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WEB E CONFLITO AMBIENTAL: A QUESTÃO DA UHE BELO MONTE 1
Geldes de Campos Castro - PPGSA/UFPA - SEMEC
Glaucy Learte da Silva - PPGSA/UFPA Rosemberg Batista de Araújo - PPGSA/UFPA
Sônia Maria Barbosa Magalhães Santos - PPGSA/UFPA
1 Introdução
O gesto de Tuíra, mulher indígena da etnia Kayapó, durante o I Encontro dos Povos do
Xingu, em 1989, na cidade de Altamira (PA), ao encostar um facão no rosto do representante do
governo, evidencia um conflito que se desenhara ainda na década de 1970: a construção Usina
Hidrelétrica de Belo Monte. Esse gesto, certamente, não revela apenas o conflito. Põe às claras a
resistência e a organização, tanto por parte dos atingidos, quanto por parte de indivíduos e grupos
organizados em diversos locais do planeta. Anos mais tarde a resistência assume grandes
proporções e ganha a Web. A construção de sites, perfis em redes sociais e a realização de
campanhas na Internet são a materialização disso.
Partimos da perspectiva de que o conflito em torno da construção da Hidrelétrica de Belo
Monte é um conflito ambiental (FLEURY e ALMEIDA, 2013) e é resultante de um modelo de
desenvolvimento e de governo que se impõe, em detrimento da vida das pessoas e da destruição do
planeta (LEROY, 2010). Dessa forma, procuramos responder à seguinte questão: como esse
conflito envolvendo Belo Monte se evidencia na Web e quais atores emergem no contexto da
resistência e da ação? Nossa hipótese é que no contexto da resistência há uma conformação de redes
sociotécnicas, que se compõem na Web e que dão visibilidade ao conflito, evidenciando a
existência de diversos atores e projetos em disputa.
Objetivando responder a essa questão, a pesquisa centra-se na Campanha “Pare Belo
Monte” realizada pelo Movimento Xingu Vivo para Sempre. A escolha se justifica pelo fato dessa
campanha se desenrolar por um longo período, evidenciando o conflito em suas várias
manifestações. Procuramos fazer uma etnografia da Web (RIFIOTIS, 2016) , de forma particular,
destacando as postagens veiculadas no Twitter , através da busca pela hastag #PareBeloMonte e
seus conteúdos. Esse foi o ponto de partida. Buscamos nesse fazer etnográfico acompanhar os
atores e suas ações (LATOUR, 2012), suas experiências e expectativas.
1 Este artigo faz parte de pesquisa em nível de doutoramento em Ciências Sociais e se situa no âmbito do Grupo de Pesquisas Hidrelétricas e sociedade na Amazônia - HISAM, da Universidade Federal do Pará, com apoio da Fundação Amazônia de Amparo a Estudos e Pesquisas do Pará - FAPESPA.
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Priorizamos as expressões mostradas nas inúmeras fotografias encontradas, uma vez que
estas são registros históricos, documentação e memória. Não é uma técnica complementar, mas um
registro da realidade que captura a atenção do internauta. É construção e exposição de cosmovisões
e cosmopolítica (STENGERS, 2007 e LATOUR, 2007). Não é nossa pretensão, entretanto,
fazermos uma sociologia da imagem, apesar de que certamente não teremos como fugir disso.
Dividimos o texto em três seções: a primeira mostra, ainda que de forma breve, o projeto
Belo Monte, sua construção histórica e os conflitos que se desenharam no percurso. Em seguida,
mapeamos os sites dos principais parceiros do Movimento Xingu Vivo para Sempre para, na seção
seguinte, ver os desdobramentos no Twitter sobre o conflito.
2 Belo Monte: um projeto, muitos conflitos
A hidrelétrica de Belo Monte, no Estado do Pará, traz em sua trilha uma história marcada
por conflitos, resistências e questionamentos. O Estudo de Impacto Ambiental (EIA) finalizou, por
assim dizer, um processo gestado ainda no ano de 1975, com o início dos Estudos de Inventário
Hidrelétrico da Bacia Hidrográfica do Rio Xingu, tendo em vista o aproveitamento hídrico da
região amazônica para fins de geração de eletricidade. Esses estudos foram concluídos no início da
década de 1980, prevendo a construção de 7 barramentos para a produção de 19 mil megawatts
(MW), o que provocaria um alagamento de cerca de 18 mil km2, totalizando 12 terras indígenas
com seus cerca de 7 mil índios (FEARNSIDE, 2011).
Com base nas questões pontuadas acima não fica difícil inferir que um projeto dessa
magnitude fosse alvo de séria oposição. O I Encontro dos povos indígenas do Xingu, em fevereiro
de 1989, em Altamira, no estado do Pará, que reuniu cerca de três mil pessoas, foi expressão disso.
Nesse evento, o gesto da índia Tuíra, encostando o facão no rosto de José Antônio Muniz Lopes, na
ocasião diretor da Eletronorte, como sinal de indignação e advertência, ganhou projeção
internacional, sendo mostrado nas páginas de jornais e noticiários do mundo inteiro, dando maior
visibilidade ao conflito. Na ocasião o nome do complexo era apresentado como Kararaô (grito de
guerra na língua Kaiapó), sendo, nesse entretempo, substituído por Belo Monte (ISA).
Após o Encontro de 1989 não houve continuidade ao projeto de construção da hidrelétrica
de Belo Monte. Seja como consequência das mobilizações contrárias, como advogam os
movimentos sociais, seja como consequência da recessão econômica do fim da década de 1980,
conforme alegam representantes do governo (FLEURY e ALMEIDA, 2013). Isso não significa,
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entretanto, que os trabalhos ficassem estagnados em definitivo. Apenas foram sendo reformulados
de modo a adaptar-se às novas situações.
Em 2008 ocorreu o II Encontro dos Povos do Xingu, na cidade de Altamira, objetivando
debater a respeito dos impactos de Belo Monte. Esse evento teve grande visibilidade, uma vez que
conseguiu reunir representantes de populações indígenas, ribeirinhos, movimentos sociais, experts
e organizações da sociedade civil. Ao final, apresentou como documento a Carta Xingu Vivo para
Sempre, contendo, vários questionamentos em relação ao empreendimento. Mais de 100 signatários
referendaram a carta, sendo que mais da metade deles é composta de representantes de nações
indígenas. A partir desse evento dá-se a criação do Movimento Xingu Vivo para Sempre (MXVPS),
principal opositor local da obra, com braços em várias regiões.
Uma particularidade do processo envolvendo Belo Monte foi a repercussão gerada na
Internet. As ações realizadas em diferentes regiões, dentro e fora do país, são compartilhadas nas
redes sociais, muitas em tempo real, seja em perfis pessoais, seja em páginas criadas tendo em vista
difundir essas ações, implementar debates ou replicar informações veiculadas na rede mundial de
computadores.
Organizações parceiras do Movimento Xingu Vivo para Sempre abrem em seus sites
institucionais seções especiais dedicadas à questão Belo Monte (hotsites ). Fornecem informações
sobre a obra, expõem documentos diversos, tanto aqueles emitidos por órgãos governamentais,
quanto os emitidos por organizações e movimentos. Apresentam as populações atingidas, tais como
ribeirinhos, indígenas e moradores das áreas urbanas afetadas. Ampliam o debate em suas páginas
ou nas redes sociais ligadas a essas instituições. Fazem um trabalho de tradução, de modo que dados
disponibilizados em “dialeto” técnico cheguem em linguagem assimilável aos destinatários.
Em outros dispositivos da Internet, como o canal de vídeos do YouTube e Twitter , são
replicadas as campanhas contrárias ao empreendimento, sendo favorecidas pelas características dos
serviços: as ações são atualizadas sempre que são feitos novos acessos e relembradas sempre que
um novo comentário é postado. A exemplo disso podemos citar o caso da hashtag #PareBeloMonte
que foi mencionada mais de 10 mil vezes. Na seção a seguir, trataremos mais detalhadamente esse
aspecto.
3 Internet e amplificação das vozes dissonantes
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Como dito acima, Belo Monte encontra grande repercussão na Web: Facebook, YouTube,
Twitter e os sites de parceiros e apoiadores do MXVPS são os principais dispositivos utilizados
para que as resistências a Belo Monte sejam mostradas. Mas, além desses, muitas outras iniciativas,
seja de indivíduos, seja de grupos, também concorrem para uma coprodução dos debates e para
amplificação das vozes dissonantes.
O ponto de partida foi o Twitter por causa da praticidade de organização em hastags , o que,
de certa forma, torna a pesquisa menos pesada. As hastags geralmente levam a reportagens, como
mostra um estudo coordenado por Kwak (2010) o qual observou que 85% dos retweets eram
manchetes de notícias diversas. Esse estudo considera que o Twitter não é apenas uma rede social,
mas também um novo meio de comunicação (news media ) e que o Ranking por retweets expõe a
influência dessa nova mídia em uma nova perspectiva.
A busca pela hastag #PareBelo Monte, ou #StopBeloMonte (sua variação em Inglês),
revelou um grande número de tweets de quatro porta-vozes, ou amplificadores do Movimento, os
quais apresentaremos, de forma breve, a seguir: Instituto Socioambiental (ISA), International
Rivers, Amazon Watch e Interamerican Association for Environmental Defense (AIDA).
3.1 Instituto Socioambiental - ISA
O Instituto Socioambiental se apresenta na seção “quem somos”. Diz que é uma
organização da sociedade civil brasileira sem fins lucrativos, com a finalidade de propor soluções
de forma integrada às questões sociais e ambientais. Seu centro de atuação, define, é a defesa de
bens e direitos sociais relativos ao ambiente, patrimônio cultural e aos direitos humanos e dos
povos. Possui sede em São Paulo (SP) e subsedes em Brasília (DF), Manaus (AM), Boa Vista (RR),
São Gabriel da Cachoeira (AM), Canarana (MT), Eldorado (SP) e Altamira (PA), epicentro da
problemática de Belo Monte.
Em relação a Belo Monte, o site do ISA passou por modificações ao longo do tempo. Antes,
Belo Monte ocupava uma posição bem destacada. Não sendo necessário procurar as informações.
Havia um banner na parte superior indicando logo a posição ocupada por essa questão, ligando
facilmente à página do especial intitulado “A polêmica da usina de Belo Monte”, disponibilizado
em fevereiro de 2003. Posteriormente, esse banner foi substituído por outro, um dossiê sobre Belo
Monte, publicado pelo ISA em junho de 2015
(https://www.socioambiental.org/pt-br/dossie-belo-monte), intitulado “Belo Monte – Não há
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condições para a Licença de Operação ”, com dados atualizados, voltados principalmente para a
Licença de operação - LO.
O especial “A polêmica da usina de Belo Monte”, passou a ser localizado na parte inferior
do site, juntamente com outros 16 especiais mantidos pelo ISA, sendo acessado pelo seguinte
endereço: https://www.socioambiental.org/esp/bm/index.asp. É um informativo sobre a polêmica,
com 14 tópicos sobre a questão: Abertura, noticias, características, localização, histórico, impactos
socioambientais, destino da energia gerada, alternativas, o que dizia a Eletronorte no governo FHC,
o que diz o especialista, o que diz o movimento social, vídeos, condicionantes, para saber mais. O
item notícias e artigos mantem dados de dezembro de 1997 a 16 de janeiro de 2016.
O especial, com foco no Dossiê, evidencia as ações na justiça, destacando a suspensão da
licença de operação de Belo Monte. Afirma que as ações previstas não foram concretizadas,
causando impactos adversos sobre a organização socioeconômica e a autonomia política das
aldeias.
3.2 International Rivers
O site da International Rivers mantém uma seção sobre as campanhas da organização, dentre
as quais há uma sobre Belo Monte. O site é editado em Chinês, Português, Espanhol e Inglês. As
edições dão destaque inicial para as reportagens editadas nas respectivas línguas, dessa forma, a
questão Belo Monte ocupa destaque quando se solicita o idioma Português
(http://www.internationalrivers.org/pt-br/recentes-content-português), aparecendo no item
“Campanhas”, ao lado de “Amazônia Viva”.
Nas versões em outras línguas não se nota o mesmo destaque. Ao clicar no link
(http://www.internationalrivers.org/pt-br/campaigns/belo-monte-dam) tem-se acesso ao especial
Belo Monte em duas línguas: Português e Inglês. Há links para um mapa, uma cartilha de quatro
páginas sobre Belo Monte, ambos datados de 2012, bem como outras informações. Há ainda um
link para o blog, mas na ocasião (09/03/2014) o link levava a uma página inexistente, o que pode
indicar que o blog teria sido desativado.
3.3 Amazon Watch
Com o site publicado apenas em Inglês, a Amazon Watch se apresenta em duas seções
principais: Our Work e About us . Na seção “Our Work ” (http://amazonwatch.org/work), mostra
que mantém campanhas em quatro países: Brasil, Peru, Colômbia e Equador. No Brasil, afirma que
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apoia as comunidades locais na luta pelos direitos humanos fundamentais, bem como os esforços
em preservar os rios e as florestas tropicais da Amazônia.
Na seção “About us ” (http://amazonwatch.org/about), encontramos algumas definições
importantes. Ela se divide em três itens: The Amazon: A Global Treasure , Our Mission e Our
Vision. No primeiro, afirma que as florestas tropicais nos sustentam, pois ajudam a regular o clima
global e manter o frágil equilíbrio da terra. A floresta amazônica, além de ser é a maior, tem a maior
biodiversidade tropical do mundo, abrigando um terço das espécies animais e vegetais do planeta,
ao tempo em que produz um quinto de toda água fresca que flui no planeta. Em “Our Mission ” a
Amazon Watch se define como uma organização sem fins lucrativos fundada em 1996, com a
finalidade de proteger a floresta tropical e os direitos das populações indígenas da bacia amazônica.
Faz parcerias com organizações indígenas e ambientais em campanhas pelos direitos humanos,
responsabilidade social e e preservação dos sistemas ecológicos da Amazônia. No item “Our
Vision ” afirma que vislumbra um mundo no qual a dignidade, valores culturais e diversidade
biológica e a contribuição crítica das florestas tropicais para o sistema de suporte para a vida no
planeta.
Até junho de 2014 o layout do site não mostrava de imediato a seção dedicada a Belo
Monte, sendo necessário fazer uma busca nos menus suspensos. A aba “our work ”, a mostrava as
campanhas ativas da organização, entre elas, Belo Monte
(http://amazonwatch.org/work/belo-monte-dam). O endereço direciona para uma página com
informações sobre Belo Monte. A seção segue com informações detalhadas sobre o Projeto, com
links diversos, referências bibliográficas consultadas, além de ligações externas para as principais
redes sociais.
A campanha Stop the Belo Monte Dam abre com a seguinte manchete: Brazil's Belo Monte
Dam: Sacrificing the Amazon and its Peoples for Dirty Energy . A tela se abre com uma
fotografia, informando créditos de autoria a Christian Poirier, intitulada Traditional fishing in the
Xingu , mostrando um indígena com arco e flecha apontando para o rio, uma referência a um modo
tradicional de vida e dependência ao rio: pesca, água, transporte etc.
Afirma que o governo brasileiro está construindo a terceira maior hidrelétrica do mundo no
rio Xingu, o maior afluente do Amazonas que devastará uma área superior a 1500 quilômetros
quadrados de floresta tropical, causando um deslocamento compulsório de mais de 40 mil pessoas.
O projeto causa um impacto nos modos de vida e subsistência de centenas de ribeirinhos, povos
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indígenas, além das famílias e comunidades do meio urbano. Ressalta que rio Xingu é símbolo da
diversidade cultural e biológica e o lar de cerca de 25.000 indígenas, de 40 diferentes grupos
étnicos.
O especial apresenta também a linha do tempo construída pela International Rivers,
intitulada “A Lifetime of Injustice - the History of the Belo Monte Dam ”. Destaca ainda a situação de
Altamira após o início das obras em 2011, como o aumento populacional, o colapso da saúde e
educação, o aumento da violência e falta de saneamento básico.
Afirma ainda que as populações indígenas, especialmente os Arara e Juruna têm sofrido com
o processo de desintegração cultural, alcoolismo, depressão, divisões internas e conflitos. Além
disso, a construção de barragens impacta na qualidade da água dos rios, comprometendo a
segurança alimentar e da água, uma vez que as populações tradicionais e os indígenas necessitam
das águas do Xingu para beber, banhar, pescar, além do transporte. A campanha Stop Belo Monte
Dam , segundo o site, tem sido conduzida pela Amazon Watch desde 2010, cujos esforços são
direcionados para mostrar a violação dos direitos humanos e do caos ambiental deixado pela
construção da barragem.
3.4 Interamerican Association for Environmental Defense (AIDA)
A Associação Interamericana para a defesa do Ambiente - AIDA - foi fundada em 1988 e se
define como uma organização internacional não-governamental de direito ambiental, que trabalha
além fronteiras para defender os ecossistemas ameaçados, bem como as comunidades que deles
dependem. Afirma que equilíbrio ambiental e direitos humanos não podem ser protegidas dentro
das barreiras políticas das nações individuais. Os 35 países do hemisfério estão unidos sob uma
bandeira ambiental comum. Os problemas internacionais requerem respostas internacionais, e a
AIDA desenvolve estratégias transnacionais para enfrentar os desafios ambientais e os direitos
humanos voltados para o século 21.
No item “Contact Us ” (http://www.aida-americas.org/contact) a AIDA apresenta endereços em
cinco diferentes países: Colômbia, Costa Rica, México, Peru e Estados Unidos. Afirma ainda que a
AIDA pode ser contatada a partir de qualquer uma das dez organizações participantes. Como
parceiros a organização lista os seguintes: Movimento Xingu Vivo; Sociedade Paraense de Direitos
Humanos; Justiça global; International Rivers; Instituto Socioambiental.
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No site da organização, as discussões sobre Belo Monte estão inseridas na categoria
“Human Rights & Environment ”, sendo encontrado no seguinte caminho: Our Work / Human
Rights / The Belo Monte Hydroelectric Dam. Apesar do site ser editado em Inglês e Espanhol, há a
opção de ver a seção de Belo Monte em Português
(http://www.aida-americas.org/our-work/human-rights/belo-monte-hydroelectric-dam). Dá
destaque à polemica em torno da hidrelétrica, enfatizando as questões de direitos humanos. Mostra
que os problemas de estudos de impacto ambiental e social são pouco abrangentes e que os acordos
de compensação não são claros.
Afirma também que a construção trouxe consigo inúmeros impactos, entre os quais se
destacam a perda do acesso a água, alimento, moradia, trabalho e transporte fluvial de milhares de
pessoas, assim como a ausência de processos de consulta e consentimento prévio, livre e informado
às comunidades indígenas afetadas.
O site possui um link que direciona para mais informações sobre Belo Monte
(http://www.aida-americas.org/sites/default/files/projects/belo_monte_fact_sheet_port_16-01-15.pd
f). O endereço mostra um documento de cinco páginas em pdf com timbre da AIDA, intitulado
“Caso Belo Monte, Brasil”. Inicia colocando informações como localização e tamanho da usina.
Afirma que o EIA não é adequado; fala que houve violação ao direito à consulta e ao consentimento
livre, prévio e informado das comunidades indígenas; afirma também que Belo Monte causou e
continuará causando mudanças dramáticas no rio Xingu e nas terras que o rodeiam; que Belo Monte
é um “portão de entrada” para novas barragens no rio; prossegue dizendo que apesar do
descumprimento das condicionantes sociais e ambientais exigidas pela licença ambiental prévia e as
medidas cautelares outorgadas pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), o
Brasil segue avançando com a construção de Belo Monte.
Algumas dessas organizações deixam mais, outras menos clara a relação de parceria com o
MXVPS. De fato, todas fazem alguma relação com o Movimento. Seja construindo hiperligações
entre eles, seja mostrando os trabalhos realizados que de alguma forma envolveram algum tipo de
parceria. Em alguns casos, a relação se mostra ao dar voz aos atores do movimento, destacando a
atuação, história de vida ou a construção de narrativas, o que se dá por meio de produção de vídeos,
fotografias, reportagens e replicação nas redes sociais.
Os parceiros, amplificadores (FRIEDBERG, 1993) ou porta-vozes (AKRICH, CALLON,
LATOUR, 1988), são necessários para a redução da incerteza e para o trabalho de tradução
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(Latour). Percebemos a conformação de uma rede em que diferentes atores se relacionam. Cada
organização dá enfoques de acordo com seus perfis de atuação lançando mão de sua expertise e de
seus experts para construir um contra-discurso aos desafios que se apresentam aos atores. São eles
que, em certa medida, permitem que dados formulados em linguagem técnica chegue ao alcance dos
destinatários - e que aqui não são simples destinatários como podem ser entendidos em uma visão
tradicional de comunicação, mas em uma visão de sociedade em rede (CASTELLS e CARDOSO,
2005) em que os destinatários também são coprodutores da informação.
Há uma relação imbricada cuja formação não se dá apenas entre humanos. Ela se
desenvolve e se expande a partir de uma relação não linear, mas em formato de redes, ao que Latour
(1994) acertadamente comenta: “Mais flexível que a noção de sistema, mais histórica que a de
estrutura, mais empírica que a de complexidade, a rede é o fio de Ariadne destas histórias confusas”
(p. 9). Uma rede mediada e facilitada pela máquina, o computador. Um espaço fértil para a
produção da informação e do conhecimento e aberta às novas configurações sociais, ao que Latour
(1994) chama de redes sociotécnicas.
4 A Campanha Pare Belo Monte
Em 01 de dezembro de 2015 o movimento Xingu Vivo lançou uma postagem em sua página
em tom de balanço provisório sobre a luta contra Belo Monte. O título “Pare Belo Monte, o grito
que segue” (http://www.xinguvivo.org.br/2015/12/01/pare-belo-monte-o-grito-que-segue/), faz um
breve balanço sobre a situação das populações envolvidas. A motivação da postagem veio após a
concessão da Licença de Operação (LO) de Belo Monte, o que ocorrera em 24 de novembro, na
semana anterior. O Movimento afirma que a emissão da LO contraria os pareceres da Comissão
Nacional para os Direitos Humanos (CNDH), da Defensoria Pública do Estado do Pará, assim como
o do Ministério Público Federal.
Caracterizou a LO como uma decisão que foi tomada considerando apenas o viés político,
contrariando os critérios legais, técnicos e climáticos, o que demonstra um desdém pelas
populações. Relaciona Belo Monte ao desastre ocorrido em Mariana, Estado de Minas Gerais, bem
como ao índice de desmatamento na área de influência de Belo Monte. Afirma que a concessão da
LO é uma tentativa de silenciar a resistência à hidrelétrica. Uma vez construída e em
funcionamento, quais mecanismos poderão ser utilizados para se ter alguma possibilidade de
reparação? Fazer funcionar significa trazer ao esquecimento os crimes cometidos pelo governo. Os
resistentes e os violados, são esses que permanecem em Belo Monte. Mas quem são eles? A mesma
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postagem afirma que o governo está equivocado e enumera quem são os que permanecem na área
de Belo Monte e que chama de resistentes e violados:
Pois engana-se o governo. Seus tão apregoados empregos acabaram, e hoje o que há na área de Belo Monte é um exército de miseráveis, sem terra, sem roça, sem peixes e sem canteiro de obras. Os desempregados, os indígenas, os carroceiros, os oleiros, os ribeirinhos, os camponeses e todos que tiveram suas vidas destroçadas continuam lá, ainda vivos. Ainda vivos apesar da violência e das chacinas que hoje são cotidianas em Altamira. Ainda vivos apesar da ameaça de transformar seu rio em uma enorme cloaca a céu aberto, por deficiente o sistema de esgotamento da cidade. Ainda vivos apesar do enchimento do reservatório da barragem poder ocorrer em época de chuva e ameaçar colocar debaixo d’água o território do Xingu, campo e cidade.
Fonte: http://www.xinguvivo.org.br/2015/12/01/pare-belo-monte-o-grito-que-segue/
Articulada pelo MXVPS e pelo Comitê Metropolitano, em Belém, Pará, a Campanha
apresenta como logomarca um fundo preto com uma mão humana vermelha espalmada. À direita
(algumas variações com o letreiro abaixo) a inscrição “Pare Belo Monte”. Abaixo, em caixa alta, a
inscrição “usina de destruição e morte”. Há ainda uma variação em que a mão humana é substituída
por uma pata de um felino, com a inscrição: “milhões de animais serão assassinados”.
Fonte: Web
Nada parece ser ao acaso e a logomarca evidencia isso. Tanto humanos quanto não humanos
serão sacrificados, ou, nas palavras do Movimento, serão “assassinados”. A palavra assassinato se
refere a uma ação intencional. Não é, entretanto um termo jurídico, uma vez que não existe um
delito no direito brasileiro com esse nome. Homicídio ou latrocínio são as referências jurídicas.
4.1 Os rostos da resistência
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Os diversos sites das organizações parceiras do Movimento mostram os rostos das pessoas
que mantém resistência a Belo Monte. Dentre as diversos faces se destaca a atuação de Antônia
Melo, líder do Movimento Xingu Vivo Para Sempre. São fotografias, vídeos, reportagens e
depoimentos de membros e pessoas ligadas ao Movimento.
(https://twitter.com/AmazonWatch/status/644720017813164033)
A postagem faz referência aos questionamentos dessa liderança a respeito de Belo Monte e
sobre o envolvimento das pessoas nas tomadas de decisões, sobre o que se esconde por detrás da
energia que gera conforto. Em outros termos, chama a atenção das pessoas para a resposabilização
sobre o que será deixado para as futuras gerações e sobre a possibilidade de outras possibilidade de
ser e de viver.
Esses “outros possíveis” constituem um ponto fundamental. Pensar que há outras
possibilidades, implica em pensar em possibilidades de ver o mundo, de nele habitar, de construir
saberes, ou de relativizar aqueles que se impõem como dominantes, o que Stengers (2007)
denomina como Cosmopolítica. Da mesma forma há que se repensar a política, fazendo possível a
tentativa de Stengers de juntar o termo “política” ao que ela chama de “enigmático termo cosmos”.
Desse modo, faz sentido a interrogação de Latour (2004): será que podemos viver no mesmo
planeta, sabendo que temos definições completamente diferentes sobre o planeta, sobre o que é
viver e o que é estar junto? A sua interrogação nos chama a continuar a considerar a proposta
cosmopolítica. Junto a Stengers, embora com suas singularidades de pensamento, Latour pensa a
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Cosmopolítica e essa possibilidade de viver juntos apesar das diferenças. Reconhecendo a filiação
da construção teórica a Stengers, Latour afirma que a “política” são os humanos e o “cosmos” são
as coisas. Há uma necessidade de unir os dois, pois separados não são o bastante. Ou nos fechamos
na política, considerando que apenas os humanos e suas reproduções, ou nos encerramos em um
naturalismo em que apenas o cosmos interessa, ou, utilizando as palavras do autor, pode-se afirmar
que “a cosmopolítica permite impedir que os dois se fechem: o cosmos está lá para impedir que a
política se feche, e a política, para impedir que o cosmos se feche. O cosmos não é
mononaturalizado, ele é a expressão de uma política ” (LATOUR, 2004: 406).
Outro link com referência a Antônia Melo aponta para uma reportagem do jornal El País
(http://brasil.elpais.com/brasil/2015/09/14/opinion/1442235958_647873.html), assinada pela
jornalista Eliane Brum e trata sobre a demolição da casa dessa liderança, a quem a reportagem
chama de a “maior liderança popular do Xingu”, “a maior árvore do Xingu”, “resistente”, “aquela
que jamais vai se calar”. Essa não é a única reportagem a trazer a resistência de Antonia Melo em
defesa de sua casa. Outra reportagem disparada no Twitter traz sua luta como destaque.
(https://twitter.com/mayirigaray/status/642309678932869120)
Desta vez o link aponta para o site da Amazon Watch. A reportagem em Inglês destaca a
história de Antonia Melo. Uma foto de abertura mostra Antonia segurando um cartaz no qual se lê:
Belo Monte não coseguirá destruir a memória de vida da minha casa”. Demonstra que a
coordenadora, e líder do Movimento de Mulheres por mais de duas décadas, é o coração do
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Movimento Xingu Vivo Para Sempre. Na reportagem, denuncia o que chama de crime
socioambiental, o que se dá também pelas violações em curso, as quais enumera: o bloqueio e
barramento do rio sem licença, o não cumprimento das condicionantes, como a preparação da
região para receber o projeto, demarcação de terras indígenas e a implementação de serviços de
educação e saúde, que são direitos humanos fundamentais.
O vídeo Voices of Xingu , disponibilizado no site da Amazon Watch
(http://amazonwatch.org/news/2014/0213-voices-of-the-xingu-antonia-melo-amazon-warrior), e
que faz parte de uma série feita pela Amazon Watch intitulada Vozes do Xingu, contanto a história
das pessoas que tiveram suas vidas alteradas pela construção de Belo Monte, mostra de forma breve
a história de Antonia Melo, contada por ela mesma. Destaca que nasceu no Estado do Piauí, mas
que que sua família mudou para o Pará ainda aos 4 anos, por isso se considera, de coração,
amazônida, altamirense. A fala de Melo é entrecortada por depoimentos de pessoas que a conhecem
e a acompanham na luta. O vídeo apresenta Antônia como a guerreira da Amazônia, título que é
recuperado, inicialmente, da fala de uma jovem ativista ao afirmar: “Antônia Melo é uma guerreira.
É uma mulher que luta pela vida do Xingu e da Amazônia”. O título de guerreira é repetido na fala
de mais dois dos depoimentos seguintes.
Em sua fala, mostra que há uma relação do rio com o Planeta como um todo. Da mesma
forma que diz haver uma relação na luta: não é uma luta dela, mas sim de todos. “Se o Xingu for
assassinado, como está sendo, se ele for morto, o Planeta todo também está morrendo ”. Mostra
também a importância do rio para os povos indígenas: “Belo Monte significa a destruição da vida
do rio Xingu. Significa a destruição dos povos do Xingu. O rio Xingu é um rio indígena. O seu
território em sua maior parte são terras indígenas. Destruindo os povos do Xingu, destroem o meio
ambiente ”.
Os atores individuais, organizacionais e institucionais se comprometem em um esforço
coletivo de definição e de controle da situação percebida como problemática. Expressam, discutem
e julgam opiniões; localizam problemas, lançam sinais de alerta ou de alarme. Dois elementos, por
assim dizer, caminham paralelamente: a situação em evidência e a dinâmica de produção dos atores.
Tanto um quanto outro, são processos em construção permanente. As formas de experiência, de
opinião e de ação pública estão constantemente se auto-instituindo (CEFAI, 2002).
O vídeo conclui com Antonia Melo cantando uma canção em homenagem à Tuíra, mulher
indígena que no Encontro dos Povos do Xingu encostou o facão no rosto do representante da
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Eletronorte. Fica evidente outro rosto a se opor historicamente: o gesto da índia Tuíra no I Encontro
dos Povos. Muitas são as referências a esse gesto e a essa mulher que se opôs de forma contundente
ao encostar o facão no rosto do representante da Eletronorte. Tuíra também é apresentada como
guerreira, mas sua denominação parece ser mais literal que metafórica. O gesto e o facão, alçado à
categoria de arma e não de artefato de trabalho, evidenciam isso.
Figura: Tuíra no Primeiro Encontro dos Povos do Xingu Fonte: Web
Outra que aparece como guerreira é a indígena Sheila Juruna. Desta vez em postagem do
Comitẽ Metropolitano. Sheila também aparece em vídeos, postagens, fotografias. Sua denominação
de guerreira, a exemplo de Tuíra também parece ser literal. É tida como uma das mais importantes
representantes dos grupos que lutam contra a construção de Belo Monte.
O MXVPS fala que ela é “um símbolo da resistência a construção da usina de Belo Monte.
Mulher, guerreira indígena, determinada e implacável, tem levado o grito do Xingu em atos,
palestras e debates pelo Brasil, e pelo mundo afora, sempre bradando, firme e forte, contra a
destruição da floresta, do rio e da vida na Amazônia” (Movimento Xingu Vivo para Sempre).
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4.2 Dos resistentes às resistências
Dos resistentes Campanha Pare Belo Monte mostras as resistências. São protestos,
ocupações a canteiros de obras, manifestações. As postagens mostram a abrangência da resistência.
Não é apenas uma motivação ou uma atitude local, mas encontra porta-vozes em muitos lugares. A
seguir mostraremos algumas dessas manifestações.
Fonte: Web
A imagem acima é exemplo do uso extensivo da fotografia no caso Belo Monte. Foi feita
durante ocupação no canteiro de obras, em 15 de junho de 2012, por ocasião do Encontro Xingu
+23, evento paralelo à Conferência Rio +20, promovido pelo MXVPS, que ocorreu entre os dias 13
e 16 de junho daquele ano. Nessa ocasião, a ensecadeira (barramento provisório) foi ocupada por
manifestantes, cerca de 300 pessoas, que romperam esse barramento e formaram a frase “Pare Belo
Monte”. As fotografias feitas por fotógrafos e cinegrafistas em sobrevoo pela área, rapidamente
“viralizaram” na Web e podem ser encontradas facilmente na rede. Uma simples busca no Google
com a expressão “pare Belo Monte” de imediato mostra essas imagens como principais resultados.
No processo de amplificação das demandas do movimento e demais manifestações, a
fotografia ocupa um importante papel. As imagens não são escolhidas ao acaso. Revelam uma
preocupação de mostrar as diversas situações que se apresentam. A fotografia, nesse caso, é vista
como uma forma de ativismo. Isso é o que mostra Michelle Bogre (2012), no livro Photography as
activism: images for social change: “Almost from the time it was invented, photography was
recognized by both protographers and social activists as a great “activist” tool for people who
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wanted to expose social injustices. Activistas and reformers used the camera as a research tool and
as an instrument for social reform ” (pag. XIV).
Desse modo são documentados conflitos étnicos, guerras, situações de extrema pobreza,
conflitos socioambientais, entre outros. Mas não apenas documentados, são registros que
comunicam de imediato e que expõem de forma clara as mazelas sob as quais estão assentadas as
relações sociais. No caso de Belo Monte há amplo registro dos mais diversos aspectos e situações:
manifestações e protestos, cotidiano, modificações ambientais causadas pelas obras, aspectos
culturais (momentos rituais, por exemplo).
Os protestos e manifestações não ocorrem apenas na área de influência de Belo Monte,
como Altamira e cidades vizinhas. Vários outros lugares são palco de eventos contrários à
construção de Belo Monte. Um tweet de Maira Irigaray, ativista da Amazon Watch, mostra uma
ação ocorrida na cidade de Paris, na França.
O link leva a uma reportagem da Rádio francesa RFI, sobre esse protesto, realizado em 14
de março de 2014, em frente às multinacionais que financiam Belo Monte, no bairro de negócios de
La Défense, como as gigantes EDF e DDF Suez e a companhia de transportes Alstom. Esse protesto
foi organizado por organizações internacionais de apoio aos povos indígenas, como Planeta
Amazônia, Amazon Watch e GITPA (Grupo Internacional de Trabalho para os Povos Autóctones).
A reportagem destaca a presença da liderança indígena Sonia Guajajara, a qual afirma que os índios
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não são contra o desenvolvimento do Brasil, mas que esperam respeito pelo pouco que sobrou de
suas terras no território nacional. Afirma ainda a necessidade de outro modelo de energia que cause
menos impactos ao ambiente, à biodiversidade e aos povos indígenas, considerando que a
construção de hidrelétricas causa um impacto irreversível.
Outro Tweet de 06 de maio de 2013 mostra um indígenas olhando um grupo de policiais de
armas em punho. A imagem desfoca o indígena, dando projeção aos policiais. Na legenda: “A luta
contra o projeto da barragem de Belo Monte continua forte apesar da repressão”. A fotografia dá
ideia de ameaça. O mais forte subjuga o mais fraco e o empurra à força para outro lugar. Quem
resiste, move-se, mas olha para trás. Não falta coragem, mas as armas mostram uma desigual
relação de forças
(https://twitter.com/Nikos_Los/status/331434221275082752)
Um protesto foi de pescadores impedindo a saída da balsa que conduzia as máquinas e
trabalhadores das obras da barragem foi outro destaque. O protesto foi contra a decisão de fechar
definitivamente o rio sem que a categoria tenha sido consultada, ou mesmo informada sobre essa
decisão do IBAMA. Cobravam do órgão uma posição sobre como iriam desenvolver suas
atividades, no caso a pesca. E, ainda, como seria a transposição dos barcos uma vez que o rio estava
fechado.
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(https://twitter.com/IgorBdAngelis/status/248803957621796865)
Na Web pululam fotografias, textos, hastags , depoimentos, comentários, debates. A palavra
de ordem é “Pare Belo Monte”. Mas esses gritos parecem neutralizados aos ouvidos do governo
que, mesmo diante das manifestações contrárias, e em alinhamento o grande capital, prossegue com
seu projeto, tido como de morte pelo Movimento. Decerto as oposições ao projeto fizeram com que
o governo o realinhasse e readaptasse no decorrer da história, mas mesmo assim permaneceu
contrário aos interesses daquela relação de categorias mostradas pelo MXVPS, que foram alijadas
durante o processo: Os desempregados, os indígenas, os carroceiros, os oleiros, os ribeirinhos, os
camponeses. Esses, compõem o rosto da resistência.
5 Conclusão
Belo Monte se apresenta como um local de conflito. A sua construção histórica foi sendo
palco de vários eventos em que eles se manifestaram. A Web evidenciou e deu visibilidade a várias
dessas manifestações. As diversas campanhas e a ação dos porta-vozes e amplificadores da
resistência, materializada localmente no Movimento Xingu Vivo para Sempre são fatores que
potencializam essa evidência.
Dentre as campanhas que tomaram forma e ganharam corpo na Web, a mais difundida foi a
“Pare Belo Monte” transformada em hastag (#PareBeloMonte) a qual foi efetiva por evidenciar e
conferir significado à resistência, ganhando força nas redes sociais e sendo renovada
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continuamente. Mostra o conflito de forma detalhada em suas várias faces e momentos. Mostra
também os rostos dos resistentes e as formas da resistência.
Mantém forte apelo visual, através de fotografias de diversas ações e momentos de
conflitos. As postagens e tweets mostram a forma de luta dos atingidos e seus intermediadores, na
conformação de redes sociotécnicas (LATOUR, 2012). A adesão às campanhas mostra uma
aproximação de ideias, as quais postulam horizontes de “outros possíveis”, ou uma cosmopolítica
(STENGERS, 2007 e LATOUR, 2007). Leva a pensar que há outras alternativas, notadamente,
possibilidades de ver o mundo, de nele coabitar, construir saberes, assim como relativizar aqueles
que se impõem como dominantes.
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6 Referências
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