Estudo comparado das normas e estruturas e doscritérios e procedimentos de editoração do INEP
(Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais AnísioTeixeira).
Parte IElementos de desenvolvimento e gestão de uma nova
política editorial
A editoração científica adota cada vez mais formas e modelosalternativos de publicação, promove transparência, eprincipalmente explora ao limite as potencialidades dapublicação eletrônica. Busca abordagens que reduzem pressõesdesnecessárias sobre autores, revisores e especialistas,diminuem o intervalo entre submissão e publicação, e mudam ofoco das decisões editoriais de ‘se’ um artigo deve serpublicado para ‘como’ publicá-lo.
NTENDE-SE POR ‘EDITORAÇÃO’ o gerenciamento dos processos
de edição através dos quais informações são corrigidas,
condensadas, organizadas, em uma só palavra modificadas
para se tornarem, tanto quanto possível, mais precisas,
consistentes, completas, úteis e acessíveis. Esse processo
transformador resulta de uma soma de habilidades criativas,
relações humanas, e conjuntos precisos de métodos, da qual
sobressai a colaboração do autor com várias editorias compostas
de assistentes e supervisores, que por sua vez se reportam a um
E
Pedro Scuro Neto, M.Soc.Sc. (Praga), PhD (Leeds), consultor em cooperação técnica internacional; http://leeds.academia.edu/PedroScuro/Papers; http://pt.wikipedia.org/wiki/Pedro_Scuro_Neto
2
editor executivo. Quanto mais curta a cadeia editorial mais as
funções das diferentes editorias se sobrepõem, conformando uma
situação característica à ‘editoração científica’ (academic
publishing), ramo específico focado nos princípios e práticas
usados pela comunidade científica e acadêmica para divulgar seus
argumentos e pesquisas, e validá-los. Dito de modo mais
prosaico, “ajuda os pesquisadores a mostrar o que descobriram
uns aos outros, reivindicar que descobriram primeiro, e provar a
seus chefes e financiadores que não estiveram à toa”.1
A contribuição maior – e a intenção – da editoração
científica é ampliar cada vez mais o avanço do ensino, das
práticas e da pesquisa difundindo métodos e técnicas rigorosas,
documentando o melhor da produção científica, favorecendo a
reprodutibilidade (um dos pilares do método científico) e a
revisão por especialistas do mesmo escalão que o autor. Na
verdade, não necessariamente “do mesmo escalão”, pois “peer review
não é nada mais e nada menos que revisão por especialistas,
diferentemente de revisão por quem não é” 2. Para todos os
efeitos, ela se tornou um ‘modelo’ de editoração, graças à
tecnologia (no começo com a copiadora Xerox e mais tarde com a
TI), e sinônimo de ciência de qualidade, antídoto contra
publicações sem interesse, e economia de tempo e recursos. Sem
descartar, no entanto, casos extraordinários como o arquifamoso
paper de Watson e Crick 3, publicado sem nunca ter sido submetido
1 Publishing, perishing, and peer review. The Economist, 22 jan. 1998. Disponívelem http://www.economist.com/node/6037192 Sir Mark Walport, diretor, Wellcome Trust (a “maior agência privada de financiamento de pesquisas no Reino Unido”, Financial Times, 4 Out. 2012) (comunicação pessoal).3 J. D. Watson & F. H. C. Crick. A structure for deoxyribose nucleic [deoxyribonucleic] acid. Nature, 171, 1953: 737-738.
3
a especialistas, ou de artigos citadissímos e até premiados, mas
que foram recusados pela peer review. 4
2. REVISÃO POR ESPECIALISTAS
O que realmente preocupa, no entanto, são as restrições ao
‘modelo’ revisão por especialistas na base de casos em que
pareceristas demonstram falta de “familiaridade com a
literatura” e mesmo de integridade. Alega-se, nesse sentido, que
enquanto o especialista rejeita um artigo porque os argumentos e
conclusões conflitam com as suas convicções, aprova outro
simplesmente por conta do autor trabalhar em uma instituição de
prestígio. Situação comprovada por experimentos em que artigos
publicados por autores de instituições de renome são
redigitalizados e submetidos novamente como se tivessem sido
escritos por autor independente ou membro de instituição menos
conhecida. Constatou-se, na maioria dos casos, que não apenas o
especialista deixou de perceber que se tratava de material já
publicado como também desaconselhou a publicação. 5
Exemplos assim obrigam entidades científicas importantes a
declarar que, apesar da revisão por especialistas ser um
procedimento “amplamente adotado e menos dispendioso” existe
“pouca evidência empírica que justifique a sua utilização como
garantia de pesquisa de qualidade”. 6 Do mesmo modo se afirma
que “muitos pareceres não valem o papel em que são redigidos”, e4 Nature, o mais citado de todos os periódicos científicos, não submete a revisão por especialistas a maioria dos artigos que recebe; não antes que o editor decida se o texto é inovador e se está ajustado à linha editorial da revista. Um caso famoso de rejeição por essa mesma revista foi o paper de Enrico Fermi sobre a interação dos raios beta, que o editor considerou “fora da realidade”. 5 David Shatz. Peer review: a critical inquiry (issues in academic ethics). Rowman & Littlefield, 2004.
4
se critica o sigilo e o anonimato da revisão por especialistas,
e por ela ser instrumento de establishments empenhados em “prevenir
a divulgação de ideias, metodologias e pontos de vista não
ortodoxos, tenham méritos ou não”. 7 Tudo sugerindo que a
editoração científica está atravessando uma ‘crise’ ou pelo
menos sofrendo – na expressão do diretor de uma das maiores
editoras universitárias do mundo – de uma “doença crônica” 8
que, mesmo não sendo fatal, desacelera o progresso científico e
provoca antagonismo em relação à ciência na população e na
própria comunidade científica. Caso da “descoberta” da relação
entre autismo e a aplicação de determinada vacina (MMR), a
partir de experimentação na base de evidências frágeis, coleta
de dados de um número limitado de casos pré-selecionados, e
procedimentos aéticos de pesquisa.9 Esses defeitos não impediram
os editores, revisores e especialistas recomendasse a publicação
da pesquisa por um dos mais conceituados periódicos científicos
do mundo, e os resultados foram imediatamente acolhidos por
6 T. Jefferson et al. Editorial peer review for improving the quality of reports of biomedical studies. Cochrane Database of Systematic Reviews, 2007. Disponível em http://summaries.cochrane.org/MR000016/editorial-peer-review-for-improving-the-quality-of-reports-of-biomedical-studies. Mais de 28 mil voluntários da Cochrane Collaboration em mais de uma centena de países organizam pesquisas médicas baseadas em evidências, abordagem reprodutível também em experimentos sociais. Cf. Pedro Scuro Neto. School strife and socialisation: on planning experiment and intervention. Chinese People's Public Security University, 1999. Disponível em http://leeds.academia.edu/PedroScuro/Papers.7 Rethinking peer review, The New Atlantis, nº 13, 2006: 106-110. Disponível em http://www.thenewatlantis.com/publications/rethinking-peer-review8 Modern Language Association. From the ad hoc committee on the future of scholarly publishing. Profession, 2002: 172-86. Disponível em http://www.mla.org/resources/documents/issues_scholarly_pub/repview_future_pub9 A. J. Wakefield et al. Ileal-lymphoid-nodular hyperplasia, non-specific colitis, and pervasive developmental disorder in children. The Lancet, 351 (9103), 1998: 637–641.
5
críticos do sistema de saúde pública e pais de crianças autistas
ou de filhos inoculados com a substância. 10
Contudo, apesar dos pesares e críticas severas, de uma
forma ou de outra a revisão por especialistas (cujos primeiros
registros históricos datam do século XVII 11) segue sendo um
recurso crucial para a reputação dos pesquisadores e a
confiabilidade do seu trabalho. 12 Ainda que a sua evolução seja
errática e às vezes condicionada por mitos e o senso comum, ela
ainda corresponde às necessidades dos diversos ramos da ciência.
Razão pela qual, malgrado suas imperfeições, diferenças de
qualidade e falta de sólida evidência acerca da sua eficácia, a
maioria dos periódicos conceituados a considera “indispensável”
– em particular nas ciências humanas e sociais – para ‘separar o
joio do trigo’. O que por si só parece justificar cada vez mais
frequentes conclamações aos protagonistas da editoração
científica – quem edita, trabalha com pesquisa e a financia – a
“trabalhar em conjunto” e aprender sobre gerenciamento de dados,
ética e integridade, de modo a prevenir práticas e ocorrências
desmoralizadoras para a ciência e a comunidade científica. 10 Na origem do experimento, segundo uma reportagem, estavam “conflitos de interesse financeiro”. Brian Deer. Revealed: MMR research scandal. The Sunday Times. 22 fev. 2004. A. Alaszewski. How campaigners and the media push bad science. British Medical Journal, 342, 2011: d23611 Philosophical Transactions of the Royal Society [http://rstl.royalsocietypublishing.org/]. No entanto, há notícias sobre ela ser ainda mais antiga, provavelmente desde quando no primeiro livro escrito sobre ética em medidicina Ishaq bin Ali Al Rahwi (854–931 AC) instou seus colegas a tomar notas acerca dos pacientes, para serem revistas mais tarde porum júri de médicos. M. Zuheir Al Kawi. History of medical records and peer review. Annals of Saudi Medicine, 17 (3), 1997: 277-278. Disponível em http://www.kfshrc.edu.sa/annals/Old/173/96-301ed.pdf12 Dos pesquisadores 90% acham que revisão por especialistas eleva a qualidade da pesquisa publicada, e 84% que sem ela não haveria controle da comunicação científica. Sense About Science – Peer Review Survey 2009: Preliminary Findings. Disponível em http://www.senseaboutscience.org.uk/presentations/PeerReviewSurvey.ppt.
6
Os periódicos científicos são os criadores das regras e normas
que determinam a ética e a integridade da ciência; eles são o
elemento decisivo na construção de um sentimento de confiança da
população em relação à ciência. Sem eles haveria apenas
cacofonia de vozes e pleitos sem respaldo na avaliação de
qualidade e autenticidade. As revistas científicas moldam de
forma categórica a ética do conhecimento orientado à efetiva
utilização pública do saber. 13
Nesse sentido, mais e mais editores adotam modelos
alternativos de editoração, convidam autores a escrever artigos
e acolhem suas indicações de especialistas, selecionam artigos
mediante pontuação estruturada, promovem transparência, revisão
aberta, restringem o acesso dos pareceristas aos resultados das
pesquisas, e, em particular, exploram ao limite as
potencialidades da publicação eletrônica. Abordagens que reduzem
pressões desnecessárias sobre autores, revisores e
especialistas, diminuem o intervalo entre a submissão e a
publicação do artigo, e mudam o foco das decisões editoriais de
‘se’ um artigo deve ser publicado para ‘como’ publicá-lo 14.
3. OS “GRANDES VIABILIZADORES”
Em algumas paragens, porém, vigora uma perspectiva
diferente que destaca tendências “naturais”, espontâneas, da
editoração científica e enfatiza a influência de atores-chave e
tecnologia. Não somente as críticas à peer review são ignoradas
como também as transformações que atravessa, enquanto a
editoração como um todo é restringida à obrigação de fazer13 Richard Horton, editor, The Lancet. In: Peer review in scientific publications. House of Commons Science and Technology Committee. 2011: 5.14 J. Scott Armstrong. Peer review for journals: evidence on quality control, fairness, and innovation. Science and Engineering Ethics, 3 (1), 1997: 63-84.
7
chegar o conhecimento o mais rapidamente possível o conhecimento
ao leitor. Missão relativizada, por sinal, pela demora das
revistas em divulgar informação – em média, de vários meses a
dois anos entre submissão e publicação 15– algo que metade dos
periódicos eletrônicos brasileiros escamoteia, simplesmente não
informando a data de recebimento dos textos.16 Missão
influenciada, ademais, pela aparente dificuldade de entender a
sobreposição das funções na editoria científica, preferindo
admitir o observador que “não se sabe” ao certo qual é
atualmente a função da “equipe do editor geral”, e concluir que
o fundamental é o periódico ter “retaguarda institucional” 17. Ou
seja, respaldo de entidades de pesquisa e ensino, e,
principalmente, conselho de política editorial, do qual o editor
não precisa fazer parte, exceto se for o caso de “decidir sobre
a permanência dele próprio na função”. No mais, as atividades
das equipes de editoração limitam-se cada vez mais a “aspectos
não científicos” dependentes de softwares autossuficientes 18,
“grandes viabilizadores” da editoração científica, que
[...] a par de oferecer uma série de procedimentos via Internet,
permitindo a submissão e a avaliação através de navegadores
(browsers) [...] de certo modo [certificam] a revista como possuidora
15 G. Ellison. The slowdown of the economics publishing process. Journal of Political Economy, 110 (5), 2002: 947-993.16 Sely M. S. Costa e Luisa V. S. Guimarães. Qualidade de periódicos científicos eletrônicos brasileiros que utilizam o sistema eletrônico de editoração de revistas (SEER). Inf. Inf., Londrina, 15 (nº esp.), 2010: 89.17 Piotr Trzesniak. A estrutura editorial de um periódico científico. In: A. A.Z. P. Sabadini, M. I. C. Sampaio, S. H. Koller (org.), Publicar em psicologia: um enfoque para a revista científica. Associação Brasileira de Editores Científicos de Psicologia/ Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo, 2009: 88.18 O Sistema Eletrônico de Editoração de Revistas (SEER), por exemplo, uma adaptação do Open Journal Systems (OJS) usado para gerenciar 11.500 publicações, como parte de um experimento (Public Knowledge Project) de três universidades americanas e canadenses sobre o “potencial de novas tecnologias”.
8
de uma retaguarda administrativa bem organizada e bem
estruturada; [permitindo], assim, uma avaliação mais completa da
qualidade global da publicação, uma vez que [asseguram] um
processo de gerenciamento bem mais transparente e controlado. 19
Exemplo é um software chamado CrossCheck, que grandes
editoras usam para localizar duplicação (texto já publicado),
plágio ou citação sem o devido crédito, através de comparação
com publicações em uma única base de dados com 30 milhões de
artigos de mais de 200 editoras.20 Reciclagem editorial, todavia,
é algo por demais complexo até mesmo para a melhor das
tecnologias. Hoje, a utilização de virtuosos softwares não
ultrapassa 10% de todo material submetido às grandes editoras.
Porcentagem que mesmo sendo maior, mesmo assim deixaria os
“grandes viabilizadores” bem longe de serem alternativa à
revisão por especialistas, apequenada sempre que a intenção é
descrever a editoração em cenários dominados pela tecnologia.
Recursos tecnológicos bem mais sucedidos são os pre-print
servers, como o arXiv – literalmente arquivo de provas de artigos
científicos – usado via acesso online nos campos da matemática,
física, astronomia, informática, biologia quantitativa,
estatísticas e finanças. Recurso que ajuda o autor a submeter
seu artigo ainda em fase bem preliminar da investigação,
permitindo acesso de outros pesquisadores ao texto, agilizando a discussão
e a colaboração conjuntas, ensejando avaliação por atores
especializados mesmo antes de o texto ser submetido a publicação
e formalmente escrutinado. 21
19 Trzesniak, op. cit., p. 99.20 http://www.elsevier.com/editors/perk/plagiarism-detection.
9
Os pre-print servers funcionam particularmente bem nas comunidades
de físicos, onde coexistem com modalidades mais tradicionais de
publicação em revistas. Encorajamos a exploração de suas
características em outras áreas, mas alertamos que podem não
funcionar onde mercado e patentes são determinantes, e onde a
publicação de estudos malfeitos pode ter consequências danosas
ou ensejar interpretações equivocadas. 22
4. EVOLUCIONISMO
Os partidários de ‘grandes viabilizadores’, por sua vez,
acreditam que antes das admiráveis tecnologias aparecerem podia-
se avaliar a qualidade do gerenciamento das revistas científicas
contando apenas com as “declarações dos editores”, ora
destronados em um contexto global de ‘interoperabilidade’. 23
Concluem que por força de disposições naturais a editoração
tende a “mudar ao longo do tempo”, submetida – particularmente
na América Latina – a um processo evolutivo de trajetória
caracteristicamente linear, incremental e progressiva.
Os desafios para os editores científicos, especialmente os da
América Latina, vêm mudando ao longo do tempo. Se em 1960-1980
[eram] simplesmente lançar algo parecido com uma revista capaz
de escoar a produção científica de uma determinada área ou
instituição, em 1990 [passaram] a ser normatizar e, nos anos
2000, indexar. E atualmente, em 2012? São ainda os mesmos de
21 No arXiv.org, hospedado e operado pela Cornell University, as provas podem ser avaliadas por moderadores, não catalogados na sua maioria, e ser submetidas para publicação em revistas, embora algumas permaneçam nessa condição.22 House of Commons Science and Technology Committee, op.cit., p. 26 (O grifo émeu. PSN).23 Em que todos os arquivos de informação científica, mesmo hospedados em máquinas e plataformas distintas, dispersas por todo o planeta, podem ser vistos como uma base de dados única.
10
1990 e 2000 os desafios da publicação científica? Nossa resposta
é não. Esses desafios já estão superados ou em fase de superação.
Propomos, para os próximos dez ou vinte anos, um mesmo, novo,
único desafio para todos os segmentos e atores envolvidos na
construção do conhecimento: a qualidade de conteúdo. 24
Na construção de conhecimento importaria apenas “análise de
conteúdo de pareceres científicos”, cujo objeto, virtude ou
personagem-chave decisivo é a qualificação do avaliador, o
protagonista do contexto propício à “produção de boas revistas”.
Conjuntura composta fundamentalmente de acréscimos: (1) elevação
da quantidade de revistas; (3) melhor atendimento às normas de
estruturação das revistas e apresentação dos artigos –
fortemente influenciado por sistemas de avaliação de docentes/
programas de pós-graduação 25, e bases de dados de texto completo
online 26. Tudo coroado por um terceiro acréscimo (“aspiração
máxima” dos editores latino-americanos e caribenhos), inclusão em
bases de dados e – notadamente quando indexadores passaram a oferecer
livre acesso online a textos completos – a consequente ampliação
da “visibilidade dos trabalhos publicados de um modo antes [...]
sequer sonhado” 27.
24 Piotr Trzesniak et al. Qualidade de conteúdo, o grande desafio para os editores científicos. Revista colombiana de psicologia, 21 (1), 2012: 58.25 Capes e CNPq, no Brasil, e Colciencias, na Colômbia. 26 Databases “autóctones”, como SciELO (Scientific Electronic Library Online, de FAPESP e CNPq, aparceiradas com BIREME – centro especializado da Organização Pan-Americana de Saúde e da Organização Mundial de Saúde) e RedALyC (Red de Revistas Científicas de América Latina y El Caribe, España y Portugal, cujo moto “La ciencia que no se ve no existe” enaltece o condomínio formado por Universidad Autónoma del Estado de México e centenas instituições de ensino superior e sistemas informacionais).27 Trzesniak et al., 2012: 58-60.
11
Com efeito, tímidas avaliações têm sugerido que, no
contexto de experimentos de “comunicação acadêmica sobre livre
acesso”, essas ferramentas facilitam (ou “têm potencial”) para
revitalizar periódicos com revisão por especialistas. 28
Determinante, no entanto, é a dependência das mesmas da
“colaboração entre os interessados” (stakeholders), “comunidades do
conhecimento” cujas relações são viabilizadas por uma
“infraestrutura cibernética e social” (serviços de Internet que
permitem integração funcional de websites e equipamentos móveis
às experiências existenciais, afetivas, úteis e significativas
dos usuários). Somente assim sistemas, produtos e serviços podem
estabelecer limites e determinar quando e se indivíduos e
instituições irão competir e/ou cooperar. 29
Entrementes, em América Latina e Caribe a corrente
evolucionista começa a notar que a “aspiração máxima” dos
editores pode ter-se transformado em grande frustração. Isso
porque os indexadores, não podendo dar conta do enorme crescimento
da quantidade de periódicos 30, resolveram selecionar e criar uma28 D. E. Atkins et al. Revolutionizing science and engineering through cyberinfrastructure: Report of the National Science Foundation Blue-Ribbon Advisory Panel on cyberinfrastructure. National Science Foundation, 2003; Brian D. Edgar & John Willinsky. A survey of scholarly journals using Open Journal Systems. Scholarly and Research Communication, 1 (2), 2010. Disponível em http://src-online.ca/index.php/src/article/view/24/4.29 Cf. D.E. Atkins, Cyberinfrastructure and the next wave of collaboration. Disponível em http://deatkins.blogs.com/dan_atkins_weblog/cyberinfrastructure_initiatives/Atkins%2520%2520Educause%2520Final.pdf30 Na América Latina e Caribe o último estudo detalhado e compreensivo sobre o assunto, à exceção dos periódicos de ciências sociais e humanidades, data de 1962. Mais recente somente relatórios e resenhas restritas a determinados países, sub-regiões, aspectos específicos, seleções de títulos ou revistas individuais. Há também fontes de informação bibliográfica como serviços de informação e bases de dados internacionais sobre determinados títulos, incompletas e inexatas quanto à produção total de países periféricos no contexto global. A tendência de cobertura relativa dos periódicos latino-americanos por essas fontes, ao menos até a chegada de bases autóctones, era
12
“casta de revistas indexadas”, que, supervalorizadas, mesmo sem ter
“nada de excepcional”, se tornaram o destino preferido não só
dos melhores, mas também de “qualquer manuscrito”. O resultado tem
sido aumento da taxa de rejeição, da dificuldade de um artigo
ser aceito, e a criação da aura quase mística que essas revistas
usufruem. 31 Misticismo condicionado, na realidade, pelo mercado
editorial cada vez mais competitivo – a empresa líder mundial na
publicação de artigos médicos e científicos, por exemplo, recebe
anualmente três milhões de artigos, dos quais metade é rejeitada
(os periódicos ‘top de linha’, Cell e The Lancet, publicam 20
artigos semanalmente e rejeitam 95% das submissões). 32
5. ÊNFASE NA VALIDADE
A existência de “castas indexadas” não constitui, na
verdade, um problema. Autores dispõem de ampla gama de revistas
para publicar, e pode, caso o artigo seja recusado, esgaravatar
até encontrar uma revista que aceite o texto. Processo
geralmente demorado que estorva o ideal de divulgação célere da
descoberta científica. Razão pela qual os pesquisadores cada vez
mais consideram submeter seus artigos diretamente a ‘revistas-
repertório’ 33, não focadas no potencial impacto do artigo, mas
na validade 34 da pesquisa, em se os resultados e a metodologia
proposta justificam as descobertas e as conclusões apresentadas.
de queda (menos de 22% dos títulos do Ulrich's Directory, por exemplo). Ana Maria Cetto e Octavio Alonso-Gamboa. Scientific periodical in Latin America and the Caribean: A global perspective. Interciencia. 23(2), 1998: 36-48.31 Trzesniak et al., 2012: 60-61. 32 http://www.elsevier.com/about/at-a-glance33 Repositories of knowledge, em inglês, diferentes de ‘arquivos’, pois os artigos nela contidos são suscetíveis a revisão por especialistas.34 Uma pesquisa é válida se as conclusões decorrem logicamente das premissas e os estágios do argumento são metodologicamente coerentes.
13
O especialista deixa de avaliar, portanto, tentando adivinhar a
relativa importância da pesquisa ou o provável interesse que o
artigo possa suscitar. Com isso reduz não só sua margem de
subjetivismo, a pressão sobre si mesmo e o tempo entre a
submissão e a publicação do artigo.
Revista-repertório exemplar é a PLoS ONE, lançada em 2006
para “desafiar a academia e sua obsessão por fatores de impacto"35. Quatro anos mais tarde já publicava 6.700 artigos e alcançava
o primeiro lugar no mundo para periódicos baseados em peer review;
a taxa de publicação foi altíssima (69% de todos os artigos
submetidos, sendo que 40% do restante foram publicados por
outras revistas).36 Dos editores se exige apenas que a pesquisa
seja séria e rigorosa; o autor não é obrigado a rever ou refazer
o artigo de modo a alcançar uma classificação mais elevada nem
que encaminhe o paper a um periódico de menor calibre.
Evidências consideradas “impressionantes” pelo Comitê de Ciência
e Tecnologia do parlamento britânico, satisfeito com crescimento
do número de revistas-repertório online de qualidade.
As revistas-repertório tendem a acelerar o ritmo de comunicação
das pesquisas e assegurar que todo trabalho cientificamente
válido seja publicado, não importando as percepções acerca de
sua importância. Há que reconhecer, no entanto, a relativa
novidade do modelo, sua rápida evolução e, por conta da cobrança35 Jim Giles. Open-access journal will publish first, judge later. Nature, 445 (7123), 2007: 9.36 Primeiro lugar inclusive em termos de impacto das revistas – em determinadasáreas, mas não não em outras (cf. http://www.gcu.ac.uk/library/PILOT/publication/publishing_17.html). A revista-repertório PLoS ONE (http://www.plosone.org) é publicada pelo Public Library of Science, um projeto sem fins lucrativos para criar uma biblioteca de revistas e literatura cientifica de acesso livre e conteúdo aberto (i.e., que pode ser reproduzido, reutilizado, revisado e redistribuído sem violar direitos autorais).
14
de taxas de publicação, sua vulnerabilidade a abusos. O
essencial, porém, é a manutenção do alto nível [focado na
validade] da revisão por especialistas. 37
Todos esses desenvolvimentos são completamente perdidos de
vista pela perspectiva evolucionista, fixada em indexadores e na
supremacia de castas de revistas de elite. Acentuam-se, dessa
maneira, questões menores, mas árduas, como a emergência de
‘práticas ruins’: (a) fixação de números mínimos de artigos
publicados anualmente, pelas agências de fomento à pesquisa para
financiar revistas, assim como pelos próprios indexadores para
incluir publicações em seus acervos; (b) ênfase na quantidade de
artigos publicados em revistas, da parte das mesmas agências,
para avaliar a produtividade de pesquisadores e programas de
pós-graduação; (c) popularização de programas de processamento
de textos e de softwares de análise estatística computadorizada, o
que, de um lado, facilitou a tarefa de dar uma aparência
profissional a qualquer artigo ou revista, e, de outro,
propiciou uma “pseudorretaguarda estatística” para informações
inconsequentes, absurdas, ou até mesmo falsas, revestindo-as de
credibilidade. 38
Práticas que por sua vez ensejam sentimentos diametralmente
contrários às percepções de evolução natural e positiva da
editoração científica. Por exemplo, enquanto na era pré-
digitalização artigos de “qualidade aquém da desejável” seriam
“poucos e raros” e, rapidamente repudiados, atualmente
estaríamos correndo o risco de uma “inversão”. Ou seja, “artigos
de boa qualidade” seriam “tão poucos e raros” que se tornariam37 House of Commons Science and Technology Committee, op. cit, p. 32.38 Idem, p. 62.
15
objeto de discussão muito rapidamente e, sendo minoria, quem
sabe “até de repúdio”. Inversão que, de um lado, invalida o
“pressuposto de que apenas o que tem qualidade é processado e
publicado com aparência de sério”, e, de outro, representa um
urgente chamamento à “mobilização consciente da comunidade
científica”. Nada a ver, no entanto, com “aspectos técnico-
normativos”, de vez que prazos, estruturação administrativa das
revistas, política editorial, instruções aos autores, etc. “não
se constituem mais em desafios”, a não ser para “editores
iniciantes” (p. 71).
6. OBSESSÃO POR IMPACTO
Na realidade, porém, mesmo publicações consagradas
enfrentam desafios técnicos e normativos, conforme verifica a
Diretoria de Estudos Educacionais (DIRED/MEC) a partir dos
relatórios das instituições que aferem a qualidade dos veículos
de difusão da produção acadêmica brasileira e os classificam.
Caso do “mais antigo periódico na área de educação do país”,
publicado pelo INEP 39, que ostenta “clara” política editorial,
39 A cargo de uma “assessoria técnica” de “preparação de originais e de programação visual”, e de “colegiados de especialistas” responsáveis pela qualidade editorial e de conteúdo das publicações. MEC/ INEP. Assessoria Técnica de Editoração e Publicações: estrutura, funcionamento e produtos,
16
editoria científica com pesquisadores de “grande reconhecimento
nacional”, projeto gráfico “excelente”, “rica” diversificação
temática, e prazo médio de avaliação de artigos bem inferior à
média internacional.40 O que não bastou, no entanto, para que a
revista fosse incluída no ambicionado “estrato indicativo de
qualidade A1” 41 do sistema Qualis/Capes, cuja escala de
preferência de periódicos determina também a avaliação dos
programas de pós-graduação do país 42.
Essa escala decrescente depende de um controverso elemento,
o ‘fator de impacto’ JCR 43, instrumento “nem sempre confiável”,
segundo a Associação Europeia de Editores de Ciência, que o
recomenda para mensurar e comparar apenas e cum grano salis a
influência de revistas, não de artigos individuais, menos ainda
de pesquisadores e programas de pesquisa. Um reparo
justificável, pois apesar de o tal fator ter sido concebido para
mensurar exclusivamente o impacto de periódicos (medida da
frequência pela qual o ‘artigo médio’ de um periódico foi citado
em determinado ano ou período), acabou regulando também a
qualidade de revistas, artigos e até mesmo da produtividade de
pesquisadores. Fatores de impacto de revistas dependem, na
verdade, de tecnicalidades e não da qualidade científica dos
2010.40 Comissão de avaliação, Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação. Formulario de avaliação, 2012. 41 Publicação amplamente reconhecida, atendimento às normas ABNT, ampla circulação, mínimo de 3 números e 18 artigos por ano, indexação por ao menos 6bases de dados (das quais 3 internacionais), etc.42 Como na Alemanha, Itália e Finlândia, país em que, por exemplo, um artigo com impacto ‘3’ em vez de ‘2’ significava, no ano 2000, mais dinheiro na dotação de um hospital. David Adam. The counting house. Nature. 14 Fev., 415 (6873), 2002: 726–729.43 Journal Citation Reports, publicação anual da Healthcare & Science, divisão da Thomson Reuters, empresa multinacional de mídia e informação baseada em Nova York.
17
artigos publicados; estão condicionados também ao campo de
pesquisa, em particular de amplas áreas de pesquisa em expansão,
cuja rarefeita literatura utiliza muitas referências por artigo.
As disfunções desse instrumento têm sido listadas cada vez
mais frequentemente 44:
(a) os fatores de impacto de um periódico e dos artigos que
publica não são estatisticamente representativos; (b) a
correlação entre fator de impacto do periódico e as citações dos
seus artigos é baixa; (c) os autores consideram diversos
critérios para submeter seus artigos além do fator de impacto de
uma revista; (d) as bases de dados equivocadamente incluem
citações de itens ‘não referenciáveis’; (e) no cálculo de fator
de impacto não se corrigem as autocitações; (f) resenhas
costumam ser muito citadas e inflacionam o fator de impacto dos
periódicos; (g) artigos mais longos são mais citados e
contribuem para elevar o fator de impacto de um periódico; (h)
espaçar citações ajuda a utilização de autocitações e a elevar o
fator de impacto do periódico; (i) citações no idioma nacional
do periódico são preferidas; (j) citações de artigos do mesmo
periódico são preferidas; (k) bases de dados possuem cobertura
incompleta; (l) bases de dados não incluem livros como fonte de
citação; (m) bases de dados têm preferência pelo idioma inglês;
(n) bases de dados são dominadas por publicações americanas; (o)
fator de impacto é função do número de referência por artigo em
determinado campo de pesquisa; (p) campos de pesquisa cuja
literatura rapidamente se torna obsoleta são favorecidos; (q)
fatores de impacto dependem da dinâmica (expansão ou contração)
do campo de pesquisa; (r) a tendência de campos de pesquisa
pequenos é não contar com periódicos de alto impacto; (s)44 Per O. Seglen. Why the impact factor of journals should not be used for evaluating research. British Medical Journal, 314, 1997. Disponível em http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC2126010/pdf/9056804.pdf
18
relações entre campos de pesquisa (e.g., pesquisa clínica x
pesquisa básica) são muito determinantes para o fator de impacto
dos periódicos; (t) a taxa de citação dos artigos determina o
impacto do periódico, mas não vice-versa.
Malgrado tanta evidência negativa, o fato é que – na
opinião da EASE (Associação Europeia dos Editores Científicos) –
o uso indiscriminado de fatores de impacto continua decidindo “o
preenchimento de vagas e promoções na academia, a outorga de
bolsas e a alocação de recursos para projetos de pesquisa”, e
causando por isso mesmo “grandes injustiças” 45. Na Europa, assim
como na China, onde “mudanças ocorrem lentamente” e ainda mais
devagar quando se trata de desenvolvimento científico. Algo que
se reflete, segundo cada vez mais pesquisadores insatisfeitos,
nas decisões dos gestores que insistem em “alocar recursos
medindo o impacto dos periódicos”. 46 Caso das revistas de
química orgânica, que já contribuíram muito ao desenvolvimento
social, mas que hoje, por conta da “obsessão com fatores de
impacto” e da pesquisa focada em conceitos efêmeros, parecem
envolvidas numa “feira de vaidades”. Mesmo assim, os fatores de
impacto devem ser vistos como medidas objetivas, menos sujeitas
a viés, das quais não se pode prescindir “sem regredir ao tempo
45 EASE Impact Factor Statement. Disponível em http://www.ease.org.uk/publications/impact-factor-statement. No Brasil, alegando ampla difusão mundial “no âmbito das agências de fomento de pesquisa”, ainda se considera que a forma correta de “avaliar a qualidade de uma publicação” é medir o “nível de interesse” de outros pesquisadores e a partir daí resolver a “demanda por financiamento para atividades científicas”.http://bc.bireme.br/f_impacto.htm. Cf. também Herton Escobar, Ranking coloca revistas científicas brasileiras em 'risco de extinção’. O Estado de S. Paulo, 6 Jul. 2009.46 Uma saída talvez fosse espaçar por um período superior a dois anos o cálculoo fator de impacto, para “confirmar que a pesquisa resistiu ao teste do tempo”. Nai-Xing Wang. China's chemists should avoid the Vanity Fair. Nature 476, 2011: 253 (texto condensado). Disponível em http://www.nature.com/news/2011/110817/full/476253a.html
19
em que se financiava pesquisa para favorecer amigos e
protegidos”.
A relação entre essa medida – com a vantagem adicional de
aliviar os encargos que recaem sobre os especialistas na revisão
– e a qualidade das revistas científicas deve ser, portanto,
melhor conhecida, preocupação subjacente às conclusões da
DIRED/MEC:
No sentido de acompanhar a evolução tecnológica que permeia a
atualidade, e de ampliar o seu nível de qualidade e atuação, a
partir da introdução de elementos inovadores do ponto de vista
conceitual, normativo, e de gestão, considera-se necessário
promover mudanças na linha editorial do Instituto [mediante] a
realização de estudos analíticos/ avaliativos dos componentes,
critérios e procedimentos adotados de modo a potencializar a
linha editorial do Instituto, possibilitando ampliar o seu campo
de abrangência, maior capilaridade, melhor qualidade editorial e
reconhecimento da comunidade acadêmica nacional e internacional,
além de possibilitar uma maior disseminação e publicização de
estudos e pesquisas educacionais, através da proposição de
melhorias. 47
Sentimentos justificados pela ocorrência de problemas
menores, porém recorrentes, expressos através de “sites difíceis
de navegar”, da ausência de “sistema de estatísticas” e
“contador de acesso de artigos”, de poucos “indexadores
nacionais e internacionais”, etc. Questões que podem se
complicar à medida que os editores perdem a memória organizacional,
esquecem como as coisas devem ser feitas e já não podem fazer
mais caso dos conceitos, da experiência e do know-how acumulado
47 Projeto BRA/04/049, Termo de referência nº 137877 (O grifo é meu. PSN).
20
por sua função. 48 Tanto que dão a impressão de terem se
transformado em simples “controladores de fluxos” 49 submetidos
às exigências da produtividade, fonte das “práticas ruins” acima
mencionadas, e à clientela que precisa publicar para “demonstrar
qualificação na hora de pleitear um cargo acadêmico ou uma
promoção”.
Antes, as faculdades aceitavam currículos com apenas um artigo
publicado, ao passo que hoje em dia exigem pelo menos um livro.
Outras não aceitam menos que dois livros e artigos extensos, com
dimensões de livro. Os comitês departamentais de admissão e
promoção, ao contrário das editoras, dão muito pouco valor à
publicação de coletâneas, livros-textos, manuais e periódicos de
uso geral. Caso de discrepância prejudicial aos docentes mais
jovens em particular, porém também a todos que concebem e
executam projetos científicos. 50
Os problemas da editoração têm a ver sim com
desenvolvimento tecnológico, e quem sabe até mesmo com a
“degradação” do trabalho editorial desvestido das habilidades
que no passado não muito distante deram a seus executores uma
gloriosa autoimagem coletiva. 51 Caso de ‘lendas vivas’ que, sem
que o leitor notasse, transformavam textos, ajeitavam
argumentos, corrigiam a redação dos seus autores.52 Hoje, porém,
48 Arnold Kransdorff. Corporate amnésia. Keeping know-how in the company. Butterworth Heineman, 1998.49 Flavia Alves Bravin, diretora editorial, Editora Saraiva (comunicação pessoal). 50 The future of scholarly publishing, 2002.51 Harry Braverman. Trabalho e capital monopolista. A degradação do trabalho no século XX. Zahar, 1981.52 The New Yorker - Mr Shawn's New Yorker (1951 - 1987). Disponível em http://h2g2.com/dna/h2g2/alabaster/A21723202.
21
não são editores sem habilidades artesanais e carisma nem a
tecnologia que põem em risco o trabalho editorial, mas o fato de
ser conduzido por “profissionais só de nome” numa indústria
carente de “padrões de competência”, constituída de “aspirantes
a profissional”, sem formação específica, acreditação, registro
legal e associativo. 53 Situação alarmante que abona a crença na
possibilidade de pesquisadores serem editores tão razoáveis
quanto os outros, tão amadores como eles, somente porque seus
conhecimentos e experiência são reconhecidos pela academia. 54
Acredita-se, ademais, que essas carências podem ser
compensadas através de apelos edificantes aos (1) autores (devem
estar “absolutamente certos de que o conteúdo do que estão
submetendo é bom, construtivo e consequente”); (2) revisores
(precisam se engajar “dedicadamente na avaliação do trabalho” e
verificar que “não se trata de um aventureiro, um mosaico” ou
algo “apenas metodologicamente correto”); e às (3) agências de
fomento (devem privilegiar a qualidade e entender que as
ciências sociais e humanas “não são reféns dos indexadores
comerciais do hemisfério norte”, e que “estar incluído em uma
base autóctone importante (SciELO ou RedALyC) é tão
significativo e eficaz quanto fazer parte daqueles”.
Surpreendentemente, como se todo o processo editorial pudesse
ser resumido a uma única contradição insolúvel, considera-se que
53 Cf. Barbara Horn. Society for Editors and Proofreaders [Reino Unido]. Disponível em http://www.sfep.org.uk/pub/train/cpd.asp..54 Diferentemente de simples amadores, ‘profissionais’ adquirem as competênciasnecessárias à execução de determinado tipo de trabalho, são examinados segundopadrões e conhecimentos próprios a essas competências, e reconhecidos como competentes por entidades que governam as qualificações, a identidade e as formas de incorporação a diferentes categorias profissionais regulamentadas por títulos obrigatórios que garantem a posse das competências necessárias.
22
ao fim e ao cabo tudo depende de uma só pessoa, o editor, “o
maestro desse processo” cujo “resultado final, bom ou mau, é sua
inteira responsabilidade”. 55
7. O DESAFIO DA ESPECIALIZAÇÃO
A tendência determinante da editoração científica
globalmente não é essencialmente tecnológica – à exceção talvez
da onerosa novidade que introduz “viabilizadores” do tipo
plataformas-múltiplas do tipo XML, para reduzir tempo e custos
de editoração 56 – nem dependente de atores-chave. Atualmente, o
fulcro do trabalho editorial, e a principal fonte de
preocupação, são os serviços especializados de fontes independentes
que executam tarefas com eficiência e reduzem pressões de
custos. Fundamentais porque mais do que simplesmente transferir
atividades ou setores é preciso sempre, na opinião dos
especialistas, capacitar o pessoal da casa a interagir com o agente terceirizado,
supervisionando e garantindo a qualidade do seu serviço 57.
Algo que o INEP, mais exatamente a sua assessoria técnica
de preparação de originais e programação visual, tem feito com
sucesso, conforme atesta o desempenho de setores que às agências
externas chamam a atenção por sua “excelente qualidade”. 58 Mesmo
assim permanece, na prática e mentalmente, “o receio de que tudo
55 Trzesniak et al., 2012: 72-73.56 Alexander B. Schwarzman et al. XML-centric workflow offers benefits to scholarly publishers. Disponível em http://people.ischool.berkeley.edu/~glushko/202/Schwarzman-XML-CentricWorkflow.pdf57 Karina Mikhli, Migrating to digital publishing? Answers from the experts. Disponível em http://publishingperspectives.com/2011/10/digital-publishing-answers-from-experts58 Comissão de avaliação, op. cit., 2012.
23
fique terceirizado” 59, razão pela qual é preciso buscar soluções
em um quadro inovador, de permanente aprofundamento e aperfeiçoamento
da convivência com serviços especializados.
Nesse processo, elementos inovadores podem ser assimilados
de modo seguro e rapidamente à medida que se constroem
salvaguardas contra precarização ou terceirização. Esta, para
desgosto de muitos analistas, “continua crescendo em todas as
atividades, atingindo também de forma intensa o setor público”;
boa parte deles, com efeito, acha que a terceirização se
transformou numa “epidemia”, numa modalidade de gestão e
organização do trabalho a exigir “maximização do tempo, altas
taxas de produtividade, redução dos custos com o trabalho e
‘volatilidade’ nas formas de inserção e de contratos”. 60
Condições que os sindicalistas, por sua vez, identificam com
rebaixamento de direitos, deterioração das condições e relações
de trabalho, e com a “total liberdade do mercado como regulador
da economia" 61.
A convivência com serviços especializados, vista dessa
perspectiva, torna-se um problema cuja aparente solução está há
mais de uma década emperrada no Congresso Nacional. Alternativa
legisferante que, se aprovada, extinguiria diferenças de salário
e jornada, de benefícios, ritmo de trabalho, condições de saúde
e de segurança. Tornaria compulsório, ademais, o pagamento
imediato de salários, décimo-terceiro, férias, recolhimento de59 Sentimento recorrente nas entrevistas e questionário aplicados durante o estudo. 60 Graça Druck. Trabalho, precarização e resistências. Novos e velhos desafios?Caderno CHR, vol. 24 (nº esp. 1), 2011: 37-57. Disponível em http://www.scielo.br/pdf/ccrh/v24nspe1/a04v24nspe1.pdf.61 CUT e Dieese revelam dados nefastos da terceirização em audiência no TST. Disponível em http://www.seebt.com.br.
24
FGTS, etc. 62 Entrementes, a Justiça admite a “responsabilidade
solidária” 63, e contém o ímpeto da convivência com serviços
especializados como fator estabilizador de inovações, processos e relações de
trabalho, preterindo-a em favor de medidas jurídicas,
desconsiderando diante da veneração de subterfúgios
tecnológicos.
Do ângulo deste estudo, porém, a correta abordagem do
desenvolvimento do processo editorial na atualidade manifesta-se
com absoluta nitidez – do mesmo modo que na cultura e na
organização do referido processo – através de tendências
internacionais que acentuam a responsabilização dos protagonistas. A
começar pela obrigação de quem edita periódicos científicos de
garantir, não um quimérico “resultado final”, mas o adequado
62 PL-4302/1998; PL-4330/2004; PL-1621/2007; PL-6832/2010. PL “alternativo” reflete compromisso entre governo federal e Ministério Público do Trabalho, trocando mão de obra terceirizada por 2,4 mil cargos, a maioria analistas de Controle Interno do Sistema Único de Saúde, vinculados ao Departamento Nacional de Auditoria do SUS. Jornal A Tarde, 27 Mar 2013.63 O empregado escolhe acionar a contratada ou a contratante, em conjunto ou isoladamente, a seu exclusivo critério. Movida a ação contra a contratante e tendo o empregado êxito, a execução será direcionada exclusivamente contra a empresa contratante, sem qualquer responsabilidade da contratada.
25
treinamento de autores, revisores 64 e peers 65 para desempenhar
seus papeis em nível profissional. O que inclui responsabilizar
– as agências financiadoras em primeiro lugar – mais do que
simplesmente pelo treinamento, pela formação de revisores e
especialistas iniciantes, incluindo os prestadores de serviços
especializados. 66
Ao acentuamos responsabilidade este estudo quer destacar a
finalidade da editoração e o interesse de seus protagonistas na
confiabilidade e reprodutibilidade da publicação científica.
Reprodutibilidade em particular, que deve ser encarada como
‘padrão-ouro’ da publicação científica, modelo de perfeição/
excelência a que revisores, especialistas e editores se referem
quando ao avaliam o conteúdo de um artigo, dando ênfase a sua
utilidade na construção de argumentos ou experimentos de outros
pesquisadores. Daí o princípio da completa transparência e ampla
disponibilidade dos dados e informações necessárias à pesquisa
científica, acentuadamente quando financiada com recursos
públicos, refletindo o compromisso do pesquisador e sua obra com
a "formação da consciência pública esclarecida". 67
64 No uso correto das normas, na correção de erros e inconsistências textuais, na correção de erros tipográficos.65 Informando o estado da arte da pesquisa sobre revisão por especialistas, esclarecendo o que vem a ser uma boa revisão por especialista, ajudando a entender o interesse da editoração no trabalho do revisor e a produzir uma revisão adequada. R. Rennie. Editorial peer review: its development and rationale. In F. Godlee & T. Jefferson (org.), Peer review in health sciences. BMJ Books, 2003:1-13; E. Wager, F. Godlee & T. Jefferson. How to survive peer review. BMJBooks, 2002.66 Ansiedade expressa de forma recorrente nas entrevistas e questionário aplicados durante o estudo. 67 Lourenço Filho, o primeiro diretor do INEP, citado por Manoel M. Maciel Formiga. Política editorial do INEP. Revista de Biblioteconomia, 17 (2), 1989: 285-290.
26
Outro aspecto, em decorrência de confiabilidade e
reprodutibilidade, é a repercussão da pesquisa na comunidade
científica, que a peer review antecipa, mas que só se confirma por
uma forma suplementar de revisão, medida pelo impacto acadêmico.
Um processo de análise e comentário pós-publicação viabilizado pela
comunicação online através do amplo intercâmbio de links aos
artigos, que ajuda a divulgar pesquisas interessantes
globalmente, propiciando e agilizando opiniões e revisões por
parte de uma audiência sem limites de fronteiras 68. Interação
que utilizada com responsabilidade, parcimônia e considerando
que nenhuma medida de impacto substitui a leitura de um artigo,
pode contribuir ademais para expor de forma rápida e barata os
problemas e as potenciais deficiências dos artigos e periódicos.
8. CHOQUE DE CULTURAS
Há mais de duas décadas o INEP enfrentava problemas de
editoração (impressa) bem diferentes de hoje em dia.
Ao longo dos últimos anos tomou-se bastante difícil realizar um
programa de trabalho coerente com as necessidades, para o INEP
em geral e para a sua editoração, em particular. Os recursos
financeiros que lhe eram destinados tomavam praticamente
impossível atender às despesas concernentes à feitura das
publicações. E mesmo quando se chegava ao produto final,
esbarrava-se em entraves que afetavam seriamente a circulação.
Não basta apenas registrar, publicar. Há todo um trabalho de
divulgação e distribuição do que se publica. E isto nem sempre é
fácil: fazer chegar às mãos daqueles que são, naturalmente, os
usuários potenciais das informações que se quer divulgar. Para a
68 Vale acentuar, nesse particular, o cuidado dos editores e revisores das revistas-repertório em melhorar a formatação, a linguagem e a precisão dos resumos dos artigos publicados.
27
iniciativa privada esse problema praticamente não existe, já que
ela dispõe de um elaborado processo de marketing. E, além disso,
os recursos empregados retomarão com lucros que um órgão público
não pode visar. [Razão pela qual, muitos periódicos de repente
deixaram de circular] por total falta de condições de suportar o
peso dos custos de produção cada vez mais crescentes. As
próprias instituições universitárias não têm – na maioria das
vezes – respaldo financeiro para manter uma publicação que
divulgue os trabalhos de seus pesquisadores e professores. [Eles
mesmos testemunham] que, muitas vezes, é mais fácil publicar no
Exterior; ou pela insuficiência de revistas nacionais que
divulguem seus trabalhos ou ainda – e esta é outra vertente da
dificuldade financeira da publicação – por não se valorizar
adequadamente a produção intelectual. 69
Sem embargo, a causa dos problemas da editoração em órgãos
públicos não era a falta de marketing ou a pouca sensibilidade
dos editores brasileiros. O miolo da noz foi a desregulamentação
(atos e processos de transferência ou redução da regulamentação
estatal) que no começo dos anos setenta ensejou transformações
nos países centrais: estagnação dos setores-chave da economia,
taxas explosivas de expansão do crédito, proliferação de ativos
financeiros, declínio das taxas de investimento fixo, e
crescimento desequilibrado dos setores de serviços. 70 O Brasil,
nessa época, como hoje em relação à crise de 2008, de início não
sentiu os efeitos da transição, além do impacto de uma de suas
resultantes, a dívida externa, suficiente para exacerbar, no
final da mesma década, o desequilíbrio entre setor público e
69 Idem, p. 288 (O grifo é meu. PSN). 70 Howard M. Wachtel. The money mandarins: the making of a supranational economic order. Pantheon Books, 1986; Pedro Scuro Neto. Trinta anos de Formação econômica do Brasil. In: Novos Rumos, 14, 1989: 103-121.
28
setor privado. Em particular quando as empresas foram
autorizadas a quitar antecipadamente junto ao Banco Central suas
obrigações com os credores estrangeiros, estatização do
endividamento privado que “acelerou a inflação, reduziu o ritmo
da economia, debilitou o planejamento estatal”. Desse modo, “ao
abrigo da desvalorização cambial e das altas taxas de juros no
mercado internacional, o setor privado ia se ajustando com
medidas de reestruturação defensiva (demissões, arrocho, repasse
de custos, sobretrabalho etc.), enquanto o setor público
acumulava disfunções” 71 – como as que na época sentiram o INEP e
sua editoração.
De lá para cá, desde que uma reforma monetária, o ‘Plano
Real’, mostrou o caminho também para uma reforma administrativa,
a dinâmica do quadro institucional brasileiro mudou e com ela as
características e as consequências dos problemas. Basicamente,
incorporou-se o generalizado otimismo global em relação à
capacidade da engenhosidade científica de resolver as coisas, em
particular pela inovação tecnológica, muito especialmente a
tecnologia da informática, veículo de globalização do
conhecimento, gerenciamento eficaz, mas também de falsas
impressões. Deslumbramentos que deram origem, no campo dos
negócios, ao “boom do ponto-com” dos anos 90 e, na década
seguinte, às “bolhas” de investimento imobiliário, por conta da
ilusão que os imóveis continuariam valorizando indefinidamente
num mundo dirigido pela tecnologia. Com a editoração, e a sua
própria explosão de expectativas (“boom do ponto-edu”), não
podia ser diferente, refletida, só para dar um exemplo, pelo
71 Pedro Scuro Neto. Gestão pública: fluxo e refluxo. In: Estudos Avançados, 9 (23), 1995: 132-133. Disponível em http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0103-40141995000100009&script=sci_arttext.
29
crescimento do número de revistas científicas eletrônicas de 325
para algo em torno de 5 mil a 10 mil, em somente três anos 72.
Todas essas mudanças tiveram início com a
desregulamentação, o progresso da tecnologia da informática –
desde a década de 70 aos anos 2000 –, de um lado, e a relativa
estagnação de setores importantes como energia, transportes,
medicina, materiais, e aeroespacial, de outro – aos quais os
humanistas e cientistas sociais ajuntariam também as suas áreas
do conhecimento. Atualmente, o cenário é de recuo diante de uma
cultura disposta a riscos e desbravamento, característica
daqueles quarenta anos, em favor de outra, mais cautelosa,
segura e regulada. Uma cultura menos ‘tecnológica’ e mais
voltada a habilidades básicas – como a capacidade de gerenciar
“aspectos técnico-normativos” da editoração, que o evolucionismo
tecnicista, inconsciente da estagnação e suas consequências,
vivendo à custa de instituições acréscimo-dependentes, considera
“superados”.
9. TECNOLOGIA EDITORIAL
Esse choque de culturas incorporou-se às intenções da
DIRED/MEC através da preocupação em “promover mudanças
[conceituais, normativas e gerenciais] na linha editorial” do
INEP, acompanhando “a evolução tecnológica que permeia a
atualidade” que, de fato, é condicionada por uma conjunção de
elementos. A moderna tecnologia, nomeadamente a tecnologia da
informática, revolucionou a editoração quando a revistas
científicas mais conceituadas foram obrigadas a adotar submissão72 Ann Okerson, bibliotecária da Universidade de Yale (vide nota nº 1), sem esclarecer se as estimativas se referem apenas a publicações de países centrais ou anglo-americanas.
30
e revisão online, reduzindo o tempo de publicação,
particularmente devido à agilização da revisão por
especialistas. Não admira, portanto, que dentre todos os
estágios do processo de editoração esse tenha se constituído no
alvo dos investimentos e da inventividade das maiores editoras
de publicações científicas do mundo. Na realidade, a revisão por
especialistas hoje em dia é um subproduto característico do
intensamente competitivo universo da editoração científica, em
que milhares de periódicos competem para publicar os artigos de
milhões de pesquisadores.
A Elsevier, por exemplo, hoje em dia conta com sete tipos
diferentes de inovações em matéria de revisão por especialistas:
PeerChoice (software que permite adequar um artigo à capacidade e
ao interesse do especialista), scientific screening (processo de
seleção de artigos fora de foco e ‘subpadrão’ que de outra forma
seriam submetidos a pareceristas), review sharing (encaminhamento
automático de artigos rejeitados para outra revista),
ReviewerFinder (software para expandir a opção de pareceristas e
também diminuir a carga dos especialistas mais antigos), reviewer
mentor programme (treinamento, supervisão e certificação de
estagiários de pós-doutorado no ofício de revisão, a cargo de
especialistas traquejados), author feedback (para que o autor tenha
clareza sobre a fase em que está seu artigo no processo de
revisão, quando será publicado ou a razão de ter sido recusado),
open peer commentary (resenhas seguidas de cinco comentários de uma
página cada e breve réplica do resenhista no final).73
73 Mayur Amin. Vice-presidente sênior de pesquisa e relações acadêmicas, Elsevier (comunicação pessoal).
31
Outro aspecto da experiência ‘mercadológica’ das revistas
científicas – que tem a ver também com peer review – é a tendência
de oferecer acesso amplo e gratuito custeado pelos autores, que
pagam – caso da revista da Optical Society of America, com 17
mil membros e 230 corporações filiadas – $ 135 pelo parecer e
mais $ 800 se o artigo for aceito. Ao mesmo tempo, no entanto,
que isso serve de garantia para a continuidade e a qualidade da
revista, porém afasta o pesquisador que tem como publicar em
outros periódicos. Incentiva, por outro lado, o surgimento de
revistas que, graças à Internet, conseguem romper o liame entre
publicação e a forma convencional de encarar revisão por
especialistas. O pesquisador que usualmente mandava versões
provisórias de um artigo seu ainda não publicado (pre-print),
agora tem à disposição arquivos eletrônicos (archives),
verdadeiras revistas científicas independentes online. No mesmo
sentido, desenvolveu-se um software para pré-prints, como o
arXiv, que ajuda o autor a submeter a seus colegas uma versão
preliminar do artigo e tirar o máximo proveito de discussão e
colaboração conjuntas. 74
A utilização de pré-prints ainda é tímida no campo das
ciências humanas e sociais, onde continua restrita à iniciativa
de autores e pequenos círculos de pesquisadores, carecendo as
editorias de mais informação e iniciativa para romper com
normas, estruturas, critérios e procedimentos aferrados à noção
de editoração científica como mera “prestação de serviços” 75.
Serviços que podem ser prestados a contento por amadores
74 Vide pp. 5-6.75 Associação Nacional de Pós-graduação e Pesquisa em Administração. Boas Práticas da Publicação Científica: um manual para autores, revisores, editores e integrantes de Corpos Editoriais. 2010.
32
imbuídos das melhores intenções em relação à academia e à
própria ciência. Razões pelas quais “a interação online entre
pesquisadores, fora do espaço tradicional dos periódicos, está-
se tornando cada vez mais importante para a comunicação
científica” 76. Interação que aponta, ademais, o caminho para a
tomada de novas decisões em relação ao processo de produção
editorial cada vez mais eficiente na disseminação de
conhecimentos importantes mensurados na base não apenas do
significado e novidade da descoberta científica 77, como também
(e provavelmente mais ainda) da validade da pesquisa através da
qual foi revelada.
PSN, Brasília/São Paulo, abr. 2013.
76 James Hendler. Reinventing Academic Publishing, Part 3. IEEE Intelligent Systems, 23(1), 2008: 2-3.77 J. Scott Armstrong, op. cit., vide nota nº 14.