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II.ª Série - n.° 3 - Dez. 2006 Programas de prevenção do consumo de álcool em jovens estudantes – Revisão sistemática Alcohol consumption prevention programs for young students – Systematic review Teresa Barroso * António Barbosa ** Aida Mendes *** * Professora Adjunta na Escola Superior de Enfermagem de Coimbra, Enfermeira Especialista de Enfermagem de Saúde Mental e Psiquiátrica. ** Professora de Psiquiatria da Faculdade de Medicina de Lisboa. *** Professora Coordenadora na Escola Superior de Enfermagem de Coimbra, Enfermeira Especialista de Enfermagem de Saúde Mental e Psiquiátrica, Doutorada em Educação, ramo de Psicologia da Educação. Resumo Com o objectivo de analisar a eficácia dos programas de intervenção para a prevenção do uso/abuso de álcool, dirigidos a adolescentes dos 10 aos 16 anos de idade em meio escolar, foi realizada uma revisão sistemática baseada no método sugerido por NHS Centre for Reviews and Disseminations (CRD, 2001). Os sete estudos incluídos nesta revisão diferem em múltiplos aspectos, tais como, as intervenções desenvolvidas (intensidade, duração, métodos e estratégias pedagógicas, responsável pela intervenção), as variáveis avaliadas e o tempo de follow-up. São reportados efeitos positivos no consumo de álcool para a amostra total, em dois estudos. Dois estudos apresentam efeitos positivos para os jovens que bebiam na linha de base e um estudo apresenta efeitos positivos para os que não eram consumidores na linha de base. Embora a base conceptual dos programas seja relativamente uniforme verifica-se uma grande variedade nas intervenções e na sua implementação, o que pode explicar a diversidade dos resultados. Apesar das diferenças verificadas, podemos concluir que a maioria dos programas são eficazes no aumento dos conhecimentos acerca do consumo de álcool e alguns desenvolvem atitudes e expectativas mais seguras acerca do uso de álcool. Palavras-chave: álcool, jovens, prevenção, escola ARTIGO Abstract Aiming to analyse the effectiveness of intervention programs to the prevention of the use/abuse of alcohol, directed at adolescents between 10 and 16 years old, in school context, a systematic review was made, based on the method suggested by the NHC Centre for Reviews and Dissemination (CRD, 2001). The seven studies included in this systematic review differ in many aspects, ranging from the interventions developed (intensity, duration, pedagogical methods and strategies, responsible for the intervention) to the assessed variables and the follow-up time. The effects of the programme in the alcohol consumption are reported, for the total sample in two studies. Two studies present effects of the program for those who drank in the basis line, and one study presents the effect for those who didn’t consume in the basis line. Although the conceptual base of the programs is relatively uniform, there is a great variety in the interventions and their implementation, which can explain the diversity of the results. Despite the differences found, we can conclude that most of the programs are effective in the increase of the knowledge about alcohol consumption and that some of them develop safer attitudes and expectations towards the use of alcohol. Keywords: alcohol, youngsters, prevention, school Recebido para publicação em 27-04-06. Aceite para publicação em 19-06-06.

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Revisão sistemática de 7 estudos realizados com o objectivo de analisar a eficácia dos programas de intervenção para a prevenção do uso/abuso de álcool, dirigidos a adolescentes dos 10 aos 16 anos de idade em meio escolar.

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II.ª Série - n.°3 - Dez. 2006

Programas de prevenção do consumode álcool em jovens estudantes– Revisão sistemática

Alcohol consumption prevention programs for young students– Systematic review

Teresa Barroso *António Barbosa **Aida Mendes ***

* Professora Adjunta na Escola Superior de Enfermagem deCoimbra, Enfermeira Especialista de Enfermagem de Saúde Mental ePsiquiátrica.** Professora de Psiquiatria da Faculdade de Medicina de Lisboa.*** Professora Coordenadora na Escola Superior de Enfermagem deCoimbra, Enfermeira Especialista de Enfermagem de Saúde Mental ePsiquiátrica, Doutorada em Educação, ramo de Psicologia da Educação.

Resumo

Com o objectivo de analisar a eficácia dos programas deintervenção para a prevenção do uso/abuso de álcool,dirigidos a adolescentes dos 10 aos 16 anos de idade emmeio escolar, foi realizada uma revisão sistemática baseadano método sugerido por NHS Centre for Reviews andDisseminations (CRD, 2001).

Os sete estudos incluídos nesta revisão diferem emmúltiplos aspectos, tais como, as intervençõesdesenvolvidas (intensidade, duração, métodos e estratégiaspedagógicas, responsável pela intervenção), as variáveisavaliadas e o tempo de follow-up. São reportados efeitospositivos no consumo de álcool para a amostra total, emdois estudos. Dois estudos apresentam efeitos positivos paraos jovens que bebiam na linha de base e um estudoapresenta efeitos positivos para os que não eramconsumidores na linha de base.

Embora a base conceptual dos programas sejarelativamente uniforme verifica-se uma grande variedadenas intervenções e na sua implementação, o que podeexplicar a diversidade dos resultados. Apesar das diferençasverificadas, podemos concluir que a maioria dos programassão eficazes no aumento dos conhecimentos acerca doconsumo de álcool e alguns desenvolvem atitudes eexpectativas mais seguras acerca do uso de álcool.

Palavras-chave: álcool, jovens, prevenção, escola

A R T I G O

Abstract

Aiming to analyse the effectiveness of intervention programsto the prevention of the use/abuse of alcohol, directed atadolescents between 10 and 16 years old, in school context,a systematic review was made, based on the methodsuggested by the NHC Centre for Reviews and Dissemination(CRD, 2001).

The seven studies included in this systematic reviewdiffer in many aspects, ranging from the interventionsdeveloped (intensity, duration, pedagogical methods andstrategies, responsible for the intervention) to the assessedvariables and the follow-up time. The effects of theprogramme in the alcohol consumption are reported, for thetotal sample in two studies. Two studies present effects ofthe program for those who drank in the basis line, and onestudy presents the effect for those who didn’t consume in thebasis line.

Although the conceptual base of the programs isrelatively uniform, there is a great variety in the interventionsand their implementation, which can explain the diversity ofthe results. Despite the differences found, we can concludethat most of the programs are effective in the increase of theknowledge about alcohol consumption and that some ofthem develop safer attitudes and expectations towards theuse of alcohol.

Keywords: alcohol, youngsters, prevention, school

Recebido para publicação em 27-04-06.Aceite para publicação em 19-06-06.

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Introdução

A investigação mostra que em Portugal, como nageneralidade dos países europeus, a percentagemde jovens que consomem bebidas alcoólicasaumenta progressivamente com a idade, e que oinício do consumo se realiza, em média, pelos 12anos (Murray e Lopez, 1996 cit in WHO, 2002;Matos, 2003; Rodrigues et al., 2005).

O consumo de álcool em idades tão precoces éduplamente preocupante: por um lado, é sabidoque o sistema biológico do jovem não estásuficientemente maduro para proceder àdegradação do álcool provocando danos cerebraise défices neurocognitivos com implicações para aaprendizagem e o desenvolvimento intelectual(Zeigler, et al. 2005), por outro lado a evidênciacientífica sugere que o início precoce de consumode álcool está associado a futuros comportamentos-problema na adolescência, incluindo violênciarelacionada com o álcool, acidentes, conduzir sob oefeito de álcool, absentismo na escola e no trabalhoe aumento do risco para o uso de outras drogas e oposterior abuso de álcool (Gurber et al., 1996, Grantet al., 1997 cit in Komro, 2002).

Deste modo são necessárias intervençõesplaneadas no âmbito da educação para a saúde nosentido de prevenir o início precoce do consumo deálcool e o seu uso inadequado nos jovens para obenefício da sua saúde actual e futura. Intervir aonível da prevenção primária é um desafio e umimperativo para os profissionais de enfermagem emqualquer contexto de exercício pelo que oconhecimento dos programas de intervençãopraticados e da sua eficácia relativa é muitoimportante.

De acordo com diversas abordagens teóricasexiste uma ligação potencial entre os períodoscríticos do desenvolvimento comportamental dosjovens e a possibilidade das intervenções pre-ventivas se revelarem eficazes. Assim, no contextoda prevenção primária para o uso de substâncias, éimportante que as intervenções se desenvolvamantes dos padrões comportamentais estaremestáveis e resistentes à mudança (Kelder et al. cit inMcBride et al., 2000).

Uma análise histórica da elaboração eimplementação de programas de prevenção do usode substâncias permite-nos verificar a existência defases distintas. Numa primeira fase, durante adécada de 60 até início dos anos 70 do século XX, osprogramas colocaram a sua ênfase no fornecimentode Conhecimento acerca das drogas e nasconsequências do seu uso. Partindo do pressupostode que o saber é a pedra angular do comporta-mento, estes programas assentavam, fundamental-mente, na informação e divulgação dos riscos emalefícios do uso de substâncias. Durante asegunda fase, que podemos situar durante a décadade 70 até ao início dos anos 80 do século XX, o quepredominou foram os programas denominadosAfectivos. Estes focalizavam-se na clarificação devalores e desenvolvimento da auto-estima.Na terceira fase, iniciada ainda na década de 80 doséculo passado e que se tem prolongado até aosdias de hoje, o Modelo de Influência Social temdominado as intervenções escolares dos programasde prevenção do uso de drogas. Devido aoslimitados resultados do Modelo de Influência Socialsurge uma extensão a este modelo integrando oDesenvolvimento de Competências Pessoais eSociais (Botvin, 2000) que inclui nos seuspressupostos teóricos a Teoria de AprendizagemSocial de Bandura (Bandura, 1977) e a Teoria deComportamento-problema de Jessor’s (Jessor &Jessor, 1977). Segundo esta abordagem o consumode substâncias é conceptualizado como umcomportamento funcional, socialmente aprendido,que é o resultado da interacção entre os factoressociais e pessoais. O comportamento de consumode substâncias é aprendido através de um processode modelamento, imitação e reforço e é influen-ciado pelas cognições, expectativas e crençaspessoais acerca das substâncias. Esses factores emcombinação com as competências pessoais e sociaispobres conduzem a um aumento da susceptibi-lidade às influências sociais para o consumo desubstâncias (Perry & Kelder, 1992).

Apesar do relatório da WHO (2002) acerca doestado da arte neste domínio concluir que osprogramas baseados na educação e intervenção

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escolar(1) são das medidas preventivas maispopulares, existe uma lacuna na avaliação formal doimpacto dessas medidas no comportamento.De facto, apesar de nos últimos 20 anos, terem sidoconcertados esforços no sentido de desenvolverabordagens eficazes de prevenção do uso desubstâncias para implementação no meio escolar,segundo Botvin (2000), existe um grande fossoentre o que a investigação tem demonstrado sereficaz e a maioria dos programas desenvolvidos nasescolas. Em parte, este desfasamento pode serexplicado pelo facto dos próprios resultados dainvestigação nesta área estarem dispersos, nãoresultando, em consequência, suficiente conheci-mento empírico que imponha uma direcção segurapara a intervenção.

Assim, embora todos os investigadoresexpressem consenso na importância do desenvol-vimento de programas que se apresentem comorelevantes e significativos para os jovens, existeapenas uma pequena referência sobre como estatarefa deva ser empreendida da melhor forma(Tobler et al., 2000; Pagalia & Room, 1998 cit inWHO, 2002).

Neste sentido, surgiu a necessidade de realizaruma pesquisa rigorosa da literatura existente nestedomínio, para extrair evidência científica e identi-ficar as lacunas existentes, que possibilite a constru-ção de programas de prevenção para o uso/abusode álcool baseado na evidência.

Questão

Os programas de intervenção para prevenção deuso/abuso de álcool dirigidos aos adolescentes emmeio escolar são eficazes?

Métodos

O objectivo principal desta revisão sistemáticaé identificar os programas de prevenção deuso/abuso de álcool baseados em intervençõesescolares e avaliar a sua eficácia, seguindo aabordagem metodológica de NHS, Centre forReviews and Dissemination (CRD, 2001).

O primeiro passo consistiu em identificar todosos estudos publicados e não publicados que sejamrelevantes e de qualidade metodológica suficiente.

Para o efeito tivemos como preocupação aelaboração de uma revisão da literatura queincluísse o meio escolar, que os participantesfossem jovens estudantes, que envolvesseprogramas de educação acerca do álcool baseadosem intervenções em sala de aula e cuja data depublicação abrangesse a última fase dos programasde prevenção, isto é, posteriores à década de 90.

Critérios de inclusão

Participantes:– Estudantes entre os 10 e os 16 anos de idade

Intervenções de prevenção:– Estudos que avaliam resultados de programas

de prevenção baseados em intervençõesescolares, relacionados com o álcool

Variáveis avaliadas:– Variáveis relativas ao consumo de álcool, aos

comportamentos-problema relacionados como álcool e variáveis mediadoras do consumo

Desenho do estudo e metodologia:– Estudos com distribuição aleatória controlada

(RCT) e desenhos quasi-experimentais comgrupo experimental e grupo de controlo

Estratégia de pesquisa para identificação dosestudos

A pesquisa foi realizada entre Julho e Setembro de2005, segundo a lista dos termos de pesquisa

(1) Os programas baseados nas intervenções escolares são sustentadospelo/a:– Missão da escola na promoção do completo desenvolvimento das

crianças e dos jovens, sendo a saúde uma parte integrante;– Reconhecimento da importância da aprendizagem precoce de

conhecimentos, atitudes e comportamentos relacionados com asaúde;

– Possibilidade de se aceder a um grande número de crianças e jovensdurante um longo período de tempo.

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utilizados e com variações para as diferentes basesde dados:

School/based/prevention/alcohol/youth/evaluation

Bases de dados: CINAHL; Pre-CINAHL;Psychology and Behavioural Sciences Collection;Cochrane Database of Systematic Reviews;Database of Abstracts of Reviews of Effectiveness;Cochrane Controlled Trials Register; MEDLINE;Nursing and Allied Health Collection: expanded;ACM-The Guide; Current Contents (ISI); ERIC(EBSCO); ISI Proccedings (ISI); Journal CitationReports (ISI); PubMed; Web of Science (ISI); ZentrallBlatt; Ciências da Saúde (periódicos on-line): AnnualReviews; BIOME Z39 (RDN); DOAJ; Science Directvia SCIRUS (Elsevier); Oaister; SciElo; Springer Link(Springer/Kluwer); Taylor & Francis; WileyInterscience (Wiley).

Para a avaliação de estudos não publicados foifeita pesquisa nas bibliotecas das Escolas de Enfer-magem e na Faculdade de Psicologia e Ciências deEducação de Coimbra.

Estudos identificados

Num primeiro refinamento da pesquisa foramidentificados 371 artigos. No sentido de identificar osestudos relevantes para os critérios da nossa revisãoforam analisados todos os resumos encontrados.Após esta análise foi feito um inventário de 53 artigosrelevantes, dos quais foi possível aceder em textointegral a 45. Destes, foram excluídos 38 estudos pornão obedecerem aos critérios de inclusão(2).

Resultados

Como resultado da metodologia utilizada naselecção final restaram 7 estudos, sobre os quaisincide esta revisão:

– School Health Alcohol Harm ReductionProject - SHAHRP de McBride et al. (2004)

– Project Alert de Ellickson et al. (2003)– Healthy School and Drugs de Cuijpers et al.

(2002)– Project Towards No Drug Abuse de Dent et al.

(2001)– Project Northland de Perry et al. (1996)– Drug Abuse Resistance Educations - DARE de

Clayton et al. (1996)– Life Skills Training - LST de Botvin et al. (1990)

Descrição dos estudos

Os estudos analisados foram realizados emdiferentes países: cinco nos Estados Unidos, um naAustrália e um estudo na Holanda. Possuemamostras consideradas grandes, com uma variaçãoentre 1208 (Dent et al., 2001) e 4466 (Botvin et al.,1990) jovens, são maioritariamente dirigidos àprimeira fase da adolescência (só um dos estudos édirigido à fase intermédia da adolescência) eseleccionam múltiplas e diferentes variáveis.

Embora não nos seja dado a conhecer asespecificidades dos conteúdos desenvolvidos nosprogramas (exceptuando o denominado deSHAHRP, de McBride e colaboradores em 2004),pelo modelo de base e pelos resultados esperados(variáveis estudadas) podemos verificar que existeuma grande variabilidade tanto nos conteúdoscomo na sua implementação.

O programa School Health Alcohol HarmReduction Project – SHAHRP de McBride et al.(2004) – é desenvolvido ao longo de dois anos.No primeiro ano, (1ªFase, média 13 anos idade) sãodesenvolvidas 17 actividades consecutivas ao longode 8 a 10 aulas (40 a 60 minutos). No ano seguinte(2ªFase, média 14 anos de idade) são desenvolvidas12 actividades num período de 5 a 7 semanas. Comum total de 29 actividades, num número de sessõesque não foi possível precisar, são abordadosconhecimentos, treinos de competências eidentificação de problemas relacionados com oálcool e a sua resolução.

O Project ALERT de Ellickson et al. (2003) ébaseado em três teorias de mudança decomportamento: Modelo de Crenças de Saúde

(2) Informação complementar sobre os artigos excluídos pode serfornecida pela autora: [email protected]

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(Becker, 1974); Modelo de Aprendizagem Social(Bandura, 1985); Teoria de Auto-eficácia Comporta-mental (Bandura, 1985). Concordante com asteorias em que se fundamenta, avalia os consumos,a auto-eficácia de resistência ao consumo, ascrenças positivas e negativas acerca do álcool e apercepção da influência dos pares. Desenvolveonze sessões no primeiro ano e três sessões nosegundo ano.

O programa Healthy School and Drugs – HSDde Cuijpers et al. (2002) é baseado na teoria decomportamento planeado de Ajzen & Fishbein(1990), na Teoria de Aprendizagem Social de Bandura(1996) e no Modelo de Mudança Comportamentalde McGuire (McGuire, 1985). A intervenção édesenvolvida em três fases ao longo de três anos.No primeiro ano decorrem 3 sessões dirigidas aotabaco, no segundo ano são efectuadas 3 sessõesdirigidas ao álcool e no terceiro, 3 sessões dirigidasà cannabis e ecstasy. Neste programa são avaliadosos consumos, os conhecimentos, as atitudes acercado álcool e a auto-eficácia.

O Project Towards No Drug Abuse – TNDA deDent et al. (2001) é um programa que utiliza oModelo Motivacional de Competências e Tomadade Decisão (Sussnan, 1996), desenvolvendo 9sessões, de 50 minutos cada, durante três semanasconsecutivas. Na primeira semana, a ênfase é dadaà aprendizagem das competências de escuta eficaz,na segunda semana são abordadas as conse-quências químicas relativas à dependência desubstâncias e aprendizagem de estratégias decoping alternativas, e por último na terceira semanaprocura-se o desenvolvimento de competênciasadicionais promovendo a motivação e o desenvolvi-mento de comportamentos adequados. Faz apenasreferência à avaliação da frequência do consumo.

As intervenções do Project NORTHLAND dePerry et al. (1996) incluem um curriculum sócio--comportamental, a liderança pelos pares eactividades comunitárias. As intervenções sãodesenvolvidas durante três anos e contam com oenvolvimento dos pais. Possui vários tipos deactividades: no 6.° ano são desenvolvidas activi-dades durante 4 semanas; no 7.° ano, realizam-se 8sessões lideradas pelos pares e no 8.° ano,

desenvolvem-se 8 sessões integrando umaprodução teatral. Avalia os consumos, a tendênciapara o consumo, a percepção do consumo pelospares, a percepção da acessibilidade e a auto--eficácia.

O programa de Drug Abuse ResistanceEducations – DARE de Clayton et al. (1996) – é umaintervenção de treino de resistência ao consumo desubstâncias. Combina vários aspectos, tais como, ainformação e educação acerca das substâncias e dosseus efeitos, as competências para resistir à pressãodos pares, a tomada de consciência da influênciados média para o consumo de substâncias, ascompetências de tomada de decisões, o desenvolvi-mento de percepções precisas dos consumos pelospares, o aumento da auto-estima e o reconheci-mento da responsabilidade pessoal na segurança.Desenvolve uma sessão de uma hora ao longo de17 semanas. Avalia o consumo, as atitudes acercado álcool, a resistência à pressão dos pares e apercepção dos pares para o consumo.

O Life Skills Training – LST de Botvin et al.(1990) – integra o Modelo de Influência Social e oModelo de Desenvolvimento de CompetênciasPessoais e Sociais. Envolve vários domíniosessenciais: educação acerca dos hábitos deconsumo habituais, treino de competências sociaise desenvolvimento de competências pessoais esociais. Inclui 12 unidades curriculares para seremleccionadas ao longo de 3 anos: 15 sessões no 7.°ano, 10 no 8.° ano e 5 no 9.° ano. Avalia o consumo,os conhecimentos, as atitudes e crenças acerca dasnormas, as competências de assertividade, a auto--eficácia, auto-estima e a ansiedade social.

Análise crítica da metodologia dos estudos

Para se proceder a uma análise crítica da metodo-logia dos estudos teve-se em conta a informaçãocontida nos artigos acerca de: a avaliação inicial dalinha de base e a avaliação pós-intervenção; adescrição do desenho metodológico e o nível decontrolo de estudo; a comparabilidade dos gruposde estudo na linha de base; a qualidade psico-métrica dos instrumentos; o atrito e a sua análise; o

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método e unidade de análise (individual/grupal); opapel das variáveis de confundimento; o viés.

Verificaram-se frequentes lacunas quanto àsdescrições metodológicas que passaremos aenunciar sumariamente:

Insuficiente descrição dos programas e dascondições da sua execução o que impede futurasreplicações;

Falta de descrição do “programa de prevençãohabitual” a decorrer no grupo controlo, nos doisestudos em que tal é referido;

Apesar de cinco estudos referirem distribuiçãoaleatória, apenas dois estudos descrevem de formacompleta a metodologia utilizada;

Em relação ao atrito, há uma grande variabili-dade (de 9% a 47%). Alguns estudos apresentamelevados níveis de atrito (superiores a 20%) e umaanálise pouco precisa do mesmo. Quando éanalisado, é avaliado o seu impacto na validadeinterna da investigação (manutenção da compara-bilidade nas condições de intervenção e controlo),no entanto, não é analisado o efeito na validadeexterna e, tendo em conta que existe uma maiorprobabilidade dos jovens que consomemabandonarem a escola, a generalização dosresultados deve ser limitada;

Todos os estudos, à excepção do ProjectoNORTHLAND de Perry, et al. (1996), avaliam asvariáveis relativas aos consumos através dequestionários de auto-resposta sem confirmaçãobioquímica(3);

Alguns estudos não apresentam as qualidadespsicométricas dos instrumentos utilizados.

Principais resultados

Quanto à conceptualização e desenho dasintervençõesO enquadramento conceptual da problemática edas intervenções encontra-se, na maioria dosestudos, razoavelmente bem definido. Tendo emconta o período de tempo considerado nos critérios

de inclusão – estudos posteriores a 1990 –,verificou-se que os estudos analisados sãoconcebidos com base numa abordagem baseada noModelo de Influência Social e no Desenvolvimentode Competências, tal como a revisão da literaturaapontava, integrando para o efeito várias teorias emodelos, tais como o Modelo de Crenças de Saúdede Becker (Becker, 1974), o Modelo de Aprendiza-gem Social de Bandura (Bandura, 1977), a Teoria deAuto-Eficácia de Mudança Comportamental deBandura (Bandura, 1985), a Teoria do Comporta-mento Planeado de Ajzen e Fishbein (Ajzen&Fishbein, 1990), o Modelo de Mudança Comporta-mental de McGuire (McGuire, 1985), o ModeloMotivacional de Competências de Tomada deDecisão (Sussnan, 1996) e a Teoria do Comporta-mento Problema de Jessor’s (Jessor & Jessor, 1997).

Os programas de intervenção apresentamdiferenças tanto nos conteúdos, e concomitan-temente nas variáveis mediadoras em estudo, comona sua operacionalização. Quanto ao conteúdo eestudo das variáveis mediadoras, a diversidade deteorias e modelos tomados pode justificar estasdiferenças. Por outro lado, nota-se uma influênciaintercorrente das três fases de conceptualizaçãoanteriormente enunciadas. O conhecimento, umavariável preponderante na primeira fase (1960-70),é igualmente considerado nos programas SHAHRP,HSD e LST. Relativamente à segunda fase, dos seteprogramas estudados, quatro (ALERT, HSD,NORTHLAND e DARE) estudam a auto-eficácia(capacidade de resistência) como uma das variáveisque influencia o uso/abuso de álcool. É esta aliás,assim, a variável mediadora que maior consensoreúne. Quanto ao Modelo de Influência Social e odesenvolvimento de competências pessoais esociais, cuja atenção se inicia na terceira fase, estãoinseridos em todos os programas, embora incidindoem diferentes aspectos. O estudo da influência depares, uma variável muito representativa destaterceira fase, é utilizado nos projectos ALERT eDARE. Outras variáveis como as atitudes (SHAHRP,HSD, DARE e LST), crenças (ALERT e LST) eassertividade (LST) são também utilizadas. Porúltimo, as expectativas são trabalhadas no projectoNORTHLAND.

(3) É de notar, contudo, que estudos recentes referem que se foremassegurados a confidencialidade e o anonimato é possível aumentar aprecisão das respostas dadas aos questionários (Skog, 1992).

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No que diz respeito às diferenças naoperacionalização, destaca-se as relativas ao tempode intervenção (1 a 3 anos), ao número de sessões(9 a 30) e à forma como são distribuídas nosdiferentes anos. Tendo em conta estas diferenças,poderemos classificar os programas como curtos oulongos de acordo com o período de tempo em queocorrem, como grandes ou pequenos tendo emconta o número de sessões envolvidas (magnitude)e de com ou sem reforço consoante se continuamnos anos subsequentes ou não. Considerando estasclassificações verificámos que a maioria dosprogramas decorre em mais do que um ano(SHAHRP, ALERT, HSD, NORTHLAND e LST),podendo os anos subsequentes funcionar comoreforços da intervenção inicial. Destes programas oúnico que é inteiramente dedicado à prevenção douso/abuso de álcool é o denominado SHAHRP.Contudo, se a maioria dos programas tem objectivosde prevenção de uso/abuso de várias substâncias,podendo ocorrer em diferentes anos umafocalização em temas específicos, poder-se-áconsiderar aspectos de finalidade comum e, porconseguinte, como reforços de um comportamentoa adoptar. Os programas desenvolvidos em mais doque um ano possuem, igualmente, muitasdiferenças quanto ao número total de anosenvolvidos, assim como à distribuição do númerode sessões em cada ano.

Por outro lado, o programa DARE, apesar dedecorrer num único ano (uma hora por semanadurante 17 semanas consecutivas), é bastante maislongo do que o programa TNDA que se apresentacomo uma intervenção caracteristicamente curta,embora intensiva (três vezes por semana em trêssemanas consecutivas, num total de 9 sessões).

Considerando a totalidade do programa podemosclassificar a maioria dos programas como grandes –SHAHRP (aproximadamente 17 sessões), ALERT (14sessões), DARE (17 sessões) e LST (30 sessões) –,enquanto que o programa TNDA é pequeno, poisinclui apenas 9 sessões. Relacionando o tempo coma magnitude verifica-se, também, uma grandevariabilidade com programas de grande magnitudea desenvolverem-se em períodos de tempo relativa-mente curtos enquanto que outros, com menor

número de sessões, se prolongam por períodos detempo mais alargados.

Encontramos diferenças, também, quanto aquem desenvolve os programas. Assim, enquanto amaioria dos programas é desenvolvida por professoresespecialmente treinados para o efeito, um é desen-volvido pelos professores de ciências (TNDA, deDent et al., 2001) e, por sua vez, o programa DAREde Clayton et al. (1996) tem a particularidade de serministrado por agentes da polícia.

As principais limitações para a análise dosprogramas são, por um lado, a apresentação poucoclara dos conteúdos desenvolvidos e das metodo-logias pedagógicas utilizadas, o que não permite aconstrução de uma matriz comparativa adequada e,por outro, os estudos analisados apresentaremainda grandes variações na definição e operaciona-lização das variáveis tanto no que respeita àsvariáveis dos consumos (frequência do consumo,padrões de consumo, consumo massivo) como àsvariáveis mediadoras (atitudes acerca do álcool,auto-eficácia, etc.) o que, como veremos adiante,também no que diz respeito aos resultados, tornadifícil a sua análise comparativa.

Quanto aos efeitos das intervençõesFomos analisar os resultados das intervençõescriando dois grandes grupos: resultados nas variáveisrelativas ao consumo de bebidas alcoólicas eresultados nas variáveis mediadoras, que seapresentam de forma esquemática no Quadro 1.

Variáveis relacionadas com o consumo de álcoolComo podemos verificar, apesar da maioria dosprogramas apresentar efeitos positivos no que dizrespeito ao consumo de álcool, encontramos algumasdiferenças. Assim, enquanto que os programasSHAHRP e HSD apresentam uma diminuição noconsumo actual de álcool e nos consumos de risconas amostras que receberam a intervenção, o LSTapresenta apenas diferenças significativas para oconsumo imoderado de álcool e, se os programasALERT(4) e TNDA só encontraram diferenças para os

(4) O programa ALERT apresenta também efeitos significativos noconsumo problemático, com consequentes comportamentos-problema(alcohol misuse).

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jovens que já possuíam um consumo de risco nalinha de base, no projecto NORTHLAND a diferençafoi estatisticamente significativa nos jovens que nãobebiam na linha de base.

Por sua vez o programa DARE não apresentoudiferenças estatisticamente significativas.

Variáveis mediadorasEm dois dos estudos (ALERT e TNDA) não são apresen-tados os resultados relativamente a estas variáveis.Nos restantes, são apresentadas, maioritariamente,diferenças significativas entre o grupo de inter-venção e o grupo de controlo para as variáveis

QUADRO 1 – Síntese dos Principais Resultados dos Programas e Enquadramento.

SHAHRPSchool Health AlcoholHarm Reduction Project(McBride et al., 2004)Austrália

Programas

A

* A - Álcool; T - Tabaco; OD - Outras Drogas.

Subs-tância*

Verificaram-se efeitos estatisticamentesignificativos do programa. Os estudantesdo GI consumiam significativamentemenos álcool, em contextos desupervisão e com menos problemasassociados ao consumo de álcool do queos estudantes do GC.No 1.° e 2.° follow-up o GI consomesignificativamente menos que o GC,convergência no 3.° follow-up.

Efeito da intervençãono consumo de álcool

Efeito da intervençãonas variáveis mediadoras

Aspectosmetodológicos

Efeitos significativos do programa nasAtitudes, Conhecimentos ao longo detodos follow-up, com convergência noúltimo follow-up apenas para osconhecimentos.

Quasi-experimentalcom GCn = 230024% atritoFollow-up 8, 10,20 e 32 meses

PROJECT ALERT(Ellickson et al., 2003)Estados Unidos

AT

OD

Efeitos estatisticamente significativos nosjovens que tinham consumo de risco nalinha de base (consumiram 3 ou maisvezes no último ano).Verificaram efeitos estatisticamentesignificativos do programa para oscomportamentos-problema associadoscom o consumo de álcool (alcoholmisuse).

Não apresenta os resultados das variáveis RCT,n = 42779% atritoFollow-up 18 meses

HEALTHY SCHOOLAND DRUGS(Cuijpers et al., 2002)Holanda

AT

OD

Verificaram-se efeitos estatisticamentesignificativos do programa para oconsumo de álcool e consumo de risco.

Efeitos significativos do programa nasAtitudes, Conhecimentos no primeirofollow-up.Não encontraram efeitos do programapara a auto-eficácia.

Quasi-experimentalcom GCn = 193027% atritoFollow-up 1 anoe 2 anos

PROJECT TOWARDSNO DRUG ABUSE(Dent et al., 2001)Los AngelesEstados Unidos

AT

OD

Efeitos estatisticamente significativos nosjovens que tinham consumo mais elevadoe de risco na linha de base.

Não apresenta outras variáveis RCT,n = 120837% atritoFollow-up 1 ano

PROJECTNORTHLANDHigh SchoolIntervenções(Perry et al., 1996)Estados Unidos

AT

OD

Efeitos significativos nos jovens que nãobebiam na linha de base.

Efeitos significativos do programa natendência para o uso de álcool, nosignificado funcional do álcool, napercepção do uso de substâncias pelospares, desenvolvimento de comunicaçãoentre pais e filhos acerca dasconsequências do consumo de bebidas.

RCT,n = 235119% atritoFollow-up 3 anos

DARE - Drug AbuseResistance Educations(Clayton, 1996)Kentucky EstadosUnidos

AT

OD

Não se verificaram efeitos significativosdo programa.

No 1.° ano efeitos significativos doprograma nas atitudes acerca das drogas,capacidade de resistir à pressão dospares, na percepção do uso de drogaspelos outros. 5 anos depois não seencontram diferenças estatisticamentesignificativas entre o GI e GC.

RCT,n = 207145% atritoFollow-up 1 anoe 5 anos

LIFE SKILLSTRAINING (LST)(Botvin et al., 1990)Estados Unidos

AT

OD

Verificaram-se efeitos significativos doprograma para o consumo imoderadode álcool (embriaguês).Não se verificaram efeitos significativosdo programa para a frequência equantidade no consumo de álcool.

Efeitos significativos do programa nosconhecimentos, percepção do consumopelos pares e nas competênciasinterpessoais.Não se encontraram efeitos significativosdo programa nas variáveis da persona-lidade.

RCT,n = 4466atrito analisadoFollow-up 1 anoe 3 anos

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mediadoras estudadas. Constituem excepções osresultados encontrados na variável auto-eficácia,na intervenção HSD e nas variáveis da personali-dade, no programa LST. O estudo que reporta osresultados do seguimento de follow-up mais longo(5 anos, DARE) verifica que as diferenças encon-tradas entre grupo experimental e grupo decontrolo, estatisticamente significativas nasprimeiras avaliações, tendem a convergir ao longodo tempo. Por sua vez o estudo de McBride et al.(2004) – SHAHRP – com um último follow-up de 32meses, só encontrou esta convergência deresultados para a variável conhecimentos.

Discussão

Dos 371 artigos analisados foram consideradosrelevantes 53. Destes, não foi possível aceder a 8 emtexto integral pelo que esta revisão apresenta, àpartida, este viés. Os 45 restantes foram sujeitos aanálise detalhada. Obedecendo aos critérios deinclusão para este estudo ficaram 7, que foramsubmetidos a uma análise comparativa rigorosa nosentido de responder à nossa questão de investi-gação: os programas de intervenção paraprevenção de uso/abuso de álcool, dirigidos aosadolescentes, são eficazes?

O resultado deste estudo mostra que a maioriados programas produziu um efeito positivo, emborapor vezes limitado, no consumo de álcool.

Analisando os artigos que serviram paradivulgar os resultados dos diferentes programasverifica-se que estes possuem um enquadramentoconceptual com uma base comum, embora comenfatização de aspectos particulares diversos.Assim, verificámos que sendo os programasbaseados no Modelo de Influência Social e noDesenvolvimento de Competências, a ênfase écolocada nos factores sociais e psicológicos, nosentido de prevenir o início do uso de substâncias.No entanto, os focos de intervenção apresentamuma grande variabilidade, como se pode verificarpelos vários componentes identificados, tais como:

conhecimentos acerca das substâncias, seus efeitose consequências do consumo; resistência à pressãosocial; atitudes e expectativas seguras acerca dassubstâncias; correcção da percepção dos hábitos deconsumo e o treino de competências sociais epessoais.

A grande diversidade de programas, tanto noque diz respeito às variáveis seleccionadas como aodesenho da intervenção no que se refere ao tempoe ao modo, pode ser percebida tendo em conta duasordens de factores. Por um lado, as diferençascontextuais e culturais em que os programas foramdesenvolvidos e, por outro, a ausência de umaevidência empírica suficientemente forte quepermita uma selecção acurada das variáveisintervenientes, ou simultaneamente, a existência deuma plêiade de factores potencialmente explica-tivos com igual força nas suas relações. Assim, se omodelo conceptual geral parece possibilitar umbom enquadramento para a elaboração e planea-mento das intervenções, por outro lado, a análisedos resultados indica-nos que futuras investigaçõesdevem procurar estabelecer a influência relativa decada variável seleccionada e dos diferentes modosde implementação.

Ao analisarmos as diferenças dos programas edos resultados por eles obtidos sobressai a ausênciade efeitos positivos no consumo de álcool noprograma DARE, os efeitos positivos mas limitadosa sub-amostras – de jovens distinguidos por seremou não consumidores na linha de base ou de tipo deconsumos –, nos programas ALERT, TNDA,NORTHLAND e LST, e os efeitos mais consistentesalcançados pelos programas SHAHRP e HSD.

As diferenças apresentadas pelos diversosprogramas na selecção das variáveis mediadorasnão parecem, neste estudo, ser suficientementeconsistentes para justificar as diferenças nosresultados obtidos por cada programa emparticular. O programa DARE, o único a nãoconcluir por qualquer diferença significativa emrelação ao grupo controlo, partilha com outrosprogramas variáveis como atitudes (SHAHRP, HSD,LST), auto-eficácia (ALERT, HSD, NORTHLAND) einfluência dos pares (ALERT). Ao mesmo tempo

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verificámos que todos os estudos(5), incluindo oDARE, reportam diferenças significativas nasvariáveis mediadoras, no final dos programas, comos grupos experimentais a apresentarem, nageneralidade, mais competências nos diferentesdomínios trabalhados.

Tomando ainda como referência o programaDARE verifica-se que este apresenta uma diferençametodológica importante relativamente aos demais.Neste programa, o grupo controlo também estava aser submetido a um programa de intervenção – ohabitual incluído no currículo – pelo que, para sersignificativo o efeito do programa de intervenção,as avaliações realizadas teriam que se sobreporàquele. De facto, não se está aqui a comparar osresultados de uma intervenção com o percursonormal de desenvolvimento destes jovens, masantes, a comparar a diferença do efeito produzidopor dois tipos de intervenção diferentes. É aindarelevante salientar que a ausência da descrição doprograma curricular é impeditiva de uma análisemais aprofundada acerca desta similitude dosresultados entre os grupos.

As diferenças encontradas em sub-amostrasespecíficas levantam um outro tipo de problema:a de saber se os programas devem ser dirigidosà população em geral ou a grupos específicos.De acordo com Loveland-Cherry (1999) a noção deque as intervenções serão mais eficazes quandodirigidas a grupos específicos tem recebido umapoio crescente, argumentando-se com a eficácia eeficiência dos programas focalizados em grupos dealto risco. Por outro lado, o facto dos adolescentesconstituírem um grupo em risco para um conjuntode factores que afectam a sua saúde tem sidoutilizado para defender a pertinência de programasde promoção da saúde.

Neste estudo, verificámos que os programasALERT e TNDA encontraram efeitos significativosnos consumidores de risco na linha de base aocontrário do programa de NORTHLAND queencontrou efeitos significativos nos não consumi-dores na linha de base. Porém, é de salientar que no

programa ALERT, 60% dos jovens já consumia nalinha de base e que o TNDA era dirigido aadolescentes já numa fase intermédia (14 aos 17anos). Para além disso, este é desenhado como umprograma curto e intensivo, inicialmente direccio-nado para jovens de alto risco. Por sua vez oprograma NORTHLAND possui a intervenção deinício mais precoce (6.° ano de escolaridade), numafaixa etária onde é esperado que a maioria dosjovens não tenha tido contacto com o uso desubstâncias e é uma intervenção longa, acompa-nhando o seu desenvolvimento durante três anos.Estas diferenças podem indicar que a população--alvo e o tempo em que decorre o programa sãocritérios diferenciadores importantes nos resultadosobtidos. Um período mais alargado de tempo para aocorrência do programa pode ser particularmenteimportante quando se pretende não a alteração deum comportamento de risco já adquirido mas,antes, com uma finalidade preventiva, a aquisiçãode comportamentos protectores de saúde.

Os programas SHAHRP e HSD são os quemelhores resultados reportam, encontrando efeitossignificativos tanto para o consumo de álcool comopara os consumos de risco. Em comum estesprogramas possuem o facto de serem longos (2 e 3anos) e trabalharem variáveis relativas aos conheci-mentos, à afectividade e ao desenvolvimento decompetências pessoais e sociais. Diferencia-os ofacto de um estar desenhado especificamente parao álcool (SHAHRP) e o outro ser dirigido ao tabaco,álcool e cannabis. Apesar dos bons resultadosapresentados quer por um quer por outro dosprogramas é de realçar que no programa dedicadoa várias substâncias, os piores resultados foram osreferentes ao álcool. Este facto não pode deixar delevantar algumas questões:

– Será que os programas ao serem desenhadosespecificamente para determinadas substân-cias terão maiores probabilidades de serevelarem eficazes?

– Será que o facto de as intervenções serem dirigidasa substâncias tão diferentes (álcool, tabaco eoutras drogas) não introduz “falsas” percepçõesnos jovens no sentido de considerarem umassubstâncias mais seguras do que outras?

(5) Os estudos ALERT e TNDA não apresentam os resultados obtidosnestas variáveis.

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Devemos observar que a maioria dos estudosapresenta como objectivo a abstinência para todasas substâncias, incluindo o álcool(6). Este aspectoassume grande importância e reflecte o dilema dedeterminar de forma realista e apropriada qual oobjectivo comportamental da intervenção adesenvolver com os adolescentes. Nesta faixa etáriaa abstinência é o comportamento mais apropriado,tendo em conta as consequências físicas e psicoló-gicas já referidas. Mas é sabido que o uso de álcoolestá amplamente difundido e que o seu consumoadequado na adultez é socialmente aceite. Estefacto leva-nos a assumir, com Loveland-Cherry(1999), que, no que diz respeito ao álcool, é maisrealista e benéfico focalizar os programas nodesenvolvimento de um comportamento respon-sável, embora não promotor do consumo, e em queos objectivos sejam claramente os de adiar aexperimentação e de esclarecer e consolidar asregras de moderação para consumo de álcool nosadultos saudáveis.

Conclusões

A revisão sistemática realizada seguiu o método dePICOD(7).

A grande diversidade apresentada pelosprogramas de intervenção dificulta o estabeleci-mento de um padrão comparativo que permita, comclareza, realçar as relações entre variáveis quemelhor contribuem para a eficácia das intervenções.Contudo, se podemos concluir que a maioria dosprogramas de intervenção para prevenção de uso//abuso de álcool dirigidos aos adolescentes emmeio escolar é eficaz, mesmo que por vezes comuma acção mais limitada, poder-se-á igualmentesugerir que as intervenções realizadas em períodosmais longos de tempo e/ou com reforços em anossucessivos foram aquelas que melhores resultadosapresentaram. Poder-se-á, assim, afirmar que uma

implicação prática diz respeito não só à importânciade implementar as intervenções num períodorelevante para o desenvolvimento dos jovens masainda à necessidade de manter os programas activosatravés de sessões reforçadoras no sentido demanter os efeitos iniciais das intervenções.

Os programas apresentados diferem na selecçãodas variáveis que foram sujeitas a intervenção.O conhecimento actual indica que o consumo desubstâncias tem um complexo conjunto dedeterminantes que podem incluir uma variedade defactores cognitivos, atitudinais, sociais, dapersonalidade, farmacológicos e de desenvolvi-mento que propiciam a iniciação e a manutençãodo consumo de substâncias. Por outro ladodesconhece-se o peso relativo de cada um destesfactores uma vez que a investigação já realizada nãopermite retirar conclusões a este respeito.

O estudo comparativo realizado permiteconcluir que apesar dos consideráveis progressosrealizados na abordagem teórica do fenómeno sãonecessários mais esforços no sentido de operacio-nalizar essas abordagens em intervenções.Ao mesmo tempo só a replicação sistemática dosprogramas de intervenção, quer em gruposdiferenciados quer com a alteração controlada decomponentes, possibilitará a construção demodelos explicativos mais completos. Por outrolado, apesar do sucesso relativo dos programas deintervenção, há pouca evidência acerca dos seusefeitos a longo prazo.

Contudo, tendo em conta os problemaspessoais, sociais e económicos relacionados com oabuso e uso inadequado de álcool, sabendo que oshábitos de consumo são formados durante ajuventude, há fortes argumentos para integrar nocurriculum escolar programas de prevenção acercado álcool. Em Portugal, apesar de 80% dos Centrosde Saúde desenvolverem programas de saúdeescolar é reconhecido que estes são ainda“incipientes, em particular a definição dos projectosnos domínios do planeamento, coordenação eavaliação dos mesmos” (DGS, 2004: 38) o quepoderá explicar o não se ter conseguido integrarnenhum estudo realizado no país.

(6) Com excepção do programa australiano, SHAHRP (McBride, et al.,2004) que tem como objectivo a redução de danos.(7) Participantes, Comparação, Intervenções, Variáveis (resultados) eDesenho.

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