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ESCOLA DE TEOLOGIA LUZ E VIDA IGREJA MATRIZ SANTO ANTÔNIO MIRACEMA - RJ

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Page 1: Trabalho Historia Da Igreja

ESCOLA DE TEOLOGIA LUZ E VIDA

IGREJA MATRIZ SANTO ANTÔNIO

MIRACEMA - RJ

ALCILANE ROSSI DE ABREU TOSTES

JULHO - 2015

Page 2: Trabalho Historia Da Igreja

As Cruzadas – 1ª PARTE

Por “Cruzadas medievais” entendemos, as expedições empreendidas pelos cristãos do Ocidente para

libertar do domínio muçulmano o S. Sepulcro de Cristo em Jerusalém. Têm início em fins do séc. XI (1095) e

terminam em 1291, quando os últimos bastiões dos cruzados no Mediterrâneo oriental sucumbiram sob os

ataques dos turcos. Recobrem, pois, os séculos XII e XIII. Verdade é que houve expedições bélicas para libertar

a Terra Santa ou o Oriente da Europa ameaçado pelos turcos também nos séculos XIV e XV, como antes de

1095 se falava de reconquistar a Espanha ocupada pelos árabes… Antes de entrarmos no tema propriamente

dito, importante observação deve ser feita, a saber: não se pode entender um episódio do passado sem se

reconstituírem previamente o quadro geral respectivo e as categorias de pensamento dos atores desse episódio.

A propósito damos a palavra a Profª. Regine Pernoud no seu livro “Les Croisades” (Paris 1960, p. 7):

“É de notar quanto a historiografia nos tempos modernos se tornou moralizante e quão poucos

historiadores resistem à tentação de se transformar em juizes e censores dos acontecimentos que eles referem.

Ora os julgamentos que os historiadores possam proferir sobre o passado, arriscam-se muitas vezes a ser

inadequados ou injustos, porque, sem que o próprio estudioso tenha sempre consciência disto, ele julga segundo

critérios que datam da sua época, e não da época analisada. Especialmente estranho é o fato de que esse

moralismo histórico se tenha propagado precisamente nos séculos XIX e XX, quando se registra admirável

esforço em prol da historiografia objetiva, imparcial configurada às ciências exatas, que seguem métodos

rigorosos. Os julgamentos dos historiadores acarretam o inconveniente de introduzir um dos elementos mais

subjetivos, ou seja, as opiniões políticas ou religiosas abraçadas pelo estudioso…

Essas sentenças arbitrárias, simplistas demais para poder ser verídicas, não provém do fato de que em

geral o estudioso está mais apressado para julgar do que para compreender?’

Conscientes do valor destas advertências, procuraremos, nas páginas que se seguem, antes do mais

compreender – o que não significa legitimar indistintamente os fatos narrados.

Causas da “Viagem da Cruz”

1 – O termo “Cruzada” mesmo nunca ocorre nos documentos medievais; é vocábulo posterior, como também

moderno é o vocábulo corporação, utilizado de maneira um tanto inadequada quando se fala de instituições

medievais. Na Idade Média falava-se de “caminho de Jerusalém, passagem, viagem, via da cruz, peregrinação”.

É, pois, a partir deste vocabulário que havemos de começar o estudo do que posteriormente foi chamado

“Cruzadas”.

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“Peregrinação” é uma das práticas mais ancoradas na Bíblia ou – ainda – na tradição judaica, na tradição

cristã e na tradição muçulmana; ver Deuteronômio 16,16; Lucas 2,41.

Em particular, a peregrinação a Jerusalém e aos lugares santos da Redenção do gênero humano foi

sempre uma das expressões de fé mais caras aos cristãos. No séc. IV após a era das perseguições, quando o

Cristianismo começou a usufruir de liberdade no Império Romano, vê-se a Imperatriz Helena, mãe de

Constantino, ir à Palestina para descobrir e restaurar os testemunhos da vida, da morte e da ressurreição de

Cristo, que haviam sido sufocados pela ocupação romana a partir de 70 e, máxime, após 135 d.C.

Pouco depois de Helena, mãe de Constantino, tem-se a figura de S. Jerônimo (?421), que resolveu

estudar a Bíblia na Terra Santa, estabelecendo-se na gruta de Belém. Aos poucos, no país bíblico foram-se

constituindo numerosos mosteiros de homens e mulheres, que queriam beneficiar-se do contato com os lugares

sagrados.

Do séc. IV em diante, o movimento de peregrinações a Terra Santa não cessou entre os cristãos:

Jerusalém, Roma e Compostela eram os principais pontos de atração da piedade. Têm-se mesmo ainda hoje

numerosos “Itinerários” de Terra Santa escritos em latim através dos séculos por cristãos de nomeada, como o

peregrino de Placência, Silvia, Etéria…

Na Idade Média tão arraigado era o hábito de peregrinar que até mesmo o servo da gleba (o homem

estático por excelência, porque ligado ao campo, que ele não podia deixar e que ninguém tinha o direito de Ihe

tirar) gozava do direito de sair da sua terra para realizar uma peregrinação, sem que ninguém se Ihe opusesse.

2 – No séc. VII a expansão árabe fez perecer as numerosas comunidades cristãs esparsas pela Síria, a Palestina,

o Egito, o norte da África. Jerusalém em 638 foi ocupada e, em parte, transformada em cidade Árabe

muçulmana. As condições dos cristãos.que lá viviam ou que lá iam ter a fim de visitar os lugares santos,

tornaram-se difíceis, embora oscilantes segundo as épocas; a tensão do ambiente foi as vezes abrandada por

acordos, como, por exemplo, os de Carlos Magno (? 814) com o califa Haroun al-Rachid; esses pactos, porém,

nem sempre foram respeitados, como no caso do califa Hakim, fundador da religião drusa, que em 1009

mandou destruir a basílica do S.Sepulcro em Jerusalém e durante dez anos moveu perseguição a cristãos e

judeus.

Pouco depois, ou seja, a partir de 1055, os Turcos seldjúcidas entraram no próximo Oriente. Em 1071,

Jerusalém caia em suas mãos. Os cristãos, em conseqüência, sofreram opressão. Os peregrinos que voltavam da

Terra Santa, narravam no Ocidente a ingrata situação em que se achavam os irmãos e os santuários na Terra

Santa de Cristo. As condições de peregrinação eram extremamente penosas. Os relatos falam de peregrinos

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colocados no cárcere, seqüestrados em troca de dinheiro, torturados, durante a viagem para a Terra Santa. Uma

das crônicas mais impressionantes era a da peregrinação de Bünther, bispo de Bamberga (Alemanha), que, com

milhares de companheiros, a pequena distância de Jerusalém, sofreu duro ataque dos beduínos da região

durante três dias.

Certamente muitos episódios e casos particulares circulavam de boca em boca na Europa a respeito do

que ocorria em Jerusalém e nos arredores; tais episódios constituíam o teor do que o cristão podia conhecer a

respeito da Terra Santa. Dessas informações temos umespécimen ainda hoje numa crônica de Guilherme de

Tiro, historiador do século XII:

“Aconteceu, por permissão de Nosso Senhor e para provação do povo, que um homem desleal e cruel se

tornou senhor e califa do Egito. Tinha por nome Hakim e quis ultrapassar toda a malícia e a crueldade que

tinham estado em seus ancestrais. Ele foi tal que os homens da sua lei o tinham também na conta de eivado de

orgulho, de furor e de deslealdade. Entre outras deslealdades, mandou abater santa igreja do sepulcro de Jesus

Cristo, que fora construída anteriormente por ordem de Constantino Imperador, pelo patriarca de Jerusalém

chamado Máximo e que fora refeita por Modesto, outro patriarca do tempo de Heráclio.53

Então começou a situação de nossa gente a ser muito mais dura e dolorosa do que fora, pois grande luta

lhes entrara no coração por causa da Igreja da Ressurreição de Nosso Senhor, que eles viam assim

destruída.Doutra parte eram dolorosamente sobrecarregados de impostos e tarefas, contra os costumes e os

privilégios que eles haviam recebido dos príncipes incrédulos. Até mesmo o que jamais lhes fora imposto,

chegou a ser lhes proibido: a celebração das suas festas. No dia que soubessem ser a maior festa dos cristãos,

eles (os drusos) os obrigavam a trabalhar mais sob o jugo e a força; proibiam-lhes (aos cristãos) sair das portas

de suas casas, em que eles eram encerrados para que não pudessem celebrar festa alguma. Em suas casas

mesmas não gozavam de paz nem segurança, pois se atiravam sobre elas grandes pedras e pelas janelas

lançavam excrementos, lama e toda espécie de lixo. Se acontecesse que alguns cristãos dissessem uma só

palavra capaz de desagradar a esses incrédulos, logo, como se tivesse cometido um morticínio, era arrastado à

prisão e lhe cortavam o pé ou a mão, ou podiam todos os seus bens ser confiscados pelo califa…Muitas vezes,

os incrédulos tomavam os filhos e as filhas dos cristãos em suas casas e com eles faziam o que queriam;ora

mediante adulação os incrédulos constrangiam muitos jovens a renegar a fé…Os bons cristãos esforçavam-se

por sustentar tanto mais firmemente a sua fé quanto mais eram maltratados.

Seria longo contar todos os vexames e as desgraças em que o povo de Nosso Senhor se encontrava

então. Eu vos contarei um episódio, para que mediante esse possais compreender muitos outros. Um dos

incrédulos, malicioso e desleal, que odiava cruelmente os cristãos, procurava certa vez um meio de fazê-los

morrer. Viu que a cidade inteira (Jerusalém) tinha grande honra e reverência pelo Templo que fora refeito54…

Diante do Templo há uma praça que se chama a esplanada do Templo, que eles (os muçulmanos) guardavam e

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mantinha limpa, como os cristãos mantém limpas as suas igrejas e os seus altares. Esse incrédulo desleal tomou

de noite, sem que alguém o visse, um cão morto, pútrido e fétido, e colocou-o nessa esplanada, diante do

Templo. De manhã, quando os homens da cidade foram ao Templo para orar, encontraram esse cão. Fez-se

então um grande grito, rumor e clamor por toda a cidade, a ponto que só se falava do ocorrido. Reuniram-se e

não tiveram dúvida em dizer que os cristãos haviam feito isto. Todos concordaram em passar ao fio da espada

todos os cristãos; já estavam mesmo desembainhadas as espadas que a todos deviam cortar a cabeça.

Entre os cristãos havia um jovem de coração generoso e de grande piedade. Falou ao povo e disse:

‘Meus senhores, verdade é que não tenho culpa alguma no que aconteceu, como, aliás, nenhum de nós a tem;

isto, eu o dou por certo. Mas será extremamente doloroso se morrerdes todos assim e se todo o Cristianismo se

extinguir nesta terra. Por isto pensei em vos libertar a todos com o auxílio de Nosso Senhor. Apenas vos peço

duas coisas pelo amor de Deus: que oreis por minha alma em vossas preces e que tomeis sob os vossos

cuidados e reverência a minha pobre família. Pois eu assumirei a causa sobre mim e direi que fui eu que fiz

aquilo de que acusam a todos nós!’

Os que lamentavam morrer tiveram grande alegria então e prometeram ao jovem fazer orações e honrar

os seus familiares de tal modo que estes, no domingo de Ramos, trouxessem sempre a oliveira, que significa o

Cristo, e a colocassem em Jerusalém. – O jovem,

portanto, foi ao encontro dos injustos e disse que os outros cristãos não tinham culpa alguma no ocorrido e que

ele era o autor da façanha. Quando os incrédulos ouviram isto, puseram em liberdade todos os outros, e

somente ele teve a cabeça talhada. “

Faça-se o desconto devido possivelmente ao estilo panegirista do cronista… É certo, porém, que ainda

no séc. XII havia em Jerusalém uma família encarregada de fornecer aos fiéis as palmas para o domingo de

Ramos, em memória (diziam) da dedicação desse antepassado generoso, que se teria sacrificado em prol da

comunidade.

Concepções e características medievais

1 – Note-se agora que os relatos concernentes aos vexames da Terra Santa ecoavam nos ouvidos de sociedade e

povos caracterizados por dois traços profundamente marcantes:

a) Eram populações nas quais todos os indivíduos (com raras exceções, que confirmavam a regra) tinham – ou

ao menos julgavam ter – e professavam a fé cristã.

Essa fé não procedia de uma autoridade exterior (do Papa ou do Imperador), mas era uma convicção

profundamente ancorada no coração de todos. Os valores da fé eram, para esses homens, o que fazia que a vida

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valesse a pena de ser vivida. O calendário da vida pública, as catedrais românicas e góticas, os nomes de

acidentes geográficos e instituições, além de numerosos outros dados, atestam. o profundo impacto que a

mensagem da fé causava sobre os povos medievais, ritmando as minúcias da vida cotidiana.

Não há dúvida, a fé dos medievais era muito propensa a demonstrações exuberantes, como também a

dar crédito a visões, aparições, feitos extraordinários, sinais retumbantes de Deus… Ao lado das grandes

Universidades de Paris, Oxford, Bolonha, Nápoles, havia também muita simploriedade e infantilidade na

piedade cristã. Mas inegavelmente tudo que se ligasse com a fé, revestia-se de grande significado para os

medievais.

b) A sociedade na Idade Média estava toda impregnada do espírito e da realidade dos cavaleiros. Efetivamente,

a espiritualidade germânica, França, celta, goda levou a civilização medieval o ideal do cavaleiro. Este aspirava

a servir a Deus na bravura destemida, magnânima, e até mesmo na guerra (caso julgasse que a honra de Deus

exigia a intervenção da espada). A espiritualidade do cavaleiro retratada nas canções e trovas da Idade Média

era apta a suscitar façanhas heróicas em nome da fé.

Mais deve-se lembrar que na Idade Média também os monges desenvolveram papel importante,

professando, porém, uma espiritualidade assaz diversa da do cavaleiro. Enquanto o cavaleiro procurava

intensificar suas atividades no mundo, aspirando assim a unir-se a Deus e chegar à vida eterna, o monge se

separava do mundo secular para penetrar diretamente em Deus e na contemplação. Enquanto o cavaleiro

aplicava os instrumentos da sua profissão, isto é, as armas, para servir ao seu Senhor, o monge, professando

pobreza e silêncio, recusavam o recurso a tais expedientes.

Ora os medievais haviam de conseguir fazer a síntese desses dois tipos de ideal cristão – o do cavaleiro

e o do monge -, criando no século XII as chamadas “Ordens Militares”. Nestas o cavaleiro se consagrava a

Deus para O servir com destemor e galhardia num

quadro de pobreza, castidade e obediência. Referindo-se aos Templários, dizia S. Bernardo (? 1153):

“Não sei se os devo chamar monges ou cavaleiros; talvez seja necessário dar-lhes um e outro nome, pois

eles unem, à brandura do monge a coragem do cavaleiro” (De laude nova emilidae (IV8).

2 – É, portanto, nas populações medievais, caracterizadas por tais traços, que ecoaram os relatos, de estilo

simples e pungente, dos peregrinos da Terra Santa, no séc. XI. Compreende-se que tenham desencadeado

reação espontânea e decidida da parte dos seus ouvintes. Somente o entusiasmo e o vigor comunicados pela fé

(e que só a fé pode comunicar) explicam tal resposta: multidões se abalaram, prontificando-se a partir para

terras longínquas, desconhecidas, sujeitas a surpresas e ciladas, sem reabastecimento seguro, sem guias peritos,

sem planos de viagem muito definidos, mas conscientes (ao menos nos primeiros tempos) de que Deus o

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queria; “Deus lo volt”, eis o brado que em Clermont, no ano de 1095, impressionou os primeiros

expedicionários e impulsionou a tantos outros que lhes seguiram o exemplo. Cosiam uma cruz de pano

vermelho ao ombro direito; donde as expressões que se tornaram técnicas: “assumir a cruz” e “fazer a cruzada”.

O ímpeto inicial teve suas repercussões durante os dois séculos de duração do movimento de Cruzadas.

Aliás, os medievais dedicavam grande devoção ao Santo Sepulcro do Senhor, que os cronistas lhes

apresentavam sujeito a vexames. Era tido como o maior santuário do mundo cristão, como o centro do universo,

segundo os sermões e os noticiários da época.

É somente a partir de tais concepções, muito vivas e significativas para os medievais, que se podem

entender as Cruzadas. Nenhum tipo de guerra moderna, nem mesmo a chamada “guerra santa” (jihad) dos

muçulmanos, pode servir de ponto de referência para se entenderem a inspiração e a força, motriz dos cruzados.

É mister, porém, reconhecer que as idéias religiosas dos primeiros expedicionários foram sendo, aos

poucos, no decorrer de dois séculos, solapadas, de sorte que a imagem do cavaleiro que em seu fervor tomava

sobre si a cruz para ir libertar o S.Sepulcro do Senhor, se foi modificando. É essa imagem posterior que muitas

vezes predomina em certos tratados sobre as Cruzadas.

AS CRUZADAS (II)

Foi o Papa Urbano II quem, no Concílio de Clermont (França) em 1095, lançou o programa de

expedições destinadas a reconquistar o S. Sepulcro em Jerusalém. O ambiente, como vimos, estava assaz

motivado para receber tal apelo. Conseqüentemente, o

brado de Urbano II suscitou entusiasmo delirante; muitos pregadores puseram-se a percorrer a Europa,

incitando os homens a cerrar fileiras. Grande multidão de ouvintes, de origem social diversa, assumiu então a

cruz, emblema da campanha. Os expedicionários, provenientes da França, da Inglaterra, da Itália, eram dotados

de benefícios espirituais pelo Papa; a quem ousasse violar ou roubar as suas propriedades durante a respectiva

ausência, tocaria a pena de excomunhão.

Em resposta imediata ao apelo e sem esperar a organização de exércitos devidamente constituídos (coisa

que levaria tempo), grande número de simples fiéis pôs-se logo em marcha para o Oriente sem o equipamento

necessário. Essa Cruzada Popular, chefiada por Pedro o Eremita e Gualtero “sem Haveres” (Gauthier sans

Avoir), fracassou, pois os seus membros ou pereceram na estrada ou foram exterminados pelos turcos.

1ª Cruzada: Em fins de 1096, quatro exércitos de senhores feudais chegavam a Constantinopla:

1) os lorenos e alemães, com Balduíno de Hainaut e Godofredo de Bouillon;

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2) os franceses do norte, sob o conde de Vermandois e o duque de Normandia;

3) os provençais, com o conde de Tolosa e o legado Ademar de Monteil;

4) os normandos da ltália, com Boemundo de Taranto e Tancredo. Nenhum rei os acompanhava, nem esses

exércitos cuidaram de instituir um Chefe geral para todos. O Imperador bizântino Aléxis Comnene, em

Constantinopla, esperava servir-se desses guerreiros para reconquistar parte da Ásia Menor, que fora arrebatada

pelos turcos. A cidade de Nicéia perto de Constantinopla foi então realmente reconquistada, mas, em vez de ser

atribuída aos ocidentais, voltou a ser domínio do Imperador bizantino. Este fato frustrou os latinos e concorreu

para que doravante latinos e bizantinos concebessem desconfiança mútua! – Após dois anos e meio de lutas e

sofrimentos atrozes, os cruzados, tendo vencido o exército de Solimão em Doriléia, havendo tomado Edessa

(1097) e Antioquia (1098), chegaram finalmente a Jerusalém e dela se apoderaram (1099). Essa sangrenta

expedição, que custara a vida a cerca de meio-milhão de homens, terminou com a fundação de quatro centros

latinos: o reino de Jerusalém, o principado de Antioquia, os condados de Edessa e de Trípolis, aos quais foram

atribuídos governantes latinos. As grandes cidades da costa palestinense foram ocupadas por navegantes e

comerciantes ocidentais. Os peregrinos recomeçaram a afluir à Terra Santa. Para protegê-los e defendê-los,

foram criadas as Ordens de Cavaleiros Militares (Hospitalários, Templários, etc.).

Como se compreende, os territórios latinos no Oriente eram constantemente ameaçados e só podiam

subsistir com o auxílio de reforços vindos do Ocidente. É o que explica uma série de expedições, ora mais, ora

menos vultosas, colocadas entre as grandes Cruzadas. Somente estas, em número de oito, serão aqui

recenseadas.

2ª Cruzada: Os turcos tendo reconquistado e destruído Edessa, preparou-se nova Cruzada, que partiu do

Ocidente em 1147. Exortados por S. Bernardo, o rei de França, Luís VII, e o da Germânia, Conrado III,

tomaram a cruz sobre si e fundiram suas tropas num só exército. Mas não conseguiram tomar nem mesmo

Damasco, e regressaram sem êxito

em 1149.

3ª Cruzada: O sultão Saladino apoderou-se de Jerusalém em 1187. Respondendo então a um apelo do Papa

Urbano III, Filipe Augusto da França, Frederico Barbaroxa da Alemanha, e Ricardo Coração de Leão, da

Inglaterra, apresentaram-se para partir. Os alemães, tendo seguido por terra, chegaram até a Ásia Menor; mas a

morte de Frederico, afogado nas águas do rio Cydnus (Cilícia), provocou a dispersão do seu exército (1190). Os

reis da França e da Inglaterra dirigiram-se por mar a S. João de Acre, que conseguiram ocupar (julho de 1191).

Embora lutassem juntos, os dois monarcas nutriam desconfiança mútua. Filipe Augusto, tendo caído doente,

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voltou à Europa, e, apesar da palavra dada, pôs-se a tramar com João sem Terra a invasão dos domínios do rei

da Inglaterra. Ricardo viu-se assim compelido a voltar (1192).

Naquela época, os cristãos já não possuíam senão o litoral, desde Tiro até Jafa, com S. João de Acre como

capital, além do principado de Antioquia, assaz reduzido. Todavia Ricardo Coração de Leão havia conquistado

Chipre, que se tornou um reino latino próspero.

4ª Cruzada: O Papa lnocêncio III (1198-1216) aspirava ardentemente à libertação de Jerusalém. Suscitou nova

expedição, a qual, porém, se afastou da sua orientação, sob a influência de Filipe da Suábia, de Veneza e dos

gregos. Os cruzados empreenderam a conquista de Constantinopla (!), que eles saquearam, fazendo da mesma a

capital de um Império latino. Esse lmpério, que compreendia a península dos Bálcãs, durou até 1261, quando

Miguel o Paleólogo retomou Constantinopla.

5ª Cruzada: Entre 1219 e 1221, alemães e húngaros assumiram a cruz. Dirigiram-se para o Egito; mas a cheia

do Nilo, que os cristãos não previam, obrigou-os a retirar-se.

6ª Cruzada: É também chamada “peregrinação sem fé” (1228-1229). Excomungado pelo Papa, Frederico II

resolveu empreender uma Cruzada, não tanto para libertar o S. Sepulcro, quanto para unir em sua pessoa os

títulos de Imperador da Alemanha e rei de Jerusalém; amigo da ciência e da cultura árabes, Frederico II

aparentava amizade com os Árabes, de sorte que obteve do sultão do Egito, por dez anos, o domínio sobre

Jerusalém, Belém e Nazaré. Terminado esse prazo, Jerusalém recaiu nas mãos dos Árabes.

7ª e 8ª Cruzadas: São Luís IX, rei da França, resolveu reconquistar a Cidade Santa. Em 1248, atacou o sultão

Eyoub, não na Síria, mas no Egito. Como em 1221, também dessa vez os cristãos tomaram Damieta, mas

caíram diante de Mansourah. Foram todos encarcerados, só conseguindo a liberdade mediante enorme preço de

resgate.

Em 1270, S. Luís renovou seus esforços, conseguindo a muito custo constituir um exército para

empreender nova expedição. O irmão do rei, Carlos de Anjou, persuadiu-o de ir primeiramente a Túnis; diante

desta cidade, o monarca, acometido de peste, veio a falecer aos 25 de agosto de 1270.

Após estes fatos, a pressão dos exércitos turcos se intensificou, visando aos últimos redutos cristãos da

Ásia. Em 1291, estes sucumbiram, encerrando-se assim a era das Cruzadas propriamente ditas.

Ainda, a título de ilustração, mencionamos as Cruzadas das crianças, pois são significativas do espírito

da época.

Page 10: Trabalho Historia Da Igreja

Em 1212, um jovem pastor, chamado Estêvão, dizendo-se enviado por Deus, convocou as crianças da

França para empreenderem uma Cruzada. O exército de 30.000 jovens que assim se formou, embarcou em

Marselha. Dois condutores de frota haviam se comprometido a transportá-los ao Oriente gratuitamente; todavia

venderam-nos aos mercadores de escravos no Egito. A maioria dos participantes pereceu; um pequeno número

recuperou mais tarde a liberdade.

As Cruzadas – 2ª PARTE

Na mesma época, a Alemanha foi teatro de episódio semelhante. Vinte mil jovens dirigidos por certo

Alexandre, tão imperito quanto os seus seguidores, atravessaram os Alpes para embarcar em Gênova. Todavia,

frustrados, dispersaram-se sem êxito algum.

Depois desta visão panorâmica do que foram concretamente as Cruzadas, importa agora procurar

compreender os fatores que provocaram o seu estranho desenrolar.

Cruzadas: idealismo ou decadência?

Os motivos de duvidar

Quem leva em conta a história das Cruzadas, à primeira vista é levado a dizer que constituíram um

fracasso ou até mesmo um contra-testemunho dos cristãos. Têm-se catalogado vários capítulos de censura aos

cruzados: ambição, traição, vileza de costumes…

É interessante notar que não somente historiadores modernos denunciam falhas tais, mas também

pregadores e cronistas medievais. Com efeito, no decorrer dos séculos XII e XIII, perguntavam por que Deus

havia permitido a derrota deste ou daquele exército de seus servidores ou por que consentira na perda da Cidade

Santa Jerusalém. – Em resposta, julgavam que o pecado devia ser a causa de tais insucessos; em consequência,

apontavam uma série de faltas morais dos cruzados. Entre outras instâncias, o Concílio de Lião I em 1245

também fez advertências a procedimentos indignos dos cruzados; cf. Mansi, Conciliorum amplissima collectio

XXIII, p. 628.

A vista destes dados, dir-se-á que as Cruzadas representam um ponto negro da história medieval. Quem

assim julgasse em bloco, seria unilateral ou mesmo injusto.

Page 11: Trabalho Historia Da Igreja

Quadro geral: apreciação

Não se pode deixar de sublinhar em primeiro lugar o que de positivo as Cruzadas representam.

Abstração feita de pessoas e episódios particulares, as Cruzadas têm sua inspiração fundamental na fé

dos homens da Idade Média, no seu amor aos valores sagrados e no seu espírito cavalheiresco, corajoso e

magnânimo.

A fé e o amor dos cristãos, na Idade Média, recorreram às armas para se exprimir concretamente (…).

Hoje muitos cristãos hesitariam diante de tal expressão; seriam até propensos a condená-la. Atualmente os

homens têm meios de confrontar suas divergências mediante reuniões, assembleias, concordatas; por isto

rejeitam (ao menos em teoria…) as soluções violentas (na prática, porém, não faltam as guerras também em

nossos dias, suscitadas pelos mais diversos motivos). Contudo na Idade Média as distâncias geográficas,

culturais, filosóficas constituíam barreiras quase intransponíveis, que dificultavam aos homens a aproximação

física e a superação de suas divergências; julgava em muitos casos ter que recorrer às armas para preservar seus

valores e garantir o bem comum. Assumir as armas em tais circunstâncias era tido como louvável; fugir delas

mereceria censura.

Verdade é que o movimento das Cruzadas não conseguiu devolver aos cristãos, de maneira duradoura, a

posse da cidade de Jerusalém e da Terra Santa em geral. Todavia ele se prolongou por dois séculos, a custa de

ingentes sacrifícios, que revelam notável espírito de heroísmo. Sucessiva e tenazmente, as gerações de cristãos

despertaram as suas energias para recomeçar a grande façanha que outros não haviam conseguido realizar

plenamente. Assim deixaram eles à posteridade o testemunho de sua fé.

Não se poderiam silenciar, outrossim, os benefícios acarretados pelas Cruzadas no plano cultural e

científico. O contato entre latinos, gregos (bizantinos) e árabes ocasionou incremento para a matemática, a

medicina, a indústria, o comércio e outros ramos das atividades humanas; desenvolveu a navegação e

modificou as condições econômicas da sociedade feudal. Em suma, preparou o grande surto das artes e das

ciências ditas “exatas” nos séculos XV/XVI.

Fatores negativos

O entusiasmo que desencadeou as Cruzadas era mais idealista do que realista; os seus arautos não

mediam a amplidão dos encargos e problemas que a execução concreta do programa devia acarretar. É o que

explica que os cruzados, após haver obtido os seus primeiros resultados, tenham experimentado sucessivos

reveses. Estes se devem a fatores vários, que podem ser assim enunciados:

Page 12: Trabalho Historia Da Igreja

1) A amplidão da tarefa empreendida pelos cruzados exigiu, com o passar do tempo, o recurso a subsídios

novos e necessariamente heterogêneos, a saber:

– Os cavaleiros e outros cristãos que entusiasticamente se ofereciam para assumir a cruz, já não

bastavam para o objetivo. Foi preciso recrutar soldados mercenários, que pugnariam não tanto por ideal cristão,

mas, sim, por interesses pessoais, às vezes mesquinhos. Muitos desses mercenários eram antigos criminosos

detentos, a quem se dava a liberdade à condição de que fossem lutar no Oriente. Ora compreende-se que tais

soldados, vendo-se livres, facilmente voltavam aos maus hábitos e prejudicavam o conjunto da tropa. Assim foi

sendo cada vez mais diluída a imagem do cavaleiro que galhardamente partia para a Terra Santa às próprias

custas, porque amava o Senhor Jesus.

– As despesas com os soldados mercenários e seus equipamentos eram ingentes, exigindo dos

responsáveis que procurassem angariar quantias de dinheiro jamais suficientes. Ora onde entra dinheiro,

facilmente é excitada a cobiça do ser humano com suas paixões, quá levam a abusos e desatinos.

Infelizmente não se tem documentação precisa sobre o montante das despesas exigidas por uma

expedição de cruzados. Desejar-se-ia saber quanto cada soldado em média percebia quanto os reis davam do

seu erário e quanto o Papa empenhava nas sucessivas Cruzadas. Existem, sem dúvida, notícias a respeito.

Todavia os diversos dados supõem épocas diversas, as quantias são expressas em moedas heterogêneas, as

notícias são parceladas, de sorte que é difícil ter ideias claras do conjunto. Apenas as duas Cruzadas de S. Luís

IX têm certa contabilidade escrita em livros; sabe-se, pois, que o total das despesas de campanha de 1247 a

1256 comportou 1.537.570 libras de Tours. Mesmo assim há dúvidas: outra documentação refere que somente

nos anos de 1250 a 1253 a Cruzada consumiu 1.053.476 libras de Tours!

– De modo particular, criou problemas o transporte das tropas para o Oriente. O meio mais indicado a

preferido eram as embarcações, que atravessavam o Mediterrâneo. Ora até a quinta Cruzada os expedicionários

não possuíam frota própria. Justamente a quarta Cruzada foi desviada para Constantinopla, porque, não tendo

naves próprias, foi obrigada a valer-se das de Veneza, que procuraram servir aos seus interesses comerciais, e

não aos dos cruzados. Tardiamente, sob Frederico II e Luis IX, os cruzados recorreram a equipamento marítimo

próprio. Anteriormente, porém, tinham que utilizar os navios das cidades comerciantes de Itália ou de França

(Veneza, Gênova, Pisa, Marselha…), que, em troca, exigiam para si direitos e privilégios nos portos da

Palestina.

– O vulto crescente das Cruzadas exigiu que a direção das mesmas fosse confiada a reis, príncipes e

grandes senhores de terras, pois estes poderiam, mais facilmente do que os cavaleiros, organizar e sustentar

exércitos de mercenários. Ora os reis a grandes senhores nem sempre se atendiam entre si; objetivos políticos e

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nacionalistas facilmente afrouxavam ou solapavam alianças previamente contraídas (levem-se em conta a

primeira e a terceira Cruzadas). – Notório é o caso de Frederico II da Alemanha, orientalista e diletante.

2) Também se apontam falhas morais no procedimento dos cruzados: rapina, abuso de mulheres e outros males,

que já os pregadores e o Concílio de Lião I censuravam (…).

O historiador sincero há de reconhecer tais erros. Todavia não se deveria fazer dessas falhas a nota

característica ou uma das notas características das Cruzadas. Elas ocorreram com os cruzados como geralmente

ocorrem nas expedições militares. Todo soldado é sujeito a procurar suas “compensações” depois de haver

sofrido os rigores de fome, da sede, do frio e de severa disciplina durante a respectiva campanha. Não poucos

cruzados chegavam finalmente à costa da Palestina doentes, vítimas de febres, e facilmente aceitavam ser

tratados em clima de moleza, bem estar e gozo. – Nem por isto tais “compensações” são legítimas.

Numerosos outros episódios se poderiam ainda propor para analisar e comentar as Cruzadas. Em síntese,

porém, parece que os principais traços das mesmas e do respectivo fundo de cena foram indicados nestas

páginas.

Em suma, pois: recolocadas no seu contexto medieval, as Cruzadas não são mancha negra; mas, ao

contrário, atestam (naturalmente segundo as categorias a possibilidades da época) a unidade e a homogeneidade

dos povos da Alta Idade Média, que encontraram na sua fé – valor que eles não discutiam – o estímulo e o

dinamismo para realizar façanhas heróicas, ao mesmo tempo marcadas pela virilidade, pela poesia e pelas

limitações humanas…!

(http://cleofas.com.br/historia-da-igreja-as-cruzadas)