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UNIVERSIDADE DA AMAZÔNIA
PRO-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO, PESQUISA E EXTENSÃO
PROGRAMA DE MESTRADO EM ADMINISTRAÇÃO
DIANA CRUZ RODRIGUES
REDE DE INOVAÇÃO INTERORGANIZACIONAL:
ANÁLISE DA APROPRIABILIDADE E CONVERGÊNCIA COM
DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL
BELÉM-PA
2014
DIANA CRUZ RODRIGUES
REDE DE INOVAÇÃO INTERORGANIZACIONAL:
ANÁLISE DA APROPRIABILIDADE E CONVERGÊNCIA COM
DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em Administração da Universidade da
Amazônia como requisito para obtenção do título de Mestre em Administração.
Linha de Pesquisa: Desenvolvimento Sustentável.
Orientador: Prof. Dr. Mário Vasconcellos Sobrinho.
BELÉM-PA
2014
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
Biblioteca Central
658
R696r Rodrigues, Diana Cruz.
Rede de inovação interorganizacional: análise da
apropriabilidade e convergência com desenvolvimento sustentável /
Diana Cruz Rodrigues. – Belém, 2014.
236 f.: il.; 21 x 30 cm.
Dissertação (Mestrado) – Universidade da Amazônia, Programa
de Pós- Graduação em Administração, 2014.
Orientador: Prof. Dr. Mário Vasconcellos Sobrinho.
1. Inovação interorganizacional – apropriação. 2. Rede
interorganizacional. 3. Relações interorganizacionais. 4.
Desenvolvimento sustentável. 5. Biodiversidade – Amazônia I.
Vasconcellos Sobrinho, Mário. II. Título.
DIANA CRUZ RODRIGUES
REDE DE INOVAÇÃO INTERORGANIZACIONAL:
ANÁLISE DA APROPRIABILIDADE E CONVERGÊNCIA COM
DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em Administração da Universidade da Amazônia como requisito para obtenção do título
de Mestre em Administração.
Linha de Pesquisa: Desenvolvimento Sustentável. Orientador: Prof. Dr. Mário Vasconcellos
Sobrinho.
BANCA EXAMINADORA:
Data de aprovação: ___/___/_____.
_______________________________________
Prof. Dr. Mário Vasconcellos Sobrinho / Unama
Orientador
_______________________________________
Prof. Dr. Emílio Arruda Filho / Unama
_______________________________________
Prof. Dr. José Márcio de Castro / PUC-Minas
Conceito:__________
BELÉM-PA
2014
AGRADECIMENTOS
Aos colegas da turma do mestrado 2012, pela companhia em percorrer essa mesma estrada e
sonhar o mesmo sonho. Em especial, agradeço as amigas Nayara Baraúna, Renata Fares e
Socorro Viegas pelo apoio nos trabalhos e estudos, pelo compartilhar dificuldades e desafios,
e pelos risos que fizeram com que tudo ficasse mais leve e colorido.
Ao Programa de Pós Graduação em Administração da Unama e todos os professores que se
dedicam a formar alunos para este campo. Cada um ao seu modo e todos em sua diversidade,
colaboraram para fortalecer meu aprendizado, minhas capacidades e decisões. Em particular,
ao meu orientador, Prof. Mário Vasconcellos Sobrinho, pela sua paciência, compromisso e
incentivo ao meu crescimento acadêmico com uma confiança que muitas vezes foi além da
minha própria.
À Escola de Administração de Empresas de São Paulo (EAESP) da Fundação Getúlio Vargas,
em nome dos professores Maria Rita Loureiro, Marco Antonio Teixeira, José Carlos Barbieri
e, em especial, à Marta Farah pela acolhida generosa e pelo aprendizado muito além da
vivência de excelência acadêmica, exemplos de vida e dedicação.
À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) pela
oportunidade por meio do Programa Nacional de Cooperação Acadêmica (PROCAD) de
realizar intercambio acadêmico na EAESP/FGV.
À Fundação de Âmparo e Desenvolvimento da Pesquisa (Fadesp) e todos os amigos que lá
fiz, pela trajetória de aprendizado e amadurecimento profissional e pessoal, proporcionado o
tempo e espaço para este sonho surgir na forma de decisão.
À UFPA, Amazon Dreams e ao Grupo Petruz (Belaiaçá) pela colaboração e confiança no
compartilhamento de relatos e informações para desenvolvimento desta pesquisa, sem os
quais este trabalho não seria possível. Também gostaria de agradecer a paciência e disposição
dos entrevistados (destas organizações e de outras) pelas longas horas de conversa. E, em
particular, minha admiração ao Prof. Hervé Rogez por acreditar em seu sonho e fazer
acontecer.
À minha família e amigos, pela convivência, carinho e amor. Em especial: Aos meus pais, à
minha mãe, pelo apoio e incentivo sempre, e ao meu pai pelo cuidado silencioso e confiança;
aos meus tios e tias sempre de algum modo presentes e seus exemplos de superação; à
Heletéia pelo reencontro e apoio em São Paulo; e à Renata pela afinidade e aprendizado dos
encontros e desencontros.
A Deus, pela fé na realização e na busca da verdade, quando tudo mais se desconecta.
RESUMO
Esta dissertação teve como objetivo analisar as condições de apropriabilidade de uma
inovação baseada em ativo da biodiversidade da região amazônica desenvolvida por uma rede
de relações interorganizacionais, sob a perspectiva de diretrizes do desenvolvimento
sustentável. A pesquisa se baseou em um estudo de caso de uma rede de inovação formada
pela Universidade Federal do Pará e as empresas Amazon Dreams e Belaiaçá para o
desenvolvimento e comercialização de uma linha de produtos inovadores de compostos
antioxidantes de açaí. O desenho do estudo se fundamentou por três níveis de análise: (1) o
contexto em que a rede de inovação interorganizacional atua, no qual são examinados os
constructos de paradigma tecnológico e de regime de apropriabilidade; (2) os atores
organizacionais com a investigação do constructo de capacidades de inovação; e, (3) a rede de
relações interorganizacionais, tendo como constructo a orquestração de redes de inovação.
Entendemos que o arranjo em rede interorganizacional configurou-se em uma resposta
adequada para superação das dificuldades individuais das organizações locais em termos de
capacidades para inovação, proporcionando a congregação de capacidades tecnológicas e de
produção necessárias. Também consideramos que o caso estudado confirma o potencial de
oportunidades biotecnológicas baseada em bioativos amazônicos, no entanto o impacto de
diretrizes de desenvolvimento sustentável sobre as condições de apropriabilidade no modelo
de negócio implementado foi limitada pela falta de coevolução de mudanças sociais, políticas
e institucionais convergentes com um projeto de desenvolvimento regional. Além disso,
observamos dificuldades relacionadas a falhas na constituição de capacidades de
comercialização e proteção da inovação na rede de inovação e barreiras na estrutura das
relações interorganizacionais quanto ao estabelecimento de reciprocidade entre os atores
organizacionais.
Palavras-chave: Apropriação de benefícios da inovação. Rede interorganizacional.
Desenvolvimento sustentável.
ABSTRACT
This dissertation aims to analyze the appropriability of an innovation based on the
biodiversity asset of the Amazon region developed by a interorganizational network, from the
perspective of sustainable development guidelines. The research was based on a case study of
an innovation network that involves the Federal University of Pará, Amazon Dreams and
Belaiaçá for the development and trading of a set of innovative antioxidants products from
acai. The study design was based on three levels of analysis: (1) the context of innovation
network, in which addressed the constructs of technological paradigm and regime of
appropriability; (2) organizations of network to research the construct of innovation
capabilities; and (3) the inter-organizational relationships network to study the construct of
orchestrating innovation networks. We understand that the arrangement of interorganizational
network configured in a response to overcoming individual difficulties of local organizations
in terms of innovation capabilities, and provided the gathering of technological and
production capabilities required. We also consider that the case study confirms the potential
of biotechnology opportunities from Amazon biodiversity, however the impact of sustainable
development guidelines on appropriability conditions in the business model was limited by
the lack of coevolution of social, political and institutional innovations in the region.
Furthermore, we observed problems in the network organizations related to difficulties in
building trading and protection of innovation capabilities and in barriers in the structure of
interorganizational relations to establish a sense of reciprocity between them.
Keywords: Appropriating the returns from innovation. Network of interorganizational
relationships. Sustainable Development.
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
AD Amazon Dreams
ALI Agentes Locais de Inovação do SEBRAE
BASA Banco da Amazônia
C&T Ciência e Tecnologia
CAPES Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior
CDB Convenção sobre Diversidade Biológica
CGEE Centro de Gestão e Estudos Estratégicos
CGEN Conselho de Gestão do Patrimônio Genético
CMMAD Comissão Mundial para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento
CNPq Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico
COFRUTA Cooperativa de Fruticultores de Abaetetuba
CRIATEC Fundo Criatec de Capital Semente do BNDES e BNB
CT&I Ciência, Tecnologia e Inovação
EMBRAPA/CPATU Embrapa Amazônia Oriental
EMBRAPII Empresa Brasileira de Pesquisa e Inovação Industrial
EMI Electrical Musical Industries
EPO European Patent Office
FEA Faculdade de Engenharia de Alimentos do Instituto de Tecnologia
(ITEC) da UFPA
FNDCT Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico
FUNAI Fundação Nacional do Índio
GMA-SAFE Grocery Manufacturers Association - Supplier Assessment for Food
Excellence Program
IBAMA Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais
Renováveis
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IEC Instituto Evandro Chagas
INPE Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais
INPI Instituto Nacional da Propriedade Industrial
ISO 22.000 Norma ABNT NBR sobre Sistemas de Gestão de Segurança de
Alimentos
ITEC Instituto de Tecnologia da UFPA
JAS Japan Agriculture Standard
JPO Japan Patent Office
MAPA Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento
MCTI Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação
MEC Ministério da Educação
MMA Ministério do Meio Ambiente
MPEG Museu Paraense Emilio Goeldi
OCDE Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico
OMC Organização Mundial do Comércio
OMPI Organização Mundial de Propriedade Intelectual
ONU Organização das Nações Unidas
ORAC Oxygen Radical Absorbance Capacity
P&D Pesquisa e Desenvolvimento
PAPPE Programa de Subvenção à Pesquisa em Microempresas e Empresas de
Pequeno Porte da FINEP
PIB Produto Interno Bruto
PIEBT Programa de Incubação de Empresas de Base Tecnológica
PINTEC Pesquisa Nacional de Inovação Tecnológica
RHAE Programa de Formação de Recursos Humanos em Áreas Estratégicas
do CNPq
SAGRI Secretaria de Estado de Agricultura (Pará)
SECTAM Secretaria Estadual de Ciência, Tecnologia e Meio Ambiente (Pará -
Até 2007)
SECTI Secretaria de Estado de Ciência, Tecnologia e Inovação (Pará - A
partir de 2011)
SEDECT Secretaria de Estado de Desenvolvimento, Ciência e Tecnologia (Pará
- Entre 2007 e 2011)
SPE Sociedade de Propósito Específico
SPI Setor de Propriedade Intelectual da Agência de Inovação da UFPA
TRIPS Acordo sobre os Direitos de Propriedade Intelectual Relacionados ao
Comércio
UFOPA Universidade Federal do Oeste do Pará
UFPA Universidade Federal do Pará
UFRA Universidade Federal Rural da Amazônia
UNIFESPA Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará
UNIVERSITEC Agência de Inovação da UFPA
USDA United States Department of Agriculture
USPTO United States Patent and Trademark Office
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 - Principais elos da cadeia produtiva do açaí. 66
Figura 2 - Quantidade da Produção Total, Cultivada e de Extração Vegetal de Açaí
no Estado do Pará no período de 2003 a 2012.
67
Figura 3 - Gráfico da evolução do número de cursos de pós graduação stricto sensu
na UFPA – período de 2008 a 2012.
111
Figura 4 - Registros de pedidos de patentes da UFPA publicados junto ao INPI. 115
Figura 5- Gráfico de distribuição de membros da Amazon Dreams por
departamento (em dezembro de 2012).
120
Figura 6 - Imagens da marca, produtos e reportagens da Amazon Dreams. 124
Figura 7 - Imagens do site, produtos e instalações da Belaiaçá. 132
Figura 8 - Quadro de referência sobre processos de orquestração de redes de
inovação.
152
Figura 9 - Rede de relações interorganizacional durante o período de invenção da
linha de produtos inovadores.
155
Figura 10 - Quadro comparativo entre o composto concentrado antioxidante
desenvolvido pelas AD e UFPA, e demais produtos disponíveis no
mercado em termos da proporção ORAC por dólar.
158
Figura 11 - Rede de parcerias durante a implementação do negócio (inovação). 166
Figura 12 - Demonstrativo de distribuição de percentuais a serem apropriados pelas
organizações sobre o resultado da comercialização dos produtos da linha
de antioxidante do açaí.
168
Figura 13 - Mapa conceitual dos constructos da pesquisa. 227
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 - Percentual da distribuição de empresas industriais que realizaram
atividade inovativa no triênio 2006/2008, por região.
34
Tabela 2 - Percentual de aplicação de recursos pelos governos estaduais em CT&I
por região do Brasil em 2007.
56
Tabela 3 - As quatro dimensões de habilidades que compõem a capacidade absortiva
por Zahra e George (2002).
89
Tabela 4 - Padrões Setoriais de Mudança Técnica. 96
Tabela 5 - Tabela de categorias de capacidades relacionadas à acumulação
tecnológico.
101
Tabela 6 - Número de Cursos de Pós Graduação Stricto Sensu na UFPA – por área
de conhecimento – período de 2008 a 2012.
111
Tabela 7 - Análise do padrão de mudança técnica da Amazon Dreams. 122
Tabela 8 - Análise do padrão de mudança técnica da Belaiaçá. 133
Tabela 9 - Evidências no estudo de caso sobre o constructo Regime de
Apropriabilidade.
182
Tabela 10 - Evidências no estudo de caso sobre a influência de aspectos vinculados à
sustentabilidade ao constructo Regime de Apropriabilidade.
184
Tabela 11 - Evidências no estudo de caso sobre o constructo Trajetória Tecnológica. 187
Tabela 12 - Evidências do estudo de caso sobre a influência de aspectos vinculados à
sustentabilidade ao constructo Trajetória Tecnológica.
189
Tabela 13 - Evidências no estudo de caso sobre o constructo Capacidades. 192
Tabela 14 - Evidências do estudo de caso sobre a influência de aspectos vinculados à
sustentabilidade ao constructo Capacidades.
193
Tabela 15 - Evidências no estudo de caso sobre o constructo de Relações
Interorganizacionais.
197
Tabela 16 - Evidências do estudo de caso sobre a influência de aspectos vinculados à
sustentabilidade ao constructo de Relações Interorganizacionais.
198
Tabela 17 - Matriz de constructos sobre apropriação de resultados de inovação. 223
Tabela 18 - Matriz de constructos sobre apropriação de inovação e interveniência de
aspectos vinculados à sustentabilidade a serem explorados.
224
Tabela 19 - Constructos referentes a análise de interação interorganizacional
relacionados à apropriabilidade.
226
Tabela 20 - Matriz de constructos sobre apropriação de resultados em rede de
inovação.
229
SUMÁRIO
APRESENTAÇÃO 14
1 INTRODUÇÃO AO DEBATE SOBRE APROPRIAÇÃO DE
BENEFÍCIOS EM UMA REDE DE INOVAÇÃO SOB A PERSPECTIVA
DO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL
18
1.1 INTRODUÇÃO 18
1.2 REDES DE INOVAÇÃO 19
1.3 APROPRIAÇÃO DE RESULTADOS DE INOVAÇÕES 21
1.4 INOVAÇÃO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 24
1.5 REDES DE INOVAÇÃO NA AMAZÔNIA E BIODIVERSIDADE 29
1.6 CONSIDERAÇÕES CONCLUSIVAS: LACUNAS NO CONHECIMENTO
SOBRE REDES DE INOVAÇÃO PARA O DESENVOLVIMENTO
SUSTENTÁVEL NA AMAZÔNIA
35
2 A INOVAÇÃO BIOTECNOLÓGICA COMO UMA ALTERNATIVA
PARA O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL
37
2.1 INTRODUÇÃO 37
2.2 PARADIGMAS TECNOLÓGICOS 38
2.2.1 Trajetórias tecnológicas 41
2.2.2 Oportunidades tecnológicas 44
2.2.3 Convergência com o desenvolvimento sustentável 47
2.3 A INOVAÇÃO BIOTECNOLÓGICA COMO OPORTUNIDADE DE
DESENVOLVIMENTO NO PARÁ: O CONTEXTO EMPÍRICO DA
PESQUISA
51
2.3.1 Breve histórico sobre as bases institucionais da inovação 51
2.3.2 Biotecnologia como oportunidade de negócio 57
2.3.3 Cadeia produtiva do açaí e o potencial da exploração da biotecnologia 62
2.4 REGIME DE APROPRIABILIDADE 73
2.4.1 Mecanismos de apropriação de inovações 75
2.4.2 Convergência com o desenvolvimento sustentável 77
2.4.3 Apropriação sobre inovações baseadas na biodiversidade: regulamentação
de acesso ao patrimônio genético e regime de apropriabilidade
79
2.5 CONSIDERAÇÕES CONCLUSIVAS 83
3 ATORES ORGANIZACIONAIS E SUAS CAPACIDADES 85
3.1 INTRODUÇÃO 85
3.2 RECURSOS E CAPACIDADES DAS ORGANIZAÇÕES 85
3.2.1 Capacidades dinâmicas 87
3.2.2 Capacidades absortivas 88
3.2.3 Capacidades de inovação 90
3.2.4 Padrões de mudança técnica setorial 93
3.2.5 Acumulação tecnológica em países em desenvolvimento 98
3.2.6 Capacidades, aprendizado e apropriabilidade 104
3.2.7 Capacidades e sustentabilidade 106
3.3 ATORES ORGANIZACIONAIS 109
3.3.1 Universidade Federal do Pará 110
3.3.2 Amazon Dreams 116
3.3.3 Belaiaçá 125
3.4 CONSIDERAÇÕES CONCLUSIVAS 134
4 REDE DE RELAÇÕES INTERORGANIZACIONAIS E O PROCESSO
DE INOVAÇÃO
137
4.1 INTRODUÇÃO 137
4.2 FORMAS DE ORGANIZAÇÃO EM REDE 137
4.2.1 Estrutura de redes 138
4.2.2 Governança em organização em rede 140
4.2.3 Funções 141
4.2.4 Disfunções 144
4.3 REDES DE INOVAÇÃO E BIOTECNOLOGIA 145
4.3.1 Biotecnologia 147
4.4 GESTÃO DE PROCESSOS DE APROPRIABILIDADE EM REDES DE
INOVAÇÃO
150
4.5 COMPOSTOS ANTIOXIDANTES DE AÇAÍ: PROCESSO DE INOVAÇÃO
E RELAÇÕES INTERORGANIZACIONAIS
153
4.5.1 O processo de inovação e as relações interorganizacionais 153
4.5.2 Benefícios identificados pelos atores organizacionais da rede de inovação
interorganizacional
177
4.6 CONSIDERAÇÕES CONCLUSIVAS 180
5 CONCLUSÃO PARA O DEBATE SOBRE APROPRIAÇÃO DE
BENEFÍCIOS DA INOVAÇÃO SOB A PERSPECTIVA DO
DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL À LUZ DA INOVAÇÃO EM
BIOTECNOLOGIA NA REDE INTERORGANIZACIONAL NO PARÁ
182
5.1 INTRODUÇÃO 182
5.2 REGIME DE APROPRIABILIDADE 182
5.3 TRAJETÓRIA TECNOLÓGICA 187
5.4 CAPACIDADES 190
5.5 RELAÇÕES INTERORGANIZACIONAIS 194
5.6 A GERAÇÃO DE BENEFÍCIOS COM A INOVAÇÃO E A PERSPECTIVA
DO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL
199
5.7 CONSIDERAÇÕES CONCLUSIVAS 206
REFERÊNCIAS 211
APÊNDICE A – DESENHO TEÓRICO E METODOLOGIA DA PESQUISA 221
A.1 DESENHO TEÓRICO DA PESQUISA 221
A.1.1 DESENVOLVIMENTO DOS CONSTRUCTOS DE ANÁLISE 221
A.1.1.1 Apropriação da inovação 221
A.1.1.2 Interveniência de critérios de sustentabilidade 223
A.1.1.3 Estrutura e processos de redes interorganizacionais 224
A.1.1.4 Apuração de resultados da inovação (variável dependente) 226
A.1.2 NÍVEIS DE ANÁLISE DOS CONSTRUCTOS 227
A.1.3 CONTRIBUIÇÕES E LIMITAÇÕES DO DESENHO DE PESQUISA 229
A.2 METODOLOGIA 230
A.2.1 OBJETO DE ESTUDO 230
A.2.2 MÉTODO 231
A.2.3 TÉCNICAS DE COLETA DE DADOS 231
A.2.4 SELEÇÃO DE CASO PARA ESTUDO 232
A.2.5 LIMITAÇÕES DO MÉTODO 233
APÊNDICE B – ROTEIROS DE ENTREVISTAS 234
14
APRESENTAÇÃO
Não é comum fazer apresentação em uma dissertação, mas escrevo este texto inicial na
intenção de expor dois importantes aspectos deste trabalho acadêmico. O primeiro aspecto é
buscar esclarecer minha relação com o objeto de pesquisa e o “lugar de onde falo”1. O
segundo aspecto é explicar a razão pela qual optei por não fazer uma dissertação no formato
comumente adotado nos Programas de Pós-Graduação, inclusive o PPAD da UNAMA.
O objeto desta dissertação versa sobre a temática de inovação na Amazônia. Este foi
construído de forma a discutir possíveis caminhos e descaminhos de uma rede de inovação
interorganizacional como oportunidade de promoção de desenvolvimento sustentável na
região. Esta rede de inovação nasce de uma parceria entre a Universidade Federal do Pará
(UFPA) e a pequena empresa Amazon Dreams, uma spin off da universidade, para
posteriormente abranger também uma agroindustrial local, a Belaiaçá.
Minha trajetória profissional até o mestrado foi marcada pela vivência na UFPA, onde
fiz meu curso de graduação. Ao concluí-lo, ingressei para trabalhar como bolsista em um
projeto de pesquisa sobre o estuário amazônico do Núcleo de Altos Estudos Amazônicos
(NAEA) e, chegando ao seu fim, fui trabalhar na Fundação de Amparo e Desenvolvimento da
Pesquisa, que apoia o desenvolvimento da ciência, tecnologia e inovação na UFPA e em
outras organizações do estado e região. Assim, durante 12 anos tive contato com diversos
projetos da Universidade, envolvendo parcerias com organizações públicas e privadas,
acompanhando conflitos e cooperações, conquistas e fracassos por trás de cada convênio ou
contrato.
Neste contexto, houve muita repercussão na Universidade e em outras instituições de
pesquisa no Pará a aprovação da Lei de Inovação e seus desdobramentos políticos, porém
também foi (e continua sendo) muito difícil sua efetiva aplicação, seja por entraves jurídicos e
administrativos, seja pela colisão de posições quanto às diferentes papéis e mecanismos
vinculados à Universidade neste cenário político de fomento à inovação no país.
Quando tive a oportunidade de escolher o tema de pesquisa me direcionei à temática
de inovação na Amazônia, no âmbito da perspectiva que o desenvolvimento da região poderia
ser alcançado por meio da busca do conhecimento e avanço científico, o que noto ser
extremamente condizente com a trajetória percorrida por mim até então. E isso me torna
consciente de que estou neste campo temático para aprender a fazer ciência, mas também,
1 Termo utilizado por Eliane Barbosa da Conceição (2013) em sua tese de doutorado qual tomei a liberdade de
replicar e agradeço à inspiração.
15
inevitavelmente, participo (com uma ínfima contribuição) do campo enquanto um ator no
processo coletivo que discute, cria convergências e divergências em busca do avanço de um
projeto de desenvolvimento para Amazônia e da Amazônia, baseado no conhecimento e na
inovação.
Ao reconhecer minha limitada capacidade de aprendiz neste campo, busquei construir
esta pesquisa centrando atenção a uma pequena iniciativa que, no entanto, retrata os grandes
esforços, muitas vezes isolados, de atores da esfera pública e privada para desenvolver uma
rede de inovação e alcançar um processo bem sucedido que gere transbordamentos à
sociedade e suscite um exemplo a ser seguido. E, assim, nutri-se a esperança de criar
conexões com outros projetos, emergindo o que possa ser efetivamente um espaço de
discussão e alinhamento de ações e políticas integradas de desenvolvimento à região.
Contudo, cabe aqui admitir que, se por lado esta minha vivência dentro da fronteira
entre Universidade e seus parceiros pode facilitar a visão de alguns processos internos e suas
relações; por outro lado, presume que sofri também de vícios de percepção. O que fui capaz
de ver na pesquisa e, também, o que não fui, são resultados de minha trajetória profissional e
acadêmica. Neste sentido, espero que este esclarecimento possa ajudar os leitores a
compreender melhor minhas falhas e expandir o canal de contribuição sobre minhas análises e
resultados.
Esse anseio de buscar conexões e integração influenciou o próprio formato
diferenciado desta dissertação. Este “fazer diferente” não deve ser visto como uma crítica ao
formato convencional em uso, mas sim como o exercício de desenvolver um ângulo diferente
para a bricolagem dos dados da pesquisa e da elaboração de análises.
Assim, esta dissertação não possui um capítulo específico para a discussão teórica ou
um capítulo para apresentação dos dados empíricos e análises. Inicio com um capítulo de
introdução ao debate das redes de inovação na Amazônia, a fim de contextualizar as questões
de pesquisa e definir um escopo da contribuição esperada deste trabalho.
A estrutura de desenvolvimento da dissertação está organizada por três (3) níveis de
análise: o contexto (1), os atores organizacionais (2) e suas relações interativas no processo de
inovação (3). Dentro de cada nível de análise, procurei integrar a orientação teórica, os dados
da investigação empírica e as análises específicas para, ao final, à guisa de conclusão, tentar
promover uma discussão integrada destes diferentes níveis de estudo, explorando as conexões
entre seus constructos. Esses três blocos contemplam:
- O capítulo dois trata sobre a análise contextual que engloba os constructos teóricos
de paradigma tecnológico e regime de apropriabilidade. Abrange também a pesquisa empírica
16
sobre a trajetória de fomento à inovação no Pará e a emergência da oportunidade da
biotecnologia, fazendo a relação com a cadeia produtiva do açaí;
- No capítulo três, apresento os atores organizacionais que se ressaltaram no processo
de inovação em estudo em termos de capacidades. Para tanto, faço uma discussão teórica do
constructo de capacidades no nível organizacional e a caracterização empírica dessas
organizações que compõem a rede de inovação (Amazon Dreams, UFPA, Belaiaçá); e,
- No capítulo quatro, utilizo uma fundamentação teórica sobre redes de relações
interorganizacionais e desenvolvo a descrição e análise do processo de inovação em si,
incluindo a apuração dos resultados da inovação alcançados pelos membros da rede.
A orientação metodológica foi uma preocupação recorrente para que conseguisse
desenvolver o estudo, considerando esta diversidade de constructos e níveis análise sem,
entretanto, fragilizar o foco das perguntas de pesquisa. Deste modo, no apêndice A apresento
o desenho teórico detalhado e a metodologia da pesquisa.
Pelo tema a que me dedico neste trabalho, reconheço que toda inovação possui riscos,
assim, sei que esta inovação de formato traz vantagens e desvantagens para a elaboração do
trabalho e sua compreensão pelos leitores. Mas, me parece que neste campo, o arriscar faz
parte do aprendizado; e o desenvolver do formato em si, representou para mim uma
oportunidade de tentar um olhar diferente da realidade que possa contribuir, de alguma forma,
em meio aos demais olhares para o avanço do campo.
17
Em agosto de 2012, a Natura Cosméticos S.A., maior fabricante
brasileira de cosméticos, lançou suas primeiras chamadas de projetos
de pesquisa científica, tecnológica e de inovação a serem executados
em parceria por meio da construção de redes colaborativas de
inovação. As propostas de projetos podiam envolver como
participantes instituições públicas, privadas e a sociedade civil
organizada.
Foram duas chamadas de projetos inicialmente lançadas: Uma de
escopo geral denominada de “Ciência, Tecnologia e Inovação”, e a
outra, denominada de “Amazônia”.
Para a primeira chamada, que estava aberta a propostas de
instituições nacionais ou internacionais, a Natura definiu entre suas
diferentes frentes de pesquisas para colaboração, estudos sobre o
próprio funcionamento de redes de inovação, buscando contemplar
“um olhar sociocultural, metodológico e ferramental para criar novas
interações, troca de conhecimento em redes de inteligência e
compartilhamento de riscos e resultados inerentes à inovação de
produtos, serviços e formas de comercialização da Natura”.
Para a segunda chamada (Amazônia), cujas propostas deveriam ser
lideradas por instituições com sede nos Estados da Amazônia Legal
Brasileira, foram selecionados como temas de pesquisa prioritários o
uso sustentável da sociobiodiversidade da região e a valorização
do conhecimento tradicional e da cultura regional.
(NATURA, 2012a, 2012b, grifo nosso).
18
1 INTRODUÇÃO AO DEBATE SOBRE APROPRIAÇÃO DE BENEFÍCIOS EM
UMA REDE DE INOVAÇÃO SOB A PERSPECTIVA DO DESENVOLVIMENTO
SUSTENTÁVEL
1.1 INTRODUÇÃO
Examinamos nesta dissertação como ocorre a apropriação de resultados de uma
inovação realizada por uma rede de relações interorganizacionais tecidas para o
desenvolvimento de produtos inovadores baseados em ativos da biodiversidade na região
amazônica. Especificamente, buscamos analisar as condições de apropriabilidade sobre a
inovação, e o modo efetivo de apropriação de resultados pela rede interorganizacional, e cada
uma de suas organizações membros.
A questão central da pesquisa foi: em que medida os resultados obtidos por um
processo de inovação em rede baseado em ativos da biodiversidade são apropriados por suas
organizações membros? Para o exame deste questionamento central é necessário entender,
primeiramente: quais fatores contribuem para a composição e dinâmica de uma rede de
inovação alicerçada em ativos da biodiversidade; quais os atributos são determinantes no
processo de inovação quando envolve ativos da diversidade biológica; e os critérios de
sustentabilidade socioambientais que influenciam as relações em redes de inovação na
Amazônia, particularmente nas condições de apropriabilidade.
O arcabouço teórico da pesquisa é delineado na interseção entre inovação e
desenvolvimento sustentável. Utilizamos as literaturas de inovação sustentável e de economia
e gestão de inovação, e procuramos explorar suas conexões com os conceitos de redes de
relações e sustentabilidade socioambiental.
O estudo tem como objeto empírico de análise uma rede de inovação estabelecida no
estado do Pará para produção e comercialização de compostos antioxidantes de açaí, que em
diferentes momentos do processo de inovação, apresentou entre seus membros organizações
como a Universidade Federal do Pará (UFPA), e as empresas Amazon Dreams e Belaiaçá.
Partimos do entendimento que a interação entre diferentes organizações é importante
para o desenvolvimento de inovações, e que a cooperação entre o público e o privado é
reconhecida como aliada do desenvolvimento sustentável, entretanto com a concepção que a
capacidade de um arranjo interorganizacional com atores que respondem por múltiplos, e não
sempre convergentes interesses, depende de uma estrutura social, política, legal e econômica
que priorize o interesse coletivo sobre o individual de cada organização.
19
Por meio desta pesquisa esperamos contribuir para o debate da convergência dos
campos da inovação e do desenvolvimento sustentável, ao tentar compreender como atributos
característicos da análise de sustentabilidade (aspectos socioambientais) podem influenciar na
análise e aplicação do conceito de apropriação da inovação, e consideramos que esta
contribuição pode gerar subsídios tanto no campo da gestão da inovação em organizações,
quanto das políticas públicas de promoção de inovação e desenvolvimento regional.
Para consubstanciar um debate inicial sobre o problema de pesquisa, este capítulo foi
estruturado de forma a primeiro discutir no âmbito conceitual questões que se apresentam
como desafiadoras na literatura sobre redes de inovação (1.1), apropriação dos resultados de
inovação (1.2) e a relação entre inovação e o desenvolvimento sustentável (1.3). Assim,
buscamos estabelecer as bases para a problematização de redes de inovação na Amazônia e
biodiversidade (1.4) e, deste modo levantarmos os fundamentos para a compreensão sobre a
apropriação de benefícios em uma rede de inovação sob a perspectiva do desenvolvimento
sustentável.
1.2 REDES DE INOVAÇÃO
A inovação tem sido considerada fator chave para a competitividade das empresas por
vários autores (CASSIOLATO; LASTRES, 1998, p. 8; REZENDE; TAFNER, 2005, p. 46),
uma vez que a capacidade de inovar de forma sistemática é considerada como uma fonte de
vantagem competitiva (TEECE; PISANO; SHUEN, 1997, p. 515). A inovação torna as
empresas aptas a desenvolver constantemente novas respostas às necessidades dos clientes, ao
mesmo tempo em que dificulta sua imitação pelos concorrentes, reforçando sua distinção
estratégica (TEECE; PISANO; SHUEN, 1997, p. 515).
Ao analisar a estrutura institucional da inovação na economia capitalista, Teece (1989,
p. 35) observa que os processos de inovação vêm sendo desenvolvidos por uma variedade de
relações entre diferentes empresas, e destas com outros tipos de organizações, como
universidades e institutos de pesquisa, sendo que tais vínculos estabelecem impactos
significativos em termos de resultado sobre a produtividade e lucratividade dessas empresas.
Gulati e Singh (1998, p. 781) demonstram em seu estudo sobre as estruturas de
governanças em redes interorganizacionais uma expansão destes formatos nas últimas
décadas, e argumentam que a relevância desta ampliação de formatos de redes reflete-se não
somente em um crescimento quantitativo destas parcerias, mas em termos de diversidade de
20
escopo e objetivos dessas relações, além da multiplicidade da nacionalidade e natureza dos
parceiros.
Vários são os motivos que podem levar a formação de redes de parcerias para o
desenvolvimento de inovações, como a complementaridade de recursos e competências, o
acesso estratégico a novos mercados, ou o compartilhamento de investimentos e riscos
inerentes ao processo (POWELL; KOPUT; SMITH-DOERR, 1996; POWELL; GRODAL,
2005).
Powell e Grodal (2005, p.58) mostram que as redes envolvendo empresas,
universidades e órgãos governamentais são críticas para o desenvolvimento de muitas
indústrias, principalmente em campos de intenso avanço tecnológico, como computadores,
semicondutores, farmacêutica e biotecnologia. Estes setores econômicos apresentam uma base
de conhecimentos que se expande rapidamente, impulsionando também o desenvolvimento
tecnológico, de modo que se tornam cada vez mais complexos (POWELL; KOPUT; SMITH-
DOERR, 1996, p. 142).
Para Powell, Koput e Smith-Doerr (1996, p. 142), a necessidade de incorporação
destes novos conhecimentos e tecnologias nos processos de inovação das empresas nestes
setores faz com que o lócus da inovação não possa mais se restringir a atividades internas de
uma única organização, passando a estar predominantemente em redes de parcerias
interorganizacionais, onde se constroem os processos de aprendizado indispensáveis à
inovação.
No entanto, se por um lado, as redes de inovação surgem como formatos
organizacionais adequados, ou mesmo necessários, para o desenvolvimento de inovações, por
outro lado, a articulação em rede impacta profundamente a forma como as organizações
inovam (DHANARAJ; PARKHE, 2006, p. 660), demandando um novo conjunto de
capacidades e processos para sua gestão.
As redes de inovação se apresentam de várias formas, tanto baseadas em acordos
formais (contratos de cooperação, alianças estratégicas, joint ventures), como laços informais
de associações ou comunidades tecnológicas, e podem ainda abranger diferentes períodos
temporais (curto e longo prazo), e uma combinação distinta de características quanto à
flexibilidade, autonomia, responsividade e coordenação (POWELL; GRODAL, 2005, p. 60).
Dhanaraj e Parkhe (2006, p. 661) analisam que, tendo as redes de inovação
características de uma organização frouxamente acoplada, a orquestração da rede torna-se
essencial de forma a assegurar tanto a criação de valor (via inovação) como a apropriação
equitativa deste valor pelas organizações membros da rede.
21
1.3 APROPRIAÇÃO DE RESULTADOS DE INOVAÇÕES
A apropriação dos resultados da inovação é realçada nas relações em redes de
inovação, em virtude de sua característica de dualidade entre a ação conjunta da rede
(cooperativa) e escolhas particulares das organizações que a compõe (competitivas), que cria
uma tensão entre interesses coletivos e individuais. Contudo, o conceito de apropriação não
representa uma apreensão exclusiva das redes de inovação, estando presente de forma geral na
literatura de economia da inovação.
Dosi (1988, p. 1139) indica que a apropriação privada dos benefícios da inovação é
concebida tanto como incentivo necessário ao esforço de inovação, quanto o resultado
alcançado pelo processo inovativo, representado, por exemplo, pelos rendimentos econômicos
efetivamente gerados pela inovação auferidos pela empresa inovadora.
Neste sentido, a apropriabilidade corresponde às condições tecnológicas, institucionais
e econômicas que permitem o desenvolvimento da inovação e sua proteção, como ativo
rentável, contra possíveis imitadores, enfatizando-a como fator necessário para gerar
comprometimento das empresas com processos de inovação (DOSI, 1988, p. 1140).
Teece (1986, p. 285) ressalta a preocupação com o fato de que muitas vezes as
empresas inovadoras não conseguirem captar os rendimentos gerados por suas inovações,
uma vez que, devido aos processos de transbordamentos da inovação, estes podem ser
distribuídos entre os demais atores de mercado, como seus concorrentes, fornecedores ou
clientes. O autor ilustra essa apreensão citando um caso clássico envolvendo a Electrical
Musical Industries (EMI).
A EMI lançou o primeiro equipamento de tomografia computadorizada do mundo no
início dos anos de 1970, e a tecnologia desenvolvida foi reconhecida como o maior avanço na
área da radiologia desde a descoberta dos raios-x. Todavia, apesar do equipamento inovador
ter tido pleno sucesso na área médico-hospitalar, a EMI em menos de dez (10) anos de
comercialização saiu desse ramo de negócios, sem conseguir competir com as grandes
empresas tradicionais da área, que continuaram fabricando este tipo de equipamento (TEECE,
1986, p. 286).
Diante de casos como este, Teece (1986, p. 286) propôs um referencial teórico com
três blocos de fatores explicativos para melhor compreender a dinâmica de apropriação de
resultados da inovação. O primeiro é o regime de apropriabilidade que corresponde um a
conjunto de fatores externos à empresa que influenciam a capacidade do inovador em reter os
lucros gerados pela inovação. As dimensões indicadas como mais importantes deste regime
22
são a natureza da tecnologia do setor (mecânica, química,...) e a eficácia da proteção de
instrumentos legais à inovação, como regulamentações sobre propriedades industriais e
comércio internacional (TEECE, 1986, p. 287).
O segundo fator relevante para estudo dos mecanismos de apropriação refere-se ao
domínio de um design ou padrão tecnológico industrial específico em um determinado setor.
Teece (1986, p. 288) indica que o desenvolvimento de inovações tecnológicas pode ser
interpretado em similaridade com a evolução científica, apresentando dois estágios distintos:
um estágio pré paradigmático ou de ruptura de paradigma, e outro estágio caracterizado por
paradigma dominante consolidado.
Na correlação com o desenvolvimento industrial de inovações tecnológicas, o primeiro
estágio representa um período de implementação de inovações radicais, apresentando projetos
de produtos fluídos e processos de produção adaptativos, com baixo grau de especialização de
equipamentos e plantas industriais, de modo que a competição entre as empresas no setor é
marcada pela disputa de propostas de projetos e designs diferenciados com ênfase na inovação
de produtos (TEECE, 1986).
Entretanto, em certo ponto, um design começa a emergir como dominante, tornando-se
referência para o setor, é o segundo estágio, onde há a consolidação de um padrão industrial.
Neste estágio, um conjunto de necessidades especializadas passa a ser requerido para o
aperfeiçoamento da tecnologia dominante, com a ênfase de desenvolvimento de inovações
incrementais, e a dinâmica de competição altera-se para o nível de preços, a escala de
produção e a aceleração da curva de aprendizado, com ênfase na inovação de processos
(TEECE, 1986, p. 288; TEECE, 2006, p. 1133).
Teece (1986, p. 288) defende que a identificação do estágio do setor em que uma
empresa está atuando é imprescindível para adoção de estratégias mais adequadas de
competição e apropriação pelas empresas, bem como para o desenvolvimento de capacidades
específicas.
E, a última das três categorias de análise sugeridas por Teece (1986, p. 288) é a posse
de ativos complementares que representam um conjunto de capacidades, como serviços de
logística, produção e estrutura de marketing e pós venda, os quais podem não estar na
essência da inovação desenvolvida, mas são indispensáveis para sua inserção com sucesso no
mercado. Caso a empresa inovadora não possua os ativos complementares necessários para
sua inovação, estará em uma posição frágil para apropriar-se de seus resultados.
A questão da apropriabilidade também é tratada por Pavitt (1984, p. 355), em sua
pesquisa sobre padrões setoriais de mudança tecnológica, que a considera um dos fatores
23
relevantes na determinação da taxa e direção de implementações de inovações e mudanças
tecnológicas. Para este autor a apropriabilidade relaciona-se às possibilidades dos inovadores
se apropriarem de parte suficiente dos benefícios gerados por suas inovações que justifiquem
seus esforços e investimentos, e esta pode apresentar diversos mecanismos de
operacionalização, como patentes, segredo industrial e desenvolvimento de capacidades e
conhecimentos específicos (PAVITT, 1984, p. 355).
Cabe ressaltar que a discussão sobre apropriabilidade origina-se pela própria natureza
do processo de inovação, pois não é possível ao inovador apropriar-se integralmente de
benefícios gerados pela inovação. Isso ocorre seja em razão de benefícios representados por
avanços tecnológicos ou de ampliação da base conhecimentos, visto que estes possuem
equilíbrio específico entre aspectos de bens públicos (coletivos) e fatores apropriáveis
privadamente (proprietários) (DOSI, 1988, p. 1139; PAVITT, 1984, p. 348). Ou ainda, por
benefícios referentes a resultados econômicos, em virtude de processos de difusão da
inovação no sistema de produção e consumo (OCDE, 2007, p. 24).
Neste aspecto, Maculan (2010, p. 166) ressalta a tensão existente entre a importância
de prover condições de apropriação de inovações que estimule os esforços inovativos de
potenciais inovadores por um lado, e a busca pela “ciência aberta” que gere oportunidades de
compartilhamento do conhecimento para a disseminação de melhorias de práticas produtivas e
de fontes de novas inovações a sociedade, por outro lado.
Maculan (2010, p. 170) enfatiza dois aspectos desta tensão nos processos de
desenvolvimento de inovações atuais, a interação cooperativa e a centralidade do
conhecimento, que criam a necessidade de reflexão sobre as modalidades possíveis de
cooperação e os impactos dessas sobre a apropriação por diversos atores.
A maior interação entre organizações diferentes em redes de inovação representa
oportunidade estratégica para as empresas, porém, com risco elevado, pela incerteza inerente
ao processo de inovação e pelo acesso concedido a recursos intangíveis internos como
informações e conhecimentos, o que demandaria fortalecimento dos mecanismos de
apropriação por estas (MACULAN, 2010, p. 170). Enquanto a centralidade do conhecimento
baseada na atuação de diferentes organizações geradoras de conhecimento, tais como
universidades e institutos de pesquisa públicos, realça a necessidade de modalidades de
circulação, compartilhamento e difusão do conhecimento na sociedade (MACULAN, 2010, p.
170). Desta forma, dar-se evidência ao potencial conflito entre as demandas de fortalecimento
de mecanismos de apropriação e a importância da difusão da ciência e do conhecimento.
24
Essa tensão cria um debate sobre qual seria o ponto de equilíbrio em termos de
políticas públicas e formatos institucionais que permitisse garantir condições adequadas de
apropriabilidade a atores inovadores, e expandir oportunidades de disseminação de
conhecimentos e avanços tecnológicos a toda a sociedade, cujo pano de fundo é o papel
relevante da inovação para o processo de desenvolvimento das sociedades, que se aprofunda
com as discussões sobre desenvolvimento sustentável.
1.4 INOVAÇÃO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL
A relação entre inovação e desenvolvimento econômico não é recente, Freeman (1995,
p. 5) retrata estudos pioneiros de Friedrich List no final do século XIX sobre desenvolvimento
industrial e catching up da Alemanha, fundamentados sobre ideias de acumulação de
conhecimento e valorização da capacitação e aprendizagem tecnológica em seu Sistema
Nacional de Economia Política (1841).
No início do século XX, Schumpeter (1997) introduz a inovação no centro do sistema
econômico como a fonte de mudança que, pela inserção de novos produtos, processos e
suprimentos, ou mesmo pela criação de novos mercados e setores industriais, impõe um
processo evolucionário de desenvolvimento econômico.
Tigre (2005, p. 207) ressalta que os trabalhos de Schumpeter são retomados pela
corrente evolucionista ou neoschumpeteriana a partir da segunda metade do século XX. As
novas teorias iluminam o progresso técnico como variável chave para a compreensão do
processo evolucionário da firma e do mercado, tendo entre seus princípios que a dinâmica
econômica é baseada em inovações (TIGRE, 2005, p. 208).
De forma geral, entende-se que a capacidade de aprender e inovar de empresas,
ancorada em interações dinâmicas com outras instituições (universidades e institutos de
pesquisa, governo, sindicatos), permite a melhoria de produtividade no sistema econômico
nacional, convergindo-se na chamada competitividade autêntica de países (VIOTTI, 2003;
CASSIOLATO; LASTRES, 1998).
Contudo, a ampliação do escopo das discussões sobre desenvolvimento lançaria nova
luz à dinâmica da inovação. Segundo Sachs (2008, p. 30), a reflexão sobre desenvolvimento e
a construção de modelos como se conhece atualmente começou na década de 1940 no pós-
guerra com objetivos de reconstrução de países afetados pela guerra e da busca de superação
de problemas sociais e econômicos em países periféricos no âmbito das disputas entre o bloco
capitalista e o socialista.
25
A partir 1970, se fortalece na ONU e em outros círculos, como o Clube de Roma, um
debate que visava incluir na agenda de desenvolvimento, além das preocupações econômicas
e sociais, às questões relacionadas ao meio ambiente, surgindo o conceito de desenvolvimento
sustentável no contexto da Comissão Mundial para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento
(CMMAD) das Nações Unidas, estabelecendo princípios norteadores de sustentabilidade
ambiental, social e de viabilidade econômica (SACHS, 2008, p. 36).
Mas Becker (2010, p. 17) em uma análise crítica da atuação da CMMAD quanto à
disseminação da agenda de preservação ambiental e do desenvolvimento sustentável em nível
mundial, entende que os trabalhos da Comissão não trouxeram novidades relevantes no
campo conceitual, mas sim cumpriram papel no campo político, criando espaços para uma
grande pressão geopolítica de países centrais sobre aqueles periféricos, muitos destes com
recursos ambientais abundantes e elevada demanda por acelerar seus processos de
crescimento econômico.
Para Becker (2010, p. 17) enquanto a proposta de desenvolvimento sustentável é
lançada aos países periféricos por meio de recomendações de políticas de contenção
demográfica, de preservação ambiental e desenvolvimento endógeno, nos países centrais o
movimento baseia-se no avanço científico-tecnológico com a máxima eficiência e qualidade
nos processos produtivos, com pesquisas sobre novos materiais e fontes de energia. Assim,
diferentes perspectivas sobre desenvolvimento sustentável e suas respectivas estratégias
passariam a ser concebidas em países desenvolvidos e em países em fases de
desenvolvimento.
Outra crítica sobre o conceito de desenvolvimento sustentável é ressaltada por
Rennings (2000, p. 321) que reconhece a existência de um contínuo debate sobre a
possibilidade de sua definição operacional, que para alguns chega a representar um ideal
heurístico, portanto, um processo não determinístico que não pode ser plenamente definido ex
ante. Porém, independente dessas interpretações, o autor considera que qualquer ação
concreta em busca de tal conceito exige o delineamento da direção e dos problemas alvos a
serem enfrentados e deve contemplar dois fatores chaves: a multiplicidade de dimensões
(econômica, social e ambiental) e a necessidade de inovações substanciais (RENNINGS,
2000, p. 321). Isso porque nos complexos sistemas de produção e consumo mundiais atuais,
os elos interdependentes de cadeias de suprimentos e as travas de infraestrutura e de
conhecimento representam desafios que requerem um conjunto de inovações, tanto de
natureza incrementais, quanto (e principalmente) radicais, que perpassam as atividades diárias
das empresas, governos e cidadãos.
26
Neste contexto, Brito e Berardi (2010, p. 156) entendem que a inserção da
sustentabilidade na agenda das organizações empresariais, pela incorporação da
responsabilidade socioambiental, tem envolvido duas perspectivas. Uma abordagem
institucionalista em que sobressaem esforços de indução de regulamentações governamentais
e pressões de grupos da sociedade civil para engajamento das empresas em busca de
legitimação social (BRITO; BERARDI, 2010, p. 163). A outra abordagem tem como foco o
alcance de melhor desempenho econômico e ambiental, e baseia-se em incentivos
relacionados à maior eficiência de recursos, com redução de custos ou exploração de
oportunidades para novos negócios (PORTER; VAN DER LINDE, 1993, p. 372; HART;
MILSTEIN, 2004, p.66).
Sobre o confronto de perspectivas que buscam lidar com a temática, Rennings (2000,
p. 329) defende a necessidade de pluralismo. Ele reconhece limitações nos instrumentos de
mercado para indução de inovações para o desenvolvimento sustentável, principalmente
aquelas que se constituírem em mudanças radicais, em função de falhas de mercado, seja pela
não internalização de custos ambientais por concorrentes, seja pela possibilidade de
transbordamento de externalidades positivas do avanço inovativo a estes, tendo como
consequência a percepção de não apropriabilidade de benefícios pelo inovador (RENNINGS,
2000, p. 325).
Neste caso, as inovações direcionadas para a sustentabilidade demandam apoio
regulatório e medidas específicas de estímulos à inovação, não somente tecnológica, mas
também de caráter institucional e social (RENNINGS, 2000, p. 326). Entretanto, Rennings
(2000, p. 330) ressalva que inovações incrementais, importantes para melhoria contínua dos
processos e produtos, poderiam ser abrangidas por instrumentos de mercado, defendendo uma
visão integrada das abordagens econômicas.
Seja por questões institucionais ou pelo direcionamento de forças de mercado, a busca
de meios de operação mais sustentáveis pelas empresas engloba uma série de desafios. Daroit
e Nascimento (2004, p. 1) ressaltam implicações quanto à modificação dos pressupostos de
gestão e desempenho nas empresas, uma vez que se passa a exigir destas uma nova
configuração de capacidades para inovar e provocam-se mudanças em processos, estruturas
organizacionais e padrões tecnológicos.
Boons e Lüdeke-Freund (2012, p. 8) ao pesquisar sobre modelos de negócios para
inovação sustentável indicam que estes devem basear sua proposição de valor na concertação
de objetivos e métricas econômicas, ecológicas e sociais, de modo que o desenvolvimento de
inovações orientadas para a sustentabilidade requer inter relações de diversos atores para
27
complementaridade de recursos e alinhamento de demandas no decorrer do processo de
transição de regimes tecnológicos, envolvendo redes interorganizacionais para sua execução.
Similarmente, Kleef e Roome (2007, p. 38), ao estudar as capacidades para a gestão de
negócios sustentáveis com foco em inovação, também encontram evidências da importância
da organização em redes. Esses autores defendem que as redes de inovação para
sustentabilidade tornam-se mais complexas por demandar capacidades distintas das redes de
inovação sem exigência de atendimento a requisitos socioambientais.
De acordo com Kleef e Roome (2007, p. 44), a colaboração de atores em redes para o
desenvolvimento de inovação sustentável apresenta as seguintes bases principais: orientação a
problemas, aprendizado e ação conjuntos, e a construção de conhecimento dependente do
contexto. Tais bases exigem uma diversidade maior de atores, com uma perspectiva
includente, de modo que representem as dimensões e interesses relacionados ao problema
para o qual a inovação será orientada, bem como requer a capacidade de proporcionar o
aprendizado em múltiplos níveis de análise, com a ação contextualizada localmente,
regionalmente e globalmente (KLEEF; ROOME, 2007, p. 44).
Neste ponto, é possível retomar a temática de redes de inovação, especificamente sob
a perspectiva do desenvolvimento sustentável, ao considerarmos a relevância da interação
entre esses temas e novas questões referentes à apropriabilidade que surgem em um cenário
mais complexo. Sob o ponto de vista da constituição de condições de incentivo às inovações
sustentáveis, entendemos que se acrescentam novos requisitos institucionais, tanto por novas
regulamentações socioambientais, como selos e certificações de referência nacional e
internacional (seja implementado pelo poder público, seja exigido por integrantes do
mercado), quanto pelo estabelecimento de mecanismos especiais de proteção, como a criação
pelo Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) da categoria de “patentes verdes” que
recebem prioridade de análise (INPI, 2013).
No entanto, do outro lado da balança, compreendemos que se potencializam as
relações de conflito entre a importância de mecanismos de difusão para tecnologias
sustentáveis com vistas ao atendimento de interesses coletivos frente às proteções
proprietárias sobre tais inovações, as quais teriam sido em si também concebidas de acordo
com princípios de sustentabilidade. Questões como estas suscitam esforços para maior
compreensão dos conflitos e formas de construção coletiva de soluções.
Destaca-se também o tema da distribuição equitativa da apropriação de resultados de
inovação, quando estes são realizados no âmbito de uma rede. Zílio et al (2007, p. 10) em
apresentação de caso sobre a gestão de inovação da empresa Natura S.A. reconhecem como
28
estratégico para inovação em rede a gestão da apropriação de inovações, entendida como
meio para assegurar a contínua colaboração de parceiros nas redes. Assim, descrevem que a
Natura S.A. “estabeleceu um processo de distribuição do valor de cada inovação entre os
diversos atores”, com “preocupação de manter uma estrutura justa de trabalho conjunta”
(ZÍLIO et al, 2007, p. 11, grifo nosso).
Gulati e Singh (1998, p. 788) ao estudar estruturas de governança em redes
interorganizações também discorrem sobre preocupações com a apropriabilidade, entendendo
esta como a habilidade de capturar o justo compartilhamento dos resultados das parcerias
implementadas. Isso em virtude de que nesse cenário de atuação em redes surge uma série
incertezas associadas a problemas coordenação de atividades interorganizacionais, além de
possíveis ameaças de comportamentos oportunistas, pela dificuldade de avaliar a contribuição
dos parceiros. Considera-se que a proposição de “justo compartilhamento” de resultados entre
os membros de uma rede demonstra-se assertiva em reconhecer a interdependência decorrente
das atividades colaborativas que em geral abrangem uma combinação de ações de cooperação
imbricadas. Porém, não se encontra nestes trabalhos um aprofundamento maior sobre critérios
que regeriam a distribuição “justa”, ou os procedimentos conjuntos entre os membros da rede
que conduziram a construção das distribuições acordadas.
Contudo, em um sentido ampliado, consideramos que discussões sobre distribuição
equitativa também podem se aplicar em termos de uma cadeia de valor em si, de forma que a
visão sobre os benefícios da inovação seja entendida como relevante não somente ao nível de
empresas individuais, mas para construção de sustentabilidade de setores nacionais. E, assim,
possa direcionar políticas de desenvolvimento em uma perspectiva includente perante a
diversidade de atores em uma cadeia produtiva.
Apesar da complexidade da problemática da aplicação de conceitos de inovação
atrelados à sustentabilidade, este é o caminho apontado por Becker (2010, p. 24) para o
desenvolvimento sustentável na região Amazônica. Becker (2010, p. 24) defende que para
alcance do desenvolvimento sustentável da Amazônia, é necessária uma revolução científico-
tecnológica baseada em um novo modo de produzir com foco em cadeias produtivas da
biodiversidade e serviços ambientais, que garanta a geração de inovações e o
desenvolvimento regional.
A trajetória histórica da Amazônia como uma região periférica, e pensada
exogenamente, tem se baseado em um modelo econômico primário exportador ancorado em
commodities relacionadas ao extrativismo madeireiro, mineração e agropecuária, cujos
processos, em geral, têm apresentado forte geração de impacto ambiental. Para Enríquez
29
(2013), a região Amazônica foi considerada uma reserva de recursos naturais para regiões
mais desenvolvidas. O estímulo a atividades como a pecuária, indústria madeireira e a
propagação da produção da soja, apesar de ter elevado a renda regional, não proporcionou
uma equidade social adequada, e se desvia da construção de um modelo de sustentabilidade
para região (ENRÍQUEZ, 2013).
Ao considerar esta trajetória, o tamanho do salto para alcance do desenvolvimento da
região representa um desafio de criatividade e de inovação (BECKER, 2009, p. 39). Não
obstante a Amazônia tenha se tornado foco de discussões com forte pressão preservacionista,
Becker (2010, p. 21) salienta que a geração de desenvolvimento sustentável na região
demanda esforços bem superiores àqueles relacionados a incentivos que visem preservar
florestas intactas, ou seja, é necessário articular atividades de conservação com
desenvolvimento regional efetivo. A solução estaria na atribuição de valor econômico à
floresta, de forma a competir e superar as commodities (GCEE, 2006a, p.7).
1.5 REDES DE INOVAÇÃO NA AMAZÔNIA E BIODIVERSIDADE
Em trabalho do Centro de Gestão e Estudos Estratégicos (CGEE, 2006a, p.7; 2007, p.
144), vinculado ao Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), a biodiversidade
amazônica é vista como elemento fundamental ao desenvolvimento regional e nacional,
considerando a própria magnitude potencial de biodiversidade do Brasil estimada em 20% de
toda a biodiversidade existente no mundo. Como oportunidades para geração de valor
econômico baseado na biodiversidade e alinhadas com aspectos socioambientais são
sugeridas seis categorias de atividades: patrimônio natural, ecoturismo, serviços ambientais,
agricultura, extrativismo e bioprospecção (CGEE, 2006a, p.12).
Em relação à bioprospecção, esta abrange a exploração e descoberta de aplicações dos
recursos genéticos e bioquímicos da biodiversidade, cuja utilização engloba diversas áreas
como: saúde e nutrição, cosméticos, e higiene pessoal, além de produtos mais sofisticados
como fármacos, incluindo fitoterápicos, bioenergia e agronegócio (CGEE, 2006a, p. 13).
Neste sentido, Enríquez (2013) destaca a bioindústria como um mecanismo essencial
para, por meio da inovação tecnológica, agregar valor aos produtos da biodiversidade
amazônica. No entanto, o autor afirma que, embora já existam como experiências pilotos de
bioindústrias na região, principalmente apoiadas em incubadoras e parques tecnológicos, para
que estas se transformem em uma estratégia de desenvolvimento regional é necessário a
30
implantação de políticas públicas específicas e proporcionar escala de produção à
biodiversidade.
Cabe acrescentar que a valorização da biodiversidade não tem seu fortalecimento
amparado somente no crescimento da demanda de produtos, como fármacos e cosméticos, ou
em demais serviços ambientais vinculados a atividades produtivas ou de bem estar na
sociedade (CGEE, 2006a, p. 21). Sua importância também se encontra em proporcionar
avanços na fronteira do conhecimento científico em si, por meio de novas descobertas, como
o desenvolvimento da biotecnologia e da biologia molecular (CGEE, 2006a, p. 21).
Assim, a biodiversidade da Amazônia é entendida como área de atuação potencial para
a integração de atividades de pesquisas científicas e produção de bens de serviços, com a
geração de inovações, visando à promoção o desenvolvimento regional (CGEE, 2006a, p. 6).
Contudo, muitos são os desafios a percorrer para que este fator potencial de desenvolvimento
torne-se efetivo, envolvendo não somente o esforço de construção de bases à inovação
tecnológica, mas principalmente referentes a inovações institucionais e sociais.
O CGEE ressalta alguns desses desafios. Um deles é a insuficiência de conhecimento
científico e tecnológico para o aproveitamento sustentável da biodiversidade, pois da
estimativa de 20% do estoque total de diversidade biológica mundial existente na Amazônia,
seu conhecimento corresponde a somente 1% do acervo científico mundial das coleções
biológicas (CGEE, 2006a, p. 7).
Também é problemático o reconhecimento não só de valor econômico, mas também
do valor estratégico da biodiversidade e dos serviços ambientais, pois são de difícil
mensuração, englobando um conjunto de relações complexas relacionadas ao próprio valor de
existência destes recursos, e seu componente de poder, seja pela concentração deste estoque,
seja pela possibilidade de dispor de serviços sem equivalente no planeta (BECKER, 2009, p.
120).
Neste sentido, o estabelecimento de um quadro regulatório de atribuição de valor ao
conjunto de serviços naturais que seja claro e consistente com interesses nacionais e regionais,
considerando-se ainda regras do jogo internacional, torna-se urgente (BECKER, 2009, p.
120). Becker (2009, p. 120) cita como exemplo sobre a falta de regulamentação de valor
econômico a serviços ambientais o caso da comercialização do carbono, o qual até o momento
somente foi estabelecido pelo mercado em termos de preço, tratando-se de uma valoração
extremamente limitada. Ainda que se reconheça a existência de controvérsias sobre os reais
efeitos do carbono na atmosfera do planeta, o exemplo demonstra que a falta de relevância
31
política e estratégica concedida a determinados serviços ambientais implica em uma
fragilidade institucional a sua efetiva valorização econômica.
No que tange especificamente à biodiversidade, sua proteção tornou-se objeto da
Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB) firmada pelo Brasil durante a Conferência das
Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento em 1992, e aprovada pelo
Congresso Nacional em 1994 (MMA, 2000, p. 7). A CDB busca estabelecer uma base de
regulação sobre o uso e a apropriação de recursos genéticos, e constituir um fórum global de
discussão e superação de conflitos, sendo destacada a tensão entre países detentores de
biodiversidade, que pretendem garantir oportunidades de aproveitamento econômico e social
com controle sobre estes recursos, e aqueles países avançados tecnologicamente no seu uso e
manuseio, que demandam acesso a tais recursos (ALBAGLI, 2005, p. 20).
Contudo, apesar do Brasil ter assinado a CDB no início de 1990, somente em 2000,
por meio de medida provisória do Governo Federal, é estabelecido um regulamento nacional
sobre o acesso e proteção ao patrimônio genético e conhecimento tradicional associado,
contemplando a repartição de benefícios e o acesso, desenvolvimento e transferência de
tecnologia para sua conservação (Medida Provisória 2.052/00, posteriormente substituída pela
Medida Provisória 2.186-16/01).
E em 2002, o Conselho de Gestão do Patrimônio Genético (CGEN), organismo
nacional deliberativo e normativo sobre o tema, efetivamente inicia suas operações, entretanto
seu funcionamento apresenta limitações, tanto em decorrência de problemas de natureza
operacional, como por falta de clareza conceitual da legislação em vigor (CGEE, 2006a, p.
127).
Embora se reconheça que a CDB representou um avanço no âmbito de negociações
internacionais, e que a construção nacional de quadro institucional sobre temática tenha
buscado formar bases de regulamentação sobre o uso de recursos genéticos e de
conhecimentos tradicionais associados, Albagli (2005, p. 23) defende que, além de
instrumentos legais de proteção e garantia de apropriação sobre estes recursos e
conhecimentos, são necessárias estratégias mais amplas, envolvendo questões culturais,
políticas e econômicas.
O debate quanto ao uso e apropriação justos dos recursos genéticos e dos
conhecimentos tradicionais associados está em aberto. Segundo a página do CGEN no site do
MMA:
32
Historicamente, o uso dos recursos genéticos e dos conhecimentos tradicionais
associados têm ocorrido de forma injusta. A importante contribuição destes
componentes para o desenvolvimento de novos produtos comerciais, muitos deles patenteados, tem sido apropriada pelos países desenvolvidos sem que tenha havido
previamente alguma solicitação para o acesso, o respeito a algum tipo de
consentimento prévio ou alguma forma de repartição de benefícios para com os
países de origem da biodiversidade ou para com as comunidades tradicionais detentoras. (MMA, 2001, não paginado).
Conforme Albagli (2005, p. 19), não obstante os esforços da CDB, acentua-se uma
tendência de apropriação privada por grupos econômicos e produtivos dominantes
tecnologicamente de informações e conhecimentos sobre a biodiversidade, por meio de
instrumentos legais cada vez mais rigorosos de proteção a patentes e outras formas de
propriedade intelectual estabelecidas por acordos internacionais.
Grande parte da discussão gira em torno do modo como tem ocorrido a apropriação
dos resultados de inovações baseadas em elementos da biodiversidade brasileira, com
destaque à amazônica, entre empresas, governo e comunidades, considerando seus impactos
no desenvolvimento regional e nacional. A apropriabilidade neste caso específico tem como
um dos pontos importantes do debate realçado por Albagli (2005, p. 25) sobre o entendimento
da natureza privada (sujeita a apropriação) e pública (interesse coletivo de bens de uso
comum) desses recursos da biodiversidade, principalmente de seu conhecimento tradicional.
O conhecimento tradicional sobre uso e manuseio da biodiversidade é relevante ao
desenvolvimento de inovações, pois pode direcionar prioridades de pesquisa e bioprospecção,
conforme características previamente conhecidas pelas populações locais, contudo este
conhecimento não é protegido por sistemas existentes de propriedade intelectual (ALBAGLI,
2005, p. 20). Assim, a falta de instrumentos adequados de proteção sobre este tipo de
conhecimento implica em uma frágil capacidade de proporcionar direitos de apropriação de
seu uso por seus detentores, quando envolvidos no desenvolvimento de inovações, em
comparação aos métodos de proteção de propriedade industrial hoje já estabelecidos, tais
como patentes, desenhos industriais e marcas.
A CDB busca introduzir algumas recomendações no tratamento dos recursos da
biodiversidade (ALBAGLI, 2005, p. 24). Reconhece a autoridade (direitos e deveres) dos
Estados nacionais sobre estes recursos, e vincula sua conservação ao uso sustentável e
incorpora preocupações específicas em relação interesses das populações tradicionais, além de
aconselhar que benefícios decorrentes da utilização de tais recursos sejam compartilhados de
forma justa e equitativa.
33
Entretanto, a temática ainda é nova e faz permear muitas dúvidas sobre a
operacionalização destas diretrizes em relação à apropriabilidade de inovações. As análises
abrangem um conjunto diverso de assuntos, pois mesclam categorias de investigação típicas
de inovação, como regimes de apropriabilidade e características tecnológicas de setores
específicos, com temas relacionados às políticas de desenvolvimento regional e atendimento
de necessidades locais.
Consideramos que explorar as conexões entre esses assuntos deve ser aplicado de
modo a encontrar formas de assegurar o estabelecimento de arranjos institucionais na
Amazônia que gerem condições de incentivo ao investimento e esforços de inovação, ao
mesmo tempo em que promovam o compromisso aos critérios de sustentabilidade e
desenvolvimento regional.
Especificamente em relação à biotecnologia, Powell, Koput e Smith-Doerr (1996, p.
123) apontam que esta corresponde um conjunto de tecnologias que envolve várias indústrias,
como farmacêutica, química, agricultura, energia, medicina, entre outras. Enquanto é possível
realçar suas oportunidades, como citado anteriormente, cabe lembrar que é uma área que
apresenta foco na intensificação da velocidade de geração de novos conhecimentos, com a
expansão desta fronteira baseada no aumento da produtividade amparada por forte base de
desenvolvimento tecnológico, constituindo-se em um campo que se torna cada dia mais
complexo e excede capacidades de atores individuais (POWELL, KOPUT; SMITH-DOERR,
1996, p. 122). Assim, é um campo onde as estruturas cooperativas como as redes de inovação
têm se destacado como meio de organização e mobilização de aprendizado e ação conjunta
(POWELL; GRODAL, 2005, p. 58).
Porém, de acordo com estudo do CGGE (2006a, p. 66) sobre rede de inovação em
biodiversidade na Amazônia, constatou-se que as redes de inovação na região ainda são
poucas, dispersas e com abrangência limitada. Assinala-se que, entre as redes identificadas,
predominavam as redes de ciência e tecnologia (C&T), direcionadas para a produção de
conhecimento, sem preocupação direta com sua aplicação imediata no desenvolvimento de
produtos ou processos produtivos, e mesmo aquelas redes observadas que envolviam o setor
produtivo, tinham origem também nas instituições de ensino e C&T (CGGE, 2006a, p. 66).
Isso sugere um ponto a ser ressaltado em relação à temática mais ampla sobre
inovação na Amazônia, que se refere à atuação das empresas da região. Dosi (1988, p. 1141)
ao discutir categorias de análise relevantes para a indução de atividades de inovação
tecnológica, indica que além das oportunidades de mercado, do desenvolvimento científico e
34
tecnológico e de condições de apropriabilidade, também são fatores essenciais ao
desenvolvimento de inovações as capacidades e competências tecnológicas das empresas.
Ainda segundo Dosi (1988, p. 1141) problemas de lacunas em competências
tecnológicas são comumente encontradas em empresas de países em desenvolvimento.
Conforme o CGEE (2011, p. 27) esta realidade se confirma de modo geral no Brasil, ao se
analisar a obtenção de patentes por empresas brasileiras no escritório de patentes dos Estados
Unidos (USPTO), uma referência para mercados internacionais, verifica-se que a posição do
Brasil é bastante desfavorável, com quantidade ínfima de pedidos (0,34 mil) em comparação
com outros países como Coreia do Sul (10,60 mil) e o próprio Estados Unidos (218,50 mil).
Outro dado de alerta refere-se à estrutura industrial do país, com setores de baixa e média
intensidade tecnológica ocupando grandes dimensões de sua matriz industrial (CGEE, 2011,
p. 28).
No caso específico da região Norte, onde se encontra a maioria dos estados do bioma
amazônico, considerando-se as extremas desigualdades regionais, a situação dos indicadores
se agrava. Com base na Pesquisa de Inovação Tecnológica (PINTEC) 2008 elaborada pelo
IBGE, o CGEE (2011) identificou que o menor percentual de empresas inovadoras (somente
3,2%.) corresponde à região Norte, com uma concentração destas no Sul e Sudeste do país,
conforme tabela abaixo:
Tabela 1 - Percentual da distribuição de empresas industriais que realizaram atividade inovativa no
triênio 2006/2008, por região.
Percentual da distribuição de empresas industriais que realizaram atividade
inovativa no triênio 2006/2008, por região
Região Percentual (%)
Norte 3,2
Nordeste 9,4
Centro-Oeste 6,0
Sudeste 52,9
Sul 28,4
Total 100
Fonte: Baseada em CGEE, (2011, p. 35).
O quadro delineado indica dificuldades em termos de capacidade de inovação
industrial na região Norte em comparação com as demais regiões do país, o que pode
corroborar com os dados referentes à fraca participação de empresas em redes de inovação na
região, apresentando-se como um desafio adicional ao projeto de desenvolvimento regional
baseado na biodiversidade por meio de inovações sugerido por Becker (2010, p. 24).
35
Portanto, reconhecemos que, se por um lado há potencial da geração de inovações
baseadas na biodiversidade regional como fator de desenvolvimento em bases sustentáveis,
por outro lado, sua efetiva realização econômica envolve um conjunto de capacidades e
arranjos industriais complexos, para os quais não tem se conseguido a mobilização adequada
na região. Esta mobilização abrange entre outras ações a promoção de condições e
instrumentos que viabilizem o desenvolvimento de inovações que proporcionem a criação e
apropriação de valor econômico em conformidade com critérios sustentabilidade no âmbito
regional.
1.6 CONSIDERAÇÕES CONCLUSIVAS: LACUNAS NO CONHECIMENTO SOBRE
REDES DE INOVAÇÃO PARA O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL NA
AMAZÔNIA
Diante deste cenário, consideramos que a discussão da temática de redes de inovação,
particularmente sobre condições de apropriação apresenta-se aberta não somente em termos
acadêmicos quanto à exploração de interconexões entre processos de apropriabilidade de
inovação e critérios de sustentabilidade já anteriormente mencionada, mas também em termos
empíricos na análise da relação a condições de incentivos e restrições efetivas ao processo de
inovação na região baseado em ativos da biodiversidade.
Deste modo, propomos a partir deste estudo um exame sobre a apropriação de
resultados de uma inovação desenvolvida por uma rede de relações interorganizacionais para
o desenvolvimento, a produção, e comercialização de produtos inovadores baseados em ativos
da biodiversidade na região amazônica. Compreendemos como relevante analisar os fatores
que contribuem para a composição e dinâmica de uma rede de inovação alicerçada em ativos
da biodiversidade, os resultados efetivos alcançados por seus membros e seus possíveis
transbordamentos para sociedade, observando se e como critérios de sustentabilidade
socioambientais influenciam em suas atividades produtivas e comerciais, bem como nas
condições de apropriabilidade da rede inovação.
De forma específica, estabelecemos como proposta de pesquisa a análise da forma de
apropriação de resultados da inovação pelas organizações no âmbito de uma rede (1), e a
influência de diretrizes do desenvolvimento sustentável sobre os condicionantes de
apropriabilidade (2). Para tanto o objeto empírico da pesquisa deve se caracterizar por uma
rede de relações interorganizacionais com foco no desenvolvimento de uma inovação baseada
em ativos da biodiversidade, com atividades inovativas localizadas na região amazônica.
36
Entendemos que o escopo relacionado a atividades vinculadas à biodiversidade na
região Amazônica reúne dois elementos contextuais importantes à pesquisa, por um lado a
existência de certo grau de pressão institucional e de mercado quanto a condicionantes de
responsabilidade socioambientais, e por outro lado o fato da natureza dos recursos da
biodiversidade vincular-se a instrumentos normativos de diretrizes sobre desenvolvimento
sustentável, como a Convenção de Diversidade Biológica (CDB).
Diante da formação de uma rede de inovação no Estado do Pará para produção e
comercialização de compostos antioxidantes de açaí, ativo da biodiversidade amazônica, cujas
principais organizações em termos de capacidades constitutivas ao processo inovativo foram a
Universidade Federal do Pará (UFPA), a Amazon Dreams e a Belaiaçá2, acreditamos que este
caso possa iluminar como tem ocorrido as condições de apropriabilidade sob a perspectiva de
uma rede regional de inovação para o Desenvolvimento Sustentável.
Cabe ressaltar que a cadeia produtiva do açaí tem grande importância econômica e de
segurança alimentar no Estado do Pará, que é o maior produtor de açaí do país (SAGRI,
2014a). Em 2011, a produção de açaí gerou aproximadamente R$677,2 milhões para
economia paraense, e conforme estimativa da Secretaria de Estado da Agricultura 60% da
produção é consumida internamente no Estado (SAGRI, 2014a). No entanto, apesar da
relevância da cadeia produtiva para o Estado, F. Costa (2009, p. 345), ressalta a existência de
carências tecnológicas elementares, seja em sua etapa de produção rural, seja na etapa de
processamento industrial, apresentando baixa capacidade de absorver e de produzir inovações.
Para a compreensão sobre a apropriação de resultados de uma inovação em uma
relação com o conceito de Desenvolvimento Sustentável na Amazônia, entendemos que deve-
se percorrer três passos que são distintos e inter relacionados. Primeiro, o exame do contexto
que envolve a rede de inovação interorganizacional. Depois, analisar os atores organizacionais
e suas capacidades para o processo de inovação. E, terceiro, analisar as redes de relações
interorganizacionais durante o desenvolvimento da inovação. Portanto, é dentro desta linha de
raciocínio que seguiremos nos próximos capítulos deste trabalho.
2 Informações detalhadas sobre o desenho e a metodologia da pesquisa estão disponíveis no Apêndice A desta
dissertação.
37
2 A INOVAÇÃO BIOTECNOLÓGICA COMO UMA ALTERNATIVA PARA O
DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL
2.1 INTRODUÇÃO
Este capítulo tem o objetivo de compreender as dimensões contextuais, tanto do ponto
de vista teórico quanto empírico, nas quais tem feito emergir os negócios inovadores
sustentáveis na Amazônia, em particular no estado do Pará. Assim, buscamos discutir os dois
constructos teóricos que norteiam as análises em nível contextual: o paradigma tecnológico e
o regime de apropriação, fazendo um esforço de explorar convergências e controvérsias
emergentes nestes temas quando de sua interseção com diretrizes do desenvolvimento
sustentável.
A partir de cada constructo teórico, desenvolvemos a apresentação e análises de dados
empíricos sobre o âmbito regional onde a rede de inovação atua, e as características do setor
industrial em que está envolvida. Essa abordagem é denominada por Hagedoorn (2006, p.
672) como enraizamento ambiental (environmental embeddedness), ao reconhecer a
relevância das influências de padrões históricos e condições contextuais no comportamento
das organizações.
Partimos do entendimento de que o paradigma tecnológico contribui na compreensão
dos desafios de adoção e implementação de diretrizes de um projeto de desenvolvimento
sustentável, ao explicar os lock in em trajetórias tecnoeconômicas, em que sua ruptura
depende da emergência em conjunto processos de transição tecnológicas, econômicos, sociais,
políticos e institucionais em coevolução. Desta forma, é necessário o desenvolvimento de
certo nível de maturidade nas trajetórias emergentes alternativas, em termos de construções de
novos arranjos e consensos dentro da sociedade para que possam sobrepor-se ao conjunto de
dependências paradigmáticas anteriores.
Em nossa perspectiva, este constructo corresponde a um nível macro de análise, e a
sua investigação empírica contemplou uma breve perspectiva da trajetória de formação das
bases institucionais da dinâmica de inovação em nível nacional e regional, para depois
focarmos no Estado do Pará, com vistas a compreender as oportunidades e os desafios postos
ao desenvolvimento de inovações baseadas na biotecnologia e na biodiversidade amazônica.
Após esta visão mais ampla, enfocamos em um nível meso de análise que visa
verificar aspectos chaves da cadeia produtiva específica do açaí no Pará, caracterizado como o
ambiente de atuação direto da rede de parceria interorganizacional em estudo. A análise do
38
desenvolvimento de inovações baseadas em biotecnologia por meio de arranjos locais torna
relevante a compreensão das relações na cadeia produtiva. Particularmente no que tange as
condições de interação entre os atores (governo, indústria, produtores rurais, instituições de
C&T), de modo a identificar as formas de articulação e seu potencial para proporcionar tanto
capacidades de investimentos conjuntos no arranjo, como o incentivo a esforços inovativos e
a criação de eficiências coletivas.
Posteriormente, retomamos a abordagem teórica para analisar o constructo do regime
de apropriabilidade de inovações, tanto na perspectiva de entender seus efeitos sobre a
efetividade de exploração de oportunidades tecnológicas, quanto o impacto deste na forma de
distribuição de benefícios de inovação. Também examinamos o conjunto diverso de
mecanismos de apropriação sobre inovações, além da tradicional proteção da propriedade
intelectual. Na convergência deste constructo com diretrizes do desenvolvimento sustentável,
buscamos com temática central no debate sobre a interação do sistema legal de proteção à
propriedade intelectual e a convenção da diversidade biológica. Em seguida, investigamos as
condições de apropriação sobre inovações baseadas na biodiversidade em termos da
regulamentação de acesso ao patrimônio genético no país e sua aplicação na cadeia produtiva
local do açaí.
Em síntese, este capítulo está dividido em quatro (4) seções a partir desta. Uma seção
sobre paradigmas tecnológicos suas trajetórias e oportunidades, acrescentando um debate
sobre a convergência destes conceitos com as diretrizes de desenvolvimento sustentável. Na
próxima seção, abrimos a apresentação de dados empíricos sobre as oportunidades de
inovação biotecnológica no Pará. A seguir, retomamos o debate teórico, agora sobre o
constructo de regime de apropriabilidade, seus mecanismos de apropriação e relação com a
temática de desenvolvimento sustentável, incluindo apontamos sobre a cadeia produtiva do
açaí. Por fim, fazemos algumas considerações finais do capítulo.
2.2 PARADIGMAS TECNOLÓGICOS
A perspectiva teórica orientadora deste estudo sobre a emergência de negócios
inovadores na relação com o desenvolvimento sustentável tem como enfoque a análise da
dinâmica da mudança tecnológica e processos de inovações. Todo processo de inovação é
resultado da interação entre capacidades e estímulos gerados dentro das organizações, com
fatores mais amplos como desenvolvimento cientifico, condições de mercado sobre
crescimento de demanda e competição entre firmas, facilidades financeiras e padrões de
39
alocação de recursos, tendências macroeconômicas, e políticas públicas (DOSI, 1988, p.
1121).
Dosi (1982, p. 151) indica que na teoria econômica ortodoxa a tecnologia é vista como
um dado conjunto de combinação de fatores produtivos, definido em termos quantitativos e
qualitativos para o alcance de determinados resultados. Neste contexto, o progresso
tecnológico dentro da empresa é visto em geral por movimentos na curva de possibilidades de
produção ou aumento no número de produtos, enquanto que o desenvolvimento científico e
descobertas de avanços tecnológicos significativos eram entendidos como atividades
exógenas à empresa (DOSI, 1982, p. 151).
Contudo, Dosi (1982, p. 151) critica essa visão, em virtude de não permitir a
compreensão das interações efetivas entre fatores de mercado e desenvolvimento científico na
construção da trajetória de tecnologias nas indústrias e o papel das organizações na dinâmica
de geração e difusão de inovações e mudanças técnicas.
Tecnologia, então, foi definida por Dosi (1982, p. 151) como um conjunto de peças de
conhecimento (empíricos e teóricos), know-how, rotinas, métodos, e experiências (sucesso ou
fracasso), além de recursos físicos e equipamentos relacionados, de modo que o
desenvolvimento tecnológico seja considerado uma atividade de resolução de problema.
Dosi (1988, p. 1128) desenvolve a noção que o desenvolvimento de uma determinada
tecnologia transcorre por meio de uma trajetória ao longo do tempo, que sofre influências
econômicas, institucionais, sociais e do próprio estágio de conhecimento tecnológico. Estas
influências implicam no estabelecimento de uma série de mecanismos de seleção que
restringe um amplo conjunto de possibilidades de direções de desenvolvimento até que se
constitui um padrão de solução para problemas tecnológicos selecionados, baseados sobre
princípios e regras de decisão e materiais selecionados, quando o autor sugere que se alcança
um estágio paradigmático (Dosi, 1982, p. 152).
Apesar de Dosi (1982, p. 152) reconhecer diferenças entre tecnologia e ciência,
particularmente em relação ao conhecimento tecnológico ser menos articulado que o
científico, mais informal e tácito (implícito em experiências e habilidades), além de ter foco
na busca de soluções, e não no alcance de uma base explicativa bem consolidada. O autor,
com esta concepção de trajetória de desenvolvimento, também identifica atributos
equivalentes aos dois tipos de conhecimento, e sugere uma analogia entre os estágios de
desenvolvimento científico paradigmático e pré paradigmático proposto por Kuhn (DOSI,
1982, p. 152).
40
Neste sentido, o estágio de desenvolvimento tecnológico pode apresentar-se de forma
paradigmática ou pré paradigmática. A fase pré paradigmática é marcada por uma intensidade
de incerteza maior, não somente sobre os resultados da busca inovativa, mas também em
relação aos princípios científicos e tecnológicos e os processos de resolução de problemas que
podem ser aplicados para o avanço tecnológico não terem sido ainda estabelecidos por meio
de um conjunto de heurísticas (regras de decisão) que possam orientar seu desenvolvimento
(DOSI, 1988, p. 1134).
Este é um estágio em que um progresso técnico extraordinário acontece quando do
desenvolvimento de um novo paradigma. Neste momento, os fatores contextuais econômicos,
sociais e institucionais impactam de forma mais forte nas mudanças de direções e esforços
dos processos científicos e tecnológicos para promoção da emergência do novo paradigma
(DOSI, 1988, p.1142).
Na fase paradigmática, Dosi (1988, p. 1142) sugere que ocorre o chamado progresso
técnico “normal”, com processos de inovação e mudança técnica dentro das fronteiras do
paradigma tecnológico corrente, e limitados ao escopo específico das características de sua
trajetória, mesmo mediante alterações em fatores contextuais. Assim, cada paradigma
tecnológico, restringe a percepção de oportunidades e reduz as fronteiras nas quais os efeitos
de incentivo do mercado pode ser exercidas, afetando condições apropriabilidade para
explorar oportunidades tecnológicas (DOSI, 1988, p. 1142).
O paradigma tecnológico é uma perspectiva que envolve um conjunto de rotinas e
procedimentos, e uma definição de problemas relevantes e da base de conhecimentos
específica para busca de soluções (DOSI, 1982, p. 148). Em cada paradigma tecnológico é
estabelecido o conceito de progresso próprio (direção e taxa de avanço), baseado nos tradeoffs
tecnológicos e econômicos selecionados a partir da interação de fatores científicos,
econômicos, sociais e institucionais frente a dificuldades e problemas anteriormente não
resolvidos (DOSI, 1982, p. 147).
Assim, um paradigma tecnológico envolve fortes prescrições sobre o progresso
técnico ao se estabelecer o que deve ser priorizado e o que não deve. São definidos
contextualmente quais as necessidades significativas, os princípios científicos a serem
utilizados e a tecnologia de materiais adequada, caracterizando assim um padrão de solução
para determinados problemas tecnoeconômicos, ao mesmo tempo em que também se exclui
outros tipos potenciais de soluções, materiais e necessidades que são negligenciados (DOSI,
1982, p. 152, 1988, p. 1127). Por exemplo, na indústria automotiva foi estabelecido no início
do século XX o paradigma tecnológico baseado no motor de combustão interna.
41
O paradigma tecnológico é economicamente explorado e reproduzido através do
tempo, assim como abrange o desenvolvimento conjunto (coevolução) de estruturas
institucionais e sociais (DOSI, 1988, p. 1128). No decorrer do tempo, as características
tecnoeconômicas são progressivamente melhoradas, embora restringidas às combinações reais
possíveis, no âmbito do sistema socioeconômico.
Desta forma, regras específicas para desenvolvimento de competências e capacidades
por parte das empresas, além de um pacote de recursos e equipamentos característicos,
moldam a direção dos esforços tecnológicos a problemas, oportunidades e alvo típicos (DOSI,
1988, p. 1127). Um exemplo representa a inovação em máquinas instrumentais (engenharia
mecânica) que apresenta como dimensão de referência o desempenho de gerações ou
máquinas anteriores, são relevantes as condições típicas de uso e os requisitos produtivos dos
usuários, e possui processos de busca de melhorias tecnológicas que focam em geral em
tradeoffs que envolvem características de velocidade, precisão e flexibilidade.
A principal implicação deste formato paradigmático do desenvolvimento tecnológico é
que os processos de inovação tornam-se extremamente seletivos, seguindo direções muito
precisas e com forte efeito cumulativo sobre a aquisição de capacidades pelos agentes (DOSI,
1988, p. 1128). Esta configuração por um lado pode dotar de maior eficiência o avanço
tecnológico dentro da trajetória instituída, porém pode trazer problemas de travamento (lock
in) frente a soluções que demandem rupturas no padrão de mudança técnica constituído.
Esta visão é caracterizada pela perspectiva do path dependency, em que se destacam
como vistos anteriormente mecanismos de retornos crescentes dentro da trajetória,
aprendizado cumulativo e aspectos de irreversibilidade e não linearidades (DOSI, 1988,
p.1142). A seguir, discutimos em maior detalhe o progresso tecnológico dentro de trajetórias
estabelecidas.
2.2.1 Trajetórias tecnológicas
Uma trajetória tecnológica representa o processo de desenvolvimento tecnológico ao
longo de tradeoffs econômicos e tecnológicos, constituída de acordo com um paradigma
tecnológico (DOSI, 1988, p. 1128). É um padrão de resolução de problemas técnicos, cuja
fronteira tecnológica é o nível de progresso mais elevado em termos de múltiplos pontos entre
as dimensões tecnológicas e econômicas relevantes (Dosi, 1982, p. 152).
Bell e Pavitt (1993, p. 165) consideram que seja mais acurado falar em tecnologias do
que em tecnologia, em virtude haver diferentes tecnologias em desenvolvimento com
42
trajetórias concorrentes ou mesmo com fortes complementaridades, assim como há diferentes
áreas e perspectivas de conhecimentos científicos. Neste caso, o desenvolvimento de uma
tecnologia pode estimular ou inibir o desenvolvimento de outras tecnologias (Dosi, 1982, p.
154).
As mudanças técnicas envolvem aspectos exógenos e endógenos do sistema
empresarial (DOSI, 1988, p. 1144). Apesar de algumas características do progresso técnico
terem base sob aspectos exógenos às empresas, como o desenvolvimento científico ou
oportunidades relacionadas ao mercado e a estrutura de setores industriais, a aplicação da
mudança tecnológica nos meios de produção se dá endogenamente em cada organização
direcionada por processos comportamentais de busca competitividade (DOSI, 1988, p. 1142).
Cabe destacar que a natureza do conhecimento tecnológico é reconhecida como
cumulativa e com substancial base tácita (DOSI, 1988, p. 1131). Segundo Bell e Pavitt (1993,
p. 166) uma parte considerável do aprendizado tecnológico abrange conhecimentos tácitos,
não codificáveis e incorporados nas pessoas (e organizações) por meio de suas vivências e
habilidades adquiridas. Portanto este tipo de conhecimento não pode ser adquirido sem
investimentos ou rapidamente, e sua transferência depende da interação entre as pessoas
(BELL; PAVITT, 1993, p. 166).
Ao considerar este aspecto tácito do conhecimento tecnológico, o papel das empresas
como local de aprendizado, operação e desenvolvimento de sistemas produtivos concede-lhe
também a característica de específico. A acumulação tecnológica ocorre por meio de
processos de aprendizado path dependent diretamente vinculados às capacidades e estrutura
de produção das organizações, assim acumulação tecnológica toma variadas formas e graus
entre os diferentes setores, tamanhos e níveis de desenvolvimento das empresas que as
habilita para a realização de mudanças ou inovações tecnológicas (BELL; PAVITT, 1993, p.
167).
A estrutura de produção de qualquer inovação técnica é endógena à dinâmica
tecnológica das empresas e relacionada tanto ao aprendizado inovativo, quanto a extensão em
que este aprendizado é internalizado e apropriado pelas empresas como fator de rentabilidade
(DOSI, 1988, p. 1162). Portanto, a busca por novos produtos e processos tecnológicos não é
nunca um processo aleatório, mas fundamentado sobre todo o conjunto de fatores de
oportunidades tecnológicas e de mercado (DOSI, 1982, p. 159).
Neste sentido, Dosi (1982, p. 148) aborda de forma crítica os modelos de inovação
baseados em processos lineares como market pull (baseado em fatores de mercado) e
43
technological push (baseado em fatores científicos e tecnológicos), de forma a questionar a
definição de determinantes unidirecionais de processos inovativos.
Em relação ao modelo market pull indica como fragilidade a incerteza no
reconhecimento a priori de necessidades de usuários e consumidores nos processos de
inovação, principalmente aqueles não incrementais, de modo que essas demandas potenciais
apresentam uma atratividade limitada (DOSI, 1982, p. 150).
Além disso, esse modelo não propicia bases explicativas para as decisões e
mecanismos de seleção da fase do processo que abrange, após a identificação da necessidade
até o resultado final do produto inovador, considerando direções de esforços, níveis de custos
e limitações do processo de criação e produção na empresa (DOSI, 1982, p. 150).
Perspectivas baseadas em fatores de demanda tendem a considerar a tecnologia como
mecanismos passivos ao mercado, e mais responsiva e versátil do que a complexidade de
procedimentos de mudança tecnológica na realidade (DOSI, 1982, p. 150).
Contudo, o modelo technological push, ao fundar-se sobre uma visão restrita de oferta
de avanços científicos e tecnológicos, falha ao não explicar como fatores de mercado
interferem em processos de mudança técnica e na direção de esforços de inovações, não
permitindo considerar a natureza interativa destes mecanismos na trajetória tecnológica
(DOSI, 1982, p. 151). Portanto, Dosi (1997, p. 1536) defende o abandono de qualquer modelo
linear de inovação e o reconhecimento de uma perspectiva de coevolução de fatores
científicos, de mercado e institucionais, incorporando constantes feedback entre estes.
Ao procurar identificar as principais interações entre fatores de progresso científico e
demais aspectos econômicos e institucionais para o desenvolvimento tecnológico efetivo,
Dosi (1988, p. 1136) destaca em relação a fatores institucionais dois pontos: A relevância de
organizações de não mercado, particularmente as instituições pontes para a aplicação
instrumental de avanços teóricos para desenvolvimento de recursos práticos, mesmo na
insuficiência de incentivos econômicos; e as intervenções via fatores institucionais de
agências públicas no financiamento de programas de desenvolvimento tecnológico em áreas
ou direções específicas, por exemplo, na saúde para busca de tratamentos a doenças
específicas.
No que tange aos fatores de mercado, Dosi (1997, p. 156) ressalta incentivos advindos
de mudanças em condições e oportunidades de mercado, como alterações nos padrões de
demanda, na distribuição das participações de mercado relativas de cada empresa, e de custos
de produção que cria uma pressão ascendente sobre a busca de melhorias tecnológicas.
44
As interações entre atributos científicos e tecnológicos e de mercado acontecem em
duplo sentido, tanto pelas tentativas de exploração de novas tecnologias por empreendedores e
por processos de pesquisa e desenvolvimento (P&D) das organizações, quanto pela demanda
e direcionamento de avanços científicos focados em requisitos de mercado e solução de
tradeoffs tecnoeconômicos de usuários existentes (DOSI, 1988, p. 1136), como gargalos
tecnológicos ou escassez de suprimentos críticos (DOSI, 1988, p.1145).
2.2.2 Oportunidades tecnológicas
Oportunidades tecnológicas representam as possibilidades de avanços técnicos e
inovações, especificamente reconhecidas como fontes de mudanças técnicas dentro de um
determinado domínio (DOSI, 1997, p. 1532). Nesta perspectiva de paradigmas tecnológicos,
considerando fatores de irreversibilidade e retornos crescentes dentro de cada trajetória, cada
base de conhecimento específico define as oportunidades possíveis de futuro avanço técnico,
bem como os limites do conjunto de coeficientes de entradas do processo de inovação
(investimentos e esforços) viáveis sobre esta mesma base de conhecimento (DOSI, 1997, p.
1534).
Assim, na prática, em cada paradigma tecnológico, é improvável haver uma fronteira
de possibilidade de inovação idealmente ilimitada (DOSI, 1997, p. 1534). A proposição de
fronteiras de oportunidades deve configurar o alcançável sobre as bases dos paradigmas
tecnológicos disponíveis e nos limites dos efeitos de incentivos possíveis, abrangendo
também os contextos econômicos, institucionais e sociais, tanto em relação às direções de
busca, quanto à intensidade desta busca e às taxas de avanços efetivos (DOSI, 1997, p. 1535).
Portanto, as oportunidades tecnológicas e os níveis de produtividade inovativa são específicos
para cada trajetória tecnológica e seu grau de maturidade (DOSI, 1988, p. 1137).
Segundo Dosi (1988, p. 1138) a medida que se avança ao longo de trajetórias
tecnológicas por meio do crescimento acumulado de resultados inovativos decorre, em geral,
uma gradual exaustão de oportunidades tecnológicas. Não obstante, cabe ressalvar que não se
observa a emergência de retornos decrescentes nos processos de busca por inovações pelo
mercado, como consequência de um possível desestímulo a inovação em trajetórias saturadas,
em virtude do surgimento de novos paradigmas tecnológicos em que as empresas passam a
atuar, e que remodelam os padrões de oportunidades de progresso técnico e proporcionam
novos escopos potenciais (DOSI, 1988, p. 1138).
45
As oportunidades tecnológicas apresentam variação também de acordo com os setores
econômicos de atuação, em função de suas trajetórias tecnológicas particulares e por
influências de fatores de crescimento, tamanho e competitividade de mercado que impactam
na propensão a inovar. Neste caso, as oportunidades tecnológicas são um fator explicativo
para os diferentes níveis de comprometimentos de investimentos e esforços de busca
inovativa entre os diversos setores industriais (DOSI, 1988, p. 1138). Conforme Dosi (1988,
p.1151) setores industriais como químico, elétrico e eletrônico haviam sido identificados no
final do século XX com nível mais elevado de oportunidades tecnológicas que outros setores.
Mas, além de diferenças intersetoriais, cabe destacar a existência de assimetrias
intrasetoriais. Ao considerar que o conhecimento tecnológico é especifico em cada
organização por possuir características tácitas e de cumulatividade, uma implicação é que
tanto a percepção de oportunidades de inovação (tecnológica), e como o desenvolvimento de
capacidades para efetivamente aproveitá-las são atributos idiossincráticos das organizações
(DOSI, 1988, p. 1137). E, assim, contribui para explicar níveis diferentes de exploração de
oportunidades de inovação entre empresas de um mesmo setor.
Contudo, o comprometimento por parte de empresas da exploração das oportunidades
tecnológicas não depende somente da percepção destas e da aquisição de capacidades, estes
são fatores necessários, mas não suficientes (DOSI, 1988, p. 1160). Para o efetivo
comprometimento é preciso que uma empresa identifique condições de apropriabilidade dos
retornos econômicos gerados pelas inovações (DOSI, 1988, p. 1140).
A apropriabilidade de resultados de inovação corresponde àquelas propriedades do
conhecimento tecnológico, de mercados e do ambiente legal que permite o desenvolvimento
de inovações por agentes privados e sua proteção em termos de rentabilidade contra a rápida
imitação pelos concorrentes (DOSI, 1988, p. 1139). O grau de apropriabilidade em uma
trajetória tecnológica relaciona-se por um lado com a natureza da tecnologia específica, por
outro com o ciclo de vida do desenvolvimento tecnológico.
Em relação à natureza da tecnologia, Teece (1986, p. 287) indica que a base de
conhecimento dos produtos e processos de cada indústria influência na escolha adequada de
mecanismos de apropriação. Segundo Ceccagnoli e Rothaermel (2008, p. 14) as principais
características tecnológicas que afetam sua apropriabilidade são seu grau de codificação,
complexidade e facilidade de aplicar engenharia reversa.
Como exemplos, Levin et al (1987, p. 831) indicam que as patentes são em geral
importantes para as indústrias químicas, em virtude dos produtos serem mais facilmente
46
identificados pela sua estrutura de moléculas, isso permite maior clareza e, portanto,
condições melhores de comprovação de validade e eventualmente a prova de infrações.
Além disso, cada tecnologia contém um equilíbrio específico entre aspectos de bem
público e fatores apropriáveis privadamente (DOSI, 1988, p. 1139), de modo que se torna
importante analisar a natureza da base de conhecimento no que tange a seu conteúdo de
dimensão pública e universal, e sua dimensão tácita e específica para o setor e a empresa.
Cabe ressaltar que uma vez que toda a inovação demanda algum nível de desenvolvimento ou
melhoria de procedimentos técnicos implementados na empresa, há algum grau de esforço e
geração de conhecimento tecnológico específico na empresa (DOSI, 1988, p. 1126).
Os aspectos públicos do conhecimento tecnológico caracterizam-se por duas formas:
elementos de “bens livres” decorrentes do livre fluxo de conhecimento e informação, como
em publicações científicas ou jornalísticas abertas e relatórios públicos (1); e as
interdependências não negociáveis entre setores e empresas que assume a forma de
tecnologias complementares por meio de externalidades tecnológicas (2) (DOSI, 1988, p.
1146).
A externalidade tecnológica ocorre quando um avanço tecnológico realizado em um
setor industrial ou uma empresa pode ser apropriado por outras empresas ou indústrias devido
a complementaridades e vínculos entre esses agentes. Os vínculos podem se configurar em
uma relação entre usuários e produtores de uma dada tecnologia, ou em uma relação entre
diferentes indústrias que sejam usuárias da mesma tecnologia e assim compartilham gargalos
e oportunidades tecnológicas similares (DOSI, 1988, p. 1146).
Dosi (1988, p. 1161) indica que os graus de apropriabilidade e a eficácia relativa de
mecanismos de apropriação (como patentes e segredo industrial) mudam significativamente
no decorrer de uma trajetória tecnológica. Esta mudança pode ser provocada por uma
combinação de fatores como o ritmo de inovações e difusão no mercado, eventuais
intervenções institucionais, requisitos de clientes, e pelo padrão particular de mudança técnica
setorial (a ser discutido no próximo tópico).
O processo de inovação envolve equilíbrio complexo e variado entre diversas formas
de conhecimento publico e proprietário, e diferentes combinações entre oportunidades de
inovação, capacidades das firmas e incentivos econômicos, entre esses os mecanismos de
apropriabilidade, além de aspectos institucionais mais amplos.
Mesmo quando trajetórias tecnológicas estão bem estabelecidas, as variáveis
institucionais podem contribuir para moldar e determinar a taxa pela qual o avanço técnico
ocorre, Dosi (1982, p. 160) destaca três fatores institucionais relevantes: as instituições pontes
47
de acumulação do conhecimento científico e aplicado (como universidades e centros de
pesquisa); as intervenções institucionais de política pública de incentivo ao desenvolvimento
da Ciência e Tecnologia (C&T); e os efeitos seletivos em interesses sociais não econômicos
em termos stricto sensu, como em áreas da defesa, autosuficiência em energia e saúde
pública.
E ainda que neste estágio o avanço técnico transcorra por muitas formas endógenas de
dinâmica econômica, a incerteza dos processos de P&D e a existência de aspectos não
comercializáveis e externalidades da mudança técnica não desaparecem (DOSI, 1997, p. 160).
Por isso, mesmo normativas econômicas tradicionais indicam que alguma forma de
intervenção pública deve ser implementada para corrigir o que se denomina de falhas de
mercado relacionadas a diferentes entre as taxas de retorno sociais e privadas, bem como
diferentes níveis de investimentos e descontos sobre riscos sociais e entre agentes privados
(DOSI, 1997, p. 160).
Além disso, há a necessidade de coevolução das diversas dimensões econômicas,
sociais e institucionais em cada trajetória tecnológica de forma a consolidar os
desenvolvimentos de infraestruturas específicas. Ao longo da formação e desenvolvimento do
paradigma tecnológico, surgem exigências relacionadas a requisitos de infraestrutura e
tecnologias complementares para produção como de energia, transporte e suprimentos, e
demandas de constituição de sistemas e fluxos de economia de escala, e de padrões técnicos
particulares que possam positivamente retroalimentar seu padrão de mudança técnica
(mecanismo de autoreforço), e resultam na configuração da estrutura industrial de cada setor
econômico (DOSI, 1988, p. 1146).
2.2.3 Convergência com o desenvolvimento sustentável
A visão da inovação tecnológica enquanto “resolução de problemas” direcionada aos
tradeoffs de cada trajetória tecnológica deve ser compreendida com base nos contextos
históricos e institucionais específicos de uma sociedade. Neste sentido, ressalta-se dois pontos
de análise referente a teoria evolucionária em relação à orientação normativa de políticas de
desenvolvimento.
O primeiro ponto corresponde ao problema da externalidade em relação à geração de
custos e benefícios por novas tecnologias ou inovações que as estruturas institucionais
existentes não foram preparadas a atentar e atuar sobre estes (NELSON; WINTER, 2005, p.
522). Deste modo, os processos de mudança técnica provocam contínuas redefinições sobre o
48
que a sociedade considera externalidade (NELSON; WINTER, 2005, p. 522), dificultando
análises prévias de impacto e a maior assertividade na busca de correções às falhas no
mercado.
O segundo ponto é o entendimento de uma perspectiva dinâmica da linha divisória
entre o que a sociedade quer manter privado ou tornar público, a qual está em contínuo
redesenho (NELSON; WINTER, 2005, p. 523). Os autores indicam duas razões principais
para que o caráter de bem público não seja constante: Uma das razões é que o conceito do que
deve ser público depende parcialmente de determinados atributos tecnológicos em produtos e
serviços disponíveis na sociedade (NELSON; WINTER, 2005, p. 522). Outra razão é a
alteração em nível coletivo na sociedade do que as pessoas consideram importante ou valioso,
e a amplitude da aplicação e demanda desses conceitos de bem estar em termos de espaço (de
cidades ao globo) (NELSON; WINTER, 2005, p. 522).
Estes dois aspectos fazem com que as bases de avaliação da sociedade de alternativas
tecnológicas mudem ao longo do tempo, e, ainda, que não seja possível antecipar efeitos
futuros das trajetórias tecnológicas que possam intervir dinamicamente nestas mesmas bases
coletivas de definição de externalidades e bem público. A ideia de progresso técnico, em
virtude de ser concebida dentro de dependências de trajetórias particulares, cria dificuldades
substanciais de sombreamento ao se procurar comparar a adequação de dois diferentes
paradigmas tecnológicos, seja ex ante, seja ex post (DOSI, 1997, p.159).
Neste sentido, Nelson e Winter (2005, p. 507) ao reconhecerem que a inovação
tecnológica envolve abordagens sobre bens públicos e externalidades abrangentes, entendem
que a economia política não consegue gerar um sistema eticamente ideal para redistribuição
da riqueza na sociedade. Portanto, os autores defendem que a sociedade deve se engajar na
experimentação, priorizando a importância da diversidade e pluralismo, gerando informação e
feedback constante, como foco central para a orientação da evolução do sistema econômico
(NELSON; WINTER, 2005, p. 567).
Para Nelson e Winter (2005, p. 523) fica colocada a questão da distribuição de renda,
que deve ser entendida tanto pelo ponto de vista de segurança de renda (compensar carências
iniciais a fim de subsidiar um padrão básico), quanto de induzir transições sociotécnicas de
forma a (re)habilitar comunidades para a promoção do progresso tecnológico e
desenvolvimento econômico.
Embora concepção de Nelson e Winter (2005) de orientações normativas para
economia política relacionadas ao desenvolvimento acima mencionada tenham ênfase em
tradeoffs nas dimensões tecnológicas e econômicas, percebe-se que há uma incorporação
49
implícita nesta última dimensão de preocupações relacionadas a dimensões de bem estar
ambiental e equidade social.
No entanto, estes fatores ambientais e sociais ascendem de forma mais explícita em
estudos de inovação quando de sua interação com pressupostos de desenvolvimento
sustentável e seu desdobramento em termos do conceito de sustentabilidade aplicado a
organizações, seus produtos e operações.
Kneipp et al (2011) constataram a emergência de estudos na temática denominada de
“inovação sustentável” (resultado da convergência dos temas inovação e desenvolvimento
sustentável), ao verificar através de um levantamento bibliométrico um crescente aumento de
pesquisas e publicações sobre esta temática específica, destacando entre as principais áreas de
conhecimento pautadas a de gestão e negócios.
O conceito de inovação sustentável pode ser entendido como uma extensão do
conceito original de inovação, qualificado por objetivos normativos vinculados ao
desenvolvimento sustentável. Deste modo, os conceitos elaborados, em geral, relacionam-se a
um processo de inovação que não deve somente ser orientado para resultados econômicos,
mas também a explicitamente atender requisitos de sustentabilidade social e ambiental,
ressaltando-se a importância da abordagem integrada dessas três dimensões (SMITH; VOß;
GRIN, 2010; DAROIT; NASCIMENTO, 2004; CARVALHO; BARBIERI, 2010; KLEEF;
ROMME, 2007).
Portanto, busca-se expressar que o atendimento a requisitos de sustentabilidade social
e ambiental tornam-se elementos essenciais imbricados a sustentabilidade econômica,
caracterizando-se inclusive como novas direções de oportunidades de atuação para a
competitividade de empresas (PORTER; VAN DER LINDE, 1993; HART; MILSTEIN,
2004; HANSEN; GROSSE-DUNKER; REICHWALD, 2009).
É neste cenário que surgem discussões sobre modelos de negócios baseados em
propostas de inovação sustentável, cuja operacionalização de diretrizes do desenvolvimento
sustentável ainda está em construção. Este debate se estabelece seja em termos dos
parâmetros de sustentabilidade (econômica, ambiental e social) a serem aplicados, seja em
termos das novas bases para regras de decisão e comportamento organizacional que devem ser
desenvolvidos.
Ao desenvolver um método de avaliação da sustentabilidade de inovações, Hansen,
Grosse-Dunker e Reichwald (2009) propõem de forma geral que a inovação sustentável deve
gerar um resultado líquido positivo no estoque global de capitais da empresa (capital
econômico, humano, social e estoque de recursos naturais do ambiente). Mas os autores
50
reconhecem que uma avaliação absoluta de sustentabilidade não é possível, visto que sempre
será influenciada por fatores relativos ao contexto institucional, tecnológico e sociocultural
(como já mencionado anteriormente) onde a inovação é implementada.
Esta sensibilidade ao contexto também é ressaltada por Boons e Lüdeke-Freund
(2012) ao refletirem que uma proposição de valor sustentável está atrelada a um determinado
contexto de tempo e espaço, onde os diversos atores participantes, as condições ambientais, o
modelo de gestão adotado, a natureza e a trajetória da tecnologia em curso afetam o
desenvolvimento da inovação e os resultados que se busca alcançar.
Kleef e Roome (2007) destacam a importância da articulação do contexto ao nível
local das operações com arranjos institucionais mais amplos e seus efeitos quanto à
globalização de fluxos de mercado, indicando que é fundamental mapear a influência de
atores regionais, nacionais e internacionais e concertar suas participações.
Esta abordagem foi mais abrangente para a inovação, na busca de soluções a
problemas relacionados ao desenvolvimento da sociedade e à sustentabilidade, é necessária ao
se visualizar os complexos sistemas de produção e consumo ao nível global estabelecidos e os
lock in tecnológicos tanto em trajetórias particulares, quanto pela complementaridade entre
elas.
Neste caso, Rennings (2000, p. 320) destaca a importância da promoção de alterações
em regimes tecnológicos em sistemas de infraestrutura, principalmente nos sistemas de
energia e transporte pela sua complementaridade com demais trajetórias tecnológicas. O autor
ainda informa como prioritário a condução de processos de aprendizado e de análise de
transições tecnológicas ambientalmente sustentáveis acompanhadas de correspondentes
coevoluções sociais e institucionais.
A superação das travas tecnológicas e transição de paradigmas nesta direção
demandam convergência de diferentes políticas públicas (econômica, ambiental, C&T,
educação) com objetivos de promoção da inovação baseada em critérios coletivos de
sustentabilidade (VOLLENBROEK, 2002; RENNINGS, 2000). A implementação de
regulamentações institucionais (coerentes entre si) que realinhem as mudanças em definições
de bens públicos e externalidades (especificamente as de efeito sistêmico), é essencial para
prover condições adequadas de apropriabilidade de inovações no âmbito dos novos escopos
de oportunidades tecnológicas sustentáveis que emergem.
51
2.3 A INOVAÇÃO BIOTECNOLÓGICA COMO OPORTUNIDADE DE
DESENVOLVIMENTO NO PARÁ: O CONTEXTO EMPÍRICO DA PESQUISA
O Brasil é um dos países detentores de megadiversidade, com estimativa de abranger
no território brasileiro em torno de 20% das espécies existentes na Terra (MOREIRA, E.,
2003, p. 39), com destaque para a região amazônica. A região amazônica representa o maior
bioma do território brasileiro, equivale a 30% da área de floresta tropical do planeta, sendo
reconhecida por conter uma das maiores diversidades genéticas do mundo (CGEE, 2007, p.
144).
Diante deste cenário, na região amazônica há potencial oportunidade de geração de
negócios, emprego e renda baseados em inovações biotecnológicas que possam propiciar o
uso sustentável de sua biodiversidade e um processo de desenvolvimento regional
economicamente mais dinâmico e socialmente mais justo. Contudo, até o momento não se
identifica o aproveitamento efetivo dessa potencialidade, e os ciclos de uso e exploração de
recursos ambientais na região não lograram a construção de um desenvolvimento regional
sustentável (CGEE, 2007, p. 124).
Assim, torna-se relevante ao objeto deste estudo fazermos uma análise sobre como a
dinâmica de incentivos e obstáculos em termos de desenvolvimento de processos de
inovações baseados em oportunidades biotecnológicas ocorre do Estado do Pará. Contudo,
para entendermos tais dinâmicas no contexto do Pará, consideramos antes necessário
conhecer um breve histórico da trajetória de formação das bases institucionais e de políticas
de fomento à inovação em âmbito nacional e regional. Estas características nacionais e
regionais são importantes por terem forte influência na formação e no desenvolvimento dos
processos políticos e institucionais internos no Estado.
2.3.1 Breve histórico sobre as bases institucionais da inovação
Suzigan e Albuquerque (2008) argumentam que o Brasil apresentou um processo
histórico de formação de instituições de CT&I tardio, limitado, e problemático. Esta situação,
combinada ao caráter também tardio e limitado da industrialização do país, implicou
importantes debilidades às interações entre ciência, tecnologia e inovação (SUZIGAN;
ALBUQUERQUE, 2008).
O processo de formação das bases de CT&I foi tardio não somente em relação a países
de economia avançada, mas também em comparação com outros países da América Latina
52
ainda no período colonial. Portugal mantinha restrições a instalações de universidades ou
instituições de pesquisa no território colonial brasileiro, de modo que, somente com a
mudança da corte portuguesa ao Brasil em 1808, as primeiras faculdades para ensino superior
puderam ser criadas, e os institutos de pesquisa começam a ser estabelecidos, tendo um
impulso maior no final do século XIX (SUZIGAN; ALBUQUERQUE, 2008).
No entanto, estas primeiras faculdades e instituições de pesquisa em geral atuavam de
forma separada, sem articulação entre um embrionário desenvolvimento científico e o ensino
superior, o que permanece como tal até o início do século XX (SUZIGAN;
ALBUQUERQUE, 2008). Esta separação entre atividades de ciência e ensino leva Suzigan e
Albuquerque (2008) a denominarem de limitada a constituição das instituições de C&T.
Contudo, além de tardio e limitado, o desenvolvimento de instituições de C&T
também foi problemático por ser marcado por desigualdades, tanto na distribuição das
instituições no território nacional, quanto à dificuldade de acesso da maior parte da população
a estes ambientes de produção científica e tecnológica, como universidades e instituições
científicas (SUZIGAN; ALBUQUERQUE, 2008).
A partir da década de 1950, evidenciam-se iniciativas do governo federal em constituir
uma política para estruturação institucional da CT&I no país. O Estado brasileiro incentivou a
industrialização do país, utilizando o modelo de substituição de importações, fazendo
investimentos diretos por meio de bancos de desenvolvimento, e criando grandes empresas
públicas em setores considerados estratégicos, além de apoiar a implantação de
empreendimentos industriais privados, com destaque à instalação de fábricas de
multinacionais estrangeiras (CASSIOLATO; LASTRES, 1998; VIOTTI, 2008).
Esta estratégia de política de desenvolvimento, Viotti (2008) caracteriza como a busca
do desenvolvimento pelo crescimento econômico e industrialização extensiva. A política de
CT&I baseou-se na promoção de infraestrutura e atividades de P&D, notadamente pela
criação e fortalecimento de universidades, instituições de pesquisa, e agências nacionais de
fomento (CNPq, CAPES e FINEP) (VIOTTI, 2008). Deste modo, foi marcada por uma
concepção “ofertista”, pelo qual se acreditava na progressiva absorção do conhecimento
tecnológico pela nascente industrial nacional (CGEE, 2010; CASSIOLATO; LASTRES,
1998; VIOTTI, 2008).
Neste período, a maioria das atividades de P&D foi feita por institutos e empresas
públicas, com participação reduzida de empresas privadas, em que a base particularmente
multinacional, manteve sua estrutura de desenvolvimento tecnológico de novos produtos e
processos em seus países de origem (CASSIOLATO; LASTRES, 1998; VIOTTI, 2008).
53
Uma segunda fase de orientação política à CT&I começa no final dos anos de 1970,
marcada pela crise econômica internacional e fortes problemas fiscais em países em
desenvolvimento (VIOTTI, 2008). De acordo com políticas de orientação neoliberal, uma
série de medidas para a redução do papel e tamanho do Estado foi efetivada, entre elas a
desregulamentação, a abertura ao comércio internacional e privatizações, e observa-se a uma
instabilidade no nível de investimentos públicos em CT&I no período, com momento de
grave retração (CRUZ; PACHECO, [20--?]; PACHECO, 2007; VIOTTI, 2008).
Para Viotti (2008), a estratégia de desenvolvimento deste período é representado pela
busca da eficiência, com destaque a implementação do Programa Brasileiro de Qualidade e
Produtividade. Entretanto, as dificuldades do legado das políticas “ofertistas” anteriores não
conseguiram ser superadas (PACHECO, 2007).
Manteve-se a assimetria entre atores do sistema de CT&I, uma vez que o
fortalecimento da pesquisa acadêmica não havia sido acompanhado pelo desenvolvimento de
capacitação tecnológica das indústrias (PACHECO, 2007). Neste sentido, Suzigan e
Alburquerque (2008) defendem que as relações entre as instituições de C&T e empresas no
Brasil são representados por poucos pontos de interações em setores específicos. Apesar de
haver setores, como aeronáutica e agricultura, em que houve a construção em longo prazo de
relações entre indústria e centros de pesquisa com esforços sistemáticos apoiados pelo
governo, estas são exceções frente ao conjunto de atividades do país.
Pacheco (2007) ressalta que as políticas de CT&I não tiveram aderência no terreno da
política macroeconômica do governo. Um dos principais desafios se configura como a
histórica desarticulação entre a política de CT&I e a política macroeconômica e industrial no
Brasil, com substancial instabilidade do gasto público na área de CT&I e extremamente baixo
investimento privado (PACHECO, 2007).
Neste contexto, uma terceira fase das políticas de CT&I tem início no final da década
de 1990, em um cenário de recuperação econômica, onde o tema da inovação assume
relevância nas proposições de políticas de desenvolvimento (PACHECO, 2007). Pacheco
(2007) ressalta três aspectos centrais: Uma melhora nos padrões de financiamento com a
criação dos Fundos Setoriais que passam a abranger o Fundo Nacional de Desenvolvimento
Científico e Tecnológico (FNDCT) com aumento do orçamento de CT&I (1); a ênfase no
estímulo de variados tipos de arranjos público-privado (2); e uma mudança mais ampla da
legislação (3).
Destaca-se a criação da Lei de Inovação (BRASIL. LEI Nº 10.973/2004) e da Lei do
Bem (BRASIL. LEI Nº 11.196/2005), além do estabelecimento de novas instituições de
54
articulação, como a implantação da Embrapii (Empresa Brasileira de Pesquisa e Inovação
Industrial), e a execução de programas com diferentes desenhos políticos, na busca de
inclusão de novos atores, como governos estaduais e municipais, e organizações do setor
privado (CGEE, 2010).
A promoção da inovação se tornou cada vez mais explícita nas principais políticas da
área de CT&I (VIOTTI, 2008). A própria mudança no nome do Ministério da Ciência e
Tecnologia (MCT) em 2011 para Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) pode retratar
simbolicamente este cenário.
Entretanto, os desafios antigos ainda precisam ser enfrentados, Pacheco (2007)
entende que uma política de incentivo à inovação faz parte da orientação de política
econômica geral de um país, seja por ação, seja por omissão. Portanto, a continua
incompatibilidade entre a política de CT&I e as políticas macroeconômicas (por exemplo,
com a elevação de juros) no Brasil é incoerente para o autor.
Em sentido similar, Viotti (2008) e Salerno e Kubota (2008) levantam o problema da
coordenação de políticas de inovação tanto no nível vertical como horizontal das esferas de
governo. É necessário a busca de uma coordenação política vertical entre as esferas federal,
estaduais e municipais, bem como uma integração política horizontal em cada esfera, por
exemplo, entre os diferentes ministérios e órgãos do governo Federal, em vez ocorrerem ainda
considerável disputa entre estes, ou mesmos órgãos que atuam sem considerar seus impactos
sobre a CT&I (VIOTTI, 2008; SALERNO; KUBOTA, 2008).
Outro obstáculo para Cruz e Pacheco (s/d) é a inconsistência de instrumentos de
políticas de promoção à inovação empresarial. Em geral, estes instrumentos são formulados
com base em modelos acadêmicos, que apesar de serem bastante conhecidos para
pesquisadores de instituições de ensino e pesquisa, não o são para empresários (CRUZ;
PACHECO, [20--?]). Além disso, a maior parte das ações de apoio são executadas dentro do
legado institucional das políticas anteriores, em instituições como FINEP, CNPq e Fundações
de Apoio a Pesquisa (FAP) que foram historicamente voltadas ao relacionamento com
universidades e centros de pesquisa públicos, o que também provoca dificuldades de
implementação (CRUZ; PACHECO, [20--?]).
Enríquez (2003, p. 169) corrobora que as dificuldades de comprometimento do setor
produtivo com atividades de inovativas relacionam-se a um histórico de políticas
protecionistas anteriores e a dependência tecnológica das empresas. O autor acrescenta
também barreiras com a escassez de crédito em condições adequadas para projetos de
inovação, e o foco das empresas ao mercado interno, em que há menor competitividade.
55
Deste modo, percebe-se que há uma retomada na promoção de um ambiente
institucional de incentivo à inovação no país, principalmente buscando o aproveitamento da
infraestrutura e capacidade científica instalada nas instituições de C&T do país para fomentar
interações com indústrias e empresas de diferentes setores e assim auxiliar no aumento da
capacidade tecnológica dos agentes privados. No entanto, essa desarticulação entre os agentes
é dependente de trajetórias históricas, e sua superação implica no desenvolvimento de longo
prazo de vínculos institucionais e no estabelecimento de relações de confiança e
reciprocidade.
Cabe destacar também que são expressivas as desigualdades na distribuição regional
de agentes e de instituições do sistema de C&T, assim como as disparidades de
desenvolvimento industrial no país (CGEE, 2007, p. 135). Por isso, outro desafio é tornar o
sistema de CT&I capaz de identificar as particularidades regionais, valorizar suas
potencialidades e atuar sobre seus pontos críticos específicos, tornando cada região capaz de
se integrar a cadeias globais tanto por possibilidades geradas pela inovação de novos produtos
e processos em setores tradicionais, como implantação de novas atividades industriais (CGEE,
2007, p. 135).
Em termos de estudos em contextos regionais, o CGEE (2011) identificou que a região
Norte apresentava o menor percentual de empresas inovadoras (somente 3,2%.) entre as
regiões do país. Segundo o CGEE (2010) alguns dos fatores estruturais mais proeminentes
para a desigualdade de CT&I entre os estados brasileiros são: Disparidade do legado histórico
da distribuição de ativos tecnológicos e institucionais (1); graves diferenças orçamentárias e,
portanto, de potencial de gasto (2); e a elevada diferenciação regional da estrutura industrial e
esforço em P&D das empresas (3).
No Estado do Pará, um reflexo destes fatores é concretizado na formação da estrutura
de instituições pontes em C&T. As principais instituições de pesquisa científica no Estado
foram criadas, ou posteriormente incorporadas, pelo governo federal, como a Universidade
Federal do Pará (MEC), Universidade Federal Rural da Amazônia (MEC), o Museu Paraense
Emílio Goeldi (MCTI), e a unidade EMBRAPA (MAPA), entre outros.
Na esfera de governo estadual, a estruturação de base institucional de CT&I inicia-se
somente no final da década de 1980, com a previsão na constituição estadual de criação de
fundo específico para C&T. Na década de 1990, o fundo de investimento em C&T foi
regulamentado pela Lei Estadual 29/1995, e passou a ser gerido pela Secretaria Estadual de
Ciência, Tecnologia e Meio Ambiente (SECTAM). Neste período, é criada a Universidade do
Estado do Pará (PARÁ. LEI Nº 5.747/1993).
56
Após essa estruturação inicial, mudanças significativas somente voltam a ocorrer em
2007, quando é criada a Secretaria de Estado de Desenvolvimento, Ciência e Tecnologia
(atual Secretaria de Estado de Ciência, Tecnologia e Inovação), com a desvinculação da área
de C&T da antiga SECTAM. O Estado passou a ter uma secretaria estadual específica
dedicada ao tema (PARÁ. LEI Nº 7.017/2007), e no mesmo ano a implantação da Fundação
de Amparo à Pesquisa do Estado do Pará (Lei complementar 061/2007), no período dentro
das diretrizes políticas estaduais, destaca-se o projeto de instalação de Parques de Ciência e
Tecnologia. Entendemos que esta formação de base institucional do Estado do Pará em CT&I
foi tardia em comparação com a trajetória da maioria dos Estados da federação, apesar de ter
se caracterizado por uma fase recente de desenvolvimento das novas instituições.
Porém, estes investimentos são fortemente baseados no governo federal (CGEE,
2010). Entre os novos investimentos federais no Estado, pode-se ressaltar a criação de novas
universidades federais (Universidade Federal do Oeste do Pará e Universidade Federal do Sul
e Sudeste do Pará) e de uma unidade local do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais
(INPE) na área do Parque de Ciência e Tecnologia Guamá.
Cabe ressaltar que as substanciais disparidades orçamentárias entre os Estados
brasileiros e a heterogeneidade de políticas de CT&I desses governos subnacionais têm como
consequência uma expressiva desigualdade também na distribuição de gastos dos estados em
CT&I. De acordo com dados do CGEE (2010), em 2007, a aplicação de recursos dos
governos estaduais em CT&I por região ocorreu conforme a tabela abaixo:
Tabela 2 - Percentual de aplicação de recursos pelos governos estaduais em CT&I por região do Brasil
em 2007.
Percentual de aplicação de recursos pelos governos estaduais em
CT&I por região do Brasil em 2007
Região Perc. de recursos aplicados
Norte 2,68%
Nordeste 9,06%
Centro-Oeste 2,53%
Sudeste 75,43%
Sul 10,31%
Total 100%
Fonte: Baseado em CGEE (2010, p. 76).
O aporte específico do Estado do Pará neste ano de 2007 representou 0,52% do total
de recursos estaduais aplicados em C&T, e em termos relativos ao PIB estadual, o aporte foi
equivalente a 0,06% de seu PIB, ocupando assim a 18ª posição em proporção de investimento
57
relativo ao PIB entre os estados brasileiros (CGEE, 2010, p. 75-76). Neste caso, observa-se
uma considerável restrição de aporte de recursos estaduais à CT&I na região Norte como um
todo, e no Pará, o que é um ponto de preocupação relevante quanto ao estabelecimento de
políticas de desenvolvimento amparadas no progresso científico e tecnológico.
Em relação à estrutura institucional de C&T na esfera municipal, durante a pesquisa
não foram identificados órgãos específicos de C&T vinculados aos governos municipais
paraenses. Poucas prefeituras apresentaram secretarias municipais explicitamente dedicadas
ao tema, sendo as encontradas localizadas somente nos municípios de Ananindeua e Marabá,
e apenas duas prefeituras foram identificadas como associadas ao Fórum Nacional de
Secretários e Dirigentes Municipais de CT&I, sendo estas as de Castanhal e Ananindeua.
Por fim, a região amazônica, com exceção à zona franca de Manaus, possui escassa
atividade industrial (CGEE, 2008, p. 19). Enríquez (2003, p. 170) afirma que, enquanto a
conjuntura industrial do Brasil se configurou pouca inovadora tecnologicamente, com baixa
capacidade de competitividade e precária interação das empresas com instituições de pesquisa
(com exceção de setores específicos), a situação na região Amazônia é ainda mais crítica,
reportando-se ao próprio modelo histórico de produção econômica baseado na exploração de
matérias primas com baixa intensidade tecnológica.
De forma que na região Norte em geral, incluindo-se o Estado do Pará, processos de
inovação tecnológica são ainda incipientes, em termos quantitativos e qualitativos, sendo o
conhecimento tecnológico acumulado e as oportunidades de aprendizado constantemente
subutilizados quanto aos potenciais arranjos institucionais possíveis entre universidades,
institutos de pesquisa, empresas e demais atores locais, nacionais e internacionais (CGEE,
2007, p. 136).
Obstáculos à formação de tais arranjos interorganizacionais tem um forte impacto
quanto à possibilidade de aproveitamento de oportunidades tecnológicas na área da
biotecnologia. Isso porque o desenvolvimento de inovações biotecnológicas é geralmente
caracterizado pela cooperação entre instituições de pesquisa e o setor produtivo, em função do
alto nível complexidade cientifica e tecnológica que envolve, além do volume de
investimentos necessários (ENRÍQUEZ, 2003, p. 172).
2.3.2 Biotecnologia como oportunidade de negócio
Contínuos avanços científicos e tecnológicos em engenharia genética e molecular
desde a década de 1980 têm permitido desenvolver e difundir a biotecnologia, processo
58
tecnológico capaz de proporcionar uma considerável agregação de valor aos produtos naturais
(ENRÍQUEZ, 2003, p. 171).
A biotecnologia tem conseguido transpassar horizontalmente e verticalmente vários
setores da economia, criando novos paradigmas tecnológicos (ENRÍQUEZ, 2003, p. 172). No
entanto, reconhece-se que a trajetória da biotecnologia não é linear em todos os setores,
variando de acordo com a base de conhecimento e trajetória tecnológica desenvolvida te então
(ENRÍQUEZ, 2003, p. 172). Por exemplo, no setor farmacêutico seu avanço é mais complexo
e envolve ruptura de base de conhecimento com a trajetória de química sintética, no setor de
alimentos funcionais até o momento a complexidade de sua aplicação é menor.
Para Assad (2003, p. 32), a biotecnologia deve ser vista não somente como uma
oportunidade de mercado para serviços e produtos inovadores, como novas rotas
farmacêuticas e melhor produtividade agrícola, mas também pode ser útil para a preservação
da diversidade genética ex situ. Por meio da biotecnologia é possível conhecer e preservar
melhor espécies e seus conjuntos de genes, contribuindo para a conversação in situ e seu uso
sustentável (ASSAD, 2003, p. 32).
O processo de biotecnologia para desenvolvimento de produtos ou processos pode ser
dividido em três etapas: pesquisa científica, bioprospecção, e desenvolvimento tecnológico. A
pesquisa científica abrange as atividades de investigação que a priori não tem identificado
potencial de uso econômico (MMA, 2005, p. 9). Assim, por sua natureza de baixo grau de
apropriabilidade de investimentos, há forte presença de instituições públicas ou sem
finalidade lucrativa nesta etapa.
A etapa de bioprospecção é a busca de princípios ativos, refere-se ao estudo de
organismos com potencial de uso comercial que possibilitem a descoberta de novos produtos
(ENRÍQUEZ, 2003, p. 174; MMA, 2005, p. 9). Nesta fase, há a direção e intensidade das
atividades já passam a sofrer maior influência do mercado, e múltiplos arranjos cooperativos
tanto entre entidades públicas e privadas, quanto entre setores e entidades privados, com forte
presença de starup de base tecnológica (como explicado mais adiante). E, finalmente, a fase
de desenvolvimento tecnológico objetiva à produção de inovações de produtos ou processos,
com aplicação econômica (MMA, 2005, p. 9).
Ao considerar a complexidade, incerteza e nível de investimentos necessários para as
atividades, Enríquez (2003, p. 172) indica que um fator essencial para o desenvolvimento da
biotecnologia é cooperação entre instituições de pesquisa e o setor produtivo, sendo que este
último exerce considerável influência na intensidade e direção das trajetórias tecnológicas a
serem seguidas. Esta característica de interação entre instituições de pesquisa e empresas é,
59
contudo, uma dificuldade já comentada em países em desenvolvimento, particularmente no
Brasil, onde esta interação é, em geral, incipiente.
Além da interação entre empresas e unidades e institutos de pesquisa, a biotecnologia
é um terreno fértil também para o desenvolvimento de parcerias entre empresas do setor
privado. Neste contexto, há espaço para as pequenas empresas de base biotecnológica, que
têm se especializado em nichos específicos de mercado de pesquisa de bibliotecas de
compostos químicos e naturais, e no desenvolvimento de produtos primários às indústrias
maiores (ENRÍQUEZ, 2003, p. 181). Este tipo de parceria interorganizacional entre pequenas
empresas baseadas em competências tecnológicas e grandes empresas que dominam
processos de produção e capacidades complementares está sendo típica na área farmacêutica,
como retrato por Powell, Koput e Smith-Doerr (1996). Segundo Assad (2003, p. 32) no Brasil
já havia 304 empresas de biotecnologia em 2003.
Se por um lado a necessidade de articulação entre empresas e entre estas e instituições
de pesquisa é um desafio, por outro lado é uma ocasião conveniente para aproveitar a
infraestrutura de pesquisa existente na região, e encontrar alternativas para fortalecer e
disseminar os conhecimento e competência já adquiridos pelos pesquisadores e instituições
instaladas na região (CGEE, 2007, p. 144).
Em termos de capacidade de C&T para biotecnologia, estudos do CGEE (2006a;
2008) destacam-se no Pará as seguintes instituições: Universidade Federal do Pará (UFPA),
Museu Paraense Emilio Goeldi (MPEG), Embrapa Amazônia Oriental e Universidade Federal
Rural da Amazônia (UFRA) (CGEE, 2006a, p. 89; CGEE, 2008, p. 69, 48, 31, 81).
Acrescenta-se a esta lista também o Instituto Evandro Chagas (IEC), na área específica de
pesquisa biomédica e saúde pública (IEC, 2014).
Os pontos positivos da capacidade instalada de C&T no Estado referem-se a um
quadro de pessoal científico e infraestrutura tecnológica alto nível3 (CGEE, 2008, p. 223). Há
dois herbários credenciados do fies depositórios (Museu Paraense Emilio Goeldi e Embrapa
Amazônia Oriental), e a UFPA possui autorização do CGEN para montagem de coleção ex
situ e acesso especial a bioprospecção (CGEE, 2008, p. 16, 30).
As instituições possuem um parque de equipamentos heterogêneo, de acordo com suas
especialidades, de forma geral, este parque é amplo e capaz de realizar múltiplas análises
3 Neste relatório do CGEE (2008) é realizado um mapeamento das principais instituições de pesquisa na região
Amazônica, contemplando o levantamento no Estado do Pará quanto a capacidade de atuação na área de
biotecnologia. São analisados itens como estrutura física e acadêmica, incluindo instalações e equipamentos,
recursos humanos, e projetos relevantes na área. Entre as páginas 126 e 136 é elaborada uma nota específica
para o Estado do Pará.
60
biológicas, químico e físicas, estando em condições niveladas às instituições nacionais
(CGEE, 2008). Estas instituições detêm experiência em diversas áreas científicas interligadas
a biotecnologia (biologia, química, física, engenharias química e de alimentos), inclusive a
UFPA possui cursos de graduação e pós graduação (mestrado e doutorado) específicos em
biotecnologia (CGEE, 2008; UFPA, 2013, 2014a).
No entanto, também se identificam dificuldades que são relacionadas principalmente a
restrições de recursos para manutenção e renovação apropriada de infraestrutura, deficiência
de pessoal técnico e de apoio, reduzido orçamento para pesquisas (dependência de captação
externa), e interação limitada com o setor produtivo (CGEE, 2008, p. 36, 54, 79-80, 85;
ENRÍQUEZ, 2013, p. 170).
Além da capacidade de C&T, Enríquez (2003, p. 186) chama atenção para as
especificidades de cadeias produtivas da biodiversidade quanto a seu potencial de
aproveitamento econômico. Alguns aspectos particulares de cadeias produtivas baseadas em
produtos da biodiversidade na região amazônica também precisam ser discutidos, pois se
distingue de cadeias produtivas tradicionais da indústria e tem impactam na possibilidade
efetiva de competitividade desses produtos tecnológicos em mercados globais, como a
garantia de qualidade e quantidade de matérias primas, com dificuldades abrangendo desde a
colheita, seleção, transporte e comercialização até os mecanismos de gestão (ENRÍQUEZ,
2003, p. 186).
Assim, é necessário considerar as características específicas das cadeias da
biodiversidade, no que tange a produção de escala, qualidade e quantidade de matéria prima
disponível, organização e logística de produção, políticas de preços, relevância de marcas, e
fatores socioambientais (CGEE, 2007, p. 22).
Em uma cadeia de ativo da biodiversidade em geral os produtos (matérias primas)
estão dispersos na natureza, bem como os fornecedores também estão dispersos
espacialmente, não há economias de escopo e escala estabelecidas ou uma rede de prestadores
de serviços e de assistência técnica organizada (CGEE, 2007, p. 22).
Em geral, neste tipo de cadeia a transação comercial entre o extrativista e a
bioindústria é instável, há grande dificuldade de se instituir uma frequência de fornecimento,
pois nem o fornecedor pode garantir a existência da produção, e nem o consumidor em geral
consegue assegurar o nível de demanda, o que pode gerar agudas oscilações nos preços
(CGEE, 2007, p. 23). Na transação comercial, aparece também forte presença do
atravessador, porém este não agrega valor substancial aos produtos, de forma que há um
61
aumento dos custos de transação e da assimetria de informação entre os agentes, em prejuízo
dos extrativistas (CGEE, 2007, p. 23).
A logística é outro aspecto crítico, há dificuldades para acessar as áreas produtivas,
deslocar o produto aos locais de armazenagem e posteriormente comercializar e transportar os
produtos para processamento industrial (CGEE, 2007, p. 23). Cabe ainda indicar como fator
complicador que os produtos da biodiversidade são comumente muito vulneráveis, sujeitos a
contaminação e rapidamente perecíveis, isso enfraquece também a posição dos extrativistas,
enquanto ente econômico (CGEE, 2007, p. 23).
Ao contrário de cadeias tradicionais, onde fornecedores constroem marcas para
identificação de mercado, em cadeias da biodiversidade é possível fazer identificação com uso
de valores e símbolos imateriais que se vinculam a um valor intrínseco (CGEE, 2007, p. 23)
da floresta, da comunidade ou de um meio de vida. Em razão disso, há um potencial de
agregação de valor por estes significados.
No que tange a fatores socioambientais, deve-se ter em mente que a manutenção da
cadeia da biodiversidade extrapola a lógica puramente econômica, uma vez que contribui para
a conservação dos ecossistemas e de serviços ambientais, pois convive com os sistemas
florestais e áreas preservadas (CGEE, 2007, p. 23). Isso abre a possibilidade de criação de
mecanismos de biocomércio e comércio justo, o que é socialmente relevante, pois se por um
lado o extrativismo tradicional da região colaborou para a manutenção da floresta, por outro
lado não tem contribuído para uma justiça social no território (CGEE, 2007, p. 16, 24).
A divulgação de propriedades especiais e qualidade diferenciada dos produtos naturais
(principalmente em termos de benefícios à saúde e de serem menos agressivos ao meio
ambiente) têm levado a uma intensificação do uso desses produtos naturais (CGEE, 2007, p.
118). Contudo, ao considerar tais especificidades das cadeias de biodiversidade, verifica-se
que há desafios em sua organização que precisam ser superados para que a possibilidade de
criação de bioindústrias se consolide.
Entre as principais limitações ressalta-se a não adequação da oferta à demanda e vice-
versa, com mercados ainda não consolidados e pouca diversificação de setores demandantes.
Deste modo, percebe-se que os arranjos produtivos são ainda incipientes e há uma deficiência
na coordenação entre os agentes da cadeia com um grande número de intermediários. Tais
problemas de informação e coordenação reforçam dificuldades em se estabelecer
regularidades entre oferta e demanda (CGEE, 2007, p. 20, 121).
Há ainda a necessidade de implementar melhorias de padrões de qualidade e práticas
produtivas que garantam adequação consistentes a normas exigidas no mercado, inclusive
62
quando a certificações ambientais, além de uma infraestrutura para a produção e distribuição
dos produtos adequadas (CGEE, 2007, p. 20).
Um exemplo de não superação desses problemas é indicado pelo CGEE (2007, p. 29)
na cadeia da castanha-do-pará: O Brasil ocupou a primeira posição no fornecimento do
mercado mundial da castanha até 1990 (80% do comércio mundial/produção de 51.000 t). No
entanto, em meados da década de 2000 a produção já havia reduzido para 30.000 t, e a Bolívia
passou a ser a principal exportadora mundial. Os principais motivos apontados para esta
queda de produção foram a redução de castanhais produtivos, deficiências de logística e de
atendimento de normas fitossanitárias, e ausência de programas de incentivo a sustentação de
renda de extrativistas.
É preciso conceber que a sustentabilidade das atividades a serem estabelecidas na
cadeia será alcançada não somente pela implantação de práticas de uso sustentável em si, mas
também terá que vencer a concorrência por espaços frente a alternativas de produção
convencionais e predatórias em curso na região.
A superação deste conjunto de questões relacionado às cadeias produtivas baseadas
em biodiversidade é de fundamental importância para assegurar a viabilidade de geração de
inovações tecnológica e sua competitividade à cadeia, de modo a torná-la sustentável. No
entanto, sua solução passa por um amplo diálogo entre todos os atores das cadeias,
comunidades produtoras, empresários, instituições de apoio e financiamento, e destes com os
representantes governamentais para alinhamento coerente de políticas públicas.
2.3.3 Cadeia produtiva do açaí e o potencial da exploração da biotecnologia
O açaí produzido no Pará é fruto do açaizeiro (Euterpe oleracaea Mart.), uma
palmeira nativa da Amazônia, cujo principal centro de dispersão está no Estado do Pará
(NOGUEIRA, 2002). As qualidades do fruto relacionam-se a um alto valor energético e
nutricional (proteínas e minerais), com elevado teor de compostos fenólicos, principalmente
de antocianinas, que são compostos bioativos antioxidantes (COHEN et al, 2006).
Estas características atraem os interesses de indústrias como de alimentos funcionais e
nutracêuticos, cosméticas e farmacêuticas por inovações tecnológicas que permitam agregar
tais qualidades em produtos de desempenho superior aos existentes no mercado consumidor
atual.
Contudo, conforme Homma et al (2006, p. 13, 20) a qualidade (níveis de
componentes) nos frutos do açaí apresentam grande variação, e alta perecibilidade, de modo
63
que a conservação de polpa do açaí exige cuidados especiais, pois sendo alcalino, facilita a
proliferação de fungos e bactérias.
Além da polpa do açaí, a fibra e o caroço do fruto também podem ser aproveitados e
ressalta que o palmito derivado do açaizeiro, é um produto de destaque em que o Pará
abastece quase 90% da produção do País, bem como atende demanda do exterior (SAGRI,
2014a).
O consumo de açaí no Pará tem raízes culturais profundas, baseadas por estruturas
produtivas com microescalas, predominantemente vinculadas à produção familiar extrativista,
espacialmente difusas, atendiam uma demanda estritamente regional (COSTA, F., 2009, p.
344). A partir da década de 1970 até o final da década de 1990, a extração de palmito
apresentava uma remuneração mais atrativa, o que causou um extensivo corte de palmeiras
em açaizais e considerável redução da oferta de açaí, posteriormente, o aumento de demanda
e, portanto, dos preços do fruto do açaí alcançaram novos níveis atrativos à cultura do açaí, e
impactou positivamente na conservação de açaizais nativos (SILVA; SANTANA; REIS,
2006, p. 31; HOMMA et al, 2006, p. 10).
Até os dias atuais, o Estado do Pará continua sendo o maior produtor e consumidor de
açaí do Brasil, entretanto, a descoberta e divulgação dos benefícios do açaí, fizeram com que
surgisse uma forte demanda nacional e internacional por produtos derivados da sua polpa
(HOMMA et al, 2006, p. 14). Assim, constatou-se um aumento da demanda de polpa para
comercialização em outros estados brasileiros e para o exterior, além da ampliação de
consumo interno municípios tradicionais de consumo, e em outros onde a produção dessa
fruta era pequena ou inexistente (HOMMA et al, 2006, p. 21)
Em 2010, as vendas para o mercado internacional de polpa de açaí alcançaram o valor
total de US$ 18,6 milhões, o que equivaleu naquele ano a 65,5% da pauta de exportação de
sucos do Estado. Em 2012, foram exportados mais de 6 mil toneladas da polpa, no valor
acima de US$ 17 milhões (SAGRI, 2014a). Os EUA lideram as demandas de exportações
com cerca de 79% do total exportado destinados a este país, seguido do Japão (14%); e mais
recentemente, países da América do Sul, como Argentina e Chile, tem aparecido como
potenciais compradores (SAGRI, 2014a).
No mercado nacional, o total comercializado para demais estados é em torno de 40 mil
toneladas/ano, e os principais demandantes são os estados de Rio de Janeiro e São Paulo que
consomem em torno de 650 toneladas/mês de polpa, e mais de 1.000 toneladas/mês no
formato de mix com guaraná e granola (SAGRI, 2014a).
64
A Secretaria Estadual de Agricultura do Pará (SAGRI, 2014a) estima que do total da
quantidade total produzida no Estado, 10% é exportada para outros países, enquanto que 60%
é comercializado para consumo no próprio estado, e 30% destinado a outros estados da
federação. De modo que é possível afirmar que a demanda de açaí apresenta-se crescente com
necessidade de atendimento no mercado local, nacional e internacional.
Este novo cenário econômico de crescente aumento de demanda no mercado de polpa
de açaí pressionou os preços para alto (SILVA; SANTANA; REIS, 2006, p. 27). Em pesquisa
sobre elasticidade-preço da oferta e demanda do açaí no período de 1980 a 2004, Silva,
Santana e Reis (2006, p. 32) concluíram que a oferta tornou mais inelástica frente ao preço, de
modo que uma variação de 1% no preço do açaí, corresponde a um aumento da quantidade
ofertada em somente 0,25%,
Na interpretação de Silva, Santana e Reis (2006, p. 32) a limitação na oferta do açaí
diante da crescente demanda por mercados consumidores em outros estados do Brasil e no
exterior resultou em um aumento de preços do fruto a partir do início da década de 2000, e
tornou a demanda de açaí no mercado local (Belém) mais elástica, alterando-se de um estado
inelástico que a caracterizou anteriormente. Ainda em termos de mercado local, Homma et al
(2006, p. 20) indicam que esta pressão de demanda vinda destes novos mercados provocou
uma exclusão das populações locais de menor poder aquisitivo ao acesso ao produto, o qual
no passado era característico desta categoria.
Em pesquisa posterior, Nogueira e Santana (2009, p. 20) identificaram que entre 2004
e 2007, a demanda pelo açaí mantém-se em crescimento mais rápido em volume que a oferta.
Neste mesmo estudo, os autores também constataram um forte padrão sazonal de preços do
fruto, devido aos períodos de safra e entressafra (como será visto adiante), o qual apresentou
significativa amplitude de variação de preços.
Segundo dados da SAGRI (2014a, 2014b), o Pará é o maior produtor nacional, com
uma produção anual em 2012 de 928.183 toneladas de fruto, tendo apresentado um aumento
de 9% na produção de 2011 para 2012, gerando um valor aproximado de R$677,2 milhões.
Com este movimento de aumento da demanda do produto emergiu na região
metropolitana de Belém e nordeste paraense uma estrutura de processamento industrial de
frutas formada por empresas de maior porte que os pontos antes tradicionais de
comercialização de polpa de açaí para consumo imediato, conhecidos como batedores
(COSTA, F., 2009, p. 344). As principais razões para constituição dessas agroindustriais para
comercialização do açaí, além do aumento da escala de produção, refere-se a necessidade do
65
emprego de processos fitossanitários (pausterização e congelamento) para conservação
adequada do produto, extremamente perecível e sujeito a contaminações.
Apesar de reconhecerem que o surgimento destas plantas industriais focava o
atendimento do mercado nacional e internacional, Homma et al (2006, p. 20) entendem que
este movimento pode trazer como tendência futura desdobramentos como a substituição em
médio e longo prazo dos pequenos empreendimentos batedores de açaí, de modo que
fornecimento do mercado local passa a ser realizado por oferta de produtos beneficiados nos
supermercados.
Para F. Costa (2009, p. 345), no centro deste processo de emergência e consolidação
de dinâmicas associadas à economia do açaí, mediante o crescimento da demanda por esse
produto, está o desenvolvimento da produção rural. Os plantios e o melhoramento do manejo
de áreas nativas tem garantido uma adequação mínima entre oferta de matéria prima e
demanda por polpa, assegurando uma expansão de mercado (COSTA, F., 2009, p. 345).
Contudo, embora esta compatibilidade mínima esteja permitindo uma rentabilidade
suficiente para ampliar a atividade, F. Costa (2009, p. 345), chama a atenção para a existência
de carências tecnológicas elementares tanto na fase rural e logística da cadeia produtiva,
quanto na sua configuração industrial, o que resulta em uma considerável capacidade ociosa
de processamento e uma ínfima capacidade de absorver e produzir inovações (COSTA, F.,
2009, p. 345). F. Costa (2009, p. 346), acrescenta que se estabelece uma situação ímpar em
que ao mesmo tempo há uma subutilização do potencial produtivo na indústria e na
agricultura e extrativismo, de forma que muitos na indústria atribuem o problema ao setor
rural e vice-versa. De modo geral, os principais elos da cadeia produtiva do açaí podem ser
vistos na Figura 1:
66
Figura 1 - Principais elos da cadeia produtiva do açaí.
Fonte: Da autora (2014).
Ao considerar os dois elos críticos indicados acima por F. Costa (2009, p. 346),
examina-se a seguir em maior detalhe a trajetória implementada pela produção rural e
agroindústria na cadeia.
- Produção rural:
Em relação à produção rural, identifica-se como principais dificuldades o
acompanhamento do fornecimento do fruto da crescente demanda do produto, com a
expansão de sua produção e, particularmente, redução de sua forte sazonalidade (COSTA, F.,
2009, p. 346). De acordo com Homma et al (2006, p. 7-9), o crescimento da demanda do açaí
teve como efeito um grande interesse no manejo de açaizeiros em áreas de várzeas e no
plantio em áreas de terra firme.
Conforme levantamento de Silva, Santana e Reis (2006, p. 35), até o ano de 2000, em
torno de 95% da produção de açaí do Pará tinha origem no extrativismo (açaizais nativos em
áreas de várzea), mas, em 2004, 80% da produção já correspondia a áreas manejadas ou de
cultivos racionais. Ainda neste estudo, os autores verificaram que as áreas em que foram
implantadas melhorias tecnológicas de cultivo alcançaram uma produtividade em média
130,02% superior às áreas do sistema extrativo original (SILVA; SANTANA; REIS, 2006, p.
32).
Este movimento pode ser observado conforme conjunto de gráficos de produção
disponibilizados no site da SAGRI, com base em dados do IBGE para a produção total, e de
áreas de cultivadas e de extração vegetal distintamente disposto na Figura 2:
67
Figura 2 - Quantidade da Produção Total, Cultivada e de Extração Vegetal de Açaí no Estado do Pará
no período de 2003 a 2012.
Fonte: SAGRI (2014b).
Nos gráficos da Figura 2 é possível observar que o aumento na produção de açaí anual
de 2003 a 2012 tem sido alcançado por crescentes elevações da produção em áreas cultivadas
(inclusive manejadas), enquanto que a produção extrativista apresentou queda no período e
uma fraca capacidade de expansão. Assim, observamos que tanto em termos da quantidade
absoluta de produção, quanto em termos de produtividade, o cultivo de açaizais é superior ao
sistema extrativo original, predominante anteriormente.
Silva, Santana e Reis (2006, p. 27) entendem que a utilização de novas tecnologias de
manejo e cultivo são fundamentais para uma exploração sustentável da cultura do açaí. Neste
sentido, Homma et al (2006, p. 9) consideram o plantio de açaizeiro em áreas de terra firme
uma alternativa para a recuperação de áreas desmatadas, e uma forma de reduzir a pressão
sobre o ecossistema de várzea, bem mais frágil, evitando sua transformação em bosques
homogêneos dessa palmeira.
68
Como vantagem adicional do plantio em áreas de terra firme está a facilidade de
transporte e um beneficiamento mais rápido, além da possibilidade de adubação que permite
ampliar a produção e a produtividade e também da irrigação como alternativa para se obter o
açaí em maiores quantidades na entressafra (HOMMA et al, 2006, p. 10).
Além disso, Homma et al (2006, p. 10) expressam preocupação com o manejo
extensivo de açaizais nativos nas várzeas, pois isso estaria promovendo a derrubada “verde”
de áreas ribeirinhas sujeitas às inundações. Para esses autores, a forma que tem ocorrido a
expansão da cultura única do açaí e a construção de canais com grande movimentação de
canoas e barcos em larga escala, pode esconder sérias consequências para a flora e a fauna na
foz do rio Amazonas em médio e longo prazo.
Cabe acrescentar que nas áreas de várzea as práticas de adubação não são
recomendadas, em virtude das inundações diárias que sofrem e do risco de contaminação do
ecossistema (HOMMA et al, 2006, p. 9). Esta inundação tem sido considerada uma fonte de
nutrientes para aos açaizais, no entanto, o aumento da carga de produção na várzea traz
incertezas quanto a sua sustentabilidade em longo prazo, pois ainda não se têm informações
consistentes sobre se a reposição de nutrientes pelos sedimentos das inundações periódicas
estão em quantidades adequadas (HOMMA et al, 2006, p. 9).
Diante disso, Homma et al (2006, p. 7) consideram que a tendência futura de expansão
do plantio é ocorrer em áreas de terra firme, inclusive com possível incorporação em sistemas
agroflorestais, não somente no Pará ou na Amazônia, mas também em outros estados
brasileiros, particularmente aqueles situados na Mata Atlântica, e mais próximos dos maiores
centros consumidores. Estes autores também não descartam o risco do cultivo do açaizeiro ser
transferido para outras regiões tropicais do mundo em razão de sua valorização econômica.
Entretanto, a produtividade do cultivo de açaí (e dos demais elos da cadeia) é
criticamente afetada pela sazonalidade de sua produção. Esta sazonalidade se diferencia
conforme a área de produção. No nordeste paraense, a safra concentra-se nos meses de agosto
a dezembro, quando se produzem em média 67% do total anual, e nos meses seguintes há uma
escassez com correspondente elevação de preços (COSTA, F., 2009, p. 346).
Na entressafra, o mercado local paraense é abastecido parcialmente com frutos
produzidos nos estados do Amapá e Maranhão, mas, em geral, devido ao substancial aumento
de preço e baixo volume disponível, as agroindústrias não processam açaí em suas plantas no
Pará neste período, a exceção do processamento de polpa congelada de origem da fase de
safra (HOMMA et al, 2006, p. 20). Tem sido um movimento comum estas indústrias
constituírem filiais ou alugarem plantas industriais no Amapá, e transferirem parte de seus
69
funcionários para este estado na entressafra a fim de garantir o processamento e abastecimento de
seus estoques (HOMMA et al, 2006, p. 20).
No Estado do Amapá, o período de safra ocorre de dezembro a abril, com pico nos
meses de fevereiro e março, contudo cabe esclarecer que quase a totalidade de produção é
oriunda de municípios paraenses no noroeste da Ilha de Marajó (Chaves e Afuá), que por
razões de proximidade tem esta produção direcionada a este Estado (HOMMA et al, 2006, p.
14). Há ainda no Amapá alguns açaizais de várzea localizados em Mazagão e Anauerapucu
que produzem no período de entressafra local (HOMMA et al, 2006, p. 14).
No Estado do Maranhão, a safra é janeiro a maio com parte desta produção é
deslocada para o Estado do Pará, e no Estado do Amazonas, a extração de açaí (variedade
Euterpe precatória) acontece de março a julho, entretanto sem condições de comercialização
para o Estado do Pará em decorrência da distância (HOMMA et al, 2006, p. 14).
Conforme o pesquisador João Tomé Faria da Embrapa Amazônia Oriental durante
entrevista de campo, deve se esclarecer que o açaizeiro é capaz de dar frutos durante a
entressafra, mas em um volume bem menor. Mas, estudos têm sido realizados na implantação
de plantações irrigadas e com sementes geneticamente melhoradas no nordeste paraense que
demonstram que é possível alcançar produtividades equivalentes entre o primeiro e segundo
semestre do ano.
Neste contexto de produção rural, percebe-se o desenvolvimento de melhorias em
processos produtivos com apoio de estudos de universidades e institutos de pesquisa. Um
destaque é o lançamento em 2004 da cultivar de açaí “BRS Pará”, uma inovação tecnológica
desenvolvida pela Embrapa Amazônia Oriental (HOMMA et al, 2006, p. 14). A atividade de
melhoria genética continua e nos próximos anos novas variedades mais produtivas devem ser
disponibilizadas. Além disso, estudos quanto a seleção de características qualitativas
relevantes do fruto, como o teor de antocianina, também devem ser incorporados como
critérios de melhoria genética, segundo João Tomé Faria.
Contudo, o alcance e aplicação dessas melhorias tecnológicas a um conjunto amplo de
produtores, incluindo aqueles produtores familiares, dependem de um direcionamento de
políticas públicas adequadas a um projeto de sustentabilidade e competitividade da cadeia do
açaí no Estado. Segundo estimativas indicadas por João Faria para atender o crescimento da
demanda teriam que ser expandidas as áreas plantadas em torno de 40 mil hectares, e hoje no
Estado do Pará devem existir somente 2 mil hectares plantados.
70
A perspectiva a médio e longo prazo de haver um alto volume de produção do fruto
fora do Estado, poderá ser configurar em uma ameaça à cadeia, e eliminar as vantagens
comparativas em que tem se baseado a agroindústria da região.
- Processamento industrial:
A implantação do processamento em escala industrial tem possibilitado o
aproveitamento da oportunidade da venda do açaí para outras regiões e no mercado
internacional com rentabilidade, tendo como vantagens a melhoria da qualidade do produto e
condições fitossanitárias, como uso de água adequada, pasteurização, e procedimento de
redução de riscos de contaminação microbiológica ao máximo (HOMMA et al, 2006, p. 20).
Contudo, do ponto de vista industrial há muitos desafios ainda a serem superados. Um
dos principais é a necessidade de ampliar a capacidade tecnológica sobre o processamento
industrial do açaí, a implementação desta estrutura inicial pode ser caracterizado conforme o
padrão de mudança setorial proposto por Bell e Pavitt (1993), como dominado pelo
fornecedor. Este padrão indica uma baixa capacidade tecnológica das empresas para a
realização de mudanças técnicas, e dependência de inovações em outros setores.
Neste aspecto, conforme entrevista de campo com funcionário de uma agroindústria,
em virtude da novidade de implantação de processo industrial para o açaí, houve dificuldades
na montagem de plantas pela ausência de conhecimentos específicos da indústria de bens de
produção sobre o processamento de açaí, assim fornecedores tiveram que realizar ajustes em
vários equipamentos. No entanto, até o momento a absorção destes conhecimentos específicos
e adaptações parecem estar sendo realizadas pelos fornecedores de bens de capital e não pelas
agroindústrias locais.
Outro desafio importante é a agregação de valor ao produto por meio de inovações,
seja aumentando sua durabilidade ou diversificando suas aplicações, além da possível
diversificação do próprio portfólio de linhas de produto da empresa. Quanto ao tipo de
produto, em geral, a maior parte dessas agroindustriais produzem exclusivamente polpa de
açaí, algumas diversificaram a produção também para produção de polpas de outros produtos
regionais, e poucas diversificaram em termos de aplicação do açaí em novos produtos, como
sorvetes e sucos (COSTA, F., 2009, p. 344).
Uma das razões da diversificação da base de matérias primas para outras frutas deve-
se a sazonalidade do açaí. Na entressafra, a redução da disponibilidade do açaí e a
concorrência do consumo local tradicional, com a consequente grande elevação de preços,
inviabiliza o abastecimento regular das agroindústrias, as quais buscam no processamento de
71
outras frutas uma alternativa de renda, em virtude disso há níveis elevados de flexibilidade
das plantas industriais (COSTA, F., 2009, p. 346). No entanto, ressalta-se que a rentabilidade
das polpas das demais frutas é bem abaixo do açaí, pois ou não possuem demanda
estabelecida nos mercados, ou enfrentam concorrência de outros Estados (COSTA, F., 2009,
p. 346).
Do lado das relações com os clientes, uma baixa capacidade de armazenagem da
produção da safra, pode fazer com as empresas percam poder de barganha frente aos
compradores, os quais mantém relativo poder de negociação sobre os preços e afetam a
rentabilidade das indústrias (COSTA, F., 2009, p. 346).
Homma et al (2006, p. 20) indicam também a relevância do fortalecimento da
capacidade gerencial de muitas agroindústrias. O salto de complexidade de processos, sejam
relacionados à produção e comercialização industrial, sejam do conjunto de relações
institucionais que precisam ser estabelecidas para superação dos desafios da cadeia produtiva
demandam o desenvolvimento de competências de gestão diferenciadas.
Além disso, há a advertência de F. Costa (2009, p. 345), sobre a insuficiência de
mecanismos de regulação, coordenação e promoção de redes horizontais é uma dificuldade
para o desenvolvimento das agroindústrias na cadeia produtiva. A criação destes mecanismos
poderia amenizar os riscos da concorrência predatória e do comportamento oportunista em
torno das fontes de matérias primas e dos mercados consumidores, ao mesmo tempo em que
cria bases para elevar a conectividade entre as empresas, incentivar capacidades de
investimentos e a interação com fontes de inovação (COSTA, F., 2009, p. 345).
- Atividades de pesquisa e desenvolvimento (P&D):
A importância cultural e econômica do açaí atua em favor de uma grande inserção
deste como tema de pesquisas em universidades e institutos de C&T no Estado. Além da
cultivar de açaí “BRS Pará” citada anteriormente, há uma série de outros progressos
relacionados a melhorias tecnológicas na produção rural no que tange a técnicas de manejo
adaptadas para as áreas de várzea e para a terra firme, à nutrição e adubação de culturas e
processos que aumentem a produtividade da mão de obra na colheita (HOMMA et al, 2006, p.
21).
Outros exemplos de projetos de desenvolvimento tecnológicos no Estado do Pará
sobre o açaí, são mencionados em levantamento de grupos de pesquisas sobre produtos
florestais não madeireiros realizado por W. Costa (2009, p. 173), como:
72
- A continuidade de atividades de pesquisa pela Embrapa Amazônia Oriental para
identificação de genótipos do açaí, em que cerca de 50 genótipos já foram disponibilizados
para programas de melhoramento com foco na produção de frutos, e 29 genótipos com foco
na produção de palmito.
- Desenvolvimento e Patenteamento de “evidenciador” de placa bacteriana a base
de açaí (2007) pela Universidade Federal do Pará em parceria com a Embrapa Amazônia
Oriental, com estudos sobre o processamento do açaí para a produção de corante.
- Pesquisa para otimização dos parâmetros tecnológicos para produção de estruturados
funcionais a partir de polpa de açaí e mix de frutas pela Embrapa Amazônia Oriental.
Podemos identificar uma multiplicidade de direções das pesquisas em curso nas
atividades das instituições C&T sobre o açaí, e os exemplos demonstram certo estágio de
amadurecimento tecnológico. Isso corrobora indicações em relatórios do CGEE (2006a; 2008)
de que há disponibilidade de competências tecnológicas no âmbito das instituições de C&T
no Pará, que podem auxiliar na melhoria dos produtos e processos tecnológicos.
As informações empíricas reunidas sobre oportunidades tecnológicas no contexto
deste estudo nos conduzem a confirmar que as trajetórias biotecnológicas em curso em
diversos setores industriais são relevantes, inclusive com substancial escopo de uso potencial.
Reconhecemos a presença de incentivos de mercado do lado da demanda (market pull) pela
atratividade por produtos de base naturais com desempenho relacionado a saúde e bem estar.
Desta descrição de atratividade a produtos naturais, distingue-se o potencial anunciado de
ativos existentes na biodiversidade amazônica, especificamente referindo-se ao ativo objeto
da pesquisa (açaí), posto os dados sobre sua qualidade energética, nutricional e antioxidante.
Do ponto de vista da “oferta” tecnológica (technology push), as instituições de C&T
no Estado possuem competências tecnológicas na área, contudo há baixo nível de interação
com a indústria. A agroindústria processadora de frutas no Estado, particularmente do açaí,
apresenta-se como uma indústria nascente, com forte incentivo de demanda de mercado,
porém pequena ou nenhuma capacidade tecnológica.
As relações institucionais na cadeia produtiva, de forma geral, possuem pouca
intensidade de interação entre os atores (governo, indústria, produtores rurais, instituições de
C&T). Esta falta de diálogo e coordenação institucional mantém grandes assimetrias seja no
sentido vertical (entre os elos da cadeia), seja no nível horizontal (entre diferentes atores no
mesmo elo da cadeia). Tais circunstâncias dificultam a articulação de soluções
interdependentes, como o desenvolvimento de capacidades de investimentos conjuntos no
73
arranjo local, esforços para aprendizado e inovação e a criação de eficiências coletivas, que se
tornam obstáculos para a efetiva exploração de oportunidades biotecnológicas.
2.4 REGIME DE APROPRIABILIDADE
O desenvolvimento de inovações tecnológicas é resultado da interação de
oportunidades tecnológicas com a cumulatividade e capacidade tecnológica das empresas por
um lado, e os vários tipos de incentivos de mercado e condições de apropriabilidade de outro
lado. O conceito de apropriabilidade apresenta vínculos diretos com o processo de criação de
valor por meio de inovações, e sua proteção frente a outros atores do mercado.
Ceccagnoli e Rothaermel (2008, p. 14) informam que o regime de apropriabilidade
baseia-se em fatores tecnológicos e legais que influenciam o custo e tempo requerido para
imitação de inovações. Os aspectos legais referem-se ao grau de efetividade de proteção aos
direitos de propriedade intelectual e industrial; enquanto as características tecnológicas
correspondem a dificuldade de imitação tecnológica por outros atores, como o nível de
codificação, de complexidade, e a possibilidade de uso de mecanismos de aprendizado, como
a engenharia reversa (CECCAGNOLI; ROTHAERMEL, 2008, p. 14).
Aspectos institucionais, como políticas e funções relacionadas a agências públicas,
também são uma parte importante do ambiente que molda condições de apropriação no
mercado, uma vez que os regimes de regulação restringem e ordenam certas ações privadas
(NELSON; WINTER, 2005, p. 525).
Para Nelson e Winter (2005, p. 515), a teoria econômica ortodoxa entende que os
direitos de propriedade e as obrigações contratuais são elaborados sem custo para os agentes,
e uma vez que são claros, a sua imposição seria perfeita. Contudo, as externalidades e o
caráter público parcial das inovações impõem a necessidade de regulamentações institucionais
e instrumentação de escolha coletiva, em uma tensão entre equidade distributiva e eficiência
na alocação de recursos (NELSON; WINTER, 2005, p. 519).
Cabe esclarecer que externalidades refere-se a custos ou benefícios correspondentes a
efeitos secundários da ação produtiva econômica (NELSON; WINTER, 2005, p. 521). Um
tipo de externalidade comum na inovação é a geração de novas aplicações tecnológicas, as
quais podem ser imitadas por outros agentes econômicos. Já o caráter público vincula-se a
indivisibilidade do produto principal pretendido, que atinge uma determinada população, em
vez de somente alguns indivíduos com os quais mantém contratos, neste sentido pode ser
74
considerado um bem público. O conhecimento e a pesquisa básica são exemplos de bens
públicos. (NELSON; WINTER, 2005, p. 521).
Neste sentido, Dosi (1988, p. 1123) explica que atividades de ciência básica
caracterizadas como de caráter de publicidade relativa, são financiadas principalmente pelo
estado ou por instituições não lucrativas, devido a sua baixa apropriabilidade. E que empresas
investem preponderantemente em pesquisa aplicada e desenvolvimento tecnológico,
guardadas diferenças setoriais entre indústrias e entre países (DOSI, 1988, p. 1123).
A preocupação em termos de política pública é que condições de apropriação guiam a
alocação de recursos no mercado em termos de direção e taxa de esforço, e que uma
apropriabilidade frágil poderia levar a um subinvestimento em processos de acumulação
tecnológica. Ceccagnoli e Rothaermel (2008, p. 26; 30) indicam que a crença na importância
de instrumentos de apropriabilidade como a proteção de patentes e propriedade intelectual,
relaciona-se a função de estimular à inovação, e ao mesmo tempo promover a difusão do
conhecimento tecnológico, crescentemente vistos como fontes de competitividade e
crescimento econômico.
Este argumento é apontado por Ceccagnoli e Rothaermel (2008, p. 30) como a base
principal para a tendência nas duas últimas décadas de fortalecer a proteção de patentes,
citando como exemplo as decisões da corte americana de tornar patenteável softwares e novas
formas de vida. Para estes autores, esse fortalecimento, particularmente na década de 1980,
tornou as patentes mecanismos de apropriação mais efetivos.
Levin et al (1987, p. 784) também reconhecem um fortalecimento do sistema de
propriedade industrial em vários países e ampliar o escopo de proteção para softwares,
designs e cultivares, por exemplo. Para estes autores, a legislação de propriedade industrial,
como leis de patente, buscam resolver a tensão entre fornecer incentivos para inovação e
assegurar o transbordamento de benefícios da difusão (LEVIN et al, 1987, p. 783).
Assim, uma patente, em termos normativos, conferiria uma perfeita apropriabilidade
ao inovador, que exerceria um monopólio sobre a invenção por um período de tempo
determinado, em troca de conhecimento público sobre esta invenção que posteriormente
(quando da expiração da patente) permitiria um amplo processo de difusão dos benefícios
(LEVIN et al, 1987, p. 783).
Porém, Levin et al (1987, p. 784) ressaltam que por um lado a garantia de
apropriabilidade estabelecida no sistema institucional não é perfeita, seja pela possibilidade de
ser burlada (desrespeitada) por outros agentes de mercado, seja por dificuldade do regime
legal quanto a questões como exigências de comprovação de propriedade e para prova de
75
fraude. Por outro lado, nem sempre é possível assegurar a também a ampla difusão em termos
competitivos dos benefícios da invenção, uma vez que o conhecimento público por si só pode
não prover o adotante das capacidades necessárias tanto pela carga de conhecimento tácito
envolvido, como por características de mercado e contínuos avanços de aprendizado já
conquistados pelo inovador (LEVIN et al, 1987, p. 784).
Neste cenário, as patentes podem não ser mecanismos adequados, ou pelo menos
exclusivos, para a apropriação de determinados tipos de inovação, dependendo da trajetória
tecnológica e das condições de mercado e institucionais do contexto no qual o inovador atua
(LEVIN et al, 1987, p. 784).
Levin et al (1987, p. 787) também destacam que não deve-se tomar a premissa que
uma maior apropriabilidade é sempre melhor, ou seja, que uma proteção mais forte
necessariamente conduz a um maior nível de inovação e competitividade. Isso em função de
que uma proteção mais forte pode produzir maior comprometimento de recursos da sociedade
em esforços duplicados de inovação, ou atrasar o acesso amplo de benefícios em termos
competitivos (LEVIN et al, 1987, p. 788). Para esses autores, por vezes, permitir a difusão de
inovações tecnológicas existentes é benéfico não somente aos consumidores e usuários, mas
também para promoção de melhorias tecnológicas pela interatividade e processo de
cumulatividade de conhecimento.
2.4.1 Mecanismos de apropriação de inovações
O sistema legal de propriedade intelectual e suas instituições relacionadas devem ser
entendidos como estruturas sociais que visam melhorar a apropriabilidade de retornos de
inovações (LEVIN et al, 1987, p. 815). Mas estas estruturas não são as únicas nem
necessariamente a barreira primária que evita o acesso ao conhecimento e informações
gerados, que de outra forma seria bens públicos puros.
Outros meios pelos quais os inovadores buscam assegurar seus ganhos são o
pioneirismo (que gera vantagens para o inovador), o sigilo, a vinculação de marca, e esforços
de vendas e serviços diferenciados que podem prover proteção adicional (LEVIN et al, 1987,
p. 816). Os mecanismos utilizados para apropriação de inovações se diferenciam em virtude
de variados fatores, como o tipo de inovação (processos ou produtos), o tamanho e
comportamentos estratégicos adotados pelas empresas inovadoras, e a natureza do paradigma
tecnológico (LEVIN et al, 1987, p. 803, 831).
76
Levin et al (1987, p. 803), com base em pesquisa empírica sobre o uso de mecanismos
de apropriação por empresas, destacam como principais limitações percebidas na efetividade
de patentes: limitação na amplitude de patenteabilidade de novos processos ou produtos (1);
patente improvável de ser validada se questionada (2); falta de meios na empresas de fazer
cumprir as patentes (3); concorrentes podem inventar legalmente baseadas nas patentes (4); e
documentos de patentes expõe muita informação (5).
Ceccagnoli e Rothaermel (2008, p. 29) defendem que as empresas que adotam
patentes como mecanismo de apropriação, o fazem quando os benefícios líquidos são
positivos, o que eles chamam de patente Premium (incremento proporcional ao valor de uma
inovação quando patenteada).
Assim, ao avaliar o patenteamento de uma invenção, a empresa pode avaliar se seu
valor aumenta (compensa patentear) ou reduz, devido a custos de oportunidade, como custos
de descoberta da informação por concorrentes, probabilidade de invenção sobre a patente,
custos com vigilância para garantir o cumprimento da patente (CECCAGNOLI;
ROTHAERMEL, 2008, p. 29). No entanto, os autores ressalvam que mesmo uma patente
Premium, não é condição suficiente para garantir lucratividade sobre a inovação, sendo que as
estratégias de patentes devem ser integradas com outros mecanismos de apropriação.
Cabe destacar que a proteção da patente em relação a oportunidades de ganhos da
empresa inovadora não reside somente em exercer a exclusividade de produção e/ou
comercialização de produtos, mas também cria um mercado de direitos a informação e
propriedade intelectual (LEVIN et al, 1987, p. 788), no qual o licenciamento e outras formas
de transferência de conhecimento tecnológico podem ser comercializados.
Para Levin et al (1987, p. 797) o licenciamento de tecnologia protegidas por patentes
pode ser uma forma relativamente efetiva para apropriação de investimento em P&D por
pequenas empresas start up, com base de competências tecnológicas, em função destas
poderem ter outros meios de apropriação (marca, esforços de vendas e serviços) mais frágeis.
Neste sentido, os autores afirmam que a empresa orientada tecnologicamente pode
considerar a patente como ativos de mercado, apesar de atentarem para a questão de difusão
tecnológica por meio de contratos de transferência tecnológica ainda possuírem consideráveis
custos de transação sobre o compartilhamento de informação e conhecimento, recursos como
vimos intangíveis e com o alto teor tácito.
Teece (2006, p. 1145) acrescenta que um regime de propriedade intelectual
fortalecido, que promova relativa eficiência ao mercado de direitos a informação e
propriedade intelectual, contribuiu para um conjunto mais diverso de formas organizacionais,
77
como joint ventures e empresas desenvolvedoras de tecnologia sem fábricas. Este cenário
coaduna com a perspectiva de Bell e Pavitt (1993, p. 202) quanto ao desatrelamento entre o
desenvolvimento de capacidades produtivas e tecnológicas.
2.4.2 Convergência com o desenvolvimento sustentável
Estudo do CGEE (2006b) aponta que alguns países, particularmente em fase de
desenvolvimento, passaram a partir do início da década de 2000 a buscar influenciar de forma
mais enfática a agenda internacional da propriedade intelectual para a reflexão sobre o
desenvolvimento e os possíveis efeitos deletérios da propriedade intelectual, se não forem
preservados o equilíbrio de interesses entre as nações, e certas flexibilidades mínimas no
sistema mundial atual.
Esta perspectiva visa incorporar nos debates internacionais relativos à propriedade
intelectual a dimensão do desenvolvimento, de forma a estabelecer um espaço político em que
os países em desenvolvimento possam tentar assegurar o acesso ao conhecimento (CGEE,
2006b). Neste sentido, o Brasil e outros 14 países procuram patrocinar uma iniciativa
denominada de “agenda para o desenvolvimento” na Organização Mundial de Propriedade
Intelectual (OMPI), vinculada à ONU, quanto à necessidade de garantir que a propriedade
intelectual não seja uma finalidade em si mesma, que poderia comprometer as alternativas de
desenvolvimento de países em situação menos favorecida (CGEE, 2006b).
Seu embasamento está no mandato conferido pela ONU à OMPI no que tange a
promover a atividade intelectual e facilitar a transferência de tecnologia para países em
desenvolvimento, que lhes sejam úteis para acelerar seu desenvolvimento econômico, social e
cultural (CGEE, 2006b). A conclusão geral é que os países em diferentes estágios de
desenvolvimento, particularmente aqueles em desenvolvimento, devem desenvolver
estratégias diferenciadas em propriedade intelectual que sejam adequadas ao seu catching up
tecnológico (BRANDELI, 2006).
Contudo, esta recomendação envolve um grau de flexibilidade na regulamentação de
propriedade intelectual que vai de encontro com a agenda de implementação do Acordo
TRIPS (Acordo sobre os direitos de propriedade intelectual relacionados ao comércio)
administrado no âmbito da Organização Mundial do Comércio (OMC) (CGEE, 2006b). Este
acordo foi estabelecido em 1994 durante a chamada rodada Uruguai, em que se criou a OMC,
e todos os seus membros passaram a obrigatoriamente integrar o acordo TRIPS (FARIA,
2003, p. 51). Deste modo, os países em desenvolvimento para serem membros da OMC foram
78
obrigados a ajustar sua legislação de propriedade intelectual ao padrão estabelecido no acordo
internacional, ampliando direitos e abrangência da propriedade intelectual, em muitos
aspectos desfavorecendo sua economia interna (CGEE, 2006b).
Um dos pontos de conflito, que é particularmente relevante à discussão em torno da
ascensão da biotecnologia, refere-se ao contexto de proteção dos recursos genéticos de países
e os conhecimentos tradicionais no âmbito da Convenção da Diversidade Biológica (CDB). A
CDB foi criada em 1992 no âmbito de uma série de diretrizes internacionais para o
desenvolvimento sustentável. Faria (2003 p. 50) informa que até então os recursos biológicos
eram considerados patrimônio da humanidade, e a partir da CDB passa a ser reconhecida a
soberania dos Estados nacionais sobre estes recursos com duas premissas importantes ao
debate: O princípio do acesso aos recursos genéticos ser sujeito a prévio consentimento, e o
princípio da repartição equitativa de benefícios oriundos de sua utilização e de conhecimento
tradicional associado. A desobediência destes princípios configura a chamada biopirataria.
Conforme E. Moreira (2003, p. 38), a consolidação da biotecnologia em diversos
setores econômicos, como farmacêutico, criou várias interseções entre o tema de proteção da
biodiversidade e da propriedade intelectual, seja em seus regimes nacionais e internacionais.
E nesta conjuntura, um debate sobre conflitos entre TRIPS e CDB é provocado pela
relevância dos resultados do desenvolvimento científico e tecnológico baseados na
biodiversidade para o mercado e para sociedade (MOREIRA, E., 2003, p. 41).
Faria (2003, p. 51) entende que o TRIPS não impede a biopirataria, em virtude deste
estabelecer como requisitos para o patenteamento somente três condições (atividade
inventiva, aplicação industrial e novidade), e permitir exceção a plantas e animais, cuja
possibilidade de patente é deixada à discricionariedade de cada país membro. Ainda segundo
a autora (2003, p. 52), o Brasil havia proposto (em 2002 e 2003) o acréscimo de mais três
requisitos no TRIPS, quando a patente for referente a materiais biológicos ou conhecimentos
tradicionais, que seriam: a identificação da origem do recurso biológico (1), a explicitação do
consentimento prévio (2), e a definição da repartição de benefícios (3).
E. Moreira (2003, p. 41), considera que a efetividade da CDB somente ocorrerá por
meio da construção de instrumentos de diálogo entre o TRIPS e o regime de acesso especial à
biodiversidade previsto na CDB. As premissas como as de respeito ao direito a Soberania, ao
uso sustentável da biodiversidade, valorização dos conhecimentos tradicionais associados, e
do desenvolvimento distributivo, além da estrita observância da atividade inventiva para a
concessão de patentes biotecnológicas devem se constituir em critérios da função
79
socioambiental de um sistema de propriedade intelectual, que se alia a princípios éticos do
desenvolvimento científico e tecnológico (MOREIRA, E., 2003, p. 46).
2.4.3 Apropriação sobre inovações baseadas na biodiversidade: regulamentação de
acesso ao patrimônio genético e regime de apropriabilidade
De acordo com o CGEE (2008, p. 16), o Brasil alcança destaque como um país
produtor de conhecimentos científicos sobre biotecnologia, incluindo sobre ativos da
biodiversidade de algumas cadeias produtivas amazônicas. Porém quando se trata de verificar
o uso e proteção deste conhecimento em termos de patentes, especialmente aquelas voltadas
para aplicação em produtos ou processos, o país possui apresenta sérias dificuldades .
Um retrato desta situação é exemplificado em relatório do CGEE (2008, p. 16) no que
tange a estudos sobre a copaíba, em que o Brasil aparece como o principal gerador de
publicações científicas, sendo mais de 50 no período de 1999 a 2008. No entanto, a
quantidade de patentes baseadas na Copaíba requeridas pelo país é mínima, sendo somente
uma (1) no escritório de patentes Europeu, e nenhuma no escritório americano (referência
mundial) enquanto outros países que apresentam números expressivos de patentes
depositadas, como os Estados Unidos com mais de 30 patentes depositadas de produtos ou
processos relacionados à copaíba (CGEE, 2008, p. 16). Este caso levanta um questionamento
sobre a eficácia do Brasil em estabelecer estratégias que gerem (e protejam) benefícios a sua
sociedade por meio do desenvolvimento de produtos e serviços biotecnológicos baseados em
ativos da sua biodiversidade.
Segundo Enríquez (2003, p. 186), até 2003, cerca de 95% das patentes biotecnológicas
no mundo correspondiam às empresas multinacionais e instituições governamentais de países
desenvolvidos. O valor estratégico deste conhecimento pode ser simbolizado pela ação da
chamada Cooperação Trilateral, entre os três principais escritórios de patentes do mundo,
Japão (JPO), EUA (USPTO) e a maior parte dos Estados Europeus (EPO), no sentido de
criarem uma base de dados de patentes não supérfluas na área da biotecnologia (CGEE,
2006b, p. 24).
Como visto no tópico anterior, a CDB procurou estabelecer marcos para um regime
especial de acesso e uso da biodiversidade e conhecimento tradicionais associados
fundamentados na conservação e uso sustentável da biodiversidade, soberania de Estados
nacionais sobre recursos naturais e distribuição equitativa de benefícios (MOREIRA, E.,
2003, p. 39).
80
O Brasil atualmente possui uma regulamentação extensa, porém de eficácia limitada
sobre o acesso ao patrimônio genético e conhecimentos tradicionais associados, e uma série
dificuldades institucionais estão postas sobre esta. As bases legais do acesso ao patrimônio
genético, em conformidade com a CDB, foram estabelecidas pela Medida Provisória
2.052/2000 que instituiu que as autorizações de acesso para fins de pesquisa científica,
bioprospecção e desenvolvimento tecnológico são de competência da União (MOREIRA, T.,
2003, p. 99). A MP 2.052/2000 foi reeditada várias vezes até a MP 2.186/2001, ainda em
vigor. O projeto de lei para implantação de uma legislação definitiva ainda está em
discussões.
Para T. Moreira (2003, p. 100), do Conselho de Gestão do Patrimônio Genético
(CGEN) do MMA, a Medida Provisória estabeleceu regras para as atividades relacionadas ao
patrimônio genético, em virtude do reconhecimento de interesses globais sobre tais recursos, e
mesclam questões éticas, sociais, políticas, ambientais, econômicas e tecnológicas. Ainda de
acordo com T. Moreira (2003, p. 101), devido a novidade de abrangência envolvida na
regulamentação, verificou-se dificuldades e forte resistência da sociedade, especificamente
das instituições de pesquisa científica e acadêmica pelo processo constituído de solicitações
de autorizações para as atividades de pesquisa realizadas.
Entre as dificuldades admitidas estão questões de deficiências quanto a clareza de
conceitos e aplicações, lacunas na composição e representatividade do CGEN, falta de ações
educativas e de divulgação, e excessos em procedimentos administrativos exigidos. Quanto a
problemas conceituais estão a própria caracterização perante a lei de “patrimônio genético” e
“conhecimento tradicional associado” (MOREIRA, T., 2003, p. 100). Como exemplo, T.
Moreira (2003, p. 100-101), indica que é importante compreender a diferença entre o que
representa uma simples coleta de material biológico (isento de atendimento das
regulamentações em discussão) e o que configura acesso ao patrimônio genético quanto a
amostras de componentes na forma de moléculas e substâncias. Há a necessidade de
tratamento desta diferenciação diante das possibilidades tecnológicas de acesso em distintos
níveis de informação (MOREIRA, T., 2003, p. 100).
Outra dificuldade mencionada foi a própria composição estabelecida para o conselho,
que somente envolvia instituições públicas, excluindo assim representantes da sociedade civil
organizada e empresas privadas, posteriormente em 2003 houve um movimento no sentido de
permitir a participação de “convidados permanentes”, mas estes somente tem direito a “voz”,
e não a voto, e regulamentações ainda são necessárias. Além disso, considera-se que há um
81
pequeno número de reuniões por mês (12) frente a grande demanda de solicitações
(MOREIRA, T., 2003, p. 101).
Reconhece-se ainda certa falta de informação tanto no setor privado e acadêmico,
quanto nas próprias comunidades, e em outros órgãos do governo para que seja possível a
implementação adequada da regulamentação (MOREIRA, T., 2003, p. 102). Também é
indicada a necessidade de alinhamento do fluxo de atividades entre os diversos órgãos
estatais, em função de uma “evidente duplicação” de ações entre CNPq, IBAMA, FUNAI e
CGEN (MOREIRA, T., 2003, p. 102).
A fim de superar essas questões, no âmbito do Ministério do Meio Ambiente algumas
as propostas elaboradas para discussão no projeto de lei, que substitua a MP 2.186/2001,
incluem a consolidação do consentimento prévio pelos provedores locais de patrimônio
genético e conhecimentos tradicionais; a implantação de um sistema simplificado para
instituições de pesquisa na etapa de pesquisa científica; definição de regras mais claras para
repartição de benefícios, e a modificação da composição do conselho, incluindo
representantes da sociedade civil organizada (MOREIRA, T., 2003, p. 103).
A regulamentação sobre o acesso ao patrimônio genético e conhecimentos tradicionais
associados é considerada uma temática institucional crítica para o desenvolvimento de
processos de biotecnologia no país, e a construção de um consenso tanto na esfera
governamental, como em termos sociais mais amplos ainda está a ser superada. Para Assad
(2003, p. 36) do MCTI:
Não adianta colocarmos porteiras e impedimentos, pois somente vamos expandir a
biopirataria. Então, cabe construirmos leis transparentes e factíveis de
implementação e que o retorno, realmente, ocorra por meio de contratos eficientes,
claros, objetivos, que contenham detalhamento a repartição de benefícios, caso a
caso... sabemos que temos que incentivar a parceria público-privada, envolvendo
empresas e academia e organizações não governamentais voltadas ao uso econômico
da biodiversidade.
Contudo, como destaca o CGEE (2007, p. 20) o não desenvolvimento de aplicações
economicamente dinâmicas com base em produtos da biodiversidade, representa um elevado
custo de oportunidade à sociedade, seja pela não geração de renda e trabalho a população
local, seja pelo não desenvolvimento tecnológico industrial em diversos setores, ou pelo não
acesso de consumidores a potenciais produtos de qualidade ou eficácia superior (por exemplo,
pela possibilidade de descobertas de novas drogas ou tratamentos a doenças). De forma que,
para o CGEE (2008, p. 14) a redução de biopirataria e conservação da biodiversidade na
Amazônia exige o desenvolvimento de soluções para transformação dos recursos da
82
biodiversidade em atividades econômicas que possam gerar emprego e renda adequados para
a melhoria da qualidade de vida da população regional.
No entanto, em termos da cadeia produtiva do açaí no Pará, devemos atentar para duas
características que particularmente acrescentam desafios à aplicação da regulamentação atual
sobre ativos da biodiversidade: alto volume de produção do fruto, e comercialização da polpa
como principal produto da agroindústria.
O grande volume de produção na cadeia do açaí é um atributo atípico em relação a
cadeias da biodiversidade, bem como é um produto com preços já regulados por parâmetros
típicos de mercado (oferta e demanda). Este cenário configura um ambiente de
comercialização que torna difícil controle por parte do produtor de açaí (extrativista ou
agricultor) em relação a se o fruto por ele produzido será objeto de processamento industrial
que se qualifique como acesso a patrimônio genético, que poderia ser foco de negociação
quanto à forma a equitativa de repartição dos benefícios entre os elos da cadeia.
Além disso, o principal produto das agroindústrias locais é a polpa do fruto para vendo
no mercado nacional ou internacional. A fabricação da polpa não é classificada como acesso a
patrimônio genético, o que não vincula em termos de regulamentação nacional à produção de
polpas dessas agroindústrias às diretrizes da CDB. Cabe ainda levantar a possibilidade de que,
ao se destinar parte dessa produção à exportação, estas polpas sejam no exterior objeto de
processamento industrial que se caracterizariam como acesso ao patrimônio genético,
conforme regulamentação do GCEN, mas neste caso já estariam fora do alcance regulatório
nacional.
Assim, na configuração atual da cadeia produtiva local, compreendemos que a
regulamentação institucional em vigor quanto à gestão do patrimônio genético não alcança
eficácia na proteção do açaí como bioativo, e no estabelecimento de condições mais
equitativas na repartição dos benefícios entre os elos desta cadeia. Isso suscita a necessidade
de criação de instrumentos de regulamentação que atendam com eficácia a proteção da
biodiversidade em um contexto de maior multiplicidade de condições de produção e
comercialização deste tipo de recursos.
Por fim, cabe destacamos que conforme F. Costa (2009, p. 345), a cadeia produtiva do
açaí no Pará caracteriza-se uma apresentar uma baixa capacidade tanto de inovar como de
absorver inovações por processos de disseminação. Mesmo a mudança técnica ocorrida em
agroindústrias locais que visou a modernização de plantas industriais para o aumento da
escala de produção e o emprego de processos fitossanitários seguiu um padrão cujo
conhecimento técnico era dominado por fornecedores de bens de capitais e consultorias.
83
Neste contexto com carência tecnológica e baixa incidência de inovação não
encontramos dados de levantamentos secundários sobre a utilização ou eficácia de
mecanismos de apropriação de inovações na cadeia produtiva do açaí local, cujo principal
produto comercializado é a polpa do fruto.
Entendemos que as principais inovações biotecnológicas que tenham o açaí como base
têm ocorrido fora do estado do Pará, realizadas ou exploradas por grandes indústrias no ramo
de cosméticos e alimentos funcionais. Estas grandes indústrias em geral exercem vantagem na
apropriação dos lucros destas inovações frente aos elos a montante da cadeia produtiva, dadas
as dificuldades do quadro institucional na cadeia produtiva local tanto em proporcionar uma
distribuição mais equitativa de benefícios, quanto em gerar incentivos ao esforço inovativo
local.
2.5 CONSIDERAÇÕES CONCLUSIVAS
Este capítulo visou analisar as dimensões contextuais em que a rede de inovação
interorganizacional formada pela UFPA, Amazon Dreams e Belaiaçá, desenvolveu o processo
de inovação de uma linha de produtos baseada em compostos antioxidantes de açaí. Deste
modo, representa a primeira aproximação do nosso objeto de estudo, quanto a recorte teórico
e a investigação empírica.
Em relação à análise da biotecnologia enquanto paradigma tecnológico, entendemos
que este contempla oportunidades tecnológicas com aplicação potencial aos ativos da
biodiversidade da Amazônia. Compreendemos que a cadeia produtiva de açaí no estado do
Pará apresenta condições positivas necessárias para exploração desta oportunidade
biotecnológica em termos de oferta tecnológica (instituições de CT&I locais) e de incentivos
de mercado (demanda crescente de produtos com qualidades antioxidantes). Porém, também
constatamos falhas no quadro institucional e de políticas públicas, particularmente
relacionadas a fraca intensidade de interação entre atores (governo, indústria, produtores
rurais, instituições de C&T), além de dificuldades no estímulo do desenvolvimento de
capacidades tecnológicas e esforços inovativos nas empresas.
Inferimos que estas falhas são reflexos da conformação histórica da região Amazônica,
e do Pará, enquanto região periférica, fundamentada em um modelo econômico primário
exportador com forte presença de commodities relacionadas ao extrativismo de recursos
naturais e minerais, cujas trajetórias tecnoeconômicas não requereram o desenvolvimento de
capacidades de inovação e a concatenação de quadros políticos e institucionais que
84
influenciassem positivamente a formação de arranjos locais para investimentos conjuntos e a
criação de eficiências coletivas. Deste modo, uma inflexão na trajetória tecnoeconômica atual
em direção a um desenvolvimento regional baseado em inovações tecnológicas a partir de
ativos da biodiversidade e serviços ambientais exige a emergência de um conjunto de
processos de mudanças sociais, políticas e institucionais em coevolução ao avanço
tecnológico.
Portanto, a geração de processos de desenvolvimento regional na Amazônia baseados
na oportunidade de inovações biotecnológicas não depende exclusivamente de questões
relacionadas a esforços de desenvolvimento de competências tecnológicas ou da
disponibilidade de ativos da biodiversidade, mas abrange a construção de convergências
econômicas, sociais, políticas e institucionais que permitam superar a trajetória até então
percorrida.
Diante desta conjuntura, a responsabilidade do papel do envolvimento governamental
deve ser realçada, é necessário estabelecer políticas públicas convergentes com o valor
estratégico da cadeia produtiva. É necessária a promoção de instrumentos e vínculos
institucionais que assegurem condições de geração de renda adequadas a todos os elos da
cadeia, ao mesmo tempo em que garanta o uso sustentável da biodiversidade, auxiliando na
transição tecnológica de atores. Chamamos atenção que o não aproveitamento das
oportunidades biotecnológicas de uso da biodiversidade por meio de inovações que gerem
emprego e renda, em alinhamento à conservação ambiental, constitui um custo de
oportunidade elevado.
Ao termos uma visão geral deste contexto, e sua mescla de pontos fortes e fracos, tem-
se o pano de fundo para atuação dos atores organizacionais no desenvolvimento do processo
de inovação, por meio da formação de redes de parcerias interorganizacional. No próximo
capítulo, pretendemos compreender cada organização que fez parte desta rede de relações
através da lente teórica do constructo de capacidades de inovação a fim de entender suas
contribuições e limitações durante o processo de inovação tecnológica.
85
3 ATORES ORGANIZACIONAIS E SUAS CAPACIDADES
3.1 INTRODUÇÃO
No presente capítulo temos como foco a análise de organizações que foram
protagonistas na composição de capacidades tecnológicas e de produção necessárias para o
desenvolvimento e comercialização da inovação de linha de produtos baseados em compostos
antioxidantes de açaí. Como no capítulo anterior, discutiremos por um lado os aspectos
teóricos do constructo de capacidades organizacionais e, por outro lado, faremos a análise
empírica no âmbito das organizações da rede.
Em termos teóricos, pretendemos compreender como a dinâmica de construção de
portfólio de capacidades de uma organização influencia no processo de desenvolvimento de
uma inovação tecnológica tanto em relação a sua propensão a inovar, quanto a sua efetividade
em gerar resultados positivos e se apropriar de benefícios.
Em termos empíricos, o objetivo é delinear as principais características de cada ator
organizacional proeminente na rede de inovação foco do estudo, neste caso Amazon Dreams,
Belaiaçá e Universidade Federal do Pará (UFPA). Para isso, apresentamos o levantamento de
dados que consistiu em inicialmente estabelecer um breve histórico de cada organização,
incluindo um panorama de processos inovativos realizados e do padrão de inovação
desenvolvido, e posteriormente enfatizamos no conjunto de suas capacidades a análise dos
atributos que favorecem ou limitam o desenvolvimento de inovações.
Cabe indicar que, a análise das relações de interação interorganizacional, envolvendo
as organizações foco deste capítulo, e o desenvolvimento do processo de inovação em si, e
seus respectivos resultados alcançados, é realizada no capítulo seguinte (4).
3.2 RECURSOS E CAPACIDADES DAS ORGANIZAÇÕES
A visão da empresa como um amplo conjunto de recursos e capacidades, os quais
constituem ativos que podem ser fontes de vantagens em termos de eficiência e efetividade
tem origem em trabalhos como de Edith Penrose em 1959 (A teoria do Crescimento da
Firma), e posteriormente continuados por acadêmicos como Wernerfelt (1984) e Barney
(1991) desenvolvendo a perspectiva teórica da visão baseada em recursos (VBR). Esta
perspectiva foca nos recursos e capacidades da empresa como fontes para a geração de renda
86
e lucratividade (WERNERFELT, 1984) e a conquista de vantagens competitivas, sob
pressupostos da heterogeneidade e mobilidade imperfeita de recursos (BARNEY, 1991).
Para Barney (1991, p. 105-106) um recurso da empresa para ser considerado gerador
de vantagens competitivas sustentáveis, no sentido de duráveis ao longo prazo, devem ter
quatro características: ser valioso para a exploração de oportunidades ou para neutralizar
ameaças; ser raro entre as empresas concorrentes atuais e potenciais; ter imitabilidade
imperfeita; e não haver outros recursos equivalentes no mercado que possam o substituir.
Ao basear-se em uma perspectiva baseada em recursos, Teece (1986, 2006) propõe um
referencial teórico sobre a análise de apropriabilidade e distribuição dos resultados de
inovação, que contempla três blocos de constructos: O regime de apropriação e padrão
tecnológico industrial, que foram discutidos no capítulo anterior, e a posse de ativos
essenciais (tecnológicos) e complementares à atividade inovadora, com ênfase a estes últimos
no contexto de sua cadeia de valor.
Neste sentido, Teece (1986) defende que uma empresa para obter lucratividade sobre
uma inovação deve possuir não somente as competências e ativos necessários para o
desenvolvimento tecnológico do produto ou processo, mas também assegurar competências e
ativos complementares para sua produção (escala, eficiência, etc) e comercialização (canais
de vendas, marketing, etc) bem sucedida em termos competitivos no mercado, de forma a
garantir um retorno econômico adequado sobre esta inovação.
Teece (1986, p. 289, 2006, p. 1134), então, classificou os ativos complementares em
genéricos, especializados e coespecializados. Os ativos genéricos são aqueles que já existem
no mercado, e mesmo que a empresa inovadora não os possua, é possível contratá-los em
termos competitivos (TEECE, 1986, p. 289; CECCAGNOLI; ROTHAERMEL, 2008, p. 15).
Os ativos especializados são aqueles desenvolvidos de forma exclusiva para a
inovação, em que há uma relação de dependência unilateral entre a inovação e o ativo. Neste
caso, ativos complementares especializados, em geral, não são encontrados facilmente no
mercado, sendo construídos dentro de trajetórias específicas. Se o inovador não possuir os
ativos complementares especializados necessários para sua inovação, poderá sofrer com
problemas de barganha potencial junto a concorrentes ou fornecedores que os possuam
(CECCAGNOLI; ROTHAERMEL, 2008, p. 15).
Os ativos coespecializados, por sua vez à semelhança com os especializados, são
caracterizados por uma relação de interdependência entre o desenvolvimento da inovação e do
ativo complementar (dependência bilateral) (TEECE, 1986, p. 289). Ceccagnoli e Rothaermel
(2008, p. 20), advertem que, ao serem organizações distintas que detenham os ativos
87
tecnológicos e ativos complementares de uma inovação, poderia gerar tendência a uma
corrida de aprendizado, em que a empresa detentora de ativos complementares teria interesse
em desenvolver capacidades de P&D, enquanto que o inovador teria a motivação contrária.
Esta classificação proporciona um quadro de referência ao inovador para analisar o
conjunto de competências necessárias vinculadas à comercialização de sua inovação, e a
compreensão de eventuais poderes de barganha entre este inovador e concorrentes ou
fornecedores quanto a apropriação dos ganhos sobre a inovação (TEECE, 2006, p. 1134).
Teece (2006, p. 1135) considera que este tipo de avaliação crítica para orquestrar os
ativos e capacidades dentro de uma empresa em relação a uma determinada inovação, no
entanto, reconhece que o foco é especificamente sobre a fase de comercialização da inovação,
e que o modelo de análise é estático.
Teece, Pisano e Shuen (1997, p. 510) observam que apesar da perspectiva de recursos
reconhecer a importância econômica dos recursos e competências diferenciadas das empresas
como geradores de rendas e vantagens competitivas distintas, esta apresentava uma visão
estática do portfólio de competências e recursos da empresa ao não explicar como estes
recursos e ativos eram desenvolvidos, combinados, aplicados e protegidos ao longo do tempo.
Diante disso, estes autores sugerem a necessidade de uma abordagem de capacidades
dinâmica, onde tais questões possam ser aprofundadas.
3.2.1 Capacidades dinâmicas
A abordagem de capacidades dinâmicas proposta por Teece, Pisano e Shuen (1997, p.
516) entende que em um mercado em que as mudanças ocorrem com maior rapidez, as
organizações tem que desenvolver habilidades de gerar novas formas vantagens competitivas.
Deste modo, a habilidade de promover respostas inovativas constantes a tendências de
mercado se configura na base da criação de valor diferenciado, e reforça as dificuldades de
imitação pelos concorrentes pela sua persistente transformação.
Assim, Teece, Pisano e Shuen (1997, p. 516) definem capacidades dinâmicas de uma
empresa como a concertação de habilidades para desenvolver, adaptar, integrar e renovar
competências internas e externas para alcançar um desempenho superior frente a ambientes de
negócios de rápidas mudanças. Para Zahra e George (2002, p. 185), as capacidades dinâmicas
tornam organizações aptas a reconfigurar sua base de recursos e adaptá-la de acordo com as
condições de mercado, de forma a alcançarem vantagens competitivas.
88
As capacidades dinâmicas estão imbricadas nos processos e rotinas organizacionais,
na posição estratégica de ativos e na trajetória das empresas (TEECE; PISANO; SHUEN,
1997, p. 516). Seu conceito pressupõe uma hierarquia entre diferentes níveis de competências
e capacidades, em que a implementação de uma capacidade de nível superior integra
competências, rotinas e ativos de um nível inferior sob seu escopo (WINTER, 2003).
Esta hierarquia entre capacidades é exemplificada por Zahra e George (2002, p. 186),
que concebem a capacidade absortiva (a ser vista em seguida) como uma capacidade dinâmica
(nível superior), composta por capacidades específicas de aquisição, de assimilação, de
transformação e de aplicação do conhecimento, que são combinadas e integradas de modo a
gerar uma vantagem competitiva diferenciada.
Teece (2006, p. 1143) afirma que a perspectiva dinâmica em relação a capacidades
deve ressaltar a importância tanto da acumulação, quanto da orquestração de capacidades
como fator crítico para a competitividade por meio do desenvolvimento de inovações. Reforça
a noção que a gestão da organização precisa ter a habilidade de desenvolver ou adquirir um
conjunto de capacidades de inovação, envolvendo capacidades essenciais (tecnológicas) e
complementares, que combinadas que produzam escopos econômicos, bem como aumentem a
sua apropriabilidade sobre estes.
3.2.2 Capacidades absortivas
A inovação tecnológica pode ser realizada tanto por meio de uma atividade interna na
empresa que pode envolver capacidades de pesquisa e desenvolvimento verticalmente
integrada com as demais áreas de produção, marketing, distribuição e vendas, como também
pode se relacionar a importação de tecnologias externas em um mercado de transferência de
inovação e competências com o uso de instrumentos como o licenciamento e consultorias
técnicas (DOSI, 1988, p. 1132). Contudo, mesmo essa “transferência” de tecnologia demanda
uma capacidade interna na empresa adotante para reconhecer, avaliar, negociar, e fazer as
adaptações necessárias da tecnologia ao seu processo produtivo (DOSI, 1988, p. 1132). Esta
capacidade está relacionada a função de capacidades absortivas.
O conceito de capacidade absortiva foi proposto por Cohen e Levinthal (1990) ao se
referir a habilidade da uma organização em reconhecer o valor de um conhecimento novo
externo, e assimilá-lo e aplicá-lo internamente em seus processos (COHEN; LEVINTHAL,
1990, p. 128). Esta capacidade de absorção de conhecimentos externos e sua incorporação na
89
base de competências da organização é de importância crítica para o contínuo
desenvolvimento de capacidades inovativas.
Zahra e George (2002, p. 185) propuseram a reconceituação de capacidade absortiva
como uma capacidade dinâmica relacionada à criação e utilização de conhecimentos que
aumenta a habilidade da firma em obter e sustentar vantagens competitivas (ZAHRA;
GEORGE, 2002, p. 185). Desta forma, a capacidade absortiva representa um conjunto de
habilidades da organização para gerenciamento do conhecimento, contemplando rotinas e
processos organizacionais pelo qual as empresas adquirem, assimilam, transformam, e
aplicam conhecimento (ZAHRA; GEORGE, 2002, p. 186).
As quatro dimensões da capacidade absortiva de acordo com Zahra e George (2002, p.
189) são:
Tabela 3 - As quatro dimensões de habilidades que compõem a capacidade absortiva por Zahra e
George (2002).
Dimensões de Habilidades da Capacidade Absortiva
Habilidade Descrição
Aquisição do conhecimento
Identificar e adquirir conhecimento, externamente
gerado, que seja crítico para as operações da
organização.
Assimilação do conhecimento Analisar, processar, interpretar, e compreender o
conhecimento obtido das fontes externas.
Transformação do conhecimento
Desenvolver e refinar as rotinas existentes na
organização com base no conhecimento recentemente
adquirido e assimilado.
Aplicação do conhecimento
Estender e alavancar as capacidades existentes na
organização, ou criar novas capacidades, ao incorporar
o conhecimento adquirido e transformado em suas
operações.
Fonte: Baseado em Zahra e George (2002).
Zhara e George (2002, p. 185) distinguem estas habilidades em dois grupos, o que
denominam de capacidade absortiva potencial, abrange a aquisição e assimilação de
conhecimento; e capacidade absortiva realizada (ou revelada) refere-se a sua transformação
em conhecimento interno e sua efetiva aplicação e desenvolvimento (ZAHRA; GEORGE,
2002, p. 185).
A importância desta distinção é compreender que a capacidade absortiva potencial
pode tornar uma organização receptiva para adquirir e assimilar conhecimento externo, sendo
fonte de renovação da base de conhecimentos, porém não garante o uso destes conhecimentos
90
e possíveis benefícios decorrentes deste (ZAHRA; GEORGE, 2002, p. 196). Enquanto que a
capacidade absortiva realizada, com a função de aplicar e alavancar o conhecimento, atua
como a fonte primária de melhoria de desempenho (ZAHRA; GEORGE, 2002, p. 190).
Cohen e Levinthal (1990, p. 141) e Zahra e George (2002, p. 196) defendem que a
capacidade absortiva modera os efeitos da apropriabilidade e das oportunidades tecnológicas
sobre a atividade inovativa das organizações. No que tange a oportunidades tecnológicas, caso
uma organização não desenvolva capacidades absortivas tende a não identificar (ou identificar
de forma limitada) o surgimento de novas oportunidades, o que implica em bloqueios no
desenvolvimento tecnológico subsequente (COHEN; LEVINTHAL, 1990, p. 136).
Em relação à apropriabilidade, para Cohen e Levinthal (1990, p. 142), apesar de
reconhecer que regimes de baixa apropriabilidade, em geral, são pouco estimulantes para as
organizações para realização de investimentos em aprendizado em virtude dos
transbordamentos de conhecimento, esses autores indicam que se houver substancial
transbordamento de conhecimento, este pode proporcionar um incentivo positivo ao
desenvolvimento de capacidades absortivas, que parcialmente compense os efeitos negativos
da baixa apropriabilidade.
Contudo, para Zahra e George (2002, p. 196), em regimes de baixa apropriabilidade,
as empresas devem exercer um esforço extra ao desenvolver capacidades absortivas, pois
devem, de forma adicional, estabelecer mecanismos de isolamento das capacidades
desenvolvidas, como o sigilo, para proteger suas vantagens e captar benefícios de seus novos
processos ou produtos.
3.2.3 Capacidades de inovação
Figueiredo (2000, 2003) diferencia linhas distintas de pesquisas sobre capacidades de
inovação, uma direcionada para a inovação e criação de conhecimento na fronteira
tecnológica em economias industrializadas, e outra relacionada ao aprendizado e acumulação
de capacidades em empresas de economias de industrialização tardia e países em
desenvolvimento.
A primeira corrente enfatiza questões sobre como as empresas podem sustentar,
renovar, criar rotinas e integrar competências tecnológicas e de inovação frente a bases de
conhecimento já acumuladas, seja nos indivíduos ou nas organizações, sem conferir enfoque
quanto a forma de construção inicial dessas competências e seus problemas (FIGUEIREDO,
2000; MIRANDA; FIGUEIREDO, 2010).
91
Portanto, enquanto esta primeira corrente se concentra em preocupações com
atividades de Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) de produtos e processos na fronteira
tecnológica, a segunda linha de pesquisa busca compreender como empresas de países de
economia emergente podem se engajar em processos de aprendizado que possibilitem a
construção de suas próprias capacidades (MIRANDA; FIGUEIREDO, 2010). O
desenvolvimento de capacidades internas e a implementação de atividades inovadoras
partindo-se de processos e produtos já disponíveis no mundo, por meio da difusão em
empresas, são extremamente importantes para as empresas em países em desenvolvimento,
bem como os diferentes tipos de processos de aprimoramento contínuo e inovações
incrementais daí decorrentes (FIGUEIREDO, 2000).
Lall (1992, p. 166) entende que os avanços sobre questões tecnológicas em países em
desenvolvimento tem se baseado em estudos sobre os esforços tecnológicos internos para o
domínio de tecnologias novas (geradas externamente), com vistas a adaptá-las as condições
locais, melhorá-las e difundi-las na economia, além de explorá-las para a diversificação e
criação de novas tecnologias (internamente), as quais possam ser inclusive exportadas.
No entanto, em função de deficiências em relação a experiências e habilidades
limitadas de produção industrial, Lall (1992, p. 168) considera que uma empresa típica de um
país em desenvolvimento seja provavelmente menos eficiente em comparação com uma
empresa típica de um país desenvolvido ao usar a mesma tecnologia. Miranda e Figueiredo
(2010) também indicam que em contextos de países em desenvolvimento, por um lado, é
comum as empresas não terem o mínimo de capacidade ou conhecimento tecnológico durante
seu funcionamento inicial, e por outro lado, a fronteira tecnológica internacional está em
constante movimento.
Por isso, é necessário que os países em desenvolvimento acelerem o processo de
acumulação tecnológica a uma taxa mais rápida do que a atualmente observada nas empresas
de economias altamente industrializadas, de modo a alcançar a fronteira tecnológica
internacional, e viabilizar a condução de atividades inovadoras de forma independente
(MIRANDA; FIGUEIREDO, 2010). Contudo, Miranda e Figueiredo (2010, p. 78) observam
que não somente a velocidade relativa de acumulação tecnológica que é importante, mas
também a direção dos esforços, visto que a emergência de descontinuidades radicais em
alguns setores pode alterar as composições de capacidades relevantes, destruindo
competências previamente desenvolvidas e criando novas demandas de conhecimentos.
Neste sentido, Miranda e Figueiredo (2010) defendem que descobertas em relação à
dinâmica e velocidade de acumulação de capacidades tecnológicas são relevantes para
92
subsidiar decisões tanto de empresários, como de gestores públicos, para orientação quanto
aos esforços de construção de capacidades inovadoras ao longo do tempo, e ter informações
sobre quando e como se materializariam seus retornos. Para tanto os estudos referentes à
acumulação de capacidades buscam explicar a forma, direção e velocidade dos processos de
aprendizado e acumulação de capacidades tecnológicas nas empresas são fundamentais.
A capacidade de inovação é compreendida como um contínuo de atividades com
crescentes graus de dificuldade e complexidade que consiste da combinação de um conjunto
de diferentes fatores (estrutura, estratégia, competências, trajetória, entre outros), e em
constante mudança pela interação com o meio externo (MIRANDA; FIGUEIREDO, 2010).
Em um sentido processual, as organizações que alcançam maior capacidade de inovação
aumentam sua probabilidade de manter-se ou elevar seus níveis de competitividade, bem
como ao obter maior competitividade aumentam sua probabilidade de desenvolver sua
capacidade de inovação (DOSI, 1988, p. 1161).
Figueiredo (2011, p. 422) ao reconhecer que existem diferentes níveis de capacidade
de inovação, enfatiza a importância em compreender sua dinâmica e propõe como central a
esta abordagem a noção de “capacidades reveladas”. No sentido em que, em vez de avaliar o
desempenho inovativo por indicadores tradicionais, como quantidade de patentes ou
investimentos em P&D, busca-se identificar os diferentes desempenhos de inovação das
organizações, em termos de distintos graus de acumulação de capacidades e da novidade e
complexidade de suas atividades e do resultado alcançado (FIGUEIREDO, 2011, p. 422;
MIRANDA; FIGUEIREDO, 2010, p. 78).
O processo de acumulação tecnológica se caracteriza pelo desenvolvimento de
capacidades relacionadas a geração e gerenciamento de mudanças técnicas (BELL; PAVITT,
1993, p. 163). As chamadas capacidades tecnológicas, ou capacidades inovativas,
contemplam os recursos necessários para implementar atividades inovativas em produtos,
processos ou sistemas organizacionais, envolvendo mudança tecnológica (MIRANDA;
FIGUEIREDO, 2010; FIGUEIREDO, 2011, p. 422). Novamente, diferentes graus de
acumulação tecnológica permitem desempenho inovativos distintos.
Ao buscar identificar as trajetórias de desenvolvimento de capacidades tecnológicas de
uma organização, em termos de seus focos tecnológicos, da frequência e formas de buscas de
aprendizado para a acumulação dos diferentes níveis de capacidades, é possível compreender
as suas diferentes direções, intensidade e velocidade (FIGUEIREDO, 2000, p. 8).
Esta compreensão é relevante ao se considerar que a existência de assimetrias entre
empresas intra e intersetorial é uma das consequências de características como a
93
cumulatividade tecnológica a nível da organização, seu conhecimento tácito e o conjunto
diverso de mecanismos de apropriabilidade utilizado sobre inovações (DOSI, 1988, p. 1153).
Em uma indústria, segundo Dosi (1988, p. 1157), a heterogeneidade entre as empresas
é relacionada a três aspectos: o grau de assimetria representado pela dispersão de níveis de
eficiência de recursos e qualidade de produtos de cada empresa (1); a variedade tecnológica
que resulta de rotinas técnicas diferenciadas, escalas de produção e parque de equipamentos
(2); e, a diversidade de comportamento que se refere ao desenvolvimento idiossincrático de
regras de decisão e estratégias particulares de cada organização (3).
Entendemos que estas três características abrangem relações vinculadas ao
desenvolvimento de capacidades e as buscas de aprendizado presentes em capacidades de
produção (diferentes graus de eficiência e qualidade alcançados), tecnológicas (direção e
intensidade tecnológica) e na própria construção de dinâmicas organizacionais mais gerais,
como a estratégia de negócio e a forma de interações sociais intra e interorganizacional, que
também envolve capacidades relacionais, conforme indicado por Capaldo (2007, p. 585, 605).
Estes processos de desenvolvimento de capacidades e inovação pelas organizações
implicam na formação, e constante reconfiguração, de uma dinâmica estrutura industrial para
setores econômicos específicos, que ao mesmo tempo atuam como resultante e como
direcionador da constante mudança tecnológica e organizacional, em virtude de gerar padrões
em termos de investimentos para inovação, taxas de inovações e desempenho (DOSI, 1988, p.
1157).
3.2.4 Padrões de mudança técnica setorial
Para Bell e Pavitt (1993, p. 177) os padrões e trajetórias tecnológicas tendem a se
diferenciar entre industriais (intersetoriais) e entre organizações empresariais
(intrasetorial/interorganizacionais). Os setores econômicos específicos desenvolvem
características próprias em termos de necessidades de mudança técnica das empresas, fontes
de tecnologia utilizadas, possibilidades de apropriação dos conhecimentos gerados e outras
questões relacionadas com respeito às atividades de inovação.
Dosi (1988, p. 1140) corrobora com esta visão ao entender que padrões de mudança
técnica setorial são resultados da interação de vários tipos de incentivos de mercado por um
lado, e oportunidade tecnológica e apropriabilidade de outro lado. Assim, o autor indica a
importância de desenvolver análises que permitam vincular características de fontes e direção
de oportunidades tecnológicas, mecanismos de apropriabilidade, e capacidades de empresas
94
em relação a emergência de padrões de mudança técnica específicos nas diferentes estruturas
industriais (DOSI, 1988, p. 1158).
Neste sentido, com o objetivo de identificar e compreender regularidades setoriais ao
longo de trajetórias tecnológicas Pavitt (1984) e Bell e Pavitt (1993) analisaram padrões
setoriais de inovação, considerando critérios tecnológicos e econômicos de forma a propor
uma taxonomia e embasamento teórico para análise da interação entre trajetória tecnológica e
dinâmica inovativa setorial (padrões setoriais de mudança técnica e acumulação tecnológica).
A taxonomia foi desenvolvida inicialmente por Pavitt (1984), e posteriormente
ampliada por Bell e Pavitt (1993) e contempla cinco categorias de modelos de mudança
técnica. As análises fundamentam-se em características de trajetórias tecnológicas, como o
foco e a direção da mudança técnica, fontes de conhecimento e acumulação tecnológica,
escalas de produção envolvidas, tipos e requisitos de usuários, e variáveis de comportamento
estratégico e apropriabilidade (POSSAS, 2003, p. 233). As cinco categorias de mudanças
técnicas setoriais são denominadas de “dominada por fornecedor”, “intensiva em escala”,
“intensiva em informação”, “base científica” e “fornecedor especializado”.
De forma sintética, empresas dominadas pelos fornecedores se encontram em setores
de manufatura tradicional, como têxtil e madeireiro, produtores artesanais e agricultura,
possuem escalas de produção menores, e baixa capacidade tecnológica e de engenharia
(DOSI, 1988, p. 1148; PAVITT, 1984, 356). O desenvolvimento de mudança técnica advém
quase que exclusivamente de fornecedores de bens de capital e outros suprimentos de
produção fabricados por indústrias fora do setor de aplicação (BELL; PAVITT, 1993, p. 178).
O processo de mudança técnica neste caso caracteriza-se mais como um processo de
difusão de inovações e melhores práticas (DOSI, 1988, p. 1148). O conhecimento e
investimentos inovativos das empresas destes setores tendem a focalizar melhorias
incrementais no processo produtivo e sua eficiência, além de inovações organizacionais
(DOSI, 1988, p. 1148). Apesar das principais oportunidades tecnológicas terem origem
exógena ao setor específico de utilização, o funcionamento pleno e eficiente do potencial da
nova tecnologia somente acontece por meio de processos de aprendizado das empresas
usuárias, o qual é facilitado ou dificultado pelas capacidades e condições de mercado em que
estas operam (DOSI, 1988, p. 1144).
As empresas intensivas em escala são, em geral, grandes indústrias de bens de
consumo duráveis, como a automobilística, e materiais industriais, como a metalúrgica
(PAVITT, 1984, p. 359; BELL; PAVITT, 1993, p. 178). A tecnologia é acumulada pela
capacidade de design e construção de componentes, equipamentos e subsistemas, ou design
95
de e construção de larga escala e sistemas complexos (BELL: PAVITT, 1993, p. 178). Riscos
e custos relacionados com mudanças radicais são elevados (escala e complexidade de
produção), portanto o desenvolvimento de processos e produtos é incremental e as principais
fontes de mudança de técnica são design, engenharia de produção, curva de experiência em
operações, fornecedores de equipamentos e componentes (BELL: PAVITT, 1993, p. 178).
As empresas intensivas em informação representam setores como bancos e grandes
empresas financeiras, de propaganda e publicidade, e de processamento de dados (BELL:
PAVITT, 1993, p. 179). Esta forma de acumulação tecnológica emergiu do desenvolvimento
da capacidade de armazenar, processar e transferir informação, por meio do design,
construção, operação e melhorias de sistemas de informações complexos (BELL: PAVITT,
1993, p. 179). As mudanças técnicas tendem a ser incrementais, e as fontes principais são
fornecedores de sistemas e aplicativos e a experiências de departamentos internos de grandes
empresas usuárias (BELL: PAVITT, 1993, p. 179).
As empresas de base científica estão tipicamente em setores químicos, eletrônicos e
biotecnologia (DOSI, 1988, p. 1149; PAVITT, 1984, p. 362). A acumulação tecnológica
emerge principalmente de atividades de P&D em grandes industriais ou de empresas de base
tecnológica, sendo que é bastante dependente de conhecimento, habilidades e tecnologias
originadas na pesquisa acadêmica (DOSI, 1988, p. 1149; BELL: PAVITT, 1993, p. 179). A
principal direção de mudança técnica é a busca horizontal (dentro do próprio setor) de um
amplo conjunto de produtos novos, ou tecnologicamente melhorados, baseados em
descobertas científicas (BELL: PAVITT, 1993, p. 179). As capacidades tecnológicas mais
relevantes são engenharia reversa, P&D e atividades de design, e requer treinamento de
cientistas e engenheiros em pesquisas com contatos internacionais (BELL: PAVITT, 1993, p.
179).
E, por fim, os fornecedores especializados tendem a ser não ser muito grandes,
atuando em setores como engenharia mecânica, instrumentos e softwares com foco na
produção de bens de capital e suprimentos para montagem de sistemas complexos (DOSI,
1988, p. 1149; BELL: PAVITT, 1993, p. 179). Estes fornecedores especializados se
beneficiam da interação com usuários avançados com grande experiência de operação, e
acumulam conhecimento em requisitos e design de sistemas caracterizados pela complexidade
e interdependências de processos de produção. Há uma ênfase na relação de confiança e foco
no desempenho dos produtos e processos, sendo que a maior parte destes fornecedores
representam um movimento de desintegração vertical e convergência tecnológica em grandes
indústrias (BELL; PAVITT, 1993, p. 179, 182).
96
A seguir apresentamos uma tabela síntese das principais características de cada
categoria na Tabela 4:
Tabela 4 - Padrões Setoriais de Mudança Técnica.
Variáveis de
análise
Categorias de Setores
Dominado por
fornecedor
Intensivo em
escala
Intensivo em
informação Base científica
Fornecedor
especializado
Setores típicos
Agricultura,
têxteis,
madeireiro
Bens duráveis,
automobilística,
metalúrgica
Bancos,
Seguradoras,
Propaganda e
publicidade
Químico,
biotecnologia,
eletrônico.
Equipamentos e
bens de capital,
Softwares,
Instrumentos
Tamanho de
empresas Pequeno Grande Grande Grande Pequeno
Tipo de
usuários
Sensível ao
preço
Sensível a preço
e desempenho
Sensível a preço
e desempenho
Sensível a preço
e desempenho
Sensível ao
desempenho
Principais
focos das
atividades
tecnológicas
Redução de
custo
Redução de custo
e melhoria de
produto
Redução de
custo e melhoria
de produto
Redução de custo
e melhoria de
produto
Melhoria de
produto
Principais
fontes de
acumulação
tecnológica
Fornecedores,
aprendiz. na
produção, serv.
de consultorias
Engenharia de
Produção;
aprendiz. nas
operações,
projetos,
fornecedores
Engenharia de
sistemas interna,
fornecedores de
equipamentos e
aplicativos
P&D interno;
pesquisa básica;
engenharia de
produção; Design
de produto
P&D interno,
Usuários
avançados
Principal
direções da
acumulação
tecnológica
Tecnologia de
processo e
equipamentos (foco ascendente
na cadeia, baixa
diversificação de
produto)
Tecnologia de
processo e
equipamentos (foco ascendente
na cadeia, baixa
diversificação de
produto)
Tecnologia de
processo e software
(concêntrica e
ascendente)
Desenvolv. de
tecnologias para
produtos (concêntrica: alta
diversificação
com foco no
mesmo setor)
Melhoria de
produto
(concêntrica: baixa
diversificação de
produto com foco
no mesmo setor)
Principais
canais de
imitação e de
transferência
de tecnologia
Aquisição de
equipamentos e
serviços
relacionados
Aquisição de
equipamentos;
licença de know-
how e
treinamentos;
engenharia
reversa
Aquisição de
equipamentos e
softwares;
engenharia
reversa
Engenharia
reversa; P&D;
contratação de
pessoal técnico
especializado
Engenharia
reversa,
Aprendiz. c/
usuários
Principais
meios de
apropriação
(proteção
contra
imitação)
Mecanismos não técnicos
(Marketing,
marca, etc)
Segredo industrial; know-
how projeto e
operação
Direito Autoral; know-how
projeto e
operação
Patentes, know-how em P&D,
know-how em
projeto e
operação
Patentes, conhecimento de
necessidades de
usuários, know-
how de projetos
Principais
incumbências
administrativas
de caráter
estratégico
Uso de
tecnologias
produzidas em
outro setor para
reforçar as
vantagens competitivas.
Integração
incremental de
tecnologias;
desenvolv. e
difusão de
melhores
práticas;
exploração das vantagens de
tecnologia de
processo
Projeto e
operação de
sistemas
complexos de
processamento
de informações;
Desenvolv. de produtos
Desenvolv. de
produtos afins;
exploração da
ciência básica;
obtenção de
ativos complementares
Monitorar as
necessidades de
usuários
avançados,
integrar novas
tecnologias em projetos
Fonte: Baseada em Bell e Pavitt (1993, p. 180).
97
Como ressaltado por Possas (2003, p. 233) a taxonomia dos padrões setoriais de
mudança técnica não objetiva fornecer critérios de enquadramento a priore para os diferentes
setores industriais, mas sim busca sugerir um conjunto de variáveis sobre padrões estratégicos
adotados pelas organizações que podem iluminar as análises de dinâmicas de inovação em um
setor ou a compreensão de atuação inovativa de uma empresa.
Archibugi (2001, p. 419) destaca que a taxonomia classifica perfis típicos de
comportamento tecnológico de empresas em setores, e não a análise de variáveis
correspondentes ao nível setorial em si, por isso defende que a classificação de forma ideal
deveria ser aplicada diretamente no nível das empresas, e não a um nível agregado de dados
de setor industrial. Neste ponto, há o reconhecimento de que a alta variedade tecnológica em
empresas classificadas dentro do mesmo setor é considerada uma das fragilidades existentes
na taxonomia, contudo, se a taxonomia for empregada para análise no nível de empresas, esta
variedade diminui (ARCHIBUGI, 2001, p. 419).
Esta última observação refere-se à constatação de Bell e Pavitt (1993, p. 182) que há
empresas que podem ser ativas em mais de uma categoria, como exemplificam a IBM no
início da década de 1990 em que atuava tanto de forma intensiva em escala, como de base
científica. Este exemplo é o que Archibugi (2001, p. 420) denomina de empresa com
multitecnologias, a qual atua sobre múltiplas trajetórias tecnológicas.
Archibugi (2001, p. 422) indica que apesar da taxonomia apresentada ser caracterizada
como uma classificação estática de padrões de mudança tecnológica (o que em si oferece
contribuições relevantes), também é possível usar a taxonomia proposta em uma leitura
dinâmica do processo de evolução econômica. Em termos estáticos, o modelo reconhece uma
substancial variedade de comportamentos inovativos e permite explorar as interações entre
estes diferentes comportamentos (links usuários-produtores), além de conjecturar prováveis
direções e principais influências no desenvolvimento tecnológico para cada categoria de
empresas (ARCHIBUGI, 2001, p. 422).
Em relação à perspectiva dinâmica, Archibugi (2001, p. 422) informa que a taxonomia
auxilia na compreensão da geração de novos diferentes tipos de empresas inovativas no
decorrer do tempo, sem que se tenha extinto os tipos anteriormente existentes, associando o
surgimento de certas categorias e ondas de desenvolvimento econômico.
Archibugi (2001, p. 422-) exemplifica com a separação durante a primeira revolução
industrial entre empresas de produção de bens de consumo e de bens de capital, que criou
inicialmente os tipos distintos “dominado por fornecedor” e “fornecedor especializado”. O
autor ainda cita as descobertas científicas na química e eletrônica que geraram oportunidade
98
de novos negócios e o estabelecimento de empresas de base científica, e os avanços mais
recentes na tecnologia de informação e comunicação que proporcionaram a criação de
negócios intensivos em informação (ARCHIBUGI, 2001, p. 422).
Bell e Pavitt (1993, p. 182) afirmam que estes padrões setoriais de mudança
tecnológica ajudam a explicar os vínculos entre os processos de acumulação tecnológica
(aprendizado) em setores industriais com dois importantes fatores relacionados aos padrões de
desenvolvimento industrial de países: alterações nas bases das vantagens competitivas e
alterações nas composições de resultados.
Em países desenvolvidos a acumulação tecnológica ocorreu de forma progressiva
entre todas as categorias estabelecidas, proporcionando a composição de uma estrutura
industrial ampla e complexa, com aprendizados e desenvolvimentos tecnológicos interativos
(entre as categorias e setores industriais) e cumulativos (BELL; PAVITT, 1993, p. 182).
Como cada padrão de mudança técnica alude à diferentes graus de importância de fatores de
produção, percebe-se que em países desenvolvidos há maior concentração em setores cuja
vantagem competitiva se baseia em níveis mais elevados de capacidades tecnológicas (BELL;
PAVITT, 1993, p. 184).
Enquanto em países em desenvolvimento tendem a ter um histórico de
desenvolvimento baseado em setores dominados por fornecedores, com presença menos
dinâmica em setores de maior ênfase competitiva baseada em elevados coeficientes
tecnológicos, e uma estrutura industrial de composição menos diversificada, que restringe
oportunidades de aprendizado interativo.
3.2.5 Acumulação tecnológica em países em desenvolvimento
Ao analisar o processo de acumulação tecnológica em diferentes países, Bell e Pavitt
(1993, p. 166) destacam distinções fundamentais no processo de acumulação tecnológica
entre países desenvolvidos e em desenvolvimento que possuem implicações relevantes aos
contextos de aprendizado tecnológico e desenvolvimento de mudanças técnicas e inovações.
A aprendizagem tecnológica em função de seu conhecimento tácito e específico move-
se ao longo de uma trajetória particular, em que o aprendizado anterior (estoque de
conhecimento e experiências) contribui para reforçar uma direção e taxa específica de
mudança técnica (BELL; PAVITT, 1993, p. 169).
Disso resultam três implicações (BELL; PAVITT, 1993, p. 169):
99
- Diferentes eficiências técnicas entre países relacionam-se a diferentes competências
técnicas acumuladas ao longo do tempo;
- Não é possível alterar rapidamente tais competências tecnológicas acumuladas, uma
vez que padrões setoriais de acumulação tecnológica são relativamente estáveis; e,
- A taxa e a composição da acumulação tecnológica influência tanto a eficiência
competitiva no curto prazo, quanto a própria evolução de novas bases de vantagens
competitivas ao longo prazo.
Bell e Pavitt (1993, p. 167) ressaltam que nos países desenvolvidos a acumulação
tecnológica construiu suas bases na importância central das organizações empresariais, como
local de aprendizado (learning by doing), de operação e desenvolvimento de sistemas
produtivos. Mas, apesar de enfatizar o papel das empresas, reconhecem que a mudança
técnica envolve complexas interações entre empresas (fornecedores, concorrentes, clientes) e
outras organizações da sociedade, como universidade, centros de pesquisa e agências públicas
(BELL; PAVITT, 1993, p. 168).
Assim, uma parte importante da acumulação de capacidades tecnológicas nestes países
decorre da construção de uma complementaridade entre instituições infraestrutural e
organizações empresariais, na qual estas organizações empresarias interagem, criando e
melhorando as tecnologias utilizadas (BELL; PAVITT, 1993, p. 168). Bell e Pavitt (1993, p.
176) ainda acrescentam que as organizações empresariais nestes países não costumam
procurar esse tipo de instituição para compensar a ausência de capacidades tecnológicas, mas
sim buscam conhecimento específico necessário para complementar atividades inovativas
internas em desenvolvimento.
Outro destaque é que a tecnologia importada (criada no exterior e incorporada à base
de conhecimento do país via assimilação dinâmica) e a acumulação tecnológica local não são
vistas como meios alternativos de geração de mudança técnica, mas são complementares para
promoção do avanço tecnológico (BELL; PAVITT, 1993, p. 171).
Contudo, sobre a acumulação tecnológica em países em desenvolvimento, Bell e
Pavitt (1993, p. 185) expõem que, embora se tenha, em geral, avançado e diversificado a
capacidade de produção industrial, há expressivas diferenças entre os países em relação aos
padrões de expansão e diversificação tecnológica, à dinâmica de eficiência do crescimento
industrial e às taxas de acumulação tecnológica industrial.
Entre os principais obstáculos identificados por Bell e Pavitt em trajetórias de
acumulação tecnológica desses países, os autores mencionam falhas em políticas de
intervenção implantadas para fomentar o avanço industrial, por um lado em políticas baseadas
100
na importação (difusão) de tecnologia contida em máquinas e equipamentos, e nos
conhecimentos e habilidades necessárias para operar uma produção de bens (BELL; PAVITT,
1993, p. 158). Por outro lado, há políticas fundamentadas em programas de financiamento do
governo a laboratórios e centros de pesquisa, no entanto, sem prover incentivos diretos para
acumulação tecnológicas em empresas, o que dificulta a interação entre estes atores e,
portanto, tolhe o desenvolvimento de aplicações na indústria dos conhecimentos científicos
básicos (BELL; PAVITT, 1993, p. 168).
Lall (1992, 171) ao mesmo tempo em que defende um papel central para as políticas
governamentais nos países em desenvolvimento para a intervenção em função de falhas nos
mercados e para criação de estruturas institucionais necessárias, também reconhece que a
implementação de políticas não representa condição suficiente, e, por vezes, as intervenções
governamentais sejam excessivas, equivocadas, ou ainda com falhas na execução (LALL,
1992, p. 172).
Particularmente, Lall (1992, p. 180) questiona políticas de intervenção relacionadas a
ajustes somente em níveis de preços da economia, pois podem levar a uma especialização em
atividades baseadas em vantagens comparativas estáticas. As configurações de preços e custos
podem não ser uma base consistente para promover a investimentos das organizações para o
desenvolvimento em capacidades, principalmente aquelas de maior complexidade
tecnológica, em função de externalidades, complementaridades tecnológicas, incerteza de
ganhos com aprendizado (problemas de apropriabilidade) ou falhas nos mercados (LALL,
1992, p. 181).
Lall (1992, p. 170) cita os exemplos do Japão e Coreia do Sul como países cujas
distintas políticas governamentais conseguiram equilibrar os investimentos estrangeiros
diretos e a importação de tecnologia externa, com exigências de estágios de desenvolvimento
tecnológico nas industriais locais e esforço tecnológico para absorção ativa destas tecnologias
importadas.
No entanto, é comum países em desenvolvimento, como o Brasil, apresentarem um
esforço na assimilação de capacidades de produção, porém com o desenvolvimento de
capacidades tecnológicas restrito, devido a forma conduzida de seu processo de
industrialização (BELL; PAVITT, 1993, p. 158). A capacidade de produção consiste de
recursos utilizados para produção industrial de bens conforme uma dada tecnologia (neste
caso predominantemente tecnologias importadas), dentro um determinado nível de eficiência
e englobando certa combinação de inputs e recursos (equipamentos, sistemas, processos
organizacionais e habilidades de trabalhadores).
101
Já capacidades tecnológicas abrangem os recursos necessários para gerar e gerir a
mudança técnica, de realizar inovações tecnológicas, considerando habilidades,
conhecimento, experiência e estrutura institucional (BELL; PAVITT, 1993, p. 163). A
mudança tecnológica nas empresas é caracterizada por Lall (1992, p. 166) como um processo
contínuo de absorção e criação de conhecimento tecnológico, ressaltando a importância das
interações com fontes externas de conhecimento, e da dependência da acumulação de
conhecimento e habilidades do passado.
Bell e Pavitt (1993, p. 163) argumentam que é crescente a distinção e especialização
entre os tipos de conhecimento e habilidade requeridos para operar um sistema de produção
(uso de tecnologia), e aqueles necessários para mudá-los (mudança de tecnologia). E, assim,
os recursos intangíveis requeridos para gerar e gerir a mudança tecnológica (habilidades,
conhecimento, vínculos institucionais) não podem mais serem concebidos como um
alinhamento marginal de recursos que constituem a capacidade de produção, pois estes se
tornaram muito mais significativos pelo aumento da intensidade de conhecimento e de
mudanças da produção industrial.
Lall (1992, p. 167) em sua análise sobre capacidades tecnológicas propõe três
categorias de capacidades distintas relacionadas à acumulação tecnológica conforme Tabela
5:
Tabela 5 - Tabela de categorias de capacidades relacionadas à acumulação tecnológica. Categorias de capacidades relacionadas a acumulação tecnológica
Capacidades Descrição
Capacidade de
investimento
tecnológico
Corresponde a habilidades em diferentes níveis de complexidade para identificar,
selecionar e obter tecnologia para novas operações ou expansões, e relaciona-se com
questão como adequação da escala de produção, mix de produtos, avaliação de
tecnologias e equipamentos alternativos.
Capacidade de
produção tecnológica
Envolve habilidades para operação, manutenção e controle de qualidade de produtos e
processos, incluindo adaptações, melhorias e até “stretching” em equipamentos, que é
o alongamento de níveis limites de produtividade. Estas habilidades determinam
como uma tecnologia é operada e melhorada na organização, assim como os esforços
internos para absorção de tecnologias externas.
Capacidade de
vínculos
Abrange as habilidades relacionadas a transmissão e captação de informações,
capacidades e tecnologias de outros atores do mercado ou institucionais, sendo
relevante tanto para a melhoria da eficiência produtiva da organização, quanto para o
desenvolvimento industrial, seja pela difusão de tecnologias na economia, seja pelo
enraizamento da estrutura industrial.
Fonte: Baseada em Lall (1992).
102
Cabe esclarecer que, apesar da noção de diferentes categorias de capacidades e
distintos graus de complexidade em cada uma destas, não significa que a acumulação destas
capacidades obrigatoriamente ocorrerá de forma linear ou sequencial, pois dependem das
trajetórias de aprendizado de cada organização (MIRANDA; FIGUEIREDO, 2010, p. 82;
LALL, 1992, p. 168).
Estas trajetórias de desenvolvimento de capacidades das organizações são resultados
de um processo que compreende características internas e respostas a estímulos externos,
incluindo a interação com outros agentes econômicos, privados e públicos, locais e
estrangeiros (LALL, 1992, p. 169).
Neste sentido, o conhecimento tecnológico não é compartilhado entre as empresas de
forma igual, nem pode ser facilmente transferido, pois devido a sua natureza tácita que exige
investimento, esforço e habilidade para seu aprendizado (LALL, 1992, p. 166). Assim, o
conhecimento aprendido por uma empresa é diferente do aprendizado de outra empresa
mesmo que trabalhe com tecnologias similares, e é ainda mais diferente de outras empresas
que trabalhem com tecnologias alternativas dentro do mesmo setor (LALL, 1992, p. 166).
Segundo Lall (1992, p. 169), a OCDE (Organização para Cooperação e
Desenvolvimento Econômico) justifica as diferenças de desempenho de economias industriais
avançadas por um conjunto de interações entre incentivos e capacidades, operando dentro de
um quadro institucional. As capacidades indicariam o melhor desempenho que as
organizações podem alcançar, e os incentivos guiam e estimulam sua utilização, expansão,
renovação ou desaparecimento, enquanto que um conjunto de regras institucionais são
estabelecidas para direcionar o desenvolvimento constante dessas capacidades e
aprimoramento de incentivos (LALL, 1992, p. 169).
Os incentivos que afetam o desenvolvimento de capacidades emergem de forças do
mercado, funções institucionais e políticas governamentais (LALL, 1992, p. 170). Os fatores
de mercado devem funcionar para evitar o subinvestimento de empresas no desenvolvimento
de capacidades tecnológicas, e basicamente referem-se à eficiência de mercados de capitais
em termos de linhas de financiamento adequadas, eficiência de mercados de trabalho,
responsivo às necessidades de habilidades individuais, e eficiência de mercado de tecnologia,
vinculados a fluxo de informação e infraestrutura de C&T (LALL, 1992, p. 171). Também
deve-se considerar os incentivos relacionados aos aspectos macroeconômicos e incentivos da
competição (doméstica e internacional).
As instituições referem-se a uma preocupação de relevância especificamente quando o
mercado não consegue criar naturalmente as instituições de “não mercado” necessárias ao
103
desenvolvimento tecnológico, como as instituições de apoio industrial (promoção de vínculos
em cadeias de valor, apoio a pequenas empresas, etc); instituições de formação e treinamento;
e instituições de pesquisa e tecnologia (LALL, 1992, p. 172). Neste caso, novamente são
necessárias intervenções que visem criar instituições e atividades que gerem
transbordamentos positivos, cujos retornos sociais excedam a apropriação percebida de
retornos por agentes privados (LALL, 1992, p. 172).
No entanto, em países em desenvolvimento, em virtude da natureza e custos das
atividades de aprendizado tecnológico, assim como de externalidades e complementaridades
geradas, os incentivos às empresas para o desenvolvimento de capacidades tecnológicas
podem ser insuficientes, por falha em mecanismo de mercado e regimes institucionais (LALL,
1992, p. 166).
Bell e Pavitt (1993, p. 190) também indicam problemas de alinhamento e
infraestrutura institucional em países em desenvolvimento, particularmente nas áreas de
educação e formação profissional, e de apoio ao desenvolvimento de P&D na indústria, o que
resulta na fragmentação de iniciativas de aprendizado e inovação por diferentes instituições, e
a não geração das complementaridades necessárias, anteriormente comentadas.
Um dos pontos ressaltados de falhas nestes vínculos por Bell e Pavitt (BELL;
PAVITT, 1993, p. 175) corresponde a compreensão que a principal contribuição da pesquisa
científica acadêmica ao desenvolvimento tecnológico não deve estar baseada na publicação de
resultados científicos, mas na formação de cientistas e engenheiros para a indústria com
elevadas habilidades de resolução de problemas, apropriabilidade científica (base de
conhecimento sólida e familiaridade com métodos e instrumentos científicos), e interação
com redes de profissionais.
Este fluxo de profissionais entre instituições da infraestrutura de CT&I e empresas
permitiria um maior equilíbrio de capacidade tecnológica entre estas esferas, e maior
acumulação tecnológica interna nas empresas, entretanto, na maioria dos países em
desenvolvimento, incluindo o Brasil, ainda há substancial desequilíbrio com mínima presença
nas empresas de quadro de profissionais mestres e doutores (BELL; PAVITT, 1993, p. 193).
Outra preocupação em relação a condições adequadas para a acumulação tecnológica
refere-se a desenvolver um sistema de apoio institucional financeiro e corporativo que
assegure que os processos de mercado sejam avaliados e encorajados em direção ao
aprendizado tecnológico cumulativo (BELL; PAVITT, 1993, p. 177).
A dificuldade está na percepção de fraca apropriabilidade destes investimentos que
pode levar ao subinvestimento, em função do alto grau de incerteza quanto a retornos em
104
processos de desenvolvimento e aprendizado tecnológico e que seus benefícios são realizados
em prazos mais longos (não imediatos) (BELL; PAVITT, 1993, p. 177). Outra questão é a
necessidade de conhecimentos específicos para avaliar de forma acurada o valor potencial de
um desenvolvimento tecnológico, que cuja competência são raras ainda em países em
desenvolvimento (BELL; PAVITT, 1993, p. 177).
Diante do exposto, fica evidente que as condições efetivas de aprendizado para
desenvolvimento tecnológico em países de industrialização tardia são atualmente bastante
diferentes daquelas trajetórias realizadas historicamente por países de economias avançadas.
Em particular, se observa que as capacidades tecnológicas têm se tornado desacopladas das
capacidades de produção, bem como se distinguem também os contextos tecnológicos,
econômicos e institucionais das mudanças técnicas e inovações (BELL; PAVITT, 1993, p.
202).
Sobre estas assimetrias entre países, Dosi (1982, p. 160) acrescenta que o processo de
mudança técnica nesta conjuntura é improvável de conduzir a convergência entre países que
partem de níveis de desenvolvimento tecnológico diferentes. Portanto, para Dosi (1982, p.
160) a imitação de políticas tecnológicas de países desenvolvidos não deve ser suficiente para
o catching up, de modo que a intervenção pública deve atuar de forma mais ampla sobre
fluxos de investimentos, comércio exterior e estrutura da indústria interna. É fundamental
atentar para estas condições diferenciadas (econômicas, políticas, institucionais), seja para
construir cenários de políticas públicas para imprimir mudanças nas dinâmicas econômicas,
seja ao se pretender desenvolver processos de inovações tecnológicas em empresas.
3.2.6 Capacidades, aprendizado e apropriabilidade
Dosi (1988, p. 1133) sugere que o escopo das capacidades de uma organização pode
definir as suas fronteiras, ao afetar tanto o escopo de sua eficiência para integração vertical,
como seu limite de diversificação de atividades. Deste modo, a relação entre capacidade
tecnológica, aprendizado e apropriabilidade vincula-se a conceitos de barreiras de mobilidade
e de entrada em indústrias (DOSI, 1988, p. 1160). E mesmo dentro de uma determinada
indústria, a velocidade da curva de aprendizado de empresas sobre a produtos ou processos
inovadores também é considerada um mecanismo importante para a apropriação de resultados
de uma inovação (DOSI, 1988, p. 1140).
Levin et al (1987, p. 805) discutem um entrelaçamento entre incentivos de
aprendizado e efeitos de eficiência do transbordamentos de conhecimento entre empresas.
105
Apesar do entendimento que a maior facilidade de uma empresa rival para aprender sobre a
tecnologia de um inovador poderia reduzir incentivos para investir em P&D, mas ao mesmo
tempo este aprendizado facilitado, poderia evitar desperdícios de duplicação de esforços de
P&D entre concorrentes que não seria socialmente eficiente (LEVIN et al, 1987, p. 805).
Também é possível que o conhecimento tecnológico sirva de tecnologia complementar para
outros projetos de P&D (LEVIN et al, 1987, p. 805).
Assim, em pesquisa realizada sobre apropriação em indústrias, Levin et al (1987, p.
805) identificaram que as organizações além de utilizarem o P&D interno e a engenharia
reversa como meios de aprendizado, empregavam como meios alternativos de aprendizado
alguns instrumentos interrelacionados a apropriação, como o licenciamento de patentes de
tecnologia e as patentes expiradas / descobertas. Também teve destaque mecanismos baseado
no transbordamento do conhecimento via comunicação interpessoal, como publicações ou
encontros técnicos, e interações ou contratações de empregados de firmas inovadoras.
Jensen e Webster (2004, p. 6) consideram que não somente ocorra um tradeoff entre o
nível de apropriação e aprendizado de capacidades, mas também pode haver conflitos entre os
estilos de apropriação e de aprendizado empregados pela empresa. Os autores indicam dois
aspectos distintos que influenciam aplicação de formas de apropriação e estilos de
aprendizado.
O primeiro aspecto é a natureza da base de conhecimento pode ser excluir ou restringir
a eficácia do uso de alguns métodos de apropriação ou tipos de aprendizado. Por exemplo, o
uso de patentes (apropriação) e manuais descritivos (aprendizado) são inconsistentes ou, no
mínimo, perdem considerável eficácia se o conhecimento for predominantemente tácito
(JENSEN; WEBSTER, 2004, p. 6).
De forma similar em que cada inovação, de acordo com a natureza de sua tecnologia
entre outras questões, demanda diferentes mecanismos de apropriabilidade, o esforço para
aquisição de capacidades tecnológicas envolve variados tipos de meios de aprendizado. Lall
(1992, p. 181) indica que capacidades menos complexas podem ser adquiridas em
treinamentos de curto prazo com atividades de learning by doing, desenvolvimento de
habilidade sem busca tecnológica ou experimentação. No entanto, capacidades mais
complexas exigem obrigatoriamente mais treinamento, inclusive formação científica, e
atividades de P&D para dominar a tecnologia (LALL, 1992, p. 181).
O outro aspecto mencionado por Jensen e Webster (2004, p. 6) é que a consistência
interna das relações interorganizacionais repercute no sentido de que comportamentos de
caráter altamente individualista se contrapõem com atividades de aprendizado cooperativo.
106
Assim, a forma como a empresa escolhe interagir com seus pares em relação a apropriação
sobre conhecimentos, como comportamentos agressivos de estratégias de apropriação máxima
de rendimentos, pode ter como consequência uma dificuldade de compartilhamento de
conhecimentos em uma rede de organizações (JENSEN; WEBSTER, 2004, p. 6).
É necessário encontrar pontos de equilíbrios de acordo com a estratégia de cada
organização e o ambiente de mercado e institucional, que viabilize a interação para
aprendizado, ao mesmo tempo em que conceda nível de apropriabilidade adequado aos
investimentos dos agentes.
3.2.7 Capacidades e sustentabilidade
De acordo com Sharma e Vredenburg (1998, p. 729) a emergência da concepção
normativa das empresas como atores com papel positivo em relação a sustentabilidade do
planeta ocorre nos movimentos da Comissão Mundial para o Meio Ambiente e o
Desenvolvimento (CMMAD) das Nações Unidas. No entanto, na prática, o real envolvimento
das empresas nestes aspectos não se dá sem questionamentos sobre como ou porque devem
assumir este papel.
No que tange a busca de respostas a estas questões, Sharma e Vredenburg (1998, p.
729) identificam três linhas de abordagens diferentes. A primeira linha tem foco na
conceituação de desenvolvimento sustentável, e defende uma redefinição do papel das
empresas na sociedade, tem uma perspectiva mais prescritiva, e não aprofunda discussões
sobre os efeitos desta redefinição na competitividade das empresas.
A segunda abordagem se contrapõe à primeira, ao argumentar que uma redefinição
ampla de papéis e responsabilidade pode ser prejudicial ao bem estar financeiro das empresas,
e assim recomendam que sejam desenvolvidos frameworks mais restrito de custos e
benefícios, em que investimentos em práticas ambientais alcancem compensação econômica
em determinado período de tempo em relação a redução de custos mediante o estabelecimento
de um regime regulatório, como economia de energia ou redução de desperdícios (SHARMA;
VREDENBURG, 1998, p. 729).
Por fim, a terceira abordagem defende que, quando apoiadas em incentivos de regimes
institucionais, estratégias de sustentabilidade podem não somente proporcionar ganhos em
termos de eficiência (economias e redução de desperdícios), mas também gerar vantagens
competitivas, através da criação de novas oportunidades de mercado, de legitimidade social
107
ou do desenvolvimento de capacidades diferenciadas (SHARMA; VREDENBURG, 1998, p.
730).
Ao considerar esta diversidade de abordagens, entende-se que diferentes organizações
podem apresentar comportamentos distintos em relação à adoção ou não de práticas de
sustentabilidade. Segundo Sharma e Vredenburg (1998, p. 733), em termos de
comportamento ou postura de resposta da organização, esta pode configurar-se como proativa
ou reativa à adoção de práticas de sustentabilidade.
A empresa é considerada proativa quando possui um padrão consistente de práticas
ambientais em suas diversas atividades com iniciativas voluntárias de adoção de critérios de
sustentabilidade (SHARMA; VREDENBURG, 1998, p. 733). Uma postura reativa representa
um padrão de comportamento em que o atendimento de critérios de sustentabilidade somente
tende a ser adotado quando ocorrem regulamentações institucionais ou como resposta a uma
pressão isomórfica no setor (SHARMA; VREDENBURG, 1998, p. 733).
Com vistas a verificar a diferença dessas posturas, Sharma e Vredenburg (1998, p.
749), ao realizar uma pesquisa identificaram que empresas com postura proativa à práticas
sustentáveis desenvolveram capacidades organizacionais distintivas, que geram benefícios
percebidos como vantagens competitivas no setor. Enquanto que em empresas reativas, cuja
adesão a critérios de sustentabilidade acontecia dentro das fronteiras regulatórias, em geral
por um movimento conjunto do setor de atuação, não foi observado o desenvolvimento de
capacidades diferenciadas e vantagens vinculadas. As principais capacidades organizacionais
desenvolvidas nas empresas proativas abrangiam três temáticas: Integração com stakeholder,
aprendizado de ordem superior e inovação contínua (SHARMA; VREDENBURG, 1998, p.
736).
Esta relação entre o atendimento a critérios de sustentabilidade e o desenvolvimento
de capacidades vinculadas a interação com stakeholders, aprendizado e inovação condiz com
o encontrado por diversos autores em pesquisa sobre inovações para o desenvolvimento
sustentável, em que a realização de inovações orientadas ao atendimento de critérios de
sustentabilidade implicava na emergência de capacidades distintas nas organizações (HALL;
VREDENBURG, 2003; DAROIT; NASCIMENTO, 2004; KLEEF; ROMME, 2007).
A ênfase de preocupações com as interações com stakeholders ocorre em virtude de a
inovação para o desenvolvimento sustentável ser caracterizada por um aumento da
diversidade de atores envolvidos, tendo em vista a necessidade da pluralidade de perspectivas,
em relação a problemas e oportunidades de solução na sociedade. Essas diferentes visões da
sociedade são ao mesmo tempo complementares (pela junção de perspectivas), e ambíguas
108
(pelos conflitos de interesse entre eles) (HALL; VREDENBURG, 2003; DAROIT;
NASCIMENTO, 2004; KLEEF; ROOME, 2007).
Diante do que chamam de adensamento na rede de relações das empresas, Hall e
Vredenburg (2003) classificam os stakeholders em dois grupos, os stakeholders primários que
são clientes, fornecedores, concorrentes e órgãos de regulação, e os chamados stakeholders
secundários (comunidades e grupos da sociedade civil afetados pelas inovações
desenvolvidas), em geral, estes secundários são com os quais a empresa não tinha contatos
frequentes e, portanto, não havia acumulado capacidades relacionais prévias.
Outra característica da inovação sustentável que influencia o desenvolvimento de
capacidades é a multidimensionalidade, pois além dos elementos econômicos e tecnológicos,
deve-se considerar também requisitos de sustentabilidade social e ambiental, o que demanda a
convergência de bases de conhecimento, e o desenvolvimento de novas tecnologias (HALL;
VRENDENBURG, 2003; HANSEN; GROSSE-DUNKER; REICHWALD, 2009). Isso cria
maior complexidade para o processo de aprendizado, que deve ser proporcionar ao mesmo
tempo a expansão de áreas conhecimentos e uma visão integrada desta diferentes áreas
(SHARMA; VREDENBURG, 1998, p. 736).
A busca de sustentabilidade nas operações empresariais, com a redução de danos
ambientais e a melhoria de padrões de vida, impõe a necessidade de um conjunto de
inovações radicais e incrementais nos sistemas de produção e consumo mundiais
(RENNINGS, 1998; KLEEF; ROOME, 2007). No entanto, as inovações radicais baseadas em
novas tecnologias sustentáveis representam descontinuidades tecnológicas (mudança de
paradigma tecnológico) que criam um alto grau de incerteza sobre os padrões tecnológicos
que serão consolidados (KLEEF; ROOME, 2007; SMITH, VOß E GRIN, 2010).
Neste caso, Smith, Voß e Grin (2010) informam a importância de espaços para
experimentação e aprendizagem de tecnologias sustentáveis, incluindo novos materiais,
designs e instrumentos, com que habilitem as empresas a articularem suas capacidades quanto
a mudanças de relações sociais e institucionais que devem ser envolvidas nas transições
tecnológicas.
Apesar da identificação de benefícios vinculados ao desenvolvimento de capacidades e
vantagens competitivas, e de abordagens normativas de orientação sobre as temáticas, Brito e
Berardi (2010, p. 163), em pesquisa sobre responsabilidade socioambiental em cadeia de
suprimentos, constataram que as iniciativas de gestão sustentável ainda se enquadravam em
sua maior parte no contexto de uma pressão ambiental por padrões mínimos de desempenho e
paridade competitiva, em que exigências externas (regulamentação, mercado e/ou sociedade)
109
são preponderantes. O que caracteriza uma postura reativa das empresas quanto à adoção de
critérios de sustentabilidade e de desenvolvimento de capacidades correspondentes.
Assim, compreendemos que este aspecto da tendência de comportamento das
organizações em relação a adoção de critérios de sustentabilidade, bem como da medida em
que pressões regulamentares são exercidas, particularmente quanto a aplicação de inovação a
ativos da biodiversidade amazônica, são pontos de análise importantes do presente estudo,
com vistas a explorar a inter relação entre desenvolvimento de capacidades e diretrizes do
desenvolvimento sustentável, e propiciar embasamento para análise empírica das
organizações que compõe a rede de inovação objeto desta pesquisa.
3.3 ATORES ORGANIZACIONAIS
Esta pesquisa se baseia no estudo de caso de uma rede de relações interorganizacionais
formada com o objetivo de desenvolver e comercializar uma linha de produtos baseados em
compostos antioxidantes de açaí, um ativo da biodiversidade amazônica, com foco na
indústria de cosméticos e alimentos funcionais. As principais organizações em termos de
capacidades constitutivas ao processo inovativo foram a Universidade Federal do Pará
(UFPA), a Amazon Dreams e a Belaiaçá.
Por isso, consideramos necessário entendê-las em termos de suas trajetórias
tecnológicas e capacidades organizacionais de inovação, de forma a melhor compreender suas
contribuições e limitações no desenvolvimento do processo inovativo a ser tratado no
próximo capítulo. Assim, o objetivo desta seção é apresentar essas três organizações (Amazon
Dreams, Belaiaçá e UFPA) que participaram da configuração de capacidades necessárias para
o desenvolvimento e comercialização da inovação.
Na análise empírica, inicialmente, estabelecemos um breve histórico de cada
organização, com um panorama de processos inovativos realizados. Posteriormente, nos
baseamos em um levantamento de capacidades de produção e tecnológicas vinculadas ao
padrão de mudança técnica característico (aplicado as duas organizações empresariais), bem
como buscamos enfatizar o conjunto de suas capacidades específicas relacionadas ao
desenvolvimento de inovações de base biotecnológicas.
110
3.3.1 Universidade Federal do Pará
A UFPA é reconhecida como uma das principais instituições de ciência e tecnologia
da região amazônica, e busca atender o princípio fundamental da integração das funções de
ensino, pesquisa e extensão. Em um contexto de promoção da inovação, se caracteriza como
uma instituição ponte de C&T para a região com atividades de formação de quadro de
profissionais e de estrutura para pesquisas científicas e tecnológicas. Sua missão declarada é
“Produzir, socializar e transformar o conhecimento na Amazônia para a formação de cidadãos
capazes de promover a construção de uma sociedade sustentável” (UFPA, 2013).
A Universidade é constituída como autarquia federal vinculada ao Ministério da
Educação (MEC), e sua criação corresponde a um movimento nacional do Governo Federal
na década de 1950 para a formação de instituições de ensino superior, e ciência e tecnologia
no país (UFPA, 2014b). Atualmente, a UFPA está instalada em Belém e em 10 campi no
interior do Estado do Pará, com atividades de ensino que abrangem todas as áreas do
conhecimento (Artes, Biológicas, Saúde, Humanas e Sociais Aplicadas, Jurídicas, Exatas e
Naturais, Engenharias, Geociências, Letras, Comunicação Social e Filosofia) (UFPA, 2013).
Segundo anuário estatístico de 2013 (UFPA, 2013), a UFPA, em 2012, empregava
2.722 professores e 2.379 servidores técnico-administrativos, e em relação ao quantitativo de
alunos, havia 39.236 alunos de graduação matriculados e 3.721 estudantes de cursos de pós-
graduação stricto sensu. Na UFPA, são ofertados 513 cursos de graduação e 56 programas de
pós graduação, sendo 26 no nível de doutorado, conforme tabela 6 (UFPA, 2013).
111
Tabela 6 - Número de Cursos de Pós Graduação Stricto Sensu na UFPA – por área de conhecimento –
período de 2008 a 2012.
Área de Conhecimento Nível 2008 2009 2010 2011 2012
Ciências Exatas e da Terra Mestrado 6 6 6 7 8
Doutorado 3 3 5 5 5
Ciências Biológicas Mestrado 6 6 6 7 7
Doutorado 6 6 6 7 7
Ciências Humanas Mestrado 7 7 8 9 10
Doutorado 3 3 4 5 5
Linguística, Letras e Artes Mestrado 1 2 3 3 3
Doutorado 0 0 0 0 0
Ciências da Saúde Mestrado 3 3 3 6 6
Doutorado 1 1 1 1 1
Engenharias Mestrado 5 5 6 6 7
Doutorado 2 2 2 2 2
Ciências Agrárias Mestrado 3 4 4 4 4
Doutorado 0 1 1 2 2
Ciências Sociais Aplicadas Mestrado 3 3 3 6 7
Doutorado 1 1 1 1 1
Multidisciplinar Mestrado 4 5 4 4 4
Doutorado 1 2 2 3 3
Subtotal Mestrado 38 41 43 52 56
Doutorado 17 19 22 26 26
Total Geral 55 60 65 78 82
Fonte: UFPA (2013).
Também é possível se observar no período de 2008 a 2012 um crescimento constante
do número de cursos de pós graduação na UFPA, conforme Figura 3. Este crescimento no
decorrer do período representa uma tendência importante tanto em termos de ampliação da
capacidade de formação de pessoal qualificado, quanto uma potencial expansão da geração de
pesquisas e avanços na ciência e tecnologia na região.
Figura 3 - Gráfico da evolução do número de cursos de pós graduação stricto sensu na UFPA –
período de 2008 a 2012.
Fonte: UFPA (2013).
112
Contudo, apesar de estar presente nas várias regiões do Estado do Pará, suas atividades
de pesquisa e pós graduação stricto sensu ainda são extremamente concentradas na capital
(Belém), onde funcionam cinquenta e quatro (54) programas de pós graduação, enquanto em
campi do interior estão em funcionamento somente quatro (4) (UFPA, 2013).
Recentemente, um de seus campi passou por processo de desvinculação para
constituição de nova universidade federal, que é o caso do campus de Santarém, uma das
plataformas de criação da Universidade Federal do Oeste do Pará (UFOPA), e do campus de
Marabá que está dando origem a Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará
(UNIFESPA).
- Capacidades relacionadas a inovação em biotecnologia:
Ressalta-se duas vertentes da UFPA em relação à contribuição por meio de suas
capacidades a uma estrutura de apoio à inovação baseada em biotecnologia: Uma vertente
refere-se a sua capacidade de pesquisa científica e tecnológica na área específica, e outra
vertente a sua estrutura de suporte a inovação e incubação de empresas de base tecnológica.
No que tange a capacidade de pesquisa cientifica e tecnológica, conforme CGEE
(2008, p. 79), a UFPA detém o maior contingente de profissionais de alta qualificação na
região Amazônica, e possui um grande parque de equipamentos científicos4.
Apesar de no citado relatório do CGEE (2008, p. 71, 78) serem descritas listagens de
dados como pesquisadores líderes, alguns projetos relevantes, laboratórios e equipamentos,
não encontramos dados sistematizados que contivessem uma lista completa de projetos da
UFPA na área de biotecnologia, com informações como volume de recursos, parceiros e
resultados alcançados. Esta lacuna impede análises mais aprofundadas em termos de
capacidades e trajetória geral da universidade em pesquisas biotecnológicas, de forma que
focaremos nas unidades da UFPA diretamente envolvidas no desenvolvimento da linha de
produtos inovadores em estudo, que são a Faculdade de Engenharia de Alimentos (FEA) e a
Agência de Inovação (UNIVERSITEC).
A Faculdade de Engenharia de Alimentos (FEA) oferta um curso de graduação em
Engenharia de Alimentos (implantado em 2000), e um curso de mestrado em Ciência e
Tecnologia de Alimentos, reconhecido pela CAPES em 2003. A FEA tem como objetivos a
formação de engenheiros com domínio de conteúdos técnico-científicos para absorver e
4 No relatório do CGEE pode-se encontrar relações de pesquisadores em posição de lideranças de pesquisa da
UFPA em áreas relacionadas a biotecnologia (página 71 a 72), de projetos relevantes na área (página 72 a 74),
de laboratórios (página 75 a 76), e de equipamentos (páginas 76 a 78).
113
desenvolver novas tecnologias, e o desenvolvimento de projetos de pesquisa de novas
tecnologias com valorização de matérias-primas regionais, no sentido de verticalizar a
produção de alimentos, com a implantação, modernização e ampliação de agroindústrias
locais (UFPA, 2014d).
De forma específica ao desenvolvimento tecnológico de matérias-primas da
Amazônia, as atividades são direcionadas para caracterizar estas matérias e seus resíduos
agroindustriais quanto a propriedades nutricionais, físico-químicas, bioquímicas (propriedades
funcionais de proteínas, poder antioxidante e atividade enzimática) e microbiológicas. E, de
acordo com esta caracterização desenvolver tecnologia em processos de extração,
concentração, conservação (pasteurização, secagem, congelamento) e geração de formulações
de alimentos funcionais das matérias-primas e de seus resíduos. (UFPA, 2014d, UFPA,
2014e)
Entre os laboratórios e infraestruturas de pesquisa da FEA para o desenvolvimento de
atividades estão uma usina piloto de processamento de alimentos, uma usina piloto de
operações unitárias e laboratórios de análises físico-químicas, microbiologia, microscopia,
análise sensorial (UFPA, 2014e).
Em relação ao apoio a inovação e incubação de empresas, hoje a UFPA possui uma
Agência de Inovação Tecnológica, denominada de Universitec, criada com o objetivo de
“promover a inovação tecnológica para o fortalecimento da economia paraense, agregando
valor a produtos da biodiversidade local” (UFPA, 2014f). Observamos que o discurso
expressado pela Universitec encontra aderência com o papel normativo de universidades
como instituições pontes à inovação, e que esta reconhece como fator relevante a base de
bioativos local.
As agências ou núcleos de inovação tecnológica de instituições de C&T no Brasil se
baseiam em termos de regulamentação pela Lei da Inovação (BRASIL. LEI Nº 10.973/2004),
que os tornou responsáveis têm pela gestão da política de inovação tecnológica dessas
instituições públicas de ciência e tecnologia e no estímulo da inovação junto ao setor
produtivo.
No entanto, a UFPA iniciou as primeiras atividades de apoio à inovação e
desenvolvimento tecnológico em empresas de forma estruturada em 1995 com a criação do
Programa de Incubação de Empresas de Base Tecnológica (PIEBT), uma iniciativa pioneira
na Região Amazônica (UFPA, 2010). Hoje em dia, a incubação de empresas faz parte das
ações desenvolvidas pela Universitec, já tendo sido atendidas 37 empresas, com 18 empresas
graduadas ao longo de sua existência.
114
A Universitec engloba três linhas principais de atividades: uma de consultorias e
serviços tecnológicos, uma de incubação de empresas de base tecnológica, e um escritório de
propriedade intelectual (UFPA, 2014f). As atividades de consultorias e serviços tecnológicos
buscam articular a prestação de serviços pela Universidade a empresas e organizações da
sociedade, com a promoção da interação da UFPA com os diversos segmentos do mercado.
A incubação de empresas atua por meio do Programa de Incubação de Empresas de
Base Tecnológica (PIEBT) com ações de formação de empreendedores, e de disseminação e
transferência de conhecimentos gerados na própria Universidade. Este programa possui mais
de 15 anos, e também já contribuiu na promoção de novas incubadoras de empresas e parques
tecnológicos no Pará.
A área de Propriedade Intelectual realiza registros de direitos autorais (obras literárias,
artísticas e científicas), e de propriedade industrial junto ao INPI (patentes, marcas e desenho
industrial, indicações geográficas e cultivares), além de registro de softwares e projetos
arquitetônicos da UFPA. Outra atividade é a formalização de contratos de transferência de
tecnologia da UFPA para o setor empresarial.
Em entrevista concedida, Gonzalo Enríquez, atual Diretor da Agência de Inovação da
UFPA, a biotecnologia pode ser dividida em três etapas, a bioprospecção, a proteção do
conhecimento e finalmente a transferência tecnológica. Para ele, em termos de bioprospecção
a UFPA possui capacidades tecnológicas fundamentais para o seu desenvolvimento na região:
“[...] temos núcleos estabelecidos em biologia e química que possuem uma força muita
grande, uma competência muito grande na UFPA, e fora da UFPA, você encontra muito
pouco (competência)”. (Informação verbal)5.
No entanto, ressalta-se o esforço ainda a ser realizado na Amazônia, visto que somente
uma pequena parte da biodiversidade da região está catalogada. Enríquez menciona a questão
de ter se consciência que o uso da biodiversidade se trata de potencialidade, pois é necessário
um substancial volume de bioprospecção para encontrar ativos que se adequem aos requisitos
dos produtos: “Nós já trabalhamos com mais de 5.000 produtos da biodiversidade, e nós
temos agora 7 ou 8 ou 10 que podem ir para o mercado?”. (Informação verbal)6.
Neste aspecto, reconhece como gargalo a interação com empresas, o setor produtivo
deve ter papel importante no direcionamento e na intensidade das buscas de bioprospecção. A
interação com empresas é visto como o principal gargalo hoje por Enríquez, pois indica que
por mais que a UFPA tenha o discurso sobre transferência de tecnologia, há dificuldade em
5 Entrevista concedida pelo Diretor da Agência de Inovação da UFPA em 15/01/2014. 6 Entrevista concedida pelo Diretor da Agência de Inovação da UFPA em 15/01/2014
115
encontrar empresas locais com perfil para atividades com bioativos, em geral, as que
identificam são as pequenas empresas que são incubadas no programa da Agência.
Esta situação retrata problemas de articulação institucional quanto ao contexto de
implementação da estrutura de C&T no Brasil (que repercuti na trajetória de relações entre
instituições de C&T e setor produtivo no Pará), o qual por muito tempo foi focado no modelo
ofertista de tecnologia, sem conseguir promover o desenvolvimento de capacidades
tecnológicas internas nas empresas locais.
Sobre esta conjuntura histórica o próprio Enríquez (2003, p. 187) entende que para
melhorar a cooperação entre centros de pesquisa e setor produtivo, entre outras ações, é
necessário fomentar e articular no setor produtivo a formação de quadros profissionais e a
capacidade tecnológica por um lado, e promover atividades interdisciplinares que
potencializem a capacidade de resposta, em termos de tempo e conteúdo, das universidades e
centros de pesquisa à demandas das empresas.
Em relação à proteção do conhecimento, o Diretor da Universitec considera que a
UFPA tenha competência e estrutura para seu exercício. A UFPA possui uma área específica
de propriedade intelectual desde 2000, que realiza registros de interesse da instituição. Na
Figura 4 são apresentados o quantitativo anual de registros publicados junto ao INPI pela
UFPA:
Figura 4 - Registros de pedidos de patentes da UFPA publicados junto ao INPI.
Fonte: UFPA (2012).
0
1
2
3
4
5
6
7
2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010
Número de pedidos de registro de patentes da UFPA
publicados junto ao INPI no período de 2001 a 2010.
116
No entanto, o primeiro processo pelo qual uma patente da UFPA foi objeto de acordo
de licenciamento é o referente aos produtos inovadores baseados em compostos antioxidantes
de açaí em estudo, assinado em outubro de 2013. Assim, embora a universidade tenha
experiência em realizar proteção do conhecimento, o caso em estudo foi a primeira
experiência de licenciamento para comercialização de uma patente.
De modo geral, compreendemos que a UFPA possui capacidades tecnológicas
vinculadas as atividades de pesquisa científica básica e aplicada em bases de conhecimento de
biotecnologia, e com foco de interesse na biodiversidade da região. Contudo, identificamos
dificuldade com a articulação com o setor produtivo, o que implica em duas deficiências
principais: a pouca interação em projetos de desenvolvimento tecnológica com o setor
produtivo que reduz sensibilidade da Universidade às direções e velocidades adequadas de
busca inovativa; e a falta de experiências relacionadas à transferência e comercialização de
tecnologias produzidas pela Universidade para efetiva aplicação produtiva, antes do
desenvolvimento da inovação em estudo.
Não foi aplicada à UFPA a análise de padrão de mudança técnica, em virtude do
framework elaborado por Bell e Pavitt (1993) ser focado em organizações do setor produtivo
industrial, de forma que esta análise é desenvolvida nesta pesquisa somente para a Amazon
Dreams e Belaiaçá. Também não buscamos discutir capacidades de produção quanto à UFPA,
pela sua natureza de instituição de C&T pública não vinculada a objetivos de produção
comercial de bens.
3.3.2 Amazon Dreams
A Amazon Dreams (AD) é uma pequena empresa de base tecnológica que tem como
objetivo desenvolver produtos de alto valor agregado baseado na biodiversidade da
Amazônia, utilizando os recursos naturais da região de forma sustentável (AMAZON
DREAMS, 2013).
A empresa desenvolve suas atividades em três eixos principais: Processos de extração
de compostos antioxidantes de espécies vegetais amazônicos (1); processo de purificação de
compostos antioxidantes (2); e, controle de qualidade dos processos e produtos desenvolvidos
(3).
A AD foi criada em 2002 por pesquisadores e ex-alunos da Faculdade de Engenharia
de Alimentos do ITEC da UFPA. Nesta trajetória inicial, a AD pode ser caracterizada como
117
uma firma nascente do transbordamento da UFPA (spin off), conforme Rapini (2007), uma
vez que foi formada por pesquisadores e ex-alunos desta universidade.
Em entrevista concedida por um dos sócios, o objetivo da criação da empresa era
transformar a tradicional lógica de produção e comercialização extrativista para exportação de
commodities da região, por meio do desenvolvimento tecnológico de produtos baseados no
aproveitamento sustentável de sua biodiversidade. Identifica-se que a construção do modelo
de negócio envolveu uma noção de geração de desenvolvimento regional com base no
conhecimento científico e tecnológico visto como uma finalidade socialmente relevante, de
modo que trazia em seu escopo anseios acadêmicos e empresariais.
Logo nos primeiros anos de criação, a AD teve seu funcionamento baseado no
processamento de polpas, mas em 2006 começa em conjunto com a UFPA o desenvolvimento
de produtos com maior complexidade tecnológica. Em 2009, já tendo protocolado junto ao
INPI o pedido de patente do processo tecnológica de produção da primeira linha de produtos a
base de açaí desenvolvido em parceria com a UFPA, a AD se candidatou como forma de
capitalização do negócio ao Fundo Criatec de Capital Semente do BNDES e BNB para
investimentos de capital de risco no Brasil, parte de uma política nacional de incentivos a
atividades empresariais inovadoras.
A AD foi selecionada para obtenção do financiamento e, no conjunto de 50 empresas
do país, foi a única empresa da região norte. Amato Neto e Amato (2009) citam a relevância
da criação de fundos especiais, por parte do governo, para o financiamento de inovação nas
empresas, de modo que estas possam realizar investimentos que visem o aumento de
competitividade e eficiência. Estes fundos permitem que as empresas de pequeno porte
compartilhem riscos e incertezas, e nesta perspectiva, o aporte de capital do Fundo Criatec
representou uma importante contribuição de capital a AD, uma vez que o processo de
desenvolvimento tecnológico foi longo, e sua produção efetiva requeria investimento para
instalações industriais.
O Fundo Criatec realizou um aporte de R$1.500.000,00 (um milhão e quinhentos mil
reais) a AD, e também trouxe outros benefícios, como acesso a contatos empresariais em
nível nacional e a programas de aceleração de processos de negócio, inclusive com suporte a
serviços de consultoria, estruturação de auditorias e controles formais na empresa. Como
exigência da operação de financiamento, também houve a alteração da natureza jurídica da
empresa que passou para o formato de Sociedade Anônima.
Esta mudança implicou na constituição de uma estrutura de governança mais
complexa na AD, pois o Fundo Criatec passou a compor seu quadro de acionistas, com 51%
118
de suas ações. O objetivo do compartilhamento de ações era proporcionar maior grau de
controle formal entre os sócios originais da AD e o Fundo Criatec, e o estabelecimento de
mecanismos de monitoramento de desempenho da gestão e alinhamento dos incentivos entre
as partes (GULATI; SINGH, 1998). Nota-se também com a aproximação da AD ao processo
de capital venture e atividades a ele relacionadas a conduz a uma maior imersão no setor
empresarial, que antes era centrada em sua forte relação com a universidade.
Uma dificuldade informada no relacionamento da AD com o Fundo Criatec se refere a
pouca intensidade de interação, pois não há escritórios do BNDES e/ou BNB na região Norte,
e como a AD foi a única empresa da região contemplada no programa, o agente do fundo
responsável pelo acompanhamento da empresa tem como base a região sudeste do país, e na
percepção da AD, isso tem como consequência contatos menos frequentes do Fundo, e um
menor entendimento deste do contexto local de atuação da empresa.
Além do aporte financeiro do BNDES, a AD conseguiu aportes complementares por
meio de prêmios e programas de fomento à inovação (estes aportes complementares até
dezembro de 2012 atingiram o equivalente 85% do aporte do Fundo Criatec). Os principais
prêmios foram: Em 2010, conquistou o Prêmio Professor Samuel Benchimol e Banco da
Amazônia de Empreendedorismo Consciente de abrangência regional; em 2011 ganhou o
Prêmio SEBRAE/FNQ Estadual de Competitividade de Micro e Pequenas Empresas do Pará;
e, em 2012, ganhou o Prêmio FINEP de Inovação na categoria micro e pequena empresa na
etapa regional (Norte) e nacional.
Entre os programas de incentivo à inovação, os principais em que conseguiu aporte de
recursos foram: o Programa de Formação de Recursos Humanos em Áreas Estratégicas
(RHAE) do CNPq; Agentes Locais de Inovação (ALI) do SEBRAE; e, o Programa de
Subvenção à Pesquisa em Microempresas e Empresas de Pequeno Porte nas Regiões Norte,
Nordeste e Centro-Oeste (PAPPE Integração) da FINEP.
Atualmente, a empresa possui em seu portfólio de produtos, além da linha de produtos
do açaí (Puro Antioxidante de Açaí, Açaí Clarificado e Óleo Refinado de Açaí), um Puro
Antioxidante a base de folhas da árvore de Ingá, e um Puro Antioxidante de a base de folhas
da árvore de Muruci, ambos também desenvolvidos em parceria com a UFPA.
- Capacidades de produção e tecnológicas:
Inicialmente cabe esclarecer que a análise referente a capacidades de produção e
tecnológica, conforme conceito de Bell e Pavitt (1993) e Figueiredo (2011), se baseia em
informações concedidas em entrevistas e pesquisa documentais, nas quais se buscou
119
identificar avanços relatados, mas sem a construção de matriz sistematizada de evolução de
níveis capacidades.
A AD desenvolveu capacidade de elevada complexidade em um nicho de negócio
relacionado à tecnologia de processos para extração, fragmentação e purificação de bioativos,
qual tem buscado expansão na base de ativos com que trabalha para o desenvolvimento de
novos produtos, com previsão de lançamento de produtos de 4 a 6 bioativos diferentes em
fase de P&D. Segundo sócio da AD:
Desenvolvemos um pool de competências sobre os usos potenciais desses extratos, partes deles, hoje a gente trabalha com atividades anti inflamatórias, atividades
cicatrizantes, antialergênica, e anticancerígenas, existe muitas outras atividades, mas
a gente se focou nessas quatro porque são muito compatíveis com cosméticos.
(Informação verbal).7
Conforme relato de sócio da AD, houve melhoria de desempenho de P&D da empresa
nas atividades inovativas desde o primeiro desenvolvimento (linha do açaí) em relação ao
tempo requerido de desenvolvimento, cujo processo inicial levou 60 meses, e dos novos
produtos levaram 30 meses8.
Também se observa que durante a fase de desenvolvimento da linha de produtos do
açaí, havia maior concentração da equipe nesta base de ativos e, atualmente, há o
desenvolvimento de produtos de múltiplos bioativos. O alcance de um processo de P&D mais
eficiente e diversificado indica aprendizado e melhoria da capacidade de desenvolvimento
tecnológico da AD.
Compreende-se que a capacidade organizacional está amparada por um quadro de
profissionais com elevada qualificação na empresa, de modo que, conforme dado de
dezembro de 2012, 45% de seus membros eram mestres ou doutores (AMAZON DREAMS,
2012). Também se constata a concentração de profissionais na área de P&D da empresa em
comparação com as demais, de acordo com a Figura 5 a seguir:
7 Entrevista concedida pelo sócio da Amazon Dreams em 13/01/2014.
8 Anotação em diário de campo durante visita técnica.
120
Figura 5 - Gráfico de distribuição de membros da Amazon Dreams por departamento (em dezembro
de 2012).
PD&I
55%
Produção
17%
Back Office
11%
Diretoria
17%
Distribuição de membros da Amazon Dreams por
departamento (em dezmbro/2012)
Fonte: Amazon Dreams (2012).
Contudo, este gráfico revela outra questão sobre as capacidades da empresa, pois se
por um lado a AD desenvolveu capacidades tecnológicas relevantes, por outro lado, possui
deficiências em termos de capacidade produtiva para operação de lotes industriais grandes,
tanto em termos de limite de volume processamento da planta industrial, quanto em termos
capacidades gerenciais em relação a rede de suprimentos e logística, com obtenção de
certificações internacionais.
A limitação em relação a capacidade de produção de lotes de produtos em grande
volume é relevante, pois o segmento de mercado da linha de produtos do açaí é focado no
fornecimento à grande indústria de cosméticos e alimentos, que precisa de uma escala de
abastecimento grande, e suficiente para oferta regular do produto final ao consumidor, o que é
uma característica já discutida em termos dos desafios de cadeias produtivas da
biodiversidade (ENRÍQUEZ, 2003, p. 186; CGEE, 2007, p. 22). Essa demanda de
fornecimento industrial associada aos entraves de safra do açaí torna-se complicador
adicional, pois exige uma capacidade de processamento da linha de produtos concentrada
somente durante a safra do açaí, que produza o suficiente para todo o fornecimento anual de
matéria prima para os clientes industriais.
Além da capacidade de processamento da linha de produtos, ainda há a necessidade de
capacidades gerenciais vinculadas, uma destas é a de gerenciamento da rede de suprimentos
do açaí, que requer habilidades de garantir o fornecimento em um mercado com concorrência
acirrada pela matéria prima (COSTA, F., 2009, p. 345), e de obter certificados internacionais
de procedência.
121
Entendemos que por um lado esta configuração de capacidades com ênfase
tecnológica da empresa pode representar uma estratégia de especialização da empresa ao
buscar um nicho de mercado viável para seu tamanho (pequena empresa) e limitações de
investimentos, contudo, por outro lado, a carência de capacidades relacionadas a produção
pode fragilizar a posição da empresa quanto as condições de apropriabilidade sobre o
resultado a ser gerado pela inovação. Esta limitação de capacidades nos termos estabelecidos
por Teece (1986) pode corresponder a fragilidades seja pelo aumento do poder de barganha de
empresas detentoras destas capacidades produtivas em eventual acordo de comercialização de
tecnologia, seja frente a concorrentes diretos que detenham tais capacidades de produção e
possam desenvolver produtos similares.
- Padrão de mudança técnica:
Como indicado anteriormente, o padrão setorial de mudança técnica (BELL; PAVITT,
1993) é um instrumento de análise ao nível de empresa, usado para identificar o perfil típico
de atividade inovativa de um setor. Neste caso particular de estudo, o padrão de mudança
técnica é utilizado como uma referência de pontos de exame ao nível de cada empresa para
auxiliar na caracterização das atividades inovativas destas empresas.
De acordo com os padrões de mudança tecnológica, identifica-se a AD como uma
empresa de base científica, conforme pontos de análise na Tabela 7.
122
Tabela 7 - Análise do padrão de mudança técnica da Amazon Dreams.
Variáveis de
análise
Padrão de Mudança
Técnica:
Base científica
Observações de análise sobre a Amazon Dreams
Setores típicos Químico, biotecnologia,
eletrônico.
Considera-se biotecnologia um campo típico para esta
estratégia de mudança técnica, em função de requerer
substancial intensidade tecnológica e processos de
bioprospecção para desenvolvimento de produtos.
Tamanho de
empresas Grande
Neste ponto não há aderência ao padrão de grande empresa,
mas conforme Enríquez (2003, p. 181) em virtude da ascensão
base de conhecimento específica da biotecnologia, o perfil de pequenas empresas com atuação em nichos de mercado
tecnológico surge como uma possibilidade viável de
competitividade. Esta constatação também é encontrada em
Powell, Koput e Smith-Doerr (1996) sobre pequenas empresas
de biotecnologia atuando no setor farmacêutico em parcerias
com as grandes empresas globais.
Tipo de usuários Sensível a preço e
desempenho
Os produtos devem se basear em elevado desempenho
diferencial, em comparação com os produtos existentes
(particularmente aqueles baseados em química sintética),
mantendo a proporção de custo/benefício equilibrada. Um
exemplo é o puro antioxidante de açaí desenvolvido, conforme
informações da AD, possui desempenho 66% superior ao líder de mercado, em termos de ORAC*/USD.
Principais focos
das atividades
tecnológicas
Redução de custo e
melhoria de produto
Ao considerar o desempenho acima, verifica-se que o produto
desenvolvido oferece a empresa compradora menor custo por
desempenho superior.
Principais fontes
de acumulação
tecnológica
P&D interno; pesquisa
básica; engenharia de
produção; Design de
produto
Principais fontes da AD indicadas baseadas em sua capacidade
de P&D em termos de produto e de definição de processos de
produção complexos.
Principal direções
da acumulação
tecnológica
Desenvolv. de
tecnologias para
produtos
(concêntrica: alta
diversificação com foco no mesmo setor)
Foco da AD é o desenvolvimento de tecnologias de extração,
fragmentação e purificação de bioativos, o que tem buscado
aplicar a várias espécies da biodiversidade da região, para
diversificação de portfólio.
O foco geral dos produtos é nos setores de cosméticos,
alimentos funcionais, e saúde e nutrição. O setor farmacêutico
é considerado uma oportunidade, no entanto não efetivada por envolver processos regulatórios e institucionais mais
complexos depende de interações e alinhamento com
demandas de pesquisas específicas.
Principais canais
de imitação e de
transferência de
tecnologia
Engenharia reversa;
P&D; contratação de
pessoal técnico
especializado
Os três principais meios de absorção de conhecimento e
transferência tecnológica identificados na AD são P&D,
contratação de pessoal especializado para equipe científica
(particularmente com apoio do RHAE) e cooperação com
instituição de C&T (principal UFPA).
Principais meios de
apropriação
(proteção contra
imitação)
Patentes, know-how em
P&D, know-how em
projeto e operação
Os dois meios de apropriação usados são patentes e sigilo.
Principais
incumbências
administrativas de
caráter estratégico
Desenvolv. de produtos afins; exploração da
ciência básica; obtenção
de ativos
complementares
Principais atividades identificadas foram o desenvolvimento
de produtos similares (antioxidantes puros) a base de outros bioativos da Amazônia, em geral cujas propriedades
bioquímicas já tenham sido objeto de pesquisas anteriores na
universidade; e a busca de parceria para produção de grandes
lotes industriais, em função de não possuir capacidade de
produção suficiente.
*ORAC: Oxygen Radical Absorbance Capacity.
Fonte: Itens de análise (coluna 1) baseados em Bell e Pavitt (1993, p. 180); e conteúdo das análises (colunas 2 e
3) da autora.
123
Compreendemos que a AD tem evoluído para a especialização no nicho de mercado
B2B9 (business to business) de bioprospecção e desenvolvimento tecnológico de produtos de
alto desempenho antioxidante baseado em ativos de biodiversidade da Amazônia, o que se
caracteriza pela necessidade de uma forte interação tanto com instituições de pesquisa e como
com empresas.
Esta estratégia é exemplificada por Enríquez (2003, p. 181) no sentido em que
pequenas empresas de base biotecnológica, que têm buscado uma especializado em nichos de
pesquisa de bibliotecas de compostos (bioprospecção) e no desenvolvimento de tecnológico
da aplicações em produtos primários às indústrias maiores.
De forma geral, entendemos que a AD tem se apresentado bem sucedida no
desenvolvimento de capacidades tecnológicas e no reconhecimento das inovações
tecnológicas realizadas, de acordo com prêmios e projetos de financiamento captados,
entretanto demonstra baixo desenvolvimento de capacidade de produção, o que pode
fragilizar as condições de apropriabilidade sobre as inovações desenvolvidas.
9 O mercado B2B (business to business) representa um segmento de comercialização entre empresas, sem
envolver o consumidor final.
124
Figura 6 - Imagens da marca, produtos e reportagens da Amazon Dreams. Marca:
Açaí
Clarificado
Óleo Refinado de
Açaí
Açaí Puro
Antioxidante
Exemplo de embalagens de produtos:
Matérias primas de produtos:
Inserções na imprensa:
Fonte: Amazon Dreams (2012).
Nas imagens da figura 6, na primeira linha mostramos a identidade visual da marca da
empresa que realça a comunicação em relação a tecnologia em antioxidantes, e também as
fotos dos três produtos desenvolvidos no âmbito da linha de compostos baseados em açaí. Na
125
segunda linha, demonstramos os três ativos da biodiversidade que a Amazon Dreams
divulgou (até o momento de finalização desta dissertação) como produtos antioxidantes
desenvolvidos. E, por fim, na terceira parte, há algumas inserções da empresa na imprensa
referente tanto a prêmios recebidos como a repercussão do desenvolvimento da linha de
produtos inovadores.
3.3.3 Belaiaçá
A empresa Belaiaçá é uma indústria de processamento de frutas de médio porte, tendo
o açaí como principal base de produto, atua no mercado nacional e internacional
(BELAIAÇA, 2014; SILVA, 2013). A empresa possui quatro plantas industriais, sendo duas
no estado do Pará (município de castanhal), uma no Amapá (para funcionamento no período
da entressafra no Pará), e outra no Ceará.
A Belaiaçá faz parte do grupo Petruz, seu portfólio de produtos se baseava
principalmente na polpa de frutas, particularmente do açaí, e recentemente desenvolveu uma
diversificação para produção de sorvetes e bebidas mistas de açaí, além da ampliação das
frutas processadas, em função da sazonalidade do açaí, de forma a melhor utilizar a estrutura
industrial instalada.
A Belaiaçá foi criada em 2005 com a instalação de sua primeira planta industrial em
Castanhal, seus proprietários tinham longa experiência com o transporte e comercialização do
açaí in natura, com a atividade de intermediação ao comprar de coletores e produtores e
vender a agroindustriais e batedores (SILVA, 2013). Durante os anos de 2003 e 2004,
operaram uma planta industrial alugada em Belém quando fizeram contatos com grandes
clientes, e um desses clientes, em 2005, ofereceu uma antecipação para montagem de
infraestrutura própria de produção, a qual seria paga por meio do fornecimento de produtos
durante a safra do açaí, somado a este recurso, os proprietários aportaram recursos
complementares para a montagem da fábrica (SILVA, 2013).
Foi fundamental a parceria dos clientes para o desenvolvimento dessas industriais,
mas a gente não vê nenhum investimento do próprio governo para potencializar as
indústrias que estão aqui dentro que vão trazer benefício para cá mesmo... Mas
imagina só se o Governo do Estado tivesse alinhado com esse crescimento que
aconteceu com o mercado de açaí e melhorasse, desse condições para poder a coisa acontecer. A Bolt House, por exemplo, ela veio para cá para o Pará para gerar
emprego e renda, e ela só funciona 24 dias por ano, e a maioria dos profissionais que
trabalhavam lá a nível técnico eram de fora, não gerava essa quantidade toda de
emprego, e ela ganhou todos os benefícios, ganhou um terreno, ganhou todos os
benefícios que as indústrias que são daqui do Pará não tem. (Informação verbal)10
10 Entrevista concedida pelo Diretor de Marketing da Belaiaçá em 09/01/2014.
126
Em um ano de operação a empresa dobrou seu volume de produção e começou a
exportar (SILVA, 2013). E a partir de 2006 até 2009, estimulada pela crescente demanda do
açaí, a empresa realizou uma expansão de sua estrutura industrial, implantou uma unidade de
produção e distribuição no Ceará (município de Maracanaú), e posteriormente adquiriu outras
unidades, sendo uma em Castanhal e outra no Amapá (município de Santana) (SILVA, 2013).
O crescimento da produção e expansão da atuação geográfica trouxe uma maior
complexidade às operações, considerando ainda a logística de contratações e de matérias primas
para o volume demandado. Deste modo, em 2010, a Belaiaçá conduziu um processo de
reestruturação administrativa, auxiliada por uma consultoria em gestão empresarial para estruturar
o modelo de negocio, além do quadro profissional técnico e gerencial (SILVA, 2013).
Esta reestruturação orientou um processo de diversificação do portfólio de produtos da
empresa, com o desenvolvimento de produtos focando novos mercados. Segundo entrevista
concedida pelo Diretor de Marketing da Belaiacá, a empresa buscou uma diferenciação das
demais agroindústrias da região que baseiam sua produção somente na polpa do açaí para
fornecimento a grandes indústrias nacionais. Por isso, a Belaiaçá passou a desenvolver
produtos para o mercado de autoserviço voltado para o consumidor final, comercializado por
canais de venda como supermercados e lojas de varejo.
É, desses produtos formulados, (nos diferenciamos) das outras industriais de açaí,
porque a gente, na verdade, fez o que lá em São Paulo já fazem com o nosso
produto, mas como marca, como produto, como fábrica daqui, local, nós somos os
primeiros de fato. (Informação verbal)11
Com foco neste mercado, a Belaiaçá realizou o desenvolvimento de produtos como o
mix de açaí com frutas, polpas de açaí diferenciadas (como o açaí adoçado para consumo
local), e a bebida mista de açaí com camucamu e soja. Estas inovações foram realizadas pela
área de P&D interna, algumas baseadas em modelos de produtos já difundidos no mercado
por grandes industriais nacionais, como o caso do mix de açaí com frutas, e outras como
inovações incrementais de produtos existentes, como a polpa adoçada e a bebida mista.
A empresa também identificou uma oportunidade no mercado para produtos de
ingredientes (compostos para produção industrial) junto a indústria de alimentos funcionais e
nutrição durante seu processo de planejamento estratégico em 2010, no entanto, reconheciam
também que a entrada neste setor exigiria inovações de produtos com maior densidade
tecnológica que a empresa não detém em suas capacidades internas12
.
11 Entrevista concedida pelo Diretor de Marketing da Belaiaçá em 09/01/2014. 12 Anotação em diário de campo durante visita na Belaiaçá acompanhada pelo Diretor de Marketing.
127
Cabe indicar que, a polpa do açaí e seus demais produtos derivados representam em
torno de 90% da produção anual da Belaiaçá, sendo também a principal fonte de renda
(SILVA, 2013). A empresa também passou a comercializar os resíduos provenientes do
processamento de frutas, particularmente os caroços de açaí (vendido como biomassa), e
resíduos de outras matérias primas para processamento de óleos e outros produtos
alimentícios (sementes de cupuaçu, maracujá, bacuri) (SILVA, 2013).
- Capacidades de produção e tecnológicas:
A Belaiaçá se destaca pelo desenvolvimento de sua capacidade de produção, de forma
rápida, iniciando suas instalações em 2005, e alcançando nível de exportação já em um ano
(2006), realizando expansões de plantas industriais nos três anos seguintes. Atualmente,
conforme o Diretor de Marketing a empresa não possui problemas relacionados a capacidade
de volume de produção industrial, e, em termos de ampliação produtiva, quando necessário,
executa-se um planejamento de aumento de turnos de trabalho para intensificar a
produtividade das plantas existentes13
.
As funções críticas identificadas são em relação a gestão da cadeia de suprimento do
açaí, o alcance de escala produtiva larga, e a produção e comercialização do açaí em padrão
de exportação que atendam a diversos certificados internacionalmente reconhecidos.
Sobre a rede de suprimento do açaí in natura para a indústria, esta é uma atividade
liderada diretamente por dois sócios, baseados em sua extensa experiência na atividade
anterior de logística e comercialização.
Os donos daqui da fábrica eles iniciaram comprando frutos, eles tem muito
conhecimento no campo, então eles conhecem o seu José da comunidade fulano de
tal, então, assim, nas comunidades ribeirinhas eles são muito conhecidos, e, assim,
por eles terem uma origem humilde, eles honram muito com pagamento... eles têm
uma credibilidade muita boa, um nome muito bom no campo, então tem muita gente
que quer vender para a fábrica... e como eles já tiveram do lado do fornecedor, tem
muita fábrica que por exemplo estipula que quer comprar 100 latas, se o cara tiver
com 150, ele não vai comprar as 150, ele só quer as 100. Aqui na fábrica, pelo fato
da gente ter um volume grande de produto, e pelo fato deles já terem trabalhado
como fornecedor, eles jamais deixam fornecedor joga fruto fora, se tem 150 a gente
dá um jeito e traz os 150 para processar, isso os fornecedores amam. (Informação verbal)14
A Belaiaçá possui estrutura própria de transporte e logística, e comunidades e
cooperativas fornecedoras “fidelizadas”, a empresa desenvolveu uma relação de confiança
junto a essas comunidades, e já realizou, quando necessário, melhorias na estrutura de
13 Anotação em diário de campo durante visita à Belaiaçá acompanhada pelo Diretor de Marketing. 14 Entrevista concedida pelo Diretor de Marketing da Belaiaçá em 09/01/2014.
128
escoamento de comunidades (como a construção de pontos de ancoragem), e em geral faz
antecipações financeiras a esses fornecedores durante a entressafra, o que garante certo nível
de comprometimento dessas comunidades para com a empresa.
Quem faz as compras até hoje são dois sócios... porque eles sabem como lidar com
as pessoas, eles conhecem, então eles vão até as comunidades, passam para a
comunidade o volume que a gente vai precisar, a comunidade vai dizer olha eu
consigo de fornecer tanto por semana, eles começam a adiantar o dinheiro antes da
safra começar... Um dos motivos é para garantir que eles vão vender realmente para
a gente porque na época da safra existe a concorrência muito grande, é uma forma de firmar aquele contrato. (Informação verbal)15
O Diretor de Marketing da Belaiaçá também indica que há conhecimento na empresa
de certo mapeamento do tipo de fruto que cada região, em relação a paladar, cor e densidade.
Existem algumas comunidades que fornecem um açaí melhor, então a gente
seleciona aquela região que o fruto que dá maior rendimento, que tem uma cor
melhor, que o sabor é melhor, e tudo é contratado antes da safra começar.
(Informação verbal)16
Esta capacidade de garantir matéria prima em grande volume é fundamental para a
produção e comercialização em grande escala de seus produtos, uma vez que há competição
pelo fruto durante a safra entre as agroindustriais locais como indicado em F. Costa (2009, p.
345). Em relação a política interna de preços de compra de matéria prima (açaí), conforme
informação do Diretor de Marketing da Belaiaçá, hoje o preço do açaí em Belém, e
municípios próximos, é definido diariamente pelo preço negociado no ver-o-peso.
Ele (preço de compra do açaí) é estipulado pelo mercado, e a gente tem um comprador que fica lá no ver-o-peso, então o valor do açaí que dá lá no ver-o-peso é
o valor geralmente que vai ser praticado no outro dia no campo, ou então em torno
daquele valor. (Informação verbal)17
Os preços do açaí como matéria prima, assim, são definidos por região de
comercialização, independente do produto que será produzido, o que é direcionado
internamente pela empresa, somente há diferenciação para o açaí orgânico, no qual ao preço é
acrescentado uma bonificação de R$0,50.
15 Entrevista concedida pelo Diretor de Marketing da Belaiaçá em 09/01/2014. 16 Entrevista concedida pelo Diretor de Marketing da Belaiaçá em 09/01/2014. 17 Entrevista concedida pelo Diretor de Marketing da Belaiaçá em 09/01/2014.
129
Existem alguns produtos, por exemplo, o fruto que vem do Marajó, ele é mais caro
que o fruto que vem de Igarapé Mirim, e o fruto do Marajó é um fruto que a gente
usa para fazer produto formulado porque ele é melhor. Mas só que é assim, porque
que a gente faz isso, porque lá no mercado de Marajó esses produtos não se
encontram, eles estão em regiões diferentes, dá para trabalhar por região, mas eu não
digo que eu pago um real mais caro se você me der o açaí Premium, não, a gente
mesmo seleciona internamente, tá pagando o valor de mercado, não tá pagando mais
caro por isso. O fruto orgânico sim a gente paga 50 centavos mais caro quando o
fruto é orgânico, até para incentivar os agricultores a trabalhar com os conceitos de
orgânico que é vantagem para gente, eles e para todo mundo. (Informação verbal)18
Neste sentido, percebemos que a comercialização do fruto do açaí in natura tem uma
comercialização próxima a de uma commodity, cujo preço é determinado por mecanismos
com ênfase em demanda e oferta e por região de comercialização, ainda que sejam
reconhecidas diferenças qualitativas entre frutas de uma mesma região por parte da
agroindústria, que diferencia tais frutos no momento de sua produção. Assim, a
comercialização de um produto mais agregado e mais valorizado economicamente pela
agroindústria não gera necessariamente um desdobramento de benefícios a montante da
cadeia produtiva, visto que a maior parte do mercado se baseia na produção em larga escala
de polpa do fruto, um produto com pouca agregação tecnológica e com valor de
comercialização com menor poder de barganha junto aos clientes industriais.
No que tange ainda a capacidade de produção em larga escala, esta se desenvolveu de
forma conjunta com o atendimento de requisitos para exportação, quanto a diversas
certificações exigidas por clientes internacionais e regulamentos nacionais sobre legislação de
segurança alimentar e vigilância sanitária. Os principais certificados da empresa são a ISO
22.000 e o GMA-SAFE em relação a segurança de alimentos para o consumo final,
certificados junto a órgãos regulatórios de países estrangeiros como USDA (United States
Department of Agriculture) para acesso ao mercado norte-americano, e JAS (Japan
Agriculture Standard) para acesso ao mercado orgânico japonês. Além disso, a Belaiaçá
realizou certificações específicas como o Kosher (atendimento de normas específicas da dieta
judaica ortodoxa) e o Halal (atendimento a normas da cultura mulçumana), e certificados de
agricultura orgânica dos produtos.
Conforme indicação do Diretor de Marketing, a empresa não possui certificados
relacionados a “comércio justo” (um selo com ênfase maior no atendimento de aspectos
sociais, que ambientais de sustentabilidade), o qual já foi mencionado por clientes,
principalmente da Europa, mas nunca exigido.
18 Entrevista concedida pelo Diretor de Marketing da Belaiaçá em 09/01/2014.
130
Clientes da Europa geralmente valorizam muito este tipo de certificado (comércio
justo), mas só que nunca foi um requisito. Os outros não, se não tiver o orgânico dos
Estados Unidos não vou conseguir vender, aí a gente pegou e foi... (Informação
verbal)19
Como certificações internacionais correspondem a custos muitas vezes elevados para a
empresa, esta, em geral, somente realiza as certificações quando se caracterização como
exigências à comercialização, com exceção dos selos Kosher e Halal, que de acordo com o
Diretor de Marketing a adesão foi voluntária da empresa.
Já as outras certificações, porque têm várias outras, a gente só seguia nelas quando o
cliente pedia, por exemplo o GMA-safe, o cliente disse, olha, na próxima safra eu só
compro se você tiver esse certificado, a gente foi e certificou. Pra não ser um custos a mais, até porque pra determinadas certificações o custo de trazer um auditor
internacional... a gente só investe se realmente tiver a necessidade e for cobrado... é
sempre o mercado que impulsiona esses certificados. (Informação verbal)20
[...] O certificado, ele agrega valor ao produto. Halal e Kosher, por exemplo, a gente
certificou sem ser cobrado, sem ninguém pedir, porque a gente entendia que quando
eu vendo no mercado internacional o consumidor final destes produtos pode ser um
judeu ou árabe. (Informação verbal)21
Segundo o Diretor de Marketing, os clientes informam a empresa quais serão as
exigências em termos regulatórios, incluindo de critérios de sustentabilidade, que serem
requisitos para compras na safra seguinte, de modo que a empresa faça as adaptações de
processo e certificações. Atualmente, “selos” relacionados a critérios de sustentabilidade são
basicamente de produção orgânica. Ao considerar o conceito de tipo de comportamento
organizacional de reposta de Sharma e Vredenburg (1998), essa postura da empresa se
caracteriza como reativa.
No entanto, a empresa esclarece que possui alguns critérios de aquisição do açaí, em
que 95% de sua matéria prima é comprada junto a comunidades fornecedoras extrativistas de
origem de açaizais nativos, e que não estimulam estas a trabalharem com o fornecimento de
palmito na entressafra, devido a necessidade de cortes e devastações na várzea.
A gente compra de área que é nativa, natural. Nós não valorizamos a cooperativa
que faz palmito porque a gente entende que o palmito, ele precisa desmatar para
poder tirar, e hoje existem fazendas que plantam o açaí só para tirar o palmito, e eu
acho que tem que ser assim mesmo e não tirar de uma vegetação natural.
(Informação verbal)22
19
Entrevista concedida pelo Diretor de Marketing da Belaiaçá em 09/01/2014. 20 Entrevista concedida pelo Diretor de Marketing da Belaiaçá em 09/01/2014. 21 Entrevista concedida pelo Diretor de Marketing da Belaiaçá em 09/01/2014. 22 Entrevista concedida pelo Diretor de Marketing da Belaiaçá em 09/01/2014.
131
Apesar de reconhecer como válidas as preocupações da empresa, principalmente
quanto a manutenção de renda as comunidades extrativistas, lembra-se que especialistas tem
levantado fortes advertência (verificadas no capítulo 2) quanto à pressão pelo crescimento da
produção de açaí em áreas de várzea, e que mesmo áreas de açaizais nativos, hoje em dia,
sofrem intensas intervenções de manejo, cujos efeitos sistêmicos ainda não podem ser
estimados em relação a manutenção do ecossistema de várzea. Assim, a enorme demanda de
volumes de produção de açaí para atendimento de mercados locais, nacionais e internacionais,
segundo especialistas (HOMMA et al, 2006; SILVA; SANTANA; REIS, 2006) não poderá
ser atendida de forma sustentável exclusivamente em áreas de várzea.
Deste modo, entendemos que ao nível da cadeia produtiva, os desafios para assegurar
a sustentabilidade tornam-se mais complexos, que soluções de empresas individuais, uma vez
que a interdependência das ações e estratégias adotadas por atores individuais precisariam ser
alinhadas.
Ainda em relação às capacidades tecnológicas, observamos que há avanços da
Belaiaçá no sentido de desenvolver seu departamento de P&D:
A gente tem um plano de investimento, e dentro do plano de investimento a gente
pega uma parte desse valor e coloca para pesquisa e desenvolvimento... esse ano,
por exemplo, a gente vai investir em ampliação de laboratório, a gente vai comprar
mais equipamentos para poder fazer análises mais específicas. (Informação verbal)23
Em síntese, entendemos que a Belaiaçá iniciou esforços de inovações internas em
produtos a partir de 2010, principalmente baseados em mudanças incrementais de produtos já
difundidos no mercado nacional, diversificando seu portfólio, no entanto, estas inovações
ainda não se caracterizam por uma substancial acumulação tecnológica industrial.
23 Entrevista concedida pelo Diretor de Marketing da Belaiaçá em 09/01/2014.
132
Figura 7 - Imagens do site, produtos e instalações da Belaiaçá. Site da empresa:
Mix de Açaí com
Banana
Bebida Mista de Açaí
com Soja e Camu Camu
Fachada de uma planta industrial no município de Castanhal:
Estrutura de Processamento Industrial
Fonte: Belaiaçá (2014).
Na figura 7, apresentamos na primeira linha a página inicial do site da empresa, em
que é ressaltada a responsabilidade ambiental de produção, e fotos de dois produtos
desenvolvidos internamente. Na segunda e terceira linha, demonstramos fotos externa e
interna da instalação da empresa em Castanhal (Pará), cuja produção segue padrões de
qualidade internacionalmente reconhecidos.
133
- Padrão de mudança técnica:
De acordo com os padrões de mudança tecnológica, identifica-se a Belaiaçá como uma
empresa ainda mais próxima da categoria de dominada pelo fornecedor, em virtude suas
mudanças técnicas se caracterizarem por processos de difusão de inovações e melhores
práticas, embora se reconheça a emergência de alguns aspectos de busca inovativa mais
independente, conforme pontos de análise da Tabela 8.
Tabela 8 - Análise do padrão de mudança técnica da Belaiaçá.
Variáveis de
análise
Padrão de Mudança
Técnica:
Dominado por
fornecedor
Observações de análise sobre a Belaiaçá
Setores típicos Agricultura, têxteis,
madeireiro
A cadeia do açaí possui industrialização recente, e a maior parte de suas agroindústrias trabalha com produto de baixo
agregação tecnológica (polpa), com forte dependência de
conhecimento dos fornecedores de sistemas industriais.
Tamanho de
empresas Pequeno
A empresa nos últimos sofreu processo de expansão, hoje configurando-se como uma empresa de médio porte conforme
legislação nacional.
Tipo de usuários Sensível ao preço
O principal produto da agroindústria, e da empresa ainda é a polpa, que é reconhecido pela Belaiaçá sendo altamente
sensível ao preço. A estratégia de diferenciação de produtos
busca desviar a empresa de competições mais predatórias e
buscar produtos de maior valor agregado, mas dada a novidade
destes novos produtos, eles ainda não possuem consolidação
no mercado.
Principais focos
das atividades
tecnológicas
Redução de custo Atividades nos departamentos de produção buscam metas de redução de custos, apesar de neste caso haver forte busca de
melhorias de produtos no esforço de diferenciação.
Principais fontes
de acumulação
tecnológica
Fornecedores, aprendiz.
na produção, serv. de
consultorias
A acumulação tecnológica para infraestrutura fabril é fortemente baseada em fornecedores de bens de capitais que se
responsabilizam pela montagem das estruturas industriais.
Também foi relatado a busca de parcerias com instituição de
pesquisa e empresa de base tecnológica (Amazon Dreams),
estas representam a emergência de maior independência de
fornecedores de bens de capital padrão, no entanto como são atividades ainda incipientes, entende-se que a base principal do
negócio e o padrão de expansão até então utilizado ainda
caracteriza de forma predominante como dominado por
fornecedores.
Principal direções
da acumulação
tecnológica
Tecnologia de processo e
equipamentos
(foco ascendente na
cadeia, baixa
diversificação de
produto)
As expansões industriais realizadas pela empresa, e mesmo a
diferenciação de produtos iniciada, tem forte foco na definição
de tecnologia de processo produtivo e dos equipamentos a
serem utilizados.
Principais canais
de imitação e de
transferência de
tecnologia
Aquisição de
equipamentos e serviços
relacionados
O principal canal de transferência tecnológica para produção é
a seleção e aquisição de equipamentos.
Principais meios de
apropriação
(proteção contra
Mecanismos não
técnicos
(Marketing, marca, etc)
A empresa afirma não utilizar de forma deliberada meios de
apropriação, provavelmente em virtude de suas inovações não
serem de caráter absoluto (novidade para o mundo) e sim
134
Variáveis de
análise
Padrão de Mudança
Técnica:
Dominado por
fornecedor
Observações de análise sobre a Belaiaçá
imitação) inovações no âmbito da empresa, o que exclui meios como
patente, e dificulta o sigilo, principalmente porque os
processos de mudanças se baseiam em tecnologias de
fornecedores que tem interesse em sua difusão.
Mas a empresa indica que para alguns processos realiza uma
fragmentação de etapas de produção, de modo que os
funcionários em geral não tenham acesso a compreensão de
todo o processo, exceto aqueles de nível gerencial, esta estratégia entende-se como uma forma de sigilo industrial.
Também se percebe uma busca recente de atividades de
marketing, em virtude da diferenciação de produtos com foco
no consumidor final.
Principais
incumbências
administrativas de
caráter estratégico
Uso de tecnologias
produzidas em outro
setor para reforçar as
vantagens competitivas.
A empresa busca basear suas inovações na aplicação em seus
processos e produtos de tecnologias já desenvolvidas, com
foco na seleção e aquisição de equipamentos, e licenciamento.
Fonte: Itens de análise (coluna 1) baseados em Bell e Pavitt (1993, p. 180); e conteúdo das análises (colunas 2 e
3) de autora.
A Belaiaçá apresenta-se como uma agroindústria em expansão, com considerável
velocidade de desenvolvimento de capacidades de produção, principalmente em comparações
com outras agroindústrias locais. Embora a empresa não tenha em sua constituição uma base
prévia de capacidade tecnológica, observa-se a emergência de ações de busca de
desenvolvimento desta capacidade, como estratégia de diferenciação de mercado, no entanto
ainda com pouca intensidade de esforços tecnológicos efetivos.
3.4 CONSIDERAÇÕES CONCLUSIVAS
Este capítulo teve como foco as três organizações que contribuíram em termos de
capacidades tecnológicas e de produção ao desenvolvimento da inovação de linha de produtos
baseados em compostos antioxidantes de açaí. Inicialmente, foi realizada uma revisão teórica
sobre os conceitos de capacidades organizacionais para compreensão da relação entre a
dinâmica de construção destas capacidades e o desenvolvimento de processos inovativos, bem
como as condições de apropriabilidade das organizações sobre este.
Também se buscou delinear algumas discussões relacionadas a temática de
capacidades de inovação e o atendimento de critérios de desenvolvimento sustentável, em que
se identificou pontos de debate sobre a postura das empresas e possíveis vantagens ou
dificuldades envolvidas.
135
Uma conexão entre este tema de desenvolvimento de capacidades para geração de
novas tecnologias sustentáveis com o conceito de paradigma tecnológico, pois muitas destas
tecnologias representam descontinuidades aos paradigmas tecnológicos em vigor, o que
explicar que as dificuldades destas buscas inovativas sustentáveis não estão baseadas somente
na expansão da base de conhecimentos científico e tecnológico, mas na articulação conjunta
de mudanças nas relações econômicas, sociais e institucionais estabelecidas. Neste caso, são
alguns aspectos normativos, como a importância da ampliação da base de stakeholders nos
processos de inovação e de uma visão mais integrada das múltiplas dimensões incidentes
sobre a inovação.
As informações empíricas corresponderam a caracterização das organizações foco do
estudo, que são UFPA, Amazon Dreams e Belaiaçá. O levantamento de dados objetivou
identificar as forças e fraquezas em termos de capacidades destas organizações para a
realização de processos de inovação, considerando um breve histórico de atividades
inovativas e análise do padrão de mudança técnico aplicado as duas organizações empresarias.
Cabe esclarecer que alguns conceitos discutidos na revisão teórica, como de ativos
complementares e capacidades absortivas não foram explorados no exame empírico deste
capítulo, mas sua abordagem é aplicada no próximo capítulo (4) no âmbito das relações
interorganizacionais do processo de inovação.
A UFPA se caracteriza como instituição de C&T com capacidades tecnológicas
vinculadas à pesquisa científica e tecnológica, com bases de conhecimento desenvolvidas
sobre biotecnologia alinhadas ao interesse sobre o uso sustentável da biodiversidade da
Amazônia. No entanto, apresenta limitações quanto a articulação com o setor produtivo, o que
restringe a contribuição da Universidade no desenvolvimento de processos de inovação na
região.
A Amazon Dreams é uma empresa de base tecnológica, spin off da UFPA, com
capacidades tecnológicas desenvolvidas para bioprospecção e desenvolvimento tecnológico
de produtos originados da biodiversidade da Amazônia, com foco em setores como
cosméticos, alimentação funcional, saúde e nutrição. Seu modelo de negócio vincula-se à
proposta de valorização econômica dos ativos da biodiversidade amazônica por meio da
biotecnologia para assegurar condições adequadas de uso sustentável e desenvolvimento
regional. Apesar de ser bem sucedida na criação de produtos de alto valor agregado, a
empresa apresenta baixo desenvolvimento de capacidade de produção. Esta configuração de
capacidades, em geral, requer atuação em regimes de apropriação forte que lhe assegurem
proteção sobre os retornos das inovações desenvolvidas.
136
A Belaiaçá é uma agroindústria de médio porte que atua predominantemente na cadeia
produtiva do açaí. A empresa encontra-se em expansão, em parte pelo crescimento da
demanda por produtos baseados no açaí no mercado nacional e internacional. Embora sua
constituição no setor da agroindustrial ser relativamente recente realizou avanços em sua
capacidade de produção, diferenciando-se da maioria das agroindústrias locais, contudo ainda
apresenta uma capacidade tecnológica incipiente. A Belaiaçá demonstra preocupações em
relação a sustentabilidade da cadeia de valor do açaí, particularmente em relação as
comunidades extrativistas, contudo sua postura tem se mostrado reativa quanto a
implementação de capacidades e de práticas socioambientais efetivas.
Ao considerar que o desenvolvimento do processo de inovação tecnológica para
comercialização da linha de produtos baseada no açaí envolveu a interação dessas
organizações, o próximo capítulo tem como objetivo compreender a rede de relações
interorganizacionais construída no decorrer do processo de inovação, com vistas a analisar o
seu desenvolvimento e os resultados alcançados, inclusive quanto a efetividade de
apropriação de benefícios pelas organizações em foco.
137
4 REDE DE RELAÇÕES INTERORGANIZACIONAIS E O PROCESSO DE
INOVAÇÃO
4.1 INTRODUÇÃO
Após realizar a análise do contexto (capítulo 2) e das capacidades das organizações
âncoras (capítulo 3) que contribuíram no desenvolvimento do processo de inovação para
comercialização da linha de compostos antioxidantes baseados no açaí, o objetivo deste
capítulo é compreender como ocorreu esse processo de inovação em si, a rede de relações
estabelecidas e, finalmente, os resultados alcançados até o período de estudo, tendo como
foco o entendimento da dinâmica de apropriação de benefícios gerados.
Para embasar a análise sobre a rede de relações interorganizacionais, a primeira parte
do capítulo corresponde a uma revisão teórica sintética sobre a temática de organização de
redes, e especificamente sobre redes de inovação, enfatizando às condições de
apropriabilidade.
Na segunda parte do capítulo, descrevemos o processo de inovação e as relações entre
as organizações, com foco na UFPA, Amazon Dreams e Belaiaçá, porém não se restringindo a
elas, dado que a dinâmica de interação envolve organizações correlacionadas a estas em
diferentes momentos do processo de inovação. O estudo das relações interorganizacionais
durante o processo de inovação busca examinar o impacto destas interações em relação a
geração de resultados e apropriabilidade das organizações. Além disso, investigamos as
conexões com os constructos ao nível de contexto (trajetórias tecnológicas e regime de
apropriabilidade) e ao nível da organização (capacidades).
Por fim, empreendemos a apreciação crítica dos resultados observados do processo de
inovação, e da apropriação destes resultados, quanto às perspectivas e limitações em
contribuir para a construção de uma nova lógica produtiva alicerçada em ativos da
biodiversidade com geração de dinâmicas de desenvolvimento regional.
4.2 FORMAS DE ORGANIZAÇÃO EM REDE
A concepção da forma de organização de rede de relações pode conformar uma série
de categorias de estudos, desde a aplicação de seus componentes estruturais a análise grupos,
organizações e indústrias, até a pesquisas sobre novos formatos organizacionais e a ampliação
138
de suas fronteiras, emergindo de debates entre diferentes bases de conhecimento como a
economia, sociologia e teoria das organizações.
A teoria econômica de custos de transação define duas formas de organização das
transações econômicas, o mercado e a organização hierárquica, de modo que estes atuariam
como instrumentos de governança alternativos do tipo ideal para realização destas transações
(BARNEY; HESTERLY, 2004). Como tipos ideais, estas duas formas são as duas pontas de
um contínuo ao longo das quais diferentes formas organizacionais reais estariam distribuídas,
podendo haver formas híbridas que combinam elementos de mercado e hierarquia, em que a
organização em redes se enquadraria nesta posição intermediária (PODOLNY; PAGE, 1998,
p. 58).
Contudo, segundo Podolny e Page (1998, p. 57), esta visão da rede como um formato
híbrido passou a ser questionada dentro dos campos da sociologia e da teoria das
organizações, ao se defender que a forma de redes representa uma terceira alternativa
diferenciada, a qual possui uma lógica própria e distinções em termos de vantagens de
eficiência em relação a mercados e hierarquias.
As características da organização em rede apresentam vantagens distintas e únicas
frente às encontradas no mercado e na organização hierárquica, que proporcionam
configurações de governança e funcionalidade que falham em se conformar com estas
definições tradicionais (PODOLNY; PAGE, 1998, p. 57).
A conjuntura básica deste argumento é que no âmbito da organização em rede, a
estrutura social proporciona uma dinâmica de relações de compartilhamento de recursos e
tomada de decisão que gera oportunidades e vantagens econômicas difíceis de replicar via
transações de mercado ou hierarquia (UZZI, 1997, p. 61).
Neste sentido, Uzzi (1997, p. 35) ressalta a importância de reconhecer que a ação
econômica está imersa em uma estrutura social (embeddedness) que governa processos
intervenientes que afetam (positivamente ou negativamente) fatores de desempenho e
resultados dos agentes econômicos, de modo a compreender que a qualidade das transações
econômicas é influenciada pela qualidade das relações sociais.
4.2.1 Estrutura de redes
Para Podolny e Page (1998, p. 59) de uma perspectiva estrutural, toda forma
organizacional pode ser representada graficamente como uma rede de relações, inclusive
139
mercados e hierarquias, cujos pontos podem ser organizações, unidades ou pessoas, e suas
relações os laços que os interligam.
Estudos de estrutura de redes em geral focam na análise da natureza de relações entre
os atores, denominadas de laços, que podem ser examinados em termos de tipos de relações
como laços fortes e fracos. Granovetter (1973, p. 1361) distingue a força de um laço entre
dois atores como determinada por uma combinação da quantidade de tempo dedicado à
relação, sua intensidade de vínculo, e o grau de reciprocidade, sendo que estes três aspectos
tendem a ser correlacionados.
Os diferentes tipos destes laços estabelecem padrões de relações distintos, em que
laços fortes estariam relacionados a características como maior confiança, identidade social e
compartilhamento mais profundo de informações e recursos, enquanto laços fracos proveriam
uma maior diversidade informações e acesso a oportunidades ampliadas. Uzzi (1997, p. 59)
entende que cada tipo de relação cumpre funções sociais distintas, sendo ambas importantes
para gerar um desempenho adequado da rede.
Outros estudos relacionam-se a arquitetura que estas relações formam (formato do
conjunto de laços e pontos), como em Ahuja (2000, p. 430) que verificou as funções de laços
diretos e indiretos, e os efeitos de posições centrais ou periféricas dos atores em uma rede e da
densidade desta rede. Neste caso, laços diretos (fortes ou fracos) interligavam dois atores e
laços indiretos representavam atores que entre si não possuíam relação, mas mantinham em
comum um laço com um terceiro ator, por meio do qual poderia fluir informações e recursos.
Deste modo, o autor indicava que o fluxo de comunicação para um ator em rede ultrapassa os
limites de suas relações diretas.
Uzzi (1997, p. 36) defende que a organização em rede proporciona uma estrutura e
qualidade de relações interorganizacionais distintos tanto do mercado quanto das
organizações hierárquicas, o que molda oportunidades e expectativas diferenciais. Em um
mercado, a comunicação tende a ser focada sobre preços, quantidades e requisitos de
produtos, enquanto em uma organização hierárquica esta comunicação se aprofunda no
sentido de uma coordenação de atividades e identidade comum, mas também se restringe em
termos de acesso a novas oportunidades e a informações não redundantes.
Em uma organização em rede, a comunicação e transferência de informação é mais
detalhada e assertiva que no mercado, pois contempla uma natureza mais tácita e holística,
além de que a identidade social entre os parceiros permite a transmissão de preferências e
opções estratégicas que melhora a coordenação interorganizacional (Uzzi, 1997, p.46). Ao
mesmo tempo, esta comunicação é mais abrangente e proporciona maior flexibilidade de
140
resposta que na organização hierárquica, pois as fronteiras de uma rede tendem a ser mais
maleáveis (menos rígida que na hierarquia).
4.2.2 Governança em organização em rede
A abordagem de governança da organização em rede é o fator chave de diferenciação
para Podolny e Page (1998, p. 59). Estes autores entendem uma rede de organizações como
um conjunto de atores (igual ou maior que dois) que buscam repetidas relações de trocas
duráveis uns com os outros, ao mesmo tempo em que há uma lacuna de autoridade legitimada
para arbitrar e resolver disputas. Neste sentido, não se enquadram no formato de mercado pelo
tipo de relações duráveis estabelecidas, enquanto que não se conforma com a hierarquia pela
falta da autoridade formalmente instituída de um ator sobre os demais.
Este conceito de governança corresponde a noção expressa por Dhanaraj e Parkhe
(2006, p. 659) que redes interorganizacionais podem ser vistas como arranjos frouxamente
acoplados, onde por um lado os atores estão interligados e conserva-se algum grau de
dependência (“acoplado”), mas por outro lado não há controle hierárquico entre estes, de
modo que eles preservam algum grau de independência entre si (“frouxamente”).
Exemplos deste tipo de perspectiva podem se aplicar a formatos como joint ventures,
convênios de pesquisa ou alianças estratégicas, contudo, Podolny e Page (1998, p. 59)
advertem que a caracterização destes formatos como corresponde a governança de
organização em rede não pode ser feita a priore, mas sim de acordo com a análise dos
aspectos específicos de caso a caso.
Cabe acrescentar que esta forma de governança implica na constituição de alguns
componentes que regulem expectativas e comportamentos entre seus membros, entre os
principais elementos identificados estão a confiança e normas de reciprocidade, e a tomada de
decisão e processos de resolução de problemas conjuntos (PODOLNY; PAGE, 1998, p. 60;
UZZI, 1997, p. 42). Podolny e Page (1998, p. 61) afirmam que, devido a elementos como
estes, a governança de redes não pode ser reduzida a uma hibridização de mercados e
hierarquias, uma vez que ambos tem como pressuposto uma postura mais de contraposição
entre os agentes.
Nesta abordagem de organização em rede, a confiança atua como facilitadora das
relações de troca de informações, enriquece oportunidades de acesso a recursos, e estende a
flexibilidade entre os atores (UZZI, 1997, p. 45). Então, funciona como uma regra de decisão
141
(heurística), ou seja, um processo de decisão que economiza recursos cognitivos e aumenta a
velocidade de decisão, porém sem prejudicar a qualidade da decisão (UZZI, 1997, p. 43).
Entretanto, Capaldo (2007, p. 601) observa que muitas vezes a confiança não é uma
condição prévia necessária ao início da parceria, a confiança pode emergir de repetidas
interações entre os atores como em um processo de evolução das relações
interorganizacionais. A confiança é característica de laços fortes, e de acordo com Uzzi (1997,
p. 54) relaciona-se ao desenvolvimento de “multiplexidade”, que são relações de múltiplos
vínculos entre dois atores, que podem envolver uma multiplicidade de vínculos tanto
econômicos, como sociais, associações políticas ou familiares.
Entre ações importantes que a confiança auxilia a serem adotadas mais facilmente em
redes estão as decisões de investimentos, pois ajuda a reduzir o risco percebido (UZZI, 1997,
p. 52) e o intercâmbio de conhecimento pela menor ênfase em preocupações de
apropriabilidade (GULATI; SINGH, 1998).
Os arranjos para resolução de problemas conjuntos e tomada de decisão coletivas são
mecanismos de voz para construção de consenso, que propicia feedback, aprendizado e
descoberta de novas combinações entre os membros da rede (UZZI, 1997, p. 47). Deste modo,
esse tipo de modelo de decisão substitui a formulação de respostas simplistas do mercado
como “ficar ou sair”, e cria bases para processos de busca de solução de problema via
aprendizado e inovação (UZZI, 1997, p. 47).
Além disso, as soluções em consenso tendem a ser elaboradas em bases mais
integrativas do que distributivas, onde se busca alavancar os resultados da rede como um
todo, em vez de somente dividir funções (UZZI, 1997, p. 50). Assim, a governança de redes
fomenta uma (re)alocação de recursos que, sem piorar as bases já estabelecidas para nenhum
de seus membros, proporcione melhorar condições para pelos menos um membro (UZZI,
1997, p. 55).
4.2.3 Funções
As potenciais distinções em termos de estrutura e governança da organização em rede,
mencionadas acima, propiciam condições para a emergência de funcionalidades específicas
que podem se configurar como vantagens competitivas (PODOLNY; PAGE, 1998, p. 62).
Estas funcionalidades podem ser interpretadas como os serviços e benefícios advindos dos
recursos de rede conforme Lavie (2006, p. 640). Os chamados recursos de rede são recursos
externos enraizados na rede de uma determinada empresa, os quais provêm acesso a
142
oportunidades estratégicas e afeta o comportamento ou valor da empresa (LAVIE, 2006, p.
638).
Segundo Lavie (2006, p. 641), os benefícios obtidos pelos recursos de rede
demonstram que a posse ou o controle exclusivo de recursos não é uma condição necessária
para a obtenção de vantagem competitiva, na realidade, a acessibilidade a estes recursos, de
modo a estabelecer seu direito de uso ou usufruto de seus benefícios é que se torna relevante,
e pode ser suficiente para gerar valor para a empresa.
Podolny e Page (1998, p. 62) destacam as três principais funcionalidades da
organização em rede como o aprendizado diferencial de novas habilidades e conhecimento
(1), os efeitos de status e legitimidade (2), e benefícios quanto ao desempenho econômico (3)
(PODOLNY; PAGE, 1998, p. 62).
- Aprendizado:
As formas de organizações em redes podem preservar maior diversidade de
informações e rotinas de buscas do que as hierarquias, ao mesmo tempo em que permite um
intercambio de informações mais abrangente e complexo do que o mercado, assim são
potencialmente capazes de promover melhores condições de aprendizado (PODOLNY;
PAGE, 1998, p. 63).
O aprendizado em redes interorganizacionais relaciona-se tanto à transferência de
informações que representam oportunidades dos atores de internalizar habilidades de outros
membros, quanto a geração de síntese destas informações por diferentes atores na produção
de novos e distintos conhecimentos (PODOLNY; PAGE, 1998, p. 62).
Neste contexto de aprendizado, Ahuja (2000, p. 430) chama a atenção que, por um
lado, há o compartilhamento deliberado de conhecimento pelos membros da rede, mas, por
outro lado, há um transbordamento não intencional de conhecimentos via repetidas interações
cooperativas entre os membros, onde uma empresa tem acesso não somente ao conhecimento
de seus parceiros diretos, mas também ao dos “parceiros de seus parceiros” (relações
indiretas).
Para Lavie (2006, p. 647) esses transbordamentos originados de recursos não
intencionalmente compartilhados sugere assumir que, em uma rede interorganizacional, as
oportunidades reais de aprendizado ultrapassam o escopo imediato da parceria firmada, e
reforça a importância do desenvolvimento da capacidade absortiva entre seus membros, de
modo que possam se beneficiar desses transbordamentos.
143
- Status e legitimidade:
Podolny e Page (1998, p. 64) indicam que um ator da rede pode obter ou elevar sua
legitimidade ou status decorrente de seu vínculo com outro membro parceiro, sendo que esta
legitimidade pode lhe trazer benefícios econômicos, como aumento de valor de mercado ou
ter acesso a um fluxo de recursos superiores. De outra forma, se uma organização focal
(central) da rede desenvolver relações com um ator externo que possua alta legitimidade na
sociedade, isso pode ter efeitos de transbordamento positivo a toda a sua rede (PODOLNY;
PAGE, 1998, p. 64).
Contudo, cabe também ressalvar que a diferença entre status dos atores pode atuar
como uma restrição a formação de laços, pois um ator com um status superior tende a ser
mais seletivo as suas relações, para evitar efeitos inversos de perdas ou redução de
legitimidade em virtude de problemas relacionados a eventuais parceiros (PODOLNY;
PAGE, 1998, p. 69). Assim como, se o rompimento de laços entre atores representar para uma
das partes algum custos de reputação, haverá um incentivo para a persistência da rede de
relações, mesmo que os efeitos tangíveis de geração de benefícios tenham cessado
(PODOLNY; PAGE, 1998, p. 70).
- Benefícios ao desempenho econômico:
Para Podolny e Page (1998, p. 65), a perspectiva da organização em rede tende a
compreender as oportunidades de melhoria de desempenho econômico do ponto de vista de
ampliação de vantagens em termos das qualidades das relações, em vez de focar na redução
de custos de transações.
Entre as qualidades ressaltadas está o desenvolvimento de melhor coordenação de
atividades produtivas e comerciais entre as empresas em função da confiança e melhoria na
comunicação entre os atores, que permite operações mais eficientes e maior adaptabilidade,
com eventual antecipação, às mudanças no mercado ou no ambiente institucional
(PODOLNY; PAGE, 1998, p. 65).
Outros benefícios também são mencionados relacionados a redução de incertezas,
particularmente pela opção de desenvolvimento de inovações via organização em rede como
joint ventures, e que redes de pequenas empresas ou produtores conduzem a ganhos coletivos
para seus membros, uma distribuição de riqueza mais equitativa e promovem um maior senso
de comunidade quanto aos compromissos firmados (PODOLNY; PAGE, 1998, p. 66).
144
4.2.4 Disfunções
Se a forma de organização em rede proporciona efetivamente estas vantagens os seus
membros frente às alternativos convencionais de mercado e de organização hierárquica,
caberia questionar a razão pela qual esta forma não é predominante nas indústrias e setores
econômicos, em detrimento das formas tradicionais. Podolny e Page (1998, p. 67) indicam
que se deve reconhecer que as funções e benefícios informados são eminentemente potenciais,
e que a forma de organização em rede também traz em seu bojo disfunções e restrições para a
adoção de sua forma de governança. Cabe considerar que tais restrições se aplicam tanto a
formação de novas relações em rede, como a persistência ou não das relações em redes
existentes (PODOLNY; PAGE, 1998, p. 70).
Enfatiza-se dois fatores de restrição, um em relação à natureza da base de
conhecimento e tecnologia dos atores e outro sobre as capacidades necessárias para a gestão
de rotinas neste formato de governança (PODOLNY e PAGE, 1998, p. 69).
A natureza da base de conhecimento e da tecnologia refere-se ao conceito de
capacidade absortiva (COHEN; LEVINTHAL, 1990; ZAHRA; GEORGE, 2002). Uma
condição de restrição a formação de parcerias interorganizacionais acontece quando as bases
tecnológicas dos possíveis atores são muito distantes (sem interconexões claras), o que afeta
negativamente a percepção destes de vantagens quanto ao compartilhamento de conhecimento
e oportunidades de internalização de informações úteis (PODOLNY; PAGE, 1998, p. 69).
Bem como, quando essas bases são muito similares, há percepção de redundância de
tecnologia, o que também não gera incentivos a formação de laços, de modo que
provavelmente somente haverá estímulo quanto às bases tecnológicas à formação da rede
quando houver distância intermediária entre as tecnologias (PODOLNY; PAGE, 1998, p. 69).
A outra restrição é a necessidade de desenvolvimento de habilidades para operar em
uma organização em rede, que envolve o aprendizado de capacidades que dependem
parcialmente da experiência adquirida dos atores (PODOLNY; PAGE, 1998, p. 72). Capaldo
(2007, p. 586) denomina de capacidades relacionais que define como a capacidade
organizacional de gerenciar as relações em rede, e coordenar as atividades e o aprendizado
por meio de rotinas dedicadas, com ênfase ao intercambio de conhecimento
interorganizacional.
Podolny e Page (1998, p. 72) realçam o aprendizado e a adaptação como processos
críticos para efetividade da rede, e algumas características entre os atores atuam como fatores
facilitadores (ou restritivos na sua falta) como o nível de integração das tarefas, a similaridade
145
da cultura organizacional, e ter objetivos organizacionais comuns. A existência de parcerias
interorganizacionais anteriores, diretamente com os atores de interesses ou indiretamente,
também funciona como um fator de influência na formação de redes, pois em geral o
desenvolvimento de relações é realizado por meio de instrumentos de referência (seja de
contatos pessoais, seja de uma terceira parte), e de controle social (PODOLNY; PAGE, 1998,
p. 69; CAPALDO, 2007, p. 599; UZZI, 1997, p. 48).
Contudo, mesmo ao superar as restrições para sua formação ou manutenção, a
organização em rede pode não gerar as vantagens esperadas devido a disfunções em suas
operações (PODOLNY; PAGE, 1998, p. 70). Estas disfunções podem estar relacionadas tanto
a estrutura destas redes como a qualidade das relações, de acordo com o proposto por Uzzi
(1997, p. 57) como o paradoxo do enraizamento (embeddedness), em que haveria uma relação
de “U” invertido entre laços fortes e desempenho.
Neste caso, se houver uma concentração de vínculos somente entre laços fortes em
uma rede, isso levaria a um isomorfismo, que reduz oportunidades de aprendizado e a
flexibilidade (UZZI, 1997, p. 57). Mas se, ao contrário, prevalecer um conjunto de laços
fracos, não será possível desenvolver os processos de confiança, reciprocidade e
compartilhamento necessários para geração das vantagens competitivas (UZZI, 1997, p. 57-
59). Os vínculos sociais tem uma influência importante na ação econômica, mas se essa
influência será negativa ou positiva depende da qualidade das relações interorganizacionais,
da estrutura e da posição das organizações na rede (UZZI, 1997, p. 60).
4.3 REDES DE INOVAÇÃO E BIOTECNOLOGIA
As vantagens relacionadas a melhores condições de aprendizado e desempenho
econômico tem fomentado uma série de estudos que buscam explorar conexões entre a
performance da organização em rede e o desempenho inovativo (CAPALDO, 2007; AHUJA,
2000, p. 426; GULATI; SINGH, 1998; POWELL; KOPUT; SMITH-DOERR, 1996;
PISANO, 1990). Em geral, enfatiza-se as redes de relações interorganizacionais como
mecanismos de acesso a conhecimentos externos, e de construção de novas combinações
destes conhecimentos, ou mesmo de novos conhecimentos (CAPALDO, 2007; AHUJA, 2000,
p. 426; POWELL; KOPUT; SMITH-DOERR, 1996).
Capaldo (2007, p. 585, 605) defende uma relação entre estrutura de rede e inovação ao
nível da organização no que tange a capacidade relacional das empresas para formação de
redes de parcerias interorganizacionais heterogêneas, e demonstra que estas estruturas de
146
redes coevoluem de acordo com as estratégias das empresas e as condições de mercado que
enfrentam.
Para o CGEE (2006a) é ressaltada a função de coordenação interorganizacional, ao
indicar que a aplicação da organização em rede para o desenvolvimento de inovação foca nos
processos interativos entre os atores sociais, que buscam nessa forma de associação articular
projetos e problemas delimitados de um modo coordenado e em consenso para atingir
propósitos próprios.
Os processos de aprendizado interorganizacional e o posicionamento do lócus da
inovação nas redes de relações são a ênfase da pesquisa de Powell, Koput e Smith-Doerr
(1996, p. 119). Os autores identificaram que, quando a base de conhecimento é amplamente
dispersa e traz vantagens competitivas significativas, as empresas obtêm nas redes
interorganizacionais acesso a conhecimentos e recursos que não estariam disponíveis via
transações do mercado, e nem poderiam ser desenvolvidos isoladamente nas empresas.
No entanto, se por um lado as redes interorganizacionais proporcionam melhores
condições para o desenvolvimento e a difusão tecnológicos, por outro lado, Gulati e Singh
(1998, p. 807) sugerem que nestes casos as relações em uma rede interorganizacional tornam-
se mais complexas. Quando as relações entre empresas em uma rede envolvem atividades em
torno de componentes tecnológicos, tanto em termos de transferência unilateral de tecnologia,
quanto intercâmbio de tecnologias e codesenvolvimento, aumenta as preocupações referentes
a apropriabilidade e a coordenação e integração das atividades interfirmas (GULATI; SINGH,
1998, p. 798).
A influência de aspectos de apropriabilidade ocorre pelas dificuldades em conceber o
conhecimento tecnológico como um produto, pois tem forte composição intangível e tácita,
assim o conhecimento a ser compartilhado na rede é difícil de ser delimitado e de monitorar
seu uso aos objetivos específicos da parceria, o que amplia as possibilidades de
transbordamentos não desejados pelos parceiros (GULATI; SINGH, 1998, p. 798).
Devido a estas características também é precário para os parceiros avaliarem o valor
preciso deste “produto”, pois por parte de quem recebe o conhecimento tecnológico não há
informações completas de seu conteúdo até que a transferência seja concluída, e por parte de
quem concede o conhecimento não há como prever seu uso potencial ou estabelecer de forma
eficaz os limites de utilização desta tecnologia (GULATI; SINGH, 1998, p. 789).
Diante deste cenário, Gulati e Singh (1998, p. 807) apontam que quando há uma
combinação de uma atividade com componente tecnológico e um setor econômico com baixa
apropriabilidade, as empresas podem ser desestimuladas a participarem em organização em
147
redes, ou restringir suas participações pelos riscos de apropriabilidade na indústria (GULATI;
SINGH, 1998, p. 807). Além disso, os custos de coordenação também são afetados por
componentes tecnológicos em termos de integração de atividades, particularmente quando
envolvem o desenvolvimento conjunto, e dificuldades de valoração quanto às contribuições
de cada membro para o produto final (GULATI; SINGH, 1998, p. 789).
4.3.1 Biotecnologia
Esta realidade complexa de componentes tecnológicos na interação
interorganizacional é reforçada em processos de descontinuidade tecnológica e ascensão de
novas trajetórias com rápido desenvolvimento, como no caso da biotecnologia, onde o
conhecimento é tanto sofisticado, quanto disperso (POWELL; KOPUT; SMITH-DOERR,
1996, p. 118). Estes aspectos fazem com que o desenvolvimento biotecnológico demande um
conjunto de habilidades intelectuais e científicas que excedem das capacidades de uma única
organização, não somente por uma questão de intensidade de níveis de investimentos e
atividades, mas também pela diversidade de fontes de inovação necessárias, de forma que
diferentes perfis de organizações são demandados a contribuir (POWELL; KOPUT; SMITH-
DOERR, 1996, p. 118). Além de empresas privadas, há presença frequente de instituições de
pesquisas públicas, universidades e laboratórios públicos e privados, e organizações sem fins
lucrativos (POWELL; KOPUT; SMITH-DOERR, 1996, p. 118).
Powell, Koput e Smith-Doerr (1996, p. 123) descrevem o processo de
desenvolvimento de produtos biotecnológicos como, em geral, intensivo em pesquisa,
prolongado e com gastos expressivos. O desenvolvimento das capacidades absortivas de cada
organização é fundamental para a aplicação dos conhecimentos e informações gerados nos
diferentes parceiros e progresso das colaborações no projeto (POWELL; KOPUT; SMITH-
DOERR, 1996, p. 142). A colaboração externa é necessária para prover acesso a novos
conhecimentos e recursos que não podem ser gerados internamente, mas ao mesmo tempo
possuir capacidades internas é indispensável para avaliar pesquisas externas já realizadas e
selecionar os conhecimentos a serem aplicados (POWELL; KOPUT; SMITH-DOERR, 1996,
p. 119).
Por esta razão, Powell, Koput e Smith-Doerr (1996, p. 119) argumentam que o
desenvolvimento de inovação de base biotecnológica ocorre no âmbito de redes caracterizadas
pelo aprendizado interorganizacional, e que nestas as colaborações não podem ser concebidas
restritamente como meios de compensar a falta de habilidades internas dos membros, nem
148
devem ser vistas como uma séria discreta de transações estanques (POWELL; KOPUT;
SMITH-DOERR, 1996, p. 119). Neste sentido, pode-se destacar a feição de interdependência
dos membros da rede para alcançar o progresso tecnológico e a inovação.
Gulati e Singh (1998, p. 808) consideram que a interdependência de recursos é um
importante determinante na estruturação de redes de relações interorganizacionais, o acesso e
compartilhamento de recursos e a necessidade de habilidades complementares produzem
incentivos para a formação de novos laços entre organizações.
No entanto, essa complementação de habilidades e recursos para inovação de produtos
e processos biotecnológicos não está somente relacionada às novas competências e fontes de
conhecimentos originadas por esta nova trajetória tecnológica, o cenário é mais imbricado.
Assim, é preciso delimitar os efeitos de mudanças de competências operadas pelo paradigma
biotecnológico.
Teece (2006) ressalta que o processo de inovação envolve diferentes atividades como
a invenção e a comercialização, que exigem para sua execução um conjunto diverso de
capacidades e recursos. Essa visão de atividades distintas relacionada ao processo de inovação
no sistema econômico remete à clássica diferenciação de invenção, inovação e difusão
encontrada em Schumpeter (1997).
Para Schumpeter (1997, p. 95) a invenção corresponde ao processo de descobrir ou
criar uma coisa nova, porém esta descoberta não significa necessariamente sua aplicação
prática na economia, pois pode haver restrições de viabilidade técnica, financeira ou de gestão
empresarial. A inovação propriamente dita somente ocorre quando esta nova ideia ou uma
nova combinação de ideias já conhecidas são empregadas efetivamente no sistema econômico
(SCHUMPETER, 1997, p. 95, 215, 216). E a difusão acontece quando a inovação se propaga
pelo sistema econômico, por meio dos canais de mercado (SCHUMPETER, 1997, p. 216).
A biotecnologia opera um processo de mudança tecnológica que destrói competências
tradicionais de P&D em vários setores, como no farmacêutico (cuja base de conhecimento
tinha ênfase na química orgânica), o que provoca substancial alteração em capacidades nos
processos de invenção e desenvolvimento tecnológico (PISANO, 1990, p. 155; POWELL;
KOPUT; SMITH-DOERR, 1996, p. 118). Porém, as competências de comercialização dos
produtos novos no mercado consumidor foram em sua maior parte preservadas, pois há uma
manutenção dos instrumentos regulatórios nas indústrias e dos canais de distribuição e vendas
de produtos (PISANO, 1990, p. 155). Deste modo, a biotecnologia se caracteriza por provocar
mudanças em competências e base de conhecimento nas atividades a montante na cadeia de
149
valor, mas há uma tendência que competências e ativos vinculados a grandes indústrias sejam
preservados a sua jusante (PISANO, 1990, p. 155).
Esta configuração é importante para compreender que, apesar da mudança de base
tecnológica ter favorecido a criação de muitas empresas novas de biotecnologia, têm sido
frequentes as alianças destas empresas entrantes com as empresas já consolidadas no mercado
que, por sua vez, possuem ativos complementares relacionados à comercialização
(ROTHAERMEL; HILL, 2005, p. 54-55; ROTHAERMEL, 2001, p. 695).
Segundo Rothaermel e Hill (2005, p. 52), uma vez que ativos complementares
especializados são necessários para comercializar produtos de uma determinada base
tecnológica, isso mantém as empresas consolidadas no mercado atrativas para formação de
parcerias dentro da indústria para processos de inovação, e assim, também as mantêm aptas a
se apropriarem de parte dos rendimentos destas inovações. Por mais que a ascensão da
biotecnologia tenha causado ruptura nas competências tecnológicas de grandes empresas,
estas ainda podem se beneficiar da biotecnologia na extensão que seu conjunto de ativos
especializados continua eficaz para criar e capturar rendimentos das inovações
(CECCAGNOLI; ROTHAERMEL, 2008, p. 22, 24).
Ceccagnoli e Rothaermel (2008, p. 22) ressaltam, inclusive, que o grau de maior
especialização das empresas de biotecnologia dentro de nichos de pesquisa e direções
inovativas tem o efeito de reduzir o número de possíveis parceiros estratégicos destas
empresas, o que acentua o valor das grandes empresas consolidadas (com atuação mais
abrangente) ao longo da cadeia de valor.
O desenvolvimento e comercialização de novas tecnologias, como a biotecnologia,
requer a integração de diversas atividades entre os elos da cadeia de valor, sendo necessário
compreender as eventuais alterações de requisitos e consequências (ROTHAERMEL; HILL,
2005, p. 56). Uma descontinuidade tecnológica ao afetar as capacidades de empresas em
setores, e, consequentemente as condições de apropriabilidade, implica, inclusive, em
mudanças na dinâmica de distribuição dos lucros pela cadeia de valor em um processo de
inovação.
Nesta perspectiva, por um lado há extensas oportunidades de parcerias entre diferentes
perfis de empresas no desenvolvimento biotecnológico, possibilitado pela variedade
tecnológica e diversidade de estratégias e comportamentos organizacionais. Contudo, por
outro lado, deve-se atentar que, principalmente as empresas consolidadas que preservam certo
poder de barganha não estão passivas a mudança tecnológica e a perda de parte dos
rendimentos antes apropriados. Por isso, estas empresas tradicionais também estabelecem
150
corridas de aprendizado nestas novas capacidades e projetos de desenvolvimento tecnológico
com equipes internas (PISANO, 1990). Portanto, questões de apropriação devem influenciar a
busca de capacidades tecnológicas e moldar as escolhas de formas de governança em que
cada processo de inovação se desenvolverá.
4.4 GESTÃO DE PROCESSOS DE APROPRIABILIDADE EM REDES DE INOVAÇÃO
A interdependência de recursos, os constantes transbordamentos de conhecimentos e
demandas de capacidades relacionais específicas são fatores que tornam as condições de
apropriabilidade mais complexas em redes de interorganizacionais. Neste contexto de
organização em redes, além dos blocos de constructos reconhecidos como conceitos
relevantes como o paradigma tecnológico, o regime de apropriação e as capacidades das
organizações envolvidas, a própria dinâmica das relações interorganizacionais afeta a forma
como o processo de inovação é conduzido e, assim a criação de valor e a captação dos
resultados gerados, seja entre as organizações da rede, seja entre estas e os demais atores da
cadeia de valor.
Com foco nas relações interativas entre as organizações que compõe uma rede de
inovação, Dhanaraj e Parkhe (2006, p. 661) propõe um quadro de análise que enfatiza a noção
dos processos internos na rede, particularmente sobre a mobilidade de conhecimento, a
apropriabilidade da inovação e a estabilidade da rede. Os autores defendem a necessidade de
se orquestrar os recursos e conhecimentos dos diversos membros da rede de modo a alavancar
os resultados a serem atingidos.
A orquestração de uma rede de inovação contempla um conjunto de ações deliberadas
desenvolvidas por uma empresa com posição central na rede para criar e captar valor
(DHANARAJ; PARKHE, 2006, p. 659). Um ponto a ressaltar neste modelo é que, em vez de
dar ênfase às variáveis de estrutura da rede (natureza de laços, densidade, centralização,...), a
atenção é sobre os processos exercidos pelos membros na rede (DHANARAJ; PARKHE,
2006, p. 661).
Segundo Parkhe, Wasserman e Ralston (2006, p. 562-563) o foco sobre processos em
estudos de redes insere implicitamente o componente “tempo” nas análises, o que permite a
visão da dinâmica de mudanças, em uma construção de ordem causal dos eventos em
evidência. Os autores apontam que esta abordagem pode proporcionar perspectivas
evolucionárias ao buscar entender a formação, manutenção e dissolução de redes, no âmbito
de conceitos de variações e seleção, desenvolvimento e cumulatividade.
151
Cabe ressaltar também que Dhanaraj e Parkhe (2006, p. 660) sustentam a necessidade
de reconhecer que redes interorganizacionais são intrinsecamente compostas por organizações
individuais, portanto o desenvolvimento de estudos sobre estas redes devem buscar abranger
esta dualidade ator-estrutura, ou seja, os efeitos das interações entre constructos ao nível da
rede e dos atores individuais.
Como indicado, Dhanaraj e Parkhe (2006, p. 663) definem três processos de análise. O
primeiro é o processo de gestão da mobilidade do conhecimento que se refere às funções de
identificação, socialização e absorção de conhecimentos necessários ao processo de inovação
entre os membros da rede. Os autores vinculam este processo a atividade de criação de valor
via inovação, e expressam que o objetivo do processo seja aumentar o compartilhamento de
conhecimento entre os membros para alavancar as competências existentes na rede
(DHANARAJ; PARKHE, 2006, p. 662).
Neste processo percebe-se uma clara vinculação com o conceito de capacidade
absortiva, porém ao invés de relacioná-lo especificamente a uma empresa, é aplicado em
termos de promoção deliberada do aprendizado entre as organizações da rede, em especial
daqueles conhecimentos requisitos às atividades de inovação (DHANARAJ; PARKHE, 2006,
p. 662).
Dhanaraj e Parkhe (2006, p. 662) também realçam a importância de processos que
reforcem a estrutura social (embeddedness) para facilitar o compartilhamento efetivo de
conhecimentos, como o fortalecimento de uma identidade comum entre os membros e o
incentivo a maior socialização entre membros para expansão do capital relacional (capacidade
relacional), como o estabelecimento de canais de comunicação formais ou informais.
O segundo processo é o de gestão da apropriabilidade na rede, que para Dhanaraj e
Parkhe (2006, p. 662-663) corresponde a atividade de assegurar uma distribuição equitativa
do valor criado e reduzir preocupações com apropriabilidade entre os membros da rede. Os
autores buscam construir um “regime de apropriabilidade” próprio no âmbito da rede baseado
nas funções sociais, como confiança, justiça procedimental e arranjos de solução de
problemas conjuntos.
O processo busca estabelecer um ambiente em que assevere que os custos e benefícios
da colaboração em rede são compartilhados justamente, e que os parceiros percebam isso. O
intuito é aumentar o comprometimento em relação aos objetivos comuns da rede a fim de
compartilhar as recompensas futuras, e assim os membros da rede tenham motivação para
compartilhar conhecimentos (afetando positivamente o processo de mobilidade de
conhecimento), além de mantê-los associados à rede, o que influência a estabilidade da rede
152
(DHANARAJ; PARKHE, 2006, p. 663). Sobre este último ponto, Hagedoorn (2006, p. 674)
corrobora que a confiança relacional enraizada nos laços interorganizacionais intervém
positivamente na estabilidade de seu relacionamento.
O terceiro processo proposto por Dhanaraj e Parkhe (2006, p. 663-664) é o de gestão
da estabilidade da rede que visa a manutenção não negativa do crescimento da rede, ou seja,
de acordo com o conceito de estabilidade dinâmica se refere a manutenção do pleno
funcionamento da rede, considerando-se possíveis entradas ou saídas de membros individuais.
Este conceito de estabilidade dinâmica de redes coaduna com a abordagem evolucionária em
relação à análise de redes de relações.
Considera-se estar relacionada a este conceito a ocorrência de mudanças nas próprias
organizações membros individualmente em termos de suas estratégias, estruturas e
capacidades (NELSON, 1991, p. 67), com impactos sobre a dinâmica da rede de inovação.
Em sentido similar, Callon (2004, p. 201-203), em seu estudo sobre a concepção de rede em
projetos de desenvolvimento tecnológico, observa que cada elemento ou organização em uma
rede, contempla em si mesmo uma estrutura interna, que também está suscetível a mudanças
endógenas, e causa alterações na estrutura da rede superior.
Dhanaraj e Parkhe (2006, p. 664) sugerem que os mecanismos indicados para isso
incluem o fomento a reputação da rede, a construção de perspectivas de ganhos futuros
vinculadas a comportamentos de cooperação, e a multiplicidade de diferentes relações entre
membros, com o encorajamento ao aprofundamento das relações e sua ampliação para outros
projetos (DHANARAJ; PARKHE, 2006, p. 664). Na figura 8, trazemos um quadro síntese
com os processos e seus impactos entre si propostos por Dhanaraj e Parkhe (2006, p. 661):
Figura 8 - Quadro de referência sobre processos de orquestração de redes de inovação.
Fonte: Baseado em Dhanaraj e Parkhe (2006, p. 661).
153
4.5 COMPOSTOS ANTIOXIDANTES DE AÇAÍ: PROCESSO DE INOVAÇÃO E
RELAÇÕES INTERORGANIZACIONAIS
A rede de inovação em estudo envolveu a participação da empresa Amazon Dreams,
da Universidade Federal do Pará (UFPA), e da empresa Belaiaçá, e outras organizações
parceiras, para o desenvolvimento de uma linha de produtos de química fina baseada em ativo
da biodiversidade amazônica (açaí) com foco na produção de compostos ricos em
antioxidantes para indústrias de cosmético, de alimentos funcionais e de saúde e nutrição.
Nesta seção, inicialmente descrevemos como aconteceu o processo de
desenvolvimento dos produtos e apresentamos o desenho da rede com a configuração das
principais organizações e relações em duas etapas, a invenção e a inovação. Após esta
descrição, os resultados identificados do processo de inovação são analisados.
4.5.1 O processo de inovação e as relações interorganizacionais
A análise da rede de relações como unidade visa compreender como ocorreu a
dinâmica de relações interorganizacionais, e seus efeitos sobre o processo de inovação no que
se refere aos resultados alcançados. Desta forma, com base nas entrevistas realizadas com
representantes das três organizações, reconstitui-se um historio sobre a formação e
desenvolvimento da rede de relações em torno do processo de inovação, assim como o
desenho da rede, fazendo uma aproximação da estrutura na qual esta se organizou. Por fim,
faz-se um exame em termos dos processos relacionados a apropriabilidade indicados por
Dhanaraj e Parkhe (2006).
Especificamente, esse desenho da rede interorganizacional é composto por “nós”, que
representam as organizações envolvidas no processo de inovação em estudo, e por “laços”,
que representam as ligações de relacionamento entre as diferentes organizações identificadas,
sendo que estas ligações são oriundas de vínculos formais ou informais (POWELL;
GRODAL, 2005, p. 65-72). Cabe ainda ressaltar que, como se trabalha com conceito de
estabilidade dinâmica de redes, observa-se que no decorrer do tempo, conforme a etapa de
processo de inovação, há alterações de alguns membros e mudanças de relações.
154
- A invenção:
Esta fase representa o período de concepção inicial do negócio e desenvolvimento de
solução tecnológica de processamento do fruto açaí para a produção de compostos ativos
antioxidantes, e tem sua concretização na submissão de pedido de patente junto ao Instituto
Nacional de Propriedade Industrial (INPI).
Esta primeira etapa caracterizou-se preponderantemente como cooperação para
Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) entre a UFPA e a AD, com aporte de subsídios públicos.
Esta parceria esteve baseada, principalmente, no compartilhamento de conhecimentos
técnicos e científicos e apresentou uma dinâmica reciprocamente interdependente como
sugerido por Gulati e Singh (1998), pois os parceiros precisaram de contínuos inputs e
desenvolveram capacidades em conjunto durante o processo de desenvolvimento científico e
tecnológico que levou cinco anos para ser concluído (de 2006 a 2010).
A UFPA exerceu atividades vinculadas ao compartilhamento de conhecimentos
científicos e serviços especializados de infraestrutura laboratorial, particularmente por meio
da unidade da Faculdade de Engenharia de Alimentos (FEA) do Instituto Tecnológico (ITEC),
além da atuação da área de Propriedade Intelectual, com assessoria jurídica sobre o processo
de patente. A Amazon Dreams exerceu funções relacionadas ao conhecimento de
desenvolvimento de escala de processamento industrial, com investimentos industriais
específicos no processo de P&D, e gastos com proteção do conhecimento (pedido de patente).
Como a Amazon Dreams foi uma spin off da UFPA, houve grande facilidade de
comunicação, acesso e confiança pré estabelecida entre os membros da empresa e da UFPA
nesta etapa de invenção, principalmente no que tange a ações de desenvolvimento
tecnológico. Os membros da Amazon Dreams detinham alto nível de formação acadêmica,
deste modo os resultados de pesquisas, informações e conhecimentos gerados na UFPA
puderam ser reconhecidos como oportunidades de desenvolvimento tecnológico para
inovação de produtos com valor econômico diferenciado. Assim, observa-se que não houve
barreira de apropriabilidade tecnológica, em virtude da trajetória dos membros da empresa
serem próximas a UFPA, tanto em termos de conexões tecnológicas como em relação a
estruturas sociais.
Neste caso, há uma superação das dificuldades mencionadas por Rapini (2007) quanto
ao pouco aproveitamento pelo setor produtivo da infraestrutura de ciência e tecnologia
nacional, o qual estaria associado a restrições de compreensão de oportunidades tecnológicas
e condições de apropriabilidade do conhecimento científico por parte da empresa e
infraestrutura analítica das universidades (RAPINI, 2007).
155
Outra característica desta etapa, é que tanto a UFPA como a AD contam com apoio de
financiamentos públicos, no âmbito de parcerias com programas nacionais de fomento e
promoção da inovação, particularmente por meio do Conselho Nacional de Desenvolvimento
Científico e Tecnológico (CNPq). Segundo Dagnino (2003), a relação entre universidades e
empresas tem sido foco de muitas políticas públicas de Ciência, Tecnologia e Inovação
(CT&I) no país. Por um lado, este tipo de parceria pode ser explicado como necessário, seja
para as empresas (acesso a conhecimentos, formação de recursos humanos, compartilhamento
de custos e riscos de produtos em estágio pré competitivo), seja para as universidades
(superação de crescentes dificuldades para obtenção de recursos para pesquisa, e de interesses
de legitimação do trabalho acadêmico junto à sociedade) (DAGNINO, 2003).
Veja a seguir na Figura 9 o desenho da estrutura da rede de relações
interorganizacionais nesta fase da invenção:
Figura 9 - Rede de relações interorganizacional durante o período de invenção da linha de produtos inovadores.
Fonte: Da autora (Software Cmap Tools versão 5.03).
Legenda: ITEC – Instituto de Tecnologia; SPI – Setor de Propriedade Intelectual da Agência de Inovação
(Universitec); CNPq – RHAE - Programa de Formação de Recursos Humanos em Áreas Estratégicas.
De acordo com a estrutura apresentada, observa-se que nesta primeira etapa, a rede de
parceria se caracterizou por um relacionamento preponderante bilateral entre a AD e UFPA,
com a presença de corelações com instituições de fomente, porém estas mais restritas à
concessão de financiamento.
A organização de governança era relativamente informal, com contatos constantes
entre a equipe de desenvolvimento tecnológico da AD, com a equipe da FEA durante todo o
período. E quando da conclusão da invenção do processo tecnológico básico de produção da
156
linha de produtos, houve contatos de sócios da AD com a coordenação do SPI, para a
preparação do processo de pedido de patente para o INPI, e neste período que começou a
emergir uma maior formalização das relações.
Cabe mencionar que além do registro do pedido de patentes junto ao INPI no Brasil,
posteriormente a AD também fez a solicitação de patente junto ao escritório de patentes dos
Estados Unidos da América, do Peru, da indonésia, das Filipinas e da Colômbia em 2013,
representando um gasto em torno de 60.000 mil reais entre todos os encaminhamentos
necessários. A seleção dos países para requerimento de reconhecimento da patente seguiu dois
critérios distintos, conforme informação de um dos sócios da AD: A patente requerida nos
EUA teve enfoque de proteção em termos de comercialização pelo seu mercado consumidor,
enquanto que os demais países foram escolhidos com foco na proteção em termos de
produção, em virtude de terem semelhanças climáticas que poderiam no futuro viabilizar a
produção agrícola do açaí, e então o desenvolvimento de toda uma cadeia produtiva
verticalizada.
Esta preocupação com a possibilidade de cultivo do açaí em outras áreas do planeta
corresponde a atenção a um requisito técnico do processamento industrial da linha de
produtos, pois devido o fruto açaí ser muito perecível, o alto teor de antioxidantes dos
compostos inventados somente é conseguido se o processamento for realizado em, no
máximo, 24 horas após a colheita do fruto. Esse prazo exíguo para o processamento a partir
do horário de colheita estabelece uma forte vantagem comparativa para a agroindustrial
regional, visto que outras fábricas no Brasil e no exterior hoje já processam sucos, sorvetes e
combinados a base da polpa do açaí comprada, mas não poderiam produzir os ingredientes
criados pela AD e UFPA por inviabilidade logística. No entanto, a AD concebe como possível
que a alta demanda do fruto incentive a cultura do açaí em outros países, o que extinguiria a
vantagem comparativa regional ora em vigor.
De forma resumida, a invenção desenvolvida referiu-se a solução tecnológica para
processos de extração, fracionamento e purificação do fruto açaí, para a produção em escala
industrial de três produtos: Açaí Clarificado, Açaí Puro Antioxidante e Óleo Refinado de
Açaí. Por um lado, as atividades abrangeram pesquisas relacionadas à descoberta e extração
de compostos bioativos para aplicação industrial e, por outro lado, compreendeu o
desenvolvimento de uma engenharia de processo avançada que permitisse a extração e um
alto teor de purificação dos compostos de interesse em uma escala de produção industrial.
Segundo explicado por um dos sócios da empresa, esse processo tecnológico
possibilitou a oferta de produtos com qualidade diferenciada, ao obter um teor de
157
concentração de antioxidante acima do produto mais usado no mercado e melhor relação de
custo/benefício, o que representa o alcance de uma alta produtividade da fruta, conforme
estudos realizados pela AD com baseados nas sugestões de uso dos fabricantes dos produtos
no mercado em termos de ORAC (Oxygen Radical Absorbance Capacity), demonstrados no
na Figura 10:
158
Figura 10 - Quadro comparativo entre o composto concentrado antioxidante desenvolvido pelas AD e UFPA, e demais produtos disponíveis no mercado em
termos da proporção ORAC por dólar.
Fonte: Amazon Dreams (2012).
852
306
339
3.200
+66%
5.300
2.800
1.241
2.006
1.153
ORAC / USD
180.000
O.N.E 81.900
Monavie 60.534
Genesis Today 90.000
Bossa Nova 180.540
Amazon Dreams 126.000
Zola 90.000
Sambazon Caps
30.000
Sambazon
Smoothie Pack
Bolt House Farms 138.387
90
66
64
28
35
23
198
265
120
ORAC Acumulado Mensal¹ USD / Mês
159
A proposição de sustentabilidade desta fase de concepção de produto baseia-se em
desenvolver tecnologia que proporcione o melhor aproveitamento da matéria prima, buscando
a utilização de resíduos de cada etapa do processo produtivo para elaboração de diferentes
produtos, alcançando, também, maior eficiência dos demais meios de produção.
Adicionalmente, buscou-se também agrega valor tecnológico no produto de forma a valorizá-
lo economicamente e assim possibilitar a geração benefícios a toda a cadeia de produtiva a
montante.
Cabe examinar que neste período na rede interorganizacional, não se percebe a
atuação de uma organização focal (central) com processos estruturados no sentido daqueles
vinculados a apropriabilidade propostos por Dhanaraj e Parkhe (2006). No entanto, parte
desses processos se funções são postos em práticas, seja por iniciativas de uma das partes, seja
pela própria necessidade de viabilizar o desenvolvimento inovativo que conduz a construção
de consensos para ações conjuntas dessas partes.
Deste modo, se investigou a possível ocorrência dos três processos (gestão da
mobilidade do conhecimento, gestão da apropriabilidade e gestão da estabilidade da rede),
com vistas a pesquisar seu alcance e limites nas relações interorganizacionais, e as
implicações para os resultados do processo de inovação.
Em relação a gestão da mobilidade do conhecimento, observamos que as duas
organizações possuíam capacidades absortivas para identificar, adquirir e aplicar os
conhecimentos compartilhados pela parceira que precisavam para o processo de
desenvolvimento tecnológico. Ressalta-se a importância da capacidade absortiva para a área
da biotecnologia, em que como defendem Powell, Koput e Smith-Doer (1996, p. 118) a
interação interorganizacional é relevante em virtude de demandar um conjunto de capacidades
e conhecimentos que, em geral, excedem os recursos de uma única organização. Isso,
principalmente pela diversidade de fontes de inovação necessárias, que engloba tanto aspectos
científicos sofisticados, como atributos de mercado e regulatórios, o que abre espaço para a
contribuição de diferentes perfis de organizações (POWELL; KOPUT; SMITH-DOERR,
1996, p. 118), neste caso específico com a interação de uma universidade (perfil com ênfase
acadêmico e científico) e uma empresa privada (perfil como foco em aplicação produtiva e
comercial).
No entanto, essa “transferência” de conhecimentos e tecnologia, e a construção de
novas combinações destes conhecimentos exige capacidades internas das organizações para
reconhecer, avaliar, selecionar, negociar, e fazer as adaptações necessárias e aplicar a
160
tecnologia ao seu processo produtivo (DOSI, 1988, p. 1132; POWELL; KOPUT; SMITH-
DOERR, 1996, p. 119).
Este é um ponto importante da relação interorganizacional entre AD e UFPA, e da
composição de capacidades da AD em si. Entendemos como fundamental a AD ter
capacidade absortiva potencial (aquisição e assimilação de conhecimento) para perceber as
oportunidades tecnológicas no campo da biotecnologia aplicada à biodiversidade amazônica,
e assim desenvolver capacidade absortiva realizada com sua efetiva transformação em
conhecimento interno e aplicação em produtos para buscar obter vantagens competitivas.
Neste sentido, pode-se corroborar que as capacidades absortivas moderam o desenvolvimento
de oportunidades tecnológicas, como propõem Zahra e George (2002, p. 185)
Além da perspectiva de desenvolvimento tecnológico, observamos também
aprendizado em termos organizacionais em procedimentos administrativos e de proteção
comercial por ambas as organizações como o processo de proteção à propriedade intelectual
que também demandou um esforço de aprendizado conjunto dos atores para a elaboração
adequada do pedido de patente, se caracterizando em termos de um aprendizado learning by
doing a medida de cada organização avançava em uma proposição e um consenso precisava
ser alcançado, em um processo de interdependência entre os membros da rede para atingir a
forma final do produto e patente.
Um caráter de aprendizado do desenvolvimento da inovação em termos de interação
interorganizacional e das diferentes contribuições de cada organização é reconhecido pela
Coordenadora do SPI da Universitec (UFPA):
Normalmente, a Universidade, ela tem aquilo que a gente costuma chamar de
patente “mãe”, a patente primeira, que às vezes faz um protótipo em nível de
laboratório, nem sempre, a gente não trabalha muito com escala industrial... Mas entre essa patente mãe e o mercado existe uma distância muito grande, que você tem
que ver matéria prima, ver escala, ver mercado, ver tudo isso e esse não é papel da
Universidade, esse é o papel da empresa. Agora isso depende muito da parceria, nas
primeiras parcerias que esse processo inicia e ele tem um caráter pedagógico.
(Informação verbal)24
Amato Neto e Amato (2009) indicam que outro fator chave para o intercambio de
conhecimento nas relações interorganizacionais é que se baseiam fortemente em relações
informais e interpessoais, neste sentido, a AD ao ter sido criada por um transbordamento da
UFPA colabora em estabelecer um grau de integração e múltiplas relações (profissional,
24
Entrevista concedida pela Coordenadora do SPI da Universitec (UFPA) em 16/01/2014.
161
professor/aluno, pessoais) entre os membros da AD e da UFPA, em consonância com a
função de socialização de conhecimentos de Dhanaraj e Parkhe (2006).
De forma geral, em termos da mobilidade do conhecimento, entende-se que as
relações estabelecidas entre UFPA e AD seguem as funções defendidas por Dhanaraj e Parkhe
(2006), proporcionando o aprendizado entre as partes, e contribuíram diretamente para o
compartilhamento efetivo de conhecimento e alcance inventivo do processo tecnológico
criado.
No que tange a gestão da apropriabilidade, compreendemos que nesta fase de
invenção, uma das principais decisões quanto a apropriabilidade referiu-se especificamente a
cotitularidade da patente requisitada. O processo de negociação e elaboração do pedido de
patente foi uma construção de consenso entre as partes parceiras, sendo os percentuais
definidos de divisão de royalties em 20% à UFPA e 80% à AD. Segundo a coordenadora do
SPI se chegou a esta proporção em virtude dos investimentos da AD em ter montado uma
planta piloto de produto, e ficar responsável por todo o processo de fazer os primeiros
produtos, realizar estudos e testes mercadológicos, de acordo com as seguintes indicações:
Em relação à titularidade ela é conjunta, ela é das duas instituições. Agora royalties,
como a empresa que está estabelecendo, por exemplo, planta piloto de produto, ela
que vai fazer os primeiros produtos, ela que vai fazer os ensaios de mercado, ela que
vai fazer o estudo mercadológico, ela assumiu tudo isso... nós temos 20% e a
Amazon Dreams tem 80%. (Informação verbal)25
A divisão de royalties depende do que cada empresa investiu, cada instituição
investiu na tecnologia... Esse percentual já era utilizado dentro da instituição (80% e
20%)... isso não é regra, isso é uma das exceções que a gente trabalha, a regra normalmente é 50%-50%. (Informação verbal)26
Nesta construção de consenso houve, por um lado, dificuldades relatados no âmbito da
parceria correspondente à falta de maior experiência das partes e de parâmetros prévios
definidos por estas para processos de propriedade intelectual, além de muitas etapas
administrativas internas na UFPA, pelas quais esse tipo de processo deve que passar, o que
demandou esforço conjunto e tempo considerável para superação. Muitas vezes o processo
deve que ser chancelado por áreas internas da UFPA que não tiveram contatos prévios ao
processo, a relativa novidade do processo e a falta de interação social com estas instâncias
dificultava também seu andamento.
25 Entrevista concedida pela Coordenadora do SPI da Universitec (UFPA) em 16/01/2014. 26 Entrevista concedida pela Coordenadora do SPI da Universitec (UFPA) em 16/01/2014.
162
Por outro lado, nota-se que a existência de confiança entre as partes permitiu que,
apesar das dificuldades apresentadas quanto a negociação ter sido extensa para definição de
parâmetros e atendimento de fases burocráticas de processo da Universidade, houve
substancial consenso em relação ao reconhecimento da cotitularidade e em relação aos
percentuais de royalties acordados, considerando a compreensão das contribuições de cada
organização ao processo de desenvolvimento da linha de produtos. Como pode ser visto na
fala da Coordenadora do SPI, ao informar que apesar de não ser utilizado o percentual
normalmente indicado pela Universidade de divisão de royalties, distingui as contribuições da
AD no processo que justifica seu percentual diferenciado.
Outro ponto a ressaltar é que os benefícios apropriados pelas partes relacionados ao
processo de inovação podem estar associados a outros tipos de ganhos às partes, além dos
econômicos. O caso em estudo envolveu a concepção de uma inovação com uma noção de
promoção de desenvolvimento regional por meio do conhecimento científico e tecnológico, o
qual congregou interesses acadêmicos e empresariais em torno de uma finalidade socialmente
relevante, capaz de ocasionar efeitos positivos a legitimidade social das partes.
E por fim, entendemos que em termos de gestão da estabilidade da rede, a dinâmica de
relações entre UFPA e AD foi efetiva quanto à função de ampliação de perspectivas futuras
positivas à medida que o processo de invenção alcançou resultados de alta qualidade tanto de
produtos como de processo produtivo criado, com a geração de expectativas favoráveis a
continuidade do processo de inovação. Também se registrou uma multiplicidade de relações
entre os membros das organizações, particularmente facilitada pela AD ser uma spin off da
UFPA, que fez com que a maior parte seus membros iniciais tivessem diversos vínculos com
a UFPA (docente, discente, colaboração de pesquisas anteriores, vínculos de amizades).
No entanto, a rede interorganizacional durante a invenção teve uma composição
predominante de relações bilaterais, de modo que por mais que tenham ocorridos avanços em
relação ao fortalecimento dos vínculos e compartilhamento de conhecimentos e recursos,
havia uma diversidade bem restrita de atores. Na próxima fase com a implementação da
inovação torna-se necessária uma expansão e aprofundamento das relações na rede.
- A inovação:
Conforme Barbieri (2004) estabelece, a inovação corresponde a um fato técnico,
econômico e organizacional, que envolve uma combinação de diversos meios de produção,
com vistas ao alcance de resultados específicos. O momento denominado de inovação no caso
163
estudado caracteriza-se pelo conjunto de ações relacionadas à implementação produtiva e
comercial da linha de produtos criados no mercado.
Neste estágio observa-se um adensamento de relações e novos atores na rede, o que
implicou em uma demanda de estrutura de governança mais complexa. Entende-se que essa
maior heterogeneidade na rede deveu-se as exigências do processo de inovação em si, com a
aplicação do processo tecnológico em produção de escala industrial e a introdução de
produtos no mercado, havendo uma necessidade de atividades e competências mais diversas
que a fase anterior.
Neste sentido, destaca-se que, enquanto na etapa anterior de invenção o cerne das
relações era o desenvolvimento tecnológico economicamente viável dos processos e produtos,
nesta segunda etapa nota-se a emergência de uma maior atenção para coevoluções de
necessidades de inovações organizacionais, institucionais e sociais (RENNINGS, 2000) para
efetividade do modelo de negócio.
Desta forma, para a implantação dos processos de produção tecnologicamente
avançados era preciso, por exemplo, encontrar fontes de financiamento, gerar
comprometimentos na cadeia de suprimentos para o estabelecimento de determinados padrões
de desempenho, e atuar junto a clientes para persuadi-los quanto às vantagens da linha de
produtos e os valores diferenciais relacionados.
Um dos primeiros destaques de atividades na rede da etapa foi a admissão da AD no
Programa de Incubação de Empresas de Base Tecnológica (PIEBT) da Agência de Inovação
da UFPA. Assim, por parte da UFPA, além da participação preponderante das unidades da
FEA/ITEC e do SPI (que passa neste período a ser vinculado a Agência de Inovação), o
PIEBT também se torna ponto relevante de relações com a Amazon Dreams como empresa
incubada. Conforme Amato Neto e Amato (2009), uma incubadora de empresas atua como
um arranjo interorganizacional que visa prover de infraestrutura física, administrativa e
operacional empresas de pequeno porte durante seus primeiros anos de constituição. Deste
modo, observa-se uma ampliação das relações entre UFPA e AD para uma maior diversidade
de domínios de atividades que envolvem o desenvolvimento da inovação.
As primeiras ações da AD para viabilizar a produção e comercialização da linha de
produtos inovadores foi a montagem de estrutura de produção e gestão, com o aporte de
recursos do Fundo Criatec iniciativa do BNDES e BNB, indicado anteriormente no capítulo 3.
Este financiamento teve uma função de crédito importante na formação desta inovação como
base para o modelo de negócio da AD.
164
Inicialmente, a AD buscou realizar o processo produtivo e comercial tendo como
fundamento sua própria estrutura em parceria com recursos do PIEBT. Nesta produção contou
com o fornecimento de frutos da COFRUTA (Cooperativa de Fruticultores de Abaetetuba),
localizada no município de Abaetetuba, próximo à Belém, capital do Estado do Pará. A
COFRUTA já era conhecida dos membros da AD e da UFPA (FEA), e tinha participado de
atividades de extensão da universidade.
A COFRUTA com apoio da AD alcançou a certificação orgânica dos frutos de açaí
fornecidos, o que por um lado é importante no âmbito da proposta de valor da linha de
produtos da biodiversidade amazônica da AD, e por outro lado oferece vantagem à
cooperativa pela oportunidade de vender os frutos com um preço premium devido a percepção
de acréscimo de valor pelo mercado.
Contudo, se constatou uma série de entraves neste período para a adequada realização
da inovação. As dificuldades se relacionam, por um lado, a não concessão de licenças e
certificações necessárias para exportação tanto em relação às instalações da COFRUTA e da
operação industrial da AD dentro do programa de incubação da UFPA, em relação
infraestrutura de saneamento e vigilância sanitária. Por outro lado, houve limitações na
infraestrutura interna da AD quanto à escala de produção para atendimento da demanda de
grandes lotes por clientes, que não conseguiu atender todos os pedidos que recebeu durante o
período de safra.
Cabe esclarecer que o foco principal de clientes para a linha de produtos desenvolvida
pela AD é o mercado internacional, a empresa chegou a contatar com algumas grandes
industriais nacionais, mas os retornos de clientes com interesse sobre os produtos foram
predominantemente do exterior. Conforme relatório do CGEE (2007, p. 156), as empresas
exportadoras em geral têm problemas com critérios de vigilância sanitária, em função dos
elevados custos financeiros e administrativos para se adequar às normas específicas de
manejo, armazenamento, beneficiamento, transporte e condições adequadas de
comercialização de produtos da biodiversidade, considerando as normas técnicas para o
produto e as exigências fitossanitárias e toxicológicas.
Estes obstáculos para atendimento de requisitos e volume de fabricação se relacionam
a falta de desenvolvimento na AD de capacidades de produção mais robustas, discutidas no
capítulo 3. Deste modo, apesar das capacidades tecnológicas da AD permitirem a
configuração de um processo de produção avançado para fabricação da linha de produtos, a
ausência de rotinas e estrutura de produção mais amadurecidas impedia a implementação da
inovação no mercado.
165
A Amazon Dreams, como vimos no capítulo três (3) caracteriza-se como uma
indústria de pequeno porte, para a qual os investimentos necessários para atingir o
processamento de grandes lotes industriais foram considerados muito altos ao se considerar a
constituição de uma planta industrial mais robusta, bem como os acréscimos de capacidades
de operações, incluindo a coordenação de uma ampla rede de suprimentos, e o atendimento de
requisitos de certificações internacionais. Além disso, destacamos que a opção estratégica da
AD foi identificada como se especializar em um nicho de bioprospecção e desenvolvimento
tecnológico como atividades de core business, de modo que um maciço investimento neste
conjunto de atividades de produção e operações não apresentaria coerência com esta
estratégia.
Entretanto, tais capacidades de produção e operações podem ser caracterizadas como
ativos complementares, que mesmo não tendo estado na essência da inovação desenvolvida,
são indispensáveis para alcance de seu sucesso comercial no mercado, de forma que se a
empresa inovadora precisa desenvolver ou assegurar a obtenção destes ativos complementares
para que esteja em posição de se apropriar dos resultados de sua inovação (TEECE, 1986).
Diante desta situação, a AD realizou estudos para encontrar uma agroindústria já estabelecida
na região com capacidade de produção consolidada para firmar parceria.
Duas empresas foram analisadas pela AD, uma delas foi a Belaiaçá, com a qual a AD
já havia realizado uma transação comercial anteriormente. A Belaiaçá, por sua vez, também
tinha identificado na AD uma oportunidade de parceria para verticalizar sua produção e entrar
no segmento de ingredientes. Segundo o Diretor de Marketing da Belaiaçá, a AD já era
conhecida pelas agroindústrias locais, e um dos sócios, que é professor da UFPA é
considerado como referência sobre o açaí na região27
. Além disso, também receberam uma
indicação de um cliente nos Estados Unidos que estava interessado na aquisição de açaí
clarificado, recomendando o produto desenvolvido pela AD28
.
Desta forma, começou a ser negociada a parceria entre AD e Belaiaçá para
transferência de tecnologia da produção da linha de produtos de açaí por meio de um acordo
de Sociedade de Propósito Específico (SPE), que se caracterizaria como uma joint venture,
chegando aos termos finais no final de 2012.
A negociação definiu papéis e benefícios entre as organizações, em um desenho de
parceria que se caracterizou como de complementação de recursos: A Belaiaçá assumiria
todas as funções de processamento dos lotes de produção, com a gestão da rede de produtores
27 Anotação em diário de campo durante visita à Belaiaçá acompanhada pelo Diretor de Marketing. 28 Anotação em diário de campo durante visita à Belaiaçá acompanhada pelo Diretor de Marketing.
166
de açaí, e de seus contatos comerciais. Enquanto que a AD seria responsável pela
coordenação da transferência tecnológica com o scale up e validação da produção para a
planta industrial da Belaiaçá, além da gestão da patente, com assistência de contatos técnicos
de requisitos e aplicações da linha de produtos junto aos clientes. Apresentamos na Figura 11
o desenho da rede de relações interorganizações acordada entre AD, UFPA e Belaiaçá para a
implementação da inovação.
Figura 11- Rede de parcerias durante a implementação do negócio (inovação).
Fonte: Da autora (Software Cmap Tools versão 5.03).
Para Gulati e Singh (1998, p. 786), nas joint venture em que há uma alocação formal
dos papeis dos parceiros, a divisão de trabalho e interações se tornam mais previsíveis e
permite que decisões conjuntas sejam mais a regra do que exceção, pois esclarecem as
fronteiras de decisão e atividades. Particularmente entre parceiros em que não há laços fortes
prévios, esta estruturação pode ajudar a estabelecer relações estáveis que possam se
desenvolver em termos de confiabilidade e reciprocidade, o que é o caso entre AD e Belaiaçá,
visto que sua relação até este ponto pode ser qualificada como de laço fraco.
Para Ceccagnoli e Rothaermel (2008, p. 19), as joint ventures, baseadas em repartição
de ganhos (equity) com a configuração de uma terceira organização, são instrumentos para
cooperação frequentemente utilizados com a emergência da biotecnologia em indústrias,
particularmente em setores como o farmacêutico. A AD já havia passado por um processo de
equity quando de sua admissão no Fundo Criatec, mas neste caso o instrumento usado foi a
alteração da própria constituição da empresa para divisão de quotas ações com o BNDES e
BNB, o que representou um processo mais abrangente ao envolver o compartilhamento de
capital de toda uma organização.
167
A criação da Sociedade de Propósito Específico (SPE) com a Belaiaçá representava
um acordo delimitado à linha de produtos do açaí, baseado na propriedade intelectual da AD,
em que havia o estabelecimento de uma produção mínima anual, e conforme desenho de
obrigações das partes, foi determinada a divisão dos resultados em 50% para cada uma das
partes, como indicado pelo sócio da AD: “Os 50%-50% se justifica muito na joint venture... a
gente tem o know-how... mas ele tem toda a expriência de produção em escala, contatos
comerciais”. (Informação verbal)29
No entanto, para que a AD pudesse oficialmente firmar o acordo com a Belaiaçá, era
necessário antes celebrar acordo de licenciamento para exploração da patente junto com a
UFPA, codetentora da patente. Essas negociações entre AD e UFPA foram iniciadas
formalmente a partir de 2011 para celebração de dois acordos. Um referente ao acordo de
titularidade da patente entre AD e UFPA, onde foram estabelecidos parâmetros de
propriedade intelectual entre as partes, por exemplo, de divisão de royalties advindos da
exploração da invenção.
Outro acordo correspondente ao contrato de sociedade para gestão dos ativos
tecnológicos, o qual concedeu exclusividade para AD utilizar a patente, tornando-a
responsável pela exploração econômica e gestão da patente, mediante o pagamento de 2,5%
de royalties a UFPA sobre o faturamento, sendo que se não houver produção anual, a AD
deveria pagar multa a UFPA no valor de R$10.000,00, como relata o sócio da AD: “A
negociação (de royalties) foi na base de 2,5% do faturamento, com uma subclausula que não
havendo o pagamento de R$10.000,00, esse valor de royalties deveriam ser devidos à UFPA,
ou seja, a situação atual, não houve produção, a gente tem que pagar R$10.000,00”
(Informação verbal)30
Este foi o primeiro acordo de licenciamento de tecnologia a ser firmado tanto pela AD
como pela UFPA, por esse motivo, parâmetros e espaços de governança tiveram que ser
construídos. Para a coordenadora do setor de propriedade intelectual da Universitec este é
considerado um “caso paradigmático” para a UFPA, pois apesar da universidade já ter várias
patentes, foi a primeira vez que conseguia fazer o licenciamento para exploração comercial de
uma patente e, deste modo, concluir todo um ciclo de transferência tecnológica que poderá
trazer benefícios à sociedade. A Coordenadora do SPI da UFPA expressa essa relevância do
processo nos seguintes relatos: “Não basta licenciar, você tem acompanhar para ver se dá
29
Entrevista concedida pelo Sócio da empresa Amazon Dreams em 13/01/2014. 30 Entrevista concedida pelo Sócio da empresa Amazon Dreams em 13/01/2014.
168
certo, até porque é o primeiro, então a gente tem tudo o interesse que dê certo... porque é um
caso paradigmático para a gente.” (Informação verbal)31
É a primeira vez que licencia patente que envolve também um professor, então é
uma coisa nova dentro da instituição, ela tem realmente um caráter pedagógico... Foi
um trabalho construído... (os principais pontos de atenção) a própria titularidade, a própria exclusividade, a própria delimitação de mercado, essas questões normais de
contrato. (Informação verbal)32
O resultado das negociações de distribuição de ganhos econômicos entre as três
organizações âncoras do processo de inovação, considerando tanto a divisão de rendimentos
da SPE entre AD e Belaiaçá, como a sobreposição do acordo de royalties entre AD e UFPA,
ficou conformada da forma exposta na Figura 12:
Figura 12 - Demonstrativo de distribuição de percentuais a serem apropriados pelas organizações
sobre o resultado da comercialização dos produtos da linha de antioxidante do açaí.
Fonte: Da autora (2014).
No entanto, um obstáculo importante durante este processo foi o tempo necessário
para conclusão de celebração destes contratos. Segundo sócio da AD, o processo inicial de
solicitação foi protocolado na UFPA em abril de 2011, e o contrato de gestão da patente foi
concluído somente no dia 28 de outubro de 2013, quando, então, a AD estaria apta a assinar o
contrato de SPE com a Belaiaçá:
31 Entrevista concedida pela Coordenadora do SPI da Universitec (UFPA) em 6/01/2014. 32 Entrevista concedida pela Coordenadora do SPI da Universitec (UFPA) em 6/01/2014.
169
Abril 2011 foi a data que eu fui na Procuradoria (da UFPA) entregar a primeira
versão do instrumento de exploração... Fechou quando? 28 de outubro de 2013, dois
anos e meio, para a empresa tu imaginas, eu totalmente desgastado com isso... a
gente perdeu a safra de novo... Quando tava liberado, e a gente podia até que enfim
encomendar a linha para alugar que demorou duas semanas para chegar, mais duas
semanas para montar e tal já tava chegando em dezembro. (Informação verbal)33
Cabe ressaltar que, como a AD e Belaiaçá tinham chegado a um acordo informal dos
termos da SPE no final de 2012, no decorrer do ano de 2013 as organizações haviam realizado
várias atividades, inclusive com investimentos financeiros, visando a produção durante a safra
(segundo semestre). Entre estas atividades estavam tanto associadas a produção como a
comercialização.
A adaptação e validação do processo tecnológico de produção na fábrica de Castanhal
da Belaiaçá da linha de produtos, envolveu a equipe da AD na análise e desenho de infra
estrutura para uma nova escala de processo, sendo definido equipamentos a serem utilizados
da Belaiaçá, e outros usados mediante aluguel, conforme informa um sócio da AD: “A gente
alugou uma linha piloto para colocar na Belaiaçá para fazer scale up industrial de açaí nessa
safra, só de aluguel de equipamentos a gente quase chegou a R$150.000,00 entre aluguel e
deslocamento.” (Informação verbal)34
Portanto, foi feito teste de validação da produção, no qual incidiu tais custos de
aluguel, frete e montagem destes equipamentos, tendo a AD conseguido um aporte de
recursos para esse scale up via fomento do Banco da Amazônia (BASA). Sobre o desafio de
adaptação tecnológica do processo de produção, um sócio da AD relata:
Uma coisa é fazer em bancada de laboratório para publicar, que é a lógica da
unversidade, mas a lógica da empresa é uma lógica de scale up e produção
industrial, então os parâmetros não são os mesmos muitas vezes, porque tu não
podes trabalhar nas mesmas condições em bancada e em chão de fábrica, e quando a
gente saí da Amazon Dreams e vai pra Belaiaçá, em uma escala industrial, daí muda
a escala e é outra realidade... tu tens que rever os processos, pensar os processos para
aplicabilidade deles em escala industrial. (Informação verbal)35
Além dos atributos internos da planta industrial, a fabricação dos compostos da linha
de produtos em estudo também apresentava requisitos relacionados à rede de suprimentos e
matéria prima, pois para a produção dos produtos é necessário utilizar frutos do açaí com alto
teor de antocianina (componente antioxidante). Assim, foi organizado processo para que os
carregamentos de frutos ao chegarem na fábrica da Belaiaçá fossem examinados, e aqueles
33 Entrevista concedida pelo sócio da empresa Amazon Dreams em 13/01/2014. 34 Entrevista concedida pelo sócio da empresa Amazon Dreams em 13/01/2014. 35 Entrevista concedida pelo sócio da empresa Amazon Dreams em 13/01/2014.
170
que apresentam o teor aceitável ou acima do aceitável em antocianina seriam selecionados
para a produção dos compostos, como indicado pelo Diretor de Marketing da Belaiaçá:
É um fornecimento diferenciado... no caso dos produtos da joint venture é feita uma
análise na recepção do produto do teor de antioxidante que aquele produto tem, se o
teor for aceitável, existe a classificação, existe o teor aceitável ou muito bom, e o
que a gente vai rejeitar, o rejeitado vai ser rejeitado para aquele produto, não é que
seja um produto ruim... (Informação verbal)36
Como o componente antioxidante tem alta perecibilidade, além da identificação do
nível de antocianina, também é necessário realizar um rápido processamento dos produtos de
modo a garantir o teor de antioxidante da ficha técnica dos produtos, por isso também foi
preciso um planejamento de produção em turno diferenciado: “Hoje, ele (fruto) é processado
em menos de 10 horas, e ele é processado durante a noite, a madrugada, para poder ter o
menor tempo possível entre a colheita e o processamento.” (Informação verbal)37
Segundo o Diretor de Marketing da Belaiaçá, a AD expressou interesse que os
produtores que fornecessem os frutos para a produção dos compostos tivessem uma
remuneração diferenciada, porém a Belaiaçá ainda não teria ainda condições para isso, pois
não tinha um mapeamento prévio das áreas com açaí de maior teor de antocianina, somente
descobrem quando o fruto já está na fábrica, o que tornaria difícil uma negociação
diferenciada com os produtores, conforme relato:
Os produtos da joint venture, até o sócio da AD queria que isso fosse feito
(remuneração de forma diferenciada aos fornecedores), só que a gente não
encontrou uma forma de potencializar isso, eu acredito que na próxima safra tenha, porque na verdade a gente analisava o teor de antocianina aqui na hora, não é como
esse que eu sei que dá bom rendimento, não, esse daqui é uma especificação mais
técnica, que uma análise que vai me dizer, mas esse ano a gente tem um mapa já da
região que tem, que é o melhor para isso, e acho que dá para trabalhar, mas não
acontece ainda assim. (Informação verbal)38
A comercialização dos produtos também é vista um desafio importante a ser superado,
pois o lançamento de produtos no mercado de ingrediente contempla um forte domínio
técnico em que requisitos e possibilidades de aplicações tem que ser esclarecidas, amostras
para testes nos clientes devem ser fornecidas, pois seu uso na fabricação de produtos finais ao
consumidor implica em todo um processo de P&D na indústria compradora. Assim, a AD e
Belaiaçá fizeram uma série de contatos comerciais, em que incluiu a realização de três
36 Entrevista concedida pelo Diretor de Marketing da Belaiaçá em 09/01/2014. 37 Entrevista concedida pelo Diretor de Marketing da Belaiaçá em 09/01/2014. 38 Entrevista concedida pelo Diretor de Marketing da Belaiaçá em 09/01/2014.
171
viagens ao exterior de representantes da AD e Belaiaçá para visitar clientes em potenciais e
participar de feiras internacionais, conforme indicou o Diretor de Marketing da Belaiaçá:
A gente fez uma viagem para os Estados Unidos e visitou uma lista de clientes
potenciais, alguns que já eram nossos clientes e outros clientes que poderiam ser, e a
gente foi lá e explicou qual era o produto, qual era a aplicação dele, apresentou as
vantagens, misturou ele com água, mostrou... e deixou amostras para as pessoas
testarem lá, e a gente também está participando de feiras, né, então a gente vai para
encontro internacional, ano passado (2013) nós participamos de três feiras
internacionais para mostrar esse produto. (Informação verbal)39
O Diretor de Marketing da Belaiaçá reconhece que o processo de venda desta linha de
produtos de ingredientes leva um tempo maior de maturação junto a clientes, como relata: “...
a gente entende que ele (produto) precisa de um tempo para as pessoas poderem entender,
para ele começar a ser procurado e consumido.” (Informação verbal)40
. “É um problema
porque não existia antes (produto inovador), e agora a gente tem que lançar no mercado, o
mercado tem que entender qual é o produto, pegar amostra, testar até chegar na aplicação.”
(Informação verbal)41
Apesar destas dificuldades, a AD e Belaiaçá haviam conseguido junto a um cliente
americano uma proposta de compra de quatro (4) containers de açaí clarificado para a safra de
2013. Contudo, como a assinatura e publicação do contrato de gestão de patente ocorreu
somente em outubro de 2013, quando já se aproximava o final da safra e o cliente que havia
realizado a solicitação de açaí clarificado, comprou o produto de outra agroindústria da
região, que segundo informações de sócio da AD, teria violado a patente do processo
tecnológico da AD e UFPA: “Já fomos copiados, tem duas empresas que produzem o
clarificado e tal, produto nosso que a gente sabe que é da nossa técnica pelo laudo técnico que
eu mesmo tenho do laboratório.” (Informação verbal)42
. “A gente perdeu a encomenda que
tinha tido em agosto, a gente não conseguiu cumprir, quem vendeu foi o concorrente que
copia, de Abaetetuba, vendeu esses containers de clarificado, e aí a gente não teve outra
encomenda.” (Informação verbal)43
Diante do final da safra, considerando que a produção da linha de produtos teria um
tempo útil de processamento na safra já bastante reduzido, e também com a perda do único
pedido encomendado previamente, a SPE não chegou a ser assinada entre AD e Belaiaçá na
39 Entrevista concedida pelo Diretor de Marketing da Belaiaçá em 09/01/2014. 40
Entrevista concedida pelo Diretor de Marketing da Belaiaçá em 09/01/2014. 41 Entrevista concedida pelo Diretor de Marketing da Belaiaçá em 09/01/2014. 42 Entrevista concedida pelo sócio da empresa Amazon Dreams em 13/01/2014. 43 Entrevista concedida pelo sócio da empresa Amazon Dreams em 13/01/2014.
172
safra de 2013. No entendimento do sócio da AD foram duas as principais repercussões
negativas, a perda de credibilidade da inovação pelos processos de infração de patente e o fato
de não terem conseguido novos pedidos de clientes: “Só que o tempo foi passando, passando,
a gente perdeu muito a nossa credibilidade quanto à inovação, então porque já tinham outros
copiando a nossa patente, o que é um problema... e ao mesmo tempo a gente não conseguiu
fechar contrato comercial.” (Informação verbal)44
A AD ainda procurou acionar duas agroindústrias da região por terem produzido o
clarificado de açaí com base em questionamento de infração de patente, uma delas sendo a
que comercializou com o cliente americano que havia encomendado o pedido anteriormente
junto a Belaiaçá e AD. Foi elaborado um laudo técnico do produto e, por meio de advogada
contratada pela AD cartas de notificação extrajudicial foram encaminhadas junto ao Tribunal
de Justiça Regional de Abaetetuba e de Castanhal, para notificação das empresas via oficial de
justiça, no entanto as empresas responderam alegando que não teriam utilizado do processo
patenteado, mas sem indicar o processo pelo qual produziram, conforme relato:
A gente fez o que se chamou de notificação extrajudicial, então a nossa advogada
por R$4.500,00 reais fez duas notificações como manda fazer a lei, a lei, ou seja,
através do Tribunal Regional de Abaetetuba e Castanhal, para que um oficial de
justiça vai encaminhar a notificação lá e isso custa caro. Isso foi notificado e ambos
nos responderem: ‘Não, a gente não tá fazendo coisa de vocês’... Precisa realmente
poder demonstrar que a pessoa faz, mas como eu vou fazer?... Aí depois para poder indicar que eu seja ressarcido, mas como que eu vou pagar tudo isso hoje, se o INPI
vai levar mais 06 anos para analisar o meu pedido... (Informação verbal)45
Neste caso para dar continuidade ao requerimento a AD deveria formalizar um
processo contra as empresas na justiça. Porém, até o final deste estudo a AD não havia
continuado o procedimento, conforme sócio entrevistado da empresa, a decisão de iniciar o
processo judicial relaciona-se aos custos que a AD teria que arcar e um descrédito em termos
da eficácia e do tempo que o processo levaria para ser concluído.
A AD, como gestora da patente, considera que a demora no trâmite de análise e
aprovação de patente pelo INPI é uma fragilidade no regime de apropriabilidade, sendo
percebida como condição de insegurança quanto ao reconhecimento da propriedade industrial.
De acordo com o relato do sócio da AD, há claro descontentamento quanto ao regime de
propriedade intelectual no país:
44 Entrevista concedida pelo sócio da empresa Amazon Dreams em 13/01/2014. 45 Entrevista concedida pelo sócio da empresa Amazon Dreams em 13/01/2014.
173
Claramente devidos a esses problemas do INPI (lentidão nas respostas dos
processos de patente), e esses problemas institucionais do Brasil, políticos,
problemas de legislação e tal... sinceramente o meu olhar hoje é ir no caminho do
segredo industrial. A PI só dar dor de cabeça e custa muito... (Informação verbal)46
Como a AD não conseguiu realizar a comercialização de contratos dos produtos
desenvolvidos em 2013, e seus sócios acionistas estão inclusive negociando um novo aporte
de recursos na empresa para mantê-la em funcionamento, nesta situação de dificuldade
financeira, o sócio entrevistado expressou que considera que a alocação de recursos
financeiros na continuidade de um processo judicial sobre a infração de patente não geraria
retorno em tempo hábil à empresa. Foi ainda ressaltado por este sócio que a UFPA se
posicionou de forma a não assinar conjuntamente a notificação, justificando que a AD pelo
contrato firmado é a gestora da patente e, portanto, responsável por todas as despesas
incidentes nesta atividade. Do modo similar este sócio indica que a Belaiaçá se pronunciou no
sentido que este problema deveria ser resolvido pela AD, pois correspondia a questões da
patente que seria responsabilidade na AD nos termos do acordo negociado.
Assim, entendemos que houve um exercício de funções estritamente formais
(contratuais) sobre os mecanismos de proteção de patente, de modo que as relações sociais
estabelecidas entre os parceiros neste aspecto demonstraram-se fracas (fraca reciprocidade), e,
portanto, as habilidades da rede de relações interorganizacionais para exercer e proteger seus
direitos de propriedade intelectual tornaram-se frágeis, pois se contasse com o apoio de todos
seus membros poderiam ter melhores condições administrativas e financeiras para assegurar o
cumprimento desses direitos frente a outros atores de mercado. De forma que neste caso, a
estrutura de laços sociais não foi capaz de fortalecer o desempenho econômico dos parceiros.
A ênfase sobre a patente e seu instrumento de gestão teve como consequência que
outros meios de assegurar a apropriabilidade fossem negligenciados (como segredo industrial)
ou inviáveis de serem utilizados, como a liderança de tempo de lançamento no mercado. E,
embora tenha havido esse enfoque sobre a propriedade industrial, quando levantada a questão
de ocorrência da violação de patente, UFPA e Belaiaçá isentaram-se da participação com a
AD de um arranjo de solução conjunta ao problema.
No que tange às funções e disfunções das relações interorganizacionais desenvolvidas
nesta etapa de inovação, faremos uma análise tendo por base os três processos
interrelacionados à apropriabilidade em redes indicados por Dhanaraj e Parkhe (2006).
Quanto a gestão da mobilidade do conhecimento, entendemos que o desenvolvimento
46 Entrevista concedida pelo sócio da empresa Amazon Dreams em 13/01/2014.
174
tecnológico da fase de implementação se concentrou quanto aos aspectos de produção no
processo de adaptação do processo à estrutura industrial da Belaiaçá e quanto aos fatores
comerciais nos requisitos de produtos e potencialidades de aplicação para setores industriais.
No entanto, a configuração e os testes de produção na planta da Belaiaçá ficaram sob a
responsabilidade dos membros da AD, sendo indicado por ambas as organizações que houve
transbordamento mínimo de conhecimento sobre o processo para os membros da Belaiaçá, o
que entendermos ter origem tanto em questões de apropriabilidade como em termos de
capacidade absortiva.
Em relação a questões de apropriabilidade, observamos que segundo a AD houve
precauções de sigilo industrial com a equipe da Belaiaçá, visto que durante todo o processo de
validação de produção o contrato da SPE não havia sido assinado. Portanto, observamos a
interferência de fator vinculado à apropriabilidade sobre atividades de socialização e
compartilhamento de conhecimento, em que a insegurança da celebração do acordo
contratual, juntamente com a caracterização de laços sociais fracos entre os membros das duas
organizações (baixo nível de confiança), provocou um desincentivo a processos de
transferência de tecnologia.
Mas também cabe notar as deficiências da Belaiaçá em termos de capacidade
absortiva, de modo que mesmo a visualização e o acompanhamento por parte de seus
membros de todo o procedimento de montagem e validação industrial não lhe forneceu
elementos necessários ao aprendizado de processo tecnológico avançado.
Contudo, em relação às informações comerciais, identificamos maior
compartilhamento de conhecimento entre a AD e Belaiaçá, entendemos que isso aconteceu
por duas razões principais, uma associada ao fato que o conhecimento da ficha técnica do
produto para comercialização não implica em conhecimento sobre o processo de produção em
si (o produto final não possibilita aplicação de engenharia reversa, por exemplo) o que reduz
preocupações de apropriabilidade. Também notamos um maior componente de capacidade
troca de conhecimento entre as organizações, no sentido que a AD partilhava conhecimento
de características e aplicação do produto, enquanto a Belaiaçá partilhava seus contatos
comerciais.
A Belaiaçá e a UFPA mantiveram laços indiretos no período, assim seu canal de
comunicação comum era a AD. Durante esta fase de implementação da inovação, a relação da
AD e UFPA predominou questões associadas aos acordos contratuais, em que a estrutura de
governança tornou-se mais formal que na etapa anterior de ênfase no desenvolvimento
tecnológico. Observamos que nesta fase o relacionamento de membros da AD se ampliou
175
para outros membros da estrutura administrativa e jurídica da UFPA, com uma tendência ao
estabelecimento de instrumentos de governança de mercado, por meio de contratos comerciais
com responsabilidade formais individualizadas entre as organizações (menor senso de
interdependência), como ressaltamos na questão da definição de procedimentos quanto à
situação de alegação de infração de patente.
No entanto, cabe indicarmos que houve continuação de relações em termos de
pesquisas científicas e tecnológicas entre os membros da FEA/UFPA e AD, mas pertinentes a
projetos de P&D de outras linhas de produtos, já não a de açaí. Assim, compreendemos que
entre AD e UFPA foi desenvolvida uma multiplicidade de relações.
No que tange a gestão da apropriabilidade da inovação, observou-se que apesar de
haver a construção de uma estrutura de processos de decisão conjunta entre UFPA e AD,
chegar a um consenso levou um prazo considerável, particularmente dentro da própria UFPA,
pois mesmo internamente entre os membros havia posicionamentos distintos. Apesar de se
reconhecer que era o primeiro caso de licenciamento que a universidade fazia, o tempo que
levou sua condução prejudicou o uso de outros mecanismos de apropriação, como o leading
timing (liderança de lançamento no mercado) e criou maior pressão sobre o segredo industrial.
De forma que como regime de apropriabilidade se mostrou fragilidade, a ênfase da
UFPA sobre o mecanismo de propriedade intelectual parece não ter direcionado o foco quanto
à eficácia de proteção ao processo de inovação específico, em vez disso abrangeu uma
discussão mais ampla de política de propriedade intelectual interna da universidade, enquanto
que a AD, como pequena empresa privada, tinha a necessidade de um procedimento mais ágil
que lhe permitisse o faturamento sobre a comercialização da primeira linha de produtos.
Assim, consideramos que o processo de celebração dos contratos de titularidade e de
gestão da patente entre UFPA e AD não teve o mesmo nível de prioridade entre certas
instâncias da UFPA (desacopladas das atividades fins de fomento à inovação) e a AD, além
de que o foco dos objetivos e expectativas entre as organizações estavam desalinhados, o que
novamente afasta comportamentos típicos de governança de redes entre seus membros
(interdependência, reciprocidade e confiança), e aproxima-se de uma estrutura de negociação
em governança de mercado (independência entre as partes, foco em aspectos formais e
objetivos prioritários distintos).
A estrutura de negociação entre AD e Belaiaçá foi mais ágil, provavelmente por serem
as duas organizações do setor privado, o que facilita um alinhamento de objetivos com foco
prioritário para a apropriação de resultados econômicos da comercialização da inovação.
Contudo, suas relações caracterizavam-se como de laços fracos, e a não assinatura do contrato
176
da SPE gerou uma insegurança sobre a estrutura de papéis negociada e a efetividade da
parceria, de modo não houve desenvolvimento de maior grau de confiança, nem o
estabelecimento de um acordo definitivo de apropriabilidade entre as partes. Consideramos
que essa situação gerou efeitos negativos em relação à mobilidade de conhecimento e à
estabilidade da rede, e, inclusive, quanto um possível apoio da Belaiaçá à AD no processo
contra a infração de patentes. Entendemos que isso corrobora a função mediadora da gestão
de apropriabilidade em relação à mobilidade de conhecimento e estabilidade da rede proposta
por Dhanaraj e Parkhe (2006).
Cabe indicar que as negociações de valores percentuais se conformaram em níveis
considerados equitativos entre as partes, entende-se que dificuldades na consistência nos
processos de apropriabilidade não tiveram vínculos com a negociação de distribuição de
resultados, mas sim quanto a eficácia em si dos mecanismos selecionados e sua forma de
execução.
No que concerne a gestão da estabilidade da rede, verificamos que no início deste
período de implementação da inovação houve a construção de perspectivas futuras positivas
entre as partes, com a previsão de compartilhamento de recursos e benefícios, no entanto, ao
final deste período de estudo observamos uma retração destas perspectivas frente ao insucesso
na comercialização dos produtos durante safra de 2013.
Esta retração tem impactos diferentes nas relações entre as organizações. A UFPA e a
AD continuam com uma multiplicidade de relações entre seus membros já anteriormente
estabelecida tanto em termos de atividades (P&D, incubação de empresas, cotitularidade de
patente) quanto em termos de naturezas (profissional, pessoal, acadêmica). Assim, embora a
AD indique que outras empresas privadas (potenciais parceiras) considerem que seu vínculo
com a UFPA perturbe em certa medida sua reputação comercial, o amplo conjunto de relações
desenvolvidas entre as duas organizações tende a manter positivas as expectativas futuras. A
AD e Belaiaçá não desenvolveram relações para outros projetos ou laços de outra natureza,
não formando assim outros mecanismos pelos quais perspectivas futuras positivas pudessem
ser expandidas.
Deste modo, como sugerido por Uzzi (1997, p. 35-48) que a estrutura de relações
sociais (embeddedness) governa processos intervenientes que afetam (positivamente ou
negativamente) a ação econômica e, portanto, influenciam na qualidade das transações
econômicas, entendemos que o conjunto de relações entre os membros da UFPA e AD, apesar
de dificuldades relatadas, tende a estimular uma continuidade de ações de trocas econômicas
entre as organizações, enquanto que o não desenvolvimento de relações sociais mais
177
consistentes entre AD e Belaiaçá cria um obstáculo para uma maior diversidade e
aprofundamento de relações econômicas.
4.5.2 Benefícios identificados pelos atores organizacionais da rede de inovação
interorganizacional
Diante do exposto, observamos que, embora as organizações da rede de relações em
estudo tenham realizado uma série de atividades visando criação, produção e comercialização
de uma linha de produtos inovadores a base do açaí, não houve apuração de resultados
econômicos por estes atores advindos da comercialização da inovação até o final da realização
desta pesquisa (fevereiro de 2014).
Consideramos que os dois aspectos acima ressaltados referente a ênfase no
instrumento de patente, e aos laços fracos com frágil grau de reciprocidade entre os parceiros
foram chaves para as dificuldades internas da rede interorganizacional que contribuíram para
não obtenção pela rede de sucesso em se apropriar de resultados econômicos efetivos deste
processo inovativo, os quais teriam sido capturados por concorrentes. E além de tais
dificuldades internas, devemos apontar obstáculos externos à rede interorganizacional,
particularmente no que se refere a fragilidade no regime de apropriabilidade e a falta de
convergências de políticas públicas para o apoio à inovação na cadeia produtiva.
Cabe ressaltar, que está fora do objeto de estudo desta dissertação a efetiva apuração
quanto à infração da patente, mas relata-se as informações fornecidas pelos representantes da
AD e da Propriedade Intelectual da UFPA quanto à alegada infração e procedimentos
adotados. Informa-se ainda que foi feita breve pesquisa sobre a empresa no município de
Abaetetuba que teria fornecido açaí clarificado ao cliente que havia encomendado à AD e
Belaiaçá, e verificou-se que sua trajetória na cadeia produtiva do açaí se baseia na produção, e
eventual exportação, de palmito. Do catálogo de produtos desta empresa, além do palmito, há
outros produtos em conserva como azeitonas, pequi e alcaparras, em que se percebe
similaridade tecnológica. No entanto, a comercialização de polpa de açaí e do açaí clarificado,
cuja base tecnológica é diferenciada, não consta no catálogo de produtos disponibilizado,
somente é indicada em página específica no site da empresa, como em execução a partir de
2010, sem maiores informações técnicas do produto.
Além do resultado econômico de comercialização da inovação, buscamos identificar
outras formas de benefícios com o processo de inovação e as relações interorganizacionais
desenvolvidas. A AD indicou como benefício advindo da inovação a visibilidade regional e
178
nacional por meio de prêmios conquistados (os quais também envolveram aporte de recursos
das premiações). Também informa a ampliação da credibilidade junto a agências de
financiamento de pesquisa e inovação, e de capital venture, neste caso com reforço pelo
vínculo com o programa de incubação da UFPA, e fortalecimento de capacidades
tecnológicas pela experiência adquirida no processo inovativo, e pela associação da parceria
com a FEA/UFPA pelo acesso a sua base conhecimento científico e tecnológico.
De forma geral, observamos que a AD, e suas atividades inovativas, ocorrem em meio
a um cenário destacado por Pacheco (2007) de implementação de novos padrões de
financiamento à inovação, predominantemente pelo Governo Federal (CNPq, FINEP,
BNDES) e de mudança de legislação para o estímulo de variados tipos de em um arranjo
público-privado (Lei de Inovação). Ao mesmo tempo em que Cruz e Pacheco (s/d)
mencionam que instrumentos de políticas de promoção à inovação empresarial foram
formulados com base em modelos acadêmicos, o que neste caso beneficiou a AD pelo perfil
de seus sócios iniciais terem origem como pesquisadores da UFPA, o que facilita a
familiaridade com estes tipos de instrumentos.
Contudo, a AD reconhece que o vínculo com a UFPA também trouxe desafios,
particularmente devido a sua estrutura administrativa pesada e o delay entre o timing do setor
público e do setor privado, cria certo desestímulo a parcerias perante outras empresas
privadas. Essa dificuldade na relação entre agentes públicos e privados para inovação no
Brasil pode ser contextualizada em uma desarticulação histórica (PACHECO, 2007), cuja
superação implica no desenvolvimento de longo prazo de vínculos institucionais e no
estabelecimento de relações de confiança e reciprocidade.
Para a UFPA, um dos benefícios do processo de inovação também está associado a
visibilidade e reconhecimento das atividades da universidade e extensão e apoio à inovação, o
que gera legitimidade à instituição pública e alinhamento com programa e políticas públicas
no âmbito nacional. Um resumo disso pode ser notado na frase do Diretor da Agência de
Inovação em relação ao programa de incubação de empresas de base tecnológica: “O nosso
case é a Amazon Dreams, é o mais importante”.
A celebração do primeiro contrato de licenciamento de patente, apesar dos problemas
de execução, também foi considerado um processo de aprendizado e amadurecimento
institucional, o qual como mencionado anteriormente teve forte componente de um
aprendizado learning by doing e de busca de consenso em um processo de interdependência
entre os membros da rede interorganizacional.
179
Outra vantagem apontada à UFPA na participação no processo inovativo e nas
relações com a AD referem-se à função pedagógica, seja como case de fomento ao
empreendedorismo para os alunos, seja pela própria interação de alunos e professores com
processos produtivos industriais como um canal privilegiado para troca de conhecimento
acadêmico e empírico, servindo de modelo para o processo de ensino-aprendizagem.
A Belaiaçá teve como prerrogativa na participação da implementação do processo de
inovação a sua inserção no mercado corporativo de ingredientes tecnológicos, e por mais que
não tenha concluído a comercialização, obteve experiência de maior interação de contatos
com clientes internacionais atuais e potenciais, com a oportunidade de amadurecer seus
conhecimentos quanto às oportunidades e limites de atuação neste segmento.
Em relação a transbordamentos à sociedade, o processo de inovação gerou uma linha
de produtos que propicia uma verticalização e agregação de valor potencialmente positiva
para a cadeia produtiva do açaí, no que tange a geração de emprego, renda e desenvolvimento
tecnológico na indústria no Estado, com uma proposta de produto alinhada a perspectiva de
uma indústria de qualidade de vida.
Em termos de sua conexão com diretrizes de desenvolvimento sustentável,
verificamos que a inovação buscou traçar uma trajetória tecnológica que rompesse com a
economia tradicional amazônica baseada na exploração primária de recursos naturais com
considerável impacto ambiental e social, por um modelo de maior agregação tecnológica que,
assim, alcance uma valorização do ativo da biodiversidade. Compreendemos este modelo no
sentido defendido por Becker (2010, p. 24) da promoção um novo modo de produzir com
foco em cadeias produtivas da biodiversidade e serviços ambientais baseado em capacidades
científicas e tecnológicas.
Deste modo, a concepção da inovação estaria orientada tanto para resultados
econômicos (baseado na competitividade dos produtos e produtividade do processo
tecnológico alcançados), mas também dirigi-se ao atendimento de critérios de sustentabilidade
ambiental (valorização de ativos da biodiversidade) e social, a medida que propícia a
possibilidade de geração de externalidades ao longo da cadeia de valor, seja a sua montante
(produtores rurais e extrativistas e fornecedores), seja a jusante junto a clientes pela
disponibilidade de produtos de melhor qualidade e um custo menor.
Contudo, tais transbordamentos como indicamos são potenciais, pois se a difusão
tecnológica ocorreu efetivamente baseada em comportamentos oportunistas e de concorrência
predatória (infração de patente) tem como consequência um desestímulo aos esforços de
inovação tecnológica mais agregada na cadeia. Além do afastamento de uma condição mais
180
adequada à criação e adesão de mecanismos de coordenação de redes horizontais na cadeia
que gerasse eficiências coletivas aos seus membros.
Neste contexto, o próprio objetivo de proporcionar uma distribuição dos benefícios da
inovação pela cadeia de valor fica restrita à implantação de novas bases para regras de decisão
e comportamento organizacional que devem ser desenvolvidos em paralelo às transições
tecnológicas. Na linha defendida por Rennings (2000) e Vollenbroek (2002) em que
inovações tecnológicas ambientalmente sustentáveis devem ser acompanhadas de
correspondentes coevoluções sociais e institucionais mais amplas, que demandam a
convergência de políticas públicas orientadas por critérios de sustentabilidade construídos
coletivamente.
4.6 CONSIDERAÇÕES CONCLUSIVAS
O objetivo deste capítulo foi entender como se desenvolveu o processo de inovação da
linha de produtos de açaí na rede interorganizacional que envolveu a UFPA, a AD e a
Belaiaçá, para com foco na compreensão das relações sociais entre os atores, juntamente com
as características discutidas do contexto local e das capacidades dessas organizações, analisar
os resultados alcançados até o período de estudo e a dinâmica de apropriação de benefícios.
Analisamos o processo de inovação em duas etapas, uma chamada de invenção que
contemplou concepção inicial do modelo de negócio e o desenvolvimento tecnológico da
linha de produtos, e outra etapa denominada de inovação em si, que abrangeu a
implementação de atividades de produção em escala industrial e de comercialização. Em cada
etapa, investigamos as formas de relações entre as organizações e sua influência (negativa ou
positiva) no desenvolvimento da inovação. Além disso, foi realizada análise em termos de
gestão de processos de apropriabilidade em redes de inovação propostos por Dhanaraj e
Parkhe (2006). Ao final, fazemos uma apreciação crítica dos resultados e benefícios
identificados que foram apropriados pelos atores advindos da participação no processo de
inovação em rede.
Na fase de invenção, a rede interorganizacional teve uma conformação
predominantemente de relações diádicas entre AD e UFPA, com a presença de múltiplos
vínculos entre esses atores, uma vez que a AD foi uma spin off da Universidade.
Consideramos que o prévio estabelecimento de laços sociais fortes entre as organizações foi
fundamental para o compartilhamento de conhecimentos e recursos, e no próprio aprendizado
conjunto dos atores, que levou ao desenvolvimento tecnológico alcançado.
181
Também observamos que não houve uma atuação focal (central) de uma das
organizações que tivesse deliberadamente estruturado processos de apropriabilidade no
sentido sugerido por Dhanaraj e Parkhe (2006), mas esses processos de mobilidade de
conhecimento, cuidados de apropriabilidade entre as partes e de estabilidades de relações
foram desenvolvidos, seja por iniciativas de uma das partes, seja pela própria necessidade de
construção de consenso entre os atores para o processo inovativo.
Na fase de inovação, houve um adensamento de atividades na rede interorganizacional
para atender aos requisitos do processo de inovação, com a validação do processo tecnológico
em escala industrial e a introdução de produtos no mercado, e a AD busca parceria com a
Belaiaçá, uma agroindústria de maior porte na região, para exploração econômica da patente.
No entanto, verificamos que apesar dos esforços das organizações da rede em realizar
diversas atividades e investimentos para a produção e comercialização da linha de produtos
inovadores, estas não conseguiram se apropriar de resultados econômicos gerados pela
inovação até o final do período deste estudo. Ressaltamos dois atributos para isso, por um
lado uma ênfase no instrumento de patente como mecanismo de proteção à inovação em um
regime de apropriabilidade com fragilidade, e, por outro lado, a presença de laços fracos de
reciprocidade entre os parceiros, que implicou em uma responsabilidade isolada da AD
quanto a iniciativas de proteção (restritas) aos direitos de propriedade intelectual da inovação.
De forma geral, notamos que, como propõe Uzzi (1997), houve uma forte influência
da estrutura de relações sociais (embeddedness) sobre a ação econômica dos atores da rede
organizacional, bem como, comportamentos de concorrência predatória conformam uma
estrutura social que afeta negativamente os incentivos para esforços inovativos.
Assim, por mais que tenhamos observados efeitos positivos de políticas de estímulo à
inovação no caso em estudo, como em termos de financiamento e de proporcionar condições
para arranjos entre universidade pública e empresas, os avanços tecnológicos desenvolvidos
tiveram seus potenciais resultados econômicos restringidos em relação à geração de
desenvolvimento.
Consideramos que parte relevante desta limitação deve-se a falta de convergência
desta política com foco no desenvolvimento tecnológico com programas para o
estabelecimento de mecanismos de articulação social e institucional que propiciem a criação
de relações de interdependência e confiança entre os agentes econômicos envolvidos,
particularmente quanto à definição de consensos mínimos quanto a critérios de
sustentabilidade e desenvolvimento que precisam ser construídos coletivamente para
alicerçada uma possível nova lógica produtiva baseada em ativos da biodiversidade regional.
182
5 CONCLUSÃO PARA O DEBATE SOBRE APROPRIAÇÃO DE BENEFÍCIOS DA
INOVAÇÃO SOB A PERSPECTIVA DO DESENVOLVIMENTO
SUSTENTÁVEL À LUZ DA INOVAÇÃO EM BIOTECNOLOGIA NA REDE
INTERORGANIZACIONAL NO PARÁ
5.1 INTRODUÇÃO
Neste capítulo, à guisa de conclusão, retoma-se o objeto central da pesquisa sobre a
apropriação de resultados de uma inovação baseada em ativos da biodiversidade na região
amazônica desenvolvida por uma rede de relações interorganizacionais. Buscamos analisar as
condições e as formas de apropriabilidade das organizações membros da rede e possíveis
transbordamentos destes para a sociedade, considerando precipuamente a influência de
diretrizes do desenvolvimento sustentável.
O objetivo deste capítulo é retornar aos principais propriedades de cada elemento de
análise (regime de apropriabilidade, trajetória tecnológica e capacidades, além das relações
interorganizacionais) e promover um debate da interação destes no delineamento dos
resultados alcançados pelos membros da rede interorganizacional, e dos efeitos observados
(ou não) de atributos socioambientais no processo de inovação.
5.2 REGIME DE APROPRIABILIDADE
No constructo do Regime de Apropriabilidade buscou-se analisar o sistema legal de
propriedade intelectual, como proteção à inovação, assim como verificar a utilização de
mecanismos de apropriação pelos atores da rede, tanto da patente, como de outros meios. De
forma sintética, no decorrer do estudo observamos evidências contidas na tabela 9.
Tabela 9 - Evidências no estudo de caso sobre o constructo Regime de Apropriabilidade.
Constructo Item de
análise
Síntese de evidências encontradas no caso empírico
Regime de
Apropriabilidade
Sistema de
proteção
legal à
inovação.
Demora no trâmite de análise e aprovação de patente pelo INPI, que é percebida como condição de insegurança quanto ao
reconhecimento da propriedade industrial pela gestora da patente
(AD).
Outros
mecanismos
de
apropriação
utilizados.
Não foram constatados o uso efetivo de outros mecanismos
complementares pelas organizações da rede de inovação para
garantir a apropriação, a como o isolamento do conhecimento, a liderança por tempo de lançamento (leading timing) ou a liderança
da curva de aprendizado.
Fonte: Da autora (2014).
183
No regime de apropriabilidade, a demora no trâmite de análise e aprovação de patente
pelo INPI foi considerada uma fragilidade, uma vez que esta pendência na aprovação da
patente é percebida como condição de insegurança quanto ao reconhecimento da propriedade
industrial pela gestora da patente (AD). Junta com esta fragilidade, estava presente uma falta
de confiança da AD na eficácia do órgão de justiça estadual em julgar, em tempo hábil, a
acusação de infração de infração, considerando-se certo grau de dificuldade de comprovação
de direito da propriedade industrial sobre o processo tecnológico.
Nesta concepção as condições do inventor para garantir sua apropriabilidade baseada
em mecanismo de propriedade industrial tornam-se mais frágeis, no entanto, a rede
interorganizacional, particularmente UFPA e AD (cotitulares da patente) derem ênfase na
adoção da patente como principal (quase exclusivo) mecanismo de proteção à inovação.
Entendemos que esta proeminência no uso da patente como instrumento de apropriação
provavelmente ocorreu devido a sua aplicação tradicional a produtos da biotecnologia
internacionalmente, de forma que não se avalia seu uso de modo negativo, porém em um
regime de apropriabilidade com fragilidade a demanda de atenção para utilização de outros
mecanismos de apropriação, principalmente vinculados às capacidades de produção e
comercialização (inclusive relacionadas a vigilância e defesa de seus direitos de propriedade)
como sugerido por Teece (1986).
Neste contexto, a menção de infração de patente por atores da rede corrobora a
necessidade de maior diversidade de mecanismos de isolamento do conhecimento do processo
tecnológico pelos inovadores. A possibilidade de concorrência predatória na cadeia produtiva
já havia sido indicada por Costa, F (2009) em estudo anterior, o que demandaria um conjunto
de ações de apropriação articulados que alavancasse a vantagem competitiva dos inovadores,
como, por exemplo, estratégias de liderança de tempo de lançamento (leading timing) e de
aceleração da curva de aprendizado, aos quais concordamos com Dosi (1988, p. 1139) que
podem atuar como mecanismos mais efetivos para proteger a inovação de processo.
Ao considerarmos a percepção de um regime de apropriabilidade fragilizado e a não
diversificação de uso de mecanismos de apropriação representaram obstáculos para as
organizações cotitulares da patente (Amazon Dreams e UFPA), e posteriormente para a rede
como um todo, em capturar resultados econômicos sobre este direito em face a outras
organizações da cadeia produtiva. Esta situação em combinação com a configuração de
capacidades e das relações interorganizacionais entre os membros da rede (a serem analisadas
nas próximas seções) posteriormente levou a uma perda de confiança na eficácia por parte da
empresa gestora da patente.
184
No que tange a análise da influência de aspectos vinculados pressupostos de
desenvolvimento sustentável sobre o constructo do regime de apropriabilidade, verificamos o
impacto de fatores institucionais e de mercado quanto ao incentivo à adoção de critérios e selos de
sustentabilidade por parte dos integrantes da rede. A atenção principal se referiu ao atendimento da
regulamentação de acesso ao patrimônio genético e a adesão a selos ou certificados de sustentabilidade
socioambientais. A síntese de evidências deste item está contida na tabela 10.
Tabela 10 - Evidências no estudo de caso sobre a influência de aspectos vinculados à
sustentabilidade ao constructo Regime de Apropriabilidade.
Construto Interveniência de
aspectos vinculados
à sustentabilidade
Síntese de evidências encontradas no caso
empírico
Regime de
Apropriabilidade
Fatores institucionais e de mercado que
exercem influência
quanto a adoção de
critérios e selos de sustentabilidade.
O parâmetro de preço comercial do açaí in
natura é definido diariamente em mercados de
comercialização locais de acordo com a oferta e demanda, sendo predominantemente afetado
pela demanda para processamento de polpas
(agroindustriais e batedores locais).
No planejamento de produção da rede
interorganizacional não havia definição de pagamento de preço diferencial ou outro tipo de
benefício aos fornecedores dos frutos para
produção da linha de produtos inovadora.
Não foram identificadas políticas públicas
focadas a prover uma melhor coordenação ao
esforço de inovação entre os atores da cadeia
produtiva.
A exigência de selos e certificados de
sustentabilidade para comercialização da
inovação apresentaram foco em aspectos
ambientais com um escopo limitado (produção
orgânica), não sendo enfatizados critérios
sociais.
A obtenção destas certificações pelas
empresas (AD e Belaiaçá) ocorrem preponderantemente de forma reativa, de acordo
com a exigência de clientes no mercado
internacional. Fonte: Da autora (2014).
Quanto ao acesso a recursos da biodiversidade, a linha de produtos desenvolvida
enquadrou-se como acesso a patrimônio genético, de forma que a AD encaminhou
documentação para processo junto ao CGEN, quanto ao desenvolvimento tecnológico dos
produtos. Apesar desta obrigação legal cumprida pela organização local, percebemos que
185
atualmente o acesso ao açaí, como bioativo, é feito com bastante facilidade em função do
comércio de polpas, o qual não envolve obrigações junto ao CGEN.
Consideramos que há possibilidade que estas polpas ao destinarem-se à exportação
sejam no exterior objeto de processamento industrial que caracterize acesso ao patrimônio
genético, conforme regulamentação do GCEN, mas neste caso já fora do alcance regulatório
nacional. Também há dificuldade para uma comunidade diferenciar se o açaí vendido a um
intermediador ou uma agroindústria implica ou não em acesso a patrimônio genético e,
portanto, incidiria em regras mais explícitas de repartição de benefícios.
Assim, compreendemos que o alto volume de produção do açaí, que é atípico em
relação a cadeias da biodiversidade, e a existência de preços regulados por parâmetros típicos
de mercado (oferta e demanda), independente do produto final que será produzido, conforme
relatado em entrevista pelo Diretor de Marketing da Belaiaçá (capítulo 2) conforma um
ambiente institucional e de mercado de difícil aplicação (ou mesmo adequação) da
regulamentação atual de acesso a recursos da biodiversidade. Entendemos que este caso
aponta a necessidade de revisão da regulamentação atual de modo a buscar estabelecer
instrumentos institucionais que atendam com eficácia a proteção da biodiversidade (e a
repartição de seus benefícios), que considere a multiplicidade de condições de produção e
comercialização destes recursos.
Pelas diretrizes do desenvolvimento sustentável, particularmente a CDB, uma
indústria ao comercializar um produto baseado em ativo da biodiversidade com agregação
tecnológica e valorização econômica, deveria gerar uma “distribuição justa” dos benefícios da
inovação tecnológica a toda sua cadeia produtiva. Neste sentido, a comercialização de um
produto inovador baseado no açaí que alcance um valor econômico maior junto ao mercado
consumidor final deveria criar condições de viabilizar um desdobramento dessa valorização
econômica até a produção rural dos frutos.
No entanto, é necessário criar mecanismos na cadeia produtiva que permitam este tipo
de desdobramento de benefícios entre a etapa industrial e a rural. Inovações de produtos a
base do açaí concentram-se na agroindústria (em menor escala) e nas grandes industriais de
alimentos e cosméticos, as quais exercem vantagem na apropriação dos lucros destas
inovações. Na falta de mecanismos institucionais, fica a cargo destes agentes industriais o
discernimento em relação a construção de uma política interna de aquisição da matéria prima
que contemple critérios de distribuição de benefícios e incentivos a montante da cadeia
produtiva em conformidade com diretrizes da CDB.
186
Os desdobramentos da etapa industrial para a produção agrícola e extrativista têm
ocorrido em termos de aumento da demanda quantitativa, o que por sua vez tem levado a
pressão nos ambientes de várzea, e as elevações de preços se fundamentado na limitação da
oferta, e não em uma maior agregação de valor ao produto.
A possibilidade de exigência de certificações de comércio justo (que não é comumente
exigido das agroindústrias) ou de certificações desenvolvidas com base em critérios de
sustentabilidade mais refinados, que possam avaliar e reconhecer os riscos da expansão de
açaizais nas áreas de várzea, em vez somente do selo de produto orgânico (mais
frequentemente requerido) poderiam ser opções de implementação institucional mais
alinhadas ao atendimento das diretrizes de desenvolvimento sustentável para a cadeia
produtiva.
No caso em estudo, se observa um domínio da agroindústria sobre a rede de
produtores rurais, assim é necessária uma reconfiguração do quadro institucional de modo a
contribuir para o desenvolvimento de inovações que incluam a concepção da provisão de
produtos e serviços ambiental e socialmente adequados. Para tanto, não é possível resolver os
obstáculos somente do ponto de vista dos elos industriais da cadeia sobre a produção rural ou
extrativista, mas é preciso fomentar o desenvolvimento de trajetória tecnológica própria
nestes elos da cadeia para que um maior equilíbrio na cadeia produtiva colabore na promoção
de um desenvolvimento sustentável. Como coloca Costa, F. (2009, p. 351), definir e
solucionar os problemas tecnológicos da produção rural a partir da perspectiva industrial pode
conduzir a um aumento da assimetria na relação agricultura-indústria, e distribuir de forma
desigual os resultados na cadeia produtiva.
Desta forma, uma valorização do produtor rural enquanto agente de realização de
inovação tecnológica e a aplicação políticas de fomento ao desenvolvimento de capacidades
na etapa rural são importantes. As políticas de inovação no campo rural na Amazônia,
particularmente junto aos produtores familiares e cooperativas, segue um modelo “ofertista”
em que prevalece a visão que as inovações devam ser produzidas nos centros de pesquisa e
disseminadas aos produtores rurais. A superação deste modelo é um desafio à trajetória
tecnológica estabelecida, e fundamental para o fortalecimento da atividade rural na região
alinhada a princípios de sustentabilidade e de promoção de inovação endógena ao setor, com
atenção a sua própria perspectiva de gargalos e oportunidades tecnológicas.
187
5.3 TRAJETÓRIA TECNOLÓGICA
Na análise da trajetória tecnológica o foco da pesquisa foi o estudo em termos de
oportunidade tecnológica quanto ao desenvolvimento de produtos baseados na biotecnologia
aplicada a bioativos regionais, e na compreensão do padrão de mudança técnica vinculado à
biotecnologia. A síntese de evidências identificadas está na tabela 11.
Tabela 11 - Evidências no estudo de caso sobre o constructo Trajetória Tecnológica.
Constructo Item de análise Síntese de evidências encontradas no caso empírico
Trajetória
Tecnológica
Oportunidades
tecnológicas.
A linha de produtos inovadores baseado no açaí apresentou
demanda no mercado e competitividade frente a produtos
similares (qualidade e custo).
Padrão setorial
de mudança
técnica.
Apesar de individualmente as empresas apresentarem
limitações em seus perfis de mudança técnica para a
implementação da inovação biotecnológica, a atuação na rede
proposta proporcionou o compartilhamento de recursos
necessários entre os membros para realização conjunta da inovação.
Fonte: Da autora (2014).
Entendemos que o caso confirma a efetividade de oportunidade tecnológica no âmbito
da trajetória da biotecnologia especificamente relacionada a setores de cosméticos, saúde e
nutrição baseada em qualidades distintas do fruto açaí, espécie endógena do bioma
amazônico, sendo seus desdobramentos potencialmente compatíveis com diretrizes de
desenvolvimento sustentável.
Também constatamos que o desenvolvimento da oportunidade tecnológica contou com
condições favoráveis tanto de oferta tecnológica (technology push), como de incentivos de
mercado (market pull). No entanto, o alcance concreto de benefícios advindos de
transbordamentos positivos do processo inovativo à sociedade em termos de desenvolvimento
regional demandaria uma articulação social e política mais ampla do que a obtida em nível da
rede interorganizacional.
Para explorar esta oportunidade foram necessárias competências tecnológicas
complexas e esforços de desenvolvimento, o que envolveu uma instituição de C&T, com
histórico de pesquisas com o fruto do açaí e infraestrutura de pesquisa, e uma empresa que
investigasse as aplicações potenciais de mercado do produto e se dedicasse a formulação do
processo tecnológico de extração, fracionamento e purificação em escala industrial.
188
Assim, do ponto de vista de oferta tecnológica (technology push) se constata que a
instituição de C&T local possuía capacidades tecnológicas na área para dar suporte ao
processo de inovação, e que a interação com o setor empresarial ocorreu por meio da criação
de uma empresa por transbordamento desta universidade. Considera-se essa situação
particular de interação entre a universidade e uma empresa que se formou por membros
(atuais ou anteriores) desta como chave neste caso para a superação da dificuldade histórica
de articulação entre empresas e instituições de CT&I, tanto em termos de constituição de
capacidade tecnológica no setor privado, como no que tange a facilitação de relações
interorganizações, que serão discutidos nos próximos tópicos.
Da perspectiva de incentivos de mercado (market pull), a indústria processadora de
ingredientes como cosméticos, alimentos, nutrição apresenta-se como um segmento
constantemente em busca de novos componentes. A demanda especificamente por açaí tem
um crescimento acentuado com seu uso em outras regiões do país e internacionalmente. Este
aumento de demanda qualificada, combinada a características de perecibilidade da fruta,
estimula a criação de agroindustriais locais, e propicia incentivos de mercado para exploração
de oportunidades tecnológicas, com vantagens comparativas locais até o momento.
Contudo, uma questão que pode ser levantada é por que esse movimento não ocorre
com maior frequência diante da oportunidade identificada, e por que não se alcança a
concretização de uma melhor distribuição na sociedade local de benefícios potencialmente a
serem gerados pela exploração destas oportunidades? Mediante o estudo deste caso
enfatizamos dois pontos importantes: a necessidade de desenvolvimento de capacidades
tecnológicas nos agentes locais (1), e a construção de convergências de políticas públicas
tecnológicas, econômicas e sociais (2).
A pequena empresa de base tecnológica (AD), por um lado, tinha capacidades
tecnológicas para desenvolver a inovação em conjunto com a UFPA, por outro lado, tinha
objetivos e atividades que a aproximavam de outras agroindustriais da cadeia do açaí. De
forma que se pode interpretar que a AD fez um papel de “ponte” ou de “tradução” entre o
conhecimento científico (UFPA) e a aplicação prática deste em escala industrial na
agroindústria regional (Belaiaçá e transbordamentos).
Esta ponte foi necessária para reduzir assimetrias entre os atores da estrutura
institucional e viabilizar os processos de inovação, pois na sua falta o conhecimento científico
e tecnológico permanece inacessível para a maioria das agroindustriais por falta de
capacidades tecnológicas internas, ao mesmo tempo em que a aplicação em escala industrial
de processos fica fora do escopo de desenvolvimento tecnológico específico da universidade,
189
centrado em questões predominantemente acadêmicas. Deste modo, entendemos que as
organizações locais, sejam elas de perfil público ou privado, com função governamental, não
governamental ou empresarial precisam buscar uma maior aproximação e superação de suas
diferenças para que relações interorganizacionais possam ser bem sucedidas.
No entanto, apesar desta função de ponte da AD no caso que poderia ser vista como
estratégica para o efetivo aproveitamento das oportunidades biotecnológicas por meio de
arranjos locais, a AD também apresentou limitações de atuação econômica, principalmente
associadas à apropriabilidade sobre suas inovações e capacidade de investimentos,
prejudicada pelas fragilizadas relações institucionais na cadeia produtiva com pouca ou
nenhuma coordenação entre os atores (governo, indústria, produtores rurais, instituições de
C&T). Deste modo, verificamos que a construção de convergências tecnológicas, econômicas,
sociais, políticas e institucionais é necessária para proporcionar que o desenvolvimento de
inovações esteja na base da competitividade e gere desenvolvimento na região.
No que tange a análise quanto à influência de diretrizes relacionadas ao
desenvolvimento sustentável nas características do constructo de trajetória tecnológica,
identificamos as evidências de forma sintética na Tabela 12.
Tabela 12 - Evidências do estudo de caso sobre a influência de aspectos vinculados à sustentabilidade
ao constructo Trajetória Tecnológica.
Constructo Item de análise Síntese de evidências encontradas no caso empírico
Trajetória
Tecnológica
Transição
sociotécnica com
adoção de critérios
de sustentabilidade.
A inovação foi realizada no âmbito de um modelo
de negócio com objetivo de valorização de bioativos
nativos da Amazônia, por meio da agregação tecnológica.
A inovação biotecnológica com a criação da linha
de produtos baseada em açaí alcançou um processo
com elevado aproveitamento do fruto e produtividade.
Na implementação da inovação no mercado, apesar
de alcançar valorização do produto, não houve
convergência de outras inovações sociais,
institucionais e ou mesmo econômicas nas relações
existentes na cadeia produtiva, não gerando impacto significativo em termos de dinâmica de
desenvolvimento regional.
Fonte: Da autora (2014).
A inovação biotecnológica implementada vinculou-se a uma proposta de modelo de
negócio que visava à valorização de ativos da biodiversidade amazônica, o que identificamos
como em consonância com diretrizes da CDB ao buscar agregar maior valor econômico ao
ativo, o que pode potencialmente criar melhores condições para sua conservação. Além disso,
190
os produtos criados apresentarem desempenho tecnológico competitivo no mercado em
comparação com produtos similares existentes, o que pode contribuir para uma transição
tecnológica no uso econômico desses ativos e nas relações sociais na cadeia produtiva.
No entanto, corroboramos com Lall (1992, p. 171-172) que as políticas
governamentais possuem um papel central no incentivo e suporte ao esforço de mudança
tecnológica em países em desenvolvimento, inclusive por meio do estabelecimento e
alinhamento de políticas públicas para a coevolução de mudanças econômicas, sociais e
institucionais que propiciem um significativo impacto na dinâmica de desenvolvimento
regional.
Identificamos no caso pesquisado fomento à inovação tecnológica por meio
principalmente de políticas de financiamento e incentivo de interação da universidade com
atores produtivos. A AD teve acesso a linhas de créditos características de apoio a inovação
do Governo Federal, seja por meio de capital venture (Fundo Criatec), seja por
financiamentos à pesquisa em empresa (CNPq, FINEP, etc). Estas linhas são importantes
principalmente em razão do período pré-competitivo de desenvolvimento tecnológico de
produtos inovadores que tem impacto considerável sobre as finanças de empresas menores,
sem acumulação de capital próprio para investimentos. Porém, cabe observar que tais linhas
também são muito específicas ao perfil de empresa de base científica, e de difícil ao ingresso
a organizações industriais regionais da Amazônia, cujo padrão setorial de mudança técnica é
predominantemente dominado por fornecedores, tendo como o exemplo desta dificuldade no
próprio Fundo Criatec, na qual somente uma empresa era da região Norte (AD).
Outro ponto é que, embora tenha ocorrido o apoio financeiro destes programas, estes
investimentos não foram coordenados com outras ações governamentais complementares,
como incentivos estaduais ou municipais, ou a implementação políticas industriais e de
desenvolvimento regional específicas, inclusive quanto a critérios de sustentabilidades, os
quais são atualmente uma pressão institucional associada a clientes internacionais, e de
escopo restrito (produção orgânica), como indicamos na seção anterior.
5.4 CAPACIDADES
A configuração da rede interorganizacional contempla a formação de um arranjo
inovativo com capacidades necessárias de produção e tecnológicas, que as organizações
individualmente que a compõem não teriam condições de congregar. A trajetória da
biotecnologia é vinculada ao padrão de mudança técnica de base científica, cujas empresas em
191
geral apresentam conexões com instituições de C&T, o que é efetivamente encontrado no
caso em análise na relação entre AD e UFPA.
Contudo, neste padrão de base científica as organizações típicas seriam de grande
porte, de modo que teriam capacidades tecnológicas e de produção desenvolvidas. Em nossa
análise, consideramos a AD com perfil de base científica por suas características específicas
de desenvolvimento de tecnológico de produtos, mas por ser uma empresa de tamanho
pequeno, apresenta limitações em termos de capacidade de produção e investimentos. Esta
limitação de capacidades fez com que a AD buscasse parcerias para ter acesso aos ativos
complementares que viabilizariam a produção da linha de produtos inovadores e a captura de
partes de seus lucros, resultando em negociações com a Belaiaçá. Neste tipo de cenário,
concordamos com o exposto por Teece (2006, p. 1145) em reconhecer a dificuldade para
pequenas empresas obterem lucros com uma inovação se estiverem em regimes de
propriedade intelectual fragilizado e sem ativos complementares, pois possuirão um conjunto
restrito de alternativas de ação para proteger suas inovações.
A criação da linha de produtos inovadores foi bem sucedida (competitividade em
termos de custo e benefício, e existência de demanda de mercado), e as organizações por meio
da rede de relações reuniram condições em termos de capacidade de produção da linha de
produtos novos. Contudo, observamos limitações relacionadas a capacidades de
comercialização e de proteção da inovação que se caracterizaram como obstáculo à efetiva
exploração econômica da inovação, que foi exercida por outra organização fora do escopo da
rede de relações.
Esta limitação na capacidade de comercialização se refere tanto a comercialização da
tecnologia desenvolvida (patente), quanto da linha de produtos em si dos membros da rede. A
dificuldade de comercialização da tecnologia refere-se a demora na construção de consenso e
definição dos termos dos acordos contratuais entre AD e UFPA, o que demorou longo período
e levou a não assinatura do acordo entre AD e Belaiaçá para a safra 2013, o que prejudicou o
início efetivo da operação da joint venture.
Também consideramos que a rede não conseguiu desenvolver capacidades para fazer
cumprir seus direitos de propriedade intelectual, o que criou prejuízos de expropriação dos
esforços de desenvolvimento tecnológico. Como indicado anteriormente, houve uma ênfase
na adoção da patente como mecanismo de proteção da inovação, sem exercer outros
mecanismos de proteção frente a possibilidade de concorrência predatória na cadeia
produtiva.
192
Identificamos ainda restrições na capacidade da AD e Belaiaçá para comercialização dos
produtos inovadores por meio da entrada no mercado de ingredientes, a qual é uma atividade nova
tanto para a AD (primeira linha de produtos), como para a Belaiaçá (nova no segmento). A
comercialização de ingredientes para a indústria de grande porte internacional exige abordagens e
timing diferenciados junto aos clientes corporativos, com maior demanda de informações técnicas, e
acompanhamento de processos de P&D desses.
Na Tabela 13, apresentamos a síntese de evidências encontradas na pesquisa do
constructo de capacidades.
Tabela 13 - Evidências no estudo de caso sobre o constructo Capacidades.
Constructo Item de análise Síntese de evidências encontradas no caso empírico
Capacidades
Capacidades
tecnológicas.
A UFPA apresentou capacidade tecnológica em termos de
pessoal com conhecimento técnico científico e infraestrutura
laboratorial para bioprospecção e ensaios de bancada.
A AD apresentou capacidade tecnológica em termos de
pessoal com formação tecnológica e científica, e realização de
investimentos para desenvolvimento de processo tecnológico em
escala industrial.
A Belaiaçá não participou da etapa de desenvolvimento
tecnológico da linha de produtos, e apresentou capacidade absortiva incipiente no processo de scale up da tecnologia para
sua planta industrial.
Capacidades de
produção.
A UFPA não apresentou perfil e objetivos organizacionais
relacionados a constituição de capacidade produtiva industrial.
A AD apresentou capacidade de produção limitada pelo
pequeno porte de suas instalações e quadro de pessoal.
A Belaiaçá apresentou capacidade produtiva para elevado
volume de produção de acordo com padrões de qualidade
internacionalmente exigidos (certificados de qualidade).
Capacidades
complementares.
Além dos itens já expostos quanto à capacidade produtiva, em relação a outros tipos de capacidades complementares:
A UFPA não apresentou previamente constituída uma
estratégia para comercialização de tecnologia, sendo este caso o
primeiro contrato de exploração comercial de tecnologia realizado.
A AD não apresentou capacidade previamente constituída
tanto de comercialização de tecnologia (primeiro processo de
exploração comercial), quanto de gestão de propriedade
industrial, com fragilidade em termos de estratégias de isolamento e vigilância de uso da patente, e de assegurar o
exercício de seus direitos de propriedade judicialmente. A AD
também apresentou capacidade de comercialização da linha de produtos de ingredientes para indústria ainda em formação.
A Belaiaçá apresentou capacidade de comercialização da
linha de produtos de ingredientes para indústria ainda em
formação.
Fonte: Da autora (2014).
193
Na análise da interação das capacidades entre os membros da rede, entendemos que
programas de fomento à inovação em geral possuem foco em capacidades relacionadas ao
avanço e desenvolvimento tecnológico pelas organizações, mas vemos uma lacuna destes em
termos de desenvolvimento equivalente de capacidades organizacionais especializadas em
comercialização, incluindo em múltiplos mecanismos e estratégias de proteção destas
tecnologias que complementem a propriedade industrial. Cabe destacar que Barbieri e Álvares
(2005) anteriormente já haviam expressado preocupação particular quanto a necessidade de
desenvolvimento de competências vinculadas a instrumentos de comercialização de
tecnologias.
Em relação à análise de aspectos vinculados a sustentabilidade no desenvolvimento e
configuração de capacidades as características sintetizadas na Tabela 14.
Tabela 14 - Evidências do estudo de caso sobre a influência de aspectos vinculados à sustentabilidade
ao constructo Capacidades.
Constructo Item de análise Síntese de evidências encontradas no caso
empírico
Capacidades
Desenvolvimento
de capacidades
específicas para
atendimento a
requisitos de
sustentabilidade.
A UFPA apresenta capacidades relacionadas a
bioprospecção na busca de valorização da qualidade
de componentes originados da biodiversidade amazônica, em conformidade regulamentações
vigentes. Também desenvolve estudos para aumento
da eficiência nos processos produtivos. Apesar disso,
suas instalações na incubadora tem fragilidades para obtenção de certificações de operação.
A AD desenvolveu proativamente, em termos de
capacidades tecnológicas, habilidades relacionadas a
criação de um processo tecnológico eficiente para melhor aproveitamento dos recursos naturais.
Também desenvolveu habilidades relacionadas a
bioprospecção na busca de valorização da qualidade
de componentes originados da biodiversidade amazônica. Contudo, a AD não desenvolveu
habilidades relacionadas ao atendimento de requisitos
de sustentabilidade em termos de capacidades de produção, logística ou comercialização.
A Belaiaçá desenvolveu de forma reativa
capacidades de produção que atendem a requisitos de
sustentabilidade de escopo limitados (produção orgânica) exigidos por clientes internacionais.
Fonte: Da autora (2014).
Compreendemos que as capacidades em termos de biotecnologia que podem trazer
vantagens competitivas para a implementação de inovações e modelos de negócios
diferenciados foram desenvolvidas por UFPA e AD por meio de uma postura proativa. No
194
entanto, o desenvolvimento de capacidades para atendimento a critérios de sustentabilidade
no que tange logística e operacionalização e comercialização apresentou-se como dificuldade
para UFPA e AD, e é em geral desenvolvida pela Belaiaçá de modo reativo.
Diante disso, observamos que há influência tanto de fatores de mercado como
institucionais atuando no ambiente que impulsiona as organizações a desenvolverem
capacidades. Todavia, estes elementos ainda apresentam uma influência limitada em relação
aos atores da rede e ao escopo de critérios socioambientais exigidos. Neste sentido,
entendemos que ainda há um impacto restrito de pressupostos de desenvolvimento sustentável
quanto à influência dos constructos contextuais na influência do direcionamento do
desenvolvimento de capacidades das organizações. Deste modo, compreendemos que seria
necessário um fortalecimento desses fatores por meio da convergência de coevoluções
econômicas e institucionais (visto anteriormente no constructo de trajetória tecnológica) para
dotar de maior o estímulo às organizações locais para um avanço mais abrangente na
configuração de capacidades para sustentabilidade.
5.5 RELAÇÕES INTERORGANIZACIONAIS
No exame das relações interorganizacionais, observamos que a rede é pequena e seus
processos e funções interorganizacionais não se apresentam deliberadamente gerenciados por
uma única organização focal, a qual exerça influência destacada sobre os demais membros. O
perfil das organizações é diversificado e há elevada autonomia destas na condução dos
processos da rede de mobilidade do conhecimento, apropriabilidade de inovação e
estabilidade dinâmica.
O maior grau de dependência entre as organizações é evidenciado na AD, pois a rede
de relações tinha como objeto central (inovação) a sua principal fonte de renda potencial
(exploração da única linha de produtos tecnológicos já concluída pela empresa), enquanto a
UFPA (principal atividade ensino e produção científica) e a Belaiaçá (principal atividade
produção de polpas e combinados) depositaram na rede funções relevantes, porém não as
tinham como principal função ou fonte de renda dominante. Deste modo, apesar das três
organizações terem como objetivo comum o desenvolvimento da inovação na rede de
relações, a expectativa e o comprometimento quanto ao processo inovativo eram diferentes
para cada uma delas.
Nesta perspectiva de expectativas e comprometimento, também podemos concluir que
a AD, sendo uma pequena empresa, possui um volume menor de recursos (financeiro,
195
pessoal, infraestrutura) frente à UFPA e Belaiaçá, e estes recursos estavam intensivamente
aplicados ao processo de inovação, de forma esta organização que apresentava maior
sensibilidade quanto ao desempenho da inovação, e, consequentemente, maior impacto face a
um possível fracasso.
Em termos de estrutura de rede, seus membros foram interligados por diferentes tipos
de laços, entre UFPA e AD havia laços fortes, com presença de confiança e multiplicidade de
tipos de relações, e entre AD e Belaiaçá eram laços fracos com tendência a tornarem-se fortes
se a parceria de produção começasse. Entretanto a não celebração da SPE e problemas de
apropriabilidade com a linha de produtos ameaçam a estabilidade de suas relações. Nesta
configuração de relações, a AD assumiu um papel de ponte, tendo relações diretas tanto com
UFPA e Belaiaçá, que possuem relações indiretas entre si.
Assim, enquanto na etapa de invenção prevaleceu uma relação diádica entre UFPA e
AD, na fase da inovação entendemos que a AD assume uma função de ponte como forma de
buscar orquestrar a rede de relações na direção de concluir o processo inovativo. A AD foi o
ator que tomou a iniciativa de procurar novos parceiros para soluções de produção e
comercialização da inovação. E posteriormente foi a organização que apresentou o maior
interesse em superar os entraves das negociações administrativas e contratuais necessárias
com cada uma das outras organizações para dar continuidade às operações de produção e
comercialização da linha de produtos inovadores. Contudo, a AD não demonstrou ter
desenvolvido processos de gestão previamente estruturados de orquestração da rede de
relações, o que pode ter contribuído para limitações no desempenho de apropriação do
resultado econômico da inovação.
Cabe indicar que não identificamos que tais entraves de articulação tenham tido
origem em disputas pela divisão dos resultados econômicos da inovação, visto que nenhuma
das partes expressou insatisfações ou mesmo empecilhos durante as negociações sobre a
distribuição de percentuais sobre os resultados. Entendemos que as barreiras ao adequado
andamento das atividades estabelecidas entre os membros tenderam a se relacionar mais a
aspectos da estrutura social na qual as organizações se inserem (divergências entre perfil e
objetivos prioritários do setor público e setor privado, e falta de laços de confiança e
reciprocidade) do que a problema em transações econômicas específicas. Assim, confirmamos
a relevância a análise das relações interorganizações no processo de inovação, considerando a
influência das relações sociais desenvolvidas sobre as transações econômicas entre os atores,
como indicado por Uzzi (1997).
196
Esta limitação nas relações entre os atores na etapa de inovação impactou
particularmente a capacidade de comercialização e proteção da inovação da rede
interorganizacional. Compreendemos que a configuração das relações entre as três
organizações da rede fragilizou a capacidade destas em fazer cumprir os direitos de patentes
ao alocar toda a responsabilidade e ônus do processo de proteção da patente somente sobre a
pequena empresa, AD. E quando da identificação da suspeita de infração da patente,
entendemos que houve uma falha no estabelecimento de relações de reciprocidade entre as
organizações da rede, uma vez que uma reversão da infração de patente beneficiaria além da
AD, tanto a UFPA (com royalties a receber), quanto a Belaiaçá (maior garantia de mercado da
linha de produtos), as quais poderiam ter colaborado, seja por mecanismos jurídicos e
administrativos, seja por meio de aporte de recursos. No entanto, estas duas organizações
optaram por seguir estritamente o determinado em acordos entre as partes, reduzindo a
capacidade de ação da rede como um todo para defender à eficácia da patente.
As evidências empíricas encontradas no caso sobre o constructo de relações
interorganizacionais estão contidas na Tabela 15, seguindo os itens de análise propostos por
Dhanaraj e Parkhe (2006).
As características da estrutura das relações sociais estabelecidas foram relevantes para
definir a forma distintiva como a mobilidade de conhecimento ocorreu entre os membros. A
UFPA e AD apresentaram processos de aprendizado e de troca de conhecimentos intensos,
com destaque à alta capacidade absortiva da AD em sua relação com a UFPA. Entre a AD e a
Belaiaçá, a falta de desenvolvimento de confiança ou de uma segurança legal (contrato de
SPE), junto com uma capacidade absortiva limitada da Belaiaçá, os processos de aprendizado
e transferência de tecnologia foram restritos.
Os membros da rede não conseguiram estabelecer entre si um regime de apropriabilidade
forte, que inclusive representasse uma força interna da rede contra possíveis ameaças de
apropriabilidade do contexto maior em que atuava. Neste sentido, as condições verificadas de
apropriabilidade da inovação relacionadas à insegurança contratual e laços fracos entre AD e
Belaiaçá realmente impactaram tanto na mobilidade do conhecimento, quanto a estabilidade
da rede. Esta constatação corrobora com os efeitos de interação entre esses processos
propostos por Dhanaraj e Parkhe (2006).
Compreende-se que os atores da rede não conseguiram articular e consolidar uma estrutura de
governança para resolução conjunta de problemas, que gerasse o alinhamento recíproco entre riscos e
a benefícios envolvidos no processo de inovação, e a percepção de eficiências coletivas da atuação
combinada dos membros da rede, independente das funções estritas definidas nos acordos.
197
Tabela 15 - Evidências no estudo de caso sobre o constructo de Relações Interorganizacionais.
Constructo Item de análise Síntese de evidências encontradas no caso empírico
Relações Inter-
organizacionais
Gestão da
mobilidade do
conhecimento.
A mobilidade de conhecimentos foi efetiva entre a AD e a
UFPA, no que tange ao desenvolvimento tecnológico, e foi estendida da linha de produtos em estudo (açaí) para outros
produtos potenciais da AD (muruci, ingá).
A mobilidade de conhecimentos entre AD e Belaiaçá foi
limitada, sem repasse deliberado de tecnologia da AD à Belaiaçá, visto que o contrato de SPE que regulamentaria
estas questões não chegou a ser assinado, e pouca capacidade
de absortiva pela Belaiaçá.
Gestão da
apropriabilidade
da inovação.
Os membros da rede não conseguiram estabelecer entre si
um regime de apropriabilidade forte, houve demora na
celebração de condições de apropriabilidade entre UFPA e
AD, e não chegou a ser formalizado o acordo entre AD e Belaiaçá, com pouco senso de reciprocidade entre os atores.
Os atores da rede conseguiram superar questões
relacionadas à repartição de possíveis benefícios do processo
do processo de inovação, mas não conseguiram acomodar o compartilhamento de riscos e investimentos, conduzindo a
um estabelecimento estrito de funções entre os membros, que
não proporcionou uma colaboração interorganizacional no caso da identificação da violação da patente.
Gestão da
estabilidade da
rede.
A relação entre AD e UFPA pode ser vista como positiva
em termos da construção de perspectivas futuras positivas,
uma vez que esses atores continuam participando do
desenvolvimento conjunto de outros produtos baseados em
diferentes bioativos regionais, que leva a uma multiplicidade de projetos com que se relacionam.
Há também a identificação de fortalecimento de
reputação da UFPA em suas atividades de extensão e apoio à
inovação, devido a premiações conquistadas pela AD; e vantagens percebidas pela AD no relacionamento com fontes
de fomento nacionais à inovação, por seu vínculo como
empresa incubada pela UFPA.
A relação entre AD e Belaiaçá não se projetou para outras
atividades além da transferência de tecnologia negociada,
mas não efetivada, e o problema da violação de patente tende
a limitar a dimensão de expectativa futura entre os atores. Fonte: Da autora (2014).
Identificamos ainda uma interação entre a configuração das capacidades e das relações sociais
dos membros da rede. Quando os atores possuíam capacidades similares em níveis elevados tendiam a
apresentar relações sociais fortalecidas, como a UFPA e AD que possuíam elevadas capacidades
tecnológicas e laços fortes, o que contribuiu para uma melhor qualidade de articulação das atividades
de desenvolvimento tecnológico. No entanto, AD e Belaiaçá possuíam capacidades incipientes para
comercialização de tecnologia/produtos tecnológicos e laços fracos, o que contribuiu para uma
fragilização de suas atividades de comercialização. Mesmo referente a interação UFPA e AD, a falta
de capacidade de comercialização tecnológica mais robusta causou efeitos negativos em suas relações
198
sociais neste âmbito, inclusive sobre a percepção de reputação da AD em sua parceria com a UFPA
frente a possíveis prospecções de privados, o que nos leva a entender que a capacidade apresenta uma
influência sobre a qualidade dos laços sociais entre os atores organizacionais.
Quanto a evidências do estudo de caso sobre a influência de aspectos vinculados à
sustentabilidade ao constructo de Relações Interorganizacionais, apresentamos uma síntese na
Tabela 16.
Tabela 16 - Evidências do estudo de caso sobre a influência de aspectos vinculados à sustentabilidade
ao constructo de Relações Interorganizacionais.
Constructo Item de análise Síntese de evidências encontradas no caso
empírico
Relações Inter-
organizacionais
Incentivo a processos de
aprendizado e transferência de
tecnologia envolvendo
diversidade biológica.
Processo de aprendizado e transferência de
tecnologia favorável à mobilidade de conhecimento biotecnológico entre AD e UFPA,
porém o mesmo não ocorreu entre AD e Belaiaçá.
Equidade e consistência
nos processos de tomada de decisão.
A equidade de distribuição de resultados
negociada entre os membros da rede interorganizacional mostrou um ponto satisfatório
por parte dos representantes das organizações, no
entanto estes não alcançaram a construção de um processo de governança consistente para tomada
de decisão conjunta.
A valorização de produtos biotecnológicos
tende a ser absorvida de forma concentrada na
cadeia produtiva no nível da agroindústria que realizou a inovação e detém os ativos necessários
para a apropriação, ou no nível dos clientes, em
geral grandes industriais, pelo poder de barganha destes.
Fonte: Da autora (2014).
Em relação a processos de aprendizado e transferência de tecnologia, compreende-se
que a inovação teve aspectos positivos quanto à mobilidade de conhecimento biotecnológico
entre AD e UFPA, apesar de não ter ocorrido transferência similar entre AD e Belaiaçá, por
problemas relacionados a riscos quanto à apropriabilidade. Consideramos que o sucesso
comercial da linha de produtos poderia criar incentivos ao desenvolvimento de novas
inovações tanto pelos membros da rede como por outros atores do mercado, contudo a
possibilidade de ter acontecido efetivamente a violação da patente, pode refletir espaços de
comportamentos oportunistas que prejudicam a articulação na cadeia produtiva de ações
conjuntas para gerar eficiências coletivas e incentivos para esforços inovativos, que
contribuam para a instituição de uma nova lógica de desenvolvimento regional sustentável.
199
5.6 A GERAÇÃO DE BENEFÍCIOS COM A INOVAÇÃO E A PERSPECTIVA DO
DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL
No âmbito do objeto desta pesquisa, no capítulo 4 levantamos os resultados em termos
econômicos e de benefícios não econômicos identificados com processo inovativo realizado
junto aos membros da rede. Por um lado, observamos que não houve comunicação de ganhos
econômicos relacionados à comercialização da inovação absorvidos pelas organizações da
rede, contudo entendemos que a linha de produtos inovadores em si foi implementada no
sistema econômico e teve resultados econômicos apropriados na cadeia produtiva. Também
podemos considerar que a AD obteve benefício econômico indireto com a inovação, apesar de
não vinculado a sua comercialização, mas associado a premiações recebidas cuja linha de
produtos foi relevante para seu alcance, como o Prêmio Samuel Benchimol e o Prêmio FINEP
de Inovação.
Por outro lado, verificamos outros tipos de benefícios gerados pela inovação às
organizações membros da rede, tais como reconhecimento e legitimidade, aprendizados e
evolução de capacidades, e inserção em nova atividade de interesse. Entre as organizações
analisadas, aquela que mais se destacou em identificar benefícios não econômicos foi a
UFPA. Compreendemos a universidade, ao não ter objetivos de atuação produtiva ou de
comercialização direta de produtos, teve sua expectativa na participação da rede
interorganizacional predominantemente focada em benefícios não econômicos, como
reconhecimento, aprendizado e ampliação de suas atividades de extensão e fomento à
inovação. Assim, a realização de ganhos econômicos apesar de considerada relevante pela
UFPA, não era o objetivo mais importante em seu comprometimento institucional no
processo inovativo.
Diante dos resultados apurados, entendemos que a interação dos membros da rede
estudada ao mesmo tempo em que promoveu condições suficientes para a criação e oferta
potencial de uma linha de produtos inovadores baseado em ativos da biodiversidade sob a
concepção de um modelo de inovação sustentável, não conseguiu assegurar requisitos
necessários à apropriação de resultados econômicos originados do processo de inovação,
como indicamos antes.
Ao considerarmos os constructos da pesquisa e aos resultados alcançados pela rede
interorganizacional, apresentamos uma apreciação crítica em termos da caracterização
empírica dos constructos e seu impacto nas condições de apropriabilidade da rede.
200
Em termos de regime de apropriabilidade, seu impacto foi considerado negativo pelos
os membros da rede, particularmente pela gestora da patente. O sistema de proteção de
patentes foi indicado como custoso para as empresas, tanto para o registro da patente, quanto
para manter procedimentos de vigilância e de assegurar o cumprimento por outros atores de
mercado desses direitos a cargo dos titulares da patente para que seja possível obter o
benefício de eficácia de proteção. Também não foram utilizados de modo efetivo outros
mecanismos complementares para garantir a apropriação, exceto alguns cuidados com
segredo industrial na transferência de tecnologia ao parceiro (Belaiaçá), o que não evitou o
transbordamento do conhecimento tecnológico gerado, nem concedeu vantagens especiais de
comercialização aos membros da rede.
Em termos do paradigma tecnológico, as oportunidades biotecnológicas foram
visualizadas como positivas à rede interorganizacional, uma vez que o caso confirmou a
obtenção de resultados positivos quanto ao desenvolvimento de produtos competitivos no
mercado (qualidade e custo) por meio da biotecnologia aplicada aos bioativos da região.
Já em relação ao padrão setorial de mudança técnica, compreendemos uma condição
também favorável à rede, pois apesar de individualmente as empresas poderem ter limitações
em seus perfis de mudança técnica para a implementação da inovação sozinhas, a atuação na
rede proposta proporcionava o compartilhamento de recursos necessários entre os membros
para realização conjunta da inovação. As limitações referem-se especificamente à AD, por ser
uma empresa de pequeno porte como de base científica que restringia seus recursos de
produção e comercialização; e à Belaiaçá por seu conjunto de capacidades associadas ao
padrão dominado por fornecedores, apresentar-se incompatível às capacidades tecnológicas
necessárias ao tipo inovação desenvolvida em biotecnologia.
Em termos de capacidades, ao analisar inicialmente as capacidades de produção e
tecnológicas, consideramos a configuração favorável à rede interorganizacional, em razão
similar ao constructo anterior em que, embora a AD, a Belaiaçá ou a UFPA não tivessem
isoladamente as capacidades tecnológicas e de produção para a realização da inovação, o
desenvolvimento do processo inovativo em rede conformou entre os seus membros as
capacidades necessárias para a criação e operação do processo produtivo inovador.
Enquanto que em relação a capacidades complementares a situação caracterizou-se
como parcialmente favorável. Além do conhecimento tecnológico específico sobre o processo
e produtos inovadores, a inovação também demandou know-how de produção e
comercialização na cadeia de valor do açaí. A rede interorganizacional foi construída como
201
um arranjo para compilar as capacidades tecnológicas e estas capacidades complementares
que estavam localizadas em diferentes atores.
No entanto, apesar de observarmos o desenvolvimento adequado das capacidades
tecnológicas (desenvolvimento do processo e produtos) e de produção (testes e validação da
produção), notamos dificuldades no processo de comercialização dos produtos inovadores. A
entrada no mercado de ingredientes é uma atividade nova tanto para a AD (primeira linha de
produtos), como para a Belaiaçá (nova no segmento), e exige abordagens e timing
diferenciados junto aos clientes corporativos.
Em termos de relações interorganizacionais, ao analisarmos os três tipos processos de
gestão entendemos que a gestão da mobilidade do conhecimento apresentou um impacto
parcialmente positivo à rede, pois por um lado a mobilidade de conhecimentos foi efetiva
entre a AD e a UFPA, no que tange ao desenvolvimento tecnológico, e foi estendida da linha
de produtos em estudo para outros produtos potenciais da AD, a qual se destaca por possuir
capacidade absortiva para identificar, assimilar e aplicar os conhecimentos provenientes da
parceria com a UFPA. Por outro lado, a mobilidade de conhecimentos entre AD e Belaiaçá foi
limitada, com incertezas quanto a condições de apropriabilidade, e pouca capacidade de
absortiva pela Belaiaçá.
Quanto à gestão da apropriação de resultados da inovação, compreendemos que este
apresentou uma condição negativa na rede interorganizacional, uma vez que seus membros
não conseguiram estabelecer entre si um regime de apropriabilidade (interno na rede) forte,
que pudesse se contrapor à fragilidade do regime de apropriabilidade do contexto institucional
(externo à rede) em que atuavam.
Apesar de considerarmos que a rede conseguiu superar questões relacionadas a
repartição de possíveis benefícios do processo de inovação, interpretamos que não conseguiu
acomodar de forma coletiva o compartilhamento de riscos e investimentos deste processo,
conduzindo a um estabelecimento estrito de funções entre os membros, que não proporcionou
uma colaboração interorganizacional mais ampla, por exemplo, no caso da identificação da
violação da patente.
Assim, entendemos que a rede de relações interorganizacional não consolidou uma
estrutura de resolução conjunta de problemas sobre a inovação, que gerasse o alinhamento
recíproco entre riscos e benefícios. Entre as empresas AD e Belaiaçá este entrave pode ser
ressaltado pela falta de formação de uma relação de confiança, pois a díade caracteriza-se
como de laço fraco.
202
Finalmente, em relação à gestão da estabilidade da rede, vemos a situação como
parcialmente favorável à rede, pois a relação entre AD e UFPA pode ser vista como positiva
com a construção de perspectivas futuras, uma vez que esses atores continuam participando
do desenvolvimento conjunto de outros produtos baseados em diferentes bioativos regionais,
que leva a uma multiplicidade de projetos com que se relacionam, incluindo a interseção de
profissionais que possuem vínculos com ambas as organizações, o que reforça seus laços
organizacionais. Também identificamos um fortalecimento de reputação da UFPA em suas
atividades de extensão e apoio à inovação, devido a premiações conquistadas pela AD, e
vantagens percebidas pela AD no relacionamento com fontes de fomento nacionais à
inovação, por seu vínculo como empresa incubada pela UFPA. Portanto, compreendemos que
esses pontos positivos superem eventuais dificuldades de timing da UFPA em procedimentos
relacionados à inovação que impactam negativamente na relação da AD junto a outras
empresas privadas.
No entanto, a relação entre AD e Belaiaçá não se projetou para outras atividades além
da transferência de tecnologia negociada, e o problema da violação de patente tende a limitar
a dimensão de expectativa futura entre estes dois atores.
Cabe também fazermos o exame desses mesmos constructos de pesquisa aplicados ao
caso em que pese a influência de diretrizes do desenvolvimento sustentável. Entendemos que
os fatores institucionais e de mercado relacionados ao acesso a recursos da biodiversidade e a
adoção de critérios e selos de sustentabilidade apresentaram baixo impacto sobre o regime de
apropriabilidade estabelecido. O açaí já possui redes convencionais de produção agrícola e
extrativista, cuja logística de distribuição se baseia na figura de intermediários ou na atuação
das próprias agroindustriais, e o parâmetro de preço comercial do fruto é predominantemente
afetado pelo mercado de processamento de polpas (agroindustriais e batedores locais), com
baixa agregação tecnológica.
Essa condição da cadeia produtiva do açaí implica em uma maior dificuldade de
proporcionar uma distribuição mais fluída (menos concentrada) dos benefícios da inovação
tecnológica a toda a cadeia produtiva. A razão é, por um lado, que o alto volume de produção
e a existência de preços já regulados por mercados não é típica em cadeias da biodiversidade,
e dificulta o controle de aplicação de regulamentos do GCEN na fase rural da cadeia, visto
que os produtores agrícolas ou extrativistas não conseguem identificar se o produto final a ser
produzido implica em acesso a patrimônio genético.
Por outro lado, o fato da produção rural ainda se destinar preponderantemente ao
processamento de polpa (com baixíssima ocorrência de inovação na agroindústria) limita a
203
valorização econômica dos frutos. Produtos que apresentem inovação tecnológica na
agroindústria local são raros, o principal produto é a polpa que possui baixa diferenciação e
agregação tecnológica e, portanto, valorização econômica limitada junto ao mercado
consumidor e aos grandes clientes corporativos, o que não permite uma margem maior de
ganho nessas agroindústrias locais que pudesse gerar (potencialmente) como desdobramento
uma valorização maior da produção dos frutos.
Além disso, não há políticas públicas focadas a prover uma melhor coordenação entre
os atores da cadeia produtiva, incluindo na intervenção sobre a distribuição adequada dos
ganhos econômicos entre os elos. No caso estudado, os principais instrumentos institucionais
como selos e certificados de sustentabilidade foram aplicados pela Belaiaçá de forma reativa,
de acordo com a exigência de clientes no mercado internacional. Estas exigências focam em
aspectos ambientais com um escopo limitado, não sendo enfatizados critérios sociais, de
forma que consideramos que os critérios socioambientais não apresentam influência
substancial sobre as condições de apropriabilidade.
No que tange à adoção de critérios de sustentabilidade no âmbito da trajetória
tecnológica também compreendemos com influência limitada no caso. A inovação de
processo e da linha de produtos visou o alcance de elevado aproveitamento de recursos, com
eficiência dos recursos produtivos, além disso, a inovação foi realizada no âmbito de um
modelo de negócio que tinha como objetivo a valorização de bioativos nativos da Amazônia,
por meio da agregação tecnológica, visando geração de benefícios às cadeias produtivas
locais. Deste ponto de vista de concepção da inovação, entendemos sua aderência a diretriz de
valorização da diversidade biológica.
Contudo, na fase de implementação da inovação no mercado, apesar de haver a efetiva
valorização da linha de produtos baseada no desenvolvimento tecnológico, consideramos que
a produção e comercialização se ajustou aos parâmetros de relações de mercado existentes,
não gerando maiores mudanças em termos de dinâmica de desenvolvimento regional.
Consideramos, assim, que somente o avanço tecnológico, sem convergência de outras
inovações sociais, institucionais ou mesmo econômicas nas relações da cadeia produtiva não
são suficientes para criar impactos positivos relevantes em termos de desenvolvimento.
Em relação ao incentivo ao desenvolvimento de capacidades específicas para
atendimento a requisitos de sustentabilidade, consideramos que houve uma influência fraca
como no item anterior, pois, embora as capacidades tecnológicas tenham focado no desenho
de um processo eficiente e de valorização da qualidade de componentes originados de
bioativos, as capacidades de produção e condições comercialização atendem a requisitos
204
limitados exigidos por clientes internacionais, apresentando uma postura reativa de
desenvolvimento de capacidades para inovações sustentáveis.
Em termos de relações interorganizacionais, vemos uma influência positiva de
aspectos vinculados à sustentabilidade em relação a processos de aprendizado e transferência
de tecnologia, ao compreender que a inovação apresentou intensa mobilidade de
conhecimento entre AD e UFPA sobre biotecnologia. Porém o mesmo não ocorreu entre AD e
Belaiaçá, por problemas de apropriabilidade.
O transbordamento que pode ter ocorrido na violação da patente, não consideramos
como uma transferência de tecnologia favorável ao desenvolvimento sustentável, pois pode
refletir espaços de comportamentos oportunistas que prejudicariam o estabelecimento de
relações de confiança na cadeia produtiva e a articulação de ações coletivas, além de
potencialmente desestimular esforços inovativos.
A distribuição de percentuais sobre os resultados econômicos negociada entre os
membros da rede interorganizacional mostrou ser um ponto de consenso por parte dos
representantes das organizações, as quais reconheceram uma forma de equidade perante as
contribuições de cada organização a inovação. Contudo, questionamos quanto à concretização
de uma adequada distribuição desses resultados entre todos os elos da cadeia produtiva, pois
percebemos uma tendência que o resultado da valorização de produtos biotecnológicos tenha
sua absorção concentrada na cadeia produtiva no nível da agroindústria que realizou a
inovação e detém os ativos necessários para a apropriação, ou no nível dos clientes, em geral
grandes industriais, pelo poder de barganha destes.
Diante desses pontos de análise, entendemos que o caso demonstra o efetivo alcance
de um desenvolvimento tecnológico de processo e de linha de produtos competitiva baseada
em bioativos amazônicos, com elevado grau de refinamento e concentração, amparado sobre
competências científicas da UFPA e capacidades tecnológicas da AD. Contudo, a inovação
fundamentada na biotecnologia, também demanda capacidades complementares para sua
implementação no mercado, particularmente de capacidades de produção e logística de
suprimento. De forma resolver essas exigências de capacidades complementares, a AD se
propôs a resolver por meio de nova parceria, com a Belaiaçá.
Essa solução de arranjo interorganizacional configurou-se em uma resposta para
superação das dificuldades de capacidades das organizações locais, a fim de transformar uma
oportunidade potencial em produtos concretos. Entretanto, obstáculos no nível do contexto
(regime de apropriação) e da estrutura social nas relações interorganizacionais acima
205
indicados reduziram as habilidades dos atores da rede de inovação de capturarem resultados
econômicos da inovação.
Assim, se por um lado, concordamos com Costa, F. (2009, p. 351) que a realização de
projetos de inovação tecnológica, com apoio de instituições pontes de C&T (como a UFPA) é
uma perspectiva de desenvolvimento na região Amazônica que se associa a demandas de um
conjunto de indústrias locais, particularmente na cadeia produtiva estudada, a qual tende a
crescer em termos de volume econômico.
Por outro lado, falhas no ambiente institucional afetam as relações na cadeia produtiva
e entre os membros de uma rede específica, no sentido de restringir a articulação coletiva em
torno de problemas comuns, com a presença de preocupações sobre comportamentos
oportunistas relacionadas à falta de confiança nas relações. Este cenário implica em coibir
ainda mais esforços inovativos por barreiras à apropriação, em um ambiente que já é marcado
por dificuldades de desenvolvimento de capacidades tecnológicas e absortivas pelas
organizações.
Tais falhas na constituição de fatores institucionais incluem a carência de políticas
governamentais específicas que regulem (ou articulem) relações na cadeia produtiva para
direcionar a busca de competitividade por meio de esforços inovativos. Atualmente a cadeia
produtiva do açaí regional se baseia em vantagens comparativas naturais, pela disponibilidade
de cultivo dos açaizais, com baixo grau de verticalização nas agroindústrias que, em geral,
produzem polpas.
Ao contrário de outros ativos da biodiversidade em que o acesso e logística ainda
precisem ser estruturados, o açaí já possui redes de produção e distribuição agrícola e
extrativista para abastecimento de agroindustriais, apesar que o aumento da demanda tem
crescido mais que oferta. Se por um lado, esta característica é uma vantagem potencial para
uma verticalização industrial na cadeia, por outro lado, a predominância do parâmetro de
preço do fruto como matéria prima é para o mercado de polpa, com baixa agregação
tecnológica, há limitada condição de valorização econômica à produção da agricultura ou do
extrativismo.
Em relação a incentivos de mercado, consideramos que os atributos de
responsabilidade socioambientais não apresentam forte influência nas condições de
apropriabilidade no caso. Isso em função das exigências de mercado para comercialização na
cadeia serem preponderantemente focadas em aspectos ambientais, porém com um escopo
estrito quanto à produção orgânica, além de certificações específicas de qualidade de
segurança alimentar na indústria, de forma que não são enfatizados critérios sociais, como,
206
por exemplo, selo de comércio justo relacionado a preocupações com a equidade na cadeia de
valor.
Assim, a emergência e desenvolvimento da biotecnologia mostrou-se uma
oportunidade para o desenvolvimento de cadeias produtivas na Amazônia, mas sua
efetividade e a adoção de critérios de sustentabilidade no processo de criação e
implementação de inovação depende não somente de avanços científicos e desenvolvimento
de capacidades tecnológicas, mas principalmente de transformações no quadro institucional
da região, com vistas a promover à realização de inovações e alterar positivamente as relações
sociais e de poder.
Neste sentido, se ressalta a relevância do papel que o apoio governamental deve
desempenhar para promover um alinhamento institucional dos atores do setor produtivo e dos
afetados por este. Como recomendação para atuação do governo neste sentido, corroboramos
com F. Costa (2009, p. 351), que indica que é preciso refletir sobre a vinculação de
instrumentos de fomento produtivo (como linhas de financiamentos ou concessão de
benefícios) ao desempenho das empresas para com indicadores de desenvolvimento,
particularmente à formação endógena de capital humano e social, além de uma postura
prudente ambientalmente.
A revisão do quadro institucional e de relações sociais deve inclusive abranger uma
discussão mais ampla sobre a efetiva aplicação de critérios de sustentabilidade, que se
mostrou com influência limitada no caso empírico. Uma inovação tecnológica por mais que
potencialmente possa gerar benefícios ao longo da cadeia produtiva não o fará se as relações
institucionais, políticas e sociais convencionais forem mantidas. Portanto, para que o avanço
tecnológico e de inovações em processos e produtos engendrem mudanças positivas na
trajetória de desenvolvimento regional, é preciso a convergência de inovações no âmbito
institucional e social, o que, no entanto, ultrapassa o âmbito de governança da rede
interorganizacional analisada.
5.7 CONSIDERAÇÕES CONCLUSIVAS
Ao analisar as condições de apropriabilidade dos resultados de uma inovação baseada
em ativo da biodiversidade por uma rede interorganizacional na Amazônia, a pesquisa buscou
explorar a convergência entre a temática de inovação e desenvolvimento sustentável. Nas
análises procuramos investigar, por um lado, à influência de diretrizes de desenvolvimento
sustentável sobre os constructos de pesquisa no caso empírico, e, por outro lado, fazer um
207
exame de em que medida o resultado alcançado do processo de inovação pela rede
interorganizacional pode contribuir para a construção de uma nova lógica produtiva
(sustentável) na região.
Identificamos que diretrizes de desenvolvimento sustentável e respectivos atributos de
responsabilidade socioambientais tiveram influência limitada nas condições de
apropriabilidade dos resultados gerados pela inovação desenvolvida na rede
interorganizacional, principalmente na etapa de implementação da inovação. Essa influencia
limitada é preocupante ao demonstrar que as instituições até então estabelecidas na região,
aplicadas especificamente à cadeia de produtiva do açaí, não alcançam efetividade em termos
de estimular ou mesmo mediar a utilização de critérios de sustentabilidade em processos
inovativos que são adotados, em geral, de forma reativa e com escopo restrito.
Assim, neste caso não encontramos instrumentos institucional ou de mercado que
regule o acesso ao bioativo específico (açaí) na região, ou ainda reduza possíveis riscos de
danos ambientais ou sociais a este relacionado. Entendemos que isso se deve provavelmente
pela comercialização do açaí já ser estabelecida em maior escala, o que pode facilitar a
instalação e crescimento de agroindustriais na região pela disponibilidade de fornecimento de
volume relevante matéria prima (apesar de haver uma defasagem de oferta frente a elevada
demanda), o que é uma condição diferenciada frente a outras espécies de bioativos. Contudo,
a existência de relações convencionais já firmadas na cadeia de produtiva, requer um esforço
de mudança dessas relações e de ruptura com práticas anteriores. Mesmo no que tange a
exigências de selos e certificações ambientais são de abrangência mais limitados (produção
orgânica) e não foram identificadas demandas específicas por selos de equidade social, como
de comércio justo.
A articulação das organizações em uma rede de relações interorganizacionais foi uma
estratégia fundamental para o sucesso do processo inovativo em termos de linha de produtos
implantada, porém não foi bem sucedida em relação à comercialização da mesma. Assim,
entendemos que a efetividade de processos internos na rede de relações impactou
positivamente o resultado tecnológico e de produção alcançado, mas devido a dificuldades
quanto a questões de apropriabilidade interna e ao não estabelecimento de laços fortes entre as
empresas envolvidas, essas relações impactaram negativamente o potencial de
comercialização e de continuidade das relações.
Entre os fatores específicos vinculados a condições de apropriabilidade, observamos
que em relação a oportunidades tecnológicas, mudança técnica e capacidades de produção e
tecnológicas, a rede interorganizacional obteve condições positivas ao processo inovativo.
208
Embora, devamos ressalvar que tal condição não pode ser generalizada como favorável a
todos os agentes da cadeia produtiva, pois nos referimos a uma análise específica do caso em
estudo, e não encontramos durante pesquisa empírica outros casos de desenvolvimento
tecnológico agregado na cadeia produtiva local. Deste modo, compreendemos que esse
conjunto de condições apresentou-se positivo na configuração específica alcançada na rede
interorganizacional, porém não sendo uma característica presente de forma geral na cadeia
produtiva.
Ao analisarmos as condições relacionadas ao regime de apropriabilidade (sistema de
proteção legal e outros mecanismos de apropriação) identificamos fragilidade em termos da
tempestividade de análises de patentes, e combinada a dificuldades de capacidade de
comercialização da tecnologia e da linha de produtos dos membros da rede gerou um impacto
negativo ao caso em estudo. Neste cenário, a apropriação de resultados econômicos da
inovação pelas organizações da rede interorganizacional, apesar dos esforços inovativos
realizados, não se concretizou de forma bem sucedida, e embora sejam identificados outros
benefícios (não econômicos) vinculados ao processo de inovação, entendemos que
apropriabilidade foi limitada em termos de promoção ao desenvolvimento dessas
organizações membros, particularmente às organizações empresariais envolvidas, e também
teve efeitos de transbordamentos restritos à sociedade local.
Na análise do resultado da apropriação da inovação, encontramos ressonância do caso
estudado com preceitos normativos relacionados à necessidade de coevoluções de inovações
sociais, políticas e institucionais para a implantação bem sucedida de inovações tecnológicas
orientadas para a sustentabilidade como sugerem Rennings (2000) e Vollenbroek (2002). E
também constatamos que fatores associados a estrutura de relações sociais, como confiança e
reciprocidade (e a falta destes) afetaram o direcionamento de transações econômicas dos
atores da rede interorganizacional, seja positivamente por exemplo no bem sucedido
compartilhamento de conhecimento entre UFPA e AD para desenvolvimento tecnológica, seja
negativamente, quando do isolamento da AD para resolução da questão de violação de patente
levantada.
Também ressaltamos como uma contribuição da pesquisa proporcionar o exame da
interação de constructos teóricos em múltiplos níveis de análise, de forma que podemos
observar o impacto de fragilidade no regime de apropriabilidade (nível de contexto)
relacionada com a dificuldade de obtenção de capacidades complementares de
comercialização dos produtos (nível organizacional) e afetado por características dos laços
sociais fracos (nível interorganizacional) interagiram em determinar os problemas da rede
209
interorganizacional (e seus membros) do alcance de apropriação dos resultados econômicos
da inovação. Esta perspectiva multinível é relevante ao permitir identificar as implicações de
interação entre as diferentes variáveis e proporcionar uma visão mais integrada do processo de
inovação.
Cabe destacarmos que o termo inovação corresponde não somente a um resultado, mas
principalmente a um processo pela qual mudanças e adaptações ocorrem, sendo parcialmente
gerenciado, mas também parcialmente não sujeito a gerenciamento (GUPTA; TESLUK;
TAYLOR, 2007). Assim, a inovação não se encerra um produto resultante em um ponto
determinado do tempo e espaço, é um processo que pode originar transbordamentos e efeitos
(aprendizados, vivências, resultados parciais) em diferentes níveis de análises, ou seja, em
indivíduos, em organizações, em setores industriais, e em regiões (ANDERSON; DE DREU;
NIJSTAD, 2004, p. 160).
As conclusões e reflexões a que chegamos nesta dissertação sobre o processo de
inovação em estudo devem ser entendidas não como respostas definitivas ao processo de
inovação concluído, mas como contribuições para a compreensão do processo de inovação em
desenvolvimento e das relações interorganizacionais em seu entorno.
Reconhecemos que a escolha da metodologia de estudo de caso e a seleção de caso
único implica em algumas limitações a generalizações das descobertas do estudo, em virtude
da não possibilidade de análise de sua validade externa por meio de replicações.
A pesquisa teve um caráter analítico e descritivo ao buscar contribuir para a
convergência entre as temáticas de inovação e desenvolvimento sustentável, assim
procuramos compreender influências de diretrizes do desenvolvimento sustentável sobre a
forma de apropriação de resultados de uma inovação em uma rede interorganizacional. Uma
limitação identificada quanto a este escopo pesquisa foi a abrangência ampla dos constructos
teóricos, o que prejudicou melhor parcimônia na coleta e análise dos dados, no entanto
consideramos essa amplitude em parte justificada pela sua natureza de procurar sondar as
possíveis relações entre constructos econômicos tradicionais e critérios de sustentabilidade.
A condição de estudo de caso incorporado (múltiplos níveis) apresentou como
dificuldade a busca de equilíbrio de atenção nas análises entre os diferentes níveis, pois
poderíamos nos concentrar de forma excessiva em um único nível de unidade, ou mesmo ter
obstáculos a realização de uma análise integrada. Para amenizar este risco, estruturamos a
pesquisa em capítulos divididos por níveis de análise, e procuramos dedicar este último
capítulo de conclusão para uma análise conjunta dos diferentes níveis. Porém reconhecemos
210
que análises mais detalhadas de capítulos específicos podem não ter recebido a devida atenção
no conjunto integrado de análise desta conclusão.
Em termos empíricos destacamos duas limitações relevantes ao estudo. A primeira
refere-se a coleta de dados por meio de entrevistas ter sido limitada no caso de AD e Belaiaçá
a somente um informante por empresa, o que pode prejudicar uma visão mais ampla das
expectativas e posições dessas empresas ao processo de inovação. A segunda limitação a ser
ressaltada corresponde à falta de dados sobre a apuração efetiva da violação da patente, pois
seria um ponto esclarecedor sobre condições de apropriabilidade no respectivo processo de
inovação. Contudo, a investigação de tal questão estava fora do escopo gerenciável do
trabalho e de suas competências puramente acadêmicas.
Como sugestões de pesquisas futuras, inicialmente propomos a realização de
investigações mais amplas sobre redes de inovação interorganizacionais em operação no Pará,
e em outros Estados da Amazônia, que possam corroborar ou questionar as constatações a que
chegamos nesta pesquisa, incluindo estudos de casos comparativos que busquem analisar os
constructos em condições distintas.
Outra proposta de pesquisa futura é o aprofundamento de estudos sobre os efeitos da
estrutura de relações sociais, como em redes interorganizacionais, no desenvolvimento de
processos de inovação, que possam conferir a oportunidade de empreender um diálogo entre
conceitos de apropriabilidade da economia da inovação e com aspectos da teoria de redes
sociais.
Neste sentido, destacamos ser propícia a realização de novos estudos de redes de
inovação sob a perspectiva de teorias de parcerias intersetoriais, em que seja possível dar
atenção as condições de conflitos e de cooperação entre organizações relacionadas entre as
próprias relações de distanciamento e aproximação entre os setores públicos e privados com
vistas a ampliação de espaços de construção de consenso social.
Por fim, sugerimos pesquisas focadas na formulação e execução de políticas públicas
de fomento à inovação na Amazônia, buscando investigar questões como o nível de
descentralização, participação e coordenação de políticas em nível Federal, Estadual e
Municipal, avaliando os impactos locais consequentes destas dinâmicas.
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221
APÊNDICE A – DESENHO TEÓRICO E METODOLOGIA DA PESQUISA
Neste apêndice, busco explicitar a construção do desenho teórico da pesquisa, com a
elucidação dos níveis de análise e seus constructos, os quais guiaram a discussão teórica e
investigação empírica contida na dissertação. Assim como, apresentar os aspectos
metodológicos de desenvolvimento da pesquisa, com a indicação das técnicas de coleta de
dados e os critérios que levaram à definição de seleção do caso para estudo, além de
limitações identificadas do método escolhido.
A.1 DESENHO TEÓRICO DA PESQUISA
O objetivo da pesquisa buscou compreender como ocorre a apropriação de resultados
de uma inovação por uma rede interorganizacional, considerando a influência de diretrizes do
desenvolvimento sustentável.
De forma geral, se esclarece que a abordagem teórica direcionadora da pesquisa teve
foco na temática de apropriação de inovação, e como o escopo da pesquisa foi delineado na
interseção entre a temática de inovação e desenvolvimento sustentável, foram também
contempladas questões relacionadas ao desenvolvimento de inovação sustentável como
intervenientes a cada nível de constructos teóricos.
A.1.1 DESENVOLVIMENTO DOS CONSTRUCTOS DE ANÁLISE
Neste tópico se descreve a seleção do conjunto de constructos teóricos ancorada na
temática de apropriabilidade de inovação, e seus respectivos itens de análise vinculados ao
encadeamento com os temas de desenvolvimento sustentável e de redes de inovação.
A.1.1.1 Apropriação da inovação
A análise da apropriação da inovação tem por base principalmente discussões
propostas por autores como Pavitt (1984), Teece (1986, 2006), Dosi (1988) e Bell e Pavitt
(1993). Teece (1986) em seu artigo “Profiting from technological innovation” (PFI) propôs
um quadro de referência sobre a análise de apropriação de inovação composto de três blocos
de constructos (anteriormente mencionados acima), discutidos em termos do objeto da
pesquisa a seguir:
222
- Regime de apropriabilidade vigente: Baseia-se em fatores tecnológicos, legais,
institucionais e de mercado que influenciam o custo e tempo requerido para imitação de
inovações (CECCAGNOLI; ROTHAERMEL, 2008, p. 14; LEVIN et al, 1987, p. 784). Em
relação à análise do objeto da presente pesquisa, consideramos este constructo relevante, e se
associa a características da trajetória tecnológica e de condições de mercado e institucionais
(LEVIN et al, 1987, p. 784) no contexto em que a rede de inovação atua. Também permite a
discussão da influência em relação a critérios de sustentabilidade sobre transbordamentos da
inovação à sociedade.
- Paradigma tecnológico dominante: Em termos deste constructo, Teece (1986, p. 288)
concentra sua análise em relação ao estágio de desenvolvimento tecnológico e sua influência
nas capacidades e processos relacionados a ênfases de tipos de inovação radicais e
incrementais. Contudo, tendo como foco redes de inovação no contexto de países em
desenvolvimento, que é o caso desta pesquisa, as inovações tendem a ocorrer dentro da
fronteira tecnológica existente (paradigma dominante), e outros aspectos da trajetória
tecnológica tomam maior relevância analítica, especificamente sugere-se trabalhar o conceito
de oportunidade tecnológica e de padrão de mudança técnica.
- Ativos complementares:
O último constructo proposto por Teece (1986, p. 288) é referente aos ativos
complementares necessários para a comercialização da inovação. No entanto, como
reconhecido pelo próprio Teece (2006, p. 1136) o framework do PFI apresenta um modelo de
análise estático em termos de recursos e capacidades da empresa, e com foco em questões
relacionadas à fase de comercialização de inovações, não dando atenção a fase de invenção.
Deste modo, como a pesquisa envolveu o estudo do desenvolvimento de um processo
de inovação, desde seu início (invenção) até a comercialização, entendemos ser adequada uma
maior abrangência deste constructo do que proposto por Teece (1986), englobando não
somente a noção de ativos complementares, mas também de capacidades tecnológicas
essenciais que em si originam a inovação tecnológica (BELL; PAVITT, 1993, p. 158-9).
Figueiredo (2000; 2003) indica que a linha de pesquisas sobre capacidades em
economias desenvolvidas tendem a não dar ênfase aos processos de aprendizado que
possibilitem a construção de capacidades iniciais de adoção e desenvolvimento tecnológico,
uma vez que suas preocupações referem-se a aspectos de fronteiras tecnológicas. Contudo,
para as empresas em países em desenvolvimento (como aqueles do objeto desta pesquisa), a
formação de capacidades para implementação de atividades inovadoras partindo-se de
223
processos e produtos já disponíveis no mundo (difusão), e os diferentes tipos de processos de
aprimoramento contínuo e de inovações incrementais são críticos (FIGUEIREDO, 2000).
Assim, a partir do esquema originalmente proposto por Teece (1986), e considerando-
se as observações acima realizadas específicas ao objeto em foco, foi proposto para o presente
estudo a seguinte matriz de constructos sobre apropriação contida na Tabela 17:
Tabela 17 - Matriz de constructos sobre apropriação de resultados de inovação.
Constructos Item de análise
Regime de Apropriabilidade Sistema de proteção legal à inovação.
Outros mecanismos de apropriação utilizados.
Trajetória Tecnológica Oportunidades tecnológicas
Padrão setorial de mudança técnica.
Capacidades
Capacidades de produção.
Capacidades tecnológicas.
Ativos complementares.
Fonte: Da autora (2014).
Como mencionado anteriormente, o objetivo deste apêndice foi somente apresentar o
escopo teórico utilizado na pesquisa, em termos de seleção de constructos e níveis de análise,
que orientou a coleta e análise de dados empíricos sobre estes. A seguir, propomos pontos de
conexão entre os constructos apresentados e a temática de desenvolvimento sustentável.
A.1.1.2 Interveniência de critérios de sustentabilidade
Na intenção de explorar conexões entre a temática de inovação e de desenvolvimento
sustentável, para cada um dos constructos de apropriação selecionados acima propomos
investigar a incidência ou não possíveis efeitos pertinentes a questões relacionadas a
sustentabilidade, particularmente a critérios socioambientais.
Neste sentido, de forma propositiva usamos os seguintes elementos para análise de
caráter exploratório:
- Regime de apropriação: Compreender como fatores institucionais e de mercado
interferem no potencial de apropriação dos atores da rede de inovação quanto ao acesso a
224
recursos da biodiversidade, regulamentações e recomendações da CDB, ou exigências de
adoção de critérios e selos de sustentabilidade.
- Trajetória tecnológica: Pesquisar implicações em função da biotecnologia e acesso a
biodiversidade quanto a aspectos relacionados à adoção de critérios de sustentabilidade, que
possa conduzir a uma possível transição sociotécnica. De forma que se busca compreender em
que medida fatores relacionadas a mudança de trajetórias tecnológicas vinculadas a critérios
de sustentabilidade interferem no potencial de apropriação dos atores da rede de inovação.
- Capacidades: Analisar como desafios tecnológicos para o alcance de critérios de
sustentabilidade em processos e produtos influenciam no desenvolvimento de capacidades nas
organizações, considerando-se a postura (proativas ou reativas) destas.
Portanto, para visualização integrada com os constructos selecionados, acrescentam-se
tais pontos à matriz anteriormente apresentada conforme Tabela 18:
Tabela 18 - Matriz de constructos sobre apropriação de inovação e interveniência de aspectos
vinculados à sustentabilidade a serem explorados.
Constructos Item de análise Interveniência de aspectos vinculados à
sustentabilidade
Regime de
Apropriabilidade
Sistema de proteção legal à inovação. Fatores institucionais e de mercado que
exercem influência quanto ao acesso a
recursos da biodiversidade e a adoção de
critérios e selos de sustentabilidade. Outros mecanismos de apropriação
utilizados.
Trajetória Tecnológica
Oportunidades tecnológicas. Transição sociotécnica pela adoção de
critérios de sustentabilidade. Padrão setorial de mudança técnica.
Capacidades
Capacidades de produção.
Desenvolvimento de capacidades
específicas para atendimento a requisitos
de sustentabilidade.
Capacidades tecnológicas.
Capacidades complementares.
Fonte: Da autora (2014).
A.1.1.3 Estrutura e processos de redes interorganizacionais
Os três constructos até então propostos são fatores reconhecidos por influenciar a
apropriação de determinada organização sobre uma inovação, no entanto o objeto desta
pesquisa abrange o desenvolvimento de um processo de inovação por meio de relações
interorganizacionais. A interação das diferentes organizações e a natureza de suas relações
interorganizacionais afetam o resultado da inovação (coletivo), e, portanto, o potencial de
225
criação de valor, bem como a distribuição do valor criado entre os membros. Deste modo,
tornou-se necessário inserir no desenho teórico da pesquisa aspectos associados a dinâmica de
redes sociais.
Dhanaraj e Parkhe (2006, p. 661) estabelecem três processos chaves sobre a
orquestração de redes de inovação no que tange a criação e distribuição de valor, são eles a
gestão da mobilidade de conhecimento (1), a gestão da apropriabilidade da inovação (2) e a
gestão da estabilidade da rede (3).
O processo de gestão da mobilidade do conhecimento refere-se à identificação,
socialização e absorção de conhecimentos necessários entre os membros da rede, de modo a
promover a troca de informações e conhecimentos essencial ao desenvolvimento conjunto de
inovações e criação de valor (DHANARAJ; PARKHE, 2006, p. 663),
Contudo, também é preciso assegurar que este valor criado seja adequadamente
distribuído pelos membros da rede, e percebido como tal entre cada um destes. Estas
atividades representam o processo denominado de gestão da apropriação dos resultados dos
esforços inovativos (DHANARAJ; PARKHE, 2006, p. 663).
Por fim, o processo de gestão da estabilidade da rede abrange a coordenação de ações
de fomento a reputação da rede, a construção de perspectivas de ganhos futuros vinculadas a
comportamentos de cooperação, e a multiplicidade de diferentes relações entre membros, com
o encorajamento ao aprofundamento das relações e sua ampliação para outros projetos
(DHANARAJ; PARKHE, 2006, p. 664).
Cabe ressaltar que estes processos são propostos como escopo teórico para análise de
redes de inovação de acordo com os seguintes pressupostos, de acordo com Dhanaraj e Parkhe
(2006, p.661): na rede de inovação existem atores que assumem papeis focais (hub),
semiperiféricos e periféricos, no entanto, independente da posição, todos esses atores são
ativos na busca de seus interesses, por meio do exercício de escolhas estratégicas, o que
implica na possibilidade de significativas mudanças na rede no decorrer do tempo tanto em
relação a seus membros (quantidade e diversidade) quanto a sua estrutura (densidade e
centralidade).
Entende-se que tal condição se aplica ao objeto de estudo, e que os três processos
indicados podem elucidar pontos chaves da interação das organizações na rede com foco na
questão da apropriabilidade. Assim, além da análise preliminar quanto ao desenho da
estrutura da rede de inovação, os constructos adotados para investigação dos processos são os
propostos por Dhanaraj e Parkhe (2006, p. 661), conforme tabela 19, em que já se expõe
aspectos propositivos relacionados a diretrizes de desenvolvimento sustentável:
226
Tabela 19 - Constructos referentes a análise de interação interorganizacional relacionados à
apropriabilidade.
Construto Item de análise Interveniência de aspectos vinculados à
sustentabilidade
Relações
Interorganizacionais
Gestão da mobilidade do
conhecimento
Incentivo a processos de aprendizado e transferência de tecnologia (transbordamentos
positivos).
Gestão da apropriabilidade
da inovação
Equidade e consistência nos processos de tomada
de decisão entre os membros da rede.
Gestão da estabilidade da
rede
Fortalecimento do capital social e diversidade de
atores quanto a interesses na área de atuação
(perspectiva includente).
Fonte: Autoria própria.
A.1.1.4 Apuração de resultados da inovação (variável dependente)
Uma vez que o objetivo da pesquisa foi analisar a forma de apropriação dos benefícios
gerados por uma inovação em uma rede interorganizacional, os resultados alcançados pela
inovação e, em sua medida, aqueles apropriados pelos membros da rede, tornam-se a variável
dependente do estudo, para a qual se busca estabelecer as relações de influência dos
constructos acima discutidos.
Estes resultados são analisados em termos econômicos e de benefícios não
econômicos para os membros da rede. A identificação de ganhos econômicos relacionados à
inovação absorvidos pelas organizações da rede pode se basear em informações como receitas
de vendas ou percentuais de royalties negociados, de acordo com as características específicas
de absorção de ganhos e atividades de cada membro.
Além dos ganhos econômicos, se procura verificar complementarmente outros tipos de
benefícios gerados pela inovação que as organizações membros da rede reconheçam terem
sido gerados pela inovação e apropriados, tais como reputação, legitimidade, inserção em
nova atividade de interesse político ou social. Estes benefícios são identificados junto às
próprias organizações da rede, e considerados na análise de forma complementar às
informações econômicas.
Apresenta-se na Figura 13 o mapa conceitual do desenho da pesquisa:
227
Figura 13 - Mapa conceitual dos constructos da pesquisa.
Fonte: Elaborada pela autora a partir de Dhanaraj e Parkhe (2006, p. 661).
A.1.2 NÍVEIS DE ANÁLISE DOS CONSTRUCTOS
Ao conceber o desenho da pesquisa, foi relevante buscar perceber os efeitos da
interação entre os diferentes constructos selecionados, e atentar para os diferentes níveis de
análise em se encontram. Para Gupta, Tesluk e Taylor (2007, p.885), toda inovação é um
fenômeno que envolve pelo menos dois níveis de análise, um referente ao ator (pode ser
individual ou coletivo) e outro mais amplo correspondente ao ambiente no qual este ator está
inserido, de modo que reconhece que a inovação é um fenômeno caracterizado por variáveis
em múltiplos níveis, cuja interação pode ter distintos impactos.
228
Assim, em uma revisão de literatura sobre estudos de inovação com múltiplos níveis,
Gupta, Tesluk e Taylor (2007, p. 888) indicam a importância de reconhecer e articular
diferentes níveis de análise, elucidando as relações de influência entre constructos e níveis, de
forma que propõem classifica estas relações no formato de bottom-up e top-down. O primeiro
formato de interação, Bottom-up, é representado quando se foca nos efeitos da emergência de
eventos que se originam em um nível mais baixo em relação a um nível mais alto, por
exemplo, o impacto de capacidades individuais de organizações sobre o desempenho da rede
interorganizacional que estas compõem.
O segundo processos de interação é top-down, quando se analisa a influência de
variáveis de um nível mais alto sob níveis mais baixos, também denominados de influências
contextuais (GUPTA; TESLUK; TAYLOR, 2007, p. 889), que auxiliam na compreensão das
influências do ambiente de mercado ou institucional sobre processos em organizações, por
exemplo.
Gupta, Tesluk e Taylor (2007, p. 889) consideram uma rede de atores em processos de
inovações um exemplo característico de análise de múltiplos níveis, em virtude de seus
estudos articularem padrões de interação entre diferentes unidades que compõe a rede, com
implicações de tensão de interesses em relações de cooperação (interdependência) e
competição (escassez de recursos).
De forma geral, apresentamos a seguinte proposição de níveis de análises e
constructos a serem explorados na presente pesquisa de acordo com a Tabela 20:
229
Tabela 20 - Matriz de constructos sobre apropriação de resultados em rede de inovação.
Constructos Nível de Análise Recorte da interação entre níveis de análise
aplicados na pesquisa
Regime de
Apropriabilidade Contexto
Influência contextual (top-down) sobre as organizações e sobre a rede interorganizacional.
Trajetória
Tecnológica Contexto
Influência contextual (top-down) sobre as organizações e sobre a rede interorganizacional.
Capacidades Organização
Influência bottom-up sob a rede interorganizacional, pela compilação de
capacidades ao nível da rede, cuja origem estão no
nível das organizações.
Gestão da mobilidade
do conhecimento
Interorganizacional
(rede)
Influência das relações interorganizacionais (top-down) que modera o resultado no nível das
organizações, mediada pelos constructos
anteriores.
Gestão da
apropriabilidade da
inovação
Interorganizacional
(rede)
Influência das relações interorganizacionais (top-
down) que modera o resultado no nível das
organizações, mediada pelos constructos
anteriores.
Gestão da
estabilidade da rede
Interorganizacional
(rede)
Influência das relações interorganizacionais (top-down) que modera o resultado no nível das
organizações, mediada pelos constructos
anteriores.
Fonte: Da autora (2014).
A.1.3 CONTRIBUIÇÕES E LIMITAÇÕES DO DESENHO DE PESQUISA
O desenho de pesquisa construído tem um caráter exploratório, que buscou contribuir
para a convergência entre as temáticas de inovação e desenvolvimento sustentável ao procurar
compreender influências de diretrizes do desenvolvimento sustentável sobre a forma de
apropriação de resultados de uma inovação em uma rede interorganizacional. Desta forma,
são sugeridos propositivamente para análise empírica atributos vinculados a critérios de
sustentabilidades para investigação de seus impactos sobre constructos tradicionais de
apropriabilidade de inovação.
Outra contribuição planejada foi a articulação de um processo de inovação no âmbito
de uma rede interorganizacional, o que conferiu a oportunidade de empreender um diálogo
entre conceitos de apropriabilidade da economia da inovação e com aspectos da teoria de
redes sociais.
A principal limitação identificada corresponde ao escopo do desenho que apresenta
abrangência ampla dos constructos teóricos, o que pode prejudicar a parcimônia na coleta e
análise dos dados, contudo sua amplitude em parte deve-se a natureza exploratória da
230
pesquisa que busca sondar possíveis relações entre constructos econômicos tradicionais e
critérios de sustentabilidade socioambiental.
A.2 METODOLOGIA
Nesta seção, apresenta-se o objeto do estudo, e o método utilizado para o
desenvolvimento da pesquisa de acordo com o quadro de referência do desenho teórico
apresentado acima. Posteriormente, são indicadas as técnicas de coleta de dados utilizadas,
bem como os critérios que levaram à definição de seleção do caso para estudo, e algumas
limitações identificadas do método escolhido.
A.2.1 OBJETO DE ESTUDO
O objeto teórico da presente pesquisa enquadra-se na intersecção dos temas de
inovação e de desenvolvimento sustentável ao ter como questão central compreender como a
apropriação de resultados de inovação realizada por uma rede interorganizacional ocorre, e
em que medida pode ser influenciada por critérios de sustentabilidade socioambientais.
Portanto, desdobra-se na análise da forma de apropriação de resultados da inovação pelas
organizações no âmbito de uma rede (1), e da influência de diretrizes do desenvolvimento
sustentável sobre os condicionantes de apropriabilidade (2).
O objeto empírico da pesquisa deve se caracterizar por uma rede de relações
interorganizacionais com objetivo de desenvolvimento de uma inovação baseada em ativos da
biodiversidade, com atividades inovativas localizadas na região amazônica. Entende-se que
este objeto de estudo contempla um escopo de atividade relacionado à biodiversidade na
região Amazônica que reúne dois elementos contextuais necessários à pesquisa conforme
segue:
(1) Existência de certo grau de pressões institucionais e de mercado quanto a
condicionantes de responsabilidade socioambientais;
(2) Natureza dos recursos (biodiversidade) vincula-se a instrumentos
normativos de diretrizes sobre desenvolvimento sustentável, como a
Convenção de Diversidade Biológica.
231
A.2.2 MÉTODO
Para entender o processo de apropriação de resultados de inovação dentro de uma rede
interorganizacional dinâmica e sua conexão com atributos de desenvolvimento sustentável, a
abordagem qualitativa foi adotada por favorecer a investigação de aplicações conceituais e a
exploração de relações entre os constructos (MAHONEY, 2005, p. 9).
O método escolhido foi de estudo de caso único em virtude da complexidade da
organização em rede e a necessidade de apreensão das interações entre este objeto e seu
contexto (YIN, 2001, p. 32). Cabe acrescentar que a análise dos processos multiníveis é
relevante teoricamente para investigação, de modo a buscar compreender a relação entre a
forma de apropriação de inovação da rede e a interveniência de aspectos contextuais
econômicos, sociais e institucionais que envolvem o desenvolvimento de inovação baseada no
uso de bioativos na região amazônica.
O estudo de caso único permite exploração profunda de dados e informações sobre em
que medida atributos de sustentabilidade socioambientais se correlacionam com a
apropriabilidade de inovações com o objetivo de contribuir para a base de conhecimento
existente, visto que estas conexões estarem ainda em desenvolvimento recente, propiciando a
geração de informação descritiva e o debate de hipóteses ou proposições que possam ser
objeto de estudos futuros (YIN, 2001, p. 51).
Como a pesquisa contempla uma perspectiva teórica multinível, o estudo de caso
caracteriza-se como incorporado (YIN, 2001, p. 64), de modo que envolve, além da análise do
contexto, dois níveis de investigação: a rede interorganizacional como uma unidade, e as
organizações que a compõe, como subunidades incorporadas a esta.
A.2.3 TÉCNICAS DE COLETA DE DADOS
Como o objeto de redes de inovação envolve múltiplos atores sociais e diversas
atividades relacionadas permite abranger uma ampla variedade de técnicas de coleta de dados
e fontes. As técnicas de coleta de dados utilizadas foram entrevistas e pesquisa documental,
complementadas com observação e anotações em diário de campo de visitas às organizações
da rede de inovação, buscando assim a triangulação de meios de coleta (YIN, 2001, p. 120).
Foram realizadas ao todo 04 entrevistas em profundidade com representantes de
organizações membros da rede de inovação, e 02 entrevistas com atores externos à rede, um
especialista na cadeia produtiva do açaí e outra especialista sobre fomento à inovação na
232
Amazônia. Antes de cada entrevista, foram construídos roteiros de entrevistas
semiestruturadas específicos para cada ator, com base em um guia de tópicos gerais que
podem ser examinados no Apêndice B.
Ressalta-se também a importância da triangulação de fontes, ao buscar esclarecer os
diferentes significados pelos quais o caso pode ser entendido. Isso é particularmente relevante
no caso em questão, em que interessa a diversidade de percepção das várias organizações que
compõe a rede do processo de inovação desenvolvido, de modo a refletir “diferentes
realidades” vivenciadas, bem como de outros agentes do contexto, pois, as diferentes
perspectivas podem influenciar em variação de percepção quanto à apropriação de benefícios
pelos atores envolvidos.
A.2.4 SELEÇÃO DE CASO PARA ESTUDO
A seleção do caso de estudo baseou-se em critérios de adequação à proposição de
constructos teóricos (EISENHARDT, 1989, p. 537) e de relevância significativa (YIN, 2001,
p. 180-181).
Em relação aos critérios de adequação concentrou na identificação de redes
interorganizacionais formadas com finalidade de desenvolver inovação tecnológica de
produto e/ou processo baseado em algum ativo da biodiversidade da Amazônia. Também era
preciso que a inovação já tivesse sido lançada ou aplicada no mercado, de forma a ter gerado
resultado, cuja apropriação possa ser estimada entre as organizações da rede.
Além desses requisitos, Yin (2001, p. 180-181) recomenda que os casos a serem
selecionados devam ser significativos, de modo que não sejam usuais e de importância ao
interesse público geral com relevância regional ou nacional.
Diante deste quadro de atributos, foi selecionado o estudo do caso da rede de inovação
para produção e comercialização de composto antioxidante concentrado de açaí, cujas
principais organizações em termos de capacidades constitutivas ao processo inovativo são a
Universidade Federal do Pará (UFPA), a Amazon Dreams e a Belaiaçá.
Em relação a adequação teórica, observa-se que a rede atende aos critérios de
adequação ao objeto de estudo, uma vez que realizou o desenvolvimento de inovação de linha
de produtos e processo na região amazônica, especificamente no estado do Pará. A linha de
produtos inovadores é baseada no açaí, fruta endêmica da Amazônia, já tendo sido lançado
comercialmente no mercado.
233
Em relação à relevância significativa, a empresa Amazon Dreams (AD) recebeu em
2012 pela FINEP o prêmio regional (outubro) e nacional (dezembro) de pequena empresa
inovadora baseada principalmente no desenvolvimento da linha de produtos de açaí, obtendo
assim reconhecimento significativo, entendendo-se que há reconhecimento público em
relação à inovação desenvolvida.
A.2.5 LIMITAÇÕES DO MÉTODO
A escolha da metodologia de estudo de caso apresenta algumas limitações quanto ao
nível de detalhamento e ao volume e diversidade de dados coletados. Apesar de permitir uma
triangulação de fontes e técnicas de coleta de dados importante, requer atenção à parcimônia e
a priorização no enfoque dos constructos do estudo. Reconhece-se que esta limitação também
decorre da abrangência dos constructos teóricos anteriormente justificada em virtude da
natureza exploratória da pesquisa.
A condição de estudo de caso incorporado (múltiplos níveis) apresenta uma
dificuldade em relação a busca de equilíbrio de atenção na análise entre os diferentes níveis,
pois podem apresentar concentração excessiva em um único nível de unidade (Yin, 2001, p.
65). Para evitar esta situação, a pesquisa foi estruturada em blocos divididos por níveis de
análise.
O caso único pode ser considerado uma limitação a generalizações analíticas das
descobertas do estudo, em virtude da não possibilidade de análise de sua validade externa por
meio de replicações (literais ou teóricas).
234
APÊNDICE B – ROTEIROS DE ENTREVISTAS
Guia de orientação para roteiros de entrevistas semiestruturadas.
Coleta de dados via entrevistas:
O objetivo deste guia de roteiros foi contemplar indicações de fontes, questões chaves
e tópicos para as entrevistas semi estruturadas. A técnica de entrevistas foi considerada o
principal meio de coleta de dados, visto que a maioria das informações exploradas em termos
da descrição do desenvolvimento do processo de inovação em si e a apropriação de seus
benefícios, e asa relações interorganizacionais decorrentes são de difícil disponibilidade por
outros canais, como levantamentos documentais ou observações.
Assim, as entrevistas abordaram tópicos que se relacionaram desde a formação das
relações interorganizacionais para o desenvolvimento de inovação, até a obtenção de
informações sobre resultados do processo de inovação.
Informantes chaves:
Em relação a fontes de informações para a condução de entrevistas, se identificou dois
grupos de informantes chaves para realização da pesquisa, que são os representantes das
organizações envolvidas no processo de inovação em rede (1), e especialistas do setor (2).
Grupo de informantes chaves 1:
Representantes de organizações da rede de inovação.
Questões chaves:
(1) Em que medida atributos socioambientais influenciaram as condições de apropriabilidade
dos resultados gerados pela inovação desenvolvida em rede?
(2) Como a efetividade (ou não) de processos internos da rede de inovação impactaram no
resultado alcançado da inovação desenvolvida?
(3) A apropriação de resultados econômicos e de outros benefícios da inovação pelas
organizações da rede ocorreu de forma adequada a promover o desenvolvimento dessas
organizações membros, e proporcionar transbordamentos positivos à sociedade local?
235
O roteiro foi dividido por partes, abrangendo um início relacionado a caracterização da
empresa, e depois em blocos abrangendo os constructos de estudo de acordo com o desenho
de pesquisa:
a. Trajetória Tecnológica:
- Caracterização da trajetória tecnológica na cadeia produtiva;
- Mudança técnica na organização e oportunidades tecnológicas percebidas;
- Relações institucionais na cadeia produtiva.
- Influências de atributos de responsabilidade socioambientais na atuação da
organização.
b. Regime de Apropriabilidade:
- Sistema de proteção à propriedade intelectual;
- Mecanismos de proteção de inovações usados;
- Influência de regulamentos relacionados ao acesso à biodiversidade.
c. Capacidades:
- Capacidades de cada organização, particularmente necessárias à inovação;
- Capacidades relacionadas à mobilidade de conhecimento e ao processo de
aprendizado tecnológico;
- Capacidades vinculadas ao atendimento de critérios socioambientais de
sustentabilidade, e mais especificamente ao acesso a ativos da biodiversidade.
d. Rede de Inovação:
- Formação da rede de inovação interorganizacional, e modificações de configurações
ao longo do processo de inovação;
- Principais atribuições das organizações para o desenvolvimento da inovação;
- Descrição do processo de negociação da distribuição de benefícios econômicos dos
resultados da inovação;
- Descrição de processos relacionados à mobilidade (compartilhamento e absorção) de
conhecimento na rede;
- Descrição de processos relacionados à apropriabilidade na rede;
- Descrição de processos relacionados à estabilidade da rede.
- Identificação de benefícios econômicos e não econômicos gerados pelo processo de
inovação e transbordamentos à sociedade.
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Grupo de informantes chaves 2:
Representantes de organizações externas à rede, sendo com conhecimento
especializado sobre:
- Cadeia produtiva do açaí;
- Fomento à inovação na Amazônia.
Questões chaves:
(1) Quais fatores induzem e quais dificultam o desenvolvimento de inovações baseadas em
ativos da biodiversidade na Amazônia?
(2) Em que grau critérios socioambientais tem sido adotados por organizações na cadeia
produtiva do açaí, e como a adoção de tais critérios tem se relacionado ao
desenvolvimento de capacidades e de inovações?
(3) Em que medida atributos socioambientais influenciam condições de apropriabilidade de
resultados gerados por inovações no setor?
Tópicos relacionados - Especialista na cadeia produtiva do açaí:
- Principais dificuldades na cadeia produtiva local;
- Diferenças entre açaizais nativos e plantações planejadas;
- Possibilidade de cultivo do açaí fora do bioma amazônico;
- Infraestrutura geral da cadeia produtiva regional;
- Relações institucionais na cadeia produtiva e poder de barganha entre os atores;
- Cenário sobre políticas públicas, e investimentos em pesquisa e desenvolvimento de
inovações na cadeia produtiva.
Tópicos relacionados - Especialista sobre fomento à inovação na Amazônia:
- Principais avanços e entraves para a biodiversidade da Amazônia constituir-se como
uma plataforma de oportunidade para o desenvolvimento regional;
- Pontos fortes e fracos das instituições de ciência e tecnologia na região;
- Acertos e desafios da atual legislação de acesso ao patrimônio genético no país;
- Influência de exigências institucionais e de mercado quanto a critérios de
sustentabilidade no desenvolvimento de inovações de produtos e processos na região;
- Cenário sobre políticas públicas, relações institucionais e investimentos em pesquisa
e desenvolvimento de inovações na Amazônia.