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Maria Antonia Malajovich / Guias de atividades Biotecnologia: ensino e divulgação http://www.bteduc.bio.br Guia 69 EXTRAÇÃO DE DNA (2) A EXTRAÇÃO DE DNA Muitas pesquisas de Biologia Molecular começam com a extração de ácidos nucleicos. A lise celular libera as moléculas em uma fase aquosa que é separada dos restos celulares por centrifugação. As proteínas são removidas da fase aquosa por solventes orgânicos (fenol, clorofórmio). O DNA, que permanece na fase aquosa, é precipitado com etanol e, posteriormente, purificado e suspendido em um buffer adequado. A existência de kits comerciais tem mudado a rotina de muitos laboratórios. Nos kits, os solventes orgânicos são substituídos por filtros que retém o DNA, em condições de concentração salina elevada. A eluição do DNA retido no filtro ocorre em baixa concentração salina. A PRÁTICA NO LABORATÓRIO DE ENSINO Por alguma razão que nos escapa, a extração de DNA é uma atividade que entusiasma a alguns e decepciona a outros. Provavelmente, as diferenças de opinião tenham mais a ver com a personalidade dos alunos e suas fantasias que com a atividade em si. As etapas possíveis no laboratório de ensino são as seguintes: 1. Trituramento do tecido, para separar as células. 2. Lise das membranas celulares com detergente, em uma solução salina, para liberar os ácidos nucleicos e as proteínas. 3. Digestão das proteínas por ação enzimática de proteases (Opcional). 4. Precipitação com etanol gelado. O DNA é solúvel em álcool, mas torna- se insolúvel na presença de sal (NaCl), porque o sódio neutraliza a carga negativa dos grupos fosfatos. O etanol formará uma camada na superfície por ser menos denso que a solução aquosa. 5. Observação de agregados moleculares, de consistência mucoide, na interface entre a solução aquosa e o álcool. Os agregados moleculares obtidos são uma mistura em proporção variável de ácidos nucleicos, proteínas e pectina, um carboidrato presente na lamela intercelular e no vacúolo das células vegetais. BIBLIOGRAFIA MADDEN D. Discovering DNA. Science in School 1: Spring 2006. http://www.scienceinschool.org. GENETIC SCIENCE LEARNING CENTER. How to extract DNA from anything living. http:// learn.genetics.utah.edu

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Page 1: 69 Extração de DNA

Maria Antonia Malajovich / Guias de atividades

Biotecnologia: ensino e divulgação

http://www.bteduc.bio.br

Guia 69

EXTRAÇÃO DE DNA (2)

A EXTRAÇÃO DE DNA

Muitas pesquisas de Biologia Molecular começam com a extração de ácidos nucleicos. A lise celular

libera as moléculas em uma fase aquosa que é separada dos restos celulares por centrifugação. As

proteínas são removidas da fase aquosa por solventes orgânicos (fenol, clorofórmio). O DNA, que

permanece na fase aquosa, é precipitado com etanol e, posteriormente, purificado e suspendido

em um buffer adequado.

A existência de kits comerciais tem mudado a rotina de muitos laboratórios. Nos kits, os solventes

orgânicos são substituídos por filtros que retém o DNA, em condições de concentração salina

elevada. A eluição do DNA retido no filtro ocorre em baixa concentração salina.

A PRÁTICA NO LABORATÓRIO DE ENSINO

Por alguma razão que nos escapa, a extração de DNA é uma atividade que entusiasma a alguns e

decepciona a outros. Provavelmente, as diferenças de opinião tenham mais a ver com a

personalidade dos alunos e suas fantasias que com a atividade em si.

As etapas possíveis no laboratório de ensino são as seguintes:

1. Trituramento do tecido, para separar as células.

2. Lise das membranas celulares com detergente, em uma solução salina,

para liberar os ácidos nucleicos e as proteínas.

3. Digestão das proteínas por ação enzimática de proteases (Opcional).

4. Precipitação com etanol gelado. O DNA é solúvel em álcool, mas torna-

se insolúvel na presença de sal (NaCl), porque o sódio neutraliza a carga

negativa dos grupos fosfatos. O etanol formará uma camada na superfície por

ser menos denso que a solução aquosa.

5. Observação de agregados moleculares, de consistência mucoide, na

interface entre a solução aquosa e o álcool.

Os agregados moleculares obtidos são uma mistura em proporção variável de ácidos nucleicos,

proteínas e pectina, um carboidrato presente na lamela intercelular e no vacúolo das células

vegetais.

BIBLIOGRAFIA

MADDEN D. Discovering DNA. Science in School 1: Spring 2006.

http://www.scienceinschool.org.

GENETIC SCIENCE LEARNING CENTER. How to extract DNA from anything living.

http:// learn.genetics.utah.edu

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EXTRAÇÃO DE DNA (2) / PROCEDIMENTO BÁSICO COM ERVILHA

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Etanol gelado

ATIVIDADE PRÁTICA

OBJETIVO

Extrair DNA mediante um procedimento simples.

MATERIAIS

Um pacote de ervilha seca, sal grosso, detergente, água fria, liquidificador, coador, béquer,

amaciante de carne com protease (papaína), etanol gelado, tubos de ensaio e grade (substituíveis

por frascos pequenos ou copos), 1 pipeta ou proveta, vareta de madeira ou agulha de crochet.

O etanol deve ser colocado no congelador, em frasco fechado, pelo

menos um dia antes da realização da prática.

PROCEDIMENTO

As membranas celulares e nucleares das células de ervilha são desagregadas com detergente, em

solução salina, liberando os ácidos nucleicos que precipitam com a adição de etanol gelado.

1. Bater no liquidificador 100 ml de ervilha seca, uma pitada de sal grosso e 200 ml de água fria,

por 15 a 20 segundos.

2. Coar a “sopa de ervilha rala” obtida anteriormente e descartar os restos de ervilha. Continuar o

procedimento com a fração líquida filtrada.

3. Acrescentar 2 colheres, das de sopa, de detergente líquido. Misturar suavemente.

4. Aguardar 5 a 10 minutos. Durante esse tempo colocar em cada tubo, ou em cada frasco, uma

pitada de amaciante de carne.

5. Distribuir a mistura nos tubos ou nos frascos (1/3 da capacidade do recipiente escolhido).

6. Acrescentar um volume equivalente de etanol 950gelado.

Esta etapa é crítica, deve-se inclinar levemente o tubo e,

muito devagar, deixar escorrer o etanol sobre o líquido de

maneira a formar uma segunda camada por cima da

mistura.

7. Aguardar 10 minutos sem misturar as camadas e

observar o DNA que precipita na interface das duas e

sobe até a superfície.

8. Retirar o DNA com uma vareta de madeira ou uma agulha

de crochet.

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NOSSO COMENTÁRIO

De todos os protocolos analisados e testados, este do Genetic Science Learning Center é o nosso

preferido, porque além de apresentar um procedimento simples, utiliza como fonte de DNA um

material barato, fácil de encontrar em qualquer época do ano.

Os primeiros protocolos de extração de DNA que foram desenvolvidos para serem aplicados em

laboratórios de ensino, utilizavam fígado e timo como fonte de DNA. Com a disseminação da

doença de Creutzfeldt-Jacob (doença da vaca louca), razões de biossegurança invalidaram o uso de

órgãos animais, que foram substituídos por outras fontes, de origem vegetal. Contudo, as células e

tecidos vegetais contém pectina, um polissacarídeo que precipita com etanol, assim como o DNA

em solução salina.

OS AGREGADOS MOLECULARES NÃO SÃO DE PECTINA

Para diferenciar a pectina e o DNA nos agregados moleculares obtidos, investigou-se a presença do

polissacarídeo na ervilha seca. Esta foi triturada e misturada com a quantidade de água prevista no

protocolo. Uma vez coada obteve-se uma “sopa” rala, da qual foram separadas duas alíquotas.

A primeira foi misturada a uma quantidade igual de etanol, agitada e deixada em repouso para

decantar. O teste do álcool para a determinação do teor de pectina deve ser interpretado como a

seguir:

A aparição de um precipitado gelatinoso e firme é sinal de bastante pectina (+++).

Um precipitado mais ou menos gelatinoso, que se rompe por agitação leve, corresponde a um

teor médio (++).

Um precipitado filamentoso granulado corresponde a baixo teor de pectina (+).

Na segunda alíquota, acrescentaram-se o sal e o detergente para completar a extração do DNA

segundo o protocolo.

Os resultados podem ser vistos na Figura 1. A comparação entre ambas as fotos indica que os

filamentos observados na imagem à direita seriam de DNA e não de pectina. A confirmação

dependeria do resultado de um tratamento desses filamentos com DNAse, um teste que está fora

de nossas possibilidades.

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EXTRAÇÃO DE DNA (2) / PROCEDIMENTO BÁSICO COM ERVILHA

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Teste de pectina (baixo teor) Extração de DNA

Pectina DNA

Figura 1: Extração de DNA de ervilha seca.

A AÇÃO DE DIFERENTES DETERGENTES

Muitos dos protocolos disponíveis recomendam o uso de SDS (dodecilsulfato sódico). Este não é

um detergente usual, de modo que nos experimentos foram utilizados produtos do supermercado.

Comparou-se a eficiência de dois agentes detergentes: o lava louças Limp e o lava roupas Ariel

líquido. Como este último contém enzimas (proteases, lipases e celulases), omitimos a adição de

protease no procedimento correspondente.

A Figura 2 mostra a extração de DNA realizada satisfatoriamente com os dois produtos. Com Ariel,

o resultado foi más rápido.

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Figura 2: Extração de DNA de ervilha seca com diferentes agentes detergentes.

O TRATAMENTO COM CALOR

Outra recomendação encontrada nos protocolos que circulam na Internet é que a mistura “sopa” +

sal + detergente seja colocada no banho Maria a 55-600C, de modo a inativar as enzimas

presentes e favorecer a liberação do DNA. Em outros protocolos, a temperatura do banho é de

700C. Em todos eles, uma vez transcorridos 15 minutos exatos, a mistura deve ser transferida a

um banho de gelo, para evitar a degradação do DNA. Esfriada a mistura, acrescenta-se a protease.

Os resultados da extração de DNA de ervilha seca com e sem tratamento com calor podem ser

visualizados na Figura 3. O protocolo do GSLC (Genetic Science Learning Center), que não

contempla o tratamento com calor, nos permitiu extrair DNA da ervilha. Acrescentando o

tratamento com calor ao mesmo protocolo, obtiveram-se aglomerados gelatinosos de pectina.

A ervilha contém pectina. Uma extração rápida a temperatura ambiente libera DNA, mas uma

extração mais demorada a uma temperatura alta (600 C) durante 15 minutos provocaria a

gelatinização da pectina, gerando a nuvem turva que se observa nas três repetições do

experimento.

Em função dos resultados anteriores, não vemos nenhuma necessidade de complicar o

procedimento. Para alcançar objetivos didáticos, o tratamento com calor resulta supérfluo.

Teste de pectina Extração com o detergente Limp Extração com Ariel líquido

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Figura 3: Extração de DNA de ervilha seca.

Os três frascos à esquerda, correspondem a extrações sem tratamento de calor, os três frascos à

direita a extrações com tratamento de calor.

A OBSERVAÇÃO MICROSCÓPICA

Recomendada em vários protocolos e frequentemente solicitada pelos alunos, a observação

microscópica dos filamentos resulta, obviamente, um fiasco. Nunca falta alguém que acredite poder

ver a dupla hélice e não adianta falar em nanômetros. A decepção permanece.

MEDIDAS DE MASSA SECA

O DNA extraído pode ser colocado a secar em um papel de filtro ou em um pedaço de papel de

alumínio. A massa pode ser calculada como

Massa (papel + DNA) – Massa (papel) = Massa DNA

A menos de contar com uma balança adequada, o procedimento de secagem e pesagem do DNA

não subministra dados interessantes.

Sem tratamento de calor Com tratamento de calor

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EXTRAÇÃO DE DNA (2) / PROCEDIMENTO BÁSICO COM ERVILHA

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COMO MONTAR UM PROJETO

Comparar os resultados da extração de DNA de ervilha com os de outros grãos (lentilha, por

exemplo).

Comparar os resultados da extração de DNA de ervilha seca, de ervilha congelada e de ervilha

enlatada.

Comparar os resultados obtidos com diferentes proteases (suco de abacaxi, líquido para a limpeza

de lentes de contato etc.).

Comparar os resultados obtidos quando se acrescenta a protease junto com o detergente.

Comparar a quantidade de DNA extraído a partir de diferentes fontes.

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