparativamente à Fase I, com

relação ao gênero. Buscamos junto aos Núcleos e às escolas conhecer a razão

dessa inversão.

Em visitas às escolas e em conversas informais com professores/as,

alunos/as percebemos e confirmamos, como já haviam adiantado as coordenadoras

regionais da EJA de cada um dos núcleos, que o fato de na fase II ter mais homens

que mulheres matriculadas/os justifica-se na medida em que a partir da 5ª série há

um expressivo número de adolescentes e jovens do sexo masculino, com

defasagem em relação à idade-série (uma futura pesquisa poderia esclarecer por

que este fato tem atingido mais os homens que as mulheres nessa faixa etária).

Esses são, geralmente, alunos oriundos das escolas regulares onde tiveram

reprovações e desistências, motivadas também pela indisciplina, como foi declarado

pelas coordenadoras “os alunos que o regular não dá conta... porque são

indisciplinados, ou porque têm dificuldades de aprendizagem e conseqüentemente

são retidos, assim que tem idade para o supletivo, vem pra EJA”.

Outro fator que devemos considerar é que nas quatro escolas municipais que

apresentam esses dados e que ofertam EJA na fase II, (terceiro e quarto períodos

que correspondem a 5ª e 6ª séries e o quinto e sexto períodos que respectivamente

equivalem a 7ª e 8ª séries) o tempo mínimo para conclusão é de dois anos.

Diferente dos PACS (Posto Avançado do Centro Supletivo), atualmente chamados

de APED (Ações Pedagógicas Descentralizadas), que permitiam o término em

pouco mais de um ano.

Além disso, há o fator idade onde as escolas municipais, orientadas pela

Secretaria Municipal de Educação, interpretam a legislação da forma mais flexível,

como já foi descrito no capítulo três desta pesquisa, onde abordamos as políticas

públicas para a EJA. Assim sendo permitem que o aluno com 15 anos faça o

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supletivo, procedimento diferente da SEED (Secretaria Estadual de Educação) que

tem orientado as escolas do Estado e os APEDS (Ações Pedagógicas

Descentralizadas) que funcionam em prédios municipais, a efetivarem matrículas de

alunos maiores de 18 anos para essa modalidade. A SEED passou a orientar dessa

forma as matrículas em EJA porque houve uma expressiva migração de

adolescentes e jovens do ensino regular para o supletivo, causando uma

significativa evasão no ensino regular e em contrapartida uma superlotação do

ensino supletivo.

Com isso a procura pelo supletivo municipal por jovens na faixa de 15, 16

anos é maior. Assim, ao que tudo indica, o fato de ter mais alunos que alunas nestas

escolas pode estar diretamente relacionado à interpretação que as instâncias

Municipais e Estaduais estão dando à lei.

Ainda que esta possa ser uma justificativa, faz-se necessário uma

investigação mais profunda, pois, inevitavelmente esses dados geram

questionamentos. Além disso, o fato de nestas escolas as mulheres não

continuarem estudando também é um dado a ser pesquisado com maior

profundidade, pois o que a nossa observação detectou e o que os professores/as,

em conversas informais nestes estabelecimentos nos revelaram, apontam que as

mulheres, nestes estabelecimentos não continuam a EJA porque:

1. As turmas têm muitos jovens entre 15 e 18 anos fato que para a aluna

adulta seria local de muita conversa, ou seja, são, segundo os/as

professores/as, turmas mais barulhentas;

2. Para algumas mulheres ao chegarem à 4ª série seu objetivo foi cumprido;

3. Outras, ao terminarem a 4ª série optam por uma escola que tenha o

APED, sistema de parceria do Estado com o Município, pois em geral

estes têm um grande número de alunos/as já considerados adultos.

4. Há ainda as que optam pelo sistema APED porque a duração do curso,

em média é um ano e meio e a do município é de dois anos.

Para melhor analisar a Fase I, vamos separar os dados:

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QUADRO 4 - MATRÍCULA POR SEXO NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS DO MUNICÍPIO DE CURITIBA – FASE I

NÚCLEOS REGIONAIS

Fase I

mulheres

Fase I

homens

Total de mulheres e homens por Núcleo

Regional

BAIRRO NOVO 452 217 669

BOA VISTA 370 178 548

BOQUEIRÃO 548 233 781

CAJURU 306 165 471

CIC 550 225 775

PINHEIRINHO 632 385 1017

PORTÃO 230 133 363

SANTA FELICIDADE 271 133 404

TOTAL 3359 1669 5028

FONTE: Dados resultados de pesquisa nos NREs (Núcleos Regionais de Educação). Mar. a

Jul./2006.

Analisando o quadro 4 temos na Fase I um total de 5.028 alunos/as

matriculados/as nos oito Núcleos Regionais sendo 3.359 mulheres e 1.669 homens.

Em percentuais o público feminino matriculado é de 67% e o público masculino

matriculado é de 33%, ou seja, de cada 10 alunos/as matriculados/as na fase I da

EJA em Curitiba, aproximadamente, 7 são mulheres e 3 são homens.

Considerando os dados que nos foram disponibilizados, o Núcleo do

Pinheirinho era o que tinha o maior número de homens e mulheres de

matriculados/as e o Núcleo do Portão era o tinha o menor número de mulheres e

homens matriculados/as. O Núcleo de Santa Felicidade aparece empatado com o

núcleo do Portão em relação ao número de homens matriculados.

O quadro 5 evidencia os Núcleos Regionais com maior número de mulheres

matriculadas.

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QUADRO 5 – NÚMERO DE MULHERES MATRICULADAS POR NÚCLEO REGIONAL NA FASE I

Classificação NÚCLEOS REGIONAIS Número de mulheres

matriculadas

1º PINHEIRINHO 632

2º CIC 550

3º BOQUEIRÃO 548

4º BAIRRO NOVO 452

5º BOA VISTA 370

6º CAJURU 306

7º SANTA FELICIDADE 271

8º PORTÃO 230

TOTAL 3359

FONTE: Dados resultados de pesquisa nos NREs (Núcleos Regionais de Educação). Mar a jul/ 2006.

O quadro 6 evidencia os Núcleos Regionais com maior número de homens

matriculados.

QUADRO 6 – NÚMERO DE HOMENS MATRICULADOS POR NÚCLEO REGIONAL NA FASE I

Classificação NÚCLEOS REGIONAIS Número de homens

matriculados

1º PINHEIRINHO 385

2º BOQUEIRÃO 233

3º CIC 225

4º BAIRRO NOVO 217

5º BOA VISTA 178

6º CAJURU 165

7º PORTÃO 133

8º SANTA FELICIDADE 133

TOTAL 1669

FONTE: Dados resultados de pesquisa nos NREs (Núcleos Regionais de Educação). Mar a jul/ 2006.

Os quadros 5 e 6 estão organizados em ordem de classificação, quanto ao

número de matrículas. Como é possível perceber, analisando esses dois quadros,

temos em todos os Núcleos Regionais um número menor de homens matriculados.

Ao que tudo indica devemos considerar que o fato de estar matriculado pode

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não refletir em freqüência efetiva às aulas, ou seja, o que a pesquisa revelou foi o

fato de que é comum ao sexo masculino matricular-se na escola, pedir uma

declaração de matrícula e evadir-se. É provável que isso deve estar ocorrendo em

função de uma exigência do mercado de trabalho como se evidencia nesta fala “tem

uns que só esperam pegá a declaração de que tão estudando, pra firma depois

desaparecem”.

Nas escolas que estivemos pesquisando, os dados de alunos do sexo

masculino matriculados, quando relacionados à freqüência escolar são menores

sendo bastante comum, em relação à lista de chamada, comentários de

professores/as como este: “esse só se matriculou”.

5.2 O CONTEXTO DA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS EM CENA:

CARACTERIZANDO OS/AS ENTREVISTADOS/AS

A partir deste momento apresentamos a caracterização dos sujeitos que

foram entrevistados para esta pesquisa. Deste modo, iniciamos com a

caracterização das coordenadoras de EJA, depois com a do/as professor/as e em

seguida a dos alunos e alunas. A caracterização é importante para a pesquisa

porque permite traçar um perfil a partir dos dados pessoais dos/as entrevistados/as,

além de conhecer as diferentes instâncias da EJA no município.

5.2.1 Caracterização das Coordenadoras da Educação de Jovens e Adultos

Neste item buscamos traçar o perfil das coordenadoras da Educação de

Jovens e Adultos nos oito Núcleos Regionais de Educação do Município de Curitiba

em que estivemos pesquisando.

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QUADRO 7 – DADOS DAS COORDENADORAS DA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS NOS

NÚCLEOS REGIONAIS

Coordenadora Sexo Formação em nível superior

Pós-graduação

Experiência na EJA

Número de escolas

que atende

Jornada de Trabalho Semanal

01 F Administração Sim 15 anos 17 40 horas

02 F Pedagogia Sim 15 anos 09 40 horas

03 F Teologia Sim 15 anos 18 40 horas

04 F Pedagogia Sim 6 anos 18 40 horas

05 F Pedagogia Sim 4 anos 12 40 horas

06 F Geografia Sim 5 meses 20 40 horas

07 F Letras Sim 1 anos 18 40 horas

08 F Pedagogia Em curso 3 anos 12 40 horas

FONTE: Dados resultados de pesquisa nos NREs (Núcleos Regionais de Educação) Mar a jul/2206.

As coordenações da Educação de Jovens e Adultos nos oito Núcleos

Regionais são exercidas por mulheres. Todas possuem nível superior e, a maioria

tem, também, especialização. São profissionais com um considerável tempo de

experiência em EJA exceto duas com menos de seis meses de experiência na

coordenação da EJA, mas com experiência no Ensino Fundamental.

Cada coordenadora de EJA, nos Núcleos Regionais é responsável pelas

escolas do seu núcleo que oferecem à comunidade essa modalidade de ensino.

Dessa forma, está sob suas orientações um avultado número de escolas. A

coordenadora que atende o menor número de escolas tem 09 e a que atende o

maior número tem 20 escolas. Uma observação importante a fazer refere-se

justamente ao grande número de escolas que cada coordenadora tem para

acompanhar sozinha.

Semanalmente todas cumprem uma jornada de 40 horas de trabalho na Rede

Municipal de Educação, em dois períodos em geral, são feitas visitas às escolas que

ofertam EJA e que pertencem ao núcleo regional sob sua coordenação. Na escola,

sua função é dar apoio administrativo em relação à legislação e à documentação

escolar, além de suporte pedagógico, já que no turno da noite raramente se dispõe

de um pedagogo para esta função.

Percebemos que a grande preocupação manifestada pelas entrevistadas está

voltada ao suporte pedagógico que atenda as professoras para o trabalho com os

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alunos especiais. Todas relatam que existem em todas as escolas alunos/as de

inclusão (portadores de necessidades especiais) e são categóricas ao afirmarem

que em média tem-se, pelo menos, 10% de alunos/as com algum tipo de deficiência

como: surdo-mudo, Síndrome de Down, paralisia cerebral, esquizofrenia, deficiência

mental leve dentre outras, que mereceriam um acompanhamento também da área

da saúde, além de profissionais preparados para atender essa demanda.

Todas foram enfáticas ao se referirem ao público presente nas escolas, “é

visível que o número de mulheres é maior que o de homens”, e atribuíram este fato

às mudanças sociais, “hoje a mulher está mais consciente, já não é tão submissa”.

Destacaram ainda que atualmente na EJA têm-se basicamente três perfis de

mulheres: “as vovós que querem aprender a ler a Bíblia, as que tiveram filhos cedo e

agora estão cuidando de si, e as mais novas que vêm em busca do estudo para o

trabalho”.

Faz-se necessário esclarecer que estas entrevistas foram importantes porque

foi através delas que conhecemos os outros núcleos regionais com suas

peculiaridades, pois conhecíamos apenas o Núcleo Bairro Novo por trabalharmos na

região há 16 anos. Os demais núcleos foram as preciosas informações das

coordenadoras e sua inúmeras indicações que nos permitiram selecionar com maior

clareza as escolas para a realização da pesquisa.

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5.2.2 Caracterização do/as Professor/as da Educação de Jovens e Adultos

Neste item caracterizamos o perfil do professor e das professoras que atuam

na Educação de Jovens e Adultos e que foram entrevistados/as para esta pesquisa.

QUADRO 8 – DADOS DO PROFESSOR E DAS PROFESSORAS ENTREVISTADOS DA

EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS

Professor

Sexo Formação Tempo de Atuação em

EJA

Jornada de Trabalho Semanal

01 F Magistério 11 anos 40 horas

02 M Magistério; Normal Superior e Especialização em Ensino Especial

05 meses 40 horas

03 F Magistério e Magistério Superior 09 anos 40 horas

04 F Normal Superior e Especialização em Inclusão

06 anos 40 horas

05 F Pedagogia Orientação Educacional e Administração Escolar

09 anos 40 horas

06 F Pedagogia e Especialização em Metodologia do Ensino

10 anos 60 horas

FONTE: Dados resultados de pesquisa de campo em escolas municipais. Mar a jul/2006.

Já vimos que praticamente a totalidade do/as professor/as entrevistado/as, da

Rede Municipal de Educação que atuam com a EJA, são do sexo feminino. Durante

fase da coleta de dados nos Núcleos Regionais de Educação descobrimos que na

EJA atuavam dois professores do sexo masculino, portanto fizemos questão de

entrevistar um destes profissionais, a fim de contemplar a visão de um profissional

da educação do sexo masculino além de cinco do sexo feminino.

Do total de 6 entrevistados/as, uma tem o magistério em nível médio, 5

possuem nível superior, destes, 3 fizeram pós-graduação em nível de

especialização. A maioria atua na Educação de Jovens e Adultos há mais de seis

anos, exceto o profissional do sexo masculino que está há cinco meses trabalhando

com EJA, embora tenha 15 anos de prática com educação, além de experiência com

educação especial.

Praticamente a totalidade das professoras entrevistadas tem padrão na EJA e

são integrantes do Quadro Próprio do Magistério. Apenas uma professora e o

professor pertencem ao RIT (Regime Integral de Trabalho), ou seja, têm um padrão

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na Rede Municipal de Educação durante o dia e à noite, fazem o RIT. Podemos

dizer que o RIT seria uma espécie de hora extra, sem os adicionais financeiros

dessa modalidade. A diferença básica é que o professor/a padrão tem assegurado o

direito de trabalhar no período noturno e o RIT, como é um contrato de trabalho

temporário, não oferece essa segurança, ou seja, se diminuir o número de alunos/as

o professor/a perde o trabalho.

Outra característica destes entrevistados é que todos/as têm uma jornada de

trabalho semanal de 40 horas, exceto uma delas que possui 60 horas.

Considerando as características histórico-culturais da nossa sociedade e a

predominância do gênero feminino no magistério, não podemos deixar de observar

que pesquisadoras como CARVALHO (1999); LOURO (2001) e HIRATA (2003);

informam que a mulher ainda tem, estrategicamente, buscado profissões

principalmente nas áreas de educação e saúde, que basicamente envolvem a

questão do cuidado. No caso das nossas entrevistadas, além da profissão de

professora, elas são: mães, esposas e donas de casa.

Uma consideração importante em relação ao quadro de dados do/as

professor/as se faz necessária, pois neste estão identificados pelo sexo e a partir

desse momento passaremos a utilizar, quando necessário, a letra P seguida de

número que não seguirá a ordem numérica descrita no quadro para preservar suas

identidades como foi acordado com todos/as os/as professores/as entrevistados/as.

5.2.2 Caracterização dos Alunos e Alunas entrevistados/as

A seguir nos quadros 9 e 10 respectivamente, estaremos demonstrando os

resultados colhidos na pesquisa de campo durante as entrevistas. Nesse sentido, o

quadro 9 contém os dados dos alunos entrevistados e o quadro 10 os dados das

alunas entrevistadas.

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120

QUADRO 9 - DADOS DOS ALUNOS ENTREVISTADOS

EJA trabalho Nasceu em

Id

ade

Cu

riti

ba

Inte

rio

r d

o P

R

Ou

tro

Est

ado

qu

anto

s an

os

está

em

Ctb

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Cas

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Qu

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Pes

soas

qu

e m

ora

m n

a ca

sa

1º P

erío

do

*

2º P

erío

do

*

Atividade Profissional

Fo

rmal

info

rmal

Renda do aluno

01 19 x 12 S - Própria H/M 03 x Serve o Exército (garçom)

x 1 sal.

02 30 x 25 C - Cedida H 02 X Manutenção de Piscina

x 2 sal.

03 31 x 16 C - Invasão H/M 02 X Construção Civil x 2,25 h.

04 32 x 15 C 01 Alugada 300,00

H/M

04 x Mestre de Obras (Autônomo)

x

05 34 x 10 C 03 Própria H 05 x Motorista x 650,00

06 41 x 18 C 03 Cedida H/M 05 x Encanador x 600,00

07 51 x 10 C 03 Própria H 02 X Plantador de mudas de Flor (CEASA)

x 1 sal.

08 57 x 32 C 01 Própria H/M 02 x Aposentado e - Confeiteiro

x 3 sal.

FONTE: Dados resultados de pesquisa de campo em escolas municipais os alunos entrevistados LEGENDA: * 1º Período equivale a 1ª e 2ª séries e 2º Período equivale a 3ª e 4ª séries do Ens. Fund. Supletivo. * 1 Salário Mínimo equivale a R$ 350,00.

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QUADRO 10 - DADOS DAS ALUNAS ENTREVISTADAS

EJA Trabalho Nasceu em

Alu

na

Idad

e

Cu

riti

ba

Inte

rio

r d

o P

R

Ou

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Casa

Su

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íod

o *

2º P

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do

*

Atividade Profissional

F

orm

al

Info

rmal

Rendada

aluna

01 25 x - S 01 Própria M 03 X Diarista x 40,00d

02 28 x 03 C 03 alugada 180,00

H 05 X Desempregada

03 29 x 10 C 02 invasão H 04 X Dona de casa x

04 30 x 16 C 01 própria H/M 03 x Doméstica x 500,00

05 32 x 20 S 01 própria M 03 x cuida de crianças x 1 sal.

06 34 x 15 A* 02 própria H/M 03 X Diarista x 45,00d.

07 35 x 03 C 02 alugada 80,00

M 04 X Diarista x 35,00d

08 38 x 31 C 04 alugada 220,00

H/M 04 X Diarista x 45,00d

09 43 x 20 D 05 invasão H/M 04 x Confecção-costura x 550,00

10 44 x 24 C 01 cohab H 03 X Desempregada

11 45 x - C 02 própria M 02 x Doméstica x 430,00

12 50 x 40 D 04 própria M 01 X Dona de salão x 4 sal.

13 55 x 03 V* 04 alugada 400,00

H/M 06 x Dona de casa Pensionista

x 2 sal.

14 58 x 50 C 03 própria H 03 X Dona de casa x

15 60 x - C 01 própria H/M 03 X Aposentada e revendedora

x

16 68 x 46 C 09 própria H 07 x Dona de casa FONTE: Dados resultados de pesquisa de campo em escolas municipais com as alunas entrevistadas. LEGENDA: A* aluna declarou-se amigada; V* aluna declarou-se viúva; * 1º Período equivale a 1ª e 2ª séries e 2º Período equivale a 3ª e 4ª séries do Ensino

Fundamental Supletivo;

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122

A caracterização dos/as entrevistados/as é importante para a pesquisa

porque permite traçar um perfil a partir de seus dados pessoais e assim conhecer a

que universo cultural e sócio-econômico os alunos e as alunas desta modalidade de

ensino pertencem, tendo em vista que estamos trabalhando com uma parcela da

população que historicamente esteve excluída do processo educacional.

Destacamos, que a pesquisa desconsiderou os alunos na faixa etária de 14 a

18 anos, pois não são objetos da pesquisa, uma vez que são, segundo a indicação

de professores/as, pedagogos/as, vice-diretores/as e coordenadoras de núcleos

regionais, alunos/as egressos. São, portanto, oriundos de Classe Especial de

escolas municipais, de escolas especiais como a Helena Antipoff e, por vezes

Hospitais Dia39 ou ainda alunos/alunas que foram retidos pela escola regular, em

geral, considerados geradores/as de indisciplina que ao completarem 14 anos são

encaminhados à EJA.

A partir dos resultados da primeira parte do roteiro de entrevistas, elaboramos

os quadros 9 e 10, e podemos dizer que a maioria do grupo de alunos é proveniente

do interior do Estado do Paraná. No caso das alunas 3 são Curitibanas, 6 são do

interior do Estado do Paraná e 7 são de outros Estados, porém, há que se

considerar que a grande maioria está em Curitiba há mais de 10 anos.

A faixa-etária dos homens entrevistados esteve entre 19 e 57 anos, estes têm

uma média de 36 anos de idade. A faixa etária das mulheres entrevistadas esteve

entre 25 e 68 anos, sendo que a média de idade é de 42 anos, a quase totalidade

dos/as nossos/as entrevistados/as é, ou considera-se casada/o, uma aluna se

identificou como amigada, outra como viúva, apenas um aluno e duas alunas são

solteiros, fato que pode ser considerado uma característica da maioria dos

estudantes brasileiros, nesta modalidade de ensino. Nesse contexto é pertinente

lembrar que a indicação casado ou solteiro nem sempre revela a situação legal do/a

entrevistado/a.

Do grupo de mulheres todas afirmam ter filhos e do grupo de homens três

entre os oito entrevistados, afirmaram não ter filhos. Estas informações confirmam

uma tendência nacional nas quais as nossas entrevistas se enquadram, ou seja, na

39 Hospital dia, segundo um aluno, em conversa informal é onde a pessoa permanece durante o dia e a noite é liberada com o compromisso de retornar no dia seguinte. Ao que tudo indica é um hospital psiquiátrico. É importante destacar que este fato foi confirmado pelas professoras.

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123

maioria dos casos, são as mulheres que assumem a responsabilidade pelos seus

filhos. Isso é relacionado à mulher em diversos períodos da história e segundo

Carvalho (1999) esse cuidado garantiria a presença de um adulto do sexo feminino

dedicada, amorosa e responsável pelo desenvolvimento da criança. O que fica

evidente nesta fala: “Não tenho filho... como diz...né... tenho e num tenho... é que a

criança mora cá mãe notro lugar” (Elias, 31)40.

Outra característica destes 24 entrevistados/as que também faz parte da

realidade da grande maioria dos brasileiros refere-se à moradia. Dos 24

entrevistados/as cinco moram em casa alugada e pagam entre 80,00 e 400,00 reais

por mês. Dois moram em casas cedidas por parentes, uma tem a casa pelo

programa da COHAB (Companhia de Habitação), três moram em área de invasão e

pouco mais de metade, treze, tem casa própria. Nem sempre a afirmação casa

própria significa uma situação legalizada do imóvel, em alguns casos “casa própria”

significa ocupação urbana ou, como popularmente é conhecida, área de invasão.

Nas entrevistas com os homens, chamou-nos a atenção o fato de que a

maioria tem certa dificuldade de expressão, em geral demoram mais tempo para

responder à mesma questão que foi feita para as mulheres.

Outro fato que nos chamou a atenção durante a pesquisa, está relacionado à

forma de se expressar dos/as alunos/as entrevistados/as: notamos que os/as

alunos/as de Santa Felicidade apresentaram um repertório de vocabulário maior,

talvez pela convivência com o nível sócio-econômico-cultural do bairro, considerado

o centro gastronômico de Curitiba e, portanto, um bairro turístico.

Foi realizado com alunas o dobro de entrevistas, tendo em vista que o público

atendido pela EJA é majoritariamente feminino. Assim, dentre o total de 24

entrevistas 16 são de mulheres e 08 são de homens. Este fato pode ser observado

nos quadros 9 e 10, onde os dados de matrículas por sexo são revelados e

confirmados pelas observações feitas por nós, enquanto pesquisadora e, pelo relato

dos/as próprios/as alunos/as nas entrevistas semi-estruturadas que serão aqui

apresentadas e analisadas.

Em relação à situação econômica de sustento da família, das 24

entrevistadas/os, 11 afirmaram que têm a participação de homens e mulheres, oito

40 É importante observar que os nomes dos alunos são fictícios para preservar suas identidades, assim como o nome de suas referidas escolas não estarão disponíveis nesse texto.

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são exercidas por homens e cinco por mulheres. Se, por um lado, isso demonstra,

que há um certo equilíbrio na manutenção das despesas da casa com mulheres e

homens colaborando para o sustento da família, por outro lado, aponta para a

necessidade cada vez mais presente do trabalho da mulher na esfera pública, como

fonte de renda para a sobrevivência da família.

Faz-se necessário considerar que essa aparente divisão no trabalho na esfera

pública, onde ambos contribuem para o sustento da família, não vem acompanhado

da divisão das tarefas domésticas na esfera privada, fato constatado também por

(Hoffmann, 2005) e por (Hirata, 2005) como “trabalho invisível”.

Outro fato, que notoriamente, os dados dos quadros 9 e 10 expõem nesta

modalidade de ensino, refere-se a um número significativo de trabalhadores/as no

setor informal: dos/as 24 entrevistados/as apenas 07 tem carteira assinada. Destes,

5 são homens e 2 são mulheres. São estes/as que gozam de algum direito

trabalhista como: férias, décimo terceiro salário, FGTS, enfim, benefícios sociais.

Estão no setor informal 12, dos/as 24 entrevistadas/os, ou seja, 50% atuam

no mercado de trabalho informal. Confirma-se, portanto, em relação ao Brasil, que

praticamente mais da metade da população trabalhadora tem uma relação informal

de trabalho (HIRATA, 2003).

De um total de 16 mulheres entrevistadas, 11 exercem atividade remunerada

e destas, 9 estão no mercado informal. Uma entrevistada é pensionista e 3 são

donas de casa. Esses dados exemplificam o que Hirata aponta:

O trabalho informal das mulheres tem se caracterizado em países como o Brasil, mas ocorre também em países do continente africano. Na introdução ampliada para o mercado de dotes e habilidades anteriormente exercidas no âmbito do trabalho doméstico, gratuito, realizado por amor, como por exemplo, costurar para fora, confecção de doces e salgados, trabalho doméstico remunerado, venda direta nas casas e na rua de produtos confeccionados por si mesma ou por indústria de cosméticos ou de confecção. Elas fazem o trabalho sem se beneficiar de nenhuma proteção social e sem estar associadas a nenhum programa de formação profissional. São trabalhos exercidos a partir do cabedal de conhecimentos acumulados no exercício da atividade doméstica e, por vezes, em cursos realizados individualmente como, por exemplo, o curso de corte e costura (HIRATA, 2003, p. 164).

O que nossas entrevistas revelaram é que trabalho informal pode não

significar acesso a direitos trabalhistas reconhecidos, porém não necessariamente

significa menores salários. As mulheres, que são a grande maioria na EJA, e

também a maioria no trabalho informal têm, por exemplo, salários maiores que os

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homens que entrevistamos. A Maria Aparecida, 34 anos, que trabalha como diarista,

sem registro em carteira de trabalho ganha R$ 45,00 por dia mais o vale transporte,

numa jornada de trabalho que pode durar entre 7 e 10 horas de trabalho diário. Elias

31 anos, que trabalha como terceirizado na construção civil, com registro em carteira

de trabalho, ganha R$ 2,25 a hora o que dá um total de R$ 18,00 por uma jornada

de oito horas diárias de trabalho.

Para Schienbinger (2001) o problema é que a sociedade tende a ver os

conhecimentos femininos como inferiores aos masculinos.

Ainda, em relação ao trabalho informal mesmo que todos/as os/as

entrevistados/as reconheçam a importância da carteira de trabalho assinada como

garantia aos direitos trabalhistas e à aposentadoria, no caso das mulheres,

observamos que há uma preferência pela informalidade, na medida em que esta

representa ganhos reais maiores. Veja o que diz a aluna: “o registrado deles, pra

mim, não dá!... Eles pagam muito poco. Então... Eu prefiro não sê registrada. Porque

daí eu ganho 35,00 por dia mais o vale transporte” (Érica, 35 anos).

Este exemplo expressa o que Antunes (1995, p. 44), apontou como

“tendência extremamente significativa dada pela subproletarização do trabalho,

presente nas formas de trabalho precário, parcial, temporário, subcontratado,

“terceirizado”, vinculados à economia informal”.

No grupo de entrevistados/as temos também uma mulher e um homem

aposentada/o que continuam trabalhando no setor informal. Este fato parece

confirmar também uma tendência nacional, na qual o povo brasileiro deste perfil

econômico, ainda que se aposente precisa continuar trabalhando para sobreviver.

A atividade profissional dos/as entrevistados/as encaixa-se no que a literatura

contemporânea tem chamado de trabalho precário e de prestação de serviços.

Dos/as 24 entrevistados/as, 17 exercem atividade remunerada, sendo 7 homens e

10 mulheres.

Os homens apresentam atividades profissionais mais diversificadas como:

garçom, manutenção de piscina, motorista, trabalhadores da construção civil e

confeiteiro. Já as mulheres, na grande maioria, exercem atividades de trabalho

doméstico, de diarista, considerados de pouco ou nenhum valor simbólico. Há,

ainda, uma entrevistada que tem um salão de beleza, uma aposentada que vende

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produtos de beleza e duas costureiras, sendo que uma delas pediu demissão para

cuidar da filha de dez meses.

Assim, reafirma-se a dramaticidade do trabalho da mulher, pois ainda que

remunerado, elas são em grande número empregadas domésticas e diaristas, que

são ocupações tradicionalmente femininas, as quais, segundo Hirata (2005), não

recebem “valorização e reconhecimento”. Este fenômeno é perceptível também na

fala de nossas entrevistadas: “[...] trabalho como diarista então é apurado e é um

serviço pesado porque cada casa que a gente vai... é limpeza de faxina né..., todo

mundo dexa o grosso pra diarista, então é bem corrido, não é mole não... e ninguém

dá valor” (Mª Aparecida, 38).

Ainda sob a ótica do emprego, nessa modalidade de ensino e particularmente

no caso das nossas entrevistadas são as mulheres que menos conseguem trabalho

na produção e segundo Hirata (2003) as pesquisas mostram que isso ocorre tanto

no Brasil quanto na França. Esta autora cita ainda que:

Dados sobre os menos empregáveis na produção hoje têm apontado de maneira bastante convergente, para as mulheres. Isto é, as populações com dificuldade de inserção ou com dificuldade de receber uma formação profissional adequada são os adultos, mulheres idosas de baixa escolaridade, ou mulheres jovens ou mulheres não qualificadas. Quando se trata de mulheres não qualificadas – jovens ou idosas – elas acumulam dificuldades. Pelo fato de serem mulheres jovens e pelo fato de não terem qualificação, há uma série de réplicas. Eu diria que, se trabalhássemos mais centralmente com a questão de raça, se elas fossem negras, por exemplo, elas teriam mais dificuldade de inserção, e mais dificuldade ainda de reinserção, no mercado de trabalho. [...] Quando conseguem uma situação de emprego tem mais possibilidade de entrar num trabalho precário (HIRATA, 2003, p. 158). O mercado de trabalho, aparentemente, define determinadas funções como

mais femininas. Assim, os postos de trabalho ocupados pelas mulheres estão, em

grande parte, relacionados às atividades antes desempenhadas no interior do

domicílio, tais como serviços pessoais, educação, alimentação e saúde, que estão

diretamente ligadas aos serviços domésticos, como empregadas mensalistas e

diaristas. Essa última atividade perpassa principalmente as mulheres que estão na

EJA e têm, portanto baixos níveis de escolaridade.

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5.3 CONHECENDO A REALIDADE DE GÊNERO NA EDUCAÇÃO DE

JOVENS E ADULTOS DE CURITIBA

Neste item apresentamos as percepções dos/as alunos/as da EJA. Em um

primeiro momento evitamos fazer comentários sobre as opiniões, motivos e

percepções que alunos e alunas expressaram. Dessa forma, trazemos ao leitor/a a

concepção mais próxima possível de como os/as entrevistados/as se manifestaram,

para isso utilizamos em vários momentos, trechos de suas falas a fim de transmitir, o

mais fielmente possível, as expressões utilizadas durante as entrevistas. Esta

metodologia aplicada aos resultados da pesquisa é, particularmente importante na

pesquisa qualitativa, porque muitas vezes os/as entrevistados/as dizem muito mais o

que pensam nas expressões verbais, nas entrelinhas e, no nosso caso, nos silêncios

do que propriamente em respostas a perguntas formais.

As categorias que emergiram das entrevistas e, portanto, foram retiradas para

a organização da descrição e interpretações de seus resultados foram as seguintes:

a) A diferença de gênero dos motivos para se matricular na EJA;

a1- Motivos que levaram os homens para a escola;

a2- Motivos que levaram as mulheres para a escola;

b) Pertinência da Educação de Jovens e Adultos para a vida de homens e

mulheres;

c) As percepções de gênero na escola ou a percepção de si e do outro;

c1 - As percepções das alunas sobre as mulheres e os homens;

c2 - As percepções dos alunos sobre os homens e as mulheres;

c3 - As percepções dos alunos e alunas sobre o/as professor/as

c4 –As percepções do/as professor/as sobre os alunos e as alunas;

d) Impactos da aprendizagem escolar para o trabalho de homens e mulheres:

o que é aprendido na Educação de Jovens e Adultos faz diferença no

cotidiano do trabalho?

e) As percepções dos/as protagonistas desta pesquisa sobre tecnologia;

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5.3.1 Motivos para se Matricular na Escola: A Diferença de Gênero.

Se a modernização traz implicações para os trabalhadores em geral, como

exigências de experiência, domínio de diferentes linguagens, qualificação constante,

e níveis de escolarização mais elevados, para os trabalhadores adultos, com baixa

escolaridade e pouca ou nenhuma qualificação e, mais particularmente, para as

mulheres nesta condição, as implicações são, ainda, maiores.

Na busca de desvelar o que leva homens e mulheres adultos/as, a retornar à

escola no nível de educação básica e as possíveis articulações com a tecnologia

presentes em seu cotidiano, passamos a apresentar os dados revelados pela

pesquisa realizada com discentes e docentes de Escolas Municipais.

5.3.1.1 Motivos que levaram os homens para a escola

De acordo com os/as entrevistados/as a maioria teve algum contato com o

ambiente escolar quando criança. No caso dos discentes do sexo masculino, nas

seis escolas e, portanto, em seis diferentes regiões da cidade de Curitiba, os

homens se matriculam na EJA, incentivados e literalmente, levados por suas

mulheres, como ficou evidente na fala do aluno Valcir, 32: “a minha mulher inventô

de estudá... E daí eu tinha que vim trazê ela aqui e depois buscá então resolvi ficá e

estudá também. É, essa mulherada tá tomando conta...”.

O aluno Elias, 31 anos, nos conta que mesmo com a insistência de sua

mulher, que já tem o 2º grau, para que voltasse a estudar e tendo feito até a

matrícula dele na escola, ele demorou muito para entrar na EJA:

a minha esposa né, feiz a matrícula e... por ela, eu já tava estudando a uns três ano atrais. Má daí eu meio com vergonha... de entrá e estudá, não vinha pra aula... Daí, um dia, de tanto passá na frente do colégio... eu firmei né... e voltei a estudá. A minha esposa, ela terminô os estudo dela... num sei como é que chama direito, mais eu sei que ela terminô o 2º grau... má ela feiz quando era moça. E daí... ela fica forçando a gente pra vim pra escola... e a família também né...então... como diz... fazê o que né?... aí a gente vem... (Elias, 31)

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No caso dos entrevistados homens, suas mulheres não só têm mais

escolaridade que eles, como de alguma forma estão exercendo, a seu modo, uma

forma de pressão para que seus companheiros voltem a estudar.

Vejamos o que Noel, 41 fala sobre sua volta à escola:

Foi a minha esposa sabe... ela imbestoô de querê estudá... assim.... daí... ela voltou a estudá... daí eu achei que eu também podia aprendê um poco... melhorá um poquinho né... porque, ela já tá lá na frente, i eu, tô ficando pra trais (Noel, 41).

Os relatos acima, expressam que os alunos homens estão voltando à escola,

num primeiro momento, incentivados ou podemos dizer literalmente “empurrados”

por suas mulheres, seja porque elas resolveram estudar e, eles estão se sentindo

obrigados a acompanhá-las, seja, porque, como os relatos indicam, eles estejam

ficando em posição de inferioridade em relação a elas.

Conforme já discutido no primeiro capítulo inúmeras pesquisas tem apontado,

segundo o INEP e o IBGE (2005), que as mulheres estão estudando mais do que os

homens e elevando na média nacional o tempo de escolarização, inclusive este fato

vem colaborando para a diminuição do analfabetismo entre as mulheres.

Outros motivos aparecem nas entrevistas dos alunos homens e são também

causa de estarem na escola. Um deles é a necessidade de se alfabetizarem para

entender e aproveitar das condições que um indivíduo alfabetizado deve e pode sem

constrangimentos usufruir deste conhecimento, ainda que seja para saber que

ônibus usar, ler a Bíblia ou nas palavras de Ailton (51 anos) “um remédio que a

gente vai vê se precisa, duma receita tudo... Como é que vai sabê se num sabe lê?

Então, por isso que eu vô estuda até que eu pudé porque cê veja... agora pra mim

saí na cidade já leio um poço né, já me viro sozinho”.

A tecnologia também aparece como um dos motivos que fez os alunos

homens voltarem à escola, o aluno Valcir, 32 anos relata que além de ter voltado a

estudar por causa da esposa também precisa ler melhor para entender a tecnologia

da construção civil.

Preciso lê melhor pra entendê a tecnologia da construção civil porque... a tecnologia me obrigô quase, entende?... A voltá pra escola... Se quiser competi, tem que tê istudo”. A tecnologia tá tomando conta de tudo, na construção civil então... Nossa! O modo tradicional praticamente acabô, sabe?... De você trabalhá igual antigamente... Hoje em dia tem máquina pra tudo e jamais você vai consegui fazê um curso pra operá um tipo de máquina se não tivé

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istudo. Lá na construção civil a tecnologia tem facilitado muita coisa, então pra quem qué continuá trabalhando e ganhando um poco melhor... e a gente que é home precisa trabalhá, porque a família precisa comê, tem que voltá a istudá, se não... Você não tem chance não!... No mínino..., no mínimo você tem que tê aí o 1º grau completo. Isso pra sê chamado de burro pelos outros. As coisas só tendem a evolui cada vez mais e, a gente sabe que tá aí num mundo tomado pela tecnologia (Valcir, 32).

A fala acima mostra que as exigências do trabalho estão envoltas com a

tecnologia e que sem o domínio da leitura e da escrita, atualmente, existem poucas

ou nenhuma possibilidade de inserção no mundo do trabalho. Trabalho que continua

sendo a evidência do processo de produção e reprodução da existência humana.

Mais do que isso “o trabalho define a essência humana. Portanto, o homem, para

continuar existindo, precisa continuar produzindo sua própria existência através do

trabalho” (SAVIANI, 1994, p. 148).

Como vimos nos capítulos 1 e 3 desta dissertação de fato as novas

tecnologias exigem novos conhecimentos e habilidades. Requisitam um trabalhador

polivalente com um pensamento mais abstrato e isso tem um impacto significativo

na forma de organização da atividade econômica da sociedade que passa a exigir

constante requalificação. Nesse sentido, a educação via escola parece ser o

caminho para cumprir tais exigências. E a escola vista como improdutiva passa a ser

potencializadora do saber como força produtiva (IBID, 1994).

Entre os motivos que fizeram os alunos que entrevistamos, voltar a estudar

está o conhecimento como forma de defesa de seus direitos. O aluno Claudinei, 30

anos diz:

Nesse mundo você tem que tê estudo para poder dialogar com as pessoas né, ou você não consegue conversá com as pessoas, daí você vai expor um pensamento fica totalmente... (longo silêncio) aí, não tem condições, se você não tiver estudo você vai ser massacrado. Se você tivê estudo já é massacrado, principalmente no Brasil. No Brasil, se você não tiver estudo você é um zero a esquerda. Você sendo formado já não vale nada pro governo, se não tivé estudo então é considerado um lixo humano. Eu queria tê um estudo assim suficiente pra mim podê se defende, pra mim podê dialogá, fazê e lutá por algum direito meu, que existem muitos mas ninguém, num consegue lutar por nenhum hoje (Claudinei, 30).

Esta fala nos mostra que o aumento do patamar de cultura através do

conhecimento que a escola pode oferecer é visto pelos alunos como poder ou

empoderamento para o diálogo e para a luta pelos direitos do ser humano.

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Dentre os diferentes motivos apontados para não terem estudado antes, dos

oito homens entrevistados, um afirma que mesmo estando na 4ª série, com 19 anos,

sempre estudou. Outro aluno que tem 30 anos revelou que deixou a escola depois

de: “4 anos de 1ª série... até que um dia... passei pra 2ª, voltei pra 1ª depois de dois

anos e... Sabe uma locura... então quando eu parei fui trabalhá...”

Estes relatos indicam que em alguns casos o Ensino Fundamental regular

destinado às crianças não tem cumprido o papel de alfabetizar seus alunos, ou pelos

menos, não o tem feito dentro do tempo estimado. Essa pode ser uma das

justificativas para programas e projetos como a aceleração de estudos, ou

adequação idade/série e ainda, outros como se tem agora de não retenção na 1ª

etapa do ciclo I41

A questão do trabalho também aparece como motivo para o abandono da

escola. Contraditoriamente, o mesmo mercado de trabalho que exige escolaridade

do trabalhador não permite que este estude, como é evidenciado nesta fala:

“comecei a EJA, daí eu parei... porque a firma que eu tava era longe i eles num dexa

a gente saí mais cedo. Eles qué gente istudada má num qué que istude né”

(Agnaldo, 34).

Outros entrevistados disseram que quando eram crianças moravam no sítio e

a escola ficava longe, depois de adultos não tiveram interesse em ir para a escola.

Isso fica evidente nestas falas:

Quando era criança morava longe da iscola né... no interior, depois quando vim pra cá..., já faiz... mais de dezesseis ano, daí num tive vontade (Elias, 31).

[...] morava num sítio vim pra cá com doze ô treze ano, achava que num precisava di estudo... já pudia tá formado (Noel, 41).

A falta de estrutura da família é apontada por outro aluno como motivo para o

abandono dos estudos quando criança “eu parei na 3ª ou 4ª série, tinha deis prá

onze ano. Daí nunca mais voltei pra uma escola. Que o meu pai e a minha mãe se

separaram e a nossa vida virô uma bagunça”.

41 O Ensino Fundamental que antes era conhecido como sendo de 1ª a 4ª séries, hoje é chamado de Ciclo e, portanto, temos o Ciclo I com a 1ª e a 2ª etapas e Ciclo II com a 3ª e 4ª etapas que respectivamente correspondem ao que conhecíamos como 1ª a 4ª séries. No ciclo não pode haver retenção na 1ª e na 3ª etapas, o que freqüentemente é associado à promoção automática.

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Há alunos que relatam, como motivo por terem deixado a escola o

desinteresse e ou a indisciplina “eu não gostava da iscola... era um piá levado,

brigava com tudo mundo” (Arnaldo, 34).

As entrevistas realizadas com os homens revelam diferentes motivos para

terem abandonado a escola. Seu retorno ocorre, num primeiro momento, com a

clareza de saber que precisam voltar a estudar, ainda que, seja porque suas

mulheres estão adiante deles na escolarização, ou porque, de alguma forma, estão

pressionando para que eles voltem a estudar e num segundo momento porque a

escola, ainda que com suas infinitas limitações, atualmente empodera os sujeitos de

alguns conhecimentos exigidos para que o ser humano possa estar e sentir-se

inserido socialmente. Mais do que isso, revelam que o trabalho evidencia no

processo de produção e reprodução a existência humana e que com as

características que este trabalho assume na sociedade globalizada a tecnologia

passou a ser também uma exigência social nas mais variadas dimensões que esse

termo pode ser compreendido.

5.3.1.2 Motivos que levaram as mulheres para a escola

As mulheres entrevistadas estão voltando para escola em busca de novos

horizontes. Elas voltam motivadas pela vontade de fazer cursos técnicos e ter ou

mudar de profissão. Como expressa essa aluna “tô cansada... de trabalhá que nem

uma loca... e num tê ganho com isso... Quero continuá estudando e fazê o curso de

radiologista, e pra isso... tem que ter o 1º grau, porque é um curso técnico”

(Aparecida, 34).

O primeiro motivo para voltar à escola, apontado por muitas entrevistadas é

fazer a carteira de habilitação de motorista, inclusive nos relatos aparecem três que

já possuem carro e uma que está pagando consórcio do seu automóvel. Apenas

uma entrevistada já dirige e tem habilitação e seu maior sonho é ter um carro, para

levar o neto deficiente passear. Mas, ela relata que o marido a lembra ironicamente

o tempo todo para que não se preocupe, porque quando ela morrer irá dirigindo para

o cemitério, pois ele se encarregará de colocar a sua carteira de motorista em cima

do caixão.

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Enquanto os homens entrevistados voltaram a estudar incentivados por suas

companheiras, no caso das mulheres entrevistadas acontece o inverso, ou seja,

enquanto eram solteiras era o pai que não permitia que estudassem depois de

casadas muitos maridos também não permitiram, além de terem os filhos pequenos

para cuidarem.

Em poucas palavras Maria de Lurdes, 43; Mª Luiza, 29; Aparecida, 34; Rita,

32; respectivamente resumem o fato de não terem estudado antes:

Meu pai, ele achava que mulher não precisava estudar, na cabeça dele era assim... o pessoal do norte é tudo assim pros meus irmão ele deu istudo, pra nois mulher não e agora isso faiz falta pra gente. O pai dizia que mulher estudada é bicho perigoso... Que mulher tinha que sabê o serviço da casa. Depois tive minha filha... Daí num estudei mais mesmo. [...] Ele achava que trabalhá, dava mais futuro istudá era coisa de muher que num tem o que fazé. [...] meu marido sempre dizia que mulher já casa de branco pra combiná com a cozinha e só serve pra esquentá a barriga no fogão e esfriá no tanque... Agora que tô sozinha, ninguém me segura, vô fazê até a faculdade.

Então, a maioria das mulheres que estão, hoje, na EJA, na verdade,

precisaram de um tempo maior para acertar, digamos, as coisas da vida. Como por

exemplo, precisaram esperar os filhos crescerem e conquistar uma certa

independência em relação aos maridos.

Ainda que, no quadro dos dados das alunas a maioria se identifique como

casada o que percebemos nas entrevistas é que a grande maioria está separada

e/ou tem novos companheiros.

Nesse sentido, vale ressaltar o que o/as docente/s P142, P3 e P5 apontam

em suas entrevistas:

Hoje elas vêm pra escola é que... na verdade a maior dificuldade delas eram os maridos e a maioria delas já está separada. [...] Elas se emanciparam, tiveram que entrá no mercado de trabalho quando se separaram ganharam a emancipação.

42 Como foi entrevistado apenas um professor do sexo masculino optamos por preservar as identidades dos docentes por isso a partir desse momento nos reportaremos a eles com a letra maiúscula P seguida de número.

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[...] As casadas, relatam que os maridos reclamam muuuuito. Que têm ciúmes ... ainda tem mulher que desiste por isso. Elas relatam que tem que fazer a janta, lavá a louça e ficá lá servindo o marido.

As que ainda estão casadas com o primeiro marido são as mais pressionadas

a abandonar os estudos. Vejamos o relato das alunas (Izabel, 58; Érica, 35; Maria,

38 e Palmira, 68) respectivamente:

A minha família é contra o estudo. Ele, diz que quem é burro tem que morrê burro. [...] por eles, eu ficava em casa pra fazê a janta. Tem dia que ele num qué dexá eu vim. Má daí ... Eu me imburro... e pego, e venho e pronto. Ele é contra eu estudá, mais eu tenho o apoio dos meus filhos...Esse pequeno sempre vem comigo. [...] o meu marido me enche muito o saco... E eu venho estudá na marra. Eu falei pra ele esses dia: se ocê me enchê muito o saco eu vô dá parte de você na poliça. (riso) Que eu quero istudá pelo meno um poquinho e você não qué dexá. E eu tenho esse direito, porque eu sô uma cidadã igual as otras pessoa. Então eu tô fazendo os meus estudos na marra. Porque ele não qué que eu estude de jeito nenhum. Ele diz que eu fico saindo de noite feito mulé de rua.

Em pleno século XXI, a fala das nossas entrevistadas revela que, a

“dominação masculina” continua presente e que a divisão sexual das tarefas

domésticas ainda não acontece em alguns lares brasileiros. Mesmo “comprando”

uma briga por dia estas mulheres têm resistido e continuam estudando. Mais do que

isso, demonstram ter conhecimento de que estudar é um direito conferido também

às cidadãs e que, portanto legalmente, elas não só têm este direito como percebem

na EJA, uma oportunidade única de recuperarem parte do tempo perdido para

conquistar novos espaços no ambiente público. Seja em relação ao trabalho, seja

em relação à satisfação de realizar seus sonhos pessoais, que sempre estiveram em

segundo plano em função de uma cultura de servir ao marido e cuidar dos filhos.

Mary Wollstonecraft citada por Boron (2001, p. 69) sobre os direitos da mulher

argumentava que: “a inferiorização da mulher era uma construção social, produto da

dependência e passividade que a dominação patriarcal lhe havia inculcado durante

séculos”.

Dessa forma, estruturado ainda numa cultura de dominação masculina,

herança do patriarcalismo, este cenário nos mostra que socialmente as mulheres

são vítimas de dois tipos de injustiça: a social e a econômica. Isso basicamente, se

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reflete na idade das mulheres que retomam agora seus estudos na EJA. Vimos que

em geral estão na meia idade, pois antes disso elas se ocuparam dos maridos e

filhos pequenos e na maioria dos casos de nossas entrevistadas ainda em trabalhos

informais colaborando para o sustento ou sustentando sozinhas a família.

Diferente dos homens entrevistados, as mulheres demonstraram que sabem

onde querem chegar, ou em que esse estudo vai ajudá-las. Todas têm definido onde

pretendem chegar com seus estudos, a grande maioria quer, além de fazer a

carteira de motorista, continuar os estudos para fazer cursos profissionalizantes

como: radiologista, chefe de cozinha, corte e costura, jornalismo, auxiliar de

enfermagem. É possível perceber que as aspirações do gênero feminino, quase

sempre, estão envoltas com a questão do cuidado e para Louro (2001, p.104) “o

trabalho fora do lar, para elas, tem de ser construído de forma que se aproxime das

atividades femininas em casa e de modo a não perturbar essas atividades”.

Essas mulheres percebem a importância do estudo para o mundo do trabalho

e mais do que isso, sabem que a formação para o trabalho ocorre através da

formação profissional. No entanto, Ireland (2004); Machado; Costa Ireland (2005)

apontam que:

Uma das inquietações presentes na construção da EJA, enquanto política pública tem sido a necessidade de responder a um grande vácuo existente nas propostas curriculares, no que tange ao distanciamento entre essas e o mundo do trabalho. Embora no Plano Nacional de Educação (PNE) e na LDB (Lei 9394/96), esteja explícita a necessidade de vinculação do ensino fundamental para jovens e adultos à formação para o trabalho, isso não tem ocorrido na prática. No máximo o que se observa são práticas aligeiradas de treinamento profissional, às vezes, vinculadas à elevação de escolaridade ( p. 97). (grifo nosso).

Assim, podemos dizer que as mulheres estabelecem metas de chegada a

longo prazo e fazem o possível e o impossível para conseguir atingi-las e que os

homens pensam mais a curto prazo ou no imediato. O/as professor/as: P1, P2, P4 e

P5 também confirmam essa conclusão como podemos observar nos próximos

relatos:

[...] os homens eles querem algo mais pra melhorar, basicamente, no que eles já estão e as mulheres, me parece... que elas querem mudar a sua condição de vida, querem mudar de emprego, por exemplo, querem mais... [...] as mulheres estão lá na frente... e querem um outro tipo de emprego. Eles querem melhorar aonde eles estão, sabe assim... sem muita perspectiva.

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O homem é mais prático ele vem buscá o diploma. A mulher, ela busca auto-estima, autonomia, independência porque elas querem fazer cursos profissionalizantes... mas se for vê elas são as que continuam, aqui no APED, a maioria também é mulher, então elas vão mais atrais dos seus objetivos lá na frente. Elas têm um objetivo que querem alcançar, a maioria trabalha fora de casa, também, além de estudar. Eles também têm objetivos, mas eles desistem mais fácil não têm aquela força, aquela garra da mulher e, elas, mesmo as de mais idade tem sempre um objetivo, do porque estão estudando às vezes o trabalho, porque elas tão cansada de trabalha de diarista de serviços de limpeza. Elas tão buscando uma melhoria e mudança no tipo de trabalho... querem mais... As que têm mais idade é aquela questão de ler a Bíblia. [...] Agora tanto o homem quanto a mulher eles não querem mais ficar discriminados pela sociedade, eles tão buscando a integração, aquela coisa de saber mesmo.

A fala do/das professor/as nos permite justificar com maior clareza a

afirmação que fizemos anteriormente de que as mulheres estão buscando na escola

uma forma de adquirir conhecimentos básicos de letramento para se qualificar em

cursos profissionalizantes.

Ao que tudo indica essa busca por cursos profissionalizantes, por parte das

mulheres, se deve ao fato de que estas estiveram à margem do trabalho na esfera

pública porque sua esfera de produção sempre foi privada, ou seja, dos serviços

domésticos e do cuidado.

Especialmente para a mulher pobre envolta em uma moralidade oficial, que

destoava de sua realidade e assegurava que esta devia ser resguardada em casa,

ocupando-se dos afazeres domésticos, enquanto os homens garantiam o sustento

da família trabalhando no espaço da rua. Esse estereótipo serviu durante muito

tempo como instrumento ideológico para distinguir as burguesas e as pobres

(PRIORE, 2004). Historicamente a mulher pobre sempre trabalhou e no predomínio

de suas atividades estiveram presentes a questão do cuidado com a casa e com os

filhos.

Os homens ocuparam a esfera pública e com isso uma diversidade maior de

funções em seus trabalhos, ainda que no caso dos nossos entrevistados isto

aconteça em sub-empregos, eles têm tido uma possibilidade maior de trabalho

formal pelo simples fato de serem do sexo masculino.

Dessa forma, os objetivos das mulheres estão envoltos na busca da

profissionalização, pois até então seus trabalhos, em função da falta de qualificação,

estão no setor de serviços, na maioria dos casos, trabalhos doméstico e informal.

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Dentre os motivos apontados para retornar à escola apareceu também a

tecnologia como podemos observar nestas falas:

Quando você perguntou se isso ajudô eu decidi voltar pra escola... Olha eu acho que ajudô porque tem que aprendê, né... pra gente saber das coisas. Eu já perdi trabalho porque não sei lidar com o computador. Porque a gente vê que as pessoas que estudam mexem com essas coisas com mais facilidade. E mexendo com o computador sabem tudo! Diferente de mim... Que quando sentei pela primeira vez na frente do computador fiquei nervosa. Mas depois comecei, a professora ensina alí... Foi que é uma beleza! Agora... Tem coisa, que eu ainda não gravei, mas é assim né? A gente vai devagar. Devagarinho vai entrando tudo na cabeça (Zeigela, 29 anos).

[...] a tecnologia também faz a gente voltar a estudar porque hoje em dia tá tudo mudado, né? Você tem computador... vai no banco tem as máquinas, tudo elétrica... tudo coisa... (Silêncio). Então tem que aprende um poco mais pra acompanhar senão você fica muito lá atrás. Por que veja... antes você chegava no banco ia no caixa e recebia lá. Hoje... você tem que ir no caixa eletônico que é tudo mais complicado. Então, se você não tem assim uma certa orientação, não consegue. E aqui na escola a gente tem aula de informática e isso já ajuda né... Por que daí a gente fica mais esperta né, e não passa vergonha (Anadir, 60 anos).

Conforme as falas das alunas Zeigela e Anadir, a tecnologia pode ser vista

como uma exigência que a sociedade tem feito continuamente. A informática, por

exemplo, facilitou algumas coisas mas ao mesmo tempo aumentou as diferenças

sociais e pelo que a fala da aluna Zeigela indica quem não souber utilizar um

computador estará perdendo oportunidades de trabalho. E, existe, uma tendência de

que isso ocorra com os/as mais pobres e menos escolarizados/as. Temos falado

muito em analfabetos/as, mas o analfabetismo digital é uma realidade cada vez mais

presente.

5.3.1.3 A pertinência da Educação de Jovens e Adultos para a vida de

homens e mulheres

No atual contexto da globalização onde as relações sócio-econômicas e

culturais passam a exigir o domínio de vários saberes a Educação de Jovens e

Adultos adquire um nível de importância mais do que especial para os/as alunos/as

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que aprenderam a ler depois de adultos. Alguns relatos nos permitem compreender

a dimensão do significado atribuído à aquisição da leitura.

Eu tô muito feliz porque eu já posso descobrir as coisas com a leitura e é muito legal. Quando eu não sabia lê, você não faiz idéia do desespero que era quando a minha filha precisava tomá um remédio. Era um sufoco! Eu chegava a ficá com dor de cabeça. Às vezes o meu marido tava trabalhando e não tinha quem lesse o remédio, ou a receita. Então, eu sempre corria na casa da vizinha. O pior é que, às vezes, ela num tava. Então... Era bemmm difícil. [...] Olha... Eu acho, que quando a gente aprende a lê de pequena, não deve achá tão importante a leitura. Mais quando você é grande... E num sabe lê... Noossa! (Longo silêncio) É... bemm difícil... Então, eu acho assim... Que a primeira coisa importante mesmo é a gente sabê lê. É, por isso, que eu acho que depois que a gente é grande e aprende a lê, a gente valoriza tanto (Rita, 32 anos). Eu tinha idéia assim que precisava istudá. [...] Má daí quando eu cheguei em Curitiba foi pior num pudia nem saí pra cidade...sofria que tá loco... agora eu já leio um poco, já me viro sozinho, pra lê já dá (Ailton, 51 anos). Agora que eu sei lê é bem melhor, mais quando eu comecei lá no meu serviço a patroa explico né... a máquina é assim que mexe, o microondas é assim.... As cortinas você abre no controle remoto e eu... sofria pra decorá tudo... eu olhava as cor ou contava primero, segundo botão.... que tinha que apertá... Agora a gente sabendo lê é otra coisa. Eu tive que me virá na marra pra não perdê o emprego (Marilda, 30 anos). Num segundo momento suas aspirações, estão envoltas, na perspectiva do

trabalho, na questão de melhorar, de arrumar um emprego melhor, por vezes sem

muita clareza aparente, do quê, ou de que tipo de emprego, mas com a percepção

de que sem estudo, hoje, não se consegue trabalho. Assim, incluímos estes relatos

na categoria de pertinência da EJA para a vida, como observamos no relato de Elias

31 anos, Claudinei 30 anos e Noel, 41 anos respectivamente:

Eu acho que quando eu terminá a EJA eu consigo um emprego melhor... Porque que nem... Eu tava entrando numa firma aí, mais eles pediram estudo e eu não tinha. Perdi a vaga! O serviço eu vi num era difícil eu sabia fazé, má num tenho istudo. [...] Ah, vai mudá, eu vô sê uma pessoa apta... e as portas vão se abri mais pra mim né. Em todos os sentidos que você imagina... o financeiro, o trabalho. Porque sem estudo você é um zero a esquerda. Não consegue nada de trabalho. Creio numa melhora muito boa... pretendo continuá pelo meno até o 2º grau... Porque a gente tendo istudo é bem mais fácil. Hoje em dia, sem istudo a gente não é ninguém... nenhuma firma qué... e num interessa se a gente sabe fazê o serviço. Eles têm umas disculpa assim, né? Antigamente, quando a gente era novo num pegava porque num tinha experiência, depois, a gente fica véio eles também num pega porque é véio i agora inventaro otra: num pega quem num istudô.

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As mulheres, também, percebem que o estudo está sendo exigido pelas

empresas e também pelas instituições nas quais elas pretendem fazer cursos e que

há, ainda, outros entraves na hora de uma contratação como o fator idade, a

questão de ser mulher, ter filhos dentre outros.

Tudo o serviço que a gente vai eles pedem: Qual é a sua escolaridade? Até aqui nos restaurantes... que antes pra fazê salada eles não pediam isso (Rita, 32). tô precisando é estuda pra mim fazê um curso... só que pra fazê esse curso. Pra se aperfeiçoá, né?... no que eu faço eu preciso sabê lê e escrevê corretamente. Provavelmente, com a minha idade, 44 anos, empresa nenhuma vai querê me contratá, né? Empresa nenhuma vai querê me dá emprego... entendeu? Então, é isso que... na minha cabeça é assim... que eu vejo, sabe? Continuá... terminá aqui e continuá estudando pra mim... pra vê se eu consigo montá alguma coisa pra mim trabalhá em casa e não precisá saí pra rua porque a minha filha é pequena e eu tenho que cuidá dela, né... e... maquinário eu já tenho tudo (Marlene, 44). o curso que eu quero fazê é um curso profissionalizante, mais tem que tê da 4ª série em diante pra podê fazê. Não adianta você sabê fazê o serviço se você não tem escolaridade. A maioria dos serviços pede estudo e curso de computador pra recepcionista, pra portero, pra cozinheira, até pra cozinhá. Eles não dão serviço pra quem não estudô. Algum serviço, a gente sabe, né... se não soubé pelo menos lê não tem como pegá (Maria, 38).

Percebemos nestes relatos as exigências do mercado de trabalho por um

trabalhador/a com maior escolaridade. Porém, essa escolaridade exigida parece

servir muito mais como um critério de seleção para as empresas, pois há um grande

contingente de trabalhadores/as e pode-se optar pelo/a mais escolarizado/a, do que

de fato uma exigência que será exercida pelo trabalhador/a. Isso vem sendo

constatado por pesquisadores como Sanchis (1997), Kuenzer (1998), Oliveira (2000)

e nossa pesquisa também apontou nessa direção.

A fala da aluna Marlene (44 anos) apontou dois indicativos, no primeiro ela

evidenciou que o fator idade é uma possível barreira a sua volta ao mercado de

trabalho formal. No segundo, ao colocar que pretende: “montá alguma coisa pra mim

trabalhá em casa e não precisa saí pra rua porque a minha filha ainda é pequena e

eu tenho que cuidá dela”, expressa o peso que os significados culturais das práticas

cotidianas inferem sobre o gênero feminino. A contradição desta fala nos dá uma

amostra de como as mulheres têm procurado conciliar trabalho para sobrevivência e

cuidado com filhos/as (ROSEMBERG, 1994).

Neste cenário, percebemos que, se por um lado, os alunos depositam na

educação a esperança de mudar sua condição sócio-econômica quando

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estabelecem uma relação direta entre estudo, qualificação, trabalho, emprego. Por

outro lado, percebem que as experiências adquiridas no cotidiano de trabalho e

mesmo de vida são descartadas pelo mercado de trabalho que exige níveis mais

elevado de escolarização mesmo para funções tidas como simples.

Na contramão das esperanças dos/as alunos/as da EJA sem trabalho segue

uma corrente que assola a força humana através do descarte (em relação à idade,

ao sexo, à escolarização, à qualificação) e da superfluidade do trabalho. Isso leva ao

que Antunes (2002), chama de forma de interação entre trabalho vivo e trabalho

morto que passa a ser corporeificado no maquinário.

A pertinência da EJA para a vida de seus protagonistas foi descrita em muitos

momentos como fator capaz de levantar a auto-estima.

Essas coisas têm tudo aqui na escola e têm as aulas de informática que eu acho difícil, porque pelo menos eu nunca tinha chegado perto do computador. Agora já aprendi um pouco, pelo menos essa coisa de ligar... Desligar. Mexe lá direitinho alguma coisa. Não sei tudo ainda, mas aprrendi bastante coisa que ajudô também na hora de mexer no caixa eletrônico porque a gente fica esperta né? E perde o medo e parece que se sente até mais gente (Anadir, 60). Dá mais vontade de vivê, de trabalhá... mais esperança parece que você dá aquela acordada, sabe?... (Mª Luiza, 25).

Ainda nesta categoria de pertinência da EJA para a vida, embora a maioria

dos/as entrevistados/as tenham dito que não precisava haver mudanças nessa

modalidade de ensino, alguns se referiram ao que chamaram de cursos básicos

profissionalizantes como sendo de grande importância. Entre os entrevistados/as

Maria de Lurdes, Aparecida, Zeigela, Palmira, Claudinei e Valcir, sugerem:

Um curso de culinária profissional ia ajudá 100%. Eu ia sê a primeira da lista porque eu ainda quero sê chefe de cozinha (Maria de Lurdes, 34). Aqui, na EJA poderia ter aula de computação (Aparecida, 55 anos e Zeigela, 28 anos). Eu não sei bem, tem que perguntá pros mais novo, eles precisam de curso, principalmente as mulhé, né... pra num ficá a vida intera cuidando só da casa (Palmira, 68 anos). Ter cursos profissionalizante... o básico poderia ter, né? Curso de costura e culinária pra mulher né. E pros home um curso de elétrica, de hidráulica esses curso básico que no dia-a-dia as pessoas... utiliza muito. Até mesmo de engenharia civil, né... de pedrero carpintero,a EJA, precisa disso (Claudinei, 30 anos).

Eu acho que o povo tá precisando de curso profissionalizante na EJA, porque as firma num vão contratá gente assim... que primero falta estudo, daí quando tem um poquinho de estudo

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falta experiência né. Eu sô pedrero e sei que bons pedrero ganha muito bem.... Só que hoje as pessoa precisa conhecê mais as coisa... é que tem muito material novo aí na construção e quem num sabe lidá só estraga as coisa (Valcir, 32 anos).

Quando analisamos essas falas percebemos que existe uma preocupação

com a profissionalização e com o mercado de trabalho. Está presente também, o

estereótipo da visão dicotômica no papel do homem e da mulher. Os cursos para a

mulher, geralmente, são pensados no âmbito que envolve as relações domésticas e

os relacionados ao homem envolvem o espaço público.

Louro, (2001, p. 77) citando BorrieThorne, diz:

... por ser baseada em dicotomias uma abordagem baseada na noção de culturas diferentes exagera a diferença de gênero e negligencia a variação no interior do gênero, as fontes de divisão e comunalidade que o atravessam, tais como classe social e etnicidade. Esses fatos abalam seriamente o ordenamento conjunto de contrastes que formam a visão de culturas diferentes e colocam o desafio de como se pode apreender os padrões complexos de diferença e comunalidade, sem esterótipos perpetuadores.

Como resultado de uma construção histórica a mulher acaba indo para as

áreas que são consideradas não técnicas, preferencialmente, que não ofereçam

riscos às funções tidas como próprias do gênero feminino e os homens para as

áreas técnicas. Isso se configura numa tendência onde as mulheres se

concentrariam mais nas Ciências Humanas e Saúde (Silva e Carvalho, 2003).

Entre as mulheres a percepção, em relação à profissionalização, revela uma

preocupação em realizar cursos voltados à área de informática, que parece indicar

um conceito mais amplo de possibilidades de trabalho, se comparado à esfera

doméstica que nossas entrevistadas ocupam, isso pode significar um rompimento

com o padrão tradicional.

Nesse caso, como a informática é vista como uma tecnologia exigida

socialmente, “tão pedindo curso de informática pra tudo: pra vendedor, pra

recepcionista, pra caixa de mercado e farmácia, até pra portero tão pedindo”, ela

começa a fazer parte das expectativas das mulheres deste universo pesquisado.

Isso ocorre porque as mudanças nas relações sociais, conforme Apple (2002) se

refletem na ação do trabalho e da cultura.

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5.4 AS PERCEPÇÕES DE GÊNERO NA ESCOLA OU A PERCEPÇÃO DE SI

E DO OUTRO

Nos próximos tópicos apresentamos as percepções dos alunos e das alunas,

do professor e das professoras quanto às questões de gênero em relação às

percepções de si e do outro que foram relatadas nas entrevistas bem como

procuramos interpretar que significados os silêncios poderiam indicar, pois “tão ou

mais importante do que escutar o que é dito sobre os sujeitos, parece ser perceber o

não-dito, aquilo que é silenciado” (LOURO, 2001, p. 67) (grifos no original).

5.4.1 As percepções das alunas sobre as mulheres e os homens

Ao analisar as entrevistas das mulheres observamos que elas se vêem como

mais interessadas, preocupadas, dedicadas, inteligentes e, principalmente, com

mais vontade de evoluir. Outras palavras, bastante recorrentes, foram força e garra

ao se referir à mulher. Dentre as características, comumente atribuídas à mulher, as

palavras sensíveis e frágeis, neste universo, não apareceram. Assim sendo é

impossível não questionar – seria por causa da classe social?

Do mesmo modo, podemos considerar que o papel da mulher na sociedade

está mudando. Pelo menos, no grupo que entrevistamos, elas já não se vêem como

sensíveis e frágeis. Ao contrário, expressam ao falar da rotina cotidiana uma jornada

de trabalho dura, que varia entre 10 e 12 horas e não estamos considerando, aqui, o

tempo representado pelas horas dedicadas ao estudo que é de aproximadamente 3

horas.

Acordo às cinco da manhã, pego o ônibus aqui no viaduto, daí eu chego no serviço as sete horas e lá por cinco horas eu venho pra casa. Chego em casa, jogo a bolsa lá... tem o serviço da minha casa, depois pego a bolsa da escola e venho pro colégio estudá (Mª de Lurdes, 43).

Ainda sobre a questão do trabalho na vida das mulheres a fala da aluna

Aparecida, (34 anos) é esclarecedora:

Você tem que fazê o serviço da casa que você limpa, tê que limpá, lavá, e na casada gente tudo de nooovo e, ainda, deixá a janta pronta pro marido, e ir pra escola. Eu até comento, que ele tem que me ajudá. Mas não funciona (Risos). Ele não ajuda não. Não sei por que! Acho que é porque esses home são muito machista ou eles são preguiçoso mesmo! [...] Mas eu acho que cada mãe cria o filho diferente... E na verdade a gente erra no jeito de criá.

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Porque o que eles não aceitam é que a gente mande neles. Porque se eu falá pro meu marido hoje é seu dia de fazê a janta... Daí ele olha pra mim. Olha pra minha filha, dá uma risadinha e fica se enrolando. Não fala nada! Mas não faz. Não é que ele não saiba fazê. Ele sabe fazê. Mas acho que é porque eles pensa que a gente tem obrigação de cozinhá pra eles. [...] O problema, é que nóis mulhé não temos paciência de mandá e esperá, a gente sempre aprendeu fazê um monte de coisa junto, e não tem paciência de esperá, então, a gente manda uma vez! Se não faz... A gente pega e faz! E... é um serviço fantasma né, porque num aparece.

Ao analisarmos o que a aluna Aparecida expressa, percebemos que ela tem

clareza de que é necessário estabelecer uma divisão das tarefas domésticas. Afinal,

podemos dizer que ela tem pelo menos tripla jornada e demonstra saber também

que se os homens não estão colaborando, é porque foram criados numa cultura de

modelo patriarcal e, mais do que isso, ela sente que o serviço doméstico é um

trabalho sem valorização.

Sobre a divisão sexual do trabalho Hirata (2005, p.10) diz que:

A divisão do trabalho entre homens e mulheres, que se faz entre trabalho leve e pesado, trabalho menos qualificado e mais qualificado, entre o trabalho mais parcelado e o trabalho com maior responsabilidade, vai continuar a existir, enquanto existir uma divisão sexual do trabalho doméstico. Enquanto as mulheres forem responsabilizadas pelo trabalho de educação das crianças, de arrumar a casa, de servir o outro. Se, se considera que as mulheres devem ser altruístas e os homens criativos, os homens como responsáveis, como criadores como “cabeças” e as mulheres como a emoção, como aquelas que vão ajudar, servir aos filhos, ao marido, a secretária em relação ao patrão, quer dizer, toda uma série de trabalho que a gente chama de care no sentido de cuidado, de solitude em relação ao próximo, enquanto existir essa divisão, certamente as mulheres vão continuar a serem exploradas. Pessoalmente, penso que a única maneira de superar a divisão sexual do trabalho existente hoje seria uma divisão igualitária do trabalho doméstico e do trabalho com o cuidado com as crianças entre os homens e as mulheres, no interior da família, entre o casal. Enquanto existir uma situação de assimetria onde as mulheres fazem o trabalho doméstico e profissional e os homens só fazem trabalho profissional, enquanto existir essa divisão, acho que é impossível superar a desigualdade e a discriminação no mercado de trabalho em relação às mulheres. Uma possível solução para essa questão é apontada pela aluna Aparecida,

(34 anos) ...“cada mãe cria o filho diferente... E na verdade a gente erra no jeito de

criá”. Se por um lado, a fala da aluna indica que as mulheres poderiam criar os filhos

de maneira diferente, por outro lado, sugere que a responsabilidade é, também, da

mulher e não de todo um contexto histórico-social-cultural.

Na escola consideram-se amigas de homens e mulheres. Afirmam que não

existe diferença no relacionamento entre os alunos e as alunas na sala de aula, que

todo mundo é amigo e nos trabalhos em grupo se ajudam. Porém, confirmam que se

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relacionam mais com as mulheres e justificam dizendo que: “tem pouco homem na

sala”.

Atribuem a predominância do gênero feminino, em todas as turmas, ao

interesse, à dedicação e à garra das mulheres “elas têm mais interesse em

aprender, os homens não. Eles preferem ficá no bar jogando uma sinuquinha,

bebendo com os amigos, enquanto a gente tá aqui na escola...”

As entrevistadas observam, ainda, que esta significativa participação feminina

na escola se deve ao fato de que elas estão, a seu modo, fazendo pequenas

revoluções diárias e tomando consciência de que podem mais “se a gente num baté

o pé tudo dia e firmá.... iche! Num vem pra escola” (Maria Aparecida, 34anos). Isto

se verifica, na medida em que percebemos a busca pela emancipação ou a busca

de uma independência, também da família, como podemos observar nesta fala

“tuda vida... eu deixei de fazê o que eu queria, prá tá com eles. Cuidá deles.

Agüentá eles... Agora eles se viram sozinho e, eu, vô cuidá um poco, de mim (Érica,

35).

Em relação à aprendizagem elas se percebem como melhores e mais

espertas que os homens porque, segundo elas, demonstram mais interesse e são

persistentes. Justificam isso, na medida em que dizem: “elas vê a coisa assim....

antes do que os homem, sabe? Porque as veiz a professora pergunta alguma coisa

e é as mulher só que responde (Marlene, 44)”.

A aluna Mª Aparecida (38 anos) expressa ainda, que: “as mulher, elas

conseguem fazê duas coisas ao mesmo tempo, ou até mais. Os homem já é mais

desligadinho tem mais preguiça, não vão muito atrás .”

Mas reconhecem a dificuldade que os homens têm de freqüentarem uma sala

de aula onde a grande maioria é mulher “...eles ficam meio com vergonha no meio

de tanta mulher, têm uns que ficam tipo tímido”. Apontam a falta de atenção dos

homens como principal fator a interferir no desempenho, além da timidez e, mesmo

das faltas. “Acho que os homens não si importam muito com esse negócio de

estudá... eles faltam muito, vem um dia falta três...” (Zelita, 50 anos).

Por outro lado, as mulheres consideram que os homens tiveram mais

oportunidades de estudar porque os pais permitiam e incentivavam que os filhos

homens estudassem. Enquanto que às mulheres não era permitido, elas ficavam em

casa se ocupando dos afazeres domésticos. Isso, para elas, é apontado como uma

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das possíveis justificativas para o fato de terem poucos homens estudando neste

nível de ensino. “Talvez os homens tenham mais estudo né... tiveram mais

oportunidade que as mulher que ficam em casa... Tem filho cedo.”

As alunas entrevistadas disseram que na vida profissional os homens

conseguem trabalhos melhores, com registro em carteira de trabalho, ainda que

tenham a mesma, ou menor escolaridade que as mulheres.

O relato da aluna esclarece essa idéia:

Eles, mesmo sem estudo, sempre conseguem assim... umas coisinha melhor, até mais leve que a gente, né. É, as veiz de portero, ou de trabalhá em elevador, de motorista por exemplo. Claro que também têm os que trabalham no pesado né..., mais também eles só fazem isso né, eles num tem que tá cuidando da casa que nem a gente. As mulher pra consegui emprego sem estudo é só coisa de limpeza, né... As veiz nem consegue porque até pra limpá chão, se for registrado, tão pedindo estudo, né... E nem é pra ganhá grandes coisa não. Olha, a gente, se quizé ganhá um pouquinho mais tem que se matá no pesado como diarista se não num dá (Maria de Lurdes, 43).

Ainda com relação a trabalho, segundo as alunas, há uma nítida preferência

pelos homens. As empresas contratam muito mais homens porque sabem que “as

mulheres são responsáveis pelos filhos pequenos”. Corroboram com essa idéia as

alunas Marlene, 44; Maria Aparecida, 38; Zeigela, 28; Rita, 32; Mª de Lurdes, 43;

Aparecida, 34; Érica, 35; Aliete, 45;

[...] a gente é mulher fica grávida então, eu acho, que machista do jeito que esse mundo é as empresa deve di ficá pensando que é muito melhor contratá um homé né, que num vai tê licença maternidade, num vai faltá o serviço pra levá filho com febre no médico. Tem firma que exige teste de gravidez, se é mulher. Pra minha amiga, perguntarô até se ela já tinha feito laqueadura... porque, hoje em dia tudo é número, né... Então, enquanto você tá gerando número pro patrão e ele tivé tendo lucro, você tem trabalho. A hora que você tivé que faltá, aí já num presta mais pra firma porque a firma já num vai tê lucro com você, né.

Na fala das alunas elas percebem a discriminação que sofrem pelo simples

fato de serem do sexo feminino e têm clareza de que o mercado de trabalho objetiva

o trabalhador, preferencialmente do sexo masculino, já que o sexo feminino trás

consigo a marca da reprodução e do papel, historicamente a elas reservado, em

relação ao cuidado e à educação dos filhos.

Nesse sentido é pertinente lembrar que o lugar da mulher grávida no mundo

do trabalho, ainda, é visto com temor e que muitas vezes a discriminação, expressa

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pelas entrevistadas, é ocultada por empresas e indústrias que não contratam um

profissional por ser do sexo feminino e estar ou poder ficar grávida.

As entrevistadas demonstram, também, saber que no contexto do mundo do

trabalho pode-se entender que as formas de preconceito com relação aos

trabalhadores e às trabalhadoras são, no limite, uma forma de barateamento dos

custos de mão-de-obra, que permitem ampliar a margem dos lucros.

A aluna (Marlene, 44 anos) costureira, atualmente desempregada, exprime o

drama de ser mulher, mãe e trabalhadora:

Eu trabalhava numa firma daí eu fiquei de licença da nené e depois voltei pro trabalho, mas daí eu tive que pedi pra saí porque como que eu ia dexá a minha única filha tão pequena, né. Tinha uma coisa dentro de mim que ficava o tempo intero me incomodando eu nem conseguia trabalhá direito, só pensava nela, sabe... Era muito difícil eu chegava em casa e me sentia a pior mãe do mundo por não ter cuidado dela. Então eu queria saí da firma, mas eles não podiam me mandá imbora, né... Que diz que tem uma lei lá que num dexa mandá imbora, por num sei lá quanto tempo, quem teve bebê. Então, eu fiz um acordo com eles e assinei um papel dizendo que eu queria saí. Agora, eu tô sem trabalha forá, né... só pra cuida dela. Daí só o meu marido tá trabalhando e pra eu vim pra escola ele fica com a nossa filha de noite (Marlene, 44).

Às mulheres na cultura de nossa sociedade, ainda se relacionam

efetivamente todos os papéis sociais que envolvam o cuidado com a casa e

principalmente com os filhos. Nossa entrevistada expressa o sentimento de culpa e

a aflição que sentia ao estar no trabalho e deixar a filha pequena, essa vivência lhe

impunha de tal forma uma pressão dramática que a fez pedir demissão para ocupar-

se dos cuidados com a filha. Isso deixa claro as marcas do passado onde

condicionantes culturais como a dicotomia dos papéis entre homens e mulheres lhe

foi imposta. Mas há mostras de que isso vem apresentando algumas mudanças

culturais no “costume” do papel dos homens como a aluna Marlene diz que para ela

vir à escola é o seu marido quem fica com a filha pequena, ou seja, neste caso as

relações de gênero parecem começar a caminhar no sentido de relações mais

igualitárias.

Carvalho (1999, p.58), citando Noddings refere-se aos homens dizendo que

“paralelamente, mais do que argumentar que os homens devem adotar os padrões

relacionais característicos das mulheres no cuidado com os filhos, eu gostaria de

sugerir que os homens trouxessem suas melhores qualidades humanas e

masculinas para a experiência de cuidar dos filhos”.

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5.4.2 As percepções dos alunos sobre os homens e as mulheres

Ao analisar as entrevistas dos alunos percebemos que eles se vêem como

mais desorganizados e tímidos. Disseram que não há diferença entre os sexos e

que se relacionam com homens e mulheres no ambiente escolar.

Atribuem a predominância do gênero feminino nas turmas de EJA ao fato de

que os homens são mais tímidos “o homem tem mais vergonha de voltar a estudar”.

Consideram que as mulheres estão ocupando mais o espaço público, em

relação ao trabalho e aos estudos, pois dentre os entrevistados, um era solteiro, os

outros se declararam casados e suas companheiras possuem mais escolaridade

que eles o que pode ser notado na fala de um deles quando diz “é, essa

mulherada... tá tomando conta”.

Chamou a atenção, no grupo de entrevistados, que a geração mais velha

apontou que as diferenças entre homens e mulheres já não existem mais

“antigamente, que tinha mais essas coisa assim... de homem não falá ou não dá

valor à mulher. Hoje não é mais assim...” (João Maria, 57). Assim como este aluno,

outros consideram que as coisas estão mudando e que não precisa ser

necessariamente da forma mais tradicional como observamos nesta fala, onde o

aluno se refere aos salários: “Parece que as mulher, hoje tão ganhando mais que os

home”.

Surpreendentemente a geração mais nova demonstrou que tem mais

preconceitos em relação ao gênero feminino, como é possível observarmos na fala

do aluno:

A minha esposa tem o 2º grau e trabalhava numa clínica veterinária... e aí a gente casô e essa era a condição: não trabalhá fora, mas ela sabia qual era os meus pensamentos, né. Ela até gostaria de trabalhar, né... (breve silêncio). Mais ela sabia... que eu tinha esse pensamento fechado pro mundo passado (breve silêncio). [...] e gostô da minha pessoa. Mas eu acho que pra ter aquela aliança de família, como antigamente a esposa tem que ficá em casa. Esse é o meu ponto de vista. Não que eu seja machista (Claudinei, 30).

O aluno diz não ser machista, no entanto não permite que sua esposa

trabalhe fora de casa. Isso revela uma preocupação com a saída da mulher para o

mercado de trabalho e a falta que sua presença pode fazer para a família e também

pode revelar que sua vivência de exemplo paterno reforçou os valores machistas.

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Nesse contexto, a idéia é de que o homem tem obrigação de sustentar a

família para que a mulher possa criar os filhos. Este mesmo aluno deixa isso

transparente: “eu sustento a família sozinho por opção minha” (Claudinei, 30). A

posição desse aluno, embora jovem, demonstra que neste modelo de masculinidade

a construção da identidade do homem se faz por meio da importância do papel de

provedor da família e principalmente da valorização atribuída a esta

responsabilidade vista como essencialmente masculina. Deste modo, como o

homem tem a responsabilidade do sustento é ele quem detém o direito de decidir

sobre a vida da família exercendo na expressão de Bourdieu (1999) a “dominação

masculina” (CARVALHO, 2003).

A percepção desse aluno de que existe um espaço masculino e um feminino

mostra que a construção histórica reserva, principalmente o trabalho público para os

homens. Essa análise se insere na reflexão de Scott (1995) que apresenta o gênero

como uma forma primária de constituir relações de poder.

Este mesmo aluno fez algumas colocações no sentido de que hoje existem

três tipos de homem, segundo ele:

Têm os machista, que nem eu... assim... do tempo passado né... que é tradicional. Tem os que têm poder os empresário, os político né... que fazem o que querem [...] e têm os home que já num sabe mais o que eles são... tão meio perdido... né... porque tipo assim.... a mulher as veiz ganha mais do que ele, istudó mais do que ele. Então... eu acho isso que tem muito home em cima do muro, já num sabe mais o que é... i daí passa pro otro lado.

É importante observarmos que, como enfatizamos anteriormente, as

companheiras de nossos entrevistados estão em níveis de escolarização mais

elevados. Ao considerarmos, o caso acima, a esposa com o 2º grau concluído e o

aluno que cursa a 2ª série parece indicar que as mulheres estão estudando mais

que os homens, porém, ainda assim têm permanecido no espaço privado em virtude

da dominação masculina.

Em relação à aprendizagem, os homens consideram as mulheres mais

dedicadas, empenhadas, caprichosas, que levam mais a sério e que demonstram

maior interesse em continuar os estudos, como os relatos abaixo evidenciam:

Na sala o desempenho delas... (Silêncio). As mulher é mais dedicada sabe... Com certeza! São mais interessada assim... Mais animada. Elas leva mais a sério. Qualquer coisinha... Até um negócinho que tem que colá alí... elas faiz tudo caprichadinho. Tudo. Entende? Elas... Tem um desempenho muito bom sabe? Eu até fico pra tráz de algumas alí. (Risos). E assim,

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até no comentário a gente vê. Elas super mais empenhada. Em chegá lá num estudo maior pra frente (Valcir, 32).

Eu acho no meu modo de pensá que as mulher se saem mais correta na leitura, nas matéria. Por quê? Eu não sei. Mas quando é hora que a gente vai no quadro, a gente já vê né? A gente já nota que elas se sai melhor né? Elas acerta mais! (João Maria, 57 anos).

A maioria dos entrevistados afirma que as mulheres têm melhores resultados.

Apenas, o aluno mais jovem coloca que os homens têm melhor desempenho na

aprendizagem e justifica sua posição afirmando que: “os homens se saem melhor

porque são mais inteligente... tem mais habilidade para escrever.... e as mulher...

demoram mais” (Robson, 19).

A opinião dos outros entrevistados difere bastante deste. Há os que atribuem

melhor desempenho das mulheres em português e em outras disciplinas como a

matemática relatam que: “Nas continha elas já perdem mais pra gente... Pros home”.

E os que disseram que no desempenho, na sala de aula “é meio pareio (risos) é....

Assim..., mais as mulher parece que ganham dos home. Pelo menos nessa aula elas

são mais esperta, mais é meio pareio as veiz numa coisa elas são melhor notra

coisa nois é somo melhor e assim vai indo”.

Outro entrevistado relata que é o único homem da turma e prefere se

relacionar só com as mulheres porque elas sabem o que querem e, ainda que,

demorando a admitir se expressou da seguinte forma:

Olha! Eu... Você sabe... que eu aprendi... Difícil admití, mas tem uma hora que sai... Assim... Aprendi muito com elas. Ás vezes coisinha pequena que a gente faiz de errado né? E acha... que tá fazendo certo. E pensando ali... junto com elas, a gente vê que... Sabe que... elas tem razão! Então... Eu aprendi assim... Eu, pra mim, acho até melhor o relacionamento com as mulheres do que com homem sabe? Até em casa o meu relacinamento mudou porque eu tô aprendendo muito com elas. [...] E assim... eu converso com todas, né ... Trato elas com respeito e elas também me tratam bem. Tem hora que elas tão falando algum assunto assim... Que... Eu também entro e falo. Mas tem hora que eu fico bem queto só aprendendo” (Valcir, 32).

Em geral, os homens demonstram certa dificuldade na oralidade,

especialmente nesta questão, fizeram muitas pausas breves e mesmo longas.

Exceto o mais jovem do grupo todos os outros, com diferentes graus de relutância,

admitiram que as mulheres têm um melhor desempenho que eles. Isso nos faz

refletir que a cultura de dominação masculina pode estar mudando. Se por um lado,

os próprios alunos julgam que é difícil admitirem que tenham um desempenho menor

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que as mulheres, por outro lado, é importante observar que eles conseguem

perceber o melhor desempenho das mulheres, neste nível de ensino.

A fala do aluno “ali tem uma porção de muié que sabe bem, mas nóis o resto

dos homé lá... nóis somo tudo fraco” (Ailton, 51), parece confirmar nossa análise.

Em relação à rotina escolar alguns homens consideram que “estudá é mais

fácil, trabalha na construção é mais difícil” (Elias, 31). Outros disseram que estudar

é mais difícil que trabalhar. Um deles relata que difícil mesmo era quando “ia imbarcá

num ônibus e num sabia lê e tinha que perguntá pro motorista” ou, quando tinha que

assinar algum papel “a gente as veis assinava uma folha no cartório e nem sabia o

que tinha lá” (João, 57).

Todos os homens entrevistados disseram que raramente fazem tarefas

escolares em casa que procuram fazer tudo na escola, mas “se tivé lição não dá pra

fazê. Faiz só no fim de semana, que daí a gente não trabalha nem sábado nem

domingo. [...] é só fim de semana mesmo, e se num tivé lição... a gente nem óia os

caderno” (Elias, 31).

Ao falar da rotina do dia-a-dia, exceto o ônibus lotado, eles não vêem

dificuldade “trabalha o dia todo, fazé as refeição na hora certa. Chegá em casa tomá

um banho espera dá a hora, e vim pro colégio” (Claudinei, 30).

Diferente da rotina das mulheres que trabalham fora e que ao chegar em casa

realizam o trabalho doméstico, os homens apontam no seu cotidiano apenas o

trabalho no espaço público e relatam que esperam a hora para vir à escola. Assim, é

possível perceber que não há uma partilha das tarefas domésticas e que a

conciliação entre o trabalho na esfera pública e doméstica, na cultura da nossa

sociedade é exigida apenas das mulheres.

Entretanto, as percepções sobre as relações de gênero do universo

entrevistado oscilam entre as manifestações tradicionais marcadas por desigualdade

e relações de poder e as mudanças que vêm acontecendo no âmbito social. Isso

pode ser interpretado como indicativo de transformação e promoção da igualdade

entre os gêneros na busca de uma sociedade mais justa e igualitária.

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5.4.3 As percepções dos alunos e das alunas sobre o/as professor/as

O relato dos alunos e mesmo das alunas, indica que as professoras e o

professor “trata todo mundo igual, tanto faiz homem ou mulher” e que “ela sempre

acha alguma coisa pra elogiá”. Apesar dessa unanimidade, numa primeira

aproximação, em afirmar que não existe diferença na postura do professor e das

professoras relacionada ao gênero ou ao sexo, algumas falas das mulheres, revelam

que:

No geral mesmo ela elogia mais as mulheres, porque são elas que mais freqüentam as aulas e acompanham melhor (Mª Luiza, 25 anos). A professora trata todo mundo igual. Má tem um menino ali que ela reclama muito da letra dele (Zelita, 50 anos). A professora sempre fala pra eles assim: tem que prestá mais atenção! Não pode ficá só conversando. E pra as mulher, ela diz... Assim né... (risadas). As vezes ela dá os parabéns. Mas assim ela trata todo mundo igual (Rita, 32 anos).

Na fala dos homens as diferenças, que foram descritas acima pelas mulheres,

sobre como o/as professor/as vêem o gênero feminino e o masculino na sala de aula

não aparecem. A posição de todos os alunos homens é a de que o professor “não

divide nada entre home e muié e “a professora e mesmo a diretora trata todo mundo

de igual pra igual” e ainda complementam “aqui na escola só tem um negócio!... A

maioria é mulher... na escola toda”.

Esta fala pode estar expressando aquilo que culturalmente foi aprendido, ou

seja, é natural a professora elogiar mais as mulheres e reclamar da letra feia do

menino. Portanto, se “naturalizou” algo que foi construído culturalmente. Dessa

forma, os alunos homens, possivelmente, nem estariam percebendo essa diferença

de tratamento em sala de aula.

A fala dos alunos indica ainda, que não só o magistério é feminino, como a

escola toda, porém não podemos esquecer, segundo Louro (2001, p. 89) que: “O que

fica evidente, sem dúvida, é que a escola é atravessada pelos gêneros; e é

impossível pensar sobre a instituição sem que se lance mão das reflexões sobre as

construções sociais e culturais, de masculino e feminino”. (grifos no original)

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Tanto os alunos quanto as alunas nas entrevistas demonstraram sentimentos

de gratidão em relação ao professor e às professoras, ao trabalho desenvolvido,

enfim à escola.

Ele é um cara muito bão de lidá. Ele passa lá, se num subê ele até dá uma mão. Se você chama, ele vai sempre atendendo e ele é bem legal (Ailton,51). A professora, nossa! Eu pra mim... Ela é ótima. Aqui eles tratam a gente como gente e incentivam a gente pra continuá, dão força (Rita, 32). Aqui é tudo igual. Não tem diferença... E nem tem um preferido. Do jeito que é um é outro. Mesmo na hora de olhá um caderno ela senta junto, fala, explica. Ela elogia, sabe assim... Ela sempre acha alguma coisa pra elogiá (Aparecida, 55).

Disseram, ainda, num primeiro momento, que não vêem necessário ter

mudanças na EJA, que o ensino é muito bom, a escola é muito bem equipada, com

tudo o que precisam como observamos na fala da aluna Izabel, 58 anos:

Até agora tá excelente, nós temus o nosso lanche, temos uma professora muito boa pra dar aula, exigente quando ela qué. Ela fica bem exigente quando a gente vai no quadro se fizé errado ela faiz apaga e fazê de novo. Mais, as professora elas não ti abandonam, na hora que a gente precisa elas tão ali, ainda mais agora que nois temus computador i... nois viramo gente. É por isso que eu digo essa iscola é uma beleza, agora se eu chegá a saí dela eu num sei o que vai sê da minha vida ( Izabel, 58).

A leitura que tanto alunos como alunas fizeram de seu/as professor/as e das

diretoras deixa transparecer que a escola é o lugar onde se sentem “gente”,

portanto, cidadãos e cidadãs de fato, além de estarem aprendendo como diz (Valcir,

32), “até a falá direito a gente aprende com a professora”. Para as mulheres foi

possível notar que a EJA, além de um espaço para adquirir conhecimentos para os

cursos técnicos que desejam fazer, representa ainda um espaço de significação no

sentido de estarem sendo de certa forma emancipadas, ou nas palavras de algumas

delas “o estudo abre a mente da gente”.

Este conhecimento, que historicamente aparece na escola como produzido

pelo homem, mas que, enquanto lugar de atuação é majoritariamente feminino

porque é uma atividade que envolve, enquanto trabalho o cuidado, a vigilância e a

educação, que são tarefas culturalmente aprendidas como femininas (Louro, 2001).

Enquanto espaço a escola também é percebida pela maioria dos alunos e das

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alunas como feminina, “aqui na escola só tem uma coisa a maioria que trabalha é

mulher... é a professora, a diretora, a mulher da limpeza, a tia do lanche”.

Deste modo, Forquim (1993, p.10-11) diz que a educação pode ser

considerada, reflexo e transmissão da cultura e que a escola lida com alguns

aspectos dessa cultura selecionados por serem reconhecidos como, podendo ou

devendo dar lugar a uma transmissão deliberada e mais ou menos

institucionalizada.

Enfim, as exigências da sociedade marcada pelas inovações tecnológicas e

pelo novo sistema organizacional de trabalho, impõem à Educação de Jovens e

Adultos, novas dimensões na busca de promover a formação integral do ser

humano, assegurando o acesso aos bens culturais e aos conhecimentos científicos

e tecnológicos necessários à participação social. Participação esta que efetivamente

não tem acontecido, pois enquanto, uma minoria participa do mercado globalizado,

um batalhão de excluídos se “vira” no mercado informal (carrinheiros, diaristas,

camelôs: de espetinho, de cachorro-quente, sacoleiros/as, oficinas de fundo de

quintal, serviços de vigilância, guardador de carro, etc...)

Por isso, ao assumir novos papéis a escola precisa construir a sabedoria com

senso crítico desenvolvendo a capacidade de “leiturização do mundo” e as relações

de gênero, devem ser parte constitutiva deste processo de formação humana,

porque o “processo tecnológico que envolve as questões de gênero altera o jeito de

ver o mundo, marcado por teorias, métodos e aplicações”. A educação é assim um

exercício de aprendizagem que significa ruptura nos segredos do saber fazer, que

exige compreensão e interpretação dos artefatos e que requer “espírito de

investigação” (BASTOS, 2003).

Nesse sentido a educação e, portanto, os que lidam com ela precisam, “estar

afinados para que sejam capazes de ver, ouvir, sentir as múltiplas formas de

constituição dos sujeitos implicadas na concepção, na organização e no fazer

cotidiano escolar” (LOURO, 2001.p. 59).

Justamente porque a escola estará deixando suas marcas nos sujeitos, é

impossível pensar nesta instituição sem que se lance mão das reflexões sobre as

construções sociais e culturais de masculino e feminino (LOURO, op. cit., p.89).

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5.4.4 Como as professoras e o professor percebem os alunos e as alunas da

Educação de Jovens e Adultos

A análise das entrevistas com as professoras e com o professor revelaram

que, nas seis escolas onde estivemos pesquisando, a presença de mulheres é

significativamente maior que a de homens. A este fato as docentes atribuem o

interesse e a assiduidade das alunas. O professor, por outro lado, fez um longo

silêncio e disse: “no momento... é... tem mais mulheres, mas não sei por quê”.

Sendo assim, tivemos a impressão de que foi uma surpresa para ele perceber

que em sua turma freqüentam mais alunas. Ao mesmo tempo, a longa pausa

confirmada pela fala indica que não foi fácil admitir este fato. Nesse caso, tudo indica

que o óbvio fica, de fato, invisível, ou na denominação de Boron (2001, p.71) é “a

invisibilidade do evidente”, ou seja, “o evidente se dilui diante dos nossos olhos, se

esfumaça até perder-se no horizonte sem deixar rastros. O olhar penetra-o,

transpassa-o e o perde pelo caminho”.

Ainda com relação ao maior número de mulheres, o/a docente, que aqui

identificamos como P3, com 9 anos de experiência na EJA, relata que:

Na minha turma têm mais mulheres. Tem só um homem, essa já é uma grande diferença. Assim, agora... isso é mais visível quando eu entrei na EJA, era sempre maioria mulher, mas era meio que igual, assim... a diferença era 3 ou 4 mulheres a mais. De 2000 pra cá eu tô percebendo muita mulher, bastante mesmo. E o que eu percebi, também é que o perfil tá mudando tão vindo mais senhoras, né. Eu tinha muito adolescente até 2000, 2002 agora o perfil tá mudando. Tá vindo mais senhoras na faixa dos 30 a 40 e poucos anos, a grande maioria auxiliar de serviços gerais, empregadas domésticas, diaristas e quase todas separadas, né (P3).

Nesta fala, percebemos uma forte presença da marca de gênero que revela, e

de certa forma explica, porque só agora as mulheres estão voltando para a sala de

aula, ou seja, até os 30, 40 anos de idade as mulheres estiveram ocupando-se dos

filhos pequenos e do espaço privado, submissas aos maridos. Poderíamos dizer,

cumprindo o papel que historicamente a sociedade lhes atribuiu, cuidar da educação

dos filhos e dos afazeres domésticos no ambiente da esfera privada. Além disso, a

maioria das alunas entrevistadas tem no espaço público como atividade

remunerada, o trabalho informal que envolve os serviços domésticos.

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Assim, aprofundando a fala da professora podemos inferir que o peso das

palavras “quase todas separadas”, parece que tem contribuído para o retorno das

mulheres à escola.

Há, entre o professor e as professoras, unanimidade em relatar que existem

diferenças entre o que o aluno e a aluna vêm buscar na Educação de Jovens e

Adultos. “Todos vêm em busca de melhorar suas condições de vida, mas o homem

busca o imediato, melhora onde já está e a mulher busca algo mais lá pra frente.

Mudar de emprego, fazer cursos.”

Nessa fala, a diferença entre os homens e as mulheres, sob nossa ótica, pode

ser justificada na medida em que a maioria dos alunos entrevistados tem registro

formal de trabalho e de certa forma uma profissão, enquanto que entre as alunas a

grande maioria se encontra no mercado informal dos serviços domésticos. E, assim

como a sociedade historicamente construiu e as próprias alunas sentem e

expressam: “o trabalho de doméstica não é profissão, por mais que você faça

ninguém valoriza e você num tem direito nenhum” (Maria de Lurdes, 43, Rita, 32,

Aparecida, 34).

Nesse sentido, elas estariam buscando outras oportunidades ao retomar a

escolarização básica com o objetivo de fazer cursos profissionalizantes. Além da

baixa escolaridade, há a falta de uma profissão e o gênero feminino que influencia

na discriminação. A história revela que tradicionalmente as mulheres são

empurradas à prestação de serviços, especialmente os domésticos. Além disso, o

trabalho informal e os serviços domésticos têm sido apontados como uma tendência

de crescimento por autores como (Antunes, 1995) e (Hirata, 2003).

Uma característica comum em alunos e alunas adultos/as, nesta modalidade

de ensino, é “a partilha de expectativas, que constituem a expressão do desejo de

viver uma vida melhor” (RUMMERT, 2002, p.125).

Em relação ao desempenho escolar as professoras afirmam que: “as

mulheres se destacam, são melhores na leitura, na oralidade e principalmente têm

mais vontade”. Para elucidar melhor este resumo das falas apresentamos o relato

do/a professor/a P1 com relação ao desempenho das mulheres:

As mulheres,... (risos) sempre, né... elas se destacam mesmo, não que elas não tenham problemas, porque elas têm também, mas elas não têm preguiça... sabe... porque eu

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observo, elas também trabalham fora né, a maioria. Se precisa pesquisa elas dão um jeito de passar no Farol, de pesquisar, de trazer novidade pra sala de aula. Os homens não, eles tão ali acomodados só esperando, né? Então elas demonstram muito mais interesse e vão atrás, pesquisam além do conhecimento oferecido na aula. Claro que também tem umas acomodadas, mas os homens nunca trazem nada, ficam só com o que é oferecido na aula. Outra coisa, que eu observo é a questão da leitura, elas lêem em casa no fim de semana e eles não, elas sempre comentam: Ah, professora tô lendo isso, li tal coisa. Eles nunca contam nada a respeito de leitura. Então, eu acho que a mulher busca muito mais o saber e eles estão mais acomodados. A maioria das minhas alunas trabalha fora o dia inteiro e chegam, assim... Enquanto não começa a aula, enquanto tão lanchando elas tão ali com um livro, aproveitando pra lê um pouquinho e eles ficam conversando, saindo da sala e ainda falam assim: ô professora vô dá uma volta, vô passiá e nunca, nunca, nunca pegam um livro. Elas pegam, mesmo os que estão na estante da sala... aqueles Lições Curitibanas, e dizem: olha professora que interessante... e têm mesmo muitos textos interessantes. Elas qualquer coisa elas tão lendo. Eles não, não lêem se limitam ao que a gente oferece em sala de aula (P1).

Outras diferenças entre homens e mulheres foram citadas: os homens têm

mais facilidade para lidar com matemática, segundo o/a professor/a P3: “eles

captam mais rápido, principalmente, nessa faixa dos 30 a 40 anos, os alunos que eu

tive são assim muito espertos. Geralmente lidam com matemática43 o dia inteiro

né..., construção, instalação hidráulica, essas coisas.”

Estas observações indicam que o cotidiano do trabalho na esfera pública,

principalmente no caso dos homens, contribui para a aprendizagem das disciplinas

das ciências exatas.

É interessante observar, no caso do professor entrevistado, ele percebe que

quebrou o rótulo de que o magistério é feminino, nesta escola. Disse que houve um

impacto mais visual do que verbal que notou que os alunos se fecharam um pouco

no começo, e que aos poucos foi conquistando a turma e salienta que:

No início senti um certo receio, até porque eu não tinha experiência e todos estavam acostumados só com mulheres, né... com professoras. Inclusive eles falaram pra mim que até a forma de verbalizar acaba sendo diferente. Não sei se é ... porque mulher às vezes têm mais tato com as mulheres... ou um tato específico com os homens e... eu tento igualar os dois. Não sei se realmente é isso mas eu tento não discriminar essa questão de homem e mulher, assim...

Com relação ao desempenho dos/as alunos e alunas o professor disse, ainda

que, com várias pausas: “na minha turma... o desempenho... mais fácil é... assim...

das mulheres”. Ao fazer esta afirmação, imediatamente, o professor argumentou

que: 43 Para conhecer mais sobre a questão da matemática ver: CASAGRANDE, Lindamir S. Quem mora no livro didático?: Representações de Gênero nos livros didáticos na virada do milênio. Curitiba, 2005, 188 f. Dissertação (Mestrado em Tecnologia), CEFET-PR.

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eu acredito que seja pela sensibilidade específica da mulher, ou até por tempo maior que tenha em casa, porque a carga de trabalho da mulher acaba sendo menor do que a do homem, até porque algumas mulheres (LONGA PAUSA) é aposentada, ou não trabalham e preferem fazer a noite por questão social mesmo, só. Então, tem um pouco mais de tempo pra lê em casa, ou reforça os estudos... E pro homem, eu já vejo assim uma dificuldade, um pouco maior... Talvez por essa carga de trabalho ser maior, às vezes ter que trabalhar até sábado. Eles acabam não podendo aproveitar... (BREVE PAUSA) é uma justificativa que eu tenho pra mim... de me conforma de repente... de ver que um homem ali... não tá acompanhando tão bem quanto uma mulher [...] Não existe um parâmetro, mas eu vejo que é equilibrado... Assim.

Nesta fala, observamos a reprodução de uma cultura onde a divisão sexual

do trabalho está explicitada dentro dos moldes tradicionais, onde somente a

atividade do homem é considerada trabalho e, para o professor entrevistado, isso

justifica o menor desempenho dos alunos homens. O trabalho doméstico da mulher

é desconsiderado, mesmo das que trabalham fora, pois a fala do professor revelou

ainda, que as mulheres “a maioria trabalha como zeladora e diarista. E tem uma

aposentada e outras que não trabalham”.

É possível notarmos nas entrevistas realizadas com as professoras, a idéia de

que o melhor desempenho é atribuído às mulheres por sua dedicação, esforço e

interesse, “elas são mais determinadas põem na cabeça que vão fazer e fazem. Vão

embora, vão pra 5ª e continuam”. Do mesmo modo, os alunos e alunas

reconheceram exatamente essas qualidades como sendo as diferenças marcadas

pelo gênero. No entanto é possível notar que a idéia de melhor desempenho

masculino não está associada a esforço e dedicação. Ao aluno homem, segundo as

professoras, se atribui melhor desempenho “quando você aplica uma coisa mais

exata o homem... é mais fácil pra eles, porque dedicado... isso eles não são mesmo.

Imagino que seja mais fácil porque eles têm contato com realidades diferentes”.

Para as professoras a escola passou a ser além de lugar onde se adquire

conhecimentos, onde se busca mudanças para a condição de vida, “consultório

psicológico” porque “às vezes parece que o que a gente faz é terapia em grupo”. As

professoras relatam que trabalham muito a auto-estima dos/as alunos/as valorizando

o conhecimento que trazem. Segundo o/a professor/a P3 e P4 se trabalha muito a

parte do elogio. “[...] acho que ninguém elogia esse povo em momento nenhum.

Você fala uma coisinha eles ficam nossa maaraaavilhados”.

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Outra questão diz respeito à oralidade, as professoras afirmam que as alunas

se expressam melhor e com boa argumentação e que os alunos têm mais

dificuldade para falar.

Com relação a mudanças que colaborariam para a prática cotidiana do

professor e da professora na EJA, exceto o professor que tinha cinco meses de

experiência, todas as professoras entrevistadas foram unânimes em dizer que os

cursos já melhoraram muito, mas que é preciso melhorar, ainda mais, porque às

vezes tem palestrantes que nem sabem o que é a EJA. A professora P3 argumenta:

Eu prefiro quando a prefeitura organiza troca de experiência porque a realidade é de quem tem conhecimento de causa, ou quando chamam pessoas que tem um trabalho interessante na EJA e essa pessoa repassa pra gente, né. Então, isso é produtivo porque ela tá em contato com a realidade ela sabe o que você passa. Agora uma pessoa com mestrado em num sei o que... Que não conhece a nossa realidade, nunca viu um aluno de EJA, isso num adianta tem uns que ficam lá na frente falando: porque as nossas crianças. Que criança? Na EJA não tem criança, é outra realidade. O que a gente precisa é alguém especializado em EJA que conheceu e conhece a realidade né... porque ficam tudo citando Paulo Freire, mas não conhecem como funciona na prática não foram na escola vê se é tudo aquilo que ele falô que a gente aplica, tal... é complicado. Então, assim eu tô na EJA desde 97, foram cursos e cursos e posso te dizer que foram poucas as pessoas que tinham conhecimento de causa [...] Para os/as docentes P1, P4, e P6 “a Prefeitura deveria dar pra EJA a atenção

que tem dado à Comunidade Escola, mas infelizmente a EJA não é prioridade tudo o

que tem na escola é para o diurno e se alguma coisa estragar ou for roubada a culpa

é EJA”.

Outro motivo de preocupação para o/as professor/as são alunos e alunas que

têm vindo estudar na EJA, que são portadores de necessidades especiais. Como

este fato apareceu, de forma bastante contundente, na fala dos/as protagonistas

desta pesquisa iremos mencioná-lo com a intenção de chamar a atenção da

Secretaria Municipal de Educação, mais especificamente da Gerência de Educação

de Jovens e Adultos, para essa questão.

Muitas professoras disseram que não estão preparadas para trabalhar com

este novo aluno que precisa de um trabalho pedagógico diferenciado. Apontaram

ainda, nas seis escolas que estivemos que existe uma média de 10% de alunos com

algum tipo de deficiência e que este é um grande desafio. A fala do/a professor/a P6

nos dá uma referência dramática do que isso significa na sala de aula:

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Tenho um aluno com DM (Deficiência Mental) não sei se é leve ou moderada, mas o fato é que ele está lá. Tem dias em que ele até consegue produzir alguma coisa, pouca é verdade. De repente no meio da aula... assim, do nada ele dá uns gritos os outros alunos até se assustam, todo mundo se assusta. As vezes ele chega na escola com um monte de comprimidos coloridos e fica o tempo todo comendo aqueles remédios e olha pra gente de modo estranho parece que vai atacar alguém a qualquer momento. Ele é muito estranho, não faz muito tempo que está na escola. O que ele nos contou é que estava internado, segundo ele no hospital de loucos e agora só precisa ficar lá durante o dia e no fim da tarde é liberado pra ir embora, daí ele vem pra escola. Olha, eu te digo que é complicado. Não é má vontade minha, mas sinceramente eu não sei como ensiná-lo, trato ele bem com educação e carinho, assim como os outros, mas eu sei que ele precisa mais do que isso e eu não estudei pra trabalhar com esse tipo de aluno eu.... (LONGO SILÊNCIO SEGUIDO DE CHORO) eu, não posso ajudar porque eu não sei... e tem horas que eu tenho medo dele. Até peguei uns livros sobre isso, li e reli, mas parece que foi pior fiquei mais desesperada... é muito complexo. Eu entendo que ele tem direito de estudar numa escola pública, mas é necessário saber se essa escola oferece estrutura, não física que não é esse o caso, mas estrutura pedagógica mesmo, profissionais qualificados pra atender alunos com essa necessidade até mesmo profissionais da área da saúde acho que precisaria ter, atendimento psicológico, sei lá... (BREVE SILÊNCIO) Eu ando me sentido mau porque eu não consigo ajudar esse aluno e ainda por cima me sinto culpada por não estar preparada para ajudar. É uma sensação horrível.

O processo de inclusão na EJA, pelo que a pesquisa apontou, tem acontecido

sem a capacitação necessária de professores/as. Além disso, a falta de apoio de

profissionais especializados como psicólogos e mesmo psicopedagogos têm

sobrecarregado os docentes que sentem o peso de assumir sozinhos/as a

responsabilidade do processo ensino-aprendizagem. O abalo emocional descrito

pode ser interpretado como o resultado do processo de inclusão e do conflito entre o

trabalho pedagógico específico que requer o “aluno especial” e a impossibilidade

do/a professor/a realizá-lo? A “Síndrome de Burnout”44, neste caso, estaria agindo

também sobre o/a professor/a da Educação de Jovens e Adultos?

A diversidade pode trazer benefícios a todos/as, mas é fundamental preparar

não somente os/as docentes, mas toda a escola, pois ao que tudo indica essa

parece ser uma realidade cada vez mais presente, também na EJA como os/as

próprios alunos/as mencionam, “na nossa sala têm dois que é especial um menino,

e uma menina que essa semana num veio, e a gente tem que dá carinho pra eles”.

Isso requer uma investigação mais profunda que neste momento nossos objetivos

não contemplam.

44 Para conhecer mais sobre essa questão ver: SANTOS, Flavia l. N. dos. Trabalho docente e Sindrome de Burnout: o caso dos professores de enfermagem (UFPR) e engenharia elétrica (UTFPR). Curitiba, 2007. Dissertação (Mestrado em Tecnologia), UTFPR.

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Ao finalizar a análise de como o professor e as professoras vêem os

alunos/as da EJA pode-se concluir que as relações de gênero perpassam a escola

em diferentes espaços e momentos do processo educativo, mas nem sempre é

percebida.

5.5 IMPACTOS DA APRENDIZAGEM ESCOLAR PARA O TRABALHO DE

HOMENS E MULHERES: O QUE É APRENDIDO NA EDUCAÇÃO DE

JOVENS E ADULTOS FAZ DIFERENÇA NO COTIDIANO DO

TRABALHO?

A maioria, tanto dos alunos quanto das alunas, apontou que depois que

voltaram à escola com o que aprenderam houve mudanças e que estas são

percebidas em relação ao trabalho. Essas diferenças entre o que aprenderam na

escola e o cotidiano do trabalho são expressos principalmente pelos alunos e alunas

que recentemente foram alfabetizados.

O aluno Ailton, explica que:

Deu a maior diferença pra gente né, porque eu cheguei aqui na escola eu não lia nada... Então, a diferença que dá lá no meu trabalho é que antes quando tinha alguma coisa marcada que ocê já sabe o que é pra fazê tudo bem... Que nem lá onde eu trabalho tem umas praquinha com o nome de tudas flor, assim aquele já é certo de ponhava tudo na mesma cor. Agora eu já consigo por as praquinhas e quando eu não lia eu não ponhava né, já anoto quantas caixas de flor, que flor que é..., então já mudô bastante (Ailton, 51 anos).

Para a aluna Marilda, 30 anos “antes era como se fosse um cego... lá no meu

serviço não tem muito que ta escrevendo né, ou lendo. Mais já melhoro muito, que

nem esses dia ligo um home e eu anotei o recado, então o que eu to aprendendo já

faiz diferença”.

Para muitos alunos que estão em processo de alfabetização o fato de saber

ler e escrever um bilhete ou mesmo fazer uma lista de compra, ou de peças, ou de

flores no trabalho significa muito mais do que podemos imaginar e a alegria com que

descrevem essas pequenas e, ao mesmo tempo, grandes conquistas são

indescritíveis. Talvez pudéssemos comparar a um prêmio muito esperado. Mais do

que isso, mostra que é urgente que homens e mulheres detenham este

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conhecimento, pois já não é possível, neste modelo atual de sociedade, a vida de

adultos sem o domínio da leitura e da escrita.

Na perspectiva de uma concepção ampla de tecnologia como foi apresentada

no capítulo 3 e 4 tornar-se alfabetizado significa, também adquirir uma tecnologia, a

de codificar (escrever) e a decodificar (ler) (SOARES, 2004).

Além de uma exigência social, a leitura e a escrita são sinônimos de auto-

estima como podemos observar nos relatos de Elias, 31; Marlene, 44; Aparecida, 55

anos; respectivamente:

Lá no meu serviço já mudô bastante [...] a gente trabaiava mais nervoso. Agora depois que comecei a estudá parece que a gente perde mais a vergonha o medo e já se sente melhor porque vai pra eiscola. Então, eu acho que a escola já me ajudô nisso. Porque a gente que nunca eistudo, a gente parece que fica um tipo tímido num tem assim saída pra muita conversa e agora eu já tenho até mais amigo lá no serviço, já converso mais (Elias, 31). Já deu diferença sabe... por que antes eu escrevia um bilhete pro meu marido... as veiz que eu sai eu dexava um bilhetinho pra ele. E, ele sempre depois tirava sarro de mim, porque eu escrevia conforme eu falava [...] e agora ele mesmo fala nossa você melhorô bastante porque antes quando você escrevia a gente tinha que adivinha o que tava escrito e agora não (Marlene, 44). Sabe o que é você precisa alguma coisa ou uma lista de supermercado e você não sabê e tê que pedi pro filho... Filho, faiz pra mãe e ele dize de novo! Então é bom saber é muito bom ir a um supermercado olhar um preço, uma marca e lê o que está escrito. Que antes se mudava o pacote lá de um produto eu já não sabia se comprava ou não. Agora eu faço tudo isso sozinha (Aparecida, 55).

Para algumas mulheres o que mudou parece ter sido a concepção de trabalho

para a mulher, pois a aluna Maria Aparecida (38 anos) se refere às mudanças no

trabalho da seguinte forma:

Sabe por que já tem mudança? Eu antigamente só pensava em limpeza e agora eu já penso em fazê cursos, né? Eu já penso em outras coisas, mais lá na frente. Essa diferença apareceu primeiro no meu pensamento que começou a mudá. Depois nas coisa do dia-a-dia porque a gente fica mais segura quando vai fazer alguma coisa como preencher uma ficha, né escreve alguma coisa... Então a letra melhoro, a leitura nem se fala... Sabe agora que eu já leio bem... já penso em fazê um curso técnico e daí... é que as coisa vão melhorar mais porque a gente não pode fica só nesse mundinho de faxina, faxina. A gente pode fazê outros tipo de serviço também (Maria Aparecida, 38). O trecho em negrito, destacado nesta fala, é enfatizado também por Marlene

(44 anos) e Aliete (45 anos), respectivamente:

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O estudo abre a mente da gente pro mundo... daí a gente fica mais esperta e tamém meio crica, né.... mais, o legal... daí é que a gente segue a cabeça da gente e num fica tipo assim... maria vai com as outra, né? E quem que faiz isso? É a iscola, porque as otras coisa tipo... a TV, ichiii, só bota na cabeça da gente coisa que num presta tipo assim... ah! se tive o celular num sei o que você é bacana o se fuma tal cigarro você é o tal, sabe assim... Então na minha cabeça a iscola mudô isso... mudô o meu pensamento (Marlene, 44). O estudo serve pra mim melhorá mais porque o estudo abre a mente da gente. Lá no meu serviço o meu istudo já tá ajudando assim... porque lá é tudo cheio de tecnologia, a dona da loja vive falando, isso é de alta tecnologia aquilo num sei o que. Agora ela colocou lá um alarme na loja e daí falo pra mim: Você tem o pânico. E eu fiquei assim... o pânico que eu conheço é de altura de otras coisa assim... eu não sabia do que ela falava e no fim é um aparelhinho que qualquer coisa que acontece é pra aperta o botãozinho que a segurança logo vem. Lá no meu serviço é cheio de alarme essas coisa... que a dona de lá fala que é de alta tecnologia. Daí... era difícil de eu intende aqueles alarme tudo, né... Daí a professora começo fazê umas atividade com calculadora, a gente até teve que compra uma na Casa China. E daí ela começo a leva a gente também lá na informática e daí ela sempre falava que era pra gente prestá atenção nos teclado das coisa... tipo do celular, da calculadora, do computador que eles eram tudo meio parecido e daí eu comecei a prestá mais atenção lá no alarme do serviço e vi que a professora tinha razão num é difícil, só que tem que tê atenção que daí agente vai acostumando e perdendo o medo, né (Aliete, 45).

A aluna Marilda, 30 anos participante desta pesquisa lembra o grande

esforço de memória que precisava fazer por não dominar a leitura, ela fazia

associações entre as cores e os números dos botões do controle-remoto que abria

as cortinas da casa em que trabalhava como empregada doméstica. Relatou ainda,

que ficava trabalhando e repetindo o dia inteiro o recado de algum telefonema que

por ventura precisasse dar aos patrões no fim do dia e que quase perdeu o emprego

quando o patrão descobriu que ela não sabia ler. Hoje segundo ela a escola já

mudou essa realidade, “já deu uma enorme diferença eu já leio bem, anoto recados

e não preciso decorá as coisa pela cor, nem fica inventando jeitos de sabê como que

liga ou desliga as coisa... que na casa que eu trabalho tem um monte de

eletrodoméstico moderno... Agora eu intendo aquele ditado que diz que saber é

poder”.

Com a globalização, e principalmente, com o avanço das novas tecnologias

e as implicações que trazem para a vida cotidiana, saber ler e escrever tornou-se

imprescindível. E ao que tudo indica, também, tem feito as pessoas sentirem

necessidade de escolarização.

Nessa mesma direção a aluna, Aparecida (43 anos) considera que as

mudanças que a escola tem feito em relação ao seu trabalho fazem diferença

quando ela precisa atender um cliente ou o telefone, pois segundo ela até a falar

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direito a escola ensina. “Depois que a gente começa a estudá, a gente aprende a se

porta um poco melhor, aprende a falá direito, fica mais educado e mais gentil com as

pessoas... com o cliente”.

Nesse sentido, HADDAD (2005, p. 50) destaca que os/as alunos/as:

“reconhecem que a escola oferece habilidades básicas para a obtenção posterior de

um conhecimento técnico, além de atribuírem a ela a qualificação social, ou seja,

aprenderam tratar bem as pessoas e a defender seus direitos e discutir vários

assuntos”.

Conforme Saviani (1994, p. 156) a educação e a escola passam a ser

importantes, pois a sociedade contratual baseada nas relações formais traz consigo

a exigência generalizada da escola. Esse autor cita Adam Smith que considerava

que “a educação básica era necessária para os trabalhadores, pois esses se

tornavam mais aptos para viver na sociedade e se inserir no processo produtivo, se

tornavam mais flexíveis, com pensamento mais ágil e mais adequado à necessidade

da vida moderna”.

A fala dos/as entrevistados/as parece revelar essa relação entre a escola e

seus efeitos no/a trabalhador/a e conseqüentemente na realização do trabalho.

Outro ponto na fala da aluna Marilda aponta para a questão de que quem detém o

conhecimento também detém o poder.

Veja em que a escola muda o trabalho da aluna Zelita (50 anos):

O que mudou é que agora eu to trabalhando com hora marcada então fica mais fácil, o cliente não fica esperando, e eu organizo melhor o meu tempo... assim..., eu agendô os horários, e nisso a escola me ajudo. Por que... assim... com os cliente agendado eu já posso tê uma idéia do que vou ganha naquele dia ou naquela semana e daí eu sei, quando a coisa aperta que num tem cliente, se é hora de faze uma promoção de corta cabelo ou de fazê unha, ou de depilação (Zelita, 50). Desse modo a escola, para os alunos e alunas que entrevistamos, tem

ajudado a organizar também o trabalho ao apropriá-los da tecnologia de leitura e

escrita. Essa escola, que por essência é de caráter contraditório, tem sido exigida

pelo mercado de trabalho que requer trabalhadores mais versáteis e com um

pensamento mais abstrato. É solicitada também pelas inovações tecnológicas desse

trabalho e pelas exigências sociais cotidianas, passando a ser reivindicada por

trabalhadores e trabalhadoras quando percebem que dominar este saber pode

significar ampliação da autonomia e do poder.

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5.5 AS PERCEPÇÕES DOS PROTAGONISTAS DESTA PESQUISA SOBRE

TECNOLOGIA.

Evidenciamos neste tópico que a questão da tecnologia perpassou

transversalmente as categorias que emergiram das entrevistas, nas diferentes

dimensões que esse termo, bastante abrangente envolve. Assim, esta questão

esteve presente nos motivos que fizeram homens e mulheres buscar a

escolarização, na questão da pertinência da EJA à vida, nas percepções de gênero

enquanto fato dicotômico e nos impactos da aprendizagem escolar no trabalho.

A leitura das entrevistas com as professor/as e com os alunos/as, na questão

tecnologia, revela que a percepção que esses têm, geralmente está baseada em

artefatos modernos como: televisão, telefone celular, alarmes, controle-remoto e

entre outros o computador, que tem interferido no cotidiano de forma mais intensa.

Essa percepção, enquanto artefato revela um conceito de senso comum em

relação à tecnologia, essa aparente estreiteza no olhar em grande parte, é

direcionada por diferentes mídias que em nome do marketing e do capital, enfatizam

sempre o artefato lançado hoje como tecnologicamente moderno.

O produto lançado ontem já é considerado obsoleto, pois, é preciso vender

sempre mais e qualquer argumento que agregue a palavra tecnologia parece estar

imune à contestação. Isso ocorre porque a sociedade contemporânea capitalista e

globalizada mudou as necessidades humanas.

A tecnologia desenvolvida historicamente sempre foi fruto das necessidades

humanas, mas a grande diferença com a sociedade globalizada é que se criam as

necessidades antes de se criar ou inventar novas tecnologias. A essa tecnologia

precisamos dirigir a crítica, pois estamos rodeados por artefatos tecnológicos e

precisamos saber, criticamente quando, como, para quê e por que usá-los ou não

(HIDALGO e CARVALHO, 2005).

O computador é o artefato tecnológico mais referenciado pelos/as

protagonistas dessa dissertação e tem interferido no dia-a-dia da escola. Se, por um

lado, sob a ótica do professor e das professoras todas as escolas estão equipadas

com laboratórios de informática, softwares, impressoras e outros equipamentos,

como os próprios docentes afirmaram: “as escolas da Prefeitura de Curitiba têm uma

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boa infra-estrutura”, por outro lado, a maioria dos/as entrevistados/as disse que

sente dificuldade em trabalhar com os artefatos tecnológicos presentes na escola, e

que os/as alunos/as têm cobrado essa aprendizagem, principalmente em relação ao

computador.

Nesse sentido, alguns comentários do/as professor/as P1, P4 e P6,

respectivamente comprovam essa análise:

[...] aqui entra a dificuldade do/a professor/a [...] eu sou bastante franco/a com eles eu não levo pro laboratório de informática porque eu não vou poder dar uma boa aula, porque o primeiro probleminha que der lá eu não vou saber resolver. [...] já fiz 4 cursos, de não sei quantas horas, e não consigo entender direito esse negócio (P1). [...] eu gostaria de ter uma boa base pra passar pra eles, assim... bem legal. Mas, eu não tenho formação, nem essa habilidade o que eu sei é o que eu uso, sabe? É uso meu mesmo” (P4). “pra mim tinha... que ter assim... um curso que desse uma boa base, mas que indicasse ao mesmo tempo como trabalhar os conteúdos pertinentes à EJA, porque não adianta um curso de informática básica, isso até a gente sabe um pouco. O que seria legal de saber é como usar de forma pertinente pra EJA, e que pudesse ser útil no dia-a-dia do meu aluno... acho que... o que eu preciso é de idéias de como trabalhar com o computador” (P6)

Durante a pesquisa era comum ouvirmos do/as professor/as que a poucos

anos atrás o/a aluno/a de EJA não tinha interesse pela tecnologia e, geralmente se

dizia que o trabalho pedagógico tradicional era o que agradava esse aluno/a. É

interessante observarmos como isso vem mudando, não só na percepção do/as

professor/as de modo geral, mas na visão dos/as alunos/as.

O/a professor/a P1 fez a seguinte observação:

Eles estão mais curiosos e ficam: ah! Professora vamo pro laboratório. Então eles têm cobrado. Mesmo a questão do celular quando aparece um, desses mais novos, eles ficam curiosos e querem sabê como funciona. A calculadora que esses dias trabalhei, ficaram surpresos com todas as funções. Então, eles têm essa dificuldade, não têm acesso a muita coisa, mas eles sabem da importância e sabem que têm que saber, principalmente em relação ao computador (P1).

O trecho destacado evidenciou o que na percepção do/da professor/a é

tecnologia para os/as alunos/as. A informática é a linguagem do momento que o

mundo está exigindo e os/as alunos/as da EJA sabem disso e vêem na escola a

possibilidade de acesso.

Destacamos ainda a fala do/a entrevistado/a P4:

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Essa turma que eu tô é mais velha e tá aberta pra isso eles querem... Esse ano eles já me cobraram, essa aula de informática, quando que vai ter? E como que se méxe? Como é que faz pra usá a internet. Então, são conceitos que eles observam né na mídia, entre os filhos, nos Faróis45, essas coisas. E quando chegam na escola eles querem saber, eles querem ter esse contato com a máquina (P4). Mas, eu acho. Eu acho não, eu tenho certeza que isso é porque a visão dos anos que a gente vem passando, que não é de agora que as escolas tem informática. [...] A visão está diferente em função de que se tem o Farol que você pode acessar, que se tem Lan House e tudo isso eles ouvem. Têm filhos, têm netos, têm eles próprios que agora não vão no Farol só pra pegá livro e sim pra pesquisar na internet, né? Então, isso e mais as outras coisas ligadas ao computador que tem no dia-a-dia deles só faz aguçar a vontade de conhecer esta máquina. Então, eles tão pe-din-do (falou pausando as sílabas), pra ir conhecer e é uma turma que eu não tenho nenhum com menos de 30 anos (P4).

É importante frisar que as mudanças tecnológicas que estão ocorrendo,

também, no cotidiano das pessoas além de vantagens e desvantagens requerem

novos conhecimentos e habilidades. Ao que tudo indica isto está interferindo nessa

nova postura dos alunos e das alunas da EJA, pois várias profissões, atualmente

exigem esse conhecimento como apareceu no relato da aluna Maria (25 anos) “tão

pedindo informática pra tudo... pra caixa de tudo que é coisa... você num trabalha

numa lotérica, nem num mercadinho se não conhece pelo menos um poco disso”.

Este fato é confirmado pelo/as professor/as que vêem uma mudança no perfil

desse/a novo/a aluno/a.

Como esta não é uma opinião unânime, o/a professor/a P3 pondera, no caso

de sua turma, “eles têm consciência de que precisam, mas são resistentes, não

entendem que na EJA eles podem aprender usando essas ferramentas”.

Desse modo, podemos perceber que a tecnologia tem causado influência na

escola como um todo. Se por um lado, alguns professores têm encontrado

dificuldades para utilizar a tecnologia disponível na escola, por outro lado, está

existindo nas escolas, com maior freqüência, uma pré-disposição dos/as alunos/as

em ter acesso a esses aparatos tecnológicos.

45 O Farol do Saber, conhecido como Faróis, é uma biblioteca que existe na cidade de Curitiba. Sua forma estrutural é igual à de um Farol onde no térreo funciona uma biblioteca, no piso superior um laboratório de informática com acesso a internet, gratuito para uso da comunidade. Para conhecer mais sobre essa questão sugerimos: ROCHA, Cristina T. da C. A Informação Via Artefatos Tecnológicos-Computacionais nas Comunidades de Prática: Os Faróis do Saber de Curitiba. Curitiba, 2001. Dissertação (Mestrado em Tecnologia), CEFET-PR.

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Os relatos revelam que há um processo de mudança cultural, e podemos

dizer que, também na geração com mais idade. Ao que tudo indica esse fato pode

ser atribuído às tecnologias presentes no dia-a-dia que têm, de certa forma,

obrigado às pessoas a conviver com elas, seja no caixa eletrônico ou na leitora de

preços do supermercado.

As percepções atribuídas à tecnologia por alunos/as referem-se às relações

com a realidade, experiências do mundo do trabalho e do cotidiano levando em

conta o artefato e, portanto, como máquinas modernas: “aqui na escola... o que eu

vejo de tecnologia é o computador a televisão, o rádio, essas coisas”.

No entanto, tecnologia é um termo bastante abrangente e conforme o capítulo

3 dessa dissertação envolve o conhecimento técnico e científico e as ferramentas,

os processos e materiais criados e/ou utilizados a partir de um conhecimento. Assim,

a palavra tecnologia envolve, principalmente, o processo que está inserido em várias

dimensões da sociedade. Tecnologia é, portanto, um processo social (BASTOS,

1998), (CARVALHO, 2003).

Nesses/as autores/as a tecnologia tem como ponto de partida e de chegada o

ser humano em todas as suas dimensões: histórica, sócio-econômica, antropológico-

filosófica e político-cultural.

Dessa forma, o conceito de tecnologia é amplo, e para Carvalho:

Perpassa todas as formações sociais, porque na produção das condições materiais de vida, necessárias a qualquer sociedade, é imprescindível a criação, apropriação e manipulação de técnicas que carrega em si elementos culturais, políticos, religiosos e econômicos, constituintes da concretude da existência social. Deste ponto de vista, tecnologia está intrinsecamente presente tanto numa enxada quanto num computador (CARVALHO, 2003, p. 20).

A tecnologia também foi percebida algumas vezes como arte. Vejamos o que

diz o aluno Ailton (51 anos) e a aluna Zelita (50 anos):

Dessa tecnologia de hoje eu não sei... (Longo Silêncio). Eu sempre lidei com as tecnologia da terra, né... da arte de pranta e muda as coisa, rega e cuida da colheta. [...] mais o que eu sei... é que.... assim.... Hoje, se ocê não subé lê... ocê num faiz tecnologia nenhuma i nem consegue fazê essas coisa de tecnologia nova que eu não sei ti arespondê (AILTON, 51). Eu acho um mundo difícil (Risos) porque sabe cada vez é mais difícil principalmente se você não estudá. Os números são dificil prá... Lá no banco é cartão né. Tem que digitá senha e tudo isso é número, tem que tê agilidade senão, [...] na hora de... Fazê um saque, um depósito! Daí é dificil... [...] Isso é mais difícil no banco... Tem que está enfrentando fila... Tem

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que ficá lá pra podê resolvê as coisa da gente sendo que a gente poderia tá resolvendo sozinho no caixa-eletrônico. E assim... de tecnologia lá no meu trabalho, eu num sei se vou sabê resondê, mas lá tem... Telefone, televisão, secador de cabelo né? Mais eu penso que uma unha decorada como tem hoje nè? Deve ser uma tecnologia. Porque não é qualquer um que sabe fazê. Tem toda uma arte nisso também. Lá no salão eu tenho também secador, alicate, chapinha e as químicas de cabelo. [...] Mais eu acho assim... pode tê a tecnologia que quizé se não sabe usá não adianta nada (ZELITA, 50). Nas falas acima, percebe-se uma concepção de tecnologia vista inicialmente

como máquina. Porém, no decorrer dessas é possível identificar a abrangência do

termo “tecnologia” que pode estar presente desde o processo necessário para se

efetuar um depósito bancário, até ao uso de uma chapinha de cabelo. Tudo é um

processo tecnológico, sendo assim, “a tecnologia está intrinsicamente presente tanto

numa enxada quanto num computador” (CARVALHO, 2003, p. 20).

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6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao longo de sua história, o Brasil tem enfrentado o problema da exclusão

social que gerou grande impacto nos sistemas educacionais. Hoje, milhões de

brasileiros ainda não se beneficiam do ingresso e da permanência na escola, ou

seja, não têm acesso a um sistema de educação que os acolha.

Durante muito tempo, o conceito de Educação de Jovens e Adultos

compreendia pouco mais do que ensinar a “ler e escrever o nome”. Atualmente a

sociedade não concebe mais este pensamento. O grande desafio que uma pessoa

jovem, adulta ou idosa tem pela frente é prosseguir estudando ou estar ligado de

alguma forma à atividade de aprender.

A Educação de Jovens e Adultos é esse continuar, o atualizar-se, o inserir-se

na sociedade como cidadão/a ativo/a e participante. O resultado é uma

complementação da oportunidade de aprendizagem, algo que desafia o que já é

sabido e que instiga à superação deste.

Atualmente, o maior nível de escolaridade costuma ser um fator que aumenta

a possibilidade de obter um trabalho, tanto, que as taxas de desemprego tendem a

diminuir para homens e mulheres que têm mais anos de estudo. No caso das

mulheres, porém, a importância desse fator precisa ser relativizada, uma vez que o

maior grau de escolaridade do sexo feminino – as pesquisas têm apontado, em todo

o país, que as mulheres tendem a estudar mais que os homens – não implica menor

taxa de desemprego para os homens.

A pesquisa que por hora findamos, apontou um significativo número de

mulheres retomando os estudos e indica também que na Educação de Jovens e

Adultos de Curitiba elas estão estudando mais do que os homens. Em percentuais o

público feminino matriculado é de 67% e o masculino é de 33%, ou seja, de cada 10

alunos matriculados na Fase I da EJA, aproximadamente, 7 são mulheres e 3 são

homens.

Os resultados apontaram que os motivos para voltar a estudar na EJA são

diferentes para os gêneros feminino e masculino. Os homens retomam os estudos,

incentivados pelas mulheres e suas aspirações referem-se a mudanças em relação

ao trabalho que já desempenham. Para a maioria das mulheres retomar os estudos

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significa “comprar uma briga por dia”. Em geral, encontram pouco ou nenhum

incentivo para prosseguir os estudos e suas aspirações se refere à mudança em

relação ao trabalho que desenvolvem, pois, a grande maioria está no trabalho

informal dos serviços domésticos. Assim, as expectativas dessas mulheres estão

envoltas na possibilidade de fazer cursos profissionalizantes e de mudar de

profissão, portanto, de ter um trabalho valorizado e reconhecido socialmente.

Destacamos a prevalência do trabalho como uma categoria fundamental na

vida social das pessoas e para a sobrevivência do ser humano. No caso da EJA, ela

proporciona melhores condições para isso, colaborando para que as pessoas que

não têm condições de atender as exigências do mercado de trabalho, que é cada

vez mais competitivo e discriminatório, tenham alguma esperança e chance de não

ficarem à margem da exclusão social.

Dessa forma, podemos considerar que a EJA, ainda é um espaço no qual as

desigualdades de gênero e a herança do poder masculino se manifestam. É

importante registrar que as relações de gênero, no caso deste universo pesquisado,

apontam uma pré-disposição à mudança, pois, se observa que os padrões

masculino e feminino independentemente de estarem atrelados a um ou outro

gênero, ora se juntam ora transitam, ora se mostram dicotomizados. Esse fato

demonstra ser necessário instigar para a discussão de gênero, e, nesse caso,

sugerimos que o/a professor/a deve estar preparado/a para assumir esse papel.

Com relação à pertinência da EJA para a vida de homens e mulheres os

resultados revelaram que esta cumpre algumas das exigências sociais fundamentais

ao empoderar os sujeitos com a tecnologia da leitura e da escrita. Portanto, tornar-

se alfabetizado significa adquirir uma tecnologia, a de codificar (escrever) e a de

decodificar (ler) na busca do letramento para o exercício das práticas sociais de

leitura e escrita que circulam na sociedade em que se vive conjugando-as com as

práticas sociais de interação oral (SOARES, 2004).

Conforme Bastos (1997) controlar a tecnologia em vez de ser controlado por

ela é a grande questão. O controle da tecnologia da leitura e da escrita possibilita a

inclusão dos gêneros na sociedade. Com isso, faz homens e mulheres sentirem-se

cidadãos e cidadãs de fato, participantes da sociedade, portanto, sujeitos com auto-

estima.

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Sobre as relações de gênero existentes no espaço escolar, da EJA na Fase I,

os resultados da pesquisa mostram que este é um reduto de maioria feminina tanto

entre discentes quanto docentes. As alunas se vêem como mais interessadas,

persistentes, com vontade de evoluir e atribuem a elas melhor desempenho na

aprendizagem. Esses fatos são corroborados por alunos e principalmente pelas

professoras, com a ressalva de que nos conteúdos que envolvem cálculos

matemáticos, referentes ao âmbito público, são os homens que se destacam.

A significativa participação feminina na EJA foi atribuída ao fato de estarem, a

seu modo, fazendo uma pequena revolução e tomando consciência de que podem

mais. Reconheceram a dificuldade que os homens têm de freqüentar uma turma

onde a maioria é de mulheres e apontam a falta de atenção destes, como principal

fator que interfere em seu desempenho. Sobre a pouca presença do gênero

masculino, neste nível de ensino, consideraram que estes tiveram mais

oportunidades de estudar, pois os pais não somente permitiam como incentivavam

os filhos homens.

Para o gênero feminino seu papel na sociedade, em relação ao trabalho na

esfera pública, vem mudando. No entanto, ainda há uma preferência do mercado de

trabalho pelos homens e esses ocupam melhores posições com registro em carteira

profissional. A dicotomia dos papéis entre homens e mulheres ainda se faz

presente, principalmente em relação à divisão sexual das tarefas domésticas e dos

cuidados com os/as filhos/as, que não acontecem de forma igualitária, isto é,

sobrecarga sobre as mulheres.

Os homens se vêem como mais desorganizados, tímidos e atribuem a

predominância do gênero feminino na EJA ao fato de que eles têm mais vergonha

de voltar a estudar. Consideraram que as mulheres estão ocupando mais o espaço

público em relação ao trabalho e ao estudo. Ao mesmo tempo em que indicaram

que as coisas não precisam ser mais do modo tradicional nas entrelinhas e, por

vezes, os silêncios deixaram transparecer que enquanto sujeitos há uma

desestrutura de suas identidades. Assim, é urgente e necessário rever o papel de

provedor que histórica e culturalmente a sociedade tem imposto ao gênero

masculino.

Nesse contexto, é pertinente lembrar, como afirma Simião (2000, p. 1), que

“a sociedade impõe certos papéis para os homens e outros para as mulheres e que

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vão determinar a forma como homens e mulheres se vêem e como se relacionam

uns com os outros”.

No universo entrevistado pela pesquisa as percepções sobre as relações de

gênero oscilaram entre as manifestações tradicionais marcadas por desigualdades e

relações de poder e as mudanças que vêm acontecendo no âmbito social. Se,

considerarmos essa oscilação, entre os papéis que a sociedade impõe para homens

e mulheres como positiva teremos o momento oportuno para instigar uma discussão

de gênero e a escola será um local fundamentalmente importante para que isso

ocorra.

Por isso, essa dissertação pretende fazer um convite à reflexão sobre como

nesse modelo de sociedade neoliberal capitalista, a mulher trabalhadora, com pouca

escolaridade, tem assumido também, não só o papel de provedora do lar, em geral

em serviços domésticos, mas como vem conquistando ao longo do tempo o seu

direito ao regresso escolar. Este regresso, essa conquista, tem sido visto pelas

próprias mulheres e pelas professoras como uma emancipação.

Queremos enfatizar que é importante perceber estas conquistas e que não

se trata de substituir o poder masculino por poder feminino, mas sim, modificar a

maneira de se pensar tanto do homem quanto da mulher, na busca de relações mais

igualitárias, portanto, mais justas para ambos. Essa é a perspectiva relacional de

gênero que, diferente da dicotômica, elimina a oposição e privilegia a relação.

Porém, enquanto o homem e a mulher não assumirem novos modelos de

relações de gênero, não estiverem conscientes da importância de não terem

previamente definido o papel que cada um deve desempenhar, seja no âmbito da

esfera pública ou da esfera privada, dificilmente haverá consenso para enfrentar as

mudanças que estão acontecendo nas relações sociais do mundo. Para que esse

enfrentamento seja mais fácil o papel de cada um deve ser definido de acordo com

as possibilidades e disponibilidades do momento (CARVALHO, 2002).

Assim, sugerimos aos profissionais da educação discutir e incorporar as

relações de gênero em suas práticas cotidianas, e nesse sentido procurar

capacitações, fazer grupos de estudos sobre este tema e incluí-lo, não somente na

EJA, mas em todos os níveis de ensino, formando cidadãos e cidadãs conscientes

com a questão.

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Nesse sentido, a educação e, portanto os que lidam com ela precisam, “estar

afinados para que sejam capazes de ver, ouvir, sentir as múltiplas formas de

constituição dos sujeitos implicadas na concepção, na organização e no fazer

cotidiano escolar”. A escola deixa suas marcas nos sujeitos, sendo impossível

pensar nesta instituição sem que se lance mão das reflexões sobre as construções

sociais e culturais de masculino e feminino (LOURO, 2001, p.59-89).

Em relação à aprendizagem escolar e o trabalho a EJA tem colaborado para

que os/as alunos/as organizem o cotidiano do trabalho ao proporcionar-lhes a

tecnologia da leitura e da escrita, o que lhes possibilita a ampliação da autonomia e

do poder. Isso significa que mesmo no início da escolaridade a aprendizagem causa

impactos no trabalho de homens e mulheres tanto na esfera pública quanto na

esfera privada.

Sob nosso olhar a tecnologia perpassou transversalmente todas as categorias

que emergiram das entrevistas, nas múltiplas dimensões e significados que esse

termo abrangente pode envolver. Portanto, a tecnologia esteve presente nos

motivos que fazem os/as alunos/as retornar à escola, pois é pertinente à vida e ao

mundo de hoje; nas percepções de gênero enquanto fato dicotômico, pois os

artefatos vistos como tecnológicos, em geral, para os homens estão na esfera

pública e para as mulheres na esfera privada e, enquanto tecnologia para o

letramento, causa impactos no trabalho tanto do gênero feminino quanto do gênero

masculino.

Mas, a questão da tecnologia foi percebida pela maioria dos/as protagonistas

dessa pesquisa apenas enquanto artefato moderno, ou seja, máquinas. Quando

os/as alunos/as se referiram às tecnologias presentes no cotidiano do trabalho

algumas falas revelaram uma transição entre tecnologia enquanto artefato moderno

e tecnologia, numa perspectiva mais abrangente, enquanto arte.

Entretanto, de forma mais intensa, o computador foi o artefato tecnológico

mais referenciado. Pela expectativa que demonstraram em ter acesso a essa

tecnologia presente na escola foi possível perceber que os/as alunos/as depositam

nesse conhecimento tecnológico uma esperança de mudar sua condição sócio-

econômica, quando estabelecem uma relação direta entre informática, estudo,

qualificação e trabalho.

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A educação tecnológica conforme Bastos (1998) é uma das possíveis

alternativas para que todos tenham acesso aos benefícios da tecnologia. Ao que

tudo indica os alunos e as alunas da EJA estão sentindo a necessidade de ter

acesso a estes benefícios.

Ao assumir novos papéis a escola precisa construir a sabedoria com senso

crítico desenvolvendo a capacidade de “leiturização do mundo” e as relações de

gênero devem ser parte constitutiva deste processo de formação humana, porque o

processo tecnológico que envolve as questões de gênero altera a maneira de ver o

mundo, marcada por teorias, métodos e aplicações. A educação é assim um

exercício de aprendizagem que significa ruptura nos segredos do saber fazer, que

exige compreensão e interpretação dos artefatos (BASTOS, 2003).

Portanto, diante desses fatos é preciso pensar como este ideal pode se tornar

realidade, mediante a definição e implementação, também de políticas públicas que

priorizem as relações de gênero e, mais do que nunca, aproveitar este momento

político onde o governo federal, como há muito tempo não acontecia, tem dado

significativa importância para a Educação de Jovens e Adultos.

Por isso, é hora de participarmos dos Fóruns regionais de EJA, do EPEJA

(Encontro Paranaense de Educação de Jovens e Adultos) e do IX ENEJA (Encontro

Nacional de Educação de Jovens e Adultos) que este ano acontece em setembro no

Paraná, discutir e propor políticas públicas que de fato interessem a essa

modalidade de ensino.

Durante as encruzilhadas dessa pesquisa nos deparamos com diversas

possibilidades que registramos para que outros/as pesquisadores e pesquisadoras

possam desvendar. Sabemos que as publicações nessa área são escassas e, por

vezes, nem sempre pertinentes à realidade que vivenciamos todos os dias em sala

de aula, portanto, apresentamos as seguintes sugestões para futuras pesquisas.

- Defasagem idade/série, no público adolescente da EJA Fase II em Curitiba,

que possui mais homens que mulheres;

- Como estão representados os gêneros no material didático, UT’S (Unidades

Temáticas), utilizados para a EJA, no município de Curitiba;

- Uma análise de questões de gênero presentes nas Políticas Públicas de

Educação do Estado do Paraná poderia contribuir para implementação do debate no

interior das escolas;

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- Acompanhar os egressos da EJA por alguns anos e verificar se suas

expectativas com a escolarização em relação ao trabalho foram atendidas;

- As possibilidades do Ensino Fundamental Supletivo atendido pelo município

de Curitiba atender as expectativas do/da aluno/a de EJA e ser também

profissionalizante;

- A possibilidade de incorporar um projeto de geração de renda para aquelas

pessoas que estão na EJA e que, tendo em vista o atual mercado de trabalho,

mesmo concluindo este nível de escolaridade não estarão dentro das condições de

empregabilidade;

- Quais as políticas que o município tem direcionado à EJA no sentido de

incorporar as relações de gênero;

Estas são algumas das sugestões que ao longo desse percurso de idas e

vindas foram “saltando aos olhos”. Além do estudo feito, somado aos 12 anos de

trabalho efetivo em sala de aula e, portanto, de conhecimento da realidade da EJA.

Essas experiências agora iluminadas pelos resultados do estudo indicam algumas

propostas de possíveis intervenções que venham a acrescentar a política de EJA

com relação a gênero e tecnologia.

- Integração efetiva das esferas municipal, estadual e federal para a

implementação de políticas públicas educacionais no Paraná que leve em

consideração as questões de gênero;

- Concurso específico para professores/as atuarem na Educação de Jovens e

Adultos contribuiria na capacitação dos/as profissionais que atuam nesta

modalidade, pois como sabemos a quase totalidade desses/as professores/as são

RIT e, portanto, não têm um vinculo efetivo com essa modalidade de ensino;

- Integrar a perspectiva de gênero nos materiais didático-pedagógicos da

Educação de Jovens e Adultos da Secretaria Municipal da Educação, nas diferentes

áreas do conhecimento pode contribuir para as relações de gênero mais igualitárias;

- Capacitar o/a professor/a da EJA para estar preparado/a para atender as

necessidades de aprendizagem e inclusão do/a aluno/a portador/a de necessidades

especiais;

- Sensibilizar professores/as da EJA para a importância da temática de gênero

no interior das escolas e de como esta pode trazer benefícios para seus alunos e

suas alunas.

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- Se a tecnologia tem se mostrado uma ferramenta útil no mercado de

trabalho, como apontam alguns/mas alunos/as da EJA em relação ao computador,

implementar nas escolas cursos de informática que atendam essa necessidade de

inclusão digital;

- Incorporar na proposta pedagógica de EJA a perspectiva de gênero e da

educação tecnológica como possível alternativa para que todos/as tenham acesso

aos benefícios da tecnologia;

Ao finalizarmos esta dissertação, fica a sensação de que ela não está

completa, que outros olhares poderiam ter sido contemplados e que, principalmente,

a EJA é muito mais do que descrevemos. Ela é um processo vivo, que alimenta a

esperança de homens e mulheres diariamente, capaz de empoderar e devolver a

auto-estima e que busca uma sociedade mais justa e igualitária, enfim mais humana.

Sabemos que é chegada a hora de por o ponto final, no entanto como diria

Fernando Sabino de tudo ficaram três coisas:

A certeza de que estamos sempre começando

A certeza de que é preciso continuar e

A certeza de que seremos interrompidos antes de terminar...

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APÊNDICE A – INSTRUMENTO PARA ENTREVISTA COM A GERENTE DA

EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS NA SECRETARIA MUNICIPAL DE

EDUCAÇÃO

Roteiro que serviu de base para a indicação e escolha das escolas.

1. O público atendido pela EJA;

2. Em quantas escolas se oferta a EJA em Curitiba; Está modalidade de ensino está

presente em todos os núcleos regionais;

3. O currículo específico para a EJA e a sua prioridade;

4. A questão de gênero na EJA;

5. O currículo prevê o trabalho de gênero na EJA. De que forma isso acontece;

6. Existem dados sobre o número de mulheres na EJA; Há alguma preocupação no

sentido de como as representações de gênero estão presentes no contexto da sala

de aula;

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APÊNDICE B – INSTRUMENTO PARA ENTREVISTA SEMI-ESTRUTURADA COM

AS COORDENADORAS DA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS NOS

NÚCLEOS REGIONAIS

Roteiro que serviu de base para a definição e escolha das escolas para a pesquisa.

1. Identificação:

Núcleo:_________________________________

Sexo:___Formação:_______________________

Tempo de atuação na EJA:_________________

Roteiro que norteou as entrevistas.

1. Escolas atendidas por este núcleo regional; Quantas tem EJA?

2. Em suas visitas às escolas você percebe a presença maior de homens ou

mulheres? A que você atribui esse fato?

3. Existe algum trabalho específico, além do previsto na proposta curricular,

desenvolvido por este núcleo?

4. Como você percebe a utilização de tecnologia nas escolas dessa região?

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APÊNDICE C – ROTEIRO PARA ENTREVISTA COM ALUNOS E ALUNAS DA

EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS.

1. Identificação

Nome:_____________________________________________________

Idade:______Sexo:___Estado civil:_____________________________

Escola:_________________________Período/série que estuda_______

Bairro que mora:________________

Casa própria/cedida/alugada/invasão____________

Quantas pessoas moram na sua casa________

Filhos:_____Idade_______Estudam_______(Que série)_____

2. Onde você nasceu:

( ) Curitiba

( ) outra cidade do Paraná. Qual:___________________

( ) outro Estado fora do Paraná. Qual:_______________

3. Quem sustenta a família:

( ) Homem ( ) Mulher ( ) os dois

4.Você esta trabalhando:

( ) sim ( ) não Em que:__________________________________________

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Com carteira assinada

( ) sim ( ) não

ROTEIRO SEMI-ESTRUTURADO

1. Fale sobre sua vida (antes de ingressar na EJA). Já tinha frequentado antes a

EJA. O que levou você a decidir voltar a estudar, alguém foi contra ou incentivou?

2. Você não estudou antes porque? Que expectativas tem em relação a EJA (o que

espera que mude na sua vida após a EJA)? Na sua opinião o que, poderia ser

melhorado na EJA que ajudaria mais os/as alunos/as?

3. Fale sobre como é a sua rotina diária; Como você concilia trabalho e escola e o

que é mais fácil e o que é mais difícil; Como faz as tarefas da escola e em que

horário?

4. Fale da sua experiência na sala de aula como você se relaciona com os homens e

com as mulheres (você é mais amigo/a dos homens ou das mulheres)? Como você

vê o desempenho dos homens e das mulheres na sala de aula (quem se sai

melhor)? E aqui na sala, a professor/a trata diferente os H e as M? E na escola

como você percebe isso?

5. Já sentiu diferença com o que aprendeu na escola? Como isso se reflete no seu

trabalho?

6. Como você se sente nesse mundo envolto em tecnologia, que cada um diz uma

coisa... Como vê isso no seu trabalho, na rua, na escola, na sua casa, enfim em

todos os espaços de vivência? Isso ajudou na sua decisão de voltar a escola para

aprender? Por quê?

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APÊNDICE D – INSTRUMENTO PARA ENTREVISTA SEMI-ESTRUTURADA COM PROFESSORES/AS QUE TRABALHAM COM EJA

Nome:______________________________________________

Formação:___________________________________________

Tempo de atuação na EJA? _____________________

1. Como você, enquanto professor/a, vê os alunos homens e as alunas mulheres?

2. Em sua turma há mais homens ou mulheres? A que você atribui este fato?

3. Por que você acha que os alunos vêm para a escola? O que eles vem buscar aqui

é diferente para homens e mulheres?

4. Como você percebe o desempenho de homens e de mulheres. Quem se sai

melhor?

5. Que mudanças/inovações ajudariam na melhora da sua atuação como docente?

6. Que mudanças a tecnologia provoca na escola? Como você aborda a questão da

tecnologia no cotidiano da sua turma e do ambiente escolar?

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ANEXO A - RESOLUÇÃO CNE/CEB Nº 1, DE 5 DE JULHO DE 2000

Estabelece as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação e Jovens e Adultos.

O Presidente da Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação, de

Conformidade com o disposto no Art. 9º, § 1°, alínea “c”, da Lei 4.024, de 20 de

dezembro de 1961, com a redação dada pela Lei 9.131, de 25 de novembro de 1995, e

tendo em vista o Parecer CNE/CEB 11/2000, homologado pelo Senhor Ministro da

Educação em 7 de junho de 2000, RESOLVE:

Art. 1º Esta Resolução institui as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação de

Jovens e Adultos a serem obrigatoriamente observadas na oferta e na estrutura dos

componentes curriculares de ensino fundamental e médio dos cursos que se

desenvolvem, predominantemente, por meio do ensino, em instituições próprias e

integrantes da organização da educação nacional nos diversos sistemas de ensino, à

luz do caráter próprio desta modalidade de educação.

Art. 2º A presente Resolução abrange os processos formativos da Educação de Jovens

e Adultos como modalidade da Educação Básica nas etapas dos ensinos fundamental e

médio, nos termos da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, em especial dos

seus artigos 4º, 5º ,37, 38, e 87 e, no que couber, da Educação Profissional.

§ 1º Estas Diretrizes servem como referência opcional para as iniciativas autônomas

que se desenvolvem sob a forma de processos formativos extra-escolares na sociedade

civil.

§ 2º Estas Diretrizes se estendem à oferta dos exames supletivos para efeito de

certificados de conclusão das etapas do ensino fundamental e do ensino médio da

Educação de Jovens e Adultos.

Art. 3º As Diretrizes Curriculares Nacionais do Ensino Fundamental estabelecidas e

vigentes na Resolução CNE/CEB 2/98 se estendem para a modalidade da Educação de

Jovens e Adultos no ensino fundamental.

Art. 4º As Diretrizes Curriculares Nacionais do Ensino Médio estabelecidas e vigentes na

Resolução CNE/CEB 3/98, se estendem para a modalidade de Educação de Jovens e

Adultos no ensino médio.

Art. 5º Os componentes curriculares conseqüentes ao modelo pedagógico próprio da

educação de jovens e adultos e expressos nas propostas pedagógicas das unidades

educacionais obedecerão aos princípios, aos objetivos e às diretrizes curriculares tais

como formulados no Parecer CNE/CEB 11/2000, que acompanha a presente

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Resolução, nos pareceres CNE/CEB 4/98, CNE/CEB 15/98 e CNE/CEB 16/99, suas

respectivas resoluções e as orientações próprias dos sistemas de ensino.

Parágrafo único. Como modalidade destas etapas da Educação Básica, a identidade

própria da Educação de Jovens e Adultos considerará as situações, os perfis dos

estudantes, as faixas etárias e se pautará pelos princípios de eqüidade, diferença e

proporcionalidade na apropriação e contextualização das diretrizes curriculares

nacionais e na proposição de um modelo pedagógico próprio, de modo a assegurar:

I - quanto à eqüidade, a distribuição específica dos componentes curriculares a fim de

propiciar um patamar igualitário de formação e restabelecer a igualdade de direitos e de

oportunidades face ao direito à educação;

II- quanto à diferença, a identificação e o reconhecimento da alteridade própria e

inseparável dos jovens e dos adultos em seu processo formativo, da valorização do

mérito de cada qual e do desenvolvimento de seus conhecimentos e valores;

III - quanto à proporcionalidade, a disposição e alocação adequadas dos componentes

curriculares face às necessidades próprias da Educação de Jovens e Adultos com

espaços e tempos nos quais as práticas pedagógicas assegurem aos seus estudantes

identidade formativa comum aos demais participantes da escolarização básica.

Art. 6º Cabe a cada sistema de ensino definir a estrutura e a duração dos cursos da

Educação de Jovens e Adultos, respeitadas as diretrizes curriculares nacionais, a

identidade desta modalidade de educação e o regime de colaboração entre os entes

federativos.

Art. 7º Obedecidos o disposto no Art. 4º, I e VII da LDB e a regra da prioridade para o

atendimento da escolarização universal obrigatória, será considerada idade mínima para

a inscrição e realização de exames supletivos de conclusão do ensino fundamental a de

15 anos completos.

Parágrafo único. Fica vedada, em cursos de Educação de Jovens e Adultos, a matrícula

e a assistência de crianças e de adolescentes da faixa etária compreendida na

escolaridade universal obrigatória ou seja, de sete a quatorze anos completos.

Art. 8º Observado o disposto no Art. 4º, VII da LDB, a idade mínima para a inscrição e

realização de exames supletivos de conclusão do ensino médio é a de 18 anos

completos.

§ 1º O direito dos menores emancipados para os atos da vida civil não se aplica para o

da prestação de exames supletivos.

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§ 2º Semelhantemente ao disposto no parágrafo único do Art. 7º, os cursos de

Educação de Jovens e Adultos de nível médio deverão ser voltados especificamente

para alunos de faixa etária superior à própria para a conclusão deste nível de ensino ou

seja, 17 anos completos.

Art. 9º Cabe aos sistemas de ensino regulamentar, além dos cursos, os procedimentos

para a estrutura e a organização dos exames supletivos, em regime de colaboração e

de acordo com suas competências.

Parágrafo único. As instituições ofertantes informarão aos interessados, antes de cada

início de curso, os programas e demais componentes curriculares, sua duração,

requisitos, qualificação dos professores, recursos didáticos disponíveis e critérios de

avaliação, obrigando-se a cumprir as respectivas condições.

Art. 10. No caso de cursos semi-presenciais e a distância, os alunos só poderão ser

avaliados, para fins de certificados de conclusão, em exames supletivos presenciais

oferecidos por instituições especificamente autorizadas, credenciadas e avaliadas pelo

poder público, dentro das competências dos respectivos sistemas, conforme a norma

própria sobre o assunto e sob o princípio do regime de colaboração.

Art. 11. No caso de circulação entre as diferentes modalidades de ensino, a matrícula

em qualquer ano das etapas do curso ou do ensino está subordinada às normas do

respectivo sistema e de cada modalidade.

Art. 12. Os estudos de Educação de Jovens e Adultos realizados em instituições

estrangeiras poderão ser aproveitados junto às instituições nacionais, mediante a

avaliação dos estudos e reclassificação dos alunos jovens e adultos, de acordo com as

normas vigentes, respeitados os requisitos diplomáticos de acordos culturais e as

competências próprias da autonomia dos sistemas.

Art. 13. Os certificados de conclusão dos cursos a distância de alunos jovens e adultos

emitidos por instituições estrangeiras, mesmo quando realizados em cooperação com

instituições sediadas no Brasil, deverão ser revalidados para gerarem efeitos legais, de

acordo com as normas vigentes para o ensino presencial, respeitados os requisitos

diplomáticos de acordos culturais.

Art. 14. A competência para a validação de cursos com avaliação no processo e a

realização de exames supletivos fora do território nacional é privativa da União, ouvido o

Conselho Nacional de Educação.

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Art. 15. Os sistemas de ensino, nas respectivas áreas de competência, são co-

responsáveis pelos cursos e pelas formas de exames supletivos por eles regulados e

autorizados.

Parágrafo único. Cabe aos poderes públicos, de acordo com o princípio de publicidade:

a) divulgar a relação dos cursos e dos estabelecimentos autorizados à aplicação de

exames supletivos, bem como das datas de validade dos seus respectivos atos

autorizadores.

b) acompanhar, controlar e fiscalizar os estabelecimentos que ofertarem esta

modalidade de educação básica, bem como no caso de exames supletivos.

Art. 16. As unidades ofertantes desta modalidade de educação, quando da autorização

dos seus cursos, apresentarão aos órgãos responsáveis dos sistemas o regimento

escolar para efeito de análise e avaliação.

Parágrafo único. A proposta pedagógica deve ser apresentada para efeito de registro e

arquivo histórico.

Art. 17 – A formação inicial e continuada de profissionais para a Educação de Jovens e

Adultos terá como referência as diretrizes curriculares nacionais para o ensino

fundamental e para o ensino médio e as diretrizes curriculares nacionais para a

formação de professores, apoiada em:

I – ambiente institucional com organização adequada à proposta pedagógica;

II – investigação dos problemas desta modalidade de educação, buscando oferecer

soluções teoricamente fundamentadas e socialmente contextualizadas;

III – desenvolvimento de práticas educativas que correlacionem teoria e prática;

IV – utilização de métodos e técnicas que contemplem códigos e linguagens apropriados

às situações específicas de aprendizagem.

Art. 18. Respeitado o Art. 5º desta Resolução, os cursos de Educação de Jovens e

Adultos que se destinam ao ensino fundamental deverão obedecer em seus

componentes curriculares aos Art. 26,

27, 28 e 32 da LDB e às diretrizes curriculares nacionais para o ensino fundamental.

Parágrafo único. Na organização curricular, competência dos sistemas, a língua

estrangeira é de oferta obrigatória nos anos finais do ensino fundamental.

Art. 19. Respeitado o Art. 5º desta Resolução, os cursos de Educação de Jovens e

Adultos que se destinam ao ensino médio deverão obedecer em seus componentes

curriculares aos Art. 26, 27, 28, 35 e 36 da LDB e às diretrizes curriculares nacionais

para o ensino médio.

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Art. 20. Os exames supletivos, para efeito de certificado formal de conclusão do ensino

fundamental, quando autorizados e reconhecidos pelos respectivos sistemas de ensino,

deverão seguir o Art. 26 da LDB e as diretrizes curriculares nacionais para o ensino

fundamental.

§ 1º A explicitação desses componentes curriculares nos exames será definida pelos

respectivos sistemas, respeitadas as especificidades da educação de jovens e adultos.

§ 2º A Língua Estrangeira, nesta etapa do ensino, é de oferta obrigatória e de prestação

facultativa por parte do aluno.

§ 3º Os sistemas deverão prever exames supletivos que considerem as peculiaridades

dos portadores de necessidades especiais.

Art. 21. Os exames supletivos, para efeito de certificado formal de conclusão do ensino

médio, quando autorizados e reconhecidos pelos respectivos sistemas de ensino,

deverão observar os Art. 26 e 36 da LDB e as diretrizes curriculares nacionais do ensino

médio.

§ 1º Os conteúdos e as competências assinalados nas áreas definidas nas diretrizes

curriculares nacionais do ensino médio serão explicitados pelos respectivos sistemas,

observadas as especificidades da educação de jovens e adultos.

§ 2º A língua estrangeira é componente obrigatório na oferta e prestação de exames

supletivos.

§ 3º Os sistemas deverão prever exames supletivos que considerem as peculiaridades

dos portadores de necessidades especiais.

Art. 22. Os estabelecimentos poderão aferir e reconhecer, mediante avaliação,

conhecimentos e habilidades obtidos em processos formativos extra-escolares, de

acordo com as normas dos respectivos sistemas e no âmbito de suas competências,

inclusive para a educação profissional de nível técnico, obedecidas as respectivas

diretrizes curriculares nacionais.

Art. 23. Os estabelecimentos, sob sua responsabilidade e dos sistemas que os

autorizaram, expedirão históricos escolares e declarações de conclusão, e registrarão

os respectivos certificados, ressalvados os casos dos certificados de conclusão emitidos

por instituições estrangeiras, a serem revalidados pelos órgãos oficiais competentes dos

sistemas.

Parágrafo único. Na sua divulgação publicitária e nos documentos emitidos, os cursos e

os estabelecimentos capacitados para prestação de exames deverão registrar o

número, o local e a data do ato autorizador.

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Art. 24. As escolas indígenas dispõem de norma específica contida na Resolução

CNE/CEB 3/99, anexa ao Parecer CNE/CEB 14/99.

Parágrafo único. Aos egressos das escolas indígenas e postulantes de ingresso em

cursos de educação de jovens e adultos, será admitido o aproveitamento destes

estudos, de acordo com as normas fixadas pelos sistemas de ensino.

Art. 25. Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação, ficando revogadas as

disposições em contrário.

FRANCISCO APARECIDO CORDÃO

Presidente da Câmara de Educação Básica