feira agroecológica, promovendo a economia solidária, segurança alimentar e a geração da...

2
É sexta-feira, são três e meia da madrugada no sítio Rosto, o sol ainda não nasceu, mas Gessi já está de pé. Dentro do cesto de palha, ele coloca o que foi colhido na horta de casa: alface, cheiro-verde, cebolinha, tomate cereja, chuchu e maracujá. O balaio vai em cima da bicicleta e, pedalando até o centro da cidade, o agricultor chega a feira na rua dos Cariris, onde dezenas de produtores preparam barracas e prateleiras, ordenando a mercadoria com os produtos hortifrutigranjeiros vindos das comunidades rurais do Crato. É assim, há 9 anos, na Feira Agroecológica promovida pela Associação Cristã de Base. Gessi é um dos 20 produtores que fazem parte desta ação. Desde que passou a comercializar o que produz na Feira da ACB, a vida nunca mais foi a mesma. A mudança, na verdade, chegou um pouco antes, veio com o desenvolvimento do modo de produzir, quando o agricultor passou a aplicar os conhecimentos que adquiriu sobre sustentabilidade nas atividades do campo. Eu aprendi a diferenciar uma realidade da outra, a primeira foi a maneira de trabalhar, a gente trabalhava queimando a terra, usando agrotóxico, só roçava e “laigava” fogo, aí ficava aquela terra preta. Hoje eu limpo, mas deixo o mato lá pra forrar, se for verdura, que é preciso plantar logo, retiro só mato grosso pra lenha e depois incorporo a terra pra cobrir o resto, sem precisar queimar. Isso foi muito importante pra mim porque agora eu sei que a compostagem orgânica tem que estar sempre ali na terra, para dar sustentação, se não ela resseca mais rápido e fica exposta ao sol, então quando vem a chuva arrasta a fertilidade, mas se a terra estiver bem protegida, a água quando vem,faz é ajudar a matéria a decompor mais rápido. E tem os insetos também que ajudam nisso. Eu faço tudo pra não danificar as formigas nem os cupins porque eles fazem parte da natureza e ajudam a manter o ambiente necessário pra gente produzir, conta o agricultor ao relatar as experiências com a produção orgânica. Depois que passou a utilizar os conceitos sustentáveis na agricultura, Gessi abandonou práticas que prejudicavam a saúde da família, uma delas era o uso de defensivos agrícolas. Era costume aplicar produtos como carbureto para acelerar o amadurecimento das bananas e agrotóxicos para combater pragas na plantação. Ceará Ano 6 | nº 889 | outubro | 2012 Crato -Ceará Boletim Informativo do Programa Uma Terra e Duas Águas Feira agroecológica, promovendo a economia solidária, segurança alimentar e a geração da qualidade vida no semiárido 1 Famílias têm acesso a água e alimento durante a seca . rúcula, um dos principais produtos da feira agroecológica.

Upload: articulacaosemiarido

Post on 23-Jul-2016

216 views

Category:

Documents


2 download

DESCRIPTION

 

TRANSCRIPT

É sexta-feira, são três e meia da madrugada no sítio

Rosto, o sol ainda não nasceu, mas Gessi já está de pé.

Dentro do cesto de palha, ele coloca o que foi colhido na

horta de casa: alface, cheiro-verde, cebolinha, tomate

cereja, chuchu e maracujá. O balaio vai em cima da

bicicleta e, pedalando até o centro da cidade, o agricultor

chega a feira na rua dos Cariris, onde dezenas de

produtores preparam barracas e prateleiras, ordenando a

mercadoria com os produtos hortifrutigranjeiros vindos

das comunidades rurais do Crato. É assim, há 9 anos, na

Feira Agroecológica promovida pela Associação Cristã

de Base.

Gessi é um dos 20 produtores que fazem parte

desta ação. Desde que passou a comercializar o que

produz na Feira da ACB, a vida nunca mais foi a mesma. A

mudança, na verdade, chegou um pouco antes, veio com

o desenvolvimento do modo de produzir, quando o

agricultor passou a aplicar os conhecimentos que

adquiriu sobre sustentabilidade nas atividades do campo.

Eu aprendi a diferenciar uma realidade da outra, a primeira foi a maneira de trabalhar, a gente trabalhava

queimando a terra, usando agrotóxico, só roçava e “laigava” fogo, aí ficava aquela terra preta. Hoje eu limpo, mas deixo o

mato lá pra forrar, se for verdura, que é preciso plantar logo, retiro só mato grosso pra lenha e depois incorporo a terra pra

cobrir o resto, sem precisar queimar. Isso foi muito importante pra mim porque agora eu sei que a compostagem orgânica

tem que estar sempre ali na terra, para dar sustentação,

se não ela resseca mais rápido e fica exposta ao sol, então

quando vem a chuva arrasta a fertilidade, mas se a terra

estiver bem protegida, a água quando vem,faz é ajudar a

matéria a decompor mais rápido. E tem os insetos

também que ajudam nisso. Eu faço tudo pra não danificar

as formigas nem os cupins porque eles fazem parte da

natureza e ajudam a manter o ambiente necessário pra

gente produzir, conta o agricultor ao relatar as

experiências com a produção orgânica.

Depois que passou a utilizar os conceitos

sustentáveis na agricultura, Gessi abandonou práticas

que prejudicavam a saúde da família, uma delas era o uso

de defensivos agrícolas. Era costume aplicar produtos

como carbureto para acelerar o amadurecimento das

bananas e agrotóxicos para combater pragas na

plantação.

Ceará

Ano 6 | nº 889 | outubro | 2012Crato -Ceará

Boletim Informativo do Programa Uma Terra e Duas Águas

Feira agroecológica, promovendo a economia solidária, segurança alimentar e a geração da

qualidade vida no semiárido

1

Famílias têm acesso a água e alimento durante a seca .

rúcula, um dos principais produtos da feira agroecológica.

. A conscientização sobre a segurança alimentar, além de influenciar a produção no campo, hoje é marca na realização da feira agroecológica da ACB. Em Crato, a exemplo do que também acontece nas feiras que a Associação Cristã de Base promove em outros municípios do Cariri, a oferta do produto natural é responsável pela fidelização dos consumidores.

Dona Lurdes, por exemplo, é um deles. Ela faz compras na feira toda semana e diz que se sente mais segura ao levar para casa verduras sem agrotóxico, “gosto de comprar aqui porque penso sempre na saúde, e é importante incluir folhas no prato. Na minha casa sempre tem vegetais na mesa, mas não compro em qualquer lugar. No mercado tem oferta, só que não sei qual é a origem do produto, comprando na feira agroecológica eu tenho mais confiança e sei que estou cuidando melhor da minha alimentação.E outra, aqui a gente percebe que o alimento é mais fresquinho e limpo, sem contar que é mais em conta pra quem compra também” explica a consumidora.Em parceria com a ACB, os produtores vêm criando as condições necessárias para desenvolver a logística de mercado e descobrindo como implementar melhorias nas atividades de negócio. Entre os avanços mais significativos, está a possibilidade de agregar valor ao produto e ao mesmo tempo potencializar a força de trabalho dos feirantes. Eu me lembro bem, antes nós vendíamos somente banana aos atravessadores e era por uma mixaria, quando pagávamos o frete não sobrava quase nada. Hoje consigo distinguir um mercado do outro, descobri que a feira é um tipo de mercado bem mais vantajoso do que eu praticava antes, quando vendia ao atravessador, sem zelar o produto, sem cuidar bem da higiene”, explica o produtor.

Não se deve esquecer da inclusão e da participação do trabalho feminino neste processo. Maioria na feira, as mulheres são responsáveis por boa parte dos ganhos. O trabalho desenvolvido permitiu a elas resgatar a autoestima e contribuir com a geração de renda dentro do lar. Maria de Fátima vende há 8 anos neste mercado e comemora as conquistas alcançadas: “Depois que passei a fazer parte do projeto da feira, percebi que muito mudou na minha vida e, principalmente

no meu trabalho, aprendi a conquistar a confiança do cliente, agora ele sempre volta pra comprar mais mercadoria, e eu sei que o retorno é por causa da qualidade do que a gente vende aqui. Nós, vendedores, também saímos ganhando com isso, porque em casa a saúde melhorou e a renda nem se fala” conta. Com o dinheiro da feira, Maria conta que conseguiu comprar um terreno e que já começou a construir moradia própria.

O reconhecimento chega com o sorriso no rosto do produtor e na certeza da conquista dos sonhos destas pessoas. “Tenho hoje a capacidade de dar uma orientação mais adequada a minha família. Estou me sentindo muito bem nessa feira, não pretendo deixar, o meu desejo é continuar produzindo, trabalhando da maneira que estou, sinto que a cada dia adquiro mais conhecimento e a capacidade para tocar o barco pra frente” diz Gessi. A semente da valorização do conhecimento e das práticas do homem simples da zona rural germinou e vem crescendo como árvore frondosa no Cariri.

2

!Mais um cliente satisfeito!

Boletim Informativo do Programa Uma Terra e Duas Águas Ceará

Apoio:

MARCAUGT Programa

Cisternas

Mulheres são maioria na feira agroecológica