livro catálogo ficÇÕes
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Catálogo da mostra "FICÇÕES" com curadoria de Daniela Name apresentada na CAIXA Cultural Rio de Janeiro de 11/07/2015 a 06/09/2015. Projeto e Produção: ADUPLA - Anderson Eleotério. Patrocínio: Caixa Econômica Federal.TRANSCRIPT
curadoria: Daniela Name
Adriana VarejãoAlessandro SartoreAna MiguelAndrey ZignnattoAyrson HeráclitoBarrãoDaniel LannesDelson Uchôa@DesdicionárioElisa CastroGuilherme DableIsmael MonticelliJosé RufinoJozias BenedictoJulia DebasseLia ChaiaLourival CuquinhaLuiz ZerbiniMarcelo MoschetaMarilá DardotMarcone MoreiraMarcos ChavesMario GrisolliMayana RedinNazarenoNino CaisPedro VarelaRaquel StolfReginaldo PereiraRosana RicaldeRosângela RennóVirginia de MedeirosVítor Mizael
FICÇÕES
11 de julho de 2015 a 06 de setembro de 2015
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FICÇÕESCuradoria: Daniela Name11 de julho de 2015 a 06 de setembro de 2015
CAIXA Cultural Rio de Janeiro - Galeria 3Av. Almirante Barroso, 25 - CentroRio de Janeiro - RJ CEP: 20031-003Tel.: (21) 3980-3815
FICÇÕES Ficções. Curadoria e Textos: Daniela Name; versão para o inglês: Julia Borja. Rio de Janeiro, CAIXA Cultural / ADUPLA, 2015. 96 p. Il. color. 20,5cm
ISBN 978-85-64507-15-9
Catálogo da exposição FICÇÕES, realizada na CAIXA Cultural Rio de Janeiro, de 11 de julho a 06 de setembro de 2015.
1. Exposições. 2. Arte Brasileira - Séc. XXI. 3. Name, DanielaI. CAIXA Cultural Rio de Janeiro. II. Título.
Alvará de Funcionamento da CAIXA Cultural RJ: nº 041667, de 31/03/2009, sem vencimento.
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A CAIXA é uma empresa pública brasileira que prima pelo respeito à diversidade,
e mantém comitês internos atuantes para promover entre os seus empregados
campanhas, programas e ações voltados para disseminar ideias, conhecimentos
e atitudes de respeito e tolerância à diversidade de gênero, raça, opção sexual
e todas as demais diferenças que caracterizam a sociedade.
Reconhecida como uma das principais patrocinadoras da cultura brasileira,
destina, anualmente, mais de R$ 80 milhões de seu orçamento para patrocínio
a projetos culturais selecionados via edital público, uma opção da CAIXA para
tornar mais democrática e acessível a participação de produtores e artistas
de todas as unidades da federação, e mais transparente para a sociedade o
investimento dos recursos da empresa em patrocínio.
Patrocinar a exposição Ficções é exaltar a pluralidade da arte contemporânea
brasileira com os olhos voltados para sua relação com outras linguagens, em
especial com o universo discursivo da literatura. A exposição ganha ainda
maior relevância quando se pensa que ela é composta por alguns dos maiores
artistas contemporâneos em atividade no país, apresentando um panorama
de qualidade da produção artística nacional.
Desta maneira, a CAIXA contribui para promover e difundir a cultura nacional e
retribui à sociedade brasileira a confiança e o apoio recebidos ao longo de sua
secular atuação e de efetiva parceira no desenvolvimento das nossas cidades.
Para a CAIXA, a vida pede mais que um banco. Pede investimento e participação
efetiva no presente, compromisso com o futuro do país, e criatividade para
conquistar os melhores resultados para o povo brasileiro.
CAIXA ECONÔMICA FEDERAL
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Antes de uma exposição, existem as obras de arte.
textos de Daniela Name
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Antes de uma exposição, existem as obras de arte.
textos de Daniela Name
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ADRIANA VAREJÃO
Canibal e nostálgica é um autorretrato de Adriana Varejão, mas também uma
síntese possível para seu trabalho: pintar as feridas da História e das histórias de
nossa identidade brasileira, latina, colonizada e tropical tem sido um dos motores
da obra da artista. A antropófaga que lança ao mar sanguíneas mensagens na
garrafa talvez tente promover o retorno de parte do corpo deglutido ao seu
lugar de origem. A chegada dos europeus ao chamado Novo Mundo fez com que
as terras dos mares do Sul se transformassem no maior destino do imaginário
ocidental. O mar, chamado de Calunga Grande pelos escravos africanos, se
transformou no território fluido para imagens e culturas em trânsito, que se
violentavam e se fecundavam reciprocamente. Ao tatuar o corpo com desenhos
de azulejos e de motivos tribais, a artista revisita um aspecto importante de
sua trajetória – o tratamento da pintura como pele e como carne – e evidencia
as cicatrizes simbólicas de nossa mestiçagem.
Se em Canibal e nostálgica Varejão lançava mensagens ao mar, como quem
faz uma pergunta, nas fotos Castelinho de areia e Castelo da Sereia, as ondas
podem estar entregando as garrafas, criando possibilidades de resposta. A
Sereia que encalha na areia, oferenda vinda do reino das águas, lembra uma
pérola imperfeita e estranha, eco de alteridade barroca, herança artística mais
do que marcante no caminho da artista. Se o Barroco é o berço da alegoria, o
Barroco brasileiro é a alegoria da alegoria: uma resposta híbrida, corrompida e
mulata àquilo que já é outro de si mesmo. A Sereia que sai de seus domínios,
sujeitando o castelo à força da água, mostra que, na obra de Varejão, o mar
sempre foi metáfora para a descoberta, o naufrágio e a vertigem das imagens.
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Canibal e nostálgica, 1998Fotografia digitalizada, 43,3 x 34 cmAcervo da artista, Rio de JaneiroCopyright: Adriana Varejão
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Castelinho de areia, 2012Fotografia digitalizada, 29 x 48 cmAcervo da artista, Rio de JaneiroCopyright: Adriana Varejão e Murillo Meirelles
Castelo da sereia, 2013Fotografia digitalizada, 40 x 40 cm
Acervo da artista, Rio de JaneiroCopyright: Adriana Varejão e Murillo Meirelles
ADRIANA VAREJÃO e MURILLO MEIRELLES
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Escoras barrocas, 2009-2015Instalação site-specific, dimensões variáveis
Escoras metálicas, tinta automotiva, MDF, tinta acrílicaAcervo do artista, Rio de Janeiro
ALESSANDRO SARTORE
O projeto site-specific de suas Escoras barrocas se relaciona diretamente com
a arquitetura do espaço da Caixa, que foi parcialmente transformada para
abrigar o trabalho. A ideia de uma escora barroca, que é puro adorno, já que
não tem de fato a função de escorar o prédio, abre a possibilidade para que se
pense o ornamento como abrigo do desejo. Com a inclusão de algo teoricamente
inútil na funcionalidade arquitetônica, é como se a fantasia pudesse amparar e
sustentar a razão, como se o ouro pudesse fazer brilhar um mundo opaco, em
frangalhos. Ao optar pelo dourado, Sartore acessa toda a carga simbólica que
a cor tem na história da arte, criando ainda hiatos e suspensões nos ambientes
com os quais dialoga com sua intervenção.
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I love you, v.2000Tecido, lã, dentes, cera rosa, mecanismos variados140 x 180 x 300 cm (M.O.I.)Acervo da artista, Rio de Janeiro
As f lores também ficam instáveis e podem ferir, 2000Tecido, metal, alf inetes, mecanismo de corda (M.O.I., com 3 f lores)Acervo da artista, Rio de Janeiro
ANA MIGUEL
Ancorado por I love you, o conjunto de trabalhos que Ana Miguel apresenta em
Ficções evidencia sua capacidade para rearranjar funções e embaralhar o jogo
de forças contido nos objetos e nas imagens. A artista desmonta brinquedos
eletrônicos e de corda, reinventando seus movimentos e sons. Macula o universo
infantil e o território das trocas afetivas com uma atmosfera de estranheza
e de alguma dor. Mas há também um quê de jardim das delícias na instalação,
que convida o visitante a entrar em estado de pausa, como se fosse possível
um oásis em que a miragem é a não-imagem. Deitado no colchão, ouvindo o “I
love you” sussurado pelas almofadas, esse observador permite que seu corpo
repouse das informações que recebeu antes. Ele pode então, quem sabe, tecer
novos sentidos, enquanto acompanha os dedinhos-aranha se movimentando
na teia acima de sua cabeça.
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ANDREY ZIGNNATTO
Com Erosões, escultura monumental criada para se adequar aos espaços onde
é apresentada, Andrey Zignnatto destaca características importantes para a
compreensão do seu trabalho. Ao fazer do tijolo sua principal matéria-prima, o
artista paulista escolheu um caminho que poderia levá-lo a ser apenas mais um a se
aproximar de uma temática urbana e de certo “ready made da desconstrução”. Mas a
singularidade de sua abordagem e do uso que faz do material tem dado ao trabalho
de Zignnatto a distinção que ele merece. Na obra do artista, o tijolo ultrapassa a
discussão sobre a cidade, se transformando em passaporte para a dicotomia entre
a maleabilidade do gesto – impressão do corpo na matéria – e a dureza que vem
da argila trabalhada pelo fogo. Outro bom duelo apresentado pelo artista é o que
contrapõe o bloco monolítico criado com tijolos, quase pedra bruta, ao baixo relevo das
erosões, que têm fatura de equação matemática e memória de um desenho digital.
Erosões, 2013Blocos estruturais de cerâmica cortados e agrupados60 x 300 x 350 cmAcervo do artista, São Paulo
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AYRSON HERÁCLITO
Buruburu é o nome que faz referência à pipoca, que nos ritos afro-brasileiros é
a comida dedicada ao orixá Omulú. Ele cuida dos descarregos e protege contra
as doenças. No candomblé, há a crença de que nada é mais certeiro para zerar
as demandas, limpar a alma e proteger o corpo do que se banhar nas “flores do
velho”, isto é, em uma porção generosa de pipoca. Os mitos africanos mostram a
força da oralidade nas nações arrancadas de seus territórios de origem e trazidas
para o Brasil, mas que ainda assim preservaram sua cultura pelo poder imantado
daquilo que é falado e cantado. Nesse vídeo exibido em dois canais, a tela da
esquerda mostra o milho explodindo na panela e se transformando em flor aberta,
alimento de corpo e de alma; ao lado, um homem negro se banha na pipoca, com
clara comunicação entre as duas telas. Estar diante de Buruburu é participar, ainda
que involuntariamente, deste banho reenergizante, comunhão entre o concreto
e o invisível: a escala monumental e a direção absolutamente frontal propostas
por Heráclito fazem com que o homem que se banha também veja quem o vê.
Estamos no espelho daquilo que também somos, do lugar de onde também viemos.
Buruburu, 2010Vídeo, 2’27”
Acervo do artista, Salvador
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BARRÃO
Varapau reúne duas colunas criadas com coloridos pés de pias de banheiro.
A alegoria, a apropriação, o humor e a aproximação de um repertório
popular vêm sendo características sempre renovadas na obra do artista.
Nesta obra não é diferente: a louça hidráulica que a constitui tem cores
que foram moda nos anos 1970, mas até hoje permanecem decorando os
banheiros dos botecos cariocas e das residências dos subúrbios do Rio.
Os tons terrosos e vegetais transformam a matéria-prima industrial, que poderia
ser entendida de forma redutora como ready made, em escultura que alude
ao natural. Há, no trabalho de Barrão, os vestígios de uma floresta tropical.
É como se Varapau apresentasse os troncos arrastados pelas águas que um
dia fluíram pelo material que os estrutura.
Varapau, 2014 Porcelana e resina epóxi, 268 x 38 x 40 cmAcervo do artista e Galeria Fortes Vilaça, São Paulo
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Aguero, 2014 Porcelana e resina epóxi, 13 x 11,5 x 49 cmAcervo do artista e Galeria Fortes Vilaça, São Paulo
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Feita de canecas de cerveja usadas em festas e eventos, Aguero apresenta
um jogo recorrente na obra de Barrão, em que o elemento que constitui
a escultura alude à sua antiga função ao ser deslocado de contexto.
As canecas anamórficas que se serviam de chope em serpentinas e barris
agora são fragmentadas e ressignificadas, transformando-se numa fonte,
da qual o que jorra é a imaginação daqueles que olham para o trabalho.
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DANIEL LANNES
A Centaura de Daniel Lannes é como uma aparição. Tronco de uma dama que
parece ter vindo de uma pintura de costumes, traseiro não de uma potranca,
como se imaginaria pelo título alusivo à mitologia clássica; ao menos não de
potranca literal. As nádegas da Centaura são de uma popozuda do funk, de
um destaque de escola de samba ou, para aqueles que têm esta memória, de
uma antiga Chacrete. No corpo aparentemente desconjuntado dessa musa,
duas partes que são domadas e vertidas em objeto, duas metades prontas
para consumo – no salão e no quarto, na Corte e no populacho. Há certa
crueldade desconcertante nesta fêmea à Frankenstein, feita de mutilações,
pronta para engolir e ser engolida. Mas há também o corpo da própria pintura
buscando dar unidade intermitente e cobrindo de graça essa figura partida.
Centaura, 2014Óleo sobre linho, 160 x 140 cm
Coleção particular, Rio de Janeiro
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Killing Lions, 2014Óleo sobre linho, 90 x 120 cmColeção Vera Holtz, São Paulo
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Com Killing lions, Lannes evidencia a relação de seu trabalho com a história da
arte, nesta obra, em especial, com as cenas épicas da pintura do século XIX.
Mas o artista também reforça a abordagem subversiva que faz destes que foram
“grandes temas” para seus antepassados. Envolvidos por uma tempestade
cinzenta, frágeis em um canto da tela, dois homens se enfrentam em uma
luta. Citando cenas acadêmicas sobre índios, Lannes põe dois lutadores de
MMA em confronto. Esses gladiadores contemporâneos são um o leão do outro,
mas o irônico é que não parece haver possibilidade de vitória para nenhum
dos lados da arena. O cinza talvez engula tudo.
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DELSON UCHÔA
As três fotos do artista em Ficções mostram seu Bicho-da-seda visitando a paisagem
do Rio São Francisco. Uchôa se apropria de guarda-chuvas vindos da China e cria
com eles muitas formas – esferas, cata-ventos, flores e mandalas – tingindo a
paisagem com as tonalidades vibrantes do tecido sintético. Além do jogo da cor
com a luz, o trabalho explora imagens em trânsito, já que flores e animais da
caatinga do Nordeste estão impressos nas sombrinhas. Essas imagens vão para
a Ásia, viram tecido, forram o esqueleto metálico e atravessam o mundo até voltar
ao Brasil. Uchôa atualiza as rotas iconográficas que marcam a história da arte no
Brasil desde sempre – um exemplo é Aleijadinho, que fez da louça da Companhia
das Índias que chegava a Vila Rica vinda de Macau a sua maior biblioteca de imagens.
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Bicho-da-Seda (São Francisco l), 2012Fotografia digital, 100 x 70 cmAcervo do artista, Maceió
Bicho-da-Seda (São Francisco ll), 2012Fotografia digital, 100 x 70 cmAcervo do artista, Maceió
Bicho-da-Seda (São Francisco lll), 2012Fotografia digital, 100 x 70 cmAcervo do artista, Maceió
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Além de exibir três fotos, o artista também criou uma intervenção no espaço
da Caixa e apresentou, na abertura da mostra, uma performance da série
Bicho-da-seda. Ao desmontar os guarda-chuvas, criando com eles uma espécie
de tapete feito de círculos – que se relacionam com a escada em caracol do
prédio – Delson nos lembra que a seda sintética é também cor e pigmento.
O tecido pode ser a tinta do pintor que, no entanto, não usa um pigmento
inocente: provavelmente produzidos com trabalho escravo ou mal remunerado,
os guarda-chuvas são uma engrenagem cruel da globalização. Ao se apropriar
destes produtos, Uchôa os anima – no sentido mais amplo que o verbo pode ter.
Enche-os de humor, de história e dos movimentos do corpo, pura dança. Assim
subverte, ainda que simbolicamente, a carga pesada que vem da matéria-prima.
Bicho-da-sedaObjeto / instalação, dimensões variáveis
Acervo do artista, Maceió
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@DESDICIONÁRIO
Daniela Belmiro é a criadora do @Desdicionário, plataforma poética com a qual
vem atuando em redes sociais como o Facebook e o Instagram. Sem preocupações
com periodicidade ou com o seguimento de uma ordem alfabética, o perfil cria
novas versões para verbetes já existentes em qualquer exemplar do “Aurélio”
ou do “Houaiss” – e ao chamar os dicionários pelos nomes de quem os criou
vemos a importância que existe no uso de cada palavra. Falar é tomar posse
do mundo. Entender o que os outros falam também o é, na medida em que,
teoricamente, o discurso se constrói a partir de um acordo sobre associações
entre nomes e coisas. O @Desdicionário perturba essa ressonância, incluindo
estados subjetivos e efêmeros na definição de cada palavra. “Chorar”, por
exemplo, pode ser “não caber em si”. Alice já sabia disso: mesmo antes de chegar
ao País das Maravilhas, precisou nadar numa lagoa de lágrimas ao crescer além
da conta depois de beber de certo vidrinho. Às vezes a alma fica grande demais
para o mesmo corpo; às vezes os sentidos não cabem mais no antigo nome.
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ELISA CASTRO
A agenda de encontros de Elisa Castro é uma história em curso, cuja coautoria é
oferecida aos visitantes da exposição. A artista disponibiliza uma agenda com datas
em que está totalmente disponível para encontros reais, no lugar escolhido pela
pessoa. Nos primeiros dias com Ficções aberta ao público, já havia convite para
almoços, cafés e até para uma viagem para Cuba (com direito ao número do bilhete
de seu interlocutor, para que a artista pudesse se localizar no aeroporto). Propostas
mais poéticas não ficam de fora, como aquela que sugere: “Encontre-me aqui 2h
da manhã da semana passada para falar mais sobre viagem no tempo”. E não é
também para esta possibilidade que este trabalho aponta? Em uma época de fluxo
contínuo, sem qualquer aderência nas relações interpessoais, Eu Você propõe que
criemos derrames e diques no ritmo non stop da virtualidade, para que se possa
viajar na construção de um espaço-tempo de troca de experiências e de afeto.
Eu/Você – Agenda de encontros, 2015Performance / intervençãoAcervo da artista, Rio de Janeiro
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GUILHERME DABLE
As duas aquarelas Shelterruin/Ruínaabrigo foram criadas originalmente para uma
exposição em Londres, onde foram instaladas no lugar dos capachos da galeria.
As padronagens copiadas dos desenhos de William Morris para os mais famosos
papéis de parede britânicos foram cobertas por uma superfície de acrílico vazado,
reproduzindo uma invenção arquitetônica brasileira: o desenho dos tijolos conhecidos
como cobogós. O acrílico protegia os desenhos de um contato direto com o pé dos
visitantes, mas, com o tempo, a água que caía dos sapatos foi redesenhando as
aquarelas com o formato daquilo que as protegia, como se o desenho brasileiro
pudesse assombrar a padronagem europeia. A água, elemento importante da
paisagem londrina, se transformou em fantasma ou sudário dos fragmentos
aquarelados de paisagem, com a chuva minando a natureza representada. Exilados
em Ficções e no Rio de Janeiro, os desenhos ampliam sua carga de ausências,
como tapetes voadores marcados pelas cicatrizes de suas antigas viagens.
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Shelterruin/Ruínaabrigo, 2013-2014Desenho em lápis aquarelável sobre papel57 x 90 cm (cada)Acervo do artista, Porto Alegre
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ISMAEL MONTICELLI
A obra de Ismael Monticelli tem evidenciado aquilo que é ínfimo e quase imperceptível,
destacando o que há de extraordinário em episódios e objetos domésticos e
buscando o diálogo entre o universo plástico e outras linguagens artísticas. Em
Satélite, o artista visita The brick moon (1869), livro escrito por Edward Everett
Hale, que fez a primeira menção a satélites artificiais. A partir deste encontro
com a ficção, Monticelli faz com que um trenzinho de brinquedo passe por duas
estruturas cúbicas feitas de lâminas de vidro. Em cada uma delas, minúsculas
figuras (um homem e uma mulher) que são satélites do trem e também um
do outro – há um jogo de refrações criado pelo espaço entre os planos do
cubo, vertendo o que é transparente em opaco. Embora parta da literatura, o
trem transita também pelos trilhos da história da pintura (Monet, Turner) e
do primeiro cinema, o que fica claro quando se vê a imagem de paisagem que é
carregada pelo vagão de carga ricocheteando em movimento pelas frestas do vidro.
Satélite, 2015Objeto / instalação, 123 x 93 x 143 cmAcervo Portas Vilaseca Galeria, Rio de Janeiro
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JOSÉ RUFINO
Um retrato inacabado de Karl Marx feito pelo pai de José Rufino quando preso
político foi apropriado pelo artista em Dogma. Rufino acrescenta ao papel manchado
pelo tempo dois fios que prendem taças negras. Elas não têm, no entanto, a
capacidade de receber ou derramar nada, já que são blocos sólidos e estéreis.
A lembrança da passagem do Evangelho em que Cristo pede “Pai, afasta de mim
este cálice” é inevitável, e mais ainda outra apropriação, a que Chico Buarque faz
deste episódio para aproximar os sons e os sentidos de “cálice” e “cale-se” na
famosa canção que foi um hino contra a ditadura militar brasileira. A sobreposição
de discursos narrativos, que jamais se dá sem perdas ou ruídos, é uma marca do
trabalho de Rufino, que vem utilizando seu inventário familiar para falar sobre as
facetas de poder presentes nos arquivos e as artimanhas e reinvenções da memória.
Dogma, 2015Grafite sobre papel, madeira, PVC, metal, resina e verniz143 x 46 x 16 cmAcervo Central Galeria de Arte, São Paulo
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JOZIAS BENEDICTO
Escrita automática (quem fala) é uma performance que o artista apresentou
na abertura de Ficções, deixando resíduos e a memória da ação no espaço
expográfico. Com uma trajetória que vem mesclando as artes visuais à literatura
e ao teatro, Benedicto se aproxima de um lastro deixado por Mallarmé e pelo
Dadaísmo ao se dispor a escrever automaticamente, em jorros ou golfadas,
na presença do público. Os textos são metalinguísticos, referindo-se na
maioria das vezes ao próprio ato da escrita (“deu um branco”, cita um deles)
ou aos instrumentos usados para escrever (como a máquina, o “dragão que
cospe letras”). Os visitantes que se dispuseram a ler os textos receberam do
artista pequenas caveiras, referência ao vanitas da história da pintura, mas
também ao Hamlet, de Shakespeare. A pergunta “ser ou não ser” ecoa, de fato,
neste trabalho, que é construído de muitas vozes – a do autor-artista, as do
público, a da máquina -, mas é feito também dos silêncios que as acompanham.
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Escrita automática (Quem fala), 2015Performance e videoinstalação, Rio de Janeiro
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JULIA DEBASSE
“Para onde você vai quando não pode voltar para casa?” É o que nos pergunta o
trabalho que funciona como cartaz ou vinheta de abertura da série de pinturas
Segue reto toda vida. Julia Debasse transita com desenvoltura pela pintura e
pelo desenho, atuando ainda como performer, cantora e escritora. Seu trabalho
tece referências que vão do rock à literatura, do pulp ao traço popular do cordel
e da pintura naïf. Constrói cenas aparentemente banais, mas as recobre com
uma atmosfera de estranheza e de deslocamento. Há sempre um tremor sísmico
indicando que algo diante dos nossos olhos pode sair do lugar – ou pode não
ser tão natural assim. Ao visitar os road movies, se aproxima de um gênero
cinematográfico que é equivalente ao que os romances de formação são para
a literatura: a estrada é sempre um percurso de amadurecimento e iluminação.
Segue reto toda vida, 2015Pinturas, dimensões variáveis
Coleção particular, Rio de Janeiro
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LIA CHAIA
Piscina é um trabalho em que Lia Chaia navega pelas águas de uma linguagem
que sempre marcou sua história – o desenho. O vídeo em 2 canais mostra em
uma das telas a artista nadando em uma piscina transformada em labirinto,
tentando acompanhar com precisão as linhas pretas que marcam o piso de
azulejos. A outra tela mostra o filme feito com uma câmera instalada na cabeça
da artista, que evidencia a impossibilidade de o corpo em movimento, em um
ambiente instável e fluido como a água, percorrer com exatidão as linhas retas.
Permeado pelo humor – um discreto barulho de jogo eletrônico dá o tom de falha
a cada linha não atingida -, Piscina é uma reflexão sobre o desenho como um fio
narrativo. Geralmente associado ao rigor e à precisão, o desenho aqui é fluido,
infinito, realizável apenas a partir da imprecisa escrita do corpo. A nadadora que
enfrenta a grade de azulejos e as linhas negras do labirinto tem a água como
estrada, não podendo por isso seguir o fio da régua, apenas a linha da vida.
Piscina, 2013 Vídeo (díptico), 16’09”
Acervo da artista, São Paulo
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LOURIVAL CUQUINHA
Cordão criado com moedas, Edição infinita propõe uma reflexão sobre capital
e utopia, e sobre a faceta f iccional e especulativa do dinheiro e do mercado
f inanceiro. O símbolo do infinito, pura abstração, nos chama a atenção para o
valor como sendo algo arbitrário e f lutuante. Não é mero acaso que Cuquinha
use justamente francos suíços, e não qualquer outra moeda, para realizar
este trabalho. País que vem sendo o território virtual e protegido para onde
escoa boa parte do dinheiro escuso do planeta, a Suíça ganha nessa obra a
elasticidade e ambiguidade da f ita de Moebius – espaço sem começo nem fim,
dentro ou fora, mas que tudo engole, tudo transforma em f luxo e trânsito.
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Edição inf inita, 2012Moedas de 5 francos suíços e cabo de açoAcervo Baró Galeria de Arte, São Paulo
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LUIZ ZERBINI
A onda traz o raciocínio fragmentado, cheio de ruídos, muito próximo ao de
uma mesa de sampler, que vem norteando o processo de trabalho de Zerbini.
Criador de uma obra que mistura os estatutos da pintura – natureza-morta,
retrato e paisagem estão sempre sabiamente embaralhados –, o artista apresenta
nessa tela monumental a possibilidade da conjugação da herança de Hokusai
com a padronagem usada na encadernação de livros antigos, os dilúvios de
Turner à ideia de pixel ou aos ruídos de uma imagem que sai do ar na TV. Há uma
tempestade simbólica, para além da natureza, que parece se desenhar nesta
água negra, que transforma a espuma em uma rede tingida das cores metálicas e
fosforescentes, características das paisagens urbanas (mas também marcantes
das escamas de peixes e de outros seres submarinos). Uma teia-espuma
pop e ancestral, vinda de um tsunami que é vertigem de muitos tempos.
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A onda, 2014Pintura, 300 x 400 cmColeção particular, São Paulo
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MARCELO MOSCHETA
Em Equalizador para horizontes distantes, uma foto da paisagem do Deserto
do Atacama, no Chile, foi combinada com 15 paquímetros, que tentam aferir as
distâncias entre a linha das montanhas e o limite da imagem, como se pudessem,
como diz o título do trabalho, equalizar o horizonte. Ao sobrepor a linha virtual que
une os paquímetros e a linha imaginária do horizonte, Moscheta reflete sobre o ato de
medir e como ele pode se fundir à ideia de representação. Volta também a fazer um
movimento que tem sido constante em sua trajetória: o de transformar em desenho
seu deslocamento no mundo, as imagens e os objetos que recolhe em viagens.
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Equalizador para horizontes distantes, 2014Fotografia impressa em papel de algodão,
niveladores de metal e texto em fita adesiva, 64 x 122 cmColeção Franklin Espath Pedroso, Rio de Janeiro
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MARILÁ DARDOT
Cage, Duchamp, Leonilson é um trabalho que afirma sua força a partir de uma
simplicidade desconcertante. O gesto de se apropriar do livro Para los passaros, de
John Cage, e pendurá-lo em um cabide cria relações imediatas com o ready-made de
Duchamp, mas o cobre de um lirismo imprevisto. A inclusão de Leonilson no grupo
de artistas que nomeia a obra cria uma trindade – simbolicamente interessante
em um trabalho que assume uma forma quase triangular na parede – e reforça
a carga subjetiva desse objeto criado de objetos. Mais do que isso, cria um ruído
na associação entre nome e coisa nomeada, já que a menção a Leonilson cria a
possibilidade que enxerguemos o livro como tecido mole repousado no cabide, e o
beija-flor que estampa sua capa como um desenho fluido e espaçado de um bordado.
Em Cores, nomes, Marilá Dardot se apropria do título de uma canção de Caetano
Veloso. Assim como ocorre nos versos do compositor, realiza uma viagem
cromática, mas em vez da visão que passa pela janela do trem, como ocorre
na música, o que impacta a artista são versos dos poetas João Cabral de Melo
Neto, Murilo Mendes, Manoel de Barros e Paulo Leminsky descrevendo 6 cores –
amarelo, verde, vermelho, azul, branco e preto. Dardot escaneou os livros em que
estavam os versos originais, preservando-lhe a tipologia, imprimiu as definições
e pintou-as com guache no tom que coincide com a cor-poema. Esta cor vaza para
além do papel que a contém, contagiando a moldura de cada quadro e a parede.
Mais do que mostrar que as cores e a poesia são infiltrações – continentes
que não se contêm – a artista evidencia os derrames que ocorrem na relação
de signos que forma a língua, entre aquilo que é e aquilo que é nomeado.
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Cage, Duchamp, Leonilson, 2013Livro e cabide, dimensões variáveisEdição única Coleção Silvia Cintra + Box4, Rio de Janeiro
Nas páginas seguintes, Cores, nomes, 2013Impressão mineral sobre papel de algodão e pintura em tinta
gouache Talens sobre papel, passe-partout, moldura e parede48 x 66 cm (moldura), 60 x 78 cm (com pintura na parede), cada
Coleção Silvia Cintra + Box4, Rio de Janeiro
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Branco, Murilo Negro, João Amarelo, João
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Verde, Paulo Vermelho, MuriloAzul, Manoel
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MARCONE MOREIRA
Equador e Tordesilhas se utiliza de restos de um barco para insinuar o encontro
de paralelos e meridianos, linhas que marcam o globo terrestre e que são
evidenciadas aqui em seu arbítrio e sua virtualidade, ganhando uma aura
f iccional. A cruz de um amarelo solar que dá concretude a esses desenhos
imaginários é um portal para falar de Equador e Tordesilhas como lugares
simbólicos da máxima importância para o Brasil. Se o Tratado de Tordesilhas,
em 1494, foi fundamental para os episódios que desaguariam na chegada de
Pedro Álvares Cabral ao litoral de nosso país, o Equador vem sendo o corte
político que divide o mundo dos ricos do território dos invisíveis. A sobreposição
entre estes eixos, quase um ponto cego causado pela insolação vinda do
amarelo, indaga sobre o lugar que ocupamos no mundo e é uma ref lexão
assombrada pela cruz das caravelas, lembrança de violência e de morte.
Equador e Tordesilhas, 2012Instalação / objeto, dimensões variáveis
Acervo Galeria Blau Projects, São Paulo
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Expansão, 2012Instalação / objeto, dimensões variáveisAcervo Galeria Blau Projects, São Paulo
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Em Expansão, Marcone Moreira transforma a madeira que um dia integrou um
barco em um arranjo visual que tanto pode lembrar uma espinha de peixe quanto
os trilhos para um trem. A especulação econômica na Região Norte, onde o artista
viveu, fez com que ferrovias e rodovias substituíssem os rios, antes usados
como vias para o transporte de matéria-prima para exportação e recebimento
de alimentos e bens de consumo, causando impacto ecológico e econômico na
vida da floresta. Fantasmas como a Madeira-Mamoré e a Transamazônica fazem
desta canoa – forma feita de suas faltas – uma espécie de barca da morte, capaz
de unir o mundo das coisas que vemos àquele para onde vai tudo o que já não há.
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MARCOS CHAVES
Criado há 20 anos como um site-specific para a placa de sinalização do Paço Imperial
do Rio de Janeiro, Não falo duas vezes ganha outra encarnação nesta mostra,
como se sua nova montagem pudesse ser também uma sombra-contraponto do
trabalho original. A homonímia e a homofonia sempre foram recursos usados por
Marcos Chaves no trato com a língua portuguesa, que cumpre em sua obra um
papel de ênfase dos ruídos inevitáveis na sobreposição entre as palavras e as
coisas. No caso de Não falo duas vezes, o duelo entre o positivo e o negativo é
radical, já que a luz cria uma afirmação para a frase negativa. A sombra é o sim,
a transparência é o não – e nesse embaralhamento cheio de ironias afirma-se
um discurso oblíquo e a impossibilidade de certezas.
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Não falo duas vezes, 1995Vidro e vinil adesivo, 90 x 60 cmAcervo do artista, Rio de Janeiro
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MARIO GRISOLLI
Pandeiro é um objeto com o qual o artista se relaciona com as experiências
fotográficas do primeiro cinema, não apenas no que diz respeito ao panorama,
ao qual o título do trabalho se refere, mas também a dispositivos como o
zootrópio. É no mínimo curioso que, em plena era digital, artistas que se dedicam à
fotografia, como Grisolli, estejam se voltando para engenhocas analógicas e quase
artesanais para falar do trato com a imagem. É como se a arte contemporânea
oferecesse uma resistência a uma migração de linguagem que está em curso,
do mesmo modo que trabalhos feitos com Super 8 foram, no passado, um índice
perturbador no advento e na popularização da televisão. Pandeiro é um objeto
para o olho, mas também para a mão, como sugere seu nome de instrumento
musical. Através dele, o visitante da mostra pode enxergá-la numa espécie
de atualização da câmara escura, que é ao mesmo tempo uma luneta na qual
se enxerga a paisagem dos outros trabalhos expostos. Cada um aponta para
o que quer ver, construindo assim a narrativa randômica dessa experiência.
Pandeiro, 2015Objeto interativo, dimensões variáveisAcervo do artista, Rio de Janeiro
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MAYANA REDIN
Com Dois chicletes, Mayana Redin revisita um material recorrente em trabalhos
anteriores. Índice de urbanidade, mas também daquilo que é informe e artificial,
o chiclete aparece como ponto de partida de uma espécie de cosmogonia,
apresentada através de um plano-sequência (que pode ser visto como uma história
em quadrinhos ou mesmo uma fotonovela) permeado por um humor existencial.
O uso do verde e do vermelho, tons opostos cromática e simbolicamente, reforça
a aura de gênese que há na relação das duas bolas de chiclete que se encontram,
se misturam, se fecundam, se ferem e se anulam. Para ir ao encontro do outro é
preciso morrer um pouco, e não por acaso o orgasmo é chamado pelos franceses de
petite mort, a pequena morte. Gozar é morrer, amar é se diluir, perder para ganhar
o encontro – esta experiência cada vez mais fugidia no cotidiano das cidades.
Dois chicletes, 2015Fotografias, 130 x 70 cmAcervo da artista, Rio de Janeiro
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NAZARENO
Em My people, only my people o artista se apropria de animais de brinquedo,
elementos recorrentes em sua produção, e monta com eles uma sala de jantar
e um quarto, com direito a mesas, cadeiras e piso de sinteco. Não são animais
quaisquer: as raposas que tomam a mesa, os gatos pretos que giram no piso e
o lobo que uiva sozinho próximo à cama trazem a carga ancestral daquilo que
simbolizaram no universo das fábulas e dos contos de fadas. O afeto que nos liga
a essas histórias é mesclado à dor e ao medo que elas também carregam. Na obra
de Nazareno, o mobiliário em miniatura nos transporta para o sótão de nossas
próprias infâncias. É como um grupo de ex-votos das casas que habitamos e parte
do vasto território de nosso inconsciente – abrigo imaterial de nossas lembranças.
My people, only my people, 2015Escultura, 15 x 140 x 60 cmAcervo do artista, São Paulo
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Em (Coisas) para se ter muito cuidado, Nazareno volta a lembrar a seus
interlocutores que palavra pode ser desenho e que a história dos alfabetos
está ligada à tentativa de transformar a língua falada em imagens. Ao longo
de sua trajetória, o artista tem usado o desenho mesclado à letra cursiva
para criar poemas visuais. Frequentemente, como nesse trabalho, a poesia de
Nazareno envereda pelas misteriosas estradas da alteridade, trilhas entre o eu
e o outro. É ambíguo transformar uma lista pragmática em roteiro afetivo para
guardar e exibir – a sequência de cuidados ganha moldura de vidro bisotado e
vira quadro-relíquia com memória doméstica. É também ambíguo que uma lista
feita de palavras tenha “as palavras” como um dos itens que exigem precaução.
(Coisas) Para se ter muito cuidado, 2013Objeto, nanquim s/ papel, vidro lapidado manualmente32,5 x 25,7 cmColeção particular, São Paulo
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NINO CAIS
Nos trabalhos da série Warfare, Nino Cais se apropria de fotografias colorizadas
e ilustrações que mostram campos devastados e heróis de guerra, cobrindo
estas imagens com brincos, outras peças de bijuteria e contas que imitam
pedras semipreciosas. Ao longo de sua história, o artista vem investigando a
estranheza que há nas imagens corriqueiras de paisagens e objetos domésticos,
que são cobertos por padronagens floridas vindas de papéis de parede ou tecidos
populares. Nesta série recente, Cais transpõe para o universo bélico a mesma
operação feita com as coisas de casa, criando com as joias e pedras falsas uma
espécie de mortalha para os mutilados e para a devastação. Ao preencher com cor
e delicadeza as feridas deixadas pelas batalhas, o artista destaca o horror dessas
cenas, mas cria para elas um abrigo de compaixão e humanidade. Guardados nessa
caixinha de joias, militares e trincheiras saem de um patamar épico e ganham
fragilidade, tornando-se mais próximos de qualquer um que se dispõe a olhá-los.
Sementes é uma instalação que dialoga fortemente com os trabalhos da série
Warfare. Com esse trabalho, Cais rompe com os limites do espaço expositivo,
transformando as sementes em uma espécie de praga que pode infestar
as paredes e a inocuidade do “cubo branco” sem qualquer ordem lógica.
São também como espermatozoides que fecundam a arquitetura, propondo
uma percepção recriada de tudo o que está espacialmente próximo. Ornadas
com falsas pedras preciosas, as bagas também propõem uma reflexão sobre
a inutilidade tão fundamental daquilo que é belo.
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Warfare, 201510 x 14 cm
Acervo Central Galeria de Arte, São Paulo
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Sementes, 2015Objetos / Instalação, dimensões variadasAcervo Central Galeria de Arte, São Paulo
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Sem título (detalhe), 2015Acrílica sobre tela e parede, dimensões variáveisAcervo do artista, Rio de Janeiro
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Sem título, 2015Acrílica sobre tela e parede, dimensões variáveis
Acervo do artista, Rio de Janeiro
PEDRO VARELA
No trabalho site-specific inédito, criado especialmente para Ficções, o artista
combina pinturas com intervenções feitas diretamente sobre a parede negra
em que as telas foram instaladas, como se uma coisa fosse o prolongamento da
outra. Na paisagem noturna, desenhada em branco sobre o fundo negro, há figuras
que emergem do escuro como se fossem aparições. Varela constrói uma teia de
referências que inclui Bosch, Goya, monstros das cartas náuticas das Grandes
Navegações e até mesmo dolorosos fantasmas da ditadura militar brasileira.
Com esta obra, o artista funde pintura e desenho, dando à figuração e ao vanitas
uma carga mais dramática e menos gentil que em seus trabalhos anteriores.
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RAQUEL STOLF
A trajetória de Raquel Stolf se confunde com o estudo das palavras, sobretudo com
o mergulho no silêncio e nas pausas. Na Lista de coisas brancas, a artista apresenta
um conjunto de vocábulos e expressões associados real ou simbolicamente ao
branco. “Arroz” e “cocaína”, que aludem à cor, aparecem junto a “soluço”, “insônia”
ou a “caneta quando falha”. O branco se torna então não apenas o rebatedor da
luz e a foz de todos os tons, mas também a pausa, o que está entre parênteses, o
invisível, o indizível. Não por acaso, Stolf escolheu montar o trabalho em um lugar
onde quase não é percebido. Em Ficções, as coisas brancas foram decalcadas
próximas ao corrimão da escada em caracol da Caixa, e acompanham o visitante
numa vertigem murmurada e literária de seu percurso em espiral.
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Lista de coisas brancas - coisas que podem ser, que parecem ou que eram brancas, 2000-2013
Instalação, dimensões variáveisAcervo da artista, Florianópolis
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REGINALDO PEREIRA
Caixas, pranchetas, estantes, calendários e outros materiais de escritório são
recorrentes na obra de Reginaldo Pereira, artista que revela o incomum contido
nesses objetos ordinários. Em alguns trabalhos, a alusão à burocracia revela
uma estranheza um tanto goyesca, como se os seres vindos da repartição,
deslocados de seus sentidos, pudessem lembrar que “o sonho da razão cria
monstros”. Em Sete Quedas, as pranchetas que compõem a instalação parecem
seguir um caminho quase antagônico. Duras, engenheiras e acadêmicas, elas se
derramam em folhas de muitos azuis, cachoeiras inundando a técnica e a perícia
com as águas da criação. Além da expansão em diversos planos daquilo que
formalmente seria pura superfície, Sete Quedas mergulha a precisão na opacidade
líquida. A lembrança de que as cachoeiras de Sete Quedas desapareceram há
mais de três décadas, dando lugar ao lago e à hidrelétrica de Itaipu, faz com que
a atmosfera um tanto espectral da obra de Pereira seja retomada. Aparecem nas
pranchetas os retratos de sete fantasmas, saltos virtuais, água que se esvaiu.
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Sete Quedas, 2010Acrílica sobre placa de madeira e ferroDimensões variáveisAcervo Casa Triângulo, São Paulo
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ROSANA RICALDE
Ao se aproximar do universo de As mil e uma noites, Rosana Ricalde convida o
observador de seu trabalho a se transformar em Sherazade, mulher que a cada
anoitecer precisa encantar o sultão com mais uma história, para seguir podendo
ver a aurora do dia seguinte. Para Sherazade, contar é sobreviver. Para o visitante
da exposição, cúmplice dessa obra de Ricalde, percorrer a instalação na parede
é verificar que todos os papéis retangulares – pontos estanques em uma rede
que parece sem fim – se referem à chegada de uma nova manhã. Seguir lendo
também é seguir vivo no contato com esta obra, manter-se conectado com o
fluxo de experiência e criação.
As mil e uma noites, v.2015Instalação efêmera com trechos do livro homônimo, dimensões variáveis
Acervo da artista, Rio de Janeiro
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ROSÂNGELA RENNÓ
Em Vera Cruz, a artista transforma em roteiro de cinema – só com falas e
nenhuma imagem – a chegada de Pedro Álvares Cabral e suas três caravelas à
Ilha de Vera Cruz, primeiro nome do Brasil. As legendas que se sucedem na tela
foram baseadas na carta de Pero Vaz de Caminha, pesquisada por Rennó em sua
versão original. O vídeo segue seu curso como um filme mudo: lemos as falas,
ouvimos a sonoplastia, mas não temos acesso às imagens, já que o vídeo tem
aparência de película velada. Vera Cruz conta com a cumplicidade da memória e
da imaginação de seus espectadores, que constroem mentalmente as imagens
que o filme omite. Toca em aspectos importantes da obra de Rennó, como o uso
da palavra e o tratamento dos arquivos como algo que jamais será imparcial
ou inocente – todo documento tem seus pontos de partida e seus contextos.
Ao omitir as imagens de Vera Cruz, Rennó aponta para a impossibilidade de
precisão na história do descobrimento do Brasil, discurso que também é
construído e, portanto, ficcional.
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Vera Cruz, 2000-2003Vídeo / som, 44’00”Acervo da artista, Rio de Janeiro
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VIRGINIA DE MEDEIROS
Para realizar Fala dos confins, Virginia de Medeiros viajou pelas estradas de onde
o pai, um ex-caminhoneiro, retirou o sustento da família. A artista percorreu os
caminhos ao redor da Bacia do Jacuípe, no sertão baiano, visitando lugarejos
próximos a Feira de Santana, sua cidade natal. Filmou as paisagens e gravou
canções e histórias de cantadores populares e contadores de causos, tudo
isso a bordo de uma Kombi batizada de Catarina. Finda a expedição, o veículo,
que ocupou o lugar do barco de Ulisses nessa odisseia nordestina, acabou
se transformando em suporte para a instalação sonora criada pela artista.
O trabalho de Virginia tem girado em torno da oralidade. Através da palavra –
áudio e vídeo abertos ao discurso alheio –, a artista tem encontrado os caminhos
para dar visibilidade a grupos de pessoas que geralmente estão invisíveis.
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Fala dos Confins (Kombi Catarina), 2010VideoinstalaçãoProjeção de vídeo sobre Kombi205,0 x 172,0 x 450,5 cmAcervo Centro Cultural São PauloColeção de Arte da Cidade/DADoC/CCSP/SMC/PMSP
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VÍTOR MIZAEL
O passaredo que Vítor Mizael criou para Ficções é fruto da reunião de cerca de
20 trabalhos sem título. As caixas em madeira ordinária – o MDF usado nas
arquiteturas efêmeras de exposições e no transporte especializado de obras
de arte – recebem minuciosos desenhos em grafite que retratam passarinhos.
Não são aves comuns: apesar da delicadeza do traço e da forte sedução que
estes objetos exercem sobre o olhar, o exame mais demorado de cada figura
revela corpos com cabeças triplicadas e patas alongadas contornando o volume
da caixa, como se quisessem aninhar o suporte que as contém. O que perturba
e encanta nesses desenhos é a contradição de uma natureza encaixotada. Ou,
se raciocinarmos de modo inverso, de uma caixa inanimada que adquire uma
natureza alada a partir das imagens em sua superfície. Há ainda um diálogo
profundo com a taxidermia e a ciência, que não deixam de ser primas-irmãs
da invenção do museu como lugar de armazenamento e exibição das obras de
arte. Temos encaixotado nossos voos? Ao ocupar uma área externa à galeria
da exposição, Mizael reforça esta pergunta.
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Sem Título, 2013Instalação com grafite
sobre 21 caixas de madeira, dimensões variáveis
Acervo Galeria Blau Projects, São Paulo
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Um texto dá mais alguns fios para a teia de uma mostra-ficção, que começa a ser tecida muito antes de ela ser aberta ao público.
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Um texto dá mais alguns fios para a teia de uma mostra-ficção, que começa a ser tecida muito antes de ela ser aberta ao público.
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Dançando no escuro
Daniela Name
Uma curadoria de uma exposição coletiva se faz do silêncio que pode existir em uma conversa imaginária entre obras e artistas. É um olhar entre as frestas, caminho tomado a partir de uma esquina; uma viagem que necessariamente pega “o bonde andando”, já que cada trabalho segue seu curso, elétrico, pelos trilhos indicados pelo artista que o criou. Desenrolar e retecer novelos com os fios destes trilhos é a tarefa em qualquer mostra que pretenda reunir um conjunto heterogêneo de artistas. A maneira como Ficções foi sendo construída – montagem, texto, trabalho de comunicação nas redes sociais – procurou evidenciar esta navegação, bem como o fato de que qualquer exposição também é um discurso construído, com forte carga subjetiva e ficcional.
Ficções roubou seu título de um livro, a famosa coletânea do escritor argentino Jorge Luis Borges, publicada em 1944. Inicialmente pensada para o Projeto Novos Curadores, organizado há cinco anos por Rejane Cintrão, teve desde o início a intenção de discutir os cruzamentos entre arte e narrativa. Havia a percepção de que alguns elementos pesquisados
obsessivamente por Borges, e usados com desenvoltura por inúmeros outros escritores em todo mundo a partir do século XX, apareciam também como recurso discursivo na arte contemporânea. Reinventada e ampliada para a Caixa Cultural, a exposição passou a contar com trabalhos de 33 artistas-narradores.
Não houve nenhuma intenção de ilustrar Borges. O escritor e seu livro são como bússolas invisíveis, que nos orientaram na jornada pelos discursos entrecortados, sempre aos soluços, que vêm permeando a arte contemporânea. Imagens de labirintos e espelhos, tão caras para o autor argentino, vêm sendo recorrentes na arte a partir dos anos 1950. Quando pensamos apenas na arte brasileira, vemos o labirinto aparecer claramente nos penetráveis e nos escritos de Hélio Oiticica e de forma insinuada em Construa seu espaço para viver (1955), de Lygia Clark, ou na Roda dos prazeres (1968), de Lygia Pape. Espirais e vertigens atravessam ainda as trajetórias de Amelia Toledo e Mira Schendel. Para aquela geração, livros e caixas foram elementos recorrentes. Se por um lado os livros reforçam a ideia de uma experiência de espaço-tempo singular com a obra de arte, por outro as caixas demonstram uma dicotomia entre a ordenação e o caos, crucial para os criadores egressos do construtivismo.
Ao apresentar Através (1983-89) em um de seus livros monográficos1, Cildo Meireles escolheu usar um trecho de O jardim das veredas que se bifurcam, talvez o mais impressionante dos contos reunidos por Borges em seu Ficções. O labirinto está ainda em outras instalações do artista, como Fontes (1992) e Desvio para o vermelho (1967-84). Já em Marulho (1997) e Babel (2001-06), Cildo inventa labirintos feitos de palavra, fazendo da língua uma espécie de fronteira elástica que nos conecta ao mundo.
1 MEIRELES, Cildo (org). Cildo Meireles. São Paulo: Cosac Naify 1999.
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Em Marulho, vem de um mar feito de livros abertos o murmúrio quase indiscernível da palavra “água” dita em mais de 50 idiomas; em Babel, uma torre de rádios sintonizados em estações de vários lugares do mundo cria múltiplas camadas com as vozes que saem pelas caixas de som. A torre vinda da Bíblia, livro que já é uma sobreposição de narrativas orais, exige que o observador esteja atento para as diferenças de potência e de design entre os rádios, e chegue perto deles para conseguir discernir a voz de cada lugar, retirá-la do amálgama criado com outras vozes. A força da oralidade e da narração na obra de Cildo, um dos maiores artistas brasileiros em atividade, foi pouquíssimo estudada. Suas proposições do início da carreira e obras antológicas como Inserções em circuitos ideológicos têm na palavra seu principal motor, mas geralmente são vistas pelo viés exclusivo da ação política.
Mas por que falar de Cildo ou dos artistas egressos dos movimentos dos anos 1950 se eles nem estão na mostra? Cada projeto tem seus bons fantasmas e suas pulsões, e Ficções procura evidenciar a potência da narração na obra de arte nas gerações posteriores às destes artistas, cujas trajetórias são mais comumente associadas à ideia de arte como experiência. A força discursiva da arte brasileira é imensa, com a utilização de recursos geralmente associados apenas à literatura, como a alegoria, a metáfora, a metonímia, a homofonia ou a aliteração. São características que não são percebidas sem o mergulho em certa opacidade e que exigem a abertura da arte para o diálogo com outras linguagens e com certa ancestralidade.
Como Borges sabia muito bem, se estamos no Ocidente não é possível pensar em narrativa sem chegar a Homero. Alberto Manguel defende que tudo o que já dissemos ou criamos poderia ser resumido pela Odisseia e pela Ilíada, sínteses de nossas viagens e de nossas batalhas. A ideia é plausível,
e pulsa, subterrânea, nesta mostra, ela própria uma ficção, assim como provavelmente foi Homero: pouco se sabe sobre o poeta, que talvez nunca tenha tido rosto ou corpo. Seu nome pode ser o abrigo de várias vozes sobrepostas. Em 1850, Flaubert criou um irônico verbete em seu Dicionário de clichês: “Homero: nunca existiu”.
Como “um livro e seus leitores são espelhos que se refletem um ao outro infinitamente”2, assumimos que, mesmo que Homero não tenha sido um cantador cego e sim o murmurar de muitas vozes, ele importa como pedra fundamental de nosso imaginário. É curioso que, até o século XIX, a poesia homérica tenha sido rejeitada pelo Ocidente platônico e filosófico como possibilidade de leitura para nossa existência. No mundo árabe, Al-Farabi3, um lógico do século X, já dava a Homero a mesma importância que atribuía à filosofia. O discurso da razão sempre rejeitou a poesia. Foi preciso tempo – e as leituras de outros poetas, como Goethe e Schiller – para que Homero se reabilitasse. Depois deles, viriam grandes escritores como Borges e Italo Calvino. A rejeição da poesia como discurso de entendimento talvez seja semelhante ao pavor que certos grupos da crítica de arte têm da narrativa e da alegoria. Do formalismo de Greenberg ao famoso ensaio
2 MANGUEL, Alberto. Ilíada e Odisseia de Homero – Uma biografia. Rio de Janeiro: Zahar, 2008.
3 A palavra “alfarrábio” ganhou forma na língua portuguesa graças ao nome de Al-Farrabi, admirador de Homero.
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publicado por Benjamin Buchloh em 1980, há sempre um grupo de forças que olha com desconfiança para a figura e para a metáfora – nos casos mais radicais, para a própria imagem. Mas estes índices de subjetividade oblíqua e difusa existem – e exibem constantemente suas potências, furando a hegemonia do discurso que se ancora apenas no estudo da forma e dos materiais. É isso que tentamos evidenciar nesta exposição.
De mãos dadas com Borges, Homero e até mesmo com Al-Farabi, procuramos transformar Ficções em uma pequena odisseia para o público. Se precisávamos viajar para conhecer e narrar, a Kombi Catarina, versão sertaneja de Virginia de Medeiros para o barco de Ulisses, recebeu o público ainda no térreo da Caixa. E trabalhos de Delson Uchôa, Raquel Stolf, Andrey Zignnatto e Vítor Mizael acompanharam o visitante até a porta da galeria 3, onde os tapetes-aquarela de Guilherme Dable o esperavam em seus primeiros passos.
Na galeria, os trabalhos são convites para deslocamentos de várias ordens, da geografia aos recursos de linguagem já enumerados. A importância transformadora da estrada, real ou imaginária, é evidenciada por Julia Debasse, Marcelo Moscheta e Ismael Monticelli. A água, território mole, está presente nos mares de Luiz Zerbini, Rosângela Rennó e Adriana Varejão, nas cachoeiras de Reginaldo Pereira, na piscina de Lia Chaia e, enviesadamente, nas esculturas de Barrão. O Pandeiro de Mário Grisolli é leme e luneta, lente através da qual o visitante pode imaginar “Terra à vista!” e reinventar a exposição que gostaria de ver.
O jorro da palavra aparece com Marilá Dardot, Jozias Benedicto, Marcos Chaves, Rosana Ricalde e Nazareno. Este também se junta a Ana Miguel, Mayana Redin, @Desdicionário e Elisa Castro, apontando para a viagem que é construir um discurso junto ao outro. As ficções da política, da estratégia militar e da economia ganham força com os trabalhos de Lourival Cuquinha, José Rufino e Nino Cais. Numa segunda sala, a jornada penetra em um território de aparições, com a
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quase cegueira causada pelo brilho das Escoras barrocas de Alessandro Sartore e pela insolação de Equador e Tordesilhas, de Marcone Moreira. É uma sala de enfrentamentos com um mundo noturno, o mundo daquilo que não há. E a segunda obra de Marcone presente no ambiente, quase a balsa da morte, nos leva até o adormecimento e os seres fantásticos das pinturas de Daniel Lannes e ao pesadelo tropical de Pedro Varela. Nessa atmosfera de metamorfose e transformação, chegamos a Omulu, orixá que reina no território dos mortos e é capaz de desfazer as demandas mais pesadas. Tomando banho de pipoca em Buruburu, de Ayrson Heráclito, o visitante é convidado a concluir seu ciclo, para quem sabe reiniciar outro. A jornada do herói só se cumpre se ele pode voltar para casa.
Buruburu traz ainda a recordação de que a sabedoria dos povos africanos enfatizava a linguagem oral. Falar era e é inventar mundos. Falar também é um percurso: se aprendemos a nomear as coisas, criamos a gênese de um universo para chamar de nosso. Fazer um desenho, qualquer desenho, é um trajeto entre pontos, fio-novelo descortinando e modificando o papel, sua galáxia possível. Nesta exposição sobre imagens e palavras, abraçamos a experiência de outros espaços e tempos para recriar nossos universos.
Não estamos sós: da Escola Peripatética de Aristóteles ao flâneur de Baudelaire e João do Rio, da pintura viajante ao conceito de deriva lúdica de Guy Debord, há em comum a noção de que é preciso estar em movimento. Mais do que caminhar, talvez o que Ficções tente deixar entrever é que é preciso, como sugeriu Nietzsche, dançar sobre as coisas do mundo. Dançando no escuro talvez possamos usar corpo, memória e afetos para colecionar relâmpagos. Deles viria a energia para tecer a estrada, f iapo e candeia a nos guiar nos próximos passos.
Legendas:
pág. 90 - A chegada da obra A onda, de Luiz Zerbini, que precisou de uma embalagem especial para vir de São Paulo. A porta de vidro da Caixa também precisou ser removida para que a tela passasse;
pág. 91 - Renato Cecílio lixa e pinta as bases e bancos presentes na mostra;
pág. 92 (alto) - Vista da entrada de Ficções
pág. 92 - Pedro Varela criando seu trabalho feito especialmente para a mostra
pág. 93 (alto) - Vista da sala das “aparições”
pág 93 - Com o terço na Kombi Catarina, a torcida para que todos os deuses habitem nossa imaginação e protejam nossas viagens
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CAIXA is a Brazilian state-owned company that stands for the respect for diversity, keeping internal committees that are active in promoting, amongst its employees, campaigns, programs, and actions designed to foster ideas, knowledge and a respectful and tolerant attitude towards differences in gender, race, sexual orientation, and all other differences which are a characteristic of society.
Known as one of the main sponsors of Brazilian culture, CAIXA allocates, early, more than R$ 80 million of its budget to sponsoring cultural projects which are selected through public announcements. CAIXA chose this selection process so it could be more democratic and accessible to producers and artists found in all regions of the federation - while also making the allocation of the company’s resources more transparent to society.
To sponsor an exhibition such as Ficções is to praise the plurality of contemporary Brazilian art while paying close attention to the way it relates to other languages, particularly to the realm of narratives found within literature. The exhibition becomes even more relevant if we consider that it contains works by some of the greatest contemporary artists working in the country, presenting an excellent overview of the national production of art.
In this way, CAIXA contributes to fostering and divulging national culture, repaying the trust and support it has received from Brazilian society throughout its long existence and active partnership in the development of our cities. CAIXA believes that life demands more than a bank. It demands investments, active and present participation, commitment to the country’s future, and creativity, so we can bring the very best results to the Brazilian people.
CAIXA ECONÔMICA FEDERAL
Dancing in the dark
Daniela Name
The curatorship of a group show is made of the silence that can be part of an imaginary conversation between the works and the artists. It is like looking between the cracks, taking a road that begins at a corner; boarding a train that already left the station, since each work follows its own electric course, through the rails the artists laid out. Unrevealing and reweaving a ball of yarn with these threads, these rails, that is the task at hand for any exhibition that hopes to bring together a homogeneous ensemble of artists. The way Ficções was put together - its construction, text, communication through social medias - strived to stablish this process of navigation as well as the fact that any exhibition is also a weaved discourse, with a strong subjective and fictional input.
Ficções stole its title from a book, a famous collection of short stories by Argentine writer Jorge Luis Borges, f irst published in 1944. Initially created as a part of Novos Curadores Project - organized by Rejane Cintrão, five years ago - it aimed, since the beginning, to discuss the intersections between art and narrative. There was a notion that some elements - which Borges researched obsessively and that were proficiently used by other authors throughout the world since the 20th century - also emerged as discourse resources in contemporary art. The exhibition, which was reinvented and expanded once it reached Caixa Cultural, now relied on the works of 33 artists-narrators.
The intention was never to illustrate Borges. The author and his book are invisible compasses that guide us in this journey through fragmented speeches, always little hiccups of a story, that permeate contemporary art. Images of labyrinths and mirrors, which are so dear to the Argentine author, have been recurring in art since the 50’s. When we think about Brazilian art, we notice the labyrinth clearly emerges in Hélio Oiticica’s writing and penetráveis [penetrables] and, in an implied manner, in Construa seu espaço para viver (1955),
by Lygia Clark, or in Roda dos prazeres (1968), by Lygia Pape. Spirals and vertigo can be found along the trajectories of Amelia Toledo and Mira Schendel. Books and boxes were recurring elements for that generation. If, on one hand, books stress the idea about the uniqueness of the space-time relationship that is stablished by the work of art, on the other hand, boxes stress the dichotomy between order and chaos, which was crucial to those creators coming from Constructivism.
When first presenting Através1 (1983-89) in one of his academic essays, Cildo Meireles chose to use an excerpt from The Garden of the Forking Paths, perhaps the most astonishing of all the stories found in Borges’ Ficciones. The labyrinth can also be found in other works of the artist, such as Fontes (1992) and Desvio para o vermelho (1967-84). On the other hand, in Marulho (1997) and Babel , Cildo reinvents labyrinths created through words, presenting language as a sort of elastic borderline that connects us to the world. In Marulho, from an ocean made out of open books comes the almost indiscernible murmuring of the word “water” being said in over 50 different languages; In Babel, a tower of radios, tuned into stations from various places in the world, creates multiple layers of voices coming out of the speakers. The tower, inspired by the Bible, - a book that is, in itself, formed by overlapping oral narratives - demands that the spectator remains mindful of the differences in volume and design between the radios, drawing near in order to distinguish each particular voice, removing it from the amalgam created by the others. The power of the spoken word and narration in Cildo’s body of work, one of the greatest living Brazilian artists, has been overlooked by researchers. Words are the driving force behind the propositions he explored early on his career and in anthological works such as Inserções em circuitos ideológicos, which generally are only seen through the lens of political action.
But why should we speak about Cildo or any of the artists coming from the 50’s movements, when they are not even part of this exhibition? Each project is haunted by its own set of ghosts
ENGLISH VERSION
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and impulses, and Ficções tries to shed light onto the power of narration found in the works of art created by previous generations, whose trajectories are often linked to the idea of art as an experiment. The discursive power of Brazilian art is enormous, making use of resources that are generally only associated with literature, such as allegory, metaphor, metonymy, homophony or alliteration. These characteristics cannot be distinguished without diving into a grey area and require art to be open to dialog through other languages with a certain ancestry.
As Borges knew all too well, once we find ourselves in the Western world, we cannot think about narratives without thinking of Homer. Alberto Manguel argued that everything that has been said and created could be summed up by the “Odyssey” and “Iliad”, syntheses of our travels and our battles. The idea is plausible and it throbs, buried beneath this exhibition, which is a fiction in itself, just as Homer probably was: little is known about the poet who, perhaps, never had a face or a body. His name could be the harbor of various overlapping voices. In 1850, Flaubert created an ironic entry in his Dictionary of Accepted Ideas: “Homer: never existed”.
The same way “a book and its readers are mirrors that endlessly reflect each other”, we suppose that, even if Homer was never a blind singer, but a murmur of many voices, he still is an important corner stone of our imaginary.2 It is curious that, until the 20th century, Homeric poetry was rejected by the platonic and philosophical West and not accepted as a book that dealt with our existence. In the Arab world, Al-Farabi, a logician from 10th century, already granted Homer the same importance given to philosophy. The discourse of reason always rejected poetry. It took time - and readings by other poets, such as Goethe and Schiller - until Homer was rehabilitated. After them, other great writers followed, such as Borges and Italo Calvino. The rejection of poetry as a discourse that deals with understanding things perhaps is similar to the dread that narrative and allegory inspire among certain groups of art
critics. From Greenberg’s formalism to the famous essay published by Benjamin Buchloh in 1980, there is always a group of forces that is wary of f igures and metaphors – and, among the most radical, even image itself. However, these rates of oblique and diffuse subjectivity do exist - and constantly display their powers, piercing through the hegemony of a discourse that grounds itself solely on the study of form and materials. And that’s what we try to highlight in this exhibition.
While joining hands with Borges, Homer, and even Al-Farabi, we seek to transform Ficções into a small odyssey for the audience. If we need to travel in order to know and tell, Kombi Catarina, Virginia de Medeiros’ backwoods version of Ulysses’ ship, welcomes the public at the ground floor of Caixa. Works by Delson Uchôa, Raquel Stolf, Andrey Zignnatto, and Vítor Mizael escort the visitor until the doorway of gallery 3, where Guilherme Dable’s watercolor-matts wait for their first steps. Within the gallery, the works are an invitation to various types of dislocation - from geographical to the various linguistic resources previously mentioned. The transforming importance of the road - be it real or imaginary - is highlighted by Julia Debasse, Marcelo Moscheta, and Ismael Monticelli. Water, a soft territory, is present in the oceans of Luiz Zerbini, Rosângela Rennó, and Adriana Varejão; in Reginaldo Pereira’s waterfalls, in Lia Chaia’s pool and, in a rather skewed manner, in Barrão’s sculptures. Mário Grisolli’s Pandeiro is also both a ship’s wheel and a telescope, lens through which the visitors can imagine “land ahoy” and reinvent the exhibition, as they would like to see it.
The gush of words appears with Marilá Dardot, Jozias Benedicto, Marcos Chaves, Rosana Ricalde, and Nazareno. The latter also joins Ana Miguel, Mayana Redin, @Desdicionário, and Elisa Castro, pointing towards the trip that it is to build a discourse with another. The political fictions, of military strategy and economics, are strengthened by the works of Lourival Cuquinha, José Rufino, and Nino Cais. In the second room, the journey enters a territory of apparitions, as we are nearly blinded by the glow of Alessandro Sartore’s Escoras barrocas
and by the sunstroke caused by Marcone Moreira’s Equador e Tordesilhas. It’s a room in which we face a nocturnal world, a world of things that are not there. Marcone’s second piece in this room, almost the ferry of death itself, brings us to slumber and the fantastic beings seen in the paintings of Daniel Lannes and Pedro Varela’s tropical nightmares. Within this atmosphere of metamorphosis and transformation, we come to Omulu, the orisha that rules the realm of the dead and is capable of undoing the heaviest of burdens. While being showered by popcorn in Ayrson Heráclito’s Buruburu, the visitors can complete their cycle or, perhaps, begin a new one. The hero’s journey is only finished when he gets back home.
Buruburu also reminds us that the wisdom of African civilizations emphasized orality. To speak is to device worlds. To speak is also a trajectory: when we learn to name things, we are able to create the genesis of a universe we can call our own. To draw something, any kind of drawing, is a trajectory between points; thread and yarn unveil and modify the paper’s surface - its suitable galaxy. In this exhibition about images and words, we embrace the experience of other spaces and times, so we can recreate universes.
And we are not alone: From Aristotle’s Peripatetic School to Baudelaire’s and João do Rio’s flâneur; from travelling paintings to Guy Debord’s concept of dérive, there is a common notion that it is necessary to keep on moving. More than moving, perhaps what Ficções tries to imply is the necessity of, as Nietzsche suggested, dancing over the things of the world. Perhaps while dancing in the dark we can use our body, memory, and affections to collect bolts of lightning. From those we could gather the energy to weave the road, the thread, and the candlestick that will guide our next steps.
1 MEIRELES, Cildo (org). Cildo Meireles. São Paulo: Cosac Naify 1999.
2 MANGUEL, Alberto. Ilíada e Odisseia de Homero – Uma biografia. Rio de Janeiro: Zahar, 2008.
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AGRADECIMENTOS / ACKNOWLEDGMENTS
Baró Galeria de Arte, Blau Projects, Casa Triângulo, Central Galeria de Arte, Centro Cultural São Paulo, Franklin Espath Pedroso, Galeria Artur Fidalgo, Galeria Emma Thomas, Galeria Fortes Vilaça, Galeria Luciana Caravello, Galeria Portas Vilaseca, Galeria Silvia Cintra + Box 4, Marcio Telles de Menezes do Prado Maia, Maria Lucia Farinha Veríssimo, Vera Holtz
Adilson Tinoco Thomaz, Adriano Trindade, Afonso Costa, Alexandre Murucci, Aloysio L. de Almeida Nogueira, Amanda Rodrigues Alves, Amalia Giacomini, Andrea Pech, Artur Fidalgo, Augusto José Botelho Schmidt, Cauê Alves, Caio Paiva, Cecília Fortes, Centro Cultural Paço Imperial, Cláudia de Brito, Contemporâneo Hostel, Daniela Seixas, Domi Valansi, Eduardo Niero, Eliane Cristina Tolentino, Elizabeth Agra, Flávia Mattar, Flora Uchôa, Gabriel de Souza, Guilherme Tavares, Gus Moura de Almeida, Ivete Flávia de Maria Menezes, Izabel Ferreira, Jaime Portas Vilaseca, Juliana Blau, Juliana Cintra, Laura Calheiros, Léo Wanke, Luciana Caravello, Marcia Lagos, Márcia Lontra, Maria Beatriz Machado, Maria Clara Rodrigues, Mauro de Holanda Cavalcanti, Nice Jourdan, Olivia Tabet, Projeto Novos Curadores, Rafael Alves, Raquel Silva, Rejane Cintrão, Ricardo Augusto, Ricardo Trevisan, Rita Paiva, Sidney Schroeder, Silvia Cintra, Vania Rodrigues Bittencourt, Kelly Leani Santiago, Wagner Lungov
PRESIDENTA DA REPÚBLICA Dilma Vana Rousseff
EXPOSIÇÃO / EXHIBITION
CURADORIA / CURATORSHIP Daniela Name
COORDENAÇÃO GERAL / GENERAL COORDINATION Anderson Eleotério
PRODUÇÃO / PRODUCTION David Motta
PROGRAMAÇÃO VISUAL / ART DIRECTION Flávio Soares
ASSESSORIA DE IMPRENSA / PRESS LIAISON Paulo Ferreira
MUSEOLOGIA / MUSEOLOGY Mariane Tomi Sato
SEGURO / INSURANCE Pro Affinite - ACE Seguradora
TRANSPORTE / TRANSPORT ArtQuality International Fine Arts Guinchos Amigão
ASSISTENTE DE PRODUÇÃO / PRODUCTION ASSISTANT Felipe Paladini
PROJETO / PROJECT Anderson Eleotério Bittencourt Produções
PRODUÇÃO EXECUTIVA / EXECUTIVE PRODUCTION ADUPLA Produção Cultural Ltda.
PATROCÍNIO / SPONSOR Caixa Econômica Federal Governo Federal
DESIGN DE MONTAGEM / EXHIBITION DESIGN Anderson Eleotério Daniela Name
ILUMINAÇÃO / LIGHTING Julio Katona
SINALIZAÇÃO / SIGNPOSTING Ginga Design
MONTAGEM E CENOTÉCNICA / SETUP AND SETTINGS Alessander Baptista de Souza Márcio Araújo Renato Cecílio das Dores Thábata Castro Thiago de Pádua Almeida
MINISTRO DA FAZENDA Joaquim Levy
PRESIDENTA DA CAIXA Miriam Belchior
CATÁLOGO / CATALOGUE
ORGANIZAÇÃO / ORGANIZATION Daniela Name Anderson Eleotério
TEXTOS / WRITER Daniela Name
PROJETO GRÁFICO / GRAPHIC DESIGN Flávio Soares
EDIÇÃO E REVISÃO DE TEXTOS / PROOFEDITING AND COPYEDITING Jozias Benedicto
VERSÃO EM INGLÊS / ENGLISH VERSION Julia Borja
PRODUÇÃO EDITORIAL / EDITORIAL PRODUCTION ADUPLA Produção Cultural Ltda.
PRÉ-IMPRESSÃO E IMPRESSÃO / PRINTING Sol Gráfica
FOTOS / PHOTOS Janaína Mirandaexceto / except: Camila Lima - págs. 90, 91, 93 (alto) Central Galeria - pág. 71 Daniel Leão - pág. 41 Daniela Name - págs. 21, 32, 34, 38, 46, 48, 50, 68, 79, 83, 85 (alto), 93 (terço) Laura Calheiros - págs. 28, 29 Mario Grisolli - págs. 54, 55, 62, 63, 92 Mayana Redin - pág. 65 Murillo Meirelles - págs. 8, 9 Raul Krebs/ Estúdio Mutante - pág. 35
PATROCÍNIO / SPONSORPROJETO / PROJECT PRODUÇÃO / PRODUCTION
BITTENCOURT ]PRODUÇÕES[
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patrocínioprojeto produção
VAMOS PRESERVAR O MEIO AMBIENTE DISTRIBUIÇÃO GRATUITA - VENDA PROIBIDA