moesch, marutschka - para além das disciplinas
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PARA ALÉM DAS DISCIPLINAS, O DESAFIO DO PRÓXIMO SÉCULO
Marutschka Moesch
As implicações epistemológicas para a construção de uma teoria do Turismo, sob uma
concepção interdisciplinar, requer a superação de paradigmas fossilizados em muitos
discursos acadêmicos, institucionais e profissionais. Revisitar as teorias do Turismo a partir
das novas práticas sociais deste fenômeno não é compromisso exclusivo dos pesquisadores
e educadores nos mais de trezentos cursos da área, no Brasil: esta preocupação
epistemológica deve recair, também, sobre consultores e políticos que atuam no setor, no
país e no exterior, cujos discursos eufemísticos apontam números grandiosos, sem se ater ao
papel dos SUJEITOS consumidores e produtores envolvidos. Uma epistemologia do
Turismo envolve cuidados teóricos, advindos de um entendimento complexo sobre uma
prática social que se dissemina de formas diferenciadas, a partir de subjetividades
infinitamente diversas e de vivências múltiplas dos SUJEITOs que as praticam, em um
mundo que se globaliza.
Os conceitos até agora registrados na literatura dita sobre uma teoria do Turismo, não
avançam na derrubada das barreiras impostas pelas primeiras análises, datadas no início
do século 20. O tráfego de pessoas e o movimento econômico, componentes de base
determinista, reproduzem-se diante dos índices exponenciais de crescimento do fenômeno
turístico mundial que, segundo dados da OMT (2000), girariam ao redor de 3,4% ao ano.
As análises com a definição e/ou categorização do que viria a ser o turismo de negócios e
de eventos , por exemplo, é um tema periférico no debate, apesar de serem estas a motivação,
cada vez mais crescente na última década, das viagens.
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A sociedade pós-moderna, plugada em redes, convive com formas de uso do TEMPO
liberado, das férias familiares - garantidas pelas leis trabalhistas aos cidadãos ainda
empregados - às novas experiências permitidas pela TECNOLOGIA, onde deslocamentos
no ESPAÇO e no TEMPO podem ser reais, mas também virtuais. A conjugação dos
TEMPOS vivenciais diferenciados, a espaços cada vez mais unos, favorecendo a
convivência física entre as pessoas e a vivência com intensidade das inter-relações, em
praias massificadas ou em bucólicos recantos rurais, requer novas reflexões e teorias
explicativas, para uma melhor atuação dos bacharéis em Turismo, no processo de
planejamento. As novas práticas turísticas requerem uma nova praxis turísticas.
A sociologia compreensiva auxilia no desvelamento deste caminho epistemológico. Autores
como Maffesoli, Lyotard, Baudrillard, Castells, Urry, Krippendorf e Molina contribuem, de
forma tangencial ou direta, para a compreensão da complexidade do Turismo: um
fenômeno marcadamente multisetorial em sua produção e interdisciplinar em sua teoria.
O PENSAMENTO CARTESIANO E O TURISMO
Construir um novo campo teórico para o Turismo requer um método que avance na
concepção do que seria conhecimento, ciência e teoria. O tratamento disciplinar que vem
sendo dado ao estudo do Turismo - e daí a dificuldade em sua superação - faz parte do
contexto da produção do conhecimento científico moderno. A disciplinaridade é
conseqüência do uso do paradigma analítico na construção dos saberes; até bem pouco
tempo, este paradigma era tido como único e incontestável.
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Este método divide problemas grandes ou complexos em partes, acreditando, assim,
diminuir sua complexidade ao diminuir a intensidade das informações e relações. O
problema maior é dividido em questões menores; repartindo-o em partes independentes,
acredita-se alcançar uma maior compreensão. Por quê? Porque resolver problemas, nesta
lógica, seria separar, solucionar os problemas de cada uma das parte ou setores e, assim,
capacitar o aluno a enfrentar um problema maior.
Não podemos negar que a ciência permitiu grandes avanços ao pensamento humano, devido
a essa abordagem analítica, chamada de cartesiana , por ter em Descartes um dos seus
principais teóricos. Hoje, o cartesianismo não dá conta, quanto se trata de uma maior
aproximação dos problemas sociais contemporâneos. Como afirma Edgar Morin (1998), a
racionalização originada na trindade técnica, ciência e razão - as quais já forneceram a luz
para esclarecer os caminhos do futuro - está equivocada, mutilada, por conter rupturas
internas. Hoje sabemos que a ciência produziu coisas boas e fecundas, mas também
permitiu que, pela primeira vez, a humanidade vislumbrasse a possibilidade da destruição
total do planeta, com a bomba atômica. Quer dizer, há problemas dentro da razão, como
afirma Morin (1998).
Os currículos universitários, na sua maioria, tratam o conhecimento numa abordagem
analítico cartesiana. Os alunos dos cursos de Turismo, por exemplo, têm disciplinas de
língua estrangeira, de Geografia, de Sociologia, de Fundamentos do Turismo e, em média,
trezentas horas de estágio "para ver como é a dinâmica do real", o chamado mercado de
trabalho. Quando muito, há o esforço de reunir estes conhecimentos, respeitando a
fronteira de cada disciplina, num Projeto Experimental, que buscaria relacionar teoria e
prática.
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O Turismo assim construído na cabeça do estudante é ora uma indústria, ora uma atividade
econômica do setor de serviços, ora uma empresa que precisa ser administrada (hotel,
agência, eventos), ou um campo para consultores em planejamento, que requereria um
perfil de empreendedorismo. Tamanha interdisciplinaridade, em geral, não leva a uma
compreensão que vá além de um rol de informações isoladas, formatadas nas diferentes
disciplinas, e que permita intervir num fenômeno que capitaliza insumos da natureza, da
cultura urbana e rural, transformando-os em bens sociais. O conhecimento turístico
compartimentado, acaba entregue a uma série de especialistas, técnicos treinados para
enfrentar problemas dividindo-os por regiões, segmentos, atividades, etc.
Sinto que está aqui o grande desafio do ensino e da pesquisa em Turismo. Como avançar
na sua compreensão relacionando as diferentes partes de sua constituição em um todo
orgânico? A realidade deste fenômeno, sua prática social, exige uma nova praxis , um novo
saber-fazer, com uma nova referência, conjugando objeto, teoria, método e a prática. Não se
trata de jogar fora o paradigma cartesiano, mas refletir sobre outras contribuições em nossas
práticas de conhecimento.
Seria injusto, se esta análise deixasse de citar os esforços de autores como Beni (1998), que
dá aos seus estudos uma abordagem sistêmica, na qual as partes são estudadas
profundamente em suas interações. O problema turístico é estudado em sistemas. Para
solucionar um problema no subsistema ecológico, por exemplo, procura-se equacioná-lo
nas suas muitas interações com os subsistemas econômico, social e cultural, demonstrando
sua complexidade. Há uma preocupação em resolver problemas maiores, através do estudo
das interações entre as partes.
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Segundo Arguello (1994), todas as partes do sistema interagem, sendo possível
desenvolver teorias a partir das suas interações. A interação seria mais do que buscar as
ciências isoladamente. Tratar-se-ia de estudar o fenômeno turístico segundo os sistemas em
que ele se insere e se constitui, numa complexa trama de elementos e interações. O sistema
turístico, assim entendido, é um sistema aberto, complexo, contrapondo-se a concepção
histórica sobre sistemas fechados, utilizados pelos físicos e biólogos. Para os físicos, tudo
iniciou muito certinho, simplificado, em um mundo que caminha para a desordem (máxima
entropia). Já para a Biologia, os organismos se formam organizadamente, dando a
impressão de caminham rumo a uma crescente organização. Tanto na concepção física
como a biologia dos sistemas abertos há necessidade de muita energia: eles interagem, eles
consomem energia, até atingir um certo equilíbrio, uma finalidade, uma complexidade
estável.
Morin (2000) discorre sobre o conceito organizador de caráter sistêmico, que permitiu
articular conhecimentos diversos (geográficos, geológicos, botânicos ), formando a ciência
ecológica, por exemplo, que pôde, a partir deste paradigma, não somente utilizar os serviços
das diferentes disciplinas, mas também criar cientistas policompetentes, com competência
nos problemas fundamentais desse tipo de organização. Entendo que processo análogo
deverá ocorrer com a produção do saber turístico, quando este fenômeno se globaliza e se
torna interesse de vários grupos sociais.
A INTERDISCIPLINARIDADE: UM CAMINHO A TRILHAR
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O conhecimento pertinente é aquele capaz de situar qualquer informação em seu contexto e,
se possível, no conjunto em que estiver inscrita, contextualizando e englobando. Criar uma
ciência do Turismo significa buscar dar conta da complexa multiplicidade do que é humano.
Segundo Morin (2000:115) "é preciso ecologizar as disciplinas, isso é, levar em conta o
que lhes é contextual, inclusive as condições culturais e sociais, ou seja, ver em que meio
nascem, levantam problemas, ficam esclerosadas e transformam-se". Quanto mais é
desenvolvida a inteligência geral, maior é a sua capacidade de tratar os problemas especiais.
Se já avançamos na construção de análises sistêmicas do Turismo, através da obra de Beni
(1998), por que não avançamos no caminho da construção de concepções teóricas que são
comuns ao sistema em geral, considerando todas as suas interações? Essas incertezas
avaliativas sobre a epistemologia a ser construída no campo turístico, faz lembrar uma
caricatura grega, citada por Arguello (1994), a qual adapto para esse estudo. Esta caricatura
dizia que Procusto, um SUJEITO que viveu na Grécia Antiga, tinha um critério para medir
as pessoas. Quando passava um viajante por sua região, ele o agarrava e o colocava sobre
seu leito. Depois de fixar ali o viajante, tratava de verificar se o fulano era maior ou menor
do que o leito. Se fosse menor, ele esticava, esticava até que os dois coincidissem. Quando
o viajante era maior do que o leito, ele cortava um pedaço das pernas, para, também nesse
caso, fazer coincidir os tamanhos. Isso era um critério, sem dúvida. Procusto estabelecia
padrões, mostrando um tipo de paradigma em que os fundamentos são impostos de fora
da essência do objeto.
Eu diria que, de certa forma, é isto que estamos fazendo no ensino e na pesquisa do
Turismo, quando adaptamos teorias e categorias existentes, conforme o interesse disciplinar
de cada área do conhecimento já preestabelecidas na academia. Analisamos a Geografia do
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Turismo, a Economia do Turismo, a Sociologia do Turismo, a Antropologia do Turismo, a
Administração do Turismo, etc., ao acúmulo de inúmeras informações para os alunos ou
conhecimentos estanques aos pesquisadores. Quando precisamos investigar o turismo rural,
ecológico, cultural, etc., cortamos analiticamente o corpo do viajante, conforme a caricatura
grega, ou o encompridamos para atender aos nossos limites e dúvidas teóricas, ou aos
esquemas explicativos e conceituais existentes.
"Devemos, pois, pensar o problema do ensino, considerando, por um lado, os efeitos cada
vez mais graves da compartimentação dos saberes e da incapacidade de articulá-los, uns aos
outros; por outro lado, considerando que a aptidão para contextualizar e integrar é uma
qualidade fundamental da mente humana, que precisa ser desenvolvida, e não atrofiada"
(Morin,2000:16).
O turismo é um fenômeno dinâmico, real, postulado no cotidiano de milhões de SUJEITOS
consumidores e produtores. O pós-turismo (Molina, 1998) requer novos esquemas
explicativos. Não será no isolamento disciplinar cartesiano que constituiremos um sistema
teórico comum. Nenhum esquema cognitivo, utilizado a partir das diferentes ciências que
compõe o conhecimento humano, é evidentemente redutível à outro. Entretanto, não estão,
apenas, nas ciências físicas e econômicas o pilar da edificação do conhecimento turístico,
pois este fenômeno surge em uma história da sociedade humana, como prática social.
"O grande problema, pois, é encontrar a difícil via de interlocução entre as ciências, que
têm, cada uma delas, não apenas sua linguagem própria, mas também conceitos
fundamentais que não podem ser transferidos de uma linguagem à outra" (Morin,2000:114).
Neste campo de debates epistemológicos, coloco a pesquisa realizada por ocasião da
dissertação de mestrado, publicada sob o título A produção do saber turístico , na qual
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procuro, na sua própria relativização e provisoriedade, romper com o isolamento disciplinar
na categorização do fenômeno turístico, a partir da análise dialética histórico estrutural. A
reflexão crítica proposta visa a determinação de um quadro teórico e, por isso, é mais
exigente na definição precisa dos níveis de análise, utilizando para tanto o recurso de
categorias e da construção de variáveis suscetíveis de observação rigorosa. Esse tipo de
estudo pressupõe a separação entre o acidental e o essencial. O paradigma cognitivo,
possibilitador desta separação, deve avançar à disciplinaridade cartesiana.
Assim, partilho as concepções de Morin (2000), quando define que interdisciplinaridade
pode significar também a troca e cooperação, o que faz com que possa vir ser alguma coisa
orgânica. Já a multidisciplinaridade constitui uma associação de disciplinas, por conta de
um projeto ou de um objeto que lhes sejam comum; as disciplinas são convocadas como
técnicos especializados para resolver tal ou qual problema. Na transdisciplinaridade tratam-
se, freqüentemente, de esquemas cognitivos que podem atravessar as disciplinas, às vezes
com tal virulência, que as deixam em transe. De fato, são os complexos de inter-multi-trans-
disciplinaridade que realizam e desempenham um fecundo papel na história das ciências.
A emergência de novas hipóteses explicativas me levaram a reconstruir o objeto do
Turismo através da articulação de diferentes domínios disciplinares, na busca da elaboração
de uma síntese teórica comum. No dizer de Morin (2000:113), "não é possível criar uma
ciência do homem que anule por si só a complexa multiplicidade do que é humano". O
exercício proposto não é o de reduzir uma ciência a outra, mas o de criar novos vasos
comunicantes entre ciências e disciplinas que se apropriam do fenômeno turístico, como
exemplos do real, simplificado-o, quando não "cortando ou espichando pernas", conforme o
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ensinamento grego. A exemplo disto temos definições caricaturais de turistas, Turismo,
segmento turístico, que pouco contribuem no entendimento da complexidade do real.
O real do Turismo é uma amálgama na qual TEMPO, ESPAÇO, DIVERSÃO, ECONOMIA,
TECNOLOGIA, IMAGINÁRIO, COMUNICAÇÃO, DIVERSÃO e IDEOLOGIA são partes de um
fenômeno PÓS-MODERNO, em que o protagonista é o SUJEITO, seja como produtor ou
consumidor da prática social turística. Não nego a contingência material do Turismo em sua
expressão econômica, mas ela ocorre historicamente, em ESPAÇOS e TEMPOs
diferenciados, cultural e tecnologicamente construídos, a serem irrigados com o desejo um
SUJEITO biológico. SUJEITO objetivado, fundamental para a compreensão do fenômeno
turístico como prática social, e subjetivado em IDEOLOGIAS, IMAGINÁRIOS e
necessidade de diversão, na busca do elo perdido entre prosa e poesia.
Avançar na construção de novas categorias para a análise do fenômeno turístico é o objetivo
perseguido num processo de investigação interdisciplinar. Mas, não bastaria aproximar as
diferentes áreas de experiência, se as mesmas não forem pertinentes entre si e em relação ao
objeto escolhido. Por isso, para análise, escolhi a perspectiva radical da dialética histórico-
estrutural (DHE), em que objetividade e subjetividade não estão separadas, complexizando
a reflexão teórica proposta. A realidade é entendida como uma criação dos SUJEITOS que,
com seus pensamentos, sentimentos e ações, transformam o mundo natural em cultura,
dando-lhe sentido.
Essa realidade sócio-cultural é entendida como uma totalidade: um todo integrado, em que
as partes - o ECONÔMICO, o ESPAÇO, o TEMPO, o TECNOLÓGICO, o SUJEITO, a
IDEOLOGIA, a DIVERSÃO, a COMUNICAÇÃO, o IMAGINÁRIO e a PÓS-
MODERNIDADE - não podem ser entendidos isoladamente, senão em sua relação com o
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conjunto. É uma totalidade vista não como soma aritmética das partes, mas como a
articulação interna de todas as múltiplas relações do fenômeno turístico. A possibilidade de
ressignificação destas categorias, bem como o desenvolvimento de nova concepção do
fenômeno turístico requer, por parte do pesquisador, uma postura interdisciplinar: "A
necessidade de interdisciplinaridade não provém apenas das deficiências do conhecimento
científico ou de organização histórica de seu fomento, mas sobretudo da realidade como tal"
(Demo, 1997:10).
Não caberia apenas justapor conhecimentos, mas de integrá-los num sentido único, na
complexidade do fenômeno estudado. Reconstruir uma compreensão do real. O real é uma
totalidades transdisciplinar, e só é apreendido em retotalizações.
CATEGORIZAÇÃO DIALÉTICA HISTÓRICO-ESTRUTURAL DO FENÔMENO TURÍSTICO:
UMA POSSIBILIDADE ALÉM DAS DISCIPLINAS
A exigência de um tratamento interdisciplinar do Turismo origina-se na realidade de sua
prática histórica e da sociedade PÓS-MODERNA, onde o ECONÔMICO e
TECNOLÓGICO, de forma simbiótica, são resultantes das necessidades subjetivas do
IMAGINÁRIO, da DIVERSÃO, da COMUNICAÇÃO e da IDEOLOGIA, criados pelos
SUJEITOS e por eles consumidos, no afã de re-ligar o mundo objetivo e subjetivo,
perpetuado, ao consumo de bens. Re-ligar significa a recuperação do poder mítico da
religião, daquilo que re-liga , liga, num sentido amplo.
O esfacelamento e o mosaico das práticas turísticas - turismo de negócios, eventos, lazer,
ecológico, rural, etc. - faz um apelo à apresentação que "reforma laboriosamente à própria
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coisa" (Maffesoli, 1996), à necessidade de contemplação, permitindo apreender a
multiplicidade dos sentidos de um mesmo objeto, seus ritmos variados, numa palavra, toda
a sua concretude. O Turismo de aventura, por exemplo, aproxima as pessoas da beleza
indomada e da força do mundo animal - real, IMAGINÁRIO ou extinto. Expressa-se na
publicidade um conjunto de elementos, objetivos/subjetivos, diversos, que estabelecem
entre si interações constantes, feitas de agressividade ou/e de amabilidade, mas que não
deixam de ser uma totalidade específica que é preciso levar em conta. Para Maffesoli
(1996), esta seria categoria da PÓS-MODERNIDADE. É uma "colcha de retalhos".
O turista, ao experimentar a sensação de um safari, onde os animais que passeiam pela
savana são tão próximos que quase podem ser tocados, vivencia uma DIVERSÃO. Mas,
lado a lado dessa DIVERSÃO, subjetiva, afetiva, lúdica, tecnológica, há um processo de
desqualificação, numa cooperação ofensiva/defensiva sempre eficaz (Morin, 1996). Um
descompromissado e divertido safari realizado no parque temático Animal Kingdom, da
Disneylandia, por exemplo, mascara um processo de desterritorialização, não só do
ESPAÇO e da cultura originária da África, mas do âmago do SUJEITO, o seu próprio medo
da vida selvagem. Há uma superioridade hegeliana, da idéia absoluta nesta IDEOLOGIA
transportada por esta experiência lúdica(MARU: ISTO AQUI ME PARECE
COMPLICADO PARA NOSSO PUBLICO MEDIO, TANTO DE ALUNOS COMO
PROFESSORES) : a natureza, encarnada nas formações materiais e nas coisas, refletindo a
forma física que lhe é estranha, sem espiritualidade, regressando, definitivamente, para si,
transformando-se em espírito absoluto.
A COMUNICAÇÃO, na forma promocional, comercial ou de marketing turístico, jorra
concepções superiores sobre a própria criação, intitulando-as como obras artísticas. As
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formações materiais, criadas e recriadas pelos homens, repletas de IMAGINÁRIO,
construindo uma espiritualidade - daí a sensação de onipresença do "criador", da origem,
junto aos complexos turísticos criados, a recriação do paraíso bíblico.
A TECNOLOGIA, utilizada no entretenimento e no setor de serviços (transporte, hotéis,
eventos), aplicada ao IMAGINÁRIO, gera no SUJEITO consumidor (turistas) e reprodutor
(agentes, hoteleiros, organizadores de eventos, turismólogos) toda a DIVERSÃO possível
de existir, ou, pressupostamente, possível de ser criada pelo homem. Todos sentem-se
repletos de criação; mesmo que o consumo seja ao máximo interativo, esta vivência já
permite substituir o processo de criação. O "Eu", moderno, torna-se a tribo Pós-moderna.
A categoria ECONOMIA, como apresentada por Castells (1997), na análise do fenômeno
turístico, não se aplica apenas ao macro, mas na esfera do micro, dos SUJEITOs
consumidores. O consumo possibilitado pelo Turismo torna-se simbólico, há a fascinação
pelos bens de consumo produzidos nos parques, resort ou em singelos souvenirs . As coisas
- produtos e serviços - adquirem poderes sobre os seres humanos, que não têm a ver com
sua necessidade palpável, mas nas projeções entre o humano e o produto. Este possui uma
série de atributos e características que queremos ter, nele inserem-se valores, afetos, crenças
que, ao serem consumidos, agregam-se ao SUJEITO.
A dimensão efetiva do fenômeno turístico, ECONÔMICA E TECNOLÓGICA, não pode
ser analisada isoladamente; as dimensões reais e as idéias são constituintes, relacionais, da
forma do objeto em questão. Assim, devemos trazer à luz da interpretação a relação do
ECONÔMICO-TECNOLÓGICO, com o IMAGINÁRIO, tão presente na representação
turística.
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O Turismo deixa de ser um ato de hospitalidade e de integração, passando a englobar o
movimento da indústria cultural globalizada, enquanto ato de consumo e absorção de um
entretenimento. A IDEOLOGIA presente estabelece um desejo universal de bem estar e
prazer, tão bem reproduzido através do marketing turístico, aliado ao processo de
globalização econômico, tendo como berço os Estados Unidos e a sua hegemonia neoliberal,
como instrumento de reprodução capitalística e modelo homogeinizador de padrões de
qualidade de serviços e produtos.
Condensações instantâneas, tão frágeis, disseminadas pela multimídia de forma global, são
objetos de forte envolvimento emocional, permitindo ultrapassar o princípio da
individuação. Elas requerem, simultaneamente, reproduzir ESPAÇOS e TEMPOS
diferenciados, de uma forma redundante, em que realidades históricas conhecidas desvelam
-se em (re)nascimentos. É no seio dos destinos turísticos que podem ocorrer essas
condensações instantâneas , tão frágeis, mas que, no momento, são objeto de forte
envolvimento emocional. É este aspecto seqüencial que permite falar da ultrapassagem do
princípio da individuação diante do testemunho coletivo.
A lógica da identificação substitui a lógica da identidade, que prevaleceu durante toda a
Modernidade, desmanchada pela concepção de TEMPO, ESPAÇO, IMAGINÁRIO e
TECNOLOGIA. Enquanto a identidade repousa sobre a existência de indivíduos autônomos
e senhores de sua ação, a globalização econômica e a mundialização cultural estabelecem
uma lógica de identificação ao por em cena pessoas de máscaras variáveis, tributárias do
"eu" dos sistemas emblemáticos. O objeto tem pouca importância, o essencial é o ambiente
mágico que agrega, a adesão que suscita.
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O Turismo representa, na reconstituição da prosa e da poesia, o aparato da geração de mais
conhecimento e processamento da informação/comunicação, em um círculo
retroalimentativo e cumulativo entre a inovação e seus usos (Castells, 1997). O ESPAÇO,
reinventado, é um produto material, aí incluídas as pessoas que o demarcam. É o suporte
material de práticas que dividem o TEMPO. O convite ao turista, para viajar no TEMPO,
faz parte de práticas simultâneas de noção de contiguidade/proximidade, não se baseando,
necessariamente, na contiguidade física.
Tanto o ESPAÇO como o TEMPO têm sido transformados sob o efeito combinado do
paradigma da TECNOLOGIA da informação e das formas e processos sociais induzidos
pelo processo histórico. Uma nova lógica espacial substitui a história da experiência
comum e da cultura: o ESPAÇO de múltiplos lugares, uma integração de cada região numa
conexão interdependente da globalização.
Castells (1997) corrobora essa análise quando suas hipóteses permitem entender a
complexidade da reprodução realizada nos parques temáticos, por exemplo. Uma
descompromissada reprodução se faz, o estético sobrepondo-se ao ético. Cientes disso, seus
produtores tentam dar moralidade a posição utilizando - ou alegando utilizar - práticas de
conservadorismo ecológico ou cultural nos projetos dos parques. A historicidade, de forma
estática e tipificada, é capturada tecnologicamente e reproduzida nos mundos
IMAGINÁRIOS e perfeitos de possibilidades ilimitadas pela multimídia.
O sistema de COMUNICAÇÃO gera a virtualidade real, na qual a existência concreta,
material e simbólica das gentes, é submersa em um cenário de imagens virtuais, em mundos
de fantasia, nos quais as aparências não estão somente nas telas, mas se transformam na
experiência em si, a ser "vivida". O que caracteriza este sistema, baseado na integração
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multimídia e interconectado de múltiplos modos de COMUNICAÇÃO, é a sua capacidade
de incluir e abarcar todas as expressões culturais, onde toda a classe de mensagem funciona
de um modo binário: presença/ausência no sistema de COMUNICAÇÃO multimídia. A
invariante ESPAÇO permanece dentro do âmago do Turismo, mas não enquanto
descontinuidade. O novo ESPAÇO de visitação, de testemunho, não incorre em necessidade
de translado físico e temporal real.
O desenraizar da experiência da história e da cultura como transferência de significado está
levando à generalização de uma arquitetura ahistórica e acultural. Ao mesmo TEMPO, a
arquitetura significativa, que trata de apresentar uma mensagem muito definida ou
expressar de forma direta os códigos de uma cultura determinada, é demasiado primitiva
para ser capaz de penetrar no saturado IMAGINÁRIO contemporâneo. O significado de sua
mensagem se perderá na cultura do mosaico que caracteriza nossa conduta simbólica.
Um lugar enquanto localidade cuja forma, função e significado estão constituídos dentro
das fronteiras de uma continuidade física, é subvertido na relação entre o Espaço dos fluxos
e o Espaço dos fixos. Essa esquizofrenia estrutural entre as duas lógicas espaciais, ameaça
romper a COMUNICAÇÃO social, pois o Espaço de fluxos é interconectado e ahistórico,
pretendendo impor sua lógica sobre lugares dispersos e segmentados, cada vez menos
relacionados entre si e incapazes de compartilhar códigos culturais diferenciados. Os
parques temáticos parecem estar reproduzindo esta esquizofrenia.
As coisas andam em ESPAÇOS paralelos em diferentes dimensões e não confluindo. Este
ESPAÇO, reconstruído, é a expressão social, é a sociedade mesma, é o suporte material de
práticas sociais que dividem o TEMPO.
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Nessa perspectiva, as várias modulações da aparência (moda, espetáculo, teatralidade,
publicidade, mídia) formam um conjunto significativo. Aqui, se substância a necessidade de
reflexão sobre a forma do fenômeno turístico, não para tipificá-la nem absolutizá-la, mas
para, através da Dialética, desvelar sua essência, sua invariante. A forma é uma matriz que
preside o nascimento, o desenvolvimento e a morte dos diversos elementos constitutivos do
objeto. "A forma é formadora" (Maffesoli, 1996:126). As novas práticas expressam uma
nova forma do Turismo, tanto na forma espacial como temporal, ressignificando as
categorias de TEMPO e de ESPAÇO, até então utilizadas em seu entendimento.
O novo ESPAÇO representa os fluxos e os cruzamentos entre a TECNOLOGIA e a
ECONOMIA globalizada, na qual o SUJEITO - o turista - através da COMUNICAÇÃO,
transfigurada numa nova prática social, transpira novas necessidades, o desenvolvimento do
IMAGINÁRIO e o gosto pela DIVERSÃO. TEMPO de fruição não mais linear, dependente
de relógio mecânica ou eletronicamente administrados. A prosaica divisão moderna entre o
TEMPO, necessário e produtivo, e o TEMPO livre, de lazer, se devanesse diante do
TEMPO da fruição atemporal.
A cultura do sentimento é conseqüência da atração, esta motivada pela similitude, que está
contida na ecologia da ação. O SUJEITO não só é homo sapiens , mas também homo
demens . Esta re-ligação, na análise complexa dos SUJEITOS, permite avançar na
perspectiva do pensar em conjunto e em interação, e não mais em exclusão, determinismo e
autonomia.
Os seres auto-organizadores - seres vivos, segundo Morin (1995) - são sistemas fechados
(protegem a integridade e identidade) e abertos sobre seu meio ambiente, de onde tiram
matéria, energia, informação e organização. São seres auto-eco-organizadores, cuja auto-
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eco-organização se realiza por computação e comunicação da informação. A sua autonomia
depende não só de seu meio, mas, também, de seu patrimônio genético. A base do
desenvolvimento da liberdade humana é a autonomia de decisão e de escolha, só emergível
da auto-eco-organização antroposocial. Esse SUJEITO, produtor e reprodutor de
IMAGINÁRIO, é um ser auto-eco-organizador, capaz de analisar situações concretas para
estabelecer projetos de comportamento, e de decidir, entre eles, os qual atingirá o SUJEITO
consumidor-turista.
Quem são esses SUJEITOS, produtores e consumidores do Turismo? SUJEITOs históricos
ou atomizados? SUJEITOS submetidos a uma obediência interior, moderna/racional, que
agem motivado por um interesse comum, comunitário? Ou SUJEITOS que têm
predominância aos interesses individuais, onde a aproximação é calculada por interesses
distintos, presos a ilusões?
A escolha do destino turístico, por parte do SUJEITO consumidor, é uma opção pela
diversidade existente, mas não sobre sua criação. Esta criação faz parte do modelo, forjado,
interdisciplinarmente, desvelador de mais uma complexidade do fenômeno turístico. O
lúdico, presente nos modelos forjados, estiliza a existência ao fazer ressaltar as
características essenciais desta. O estar-junto é fundamental, espontaneidade vital que
assegura as culturas a sua força e solidez específicas; com o tempo, esta espontaneidade
pode até se artificializar, apropriada em obras como os parques temáticos.
Para apreciar as novas orientações (ou re-orientações), devemos retornar à forma pura que é
o estar-juntos à toa , um elemento revelador para os novos modos de Turismo pois, o que
propicia este estar juntos à toa, é a perspectiva orgânica dos grupos, trazendo à luz a lógica
da atração social . Constrói-se uma rede que liga o SUJEITO produtor ao grupo produtor e
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reprodutor, e ao SUJEITO consumidor. Essa ligação não tem a rigidez dos modos de
organização que conhecemos. Remete antes a uma ambiência, a um estado de espírito ou a
um estilos de vida que privilegia a aparência e a forma , ou seja, a cultura turística.
Urry (1996) denomina TEMPO glacial a uma noção em que a relação entre seres e natureza
é longa e evolutiva. A diferenciação conflitiva do TEMPO, entendida como um impacto dos
interesses sociais opostos sobre a seqüência dos fenômenos, retrocede da história humana
imediata e avança para um futuro, completamente inespecificado. Os visitantes, ao
participam de fictícias construções de túneis do TEMPO, em espaços culturais de base
histórica, convivem com uma imagem de eternidade, na possibilidade de animar a vida
passada , de negar a morte.
O presenteísmo (Maffesoli:1996), característica da pós-modernidade, permite a
revalorização do senso comum: o sensível é a condição. Daí a tônica atual sobre a
experiência a estética, o tribalismo, hedonismo, culto dos objetos e o narcisismo coletivo. O
senso comum dos 657 milhões de turistas que, segundo a OMT (2000), viajaram pelo
mundo em 1999, optaram por uma transfiguração, também poética do Turismo. Parques
temáticos, resorts, clusters espalharam-se por lugares paradisíacos do planeta, atendendo a
diferenciados segmentos de SUJEITOS consumidores.
A revolução tecnológica da informação mudou as organizações e incentivou o seu
crescimento; a sua produtividade passa pela competência global na busca de consumidores.
Abrir novos mercados, vinculando-se a uma rede global com segmentos em cada país, só é
possível pela espetacular capacidade de Comunicação, hoje, exercida pelas empresas.
(Castells, 1997). O consumo, por sua vez, se desdobra para além do real, no consumo
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simbólico, realimentado pelas lojas de souveniers, estrategicamente, situada no final de
cada atrativo, onde ao produto vendido agrega-se o sonhado.
O sentimento tribal, outra característica da pós-modernidade (Maffesoli, 1998), é
desenvolvido pelas organizações turísticas, desde a escolha do destino, quando o turista já
se sente parte desse mundo mágico, através da rede de Comunicação montada via Internet
(sites hotéis, agências de viagens e de localidades) ou via programas de televisão,
reportagens de jornais e revistas, vídeos promocionais, folheterias e relatos de outros
turistas. A informação corre o mundo globalizado. A Comunicação realizada pelas
companhias de turismo carrega microvalores éticos, religiosos, culturais, sexuais,
produtivos, que se entrecruzam com os desejos de cada SUJEITO consumidor - turista.
Na COMUNICAÇÃO turística é importante confirmar o sentimento de participar de um
grupo mais amplo, do sair de si e participar de um espaço multicultural, cujo objetivo, antes
de tudo, é o de realimentar a própria COMUNICAÇÃO e uma atitude crítica ligada a uma
orientação instrumental, mecanicista e operacional de sociedade.
A conceituação do turista, o seu entendimento, a sua segmentação visa atender aos seus
mais recônditos sonhos e ilusões. Do universo particular, busca-se a total publicação. Pólos
de atração do IMAGINÁRIO coletivo, tanto do ponto de vista existencial, quanto
econômico são disponibilizados, de forma democrática ao consumidor. O que dá sentido ao
mosaico, existente na estética dos destinos turísticos.
Viajar passou a ser um signo. Diversão garantida e presença do novo. A emoção coletiva é
alcançada num movimento de ações/retroações, em que reconhecer o signo permite
reconhecer os outros, e assim reconhecer o que me une aos outros que ali estão em seu
TEMPO de férias. Num processo de massificação constante, operam-se condensações
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barrocas, através de sucessivas sedimentações, constituímos a ambiência estética das
condensações instantâneas tão frágeis, são objeto de forte envolvimento emocional,
organizam-se tribos mais ou menos efêmeras que comungam valores minúsculos, e que, em
um balé sem fim, entrechocam-se, atraem-se, repelem-se numa constelação de contornos
difusos e perfeitamente fluidos. Essa fusão determina uma nova forma de solidariedade nas
sociedades complexas, este princípio seqüencial que permite falar da ultrapassagem do
princípio de individuação. Compulsão coletiva é o único valor da Pós-modernidade.
(Maffesoli, 1998:107)
O marketing turístico não basta para justificar as loucuras das multidões estivais (TEMPO
de fortalecer), nem reduzi-los a chavões de uma escala de irracionalismo; segundo
Maffesoli (1996), em cada destino turísticos massivos, parece confrontar-se um verdadeiro
impulso instintivo, que incita a reunião por toda e qualquer razão, importando apenas, afinal,
o ambiente afetivo no qual cada um está imerso. A ética que agrega o grupo, torna-se
estética, emoção comum e vice-versa. O espetáculo generaliza-se e o espectador pede bis :
eis, aí, definida a área do lúdico, a repetição como totem em torno do qual nos agregamos.
Induz-se uma cultura, ou seja, uma maneira de ser específica, que permite integrar o uso dos
prazeres na compreensão da vida social. O TEMPO de Turismo é um dos TEMPOs desta
fruição. E ela só é total, quando realizada num grande espetáculo estético, de forma
presenteísta.
Os sonhos de humanidade perderam o realismo das grandes utopias sociais; o
desengajamento político, a saturação das grandes idéias longínquas, a fraqueza de uma
moral universal indicam o nascimento de uma nova cultura em que pressupostos não-
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racionais são incorporados a vida corrente diária. No Turismo, a nova concretização de
sonhos e Imaginários, e destes novos pressupostos.
As formas de Turismo (aventura, ecológico, rural, cultural, etc...) representam esta nova
estética pós-moderna, em que o turista não é reduzido a espectador alienado e passivo, mas
figurante ativo a desfrutar da magia produzida, reconhecendo-se em outrem, a partir de
outrem. Pode haver, neste processo, uma Comunicação que tenha por objetivo apenas
tomar o outro, entrar em contato, o participar junto como uma forma de gregarismo.
O Turismo de grupos, de massa como é chamado comumente, é criticado por representar
esse gregarismo, visto sob os olhos da teoria crítica, como um movimento de alienação e
consumismo cultural. Esse paradigma não atende à complexidade do fenômeno turístico da
atualidade, ao reduzir 657 milhões de turistas a uma massa alienada de consumidores.
A Comunicação tátil (Maffesoli, 1996) como categoria de análise nos permite avançar
diante da limitação da teoria crítica. Se a Comunicação ocorre num ambiente abrangente,
que tende a uniformização da maneira de pensar, gesticular e vestir, há «algo mais que se
reencontra nesses deslocamentos dementes que são as viagens de férias, que se reencontra
nessas promiscuidades obscenas, que são as praias estivais, os pontos turísticos, as
diversões, reuniões, festivais, carnavais. Cada uma dessas reuniões pode ser concebida
como um momento de um sacrifício: vai-se "matar o TEMPO", ou seja, vai-se vencer o
tédio, a produção e o TEMPO, racionalmente, organizado não são mais aquilo a partir do
que tudo se determina, mas, antes, essa necessidade, o "amark é", trágico, que se vai,
pontual e ritualmente, sacrificar nos bacanais que se conhecem » (Maffesoli, 1996:65).
Na pós-modernidade abandona-se uma lógica da representação, para entrar na da percepção.
Trata-se de um estilo que não é mais egocêntrico, mas que se situa em um contexto
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interlocutivo comum. "Comunicar é servir-se daquilo que se tem em comum" (Maffesoli,
1996:82). E esse sentimento comum é reproduzido pelos mecanismos de reprodução do
Turismo.
O estado prosaico do fenômeno turístico, que responde à situação utilitária e funcional do
agente de viagem, se mistura ao poético, forjado pela motivação de viagem do turista, que
só se manifesta, como tal, em relação ao estado prosaico. O costume é uma das modulações
particulares da Comunicação, o mundo expresso tal qual é, o dado social com que cada
visitante, estruturalmente, se envolverá. O envolvimento orgânico de uns com os outros, é
estabelecido no próprio processo de venda do produto turístico.
A civilização ocidental moderna separou a prosa e poesia. Rarefez, em parte, e esvaziou as
festas em proveito do lazer, noção-sacola que cada um preenche como puder. A vida de
trabalho e a vida econômica foram invadidas pela prosa (lógica do ganho da rentabilidade, e
etc.); a poesia refugiou-se na vida privada, de lazer e de férias, e teve seus
desenvolvimentos próprios com os amores, os jogos, os esportes, os filmes e,
evidentemente, a literatura e a poesia propriamente ditas. (Morin, 1995:178)
A Comunicação, predominante no fenômeno turístico, visa tocar o outro , favorecer o
contato com o outro, seja direta ou indiretamente. Comunicação relativista que, junto a sua
desconceptualização, favorece a relação entre os SUJEITOS produtor, reprodutor e
consumidor. O que era estranho, diferenciado, pertencente a outra cultura, a outro Espaço e
TEMPO, passa a ser compreendido em seus dois aspectos, natural e cultural, pela
Comunicação tátil estabelecida.
O prazer vivenciado nas férias pode ser vivido como um modo de apropriar-se do mundo,
em oposição às doutrinas ascéticas, para as quais ele só pode ser medido pela produção. O
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que corresponde a ultrapassar a distinção estrita entre o prazer e a ação, ou entre a estética e
a moral, distinção que engendrou os diversos imperativos axiológicos que se conhecem. O
Turismo carrega, enquanto processo humano, a possibilidade de liberação deste imperativo
capitalista-calvinista, que coloca o não-trabalho e o ócio como vergonhas do homo
economicus .
A vivência lúdica realiza uma utopia atemporal, ao colocar todos os acontecimentos,
passados ou futuros, sob palcos simultâneos, onde o espetáculo da variedade é muito mais
importante do que o discurso da personalidade científico-política, misturando,
inexoravelmente, todas as seqüências.
O apelo da unicidade, nas atividades turísticas propostas para as férias em família, a
exemplo dos os parques temáticos Disney's, é uma constante pois crianças e adultos
poderão vivenciar os mesmos sentimentos. Todo o complexo é vendido como Espaço
atemporal de Diversão, informação, educação, congrassamento. Formatos de valorização do
sensível, da Comunicação tátil, da emoção coletiva, tornando-se uma ética, um desejo de
estar junto, de fazer parte da tribo Disney (Maffesoli, 1996).
Vivência turística, que expressa uma emoção coletiva, constituindo uma verdadeira
"neutralidade subterrânea", um imprevisível querer viver. "A partir do momento em que o
progresso não é mais considerado um imperativo categórico, a existência social é devolvida
a si própria" (Maffesoli, 1996:27). Quando o mundo é devolvido a si mesmo, pois a
divindade não é mais una, se acentua o que nos liga aos outros: a re-ligação.
Os grandes precursores dos empreendimentos turísticos atuais, pretendiam ir além do
IMAGINÁRIO. A realidade virtual do IMAGINÁRIO está em via de se apoderar de todo o
universo real, para integrá-lo em seu universo de síntese sob a forma de um imenso show de
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realidades, em que a própria realidade é o espetáculo - o próprio real se torna um grande
parque de diversões.
A episteme moderna, que tanto postulou a separação da natureza e cultura, é colocada em
suspensão. Contemporaneamente, a partir da fragilidade dos meta-discursos científicos,
convivemos com a ultrapassagem desta restrita separação. Em resumo, a relação como o
ambiente social está, indissoluvelmente, ligada ao que nos remete aos ambientes naturais.
"Inúmeras são os domínios onde uma tal "ecologização" do mundo é evidente seja na
maneira (e na matéria) de vestir, de se alimentar, no que diz à qualidade de vida, sem
esquecer as filosofias e outros modos de produzir, a natureza não é mais apenas objeto a
explorar, mas torna-se parceira obrigatória (Maffesoli, 1996). Poderíamos incluir na citação
do autor o domínio do lazer e do Turismo ecológico, tão apreciado pelos turistas da
atualidade.
O Turismo de massa, ao contrário, favorece a metonímia, os detalhes espaciais, flagrados na
pose fotográfica, com sua visibilidade demonstrativa aparentemente, autêntica ou nos
cartões postais que destacam a referência do detalhe arquitetônico, o monumento, a praça, o
"áxis mundi ". Para o produtor de Turismo de massa, a parte vale pelo todo e é suficiente
para despertar sonhos, lembranças, nostalgias e, sobretudo, o grande fator do mercado, a
necessidade de repetir a experiência. Este é o círculo do deslocamento espacial, produzido,
simbolicamente, pelo Turismo de massa.
Ao participar, no sentido místico do termo, deste ou daquele "tipo" de Turismo - ecoturismo,
cultural, lazer -, permite que o turista seja tipificado em alocêntrico, messocêntrico,
psicocêntrico, nômade, explorador, peregrino, existencial, recreacionista, de elite, entre
outros, escolhendo-se aquele que melhor represente esse "tipo". Cada um, entretanto, se
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integra em um conjunto que lhe permite, ao mesmo TEMPO, viver seu TEMPO livre e
entrar em correspondência com os outros.
A tentativa aqui proposta foi de iniciar um processo de desvelamento epistemológico do
objeto turístico. Na proposição de novas categorias de análise visei fundamentar um corpo
de conhecimentos com entidade particular, mas resguardando a complexidade das relações
práticas que o Turismo constitui, transpondo o objeto até então percebido. A análise das
múltiplas dimensões do fenômeno turístico (econômica, social, subjetiva, tecnológica,
temporal, espacial, etc.) é um caso fecundo de hibridização disciplinar, pois permite o
encontro de novas hipóteses e esquemas cognitivos, levando a articulações, organizadoras
ou estruturais, entre categorias isoladas, possibilitando conceber a unidade do que pareceia
fragmentado.
O olhar interdisciplinar, que possibilita a troca e cooperação, possibilita a organicidade,
estabelecendo pontos entre ciências e disciplinas não comunicantes que, através do
fenômeno turístico, são ultrapassadas e conservadas, apontando a permanente incompletude
do processo de investigação teórico, desafio posto para os SUJEITOs implicados numa
concepção de sustentabilidade prática e teórica para o turismo do próximo milênio.
BIBLIOGRAFIA:
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para a ciência, para a educação, para o trabalho sindical, Petrópolis, RJ, Vozes,1994BENI, Mário C. Análise Estrutural do Turismo. São Paulo, SENAC,1998
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Red.,v.12,Madrid:Alianza,1997
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____________________.O TEMPO das Tribos- o declínio do individualismo nas
sociedades de massa.RJ,Forense,1998
MOLINA