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DISSERTAÇÃO O “NOVO” DISCURSO HEGEMÔNICO DA (IN) SUSTENTABILIDADE DO CAPITALISMO VERDE: UMA ANÁLISE CRÍTICA. LUCIANA DO NASCIMENTO SIMIÃO ORIENTADORA: DRA. ANDRÉA LIMA DA SILVA Dissertação, apresentada ao Programa de Pós- graduação em Serviço Social- PPGSS /Mestrado da Universidade Federal do Rio Grande do Norte- UFRN, como requisito à obtenção da titulação de Mestre em Serviço Social, inserida na área Sociabilidade, Serviço Social e Política Social, linha de pesquisa Serviço Social, Trabalho e Questão Social. NATAL-RN 2014

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Page 1: O “NOVO” DISCURSO HEGEMÔNICO DA (IN) SUSTENTABILIDADE DO ... · Os últimos anos da minha vida tem se resumido a duas ... RESUMO No capitalismo contemporâneo a crise ambiental

DISSERTAÇÃO

O “NOVO” DISCURSO HEGEMÔNICO DA (IN) SUSTENTABILIDADE

DO CAPITALISMO VERDE: UMA ANÁLISE CRÍTICA.

LUCIANA DO NASCIMENTO SIMIÃO

ORIENTADORA: DRA. ANDRÉA LIMA DA SILVA

Dissertação, apresentada ao Programa de Pós-

graduação em Serviço Social- PPGSS /Mestrado da

Universidade Federal do Rio Grande do Norte-

UFRN, como requisito à obtenção da titulação de

Mestre em Serviço Social, inserida na área

Sociabilidade, Serviço Social e Política Social,

linha de pesquisa Serviço Social, Trabalho e

Questão Social.

NATAL-RN

2014

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Catalogação da Publicação na Fonte.

UFRN / Biblioteca Setorial do CCSA

Simião, Luciana do Nascimento.

O “novo” discurso hegemônico da (in) sustentabilidade do capitalismo verde:

uma análise crítica / Luciana do Nascimento Simião. - Natal, RN, 2014.

167 f.

Orientadora: Profa. Dra. Andrea Lima da Silva.

Dissertação (Mestrado em Serviço Social) - Universidade Federal do Rio

Grande do Norte. Centro de Ciências Sociais Aplicadas. Programa de Pós-

graduação em Serviço Social.

1. Serviço Social - Dissertação. 2. Bem estar ambiental - Dissertação. 3.

Desenvolvimento sustentável - Dissertação. 4. Capitalismo verde – Dissertação. I.

Silva, Andrea Lima da. II. Universidade Federal do Rio Grande do Norte. III.

Título.

RN/BS/CCSA CDU 364.68

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Dedico

À classe trabalhadora do mundo inteiro que em tempos difíceis

como esses não perdem a esperança por dias melhores e seguem

lutando por eles. À toda categoria dos trabalhadores bancários,

em especial, do Itaú Unibanco, que resistem e lutam diariamente

por melhorias nas relações de trabalho e pelo direito de garantir

as condições de sua reprodução social. Às populações

tradicionais. Aos movimentos Ecológicos e Sociais. À todas/os

as/os marxistas do Serviço Social brasileiro e áreas afins,

companheiras/os de luta que não perdem o horizonte socialista.

Estes que “movem montanhas” na luta pela superação da

exploração e opressão da sociabilidade burguesa e o fim da

destruição ambiental. Por fim, à natureza e sua generosidade

para com a raça humana.

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AGRADECIMENTOS

Os últimos anos da minha vida tem se resumido a duas coisas: ao fim de um ciclo e o

início de outro. A propósito disso, me sinto muito feliz e realizada. Penso que a partir de

agora, isso será uma constante.

Tenho tido a oportunidade de nesses ciclos conhecer, ter experiências e crescer com

pessoas maravilhosas. Porém, não me esqueço de quem fez parte de todos eles e para sempre

fará. A todas essas pessoas reconhecerei e darei aqui meus sinceros e humildes

agradecimentos.

A conclusão dessa pesquisa enfatiza a necessidade que temos uns dos outros. Aliás,

como somos dependentes uns dos outros! Aqui está presente a união da força de vários

braços e consciências, que de forma direta ou indireta contribuíram com a conclusão desse

trabalho.

Agradeço à minha mãe, Maria José, exemplo de ser humano, de mulher, na qual sinto

orgulho imenso e amor por tudo que ela representa na minha vida, meu pai (em memória),

meus irmãos Renata e Ricardo, companheiros de sempre, pelo aparato espiritual, emocional,

material, bem como, pelo amor, zelo, disponibilidade, generosamente ofertados a mim por

toda uma vida e que me possibilitaram chegar até aqui.

Em especial ao ser que veio ao mundo no período do mestrado e representou o maior

motivo de alegria da nossa família dos últimos tempos, meu sobrinho João Pedro. Dele “titia -

mamãe” (conforme ele me chama), madrinha e protetora. Ele que coloriu minha vida, trouxe

mais amor e esperança. Agradeço também ao esposo da minha irmã João Igor pelo apoio dos

últimos tempos. Estes sujeitos foram determinantes para esse momento da minha vida. Peço

desculpas pelas ausências e a dureza de alguns momentos com as quais tive que arcar para dar

movimento e vasão ao meu processo de pesquisa.

Às minhas tias maternas pela proteção e carinho, apoio, força e incentivo.

Aos meus primos e amigos, Gabriel, Rosangela, Marina e Márcia, pela amizade, amor

de sempre, alegria e festividade. As minhas amigas de infância, Dayanne e Thaise. À Daniel

que tem se revelado um grande amigo. À Carliane, João Victor e Polianna, amigos da escola,

de aventuras, da vida.

À Bruna Massud, amiga que conquistei na graduação, de profissão, de mestrado, da

vida. Esta com quem tenho compartilhado as angústias acadêmicas, as alegrias e as

confidências.

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À Abner Andrade, um grande amigo que não mede esforços.

Aos amigos que conquistei por ocasião do mestrado e que trouxeram alegria e mais

leveza nesses últimos dois anos da minha vida: Maria Clara, Marta Simone, Taise, Guilherme,

Jéssyka, Lidiane, Nilmar, Samuray e Jodeylson.

À minha orientadora Andréa Lima, essencial nesse processo de construção do trabalho

com um suporte que transcendeu a clássica relação professor – aluno. Agradeço pelo apoio

acadêmico, socialização do seu rico conhecimento temático, pelo companheirismo,

horizontalidade e a relação de carinho, respeito e amizade que criamos.

Às docentes que generosamente aceitaram ao nosso convite para avaliar o trabalho, em

meio a uma agenda conturbada. Em especial à docente Silvana Mara por acompanhar meu

processo desde a graduação, por todo carinho e incentivo de sempre.

À todos os docentes que até aqui fizeram parte da minha formação.

Ao Programa de Pós-graduação em Serviço Social- PPGSS da Universidade Federal

do Rio Grande do Norte- UFRN, vinculado ao Departamento de Serviço Social- DESSO e ao

seu corpo docente, pelo esforço para manutenção do Programa, atenção às demandas dos

discentes e compromisso com a qualidade na formação.

À Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN que subsidiou minha

formação e a continuação dela, bem como, à Pro Reitoria de Pós- Graduação. A existência de

Universidades Públicas, de ensino gratuito possibilita que estudantes como eu, filha de

trabalhadores de origem humilde, que teve sua formação escolar em Escola Pública, com

todos os problemas e que atravessou contextos adversos para alcançar o objetivo da formação

de 3º grau, possam continuar sonhando.

À sociedade, à classe trabalhadora.

Às companheiras da Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social -

ABEPSS da Gestão “Lutar quando é fácil ceder” com as quais uni forças para a defesa de uma

formação profissional de qualidade e demais bandeiras.

À todos os meus sinceros agradecimentos.

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Não resta mais do que o presente avassalador, o pragmatismo

globalizador. Não há projeção para o futuro fora das inércias

que agitam o mundo atual; não há alternativa nem opção;

não resta mais do que pedir misericórdia e justiça para

continuar sendo parte de um mundo que gravita fora da

história, movido pela insensatez econômica (LEFF, 2001,

p.35).

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RESUMO

No capitalismo contemporâneo a crise ambiental evidenciada pela profunda instabilidade da natureza

que hora nos deparamos, tem sido alvo de debates que mobilizam amplos setores da sociedade em

torno do desenvolvimento de estratégias para o seu enfrentamento, formando um movimento

heterogêneo e multisetorial. É acima de tudo um movimento classista, posto que, as escolhas de

avaliação do conflito ambiental redundam à própria posição de classe dos indivíduos. Por conseguinte,

os interesses em conflito dessas classes. Entretanto, os problemas ambientais são alvos de discussões

desde a década de 1970 no panorama mundial, quando cientistas e movimentos ecológicos

denunciaram os impactos ambientais da produção nos moldes do capitalismo. Vimos se desdobrar daí

conceitos oficiais sobre as concepções de desenvolvimento que passaram a incorporar as questões

ambiental e social. Dando origem, por exemplo, ao conceito de Desenvolvimento Sustentável. Do

desenvolvimento Sustentável à Economia Verde – conceito último que enfatiza o papel da economia

para o enfrentamento da crise ambiental – as elites foram se colocando como a vanguarda para

solucionar a problemática ambiental. Sem romper com os fundamentos estruturais do capital, os

debates versam sobre a possibilidade de alinhamento das relações de reprodução do capitalismo com

desenvolvimento sustentável. Em verdade, assistimos a um processo de mercantilização da natureza

travestido de um discurso ideológico falacioso de inversão de valores do capital, de “ecologização”.

Todavia, é sabido que o modo de produção capitalista transformou natureza e trabalho em

mercadorias. A lógica produtivista do capital historicamente engendrou processos produtivos

destrutivos para essas duas dimensões. De posse de todo conhecimento crítico acumulado sobre o

capital, nossa pesquisa se propõe a problematizar as perspectivas ideopolíticas e econômicas

obscurecidas no novo discurso hegemônico do “Capitalismo Verde” a partir das contradições

históricas e concretas desse sistema. O Objetivo Geral do nosso trabalho é o de: “Analisar o

“capitalismo verde” em suas dimensões sociopolítica, econômica e ideológica de maneira articulada

situadas na realidade do Brasil”. Temos como objetivos específicos, respectivamente: problematizar a

deterioração ambiental e as relações sociais do capitalismo; identificar o papel do Estado na relação

com o capitalismo verde; analisar a contradição entre o discurso de compromisso com o

desenvolvimento sustentável da empresa delimitada e suas relações de trabalho. Elegemos o Itaú

Unibanco, grande empresa do setor financeiro brasileiro, reconhecida nacionalmente e

internacionalmente que anuncia agregar à sua filosofia de gestão empresarial o comprometimento e a

perspectiva de tornar-se líder em Performance Sustentável, com Responsabilidade Corporativa e

Social, concomitante engendra relações de trabalho precarizadas, tendo sua lucratividade associada

não somente aos produtos e serviços que lhes sustentam, mas e sobretudo, a uma política de corte de

custos relativos ao trabalho. Nosso propósito é partir da realidade concreta onde se materializam as

estratégias para manutenção do status quo, para identificar as contradições do “Capitalismo Verde”.

Nossa pesquisa é quanti-qualitativa. Isso porque teórico-metodologicamente recorre a um arsenal de

dados em documentos e na produção literária, especificamente de textos afinados com a perspectiva

marxista, do campo do Serviço Social Brasileiro e áreas afins, bem como, a pesquisas quantitativas de

órgãos voltados a este fim, para fundamentação da análise. Confrontamos as denúncias da classe

trabalhadora organizada vinculada ao Itaú Unibanco com a visão institucional sobre o que denominam

de “Performance Sustentável”. Partimos de pesquisas e publicações de iniciativa Confederação dos

Trabalhadores do Ramo Financeiro – CONTRAF, em associação com o DIEESE e a Central Única

dos Trabalhadores. Assim como, analisamos o Relatório Anual Consolidado 2013 do Itaú Unibanco.

Nossa hipótese é de que o capital é incompatível com relações sustentáveis. Nossa pesquisa está

vinculada a grande área: Sociabilidade, Serviço Social e Politica Social; e a linha de pesquisa “Serviço

Social, Trabalho e Questão Social.

PALAVRAS-CHAVE: CAPITALISMO VERDE, ESTADO, ECOSSOCIALISMO, ITAÚ

UNIBANCO.

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ABSTRACT

In contemporary capitalism the environmental crisis evidenced by profound instability of

nature that time we encounter has been the subject of debates that mobilize broad sectors of

society around the development of strategies for solving them, forming a heterogeneous and

multi-sectoral movement. It is above all a class movement, since the assessment of choices of

environmental conflict redound to their own class position of individuals. Therefore, the

competing interests of those classes. However, environmental problems are targets of

discussions since the 1970s on the world stage when scientists and ecological movements

denounced the environmental impacts of production in capitalism molds. We saw unfold there

official concepts of the development of concepts that began to incorporate environmental and

social issues. Giving rise, for example, the concept of Sustainable Development. Sustainable

development to the Green Economy - last concept that emphasizes the role of the economy to

cope with the environmental crisis - the elites were posing as the vanguard to solve

environmental problems. Without breaking with the structural foundations of the capital, the

debates concern the possibility of alignment of capitalist reproduction of relations with

sustainable development. In fact, we have seen a nature commodification process disguised as

a fallacious ideological discourse inversion capital values of "greening". However, it is known

that the capitalist mode of production has transformed nature and work in goods. The

productivist logic of capital historically engendered destructive processes for these two

dimensions. In possession of all accumulated critical knowledge on capital, our research aims

to question the ideopolíticas and economic outlook darkened in the new hegemonic discourse

of "Green Capitalism" from historical and practical contradictions of the system. The general

objective of our work is to "analyze" green capitalism "in its socio-political, economic and

ideological dimensions of articulated located in Brazil's reality." We have specific objectives,

respectively, discuss the environmental deterioration and social relations of capitalism;

identify the role of the state in relation to green capitalism; analyze the contradiction between

the commitment to sustainable development discourse with the defined company and its labor

relations. Elected Itaú Unibanco, great company in the Brazilian financial sector, recognized

nationally and internationally announcing add to its philosophy of business management

commitment and the prospect of becoming a leader in Sustainable Performance, Corporate

Responsibility and Social concomitant engenders labor relations precarious, and its

profitability associated not only to products and services that support them, but above all, a

cutting political costs for the work. Our purpose is from the concrete reality where materialize

strategies for maintaining the status quo, to identify the contradictions of "Green Capitalism".

Our research is quantitative and qualitative. This is because theoretically and

methodologically uses an arsenal of data in documents and literary production, specifically

tuned texts with the Marxist perspective, the Brazilian Social Service of the field and related

fields, as well as the quantitative research bodies aimed at this purpose, to substantiate the

analysis. Confront the allegations of the organized working class linked to the Itaú Unibanco

with the institutional vision of what they call "Sustainable Performance". We start research

and publications Confederation initiative of Financial sector workers - CONTRAF, in

association with the DIEESE and the Central Workers. As we analyze the Consolidated

Annual Report 2013 Itaú Unibanco. Our hypothesis is that capital is incompatible with

sustainable relationships. Our research is linked to the penalty area: Sociability, Social Work

and Social Policy; and the line of research "Social Service, Labour and Social Issues.

KEYWORDS: CAPITALISM GREEN, STATE, ECOSOCIALISM, ITAÚ UNIBANCO.

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

GRÁFICO 1. Desmatamento da Amazônia..........................................................................................102

QUADRO 1. Área Total desmatada da Amazônia...............................................................................104

FIGURA 1. Mapa de Sustentabilidade do Banco Itaú do Relatório Anual Consolidado

2013......................................................................................................................................................120

QUADRO 2. Aspectos Gerais da Organização do Trabalho nas Agências do Banco Itaú..................143

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LISTA DE SIGLAS

ABEPSS- Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social

BIRD- Banco Internacional para reconstrução e o desenvolvimento

BNDES- Banco Nacional do Desenvolvimento

BNDES- Banco Nacional do Desenvolvimento.

BOVESPA- Bolsa de Valores de São Paulo

CAF- Corporação Andina de Fomento

CAGED – Cadastro Geral de Empregados e Desempregados

CCSCS- Comitê de Finanças da Coordenadora das Centrais Sindicais do Cone Sul

CFESS- Conselho Federal de Serviço Social

CNUMAD- Conferência das Nações Unidas sobre o meio ambiente e o desenvolvimento

COES- Comissões de Organização dos Empregados

CONAR- Conselho Nacional de Autorregulação Publicitária

CONTRAF – Confederação dos Trabalhadores do Ramo Financeiro

CPD - Centros de Processamentos de Dados

CRESS- Conselho Regional de Serviço Social

CUT- Central Única dos Trabalhadores

DIEESE - Departamento Intersindical de Estatística e Estudos socioeconômicos

ENESSO- Executiva Nacional dos Estudantes de Serviço Social.

FAO- Organização das Nações Unidas para a agricultura e alimentação

FIES- Fundo Itaú Excelência Social

FMI- Fundo Monetário Internacional

GIFE- Grupo de Institutos Fundações e Empresas

IBGE- Instituto Brasileiro de Geografia e Estatistica

IIRSA- Iniciativa para a Integração da infra-estrutura Regional Sul-Americana

INCRA- Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária

ISE- Índice de Sustentabilidade Empresarial

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NYSE- New York Stock Exchange

ONG’s- Organizações Não-Governamentais

ONU- Organização das Nações Unidas

PNUMA- Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente

RSE- Responsabilidade Social Empresarial

TFT- Taxa de Fecundidade Total

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SUMÁRIO

1.INTRODUÇÃO..................................................................................................................13

2.FUNDAMENTOS HISTÓRICOS DA CRISE AMBIENTAL CONTEMPORÂNEA:

UMA ANÁLISE CRÍTICA DO DISCURSO IDEOLÓGICO DO “CAPITALISMO

VERDE”.................................................................................................................................27

2.1 A dimensão estrutural da crise ambiental no capital.......................................................................28

2.2 O debate ambiental e as contradições históricas.............................................................................45

2.3 Economia Verde: o novo discurso hegemônico e ideológico do capital........................................61

3. DA POLÍTICA DO ESTADO BRASILEIRO CONTEMPORÂNEO DE

DESENVOLVIMENTO SUBORDINADO, A INSUSTENTABILIDADE

SOCIOAMBIENTAL......................................................................................................75 3.1 A relação histórica do Estado e o Capital, breve resgate

histórico.................................................................................................................................................76

3.2 A contribuição do Estado brasileiro contemporâneo para insustentabilidade socioambiental nas

cidades e no campo...............................................................................................................................98

3.3.Crise ambiental e o ecossocialismo: “a alternativa às alternativas das elites do capital”.............106

4.“A RESPONSABILIDADE SOCIOAMBIENTAL NAS EMPRESAS: O CASO DO

ITAÚ UNIBANCO........................................................,.......................................................114

4.1 As “ecomudanças” do Itaú Unibanco, um retrato do novo discurso ideológico do capital: do “Eco”

que convém, a mercantilização e a financeirização da natureza..........................................................119

4.2 A (in) sustentabilidade das relações de trabalho do Banco Itaú.....................................................132

4.3. Reestruturação produtiva e o desemprego no setor bancário, entre precarização das relações de

trabalho e o fantasma das demissões...................................................................................................147

5.CONCLUSÃO...................................................................................................................155

6.REFERÊNCIAS...............................................................................................................161

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1. INTRODUÇÃO

Num tempo histórico de profundas transformações na vida social, nosso trabalho se

debruça sobre a complexa análise da crise ambiental e das alternativas em discussão no Modo

de Produção Capitalista para seu enfrentamento, se situando no campo da reflexão crítica

dessa problemática.

As produções que outrora se dedicaram à investigação dessa problemática, numa

perspectiva de totalidade, enfatizaram a dimensão do controle do metabolismo social

pretendido pelo capital através do discurso de Desenvolvimento Sustentável, demonstraram as

evidências da questão ambiental, resgataram os fundamentos estruturais dessa sociabilidade e

sua relação com a natureza e o trabalho e/ou se esforçaram para contribuir com construção de

uma “alternativa às alternativas” do capital.

Partindo e considerando esse acúmulo essencial, nosso trabalho objetiva dar ênfase às

dimensões ideológica e sociopolítica do capital em relação à crise ambiental, investigando as

contradições inerentes à suposta inversão de valores do sistema, que recai sobre o discurso de

“Capitalismo Verde”1 – o novo discurso hegemônico do capital.

Portanto, nos desafiamos a analisar a falácia do discurso ideológico do capitalismo

contemporâneo do Desenvolvimento Sustentável e do recente conceito de “Economia Verde”,

perseguindo os fundamentos do entendimento do segmento empresarial brasileiro,

especificamente do Itaú Unibanco, sobre a questão, buscando confrontá-los com a realidade

concreta das práticas contraditórias que expressam o paradoxo desse movimento.

Ao interesse pelo estudo crítico da temática da “Questão socioambiental” no

capitalismo contemporâneo se associam uma série de determinações históricas. Remonta por

exemplo, meu processo de formação profissional em Serviço Social.

O Serviço Social brasileiro busca referências e direção ética, política, teórico-

metodológica e técnico-operativa na teoria marxista - que consiste em um campo vasto de

produções, reflexões, pesquisas, debates, experiências teórico- políticas e práticas, embasadas

na leitura crítica de sociedade do próprio Marx e/ou de intelectuais que se fundamentam em

suas análises, atualizando-as de acordo com os desafios do tempo histórico em que se

1 Termo que consideramos expressar a totalidade do movimento do capital na direção da criação do espectro

ideológico da preocupação com o enfretamento da crise ambiental.

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materializam – à defesa de um projeto societário e profissional cujo horizonte é a

emancipação humana.

No meu processo de formação acadêmico-profissional, a influência da perspectiva

marxista foi fundamental, porque além de influenciar na construção de uma leitura crítica da

realidade, foi decisiva na definição da direção do trabalho de conclusão do curso, como

também, para a escolha por estudos voltados à compreensão do capitalismo numa perspectiva

de totalidade que permitiram estabelecer a articulação necessária à compreensão da

problemática socioambiental com o projeto societário hegemônico.

O acúmulo teórico-crítico subsidiado por esse processo de formação acadêmico-

profissional no curso de Serviço Social da Universidade Federal do Rio Grande do Norte-

UFRN, associado a experiências de estágio, foram fundamentais na definição da “Questão

Socioambiental”, especificamente, da Sustentabilidade à luz do capital, enquanto objetode

pesquisa.

O referido estágio foi desenvolvido na Gerência Executiva de Responsabilidade Social

do SESI, uma instituição de direito privado sem fins lucrativos, que dentre diversas atividades

voltadas à indústria, é atuante na materialização dos indicadores empresariais de

sustentabilidade através de ações, programas e projetos, conforme o entendimento do setor,

para efetivação do novo compromisso “ético-humanista” empresarial, “inovador”.

O processo de construção do Trabalho de Conclusão de Curso- TCC, orientado,

intitulado: “A dimensão destrutiva do capital: elementos para contribuição à crítica do

conceito de sustentabilidade” (monografia2) nos permitiu analisar criticamente o conceito de

desenvolvimento sustentável.

Assim, o estudo realizado na construção do TCC teve a importância de fomentar ainda

mais esse interesse pela temática e o aprofundamento das análises. E é nesse sentido, que esta

pesquisa se configura num desdobramento de um processo de estudo já iniciado3.

Todavia, o percurso no Mestrado em Serviço Social no Programa de Pós- Graduação

em Serviço Social- PPGSS na Universidade Federal do Rio Grande do Norte, foi essencial

para o aprofundamento da leitura sobre a crise ambiental. O projeto de pesquisa passou por

transformações importantes, agregando à discussão novas determinações que resultou na

reorganização e redefinição dos próprios objetivos do trabalho e das escolhas teórico-

2 TCC concluído em 2011.2 Sob orientação da docente Ms. Tássia R.M. Santos, professora do Departamento de

Serviço Social da UFRN. 3 Esta pesquisa está inserida na grande área: Sociabilidade, Serviço social e Política social/ Linha de pesquisa:

Serviço Social, Trabalho e Questão Social.

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metodológicas a serem adotadas na presente pesquisa. Nesse sentido, nossa pesquisa em sua

totalidade foi antes de tudo, uma construção coletiva.

Dentre as produções críticas marxistas, que elegem como objeto de estudo o Modo de

Produção Capitalista4, a fim de melhor compreender a formação das sociedades dentro da sua

lógica e seus efeitos para as relações dos homens entre si e com a natureza é consenso que

esse modo de organização das relações de produção fez imperar desde seu devir um projeto de

sociedade destrutivo e explorador. Estas últimas dimensões sendo inseparáveis e constitutivas

do capital.

Dessa forma, ao nos depararmos com uma conjuntura global de crise contemporânea

do capital, cujas refrações são sentidas em todos os espaços da vida sendo a crise ambiental

dela uma expressão, é fundamental considerar a trajetória desse sistema que criou uma

relação social e histórica com o trabalho e a natureza, marcada pela subsunção de ambos ao

mercado e sua transformação em mercadoria, para suprir a avidez de uma classe específica

por geração de riqueza abstrata, garantida pela produção massiva de mercadorias e

apropriação privada dos frutos do trabalho (mais-valia). Em poucos termos, pela máxima

exploração do homem sobre o homem e da natureza, de uma forma sempre destrutiva.

Um processo em que, dada a separação operada pelo capital, do trabalho em relação

aos meios de produção, determina a forma de pertencimento dos sujeitos constituindo uma

sociedade de classes, também a própria consciência e os interesses que a partir daí tornam-se

conflitantes por serem distintos. Assim sendo, as lutas são provocadas por suas contradições.

Aqui, a ideologia, cumpri um papel fundamental, principalmente quando se percebe que nesse

modo de produção, quando a violência não ocorre de forma bárbara, o consentimento é

fundamental, logo sua função é a de garanti-lo, na direção da perpetuação da lógica e dos

interesses da burguesia – classe que é poder dominante e detém as condições materiais de

fazer imperar suas ideais, tornando-as igualmente dominantes- de alienação e de consenso

entre as classes constituídas a partir dessa relação social.

No capitalismo contemporâneo a “questão socioambiental” apresenta-se como

problemática da humanidade, cujo enfrentamento tem mobilizado diversos setores da

4 “Toda sociedade é moldada pela forma como organiza a produção e a distribuição das necessidades básicas da

vida. O capitalismo é um sistema no qual praticamente todos os bens e serviços são produzidos para e obtidos

através do mercado. Outras sociedades tiveram mercados, mas somente no capitalismo a dependência do

mercado é uma condição fundamental da vida. Este modo único de organizar a vida material tem uma história

relativamente curta, tendo emergido no campo inglês no século XVI ou XVII, embora a palavra “capitalismo” só

tenha aparecido muito mais tarde; o sistema só se tornou industrialmente maduro no século XIX (WOOD:2003,

p.38)”.

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sociedade, configurando um movimento multissetorial, antagônico, dialético e de grande

complexidade analítica. Embora o problema ecológico seja antigo.

Na verdade, o problema da ecologia real há algum tempo, ainda que

evidentemente, por razões inerentes à necessidade do crescimento capitalista,

poucos tenham dado alguma atenção a ele. Marx, entretanto [...] abordou essa

questão dentro das dimensões de seu verdadeiro significado socioeconômico,

e isto há mais de 125 anos (MÉSZAROS, 2009, p.52).

Nesse momento histórico de profunda crise social, ecológica e econômica são

inúmeros os debates sobre os desafios e “possibilidades de enfrentamento real” de tais

problemáticas, com participação de diferentes sujeitos, que representam interesses e posições

distintas, divergentes e/ou convergentes e que versam sobre o futuro da humanidade frente à

escala de produção e consumo global atual e aos sinais evidentes de esgotamento dos recursos

renováveis e não renováveis da natureza.

Nessa diversidade de sujeitos e posições, muitas vezes as leituras da crise ambiental

não contemplam uma visão de totalidade da questão, recaindo em análises que tendem a

transferir a responsabilidade por sua superação à adoção de posturas individuais voltadas a

este fim5, à própria humanidade de forma generalista e não estabelecem a relação necessária

com as determinações históricas do capital e sua dinâmica destrutiva. Além delas, de análises

que buscam soluções para crise ambiental reforçando a dinâmica do capital, que não

transcendem os limites dessa sociabilidade.

Acerca disso referendamos a sensível reflexão de Mészaros (2009):

Afirmar que os custos da despoluição de nosso meio ambiente devem ser

cobertos, em última análise, pela comunidade é ao mesmo tempo um óbvio

lugar- comum e um subterfúgio típico, ainda que os políticos que pregam

sermões sobre essa questão acreditem haver descoberto a pedra filosofal.

Obviamente, é sempre a comunidade dos produtores que cobre os custos de

tudo. Mas o fato de dever sempre arcar com os custos não implica de modo

algum que sempre o possa fazer. Certamente, dado o modo predominante de

controle social alienado, podemos estar certos de que a comunidade não será

capaz de arcar com tais custos (p.53)

Daí decorre nossa necessidade em fazer da nossa pesquisa um instrumento de crítica,

recorrendo às análises que conseguem captar as múltiplas determinações da problemática

5 Tais análises enfatizam a importância da educação ambiental como estratégia à adoção de comportamentos

sustentáveis, na perspectiva da conscientização dos indivíduos da responsabilidade que tem no enfrentamento da

crise ambiental. Daí decorre as iniciativas que influenciam a separação do lixo orgânico, inorgânico e

tecnológico em atividades cotidianas; que ensinam a não depositar lixo na natureza e ambientes públicos fora

dos locais apropriados dentre outras. Associado a isso, essas análises dão centralidade à reciclagem para redução

dos riscos ambientais. Adicionalmente, ao poder local. No entanto, relegam quase que ao esquecimento o peso

do modo de produção capitalista e seu produtivismo destrutivo para o acirramento da crise ambiental. Não

dizemos com isso que essas ações não sejam importantes. No entanto, não dão conta de compreender a totalidade

das determinações da crise ambiental e não oferecem saídas concretas a sua superação. Demonstram antes de

tudo, análises apressas, acríticas e pouco historicizadas da problemática.

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ambiental no capital, a fim de contribuir para que o “nosso grito ecoe” e possa oferecer uma

perspectiva de avaliação do conflito ambiental numa direção radicalmente oposta à

perspectiva hegemônica.

Difunde-se, estrategicamente, no capitalismo contemporâneo, uma ideia de

compromisso ambiental, de possibilidade de alcance de um “Capitalismo Verde”, que

contraria a essência destrutiva desse sistema. Um processo que se iniciou no período Pós

Guerras Mundiais, especificamente a partir da década de 1970, partindo dos países

considerados centrais aos periféricos - na lógica do capital.

O chamado Desenvolvimento Sustentável que surge como conceito a ser perseguido

pelo mercado e os Estados-nação, a partir de um processo de discussões políticas e

econômicas na história e que evoca o discurso de um desenvolvimento que considere a tríade

setor econômico, ambiental e social. Nesse sentido, são postas iniciativas técnicas para

oferecer “solução” à crise ambiental.

No ambiente empresarial, a partir da década de 1990, vimos se desdobrar uma ação

social/filantrópica, que incorporou bandeiras dos movimentos sociais e ecológicos para

indicar um suposto “novo jeito de fazer” que rompe com as antigas formas de filantropia,

através do que se convencionou chamar, investimento social privado, onde incorporam às

suas práticas os princípios da Responsabilidade Social e Corporativa.

Perfila-se um projeto empresarial pautado na ideologia do “capitalismo verde”, em que

o mercado assume um compromisso socioambiental, que não prioriza tão somente a

lucratividade em detrimento do “desenvolvimento social e a preservação do meio ambiente”.

Nesse projeto, as empresas afirmam desdobrar “esforços” para inserir às suas práticas,

ações que lhes concedam o reconhecimento de agentes de transformação social e referências

em desempenho sustentável. Esses seriam os fundamentos gerais do discurso de

Responsabilidade Social e Corporativa, afinadas com os princípios oficiais de

Desenvolvimento Sustentável vigentes no capital.

Entretanto, o Desenvolvimento Sustentável enquanto conceito hegemônico se revela

eivado por intenções políticas, cujo plano de fundo são estratégias de controle do

metabolismo social e a manutenção de um modelo econômico-produtivo insustentável, que

tem grande responsabilidade histórica pelo acirramento das problemáticas ambientais,

econômicas e sociais6.

6 No cerne desse debate, a influência de parcela considerável do segmento empresarial mundial - cuja origem

participativa data da década de 1990 no panorama do ambientalismo mundial-; das Organizações Multilaterais

que fomentam, regulamentam/padronizam e fiscalizam quanto à institucionalização, legalização e materialização

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Atentamos para o conflito de interesses entre as classes no capitalismo. Considerá-lo

significa identificar as direções e perspectivas antagônicas e compromissos opostos dos

sujeitos políticos que vem protagonizando os debates, no processo de discussão para o

enfrentamento das crises ambiental e social.

Há perspectivas distintas, no que tange aos fundamentos do conceito do

desenvolvimento sustentável. Isto porque, para o capitalismo, sustentabilidade representa

manutenção, para a classe trabalhadora (atenta a sua dinâmica) representa ruptura.

Discute-se uma forma de Desenvolvimento Sustentável no capital que se revele em

“esforços” de considerar e acompanhar as necessidades das sociedades do tempo presente,

sem supostamente comprometer a natureza e seus recursos, inclusive preservando-a para

gerações futuras.

Nessa direção, entra em debate a necessidade de participação mais efetiva dos Estados

e dos setores produtivos para contribuição com o desenvolvimento sustentável. É nesse

contexto que entra em cena a chamada “Economia Verde”7, que confere à economia a

capacidade de articulação de processos econômico-produtivos da sociedade e de todas

atividades que dele derivam, com os esforços ao alcance do desenvolvimento sustentável, pela

perspectiva do livre mercado 8. Assim o debate do Desenvolvimento Sustentável no âmbito

empresarial tornou-se massificado.

Estas práticas chegam até nós em forma de propagandas das empresas que

estrategicamente aderiram ao discurso, no sentido de indicar um “compromisso ético” com a

natureza, a Terra e a humanidade. O que ocorre por meio de anúncios de ações e projetos

empreendidos pelas empresas, que perpassa desde os seus processos produtivos até políticas

de cunho socioambiental, com investimento privado, que contam com a parceria e

financiamento de bancos - podendo ser inclusive de sua iniciativa- e com incentivos estatais.

Nesse processo de Marketing empresarial a exaltação de “selos verdes”, premiações e

propagandas dos padrões de qualidade na prestação dos serviços e mercadorias são uma

constante, de que são exemplos: o selo de “Empresa Amiga do Meio Ambiente”; os informes

dos acordos internacionais, acompanham politicamente à implementação das agendas nos países e organizam

megaeventos com fins políticos/organizativos que tem sido responsáveis pelo estabelecimento de grandes

acordos internacionais e agendas de estratégias de preservação ambiental à luz projeto societário vigente; dos

Estados; e da sociedade civil como um todo articulado; e a cadeia de interesses e posições antagônicas no que

tange a sustentabilidade; dá forma a um movimento multissetorial de grande complexidade de análise, donde as

primeiras preocupações ambientais emergiram na década de 1960.

7

Conceito debatido na Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável (CNUDS),

conhecida como Rio+20, realizada no Rio de Janeiro, em junho de 2012. 8 Pretendemos no decorrer da pesquisa aprofundar tal conceito nas análises.

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que vem nas embalagens apontando as empresas como parceiras na transformação

socioambiental por alinhar suas práticas a pelo menos um dos Objetivos do Milênio da OMC;

propagandas de produtos “verdes”; valorização da preservação de reservas, parques e áreas de

preservação ambiental; a incorporação de tecnologias limpas nos processos produtivos;

projetos na área social desde a assistência as famílias de classe subalterna, à formação

técnico-profissional e ensino de base; projetos de reciclagem e educação ambiental,

direcionadas à comunidade, etc. Algumas premiações consideram a análise da implantação

das normas da ISO9 pelas empresas, as principais delas são as IS0’s 9000/9001 que tratam da

Gestão da Qualidade.

As empresas são reconhecidas por praticarem ações “sustentáveis” de pequeno, médio

ou grande porte nas atividades econômico-produtivas. Oportunizadas por esse

reconhecimento empresarial, escoam propagandas que incitam o consumo dos seus produtos,

pautadas pelo discurso de amizade com o meio ambiente, as crianças, a sociedade e de

solidariedade e compromisso ético com a (re) construção de um “mundo melhor, sustentável”.

Vê-se, portanto, que o “compromisso ético-social e ambiental” empresarial não se desvencilha

da perspectiva do “lucro a qualquer custo”.

Em verdade, essas ações tentam obscurecer as relações predatórias das empresas com

a natureza, a expropriação e exploração da classe trabalhadora na relação capital x trabalho

que de fato ocorrem. As empresas perseguem com essas práticas a construção de uma boa

imagem social, incentivos fiscais, anistia de crimes ambientais constantemente cometidos e

legalmente amparados. E, principalmente, alta lucratividade.

Adicionalmente, temos parcela considerável da comunidade científica comprometida

com os interesses do mercado, preocupada em desenvolver tecnologias que fomentem o

processo de acumulação capitalista em detrimento de projetos para a classe trabalhadora e

para a proposta de um meio ambiente coletivo. Nesse contexto, efetiva-se sob a regência do

sistema capitalista o inverso do que anunciam os conceitos de Desenvolvimento Sustentável e

Economia Verde.

Ao analisar as atividades produtivas contemporâneas confirmamos uma dinâmica

assentada na intensa destruição ambiental para suprir a avidez das elites por lucros10

.

9

A Organização Internacional para Padronização- ISO é uma organização cuja finalidade é instituir

padronização e normalização em 170 países, em que entre os tipos de classificação da ISO podemos citar:

Normas Técnicas (ex: ABNT), Classificações (BR/BRA), Normas de procedimento (Gestão da Qualidade- ISSO

9000). 10

Dentre as quais podemos mencionar: o mercado do agronegócio cujo cultivo produtivo é à base de pesticidas

tóxicos danosos à saúde humana e à biodiversidade; a produção de transgênicos; desmatamento em grande

escala, que se agrava com o processo de extração e comercialização ilegais de madeira, bem como, pelas

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O capitalismo hoje é dependente do petróleo11

como matriz energética, ou seja, da

economia marrom. Todos os “esforços” em direção da busca por alternativas ditas limpas

para substituí-lo, em verdade redundam às preocupações dos segmentos dominantes da

economia pela busca incessante por novas estratégias de sustentação do mercado numa

possível conjuntura em que o Petróleo não mais possa garanti-lo. Ademais, muitas das

alternativas pesquisadas tem se demonstrado ineficientes e incapazes de evitar a destruição do

meio ambiente, criando novos problemas ambientais, dividindo inclusive as opiniões de

estudiosos da questão. Acrescentamos que, em grande medida, essas ações tem acirrado o

processo de mercantilização da natureza, uma vez que, se cria um novo mercado, o do

“econegócio”12

.

Estamos diante de uma crise estrutural do capital, na qual se diferencia das demais

crises por não estar atrelada tão somente a superprodução como se configurou em outros

estágios nos seus ciclos econômico-produtivos. É uma crise de acumulação, estrutural.

Os processos reestruturação do capital e o reordenamento da economia engendrados

por essa crise, que tem se demonstrado longeva e intensa, influenciam na radicalização da

degradação do meio ambiente, bem como, no que se refere ao “mundo do trabalho”, em

formas de gestão que tendem ressignificar e aprofundar a exploração e alienação do trabalho.

Assim, conforme discute Mészaros (2009):

O fato de o capitalismo lidar dessa forma – ou seja, a seu modo – com a

ecologia não deveria provocar a mínima surpresa: seria quase um milagre se

não fosse assim. No entanto, a manipulação dessa questão em benefício do

“moderno Estado industrial” [...] não significa que podemos ignorá-la. O

problema não é suficientemente concreto, independentemente do uso que

dele se faça nos dias atuais (p. 51)).

E é nessa dimensão dialética e de totalidade que consideramos imprescindível a

reflexão crítica acerca da ideologia do “capitalismo verde”. É necessário realizarmos

pesquisas que desvelem os fundamentos reais dessa questão, para podermos travar,

qualitativamente, uma interlocução com todos os setores da sociedade e com intelectuais e as

queimadas para abertura de pastagens; lançamento de gases poluentes na atmosfera pesca ilegal; lançamento de

produtos químicos em rios por grandes empresas, indústrias, hotéis; poluição nos rios e mares por grandes

vazamentos de petróleo e outros combustíveis; lixões a céu aberto sem intervenção estatal; expropriação do

espaço citadino pelo mercado imobiliário que afeta as classes subalternas; além disso, do desmatamento

florestal; dentre outras graves questões.

11

O petróleo tem grande contribuição na poluição da atmosfera. Os gases de efeito estufa são originários dos

combustíveis fósseis derivados do petróleo e que estão presentes em quase todas as atividades produtivas e

mercadorias. 12

E o “econogócio” tem sido uma das grandes preocupações dos movimentos ecológicos que denunciam a

mercantilização da natureza, que passa a ser considerada como um “ativo” nos temos do capital financeiro,

através da “precificação” de espaços da natureza ricos em recursos para a produção de insumos.

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produções que ideologicamente o defendem, mas, escamoteiam os interesses hegemônicos de

mercado que lhe são inerentes.

Algumas inquietações foram fundamentais para a construção desse trabalho, que

partem do reconhecimento da dinâmica do capitalismo como um modo de produção que

estabelece relações que põem em xeque a capacidade da natureza de suportar seus padrões de

produção e consumo exacerbados que se sustentam na exploração histórica do trabalho,

concentração das riquezas e apartheid entre as classes, tendo a desigualdade social como um

traço constitutivo. Assim refletimos: Sustentabilidade para quem? Quais os verdadeiros

interesses que estão em questão? De que forma o discurso é utilizado para obscurecer

estratégias do capital? É possível solucionar a realidade de crise socioambiental, frente aos

padrões produtivos no capital?

No entanto, existem amplas pesquisas no âmbito da produção crítica que se

debruçaram sobre o desafio de oferecer respostas a esses questionamentos. Nas quais

consultamos à construção do nosso trabalho. Assim, tais inquietações não se configuram em

lacunas do conhecimento.

Entretanto, nosso olhar sobre o “Capitalismo Verde” tentou apreender em centralidade

a ideologia no novo discurso hegemônico do capital. Assim, nossos questionamentos

principais são: Quais as perspectivas ideológicas e políticas na disseminação empresarial do

discurso de sustentabilidade? Em que medida as crises ambientais tem se configurado em um

novo e lucrativo mercado? O que justifica o reconhecimento das empresas como sustentáveis?

De que forma o discurso ideológico de compromisso socioambiental é funcional ao

obscurecimento de práticas insustentáveis no âmbito empresarial?

Nossa pesquisa tem como Objetivo Geral “Analisar o “capitalismo verde” em suas

dimensões sociopolítica, econômica e ideológica de maneira articulada situadas na realidade

do Brasil”. Definimos para este fim como objetivos específicos, respectivamente:

problematizar a deterioração ambiental e as relações sociais do capitalismo; identificar o

papel do Estado na relação com o capitalismo verde; analisar a contradição entre o discurso de

compromisso com o desenvolvimento sustentável da empresa delimitada e suas relações de

trabalho.

Em nosso trabalho, problematizamos as contradições estruturais do capital a fim de

identificar os limites do “capitalismo verde” na efetivação do desenvolvimento sustentável

partindo da análise da realidade brasileira, tendo lócus de pesquisa o Itaú Unibanco. Como

critérios de elegibilidade, avaliamos: o porte da empresa, missão institucional, premiações e

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selos de responsabilidade social, marketing socioambiental e lucros, financiamento de

projetos, incentivo estatal, relações de trabalho.

O Itaú Unibanco é uma grande empresa do setor financeiro brasileiro (uma das

maiores do país) que recentemente estendeu suas atividades à América Latina, reconhecida no

cenário nacional e internacional tanto pela dimensão dos negócios, quanto pela “Performance

Sustentável”. Esta empresa do setor bancário/financeiro, assumiu um discurso de

compromisso com o Desenvolvimento Sustentável, paradoxalmente às relações que

estabelece com seus trabalhadores. Entretanto, a que se deve todo esse prestígio relativo à

Performance Sustentável do Itaú Unibanco?

Dentre os questionamentos principais que balizaram nossa análise sobre o Itaú

Unibanco, a fim de compreender como se expressam as contradições do capital no âmbito

empresarial no que se refere ao discurso de sustentabilidade “incorporado” mencionamos: Sob

qual prisma a sustentabilidade é concebida? Sustentabilidade para que(m)? O que poderia

justificar premiações e reconhecimento por práticas sustentáveis para uma empresa do sistema

financeiro? Qual concepção de sustentabilidade predominante? A considerada e premiada

Performance sustentável do Itaú Unibanco de fato reflete suas práticas?

Nosso trabalho consiste em uma pesquisa qualitativa que buscou referências em um

arsenal de dados em documentos e na produção literária do campo marxista do Serviço Social

brasileiro e de outras áreas do conhecimento, bem como, considerou outras fontes

secundárias, como pesquisas quantitativas de órgãos voltados a este fim, para fundamentação

da análise.

Entendemos que a pesquisa qualitativa responde a questões muito particulares,

corresponde à análise de questões que não podem ser quantificadas, pois desdobram

significados, motivos e aspirações, crenças, atitudes e valores, e ao aprofundamento do

entendimento e da percepção das relações e de processos como o objeto de estudo dessa

pesquisa, que apesar de ser concreto, e também poder ser analisado por intermédio de dados,

não se limita a uma questão de variáveis, é dotado de determinações complexas, interesses e

motivações que requerem mediações também densas e teoricamente embasadas

(MINAYO:1993).

Reunimos dados de pesquisas e publicações de iniciativa Confederação dos

Trabalhadores do Ramo Financeiro – CONTRAF, em associação com o DIEESE e a Central

Única dos Trabalhadores, para investigação das relações de trabalho do Itaú Unibanco, bem

como, do setor bancário de uma forma geral para análise do mundo do trabalho em tempos de

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crise financeira e o paradoxo do discurso sustentável das empresas. Estes foram fundamentais

para nossa análise13

.

Para reunir dados sobre a concepção institucional do Itaú Unibanco sobre o que

significa ser sustentável, analisamos o Relatório Anual Consolidado 2013. Ao confrontar

esses dados identificamos o paradoxo da “incorporação” a sustentabilidade no âmbito

empresarial.

Foi a partir da análise dos discursos e práticas dessa empresa que nos lançamos no

desafio de identificar as contradições históricas do capitalismo quanto ao enfrentamento da

crise ambiental. Analisamos a partir deles as estratégias do capital para superação de sua crise

e a falácia do discurso ideológico do “Capitalismo Verde”.

Ancoramos nossa análise, referenciando algumas das categorias da escola crítica

marxista que nos permitiram vislumbrar uma perspectiva radicalmente oposta à consideração

hegemônica que hora nos deparamos sobre a concepção de desenvolvimento, articulada pelo

capital, que prioriza a economia e reconhece nela mesma a vanguarda na construção de

soluções para o enfrentamento da crise ambiental.

Em nossa discussão, reiteramos a centralidade do trabalho como o fundamento da

sociedade capitalista, atividade essencial e inalienável para o conjunto das relações sociais.

Resgatamos o entendimento da relação social entre o capital e o trabalho, bem como, com a

natureza, discutida por Marx. Classes, consciência e ideologia, são algumas das categorias

que balizaram nosso olhar crítico sobre o “Capitalismo Verde”. Nesse sentido, recorremos ao

método de análise histórico-crítico e dialético.

Para Marx, aplicando o método dialético, todos os fenômenos econômicos ou

sociais, todas as chamadas leis da economia e da sociedade, são produto da

ação humana e, portanto, podem ser transformados por essa ação. Não são

leis eternas absolutas ou naturais. São leis que resultam da ação e da

interação, da produção e da reprodução da sociedade pelos indivíduos e,

portanto, podem ser transformadas pelos próprios indivíduos num processo

que pode ser, por exemplo, revolucionário (LOWY: 1985, p.15).

O método de investigação em Marx possibilita ao sujeito pesquisador a apreensão da

realidade numa perspectiva de totalidade, isto é, explorando as determinações complexas do

sistema social, partindo da análise de categorias centrais para construção da crítica da

Economia Política Capitalista, tais como: trabalho, modo de produção, capital, movimento

dialético das sociedades numa concepção materialista-histórica, que compreende o modo de

13

Sentimos aqui a cristalização das desigualdades entre as classes, quando da busca pelas fontes de pesquisa,

uma vez que, os textos do Itaú Unibanco, dadas as condições concretas, têm maior estrutura e perspectiva de

alcance. Entretanto, a classe trabalhadora “luta com as armas que tem” e que em nossa análise continuam sendo

fundamentais. São, aliás, base na nossa análise.

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se organizar a produção e a vida, partindo do modo como historicamente se responde as

necessidades sociais concretas, se organiza e divide o trabalho, os sentidos ontológicos do ser

social e do trabalho as contradições entre os interesses de classes, as causalidades e

condicionalidades das mesmas (AUGUSTO, 1999).

Nesse sentido, a categoria metodológica da totalidade implica na análise da realidade

social como um todo orgânico estruturado, na qual seu entendimento requer a análise do

conjunto das determinações de forma sempre articulada. Assim, à análise dos fundamentos do

poder ideológico do capitalismo verde, numa direção crítica, a perspectiva marxista é

fundamental e estratégica.

Sabemos que nosso problema de pesquisa está em constante transformação, não é

estático. Nesse sentido, estamos cientes da incapacidade da nossa pesquisa de saturar todas as

suas determinações. Tentamos, porém, nos limites da nossa apreensão oferecer chaves

heurísticas para sua compreensão.

A hipótese fundamental da dialética é de que não existe nada eterno, nada

fixo, nada absoluto. Não existem ideias, princípios, categorias, entidades

absolutas, estabelecidas de uma vez por todas. Tudo o que existe na vida

humana e social está em perpétua transformação, tudo é perecível, tudo está

sujeito ao fluxo da história (LOWY: 1985, p. 14).

Com esse entendimento seguimos as reflexões críticas embasadas por autores do

campo de pensamento crítico marxista e do Serviço Social brasileiro, na leitura das

contribuições destes que refletem a sociabilidade capitalista e suas problemáticas

socioambientais, apontando o socialismo e/ou o ecossocialismo como horizonte. O que em

nossa percepção é um pressuposto para desenvolver estudo dessa ordem.

No segundo capítulo resgatamos inicialmente discussões sobre os fundamentos do

capital para compreender a relação histórica desse sistema com a natureza e o trabalho a fim

de situar a crise ambiental como reflexo das suas determinações. Ou seja, discutimos a

dimensão estrutural dessa crise. Num segundo momento, ainda nesse capítulo, tratamos do

surgimento dos debates sobre os problemas ambientais no lastro histórico, a partir da década

de 1970 e tecemos algumas considerações das contradições dos conceitos formulados a partir

deles, consubstanciadas em autores referência na questão. Feito esse percurso histórico,

problematizamos a emergente “Economia Verde” como o novo discurso hegemônico

ideológico do capital para o enfrentamento da crise ambiental.

No terceiro capítulo, discutimos as particularidades da “questão socioambiental no

Brasil”. Resgatamos primeiramente as concepções e o papel do Estado no Capitalismo, em

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diferentes estágios, para compreender a lógica que impera ao Estado brasileiro na

contemporaneidade.

À compreensão do Estado brasileiro e a relação com o “capitalismo verde”

desdobramos nossa análise, com recorte histórico do século XXI como ponto de partida.

Investigamos o delineamento dos governos do PT e as implicações para a “questão

socioambiental” no país. O segundo momento consiste na análise dos impactos ambientais do

capitalismo no Brasil, remontando a década de 1960, quando do surgimento da Revolução

Verde e do discurso de progresso que o sustentou, como principal impulso para

reconfiguração do setor agrário brasileiro que teve forte contribuição para a destruição

ambiental. Por fim, tecemos considerações e afirmamos a perspectiva do ecossocialismo

como alternativa às alternativas do capital para o enfrentamento da crise ambiental.

No quarto e último capítulo apresentamos os dados relativos ao Itaú Unibanco onde

procuramos evidenciar as contradições entre discurso e prática dessa instituição no que tange

a sustentabilidade que afirma praticar, onde evidenciamos as efetivas relações de trabalho

insustentáveis de que é mantenedora. Sequencialmente, primeiramente, discutimos as

denuncias da categoria profissional organizada que tem vínculo empregatício com essa

instituição. No segundo momento, confrontamos esses dados com a visão institucional sobre o

que vem a ser sua suposta Performance Sustentável. Por fim, fazemos considerações gerais

sobre o desemprego no setor bancário brasileiro e discutimos os nexos com a conjuntura de

crise estrutural do capital com o desemprego estrutural.

Nossa perspectiva com a construção do capítulo quarto e as análises que nele tentamos

fazer, foi a de identificar que nossa denuncia de que o “capitalismo verde” representa o novo

discurso ideológico hegemônico, diz respeito a uma realidade concreta. Ou seja o

“capitalismo verde” representa para além de um paradoxo, uma falácia.

Por fim, afirmamos aqui importância de um estudo dessa ordem para o âmbito do

Serviço Social. O Serviço Social brasileiro, representado politicamente pelo conjunto

CFESS/CRESS, ABEPSS e ENESSO14

, coloca-se atento à dinâmica do modo de (re)

produção sociais na ordem do capital, seja lutando, fortalecendo os movimentos sociais, no

enfrentamento cotidiano, seja refletindo às problemáticas históricas do tempo presente e

comprometido com um projeto societário coletivo. Isto tem nos possibilitado compreender,

por exemplo:

14

CFESS- Conselho Federal de Serviço Social/ CRESS- Conselho Regional de Serviço Social/ ABEPSS-

Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social/ ENESSO- Executiva Nacional dos Estudantes de

Serviço Social.

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(...) o agravamento das múltiplas expressões da questão social, base sócio-histórica da

requisição social da profissão. A linguagem de exaltação do mercado e do consumo,

que se presencia na mídia e no governo, corre paralela ao processo de crescente

concentração de renda, de capital e de poder. Nos locais de trabalho, é possível atestar

o crescimento da demanda por serviços sociais, o aumento da seletividade no âmbito

das políticas sociais, a diminuição dos recursos, dos salários, a imposição de critérios

cada vez mais restritivos nas possibilidades da população ter acesso aos direitos

sociais, materializados em serviços sociais públicos (IAMAMOTO: 2008, p, 18).

Nosso olhar sobre a crise ambiental, a perspectiva que elegemos e a direção

anticapitalista que apontamos afinam-se com dimensão crítica e o compromisso social

historicamente assumido pelo Serviço Social brasileiro, considerando a ampla abrangência da

nossa formação e exercício profissional, o compromisso ético, político, teórico-metodológico,

que configuram o Projeto Ético-Político (PEP) dessa categoria, que a propósito é

regulamentado15

. No referido Projeto a liberdade é um valor ético central assumido e a defesa

por direitos da classe trabalhadora é o que orienta a prática, tendo sempre como horizonte

histórico à construção de uma sociedade justa, equitativa, e libertária.

Em suma, esperamos que esse trabalho possa contribuir para a formação de novas

consciências, livres das amarras ideológicas que legitimam a ordem vigente. Ao analisar as

determinações históricas da crise ambiental no capital assumimos, antes de tudo, um

compromisso político com a construção de outra forma de sociabilidade que rompa com os

condicionais de sua existência.

15

O Projeto Ético-Político dos Assistentes Sociais tem como representações legais o Código de Ética dos

Assistentes Sociais- 8662/93 e a Lei de Regulamentação da Profissão dos Assistentes Sociais 8.662/93/

Diretrizes curriculares para os cursos de Serviço Social.

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27

2. FUNDAMENTOS HISTÓRICOS DA CRISE AMBIENTAL CONTEMPORÂNEA:

UMA ANÁLISE CRÍTICA DO DISCURSO IDEOLÓGICO DO “CAPITALISMO

VERDE”.

Frente à profundidade da crise ambiental na contemporaneidade, vai se desenhando

um movimento heterogêneo de discussões de propostas para seu enfrentamento, com

abordagens e perspectivas distintas que remontam a posição das classes dos sujeitos que as

defendem e seus objetivos e que versam sobre a continuidade “moderada” ou a necessidade

de ruptura com os padrões econômicos – produtivos vigentes. Ao passo que nesse movimento

entram em disputa as soluções defendidas pelas elites dos diversos setores do capitalismo

mundial, Estados, organizações multilaterais, ONG’S, Academia (intelectuais orgânicos do

capital), com os Movimentos Ecológicos e Sociais e os intelectuais críticos.

Entretanto, tem sido hegemônica a defesa da concepção histórica da burguesia

mundial quanto à necessidade da articulação de estratégias para a configuração de uma

concepção de desenvolvimento atrelada à responsabilidade ambiental, que implica na

continuidade do sistema capitalista em moldes atuais, porém, com certo “controle” e

preocupação com os impactos ambientais e sociais dos setores produtivos e econômicos,

numa possível escologização do capital.

Esse movimento é permeado por contradições uma vez que o que se apreende é que

simultâneo a todos os debates que perfilam o “mercado verde” e difunde uma ideologia de

uma suposta inversão de valores do capital, ocorre latente processo de destruição da natureza,

com participação especial da ciência. Portanto, ao confrontar a análise da dinâmica estrutural

do sistema capitalista com as discussões de desenvolvimento sustentável e da Economia

Verde16

, nos deparamos com um grande paradoxo.

Ora, o capitalismo é um sistema que em sua centralidade visa à produção de

mercadorias potencializadas em seu valor de troca, donde a natureza e a força de trabalho

humano são apropriadas e exploradas para fins de acumulação. Logo, articula critérios de

avaliação do conflito ambiental que esbarram nele mesmo e em nossa visão, não são capazes

de oferecer soluções concretas, pois reforçam uma dinâmica destrutiva.

16

Conceitoconsolidado a partir da Conferência Rio + 20 e defendido no Relatório do Programa das Nações

Unidas para o Meio Ambiente –PNUMA, sobre o qual faremos análises no tópico terceiro deste capítulo.

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28

Conforme reflete Silva,

A dinâmica destrutiva do sistema se mantêm e se aprofunda a despeito

do avanço das discussões sobre a necessidade de

preservação/conservação dos bens naturais e dos investimentos

realizados neste campo, seja através da adoção de novas tecnologias,

da intensificação dos processos de educação ambiental ou mesmo da

incorporação de indicadores socioambientais nas atividades mercantis,

como expressão das iniciativas de integração de fatores econômicos,

ambientais e sociais nas estratégias de negócio das empresas (2010,

p.46).

Desse modo, a perspectiva do alcance do desenvolvimento sustentável nos evidencia

um subterfúgio do capital perante aos problemas que sua dinâmica estrutural fez emergir, uma

recorrência a um discurso ideológico falacioso de compromisso ambiental - consideradas suas

contradições históricas nas quais, daremos pistas ao longo desse capítulo das discussões

críticas já alavancadas, com nossas contribuições, no sentido de fundamentar nossa análise de

que, o Capitalismo Verde é pautado por um discurso ideológico que legitima o sistema do

capital.

Assim, nesse capítulo sequencialmente analisamos criticamente as particularidades

estruturais históricas da destrutiva relação do capitalismo com natureza e trabalho, os debates

ambientais e suas contradições e por fim, discutimos o discurso ideológico último da

Economia Verde.

2.1 A dimensão estrutural da crise ambiental no capital

Estabelecer a relação da crise ambiental contemporânea com o significado sócio –

histórico do capitalismo é fundamental. Se considerarmos a relação do homem com a natureza

na história da humanidade à satisfação das suas necessidades sociais, pelo trabalho,

constataremos que sob o domínio desse modo de produção, conseguiu-se degradar em

décadas o que as antigas civilizações não o fez em séculos.

Ora, a finalidade última da humanidade no capital nas sociedades moderna e

contemporânea tem sido a produção privada da riqueza, em que predomina os valores de troca

em detrimento dos valores de uso – aqueles intimamente relacionados com as necessidades

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genuínas humanas. O que segundo Mészaros (2009) no mundo antigo era consequência, na

modernidade tornou-se finalidade. Obviamente, que no passado havia pequenos grupos

monopolistas de comerciantes. Todavia é no mundo moderno, que a produção se estabelece

enquanto um objetivo da humanidade e a riqueza o objetivo da produção.

Necessário dizer que, são objetivos e traços inerentes ao capital, à produção de

mercadorias17

, a manutenção da propriedade privada dos meios de produção e a apropriação

do produto do trabalho social (mais-valia).

Marx, (1975) é categórico ao afirmar essas questões, como constitutivas do capital.

Em primeiro lugar, ele aponta que, em essência no capitalismo o grande vetor é a mercadoria

potenciada em seu valor de troca, ou seja, a mercadoria transformada em capital, haja vista o

retorno em lucros e acumulação (MARX, 1975).

Em segundo, a relação histórica indivíduo e natureza e a satisfação das suas

necessidades, através do trabalho, têm no capital, sua apropriação como objeto, cuja

intervenção produtiva/ destrutiva, engendra processos que acirram grandes problemáticas

ecológicas, como também, econômico, social, político e cultural(MARX,1975).

Em terceiro, na relação capital x trabalho, há um complexo de relações- também

refletidas por Karl Marx no nascedouro dessa sociabilidade- possibilitadas pela apropriação

privada dos meios de produção e da riqueza socialmente alcançadas pela divisão social do

trabalho, por uma só classe, que condiciona a exploração do homem sobre o homem

(MARX,1975).

Partindo para as transformações que incidiram sobre as relações de produção a partir

do capitalismo, o domínio da terra passou a ter um significado diferente em relação às

sociedades pré-capitalistas, bem como, as relações de trabalho passam a ser organizadas de

maneira radicalmente oposta.

Segundo Silva (2010), a partir de Marx, no período anterior ao sistema feudal a terra

representava um “poder estranho que imperava sobre os homens”, e a partir da ascensão

desse modo de produção, passa a ter um significado político, definidor dos poderes de quem a

possuísse, ou seja, seu proprietário. Este por sua vez detinha um poder que estendia seus bens

para além da terra, dado o controle sobre a família e a casa, concebida como propriedade una,

17

Entendendo que: “A mercadoria é, antes de mais nada, um objeto externo, uma coisa que, por suas

propriedades, satisfaz necessidades humanas, seja qual for a natureza, a origem delas, provenham do estômago

ou da fantasia”. (MARX, p.57). Consideramos que a mercadoria é uma unidade que sintetiza valor de uso e

valor de troca, o que implica que pra sua produção são indispensáveis a divisão social do trabalho e a

propriedade privada dos meios de produção. Isto porque, sem essas duas dimensões, produz-se bens, valores de

uso (NETTO & BRAZ, 2007).

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portanto, submetida ao controle e regulamentação no que diz respeito à definição de direitos

políticos em sua jurisdição, assegurando-se assim, a dominação sobre os camponeses.

O elemento definidor deste modo de produção – assim como dos

anteriores – é o fato de o trabalho não ser realizado com vistas à

obtenção de valor. O excedente produzido destina-se às trocas, com o

fim de assegurar a manutenção do trabalhador individual e de sua

família, além da comunidade onde se insere. A riqueza não constituía

o objetivo da produção, um fim em si mesmo. Assim sendo, é possível

afirmar que nas formas sociais assentadas na propriedade da terra e na

agricultura como base do ordenamento econômico, prevaleceu a

produção de valores de uso, sendo a reprodução dos indivíduos e de

sua comunidade o fim último da produção (apud Silva, 2010, p.49)

O sistema de economia mercantil inverte essa dimensão dada ao valor de uso para os

processos produtivos. E o faz, centralizando os meios de produção. Nos termos de Silva

(2010), convertendo-os (de meios individuais de produção) em meios sociais. Assim conferiu

uma natureza social ao processo produtivo, que passa a ser desenvolvido de forma articulada

por uma “coletividade de homens”18

.

Assim, de acordo com Silva:

Este movimento, essencialmente concentrador de riquezas, altera

radicalmente, as relações entre sociedade e natureza. Ao adotar como

objetivo da produção a formação de excedentes para o mercado com

fins de obter lucro, a burguesia institui a concorrência e a

competitividade com valores essenciais às práticas econômicas e

impulsiona o desenvolvimento das forças produtivas como contraface

da apropriação do trabalho alheio, inaugurando também uma nova

etapa na relação com o meio ambiente. Do domínio da terra passa-se,

então, ao domínio da natureza (em escala planetária) e da própria

humanidade (2010, p.52).

Para Marx, o capitalismo:

Onde passou a dominar, destruiu as relações feudais, patriarcais e

idílicas. Dilacerou sem piedade laços feudais, tão diferenciados, que

mantinham as pessoas amarradas a seus “superiores naturais”, sem pôr

no lugar qualquer outra relação entre os indivíduos que não o interesse

nu e cru do pagamento impessoal e insensível “em dinheiro”. Afogou

na água fria do cálculo egoísta todo fervor próprio do fanatismo

religioso, do entusiasmo cavalheiresco e do sentimentalismo pequeno-

burguês. Dissolveu a dignidade pessoal no valor de troca e subsistiu as

muitas liberdades, conquistadas e decretadas, por uma determinada

liberdade, a de comércio. Em outra palavra, no lugar da exploração

encoberta por ilusões religiosas e políticas ela colocou uma exploração

aberta, desavergonhada e seca (2008, p.12).

18

O trabalho é, sempre, atividade coletiva: seu sujeito nunca é um sujeito isolado, mas sempre se insere num

conjunto (maior ou menor, mais ou menos estruturado) de outros sujeitos. Essa inserção exige não só a

coletivização de conhecimentos, mas sobretudo implica convencer ou obrigar outros à realização de atividades,

organizar e distribuir tarefas, estabelecer ritmos e cadências etc. [...] Esse caráter coletivo da atividade do

trabalho é, substantivamente, aquilo que se denominará de social (NETTO & BRAZ, 2007, p.34).

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Assim podemos aferir que a reflexão de Marx indica o nascedouro de um determinado

modo de produção que subverteu a ordem na qual os processos produtivos eram conduzidos.

Portanto, o capital se alicerçou com a separação do valor de uso em relação ao valor de troca,

reinando a supremacia do segundo.

Esta característica, na verdade, foi um dos grandes segredos do

sucesso da dinâmica do capital, já que as limitações das necessidades

dadas não tolhiam seu desenvolvimento. O capital estava orientado

para a produção e a reprodução ampliada do valor de troca, e portanto

poderia se adiantar à demanda existente por uma extensão

significativa e agir como um estímulo poderoso para ela

(MÉSZÁROS, 2009,p. 606).

Essa subordinação da produção objetivando a acumulação da riqueza requereu

também uma organização das relações do trabalho equivalente à necessidade expansiva do

capital, convertendo o trabalho em trabalho abstrato19

, ou seja, uma atividade social

assalariada e alienada pelo capital.

O trabalho é uma categoria central do mundo dos homens, segundo Luckács

(Lessa:2012), por ser a atividade humana que transforma a natureza e homens

concomitantemente. O trabalho é a atividade que permite que o homem transforme a natureza

em bens necessários a sua reprodução e a si mesmo, posto que, é também em sua realização,

que num salto ontológico ele transcende das suas necessidades vitais, meramente biológicas e

desenvolve-se como ser social20

. Como bem assinala Netto & Braz,

[...] o trabalho não transforma apenas a matéria natural, pela ação dos

seus sujeitos, numa interação que pode ser caracterizada como o

metabolismo entre sociedade e natureza. O trabalho implica mais que

a relação sociedade/natureza: implica uma interação no marco da

19

O trabalho abstrato é a redução da capacidade produtiva humana a uma mercadoria, a força de trabalho,

cujo preço é o salário. Todas as atividades humanas assalariadas são trabalho abstrato. O trabalho enquanto

categoria fundante é o complexo que cumpre a função social de realizar o intercâmbio material do homem com

a natureza, é o conjunto de relações sociais encarregado da reprodução da base material da sociedade (LESSA,

2012, p.28). 20

Guilhermo Foladori ao discutir a evolução dos seres na natureza, apresenta uma importante definição das

formas humanas de superar as contradições para sua reprodução e de relacionar com o meio e os demais seres.

Assim, afirma: “A espécie humana, como os outros seres vivos, deve enfrentar a contradição do mundo abiótico,

com as demais espécies vivas e com seus semelhantes. Ao produzir, consegue incorporar às suas necessidades

parte do mundo abiótico e os demais seres vivos. A segunda contradição se supera reproduzindo outras

espécies, ou submetendo-as a determinadas condições de vida. A forma de superar a terceira é mediante a

associação consciente. Claro que cada uma dessas superações significa, simultaneamente, novas dificuldades e

contradições. Assim, a produção trouxe como consequências a depredação e contaminação, o que hoje em dia

se manifesta a crise ambiental. A reprodução e o controle de espécies coadjuvantes na extinção e negação da

biodiversidade. E a associação entre os seres humanos percorreu o caminho conhecido: nas sociedades de caça,

pesca e coleta, expulsou ou congêneres excedentes; nas sociedades escravistas, tratou-os, na prática, como se

fossem de outra espécie, nas sociedades despóticas, tributárias e servis, submeteu-os pela força; na sociedade

capitalista, submeteu-os pelo mercado. Mas assim como a tendência global da vida mostra ser a liberação do

meio, a tendência global da evolução humana mostra ser a associação consciente, embora ainda pareça faltar

muito caminho a ser percorrido”.

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própria sociedade, afetando seus sujeitos e a sua organização. O

trabalho, através do qual o sujeito transforma a natureza (e, na medida

em que é uma transformação que se realiza materialmente, trata-se de

uma transformação prática), transforma também o seu sujeito: foi

através do trabalho que, de grupos primatas, surgiram os primeiros

grupos humanos -numa espécie de salto que fez emergir um novo tipo

de ser, distinto do ser natural (orgânico e inorgânico): o ser social

(2007, p.34).

Não pode haver existência social sem trabalho. Logo, essa é uma categoria central na

abordagem das relações de produção e reprodução do capital e que deve ter uma abordagem

cuidadosa do seu sentido, haja vista que o trabalho e o trabalho abstrato têm determinações

específicas que precisam ser discutidas.

Ou seja, para Marx e Engels há uma clara distinção entre trabalho

abstratoe trabalho: o primeiro é uma atividade social assalariada,

alienada pelo capital. Corresponde à submissão dos homens ao

mercado capitalista, forma social que nos transforma a todos em

“coisas” (reificação) e articula nossas vidas pelo fetichismo da

mercadoria. O trabalho pelo contrário, é a atividade de transformação

da natureza pela qual o homem constrói, concomitantemente, a si

próprio como indivíduo e a totalidade social da qual é participe. É a

categoria decisiva da autoconstrução humana, da elevação dos homens

a níveis cada vez mais desenvolvidos de sociabilidade (LESSA, 2012,

p.26).

Assim sob o primado do capital há a subsunção do trabalho ao mercado, o que implica

na sua transformação em mercadoria. Embora o capital opere uma cisão entre trabalho e

meio(s) de produção necessita do primeiro para a produção de mercadorias e apropriação da

mais valia (via usurpação do produto do trabalho). Ao mesmo tempo, o trabalhador “livre”

depende da venda da sua força de trabalho (transformada em mercadoria) para existir. Cria-se

uma relação social, um caráter complementar entre capital e trabalho. No entanto, é essa uma

relação de exploração, porque é mediada pelo salário e pela apropriação privada da riqueza do

seu produto. Assim, o trabalho se torna uma atividade destinada a um fim mercadológico e

mina o potencial desenvolvimento do ser social em sua relação genuína com o trabalho,

ontológica, homem/natureza, o trabalho como principio da liberdade, transformando-a numa

relação entre homens.

Potencialmente, podemos creditar ao capital, a banalização e/ou naturalização da

relação de compra e venda de mercadorias. Estamos corriqueiramente, comprando e vendendo

coisas, acumulando-as. Isto implica numa produção em massa, voltada para um consumo

excessivo. Logo, as relações de produção exigem a constante complexificação das forças

produtivas, o que se traduz na busca incessante pelo desenvolvimento tecnológico e o avanço

das formas de responder as necessidades sociais e potenciá-las em seu valor de troca para

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geração da riqueza abstrata. Requer uma também complexa divisão social do trabalho e a

procura por novos territórios ricos em recursos produtivos.

Segundo Wood:

Há também outras consequências, como por exemplo: 1. A

organização do trabalho visando a maximização dos lucros significa

que o emprego de tempo e energia de uma grande parte das pessoas se

dá na realização de trabalhos desagradáveis e nada compensadores. 2.

A qualidade e até mesmo a segurança dos bens e serviços

frequentemente cederão lugar à maximização dos lucros e aos cortes

de gastos. 3. Todos os aspectos da vida que se tornam mercadorias são

retirados da esfera da responsabilidade democrática e passam a

atender não á vontade do povo, mas às exigências do mercado e do

lucro e da acumulação de capital, é necessariamente um sistema de

produção que destrói e desperdiça. Consome vastas quantidades de

recursos, atua segundo suas exigências e de curto prazo do lucro em

vez de agir segundo as necessidades de longo prazo do meio ambiente

sustentável, e implica constante destruição e desperdício para criar

nova demanda (2003, p.41).

Sentimos a atualidade da discussão feita por Marx há dois séculos atrás em relação a

necessidade expansiva do capital, quando ele indica que:

A burguesia não pode existir sem revolucionar constantemente os

instrumentos de produção, portanto as relações de produção, e por

conseguinte todas as relações sociais. A conservação inalterada dos

antigos modos de produção era a primeira condição de existência de

todas as classes industriais anteriores. A transformação contínua da

produção, o abalo incessante de todo o sistema social, a insegurança e

o movimento permanentemente distinguem a época burguesa de todas

as demais. As relações rígidas e enferrujadas, com suas representações

e concepções tradicionais, são dissolvidas, e as mais recentes tornam-

se antiquadas antes que se consolidem. Tudo que era sólido se

desmancha no ar, tudo o que era sagrado é profanado, e as pessoas são

finalmente forçadas a encarar com serenidade sua posição social e

suas relações recíprocas ((2008, p.14).

O capitalismo é um sistema de classes, que tem determinações sobre o modo de ser,

ver e viver o/no mundo. Portanto, a desigualdade social é constitutiva de seu funcionamento, e

nos ajuda a compreender a existência da “Questão Social”, quando a consideramos como a

expressão do conjunto das desigualdades sociais 21

.

O desenvolvimento das forças produtivas em tempos de capitalismo maduro se por um

lado na relação capital trabalho intensificam as explorações e opressões da classe

21

Encontramos respaldo quanto a essa compreensão na reflexão de Iamamoto(2008), quando a mesma reflete

que : “A questão social é expressão do processo de produção e reprodução da vida social na sociedade burguesa,

da totalidade histórica concreta”. (p.114)

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trabalhadora, agudiza o processo de degradação ambiental. É nesse sentido que à superação

das crises ambiental e social são necessárias mudanças estruturais e não as reformas

moderadas ecocapitalistas, tecnocráticas, e cientificistas22

.

De certo que os níveis de degradação ambiental nas sociedades anteriores ao

capitalismo não chegaram a configurar um quadro de ameaças à

sustentabilidade planetária, tendo em vista que o objetivo precípuo da

produção não residia na formação do excedente com vistas ao mercado e,

consequentemente, à obtenção do lucro. O baixo nível de eficácia da técnica,

observado nas sociedades que antecederam o mundo burguês – para as quais a

natureza aparece como uma fonte de magia e de mistérios – não possibilitou o

efetivo domínio da natureza. Na base deste fenômeno encontravam-se as

formas sociais de organização da produção – seja como trabalho escravo ou

servil –, as quais não estimularam o desenvolvimento das forças produtivas

(SILVA, 2010,p. 48).

O capital, no controle dessa dinâmica, contraditoriamente, destrói as suas duas fontes de

riqueza, a natureza e a força de trabalho.

[...] podemos dizer que é o próprio funcionamento de um sistema de produção

de mercadorias (Kurz, 1996), estruturalmente orientado pela busca da maior

rentabilidade na acumulação de riqueza abstrata, que conduz à degradação

daquelas condições naturais da qual depende visceralmente. Nesse sistema, a

concorrência precipita os capitais individuais numa luta de vida ou morte pela

externalização dos custos de produção e de provimento das condições de

produção (CARNEIRO, 2005, p. 29)

Cabe assinalar que, a relação que o capital estabelece com a natureza, está orientada à

produção, uma vez com esse foco, é inversa a que é preconizada pelas populações tradicionais

cuja intervenção em seus recursos tem a finalidade última de fornecer as condições de

reprodução das mesmas. Assim,

[...] o uso capitalista das condições naturais como condições do processo de

acumulação de riqueza abstrata choca-se com outras formas de apropriação

sociais das condições naturais, seja para fins de produção de valores de uso em

moldes não-capitalistas, seja para fins científicos ou lúdicos, seja como

fundamento da vida orgânica ou da identidade territorial de determinadas

populações e comunidades. A mediação estatal faz-se presente para assegurar

o provimento e o uso das condições naturais como condições da produção

capitalista, mas ao mesmo tempo, deve responder, de alguma forma, às

pressões de classes e grupos sociais interessados em outros usos das condições

naturais (CARNEIRO, 2005, p.29).

22

Assim, o pensamento socialista não se diz detentor de uma prosaica “verdade ecológica”, pelo contrário, a

partir do homem real e concreto inserido nas tensões da sociedade de classes, situa como ponto central da

questão a instituição de uma ideia de natureza que esteja ligada ao seu povo, aponta para outras relações entre os

homens, outro modo de vida, e, consequentemente, outras relações com a natureza, que não as engendradas pela

sociedade industrial moderna e seus agentes. (MELO, 2010, p.234)

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Neste sentido, podemos afirmar que a ciência, também está subsumida à lógica

mercantil do capital é utilizada para dar materialidade do ponto de vista tecnológico às

perspectivas de produção desse sistema. Obviamente, nessa lógica, o capital fomenta

pesquisas, com maior incidência no campo das ciências exatas e biológicas que movimentam

o mercado, vislumbrando retorno em lucros. Não por acaso, parcela considerável dessas áreas

do conhecimento, tem pesquisas fomentadas, orientadas, financiadas e controladas pelo

mercado.

Além disso, uma formação profissional intrinsecamente direcionada ao mercado.

Inclusive, existem grandes ofertas de estágio para essas áreas e premiações para os melhores

trabalhos de conclusão de curso e/ou projetos de intervenção que estejam diretamente

articulados aos processos produtivos e rendam algum ganho para as empresas/indústrias em

que são oferecidos, e alcance um grande vetor perseguido pelo mercado, a “inovação” voltada

ao lucro.

Assim, conforme aponta Carneiro (2005), a materialidade das tecnologias existentes é

intrinsecamente antiecológica, na medida em que a ciência é posta a serviço do capital.

Ressalva-se aqui, que nos últimos anos, grandes saltos históricos foram dados pela ciência na

busca de alternativas para os processos produtivos de maneira a preservar a natureza, bem

como, na descoberta da cura de doenças que acometem seres humanos e os animais. No

entanto, em grande medida, parcela considerável das descobertas, privilegia o mercado,

mesmo quando se anuncia a perspectiva dos ganhos para a humanidade.

Destarte, esta é uma perspectiva inerente ao capital, a de subordinar todas as coisas à sua

lógica. Sob o capital, todas as necessidades humanas, sejam elas do estômago ou da fantasia

(MARX, IN: NETTO &BRAZ, 2007), passam por uma apropriação mercadológica, são

transformadas em mercadoria. O resultado histórico disso? O amadurecimento de um sistema

que cresceu ancorado na máxima exploração predatória da natureza (degradando biomas) e do

indivíduo.

Logo, a ciência e os avanços tecnológicos dela decorrentes são apropriados para

legitimar o status quo do capital, sendo determinados por ele. E isso, tem implicações

destrutivas graves para a natureza e a própria humanidade.

Esta tendência destrutiva do capital reside em sua natureza mesma,

como “contradição viva”: ao subordinar a produção aos imperativos

da acumulação, o capitalismo não pode sustentar-se indefinidamente

sem os avanços tecnológicos e científicos por este obtidos resultem

em crescente perdularidade e destruição. O assombroso aumento da

produtividade do capital faz senhor e voraz devorador dos recursos

humanos e materiais do planeta para, em seguida, retorná-los como

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mercadorias de consumo de massa, cada vez mais subutilizados ou,

diretamente, como armamentos com imenso poder destrutivo (SILVA,

2010, p, 47-48).

No capitalismo, o caos e a barbárie coexistem. Sob o domínio do capital a noção de

desenvolvimento concretamente parte da necessidade de preservação da natureza e de valores

humanos de emancipação, tendo como horizonte a supremacia do mercado, do lucro e da

riqueza acumulada. No tempo presente, acompanhamos uma conjuntura global de crise

socioambiental e econômica do capital, que mantenedora da perversa dinâmica estrutural do

capital.

A história do capitalismo é marcada em suas diferentes fases por grandes crises, hora

de superprodução ou como presenciamos de caráter predominantemente financeiro. As crises

são inerentes ao capitalismo. O que se diferencia são as formas de enfrentamento das mesmas,

os impactos e a dimensão do poder de destruição destas não só para o capital, mas, e,

sobretudo, para as sociedades e a humanidade.

O contexto de desemprego e/ou inserção precária ao mundo do trabalho, fome e

miséria, acirrados na contemporaneidade, e que assolam grandioso contingente de seres

humanos, indicada inclusive por dados da Organização das Nações Unidas – ONU nos quais

apresentamos anteriormente denunciam a dinâmica desigual e excludente do capital. Revela-

se um grande paradoxo se considerada a ciência, a tecnologia e a intensa capacidade de

produção de riquezas alcançadas pelo desenvolvimento das forças produtivas com o processo

de complexificação do sistema, porque não é capaz de socializá-las, ou seja, de contemplar

todos os seres humanos e fazê-los colher os frutos do trabalho coletivo. Conforme Wood,

Ali onde a produção é distorcida em prol da maximização do lucro, a

sociedade (...) pode possuir alta capacidade produtiva suficiente para

alimentar, vestir e abrigar toda a sua população em níveis bastante

altos e ainda assim conviver com a pobreza, desabrigados e cuidados

de saúde inadequados(2011,p.41)

Logo, as questões socioambiental, urbana e rural, são expressões das desigualdades e

contradições de uma mesma dinâmica estrutural, erigem no capitalismo, dada sua essência

desigual, concentradora e centralizadora do poder e das riquezas socialmente produzidas.

Dessa forma, a crise ambiental na qual presenciamos, numa análise de totalidade, não

pode ser compreendida dissociada do modo de produção capitalista que a determina por um

complexo de relações estabelecidas, que envolvem a ciência, a tecnologia, os processos

produtivos, o mercado, a economia e instituições políticas, sendo marcadas pela intervenção

destrutiva desse sistema sobre a natureza que tem prejudicado os biomas e o ecossistema

(donde os recursos são esgotáveis); pautadas também na exploração do trabalho e dizimação

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da própria força de trabalho humana; bem como, pela desigualdade social cada vez mais

expressiva, registrada nos índices de pobreza e miséria que atinge um vasto contingente de

seres humanos no globo.

Portanto, a chamada crise ambiental deve-se a um conjunto de

variáveis interconexas, dadas em bases sociais, econômicas, culturais

e políticas, estruturalmente desiguais, que conformam a sociedade

capitalista (SACARIAS, 2012, p.132).

Assim, partindo da análise do capitalismo contemporâneo, deparamo-nos com uma

conjuntura global de crise, que apresenta um mercado desregulamentado, profundamente

instável, ao mesmo tempo voraz e sem fronteiras que se apropriou das bandeiras de lutas

históricas do movimento ambientalista.

Desse modo, o capital repensou estratégias de acumulação e sustentação do mercado,

criou, aperfeiçoou e disseminou o conceito de uma Economia Verde, para fins de acumulação,

respaldado na ideologia da sustentabilidade ambiental e na ideia de um mercado verde para o

desenvolvimento de tecnologias limpas e lucrativas.

Esta crise é global porque de afeta todos os países e em todas as dimensões: social,

econômica, política, ambiental, cultural.

Sacarias, seguindo as reflexões de Mészáros, aponta a década de 1970 como marco

histórico da eclosão da crise estrutural do capital. As crises inerentes ao capital transformam o

caráter de crises cíclicas passando a ser contínuas, onde as soluções e ajustes imediatos das

crises parciais (ajustes fiscais, reforma do Estado, garantia de direitos), não são suficientes

para eliminar as contradições na lógica do capital.

Nesta, não acontecem os espaços entre expansão e recessão definidos

pelas contradições no processo de acumulação de riqueza e de

produção-consumo, mas há a eclosão de precipitações cada vez mais

frequentes e contínuas. De acordo com Mészáros (2011;2002) a crise

afeta pela primeira vez a totalidade da humanidade e todos os pontos

do planeta, mostrando-se longeva e duradoura, sistêmica e estrutural,

reduzindo a margem de alternativas factíveis do capital em sua busca

de sustentabilidade no processo de acumulação da riqueza. Isso se

explica por meio da sua tripla destrutividade: (1) ampliação de

guerras, cujo movimento se inicia no imperialismo monopolista do

século XIX; (2) intensificação do uso dos bens naturais acima da

capacidade de suporte, degradação dos ecossistemas e extinção em

massa da diversidade; (3) aumento da produção destrutiva, pautada na

obsolescência simbólica e material das mercadorias (2012, p.128).

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Dessa forma, Sacarias reflete que pensar a crise ambiental como uma problemática

inscrita no processo macro de crise do próprio capital, ou seja, numa perspectiva de

totalidade, rompe com uma visão endógena desse processo:

Esse tipo de posicionamento inverte uma máxima ambientalista. A

crise não é determinantemente ambiental e sim do sistema do capital,

no qual a questão ambiental é uma de suas manifestações mais

evidentes. É essa crise estrutural do capital, cujas forças

potencialmente destruidoras estavam inscritas nos fundamentos do

capitalismo, que vem colocando em risco duas fontes de produção de

valor e de toda riqueza produzida: a capacidade de trabalho e a

natureza (2012, p.129).

É nesse cenário que surge o debate do “Capitalismo Verde” que tenta articular e

difundir uma “nova ética” socioambiental e econômica e um “humanismo” do capitalismo,

donde a “economia verde” para o desenvolvimento sustentável é uma expressão. Um debate

que tem versado sobre a criação de tecnologias que evitem o desperdício dos recursos

naturais, supostamente respeitando os limites físicos da natureza e que revisita seus padrões

de produção e consumo, cujas alternativas tem se direcionado e circundado a esfera da

produção, da tecnologia e da eficiência energética, de iniciativa, gestão e controle do mercado

em articulação com o Estado (Sacarias, 2012).

Há uma evidente disputa de projetos societários na abordagem da problemática da

degradação ambiental. Segundo Sacarias:

De um lado, estrutura-se um pensamento que se opõe à ideologia do

capital, formado por pensadores críticos ao modelo de produção

capitalista, por movimentos sociais, fora da lógica do mercado. Para

esse pensamento, as condições que levam à degradação ambiental têm

causas econômicas e políticas e sua gênese está ligada às relações

sociais que se firmam entre os seres humanos a partir da maneira

como se distribuem os meios de produção [...] De outro lado,

estrutura-se uma corrente de pensamento atualmente hegemônica,

defendida por representantes ligados às instituições multilaterais e às

grandes corporações internacionais. Nessa concepção, defende-se que

o cerne dos problemas ambientais está ligado ao desperdício de

matéria e energia, portanto, um limitador para a expansão da

economia e para o crescimento do mercado. Além disso, defende

ações da chamada modernização ecológica, destinadas essencialmente

a promover ganhos de eficiência e ativar mercados (2012, p. 126-127).

Esta segunda perspectiva analítica da questão socioambiental hegemônica tem

profunda filiação com os interesses do capital e impetra em suas formulações uma ofensiva

ideológica neoliberal23

na direção do cumprimento das estratégias de superação da crise desse

23

“(...) a verdade é que em nossas sociedades tudo está “impregnado de ideologia”, quer a percebamos, quer não.

Além disso, em nossa cultura liberal conservadora o sistema ideológico socialmente estabelecido dominante

funciona de modo a apresentar – ou desvirtuar – suas próprias regras de seletividade, preconceito, discriminação

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sistema e do obscurecimento de suas relações sociais e ambientais destrutivas, com apoio

irrestrito do Estado. É acima de tudo, defensora da capacidade institucional do mercado de

pôr fim à problemática ambiental, na lógica da contenção dos desperdícios dos recursos

naturais via tecnologias ditas limpas, criando um “mercado verde”, bem como, “sustentável”

para o capital.

É uma perspectiva fortalecida porque representa aos interesses da classe que é poder

dominante. Portanto, a classe que detém as condições objetivas de fazê-lo. Marx refletiu em

“A ideologia Alemã” (2009), que a classe que é poder econômico dominante em determinado

tempo histórico, também o é no plano das ideias, levando em consideração suas condições

materiais de fazer valer sua hegemonia. Marx compreendia que esse movimento não ocorre

sem disputa entre as classes.

As ideias da classe dominante são, em todas as épocas, as ideias

dominantes, ou seja, a classe que é o poder material dominante da

sociedade é, ao mesmo tempo, o seu poder espiritual dominante. A

classe que tem à sua disposição os meios para produção material

dispõe assim, ao mesmo tempo, dos meios para a produção espiritual,

pelo que lhe estão assim, ao mesmo tempo, submetidas em média as

ideias daqueles a quem faltam os meios para produção espiritual. As

ideias dominantes não são mais do que expressão ideal das relações

materiais dominantes, as relações materiais dominantes, concebidas

como ideias; (MARX, 2009, p,68).

Dessa forma, a “ideologia verde” do capitalismo se estabelece, orientada por sua

racionalidade econômica, e é envolta de variáveis marcadamente lucrativas e indicadores de

que se afinam com o objetivo da acumulação de riquezas. Assim, Lowy reflete que:

A racionalidade limitada do mercado capitalista com o seu cálculo

imediatista de perdas e lucros, é intrinsecamente contraditória com

uma racionalidade ecológica, que leve em conta a longa temporalidade

dos ciclos naturais. Não se trata de opor os ‘maus” capitalistas

ecocidas aos “bons” capitalistas verdes: é o próprio sistema, fundado

na impiedosa competição, nas exigências da rentabilidade na corrida

atrás do lucro rápido que é o destruidor dos equilíbrios naturais.

(2007,p.50).

Há uma perversão e/ou transformismo do sentido da preservação ambiental que é

ideológico e estratégico em termos políticos e econômicos, da solidariedade e de humanização

pelo capital quando verificamos e identificamos na realidade social, as dimensões da

produção destrutivas do meio ambiente e da classe trabalhadora e espoliação das riquezas

produzidas socialmente, acirrando contradições do sistema do capital.

e até distorção sistemática como “normalidade” “objetividade” e “imparcialidade cientifica (Mészáros, 2009,

p.57)”.

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Naturalmente, aqueles que aceitam de modo imediato a ideologia

dominante como a estrutura objetiva do discurso “racional” e

“erudito” rejeitam como ilegítimas todas as tentativas de identificar os

pressupostos ocultos e os valores implícitos com que está

comprometida à ordem dominante. Assim em nome da “objetividade”

e da “ciência” eles precisam desqualificar o uso de algumas das

categoriais vitais do pensamento crítico. Reconhecer a legitimidade de

tais categoriais seria aceitar o exame dos próprios pressupostos que

são assumidos como verdadeiros, juntamente com as conclusões que

podem ser- e efetivamente são- facilmente delas extraídas

(MÉSZÁROS, 2004, p58).

O capital resgata estratégias de domínio, para o reordenamento da economia, que tem

implicações na forma de condução da política. O que demonstra que o discurso ideopolítico

“verde” de iniciativa dos segmentos dominantes vincula-se com a dinâmica econômico-

produtiva então estabelecida,

(...) a ideologia não é ilusão nem superstição religiosa de indivíduos

mal- orientados, mas uma forma específica de consciência social,

materialmente ancorada e sustentada. Como tal, não pode ser superada

nas sociedades de classe. Sua persistência se deve ao fato de ela ser

constituída objetivamente (e constantemente reconstituída) como

consciência prática inevitável das sociedades de classe, relacionada

com a articulação de conjuntos de valores e estratégias rivais que

tentam controlaro metabolismo social em todos os seus principais

aspectos. Os interesses sociais que se desenvolvem ao longo da

história e se entrelaçam conflituosamente manifestam-se, no plano da

consciência social, na grande diversidade de discursos ideológicos

relativamente autônomos (mas, é claro, de modo algum

independentes), que exercem forte influência sobre os processos

materiais mais tangíveis do metabolismo social (MÉSZÁROS,

2004.p.66).

Estas estratégias, buscam fundamentos no resgate de teorias clássicas burguesas sobre

desenvolvimento para apreensão e ação sobre a realidade e/ou as reformulam, transformando-

as em postulados para a gestão da política socioeconômica e ambiental contemporânea a nível

mundial.

A concepção de desenvolvimento pode expressar a posição e os interesses da classe

que a defende. Segundo Traspidini & Mandarino (2013), as teorias tradicionais

compreendem o desenvolvimento distante do sentido ontológico refletido por Marx, ou seja,

que o concebe como construção histórica fruto da práxis social, que é passível de

transformação, mudanças e permanências, e que tem como horizonte um futuro radicalmente

oposto ao status quo.

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41

Nesse sentido, identificam o capitalismo como o estágio mais avançado da história da

humanidade, portanto, não defendem sua superação. Assim, tanto as teorias de

desenvolvimento econômico pautadas pela burguesia no Pós Segunda Guerra

(desenvolvimentismo ou Nacional- desenvolvimentismo), quanto as mais recentes

(neodesenvolvimentismo), tem como limite de análise do real e ação a sociedade burguesa e

seus fundamentos.

Nessa direção, podemos compreender a expansão do discurso neoliberal que afirma o

mercado e o setor financeiro, como protagonistas na condução das políticas rumo ao

Desenvolvimento Sustentável, formulando assim, o conceito de Economia Verde, do qual

trataremos nesta análise, - que diz respeito a todas as estratégias do capital quanto ao

enfrentamento da crise socioambiental.

Nesse sentido, no capitalismo contemporâneo, o paradigma do Desenvolvimento

Sustentável e as alternativas a superação da crise socioambiental nos evidenciam um

paradoxo, quanto à possibilidade de seu alcance nos limites dessa sociabilidade, porque nos

referimos a um sistema que historicamente se ancora na máxima produtividade, lucratividade,

exploração, bem como, na expropriação e apropriação privada do trabalho e da natureza,

concentração/centralização das riquezas.

Haja vista que as ações empresariais, dimensionadas para o “capitalismo verde”

apontam para a transformação da necessidade de preservação dos recursos naturais em

mercadoria. E por isso, coloca-se em xeque o novo compromisso “ético humanista” do

capital. Isso nos faz questionar a ideologia do desenvolvimento sustentável, que hora se

discute, que além de anunciar um novo compromisso ambiental do mercado, reclama a

necessidade e a possibilidade de minar ou minimizar as desigualdades sociais. Mas as

soluções para a desigualdade social aqui reduzem a uma questão de variáveis, visto que,

pobreza e miséria são enfrentadas através de políticas de redistribuição mínima de renda para

acesso ao mercado de consumo que não contemplam o conjunto das demandas dos

indivíduos. Portanto, não rompem estruturalmente com as causas de ambas.

Das conferências históricas realizadas pelas Nações Unidas que se iniciaram desde a

década de 1970 (conforme analisamos no item subsequente) surge a noção de ações de

sustentabilidade à contribuição do Desenvolvimento Sustentável, que se materializam através

da Responsabilidade Social Empresarial ou Corporativa (Socioambiental, Socioempresarial,

etc.).

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O conceito de sustentabilidade fomentado por organizações como o Instituto Ethos24

contempla indicadores sociais, ambientais e econômicos, nos discursos apresentados, afirmam

revelar uma preocupação com a intervenção ambiental consciente e viável, com o

desenvolvimento econômico e social, com o trabalho, a comunidade etc. O produto dessas

Conferências e Comissões da ONU e o substrato das formulações mais importantes discutidas

culminam na construção de documentos oficiais que terminam por serem referências de

planejamento e ação da gestão “socioambiental humanizada”(COMPÊNDIO UNIETHOS,

2008).

Vale ressaltar, que no Pós-Segunda Guerra Mundial os processos de reordenamento

geográfico a serviço do capital e de acumulação intensificaram-se, através de medidas

burguesas e estatais de enfrentamento das problemáticas oriundas desse tempo histórico. A

exemplo, do período das décadas de 1940 e 1970, quando através do fordismo/keynesianismo

e do WelfareState, efetivou-se às medidas de ajustes estruturais da gestão da produção para

elevação da lucratividade e desenvolvimento econômico a dimensão social, com políticas

direcionadas a classe trabalhadora.

Isso nos países centrais, visto que, os países periféricos jamais vivenciaram tal

experiência, em razão, do processo de industrialização chegar tardiamente a nós,

desencadeando outro processo, o Desenvolvimentismo, que serviu aos grandes pólos do

capitalismo, como um reforço aos seus interesses (MOTA, 2009).

O fato é que, ainda no estágio em que o capital dominava a gestão da produção,

mediada pelos ditames do Fordismo - que resulta na extração predatória dos recursos naturais

para atender aos interesses do mercado em relação da produção e consumo em massa- o meio

ambiente e a classe trabalhadora sentiam fortemente os impactos desse modo de acumulação

destrutivo.

O movimento ambiental que se iniciou como uma resposta à industrialização desde as décadas

de 1960 ganhou novos contornos em tempos de capitalismo contemporâneo. Assim, faz-se

necessário dizer que vivenciamos uma serie de “ajustes globais”, no processo de

mundialização do capital, que tem aprisionado economias, condicionado a “periferia do

capital” à submissão aos países de economia capitalista desenvolvida, desconstruindo o

“Estado social” e reconstruindo um “Estado para o capital”. Os resultados desse processo é

perceptível na destituição de direitos históricos conquistados pela classe trabalhadora, na

diminuição dos gastos públicos, na flexibilização de relações de trabalho, nas políticas de

“gestão da pobreza” em nome da sustentabilidade do Capital.

24

Instituto voltado para fomentar a Responsabilidade Social (http://www3.ethos.org.br/).

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A sociedade civil e seus aparelhos privados de hegemonia, representada por fundações

empresariais, ONG’s, “empresas cidadãs”, fomentam as chamadas ações de Responsabilidade

Social Empresarial /Corporativa (RSE) e as ações ideológicas do mercado reestruturado

induzido por instituições financeiras multilaterais internacionais, e buscam um lugar de

destaque no enfrentamento de recortes da questão social, alinhado aos interesses

mercadológicos do capital, possibilitado pelo recuo estatal na lógica neoliberal.

Há uma difusão da solidariedade, do voluntariado e da cooperação que tende a

enaltecer a perspectiva do mérito, da responsabilidade dos indivíduos pela transformação

social e superação da condição de miséria, pobreza, desemprego, dentre outros. Ressalta-se a

possibilidade de ascensão dos indivíduos via autonomização da atividade produtivo/lucrativa,

baseada na lógica de ideias inovadoras necessárias, numa conjuntura de desemprego e

informalização do trabalho. Iniciativas absorvidas por empresas que estrategicamente as

fomentam e oferecem suporte técnico e financeiro a esses processos.

Os ajustes supra-estruturais do capital, que são: gerenciais, econômicos, sociais,

políticos, ideológicos e adentram as esferas da cultura e da individualidade (re)criam um

cenário de destituição de direitos, que com as crises do capital, sob o prisma do corte do gasto

público, se intensificam e imperam relações sociais que evidenciam problemáticas cujo

enfrentamento se torna a cada dia mais complexo.

Do ponto de vista histórico e de totalidade é questionável e contraditória a proposta de

Desenvolvimento Sustentável na sociabilidade capitalista, face as suas contradições

estruturantes. Vivenciamos seu estágio de maturação na contemporaneidade, quanto ao

desenvolvimento das forças produtivas, que nos revela uma capacidade tecnológica de alto

nível em respostas as necessidades humanas (criadas a partir da lógica do consumo) e da

incapacidade de atender as demandas mínimas das classes subalternizadas.

A chamada “globalização” (que iremos tratar neste trabalho como mundialização do

capital) foi entronizada em todo o mundo como algo benéfico às sociedades, necessário e

insuperável (IANNI, 1997). Em verdade o que se pleiteava era uma estratégia de superação da

crise do capital, uma proposta de (re) configuração do sistema, a nível mundial, munida de

instrumentos e aparelhos de controle e regulação. Logo, um processo de mundialização

(LIMA, 2003).

A mundialização capitalista é efetivada e propagada ideologicamente enquanto um

processo “natural” histórico, que permitiu o alcance do mercado a diferentes espaços do globo

e com isso, houve uma suposta “democratização” no acesso aos bens e ao seu consumo. Seria

na verdade um aprimoramento e sofisticação nas formas de reposta às necessidades humanas,

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através de seu desenvolvimento tecnológico impar, com expansão de lucros, inter-relações

entre povos e desenvolvimento econômico e social, numa suposta igualdade de oportunidades

neoliberal. Resta-nos questionar: necessário para quem e para o quê?

Segundo Silva:

O caráter ideológico, que se esconde por trás da expressão

“globalização”, é todo o esforço de uma ínfima parcela da população

mundial para fragmentar os territórios nacionais e regionais, na

perspectiva da obtenção de lucros, expansão do “livre” mercado e na

“criação da fábula” quanto à existência de um mundo sem fronteiras e

de interesses comuns. Nos propósitos reais desta expressão

“homogeinizadora” está dada a hegemonia dos países centrais sob o

resto do mundo (2003, p.22).

Atualmente, o modelo de acumulação capitalista, o Toyotismo ou flexível - em

vigência a partir da década de 1980- cumpre seus objetivos de acelerar processos, pela

incursão da tecnologia computadorizada, redução de gastos com a contratação de mão de obra

e redução de desperdícios, pela potente produtividade das máquinas. Ao mesmo tempo e pelo

mesmo processo, acarretou na fragilização das relações sociais e de trabalho (BEHRING,

2008), sobretudo na destruição do meio ambiente, no desemprego e na desvalorização do

trabalho em sua amplitude.

A necessidade de expansão do capital alia-se a hegemonia do pensamento que

converge com interesses em consolidar, ideologicamente, o enraizamento necessário das suas

formas tecnológicas de produzir e organizar o trabalho, através da disseminação apologética

da sua inconteste eficiência, e na defesa da colaboração entre as classes.

Nesse sentido, as perspectivas ideológicas do capital se fazem atuantes para efetivar o

ideário neoliberal, do direito a propriedade privada, da liberdade econômica, do

individualismo por interesses econômicos, do mercado livre e sustentável, eficiente nas

relações produtivas e no desenvolvimento econômico, capaz de enfrentar até mesmo

problemáticas sociais e atrasos25

.

É lançado o espectro ideológico de igualdade de acesso e de condições materiais de

efetivação de interesses econômicos individuais, alcançáveis pelo esforço individual motivado

para tal fim. O reflexo disso são relações sociais estabelecidas pela lógica do individualismo,

25

“Tem-se, dentro disso, a massificada divulgação, pelos mais variados instrumentos de mídia, de algumas

“verdades incontestáveis” e aparentemente racionais- acompanhada da desqualificação dos argumentos em

contrário-, no sentido de forjar um consentimento ativo e majoritário para as medidas econômicas e políticas (...).

Para tanto, conta-se com o aval de amplas parcelas da comunidade científica. Eis o chamado pensamento único,

ou seja, um conjunto sistemático de idéias e medidas, difundidas pelos meios de comunicação de massas, mas

também, dentro dos ambientes bem pensantes, estes últimos assaltados por profundo pragmatismo e

imediatismo. O pensamento único vigorou amplamente nos anos 1990, mas ainda mantém sua força neste início

de milênio” (BEHRING, 2008, P.66).

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concorrência entre trabalhadores, competitividade, fetichismo e alienação, além da

reprodução do sistema e do enraizamento do seu poder de hegemonia nas esferas sociais, que

desconsidera os condicionais contrafactuais, suas contradições e seus mecanismos de opressão

da classe trabalhadora.

O sistema capitalista desde a implantação do modelo de acumulação dito flexível, em

meados da década de 1980, vem exercendo papel central na dinâmica da desvalorização do

trabalho e na composição das condições de exploração intensiva pelas formas reificadas da

organização gerencial(ANTUNES, 1999). Este processo culmina em relações de trabalho

substancialmente precarizadas (ANTUNES, 2006), marcadas por empregos temporários,

trabalhadores subcontratados, com direitos conquistados historicamente sendo negados, e uma

crescente informalização (TAVARES, 2004) dinâmica que vem polarizando o desemprego, e

recaindo sobre a percepção de uma realidade crônica da questão (MÉSZÁROS, 2009). Frente

a isto, podemos afirmar que é quase impossível o capital cumprir os objetivos de humanização

que ideologicamente propõe mediante o processo de produção destrutiva.

2.2 O debate ambiental e as contradições históricas

No contexto histórico, o surgimento do debate da crise socioambiental remonta

meados do século XX, momento em que o capitalismo atravessava um período de transição e

dava inicio à sua maior crise, atualmente considerada como estrutural26

por sua dimensão

mundializada.

De acordo com Filho (2001), partindo das indicações de Héctor Ricardo Leis

(1996:90), na década de 1960, se iniciou a chamada revolução ambiental norte-americana em

que as preocupações com a degradação do meio ambiente se evidenciam e que a maioria da

população passa a expressá-las. Nos anos subsequentes tais preocupações com o meio

ambiente alcançam outros países do globo.

Em 1970, as discussões sobre a deterioração do meio ambiente e a necessidade de

adoção de medidas urgentes também chegaram no Canadá, a Europa Ocidental, o Japão, a

26

Conceito discutido por IstivanMésáros.

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Nova Zelândia, a Austrália. Na década de 1980, esta preocupação atinge a América Latina, a

Europa Oriental, a União Soviética e Sul e Leste da Ásia.

Fruto dessa preocupação, surge e prolifera, principalmente a partir de

1970 uma série de atores e processos que constituem o movimento

ambientalista global, tais como, citando apenas alguns: organizações e

grupos que lutam pela proteção ambiental; agências governamentais

encarregadas desta proteção; grupos de cientistas que pesquisam os

temas ambientais; gestão de recursos e processos produtivos, em

algumas empresas, voltadas à eficiência energética, redução da

poluição; e, de suma relevância, demandadores de produtos

caracterizados como “verdes” no mercado (FILHO, 2001,p.)

Nesse sentido, a partir de então o ambientalismo se tornou um movimento

multissetorial, conforme reflete H. R. Leis (apud FILHO, 2001), bem como, societal,

heterogêneo, cultural, social, político e econômico.

No resgate histórico do movimento ambientalista, sua emergência, evolução e

significado Filho (2001), partindo das indicações de Leis e D’Amato (1995), aponta a análise

cronológica do seu desenvolvimento. De acordo com Leis e D’Amato (Idem), nos anos de

1950 temos um ambientalismo dos cientistas, haja vista que é pela ciência que emerge a

preocupação com a dimensão ecológica mundial. Na década de 1960, entram em cena as

organizações não-governamentais. Em 1970, o ambientalismo se institucionaliza sendo esta

década marcada pela Conferência de Estocolmo-72 sobre o meio ambiente, em que estiveram

envolvidos os segmentos políticos- governos e partidos-, bem como, a igreja católica. Nesta

década surgem também diversas agências estatais vinculadas ao meio ambiente.

Logo, tal discussão há muito tempo é pautada pelos movimentos ambientalistas. No

entanto, pela conjuntura de crise estrutural do capital, tornou-se massificada e foi incorporada

nas agendas políticas do mundo inteiro, envolvendo diversos setores da sociedade (Estados,

Organizações Multilaterais, Entidades de Fomento, ONG´s, Empresas), ainda que com

interesses e perspectivas de análise antagônicas.

A partir de 1970, a situação de precariedade encontrada nos sistemas

naturais que sustentam a vida no planeta passa a ser reconhecida

oficialmente por diversos setores da sociedade global. O pensamento

hegemônico defendido por representantes ligados aos órgãos oficiais,

às instituições financeiras multilaterais, às grandes corporações vem

ao longo dos últimos 40 anos criando conceitos, como o

desenvolvimento sustentável, e organizando documentos, como a

Agenda XXI, que são utilizados como referência para implementar o

desenvolvimento agora considerado sustentável, a ser adotado nos

países e no Brasil (FILHO, 2001, p.133).

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Havia desde a década de 1970 uma manifestação latente da instabilidade ecológica,

denunciada pela comunidade científica e os movimentos ambientalistas, que não poderia ser

ignorada. Isto, face ao legado destrutivo do modelo de produção fordista para o meio

ambiente e seu desgaste eminente para cumprimento dos objetivos do capital27

(ANTUNES,

1999).

A “sensibilização das consciências” no mundo inteiro para a responsabilidade que se

deve ter para com a preservação da única Terra que temos que é dotada de um ecossistema

frágil e interdependente, foi fortemente influenciada na década de 1969 pela divulgação da

primeira imagem do planeta visto do espaço. E a partir de então se desdobrou uma

mobilização mais efervescente para problematizar a incidência da ação humana sobre o meio

ambiente.

Em 1972 a ONU organizou a Conferência das Nações Unidas sobre o Ambiente

Humano (ou Meio Ambiente), em Estocolmo, Suécia. Isto porque, as efervescentes

discussões deflagradas na década de 1960 que despertaram a visão ambiental já não poderiam

ser ignoradas. O resultado deste evento foi à divulgação de um Manifesto Ambiental no qual

estavam presentes 26 princípios para elucidar as bases para a agenda ambiental do sistema das

Nações Unidas, assim como, tendo por objetivo anunciado à época, também melhorar o meio

ambiente para as gerações da década passada e para as atuais.

Neste Manifesto Ambiental da Conferência das Nações Unidas, em seus princípios

selavam-se compromissos com a preservação do meio ambiente (fauna, flora, ecossistemas) e

seus recursos finitos; com o bem estar e qualidade de vida dos seres humanos, através de

políticas demográficas; condições de trabalho favoráveis; Planejamento racional quanto as

necessidades do desenvolvimento e as condições do meio ambiente; punições severas às

praticas ilegais que tem impactos destrutivos ao meio ambiente através do Estado que

exerceria essa função normativa e fiscalizadora, associado ao controle rigoroso das

Instituições Nacionais apropriadas; a ciência e a tecnologia como protagonistas para um

desenvolvimento econômico e social poupador do meio ambiente, dentre outros.

Atualmente, com olhar sobre a crise ambiental, social e econômica, podemos inferir

que a maioria destes princípios não se materializou – inclusive, foram desconsiderados por

alguns países, em geral os mais desenvolvidos e também mais poluentes. Mas o discurso

regido à época evocava o compromisso ético com a preservação do meio ambiente e apelava

27

Movimento fortemente influenciado pelo contexto de lutas e participação política dos movimentos sociais

democratas, não perdendo de vista que, todas as ações do capital na direção de direitos e humanidades, têm por

plano de fundo, a luta de classes e a resistência da classe trabalhadora.

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às autoridades de cada Nação que engendrassem políticas que impulsionassem práticas

sustentáveis.

Conforme a reflexão do Manifesto Ambiental (Estocolmo Suécia, 16 junho de 1972)

em que a Organização das Nações Unidas – ONU faz um apelo às “consciências” do mundo

para que se sensibilizem a necessidade de ter maior cuidado e prudência em relação ao meio

ambiente. Nesse documento a ONU diz que através de todo conhecimento e uma ação

racional poder-se-ia articular uma vida melhor e um meio ambiente afinado com as

necessidades humanas. Caberia então, ao homem, o incremento da ciência e do conhecimento

para construção em parceria com a natureza de um mundo melhor28

. O objetivo central seria o

alcance de um modelo de desenvolvimento contínuo que pensasse no bem comum, no

equilíbrio ambiental, que respondesse as necessidades das nações de outrora, sem

comprometer a vida das gerações futuras.

Em dezembro de 1972, a Assembleia Geral, criou o Programa das Nações Unidas para

o Meio Ambiente (PNUMA). Após onze anos de sua criação, o Secretário Geral da ONU

convidou a médica Gro Harlem Brundtland, mestra em saúde pública e ex- Primeira Ministra

da Noruega, para presidir e formar a Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e

Desenvolvimento (CMMAD). Em 1987, a Comissão Brundtland publicou o relatório de suas

ações nomeado de “Nosso Futuro Comum”, que além de apresentar as condições ambientais

do planeta e as conexões com o modo de desenvolvimento adotado pelos países conceituou o

Desenvolvimento Sustentável (ZACARIAS, 2012)29

.

Sobre o Relatório de Brundtland cabem algumas ponderações. Esse relatório em

verdade subsidiou a construção de uma proposta de desenvolvimento sustentável mais afinada

com os interesses mercadológicos, bem como, de oposição às indicações ecológicas mais

radicais que vislumbravam uma perspectiva mais “democrática”. O legado desse relatório foi

28

FONTE: http://www.onu.org.br/a-onu-em-acao/a-onu-e-o-meio-ambiente/.

29O desenvolvimento sustentável é o desenvolvimento que encontra as necessidades atuais sem comprometer a

habilidade das futuras gerações de atender suas próprias necessidades.” (...) “Um mundo onde a pobreza e a

desigualdade são endêmicas estará sempre propenso à crises ecológicas, entre outras. O desenvolvimento

sustentável requer que as sociedades atendam às necessidades humanas tanto pelo aumento do potencial

produtivo como pela garantia de oportunidades iguais para todos.” (...) “Muitos de nós vivemos além dos

recursos ecológicos, por exemplo, em nossos padrões de consumo de energia. No mínimo, o desenvolvimento

sustentável não deve pôr em risco os sistemas naturais que sustentam a vida na Terra: a atmosfera, as águas, os

solos e os seres vivos.” (...) “Na sua essência, o desenvolvimento sustentável é um processo de mudança no qual

a exploração dos recursos, o direcionamento dos investimentos, a orientação do desenvolvimento tecnológico e a

mudança institucional estão em harmonia e reforçam o atual e futuro potencial para satisfazer as aspirações e

necessidades humanas (ONU BRASIL).

FONTE: http://www.onu.org.br/a-onu-em-acao/a-onu-e-o-meio-ambiente/.

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a criação da ideologia do crescimento controlado do capital, “confluindo assim, a produção

no contexto da acumulação do capital, com o caráter da preservação, do crescimento

econômico com “limites” conforme discutiu Silva (2003). Nessa linha de formulação o

conceito originário desse relatório seguiu os postulados da política neoliberal.

Ainda na análise de Silva:

Apesar do Relatório de Brundtland identificar um fosso social

enorme entre os países; de relatar que a dívida dos países

periféricos agravada, ainda mais, os seus problemas ambientais e

que as estratégias de desenvolvimento dos países centrais são

insustentáveis para o meio ambiente; a comissão propõe uma

política de consenso com saídas diplomáticas e sem eficácia

prática para o enfrentamento da pobreza nos países de economia

periférica. A proposta se resume numa carta de boas intenções e

na promessa quanto ao empenho das Nações Unidades para

melhorar a qualidade de vida no planeta (2003, p. 46.)

Em 1992, seguindo as recomendações da Comissão de Brundtland, foi realizada a

Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento, cuja pauta

maior era introduzir este assunto na agenda pública. Esta Conferência foi realizada no Brasil,

no Rio de Janeiro, ficando conhecida como “Cúpula da Terra” e teve como desdobramento a

Agenda 21, que se configurava em um diagrama para a proteção do planeta e para promoção

do desenvolvimento sustentável. Agenda esta em que governos se comprometiam a cumprir

um programa detalhado para controlar ou reverter o quadro insustentável de crescimento

econômico, e instituir atividades que protegessem e renovasse os recursos ambientais

(atmosfera; combate o desmatamento, a perda de solo e a desertificação; prevenção da

poluição da água e do ar; banir a destruição das populações de peixes e promover uma gestão

segura dos resíduos tóxicos).

A Agenda 21 além de abordar as questões ambientais, discutiu os padrões de

desenvolvimento que causavam danos ao meio ambiente. Nesse sentido, trouxe para a pauta,

temas como: a pobreza e a dívida externa dos países periféricos; processos de produção e

consumo e a insustentabilidade de seus padrões; as pressões demográficas e a estrutura da

economia mundial. Além disso, enfatizou a necessidade de fortalecimento do papel das

formas organizativas em defesa da natureza e do trabalho, como grupo de mulheres,

organizações sindicais, agricultores, crianças e jovens, povos indígenas, comunidade

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científica, autoridades locais, empresas, indústrias e ONGs, para o alcance do

Desenvolvimento Sustentável30

.

No entanto, a agenda 21 culminou em propostas e estratégias com pouca força na

determinação da ruptura com a dinâmica destrutiva da natureza pelo capitalismo porque

buscavam se adequar à manutenção da hegemonia desse sistema. Estavam profundamente

entrelaçadas ao neoliberalismo. Assim, as estratégias da Agenda 21, que definia o

protagonismo do Estado no fomento do desenvolvimento sustentável no seu território de

origem, assumiram um caráter paliativo, imediatista e pontual (SILVA, 2003). O apelo à

sensibilização das consciências não poderia representar uma solução concreta a questão

ambiental porque tendia a naturalizar as relações capitalistas, não se contrapondo aos seus

fundamentos estruturais, bem como, a particularizar nos indivíduos a responsabilidade pelo

resgate de um futuro de esperança.

Após essa grande Conferência (a Rio 92), as discussões sobre desenvolvimento

sustentável ganham novos formatos e contemplam novos indicadores, ou seja, além da

economia passa a estrategicamente integrar as dimensões social e ambiental, se constituindo

nos três pilares da sustentabilidade. Reivindica-se a partir de então, a necessidade do

estabelecimento de parcerias público-privadas para a construção da proposta de

sustentabilidade: governos, Estados- Nação, ONG’S, empresariado e a sociedade de uma

forma geral31

(COMPÊNDIO UNIETHOS, 2008).

Houve em 1997 uma sessão especial realizada pela Assembleia Geral, denominada de

Cúpula da Terra+5, a fim de revisar e avaliar a implementação da Agenda 21, bem como,

tecer orientações para sua implementação. Consta no documento final, a recomendação da

adoção de metas vinculadas juridicamente para redução das emissões de gases e efeito estufa

que geram mudanças climáticas e para uma maior movimentação dos padrões sustentáveis de

30 “Para assegurar o total apoio aos objetivos da Agenda 21, a Assembleia Geral estabeleceu, em 1992, a

Comissão para o Desenvolvimento Sustentável como uma comissão funcional do Conselho Econômico e Social.

A Cúpula da Terra também levou à adoção da Convenção da ONU sobre a Diversidade Biológica (1992) e a

Convenção da ONU de Combate à Desertificação em Países que sofrem com a Seca e/ou a Desertificação,

Particularmente na África (1994). Em 1994, a Conferência Mundial sobre o Desenvolvimento Sustentável dos

Pequenos Estados Insulares em Desenvolvimento, realizada em Barbados, adotou um Programa de Ação que

estabelece políticas, ações e medidas em todos os níveis para promover o desenvolvimento sustentável para estes

Estados”. (FONTE: http://www.onu.org.br/a-onu-em-acao/a-onu-e-o-meio-ambiente/.) 31

O conceito e o debate sobre sustentabilidade na atualidade, encontra-se tecnologicamente desenvolvido a tal

ponto que existem instituições cuja existência e missão justifica-se pela necessidade do cumprimento dos

objetivos do capital, atuantes no fomento e capacitação às intervenções empresariais no campo socioambiental

através do investimento social privado, a exemplo: do Instituto Ethos e o GIFE.

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distribuição de energia (produção e consumo), bem como, a erradicação da pobreza como um

pré-requisito para o desenvolvimento sustentável32

.

Anteriormente, em 1988, o PNUMA e a Organização Meteorológica (OMM) criaram

o Painel Intergovernamental para as Mudanças Climáticas (IPCC), que hoje se configura

como fonte de informação científica relacionada às mudanças climáticas. O Protocolo de

Kyoto, que instituiu metas obrigatórias para 37 países industrializados para redução de gases

estufa, foi adotado em 1997. Em 2002, houve a Cúpula Mundial sobre Desenvolvimento

Sustentável, em Johanesburgo (na África do Sul) com o objetivo de avaliar os possíveis

avanços e os retrocessos desde a Cúpula da Terra em 1992.

Entretanto, o protocolo de Kyoto, lançado em 1997, em muito contribuiu para a

mercantilização da natureza. Os “créditos de carbono” que dele são decorrentes se

constituíram em instrumentos de negociação no próprio mercado financeiro. As empresas que

conseguissem reduzir as emissões de Gases de Efeito Estufa (GEE), adquiria o direito de

emitir créditos de carbono e esses últimos passaram a ser precificados negociados no mercado

(KLIASS, 2012).

Os créditos de carbono tinham como um objetivo fomentar a substituição dos

processos produtivos considerados “sujos” por novos processos “limpos”. No entanto, o

volume alto dos títulos e sua negociação massiva criou um mercado, tendo vários tipos de

produtos financeiros a ele associado. Tais créditos passaram a ter cotação nas Bolsas de

Mercadorias, com análise das tendências de alta, das expectativas de queda, operações de

mercado futuro, dentre outras questões (KLIASS, 2012). Ou seja, o mercado vê vantagens

econômicas nos “serviços ambientais”.

Desse movimento podemos apreender que está implícita a perspectiva do capital de

universalizar as suas relações. Desse modo passou-se a incorporar a dimensão do meio

ambiente como mais um instrumento de acumulação e dinamização do mercado. Assim, a

problemática ambiental vai assumindo um caráter mercantil. Ao analisar essa questão, Silva

reflete que,

De fato, a propagação da temática ambiental em pleno processo

de expansão do ideário neoliberal lhe confere um caráter cada

32 Os princípios do desenvolvimento sustentável estão implícitos em muitas das conferências da ONU, incluindo:

A Segunda Conferência da ONU sobre Assentamentos Humanos (Istambul,1999); a Sessão Especial da

Assembleia Geral sobre Pequenos Estados Insulares em Desenvolvimento (Nova York, 1999); a Cúpula do

Milênio (Nova York, 2000) e seus Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (cujo sétimo objetivo procura

“Garantir a sustentabilidade ambiental”) e a Reunião Mundial de 2005.”Fonte: http://www.onu.org.br/a-onu-em-

acao/a-onu-e-o-meio-ambiente/. “

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vez mais mercantil, revestindo o seu conteúdo de uma tendência

à homogeneização das pautas de consumo e de produção,

impondo normas e regulamentos pretensamente capazes de

responder aos contundentes desafios do nosso tempo, mas que

têm revelado sua incapacidade de reverter os ritmos de

destruição da natureza (2010, p.216).

Nesse contexto, para Leff:

O discurso do desenvolvimento sustentável inscreve-se assim numa

“política da representação” (Escobar, 1995), que simplifica a

complexidade dos processos naturais e destrói as identidades culturais

para assimilá-las a uma lógica, a uma razão, a uma estratégia de poder

para a apropriação da natureza como meio de produção e fonte de

riqueza. Neste sentido, as estratégias de sedução e simulação do

discurso da sustentabilidade constituem o mecanismo extra-

econômico por excelência da pós-modernidade para a reintegração do

ser humano e da natureza à racionalidade do capital (O’Connor,

1993), gerando formas mais sofisticadas, sutis e eficazes para a

exploração do trabalho e a apropriação dos recursos naturais que a

aplicação da violência direta e a lógica pura do mercado (2001, p.25-

26).

No Brasil, a configuração de um movimento ambientalista tem suas primeiras

expressões na década de 1970 tendo como principais atores o Estado e a sociedade civil. Este

foi um movimento antagônico, em que a sociedade civil pressionava o Estado alertando

quantos as preocupações ambientais e a importância do debate. O Estado a priori limitava-se a

aprimorar a legislação, demorando a perceber e reconhecer a importância da problemática

ambiental. Todavia, na década de 1980, pelo agravamento dos problemas ambientais e a

disseminação das preocupações ambientais no mundo, o movimento ambietalista no Brasil,

gradativamente se torna multissetorial, ainda que com os mesmos processos e setores

envolvidos da década anterior. É importante chamar a atenção que até então, não se vinculava

a temática ambiental ao desenvolvimento socioeconômico.

Na década seguinte, especificamente no final dos anos de 1980 e início dos anos de

1990 o movimento ambientalista no Brasil vai se reconfigurando.

Nesse sentido, segundo Filho:

A fase final dos anos 80 e o ano de 1990 são marcantes no

ambientalismo brasileiro. Registram a mudança de um movimento que

se interessava pelos problemas ecológicos mas não os vinculava ao

tema do desenvolvimento socioeconômico: economia e ecologia eram

percebidas como realidades antagônicas. A acentuação da crise

econômica, a discussão e aceitação do conceito de desenvolvimento

sustentável expresso no Relatório de Brundtland, de 1988 (...), pela

maioria dos integrantes do movimento, e outras razões, fizeram com

que se passasse a considerar mais exclusivamente a perspectiva da

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proteção ambiental, mas sim esta em relação ao desenvolvimento

(2001, p.38).

Em 1990, o ambientalismo brasileiro passa a articular ao discurso ambiental à

dimensão do desenvolvimento socioeconômico, frente à conjuntura de crise econômica a

nível mundial. A Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento,

também conhecida como Rio-92, é cristalização da acepção ao paradigma do

desenvolvimento sustentável, conforme já assinalamos.

No século XXI, as discussões sobre Desenvolvimento Sustentável no panorama

mundial e no Brasil, assumiram novos contornos diante da complexa dinâmica econômico-

produtiva do capitalismo contemporâneo e a conjuntura de crise instaurada onde se situa a

crise ecológica.

Após vinte anos da Rio 92, a Rio + 20, com o lema “crescer, incluir e proteger”,

novamente liderada pela Organização das Nações Unidas ocorreu em 2012 no mês de Junho

na mesma cidade, e mobilizou a grande cúpula da burguesia mundial e a sociedade,

apadrinhada pelos Estados-Nação, ONG’s, grandes empresas, para discutir, propostas e

agendas que terão de cumprir ao alcance do desenvolvimento sustentável que defendem

dentre outras questões, a “economia verde” e “limpa”, 33

.

A “Economia Verde” foi um debate central na Conferência das Nações Unidas sobre

Desenvolvimento Sustentável (CNUDS), conhecida como Rio+20, que ocorreu no Brasil –

simultânea a Cúpula dos Povos – cujo objetivo anunciado era o de “renovar os compromissos

políticos para o Desenvolvimento Sustentável”34

. Esse termo Economia Verde surgiu no

contexto da Rio 92, mas foi resgatado nessa Conferência. De acordo com Relatório Rumo à

Economia Verde: caminhos para o desenvolvimento sustentável e erradicação da pobreza do

Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), Síntese para tomadores de

decisão, é conceituada como:

(...) uma economia que resulta em melhoria do bem-estar

dahumanidade e igualdade social, ao mesmo tempoem que reduz

33

Dentre as discussões da conferência, estiveram presentes os seguintes eixos temáticos: Erradicação da pobreza

extrema, Segurança alimentar e nutricional, Equidade,Acesso à saúde, Trabalho decente, emprego e

responsabilidade social das empresas,Educação, Cultura, Gênero e empoderamento das mulheres, Promoção da

igualdade racial, Reforço do multilateralismo com participação da sociedade civil, Papel do Estado, Produção e

consumo sustentáveis, Energia, Cidades e desenvolvimento urbano, Transportes Agropecuária e

desenvolvimento rural, Promoção da inovação e acesso à tecnologia, Financiamento para o desenvolvimento

sustentável, Mudança do clima, Biodiversidade Combate à desertificação, Água, Oceanos, mares e zonas

costeiras, Pesca e aqüicultura, Florestas etc. (DOCUMENTO DE CONTRIBUIÇÃO BRASILEIRA À

CONFERÊNCIA RIO+20.)

34

Nesta, participaram mais de cento e noventa líderes de nações.

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significativamente riscos ambientaise escassez ecológica. Em outras

palavras, uma economia verde pode ser considerada como tendo baixa

emissão de carbono, é eficiente em seu uso de recursos e socialmente

inclusiva. Em uma economia verde, o crescimento de renda e de

emprego deve ser impulsionado por investimentos públicos e privados

que reduzem as emissões de carbono e poluição e aumentam a

eficiência energética e o uso de recursos, e previnem perdas de

biodiversidade e serviços ecossistêmicos. (PNUMA, 2011).

De acordo com Araújo e Silva:

Chama a atenção, no discurso dos ideólogos da economia verde, a

ausência de crítica ou mesmo de proposições alternativas quanto aos

atuais padrões de produção e de consumo, marcado pela obsolescência

programada das mercadorias – com vistas a encurtar a velocidade de

rotação do capital – com enormes dispêndios de recursos naturais e de

energia, além dos impactos já amplamente constatados do aumento da

produção de lixo. Ironicamente, é a própria Organização das Nações

Unidas (ONU) que atesta a insustentabilidade deste modelo e sua

incompatibilidade com as atuais condições de reprodução da vida no

planeta (...) (2012, p. 134).

No documento final da Rio+20, há uma forte contradição entre o objetivo anunciado

de “renovação de compromissos” - estabelecidos na Rio92- e o seu texto. Isto porque foram

desconsiderados princípios acordados na Rio92, como: o princípio do poluidor-pagador, o

princípio da precaução e o princípio das responsabilidades comuns, porém diferenciadas35

.

A prevalência do interesse pela manutenção do crescimento das taxas de lucro e da

acumulação em detrimento do meio ambiente efetivamente sustentável ficou evidente nas

posturas de países ricos, que inclusive, exigiram a retirada de um trecho do documento

principal da Rio + 20, intitulado “O Futuro que Queremos” sobre as “Responsabilidades

Comuns Porém diferenciadas”, que institui maior obrigação destes quanto ao empenho

financeiro na realização de ações “sustentáveis”36

. Porém, apesar de sofrer alterações na

35

O princípio do poluidor- pagador, impera a todas as empresas com atividades penosas ao meio ambiente a

necessidade de responsabilização própria, transferindo os custos com políticas de prevenção de danos, exigindo

medidas de monitoramento desses danos e se houver a constatação dos mesmos impõe também a reparação. O

princípio da precaução diz respeito à necessidade de articulação do desenvolvimento sustentável a longo prazo.

Das responsabilidades comuns, porém diferenciadas são impostas medidas a serem tomadas pelos países

desenvolvidos e em desenvolvimento considerando as diferenças dos padrões produtivos dos mesmos e seus

ecossistemas.Fonte:(Artigo:*Amyra El Khalili )http://www.institutocarbonobrasil.org.br/artigos/noticia=731616.

Acesso em: (20.01.2013). 36

Em uma elucidativa entrevista36

, Michel Löwy, intelectual marxista brasileiro, reflete que a Rio+20 foi um

campo favorável para criação de “negócios verdes”, com promessas vazias e grandes discursos ideológicos. A

realidade revela-nos que, “estamos com o pé no acelerador e nos precipitamos ao abismo”. Não podemos

esperar dos Estados, das Empresas, das Organizações Multilaterais, Organizações Mundiais, soluções reais e

compromisso efetivo com a preservação ambiental. Países desenvolvidos como os Estados Unidos, aponta

Michel Lowy, toleram a temática, visto que, suas ações voltadas a descoberta de fontes energéticas alternativas e

a intervenção mercadológica responsável para diminuição da emissão de CO2, são entraves para o alcance dos

objetivos mercadológicos. Dentre outras questões, Michel Lowy aponta como caminho, o ecossocialismo,

liderado pelos movimentos sociais e as ONG’s36

a eles vinculadas que o defendem. E a superação radical desse

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redação, os fundamentos desses princípios foram mantidos a despeito das críticas que os

países fizeram.

O fundo de US$ 30 milhões que se destinaria ao desenvolvimento de ações ditas

“sustentáveis”, nem mesmo teve sua aprovação concretizada. Numa conjuntura de crise

internacional e uma corrida para uma injeção de lucratividade nas economias, a discussão

desse fundo é imensamente contrária aos interesses do capital. Os objetivos para o

Desenvolvimento Sustentável, que se traduziriam em metas, nem mesmo fizeram parte das 49

páginas deste relatório supracitado. Todavia, o Governo Brasileiro por lançar a proposta do

programa Bolsa família como estratégia mundial para a Erradicação da Pobreza considerou o

documento e a própria Conferência, como avanços37

. Assim, as estratégias de enfrentamento

da crise socioambiental, estão aquém do que de fato se poderia esperar de um futuro

promissor por várias razões.

Esta conferência, além de pouco representar avanços no debate da crise ambiental foi

um espaço em que mais uma vez as grandes potências capitalistas mundiais tentaram recuar

quanto as responsabilidades mais sérias pelos impactos ambientais da produção destrutiva que

engendraram por décadas que supera a realidade a ação dos países em desenvolvimento,

conforme nos apresenta o questionamento do principio das responsabilidades comuns porém

diferenciadas que aludimos, em sintonia com seus interesses mercantis e geopolíticos38

.

O resultado disso, conforme aponta Khalili (2012), é a aceleração da financeirização

dos bens ambientais, como: água, biodiversidade, florestas (fauna e flora e patrimônio

genético) e minério. Isto num contexto em que o Estado que se ausenta de suas

responsabilidades nos moldes neoliberais, é benevolente e conivente com estes processos,

transferindo suas responsabilidades para as corporações através do sistema financeiro,

promovendo a fragilização de leis ambientais que asseguram a mínima proteção,

negligenciando a fiscalização e reprimindo os movimentos sociais e ambientais.

Este processo de financeirização dos bens ambientais tem se expressado na compra e

venda de Terra, água, recursos minerais dentre outros, por parte de países com recursos parcos

àqueles que têm em abundância. Segundo Khalili (2012), em geral as terras mais cobiçadas

são territórios das populações tradicionais, caiçaras, indígenas e quilombolas. Além dessas

sistema. Nesse sentido, “A única esperança então são os movimentos sociais e aquelas ONGs que são ligadas a

estes movimentos (outras são simples "conselheiros verdes" do capital).”

37

G1. Globo.com/Link: http://g1.globo.com/natureza/rio20/noticia/2012/06/rio20-foi-um-sucesso-diz-secretario-

geral-da-onu.html / Acesso em 04/07/2012. 38

Site pesquisado: http://www.revistaprincipios.com.br/principios/editorial-revista/274-rio-20-o-verde-e-objeto-

de-intensa-disputa-politica.html. Acesso em 02/08/2013.

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populações, os pequenos proprietários de terras dotadas de mananciais, represas, rios, águas

subterrâneas em suas propriedades também são vítimas de especuladores que se apresentam

com discursos de vantagens financeiras, segundo Khalili (2012), através de cartas de gaveta

(sidelitters)39

de compra e venda de áreas vinculantes aos créditos de carbono e de

compensações, ou seja, valendo-se das áreas como “garantia para negociar tais títulos”.

Esse movimento já ocorre na informalidade há 15 (quinze anos), à

revelia dos órgãos normatizadores e fiscalizadores, colocando em

risco a soberania nacional por conta de conflitos fundiários e rurais,

entre outros fatores territoriais. O mais alarmante é a velha troca de

votos por água. É delicada e preocupante a fragilidade das populações

que não têm acesso à água, em quantidade e qualidade, e ao

saneamento básico. Estas são reféns, há séculos, do voto de cabresto

(Ibidem).

Considerando as relações políticas internacionais, historicamente predomina uma

política de soberania entre os países. Isto porque cada um tenta articular, politicamente,

vantagens para exploração dos recursos naturais de outros países, da mão de obra, e dos

serviços ambientais que dispõe. Os Estados Unidos na Eco 92, recordemos, se recusou a

assinar o protocolo de Kyoto cujas determinações imperam a diminuição de gases estufa. Isso

significaria diminuir a produção, consequentemente o lucro, o que não representaria uma

vantagem a esta nação. Todavia, esta nação é uma das que mais poluem, emitindo grandes

quantidades de gases de efeito estufa.

Conforme reflete FILHO:

(...) no plano internacional, apesar da retórica de cooperação e

desenvolvimento sustentável, cada país argumenta acerca de sua

soberania e busca garantir politicamente a maior vantagem na

exploração dos recursos naturais e na utilização dos serviços

ambientais de outros países (Porter;Brown, 1991) (2001,p. 39).

Além disso, quanto aos acordos internacionais, dentro dessa política de soberania entre

os países, alguns deles, se recusam a assinar os acordos, visto que, eles impõem limites na

exploração de outros territórios e de seus recursos naturais, bem como, na produção industrial,

na tentativa de reduzir as ofensivas ao meio ambiente. Os Estados Unidos, por exemplo,

recusou a assinatura do acordo que obrigava os países à redução de 20% dos gases poluentes

na Rio - 92.

Segundo Zacarias (2012), existem dois argumentos que se destacam na abordagem

hegemônica do Desenvolvimento Sustentável: a crítica ao excesso da população e seu

39

São contratos não oficiais, geralmente acordados diretamente entre as partes interessadas vendedor e

comprador.

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impacto no meio ambiente; a crítica à finitude dos recursos naturais, principalmente aos atuais

padrões de produção e consumo.

No que se refere a essa primeira crítica, os segmentos dominantes atribuem os riscos e

impactos ambientais à pressão demográfica (desertificação, fome, esgotamento de recursos,

degradação do ambiente, entre outros). De acordo com Zacarias (2012), essa perspectiva do

controle demográfico busca referências nas discussões de Thomas Robert Malthus (1766-

1834)40

, quem inaugurou o debate sobre a relação dos aspectos demográficos e os recursos

naturais, em seu ensaio anônimo intitulado “Ensaio sobre o princípio da população e seus

efeitos sobre o futuro e aperfeiçoamento da sociedade, com observações sobre as

especulações de Mr. Godwin, M. Condorcet e outros autores.

Apesar da fragilidade dos argumentos da teoria de Malthus e de suas

projeções não se confirmarem, sua teoria conseguiu subsistir dois

séculos, sendo comum a menção de suas propostas quando se debatem

as questões relativas ao desenvolvimento, subdesenvolvimento,

demografia e meio ambiente. Segundo Rodrigues(2011), na década de

1970 a teoria malthusiana foi revisitada ao se iniciarem as discussões

sobre crescimento populacional como um entrave ao

desenvolvimento, argumentando que boa parte dessa população seria

formada por pessoas improdutivas, como jovens e crianças, e que os

recursos destinados a sustenta-las poderiam ser investidos na

produção, o que contribuiria para o progresso econômico dos países.

Nesse período, houve uma preocupação com o controle de natalidade

nas nações subdesenvolvidas; o Banco Mundial e o Fundo Monetário

Mundial começaram a exigir Políticas de Planejamento Familiar. Essa

preocupação se amparava na ideia de que a escassez de recursos e a

superpopulação impedem o desenvolvimento da humanidade

(ZACARIAS, 2012, p.134-135).

A ênfase no controle demográfico embasou as principais discussões sobre o

desenvolvimento sustentável, estando presente no documento Limites do Crescimento, que foi

base da Primeira Conferência sobre Meio Ambiente e Direitos Humanos em 1972, bem como,

no texto do relatório final da Comissão sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, no

Manifesto Ambiental da Conferência das Nações Unidas e é retomado na Segunda

Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente, que ocorreu em 1992, no Rio de

Janeiro. Assim, a Agenda XXI, que foi o principal documento resultante dessa conferência,

também discute as questões ligadas à dinâmica demográfica e a sustentabilidade.

Na análise de Zacarias:

40

Segundo as análises de Malthus, o princípio da população era o mais importante e norteava a sociedade

humana. Ele acreditava que havia a necessidade de garantir o equilíbrio entre o crescimento populacional e o

crescimento dos meios de subsistência. Em sua visão, havia desproporção entre a sobrecarga populacional e o

crescimento dos meios de subsistência. Logo, propôs a abstinência sexual para as classes menos favorecidas e a

redução dos programas assistencialistas governamentais e privados (Zacarias: 2012).

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Apesar de não citar a teoria Malthusiana e incluir outros elementos na

discussão, como por exemplo, os padrões não sustentáveis de

consumo, ela apresenta como proposta um dos argumentos

malthusianos: o controle demográfico (2012, p.136).

A segunda crítica enfatizada pela perspectiva hegemônica quanto ao Desenvolvimento

Sustentável, diz respeito a análise destrutiva dos padrões de produção e consumo vigentes

desde a década de 1960, onde se reconhece que a intervenção predatória sobre os recursos da

natureza se traduziria na limitação do crescimento à humanidade e provavelmente em um

colapso.

(...) Na década de 1990, essa preocupação foi retomada na

Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e

Desenvolvimento. A agenda XXI, ao abordar o tema Mudança dos

Padrões de Consumo, diz que “[...] as principais causas da

deterioração interrupta do meio ambiental mundial são os padrões

insustentáveis de consumo e produção, especialmente dos países

industrializados” (CMMAD, 1997, p. 39). Reconhece ainda que, em

determinadas partes do mundo, os padrões de consumo são muito altos

e que existe um amplo seguimento da sociedade que não é atendido

em suas necessidades básicas. É importante ressaltar que, apesar de o

documento reconhecer a desigualdade no consumo entre países ricos e

pobres, as alternativas recomendadas para o enfrentamento da

problemática sugerem apenas mudanças comportamentais na forma de

consumir e produzir (ZACARIAS, 2012, p.136-137).

Do ponto de vista de redução do consumo as alternativas propostas na Agenda 21

instituem aos governos o compromisso de estimularem aos grupos de consumidores a

consciência sobre as consequências do seu consumo exacerbado, ou seja, atuar diretamente

sobre o comportamento de consumo, indicando inclusive a procura por produtos

ambientalmente saudáveis. No que tange aos processos produtivos, dizem respeito a adoção

de técnicas e tecnologias ambientalmente responsáveis, para o uso eficiente da energia e dos

recursos.

Embora esse documento reconheça a diferença entre a produção e o consumo entre os

países ricos e pobres, que segmento expressivo de seres humanos sequer tem suas

necessidades básicas atendidas, os limites dos recursos naturais e a necessidade de ruptura

com o alto padrão de destruição do mercado e das sociedades com a produção e consumo

elevados, compreensivelmente, não discutem as contradições que permeiam esse processo.

Esta ausência da análise das contradições que envolvem os acordos internacionais que

se desdobram em estratégias como as que estão presentes nesses documentos tem relação com

a perspectiva de obscurecimento dos reais interesses da classe que o defende.

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59

Ora, as contradições a que nos referimos estão nas próprias relações sociais vigentes

no capitalismo que determinam essas problemáticas a começar pela forma de distribuição dos

meios de produção e das riquezas socialmente produzidas que irão incidir diretamente na

forma de pertencimento e uso do meio ambiente. Além disso, as alternativas propostas

também redundam a criação de novas formas de consumo e não o rompimento radical com as

atuais, promovendo um culto ao mercado e ao modo de produção capitalista pautado pela

ideologia da produção e do consumo verdes, sustentáveis, poupadores e eficientes.

(...) Numa análise superficial, pode-se compreender que os

argumentos apontados pela visão hegemônica, relacionada à

população e ao meio ambiente, e os altos padrões de consumo estão

ligados aos limites dos recursos naturais, levando ao entendimento de

que existe uma contradição insuperável entre um mundo com recursos

finitos e um crescimento da produção. No entanto, a contradição entre

os limites físicos e o desenvolvimento social é equivocada, uma vez

que a sociedade nunca se defronta em seu conjunto com limites

físicos, pois, como muito bem esclarece Foladori (2001 a, p.18), [...] a

sociedade humana antes de depara com limites naturais ou físicos está

frente a frente com as contradições sociais” (ZACARIAS, 2012,

p.138).

Nesse contexto, a compreensão do Desenvolvimento Sustentável deve considerar as

questões econômicas e sociais. A crise ambiental não é um fator isolado, dissociado das

relações de reprodução social do capital. É exatamente em decorrência delas, que a

degradação do meio ambiente ocorre, pelos interesses que movimentam o atual modelo de

exploração econômico que considera o lucro em detrimento da natureza e seus recursos.

As soluções técnicas desenvolvidas em prol do desenvolvimento sustentável são

influenciadas por essas relações sociais. Segundo Foladori (2012) numa sociedade em que as

relações sociais promovem a degradação do meio ambiente, as alternativas técnicas só podem

ser paliativas, transferir o problema de um lugar para o outro. E, as relações sociais

capitalistas expressam essa relação. Portanto, dentro do capitalismo só é possível oferecer

soluções pontuais aos problemas ambientais, a economia e o desenvolvimento em harmonia

com a natureza são inalcançáveis. Adicionalmente, o capital não é capaz de solucionar o

problema da desigualdade social e da pobreza porque elas estão implícitas a sua dimensão

estrutural.

Assim, segundo Silva,

O ideário do Desenvolvimento Sustentável - e a unanimidade que

suscita – revela seu caráter ideológico. A subordinação às relações de

propriedade burguesas se faz à custa de um crescente distanciamento

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entre discurso e realidade: o apelo à solidariedade, à justiça social, à

utilização racional dos recursos naturais e à preservação da natureza

articula-se dialética e contraditoriamente com o aprofundamento da

devastação do planeta, com a crescente descartabilidade e com a

degradação da vida humana, apesar dos inúmeros acordos e pactos

internacionais firmados em nome de uma ética ambiental abstrata

(2010, p.228)

Os problemas ambientais e os limites físicos que hoje vivenciamos são vistos pelo

capital como entraves para o desenvolvimento, consequentemente se configuram como

problemas técnicos que podem ser revertidos com alguns ajustes. Assim, a crise

socioambiental passa a ser uma oportunidade de negócios, criando um “mercado verde”. O

que tem transformado a natureza em um ativo, na linguagem do mercado financeiro, como

outro qualquer, portanto, alvo da competitividade, disputa política (histórica) e financeira.

Mas acima de tudo, fonte de lucros. Logo, segundo Zacarias:

A perspectiva hegemônica considera, ou melhor, crê que a tecnologia

é a solução para os problemas ambientais. Em relação aos padrões de

produção e consumo, tanto as propostas oficiais, como a Agenda XXI,

quanto as propostas das organizações da sociedade civil, que

comungam com essa perspectiva, são unânimes em apontara

tecnologia aliada a um trabalho educativo como o caminho para que se

atinja a qualidade ambiental e o chamado desenvolvimento sustentável

(2012, p.139).

Não se efetiva um debate que verse sobre uma ruptura com o modelo econômico-

produtivo vigente. Percebemos que se priorizam discussões sobre o desenvolvimento de

estratégias e de tecnologias produtivas e sociais que viabilizem o hipotético equilíbrio entre

economia capitalista, natureza e a dimensão social. Assim, as principais propostas para

desenvolvimento sustentável residem na ideia de manter o produtivismo com a possibilidade

de sustentabilidade ambiental. Isto expressa uma forte contradição, em se tratando do sistema

capitalista, pois este é mantenedor das desigualdades sociais e da degradação ambiental.

Nestes termos, o Desenvolvimento Sustentável, como expressão da

tentativa de estabelecer mecanismos de controle da relação

sociometabólica – via superação dos limites físicos e ideopolíticos à

sua reprodução -, apresenta-se bastante restrito. A natureza técnica das

respostas empreendidas, ao não questionarem os fundamentos da

dilapidação ambiental, parecem reiterar a incapacidade de o sistema

do capital reconhecer fronteiras à sua expansão (SILVA, 2010, p.

226).

Os fundamentos da proposta do “capitalismo verde” não são compatíveis com seu

modelo produtivo. Considerar a questão da preservação ambiental pressupõe erradicar um

modelo produtivo imensamente destrutivo dos recursos ecológicos, que considere de fato as

necessidades da classe trabalhadora e não do mercado.

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2.3Economia Verde: o novo discurso hegemônico e ideológico do capital

Estando vivenciando um tempo histórico que nos apresenta graves problemas

ambientais, sociais e econômicos, que nas últimas décadas se acirraram e trouxeram à tona a

necessidade de discussão sobre as causas, consequências e as alternativas de transformação, e

ainda, de posse de todo conhecimento acumulado sobre o sistema de “coisas” que representa o

Modo de Produção Capitalista, irrompe em nós as seguintes questões: O que se caracteriza

por Economia Verde? De que forma isso representa um discurso ideológico do/para o capital?

Qual o papel da ideologia no modo de produção capitalista, isso tem relação com a

consolidação de um conceito dessa ordem? A que interesses a difusão desse discurso

responde? Essas foram algumas das inquietações que balizaram o nosso olhar sobre o

significado do conceito de Economia Verde numa conjuntura global de crise do capital, nas

quais iremos contribuir para o debate crítico.

Iniciemos nossa discussão, refletindo alguns aspectos do Relatório do Programa das

Nações Unidas para o Meio Ambiente- PNUMA intitulado Caminhos para o

Desenvolvimento Sustentável e a Erradicação da Pobreza – Síntese para Tomadores de

Decisão. Nele, o conceito de Economia Verde é apontado como um desdobramento, um

resultado das discussões que versam sobre o Desenvolvimento Sustentável numa conjuntura

em que segundo os intelectuais orgânicos do capital a população mundial encontra-se

desacreditada do paradigma econômico vigente por suas falhas e sucessivas crises.

Em verdade, mais do que um descrédito da sociedade, a humanidade encontra-se

ameaçada por esse mesmo paradigma vigente, que fez imperar relações de produção,

conforme viemos discutindo ao longo do nosso trabalho, imensamente exploratórias e

destrutivas, e que o fez reconhecer forçadamente o saldo dessa intervenção pelos sinais

evidentes do esgotamento do meio físico sobre o qual se ancora para conduzir sua lógica, o

meio ambiente. Não se trata, pois, de (des) creditar o capitalismo. Além disso, mais do que

reconhecer os impactos de sua própria “autodestruição”, levando em consideração a

destruição das suas duas fontes de riqueza, a natureza e o trabalho (humano), pensar de que

forma poderá se manter ativo dadas as novas condições ambientais de escassez de recursos.

Quem dominará o que? De que forma se poderá lucrar numa dada economia apartada da

dependência do petróleo?

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A crise do capitalismo financeiro, por exemplo, cujo denotador aparece no cenário

mundial em 2008, que é mencionada no referido relatório é a cristalização de um sistema que

se tornou mundializado via um mercado desregulamentado, voraz e imperialista que, em dado

ponto da história, um período também de crise, reestrutura suas bases para “reanimar” o

mercado e alimentar sua necessidade sempre expansiva. Assim a ideia lançada de

“[...]grande desilusão em relação ao nosso paradigma econômico predominante; uma

sensação de fadiga emanando das várias crises simultâneas e falhas de mercado vividas

durante a primeira década do novo milênio [...]” difunde uma noção desistoricizada, pouco

crítica, mas sobretudo, carregada pela ideologia dominante, para perpetuação da lógica

produtivista vigente.

Pensar a Economia Verde, de acordo com o referido documento, requer considerar

uma economia que tenha como resultado a melhoria do bem- estar da humanidade e na

igualdade social, a diminuição dos riscos ambientais e da escassez ecológica. A Economia

Verde teria como pilares: a busca pela baixa emissão de carbono na atmosfera; a eficiência no

uso dos recursos; e a uma política inclusiva.

Em uma economia verde, o crescimento de renda e de emprego deve

ser impulsionado por investimentos públicos e privados que reduzem

as emissões de carbono e poluição e aumentam a eficiência energética

e o uso de recursos, e previnem perdas de biodiversidade e serviços

ecossistêmicos. Esses investimentos precisam ser gerados e apoiados

por gastos públicos específicos, reformas políticas e mudanças na

regulamentação. O caminho do desenvolvimento deve manter,

aprimorar e, quando possível, reconstruir capital natural como um bem

econômico crítico e como uma fonte de benefícios públicos,

principalmente para a população carente cujo sustento e segurança

dependem da natureza (PNUMA,p.01-02).

Advoga-se no Relatório do PNUMA que essa inclinação do capital à Economia Verde

reflete os intentos pela consolidação de um suposto novo paradigma econômico em que o

alcance da riqueza material não possa ocorrer sob o peso do risco ao meio ambiente, marcado

por escassez ecológica e disparidades sociais. Eis a natureza conflitiva desse debate.

Segundo Silva:

Os arquitetos do Desenvolvimento Sustentável propõem um processo

de incorporação dos critérios ambientais na e pela atividade produtiva,

a fim de que seja assegurado o crescimento econômico (tido como

condição para obter-se os padrões desejados de desenvolvimento), ao

mesmo tempo que sejam respeitadas as condições de renovação e a

capacidade dos ecossistemas existentes no planeta [...] Em síntese, o

desenvolvimento sustentável se apresentam como reação social e

política à “estreiteza do cálculo econômico-financeiro”, embora de

conteúdo impreciso e de exequibilidade um tanto controversa

(2010,p.166).

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As soluções técnicas articuladas pelo capital para conter os danos da produção ao meio

ambiente têm dividido opiniões quanto a sua efetividade e gerado polêmicas entre seus

próprios defensores sobre os impactos destas para o meio ambiente. Além disso, por

representarem custos, e custos altos para sua implementação, não se pode esperar que serão

priorizadas, que assumirão posição de destaque nas diretrizes do mercado, porque o objetivo

da produção no capital é a geração de riqueza abstrata, acumulação de lucro. As relações de

produção são alicerçadas nas diferenças das classes, das formas de pertencimento dos sujeitos

no capitalismo provocadas pela separação do trabalho dos meios de produção, da relação

social e histórica que se cria com trabalho e a natureza pelo capital, que é de exploração.

Donde a crise socioambiental e a desigualdade social erigem da dinâmica estrutural desse

sistema. Logo, sua perpetuação, as tais soluções técnicas que visam redirecionar a lógica

produtiva colocando o capitalismo pela busca de eficiência energética e sustentável,

pressupõe risco ao meio ambiente, escassez ecológica e disparidades sociais, indo na

contramão dos objetivos enunciados.

Defende-se como diretriz no referido documento o ” esverdeamento” da economia,

com políticas verdes, empregos verdes, mercados verdes, o que implica:

Para os governos, esta deve incluir o nivelamento de produtos mais

verdes através da eliminação progressiva dos ultrapassados subsídios,

a reforma de políticas e o fornecimento de novos incentivos, o

fortalecimento da infraestrutura de mercado e mecanismos de base de

mercado, o redirecionamento do investimento público e tornar mais

verdes os contratos públicos. Para o setor privado, isso envolveria

entender e aproveitar a verdadeira oportunidade representada pela

transição das economias verdes em relação a um número de setores

chave, e responder à reformas políticas e aos sinais dos preço através

de níveis cada vez mais altos de financiamento e investimento

(PNUMA, p.1-02).

Essa argumentação se alicerça na visão de que seria vantajosa, do próprio ponto de

vista econômico, essa “inversão de valores” dos mercados, portanto, a adesão à “Economia

Verde”.

De fato, sob o argumento do esverdeamento da economia, o capital,

em face da impossibilidade de escamotear os gravosos efeitos da

“questão ambiental”, promove o desfecho de um novo escopo

ideopolítico, o qual tem como suposto a necessidade de convencer a

todos e a cada um da contínua capacidade do sistema de “reformar-

se”, em prol do seu aprimoramento, beneficiando, assim o conjunto da

sociedade. Enquanto isso, segue a sua trajetória inexorável em busca

do aumento de sua lucratividade, apropriando-se vorazmente do

conjunto dos recursos planetários – de modo a comprometer as

condições de reprodução das múltiplas formas de vida – ainda que o

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faça sob nebuloso discurso verde ou em nome da sustentabilidade (

ARAÚJO & SILVA, p.141).

Reconhece-se neste documento que nos últimos tempos apresenta-se um desgaste dos

recursos ecológicos e uma desigualdade sem precedentes, que ameaça a existência humana e

nos dá um prognostico alarmante de um futuro de escassez que começará a nos acometer

estimativamente em 2050, quando a população mundial crescerá substancialmente, colocando

em xeque a capacidade do meio ambiente de suportar as implicações desse crescimento. Fato

a que se julga no texto o mau uso do capital através do investimento centrado: a) na pobreza;

b) nos combustíveis fósseis e c) nos bens financeiros estruturados com derivativos

incorporados; em detrimento, do pouco investimento em energias renováveis, eficiência

energética, transporte público, agricultura sustentável, proteção dos ecossistemas e da

biodiversidade, e conservação da terra e das águas.

No entanto, o fato de essa percepção do saldo destrutivo para o meio ambiente e para o

social das estratégias de crescimento e desenvolvimento econômico adotadas até então fazer

parte do texto desse relatório, não podemos assumir as alternativas propostas como aceitáveis

porque reiteram o paradigma vigente, não se defende uma concepção radicalmente oposta a

uma dinâmica que segue acirrando os problemas socioambientais.

Numa visão superficial, pode parecer que a proposta da economia verde é o

instrumento pelo qual os problemas ambientais e sociais serão solucionados.

No entanto, numa perspectiva crítica e de totalidade, é possível dizer que a

economia verde é uma representaçãoem uma nova embalagem das estratégias

que vem sendo defendidas pelo capital desde a década de 1990, só que agora

atualizada por uma leitura conjuntural mais pertinente com a realidade

contemporânea, em que a ideia mais abrangente de Economia parece trazer

benefício de um olhar mais integrador do que no âmbito das empresas

(ZACARIAS, 2012, p. 141).

No corpo do próprio texto do Relatório do PNUMA em questão, ressalta-se que pensar

a sustentabilidade ambiental dicotomizada da economia é um mito. Há um compromisso

assumido da economia verde com o capital. Ela é apresentada como um campo que apresenta

oportunidades econômicas, vantagens ao mercado.

É nesse contexto que se pode afirmar que somente o esverdeamento da

economia não consegue implementar as mudanças necessárias que atual crise

ambiental exige. A Economia Verde é uma estratégia pensada dentro da lógica

do mercado fundado em business verde, instrumentos de mercado e

precificação dos recursos naturais e apropriação do bem comum. Além disso,

concordando com o professor Sawyer (2011), a economia verde é uma

proposta que tende a se tornar uma lavagem verde cosmética, pois pode se

resumir a atividades ou projetos verdes atualmente na moda, tais como painéis

fotovoltaicos, moinhos eólicos, parques nacionais remotos, pontos de

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reciclagem de lixo, hortas orgânicas e pousadas ecoturísticas na selva

(ZACARIAS, 2012,p.147).

Com a interferência da “economia esverdeada”, a partir desse conceito de Economia

Verde, a natureza passa a ser um ativo econômico, como outro qualquer, capital natural, na

lógica do mercado financeiro. Portanto,

[...] as propostas produzidas pelos órgãos oficiais que preconizam o

desenvolvimento sustentável, como a Agenda XXI e a Economia Verde,

evidenciam o compromisso da corrente hegemônica com a conservação da

ordem política, social e econômica vigente. Essas alternativas são pensadas

dentro da lógica do mercado e se conectam perfeitamente, portanto, ao fluxo

da historia das classes dominantes (ZACARIAS, 2012, p.147)

Segundo Camila Moreno, pesquisadora e coordenadora de sustentabilidade da ONG

ecológica Alemã Fundação Heinrich Böll, em fala transcrita pela Carta Maior, em 201241

,

adiscussão sobre Economia Verde é operada tendo como horizonte o tempo em que estamos

até o ano de 2020, quando então tanto a Organização das Nações Unidas – ONU assumirá

uma nova arquitetura institucional e financeira, quanto em termos de marcos legais nos

países. Assim como se leva em consideração um período mais longo que compreende até

2050 quando imaginam que estará consolidada a transição de uma economia pós-petroleira.

De acordo Camila Moreno a “Economia Verde é intrinsecamente dependente da

economia marrom, da economia petroleira”.

O que está em jogo no horizonte é como o capitalismo vai viver para além dos

combustíveis fósseis. Assim, a Economia Verde surgiria como alternativa para

viabilizar não só a expansão da atual economia petroleira até seu limite, mas

também o controle das novas fontes de energia pelas mesmíssimas empresas e

grupos de poder que mandam no petróleo. “Economia Verde” é

fundamentalmente como vai se extrair mais recursos naturais e quem vai

controlar esses recursos”.

O conceito de Economia Verde surge logo após o lançamento do relatório da ONU

sobre o impacto econômico das mudanças climáticas. A partir de então são construídos planos

para a transição de uma economia de baixo-carbono tendo como principal medida imediata a

aposta nos agrocombustíveis. Cabe ressaltar que em 2008 no contexto da explosão dos

agrocombustíveis, a crise alimentar também foi uma realidade. No entanto, segundo Camila

Moreno:

41

“Economia Verde é no novo discurso hegemônico, diz pesquisadora”, transcrição de fala de Camila

Moreno, por Rodrigo Otávio, Disponível em: http://www.cartamaior.com.br/?/Editoria/Meio-

Ambiente/Economia-verde-e-novo-discurso-hegemonico-diz-pesquisadora/3/25270. Acesso em: 23/08/2014.

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[...] ideia de baixo-carbono não colou depois de 2008, quando a ideia de

‘baixo’, ‘pequeno’ ou ‘diminuir’, era completamente ao contrário do senso de

superação da crise. Então todos os textos de economia de baixo carbono foram

rebatizados para desenvolvimento verde, e daí ficou o verde.

Dessa forma, ainda na discussão de Camila Moreno, o debate de economia verde se

entrelaça ao de clima e energia, uma vez que, a partir da construção de uma política nacional e

de planos de ação dos países “que vai se introduzir a ideia de criação de mercado dos ativos

ambientais, perdendo toda a construção política do que é agroecologia e disputa de

sistemas”.

Cabe notar que o incentivo a criação desses novos mercados denominados verdes,

abrem um novo espaço para acumulação do capital. Nesse sentido, Camila Moreno

exemplifica que no Relatório das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), há uma

definição do “estoque e o fluxo de serviços ecossistêmicos” como “constituição” do capital

natural.

“Ou seja, o ‘estoque e o fluxo de serviços ecossistêmicos’ é a polinização das

abelhas, respiração das aves, a água e a fertilidade do solo, traduz a

pesquisadora, acrescentando que, ainda segundo o PNUMA, “o erro da

economia marrom é que até agora ainda não conseguiu dar valor (preço) a

esses ativos. O enredo se dramatizaquanto temos um contexto em que “esses

ativos”, os recursos naturais, estão cada vez mais escassos. Aí, salienta

Camila, entra “a velha e boa garantia de direitos de propriedade sobre esses

ativos ambientais”. Ela alerta que no Brasil a questão está explicitada no

Código Florestal, quando o capítulo 11 cria o certificado de Cobertura da

Reserva Ambiental e dá poderes aos proprietários de terra com excedentes de

reserva legal a registrarem e negociarem essas “sobras” em bolsas de valores,

as futuras bolsas verdes”42

.

A indicação de que no ano de 2012 as emissões de CO2 (Dióxido de Carbono)

subiram 1,4% no mundo – número esse considerado recorde pela Agência Internacional de

Energia (AIE) – que divulgou um relatório, onde constava que nesse mesmo ano foi registrada

a emissão de 31,6 gigatolenadas de gases-estufa, considerando as diferenças de regiões (em

que umas aumentam e outras diminuem tais práticas), se confronta com a ideia de que o

desenvolvimento da economia possa considerar essa quebra da poluição pela recorrência aos

combustíveis que geram esses gases. Cabe notar que os países em desenvolvimento, como a

China, tem liderado o ranking dos países que mais emitem os gases-estufa, em relação aos

EUA e a Europa, que embora o tenham feito por um longo período de tempo, em relação ao

primeiro tem conseguido diminuir seus índices pela adoção tecnologias e recorrência a fontes

42

“Economia Verde é no novo discurso hegemônico, diz pesquisadora”, transcrição de fala de Camila

Moreno, por Rodrigo Otávio, Disponível em: http://www.cartamaior.com.br/?/Editoria/Meio-

Ambiente/Economia-verde-e-novo-discurso-hegemonico-diz-pesquisadora/3/25270. Acesso em: 23/08/2014.

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renováveis. Todavia, o Japão segue no movimento contrário, aumentando em 70 milhões de

toneladas, ou 5,8%. O que caracteriza um risco ambiental expressivo. Mesmo que a orientação

da comunidade científica seja que o aumento da temperatura média global se limite a 2°C

para que se evite os efeitos climáticos43

.

Em decorrência de desastres ambientais provocados pelos elevados índices de

degradação ambiental, a pobreza extrema deverá acometer uma massa ainda maior de seres

humanos no globo, até 2050, conforme fragmento do artigo consultado do portal brasileiro de

notícias G1, com dados oriundos do Relatório do Desenvolvimento Humano 2013:

Apesar dos investimentos de vários países em energias renováveis e

sustentabilidade, o mundo pode viver uma "catástrofe ambiental" em 2050,

segundo o Relatório de Desenvolvimento Humano 2013, apresentado [...] pelo

Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud).Ao fim dos

próximos 37 anos, são estimadas mais de 3 bilhões de pessoas vivendo em

situação de extrema pobreza, das quais pelo menos 155 milhões estariam na

América Latina e no Caribe. E essa condição demográfica e social seria

motivada também pela degradação do meio ambiente e pela redução dos

meios de subsistência, como a agricultura e o acesso à água potável. De

acordo com a previsão de desastre apresentada pelo relatório, cerca de 2,7

bilhões de pessoas a mais viveriam em extrema pobreza em 2050 como

consequência do problema ambiental. Desse total, 1,9 bilhão seria composto

por indivíduos que entraram na miséria, e os outros 800 milhões seriam

aqueles impedidos de sair dessa situação por causa das calamidades do meio

ambiente. No cenário mais grave, o Índice de Desenvolvimento Humano

(IDH) global diminuiria 15% em 2050, chegando a uma redução de 22% no

Sul da Ásia (Índia, Paquistão, Sri Lanka, Nepal, Bangladesh, Butão e

Maldivas) e de 24% na África Subsaariana (todos os países ao sul do Deserto

do Saara)44

.

Os próprios dados oficiais de organismos internacionais como a ONU que defendem o

conceito de Desenvolvimento Sustentável e mais recentemente de Economia Verde,

reconhecem que as ações ditas “sustentáveis” não evitarão as catástrofes ambientais previstas

para os próximos 36 anos, caso sejam mantidos os atuais índices de degradação ambiental por

gases de efeito-estufa, dentre outras questões. Falamos de miséria por escassez de água

potável, alimentos, desastres ambientais (terremotos, enchentes, furacões, aumento do volume

das águas pelo derretimento das geleiras, etc).

Cabe notar que, essas desastres ambientais, já têm acontecido. Basta rememorar as

grandes catástrofes que presenciamos nos últimos anos, como os terremotos que provocaram

Tsunamis e deslizamentos de terras, enchentes, furacões, que não só provocaram massacres

43

FONTE: http://g1.globo.com/natureza/noticia/2013/06/emissoes-de-co2-no-mundo-batem-novo recorde-em-

2012-aponta-aie.html. Acesso em: 24/07/2014. 44

FONTE: http://www.pbmc.coppe.ufrj.br/pt/noticias/326-relatorio-da-onu-preve-catastrofe-ambiental-no-

mundo-em-2050. Acesso em 24/07/2014.

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humanos, como também desalojaram pessoas, provocaram escassez de alimentos e grandes

danos ambientais. Onde a parcela que mais sofre as consequências desses desastres ocupam as

regiões periféricas urbanas, nelas residindo, regiões irregulares, insalubres, inseguras, sem

nenhum planejamento e projeto, com uso predatório dos recursos da natureza, dada ausência

de informações e formação pedagógica que elucide o contrário, graças ao fenômeno

“afavelamento” da classe trabalhadora provocado pelo capitalismo, o sistema das

desigualdades sociais.

A ameaça ao desenvolvimento humano no capital não se limita as relações de

produção. As disputas históricas pelo poder, de caráter territorial, que se desdobraram em

grandes guerras, também o fizeram, pelas lutas sangrentas, bombas atômicas, armas químicas,

fome e miséria, catástrofes ambientais etc – O que tem acontecido em pleno século XXI, com

os conflitos que estão ocorrendo no Oriente Médio, entre palestinos e israelenses.

A partir dessas reflexões vemos o peso ideológico que o discurso hegemônico de

Economia Verde tem para construção da falsa consciência da impossibilidade de romper com

o paradigma econômico vigente e seu modelo de urbanização. Quando nesse momento,

assistimos a negociação desses supostos “excedentes” ambientais, no futuro veremos a sua

acumulação, porque a mercantilização dos mesmos já está em curso.

Mas a ideologia no Modo de Produção Capitalista cumpre esse papel, de construir uma

forma de consciência social específica, na perspectiva de naturalizar, banalizar, tornar

irremediável, os interesses de uma classe também específica. Conclusivamente, também o é o

novo discurso hegemônico de Economia Verde. Na discussão de Mészáros,

Na verdade, a ideologia não é ilusão nem superstição religiosa de indivíduos

mal-orientados, mas uma forma específica de consciência social,

materialmente ancorada e sustentada. Como tal, não pode ser superada nas

sociedades de classe. Sua persistência se deve ao fato de ela ser constituída

objetivamente (e constantemente reconstituída) como consciência prática

inevitável das sociedades de classe, relacionada com a articulação de conjunto

de valores e estratégias rivais que tentam controlar o metabolismo social em

todos os seus principais aspectos. Os interesses sociais que se desenvolvem ao

longo da história e se entrelaçam conflituosamentemanifestam-se, no plano da

consciência social, na grande diversidade de discursos ideológicos

relativamente autônomos (mas, é claro, de modo algum independentes), que

exercem forte influência sobre os processos materiais mais tangíveis ao

metabolismo social (2012, p.63).

Dessa forma, o capitalismo não pode sobreviver sem recorrer a discursos falaciosos

que indiquem uma “reconciliação” entre seus interesses e os da sua classe antagônica. O

controle das consciência é uma vertente fundamental para sua manutenção, ou seja, a criação

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do consenso. Isto, vislumbrando o obscurecimento do conflito mais fundamental da arena

social que Segundo Mészáros,

[...] o conflito mais fundamental na arena social refere-se à própria estrutura

social que proporciona o quadro regulador das práticas produtivas e

distributivas de qualquer sociedade específica. Exatamente por ser tão

fundamental é que esse conflito não pode ser simplesmente deixado á mercê

do mecanismo cego de embates insustentavelmente dissipadores e

potencialmente letais. Na realidade, quanto menor for tal controle, maior será

o risco as calamidades implícitas no crescente poder de destruição à

disposição dos antagonistas (2012, p. 65).

Conclusivamente estamos diante de um paradoxo. Como podemos creditar ao

capitalismo (paradigma econômico vigente) a possibilidade de alcançar o equilíbrio entre

economia, meio ambiente e social, se num olhar mais atento a dinâmica contemporânea,

constatamos sua ineficiência no trato dessas questões ou até mesmo na condução da própria

economia, constantemente em crise? Não seria a Economia Verde, um discurso ideológico

falacioso que visa o consentimento das massas para manutenção do status quo? No entanto, o

que entendemos por ideologia, qual sua funcionalidade no capitalismo?

Segundo a discussão de Montaño e Duriguetto (2010), a ideologia pode ser

compreendida em três momentos. Numa primeira abordagem, a ideologia sinaliza um sistema

ordenado de ideias e representações sobre o que se é vivenciado na realidade e das normas de

comportamento, que por sua vez, se apresentam aos sujeitos como entidades autônomas, fatos

naturais e perenes, ocasionados pela separação entre o trabalho manual e intelectual, que,

todavia, resultam das condições objetivas da própria existência dos indivíduos. Compreende-

se aqui, que a produção de ideias, de representações e da própria consciência está articulada

com a atividade material e com o intercâmbio material dos homens. De modo que,

parafraseando Marx, ou autores indicam que não é a consciência que determina a realidade,

mas a realidade que determina a consciência.

Assim, ao assumir uma ideologia, os sujeitos expressam um entendimento

determinado do mundo, da sua própria condição e suas ações irão refleti-la. Ou seja, ver/viver

o/no mundo, perceber a si próprio e agir diante dos fatos imediatos a partir de uma ideologia.

Assim, a “ideologia burguesa”, “proletária” e “religiosa” são expressões dessa questão.

Na segunda forma de acepção do termo ideologia, ela será vista em suas relações e

contradições entre si. Isso significa que, no Modo de Produção Capitalista (MPC), por

exemplo, por constituir uma sociedade de classes, onde os interesses entre as mesmas serão

antagônicos, as ideologias (visões de mundo e que indicam o comportamento dos sujeitos), se

confrontarão e expressarão a defesa dos mesmos. De modo que, as formas de ideologia

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(burguesa, proletária, conservadora, revolucionária), se conflitam por serem distintas e

representarem interesses antagônicos, irreconciliáveis. Assim, as visões de mundo, ideias e

valores serão igualmente diferentes.

O terceiro momento, que estes autores refletem, irá caracterizar o intento pela

imposição de uma ideologia perante as outras, ou seja, a transformação daquilo que expressa

um conjunto de ideias de uma classe específica, em ideias que sejam aceitas por todos,

universais. Isso nos permite estabelecer vinculo no Modo de Produção Capitalista (MPC),

entre a luta ideológica com as lutas de classes, porque estará em disputa a hegemonia das

ideias, da maneira dos indivíduos verem e viverem o/no mundo, a si mesmo e sua ações.

Assim, as ideologias conflitantes de qualquer período histórico constituem a

consciência prática necessária em termos da qual as principais classes as

sociedade se inter-relacionam e até se confrontam, de modo mais, ou menos,

aberto, articulando sua visão da ordem social correta e apropriada como um

todo abrangente (MÉSZÁROS, 2004, p.65).

É nessa perspectiva que,

[...] aceitar a exploração como dado natural ou enfrenta-la, imaginar a

desigualdade social e a pobreza como uma vontade divina ou como produto de

um sistema injusto; conceber a superioridade ariana sobre outras raças ou lutar

contra a discriminação racial; imaginar que o empresário “socialmente

responsável” realmente pensa e age pelo “bem comum” ou conceber o MPC

como um sistema com uma ineliminável contradição fundante entre capital e

trabalho, afirmar que o “marxismo é obsoleto” ou adotá-lo como instrumento

de análise crítica do MCP etc (MONTAÑO; DURIGUETTO, 20120, p.).

Cabe notar que a ideologia tem uma implicação prática, interfere na realidade.

[...] o que determina a natureza da ideologia, acima de tudo, é o

imperativo de se tornar praticamente consciente do conflito social

fundamental – a partir dos pontos de vista mutuamente excludentes das

alternativas que se defrontam em determinada ordem social – com o

propósito de resolvê-lo pela luta. Em outras palavras, as diferentes

formas ideológicas de consciência social tem (mesmo se em graus

variáveis, direta ou indiretamente) implicações práticas de longo

alcance em todas as suas variedades, na arte e na literatura, assim como

na filosofia e na teoria social, independentemente de sua vinculação

sociopolítica a posições progressistas ou conservadoras (MÉSZÁROS,

2004, p.66)

Nesse sentido, podemos compreender que para a classe dominante estabelecer-se

como tal é necessário não apenas valer-se das condições materiais para sua efetivação, mas

construir, difundir paralelamente, uma ideologia que reflita seus interesses e lhe possibilite a

hegemonia também no plano das ideias. Essa é uma necessidade da burguesia, ela precisa

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ampliar seu domínio à vida das pessoas, criando consenso para legitimar a ordem que lhe

favorece. Conforme a reflexão de Marx em a Ideologia Alemã que já pontuamos no decorrer

da nossa discussão, a classe que é poder material dominante é em todas as épocas o poder

ideológico dominante porque detém as condições concretas para fazer valer suas ideias.

Obviamente que hegemonia não significa consenso. Há um fator muito importante a

ser considerado - a correlação de forças. Ou seja, a disputa também ideológica que retoma as

lutas de classes.

Assim,

[...] Nesse sentido Lefebvre afirma que, “à medida que não existe sociedade

baseada na violência pura é a ideologia que obtém o consentimento dos

oprimidos, dos explorados. A ideologia os representa de maneira tal, que lhes

extorque, além da riqueza material, a aceitação e mesmo a adesão espiritual.

Ou seja, conforme Iamamoto, “a ideologia dominante é um meio de obtenção

do consentimento dos dominados e oprimidos socialmente, adaptando-os à

ordem vigente, sendo que para autora, “o modo capitalista de reproduzir e o

de pensar são inseparáveis, e ambos se expressam no cotidiano da vida social

(MONTAÑO & DURIGUETTO, p. 107)

Dessa maneira, o discurso ideológico do capitalismo verde tenta difundir essa ideia da

“virada do sistema” na perspectiva de considerar o que sempre ignorou, a capacidade da

natureza de prover os recursos necessários a sua sustentação, com um possível olhar sobre o

desenvolvimento social, para gerar consenso e “sobreviver” num tempo histórico em que suas

“vísceras” estão expostas. Sob o paradigma vigente, as crises são quase que uma constante,

nos campos: ambiental, social e econômico.

Temos em movimento, crises climáticas que ameaçam a fauna e a flora afetando a

biodiversidade, a iminência de escassez de alimentos, de água doce e potável, no setor

econômico, crises financeiras. Estas provocadas pela dinâmica das sociedades modernas, que

cresceram acompanhando o ritmo da industrialização e do desenvolvimento do paradigma

econômico vigente, que lançam sobre a atmosfera grandes quantidades de gases de efeito

estufa (ex: automóveis) pela queima massiva de combustíveis fósseis, gerando crises

climáticas descontroladas e incontornáveis. Além disso, sociedades se tornaram

energeticamente dependentes desses recursos da natureza.

O trato ideológico da crise ambiental na lógica mercantil o coloca como o

“antibiótico”, “medicamento”, grande solução para a “cura” das mazelas socioambientais do

nosso tempo, embora o mesmo represente o “agente etiológico” (a causa) (SILVA, 2010).

Portanto,

Para isso, para tornar as ideias da classe dominantes em ideias dominantes, a

“ideologia burguesa” na forma de ver e viver a realidade e os valores

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burgueses em valores socialmente aceitos, a burguesia precisa de alguns

artifícios, como a naturalização e o ocultamento da realidade social (tornando

os processos sociais como coisas naturais e incompreensíveis aos sujeitos), a

fetichização (que atribui às coisas, à mercadoria, fundamentalmente,

propriedades supostamente “naturais”, como se não fosse produto dos sujeitos

históricos, da história) e a reificação (como um aspecto da alienação, que

“coisifica” os sujeitos e as relações sociais, ou seja, os transforma em coisas,

mercadorias, dominadas por leis “naturais” do mercado). Os valores e normas

“naturalizados” e “ocultos”, as relações sociais “reificadas” os processos

capitalistas “fetichizados” são, então, desistoricizados; nesse sentido, são

vistos como naturais e compreensíveis ou indecifráveis, portanto, imutáveis. A

forma de fazer isso é desenvolvendo um tipo de racionalidade que seja ao

mesmo tempo segmentadora e manipuladora do real (MONTAÑO &

DURIGUETO: 2010, p. 107).

Uma vez distorcida a contradição capital/trabalho pela complexificação das relações

de produção, que conferiu nova dinâmica as classes sociais promovendo uma mobilidade das

mesmas e um fracionamento no seu interior, mantendo apenas as características definidoras

(detentores de riquezas e usurpados), - o que interferiu diretamente na consciência das

mesmas sobre sua realidade, sobretudo à classe trabalhadora – torna-se ainda mais funcional

impetrar a ideologia do “Capitalismo Verde”, porque em grande medida, a compreensão da

raiz dos problemas socioambientais cada vez mais é obscurecida pelo capital maduro,

permitindo uma maior aceitação, receptividade dessa perspectiva.

O processo de globalização/mundialização do capital que se ocorreu na lógica da

reestruturação produtiva que à sua efetivação articulou a ideologia do progresso, da conexão

entre os povos (cuja contra face é a expansão sem fronteiras do capital) acarretou um

desenvolvimento tecnológico que possibilitou não apenas maior acumulação, como também

maior força para padronização dos hábitos, comportamentos, das subjetividades, das culturas,

das ideias, pelos ditames do mercado. Isso implica numa ideia de pertencimento dos sujeitos

pela capacidade de possuir ou não bens disponíveis no mercado, de estar inserido nessa

lógica. Aqui, ser consumista (que possa pagar) assume inclusive um papel importante não só

para o mercado, como também, subjetivamente confere status de “ser” (sujeito) privilegiado.

O resultado disso é uma separação do entendimento do que isso representa para o

meio ambiente, para a sociedade, para os indivíduos que se perdem num universo de relações

materiais, pautadas cada vez mais pelo individualismo, e pela perda de valores genuínos

humanos.

Além disso, num mundo capitalista cada vez mais urbanizado, o entendimento da

relação campo/cidade, rural/urbano, é alienado. As pessoas vivendo em suas “caixas”

(vendidas por um mercado imobiliário, profundamente voraz, danoso ao meio ambiente),

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isoladas, consumindo produtos industrializados (enlatados, congelados, etc), cada vez menos

naturais, conectadas virtualmente (internet), sequer compreendem muitas vezes de onde vem

o que consomem, bem como, os riscos à própria saúde causados pela ingestão massiva dos

produtos químicos, venenosos, que neles estão presentes. Ainda que estas vivam na

considerada “era da informação”.

Informação esta que é manipulada, monopolizada por uma fração da classe burguesa,

detentora das mídias, que articula ideias que sejam favoráveis à manutenção do status quo, em

diferentes tempos históricos, do ponto de vista politico, econômico, cultural, ideológico. As

mídias de massa, organizam sua programação de acordo com o estágio do capitalismo, de

modo que desde o desenho infantil, passando pelos telejornais, aos programas de

entretenimento (novelas, séries, programas, etc), o antigo “pão e circo” romano, a ideologia

burguesa é vendida, muitas vezes de forma explícita, outras de maneira silenciosa, donde

estão corporificadas valores e normas da classe dominante que passam a ser reproduzidos pela

classe dominada (muitas vezes inconscientemente). Consequentemente, é dessa forma que: “A

ideologia dominante se afirma fortemente em todos os níveis, do mais baixo ao mais refinado

(MÉSZÁROS, 2004, p.59).

Cabe assinalar o papel dos intelectuais orgânicos da burguesia que atuam fortemente

para a construção de conceitos que legitimem e fortaleçam a ordem. Aliás, historicamente, os

intelectuais da burguesia exercem um papel importante, que nos digam os liberais clássicos,

os neoliberais, os pós-modernos. Parafraseando Luckács, partindo de Lessa (2010), não existe

revolução, sem uma teoria revolucionária. Nesse sentido, também podemos considerar

revolucionárias as teorias desenvolvidas por esses grupos. Todavia, revolucionárias para o

capital. Teorias essas impregnadas pela ideologia da classe dominante.

As ideias dominantes, que se tornam hegemônicas são corporificadas nas relações

sociais e, os indivíduos, uma vez inseridos e determinados sócio – historicamente, passam a

reproduzir as mesmas e formar suas consciências tomando-as como referencial.

Assim, retomando a discussão de Montaño e Durigueto:

É nesse processo que Marx e Engels trata a ideologia como falsa consciência

como processo no qual o individuo desenvolve uma consciência que não

corresponde com sua própria existência de classe, uma ideologia que vem de

outra classe, (representando os interesses desta). A ideologia burguesa, após

sua conversão em classe hegemônica, o que a leva a perder qualquer

perspectiva crítica e de transformação, (Ver Luckacs) ao contrário, pela sua

atual necessidade de reprodução da ordem vigente, produz um conhecimento

acrítico, segmentado, incapaz de explicar os fundamentos da sociedade

capitalista, da pobreza, da desigualdade social, tornando essa sua visão de

mundo uma ideologia hegemônica (2010, p.108).

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Do ponto de vista da ideologia do “Capitalismo Verde”, nelas (nas mídias), a mesma

aparece em propagandas do mercado e seus diferentes setores, ou seja, do ramo industrial,

comercial, dos serviços ou financeiro, que exaltam o mercado como cidadão, ético,

ambientalmente responsável.

[...] pode-se dizer que as alternativas defendidas pelo campo hegemônico

preconizam a capacidade de alcançar o desenvolvimento sustentável dentro da

ordem do capital. Entende-se, nesse contexto, que é possível reformar o

capitalismo, atingir um capitalismo mais verde, mais respeitoso com o meio

ambiente, com propostas que se restringem a processos de produção,

tecnologia, reciclagem, eficiência energética, consumo responsável etc.,

despolitizando o debate (ZACARIAS, 2012, p.148).

Assim, se considerarmos a Responsabilidade Social (RSE) que demarca a intervenção

das empresas que a partir de 1990 passam a incorporar estrategicamente as práticas ditas

sustentáveis aos seus processos produtivos, (considerando normas internacionais instituídas

por órgãos de fomento, cujos objetivos e expectativas anunciam falaciosamente uma “nova

ética” do mercado, cidadão, respeitoso no trato dos interesses da comunidade afetada por suas

práticas, relações mais justas de emprego etc., com o próprio meio ambiente,) e as reais

práticas de muitas delas, iremos nos deparar com uma contradição óbvia entre aquilo que se

anuncia e o que de fato representa prioridade e interesse desse setor (lucros). O mesmo se

aplica ao conceito de “Economia Verde” que mais recentemente foi desenvolvido para inserir

a economia no grupo considerado de vanguarda para o alcance do Desenvolvimento

Sustentável, creditando-se a esse setor um papel impar na utilização do capital de maneira

“correta”.

[...] é importante ressaltar que o campo conservador tem como denominador

comum a despolitização da questão ambiental e, no entender de Coggiola

(2010), como esse pensamento fala-se do meio ambiente e do planeta como se

fala do tratamento de um enfermo, que se tem que curar, mas em nenhum caso

descrevem que vírus provoca a enfermidade. Escondem-se as forças que

destroem o meio ambiente – e também os milhares de milhões marginalizados,

que sofrem as principais consequências (ZACARIAS, 2012, p. 148).

Muitas empresas anunciam compromisso ético ambiental, mas tem seus processos

produtivos ancorados na máxima exploração dos recursos da natureza, na expropriação e

exploração das comunidades tradicionais, na exploração dos seus trabalhadores, demitindo

sem pena em tempos de crise, logo são incapazes de fazê-lo. De modo que a incorporação do

discurso se dá em grande medida pela perspectiva da sobrevivência, como tendência de

mercado. Como é o caso da empresa que elegemos como referencial para pesquisa. O banco

Itaú, sobre o qual desdobraremos análises no capítulo III.

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3. DA POLÍTICA DO ESTADO BRASILEIRO CONTEMPORÂNEO DE

DESENVOLVIMENTO SUBORDINADO, A INSUSTENTABILIDADE

SOCIOAMBIENTAL.

Neste capítulo, analisamos a função do Estado no capitalismo contemporâneo. Ao

corroborar com os objetivos sempre expansivos da ordem burguesa, o Estado, assume uma

estreita relação com os interesses privados de uma classe específica, em detrimento do

compromisso com os interesses populares numa perspectiva democrática e contribui para a

sujeição da natureza ao capital.

O Estado é parte estratégica na disseminação da ideologia do Capitalismo Verde.

Entretanto, representa mais do que isso. Sua função histórica no capital tem sido a de fornecer

os mecanismos necessários à fluidez do desenvolvimento econômico, oferecendo aparato

jurídico, financeiro e infraestrutural. É desse modo que políticas públicas o fundo público são

colocados a serviço da economia e à salvaguarda das empresas, em tempos de crise estrutural.

Do campo à cidade, o Estado se afina com os interesses da burguesia, ainda que,

decorrente das atividades produtivas empreendidas pelas empresas, os impactos ambientais e

sociais sejam destrutivos e preocupantes. Assim, o Estado tem um peso importante na

contribuição da insustentabilidade socioambiental, quando assume firme compromisso com os

interesses da burguesa tornando perenes suas relações de reprodução sociais.

Ao invés de fortalecer e canalizar os recursos públicos ao apoio das comunidades que

estabelecem relações genuínas com a natureza, contribuindo com sua preservação e

recuperação dos recursos, bem como, dos seus territórios com atividades pautadas pelo

respeito, investe nas atividades econômico-produtivas destrutivas do capital. Estas que longe

de integrar as populações tradicionais, as expropriam, exploram e retira-lhes sua fonte de

sustento de forma perversa. Além disso, estabelecem a relação oposta com a natureza.

Para nossa análise, inicialmente resgatamos a relação histórica do Estado com o

capitalismo e os interesses das classes sociais a partir das concepções teórico-políticas que

nortearam e ou influenciaram, em estágios diferentes desse modo de produção, sua forma de

organização. Em seguida, discutimos brevemente a particularidade do Estado na América

Latina, especificamente no Brasil, priorizando as análises do Estado Brasileiro no século XXI,

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suas formas de planejamento e gestão, o discurso de desenvolvimento e a relação com os

interesses dominantes.

No segundo momento da discussão, elucidamos a questão ambiental no país. Partimos

da consideração do desdobramento da modernização do setor agrário e da crise ambiental que

se acirra mediante tal processo, inserindo, ainda o debate sobre o discurso de progresso e

desenvolvimento sustentável assumido pelo Estado brasileiro contemporâneo. Por fim,

chamamos a atenção para a questão ambiental que transcende a particularidade brasileira e

analisamos as discussões das alternativas do capital para o enfrentamento da sua própria crise

e do processo de degradação ambiental em curso.

Portanto, o objetivo desse capítulo em sintonia com a discussão que viemos fazendo

ao longo do nosso trabalho é refletir a dimensão ideológica que envolve a discussão do

Desenvolvimento Sustentável que perpassa o próprio aparelho estatal.

3.1 A relação histórica do Estado e o Capital, breve resgate histórico.

Na trilha da concepção da crítica da economia política é possível considerar que,

diferentes autores marxistas, buscaram analisar o papel do Estado, no sentido de desvendá-lo

e de compreender a relação do mesmo com as classes.

Marx, por exemplo, ao partir da análise de diferentes autores da época e da recente

ordem do capitalismo concorrencial do século XIX, evidenciou, entre outras questões, que a

classe trabalhadora não detinha nenhuma influência sobre o Estado e tinha suas formas de

organização fortemente reprimidas, sendo o mesmo composto majoritariamente pela

burguesia, entendia que ele representava uma espécie de Comitê Executivo dos interesses

coletivos da burguesia e as suas formas institucionais se valeriam da coerção e/ou da opressão

para garantir o domínio dessa classe. Portanto, para Marx, o poder político era visto como

negativo, porque nele encontrava-se corporificado a essência opressora do sistema capitalista

e neste contexto, caberia à classe trabalhadora ocupar o Estado, derrotar suas instituições, e

reconstituí-lo, de modo que representasse aos interesses coletivos, no sentido de que o poder

político e o próprio Estado, em sua forma negativa, deixasse de ser uma realidade

(MONTAÑO & DURIGUETTO, 2010).

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Na linha de Marx e Engels, Lênin, marxista que viveu na Rússia pré-industrial e

absolutista, entendia que o Estado era o núcleo central do Estado Burguês, um aparelho

repressivo da burguesia, a sua força armada, donde o principal mecanismo e instrumento da

força do poder do Estado é o poder coercitivo institucionalizado, representados no exército e

na polícia. Ou seja, o Estado representa os interesses de uma classe específica. Logo, indicava

que sua superação deveria ocorrer através de uma revolução violenta, que em sua visão era

inevitável. Onde o proletariado tomasse o Estado, e se tornasse a classe dominante,

transformasse os meios de produção em propriedade estatal e destruísse o aparelho de poder

do Estado (MONTAÑO & DURIGUETTO, 2010).

Outro importante marxista, Antônio Gramsci, que buscou referências em Marx,

Engels e Lênin, mas que pela experiência vivenciada do século XX, acompanhou outra forma

de Estado, o estado monopolista. Gramsci presenciou um período histórico de socialização da

política, onde a classe trabalhadora conquistou através de muitos embates de classe, o direito

de se organizar através de partidos políticos e sindicatos, lutar por seus direitos e ocupar

espaços no Estado. Muito embora, a bem como a própria burguesia também, neste período

articulava seus movimentos, como o facismo e o nazismo. Ou seja, este é o contexto onde há

uma complexificação das relações de poder e da organização dos interesses de classe, sendo

que, para Gramsci as lutas políticas e sociais apontaram para uma reconfiguração da

sociedade civil e do seu papel (MONTAÑO & DURIGUETTO, 2010).

A sociedade civil, em Gramsci, estava atrelada a mesma infraestrutura econômica,

porém determinada pela estrutura e era composta por uma rede de organizações, onde as

classes se organizavam e defendiam seus interesses, confrontar seus projetos societários e

lutar pela hegemonia das suas ideias. Logo, a sociedade civil era composta pelos Aparelhos

Privados de Hegemonia - os organismos sociais que representavam os interesses em conflito.

Mas, acima de tudo, a sociedade civil fazia parte do Estado. (MONTAÑO & DURIGUETTO,

2010).

Assim, para Gramsci, essa socialização da política ampliava o Estado, diga-se, a

participação da sociedade civil, que embora estendesse o domínio da burguesia à

superestrutura, não significa mais um aparelho repressivo da burguesia, restritivamente. Isso

porque nele estavam presentes as lutas de classes, o que lhe imperava a incorporação de novas

funções, embora o mesmo mantivesse a função coercitiva, ou seja, a função de dominação de

uma classe através dos aparelhos de coerção e repressão. A sociedade passa a ser a esfera das

mediações e o exercício do poder, do domínio da classe dominante, pelo convencimento e as

lutas de oposição pela coerção e consenso. (MONTAÑO & DURIGUETTO, 2010).

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Todavia, embora compreendesse essa nova configuração do Estado (ampliado)

Gramsci, tal como Marx e Lênin, defendiam uma sociedade sem Estado, via ampliação da

sociedade civil e o fim da sociedade política, porque essa última representava a perpetuação

de uma lógica opressora e da primazia dos interesses de uma classe específica sobre as demais

(MONTAÑO & DURIGUETTO, 2010).

O fato é que, o Estado no capitalismo, seja qual for a Nação na qual esteja organizado

institucionalmente representa, se não em sua totalidade, considerando as lutas de classes,

portanto, a correlação de forças, um comitê que administra os interesses da classe dominante,

um instrumento de legitimação da ordem pela função que historicamente tem desempenhado,

assumindo um desenho organizativo alinhado com o tempo histórico e conjuntural desse

sistema. Donde, as concepções e teorias dos intelectuais da burguesia, terão peso ímpar nesse

processo.

No período histórico de meados do século XIX à terceira década do século XX, por

exemplo, a perspectiva liberal teve um grande peso econômico e político para o capital, uma

corrente de pensamento construída à defesa dos interesses da burguesia, assentada no conceito

de liberdade, através de uma concepção negativa-formal dela, incompatível com a noção de

igualdade e que reivindicava um Estado ausente em tudo que se referisse ao mercado.

Na perspectiva liberal é dado ênfase ao mercado colocando-o como elo para o acesso

aos bens e serviços produzidos socialmente (condicionado ao mérito individual). Adam Smith

e David Ricardo, liberais clássicos, afirmavam que a soma das ações dos indivíduos atuando

em seu interesse econômico próprio, maximizaria o bem estar coletivo. O mercado seria

então, uma espécie de “mão invisível” que regularia as relações econômicas e sociais e

produziria esse bem comum. E ao Estado, creditava-se a função de garantir a base legal para

que o mercado pudesse fazê-lo. O Estado era tolerável, ou seja, não havia aqui uma ruptura

com o mesmo, no entanto, sua função limitava-se a dar suporte ao mercado (BEHRING &

BOSCHETTI, 2008).

A perspectiva liberal, no período que compreende o pós-primeira grande crise

internacional do capital das décadas de 1929-1932, bem como, o pós Segunda Guerra

Mundial, passa a ser questionada e, como forma de buscar ser revertida a crise, ao Estado é

reivindicado uma ação mais intervencionista. Um dos principais formuladores do paradigma

da intervenção do Estado é Keynes. Para Keynes ao Estado caberia o papel de reestabelecer o

equilíbrio da economia associado à proteção social. Assim, sua concepção de Estado,

substituiu a “mão invisível” do mercado, defendida por Adam Smith e o Laissez-faire (deixa

fazer, deixa passar), do liberalismo clássico, acentuando sua importância através da regulação

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estatal do mercado, portanto, sua intervenção na economia e na área social, para recuperar o

capitalismo. E o que se verificou entre os anos de 1945 a 1970 foi um período de forte

crescimento da economia (BEHRING & BOSCHETTI, 2008).

Tão logo apresentou sinais de esgotamento, em termos de índices de crescimento

econômico, o argumento de Keynes do Estado intervencionista, que em muito incomodava os

liberais clássicos, ofereceu terreno fértil à retomada das formulações que lhes antecedeu. Ou

seja, o Estado Social, que consolidou o Welfare State, passou a ser enfrentado pelos

saudosistas do liberalismo. Logo, no capitalismo monopolista, no período pós a década de

1970, com as crises instauradas a partir de 1969-1973, as ideias neoliberais emergem.

Assim, o neoliberalismo, no capitalismo de monopólios, consistia em uma reação

teórica e política contra o Estado Intervencionista e social defendido por Keynes, tendo como

principal representante Hayek que se colocava contra qualquer que fossem os mecanismos de

restrição e regulação ao mercado visto que isso ameaçava a liberdade econômica e social.

Na perspectiva de Hayek, perfilava-se um Estado que perseguisse os espaços

organizativos da classe trabalhadora, rompendo com seu poder (a exemplo dos sindicatos), a

fim de controlar a moeda, na busca pela estabilidade monetária, implantasse uma reforma

fiscal, contivesse os gastos sociais e restaurasse um taxa natural de desemprego, operando um

desmonte dos direitos. Ou seja, um Estado mínimo para o social e máximo para o capital.

A burguesia impactada pelo “fracasso” do Welfare State, em termos de estabilidade

monetária, com o fim das estratégias do pacto keynesiano/fordista, procurou se reorganizar,

desdobrando um processo que a tradição crítica nomeou como reestruturação produtiva,

donde, o toyotismo ou modelo japonês se consolidou, retomando o ideário liberal ou parcela

significativa de suas proposições, sobretudo no questionamento da intervenção e regulação do

Estado, para um mercado mais livre e auto-regulável, ou seja, um Estado menos social. A

partir de então,

[...] tem-se: retirada do Estado como agente econômico, dissolução do coletivo

e do público em nome da liberdade econômica e do individualismo, corte dos

benefícios sociais, degradação dos serviços públicos, desregulamentação do

mercado de trabalho, desaparição de direitos históricos dos trabalhadores;

estes são os componentes regressivos das posições neoliberais no campo

social, que alguns se atrevem a propugnar como traços da pós-modernidade

(MONTES, 1996,39 IN: BEHRING, 2008,p.58).

A política neoliberal para o capital provocou a intensificação da acumulação e

concentração de capitais, via fusão e reagrupamento de setores de grande expressão da

economia como saída à crise, formando-se oligopólios. Para o social por sua vez,

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especificamente, para a classe trabalhadora, o impacto dessa política, com a retração do

Estado e a substituição do modelo de produção fordista/taylorista pela implantação do modelo

de acumulação flexível ou toytista, foi o recrudescimento da questão social.

A flexibilização, implantada pelo modelo Toyotista, igualmente ocorreu no campo das

relações de trabalho. O neoliberalismo, enquanto direção teórica, política e econômica,

associado ao modelo de acumulação flexível, implicou no desemprego estrutural, na perda de

direitos do trabalho, inserção precária ao mercado de trabalho (subcontratação, profissionais

temporários), superexploração dos trabalhadores (realizando multitarefas), dentre outros

aspectos. No que diz respeito ao quadro do desmonte dos direitos, a partir do capitalismo de

monopólio, pela retração do Estado nesse campo, a “questão social”, compreendida aqui

como as múltiplas formas de expressão das desigualdades e contradições do capitalismo,

atingiu o patamar mais alto de sua expressão.

Vê-se que o capitalismo, não sobrevive sem o aparato histórico do Estado, porém,

coloca-se em relação a ele de forma ambivalente, ou seja, em períodos de crescimento

subjuga sua intervenção, em tempos de crise a reivindica. O Estado oferece o aparato

necessário para a manutenção e legitimação do status quo, diga-se, um modelo de produção

ancorado da máxima exploração do homem sobre o homem e da natureza, sempre de forma

destrutiva. De modo que reiteramos a compreensão de que o Estado se reconfigura em

diferentes estágios do capitalismo. E, essa relação que o Estado estabelece com a classe

dominante, tem consequências destrutivas para a classe trabalhadora, no que tange as suas

condições de reprodução.

O capital imperialista contemporâneo dentre suas múltiplas facetas tem recriado um

modelo de Estado suficientemente forte e enxuto ancorado nas políticas neoliberais e em

sintonia com a dinâmica da reestruturação produtiva. A dinâmica desta relação –

reestruturação produtiva e estado neoliberal – de certa forma, resulta em certas perdas da

perspectiva democrática, uma vez que não se trata de pensar o capitalismo na esfera local e

sim sua dimensão enquanto Estado-Nação. Ao afirmar aqui a perda da perspectiva

democrática para o Estado no capitalismo neoliberal, implicado por esse processo, não

perdemos de vista a compreensão da incompatibilidade entre o capitalismo e a democracia.

Estruturalmente o capitalismo expressa o avesso do sentido da democracia. Na história

desse sistema a riqueza sempre significou um acesso privilegiado ao poder. Além disso, a

mercantilização da ação humana contraria o sentido de democracia. Democratizar significa

exatamente a relação contrária. Logo, a superação do próprio capitalismo (WOOD, 2008 apud

Teixeira: ano, p.134).

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No entanto, o que apontamos é que, a hegemonia burguesa neoliberal tem cumprido

seus objetivos ao fracionar o Estado-Nação, com um modelo de democracia peculiar que

afasta a instituição do campo dos direitos e focaliza suas ações ao eixo da competitividade sob

a ação atenta de instituições financeiras, como o Banco Mundial45

e o Fundo Monetário

Internacional (FMI), que coordenam rigorosamente esse processo de ajuste estrutural,

sobretudo nos países periféricos, a fim de adequá-los aos interesses dos oligopólios, dotando o

poder Executivo de maior centralidade em relação ao Legislativo e o Judiciário (a tríade que

comanda a dinâmica institucional do Estado) (BEHRING, 2008).

Nesse processo de “ajuste global” para o capital, compete aos organismos financeiros

internacionais fomentar as condições de infraestrutura para que os ajustes possam ser

realizados e, neste contexto, as condicionalidades para com os países de economia periférica

passam a ser fundamentais. Uma vez que, em sendo países devedores para com as economias

centrais, os coloca em posição de subordinação e dependência, sobretudo, para dar suporte em

períodos de crise, num processo que reflete privatização neoliberal do setor público e a

redução do Estado, para o desenvolvimento sustentável do capital (AMARAL & CESAR,

2009).

Dentro disso, os Estados nacionais restringem-se a: cobrir custos de

algumas infra-estruturas (sobre as quais não há interesse de

investimento privado), aplicarem incentivos fiscais, garantir

escoamentos suficientes e institucionalizar processos de liberação e

desregulamentação, em nome da competitividade. Nesse sentido

último, são decisivas as liberalizações, desregulamentações e

flexibilidades no âmbito das relações de trabalho – diminuição da

45

A respeito do Banco Mundial, Teixeira (2010), analisou criticamente o conceito de políticas sociais desse organismo a partir dos seus documentos oficiais, concluindo em sua análise que cada eixo que ele problematizou tem um papel político- ideológico, segundo ele: “1) A começar pela noção de que a prioridade para o desenvolvimento social é o crescimento econômico, o que reafirma a defesa do ajuste estrutural; 2)passando pela focalização nos extremamente pobres como forma de aliviar (e não erradicar) a pobreza, numa perspectiva de assegurar os fatores de coesão da sociedade capitalista; 3) onde tem papel estratégico a noção de transferências de rendas (mínimas) aos comprovadamente pobres. Esta noção assume a condição de elemento central da concepção de política social do Banco, tanto porque permite um resultado de curto prazo como resposta aos agudos problemas vividos por grandes segmentos da população, quanto porque é condizente com o princípio de que as políticas devam ser orientadas pelo e para o mercado, o que, portanto, tem na renda um fator estimulador das economias em localidades extremamente pobres além de atribuir aos indivíduos a condição de protagonistas na superação de sua condição de pobreza. E é assim que o transitório se torna permanente. [...] Soma-se ainda: 4) a noção de participação difundida em paralelo à desresponsabilização do Estado no provimento das necessidades sociais, funcionando como um chamamento moral a todos no compromisso com os desfavorecidos. Noção esta que oculta a readequação do papel do Estado como agente estratégico na manutenção e retomada dos princípios da sociedade burguesa, atuando na esfera macroecoômica em favor do grande capital e, por consequência (mas de maneira dissimulada), em desfavor das classes que tem apenas a força de trabalho para vender. Com a referida noção de participação abre-se ainda um grande nicho para a atuação do setor privado na venda de serviços sociais, em caráter “complementar”, que adquire proporções gigantescas em todos os campos em que as necessidades sociais puderem adquiri a dimensão de mercadorias altamente lucrativas (TEIXEIRA, 2010, p. 677-678)”.

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parte dos salários, segmentação do mercado de trabalho e diminuição

das contribuições sociais para a seguridade; e do fluxo de capitais, na

forma de IED e de investimentos financeiros em portfólio. Aqui, tem

destaque os processos de privatização, reduzindo as dimensões do

setor público, para livrar-se de empresas endividadas, mas

principalmente para dar “guarida” aos investidores, em especial ao

IED”(BEHRING, 2008. p.59).

No panorama desses “ajustes globais”, a esfera pública estatal tem sido

gradativamente privatizada sob a difusão estratégica do ideário neoliberal que caracteriza o

Estado como burocrático, corporativista e ineficiente, tendo ainda uma direção muito bem

definida: a responsabilidade de cumprir suas funções sociais, cabendo ao Estado apenas à

função de representação dos interesses mundializados da economia, sem interferência no

mercado e de estabelecer relações internacionais.

“A “Reforma do Estado” postulou o reconhecimento de um “espaço

público não-estatal”, composto por organizações e iniciativas privadas

sem fim lucrativos que, em tese, seriam capazes de absorver a

prestação de serviços sociais com base na “cidadania” e no “espírito

comunitário”. (IBID, p. 430).

O fato é que em linhas gerais as protoformas da mundialização do capital regidas pela

ofensiva neoliberal, através das dinâmicas de atratividade, adaptação, flexibilidade e

competitividade, acentuou ainda mais o fosso que separa o Estado em sua relação com as

classes sociais, colocando-o demasiadamente a serviço da classe dominante (BEHRING,

2008).

É em torno, de um Estado complexo, ampliado (em termos gramscianos),

contemporâneo, situado no padrão de acumulação regido pela financeirização, cujas

determinações históricas e geopolíticas, afetam fortemente a dinâmica econômica e política

dos países periféricos, dominados pela política neoliberal e que para alguns estudiosos

apresentam tendências de resgate da política neodesenvolvimentista (ainda em discussão pela

tradição crítica) que iremos desdobrar nossa análise, a fim de estabelecer um diálogo com a

configuração que o mesmo assume nesse tempo histórico e perceber os nexos com a questão

socioambiental no Brasil.

3.1.1 O Estado Brasileiro na “ordem” para o “progresso”: no simulacro do desenvolvimento, a

produção destrutiva do meio ambiente e suas consequências para a classe trabalhadora.

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O Estado brasileiro, cuja trajetória histórica remonta períodos de dominação burguesa

em sua formação econômica-social, dada a condição do país de periferia do capital, assim

como os demais países da América Latina, tende a se organizar em termos institucionais e a

movimentar-se, em grande medida, orientado a suprir as necessidades do mercado através do

crescimento econômico. Isso decorre do esforço histórico para inserir o país na rota

capitalismo mundial e elevar o patamar de desenvolvimento econômico, a fim de superar a

condição de “economia periférica”.

Este direcionamento ganha maior expressividade a partir dos governos da Frente

Popular, liderados pelo PT - Partido dos Trabalhadores.

Rocha (2012) analisou as consequências da política de desenvolvimento nos governos

Lula a partir dos Planos Plurianuais (PPA) 2004-2007 (Plano Brasil para todos) e 2008-2011

(Desenvolvimento com inclusão social e educação com qualidade). Segundo a autora:

[...] Tratava-se de um empreendimento de desenvolvimento

econômico e social, a compor um projeto de longo prazo, cuja meta

era a inclusão social e a desconcentração da renda com crescimento do

produto e do emprego. A estratégia visava ao crescimento

ambientalmente sustentável, dinamizado pelo mercado de consumo de

massa, por investimentos e pela elevação da produtividade, bem como

à redução da vulnerabilidade externa por meio da expansão de

atividades competitivas. As políticas e programas que consubstanciam

essa estratégia foram distribuídas em três mega objetivos: dimensão

social; dimensão econômica, regional, ambiental; e dimensão

democrática (ROCHA, 2012, 332).

Nas linhas do PPA 2004-2007 o desenvolvimento social deveria estar alinhado com o

econômico via um planejamento nessa direção, de modo que provocasse uma sociedade

moderna e dinâmica, com geração de empregos, riquezas e justiça social. Para isto, o

crescimento econômico deveria ser firme e duradouro. Aqui os programas sociais eram

compreendidos como insuficientes para a superação da “exclusão social” e desigualdade de

renda (embora não perdessem sua importância) visto que, se entendia que era o crescimento

sustentado, com a máxima geração de riqueza, que poderia elevar o volume de investimentos

e a massa salarial do país. Logo, a superação da desigualdade social e de renda, nessa lógica,

estaria subordinada ao crescimento do mercado impulsionado pelo aumento do consumo de

massa das famílias da classe trabalhadora (ROCHA, 2012, p. 333).

Segundo o PPA 2004-2007, esse modelo era viável, já que está

inscrito na lógica de operação da economia brasileira, na qual

um aumento do poder aquisitivo das famílias trabalhadoras

deveria traduzir-se no aumento da demanda por mercadorias dos

ramos de consumo da indústria moderna, o que impulsionaria a

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demanda por mão de obra. Esperava-se, portanto, o denominado

circulo virtuoso, isto é, que a transmissão do aumento da

produtividade ao poder aquisitivo das famílias gerasse mais

consumo, mais investimentos, mas empregos e assim

sucessivamente (ROCHA, 2012, p. 333).

As políticas adjacentes a esse processo de impulso da economia pelo consumo eram

entendidas como necessárias, visto que, ainda que, em períodos em que o ritmo de

crescimento fosse rápido e expressivo, a geração de emprego tendia a ser insuficiente, tanto

para trabalhadores de maior qualificação laborativa quanto para a grande maioria dos

trabalhadores, que no contexto da indústria informatizada, são considerados

“desqualificados”.

Assim, as políticas de inclusão social e transferência de renda foram centrais para que

a estratégia de desenvolvimento pautado no impulso do consumo fosse efetiva (ROCHA,

2012). Essa relação entre desenvolvimento econômico para o desenvolvimento social era

defendida como uma “inovação” no que diz respeito à concepção das políticas sociais.

De acordo com o documento, residia aí o grande desafio do país sob

coordenação do PPA 2004-2007: eliminar os principais obstáculos ao

crescimento continuado da economia, na direção do incremento ao

consumo de massa em âmbito interno, bem como a redução da

vulnerabilidade externa, considerando a influência positiva de tal

redução para a expansão do volume de exportações. A combinação era

conhecida: incitar a expansão do consumo bem como a expansão do

investimento das exportações (ROCHA, 2012, 335).

O crescimento do volume das exportações representava outro ponto nodal para

efetivação do PPA 2004-2007, especialmente as exportações do setor agropecuário bem como

de manufaturados em escala maior e diversificada. Nessa direção Rocha (2012) aponta que:

Há uma perceptível nostalgia do desenvolvimentismo nesse

projeto, sem a ousadia do enfrentamento das causas da

dependência [...] a inserção periférica da América Latina no

processo de acumulação capitalista em escala global,

determinada pela dependência, fundamenta-se a partir da

formação de uma divisão internacional do trabalho, que

posteriormente acaba por condicionar o desenvolvimento

subsequente da região dependente (p.335).

Essa dinâmica de dependência dos países periféricos, principalmente os situados na

América Latina, em relação aos de economia capitalista desenvolvida, tende a tecer relações

comerciais sempre desfavoráveis aos mesmos. Resta-lhes exportar produtos primários

(gêneros agrícolas e matérias primas) para suprir as necessidades produtivas dos países

desenvolvidos, graças à riqueza ainda existente de recursos naturais; importarem tecnologias

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(de alto custo); abrirem seus territórios à exploração; oferecer força de trabalho de baixo

custo, dentre outros. Essa dinâmica é garantida pelo incremento para máxima exploração da

força de trabalho, com a intensificação dos processos de extração da mais valia.

Assim, Rocha (2012), em sua discussão, reflete que o PPA 2004-2007 ao ter como

“motor do desenvolvimento econômico e social, a ampliação na pauta de exportações e o

estímulo ao consumo de massa”, não problematiza nem busca a elaboração de estratégias que

rompam com essa dinâmica de dependência.

Isso significa que a histórica impotência do Estado brasileiro e latino-

americano, revelada pela submissão aos interesses da economia

exportadora de produtos primários, aliada aos que se beneficiam da

intensa expropriação da riqueza social pelo mecanismo do

endividamento público, seguiu quase intacta, revelando a incapacidade

de se romper com esse modelo, reproduzindo e priorizando os mesmos

interesses que o fundaram (ROCHA, 2012, p.336).

Podemos compreender que as políticas sociais empreendidas a partir do PPA 2004-

2007 para a construção de um “Brasil para todos”, de acordo com os intentos do governo

Lula, assumiram um papel conciliatório com o projeto societário em vigência, alinhadas,

também, com as orientações de organismos multilaterais. Essa concepção de desenvolvimento

ideologiza a questão da universalização de acesso a bens e serviços, como se pudéssemos

creditar ao desenvolvimento econômico a serviço do capital o bônus por melhorar as

condições de reprodução da classe trabalhadora e a superar as desigualdades sociais, ou seja,

de promoção de mudanças estruturais. Em verdade, o que articula é uma falsa ideia de que a

riqueza social concentrada e de usufruto de uma minoria possa ser alcançada pela grande

massa e não apenas, também a sua forma de consumo.

No plano econômico, vislumbram exaltar e tornar atrativo o território nacional à

exploração de outros países, guiadas por uma concepção de desenvolvimento que prioriza a

economia, assimilada pela influência de organismos multilaterais como o Banco Mundial,

para acelerar o processo de “inclusão” do país na rota do capitalismo internacional, com

discurso de progresso e crescimento, melhorias para as condições de vida da população e

redução das desigualdades do ponto de vista numérico, tendo como marco referencial a

estratificação das classes classificando-as em A,B,C (etc) – um sistema arbitrário, que

despolitiza a análise, homogeneizando classes e sujeitos que tem condições de vida e

demandas diferentes (VIANA, 2010).

É fato que desde o início da gestão do PT na presidência da República, presidida por

Lula e que teve continuidade com Dilma Rousseff, o Brasil, passou por transformações

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86

socioeconômicas46

em termos estatísticos, embora perpassadas por contradições e não

reveladoras da superação da realidade estrutural de onde derivam o conjunto das

desigualdades sociais. As oportunidades de financiamento de automóveis, imóveis,

eletrodomésticos da “linha branca”, possibilitados pela diminuição dos impostos ou isenção

total garantida pelo Estado para impulsionar o consumo, tem um peso significativo para essa

realidade. Esta uma estratégia impulsionada pela crise deflagrada em 2008 para diminuir os

impactos para as empresas nacionais afetadas.

O programa “Minha Casa, Minha Vida”, por exemplo, ao promover um crescimento

exponencial ao mercado da construção civil, fez com que também fossem gerados empregos

formais e possibilitou às famílias a compra de unidades domiciliares através do

financiamento. Por outro lado, esse Programa expressa mais uma tentativa de possibilitar um

alto crescimento das empresas da construção civil e do ramo financeiro, alavancando esses

setores, do que uma perspectiva concreta de mudanças para a vida da classe trabalhadora por

uma política habitacional abrangente.

Além disso, todo esse crescimento socioeconômico em termos numéricos não remeteu

a uma superação da condição de subalternidade do Brasil em relação aos países de economias

centrais.

É um mecanismo típico das economias periféricas que o fomento ao

crescimento econômico se traduza no aprofundamento das relações de

dependência, dessa vez reeditado, seja com ausência das reformas

estruturais, seja com a desindustrialização e a expansão do

agronegócio, submissos às multinacionais. Nesse sentido, a ideia

mitológica do desenvolvimento econômico caracteriza um problema

essencialmente político, já que tal empreitada opera pela omissão da

dominação dos povos, conforme caracterização de Furtado: graças a

ela tem sido possível desviar a atenção da tarefa básica da

identificação das necessidades fundamentais da coletividade e das

possibilidades que abre ao homem o progresso da ciência, para

concentrá-la em objetivos abstratos como o investimento, as

exportações e o crescimento (Furtado, 1974, p.75) (ROCHA, 2012, p.

338).

Estamos imersos numa forma política centrada no desenvolvimento econômico

substanciada pela ideologia de progresso que conforma as análises sobre as contradições

históricas vivenciadas no país pela classe trabalhadora e os impactos para a vida e para o meio

46

Segundo Pochmann (2010): “Em síntese, percebe-se que somente entre 2005 e 2008, 11,7 bilhões de brasileiros abandonaram a condição de menor renda, enquanto 7 milhões de indivíduos ingressaram no segundo estrato de renda e 11,5 milhões de pessoas transitaram para o estrato superior. Com o recente retorno da mobilidade social ascendente no Brasil, convém considerar o quanto isso vem impactando a estrutura social. Para tanto, buscou-se comparar a estrutura social de 2008 com a de 1998, o que permitiu observar as principais transformações dos últimos dez anos da sociedade brasileira (p.645)”.

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ambiente. Associado a isso, profundamente condicionados a uma forma de política que

continua beneficiando as empresas e seus interesses lucrativos, pela sinergia que se criou

entre desenvolvimento social e econômico, o primeiro aprisionado ao segundo.

Nos governos do PT, de Luiz Inácio da Silva a Dilma Rouseff, o agronegócio foi

assumido como um ponto estratégico para o desenvolvimento econômico do setor agrário

brasileiro, ainda que o impacto disso para o meio ambiente e a saúde humana tenha graves

consequências pelo significado dessa forma destrutiva de produção, a base de pesticidas e

produtos transgênicos. Não por acaso no Brasil constata-se um “boom” da produção agrícola

de transgênicos, que impulsionam o agronegócio.

Em nossa análise, essas medidas estão profundamente afinadas com o projeto

neoliberal, não apresentam rupturas com as estratégias de superação da crise do capital.

Porém, há parcela crescente de intelectuais que defendem a perspectiva da refuncionalização

do desenvolvimentismo.

Segundo Armando Boito Jr (2012), por exemplo, no século XXI se formou no Brasil

uma frente política de base neodesenvolvimentista que, por exemplo, sustentou a política de

crescimento econômico e de transferência de renda alavancadas pelos governos Lula e Dilma

Rouseff, uma situação que expõe similaridades com o período desenvolvimentista e populista.

Embora ressalte que as condições históricas e a estrutura de classes se transformaram

substancialmente implicando em diferenciações do poder que uma frente nacionalista e

populista pode exercer sobre a população. Isso pelo perfil da classe trabalhadora de hoje que

está organizada e detêm maior poder de pressão em espaços que no Brasil no pós-1930 ainda

estavam em formação, visto que, era recém egressa do campo, sem experiência organizativa e

de lutas reivindicatórias. Além disso, as próprias empresas brasileiras que, hoje se encontram

vinculadas com capitalismo internacional, são menos receptivas a uma política desse cunho,

como outrora as empresas industriais e de serviços nas décadas de 1930 e 1940.

Nessa discussão, Boito Jr indica algumas características desta frente política que se

forma no Brasil atual, quais sejam:

a)essa frente é dirigida pela grande burguesia interna brasileira

(BOITO, 2012); b) tal frente envolve classes trabalhadoras que se

encontram excluídas do bloco no poder – baixa classe média,

operariado, campesinato e trabalhadores da massa marginal

(KOWARICK, 1975; NUN, 1978 e 2001); c) a frente entretém

uma relação de tipo populista com essa massa marginal; d) a

frente se constituiu no principal recurso político do qual se valeu a

grande burguesia interna para ascender politicamente no interior

do bloco no poder e e) ela enfrenta, no processo político nacional,

aquilo que poderíamos denominar o campo neoliberal ortodoxo,

campo esse que representa – essa é a nossa hipótese de trabalho –

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o grande capital financeiro internacional, a fração burguesa

brasileira perfeitamente integrada e subordinada a esse capital,

setores dos grandes proprietários de terra e a alta classe média,

principalmente aquela alocada no setor privado mas, também, no

setor público (p.4).

Segundo esse autor a frente política neodesenvolvimentista no Brasil começou a se

formar na década de 1990. Isso porque, na década anterior as lutas circundavam em torno do

conflito salarial, agudizado pela inflação e que colocava os movimentos sociais (CUT, PT e

MST) em combate e desacordo com a classe empresarial. A partir do início da década de 1990

a situação teria mudado, porque uma parcela importante da elite da burguesia nacional

agregou-se em torno do projeto neoliberal, o que resultou no aumento do desemprego, e

acarretou numa retração dos movimentos sociais, com exceção do MST. Todavia, na segunda

metade década de 1990, as divergências entre a própria burguesia que apoiou o programa

neoliberal criaria um novo cenário.

Na discussão de Rocha (2012),

Constituída como alternativa aos males do capitalismo, a virada novo-

desenvolvimentista, de acordo com seus defensores, advoga um

Estado capaz de regular a economia, que deve formar um mercado

forte e um sistema financeiro funcional, isto é, que seja direcionado

para o financiamento da atividade produtiva e não para a atividade

especulativa. Para tanto, de acordo com Sicsú, Paula e Michel (2007),

é preciso não somente buscar formas inteligentes de ação estatal,

complementares à ação privada, como também proporcionar

condições para que o Estado possa desempenhar de forma mais eficaz

sua ação. Trata-se de adotar uma forma de gestão que aproxime as

práticas dos gerentes públicos às dos privados, tornando-os ao mesmo

tempo mais autônomos e responsáveis perante a sociedade (ROCHA,

2012, p.338).

Ressalta-se aqui, que a perspectiva do novo-desenvolvimentismo ou neo-

desenvolvimentismo é um debate em curso, que não é consensual entre a perspectiva crítica -

portanto, divide opiniões- porque para muitos, o que está em curso na verdade é a

materialização dos preceitos do neoliberalismo.

Retomando a discussão dos Planos Plurianuais brasileiros, do segundo mandato do

governo Lula, no estudo de Rocha (2012), o PPA 2007 para o quadriênio de 2008-2011, em

verdade, nada mais é do que o aprofundamento do anterior, o PPA 2004-2007 dada a

avaliação positiva e os resultados esperados pela gestão. Ou seja, os objetivos, programas,

projetos e ações, seriam apenas aprofundados de maneira a qualificar a inclusão social

pretendida no planejamento anterior.

Considera pois que as políticas implementadas no quadriênio anterior

lançaram as bases para um desenvolvimento sustentável que

finalmente – agora sim- permitirá ao país ingressar no circulo

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virtuoso, por meio do qual se alcançará em um futuro próximo, a

perfeita simetria entre crescimento econômico, redução das

desigualdades e respeito ao meio ambiente. Por esse motivo, o novo

período de governo seguiu apostando no desenvolvimento econômico

para o sucesso das políticas públicas propostas, sentenciando que “a

sinergia resultante de tais políticas é, simultaneamente, pressuposto e

resultado de uma estratégia de desenvolvimento que opera com base

na incorporação progressiva das famílias no mercado consumidor das

empresas modernas” (BRASIL, 2007, p. 11). A partir de tal

pressuposto, o PPA 2008-2011 organiza as ações do governo em três

eixos: crescimento econômico, educação de qualidade e agenda social.

Os dois primeiros eixos para serem operacionalizados a partir de dois

grandes programas, respectivamente: Programa de Aceleração do

Crescimento (PAC) e Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE)

(ROCHA, 2012, p. 342)

No governo de Dilma Rousseff o PPA do quadriênio 2012-2015 “Plano Mais Brasil”,

voga a necessidade de continuidade dos projetos alavancados na gestão de Lula, enfatizando a

aceleração do crescimento econômico, com melhoria das condições de vida da população

brasileira e na distribuição da renda. Ou seja, reitera-se o consumo como um dos objetivos.

Portanto, os desafios postos para o próximo período centram-se no

crescimento e estabilidade econômica, na redução das desigualdades,

erradicação da pobreza extrema e em potencializar o mercado interno.

Soma-se a estes a elevação das fontes de financiamento privadas para

os projetos de longo prazo. O destaque nesse plano é aprofundar o

mercado de capitais e de crédito, no entanto, não somente por meio de

bancos com capital público, como o Banco Nacional de

Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), o Banco do Brasil

(BB) e a Caixa Econômica Federal (CEF), mas sim potencializando e

fomentando fontes privadas de financiamento – processo que

possivelmente contribuiu para o aprofundamento da dependência

latino-americana, especialmente no cenário de crise estrutural do

capitalismo na idade do capital fictício e da financeirização (ROCHA,

2012, p. 346).

Acerca do Programa de Aceleração do Crescimento – PAC, compreendemos que ele

tem um peso significativo na configuração de um cenário ambiental preocupante.

Relativo ao PAC, trata-se de um conjunto de investimentos públicos

em infraestrutura, principalmente concentrados nos setores de

transportes, energia, recursos hídricos, saneamento e habitação, além

do que denomina medidas de incentivo ao desenvolvimento

econômico, dentre as quais se incluem estímulos ao crédito e ao

financiamento, melhoria do ambiente de investimento, desoneração

tributária e medidas ficais de longo prazo. Essas medidas compões

metas fundamentais para a expansão da capacidade produtiva nacional

e elevação da produtividade sistêmica da economia e, por esse motivo,

prevê o aumento significativo do investimento privado, haja vista que

o setor público disponibilizará grande montante de recursos para

ampliação do mercado interno (ROCHA, 2012,p. 342).

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Para o campo ambiental, o PAC, têm consequências desastrosas, porque está em curso

um processo de privatização da terra pelo agronegócio que além de degradar, expropria as

populações locais, além disso, o avanço do hidronegócio e de mineradoras que assolam os

recursos hídricos e minerais. Essa uma realidade comum a várias partes do planeta que,

porém, afeta principalmente os países periféricos porque estes são detentores de ecossistemas

ricos e potencialmente fornecedores de matérias-primas necessárias à produção de

mercadorias, como o Brasil.

Sabe-se que o avanço do agronegócio tem gerado um processo de

expropriação expressivo de populações locais e tem sido um dos

principais entraves para a demarcação de territórios de populações

tradicionais, a exemplo de terras indígenas e quilombolas. No mais os

projetos de infraestrutura inseridos no Programa de Aceleração do

Crescimento (PAC) para alimentar a expansão de grandes empresas, a

exemplo da hidrelétrica de Belo Monte, têm ameaçado a vida de

muitas comunidades que vivem no seu entorno (VALADÃO &

BACELLOS, 2012, p.148).

Nessa perspectiva, o PAC representa um padrão de desenvolvimento que considera a

economia em centralidade e negligencia o meio ambiente. Todas as mudanças no Código

Florestal as Emendas Constitucionais que a elas se somam, contribuem para processos de

destruição ambiental, impactantes. Esse Programa integra uma política particular brasileira

para aceleração do crescimento, dentro do planejamento do Estado, no entanto expressa

similaridades com outros processos que ocorrem na América Latina. Além disso, está

conciliado com o desenvolvimento desigual que o capitalismo faz imperar aos países

periféricos, que reforça a dependência e subordinação e tem sido responsável pela exploração

irrestrita desses territórios e da riqueza social produzida, sob o prisma da histórica promessa

de inserção no seleto grupo dos desenvolvidos.

Segundo Valadão & Bacellos (2012) associado ao PAC, outras questões preocupam os

movimentos sociais47

ligados ao campo. A legislação ambiental brasileira historicamente é

47

A Revista Temporalis, ano 12, N. 24, da Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social- ABEPSS, cujo tema é “Questão Agrária, Urbana, Ambiental e Serviço Social”, traz nas suas páginas finais as Campanhas de iniciativa da Via Campesina contra os Agrotóxicos em defesa do meio ambiente e da vida, bem como, a luta pelas sementes de cultivo da agricultura familiar, respectivamente. Estas demonstram a preocupação dos movimentos ambientalistas contrários ao produtivismo destrutivo do capital. Um dos textos da revista sobre essas campanhas apresenta que a Via Campesina Internacional, em junho de 2002, decidiu implantar a campanha “sementes patrimônio do povo a serviço da humanidade”, durante a realização da Conferência Mundial da Organização das Nações Unidas para Agricultura e a Alimentação (FA0), em Roma, Itália. No entanto, essa campanha foi lançada em janeiro de 2003, durante a realização do Fórum Social Mundial, em Porto Alegre (RS), no Brasil. Os objetivos da campanha são: garantir o direito de todos os agricultores familiares de produzirem suas próprias sementes “varietais”, de forma individual ou comunitária; preservar e viabilizar a produção própria de sementes através da democratização da produção de sementes e da garantia do princípio

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flexibilizada para dar fluidez aos processos produtivos do capital. É nesse sentido, que as

mudanças propostas para o Código Florestal e a Emenda Constitucional (PEC) 215 em muito

incomodaram os defensores genuínos dos recursos naturais do Brasil, em detrimento dos

interesses econômicos, porque significavam a facilitação para perpetuação da degradação

ambiental de áreas que precisam ser preservadas, a anistia de crimes ambientais cometidos e a

expropriação das comunidades tradicionais das localidades exploradas. Isso porque, à época,

as propostas de mudança para o Código e a Emenda em questão, tinham os seguintes

propósitos:

O primeiro propôs entre tantas coisas a redução da área de Reserva

Legal no Cerrado de 50% para 20%; a redução da área de Reserva

Legal da Amazônia de 80% para 50%. As mudanças no código

preveem o uso de florestas de preservação permanente para realização

de construções, abertura de estradas, canais de derivação de água, e

para atividades de mineração e garimpo. No caso da PEC 215, esta

propõe que passe das mãos do Poder Executivo para o Congresso

Nacional a decisão sobre a aprovação da demarcação das terras

indígenas, quilombolas e a criação de unidades de conservação

ambiental. No mais, o projeto interfere na forma como as

comunidades gestam os seus territórios, atingindo um direito

consagrado pela Constituição Federal brasileira, que é o seu direito à

autodeterminação (VALADÃO &BACELLOS, p. 149).

Outro ponto complexo são os chamados serviços ambientais que têm sido colocados

como estratégia para o enfrentamento das mudanças climáticas. No entanto, os movimentos

socioambientais advertem que esses serviços são formas de financeirização/privatização da

natureza (VALADÃO &BACELLOS, p. 149).

Importante dizer que uma das determinações mais evidentes do capital para a dinâmica

das sociedades é atacar as comunidades tradicionais e transformá-las em centros urbanos,

levar a expansão e a modernidade a todos os espaços “sem limites e sem fronteiras”. Ou seja,

levar um modelo destrutivo, do ponto de vista socioambiental, para todos os espaços

irrestritamente. Acerca disso, Laschefski (ano) reflete,

da soberania alimentar, em todos os países e nas comunidades de todo o mundo; garantir e difundir a produção de sementes sadias e adequadas ao meio ambiente de cada região; evitar que a produção e o comércio de sementes sejam baseados apenas no lucro e na exploração econômica; impedir a disseminação de sementes transgênicas para cultivos comerciais enquanto a comunidade científica não tiver condições de conhecer suas consequências para a saúde dos agricultores e dos consumidores e para o meio ambiente; impedir que as empresas transnacionais obtenham o controle oligopolista da produção e comercialização de sementes; estimular, entre todos os agricultores familiares do mundo, a consciência da importância do cultivo das suas sementes; pressionar para que a FAO e a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) declarem as sementes “varietais” patrimônio cultural de toda a humanidade; pressionar para que os produtos da agricultura, em particular os alimentos e as sementes, não sejam objeto da legislação e acordos sob a tutela da Organização Mundial do Comércio (OMC) (TEMPORALIS, 2012, p. 471-472).

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92

A ameaça representada pelas mudanças climáticas é um dos muitos

indícios sobre o fracasso de um modelo de desenvolvimento que,

desde o fim da II Guerra Mundial, visa à transformação de culturas

tradicionais em sociedades modernas, seguindo o exemplo dos países

industrializados. Hoje, existe uma certa unanimidade no

reconhecimento de que as sociedades “desenvolvidas” chegaram aos

seus limites ecológicos. Sobretudo, a aceleração dos processos

produtivos e o aumento de bens e mercadorias, disponíveis por meio

da industrialização, não trouxeram o esperado melhoramento do

“bem-estar” para grandes parcelas da população. A implementação de

programas de desenvolvimento em muitos países foi acompanhada de

graves conflitos nas zonas rurais e nas favelas urbanas. Trata-se

frequentemente de lutas pelo acesso aos recursos necessários a

sobrevivência em termos materiais ou espaciais (LACHESFSKI, ano,

248).

O que se evidencia nas propostas articuladas pelo capital para o controle das mudanças

climáticas, é uma busca pela superação do que para esse sistema se materializou como

entraves ambientais (desastres ecológicos etc.), uma vez que os desastres acarretam perdas

econômico-lucrativas. Entretanto, considerando toda a perda em termos de sustentabilidade

que significa a urbanização, os processos industriais exploratórios de regiões ricas em

recursos naturais, o que deveria ser pautado, em verdade, seria um reconhecimento concreto

desse modelo de desenvolvimento fadado à destruição ambiental e impotente em garantir o

desenvolvimento sustentável e a busca pela ruptura efetiva da produção voltada para o alto

consumo (consumista) e o crescimento econômico lucrativo.

As comunidades tradicionais, compostas por grupos indígenas, ribeirinhos,

seringueiros, dentre outras, são consideradas no capitalismo, como atrasadas em relação a

todo progresso tecnológico e cientifico do século XXI, quando deveriam ser percebidas como

populações que tem práticas sustentáveis no manejo da natureza, tendo em vista as relações

que estabelecem com o meio ambiente, que são radicalmente opostas às sociedades ditas

“modernas”, que representam o “avanço”. Estas últimas, em virtude da industrialização que

acarretou a reestruturação da reprodução social, estabelecem uma relação cada vez mais

fragilizada com a natureza, conforme Laschesfski:

Em decorrência da reestruturação profunda da reprodução social e

cultural nas sociedades urbano-industriais, as relações com a natureza

estão se tornando cada vez mais alienadas. O uso da terra no sistema

urbano-industrial apresenta-se além dos limites das cidades, como um

mosaico de paisagens uniformes, cada uma destinada à produção de

mercadorias específicas, tais como áreas para a agroindústria ou para o

manejo florestal. Nessas, a biodiversidade é substituída por

oligarquias ou monoculturas. Os insumos técnicos (agro-químicas,

máquinas, entre outros) permitem a produção, até um certo nível, sem

a necessidade de considerar os ritmos e ciclos da regeneração da

natureza. Outras áreas são completamente transformadas, para

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finalidades como mineração e produção de energia (hidrelétricas). O

resultado é a “monoculturação” ambiental e social do espaço, com

efeitos não-sustentáveis. As redes de transporte abrangem longas

distâncias, até mesmo em escala global, aumentando assim o consumo

de recursos naturais e de energia. Como na sociedade moderna

prevalece a ideologia da acumulação ilimitada de capital e bens, a

tendência é a crescente dependência de áreas fora dos limites dos seus

próprios territórios e a eterna expansão do consumo dos recursos

naturais e do espaço (2005, p. 252).

Na América Latina, instituições financeiras como a Corporação Andina de Fomento

(CAF), Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), somando-se a

um grupo considerável de Instituições Financeiras Regionais (IFRs) atuam fortemente frente

ao financiamento de projetos voltados a oferecer estrutura física e viabilizar as condições

necessárias, no que se refere à construção de estradas, hidrovias, ferrovias, gasodutos e usinas

hidrelétricas, para o aumento da competitividade e interdependência econômica regional.

Desse modo, evidencia-se a abertura de uma política de facilitação dessas instituições

financeiras para o alcance de projetos que redescubram novas áreas de extração dos recursos

naturais (minérios, petróleo, soja, dentre outros), visando estimular o alcance de novos

mercados na economia mundializada48

.

O governo brasileiro assumiu compromisso e tendências ao financiamento de tais

Projetos no país (2007/2008), com ações concretas, alcançou êxito nas estratégias de

transnacionalização de suas grandes empresas. No que diz respeito à expansão e

transnacionalização da economia e de estratégias para manutenção do projeto de acumulação

do capital das empresas brasileiras para os países vizinhos, as principais beneficiadas, foram:

a Petrobras, Camargo Corrêa, Vale do Rio Doce, Odebrecht, Gerdau e Votorantim, com

atuações que muito se relacionam com os preceitos da Iniciativa da Infra-Estrutura Regional

Sul-Americana. Um exemplo disso, foram às obras para criação de rodovias inter- oceânicas

para interligar Bolívia e Peru, onde atuam as principais empreiteiras brasileiras, que

beneficiam enormemente o setor do agronegócio do centro – oeste e norte do Brasil, o centro

industrial instalado no Sudeste brasileiro e as principais cadeias produtivas das

transnacionais que operam no continente (sic)49

(REDE BRASIL,2009) .

48

Por Ricardo Verdum, Contra Corrente: Revista Rede Brasil: 2009. 49

Essas Instituições em alude (IIRSA, IFIC, BIRD), que se voltam às obras de infraestrutura na América do Sul e

no mundo, com os objetivos que já mencionamos, em parceria com o BNDES, anunciavam, em Setembro de

2008, a criação da Empresa Brasileira de Projetos (EBP), com a missão de estruturar os projetos nas áreas de

concessão pública e parceria publico- privada, tanto no país como na América do Sul, aonde estão envolvidos

importantes Bancos: como o Bradesco, o Itaú- Unibanco, Santander, Citibank, Votorantim, Banco do Brasil e

Espírito Santo. O banco em destaque é o mesmo que em 2011, conforme indicamos é considerado o mais

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Outro exemplo emblemático fomentado pelo Programa de Aceleração do Crescimento

- PAC tem sido o acirramento da degradação ambiental na Amazônia. Paradoxalmente, as

mineradoras instaladas em território amazônico afirmam que suas atividades são sustentáveis

(ALMEIDA: IN: REDE BRASIL: 2009). Criam-se pequenos parques artificiais de

preservação ambiental e recebem o selo de atividades sustentáveis.

Obviamente a questão ambiental no território da Amazônia conta com outros

problemas que superam o PAC, como por exemplo, as queimadas provocadas para abertura de

pastagens, o comércio ilegal de espécies, a derrubada de árvores, dentre outros. Mas

certamente, o PAC impulsiona em grande medida o processo de exploração predatória dos

recursos da Amazônia brasileira.

Os impactos sobre a Amazônia, do ponto de vista ambiental, e até mesmo social,

considerando as populações tradicionais, numericamente, revela dados assustadores do nível

de desmatamento da região que tem impactos negativos para a fauna e a flora, ou seja, a

biodiversidade, conforme apresentaremos no decorrer da nossa discussão. E, importante dizer,

que os níveis de degradação da Amazônia influenciam diretamente para desequilíbrio

ambiental das demais regiões do país.

Segundo Nascimento (2012):

Os resultados históricos da presença do grande capital na Amazônia

têm sido agravados em função de novas dinâmicas produtivas que

invadiram o espaço amazônico – como é o caso da cultura da soja -, as

quais se somaram às dinâmicas já sedimentadas, especialmente a

exploração mineral pela via dos grandes projetos, produzindo efeitos

sociais, econômicos e ambientais de toda ordem. À expropriação do

homem nativo, seguiu-se, como uma das alternativas de

sobrevivência, a migração interna que, aliada à migração externa – em

função da atração exercida pelos grandes projetos -, contribuiu, ao

lado de outros processos, para, por exemplo, a reconfiguração da rede

urbana da Amazônia (NASCIMENTO, 2012, p. 179)

‘Ao analisarmos a questão ambiental no Brasil para além da Amazônia, identificamos

ainda, outros problemas. Devido ao processo de urbanização do país, acarretado pela

industrialização, as cidades consideradas modernas e berço da economia, atualmente grandes

responsáveis pela poluição do meio ambiente, tem sentido os impactos de uma intervenção

predatória sobre a natureza. Podemos exemplificar considerando a realidade da cidade de São

Paulo que tem sofrido com esvaziamento dos reservatórios de água atualmente, o que tem

Sustentável do Mundo, e que acumula premiações na área de promoção do Desenvolvimento Sustentável

segundo a discussão empresarial da questão.

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implicado para a população no racionamento ou ausência de água para o desempenho de

atividades cotidianas, que paradoxalmente, é dotada por um rio grandioso, o Tietê, que se

encontra poluído e é incapaz de fornecer qualquer benefício à mesma. E, pelo Rio de Janeiro,

que convive com grandes enchentes, responsáveis por causar grandes massacres humanos,

desalojamento, dentre outras questões.

As mudanças climáticas, que redundam em variações periódicas do tempo, tem

“surpreendido” a população urbana, gerando problemas para outras cidades do país, como

para as capitais dos Estados do Espirito Santo e do Rio Grande do Norte, Vitória e Natal,

respectivamente, que no ano de 2014 sofreram com enchentes e deslizamentos de terra que

vitimaram e desalojaram números expressivos de pessoas.

Diante desse contexto, podemos concluir que as expectativas de um governo

“popular” na Presidência da República com a ascensão de representantes políticos da classe

trabalhadora foi completamente esvaziada e debelada por um projeto de governo que

priorizou o capital e seu projeto de acumulação em detrimento das demandas históricas e

necessárias da classe trabalhadora.

Mais do que isso, essa perspectiva assumida pelos Governos no PT obstacularizam o

caminho para a construção de uma perspectiva alternativa à essa filiação com o mercado.

Assim como, nos faz questionar: Como pensar em desenvolvimento sustentável no Brasil, em

desenvolvimento sustentável se o Estado brasileiro enfatiza o movimento pela defesa do pré-

sal, do agronegócio, dos monocultivos, de produtos transgênicos, que tem um impacto

socioambiental destrutivo diretamente em maior escala para a classe trabalhadora?

Essas atividades produtivas e mesmo a busca por alternativas ditas “limpas e

sustentáveis” tem contribuído para transformar a natureza em um “ativo” econômico,

lucrativo e privatizado, gerando os chamados “bens ambientais”, responsáveis pela

exploração predatória e expropriação das comunidades locais, conforme já elucidamos linhas

acima.

No grupo das iniciativas das Tecnologias Limpas no Brasil, a construção de parques

eólicos assume destaque perante as demais, mas expressa a ambivalência das soluções

técnicas do capitalismo na construção de alternativas de fomento ao desenvolvimento

sustentável.

À escassez de algumas matérias-primas e aos efeitos catastróficos da

produção industrial – a exemplo da incomensurável produção de lixo e

dejetos de toda ordem- o sistema vem engendrando um conjunto de

respostas de natureza técnica, cujo intento é atenuar as marcas de sua

destrutividade e encontrar novos campos de valorização do valor. A

indústria de reciclagem, o desenvolvimento das “energias limpas” e as

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tecnologias destinadas a minimizar a liberação de poluentes diversos

na natureza são paradigmáticos desta tendência (SILVA: 2010, p.

100).

As Tecnologias Limpas são consideradas desde as grandes iniciativas para

extinção/redução de danos ambientais em práticas econômicas e produtivas, até tecnologias

sociais de pequeno porte, em prol da preservação ambiental50

, para além de uma iniciativa do

capital para o meio ambiente configura-se num novo espaço no mercado; um negócio atraente

para investidores internacionais e nacionais. Um grande exemplo disso é a matriz energética

de fonte eólica. A energia eólica surge como fonte alternativa de extração de lucros via meio

ambiente, na década de 1970 com a crise do petróleo. No Brasil o primeiro parque eólico foi

implementado em 1992, em Fernando de Noronha/PE.

O Brasil atualmente ocupa a 21° posição no ranking dos países que produzem energia

eólica. Atualmente conta com 71 parques eólicos com aproximadamente um mil

aerogeradores, no qual existem nove fábricas de aerogeradores que inclusive já exportam essa

tecnologia e que custa em torno de R$4,5 milhões a R$5 milhões51

.

Um dos maiores complexos de energia eólica do Brasil se encontra em Água Doce–

SC, onde existem oitenta e seis torres, embora seja no nordeste que se considere que o tipo de

energia trouxe maiores benefícios. Dessa região, é o Ceará que detém 40% da capacidade do

país, com dezessete parques, e algumas residências já possuem aerogeradores particulares. No

Rio Grande do Norte, essa fonte de energia foi implementada, porque os “bons ventos”

atraíram investidores. Atualmente existem dez parques eólicos, e outros trinta estão em

construção. Estima-se que até 2014, o Estado será o principal produtor de energia eólica do

país. (Ibdem).

Sobre os impactos da implantação dos parques eólicos na Região do Ceará, cientistas

da região tem se debruçado em pesquisas para avaliar os impactos ambientais e dentre as

análises gerais apontam, que por serem implantados em regiões litorâneas, em dunas,

manguezais, próximos ao mar e lagoas costeiras, esses parques têm contribuído para

50

As de grande porte e tecnologia, são desenvolvidas por empresas e utilizadas nos processos produtivos e/ou

para a geração de energias consideradas “limpas”, inclusive, fomentam e financiam pesquisas científicas, no

intuito de garantir menos desperdício de materiais e conferir maior produtividade, e/ou considerar a preservação

ambiental (os parques eólicos, energia solar, etanol). Existem também as iniciativas domésticas, igualmente

consideradas de tecnologias limpas, empreendidas pela sociedade civil, voltadas para as atividades cotidianas da

sociedade (banho, locomoção, conforto pessoal, atividades domésticas, dentre outras), são exemplos destas: a

reciclagem do lixo, confecção de móveis domésticos a base de lixo, etc.

51

SITE: http://g1.globo.com/jornal-da-globo/noticia/2012/05/brasil-ocupa-21-posicao-no-ranking-dos-

produtores-de-energia-eolica.html-Edição do dia 24/05/2012 / 25/05/2012 01h06 - Atualizado em 25/05/2012

01h24.

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desestruturação morfológica, alterando a paisagem. Regiões essas nas quais a biodiversidade

deveria ser preconizada52

.

Os parques eólicos tem provocado o soterramento das lagoas costeiras quando fixam

as dunas que naturalmente são móveis e que em consequência disso vem perdendo a

capacidade de contribuir para amenização de processos erosivos, causando desequilíbrio

ambiental53

.

Mas os impactos também são sociais. Os aerogeradores representam riscos de morte

genuínos para as comunidades tradicionais localizadas em seu entorno. Geralmente, a

construção desses parques ocorre mediante a privatização do território, expropriando e

afetando as formas históricas de provisão do sustento das comunidades tradicionais

(fragilizando a soberania alimentar). O nomadismo das comunidades é impulsionado por esse

processo, visto que os trabalhadores procuram outras comunidades para sobrevivência, que

muitas vezes não os podem receber, gerando outros problemas. Além disso, a implantação dos

parques eólicos no Ceará e nas demais regiões do Brasil por extensão vem provocando o

subemprego uma vez que esses parques não agregam a mão de obra local, bem como,

influenciando no aumento exploração sexual e da gravidez precoce, dentre outros54

.

Os projetos de construção de parques eólicos não são somente motivados por interesse

ambientais, as expectativas mercantis são muito presentes e determinantes nesses processos.

Isto na medida em que envolvem interesses particulares e de mercados do setor de energias

limpas. Inclusive daqueles cujo interesse lucrativo centrava-se no setor do petróleo,

estritamente e que passam a vislumbrar no setor eólico grande fonte lucrativa.

Isso porque as empresas do setor eólico contam com financiamento do BNDES, tendo

apenas como critério, a utilização de, no mínimo, 60% de peças e acessórios nacionais,

fabricados no Brasil na construção dos aerogeradores e dos parques. O que movimenta e

beneficia os demais setores da indústria- aqueles não tão ecologicamente responsáveis assim -

e agricultores que alugam as terras para instalação dos parques e recebem altas quantias em

dinheiro anualmente por isso.

52

“Parques eólicos desestruturam a dinâmica ambiental e ecológica do litoral. Entrevista com Antônio Jeovah de

Andrade Meireles”. Publicação de Segunda, 22 de julho de 2013, Adital. Disponível em:

http://www.adital.com.br/site/noticia_imp.asp?lang=PT&img=N&cod=76524. 53

“Parques eólicos desestruturam a dinâmica ambiental e ecológica do litoral. Entrevista com Antônio Jeovah de

Andrade Meireles”. Publicação de Segunda, 22 de julho de 2013, Adital. Disponível em:

http://www.adital.com.br/site/noticia_imp.asp?lang=PT&img=N&cod=76524. 54

“Parques eólicos desestruturam a dinâmica ambiental e ecológica do litoral. Entrevista com Antônio Jeovah de

Andrade Meireles”. Publicação de Segunda, 22 de julho de 2013, Adital. Disponível em:

http://www.adital.com.br/site/noticia_imp.asp?lang=PT&img=N&cod=76524.

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Ainda que esta fonte energética contemple aproximadamente 12 milhões de brasileiros

e que evite a queima de combustíveis fósseis, a apropriação dessa tecnologia científica,

mercadológica põe em xeque as afirmativas de compromisso ecológico do capital, por

representar mais interesse lucrativo do que um compromisso ético ambiental55

.

Essa importante e fundamental fonte de energia deveria estar efetivamente afinada ao

seu objetivo de contribuir para um meio ambiente sustentável. Entretanto, para isso ocorrer, a

desmercantilização dessa tecnologia é fundamental, bem como, coloca-la a serviço da

comunidade e não do capital.

Em suma, percebemos que no século XXI o Estado brasileiro, especificamente,

incorporou o discurso ideológico do Desenvolvimento Sustentável, porém suas políticas estão

afinadas com o estímulo ao consumo e manutenção da hegemonia do capital. Esse mesmo

Estado se coloca paradoxalmente como defensor do meio ambiente e fomenta ao mesmo

tempo atividades produtivas destrutivas.

3.2 A contribuição do Estado brasileiro contemporâneo para insustentabilidade

socioambiental nas cidades e no campo.

A consideração do processo de modernização da agricultura brasileira, um

desdobramento da Revolução Verde, nos oferece um ponto de partida para compreender de

que forma a intervenção do Estado brasileiro, acompanhou e ajudou a cumprir os objetivos da

política neoliberal, reconfigurando o espaço urbano-rural. A Revolução Verde e suas

implicações para a agricultura e consequentemente para os/as trabalhadores/as rurais teve um

peso especial na formação da “questão socioambiental” contemporânea no Brasil. Assim,

considerá-la nos ajuda a desmistificar a realidade insustentável - do ponto de vista

55“AMSTERDAM — A Dinamarca deve grande parte de sua receita às fazendas eólicas e outras tecnologias verdes; os

Estados Unidos estão rapidamente expandindo seu setor de tecnologias limpas; mas nenhum país se compara ao ritmo

de crescimento da China. Essas são as informações de um novo relatório obtido pela The Associated Press. A produção

de tecnologias verdes na China cresceu impressionantes 77% em um ano, de acordo com o relatório encomendado pela

World Wildlife Fund for Nature (WWF). (...) A Dinamarca, líder há tempos em energia eólica, retira 3,1% de seu

produto interno bruto de tecnologias de energia renovável e eficiência energética – o que equivale a US$9,5

bilhões, de acordo com o relatório. A China é o maior produtor, em termos financeiros, ganhando mais do que

US$ 64 bilhões, ou 1,4% do seu PIB. Os Estados Unidos vêem em 17º lugar na produção de tecnologias limpas,

com 0,3% do PIB (US$ 45 milhões). No entanto, essa indústria vem crescendo a uma taxa de 28% ao ano desde

2008.” Fonte: http://info.abril.com.br/noticias/tecnologias-verdes/dinamarca-e-china-lideram-tecnologias-

limpas-11052011-3.shl / Acesso em: 06/11/2012.

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socioambiental - dos processos produtivos no país que historicamente, se apoiaram na

privatização da terra e no acesso privilegiado ao poder, na expropriação e exploração dos

territórios das comunidades “tradicionais”, ampla degradação ambiental, dentre outros

problemas, para responder a necessidade de inserção na lógica do capitalismo desenvolvido.

O processo de modernização da agricultura brasileira surgiu como uma necessidade de

adequar as atividades rurais para acompanhar o processo de industrialização em curso no país,

com a política desenvolvimentista alinhada ao projeto colocado em movimento pelos Estados

Unidos no Pós Segunda Guerra Mundial, no período da década de 1964, sob o regimento do

Golpe Militar. Logo, o setor agrário brasileiro recebeu especial atenção e foi alvo de

intervenção planejada de fomento do Estado em parceria com as elites nacionais e

participação da elite estadunidense, interessada nesse processo. O fim último era a construção

de ações modernizadoras da agricultura. No entanto, o que estava implícito também nesse

processo, era o truncamento da proposta de Reforma Agrária emergente.

O processo de modernização da agricultura nos anos 60 refletiu e acompanhou

o movimento de difusão da Revolução Verde fazendo as grandes propriedades

transitarem à categoria de grandes empresas capitalistas, respondendo, assim,

ao novo arranjo produtivo que passou a determinar o perfil da agricultura

brasileira – produtivista, atrelado à adubação química e à mecanização das

culturas, direcionado para o mercado externo e definidor do padrão alimentar

par atender a corporações agroindustriais. Este moderno arranjo econômico

preservou e ampliou a grande propriedade fundiária, excluindo ou deixando

quase à mingua a pequena propriedade em relação a benefícios creditícios e de

comercialização, por exemplo. Sem qualquer diretriz de política econômica a

seu favor, a pequena propriedade familiar/camponesa sofreu um vigoroso

processo de espoliação e fragilização, induzindo pequenos produtores ao

êxodo rural, particularmente nas décadas de 1970 e 1980 (VALADÃO &

BACELLOS, 2012, p.153).

Segundo Balestro&Sauer (2013), a “Revolução Verde” se refere as inovações

tecnológicas para a agricultura nascidas a partir de pesquisas pela Fundação Rockfeller, no

México nos anos de 1940 e que foram introduzidas e disseminadas no Brasil no final dos anos

1960 e início dos anos 1970 por intermédio dos incentivos governamentais, através de

créditos fácil e barato, num processo de modernização conservadora.

Este processo de modernização conservadora teve como principal instrumento

governamental para implantar a “Revolução Verde” o crédito subsidiado56

.

56

Nesse sentido, o modelo agropecuário e o pacote tecnológico se realizoucom a criação de uma rede pública,

com a oferta de assistência técnica e extensão rural, com a instalação, destinação de recursos e promoção de

pesquisas e ensino (criação de cursos universitários e técnicos nas universidades públicas e escolas técnicas). Os

recursos públicos direcionavam-se ao financiamento de pesquisas e disseminação do pacote tecnológico baseado

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O principal instrumento governamental para implantar a modernização

conservadora engendrada pela Revolução Verde foi o crédito subsidiado. O

Regime militar, especialmente nas décadas de 1970 e 1980, alocou grandes

somas de recursos financeiros, a juros baixos, para capitalizar os grandes

proprietários, possibilitando elevados investimentos em máquinas e insumos

(sementes, felitizantes, inseticidas etc.). Este pacote tecnológico foi

implantado através de crédito subsidiado, associado com as ofertas de

assistência técnica, recursos públicos para a pesquisa e preparação de

profissionais especializados no âmbito de ensino universitário ou

técnico(BALESTRO, SAUER:2013, p,8-9).

Indubitavelmente este modelo agropecuário elevou a capacidade produtiva agrícola do

país impulsionando a oferta para os mercados interno e externo (produtos primários), sendo a

balança comercial brasileira beneficiada por este processo. Todavia, e não menos importante,

o conjunto das tecnologias da “Revolução Verde” acarretou consequências danosas aos

biomas brasileiros, segundo Balestro e Sauer (2013).

(...) a adaptação do pacote tecnológico às condições dos biomas brasileiros,

inclusive com a famosa conquista do cerrado, através das técnicas de correção

de acidez do solo, tem sido responsável por sérios impactos ambientais.

Passados mais de 30 anos do início deste processo no cerrado, tornam-se

visíveis os efeitos perversos do modelo da Revolução Verde na região

ensejando severas críticas à sua manutenção. (idem)

Dessa forma, ainda levando em consideração as reflexões de Balestro e Suer (2013), a

introdução das biotecnologias na produção agrícola, de que é um exemplo os Organismos

Geneticamente Modificados (OGM’s ou transgênicos), representa a continuação e/ou o

aprofundamento da “Revolução Verde”, no sentido de que não se pode identificar mudanças

na lógica de produção e de artificialização da agropecuária e da natureza. Isto porque,

permanece a mesma lógica reducionista e um processo produtivo que segue recorrendo ao uso

de produtos químicos, danosos à natureza e à saúde humana.

A transgenia aprofunda o modelo de concentração de renda,

“concentra o controle tecnológico, concentra o poder, maximizao uso

da química ao mesmo tempo que maximiza os riscos ao meio

ambiente e à saúde de agricultores e consumidores” (GORGEM, 2000,

p.35). Nessa perspectiva, a expansão originária na última fronteira é

motivada a degradar a região, modifica os ecossistemas, polui e

envenena os rios, vindo a modificar toda a formação integrada do

meio ambiente. O modelo capitalista imposto ao mundo moderno, que

está fundado no “lucro e na produção de mercadorias, tem sido

responsável pela maioria dos problemas socioambientais (PIAIA,

1999, p.198) (PICOLI, 2006, p.124).

na lógica da produção monocultora em grandes extensões de terra, o que dizimava os pequenos produtores

(idem).

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101

No Brasil, segundo comparativos dos dados do IBGE e da Consultoria Céleres,

previsão para a produção de transgênicos para 2013, era que resultasse em mais da metade de

toda área plantada, ou seja, 54,8% de toda a área cultivada. A consultoria Céleres afirmava

que a área plantada com transgênicos deveria atingir 37,1 milhões de hectares neste ano,

representando um aumento de 14% se comparada a safra anterior. O IBGE por sua vez indica

que uma área de quase 70 milhões de hectares será utilizada com o plantio de transgênicos.

Ambientalistas e os movimentos do campo se contrapõem a esse tipo de produção

transgênica. Isto porque defendem uma produção mais sustentável. Na saúde humana,

conforme uma imensa quantidade de estudos já alavancados, tem se percebido o aumento do

número de pessoas com câncer e problemas reprodutivos em decorrência desse tipo de

alimento57

.

Vale enfatizar aqui a insutentabilidade desse modelo agroindustrial, levando em

consideração os impactos ambientais, que se revelam na erosão e contaminação do solo,

desperdício de recursos hídricos, a destruição das florestas e ameaça frontal a biodiversidade,

etc.

As principais consequências da adoção deste modelo agropecuário foram o

êxodo rural, a ampliação da concentração fundiária e profundos impactos

sobre o meio ambiente, apenas para citar três consequências desastrosas. Em

relação ao êxodo, o campo brasileiro abrigava mais ou menos de 70% da

população nas décadas de 1950 e 1960 chegando, na década de 1990, a ter

menos de 30% do total da população. (Idem,p.10)

A empresa Maplecroft da Grã-Bretanha, especializada em análises de riscos, divulgou

em 2011 um relatório na 17° Conferência das Partes da Convenção Quadro- da ONU

(COP17), em Durbam, para mudanças climáticas, cujo objetivo era o de avaliar os países que

mais emitem gases poluentes na atmosfera para a produção de energia. Foram analisados 176

países do setor energético58

.

No referido relatório, o Brasil ocupa a 6° posição dentre os países avaliados como

mais emissores de gases poluentes em virtude de ter lançado na atmosfera aproximadamente

1.144 megatoneladas de CO2e, entre 2009 e 2010. Além de CO2e, esse dado também se

refere à emissão de outros gases aprisionadores de calor, como: metano; dióxido nitroso-

responsáveis pela produção energética. De acordo com esse relatório, o Brasil à época em que

57

Fonte: http://www.radioagencianp.com.br/11380-metade-da-area-cultivada-no-brasil-sera-de-transgenicos-em-

2013. Acesso em: 30/09/2013. 58

Fonte: http://planetasustentavel.abril.com.br/noticia/desenvolvimento/brasil-sexto-maior-emissor-gases-

poluentes-setor-energia-cop17-648185.shtml. Acesso em: 04/03/2013.

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102

foi divulgado, era o responsável por dois terços das emissões globais de gases causadores do

efeito estufa do setor de energia59

.

No campo ambiental, apresentando a realidade do Brasil, para dimensionar a

degradação ambiental, transformamos em gráfico dados do Instituto Nacional de Pesquisas

Espaciais – INPE que através do Projeto PRODES realiza o monitoramento por satélite do

desmatamento na Amazônia em Km². Os índices de desmatamento, nos últimos 24 anos, ou

seja, do período que compreende os anos de 1988 a 2012, oscilam em muito, ocorrendo com

maior expressividade nos anos de 1988, 1995 e 2004 que em números corresponde a 21050,

29059 e 27772 Km², respectivamente. Os anos de 2011 e 2012 apresentam diminuição

expressiva nos índices de desmatamento em Km² na Amazônia. Todavia tal diminuição no

desmatamento não anula o saldo de degradação dos anos que os antecedem.

(FONTE: PRODES/INPE)

Mais do que números, esses dados nos apresentam uma realidade histórica

preocupante de desmatamento cujas implicações para a fauna, flora e vida humana são

59

Neste relatório da Maplecroft, a China ocupa o 1° lugar dentre os países mais poluentes por haver lançado

entre 2009 e 2010 9.441 megatoneladas de CO2e na atmosfera, o que significou a superação dos EUA que no

mesmo período emitiu 6.539, ocupando o 2°lugar. Na sequência estão: localizadas a Índia (2.272,45); Rússia

(1.963); Japão (1.203). Após o Brasil em sequência, aparecem: Alemanha , Canadá, México e Irã.

21050

17770

13730

11030

0

14896

14896

29059

18161

13227

17383

17259

18226

18165

21651

25396

27772

19014

14286

11651

12911

7464 7000

6418

4656

0

5000

10000

15000

20000

25000

30000

35000

88

89

90

91

92

93

94

95

96

97

98

99

20

00

20

01

20

02

20

03

20

04

20

05

20

06

20

07

20

08

20

09

20

10

20

11

20

12

Desmatamento da Amazônia em Km² ao longo da história 1988-2012

DesmatamentoKm²

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103

incalculáveis e irreversíveis. Eles agregam em si, o significado do crescimento industrial com

expansão dos mercados cuja intervenção predatória sobre as áreas verdes da Região da

Amazônia resultam em tamanho processo destrutivo. Representam, portanto, a expansão do

capital que subordina a natureza a sua lógica produtivista. Conforme Picoli, “Na Amazônia, o

modelo expansionista dos tempos modernos, fundamenta-se na destruição da natureza e na

finalidade de obter lucro sem limitações (PICOLI, 2006.p124)”.

As principais causas de tal desmatamento são as queimadas ilegais para abertura de

pastagens para criação de gado, a derrubada de árvores pelas madeireiras e demais indústrias,

à extração clandestina de árvores para alimentar o mercado ilegal, o próprio crescimento

populacional. Este último em menor proporção em relação às empresas.

Segundo Picoli:

Os índices de desmatamento das últimas décadas e a progressão

futura, que ocorrem na região, são entendidos através de duas

amplitudes diferentes. Primeiro, são resultados da entrada das

madeireiras para a coleta das árvores, tendo finalidade apenas

econômica e o aproveitamento dos recursos florestais uma única vez.

Segundo, pela formação de grandes empreendimentos econômicos,

através das empresas agropecuárias, pois nesses projetos necessitam

fazer a retirada de toda a cobertura florestal. Estabelecem projetos de

contínua exploração, mas ambas as formas necessitam interferir no

meio ambiente através da devastação definitiva (PICOLI, 2006,

p.144).

Na Amazônia brasileira, embora segundo dado do INPE, tenha declinado os índices de

desmatamento nos anos de 2011 e 2012 para 4.656 km², o saldo de área florestal que já foi

perdida que totaliza 745 mil km², equivale a 490 cidades no tamanho do município de São

Paulo ou a 90 milhões de campos de futebol. Do total do bioma 18% equivale a área

desmatada, 4% é de corpos D´água, 78% é de vegetação remanescente.

Picoli (2006) aponta que essa dinâmica só é possível porque,

O Brasil possui uma política florestal que atende o grande

capital, em detrimento dos povos originários e dos posseiros. A

mesma política que destruiu a floresta atlântica brasileira

apresenta-se também através da indústria madeireira na

Amazônia. Faz-se necessário lembrar que a produção oriunda do

setor de transformação de madeireiras cresce em volume a cada

ano, proporcionado pela interferência de capital nacional e

internacional, mas não com práticas sustentáveis que venham a

respeitar o meio ambiente. O projeto estabelecido na região não

contempla madeireiras para sempre, mas é itinerante, com o

objetivo de aproveitar as árvores sem sustentabilidade (PICOLI,

2006, p. 144).

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104

Até 2008, a forma como é utilizada a área total desmatada, totaliza:

Pasto 62%

Vegetação Secundária 21%

Área não observada 6,3%

Agricultura anual 4,9%

Mosaico de ocupação 3,4%

Área urbana 0,5%

Mineração 0,1%

Outros 1,6%

Fonte: www.planetasustentavel.abril.com.br/

Disponível em: http://planetasustentavel.abril.com.br/pops/desmatamento-amazonia-

infografico-2012.shtml

Fonte originária: Exame.com

Apuração: Vanessa Barbosa

Fontes: PRODES/INPE.

*Quadro organizado pela autora da pesquisa.

Acerca desses dados, o quantitativo de desmatamento por abertura de pastagens de

62% é um dado que preocupa, embora seja uma realidade que tende a se expandir. As

queimadas ilegais destinadas a este fim tem um grande peso no desmatamento da Amazônia.

Para além da Amazônia, os centros urbanos brasileiros, igualmente tem demonstrado

uma dinâmica preocupante no que diz respeito a contribuição para o acirramento do

aquecimento global e para o cenário ambiental do país. Segundo a OMS, o Brasil em 2011

ocupava o 44° lugar entre 91 países avaliados em seus índices médios de poluição do ar. O

Rio de Janeiro era a 144° cidade mais poluída, cujo índice de material particulado a cada m³ é

de 64 microgramas. O Rio de Janeiro tinha a situação mais grave que São Paulo, com 38

microgramas por m³ de ar. A pior cidade do mundo é a de Ahwaz, no Irã, com 372

microgramas por m³60

.

Diante desses dados, podemos compreender o porquê de o Rio Grande do Norte,

estado situado no Nordeste brasileiro, com aproximadamente 3.168.027 habitantes (Censo

IBGE:2010), enfrentou em 2013 a pior seca dos últimos 50 anos que colocou em situação de

emergência mais da metade de seus municípios e trouxe transtornos a mais de meio milhão de

pessoas. Os açudes responsáveis pelo abastecimento de cidades com 5 mil habitantes estão

60

Fonte: http://www.indicadorbrasil.com.br/2011/09/brasil-e-o-44%C2%BA-pais-no-ranking-de-poluicao-do-ar/.

Fontes originárias: OMS; O Estado de São Paulo. Acesso em: 14/03/2013.

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105

abaixo de sua capacidade, um desses com menos de 9%, ou seja, água que contempla no

máximo 90 dias. As barragens secaram, muitos animais morreram. Cerca de 90% dos 167

municípios do Rio Grande do Norte ainda permanecem em situação de emergência61

.

No setor agrário, o crescimento da produção com utilização de agrotóxicos também

evidenciam as marcas de uma dinâmica insustentável no Brasil. Nos últimos dez anos o

mercado de agrotóxicos no mundo subiu 93%, só no Brasil a crescimento foi de 190%. Em

2011 foi pulverizado 852,820 milhões de litros de agrotóxicos nas lavouras do país. Em 2008

o Brasil já havia ultrapassado os EUA assumindo o posto de maior mercado de agrotóxicos,

utilizando 19% desse produtos produzidos no mundo. Os brasileiros têm consumido

individualmente por ano 5,2 litros de agrotóxico62

.

Segundo a ANVISA, um terço dos alimentos consumidos cotidianamente pelos

brasileiros está contaminado por agrotóxicos. Dentre os alimentos analisados, o pimentão

lidera a lista com 92% de contaminação, em seguida, o morango com 63,4%, o pepino com

57,4%, a alface com 54,2% , a cenoura com 49,6%, o abacaxi com 32,8%, beterraba com

32,6% e mamão com 30,4% (ABRASCO, 2012).

Segundo o relatório ABRASCO, os transgênicos influenciam no aumento do consumo

de alimentos contaminados por agrotóxicos, apontando inclusive que só oglisofato, que é

utilizado no cultivo de soja transgênica, representa 40% do mercado nacional63

. O interessante

61

Fonte: http://g1.globo.com/jornal-nacional/noticia/2013/09/pior-seca-dos-ultimos-50-anos-castiga-meio-

milhao-de-pessoas-no-rn.html . Acesso em 30/09/2013. 62

Atualmente o Brasil ocupa o primeiro lugar como consumidor mundialde agrotóxicos. Utilizados

principalmente na agricultura, mas também na pecuária, na conservação de madeira, de alimentos, na

produção de florese como domissanitários (ex: inseticidas domésticos). A população rural constitui o grupo

populacional mais diretamente exposto, muitas vezes desde a infância, porémtoda a população pode ter contato

com agrotóxicos, seja pela ocupação, pela alimentação ou pelo ambiente.Alguns compostos testados em animais

evidenciaram carcinogenicidade, como os organocloradados, alguns derivados do enxofre e o creosoto, um

composto formado por hidrocarbonetos aromáticos, ácidos e alcatrão, muito utilizados na preservação da

madeira. Outras substâncias são promotoras de tumor, como o diclorodifeniltricloroetano (DDT), clordane e

lindane (IARC, 2010). Em humanos, compostos derivados do arsênio e inseticidas têm sido classificados pela

IARC como cancerígenos. Estudos epidemiológicos são controversos nos achados que identificam a relação

entre a exposição a agrotóxicos e o aumento do risco de câncer. Associações positivas entre cânceres

hematológicos e exposições ocupacionais a substâncias químicas foram observadas em estudos de caso-controle

no sul do Estado de Minas Gerais para trabalhadores expostos a agrotóxicos ou a preservantes de madeira e

para trabalhadores expostos a solventes orgânicos, lubrificantes, combustíveis e tintas (Silva, 2008). Solomonet

al. (2000) e Clapp et al. (2007) encontraram relação entre agrotóxicos e câncer, incluindo os cânceres

hematológicos, do trato respiratório, gastrointestinais e do trato urinário, entre outros. Wijngaardenet al.

(2003) descrevem a exposição intrauterina e a ocorrência de câncer do cérebro na criança. Miligiet al. (2006)

associaram a exposição a herbicidas fenoxiacéticos com aumento de risco para sarcoma, linfoma não Hodgkin,

mieloma múltiplo e leucemias; exposição a triazinas (herbicidas) ao aumento de risco para câncer do ovário;

exposição a inseticidas organofosforados ao aumento de risco para linfoma não Hodgkin, leucemias e câncer da

próstata e a exposição a organoclorados ao aumento de risco para câncer da mama. Ainda sobre o câncer da

mama, Snedeker (2001) observou resultados controversos entre câncer e níveis sanguíneos ou no tecido adiposo

do inseticida DDT e de seu metabólito diclorodifenildicloroetileno (DDE).(INCA: 2012) 63

http://www.brasildefato.com.br/node/9809. Acesso em: 01/10/2013. Artigo: Bevenuti (13/06/2012).

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106

é que algumas empresas afirmavam que a produção de transgênicos reduziria a quantidade de

contaminação pelos agrotóxicos.

De posse desses dados e análises, podemos compreender que o desenvolvimento

sustentável do mercado capitalista, seja ele no Brasil ou no mundo, implica na

insustentabilidade do meio ambiente. E o Estado tem sido diligente na criação das condições

de perpetuação dessa lógica destrutiva. É o que temos visto se desdobrar não apenas nas

formas de condução da política governamental brasileira contemporânea, como também em

toda a América Latina e no mundo. O desenvolvimento social é subordinado ao pleno

crescimento e expansão irrestritos para o capital. Os recursos ecológicos são subordinados a

suprir a avidez lucrativa. Por fim, a classe trabalhadora, posta a serviço da consolidação desse

processo.

Vimos que em contrapartida a perspectiva de conciliação que discurso ideológico do

capitalismo verde articula e que o Estado brasileiro agregou a sua política, se desenvolve um

processo produtivo desagregador e predatório.

A perpetuação dessa dinâmica produtiva que acirra a destruição dos recursos naturais

não nos permite creditar ao capitalismo a capacidade de reversão da problemática ambiental.

Nesse sentido, é importante e necessário um debate crítico sobre os fundamentos

sociopolíticos do discurso hegemônico do Capitalismo Verde que agrega as discussões do

Desenvolvimento Sustentável e da Economia Verde. Mas acima de tudo, a construção de

estratégias alternativas perante as alternativas que o capitalismo assume como bandeira ao seu

pleno desenvolvimento em detrimento do meio ambiente sustentável.

Ciente das determinações do capitalismo, a escola crítica se esforça para construir uma

alternativa socialista para o meio ambiente. Assim, surgem conceitos como o Ecossocialismo

e Agroecologia, sobre os quais desdobraremos os fundamentos no tópico subsequente.

3.3. Crise ambiental e o ecossocialismo: “a alternativa às alternativas das elites do

capital”.

No campo do debate crítico sobre a crise ambiental, o ecossocialismo é uma

perspectiva que vem se afirmando como “alternativa às alternativas” discutidas pelo

pensamento hegemônico, que compreende o conjunto articulado de determinações sistêmicas

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107

para a configuração da crise ambiental apontando a necessidade de luta pela ruptura com esse

modo de produção insustentável64

. Embora não seja uma corrente politicamente homogênea

no pensamento crítico, seus fundamentos articulam temas em comum.

Esta corrente está longe de ser politicamente homogênea, porém a

maior parte de seus representantes compartilha alguns temas comuns.

Em ruptura com a ideologia produtivista do progresso – na sua forma

capitalista e/ou burocrática – e contrária à expansão sem limite de um

modo de produção e de consumo destruidor da natureza, ela representa

uma tentativa original de articular as ideias fundamentais do marxismo

com os conhecimentos da crítica ecológica (LÖWY, 2010, p.689).

Conforme sugere a nomenclatura, o Ecossocialismo refere-se ao socialismo ecológico

que aceita como realidade uma sociedade pautada por um controle democrático, com

igualdade social e marcada pela predominância do valor de uso em detrimento do valor de

troca. Ou seja, a relação oposta que o capitalismo estabelece com o homem e a natureza.

Como uma das alternativas que se contrapõe ao ideário de um “capitalismo verde” a

proposta do ecossocialismo se revigora, muitos movimentos sociais apontam suas ações para

uma direção anticapitalista. Mas, afinal, do que se trata?

De acordo com Löwy:

Trata-se de uma corrente de pensamento e de ação que se apropria dos

conhecimentos adquiridos fundamentais do socialismo, mas do

socialismo desvencilhado de seus resíduos produtivistas. Para os

ecossocialistas, alógica do mercado e do lucro, bem como a lógica do

autoritarismo burocrático do finado “socialismo real”, são

incompatíveis com as exigências de proteção do meio natural. Apesar

de criticar a ideologia das correntes dominantes do movimento

operário, os ecossocialistas sabem que os trabalhadores e suas

organizações são uma força essencial para qualquer transformação

radical do sistema, e para o estabelecimento de uma nova sociedade,

socialista e ecológica (LÖWY, 2010, p. 689).

Há um reconhecimento dos defensores do ecossocialismo da responsabilidade que o

capitalismo tem pela crise ambiental a partir da compreensão da lógica perversa de expansão

desenfreada que engendra esse sistema, que desconsidera o meio ambiente na perseguição do

lucro.

No ecossocialismo não se transfere a responsabilidade da crise ambiental aos seres

humanos em geral, conforme o fazem os cientistas, e sim essencialmente ao capital. O

ecossocialismo expressa antes de tudo, uma preocupação em avaliar a extensão dos problemas

ambientais, de historicizá-los e contribuir para a construção de uma realidade radicalmente

64

Cabe salientar que existem outros debates importantes acerca de soluções alternativas para a superação da

crise ambiental, como a Agroecologia que vem se desdobrando em discussões que articulam formas de produção

em bases menos destrutivas, embora não necessariamente dialoguem com o pensamento crítico marxista.

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oposta. Uma perspectiva que vai além das soluções e alternativas postas pelos responsáveis

por esse processo destrutivo.

Acerca das soluções de iniciativa das elites do capital, Löwy (2010) apontou três

grandes grupos: 1) grupo dos avestruzes, 2) dos partidários do business as usual e 3)dos

acordos internacionais restritivos.

O 1) grupo, que denominou de “avestruzes”, é composto pelas elites que defendem

que as mudanças climáticas não tem relação com as atividades humanas, não tem origem

“antrópica”. As mudanças climáticas são percebidas como consequências de processos

naturais (como as manchas do Sol). O autor exemplificou que essa era a posição assumida por

Bush e que tem influência da indústria petrolífera. Essa perspectiva tentava silenciar as

previsões mais próximas do real e coadjuvar os apontamentos de cientistas que afirmavam o

contrário.

O grupo 2) dos partidários do business as usual, considerava a existência do problema,

no entanto, apontavam como direção que as empresas de forma voluntária a partir de meios e

medidas técnicas o solucionasse. Esse grupo, sem dúvida é ativo na transformação dos

problemas ambientais em um novo nicho de mercado.

Por fim, o 3) grupo dos acordos internacionais restritivos, como é o caso do Protocolo

de Kyoto que, embora represente um avanço pela proposta de determinar quantitativos

especificados e penalidades em caso de não cumprimento dos objetivos especificados, não

tem de fato surtido o efeito esperado no truncamento do processo de emissão de gases de

efeito estufa.

Dessa maneira, o debate das mudanças climáticas e das soluções para elas tem no

capitalismo relação com os interesses em disputa das elites e com o objetivo maior do capital,

o lucro. Desempenham, portanto essas concepções, um papel econômico e político que se

desdobra em discursos falaciosos de compromisso ético-social e ambiental por parte tanto das

empresas quanto de governos de países de economia desenvolvida, etc. E isso se torna

preocupante para os movimentos ambientais uma vez que o capitalismo segue destruindo

quando a natureza “pede socorro” e tem demonstrado não suportar tal dinâmica de

deterioração e destruição.

Levemos em consideração as variações climáticas que saltam aos nossos, bem como,

os sinais evidentes do esgotamento da natureza pela dinâmica produtiva direcionada ao

consumismo, como nos apresentam: o derretimento das geleiras em ritmo acelerado, fazendo

crescer o volume das águas que retomam seu espaço invadido pelos homens, a escassez de

recursos não renováveis, a migração dos animais, insetos e microorganismos para adaptação

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109

as novas condições impostas pela dinâmica das sociedades modernas, a extinção de animas e

espécies de plantas, provocados pela ampla destruição e poluição, dentre outros.

O fenômeno aquecimento global, provocado pela elevada poluição por gases de efeito

estufa, lançados em grande quantidade cotidianamente, tem grande peso na configuração

desse cenário de mudanças climáticas e bionaturais.

Nos termos de Silva o aquecimento global,

parece sinalizar uma generalização e potencialização da degradação ambiental,

agregando novas dimensões a esta problemática, visto que seus impactos se

fazem sentir em todo o planeta com a incidência sobre as condições de vida ,

em especial sobre a saúde e habitabilidade dos segmentos mais pauperizados

das classes trabalhadoras (2010, p.105).

O IPCC (Painel Intergovernamental de Mudança Climática) vinculado a ONU

divulgou em 27 de setembro de 2013 um novo relatório de 30 páginas, embasado por

pesquisas recentes, denominado de Sumário para Formuladores de Política, produto de um

encontro entre cientistas e representantes governamentais que se reuniram em Estocolmo, na

Suécia, no qual os cientistas apontam com maior ênfase a responsabilidade da ação humana

pelo aquecimento global. Segundo os dados das pesquisas mais recentes há 95% de certeza do

envolvimento humano no aquecimento global. Houve um aumento de 5% dessa certeza se

comparada a divulgação do relatório de 2007 no qual essa certeza era de 90%.

Segundo este novo relatório, a temperatura na Terra aumentou 0,85 graus Celsius entre

1880 e 2012. Entre as décadas de 1952 e 2012, o aumento na temperatura foi de 0,12 graus

Celsius por década. Mas, a partir de 1998 o ritmo de aquecimento do planeta caiu 0,05 graus

Celsius por década. A concentração do dióxido de carbono na atmosfera hoje superou o da

época da Revolução Industrial, sendo de 40%, fato a que se deve a grande quantidade de

queima de combustíveis fósseis. Até o final do século XXI a temperatura poderá atingir 4,8

graus Celsius, isso se persistirem os atuais níveis de emissão de gases poluentes.

O nível do mar poderá ficar entre 26 e 83 centímetros até 2100. Isso em decorrência

ou influenciado pela diminuição intensiva da cobertura de gelo do ártico. Os cientistas

indicaram que até o final do século esse processo de diminuição continuará. Na estação do sol

essa cobertura poderá perder entre 43% e 94% de sua área65

.

Este novo relatório é o resumo de outro relatório técnico escrito por cientistas que

foram reunidos pelo IPCC, e que contém 2.000 páginas, sendo esta a primeira parte das quatro

que compõem o documento completo. Há a previsão de que ocorrerá com maior frequência e

65

Fonte: http://veja.abril.com.br/noticia/ciencia/relatorio-da-onu-aumenta-certeza-de-envolvimento-humano-no-

aquecimento-global-nao-publicar. Acesso em: 30/09/2013.

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quantidade eventos extremos de expressão climática do aquecimento global, como:

tempestades, furacões e secas. As cidades litorâneas sofrerão e/ou terão sua existência

ameaçada com os impactos do aumento do nível dos mares que nesse novo relatório do IPCC,

indica que vai aumentar entre 26 e 83 centímetros.

Todo o aparelho produtivo do capitalismo está baseado na utilização dos combustíveis

fósseis (petróleo e carvão) (LÖWY, 2010) que são os responsáveis por provocarem o

aquecimento global, dentre outros impactos ambientais. Assim, o capitalismo aprisionado,

dependente da economia marrom, vai acirrando a crise ambiental. A queima desses

combustíveis que são responsáveis pelo lançamento de CO² na Atmosfera que provoca o

aquecimento global e os problemas climáticos dele decorrentes.

[...] a responsabilidade por isto cabe ao sistema capitalista, à sua

lógica absurda e míope de expansão e acumulação sem limites, a seu

produtivismo irracional obcecado pela procura do lucro. De fato, todo

aparelho produtivo capitalista está baseado na utilização de das

energias fósseis – petróleo, carvão –, emissoras de gás responsável

pelo efeito estufa; o mesmo se aplica ao sistema de transporte

rodoviário, sobretudo ao longo das últimas décadas, e ao automóvel

individual (LÖWY,2010, p. 684).

A Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação- FAO, no Dia

Mundial da Água divulgou, em 2012, dados alarmantes sobre a utilização da água nos setores

produtivos e no âmbito doméstico. As necessidades alimentares diárias de cada pessoa, por

exemplo, são satisfeitas através da utilização de três mil litros de água. Consideremos que

somos atualmente aproximadamente 7 bilhões de seres humanos, o consumo humano com

água diariamente, no mundo, é de 21 trilhões de litros de água. Esse número é bastante

expressivo, porém se comparado a utilização dos setores produtivos, percebe-se que é

insignificante. A agricultura utiliza 70% de toda água disponível no mundo; a indústria 20%;

e o consumo doméstico gira em torno de 10%. Isso, sendo água doce e potável, um recurso

finito, apesar de renovável. Para a produção de um quilo de grãos é necessária a utilização de

1.500 litros de água, e 10 vezes essa quantidade para a produção de um quilo de carne, ou

seja, aproximadamente 15 mil litros de água66

.

Apesar da América Latina ser o lócus privilegiado desse recurso da natureza, por

receber quase 30% da precipitação mundial e (...) uma quantidade de água por habitante

muito acima da média do planeta: 28 mil metros cúbicos por habitante ao ano (FA0:2009),

temos uma distribuição muito desigual, sendo o resultado disso, regiões muito abastecidas -

66

SITE: https://www.fao.org.br/DMApcqcn15mladFAO.asp. Acesso em: 25/02/2012.

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111

em geral as capitais e os municípios do seu entorno- e regiões parcialmente ou totalmente

desabastecidas, nos lugares mais longínquos, cujo custo de obras infra-estruturais para o

Estado são elevados.

Cabe aqui refletir que os problemas de ordem ambiental e social, são determinações da

dinâmica desigual e exploratória do capitalismo..

Conforme reflete Ellen M. Wood:

Apesar do seu dinamismo, ele não é um modo muito eficiente de suprir as

necessidades humanas. É certamente verdade que o capitalismo gerou grande

progresso técnico e material, mas existe uma enorme disparidade entre a

capacidade produtiva engendrada pelo capitalismo e o que ele, de fato,

oferece. A produção não é determinada pelas necessidades da sociedade, mas

por aquilo que proporciona mais lucro (2003, p.40).

A intervenção humana predatória, de base capitalista, cuja natureza é apropriada

enquanto objeto67

, não tem considerado efetivamente a fragilidade dos recursos da natureza e

a impossibilidade de muitos destes serem renovados. Nesse sentido, a luta pela superação do

capitalismo é fundamental para sustentabilidade planetária. Não é apenas uma utopia, mas

uma necessidade.

A perspectiva anticapitalista historicamente lida com o estranhamento e ceticismo

sociais porque a ideologia que sustenta a máquina capitalista está profundamente enraizada no

conjunto das relações sociais. Uma corrente contra hegemônica que questiona, por exemplo, o

consumismo, tão imbricado no conjunto das relações sociais, causa estranhamento porque a

cultura e os valores da sociabilidade capitalista vigentes tem maior força na determinação das

necessidades sociais.

Ora, o capital entronizou um padrão de vida que subverteu e complexificou ainda mais

o entendimento das necessidades sociais, genuínas humanas, como alimentar-se, vestir-se,

hidratar-se e abrigar-se, tudo passou por um processo de mercantilização. Todas as

necessidades humanas foram vinculadas as necessidades materiais.

Numa sociedade socialista ecológica os valores do consumo mercadológico teriam que

ser progressivamente desconstruídos, resgatando o entendimento do que de fato representa

uma necessidade social, alterando-se por extensão as consciências, a partir de um esforço

analítico e de ruptura com os padrões capitalistas.

E que, segundo Michel Löwy (2007), pressupõe: propriedade coletiva dos meios de

produção; planejamento democrático que permita a sociedade definir os objetivos da

produção e os investimentos, e uma nova estrutura tecnológica das forças produtivas. Sob esse

67

SILVA, Andréa Lima da: CEFESS/MANIFESTA/2012, Dia Mundial do Meio Ambiente.

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prisma, podemos identificar a necessidade dessa superação, articulada com as relações sociais

de trabalho, produção e o usufruto do conhecimento científico.

À medida que se passa das determinações mais abstratas (naturais e técnicas)

para as mais concretas (incluindo a relação social de trabalho, a produção e a

aplicação dos conhecimentos científicos etc.), a contradição já não diz respeito

apenas as forças produtivas e põe em ação noções como crescimento e

desenvolvimento (LOUREIRO, 2007,p.59).

Michel Lowy reflete que a utopia de um socialismo verde ou do alcance de um

comunismo não significa não devamos agir de imediato, no tempo presente. Isto é, o fato de

não alimentarmos ilusões sobre a realidade que vivenciamos, ou seja, entendemos a

impossibilidade de “ecologizar” o capitalismo, não significa que não devemos empreender

lutas por reformas imediatas.

O combate por reformas ecossociais pode ser portador de uma dinâmica de

mudança, de “transição” entre as demandas mínimas e o programa máximo,

com a condição de que se recusem os argumentos e as pressões dos interesses

dominantes, em nome das “regras do mercado” da “competitividade” ou da

“modernização” (2005, p.60).

Nesse sentido, ainda segundo Lowy (2005) algumas demandas imediatas já devem ser

consideradas como pontos de convergência na luta dos movimentos sociais e os movimentos

ecológicos, como por exemplo: a promoção de transportes públicos, baratos ou gratuitos

(alternativas para frear a realidade de abafamento e a grande a poluição das cidades e dos

campos impulsionadas pelo uso do carro individual e pelo sistema de transportes rodoviários);

a luta contra o sistema da dívida e os “ajustes” ultraliberais impostos pelo FMI e pelo Banco

Mundial aos países do Sul, com graves consequências sociais e ecológicas; defesa da saúde

pública, contra a poluição do ar, da água ou dos alimentos pela avidez das grandes empresas

capitalistas; redução do tempo de trabalho (em resposta ao desemprego e uma visão da

sociedade que se contraponha à acumulação de bens indiscriminada, privilegiando o tempo

livre).

E, fundamentalmente que se possa compreender que o que devemos almejar romper

para a configuração de uma realidade efetivamente sustentável, não se limita a defesa da

superação restrita das relações de produção e de propriedade características do capitalismo,

mas com o próprio aparelho produtivo. Requer antes de tudo uma leitura mais ampla do

significado de revolução socialista, bem como, de união de forças entre os movimentos

sociais e ecológicos. Entendendo que as problemáticas que ambos enfrentam são faces de uma

mesma realidade estrutural.

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Por fim, desvelar a natureza das ofensivas ideológicas do Capitalismo

constitui tarefa de primeira ordem, especialmente, em tempos de crise

estrutural. Entrar na disputa pela reorientação dos movimentos ambientalistas,

no caminho do ecossocialismo, de natureza essencialmente anticapitalista,

assim como pela incorporação da pauta ambiental nas demais lutas sociais,

faz-se condição fundamental para defender a continuidade de nossa posse e

permanência no planeta, tendo como suposto uma sociedade humanamente

emancipada. Se a insustentabilidade planetária resulta de uma ordem social

perdulária e destrutiva (não natural), somente com a superação desta ordem

social é possível construir uma sociedade verdadeiramente sustentável

(ARAÚJO & SILVA, 2012, p. 141).

Dessa forma, corroboramos com essa corrente de pensamento crítico ecossocialista,

essencialmente anticapitalista, no que se refere ao reconhecimento à impossibilidade de nos

limites da sociabilidade capitalista se efetivar a sustentabilidade, por conseguinte com a

defesa de sua superação.

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4. “A RESPONSABILIDADE SOCIOAMBIENTAL NAS EMPRESAS: O CASO DO

ITAÚ UNIBANCO.

No capitalismo historicamente a natureza é apropriada mercadologicamente, esse é um

aspecto constitutivo e que responde a necessidade expansiva desse sistema. A especulação

sobre os bens ambientais, marcada pela precificação e comercialização é própria do modo de

produção capitalista.

Através de políticas que determinam o livre mercado e a privatização, o capital se

apropria dos bens naturais em escala sempre crescente (terra, água, petróleo, minérios,

alimentos, etc.) e os submete a sua lógica mercantil produtivista e destrutiva dos recursos

ecológicos. Portanto, a mercantilização da natureza se deve a essa dinâmica.

A apropriação mercantilizadora da natureza só é possível pelo aparato que o Estado

historicamente oferece ao capital com a criação dos marcos legais e de condições

infraestruturais fundamentais para esse processo. Isso porque, a gestão desses bens passa a

ser cedida pelo Estado ao capital.

Na lógica neoliberal, o recuo do Estado no que se refere à intervenção nas políticas

industriais, nos bancos públicos e na prestação de serviços, em contrapartida ao fomento à

expansão do mercado financeiro que oferece através de sua forte intervenção quanto à fixação

de políticas monetárias, redução de impostos e suporte às instituições financeiras impactadas

pela crise, vai potencializando o mercado financeiro. A política econômica mundial a partir

disso é marcada pela forte influência das elites, das instituições e do mercado financeiro.

Assim, num tempo histórico em que o mercado financeiro assumiu um papel central

na dinâmica do capitalismo os bens ambientais passaram a ser alvo de especulação e a

integrar os negócios nesse setor da economia.

A crise financeira deflagrada em 2008 que adquiriu a dimensão de crise econômica

porque atingiu todos os países de economia capitalista, desenvolvidos e em desenvolvimento,

provocou investidores à busca de novos campos para o resgate dos lucros. Quando se

esgotaram as possibilidades de investimento estritamente em ativos financeiros, a especulação

financeira sobre a natureza cresceu, posta as evidências da crise ambiental, configurando um

novo e lucrativo mercado (“verde”). Os recursos da natureza, bem como, as alternativas para

solucionar a crise ambiental, passam por um processo de financeirização.

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A escassez de bens naturais se apresentou ao mercado como uma oportunidade de

negócios. Assim os investidores passaram a especular no mercado de alimentos, que

impulsionou a crise alimentar de 2008/2009, na qual aumentou consideravelmente o preço dos

alimentos básicos – o que duramente afetou as classes subalternizadas das sociedades,

“excluídas”, sobretudo, nos países onde a pobreza é mais latente.

Todavia, o “mercado verde” se apropriou de outros aspectos da natureza. Para tanto,

articulou governos nacionais e organismos internacionais a fim de criar as bases para

estruturação desse projeto. A expansão “sem fronteiras” da especulação financeira sobre os

bens ambientais, por exemplo, resultou na criação do mercado de carbono mediante a

comercialização dos certificados de emissão, bem como, das funções dos ecossistemas através

da lógica do mercado dos “serviços ambientais”. Além deles, foram criados outros nichos de

mercado que rondam sobre outros bens naturais, como a água, as espécies, etc.

Nesse contexto, as alternativas para o enfrentamento dos problemas econômicos,

sociais e ambientais de mediação do mercado financeiro progressivamente se distanciam de

soluções concretas, acirrando-os e aprofundando cada vez mais o controle, a apropriação e

submissão da vida e da natureza ao capital. Contrariando e expondo a fragilidade da proposta

do “capitalismo verde” a natureza continua a sofrer com os impactos pela dinâmica produtiva

destrutiva poluidora do capital e a desigualdade social se aprofunda na contemporaneidade,

enquanto o mercado financeiro se expande68

.

O problema não reside somente na transformação dos bens naturais em mercadorias, a

financeirização da natureza implica na apropriação do mercado financeiro da gestão dos seus

recursos e das soluções para o enfrentamento da crise ambiental, se traduzindo em alternativas

que privilegiam os interesses pelo lucro, a fim de manter os níveis atuais e encontrar novas

formas de expansão dos ativos econômicos oriundos da riqueza privada, em detrimento de

uma preocupação efetiva com a sustentabilidade socioambiental.

A abordagem das crises climáticas no cenário internacional prospecta a criação de um

mercado mundial de carbono que renda bilhões. Nessa esteira, os setores de ponta do sistema

financeiro se apropriam do discurso ideológico do “capitalismo verde” e se reorganizam para

se readaptar a seus imperativos competitivos e gerar lucros. Assim,

Para cumprir com o imperativo de gerar lucros, os banqueiros, os

comerciantes de matérias-primas, os agentes de produtos financeiros

derivados e os economistas neoclássicos, os quais, junto aos governos do

Norte, dominaram o desenvolvimento dos mercados de carbono,

68

A produção não acompanha essa dinâmica, causando o truncamento do mercado de trabalho, com a redução de

postos e dos salários, criando o desemprego estrutural.

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concentraram sua criatividade em fazer com que o novo produto tenha

liquidez, seja comparável a outras mercadorias, esteja normatizado e possa

ser vendido rapidamente e em uma ampla esfera geográfica. Ao mesmo

tempo, dedicaram-se a não facilitar a transição para um sistema afastado do

consumo de combustíveis fósseis69

.

Vimos um processo crescente de especulação financeira em torno da comercialização

dos certificados de redução de emissões (CER’s), conquistados por empresas que são

identificadas por agências reguladoras como principais causadoras da poluição e, por elas

direcionadas, para adesão a um plano de metas de redução de suas emissões. As empresas que

tem sucesso angariam esses títulos que lhes rendem o direito de poluir, porque eles autorizam

a emissão de toneladas de gases poluentes na atmosfera, como o dióxido de enxofre e

monóxido de carbono. As que não alcançam as metas de redução estabelecidas recorrem à

compra dos bônus das que obtém êxito.

As empresas tem a liberdade de incorporar e adequarem-se às diretrizes e leis

ambientais num processo que ocorre à revelia do monitoramento mais efetivo do Estado, ou

seja, de acordo com suas prioridades.

Tais certificados podem ser comercializados através das bolsas de valores e

mercadorias. Inclusive de acordo com Khalili,

Há várias empresas especializadas no desenvolvimento de projetos que

reduzem o nível de gás carbônico na atmosfera e na negociação de

certificados espalhadas pelo mundo, vendendo cotas dos países 129

Commodities Ambientais em missão de Paz subdesenvolvidos e países em

desenvolvimento que, em geral, emitem menos poluentes, para os que

poluem mais. Enfim, estão negociando contratos de compra e venda de

certificados que conferem aos países desenvolvidos o direito de poluir (2009,

p.129).

As instituições do ramo financeiro são exímias negociadoras dos créditos de carbono.

Obviamente, um espaço tão lucrativo não poderia “escapar aos olhos abrilhantados” por

lucros. O Itaú Unibanco pertence ao seleto e rico segmento da economia mundial que

especula e gerenciam fundos ditos direcionados à “ecomudança” e a comercializam os

créditos de carbono.

Portanto, distante de operar uma “ecologização do capital” o mercado de carbono e as

demais iniciativas do sistema financeiro que ideologizam a “sustentabilidade” é um

subterfúgio típico do capital que agrega em si os fundamentos mais legítimos do

neoliberalismo vigente.

69

Boletim 181, publicado em 30 de agosto de 2012, pelo World Rainflorest Moviment.

(Fonte:http://wrm.org.uy/pt/artigos-do-boletim-dowrm/secao1/aespeculacaoquecrescedaapropriacao-e-da-

mercantilizacao-a-financeirizacao-danatureza/)

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A sustentabilidade se apresenta hoje ao mercado capitalista como um investimento,

um nicho de mercado. Uma forma de propagar um conceito eivado por intenções econômicas

e políticas, uma vez que incorporação e disseminação do discurso ideológico de compromisso

“verde” e socialmente responsável consolida uma imagem social favorável que se reverte em

lucros.

A realidade do Itaú Unibanco é um espelho disso. Partícipe da dinâmica do

capitalismo financeiro internacional, sendo um dos maiores bancos do Brasil, o Itaú Unibanco

persegue os caminhos lucrativos que implicam na mercantilização/financeirização da

natureza.

O Itaú Unibanco, fusão entre esses dois bancos brasileiros, iniciada em 2008 e

consolidada em 2010, é uma grande empresa do ramo financeiro, uma das maiores e mais

reconhecidas nacionalmente e internacionalmente, tem aproximadamente 95 mil

colaboradores e é atuante no Brasil e no exterior, com mais de 4 mil agências e 27 mil caixas

eletrônicos, tendo suas ações preferenciais e ordinárias Itaú Unibanco e ordinárias negociadas

na Bolsa de Valores de São Paulo a BM&F BOVESPA, embora também tenha certificados de

ações na Bolsa de Valores de Nova Iorque a New York Stock Exchange – NYSE. As ações do

Banco Itaú movimentaram em média, R$ 659 milhões nessas duas bolsas de valores em 2013.

Além delas, tem certificados de ações negociados na Bolsa de Comércio de Buenos Aires.

Na América Latina, em 2013, a instituição adquiriu 100% das ações do Citbank no

Uruguai, onde assumiu uma carteira de 15 mil clientes, tendo como foco as operações de

crédito. Segundo o Relatório Anual Itaú Unibanco Holding 2013, esse negócio reforça o

compromisso com a criação de valor de longo prazo para os acionistas da instituição70

.

A partir da análise sobre as determinações históricas, no qual explicitamos a relação

do capital com a natureza e o trabalho ontologicamente, para compreendermos a crise

70

Em maio de 2013 fizeram um acordo com o Citbank para a compra da Credicard e da Citifinancial, incluindo a

marca “Credicard”. No Brasil, os negócios expandiram por meio da aquisição da Credicard e da Citifinancial.

Essas duas empresas são responsáveis pela oferta e pela distribuição de produtos e serviços financeiros,

sobretudo de empréstimos pessoais e cartões de créditos. Ambas contam com uma base de 4,8 milhões de

cartões. O Itaú lançou uma nova bandeira de cartão de crédito, em outubro de 2013, Hiper que cobre todo o

Brasil e é aceita por mais de um milhão de estabelecimentos. O banco também reposicionou a Redecard para a

marca Rede. Essas mudanças dizem respeito à perspectiva da empresa de expandir os negócios no campo digital,

lançando também a e-Rede e m-Rede que são as plataformas digitais e mobile da marca. O banco teve o melhor

desempenho econômico da sua história, com lucro recorde de 16,4 bilhões de reais, com rentabilidade de 20,9%,

que como vimos, tem influências dos cortes dos custos com a contratação de mão de obra. O banco indicou que

esse resultado tem relação com a estratégia iniciada em 2011 onde se definiu que a instituição iria focar em

carteiras de crédito de menor risco, priorizaram o controle de custos e a eficiência e intensificaram a oferta de

serviços e conveniência para o cliente.

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ambiental no capitalismo contemporâneo, pudemos indicar que está na ordem do dia a

propagação de um discurso ideológico de sustentabilidade ambiental.

Desse modo, aqui analisaremos o discurso de caráter ideológico que se apresenta na

lógica e dinâmica empresarial, que demonstra efetivamente a insustentabilidade

socioambiental do sistema do capital e das ações empresarias. Dessa forma, problematizamos

as contradições do Itaú-Unibanco quanto a sua prática e desempenho sustentável verificadas

nas relações de trabalho entre os seus funcionários/as.

Para nossa análise, buscamos confrontar os dados que demarcam o posicionamento

oficial do Banco sobre sustentabilidade, suas ações efetivas e denúncias da Confederação dos

Trabalhadores do Ramo Financeiro – CONTRAF/CUT, pesquisas do DIEESE em associação

com essa Confederação e o Relatório Anual Consolidado 2013 do Itaú Unibanco.

Trataremos de debater criticamente a questão da incorporação ideológica e estratégica

do/para o capital do Desenvolvimento Sustentável em tempo de crise estrutural.

Faz-se necessário informar novamente que iremos analisar apenas uma empresa, o que

não indica um reducionismo da questão em tela, considerando que a maioria das empresas

brasileiras detentoras do “selo verde”71

comungam com as mesmas práticas e direção

ideológica que o Itaú Unibanco, até porque o fim último de todas as incorporações

empresarias é o lucro e não a natureza e seus trabalhadores/as.

Destarte, compreendemos que nosso objeto de estudo está inserido numa realidade

macrossocietária marcada pelas determinações sociohistóricas do capitalismo em nível

mundial. Portanto, as contradições do Itaú Unibanco discutidas nesse capítulo expressam a

realidade de outras empresas de diferentes setores (industrial, comércio, serviços,

educacional) que, se por um lado difundem uma falsa ideia de compromisso socioambiental,

concretizam em suas práticas produtivas e relações de trabalho, o seu inverso, contribuindo

para o acirramento de relações insustentáveis.

71

Este selo foi construído para identificar empresas que tem práticas produtivas de alto impacto ambiental, mas,

articulam ações de resvalam em comportamentos “ambientalmente responsáveis”, com planos de manejo, de

modo a conferir-lhes certificação por “boas práticas”. Ele leva em consideração um conjunto de normas que

regulam o comércio dos produtos oriundos das florestas tropicais embasados nos acordos internacionais.

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4.1 As “ecomudanças” do Itaú Unibanco, um retrato do novo discurso ideológico do

capital: do “Eco” que convém, a mercantilização e a financeirização da natureza.

A incorporação dos princípios “sustentáveis” no âmbito empresarial e nesse setor do

capitalismo, em verdade sinaliza para a mercantilização e financeirização da natureza72

. Esta

última resulta das determinações da crise econômica que atingiu o mercado financeiro,

denotada em 2008, que impulsionou os investidores a redirecionarem seus interesses

especulativos à “caça” e transformação da natureza em um campo brilhante de possibilidades

de negócios e lucros.

Deste modo, nos esforçamos para trazer a visão institucional do Itaú Unibanco sobre a

sustentabilidade, analisando o Relatório Anual Consolidado Unibanco Holding 2013. Partindo

dele e do conhecimento que acumulamos sobre o significado da sustentabilidade na lógica

empresarial, que teceremos nossas contribuições críticas.

A premissa do Itaú Unibanco é ser o banco líder em Performance sustentável e em

satisfação dos clientes. Na concepção do banco “Performance Sustentável” significa a geração

de valor compartilhado para clientes, acionistas e sociedade, garantindo perenidade dos

negócios73

.

O banco afirma trabalhar para inserir a sustentabilidade em seus negócios para

alcançar a estratégia de ser “o banco líder em performance sustentável e em satisfação dos

clientes”. Para isso, o banco indica considerar três grandes focos estratégicos: a Educação

Financeira, o Diálogo e Transparência e os Riscos e Oportunidades Socioambientais. Assim

como querer compreender as necessidades das pessoas e oferecer conhecimento e soluções

financeiras adequadas, para contribuir para que os indivíduos e as empresas possam

estabelecer uma relação saudável com o dinheiro. Essas diretrizes estão associadas ao Mapa

de Sustentabilidade do Itaú Unibanco, conforme figura a seguir.

72

A mercantilização no capital não indica um dado novo, o capital se expandiu transformando a própria natureza

em mercadoria. Mas a financeirização dos bens ambientais remonta o momento histórico do capital

contemporâneo em que o sistema financeiro adquiriu centralidade, determinando a economia mundial. 73

Uma das estratégias utilizadas pelo banco foi a de reduzir o perfil de risco da carteira de crédito o que resultou

a queda dos índices de inadimplência, de 1,1% desde a fusão entre o Itaú e o Unibanco que ocorreu em 2008.

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(Fonte: Relatório Anual Consolidado 2013)

Na perspectiva do Banco, de acordo com o texto do Relatório Anual Consolidado

2013:

Mais do que criar novos produtos, nossa meta consiste em ajustar

nossas operações para atingir um crescimento sustentável, bem como

minimizar riscos, encontrar vantagens competitivas e gerar receita em

um contexto de demanda para uma gestão adequada dos impactos

socioambientais. Essa visão de sustentabilidade de longo prazo tem

evoluído e sido incorporada em nossas diferentes unidades de negócio,

por meio da análise sistêmica de indicadores e da avaliação de

resultados (R.A. CONSOLIDADO, p. A-333).

Sobre a educação financeira é importante compreender que o mercado capitalista tem

muito interesse no “uso consciente do dinheiro”, uma vez que o endividamento dos

consumidores significa prejuízos econômicos. A educação financeira, mais do que significar

um compromisso com o “bem-estar” dos consumidores, revela antes de tudo, o compromisso

com o desenvolvimento sustentável do mercado.

O diálogo e transparência são obrigações das empresas perante sua população

consumidora, isso está previsto em lei e é passível de punições severas. A satisfação dos

clientes por sua vez é um pressuposto para a sustentação dos negócios. Vê-se, portanto, como

os ideólogos do capital tentam colocar “flores em algemas”.

No que se refere à questão socioambiental o Banco anuncia o monitoramento de riscos

e oportunidades socioambientais, considerando as tendências de mercado, as

regulamentações, demandas dos clientes e da sociedade. O banco indica que através de um

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diálogo permanente, busca compreender expectativas dos “colaboradores” (trabalhadores),

dos clientes e da sociedade.

Por essa razão, o banco subjuga que sua intervenção está associada a um

comportamento ético e transparente e marcada por relações de confiança e perenes.

Efetivamente isso significa nos termos do Banco “incluir aspectos socioambientais nos

modelos de avaliação de crédito, investimentos e nos seguros”.

Ou seja, o Banco afirma realizar uma análise socioambiental incluindo os aspectos

ambientais nos diferentes modelos de negócio. Exemplo disso, o Relatório Anual

Consolidado 2013, menciona que na análise do crédito, se baseiam na Política de Risco

Socioambiental Corporativa e dos Princípios do Equador.

Ora, as empresas necessitam conciliar o objetivo lucrativo, com demandas da

comunidade impactada pelos seus serviços. Sobreviver às mudanças do capitalismo

mundializado impera as empresas a busca permanente pelo domínio do conhecimento sobre

os novos nichos de mercado dados na realidade. Mas, sobretudo, estar atentas as necessidades

sociais e ambientais para também tirar proveitos nestas áreas. Nesse sentido, questionamos de

fato, a materialidade das práticas sustentáveis do referido banco.

No que se refere à avaliação da composição da carteira de investimentos o Banco

afirma ser signatário dos Princípios para Investimento Responsável (PRI). Isso se estende às

outras frentes de negócios como os Seguros, onde se indica uma preocupação em contribuir

com os Princípios para Sustentabilidade em Seguros.

Quanto ao relacionamento com os clientes, o Banco afirma ter incorporado “um novo

jeito de se comunicar com as pessoas”, pelas redes sociais. Sobre esse “novo jeito”, cabe

discutir o papel que as redes sociais têm desempenhado nos últimos tempos tanto para as

empresas como para a classe trabalhadora.

Hoje, além de um mercado lucrativo para as empresas, as redes sociais também são

instrumentos importantes para a organização e conscientização das classes subalternas, a

exemplo das mídias alternativas que são criadas e difundidas pela internet. Entretanto, iremos

aqui considerar a quais as vantagens das redes sociais para o mercado, ou seja, o significado

para as empresas, especificamente para o Itaú Unibanco.

O Itaú Unibanco investe o que for preciso para o fomento de uma imagem

institucional associada à Sustentabilidade, porque isso indiretamente lhe rende lucros, atrai

clientes, embora o discurso tão somente evoque o compromisso da empresa com as dimensões

socioambientais. O banco mantem canais no Facebook, Twitter e Youtube, espaços virtuais

onde lança suas campanhas, de alto nível de produção, que exaltam o compromisso de um

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banco que “cuida das pessoas”, dos “colaboradores”, “do meio ambiente”, “que fomentam a

educação”, “que investe nos esportes e na cultura”.

Inclusive o texto do Relatório Anual Consolidado 2013 do Itaú confirma que as redes

sociais tem tido um peso importante para a conquista de novos clientes que motivamos pelas

campanhas lançadas nesses espaços, sentem maior nível de confiança na instituição.

O que para nós reforça a ideia de que a sustentabilidade incorporada pelas empresas

não pode ser considerada como uma perspectiva de inversão de valores. Elucida em grande

medida a busca intermitente das empresas de garantir o lucro associada a preocupação com as

dimensões sociais e ambientais que na nossa análise, tais preocupações revelam a força do

discurso ideológico que oblitera o real.

Conforme Cesar,

Trata-se, então, de um aspecto adjacente aos fatores econômicos

determinantes da intervenção social do empresariado,

principalmente se for levado em conta que, com a difusão da

“responsabilidade social corporativa”, as organizações capitalistas

criam condições favoráveis à implementação de seus negócios no

mercado globalizado e ainda capitalizam seus investimentos na

privatização e na comercialização dos serviços sociais. Assim, os

empresários unem “útil” ao lucrativo (2012, p.32).

O Banco Itaú tem iniciativas direcionadas para a educação, cultura, esporte e

mobilidade urbana, que também motivam a “hastag #issomudaomundo” de iniciativa do

banco que diz respeito a integração de todas as suas atividades que denotam o “esforço” de

ser um “agente de transformação social”, conforme sua filosofia74

.

No ano de 2013, o Banco afirmou investir mais de R$ 422,7 milhões em ações

direcionadas para o desenvolvimento social, como a Fundação Itaú Social, Instituto Unibanco,

74

O Banco tem sido “premiado” com o reconhecimento de outras empresas por essas práticas ditas Sustentáveis.

Segundo consta no Relatório Consolidado de 2013. A Revista Exame reconheceu, pelo Guia Exame, o Itaú como

a empresa mais sustentável do ano de 2013. Essa premiação é considerada uma das mais importantes nesse

sentido no Brasil.A nível internacional, o Itaú Unibanco faz parte do “The Word’s Top 20 Green Banks em

2012, da Revista Bloomberg Markets, que para esse ranking considera os “esforços de sustentabilidade dos

bancos”, estendendo o olhar para os investimentos em energia limpa e redução de resíduos. O Banco também

compõe o “Dow Jones Sustainability World Index 2013/2014, sendo o único Banco latino-americano a fazer

parte dele. O Itaú Unibanco foi selecionado pela nona vez a participar do Índice de Sustentabilidade Empresarial

(ISE) da BM&F Bovespa 2013/ 2014. Nesse índice constam as empresas que são consideradas “referências em

investimento socialmente responsável e que atuam em negócios de referência no Brasil. O Banco também foi

premiado pelo Prêmio Época Empresa Verde da Revista brasileira Época, como uma das empresas brasileiras

com as melhores práticas ambientais e uma das lideranças do setor pelo Prêmio Época de Mudanças Climáticas,

pelas práticas que apresentaremos no próximo subtítulo. Assim como foi reconhecida em seis categorias no

Prêmio Amigo do Esporte 2013, pelo Ministro dos Esportes do Brasil, como uma das empresas que mais

investem no setor de esportes.

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Itaú Cultural, com foco na melhoria da educação pública, para a valorização e divulgação da

arte nacional, na mobilidade urbana e apoio ao esporte.

Cabe notar, que o engajamento das empresas em movimentar a Responsabilidade

Social ou ter uma política para práticas de preservação ambiental, remonta o ideário

neoliberal de desconstrução da eficiência do Estado em lidar com as questões sociais e

afirmar a auto- suficiência do livre mercado.

O Banco anuncia uma política na qual nomeia “Nosso Jeito de Fazer” baseada em dez

princípios. Os dez princípios são: Todos pelo cliente; Paixão pela performance; Liderança

ética e responsável; Craques que jogam para o time; Foco na inovação e inovação com

foco; Processo servindo pessoas; Ágil e descomplicado; Carteirada não vale; Brilho nos

olhos; Sonho grande.

Segundo o Relatório Anual Consolidado 2013, a instituição tenta transferir os valores

para os trabalhadores através de ações como tornar o alinhamento dos trabalhadores com

esses princípios como parte dos processos de avaliação de desempenho; campanhas nos

canais de comunicação e eventos. De acordo com José Castro de Araújo Rudge, Vice-

Presidente do Itaú Unibanco (Recursos Humanos, Marketing e Relações Institucionais):

“Estamos construindo uma cultura corporativa para inspirar

nossos colaboradores a sentirem orgulho de fazer parte do

Grupo Itaú Unibanco, reforçado por empenho em criar valor

para os colaboradores, clientes, acionistas e a sociedade.” (A-

41).

Entretanto, ao confrontarmos esse discurso com os dados apresentados pelo

CONTRAF/CUT que trabalhamos no tópico subsequente, teremos uma realidade oposta a

essa criação de uma Cultura Corporativa que inspira os “colaboradores” (trabalhadores

explorados) a sentirem orgulho de fazer parte do Grupo Itaú Unibanco. Isso porque, o que nos

apresentaram foi um quadro de instabilidade no trabalho quanto à permanência desses

trabalhadores em seus postos, sobrecarga em razão das terceirizações, bem como, da política

de metas (controladas pela empresa), com a progressão de carreira associada ao seu alcance,

pautado no produtivismo individual – essas que muitas vezes são inatingíveis, requerem forte

despendido de energia e muitas vezes provocam a extensão de horário – diferenças salariais

exorbitantes, dentre outros problemas.

Dos dez princípios, o que propõe aos trabalhadores que sejam “Todos pelo cliente”,

impera uma total responsabilização do trabalhador pelo estabelecimento de um bom

relacionamento com o cliente, o mesmo trabalhador submetido às pressões por metas,

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124

gerenciadas e controladas e passíveis de punição pelo Programa AGIR, responsável pela

fiscalização do atendimento e da produtividade das agências.

No Itaú Unibanco, segundo o Relatório Anual Consolidado 2013, o desenvolvimento

de carreira está associado ao princípio da meritocracia. Confere a isso, que o crescimento do

trabalhador na empresa estará associado aos resultados individuais, as contribuições e o

envolvimento ao “Nosso Jeito de Fazer” que caracterizam a filosofia da gestão dessa empresa.

Contribuições essas que revelam a capacidade produtiva, ou seja, de atingir as metas

esperadas pelo Banco. Ou seja, o trabalhador não é valorizado pela sua qualificação

profissional em si, mas pelo o que render em termos lucrativos à empresa. O que, sobre o

estímulo da “possível” ascensão de carreira, indiretamente o pressiona à submissão a uma

lógica perversa de produtividade, bem como, o coloca em total disponibilidade à exploração

da empresa.

De acordo com o Relatório Anual Consolidado 2013, o Itaú Unibanco adota uma

política que denomina de “Ecoeficiencia” que diz respeito à utilização responsável dos

recursos da natureza com estratégias que possam diminuir o impacto de suas ações, tendo em

vista que a empresa consome água e energia em níveis elevados pela tecnologia que incorpora

às suas operações.

Assim, a empresa afirma monitorar o uso água em suas agências e prédios, da energia

elétrica, dos transportes que contribuem para elevação da emissão dos Gases de Efeito Estufa

(GEE) (pelo controle das viagens de negócios), de papel, o descarte do lixo eletrônico passa

por processos de reciclagem e destinação sustentável, dentre outras. Para esse monitoramento,

o Itaú Unibanco realiza auditorias internas, em todas as empresas do banco75

.

Cabe discutir que a pontualidade dessas ações de iniciativa do banco para “contribuir”

com a redução das emissões de gases de efeito estufa, bem como, de outras empresas, não

poderão representar um futuro sustentável. Reduzir uso interno de água, o uso de papel,

separar e destinar o lixo corretamente para reciclagem em compensação seguir com o

financiamento (in)direto às empresas que apesar de consumir sua “cota” de emissões de

carbono na atmosfera seguem operando processos produtivos que impactam sobre o equilíbrio

ambiental, além disso do gerenciamento do mercado de carbono, não alavanca uma

alternativa sustentável concreta.

75

“As auditorias são realizadas periodicamente por uma equipe exclusivamente dedicada a isso e também a

avaliam a aderência à Política de Sustentabilidade, quanto aos aspectos: • Estratégia para sustentabilidade; •

Estrutura – governança e gestão; • Adequação de representações e associações em fóruns externos de

sustentabilidade; • Implementação e aderência aos compromissos e pactos; • Comunicação e monitoramento; •

Política Corporativa de Risco Socioambiental; • Princípios do Equador, para financiamentos de projetos na

modalidade Project Finance (R.A.CONSOLIDADO, 2013, p.A-433)”.

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Esse documento em alusão indica que as mudanças climáticas gradativamente estão

sendo entronizadas na agenda da empresa, a partir da adesão das variáveis dessa problemática

nos negócios. O banco afirma gerenciar os riscos e tentar desenvolver soluções que

respondam adequadamente a busca da redução dos Gases de Efeito Estufa (GEE) e para

adaptação a essas mudanças. Para tanto, o Itaú Unibanco divulgou que utiliza créditos de

análise de impacto ambiental na concessão de crédito, de seguros e de investimentos, bem

como, práticas de minimização dos impactos diretos de suas operações. Os critérios de

avaliação desses riscos consideram diversas temáticas, como: a escassez de recursos naturais,

as mudanças do clima, o pagamento por serviços ambientais e a biodiversidade (R.A.

CONSOLIDADO: 2013).

À análise dos riscos das mudanças climáticas para os próprios negócios do banco, o

Itaú realiza um mapeamento dos principais riscos, embasando-se na “Codificação de

Desastres, Ameaças e Riscos”, Instituída pela Defesa Civil do Brasil, onde fazem parte: os

desastres naturais de causas eólicas (vendavais e tempestades), de temperaturas extremas

(granizos e geadas), de inundações bruscas em áreas urbanas e das inundações litorâneas,

dos relacionados à geomorfologia, ao intemperismo, a erosão e acomodação do solo

(escorregamentos ou deslizamentos). Na visão do Banco, essa análise é necessária porque tais

desastres se configuram primeiramente em prejuízos financeiros de grande expressão, além

dos impactos que podem configura-se em tragédias sociais, ambientais e econômicas (R.A.

CONSOLIDADO: 2013).

Acerca disso, o texto desse Relatório acrescenta,

Mediante o conhecimento adquirido no tema, é possível desenvolver

novos produtos, tecnologias e serviços que minimizem riscos

socioambientais e econômicos e orientem os clientes sobre esses

aspectos. Créditos de carbono, energias renováveis, estratégias de

concessão florestal via manejo sustentável, vulnerabilidade climática

de culturas agrícolas e planejamento urbano são oportunidades para a

atuação da Itaú Seguros (2013, p. A-404).

O Itaú Unibanco apresenta sua Política de Risco Socioambiental como uma iniciativa

cujos objetivos se norteiam na perspectiva de “mitigar os riscos de crédito, socioambientais,

legais e de imagem”, assim como, “fornecer diretrizes sociais e ambientais para análise”, onde

a empresa considera: as condições de trabalho considerando possíveis práticas de

escravismo, exploração do trabalho infantil, prostituição (nos termos do banco), os riscos

ambientais relacionados a práticas econômicas específicas, cláusulas contratuais sobre as

questões ambientais, respectivamente (R.A. CONSOLIDADO, 2013).

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De acordo com o Relatório Anual Consolidado 2013, aqui em referência, quanto “as

especificações da aplicabilidade da Política de Risco Socioambiental”, o banco assume as

responsabilidades com,

Financiamento Imobiliário: aplicável à construção de

empreendimentos em todo o Brasil. • Seguros: possui critérios

socioambientais específicos na subscrição de seguros de

responsabilidade civil ambiental. Em Seguros, ainda possuímos os

Princípios para Sustentabilidade em Seguros. • Itaú BBA: considera

critérios de análise para financiamento de projetos, além dos

Princípios do Equador e da análise de risco de contaminação em

garantias de bem imóvel. • Área Empresas: aplicável a pequenas e

médias empresas. É realizada uma categorização socioambiental

setorial considerando critérios como uso de água e energia,

lançamento de efluentes líquidos, emissões atmosféricas e risco para a

saúde e segurança no trabalho. Em seguida, a análise de risco é

realizada para empresas consideradas A (alto potencial de risco) e B

(médio potencial de risco) e que tenham envolvimento em crédito com

o banco igual ou superior a R$ 5 milhões. Também são avaliadas

empresas com ramos de atividades presentes na Lista Restrita, com

envolvimento em crédito igual ou superior a R$ 1 milhão (2013, p. A-

427).

A política de Risco Socioambiental do Itaú Unibanco deixa evidente o entrelace

indissociável na concepção empresarial da sustentabilidade com os negócios. A

sustentabilidade dos negócios sempre aparece como ponto nodal para a incorporação dos

“princípios sustentáveis” pelas empresas. A financeirização dos bens ambientais é uma

consequência desse processo.

O Itaú Unibanco gerencia a compra e venda dos créditos de carbono. Segundo o

Relatório Anual Consolidado 2013 do referido:

Em 2013, após as áreas de produtos, jurídica e de Risco

Socioambiental passarem por uma capacitação interna sobre o

mercado de crédito de carbono, o Itaú BBA formulou e aprovou um

novo produto financeiro que consiste no adiantamento de recebíveis

do contrato de compra e venda de créditos de carbono. Esse produto

tem como objetivo incentivar a geração e venda de créditos de

carbono no mercado regulado, uma vez que possibilita ao gerador

receber o dinheiro do contrato previamente e usá-lo como

investimento em novos projetos geradores do seu portfólio (2013, A-

403).

Segundo o R.A Consolidado 2013, o banco também se colocou como viabilizador dos

projetos com baixa geração de emissões de Gases de Efeito Estufa (GEE). Em 2013,

concedeu R$ 400 milhões em crédito para os projetos de geração de energia eólica e trabalhou

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assessorando mais de 2,1 bilhões em investimentos nesse mesmo setor como também em

energia solar.

A mediação que o Itaú Unibanco realiza nas transações em torno dos créditos de

carbono estimulando sua compra e venda, adiantando inclusive o pagamento aos vendedores

para que possam realizar investimentos em novos projetos, não ocorre de maneira

desinteressada. Este é um espaço de negócio que tem movimentado milhões ao redor do

mundo e que, portanto, tem despertado o interesse do setor financeiro. Diante disso,

compreendemos como essa incursão do setor financeiro ao mercado de carbono torna ainda

mais abstrata, frágil e desligada a relação do capital com a preservação dos bens ambientais.

O Itaú Unibanco desenvolve fundos socioambitentais seguindo sua política de

“investimento responsável”, dentre os fundos citados no R. A. Consolidado 2013 está o Fundo

Itaú Excelência Social (FIES), em que o banco investe em empresas com práticas

“socialmente responsáveis”, esse fundo ainda destina 50% das taxas de administração dos

fundos para projetos educacionais desenvolvidos por ONG’s.

Através do Fundo Itaú Excelência Social (FIES), a empresa divulgou no R.A.

Consolidado 2013 que apoia ações de empresas que desenvolvem práticas de responsabilidade

corporativa76

, e que os Fundos que são denominados de “Fundos Itaú Ecomudança”,

destinam 30% da taxa de administração para projetos de ONG,’s com ações direcionadas para

redução das emissões de Gases de Efeito Estufa (GEE).

Para suposta contribuição na minimização dos impactos que provocam as mudanças

climáticas, o banco indica estar oferecendo aos seus clientes a possibilidade de aplicação dos

seus recursos financeiros e ter um retorno adicional que seria o investimento em projetos que

visam à transformação da sociedade.77

Tais fundos estão submetidos à dinâmica de oscilação

76 “Lançado em 2004, o Fundo Itaú Excelência Social (FIES) é um fundo de investimento socialmente

responsável. Esse fundo investe em ações de empresas com reconhecidas práticas de responsabilidade social

corporativa, com o objetivo de obter retornos de longo prazo superiores àqueles oferecidos pelos principais

índices do mercado financeiro brasileiro. Além de analisar os riscos e retornos das empresas, os gestores do

fundo também levam em consideração três critérios fundamentais em relação às companhias: atividades sociais

corporativas, aspectos de proteção ambiental e boas práticas de governança corporativa. A cada ano, o gestor do

fundo FIES doa 50% da sua taxa de administração acumulada para projetos sociais nas seguintes categorias:

educação ambiental, ensino técnico e educação infantil (R.A.CONSOLIDADO, p. A-64)”. 77

“[...]o Itaú oferece aos seus clientes a possibilidade de aplicar seus recursos financeiros e de obter um retorno

adicional: o fortalecimento de projetos que transformam a sociedade [...]”. (FONTE:

http://ww2.itau.com.br/sustentabilidade/_/produtos-servicos/parasuaempresa/empoqueecomudanca.html).

Acesso em: 28/09/2014.

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das taxas de juros, ou seja, os rendimentos tendencialmente sobem ou diminuem de acordo

com ela78

.

Tais projetos apoiados por esses fundos compreendem desde a preservação de reservas

florestais, reflorestamento, destinação correta de resíduos, implantação de tecnologias limpas

em comunidades tradicionais (indígenas, quilimbolas, seringueiras, etc) para o

empoderamento das mesmas. Acerca do empoderamento, Leff discute que:

O “empoderamento” (empowerment) das pessoas como proposta para

“distribuir o poder” resulta numa formulação voluntarista e vaga, que

não permite compreender nem orientar os movimentos sociais de

justiça ambiental pela incorporação de princípios de equidade às

condições de sustentabilidade. O poder não é um bem que pode ser

subministrado e repartido, mas uma relação de forças que surge no

confronto de interesses diferenciados (2001,p.72)

Para o capital o apoio a projetos dessa ordem, objetiva levar a expansão a todos os

pontos e refuncionalizar as tradições em nome do “progresso” do capitalismo mundializado,

Isto requer o enquadramento das comunidades tradicionais aos moldes desse sistema que

entende como atrasadas todas as formas de organização da vida que recuse seus pressupostos

econômicos-produtivos e o controle de possíveis conflitos na disputa pelos territórios.

Segundo Leff,

O neoliberalismo ambiental busca debilitar as resistências da

cultura e da natureza para subsumi-las dentro da lógica do

capital. Seu propósito é legitimar o espólio dos recursos naturais

e culturais das populações dentro de um esquema combinado,

globalizado, onde seja possível dirimir os conflitos num campo

neutro. Através deste olhar especular (especulativo) pretende-se

que as populações indígenas valorizem seus recursos naturais e

culturais (sua biodiversidade e seus saberes tradicionais) como

capital natural, que aceitem uma compensação econômica pela

78

A partir do processo seletivo da edição 2012/2013 para o investimento dos Fundos Itaú Ecomudança, o banco

elegeu 5 projetos para destinação desses recursos financeiros: “Tecnologias Sociais no Pantanal” da ONG

Ecologia e Ação – ECOA (Poconé e Corumbá- MS), projeto que objetiva empoderar comunidades tradicionais

do pantanal através da implantação tecnologias sociais (filtros de água, biodigestores e turbinas eólicas); “Doces

quintais” da ONG Instituto Brasileiro de Ecologia e Sustentabilidade – IBES (Poço Redondo e Pacatuba – SE),

projeto que visa a implantação de 10 hectares de florestas no semirárido com a criação de pomares

agroecológicos com frutíferas nativas utilizando água de reuso e pluviais e mais 20 hectares em sistemas

agrosilvipastoris; “Reflorestamento diversificado e produtivo na floresta nacional do Purus da ONG Cooperativa

Agroextrativista do Mapiá e Médio Purus, projeto direcionado à reconversão de áreas degradadas na Amazônia;

“Refazenda: viveiro e preservação de espécies em aldeias guarani de São Paulo”, da ONG Agência Ambiental

Pick – upau, como foco na ampliação da biodiversidade das Aldeias Guaranis Tenonde Porã e Krukutu que

existem no extremo sul de São Paulo; “Gestão de resíduos Orgânicos na cidade de Lençóis- BA, voltado para

implantação de um programa de coleta e processamento de resíduos orgânicos na cidade de Lençóis; Por fim, a

manutenção da parceria com a ONG internacional The Nature Conservancy. – TNC que desenvolve projetos de

conservação ambiental em mais de 30 países e está presente no Brasil desde 1988. (FONTE:

http://ww2.itau.com.br/sustentabilidade/_/produtos-servicos/para-voce/voce-oqueecomudanca/voce-

resultados.html) Acesso em: 20/08/2014.

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cessão desse patrimônio às empresas transnacionais de

biotecnologia. Seriam estas as instâncias encarregadas de

administrar os “bens comuns”, em benefício do equilíbrio

ecológico, do bem estar da humanidade atual e das gerações

futuras (2001, p. 29).

Num olhar um pouco mais atento para esses investimentos, vemos que o mercado se

coloca como um gerenciador dos bens ambientais. Na prática, o Itaú Unibanco como toda

instituição do ramo financeiro, gerencia esses investimentos dos clientes em tais fundos

porque deles pode extrair vantagens lucrativas.

Entretanto, o que é difundido ideologicamente é que a sustentabilidade que invade os

setores de ponta da economia revela-se em um momento em que as empresas assumindo seu

“papel social” passam a atribuir maior atenção às questões socioambientais, em detrimento do

vinculo com os interesses lucrativos. Embora o Itaú Unibanco não demonstre tal preocupação

de ocultar seus interesses, uma vez que deixa clara sua posição de encontrar um “jeito certo de

lucrar”.

Ao referenciar a posição do Itaú Unibanco frente à sustentabilidade podemos

compreender e identificar os interesses centrais que perpassam a adesão das empresas ao

“capitalismo verde”, bem como, o significado ideológico e político desse movimento que se

expande na atualidade. De acordo com a edição a Performance Sustentável em revista 2013

do Itaú Unibanco a perspectiva do banco em aderir à uma política socioambiental, segundo a

superintendente de sustentabilidade, Denise Hills:

“é construir um modelo permanente, pautado por relações de

confiança, que visem o lucro do jeito certo e não às custas do meio

ambiente ou das pessoas”[...]“Era preciso fazer de um banco que já

era líder de mercado um banco que permanecesse na escolha dos

clientes”, esclarece Denise. “Sem o envolvimento de toda a

organização, isso é impossível. A área de sustentabilidade é apenas

tradutora e intérprete das mudanças externas e de novas variáveis, que

podem impactar o banco no curto e no longo prazos (p.16).”

Ou seja, a sustentabilidade enquanto conceito, em incorporação no ambiente

empresarial, revela-se como uma modalidade de investimento que se tornou fundamental para

manter a “sustentabilidade” dos próprios negócios. Trata-se de unir o útil ao lucrativo (Grifos

nossos).

A Lucratividade alinhada com a proteção e equilíbrio ambiental são colocados pelas

empresas como pontos convergentes para um desenvolvimento econômico viável e sustentado

na atualidade, ou seja, como algo de alcance possível, objetivo e resultado da intervenção

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“socialmente responsável” e “produtivamente prudente”. O anunciado olhar “integrador” para

a problemática ambiental das empresas tende a unificar dimensões inconciliáveis, o lucro e

natureza, naturalizando o primeiro e despolitizando seu significado histórico no capital que

indica a apropriação privada da mais-valia.

Nesse panorama os ditos “esforços ambientais” que compreendem desde o propagado

compromisso com a mitigação das crises climáticas pela progressiva redução das emissões

dos gases de efeito estufa (GEE) às demais alternativas, de implantação, fomento e

financiamento de programas, projetos e ações “sustentáveis”, resvalam num processo de

mercantilização da natureza, porque tais iniciativas redundam em vantagens econômicas

obtidas pelas empresas.

Concretamente, a integração da sustentabilidade à filosofia das empresas denota uma

preocupação de controle sobre as influencias externas que podem impactar no equilíbrio e

sustentabilidade dos negócios, consequentemente do lucro. Uma vez que as crises climáticas

provocativas de desastres ambientais e sociais trazem prejuízos econômicos. Assim, conhecer

os problemas, provocar soluções e acima de tudo ter o controle sobre isso, torna-se

fundamental para o mercado no que se refere a sua dinamização do processo de acumulação e

sua manutenção.

E esse “esforço” de incorporar indicadores de sustentabilidade aos negócios comum ao

Itaú Unibanco e demais empresas nacionais e internacionais é exatamente o problema,

sobretudo de uma conjuntura de profunda crise ambiental. Demonstra a forma na qual o

capitalismo lida com os problemas sociais e ambientais. Estes se encaixam às suas

prioridades, passam a fazer parte do conjunto de estratégicas que as elites movimentam para a

manutenção de seus monopólios.

[...]atualmente, as ações sociais desenvolvidas pelos empresários no

Brasil integram ações estratégicas potencializadoras de hegemonia

burguesa, num contexto em que a relação entre as formas mercantis e

o aparato estatal, que lhe legitima e sustenta, é reconfigurada no

movimento de resposta do capital às suas crises (CESAR, 2012, p.32).

O envolvimento empresarial com o Desenvolvimento Sustentável é um movimento

que se iniciou na década de 1990, mas que assume maior expressão no século XXI porque

estão mais evidentes as expressões da crise estrutural do capital, bem como, a escassez dos

recursos naturais que se apresentam como grande oportunidade de negócio para o capital.

Adicionalmente, as crises climáticas que com o devir deste século, também, tornaram mais

explícitas as consequências e os riscos ambientais provocados pela ação produtivista do

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capital, provocou no empresariado a necessidade mercantil de assumir o discurso de ética

socioambiental e agregá-lo as suas práticas.

Não por acaso, tomando como referência o Itaú Unibanco, a perspectiva da

sustentabilidade propriamente começa a se desenhar em seu interior em 2009, de acordo com

o Relatório Consolidado de 2013, com a publicação da “Essência da Sustentabilidade”, onde

constavam oito temas que definiram o entendimento e a estratégia de sustentabilidade a

serrem associados pelo banco. No ano de 2011, o lançamento da campanha “O mundo Mudou

e o Itaú Muda com você” movimentou a instituição pela definição do que viriam a consideram

como “Performance Sustentável”, ou seja, a organizar seu planejamento de metas

institucionais e o Mapa da Sustentabilidade supracitado.

Ao analisar o contexto internacional das alternativas “reformistas” das forças do

mercado para o enfrentamento da crise ambiental que se traduzem, por exemplo, na

incorporação da dimensão do meio ambiente no âmbito empresarial, apreendemos desse

processo que há uma tendência que se evidencia, de interesses na administração de negócios

nessa área, porém obscurecidos pelo discurso ideológico de comprometimento com a

“salvação planetária”.

Todavia, a sustentabilidade não deveria apenas “agregar valor” às estratégias

empresariais. O desenvolvimento sustentável deveria ser um elemento central para toda

sociedade.

Entretanto, em nossa compreensão, o mercado é incapaz de concretamente efetivar

essa complexa e onerosa missão. Isso, ao considerar que o lucro imediato representa o

interesse central. Para nós, a sustentabilidade de iniciativa das empresas revela o esforço do

reconhecimento das formas de garantia do lucro adaptadas às novas condições ambientais

impostas.

Nossa perspectiva de análise identifica que todo o movimento de incorporação do

mercado de práticas orientadas ao enfrentamento das crises nos setores social e ambiental tem

interesses econômicos e políticos de fundo. Interesses esses, que estão ocultos em discursos

que tentam afirmar unilateralmente o novo compromisso ético-social e ambiental do mercado.

E isso é preocupante, uma vez que vai se consolidando a mercantilização da natureza.

Não afirmamos com isso que as empresas desconsiderem em sua totalidade as demais

dimensões que se referem ao Desenvolvimento Sustentável. O Itaú, por exemplo, as indica

como preocupações constitutivas das iniciativas “sustentáveis” que o banco adota. Contudo,

entendemos que o objetivo da incorporação de princípios de sustentabilidade no âmbito

empresarial, não indica a priorização do meio ambiente em relação ao lucro. O lucro sempre

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será a finalidade última do mercado. E a sustentabilidade em nossa percepção supõe a relação

contrária, ou seja, o equilíbrio ambiental em detrimento do lucro como fundamento das

atividades produtivas em resposta as necessidades sociais.

Direcionar as ações e os focos estratégicos na direção do lucro “limpo” que requer a

inserção das diretrizes de sustentabilidade, não altera toda uma estrutura produtiva e

econômica que impera a natureza uma dinâmica de profunda degradação. O que se percebe é

que as empresas tentam adquirir o direito de continuar poluindo, emitindo CO2 na atmosfera,

inserindo em suas práticas ações de produção “controlada” que lhes rendam créditos de

carbono que eventualmente pode inclusive se tornar uma mercadoria (lucrativa), alvo de

especulações e gerenciamento no/pelo setor financeiro (conforme vimos linhas acima na

particularidade do Itaú Unibanco). E assim, seguem destituindo direitos e ameaçando as

comunidades tradicionais e suas formas históricas de relação com o território e a natureza,

avessa a dinâmica produtiva “suja” do capital, bem como, destruindo as florestas e a

biodiversidade.

Portanto, na nossa análise crítica dos fundamentos econômicos e políticos do

capitalismo “verde” podemos identificar o paradoxo e o discurso ideológico do capital

impresso nas práticas empresariais, a partir do que vimos do Itaú Unibanco. Como se fosse

possível, sob o domínio do capital, assegurar um desenvolvimento efetivamente sustentável.

A sustentabilidade como necessidade socioambiental contraria a lógica da valorização

que o capital imprime aos valores de troca na produção de mercadorias, nos serviços,

direcionados ao lucro máximo. A concentração da riqueza e do poder pela burguesia são

dimensões constitutivas estruturais do capital. Logo, é incompatível um desenvolvimento no

capital que considere antes de tudo, a estabilidade ambiental e a igualdade social. Portanto, o

alcance da sustentabilidade no capital.

4.1 A (in) sustentabilidade das relações de trabalho do Banco Itaú.

No dia 16 de Junho de 2011, em Londres, o Itaú Unibanco, foi premiado por ser

considerado “O Banco Mais Sustentável do Mundo” pela FT/IFC Sustaintable Finance

Awards, após ter disputado com 187 iniciativas sustentáveis de 161 instituições representando

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61 países. Somando-se a isso, aos demais prêmios que recebeu nos anos anteriores, 2009 e

2010, acumula, também, o título de Mais Sustentável das Américas79

.

O Itaú Unibanco, fusão entre dois grandes grupos econômicos no Brasil, no discurso

do seu presidente, Roberto Setúbal80

, sobre as iniciativas que o banco desencadeou, foi

premiado porque para o banco a sustentabilidade revela, sobretudo, ter transparência com as

partes interessadas.

[...] Na prática, isso implicou, por exemplo, redesenhar os produtos

para que eles fossem oferecidos a quem precisa. Em seguro de vida,

por exemplo, a oferta passou a ser feita a quem de fato está

interessado no produto. Sem a chamada “venda empurrada”, houve

20% de perdas em vendas, mas redução de 40% nos custos dos

seguros, por conta dos menores índices de cancelamentos. Os

financiamentos, por sua vez, passaram a levar em conta os riscos dos

impactos socioambientais de forma mais preponderante. Se o impacto

for considerado inaceitável o banco não libera financiamento

(UNIETOS, 2011).

Quando indagado sobre os custos dessas ações e o retorno em termos de rentabilidade,

Roberto Setúbal, Presidente do referido banco, afirma que se pensadas em longo prazo essas

ações são as melhores expressões da sustentabilidade na atualidade e que não custa tão caro,

porque as perdas podem ser facilmente repostas em outros setores, como no caso dos seguros

de vida, por exemplo. Ademais, a sustentabilidade dá retorno na composição de uma marca

com maior reputação e valorização, porque gera confiança e traz estabilidade. Além disso, na

atualidade a empresa que deseja se manter no sistema deve adotar essas práticas sustentáveis,

não de forma alternativa, mas como estratégia de sobrevivência81

.

Assim, o Itaú Unibanco lançou para a sociedade uma propaganda ideológica para

sensibilizar a sociedade onde exibia e exaltava um título que lhe fora outorgado de “Banco

Mais Sustentável do Mundo”, pelo jornal britânico Financial Times e pelo Internacional

Finance Corporation, esse último, articulado ao Banco Mundial. Todavia, essa propaganda

teve sua validade e seus moldes questionados pelo Conselho Nacional de Autorregulação

Publicitária (CONAR), na 7º Câmara do Conselho de Ética, onde se determinou a

reformulação da mesma. No fim de setembro, de 2011, os conselheiros recomendaram essa

reformulação caso o banco decidisse manter o slogan, pois entendiam que as informações

79

Essas premiações existem em razão do reconhecimento dentro da lógica do desenvolvimento sustentável e das

discussões avançadas sobre a sustentabilidade e a responsabilidade social empresarial, como forma de tornar

visível os denominados “cases” (casos) de sucesso, desenvolvidos pelas empresas.

80

*Encontrado na entrevista divulgada pelo Instituto Ethos, em 20 de Junho de 2011. 81

Encontrado na entrevista divulgada pelo Instituto Ethos, em 20 de Junho de 2011.

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sobre essa premiação não foram suficientemente esclarecidas. O banco optou por retirá-la do

ar (BOLETIM 06, 2011, p.2).

Diante da percepção do significado histórico das empresas do setor financeiro no

capitalismo, sua razão social e seus objetivos, suscitam em nós questionamentos sobre o que

poderia vir a ser considerado como sustentável em suas práticas. Sob qual prisma a

sustentabilidade é concebida? Sustentabilidade para que(m)? O que poderia justificar

premiações desse cunho para uma empresa do sistema financeiro? Qual concepção de

sustentabilidade predominante?

Se considerarmos as relações de trabalho denunciadas por seus trabalhadores, nos

depararemos com a contradição e o peso ideológico que a afirmação do Itaú Unibanco como

uma empresa referência em Performance Sustentável tem para a criação de uma imagem

positiva perante o mercado e a sociedade. Contrariando inclusive a indicação da missão que a

própria empresa divulgou em seu Relatório Anual Consolidado 2013, de “ser um banco líder

em Performance Sustentável”.

Demissões, terceirizações, inserção precária, sobrecarga de trabalho e alta rotatividade,

são as marcas de um banco que pela garantia dos lucros flexibilizou as relações de trabalho

em seu interior. Esse processo de flexibilização imperou uma dinâmica de instabilidade para a

classe trabalhadora no que se refere à segurança do emprego garantido, bem como,

enfatizaram condições de trabalho precarizadas, contrariando a imagem que tentou articular

em torno de si, como “O Banco Mais Sustentável do Mundo”.

Assim efetivou uma série de ações que evidenciaram desrespeito com seus

trabalhadores e a fragilidade da sua “responsabilidade social”. Hoje, utilizada como discurso

inclusivo e ético-social dessa empresa para com o meio ambiente e a sociedade.

O Banco, na mesma direção em que aumentou os seus lucros em 2011, também o fez

no que diz respeito às demissões no Brasil. O que era uma previsão de especialistas em

tendências de negócios quando do momento da fusão entre o Itaú e o Unibanco, se

materializou. Ou seja, para garantir a alta lucratividade, o corte com os custos relativos ao

trabalho ocorreu de maneira intensa. Tais demissões, provocadas por essa fusão, resultou na

precarização do trabalho para os trabalhadores que permaneceram.

A fusão entre Itaú e Unibanco ocorreu em 2008 em plena deflagração da crise do

capitalismo financeiro internacional, que impulsionou o reordenamento do setor para

acompanhar o mercado competitivo e “globalizado”, por conseguinte, a criação de novas

formas de gestão do trabalho afinadas ao novo tempo, conforme discutiremos no tópico

subsequente.

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Essa fusão entre os dois bancos representou uma ação de alta lucratividade,

transformando-os na maior instituição financeira do Brasil e do Hemisfério Sul e uma das 20

maiores do mundo. A partir dela o total da junção dos ativos82

dos dois bancos somou mais de

R$575 bilhões, tornando-se superior aos do banco concorrente, o Banco do Brasil (R$403,5

bilhões), segundo dados do Banco Central83

.

À época, o sindicato e toda categoria dos trabalhadores temiam as consequências que

uma ação dessa ordem poderia acarretar para as relações de trabalho de ambos. Todavia, os

diretores dos dois bancos, Roberto Setúbal e Pedro Moreira Salles, do Itaú e Unibanco,

assumiram um discurso de que não haveria consequências, ou que pelo menos, seria

despendido certo “esforço” por parte das duas instituições em realocar pessoal ao invés de

demitir.

Tal discurso não convenceu a categoria dos bancários porque tinham conhecimento do

histórico complicado dos dois bancos quanto a processos anteriores de fusão empreendidos

pelos mesmos em outras conjunturas. Logo, a luta pela formalização de um acordo que

oferecesse segurança de que as demissões não seriam uma realidade, se colocava como uma

grande bandeira a ser defendida. Embora jamais tenha sido assinado, conforme

apresentaremos ao longo da discussão.

O Banco Itaú, por exemplo, segundo o Jornal da Confederação Nacional dos

Trabalhadores do Ramo Financeiro – CONTRAF/CUT, publicado em dezembro de 2008:

Em processos anteriores de fusão ou compra de outros bancos, o banco foi

extremamente violento nas demissões e na retirada de direitos dos

trabalhadores. Mesmo nesse processo já houve quebra da palavra do banco.

Após o compromisso dos presidentes de não demitir ou fechar agências, 90

lojas da Taií, financeira do Grupo Itaú, foram fechadas. O maior exemplo

dessa conduta é o papel do banco nas privatizações de bancos públicos

estaduais. Entre 1997 e 2001, o banco comprou os bancos estatais Banerj,

BEMGE, Banestado e BEG. Em todos os casos as declarações do banco foram

na mesma direção: não haverá demissões ou perda de direitos. No entanto, os

números mostram coisa diferente. Se em 1996 o Itaú registrava empregar 31,3

mil pessoas, em 2003 - depois de comprar os quatro bancos, que juntos

somavam cerca de 27,7 mil funcionários – o banco de Roberto Setúbal tinha

apenas 11,2 mil funcionários a mais em seu quadro. A diferença é facilmente

explicada: cerca de 90% dos funcionários dos bancos comprados foram

demitidos pelo Itaú. Também na compra da operação do BankBoston no

Brasil pelo Itaú os bancários acabaram levando a pior. O problema foi que os

direitos conquistados pelos trabalhadores do banco adquirido eram maiores do

que os do Itaú. Um exemplo claro é o plano de saúde oferecido aos

trabalhadores. O Boston disponibilizava um plano mais amplo que o do Itaú e

82

Termo da área contábil recorrente para indicar os bens, valores, créditos, ações, títulos, dentre outros que

formam o patrimônio pessoal ou institucional. 83

Jornal da Contraf/CUT, dezembro de 2008. Disponível em:http://www.contrafcut.org.br/publicacao.asp.

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não cobrava nada dos bancários. Os trabalhadores passaram a pagar por um

plano inferior84

(p.1).

Se sintonizarmos a análise desse processo numa perspectiva de totalidade de modo a

relacioná-lo com as mudanças estruturais históricas do capitalismo, estaremos cientes de que

faz parte de todas elas a propagação de discursos de progresso.

Em geral, tais discursos asseguram que as tais mudanças estruturais são necessárias e

urgentes para o reequilíbrio da economia na lógica do capitalismo e suas crises cíclicas,

porém, não implicarão em perdas para o mundo do trabalho.

No entanto, reiteram-se em seus processos produtivos o aprofundamento da

exploração, alienação e apropriação da riqueza fruto do trabalho social (mais-valia). É nesse

sentido, que a cada novo ciclo do capital, as relações de trabalho tornam-se cada vez mais

recrudescidas. Ou seja, os discursos dos diretores dos dois bancos à época em processo de

fusão expressam essa dinâmica.

Ressaltamos que a crise de 2008 do sistema financeiro não representa apenas mais

uma crise cíclica do capital. Isto porque, à diferença das anteriores, o que está em curso é

crise de acumulação. Portanto, uma crise estrutural do capital que a diferencia das demais. E

essa crise estrutural, que tem se demonstrado longeva e impactante para todas as dimensões

da vida, associada às mudanças estruturais iniciadas em 1980 com a reestruturação produtiva,

tem se revelado crucial para o desemprego estrutural.

No que diz respeito ao Unibanco, ainda segundo o jornal em alusão da

CONTRAF/CUT, quando o referido fundiu-se ao Banco Nacional, entre 1994 e 1995, seu

quantitativo de funcionários aumentou de 17 mil para 28 mil, porém, nos anos subsequentes

esse número caiu até voltar ao mesmo número de antes da fusão, ou seja, os mesmos 17 mil- o

que representou uma redução de 39%.

Em dezembro de 2008, o sindicato dos bancários organizou a categoria para

reivindicar a assinatura de um acordo que desse garantia aos trabalhadores de que a fusão

entre os bancos não acarretaria em demissões em massa. Ambos os Bancos, recusaram a

formalização de tal acordo. Nesse sentido, a Contraf/CUT organizou a Campanha Nacional de

Proteção ao Emprego que fazia parte da Jornada Internacional de Lutas lançada pela Uni

América Finanças e pelo Comitê de Finanças da Coordenadora das Centrais Sindicais do

Cone Sul (CCSCS) 85

.

84

Jornal da Contraf/CUT, dezembro de 2008. Disponível em: http://www.contrafcut.org.br/publicacao.asp. 85

Jornal da Contraf/CUT, dezembro de 2008. Disponível em: http://www.contrafcut.org.br/publicacao.asp.

Acesso em: 23/01/2014.

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A resposta negativa em relação à assinatura de um acordo que formalizasse o

compromisso das instituições quanto à manutenção dos postos de trabalho, anunciada pelos

Diretores dos dois Bancos, Roberto Setúbal e Pedro Moreira Salles, do Itaú e Unibanco,

respectivamente, foi justificada pelos seus negociadores como uma impossibilidade de ambos

de garantir isso.

Para o processo de negociação os bancários construíram uma pauta de 15

reivindicações que foram aprovadas no Encontro Nacional dos Dirigentes Sindicais do Itaú e

do Unibanco e unificadas em uma reunião das Comissões de Organização dos Empregados

(COE’s) de ambos os bancos. Os bancários pressionaram os bancos para que o processo de

fusão acarretasse em melhorias para a sociedade e também na garantia de empregos, não a

relação contrária. E, dentre as reivindicações que pautaram a reunião com os dirigentes dos

bancos, pedia-se pela aplicação da Convenção 158 da Organização do Trabalho86

; fim

imediato das demissões e horas-extras, a manutenção das agências e ampliação em no 20%

do quadro de funcionários; plano de incentivo a aposentadoria; manutenção dos direitos

observando as condições mais vantajosas87

.

Segundo o Jornal da Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro-

Contraf/CUT de dezembro de 2008:

As demandas foram apresentadas ao banco durante a negociação, mas

foram poucos os avanços conquistados. Os bancos se negaram a

assinar um acordo garantindo os empregos dos bancários durante o

processo de fusão, mas atenderam algumas das reivindicações dos

trabalhadores, com destaque para a suspensão de novas contratações.

Outro ponto positivo foi o compromisso de criação de um centro de

realocação para aproveitar os funcionários excedentes de áreas em que

haja sobreposição dentro das empresas. Os bancos também acenaram

positivamente para a proposta de criação de um programa de

antecipação das aposentadorias. O programa funcionaria na forma de

incentivos para trabalhadores que estejam próximos da aposentadoria

a deixarem antes a empresa, abrindo espaço para outros bancários. Os

negociadores afirmaram se tratar de uma possibilidade que está sendo

analisada, mas que ainda não concluíram nenhum estudo sobre o

86

A Convenção 158 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) é um tratado internacional que traz

garantias contra a dispensa imotivada, ou seja, as empresas teriam que demonstrar justificativas para a

demissão. Não se trata aqui das demissões por justa causa previstas na CLT. Nos casos em que a motivação for

econômica, tecnológica ou estrutural, a 158 prevê a necessidade de negociação prévia com os sindicatos para

realocação do pessoal. Quando seus procedimentos não forem observados, o trabalhador tem o direito de

pleitear sua reintegração na Justiça do Trabalho. Esta convenção já vigorou no Brasil entre janeiro de 1996 e

novembro de 1997, quando foi denunciada pelo governo FHC. A luta pela revogação da denúncia e ratificação

da Convenção 158 é uma das prioridades da CUT e da Contraf (JORNAL CONTRAF/CUT, 2008). 87

Jornal da Contraf/CUT, dezembro de 2008. Disponível em:http://www.contrafcut.org.br/publicacao.asp.

Acesso em: 23/01/2014.

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melhor formato e possível impacto da medida na manutenção de

postos de trabalho (p.2)88

.

Não bastassem os impactos imediatos que fusão significaria para as relações de

trabalho, os dois bancos não se mostravam plenamente disponíveis para receber as demandas

da classe trabalhadora e oferecer segurança de que seus postos de trabalho seriam mantidos,

em detrimento do processo.

O fato os anos subsequentes à fusão foram marcados pela confirmação da realidade

que previam os sindicatos e os especialistas nas análises das tendências de mercado. O

desemprego virou realidade. Assim, as lutas da categoria passaram a ter como principal

bandeira a defesa pela permanência no trabalho, associada a ela, as melhorias das relações.

Segundo o Boletim Especial 06, de novembro de 2011 da Rede Global Bancária89

, os

trabalhadores do Itaú Unibanco se demonstravam insatisfeitos e sedentos por melhorias nas

condições de trabalho, precarizadas, haja vista, a avidez do referido por lucro.

Dessa forma, através da iniciativa da Uni América Finanças e Caribe, apoiada por

entidades filiadas em cada país, se organizaram internacionalmente, construindo a Jornada

Internacional de Lutas e foram às ruas entre os dias 21 e 25 de novembro de 2011, em todos

os países em que o banco é atuante, para reivindicar a assinatura de um acordo marco global

com o referido, cuja luta de fundo se âncora sobre as seguintes bandeiras: isonomia de

direitos, salários e emprego, sendo garantidas melhores condições praticadas. Associadas a

essas bandeiras, os trabalhadores, também, cobraram do Itaú, internacionalmente,

participação nos lucros e resultados, fim das metas abusivas, combate ao assédio moral e a

implantação de uma política inclusiva de contratação de minorias.

Tal jornada também denunciou o processo de precarização do trabalho nesse banco,

comum a situação dos diversos países em que é atuante, através da terceirização, que na visão

dos trabalhadores, discrimina, desorganiza e desregulamenta a relação capital identidade e

vínculos de categoria profissional, além de terem salários menores aos da categoria que

estão substituindo. Nessa lógica, segundo a percepção dos mesmos, se configura uma forma

de gestão para redução de custos para o aumento dos lucros.

A alta lucratividade do Banco Itaú no ano de 2011 lhe rendeu o recorde perante os

demais bancos brasileiros, ocorreu simultânea ao corte de funcionários em um nível elevado

em relação ao ano de 2010. No Boletim a que estamos nos reportando, consta que:

88

Jornal da Contraf/CUT, dezembro de 2008. Disponível em: http://www.contrafcut.org.br/publicacao.asp.

Acesso em: 23/01/2014. 89

Jornal da Contraf/CUT, dezembro de 2008. Disponível em: http://www.contrafcut.org.br/publicacao.asp.

Acesso em: 23/01/2014.

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Enquanto bateu novo recorde de lucro entre os bancos brasileiros, atingindo

1,9 bilhões até setembro deste ano, o Itaú Unibanco cortou 2.496 empregos no

mesmo período no Brasil, o que é injustificável. Conforme dados do DIEESE,

o banco contava em dezembro de 2010 com 102.316 trabalhadores. O número

caiu para 99.820 em setembro de 2011. Além disso, o banco pratica alta

rotatividade. E as demissões aqui não param (p.2).

Tais demissões executadas pelo banco aconteceram em todo o Brasil, compreendendo

os setores de crédito para o consumidor, financeiras e os seguimentos de cartões de crédito,

também nas áreas de tecnologia da informação e suporte jurídico, varejo e negócios

(BOLETIM 06, 2011,p.2). De certo, isso teve implicações para a saúde desses trabalhadores,

na medida em que, “com a redução de funcionários, as condições de trabalho pioraram no

banco e, para suprir a demanda dos clientes, os trabalhadores estão quase todos estressados,

diante da pressão pelo cumprimento de metas inatingíveis” (BOLETIM 06, 2011,p.2).

Em contrapartida do aumento dos cortes no Brasil, o Itaú no mesmo ano, contratou

mais funcionários no exterior, gerando 425 novos empregos. Numericamente o banco tinha

5.741 trabalhadores até dezembro de 2010, e em setembro de 2011 passou a ter 6.149

(BOLETIM 06, 2011,p.2).

Segundo, matéria divulgada no Brasil de Fato, em 12 de junho de 201290

, foram

desligados 1.964 trabalhadores já no primeiro trimestre do referido ano, mesmo com o lucro

de 3,4 bilhões que o banco alcançou. O sindicato dos bancários articulou nesse mesmo dia 12

de junho de 2012, uma parada das atividades das agências do Itaú Unibanco em todo o país

como forma de protesto contra essas demissões em massa operadas pela instituição. Além

disso, tal matéria expõe dados do DIEESE que apontam as diferenças salariais internas entre

bancários e diretores, a o processo de alta rotatividade com perdas salarias para categoria91

.

De acordo com esse texto:

Segundo a Pesquisa do Emprego Bancário, feita pela Contraf-CUT e o

Dieese, com dados do Cadastro Geral de Empregados e

Desempregados (Caged), a remuneração média dos admitidos foi de

R$ 2.430,57 em 2011, enquanto que a dos desligados foi de R$

4.110,26, uma diferença de 40,87%. No ano anterior, a diferença era

de 37,60%.Enquanto realiza o corte de gastos com a demissão dos

trabalhadores, o Itaú é o banco que melhor remunera seus diretores.

Em 2011, a instituição gastou R$ 7,45 milhões por diretor. A

remuneração anual de um diretor do Itaú supera 208 vezes o ganho de

um bancário que recebeu ao longo de 2011 o piso da categoria,

segundo cálculo do Dieese92

.

90

Disponível em: http://www.brasildefato.com.br/node/9795. Acesso em: 25/01/2014 91

Disponível em: http://www.brasildefato.com.br/node/9795. Acesso em: 25/01/2014. 92

Disponível em: http://www.brasildefato.com.br/node/9795. Acesso em: 25/01/2014.

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A Revista Exame, em agosto de 2012, publicou texto de Raquel Landim93

, sobre o

fechamento de 9 mil postos de trabalho, pelo Itaú Unibanco, no período de um ano,

destacando o banco em relação ao seus concorrentes quanto as demissões, que representaram,

segundo o texto, mais de 40% apenas no segundo semestre no ano em questão. Fato que à

época, compreensivelmente, foi alvo das preocupações do sindicato dos bancários se

transformando em campanha salarial. Conforme o texto em questão:

De acordo com dados obtidos no balanço do banco, o Itaú Unibanco

empregava 92.517 pessoas no país em junho deste ano, 9.014 menos que em

junho de 2011. Boa parte dessa redução ocorreu recentemente, com um corte

de 3.777 vagas entre março e junho. De janeiro a junho, o saldo é negativo em

5.741 postos. Bradesco e Santander também reduziram o número de

trabalhadores no segundo trimestre, mas em volume menos significativo.

Foram fechadas 571 vagas no Bradesco e 135 no Santander de março a junho.

No acumulado do ano, o saldo é negativo em 153 postos no Bradesco e

positivo em 316 no Santander. Entre junho de 2011 e junho deste ano,

Bradesco e Santander registraram aumento no número de funcionários - 6.214

e 1.557 novas vagas, respectivamente. No Bradesco, com a perda do Banco

Postal para o Banco do Brasil, houve abertura de novas agências e contratações

94.

Tais demissões segundo o Itaú Unibanco, que ocorreram em 2012, foram provocadas

pela venda da processadora de Cartões Orbitall, e que, no momento da fusão entre os dois

bancos, houve o remanejamento de 2 mil funcionários.

O Itaú é o banco que mais demitiu no Brasil em 2012, apesar dos lucros

recordes. A instituição fechou 7.935 postos de trabalho, uma redução de

8,08% de seu quadro funcional. Desde março de 2011, já são 13.699 empregos

a menos. Enquanto isso, o lucro líquido recorrente do Itaú atingiu R$ 14,043

bilhões em 2012. Esse foi o segundo maior lucro de um banco no país. O

maior foi o resultado do próprio Itaú em 2011, quando bateu R$ 14,640

bilhões. Sem contar que, embora tenha sido bilionário, o lucro teria sido ainda

maior se o banco não usasse a manobra contábil de superdimensionar as

provisões para devedores duvidosos (PDD), que apresentou um crescimento

de 20,66%, passando de R$ 19,9 bilhões em 2011 para R$ 24,025 bilhões em

2012. Ao mesmo tempo, a taxa de inadimplência real de dezembro de 2012

diminuiu 0,1 ponto percentual em relação ao mesmo período de 2011. Na

comparação de dezembro em relação a setembro de 2012, a variação foi de -

0,2 ponto percentual, o que demonstra estabilidade. O banco pagou em 2012

todas as despesas de pessoal apenas com receitas de serviços e tarifas e ainda

apresentou um excedente de 44,8% da soma dessas receitas. Além disso, a

despesa com pessoal cresceu apenas 0,5% de 2011 para 2012. Isso mostra que

o Itaú está se utilizando da rotatividade e do corte de funcionários para

turbinar o seu lucro. O total desembolsado pelo banco para pagar a PLR em

2012 para seus funcionários foi de R$ 702 milhões. Enquanto isso, o Itaú

93

Disponível em: http://exame.abril.com.br/negocios/noticias/itau-unibanco-fecha-9-mil-vagas-em-um-ano/.

Acesso em: 22.01.2014. 94

Disponível em: http://exame.abril.com.br/negocios/noticias/itau-unibanco-fecha-9-mil-vagas-em-um-ano/.

Acesso em: 22.01.2014.

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pagou de bônus aos 15 membros da sua diretoria executiva R$ 125 milhões.

Ou seja, cada um deles recebeu uma remuneração anual de R$ 8,3 milhões95

.

No entanto, os sindicatos discutiam a época que as tais demissões ocorriam como

reflexo da fusão entre os dois bancos.

Para os representantes dos trabalhadores, os cortes ainda são um reflexo da

fusão. Em 2008, os dois bancos empregavam 108.458 pessoas - 77.354 no Itaú

e 37.104 no Unibanco. Em relação ao total de colaboradores hoje, foram

fechados 15.941 postos. Os sindicalistas também atribuem os cortes de vagas

ao crescimento dos correspondentes bancários - casas lotéricas, lojas de

roupas, farmácias e outros varejistas que realizam operações como abertura de

conta-corrente, serviço de cobrança e crédito. As informações são do jornal O Estado de S.Paulo

96.

Cabe notar, que entorno desse Banco, no discurso de seus representantes, foi e é criada

uma imagem institucional de preocupação com a classe trabalhadora, desde a fusão, que

ocorreu em 2008. No entanto, os dados revelam o paradoxo desses discursos.

As parcerias do banco com demais empresas como farmácias, lotéricas, lojas de

roupas, verejistas, que realizam as funções de funcionários dos bancos, em muito influenciam

para o processo de demissões. Fato que se agrega aos serviços oferecidos pela internet,

“internet banking”, que mais do que “facilitar a vida dos seus usuários”, faz com que

trabalhadores façam o serviço que poderia estar sendo feito por outros trabalhadores,

devidamente empregados, assalariados, com todos os direitos do trabalho assegurados.

Passados sete anos da fusão entre o Itaú e o Unibanco, a lucratividade continua a

crescer em detrimento do fim das demissões. O crescimento econômico dessa empresa de alto

porte do setor financeiro brasileiro, não é socializado com os trabalhadores na mesma

proporção em que isso acontece, os verdadeiros responsáveis por esse resultado e ainda há

diferenciações díspares em relação aos salários de seus diretores, conforme apontamos linhas

acima. E isso confirma as previsões e as preocupações que a categoria já demonstrava desde o

anúncio da fusão, visto que, a concentração de renda e as demissões em massa, nos anos

subsequentes se tornaram uma realidade. Em 2014:

O Itaú obteve lucro líquido de R$ 9,502 bilhões somente no primeiro

semestre de 2014, o que significa crescimento de 33,2% em relação a

igual período de 2013. O resultado aumentou 9,8% apenas no segundo

95

Publicação feita pelo Contraf/CUT, em abriu de 2013, voltada para os bancários do Itaú Unibanco, intitulada

Itaunido. Disponível em: http://www.contrafcut.org.br/publicacao.asp. Acesso em: 23/01/2014.

96

Disponível em: http://exame.abril.com.br/negocios/noticias/itau-unibanco-fecha-9-mil-vagas-em-um-ano/.

Acesso em: 22.01.2014.

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trimestre alcançando R$ 4,97 bilhões. Trata-se do maior lucro da

história do banco considerando esse período, superior ao recorde dos

primeiros seis meses de 2011, que fora de R$ 7,133 bilhões. [...]

Apesar desse resultado estrondoso, o Itaú continuou demitindo e

extinguindo postos de trabalho. No primeiro semestre, foram cortados

1.363 empregos, mesmo com o banco passando a considerar o número

de empregados vindos da Credicard. Apenas no segundo trimestre

foram eliminados 601 empregos. Já nos últimos 12 meses, a redução

foi de 639 funcionários. Assim, em junho de 2014, o quadro caiu

0,7%, ficando em 87.420 empregados ante 88.059 em junho de 2013.

O banco segue andando na contramão da economia brasileira, que nos

primeiros seis meses do ano gerou 588,6 mil novos empregos com

carteira assinada.

A dura realidade de trabalho dos bancários nas mais variadas agências do Itaú, no

Brasil, impacta na saúde desses trabalhadores. Mas do que desrespeito revela a face desumana

e avessa à responsabilidade social por parte dessa instituição: Trabalho sobre pressão para o

alcance de metas abusivas; com horário estendido; cerceamento da produtividade individual e

coletiva, passível de punições, caso esta meta não seja alcançada; ameaça de demissão; falta

de tempo para realizar outras atividades e investir em capacitação; assedio aos clientes para a

venda de produtos do banco; baixa remuneração; ausência de perspectiva de ascensão de

carreira; contratação temporária; polivalência; desvio de função; diferenciações salariais,

dentre outros. Estes são alguns dos graves problemas enfrentados diariamente pelos

trabalhadores dessa instituição. O Itaú Unibanco, caminha na direção oposta da visão que

tenta articular em torno de si e faz imperar relações de trabalho insustentáveis.

A pesquisa da Engenheira do Trabalho Sheila R. N. Mota (2009) intitulada “Análise

das Condições Ambientais de Trabalho da área comercial e operacional do Banco Itaú”, cujo

lócus da pesquisa, foram as agências do Banco Itaú do ABC Paulista, embora tenha uma

perspectiva de análise diferente da que elegemos para nosso trabalho, trouxe dados

interessantes sobre as condições de trabalho nas quais estamos denunciando, com acesso real

as mesmas, de um ponto de vista técnico.

Organizamos um quadro com os resultados apresentados nessa pesquisa, sobre os

aspectos gerais da organização do trabalho, que levou em consideração os relatos dos

trabalhadores/as e as indicações do sindicato dos bancários. Tal pesquisa reitera os dados

apresentados nas publicações do sindicato dos bancários e outras e enfatiza o que viemos

discutindo ao longo desse tópico.

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Aspectos Gerais da Organização do Trabalho nas Agências do Banco Itaú do ABC

(Por: Sheila R.N.Mota, 2009)

1 A gestão organizacional está baseada na metodologia de premiação e promoções;

2 Metas são coletivas e individuais, onde cada agência tem sua porcentagem e são formuladas por um

departamento específico fora das agências, segundo o banco, baseado em várias análises, entre elas,

de mercado em cada região;

3 O controle da produtividade e metas da agência e o controle do trabalhador são percebidos como

tarefas penosas, pois implica na supervisão do trabalho dos colegas e a competição entre os

trabalhadores da agência. Inclui-se também a imposição de metas inatingíveis;

4 A oferta dos produtos nem sempre considera as características da clientela da área de abrangência da

agência, desta forma, o trabalhador é obrigado a oferecer produtos que o poder aquisitivo da

clientela não comporta. Dentre os produtos oferecidos temos: seguros diversos, cartões de crédito,

planos de previdência, planosde capitalização,consórcios, empréstimos, etc.

5 Ritmo de trabalho intenso devido o número reduzido de funcionários para atendimento das

exigências – metas e produtividade - do Programa AGIR.

6 Realização de atividades além das específicas do seu cargo, por exemplo, o tesoureiro/chefe de

serviços assumindo as atividades do caixa e o gerente operacional assumindo as atividades de

tesoureiro/chefe de serviços;

7 Em relação aos aspectos gerenciais – administrativos, cabe ao gerente operacional administrar a

prestação de serviços dos contratos terceirizados e as intercorrências que ocorrem durante o

expediente. Citamos por exemplo o serviço de limpeza, que não atende todo o horário de

atendimento da agência;

8 O banco introduziu a partir de meados de 2008 para a área operacional uma tarefa até então

exclusiva da área comercial, a venda de produtos que está vinculada às metas do Programa AGIR.

Na prática acaba ficando a cargo dos caixas, pois são estes que tem contato maior e direto com o

cliente. Tal atividade associada às rotinas, como por exemplo, o fechamento do caixa pode gerar

diferenças a serem descontadas do trabalhador, aumentando a pressão no trabalho;

9 Controle da fila de cliente é mais um instrumento de produtividade, através de sistema

informatizado, chamado de “papeletas”, no qual se verifica se o atendimento está ocorrendo com

tempo ideal estipulado pelo banco. O sistema de medição funciona da seguinte maneira: todos os

terminais caixas têm uma faixa verde onde o sistema escolhe aleatoriamente a hora de medir o

tempo de fila. Para tanto o sistema emite um apito e fica piscando avisando que o funcionário deve

puxar através de certa função o documento chamado “papeleta” para ser entregue ao último cliente

da fila que o entregara ao caixa para que este jogue no sistema e seja feita a aferição do tempo que

este cliente levou para ser atendido. Este tempo entra no hall de cobranças do AGIR, que estipula

um limite máximo de 25 a 30 minutos dependendo da agência. As agências que têm o menor tempo

de fila obtêm maior pontuação, já aquelas que ultrapassam este tempo estipulado são penalizadas.

10 Há necessidade de realização de jornada extraordinária para cumprimento das atividades não

respeitando o artigo 71 da CLT;

11 O controle da produção de todos os trabalhadores está informatizado através dos Programas de

Gerenciamento adotados pelo Banco, de modo que os erros ou equívocos, eventualmente,

cometidos, são apontados pelo sistema, bem como a produtividade e metas que devem ser

alcançadas;

12 As exigências de atendimento ao cliente presencial e telefônico, por vezes concomitante, podem

gerar conflitos de prioridade no atendimento e possíveis reclamações. Se tais reclamações chegarem

a ouvidoria do banco, os funcionários tem chance de defesa, porém, devem sempre retornar ao

reclamante (o cliente sempre tem razão), e atingem negativamente a agência na pontuação do AGIR;

13 Os programas gerenciais instituíram auditorias permanentes, o controle diário das vendas e

tentativas de “burlar o sistema” pelos atores envolvidos para alcançar as metas e manter o emprego.

14 Desconforto e comprometimento do funcionário quando da sua autoavaliação inserido no Programa

de Diálogo de Desenvolvimento para aperfeiçoar seu desempenho e potencial, inclusive discutindo

com seu gestor sobre suas atitudes. Neste programa o funcionário se responsabiliza pelo seu

crescimento profissional;

15 Verificamos que o Programa de Cultura de Performance enfatiza toda a responsabilidade dos

funcionários pelo bom relacionamento/conduta com o cliente;

16 Incorporação de tarefas aos cargos de caixas, gerentes operacionais, gerentes, assistentes de gerência

e agentes comerciais devido à extinção do cargo de CONEG na área operacional varejo gerando

sobrecarga de trabalho. Em algumas agências maiores um caixa está ajudando a realizar o serviço

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incorporado a sua rotina, mas como a sua funcional não permite o cadastramento de tudo,

inevitavelmente sobra para o Gerente Operacional;

17 Reclamação dos funcionários que tem como tarefa a liberação da porta de entrada quando trava para

o cliente. Estes não recebem treinamentos e nem orientação para saberem se a pessoa é perigosa e

também passam por muitos constrangimentos;

18 Falta de procedimento quando de trabalhos externos para capitalizar clientes. Geralmente saem as

ruas sem destino, em qualquer lugar em busca de novos clientes;

19 A reabilitação dos funcionários na prática não atende ao plano do banco que está no papel.

Acompanhamento do Sindicato nesta questão e depoimentos de bancários adoecidos relatam que as

indicações sobre restrições do próprio médico do trabalho do banco, em muitos casos são

desrespeitados nas agências, seja por falta de funcionários implicando em sobrecarga de trabalho,

seja por desconhecimento ou mesmo desrespeito dos gestores, seja pela própria função e infra-

estrutura do banco que em muitos casos não dialogam com estas restrições. Um exemplo são os

casos de LER/DORT, que na maioria atingem os caixas, onde a única alternativa é nas tarefas no

auto-atendimento (a função de assistente de auto-atendimento foi criado para atender estas

necessidades do banco para realocação destes trabalhadores adoecidos) ou na cobrança onde

praticamente não existe trabalho que não seja necessária a entrada de dados. Um dos relatos é o caso

de um trabalhador que retornou ao trabalho, após afastamento por problemas psíquicos, foi exposto

aos mesmos fatores que o adoeceram, ou seja, a sobrecarga de trabalho, cobranças excessivas e

muitas vezes, mais comum do que se pensa sofreu assédio moral. Os trabalhadores adoecidos são

discriminados, marginalizados pelos gestores e pelos próprios funcionários do banco. Outro

problema da reabilitação que foi averiguado, através dos relatos, é que os médicos do trabalho que

acompanham os funcionários em reabilitação desconhecem o ambiente de trabalho, pois quase

nunca comparecem neste local. São raros os casos relatados do comparecimento deste profissional

nas agências. Também foi verificado que o banco estipula seis meses de estabilidade para o

funcionário que voltou do INSS, porém deixa claro que o mesmo tem estes seis meses para se

readequar ao trabalho (pois não existe transferência) estipulando que de maneira crescente tem de

voltar a produtividade de antes, na maioria dos casos, o mesmo trabalho que o deixou com seqüelas.

20 O Programa de Oportunidade de Carreiras segundo relato de alguns bancários é um sistema

altamente burocrático e depende de “QI” (quem indica). Um dos dirigentes do Sindicato relata que

um dos maiores entraves deste sistema é que o funcionário só pode se inscrever no programa após

seis meses numa mesma lotação, com alto nível de transferências que o banco realiza, o funcionário

não tem quase chance. Outro motivo é que muito funcionários têm medo de se cadastrar neste portal

e o seu gestor achar que o mesmo está insatisfeito com o seu trabalho.

Vê-se claramente uma dinâmica funcional e perversa nestas relações de trabalho que

são precarizadas e desrespeitosas. A ênfase por metas e produtividade, a fiscalização arbitrária

do trabalho, o horário estendido não remunerado, dentre outros graves problemas denunciados

nessa pesquisa, demonstra o avesso dos direitos. Então, estamos falando da mesma instituição

que tenta vender a imagem de “Banco Mais Sustentável do Mundo”, de empresa preocupada

com o meio ambiente, com seus clientes e com o público interno? Sim, estamos.

Descortinar essas relações precarizadas e insustentáveis do Banco Itaú-Unibanco é

uma tarefa incansável dos/as trabalhadores/as. Há um grande paradoxo entre essas práticas

institucionais em relação ao trabalho e as campanhas de cunho ideológico que propagam uma

imagem institucional quase “maternal”97

e que tem um longo alcance nas mídias e redes

sociais, como a mais recente ideia lançada de “Banco Feito pra você”, dentre outras. Um

97

Historicamente, o uso dessa expressão remete ao cuidado, proteção, instintiva e natural da figura

materna/feminina/fêmea.

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banco que maltrata seus funcionários e “incita” indiretamente as vendas de forma

irresponsável, não pode ser um “banco feito pra você”.

O Itaú Unibanco ao contrário do que tenta afirmar como realidade acirra o

desenvolvimento insustentável, considerando a amplitude do conceito, a irresponsabilidade

social. É o que esses dados claramente nos indicam. Não temos conhecimento público

(comprovado) de financiamento de atividades produtivas que promovem destruição ambiental

por parte dessa instituição. No entanto, o Banco Itaú sofre acusações de financiamento de

projetos insustentáveis, principalmente pelos movimentos ecológicos brasileiros, como a

construção da Hidrelétrica de Belo Monte.

Temos conhecimento de que o Itaú Unibanco investe, implementa e apoia projetos

filantrópicos de cunho social, ambiental na lógica do investimento social privado e que de

alguma forma tem impactos sobre a vida de uma parcela da população que são beneficiárias

destes projetos.

No entanto, um banco que empreende relações de trabalho dessa ordem, denunciadas

pelos bancários a ele vinculados, necessita realizar ações de cunho socioambiental e divulgá-

las, bem como, através de um marketing poderoso, criar uma imagem social institucional que

o sustente e conquiste a confiança de seu público alvo. Mais do que uma ação filantrópica,

uma relação humanizada, podemos dizer que estas ações que remetem a iniciativas

sustentáveis focam o lucro como objetivo principal. Melhorar a imagem da empresa é certeza

da conquista de mais clientes e de respeitabilidade no mercado.

O Itaú Unibanco, diante do que a categoria bancária vinculada a esta empresa

denunciou, é mantenedor de relações de trabalho que são em nossa compreensão constitutivas

do próprio capital, por estarem baseadas na exploração, alienação e apropriação da mais-valia.

Observamos dos dados que trabalhamos, divulgados pela Confederação dos

Trabalhadores do Ramo Financeiro – CONTRAF, em associação com a Central Única dos

trabalhadores – CUT e o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos socioeconômicos

– DIEESE, relativos ao período que compreende desde o ano 2008 a 2013, que os lucros

exorbitantes dessa empresa, sobretudo nos últimos dez anos no Brasil, para além dos seus

negócios, revela a contradição que se manifesta no “descarte” dos seus trabalhadores/as.

Assim, o lucro obtido com demissões e as relações de trabalho precarizadas vivencidas

pelos funcionários/as passaram a ser um traço dessa poderosa instituição do setor financeiro

brasileiro, embora seja propagado um discurso ideológico de compromisso com o

Desenvolvimento Sustentável e de responsabilidade social.

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Todavia para nós não é surpresa que a sustentabilidade do Itaú Unibanco represente

um paradoxo, visto que no capital, as empresas não podem expressar nada mais do que seus

fundamentos estruturais. Portanto, todas as suas contradições.

É imperativo afirmarmos que a crítica que fazemos ao Banco Itaú é uma crítica a todas

as empresas “verdes” e que apresentam na sua missão institucional a responsabilidade social e

na realidade de suas ações imprimem práticas insustentáveis do ponto de vista socioambiental.

O nosso estudo, é, na verdade uma análise das estratégias da “Economia Verde” e sua

tentativa de “ecologização do capital”. Portanto, não assumimos na nossa pesquisa uma

crítica irresponsável e distorcida do real. O que fazemos é questionar e tornar visível o

paradoxo e o apelo ideológico que representa essa suposta inversão de valores que está na

ordem do dia no capitalismo contemporâneo. Ações que extrapolam as ações do Itaú-

Unibanco porque estão assentadas no processo de produção destrutiva do capital com todas as

suas engrenagens para acumular riquezas e produzir desigualdades.

Uma das principais ferramentas de ideologização da propagada sustentabilidade

empresarial, é o uso contínuo da propaganda que de tão “verdadeira” não se percebe a

ambivalência do discurso verde empresarial e que exerce uma influência decisiva nos

indivíduos sobre a sua responsabilidade na preservação ambiental. Esta última, uma

característica que remonta a influência do neoliberalismo sobre as relações sociais e que

entroniza e personifica a atitude proativa do indivíduo.

O novo discurso hegemônico da burguesia e do Estado que evocam o desenvolvimento

sustentável e a Economia Verde, também, colocam o mercado na suposta “vanguarda” do

enfrentamento da crise socioambiental no mundo para garantir que as empresas continuem a

lucrar, mesmo em uma ordem societária com intensa degradação socioambiental.

O que buscamos analisar na nossa pesquisa são as formas ideológicas utilizadas pelo

capital para se legitimar. Em diferentes estágios o capitalismo sempre operou suas

transformações nas relações de reprodução social e tentou superar e justificar suas crises,

ancorado em discursos ideológicos de progresso, desenvolvimento, sustentabilidade.

E o Itaú Unibanco, assim como todas as empresas ancoradas na lógica do mercado,

expressam com clareza as contradições estruturais do capitalismo, quais sejam: a

lucratividade como objetivo através da máxima exploração do trabalho98

, a apropriação da

mais-valia, por fim, o apelo ideológico que naturaliza as relações.

98

Embora seja do trabalho considerado improdutivo por na divisão sócio técnica do trabalho estabelecer uma

relação social (capital x trabalho) desvencilhada das atividades genuínas produtivas (transformação direta da

natureza, ex: produção industrial) (NETTO & BRAZ, 2007).

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Conforme Cesar (2008),

(...) a moderna responsabilidade social das empresas são formas “de

camuflar as novas estratégias de exploração, negando as contradições,

na medida em que a consciência e a sociabilidade que se constroem na

esfera da produção deslocam-se para a esfera da reprodução ou do

consumo (CESAR: 2012, p.30).

É assim que esse movimento amplo que podemos denominar de “Capitalismo Verde”

para nós expressa as contradições estruturais do sistema capitalista e uma perspectiva de

obscurecimento delas. Um novo discurso hegemônico paradoxal se consideradas as

determinações históricas da influência do capital para todas as dimensões da vida social e para

a natureza.

4.3. Reestruturação produtiva e o desemprego no setor bancário, entre precarização das

relações de trabalho e o fantasma das demissões.

O desemprego e a precarização das relações de trabalho no capitalismo tem relação

direta com as históricas determinações estruturais desse sistema e assume novos contornos a

partir das reconfigurações produtivas postas em movimento para recuperação de suas crises.

Desde a década de 1980 acompanhamos um movimento contínuo do capital de

reestruturação para o enfrentamento da crise de acumulação. Desdobram-se desse movimento

uma série de processos econômicos e políticos que refletem na totalidade da vida social. A

crise estrutural do capital que vem se revelando longeva, profunda e que não caracteriza as

crises cíclicas inerentes a esse modo de produção, vem espraiando consequências para todas

as dimensões da vida e denota a instabilidade desse sistema.

Percebemos um conjunto de mudanças que afetam o cenário internacional e nacional e

que para o “mundo do trabalho” refuncionaliza a relação social99

entre capital e trabalho.

A reestruturação produtiva que se iniciou em meados dos anos 1980, implicou para as

relações de trabalho um processo de flexibilização que transformou e/ou redimensionou os

problemas sociais enfrentados pela classe trabalhadora. A considerada Terceira Revolução

99

Conforme discutimos no capitulo 2.

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Industrial marcada pela tecnologia, dada pela mundialização do capital, tem um grande peso

na determinação dessa realidade.

O que chamamos de reestruturação produtiva engloba todos os processos de mudanças

na relação capital x trabalho geridas para resgatar o capital de suas crises e que tem

consequências para todo “mundo do trabalho” (STAMPA, 2012).

Ou seja, a reestruturação produtiva significa um processo amplo, político e econômico

que supõe o desenvolvimento de estratégias para recriação da valorização do capital e sua

dominação ideológica. As mudanças daí decorrentes vão caracterizar um capitalismo

contemporâneo cuja análise de seus fundamentos nos desafia pelas consequências complexas

que faz imperar. No entanto, de antemão podemos afirmar que o elo entre a conjuntura de

reestruturação produtiva e a crise contemporânea do capital com o desemprego estrutural é

fundamental (STAMPA, 2012).

Esse período passou a ser atravessado por privatizações e fusões de empresas, novas

formas de produzir mercadorias, por exigências de produtividade e rentabilidade, vem

reduzindo os postos de trabalho e ao mesmo tempo implicando um controle mais rígido do

desempenho do trabalhador. Assim, as terceirizações, precarização e flexibilização das

relações de trabalho, estão sintonizadas com esse movimento mais amplo da economia

mundial, onde as estratégias empresariais se redirecionam à criação de uma cultura do

trabalho adequada a produtividade, competitividade e maior lucratividade (AMARAL &

CESAR, 2009).

A ideologia do progresso, da capacidade do capital de resolver os problemas que

gerou, sejam eles de ordem econômica, social e/ou ambiental, parece sinalizar o objetivo de

reificar, universalizar as relações do capital e torná-las perenes, ainda que diante das

contradições que elas expressam. Ou seja, defender o capital como um modo de produção e de

relações sociais insuperáveis. Embora esse movimento de busca incessante por

autovalorização, superação de crise com o resgate a estabilidade na acumulação o capital,

tenha significado cada vez menos a recorrência à força de trabalho vivo, que ainda continua

sendo base para o processo de acumulação (AMARAL, 2012).

Confere ao capital a necessidade de articulação da ideologia que o sustenta para dar

materialidade às transformações pretendidas por suas elites para manutenção do status quo.

Ou seja, de estratégias de conformação que obscureçam suas relações.

Em relação às mudanças que vem ocorrendo em razão da reestruturação do capital,

para o “mundo do trabalho”, entram em cena, “modernas” formas de gestão que se apoiam

num discurso participativo e integrador, colaborativo da classe trabalhadora em relação ao

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capital que em verdade obscurece a realidade de exploração do trabalho ao difundir uma ideia

de parceria entre ambos. Mas, sobretudo, a ideia de cuidado com a classe trabalhadora e

respeito por suas demandas, quando a conjuntura demonstra o inverso disso ao tornar ainda

mais evidente a flexibilização e precarização das relações de trabalho (AMARAL, 2012)

Assim o capital passa a exigir um novo perfil de trabalhador. Aos trabalhadores é

transferida a responsabilidade por estarem atentos a essas transformações e responder a

contento. Isso significa total disponibilidade do trabalhador para o capital usufruir a seu estilo

de sua força de trabalho, cedendo a uma dinâmica de máxima exploração (AMARAL, 2012).

Essas tendências de alienação do trabalhador e máxima exploração são identificadas

nos dados que problematizamos sobre a realidade do Itaú Unibanco e se reiteram quando da

análise que trazemos sobre o setor bancário brasileiro e a relação com o desemprego

estrutural, que estabelece nexos com as transformações e mudanças econômicas e políticas

oriundas da reestruturação do capital.

Antes de tudo, é importante destacar as especificidades do setor financeiro no

capitalismo contemporâneo. Isto porque, o setor financeiro no capitalismo contemporâneo

assumiu a partir da reestruturação produtiva um papel de destaque quanto ao comando e a

distribuição da riqueza social. Estamos, portanto, diante de um novo patamar de acumulação

(SEGNINI, 1999).

Nesse sentido, o sistema financeiro passa por um processo de reordenamento constante

que implica na busca “pela proliferação, descentralização das atividades financeiras, criação

de novos instrumentos e mercados” (SEGNINI, 1999, p. 185). Segundo a autora, o sistema

financeiro vive um duplo papel, visto que, concomitante contribui para o processo de

reestruturação do capital, atravessa por transformações para se adequar a lógica neoliberal

(SEGNINI, 1999). Tornar-se competitivo e fazer parte do sistema financeiro internacional

movimenta os bancos para uma corrida desenfreada pela eficiência na gestão, que se traduza

em máxima produtividade e lucratividade. Entra em cena o papel das “inovações” onde a

tecnologia é parte constitutiva do processo, reordenando a relação capital e trabalho para o

setor.

Podemos considerar que a questão do desemprego no setor bancário está imbricada

pelo contexto de busca pela estabilização monetária, ampla concorrência interbancos e pela

informatização, sobretudo nessa conjuntura de crise estrutural do capital.

Acerca do emprego bancário no Brasil em 2011 a pesquisa feita em parceria entre a

Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro (CONTRAF/CUT) e o

Departamento Intersindical de Estatística e Estudos socioeconômicos – DIEESE, baseada em

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números do Cadastro Geral de Empregados (CAGED), constatava que de setembro a janeiro

de 2011 foram criados 18.167 postos de trabalho no setor bancário em todo o país. No

entanto, a geração desses empregos tem relação com a análise das 46.064 admissões e 27.897

desligamentos.

O setor bancário tem demitido seus funcionários mais antigos e com remunerações

mais altas e apostado na alta rotatividade e empregabilidade de jovens, minando a

possibilidade da carreira bancária e apostando nas contratações temporárias em detrimento de

concursos. Segundo essa pesquisa o CAGED registrou que o maior saldo registrado de

empregos gerados foi verificado entre os mais jovens totalizando, em 2011, 16.731 postos de

trabalho nas faixas entre 24 anos em relação a 6. 789 entre as faixas etárias de 25 a 39 anos

(CONTRAF/CUT: DIEESE, 2011).

A remuneração média de admitidos foi de R$ 2.487, 74 enquanto a dos desligados foi

de 4.041,64, resultado numa diferença média de remuneração entre admitidos e desligados de

38,45% (CONTRAF/CUT: DIEESE, 2011). Ou seja, os bancários de maior salário são

demitidos e novos trabalhadores assumem postos via contratações com remuneração inferior.

Na faixa etária que compreende a partir de 40 anos, registrou-se um saldo negativo

com o fechamento de 5. 311 postos de trabalho. Assim, à movimentação de pessoal no setor

bancário por faixa etária percebe-se que 20. 755 ou 45,06% dos admitidos tinham até 24 anos.

Entre os 46.064 bancários admitidos em 2011, 33. 832 que representa 73,45% tem até 29 anos

o que demonstra a preferência dos bancos pela admissão de trabalhadores jovens

vislumbrando o produtivismo, cortes de salários e a lucratividade (CONTRAF/CUT:

DIEESE, 2011).

No que diz respeito a faixa de remuneração entre janeiro de setembro de 2011 tiveram

saldo positivo as que circundavam em torno de até 3 salários mínimos e todas as faixas acima

disso tiveram saldo negativo de geração de empregos (CONTRAF/CUT; DIEESE, 2011).

No que concerne ao tempo de permanência no emprego em 2011, segundo o CAGED,

observou-se que 59,22% dos trabalhadores bancários eram demitidos antes de completarem 5

anos no emprego, acentuando ainda mais a percepção da alta rotatividade para o setor

(CONTRAF/CUT; DIEESE, 2011).

Em 2012, em relação ao período que compreende o mês de janeiro a setembro, quanto

ao perfil dos admitidos, o CAGED também registra a supervalorização da contratação de

trabalhadores mais jovens no setor bancário. Os dados reafirmam essa preferência nas faixas

etárias que se estendem até os 29 anos, onde ganham maior expressão pessoas entre 18 e 24

anos tendo como resultado para estes últimos um saldo de 9.022 empregos gerados. Para

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trabalhadores a partir de 30 anos o saldo seguiu negativo quanto à geração de novos

empregos. No entanto esses novos empregos referem-se à contratação de novos bancários pela

Caixa Econômica Federal que abriu 4.407 postos de trabalho, em detrimento dos demais

bancos (CONTRAF/CUT; DIEESE, 2012).

Outro dado que sem dúvida nos demonstra uma preocupação dos bancos quanto aos

cortes dos custos com a contratação de mão de obra mais qualificada é a ampla recorrência

aos trabalhadores com ensino médio completo e superior incompleto. Sendo que para os

trabalhadores com Ensino Superior Completo foram fechados 6.101 postos de trabalho

(CONTRAF/CUT; DIEESE, 2012). Isso não é um dado qualquer. O desemprego no passado

na realidade brasileira estava associado à desqualificação da mão de obra. Ou seja, em

decorrência da reestruturação produtiva e seus impactos para o setor bancário e demais setores

do capitalismo, conferiu-se uma nova dimensão aos problemas sociais no Brasil. Se trata do

desemprego que também atinge a mão de obra qualificada e especializada.

O neoliberalismo viabilizou uma análise que lhe é funcional em torno da relação entre

qualificação demandada pelo mercado capitalista pautado na tecnologia e o desemprego.

Transfere-se o peso para o trabalhador pelo não ingresso ao mercado de trabalho por

despreparo e desqualificação, na lógica neoliberal da meritocracia. O mercado capitalista,

supostamente, exige um trabalhador cada vez mais qualificado.

Em verdade, a tecnologia promoveu o processo inverso, ou seja, acirrou a

desqualificação dos profissionais. Em nossa análise, o mercado capitalista contemporâneo

desqualifica os trabalhadores ao submetê-los meramente a gerir e conferir o trabalho das

máquinas, ao demandar qualificações muito específicas em resposta às demandas tecnológicas

do mercado, pressionando um tipo de formação cada vez mais empobrecida para os Estados.

Além disso, percebe-se que o trabalho passou a ser rotineiro, explorador e não muito

provocativo do desenvolvimento da capacidade teleológica do trabalhador.

Existe um ponto nodal na problematização dessa questão que é consideração da crise

financeira de 2008. Havia um discurso anunciado por empresas e Estados de que o capital

conseguiria restaurar o equilíbrio monetário sem que isso implicasse em demissões em massa.

Os Estados demonstraram-se solícitos quanto a isso ao destinar recursos do fundo público

para cumprir esse objetivo e/ou ao implantar uma política fiscal diferenciada, reduzindo

impostos sobre os produtos industriais para fomentar o consumo, garantindo a circulação de

mercadoras. No entanto, nem isso foi capaz de evitar as tais demissões e o acirramento da

precarização das relações de trabalho, de perda de direitos do trabalho a duras penas

conquistados.

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Apesar de os Estados, em escala mundial, terem gasto cerca de 34

trilhões para salvar grandes empresas e bancos, tentando recompor a

economia quando as grandes corporações financeiras, comerciais e

industriais receberam um valor correspondente a três vezes o PIB da

América Latina em 2008, as condições de vida dos trabalhadores ao

redor do globo não melhoraram na mesma relação, nem se retirou do

horizonte da grande maioria dos trabalhadores dos países pobres as

ameaças de desemprego e miséria, que persistem e se agravam

(STAMPA: 2012).

Assim a manutenção dessas relações precárias, com as “modernas formas de gestão”

oriundas da reestruturação do capital, os trabalhadores são ludibriados com um discurso

ideológico “participativo”, “colaborativo” que tende a naturalizar sua exploração.

As empresas com um discurso de Responsabilidade Coorporativa quando afirmam

preocupar-se com o bem estar do trabalhador, dentro e fora do seu ambiente de trabalho,

assim como, ter um compromisso com criação de um ambiente de trabalho menos estressante,

que prime pela saúde do trabalhador, seja no que concerne à infraestrutura ou as relações, o

que chamam de “clima organizacional”, em verdade, tentam viabilizar a fluidez do trabalho

para máxima produtividade direcionada a lucratividade que objetivam.

Essa situação vivenciada pela classe trabalhadora brasileira e de outros países termina

por fragilizar as formas históricas de organização coletiva para reivindicação de suas

demandas.

Conforme discutiu Stampa (2012),

Retomando a questão das condições de vida e trabalho na sociedade

brasileira atual, observa-se que esse quadro afeta, gravemente, as

consequências subjetivas dos trabalhadores e se reflete na fragilização

dos laços sociais, rompendo com formas elementares de solidariedade

social e de ação coletiva. Diante de tal contexto, pode-se falar na

construção de uma nova sociabilidade. Contudo, tudo parece indicar

que, não obstante as dificuldades enfrentadas, os trabalhadores e suas

organizações – no caso desta análise, os sindicatos – continuam

atuantes, trazendo para o centro de suas lutas e do debate novas pautas

e formas de atuação (STAMPA, 2012, p. 39).

É nesse contexto que o processo de flexibilização das relações de trabalho, marcada

por desemprego, subcontratação e terceirizações, tem tido um peso importante no processo de

desmobilização das formas organizativas da classe trabalhadora, a exemplo do sindicalismo.

Elementos como desemprego estrutural e diversidade de situações de

trabalho têm modificado as bases da solidariedade sindical, trazendo

graves consequências para a organização da classe trabalhadora

(STAMPA, 2012, p. 38).

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Todavia, embora o contexto acarretado pela crise do capital tenha corroborado para

esse processo, podemos perceber que os sindicatos tem se desdobrado em meio a um contexto

adverso para unir forças ao enfrentamento das demandas da classe trabalhadora.

A luta principal tem sido pela própria permanência no mercado de trabalho em face

da forte política de demissões e rotatividade, sem obviamente relegar ao esquecimento a luta

por melhores condições de trabalho e de direitos a ele concernentes.

O fato é que os sindicatos tem buscado estabelecer alianças com movimentos sociais e

unido forças intercategorias, um exemplo muito concreto é a associação que vimos no tópico

anterior entre CONTRAF/CUT e a busca por alianças que transcendem as formas

organizativas do território nacional, uma vez que as instituições financeiras em virtude da

mundialização do capital são transnacionalizadas.

O que se observa é que os sindicatos se mantêm atuantes, e a novidade

recai na criação dessa articulação com os movimentos sociais, que se

dá de forma diferenciada. A esse despeito Rodrigues (2004, p.3)

chama a atenção para o fato de que há uma nova pauta sindical, onde

um dos temas cruciais é a manutenção do emprego, e outro, “a

capacidade de transitar com desenvoltura do interior da empresa à

comunidade, da sociedade civil às instituições políticas, enfim, do

local e/ou regional ao nacional e/ou global” (STAMPA, 2012, p.48).

Desse modo, tornou-se importante e estratégico a busca pela aliança da categoria e o

confronto da análise das demandas em comum, do resgate da solidariedade de classe que a

política neoliberal subsumiu ao individualismo. De forma alguma podemos assumir uma

postura acusativa, no sentido de analisar ser esse um processo de mero desinteresse da classe

trabalhadora, visto que não se pode perder de vista que a mesma tem atravessado tempos

difíceis quanto à questão das condições de vida e de trabalho. Mas a luta principal das formas

organizativas da classe trabalhadora não pode secundarizar o horizonte da construção de uma

nova sociabilidade.

A luta por melhores condições de trabalho, pela superação da crise ambiental e social,

deve ter como direção outra sociedade que se paute por valores e práticas emancipatórias,

efetivamente sustentável e anticapitalista.

Em suma, vimos ao longo desse capítulo as contradições que o Desenvolvimento

Sustentável na lógica do capital representa, mantendo estrategicamente um discurso

ideológico que tem sido recorrente, com o objetivo de garantir a manutenção da hegemonia do

capital. Assim, o conceito Desenvolvimento Sustentável e da Economia Verde que dele

deriva, não significam alternativas efetivas para superação da crise ambiental e das

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desigualdades sociais, uma vez que o sistema do capital é mantenedor da insustentabilidade

ambiental.

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155

5. CONCLUSÃO

Ao longo do nosso trabalho, nos esforçamos para cumprir o objetivo central da nossa

pesquisa de apreender as dimensões ideológicas e políticas do “Capitalismo Verde”,

enfatizando o paradoxo desse discurso, dadas as contradições estruturais do capital e

refletindo que a crise ambiental é consequente da ordem burguesa.

Problematizamos o entendimento hegemônico sobre o desenvolvimento sustentável

que atualmente se ampliou dando origem à “Economia Verde”. Ao analisa-los criticamente,

discutimos que ambos partem da premissa de que é possível, através de alguns ajustamentos,

perpetuar o mesmo sistema produtivo, comercial, financeiro e de consumo e, concomitante,

assegurar o bem estar dos seres humanos e promover a igualdade social, com redução dos

riscos ambientais de modo a evitar a escassez ecológica. Entretanto, sem considerar a

dimensão estrutural desses problemas, qual seja a relação histórica do capital com a natureza e

o ser humano, de exploração e exclusão.

A “Economia Verde” acirrou o processo de mercantilização e financeirização da

natureza, embora o conceito de Desenvolvimento Sustentável também o tenha feito, porque

apesar de incorporar debates importantes, surgiu em um contexto histórico que refletiu na

subsunção das políticas ambientais aos ajustes da economia neoliberal. Ou seja, os debates

sobre a política ambiental gravitam na lógica da racionalidade econômica.

Assim, a natureza passou a ser considerada um “ativo”, um investimento, fonte de

lucro. Criou-se um mercado “verde” ou “econegócio”, lucrativo e alvo de muito interesse

empresarial que retoma a propriedade do capital de mercantilizar a todas as coisas. Ou seja, o

capital articula uma visão de ecologização à sua “imagem e semelhança”. Trata-se de

negociar com preservação ambiental, ao quantifica-la, atribuir-lhe “preço”.

Nesse sentido, os investimentos são direcionados a natureza. Portanto, a Economia

Verde e financeirização se complementam, uma vez que correm na mesma direção, a

especulação sobre os bens da natureza com o fim último lucrativo.

No novo tempo no capital em que o mercado financeiro se fez centro no processo de

acumulação por apropriação da mais-valia, onde são sucessivas, longevas e ininterruptas suas

crises (agora de acumulação), a busca por possibilidades de investimentos para suprir os

interesses especulativos, diante da crise ambiental, suscitou às elites a perspectiva da

financeirização dos bens ambientais, da própria natureza. Trata-se de conferir “preço” e

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comercializar a natureza para lucrar, lucrar e lucrar. Portanto, de um processo de

financeirização dos bens ambientais.

As soluções técnicas empreendidas pelo capital e denominadas “verdes”, onde se

situam a criação das tecnologias consideradas “limpas”, significam mais apropriação

mercantil dos territórios e desdobram impactos ambientais e sociais destrutivos.

Nestes termos, o Desenvolvimento Sustentável, como expressão da

tentativa de estabelecer mecanismos de controle da relação

sociometabólica – via superação dos limites físicos e ideopolíticos à

sua reprodução – apresenta-se bastante restrito. A natureza técnica das

respostas empreendidas, ao não questionarem os fundamentos da

dilapidação ambiental, parecem reiterar a incapacidade de o sistema

do capital reconhecer fronteiras à sua expansão. Em outras palavras: o

Desenvolvimento Sustentável como alternativa ante a

incontrolabilidade do capital não se constitui em efetivo

enfrentamento da “questão ambiental”, apesar de que alguns avanços

tenham sido obtidos neste campo (SILVA, 2010, p. 227).

O discurso de compromisso sustentável esbarra com o objetivo central da máquina

capitalista, o lucro. O que se percebe sobremaneira é um esforço de indicar a incorporação de

princípios sustentáveis, ainda que submetidos na lógica mercantil, para o controle do

ordenamento social e legitimação da ordem vigente.

Apreendemos que as principais alternativas discutidas nesse sistema não dão

materialidade a soluções concretas à crise ambiental porque não vislumbram a ruptura

necessária com os fundamentos dessa sociabilidade. Não se opera uma fratura com os

fundamentos estruturais do capital de modo à efetivamente construir um projeto societário em

que a emancipação humana seja viável.

Dizemos isso, ao constatar que os níveis de degradação seguem se aprofundando, a

despeito dessas discussões e soluções técnicas, expressando a incapacidade de superação da

crise ambiental reforçando uma dinâmica mercantil e financeira insustentável, hora posta pelo

capital mundializado.

Convencionou-se difundir ideologicamente a posição de um “capitalismo verde” por

uma dinâmica de crise ambiental que dificulta ao capital “varrer a sujeira para debaixo do

tapete”, ou seja, ignorar suas expressões latentes.

Na lógica neoliberal percebemos o aprisionamento e a subsunção do Estado aos

interesses de uma classe específica. Os Governos têm seguido os postulados de concepções de

desenvolvimento que priorizam o mercado, organizando suas agendas políticas de modo a

cumprir seus objetivos, orientadas de perto por instituições multilaterais como o Banco

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157

Mundial. A particularidade do Brasil é um grande exemplo desse processo, conforme

discutimos no capítulo terceiro.

No Brasil, como observamos no resgate histórico que fizemos as políticas sociais ditas

para o enfrentamento das desigualdades sociais e proteção do meio ambiente, estão atreladas

ao mercado. As demandas da coletividade são subsumidas ao interesse lucrativo dos

mercados.

No plano ambiental no país, essas políticas tem significado o acirramento da máxima

exploração dos recursos da natureza, por atividades lucrativas que negligenciam quaisquer

que sejam os princípios sustentáveis.

A Responsabilidade Corporativa e Social, assimilada na modalidade de discurso, por

sua vez, é um conceito que é incompatível com as práticas denominadas “sustentáveis”,

conforme analisamos na particularidade do Itaú Unibanco.

A dinâmica dessa empresa assimilada à totalidade das relações capitalistas nos permite

compreender que o desemprego, a precarização das relações de trabalho em paradoxo com o

discurso de sustentabilidade redundam aos próprios ajustes e reordenamentos à superação da

crise estrutural. Ademais, que a ideologia do compromisso “verde” das empresas se associa

aos seus interesses lucrativos.

Na totalidade das relações empresariais com o meio ambiente e a sociedade o

descompromisso com o Desenvolvimento Sustentável é uma vertente absoluta. Entre a

preservação ambiental e o lucro, a escolha empresarial é sempre na direção deste último.

As empresas buscam o “jeito certo de lucrar”, fazem muito bem o “dever de casa”,

estudando o mercado, o novo perfil de clientes, são onipresentes – o que em tempo de redes

sociais é estratégico para expandir os negócios e atrair clientes e investimentos através de um

marketing eficiente. Estão atentas ao novo mercado ambiental que a partir da crise de 2008 se

colocou como um novo campo de investimentos e especulação, atrativo e lucrativo.

Sobretudo, as grandes corporações do ramo financeiro que gerenciam os negócios nesse

campo e tem obtido retorno em termos de lucros.

Portanto, os debates assumem uma dimensão ideológica que visa o obscurecimento

das relações genuínas do capital com a natureza e os seres humanos.

Neste sentido, o ideário do Desenvolvimento Sustentável – e a

unanimidade que suscita – revela seu caráter ideológico. A

subordinação às relações de propriedade burguesas se faz à custa de

um crescente distanciamento entre discurso e realidade: o apelo à

solidariedade, à justiça social, à utilização racional dos recursos

naturais e à preservação da natureza articula-se dialética e

contraditoriamente com o aprofundamento da devastação do planeta,

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com a crescente descartabilidade e com a degradação da vida humana,

apesar os inúmeros acordos e pactos internacionais firmados em nome

de uma ética ambiental abstrata (SILVA, 2010, p. 228).

Ao resgatar o surgimento histórico das preocupações ambientais, vimos que há muito,

elas fazem parte das denuncias de uma parcela de cientistas e intelectuais atentos e sensíveis

às consequências da produção capitalista para o meio ambiente.

Os movimentos ecológicos e sociais igualmente historicamente tencionam esse projeto

societário, discutindo e tornando visíveis os “bastidores do espetáculo do progresso e

modernização” que o capital fez imperar e o peso que as atividades que dão materialidade à

ela têm para configuração do desequilíbrio ambiental - ameaçador da biodiversidade –à saúde

e sobrevivência humana. Além disso, a faculdade do capital de se apropriar privadamente das

riquezas naturais e dos territórios, perseguindo as comunidades tradicionais100

e seus

conhecimentos milenares, sitiando-as e/ou excluindo-as, explorando a força de trabalho dos

indivíduos que as compõe com discurso “progresso inclusivo”, num processo de negação de

direitos basilares, amparados em lei. Absurdamente, com o suporte do Estado.

E esse esforço de ambos, historicamente, não ocorre isento da vigilância do capital

que se traduz em perseguições políticas e criminalização das formas organizativas e

reivindicatórias, para o sufocamento de ideias “ameaçadoras” do ordenamento social vigente.

Todavia o capital estrategicamente se apropriou/a das bandeiras dos movimentos ecológicos,

refuncionalizando e mercantilizando-as muitas vezes. O que significa o conceito de

desenvolvimento sustentável na lógica do mercado para além de um pacto internacional em

defesa do meio ambiente, se não um simulacro dessas bandeiras?

Igualmente, a despeito da crise ambiental, o capital por um longo tempo histórico

sequer demonstrou qualquer vinculo com a natureza (não que estruturalmente o possa fazer),

onde seguiu com a expansão sem limites e fronteiras para acumulação, mercantilizando-a e se

apropriando dos territórios de maneira sempre destrutiva. E a essa conversão da natureza em

mercadoria pelo capital se deve a existência da crise ambiental contemporânea.

Os padrões criados para elevação da capacidade produtiva do capital para alimentar o

consumismo, acirraram o processo de degradação e poluição ambientais que resultaram nas

crises climáticas de hoje, consideradas irreversíveis se perpetuados os atuais níveis de emissão

de gases de efeito estufa. Todavia, o capital tem transformado essa necessidade

100

Estas que às sociedades “modernas” representam um retrocesso, práticas rudimentares, tendo com parâmetro

os padrões tecnológicos e científicos que o desenvolvimento das forças produtivas alavancado por esse sistema

acarretou.

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socioambiental em mercadoria. Vimos o esforço internacional em consolidar e fortificar o

mercado de carbono. Não que a natureza o possa suportar!

Na contra corrente de qualquer dimensão de compromisso com a sustentabilidade, os

processos produtivos além dos impactos ao meio ambiente tem consequências à saúde

humana.

Nas cidades modernas do capital as paisagens são encobertas pelo cinza das cortinas

de fumaça oriundas da poluição industrial latente, o preto da fuligem e dos combustíveis

queimados, emanados por veículos automotivos, pelo colorido do lixo (residual, tóxico,

eletrônico, etc), com pouco ou sem nada do “verde”, do ecológico. Ambos, responsáveis pelo

lançamento de gases de efeito estufa.

Entretanto, o produtivismo voltado ao consumismo para lucratividade no capital, reina

soberano, ainda que todos esses aspetos signifiquem a destruição da natureza. Nestas mesmas

cidades, convivem riqueza e pobreza. Luxo e miséria.

O “capitalismo verde” representa a continuação do colonialismo pautado na violência

contra os povos indígenas, das comunidades tradicionais de uma forma ampla na medida em

que se apropria privadamente dos seus territórios para mover as atividades lucrativas

destrutivas ambiental e socialmente, expropriando-as.

Os postulados do “capitalismo verde” impulsionados pelos diversos setores

econômico-produtivos criam pelo poder econômico que tem e fácil reprodução e

disseminação ideológica, uma falsa consciência do que de fato é necessário para o alcance do

Desenvolvimento Sustentável. E isso tem acirrado ainda mais o processo de mercantilização

da natureza, num tempo histórico de crise ambiental que suscita a necessidade de

desmercantilizá-la. A natureza dever ser cuidada, preservada e não transformada em um

negócio.

Nesse sentido, a equidade na reapropriação da natureza não dever ser limitada a

resolver os conflitos ambientais por avaliações de custos e benefícios oriundos das atuais

formas de exploração e manejo dos seus recursos. Na perspectiva de Leff:

[...] a equidade não pode ser definida por um padrão homogêneo de

bem-estar; não depende apenas da repartição do acervo de recursos

disponíveis e da distribuição dos custos de contaminação do ambiente

global, os objetivos de equidade e de sustentabilidade implicam abolir

o domínio do mercado e do Estado sobre a autonomia dos povos,

gerando condições para a apropriação dos potenciais ecológicos de

cada região, mediados pelos valores culturais e pelos interesses sociais

de cada comunidade (2001, p.77)

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A crise ambiental contemporânea sinaliza a necessidade de mudança de rumo, de

inversão de valores e dos padrões produtivos, hora vigentes. Não apenas de forma

representativa, política e ideológica. Mas, estrutural.

Para tal, é fundamental a redefinição da relação do Estado com a sociedade de modo

que possa atender aos interesses coletivos e de fato comprometer-se com a preservação

ambiental, em detrimento de qualquer que seja o interesse lucrativo e privado.

Isto porque, no capitalismo contemporâneo as políticas, bem como, as verbas

públicas, conforme vimos, têm sido destinadas ao apoio de grandes empreendimentos,

privilegiando empresas e bancos, bem como, ao resgate do equilíbrio monetário. E,

geralmente, as políticas oferecem o aparato necessário para dar fluidez a mecanismos

desvencilhados de qualquer compromisso ambiental, como no caso do comércio de serviços

ambientais que resultam na mercantilização e financeirização da natureza.

Numa sociedade socialista ecológica, no nosso entendimento, os combustíveis fósseis

deveriam ser substituídos por energias limpas, em sua totalidade; a produção agrícola

preconizaria a organicidade em detrimento do agronegócio; a riqueza teria que ser socializada

de forma igualitária; não haveria a exploração do homem sobre o homem, com relações de

trabalho justas e valorativas; valorização do tempo livre; a produção relegaria ao

esquecimento a necessidade de mercados e assumiria um compromisso ético-ambiental

efetivo de modo a preservar o meio ambiente e sufocar qualquer interesse privado; a posse da

terra também não poderia ser privada; o Estado não responderia aos interesses de uma classe

específica, portanto não representaria aos interesses lucrativos restritos a ela, fazendo vista

grossa para qualquer atividade cuja intervenção ambiental fosse predatória, dentre outros

importantes aspectos.

Resta-nos unir forças à construção de novo projeto societário, socialista, que rompa os

pressupostos da sociedade de mercado, perseguindo e tencionando desde já seus fundamentos

econômicos, políticos, culturais e ideológicos. Reforçar a análise crítica do capitalismo verde

é acima de tudo assumir um compromisso político com essa construção, descortinando uma

condição sustentada na alienação, na exploração, exclusão e destruição.

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DOCUMENTOS CONSULTADOS/ANALISADOS:

Diretrizes para a vigilância do câncer relacionado ao trabalho. Ministério da Saúde – Instituto

Nacional de Câncer José de Alencar Gomes da Silva (INCA), Rio de Janeio, 2012.

Contribuição brasileira à Conferência Rio+20, 2012.

Relatório Anual Consolidado 2013 Itaú Unibanco Holding S.A.

Relatório do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente – PNUMA “Rumo a uma

Economia Verde, caminhos para o Desenvolvimento Sustentável e a Erradicação da Pobreza,

síntese para os tomadores de decisão, 2011.

Pesquisa de Emprego Bancário, Ano 3 – N, 11, novembro de 2011, do Departamento

Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos – DIEESE, Confederação dos

Trabalhadores do Ramo Financeiro – CONTRAF e Central Única dos Trabalhadores – CUT.

Pesquisa Desemprego Bancário, Número 15, dezembro de 2012, do Departamento

Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos – DIEESE, Confederação dos

Trabalhadores do Ramo Financeiro – CONTRAF e Central Única dos Trabalhadores – CUT.

Saldo de Empregos no Setor Bancário em 2013 – Análise do Cadastro Geral de Empregados e

Desempregados (Caged) do Ministério do Trabalho e Emprego do Departamento Intersindical

de Estatística e Estudos Socioeconômicos – DIEESE.

Pesquisa de Emprego Bancário (PEB), 2014, da Confederação Nacional dos Trabalhadores do

Ramo Financeiro (Contraf/CUT) em parceria com o Departamento Intersindical de Estatística

e Estudos Socioeconômicos (Dieese), com dados coletados com base em números do

Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), do Ministério do Trabalho e

Emprego (MTE).

OUTRAS FONTES

Publicação Nacional para bancários do Itaú Unibanco - ITAUNIDO / Abriu de 2013

CONTRAF/CUT.

Boletim Especial 06, novembro, 2011, Jornada Internacional de Luta, Comitê de Finanças da

CCSCS – UNI Américas Finanças – Jornada Internacional de Lutas cobra emprego decente

do Itaú – Rede Global Bancária.

Jornal da CONTRAF/CUT –Especial Itaú Unibanco dezembro de 2008 “Em defesa dos

empregos e direitos.

Itaú Unibanco fecha nove mil vagas em um ano, matéria de Raquel Landim do ESTADÃO,

agosto de 2012. Disponível em: http://exame.abril.com.br/negocios/noticias/itau-unibanco-

fecha-9-mil-vagas-em-um-ano/.

“Bancários Protestam contra demissões no Itaú Unibanco”, matéria da Redação do Brasil de

Fato, de junho de 2012. Disponível em: http://www.brasildefato.com.br/node/9795.

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“Bancos dizem que funcionários redundantes serão realocados, mas analistas acreditam que

haverá cortes.”, matéria de Francine de Lorenzo, Portal da Revista Exame, novembro de2008.

Análise das Condições de Trabalho da Área Comercial e operacional do Banco Itaú – Sheila

Roberta Nanci Mota, Engenheira de Segurança do Trabalho, janeiro de 2009, 34.p.

LINKS ÚTEIS DE SITES CONSULTADOS:

SITE:http://www.onu.org.br/a-onu-em-acao/a-onu-em-acao/a-onu-e-populacaomundial/

Acesso em: 24/09/2012.

SITE: http://g1.globo.com/mundo/noticia/2011/10/populacao-mundial-chega-7-bilhoes-de-

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01/05/2013

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SITE:(Artigo:*AmyraElKhalili )http://www.institutocarbonobrasil.org.br/artigos/noticia=7316

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SITE: http://www.brasildefato.com.br/node/9809. Acesso em: 01/10/2013. Artigo: Bevenuti

(13/06/2012).

SITE: http://www.onu.org.br/a-onu-em-acao/a-onu-e-o-meio-ambiente/.