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RAUL CÓRDULA TEXTOS E IMAGENS

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Page 1: Raul Córdula | Textos e Imagens

RAUL CÓRDULATEXTOS E IMAGENS

Page 2: Raul Córdula | Textos e Imagens

Tríptico | 100X450mm | 1982 | Coleção MAMAM

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Profª Joana D’Arc Lima

FALAS DO ARTISTA ENTRE O PASSADO E DEVIR: 1960 | 2000

Suporta em suas palavras parte da existência da experiência de vida e de produção das artes visuais e da escrita crítica de arte de Raul Córdula. O artista nasceu em Campina Grande em 1943, entre a infância e o início da adolescência residiu na cidade do Rio de Janeiro com sua família, de volta à Paraíba, circula em ambientes de sociabilidades da intelectualidade paraibana e faz sua primeira exposição na Biblioteca Pública de João Pessoa em 1960 e continuou praticando, desde então, o campo das artes como pintor, cenógrafo, escultor, poeta visual, articulador e gestor de espaços culturais, professor e crítico das artes em diversas cidades do Brasil e no exterior. Assumiu posturas radicais importantes em momentos cruciais da vida política do país, ecoando em sua produ-ção, estabelecendo entrecruzamentos e entrelaçamentos profícuos entre arte e política. Tais campos, arte e política, praticamente na experiência cotidiana são inseparáveis, mantendo entre si interdependências viscerais, contudo, são exceções os artistas que intensificam esse diálogo e exploram essas tensões e limites. Raul Córdula não apenas aproximam esses lugares de poder, como, muitas vezes escancara os dilemas postos e se aventura em sua produção crítica e artística em poéticas que produzem fissuras ex-tremamente instigantes nesses espaços.

Objetivando a concretude material desse projeto propomos a realização de um (01) li-vro ilustrado que narre o percurso criativo plástico e crítico do artista por meio de suas memórias, de suas obras e de seus textos críticos, portanto, uma narrativa em primeira pessoa, entrecruzada, reelaborada e reescrita, ou seja, interpretada pelo olhar de pes-quisadores convidados.

A importância da obra de Raul Córdula é fundamental para o entendimento da história da arte brasileira. Ou melhor, o fundamental reside na contribuição de sua obra para a ampliação da noção de arte brasileira, transbordando limites e fronteiras de enten-dimentos e construções historiográficas pautadas em trajetória e percurso criativo do artista anuncia, no horizonte maior de sua abrangência, questões relativas à produção de uma história da arte social brasileira, e ainda, propor indagações sobre que história da arte escolhemos para escrever e nos inserir.

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Desenho | 1965 | Coleção do Autor

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Harry LausVISÕES DO MUNDO

Nestes tempos de Appel, Dubuffet, Tápiés e os outros informais ou tachistas, parece-nos conveniente re-valorizar o exemplo de expressão natural dado por nossas crianças pe-los muros e paredes. Com um mínimo de requisitos, uma criança nos dá uma visão do mundo. Nós, que vivemos na era dos mínimos, precisamos compreender a escritura dos muros: como as crianças precisamos aprender a rabiscar. – Encontro estas palavras de Hans Rodeker numa reportagem publicada na revista holandesa “Delta”, focalizando desenhos de crianças feitos em muros e paredes.

Uma das fontes de inspiração de Raul Córdula é exatamente esta. Dando um tratamen-to artístico às figuras casuais que as crianças riscam pelas paredes com giz, carvão ou uma lasca de pedra, parte para a complementação do quadro a óleo ou do desenho com o emprego da cor e a orientação dos planos. Com predominância do azul, do cinza e terras no fundo, lança suas figuras em traços negros, obtendo efeito novo de grande beleza plástica, com sentido perfeito de modernidade.

Raul Córdula é autodidata e vem de João Pessoa onde exerce as funções de Diretor do serviço de Artes plásticas da universidade da Paraíba. Viveu muito tempo no interior do estado do Rio, mas foi novamente em sua terra, Campina Grande, que sentiu o despon-tar de sua vocação quando começou a desenhar as tristes pessoas da feira local. Agora, além do que tenha ficado dessas observações, mais a instigação do grafismo dos muros, também recebe a influência pictórica dos pescadores de Tambaú dançando o coco. Es-tes, os elementos objetivos da criação de Córdula. A parte subjetiva que dá alento e vida a seus quadros tem muito da angústia e da miséria que tem o campo livre do Nordeste.

A galeria Verseau apresenta ao público carioca um artista jovem (nasceu em 1943) que se alia a tantos valores que despontam em nossas artes plásticas.

Jornal do Brasil | Rio de Janeiro | 1965 | Galeria Verseau | Rio de Janeiro | Abril de 1965

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Eclipse | 1995 | Coleção do AutorDesenho | 1965 | Coleção do Autor

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Josete Mélèseo mistério dos signos

Nascido em 1943 no Nordeste do brasil, Raul Córdula, que fez seus estudos nos ateliês do museu de arte moderna do Rio, pinta, desenha, esculpe. O Espaço Cultural da Em-baixada do Brasil apresenta meia centena de suas obras recentes, pinturas, desenhos, esculturas em forma de jóias. O que pode surpreender nessas criações é uma mistura de rigor e de improvisação, de geometria e de liberdade gestual.

Córdula, ao mesmo tempo que vive intensamente no seu tempo e participa dos progra-mas culturais de seu país, não deixou de procurar as fontes de sua inspiração bem, lon-ge no passado. Ele trabalhou durante muito tempo no sítio pré-histórico do Ingá para nele estudar os signos e caracteres, hoje indecifráveis, mas ricos de uma carga emocio-nal secular. Através das civilizações antigas, reencontramos a estabilidade do quadra-do, o dinamismo do círculo, a espiritualidade do triângulo, o imobilismo do horizontal, a atividade do vertical, a combatividade do oblíquo, mesmo se outros significados se superpõem a estes.

São estas expressões imutáveis, e todavia singulares, que Córdula esforça-se por in-tegrar, com o poder de sugestão e meditação que estas figuras têm, com a abstração informal. Disso resulta este curioso equilíbrio entre as formas geométricas em oposição às pulsações gestuais da cor. A maneira que Córdula encontrou para exprimir o imemo-rável caos da sua região natal, o Nordeste brasileiro.

PARISCOP | Paris | Julho de 1991

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Pintura | 80x100cm | 1989 | Coleção Evelyn Iochpe

Eva LouzonO Criptograma do SertãoO alfabeto visual de Raul Córdula busca suas origens no seio das três fontes do Nor-deste brasileiro: o cristianismo, os ritos africanos de origem yorubá, a mitologia dos indígenas tupis e cariris.

Na obra de Córdula, nos encontramos a essência de sua inspiração, sinal de uma forma-ção cultural eclética, inerente a sua região sempre aberta a proposições universalistas.O artista não se preocupa nem com academismo nem com questões estéticas estabele-cidas. Porque para ele o arcaico não é o antigo, ele é perpétuo, a própria raiz da lingua-gem.

O universo de Pitágoras, as sociedades secretas, as artes criptográficas e rupestres, são interpretadas por Raul Córdula a partir da pesquisa que ele realiza sobre o sítio pré-his-tórico do Ingá, no estado da Paraíba. Lá onde há 10 mil anos, os indígenas gravaram seus símbolos sobre a Itacoatiara (“pedra gravada” em língua tupi).Durante sua primeira exposição em Paris, Córdula apresentou na Embaixada do Brasil, de 5 de maio a 7 de junho, um vasto panorama gráfico e plástico de sua obra: pinturas inspiradas pelos signos rupestres do Ingá, aquarelas baseadas em figuras pitagóricas e jóias de prata dedicadas ao panteon do candomblé.

Sol a Sol | Paris | 1991

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Pintura | 80x100cm | 1989 | Coleção Particular

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Fernande SchulmannUma qualidade de vibração

Artista já conhecido no Brasil, participou de bienais de arte, exposições coletivas e in-dividuais na França e em outros países da Europa. Para melhor compreensão de sua carreira, é importante lembrar o papel do Brasil na América latina. Maior país do con-tinente sul, é berço de criação artística original e diversificada que vai do barroco colo-nial à arquitetura do Século XX, de pinturas rupestres do nordeste – que influenciaram durante muito tempo o trabalho de CÓRDULA – aos poemas épicos dos «bandidos de honra» (cangaceiros), etc.Talvez seja à tripla composição índia, africana e européia que este povo deve seu imagi-nário singular no qual o muito conhecido Carnaval é apenas uma tênue ilustração. Seja como for, não se deve ceder à tentação simplista de relacionar os artistas desta parte do mundo a influência de escolas européias. Em se tratando do trabalho de CÓRDULA, pode-se apenas evocar um leve parentesco com os cinéticos latino-americanos, ainda que estes se preocupem preferencialmente com o movimento e o desenrolar das figuras, enquanto que ele reduz o essencial à uma qualidade de vibração.

Nascido em 1943 no estado da Paraíba, Raul CÓRDULA formou-se no Rio de Janeiro. Dotado de curiosidade multiforme, interessou-se pelos aspectos mais variados do campo plástico – inclusive pesquisando sobre o artesanato – e até à joalheria. Tudo isso sem excluir inúmeras outras funções tais como: professor universitário, curador, diretor de vários organismos e fundações, tendo sempre se destacado por sua competência.

Depois de muitas andanças, fixou-se perto de Recife, em Olinda, pequena cidade antiga e preservada - onde cria sua obras com lenta obstinação - Não se trata, de uma criação de estilo desordenado, mas, sobretudo, de um trabalho de aprofundamento da sua di-nâmica interior.

Sua produção, e particularmente a mais recente já qualificada como «novas geome-trias», reconduz a uma série de encaixamentos de cores esplendorosas, sabiamente emparelhados. Existe, no trabalho deste artista, uma constante e única obsessão de equilibrar valores e volumes, totalmente descompromissada com toda preocupação decorativa.Suas telas, constituídas de grandes superfícies planas luminosas que se ajustam e se incrustam umas nas outras, apesar dos inúmeros ângulos, demonstram uma suavidade que se aproxima da ternura. Basta contemplar uma delas para perceber tal envolvi-mento. O que sugere o trabalho deste pintor, nunca fácil, porem, evidente, é enfim, uma forte relação com o sonho colorido de sua terra.

Paris | Março de 1999 | Museu de Arte Moderna da Bahia | Galerie Einstein | Berlim

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Pintura Acrílica | 90x180cm | 1987

Díptico | Óleo e Acrílico sobre Tela | 120x160cm | 1987Coleção do Autor

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Gislain ClermontO passado nutre o presenteExposição que mostra, enfim, uma arte sul-americana original e muito contemporânea na sua estratégia.

Infelizmente, no Canadá onde moro, não se vêem jamais artistas do Brasil, por causa dos intercâmbios culturais subdesenvolvidos com a América Latina. É uma arte que tem o mesmo valor da que é feita neste momento em New York, ou ainda em Toronto ou Montreal.

O passado pré-histórico do Brasil soube inspirar (eu devia escrever nutrir) este artista que, todavia, utiliza formas/cores/composições modernas.

Comissário da Galeria de Arte da Universidade de Mocton | Montreal | 1991

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Aquarela | 1991 | Coleção Cláudio Córdula

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Tereza de Arruda

Em seus quarenta anos de carreira como artista plástico, Raul Córdula já se posicionou como um dos maiores defensores da estética geométrica, mas neste momento declara estar desinteressado pela continuidade formal. Raul Córdula é pintor por excelência e representante de uma das gerações mais produtivas do Brasil enraizada na tradição das décadas de 60 e 70, além de ser um grande propulsor da arte contemporânea no Nordeste brasileiro através de sua atuação em diversas instituições culturais.Raul tem como ponto de partida formas geométricas que vêm sendo exploradas nos últimos anos em todas as suas perspectivas, cores e agrupamentos. Versátil é o resulta-do artístico, proveniente das infinitas combinações possíveis e criadas pelo incansável artista.

A fonte de inspiração é o rico Nordeste brasileiro, onde o artista nasceu e apesar de al-gumas interrupções continua sendo o seu lar. Seu ateliê se encontra atualmente em um pedaço do Paraíso chamado Olinda, no estado de Pernambuco, cidade tombada como patrimônio histórico mundial e com muitos vestígios de sua herança colonial represen-tada pela arquitetura e vários ornamentos estéticos.

O hábitat sempre teve um papel muito importante na produção de Raul, tendo como ponto de partida grafites nos muros de sua cidade natal, Campina Grande, na Paraíba, que o levaram ao convívio tão intenso com a geometria. Os densos agrupamentos de triângulos, retângulos, círculos e demais formas utilizadas no decorrer de sua carreira têm se apresentado em um conjunto mais solto e informal no trabalho atual.

O suporte, tela ou papel, ressalta corpos distintos e autônomos. A geometria continua presente, porém suas formas rígidas surgem dissolvidas em campos coloridos que as demarcam e acentuam com relação à composição total. Ela é geralmente acompanha-da por um ou mais elementos, estes também oriundos do estudo atual do artista sobre as figuras de decoração de Pernambuco, provenientes de desenhos nas calçadas ou fa-chadas, testemunhos do período eclético nordestino. Esses símbolos com traços mais orgânicos são transpostos para a obra, claramente posicionados, formando um diálogo aberto com os demais componentes da tradição geométrica. O fundo, elemento de jun-ção do trabalho total é formado de largas pinceladas soltas que sugerem o confronto claro/escuro através da transparência e do movimento atingido. Cores precisas e fortes são utilizadas subtraídas diretamente de seu cotidiano, no qual o sol e seu brilho mar-cam presença diariamente.

Raul Córdula expôs em Berlim, na extinta Kunsthalle, no final da década de 80, em uma mostra coletiva resultante de um workshop, em São Paulo, com a participação de artis-tas brasileiros e alemães. Seu trabalho volta à cidade em uma exposição na Galeria Im Einstein, na Unter den Linden 42, e pode ser vista até 15 de outubro. As obras apresenta-das relatam um compêndio da paisagem urbana nordestina brasileira que formam um interessante contraponto com a nova pintura de Raul.

Chasqui Mensajero de Iberoamérica | periódico del Instituto IberoamericanoBerlin | Outubro 2000

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Serigrafia | Meia Folha | 1985 | Coleção do Autor

O Aspero e o Macio | Quache e Nanquim sobre Papel | 50x75cm | 2005 | Coleção do Autor

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Paulo Sérgio DuarteA dança da geometriaA pintura de Raul Córdula mantém, há algumas décadas, duas características muito claras e nada simples: o atavismo ao ofício de pintar, isto é, o amor pelo fazer artístico, muito forte nos artistas da comunidade do Nordeste do Brasil a que pertence - aqueles residentes em Olinda, Pernambuco - e a exploração do abstracionismo geométrico, res-ponsável, junto com as correntes construtivas, por conquistas de novos patamares na arte brasileira desde a segunda metade do século XX.

O encontro dessas características é complexo porque obrigou o artista, durante muito tempo, a ir contra a ideologia regionalista. Cultivado à esquerda e à direita, o regiona-lismo sofisticou-se e produziu experiências muito ricas em simbiose com recursos con-temporâneos típicos da sociedade industrial. Foi ainda responsável pela preservação de ricas manifestações da cultura popular que sem essa armadura tecida por intelectu-ais da classe média não teriam sido sequer detectadas. Sua monocórdica exclusividade dos valores locais é muito poderosa até hoje, e vista como uma espécie de antídoto ao deslumbramento diante da globalização. Mas, ao mesmo tempo, esse mesmo regiona-lismo serviu para promover surpreendentes mediocridades. Ao não temer dialogar com uma linguagem que ultrapassava as fronteiras culturais mais imediatas, Raul Córdula recusou uma arte temática a favor de uma pesquisa essencialmente moderna. Criou-se um paradoxo: num ambiente que explorava suas idiossincrasias de modo generalizado quem se individualizava e contrastava isolada era a pintura de Raul Córdula. Situação muito similar enfrentou o escultor Sérvulo Esmeraldo no Ceará.

Córdula pôde, assim, criar uma linguagem própria, numa situação descentrada. Fora do centro ao quadrado: distante dos grandes centros de produção – Rio de Janeiro e São Paulo – e distante do centro de gravidade da cultural local. Sua arte é na origem, lite-

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Série Galeria Einstein Belin Pitura em Papel | 2000 Coleção do Autor

ralmente, excêntrica. É claro, essa leitura pressupõe um recuo histórico a um Brasil que existe e que também não mais existe. Existe nos núcleos que ainda equacionam suas fórmulas dentro de estratégias de resistência cultural, muito fortes onde Córdula traba-lha, em Pernambuco, e também no Rio Grande do Sul. Não existe mais porque toda uma produção artística do Nordeste de hoje contribui para a arte contemporânea com visão crítica, muito talento e originalidade de modo afirmativo, sem se perder em dilemas políticos quanto à fidelidade ortodoxa a uma origem mítica. Mas no final dos anos 60 e até os anos 70, apesar de todo o movimento construtivista e pós-construtivo que se de-senrolou nos grandes centros do Sul, a escolha estética de Raul Córdula é uma escolha quase solitária na sua região. Mas não apenas pelo que ela apresenta como linguagem, busca da excelência, consciência cultural, mas, também, como postura ética. Não era fácil ser moderno num ambiente que estigmatizava a modernidade como uma espécie de adesão ao “estrangeiro”. Por isso, onde quer que, hoje, um observador se encontre diante das telas de Raul Córdula, dificilmente pode avaliar o formidável esforço de co-erência perseguido pelo artista obstinadamente durante as últimas quatro décadas.

Mas o que esse observador tem diante de si? Arrisco dizer que essa pintura construiu sua identidade a partir da dupla distância que ela mesma engendrou. Aquela do fol-clore. Mas, também, ficou longe de uma pintura “teórica” que muitas vezes nascia de postulados racionalistas ao extremo como os dos concretistas de São Paulo. Ganhou em lirismo, numa alegria que transparece no uso livre das pinceladas e numa paleta al-tiva, elevada mesmo, que dá as costas à melancolia. Ora, nada mais local, se quiserem, regional, que essas cores. É verdade que elas não estão presentes na natureza, mas na cultura popular, nas roupas das Folias de Reis, nos Caboclinhos, por exemplo. Portanto, a presença da cultura local pode se fazer de uma forma enviesada e inteligente e não somente através da simples adesão aos seus estereótipos. (Diga-se de passagem, nunca parei para pensar o por quê da presença de tantos tons tristes - sépias e amarronzados - que dominaram a paleta dos pintores de classe média dessa região do Nordeste durante tanto tempo. Não conseguiam perceber a fartura de cores e a jovialidade das fachadas das casas pobres, das vestimentas das festas humildes, das fantasias cultivadas pelo povo.)

Para mim, sempre foi um alívio e muito enriquecedor fruir as cores e o jogo de formas, explorando um conflito produtivo de oposições cromáticas, que sempre existem nas te-las de Raul Córdula. Elas conseguem reunir numa dinâmica muito ágil as cores e os triângulos – figura geométrica da preferência do artista – e essa velocidade não des-cansa: salta como um dançarino de frevo. Estão sempre rompendo os limites virtuais do desenho nos rápidos drippings e brincam com as cores vizinhas. Em cada tonali-dade, exploram passagens na direção das maiores densidades para as mais leves, da opacidade para a transparência, nunca ao contrário. Essa direção não pode ser apenas traduzida sob um prisma psicológico, porque essas telas, na sua extroversão lançam uma aposta para além delas e se traduzem num otimismo que não concilia com as visões apocalípticas da arte e da cultura. Raul Córdula, no seu trabalho, entra em con-sonância com o mundo naquilo que tem de melhor: a possibilidade de transforma-lo num acontecimento plástico vivo e alegre, trazendo na sua forma sofisticada o que, tal-vez, tenham aprendido olhando para fora de seu universo privado, mas que se encontra presente nas festas simples do povo que passam na porta da sua casa. Por isso essa pintura, que à primeira vista poderia ser feita em qualquer lugar, só poderia ser feita no Brasil, em Olinda, e por Raul Córdula.

Rio de Janeiro | 8 de agosto de 2000

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Aquarela | 30x40cm | 2000 | Coleção Galeria Einstein

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Olívia MindéloGeometria RecenteApesar de dialogar visualmente com movimentos que levaram a pintura na direção do abstracionismo geométrico, estas telas de Raul Córdula não buscam um fim em si mes-mas. Não são a expressão da arte pela arte, da forma pela forma, da autorreferência preconizada pelo ideal da “estética pura”.

Neste caso, é preciso ir além de códigos reproduzidos pela história da arte. Não há aqui um rompimento total da pintura com a “realidade”, ou seja, com a sua função repre-sentativa. Não raro, as composições monocromáticas do artista remetem a diversas referências de seu repertório visual. São alusões, muitas vezes, ao arsenal de uma rica memória imagética; de uma arquitetura afetiva, sobretudo.

Detalhes de platibandas das casas de interior, com adornos losangulares, por exemplo, são trazidos à cena pelo seu olhar geometrizado. O grafismo de um carro, visto pelo artista nas paredes de uma casa do Sertão do Ceará, nos anos 1980, ganha nova repre-sentação pelas mãos dele. São trabalhos recentes contaminados por questões antigas, como diz o pintor.

Entre trípticos e dípiticos, pinturas ganham volume e cores saltam aos olhos, camada a camada. É como se quisessem confirmar o título de “colorista” dado usualmente pela artista Amélia Couto a ele, seu marido. Explorando uma geometria figurativa, ele pa-rece querer buscar, outra vez, o princípio das coisas; o “grau zero” da pintura brasileira, usando a expressão de Paulo Sérgio Duarte, que Raul acompanhou em pesquisas sobre casas de interior.

Mas não há nem uma pretensão minimalista, tampouco um pacto de fidelidade com o “real”. Raul Córdula trafega entre as brechas e segue seu percurso sem querer saber de muitas distinções.

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Paisagem Urbana | “Composição de Varias Telas“ 120x270cm | Coleção do Autor

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Campina Grande, 1943 – artista visual curador e crítico de arte filiado às associações brasileira e internacional de críticos de arte – ABCA e AICA.

Exposições individuais e coletivas:

No Brasil:

Paraíba: João Pessoa – Galeria Gamela, Galeria Archidy Picado, Escritório de Arte da Paraíba, Espaço Cultural Energisa.Campina Grande Museu de Arte Assis ChateaubriandFestivais Universitários de Patos, Guarabira e Cajazeiras; Festivais de Cultura de Areia.Olinda: Oficina 154, Galeria Três Galeras, Oficina Guaianases de Gravura, Olinda Arte em Toda ParteRecife: Galeria Xiko Arte Interior, Galeria Belaurora, Galeria da Casa da Cultura de Per-nambuco, Galeria Rodrigues, Galeria Vicente do Rêgo Monteiro da Fundação Joaquim Nabuco, Galeria Artespaço, Galeria Officina, Galeria Pallon, Shopping Center Recife, Arte Plural Galeria, Galeria Janete Costa (2013), Instituto de Arte contemporânea da UFPE (2013).Maceió – Galeria Karandarche, Aliança Francesa, Museu de Arte da Universidade Fede-ral de Alagoas;Natal – Forte dos Reis Magos, Museu de Arte do Rio Grande do Norte.Fortaleza – Arte Galeria.Salvador – Museu de Arte da Bahia, Museu de Arte Moderna da Bahia – MAMBAHIA.Belo Horizonte – Museu da Pampulha, Galeria Gesto Gráfico.Tiradentes MG – Oficina de Gravura N.S. do Ó.Cataguases – Museu Chácara Dona Catarina.Rio de Janeiro – Galeria Verseau (1965), Galeria Sérgio Milliet – FUNARTE (1982), Museu de Arte do Rio – MAR (exposição Pernambuco Experimental – 2013/2014).São Paulo – Galeria de Arte Global, Galeria Britto Central, MASP, Instituto Tomie Oh-take – exposição “Anos 70, arte como questão”.Curitiba – Museu de Arte Contemporânea do Paraná.Caxias do Sul – Galeria do Clube Juvenil.

Cronologia de Atividades

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Foz do Iguaçu PR – Ecomuseu ITAIPU.Brasília ; Galeria Portofólio.Cuiabá – Museu de Arte Popular da Universidade Federal do Mato Grosso.Pará – Salão Arte Pará (artista convidado).

Exterior:

Paris – Espaço Cultural da Embaixada do Brasil, Galerie Le Cube, Club de Press, Galeria Eduardo.Marselha – Association Culturel Le Hors Là).Circuito 4B – Ortez, Monein, Lourdes, Tarbes, Onati, Sait Savin, Las Neves, Pau, La Gar-de, Bordeaux.Cagnes-Sur-Mer – 23º Festival National da la Peinture;Espanha – Circuito 4B, Saragoça e Viruela;Bruxelas, Porto, Lisboa, Lisboa;Chile Bienal de Valparaiso;Berlim – Staatliche Kunsthalle Berlin, Galerie Einstein;Argentina – Centro Cultural Nordeste – Universidad Nacional del Nordeste, Corrientes – Resistencia, Museu de Arte da UNNE – Província del Chaco.Prêmios:Salão de Arte das Festas Henriquinas - Biblioteca Pública da ParaíbaMenção Honrosa em Pintura 1961. Salão Municipal de Belo HorizontePrêmio de Desenho, 1964. Salão MineiroIsenção de Júri. Salão acional de Arte ModernaPrêmio de Desenho, 1966. Salão da Arte Jovem de Campinas – Medalha de Bronze, 1969.1º Salão de Arte Global de Pernambuco Prêmio MEC - Museu de Arte Contemporânea de Pernambuco, Olinda, 1974.2º Salão de Arte Global de Pernambuco 1º Prêmio - Viagem à Europa, Casa da Cultura de Pernambuco, Recife, 1975.Sala Especial do IV Salão Nacional de Artes Plásticas - A Presença das Regiões - Palácio Gustavo Capanema, Rio de Janeiro, 1981.XXXVI Salão de Artes Plásticas de Pernambuco - 1º Prêmio - Vicente do Rego Monteiro e Prêmio Secretaria de Cultura, Esporte e Turismo do Estado para omelhor conjunto de obras, 1982.Mensão Honrosa no Prêmio Estadual de Cultura da Paraíba (1994)Prêmio Gonzaga Duque destinado a sócio da Associação Brasileira de Críticos de Arte – ABCA por sua atuação em 2010Prêmio Sérgio Milliet, pela publicação da obra Utopia do Olhar, Fundarp, 2013

Cargos e Representações:

Diretor e chefe do ateliê de pintura do Setor de Artes Plásticas do Departamento Cultu-ral da UFBP (1963/65).Fundador da Associação Paraibana de Artistas Plásticos – APAP (1967).Diretor Fundador do Museu de Arte Assis Chateaubriand (Campina Grande, 1967).Diretor da Casa da Cultura de Pernambuco (1977/78).Coordenador do Núcleo de Arte Contemporânea – NAC/UFPB (1978/85).Cenógrafo de televisão (TV Globo, TV Tupi – Rio de Janeiro – TV Bandeirantes – São Paulo)Professor (aposentado) de História da Arte e Fundamentos da Linguagem Visual do Curso de Educação Artística do Departamento de Artes e professor de História da Arte e da Arquitetura do Curso de Arquitetura da Universidade Federal da Paraíba.Diretor artístico e diretor técnico da Oficina Guaianases de Gravura, (Olinda, 1982/84).Diretor de Desenvolvimento Artístico e Cultural da Fundação Espaço Cultural da Para-íba – FUNESC (1997/98).Membro da Comissão Nacional de Artes Plásticas da FUNARTE, (1986/88).Integra a Associação Brasileira de Críticos de Arte – ABCA e a Associação Internacional de Críticos de Arte – AICA.Participou, como observador da Rede Globo de Televisão, da 9ª Conferência Mundial de Artesanato realizada no México pelo Conselho Mundial de Artesanato (World Carft Council – WCC), ONG filiada à UNESCO na categoria A.Comissário brasileiro do Conselho Mundial de Artesanato (World Craft Council – WCC) – 1979 a 1985Curador do 3.º Salão de Arte Global de Pernambuco – O Artesanato e o Homem (Recife,

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1976).Coordenador da área temática do festival Arte do Povo, da Fundação Roberto Marinho – Centro de Convenções de PE, 1982.Integrante da Comissão Organizadora que criou o Museu de Arte Contemporânea da Paraíba – Fundação Espaço Cultural da Paraíba – FUNESC, 1997.Presidiu o Conselho Municipal de Cultura da Prefeitura da Cidade do Recife (2002 / 2004).Implantou no Brasil e presidiu entre 1992 a 1998 a Associação Cultural Le Hors Là para intercâmbio entre artistas de Marselha (França) e João Pessoa, Recife e Bahia.Membro fundador da ONG REDE Para a Movimentação de Artistas Visuais, de intercâm-bio com a Suíça.Coordenou a criação e implantação do Salão MAMBAHIA de Artes Plásticas.Integrou Comissões de Seleção e Premiação de diversos salões de arte no Brasil, como:Salão MAMBAHIA de Artes Plásticas – Salvador BA, em 1994, 1997 e 2006;Salão Paranaense de Artes Plásticas, Curitiba, em 2003;Salão dos Novos de Pernambuco do Museu de Arte contemporânea – MAC-Olinda (em mais de uma versão) (?);Salão Municipal de Artes Plásticas de João Pessoa – SAMAP;Salão Municipal de Artes Plásticas de Natal;Prêmio Pernambuco de Artes Plásticas – Novos Talentos MAC PE Olinda, 1999;Salão Pernambucano de Artes Plásticas 2000, Torre Malackoff, Recife;5a Bienal Internacional de Esculturas Del Chaco – Resistencia, Argentina, 2007;7ª e 10ª Bienais do Recôncavo – Cachoeira BA.Membro da Comissão Técnica do Prêmio Bunge de Pintura 2009.Membro da Comissão de Seleção das propostas de ocupação do espaço expositivo da Usina Cultura ENERGISA – João Pessoa, 2011Curadorias:

Curador Geral do Prêmio Pernambuco de Artes Plásticas - Novos Talentos, no Museu de Arte Contemporânea de Pernambuco, 1999.Curador Geral do Salão Pernambucano de Artes Plásticas 2000.Curador da 1ª Bienal Nacional de Desenho, do VIII Festival Nacional de Arte – FENART, da Fundação Espaço Cultural da Paraíba.Curador do segmento Arte Incomum da Semana de Artes Plásticas – SPA Tamarineira – Recife, 2005.Além de dezenas de textos críticos curatoriais, e apresentações de exposições, escreve-ram:Os Anos 60, aspectos das artes plásticas na Paraíba (edição FUNARTE, 1880, em parce-ria com Chico Pereira).ALMANAC – relatório do primeiro ano de atividade do NAC (edição Funarte, UFPB).Fragmentos (edição FUNESC).Caminhos de Pedra (edição URB-Recife, em parceria com Betânia Luna e Jane Pinheiro).Pernambuco Imortal III – CULTURA – 3 tablóides para o Jornal do Commercio sobre a história da arte moderna no Recife.Vários artigos no Jornal da ABCA – Associação Brasileira de Críticos de Arte.Luzes de Holanda – artigo para o livro “Relendo o Recife de Nassau, organizado por Jomard Muniz de Brito.Artigos para a coletânea da Coleção Papo de Artista editada pela FUNARTE, sobre o Núcleo de Arte Contemporânea da UFPB.Tereza Costa Rêgo – Edição Publukimagem, Olinda 2009Memórias do Olhar – João Pessoa 2009 – Edição Instituto Cultural Raul Córdula e Edi-tora Linha D’Água.Textos para as publicações “Primeira Pessoa”, “Segunda Pessoa” e “Terceira Pessoa”, publicações sobre artes visuais na Paraíba – João Pessoa, 2008 a 2010Revista Pessoa – João PessoaUtopia do Olhar – Edição Funcultura, Olinda, 2013.Ministrou oficinas de arte em João Pessoa PB (em várias oportunidades, em eventos oficiais e privados), Campina Grande PB (duas oficinas no Museu de Arte Assis Chate-aubriand), Salvador BA (como evento paralelo ao 1º Salão MAMBAHIA de Artes Plásti-cas), Foz do Iguaçu PR (Fundação Cultural do município), Antonina PR (12o.e 13o. Festi-vais de Inverno da UFPR), Natal RN e São Paulo e Bonito, PE.TSua obra pictórica é objeto de Tese de Mestrado defendida em 1992 na Escola de Belas Artes da UFRJ pela arquiteta Eleine Bourdette.

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Pintura Acrílica | 150x180cm | 1990Coleção Sinval de Itacarambi Leão

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