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INDYAMARA MASSARO MACHADO UMA ALTERNATIVA EM BUSCA DA ABOLIÇÃO DAS ARMAS NUCLEARES SÃO PAULO 2011

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INDYAMARA MASSARO MACHADO

UMA ALTERNATIVA EM BUSCA DA ABOLIÇÃO DAS ARMAS NUCLEARES

SÃO PAULO

2011

1

INDYAMARA MASSARO MACHADO

UMA ALTERNATIVA EM BUSCA DA ABOLIÇÃO DAS ARMAS NUCLEARES

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado junto ao Centro Universitário Belas Artes de São Paulo, como parte das atividades para a obtenção do título de Bacharel em Relações Internacionais, sob a orientação da Prof.º Adilson de Oliveira Franceschini

SÃO PAULO

2011

2

DEDICATÓRIA

Ao meu Mestre, Daisaku Ikeda.

3

AGRADECIMENTOS

Gostaria de manifestar minha gratidão ao meu mestre, Doutor Daisaku Ikeda,

que direcionou minha existência. Se não fosse o desejo de corresponder ao mestre,

sem duvidas, não faria Relações Internacionais. Muito obrigada por todas as

oportunidades. Fique tranquilo, este é somente começo da luta contra as armas

nucleares.

Agradeço a minha família por ter me proporcionado grandes oportunidades

mas, em especial, por ter cultivado valores que me forjaram e são a razão de eu ter

conseguido vencer em todas as fases de minha vida. Obrigada por todo apoio,

carinho, compreensão e incentivos de sempre. Patrícia, Carlos, Vitor, Sandra, Bem,

Tios, Primos, vocês são o tesouro mais precioso que possuo.

A minha amiga, Juliana Reis, que fez parte de todo o processo entre, escolher

fazer Relações Internacionais e realizar este TCC. Muito obrigada por todos os

momentos que me ouviu, incentivou e, quando necessário, até brigou. Você é minha

irmã que, por um acaso, nasceu em outra família.

Ao Centro Universitário Belas Artes de São Paulo pelo ensino de qualidade.

Ao meu orientador, Professor Adilson, pela paciência, tanto com sua

orientanda, como também, com a representante da AN8RI. Muito Obrigada por toda

dedicação juntamente com o Professor Sidney e Helton com todos nós.

A AN8RI, por todas as emoções que me proporcionaram. Foram quatro anos

de muitas mudanças em que tive a oportunidade de realizar diálogos e trocar ideias

inspiradoras. Sou grata a todos, sem exceção, pois pude aprender com cada um e

polir minha vida.

A Aline e Carol que estão comigo desde o primeiro semestre. Sem duvidas,

elas já presenciaram todas as condições de minha vida e foram às maiores vítimas

de celulares não atendidos, compromissos desmarcados ou simplesmente não

comparecidos e, mesmo assim, por uma grande benevolência, continuam a ser

minhas amigas. Muito obrigada!

Em todos os aspectos, por vocês existirem, sou uma pessoa extremamente

afortunada. Muito obrigada a todos!!!

4

EPÍGRAFE

Não seria a juventude, então,

O tesouro da humanidade?

Não seriam os jovens,

Os verdejantes campos da paz?

Quando nos unimos num propósito comum,

Ressoa um trovão ensurdecedor,

Condenando os abusos do poder arrogante.

(IKEDA, 1957. p. 2)

5

RESUMO

O presente trabalho tem como objetivo estudar a aplicabilidade da teoria

construtivista na abolição das armas nucleares e traremos como estudo de caso o

Brasil. De início, apresentaremos um panorama histórico desde a Segunda Guerra

Mundial, focado nos acontecimentos nucleares e, após, mostraremos o cenário de

tensão internacional gerado por ocasião da Guerra Fria. Cenário este que

permanece até os dias de hoje, mesmo que disfarçado por assuntos de cunhos

diversos, pela existência das armas nucleares oriundas da corrida armamentista

que, após a Guerra Fria, manifestou o desejo em outros Estados de adquiri-las. Este

cenário levou a ratificação do Tratado de Não-Proliferação de Armas Nucleares, que

por sua vez, passa por dificuldades a nível de credibilidade. Assim, centralizado nas

questões das armas nucleares, faremos uma amostra geral do pensamento teórico

das relações internacionais, na busca de uma alternativa para a abolição das armas

nucleares e, ao final, traremos nosso estudo de caso.

Palavras-chave: TNP. Abolição. Armas Nucleares. Construtivismo. Identidade.

Brasil.

6

ABSTRACT

The present essay aims to study the applicability of constructivist theory in the

abolition of nuclear weapons and will bring as a case study of Brazil. At first, we

present a historical overview since the Second World War, focused on nuclear

events, and after we show the scenario of international tension generated during the

Cold War. This scenario that remains to this day, even what disguised by various

issues of cleats, the existence of nuclear weapons coming from the arms race, after

the Cold War, expressed the wish in other states to acquire them. This scenario led

to ratification of the Treaty on the Non-Proliferation of Nuclear Weapons, which in

turn, pass by difficulty at the level of credibility. So, centered on issues of nuclear

weapons, we will make a general sample of theoretical thought in international

relations, seeking an alternative to the abolition of nuclear weapons and in the end,

we will bring our case study.

Keywords: NPT. Abolition. Nuclear Weapons. Constructivism. Identity. Brazil.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO....................................................................................................... 8

1 SEGUNDA GUERRA MUNDIAL - O INÍCIO DA HISTÓRIA DAS ARMAS

NUCLEARES.......................................................................................................... 10

1.1 Projeto Manhattan............................................................................................ 11

1.1.1 Hiroshima, Nagasaki e o fim da Guerra........................................................ 12

1.2 Pós Segunda Guerra Mundial.......................................................................... 13

1.3 Guerra Fria....................................................................................................... 14

1.3.1 Surgimento do Tratado de Não-Proliferação das Armas Nucleares (TNP).. 15

1.4 Pós 89.............................................................................................................. 17

1.4.1 O cenário atual.............................................................................................. 19

1.5 Cronologia Nuclear........................................................................................... 20

2 O CONSTRUTIVISMO........................................................................................ 25

2.1 O pensamento teórico nas relações internacionais.......................................... 25

2.1.1 A teoria construtivista.................................................................................... 27

2.2 O papel do indivíduo em prol da abolição das armas nucleares...................... 30

3 SOBRE O BRASIL.............................................................................................. 33

3.1 Panorama histórico do Brasil e sua relação com as armas nucleares............. 33

3.1.1 Sua política com relação ao TNP.................................................................. 37

3.1.2 Pós TNP........................................................................................................ 37

3.2 Seleção de discursos....................................................................................... 38

3.2.1 O caso do Irã................................................................................................. 38

3.2.2 O ano de 2010 representado por Celso Amorim........................................... 39

3.2.3 2011 a nova representação........................................................................... 41

3.3 A identidade brasileira...................................................................................... 42

CONSIDERAÇÕES FINAIS................................................................................... 47

REFERÊNCIAS...................................................................................................... 50

8

INTRODUÇÃO

No presente trabalho, apresentaremos os acontecimentos nucleares desde a

Segunda Guerra Mundial até os dias atuais.

Pós Guerra Fria, a utilização de energia nuclear adquiriu várias vertentes

como a civil, política, econômica e militar que podem ser usadas para fins pacíficos

ou de ameaça.

Porém, a prática de proliferação das armas nucleares, ainda se faz presente e

isto ocorre pela busca de poder, necessidade de prover sua própria segurança,

incrementar a defesa e a dissuasão.

No discurso proferido em fevereiro de 2010, em Paris, o ex-Ministro, Celso

Amorim expõem: “Os argumentos usados para defender as armas nucleares não

são mais justificáveis, se é que em algum momento o foram. A era do equilíbrio do

terror acabou.”

Tais armas são as mais destrutivas concebidas pelo homem através da

ciência e tecnologia. O que elas representam na verdade, é uma ameaça a

existência da humanidade.

Em um artigo publicado em 2010, o Doutor Daisaku Ikeda declara: “a luta pela

abolição das armas nucleares teve início às 8h15 da manhã do dia 6 de agosto de

1945, quando a primeira bomba atômica foi lançada sobre a cidade de Hiroshima”

Este episódio, fez imediatamente e ao longo dos anos milhares de mortos.

Durante a Guerra Fria, as armas nucleares adquirem um forte papel e, ao

perceberem a ameaça que esta indicava, surge o Tratado de Não-Proliferação de

Armas Nucleares (TNP).

Mas, perceberemos que as propostas e medidas apresentadas pelo TNP, não

ocorrem, sendo muitas vezes o tratado descumprido pelos signatários, o que o deixa

sem credibilidade e gera um movimento inverso ao proposto visto que alguns países

se dedicam a desenvolver o arsenal, pois outros ainda as possuem ou as

desenvolvem.

A ameaça das armas nucleares, não é coisa do passado, e sim, uma crise

constante, pois, pós Guerra Fria, de acordo com uma pesquisa do ano de 2010, feita

pela revista japonesa, Quarterly, ainda existem aproximadamente 23 mil armas em

todo o mundo, o suficiente para destruir a humanidade várias vezes.

9

No mesmo discurso falado acima, do ex-Ministro, Celso Amorim, ele expõem

que foi necessária uma grande crise financeira para surgirem mudanças de

conceitos e práticas e, nesta mesma linha de raciocínio, busca fazer uma reflexão

perguntando se é necessário esperar por uma crise nuclear, para iniciar sua

eliminação.

Após o teste da bomba de hidrogênio, Bertrand Russel e Albert Einstein

escreveram: “vamos acabar com a raça humana ou vamos renunciar à guerra?”.

Situações como essas ocorreram e ocorrem devido ao sistema internacional ser

conduzido por pensamentos realistas.

Na Proposta de Paz, enviada a ONU neste ano, o Dr. Daisaku Ikeda declara:

“o inimigo real que temos que enfrentar é a maneira de pensar que justifica as armas

nucleares, a prontidão para aniquilar os outros quando eles são vistos como ameaça

ou como empecilho para a realização de nossos objetivos”.

Assim, para fugir de tais premissas, o presente trabalho irá buscar uma

alternativa para pensar na abolição das armas nucleares e usará a teoria

construtivista, com estudo de caso no Brasil, a fim de responder se esta teoria é

aplicável para o assunto, abolição, e se o Brasil seria o melhor protagonista.

10

1 SEGUNDA GUERRA MUNDIAL - O INÍCIO DA HISTÓRIA DAS ARMAS NUCLEARES.

A Segunda Guerra Mundial teve inicio por uma sequencia de questões

deixadas mal resolvidas, desde a Primeira Guerra Mundial, com a insatisfação

gerada pelo rigor das cláusulas dos Tratados de Versalhes, em 1919, de Locarno,

em 1925, e pela Liga das Nações que não conseguiu exercer sua missão, a

manutenção da Paz.

Neste período, pelo menos até 1925, a Alemanha e União Russa Socialista

Soviética (URSS) eram de certa forma Estados marginalizados, em relação aos

outros Estados europeus, o que levou a realizarem acordos secretos que permitiam

à Wehrmacht (Forças Armadas Alemãs) fazer testes com armamentos e treinar

algumas unidades em território soviético.

Os Estados Unidos (EUA), vencedor da Primeira Guerra Mundial, adotou uma

política conhecida como isolacionismo onde, apesar de ter um posicionamento claro

com relação aos Estados europeus, procuravam se manter longe dos conflitos, mas

forneciam materiais bélicos, alimentos e matérias-primas.

Em janeiro de 1933, Adolf Hitler, assumiu o poder e seu objetivo era

transformar a Alemanha em uma grande potência com poder militar e vasto território.

E, em 1935, Hitler fazia a declaração da política do rearmamento, o que violava o

item mais importante do Tratado de Versalhes.

Com a retomada da Alemanha se inicia uma aliança anticomunista, que

reunia interesses ideológicos, de segurança e hegemonia entre Alemanha, Itália e

Japão onde ambos se apoiavam em suas técnicas de expansão e desenvolvimento.

E, após, várias invasões tiveram inicio como a da Itália na Etiópia e da Alemanha na

Áustria.

Em 1939, Hitler ordenou que as forças alemãs invadissem o território polonês,

pois, na época, dividia o território alemão. Porém, a França e Inglaterra possuíam

compromissos de ajuda com os poloneses e enviaram um ultimato a Alemanha que,

Hitler por sua vez, não respondeu. Assim os Estados declararam guerra à

Alemanha.

Isto ocasiona a divisão do mundo em: Aliados (URSS, Inglaterra e França) e

Eixo (Itália, Alemanha e Japão). Ambos buscavam interesses econômicos que

11

refletiram na política e, em especial, na defesa de uma ideologia para orientar a

humanidade.

Com isso, ao longo dos dias o mundo viveu um período de constantes e

intensos ataques. Territórios foram dominados, transformados em zonas de

influência, pessoas foram exterminadas pela busca de uma “raça pura” pelos

nazistas e assim a Segunda Guerra Mundial se transformou em um marco devido às

pretensões ilimitadas dos Estados na busca da submissão total do adversário.

Neste período todas as forças e recursos que foram mobilizados para a

guerra levaram ao desenvolvimento de técnicas de busca, seleção, concentração,

do setor econômico, meios de transporte e tecnologia, porém, na mesma proporção

da devoção em massa, à destruição também foi em massa. Não somente material,

mas de pessoas.

No final de 1941, se iniciava “o começo do fim” que foi quando o Japão

realizou o ataque a Pearl Harbor, Havaí. O ataque resultou no abandono dos EUA

por sua política isolacionista e a formação da Grande Aliança entre EUA, Inglaterra e

URSS que tinham como inimigos comuns o Eixo.

Após o ataque o almirante Yamamoto, estrategista naval do Japão declarou:

“Podemos crescer sem freios por seis meses a um ano, mas, depois disso, os poços

de petróleo do Texas e as fábricas em Detroit darão os meios para um

contraofensivo irresistível dos americanos do Pacífico” (TOTA, 2006, p. 383).

Eles já sabiam que algo lhes aguardava. E foi exatamente assim que ocorreu.

Em 1941, os Aliados encontraram uma alternativa que acreditavam ser a única

solução para o fim da guerra, o Projeto Manhattan.

1.1 Projeto Manhattan

O projeto surge com o objetivo de construir rapidamente uma bomba atômica

que foi tratada com prioridade devido a suspeita de que a Alemanha estaria em um

processo de pesquisas para produção de bombas, pelo ambiente deixado com o

ataque de Pearl Harbor e por acharem que seria o único modo de colocar um fim na

guerra. Sobre este último ponto, em 2006, Pedro Tota escreve:

Na batalha na ilha de Tarawa, dos 5 mil combatentes japoneses, restaram somente oito sobreviventes. Todos lutaram violentamente até o fim. Tudo isso mostrava ao comando americano que a conquista das ilhas centrais japonesas custaria muitos milhares de vidas de soldados americanos. Por

12

isso a decisão de usar a mais nova arma de destruição em massa então desenvolvida – a bomba atômica. (TOTA, 2006, p. 416)

Porém, os políticos não se preocuparam ou não perceberam o perigo que isto

poderia causar a humanidade. Para este projeto foi necessário um grande

empreendimento industrial e demanda de profissionais de diferentes áreas.

Estes profissionais desenvolveram pesquisas sobre o armamento em questão

e, posteriormente, resultou na criação de uma comissão chamada de Comissão

Especial para Tomada de Decisões Estratégicas (CETODES). Dentro desta

comissão havia dois grupos, os que defendiam a construção das bombas e outro

que não, pois acreditavam que o investimento era necessário para outras pesquisas.

Após muitos estudos o grupo favorável à construção da bomba assume o

insucesso na busca de vantagens para a mesma, dado o poder de destruição, mas

argumenta sua importância com o objetivo de desenvolver a radiação para áreas

como medicina. Porém, os que eram contrários à bomba não conseguiram encontrar

outro modo de controlar e resolver a situação de grande conflito. Isto ocasionou a

efetiva realização do projeto que então produziu três bombas nucleares.

A primeira, chamada Trinity, foi usada para teste e lançada no dia 16 de Julho

aproximadamente no deserto de Alamogordo, México. Seu alcance e reação em

cadeia foi extremamente rápido a completar. O teste havia sido bem sucedido.

1.1.1 Hiroshima, Nagasaki e o fim da Guerra

Assim, com frutos do Projeto Manhattan, se inicia um marco na história da

humanidade, o ataque a Hiroshima e Nagasaki.

Little Boy foi à segunda bomba, primeira utilizada para combate contra o

Japão no dia 6 de Agosto na cidade de Hiroshima. Como se não bastasse a grande

devastação, em todos os aspectos em Hiroshima, após três dias a terceira bomba,

Fat Man, foi lançada sobre a cidade de Nagasaki.

Os bombardeios mataram milhares de pessoas imediatamente, destruiu

casas, estruturas, acabou com a qualidade do solo e sua reação em cadeia atingiu

pessoas que, mesmo não morrendo na hora, sofreram consequências com a

radiação, algumas se manifestaram até mesmo anos depois.

E assim terminava a guerra. O Japão, devastado, se rendeu e a Alemanha

estava humilhada, pois, desde 1943, os Estados do Eixo enfrentavam grande

13

declínio com as derrotas na África, Cáucaso, entre outras regiões, que levaram a

invasão e tomada da Itália. Após a derrota nos Bálcãs e nas praias da Normandia,

que sucedeu com a invasão na França e por fim, partiram para a Alemanha tomando

os territórios, até então nazistas, e assim, chegaram a Berlim no dia 16 de abril de

1945. Posteriormente, Hitler se suicidou.

1.2 Pós Segunda Guerra Mundial

Os países Aliados se reuniram em Potsdam e começaram a promover

diálogos sobre questões econômicas e territoriais. Nesta ocasião as primeiras

divergências começaram a surgir.

A Europa e Áustria foram divididas. A Alemanha além de ser dividida em

ocidental (EUA) e oriental (URSS), sofreu limitações com relação à indústria. Para o

Japão se foi criado o Tratado de São Francisco que declarava a perda de todos os

territórios conquistados na guerra.

Por sua abrangência e crueldade a segunda guerra mundial foi única na

humanidade. Esta pode ser considerada também uma guerra de criatividade de

eficiência produtiva e a venceu quem ganhou a batalha na produção. Estes

desenvolvimentos e inovações criaram o ambiente oportuno para a Guerra Fria.

Neste cenário surge a proposta de criação de um organismo internacional

com a função de estabelecer uma paz duradora e nasce então a Organização das

Nações Unidas (ONU) que foi formalizada na Conferência de São Francisco, em

junho de 1945.

Na ocasião 50 nações assinaram a carta e como órgão máximo foi criado o

Conselho de Segurança composto por EUA, URSS, Inglaterra, França e China,

membros permanentes. Estes deveriam se responsabilizar por essa manutenção da

paz e segurança internacional, além de terem direito a voto individual de veto nas

resoluções internacionais.

Mas, isto não foi suficiente para impedir as tensões que surgiriam entre EUA e

URSS. Inicialmente, em fevereiro de 1946, os EUA suspeitaram que existisse uma

rede de espionagem da URSS para obter informações sobre as armas nucleares

que foi aparentemente foi confirmada após a URSS ter explodido seu primeiro

componente nuclear em 1949.

14

Além da questão militar, os Estados estavam em atrito devido as suas visões

comunistas (URSS) e capitalistas (EUA). A URSS não pensava em entrosamento de

ideias o que deixava o conflito inevitável e os EUA se dedicaram a conter a

expansão do comunismo. Assim, com o avanço desta ideologia na Grécia os EUA

deram a seguinte resposta descrita por Pedro Tota, em 2006:

Em março de 1947, Harry Truman dirigiu-se ao Congresso americano e proclamou a doutrina que seria batizada com seu nome: ‘A política dos Estados Unidos deverá ser de apoio total aos povos livres que lutam e resistem às tentativas de submissão de povos. Pela força das armas ou não...’ Era a Guerra Fria que se iniciava (TOTA, 2006, p. 419).

1.3 Guerra Fria

A Guerra Fria (termo da financista Bernard Baruch que foi popularizado por

Walter Lippman) é caracterizada por uma corrida armamentista que nunca chegou

ao conflito propriamente armado, mas gerou uma instabilidade na segurança

internacional devido a sua intimidação e ocupação no campo ideológico e cultural.

A guerra teve inicio, indiretamente, após os ataques de Hiroshima e Nagasaki

onde, a URSS, percebe a expansão do poder bélico dos EUA e acreditavam que

estes não hesitariam em usá-lo novamente em busca de seus interesses políticos.

Assim, o poder bélico passou a ser levado como um método para conduzir

assuntos internacionais e os diálogos entre EUA e URSS passou a serem

demonstrações de poder bélico e ameaças, levando-os a uma corrida armamentista.

Já os EUA passam a ver a URSS como uma ameaça à liberdade e à

democracia que afirmavam defender. Então, tomam uma posição mais efetiva de

auxiliar financeiramente alguns países para mantê-los aliados ao modelo capitalista

com a origem do Plano Marshall. Este estendia o auxílio econômico aos países da

Europa ocidental com objetivo de fortalecer os países e influenciar para não serem

levados pela URSS.

Além disso, organizaram uma aliança militar, para proteger a Europa ocidental

do comunismo, chamada Organização do Tratado do Atlântico Norte, OTAN. E,

como veremos abaixo na cronologia, a cada ano seguinte um novo acontecimento

ocorria envolvendo o assunto nuclear.

Dentro da Alemanha a parte Oriental não se desenvolvia como a Ocidental o

que gerou comparações e manifestações a favor do capitalismo. Isto fez com que,

em 1962, a URSS ordenasse a construção do Muro de Berlim para acabar com a

relação entre Alemanha Oriental e Ocidental.

15

Mesmo este sendo um momento de grande intolerância, ambas as potências

tinham consciência que se entrassem em ação com suas armas o mundo acabaria.

Isto ocasionou um pequeno momento de trégua em que as potências tentavam

influenciar pelo âmbito ideológico e não por armamentos. Mas este período acaba

rapidamente com a eleição de Ronald Reagan que inicia novamente provocações e

ameaças.

Por sua vez, a URSS não percebeu que um de seus maiores problemas

ocorreu em função da estagnação política, econômica e necessidade de investir em

recursos naturais para indústria bélica que a levaria para um processo de

deterioração interna.

Isso já era visto, de outra forma, pela lenta desintegração da URSS e do

Bloco Comunista. O programa de Gorbatchev de liberalização tornou visíveis os

problemas que possuíam como a ineficiência da economia, causado pela

centralização da URSS.

Assim, Gorbatchev, lançou o programa Glasnost, que visava combater a

corrupção e a ineficiência administrativa com abertura política. E, posteriormente o

programa Perestroika seria formulado.

Mas os esforços não foram suficientes e a URSS entra em colapso e a Guerra

Fria chega ao fim, simbolizada pela queda do Muro de Berlim em 1989.

1.3.1 Surgimento do Tratado de Não-Proliferação das Armas Nucleares (TNP)

A corrida armamentista origina um grande medo devido à ameaça a toda

existência da humanidade. E, compreendendo este cenário, durante a Guerra Fria,

surge em 1968, o Tratado de Não-Proliferação de Armas Nucleares (TNP).

Um tratado pode ser descrito como um “acordo formal concluído entre sujeitos

de direito internacional público, e destinado a produzir efeitos jurídicos” (REZEK,

2000, p. 14), portanto, há uma natureza obrigacional aos seus signatários com

objetivo de exercer instrumentos morais.

O tratado possui alguns variantes e sinônimos como: acordo, carta,

convenção, declaração e protocolo. Temos como exemplo o Acordo Geral sobre

Tarifas e Comércio, a Carta da ONU, Convenção de Viena, Declaração Universal

dos Direitos Humanos, Protocolo de Kyoto (LIMA, 1998) e com o próprio nome de

16

tratado como o Tratado de Não-Proliferação de Armas Nucleares que iremos

apresentar.

No momento em que o tratado é ratificado existe um documento que

compõem todas as normas e regras do mesmo. Habitualmente segue a seguinte

ordem: O preâmbulo, o articulado, a declaração, a indicação e as assinaturas. Ao

final, os Estados que desejarem podem fazer emendas e, o idioma ao qual o tratado

será redigido é escolhido pelos Estados partes.

Os tratados podem ser bilaterais, multilaterais, plurilaterais ou coletivos. No

caso do TNP, é um tratado coletivo, pois envolve um grande número de Estados. Na

ocasião de sua criação foram 189 Estados que ratificaram o TNP e, até os dias hoje,

não conta com a presença de Israel, Paquistão, Índia e Coreia do Norte.

O TNP legitima a posse de armas nucleares além de tentar evitar que outros

Estados as desenvolvam. É baseado em três pilares: “Não-Proliferação”,

“Desarmamento” e “Isso de Energia Nuclear para Fins Pacíficos”. Como consta no

tratado:

Convencidos de que, na promoção deste princípio, todas as Partes têm o direito de participar no intercâmbio mais amplo possível de informações científicas e de contribuir, isoladamente ou em cooperação com outros Estados, para o desenvolvimento crescente das aplicações da energia nuclear para fins pacíficos; Declarando seu propósito de conseguir, no menor prazo possível, a cessação da corrida armamentista nuclear e de adotar medidas eficazes tendentes ao desarmamento nuclear (TNP, 1968, p.1).

Além disso, deixa clara a divisão do mundo entre os nuclearmente armados e

os que não a possuem. Os nuclearmente armados ao ratificarem o TNP se

comprometem a não fornecer esses dispositivos ou repassar a sua tecnologia para

outro Estado, além de se esforçar para o desarmamento. Os que não a possuem

abrem não de obtê-las e se comprometem a desenvolver a tecnologia nuclear

somente para fins pacíficos.

Artigo I - Cada Estado nuclearmente armado, Parte deste Tratado, compromete-se a não transferir, para qualquer recipiendário, armas nucleares ou outros artefatos explosivos nucleares, assim como o controle, direto ou indireto, sobre tais armas ou artefatos explosivos e, sob forma alguma assistir, encorajar ou induzir qualquer Estado não-nuclearmente armado a fabricar, ou por outros meios adquirir armas nucleares ou outros artefatos explosivos nucleares, ou obter controle sobre tais armas ou artefatos explosivos nucleares. Artigo II - Cada Estado não-nuclearmente armado, Parte deste Tratado, compromete-se a não receber a transferência, de qualquer fornecedor, de armas nucleares ou outros artefatos explosivos nucleares, ou o controle, direto ou indireto, sobre tais armas ou artefatos explosivos; a não fabricar, ou por outros meios adquirir armas nucleares ou outros artefatos explosivos nucleares, e a não procurar ou receber qualquer

17

assistência para a fabricação de armas nucleares ou outros artefatos explosivos nucleares (TNP, 1968, p.1).

Uma obrigação jurídica que consta no tratado para os Estados que possuem

armas nucleares é o de negociarem o desarmamento completamente.

Artigo VI - Cada Parte deste Tratado compromete-se a entabular, de boa fé, negociações sobre medidas efetivas para a cessação em data próxima da corrida armamentista nuclear e para o desarmamento nuclear, e sobre um Tratado de desarmamento geral e completo, sob estrito e eficaz controle internacional (TNP, 1968, p.2).

Através do TNP, acontece a cada cinco anos uma conferência que busca

revisar o tratado e encontrar medidas para que seus objetivos sejam alcançados.

Muitos o acham injusto, pois causa desigualdade ao dividir os nuclearmente

armados e os que não a possuem além de fazer concessões aos nuclearmente

armados e vista grossa aos que não a possuem.

Outro problema é o fato do TNP não ser universal e não tomar medidas

efetivas para implementar o tratado, deixando-o assim com limitações para impedir o

uso e proliferação das armas nucleares.

1.4 Pós 89

O fim da Guerra Fria trouxe conquistas, mas deixou o cenário internacional

tenso e sofre até hoje com suas consequências. No relatório intitulado “As armas do

terror: libertar o mundo das armas nucleares, biológicas e químicas” elaborado, em

2006, pela Comissão sobre Armas de Destruição em Massa consta: “Apesar do fim

da Guerra Fria, a última década conheceu mais reveses do que êxitos”.

Esta afirmação retrata o caso da proliferação de armas nucleares que, mesmo

com o TNP, devido o cenário desconfiante e avanços tecnológicos, deram

oportunidade para os Estados, ao invés de reduzir, aperfeiçoar seus arsenais,

melhorar suas bombas, refinar suas técnicas e daqueles que não as detinham as

adquirir. Sobre isto o documento exalta: "Após 50 anos de Guerra Fria, vemos um

risco de corridas armamentistas que envolveriam novos tipos de armas nucleares,

armas espaciais e mísseis".

Ao longo dos anos os seguintes acontecimentos se desdobraram como a

ratificação do Tratado de Redução de Armas Estratégicas (Start II) pelos presidentes

18

George Bush e Boris Yeltsin e, em 1995, ocorre a Conferência de Revisão do TNP

em que sua maior conquista foi à prorrogação indefinida do tratado.

Em 2000, foi realizada a Conferência de Revisão do TNP. Nesta ocasião

foram proferidos treze passos práticos na busca de um maior compromisso para a

implementação do Artigo VI do TNP até a próxima Conferência que foram:

1) A entrada em vigor do CTBT;

2) A moratória dos testes nucleares até a entrada em vigor deste tratado;

3) A negociação de um Tratado sobre Banimento da Produção de Materiais

Físseis (FMCT) não-discriminatório, multilateral e efetivamente verificável;

4) O estabelecimento, na Conferência sobre Desarmamento, do corpo

subsidiário para desarmamento nuclear;

5) A aplicação do princípio da irreversibilidade às medidas de desarmamento e

redução nucleares;

6) O empreendimento inequívoco de eliminação dos arsenais atômicos;

7) A entrada em vigor do START II, a ratificação do START III e o fortalecimento

do Tratado sobre Limitação de Sistemas Antimísseis Balísticos (ABMT);

8) A Iniciativa Trilateral entre os EUA, a Rússia e a Agência Internacional de

Energia Atômica (AIEA) para proteção de material nuclear;

9) A tomada de medidas como reduções unilaterais, transparência sobre

capacidades e acordos, reduções nucleares não estratégicas e diminuição do

status operacional de armas nucleares e de seu papel nas políticas de

segurança;

10) A submissão do excesso de material físsil para fins militares à AIEA ou a

outro mecanismo de verificação internacional, e a disponibilidade desse

material para fins pacíficos;

11) A reafirmação do objetivo de desarmamento completo sob controle

internacional efetivo;

12) A elaboração de relatórios regulares sobre a implementação das obrigações

contidas no artigo VI e;

13) O desenvolvimento de capacidades de verificação dos acordos sobre

desarmamento nuclear.

19

Com isto houve uma consolidação e fortalecimento da confiança na validade do

TNP. Porém em 2003, a Coréia do Norte anuncia sua retirada do TNP e suspeitas

de que o Iraque tinha em seu poder armas nucleares resultou em uma rigorosa

pesquisa de seis meses que não revelou provas.

Situações como essas deixaram o cenário internacional tenso e, em 2005, na

Conferência de Revisão do TNP, todos os esforços anteriores foram praticamente

anulados pela falta de interesse dos Estados nuclearmente armados em promover

os trezes passos o que gerou uma falta de confiança entre os signatários e duvidas

com relação à validade do TNP.

Sobre resoluções concretas, em 2005, não houve nenhuma. Isso gerou

desconforto e diversos países repensaram no fato de ter concordado com a

extensão indefinida do TNP sem ter conseguido compromissos mais firme por parte

dos Estados nuclearmente armados.

1.4.1 O cenário atual

Em 2008, é a criada a Comissão Internacional de Não Proliferação Nuclear e

do Desarmamento (ICNND). Nesta ocasião, no mesmo ano o secretário-geral das

Nações Unidas expos um Plano de Cinco Pontos para o Desarmamento Nuclear que

foram:

1) Os Estados que possuem armas nucleares devem cumprir suas

obrigações em matéria de negociações para o desarmamento nuclear

(eventualmente sob a forma de uma convenção sobre as armas

nucleares);

2) A cúpula do Conselho de Segurança das Nações Unidas deve se reunir

para discutir questões de desarmamento;

3) Entrada em vigor do Tratado de Proibição Completa dos Testes

Nucleares, a ratificação de todos os tratados regionais existentes sobre

zonas livres de armas nucleares, o estabelecimento dessa zona no

Oriente Médio, padrões de salvaguardas da AIEA fortalecidos e o

reconhecimento de que o ciclo de combustível nuclear configura

perspectivas para o desarmamento;

20

4) Os Estados que possuem armas nucleares devem prestar contas das

ações sobre os compromissos de desarmamento;

5) Novos progressos na eliminação de outros tipos de armas de destruição

em massa (químicas e biológicas), e a proibição de novas armas.

Em 2010, ocorreu à última Conferência do TNP até os dias atuais. No

documento final existe a proposta para uma convenção de armas nucleares. Porém,

isto não é o suficiente para mudar a visão do TNP. Rebecca Johnson, conselheira da

Campanha Internacional pela abolição das armas nucleares, expõem: “A conferência

do TNP de 2010 mostrou-se incapaz de adotar compromissos concretos para

desvalorizar as armas nucleares” (JOHNSON, 2010, In: Quarterly, p. 7).

Desta forma o TNP perde cada vez mais sua credibilidade e o clima de

intransigência e desconfiança sobre o desarmamento prevalece e tem impedido

progressos, mesmo com a dimensão das inúmeras consequências negativas

geradas por essa prática e pelo uso da mesma.

Precisa-se mudar a visão de que armas nucleares tem algo haver com

segurança. Mesmo sem guerra vivemos sob a sombra das armas nucleares, pois a

ameaça continua. Estimasse uma quantidade de 23 mil ogivas nucleares espalhadas

pelo mundo, número suficiente para acabar com a humanidade mais de uma vez.

Ainda que não sejam lançadas são usadas para coagir ou deter ações de

outras, isto não se relaciona com segurança. A abolição não dará vantagens

militares, não estaremos sobre o risco de cair nas mãos do terrorismo e estaremos

coerentes aos direitos humanos, isto é segurança.

Assim, devido os limites do TNP e de outros acordos, que ocorrem devido à

falta de vontade de muitos Estados em efetivá-los, podemos apontar como uma

alternativa para o desarmamento e abolição das armas nucleares a força da

sociedade.

Sobre este contexto, Rebecca Johnson exalta: “Cabe à sociedade civil e aos

governos-chave desenvolver estratégias eficazes e promover campanhas públicas

para tornar impossível o uso de armas nucleares por qualquer um.” (JOHNSON,

2010, In: Quarterly, p. 7).

1.5 Cronologia Nuclear

21

1898 Marie Curie elabora e desenvolve o conceito de radioatividade.

1905 Albert Eistein elabora a teoria de que uma pequena quantidade de

matéria pode se transformar em uma enorme quantidade de energia.

1932 É comprovado à teoria de Eistein com a primeira fissão nuclear em

laboratório.

1934 Surge à ideia de utilizá-la como forma de obtenção de energia.

1938 Cientistas alemães elaboram por nêutrons a fissão nuclear do urânio.

1942 Enrico Fermi constrói o primeiro reator nuclear.

Inicia-se o Projeto Manhattan.

1945 Armas Nucleares são lançadas contra Hiroshima e Nagasaki.

1946 A primeira resolução da Assembleia Geral da ONU solicita a eliminação

das armas nucleares

1949 URSS realiza os primeiros testes nucleares.

1952 EUA testam bomba de hidrogênio.

Brasil funda centro de pesquisa nuclear.

1953 URSS explode sua bomba de hidrogênio

1954 EUA detonam uma bomba de hidrogênio no Pacífico, contaminando

barcos de pesca japoneses e moradores de Rongelap e Uritik.

1955 EUA inicia o fornecimento de eletricidade de origem nuclear.

1956 Inauguram a primeira usina nuclear do mundo em Calder Hall,

Inglaterra.

É instalado o primeiro reator nuclear de pesquisa do Hemisfério Sul na

Universidade de São Paulo.

1957 URSS lança o primeiro satélite artificial da terra.

Na Inglaterra, um acidente com o reator nuclear militar provoca

vazamento de nuvem contaminada.

Ocorre a primeira conferência de Pugwash sobre Ciência e Relações

Mundiais.

É criada a Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA).

1958 Em contra partida a Inglaterra inicia a campanha pelo desarmamento

apresentando uma petição contra testes de armas nucleares.

1959 Elaboração do Tratado da Antártida faz dela a primeira Zona Ártica

Livre de Armas Nucleares.

1960 França realiza seu primeiro teste nuclear.

22

1962 Crise dos mísseis Cubanos quase leva o mundo a uma guerra nuclear.

1963 EUA e a URSS ratificam o Tratado de Banimento Parcial dos Testes

Nucleares.

1964 China explode a primeira bomba atômica.

1967 O Tratado do Espaço Sideral é ratificado onde proíbe atividades

militares em corpos celestes e no espaço sideral, incluindo a Lua.

O Tratado de Tlatelolco é ratificado e estabelece a Zona Livre de

Armas Nucleares na América Latina e no Caribe.

1968 O Tratado de Não-Proliferação das Armas Nucleares é ratificado.

A bomba B-52 cai no mar gelado de Thule, na Groelândia e esparrama

plutônio.

1971 É ratificado o Tratado sobre Proibição de Instalação de Armas

Nucleares no fundo do mar.

1972 Richard Nixon e Leonid Brezhnev assinam o Acordo de Limitação de

Armamentos Estratégicos (Salt) e Antimísseis Balísticos (ABM) que foi

seguido pelo Salt I: Acordo interino de armas ofensivas.

1974 A Índia realiza testes nucleares subterrâneos.

1975 Ocorre à Convenção sobre Armas Biológicas.

Brasil assina acordo para construção de Angra I com a Alemanha.

1979 Em sigilo, militares e cientistas brasileiros iniciam programa para

desenvolver a tecnologia de urânio enriquecido.

Ocorre nos EUA o acidente da usina de Three Mile Island.

1980 A China realiza o último teste de armas nucleares na atmosfera.

1981 Submarino dos EUA que carregava 160 ogivas nucleares colide com

um cargueiro japonês no mar da China oriental.

Início do funcionamento de Angra I.

1983 Reagan traça novos planos, para a tecnologia de defesa antimísseis,

com o projeto Stars Wars.

1985 É ratificado o Tratado da Zona Livre de Armas Nucleares do Pacífico

Sul.

1986 Ocorre à explosão de Chernobyl e Reagan e Gorbachev discutem

sobre a eliminação das armas nucleares em Reykjavik.

É realizado o acordo de Desenvolvimento de Medidas para Aumentar a

Confiança e a Segurança e Desarmamento na Europa.

23

1987 Reagan e Gorbatchev ratificam o Tratado de Forças Nucleares de

Alcance Intermediário (FNI).

Acidente radioativo em Goiânia.

Brasil anuncia que possui tecnologia para o enriquecimento de urânio.

1989 Queda do Muro de Berlim e fim da Guerra Fria.

1990 O Tratado das Forças Armadas Convencionais na Europa é ratificado.

1991 Fundação da Agência Argentino-Brasileira de Contabilidade e Controle

de Materiais Nucleares (ABACC).

O Tratado de Redução de Armas Estratégicas (Start I) é ratificado.

Ocorre a inspeção de Armas no Iraque.

1992 É ratificado o Tratado de Céus Abertos.

1993 George Bush e Boris Yeltsin ratificam o Tratado de Redução de Armas

Estratégicas (Start II).

Convenção para a Proibição das Armas Químicas (CPAQ).

É estabelecido um Registro de Armas Nucleares pela ONU.

1994 Anuncia-se a ratificação do Brasil ao Tratado de Tlatelolco.

Brasil e Rússia estabelecem acordo sobre acidentes nucleares.

Ratifica-se o Tratado para a proscrição de Armas Nucleares na

América Latina e Caribe.

África do Sul finaliza o desarmamento de suas armas nucleares.

1995 Conferência de Pugwash.

Conferência de Revisão do TNP em que sua maior conquista foi à

prorrogação indefinida do tratado.

É estabelecido o Acordo de Wassenaar para o Controle da Exportação

de Armas Convencionais e Mercadorias e Tecnologias de Dupla

Utilização.

1996 A Assembleia Geral da ONU solicitou o parecer consultivo da Corte

Internacional da Justiça (CIJ) sobre a Licitude da Ameaça ou Emprego

das Armas Nucleares e no documento final consta: “Existe o dever de

conduzir de boa-fé negociações e de chegar a conclusões que levem

ao desarmamento nuclear em todos os aspectos”.

É ratificado o Tratado da Zona Livre de Armas Nucleares do ASEAN e,

outro, também na região da África conhecido como Tratado de

Pelindaba.

24

Assembleia Geral da ONU adota o Tratado Abrangente de Proibição de

Testes nucleares (TAPT).

Brasil estabelece um acordo de cooperação nuclear com a Índia.

1997 O Brasil ratifica o TNP.

1998 Índia e Paquistão realizam teste nucleares.

1999 Ocorre a Convenção Interamericana para Transparência na Aquisição

de Armas Convencionais.

2000 Conferência de Revisão do TNP.

Entra em operação Angra II.

2001 Reportagens televisivas da Rússia mostram que sete pessoas foram

apreendidas acusadas de tentar vender urânio para armas.

2003 Coréia do Norte anuncia retirada do TNP.

Termina após seis meses, sem terem encontrado nada, uma pesquisa

pela ONU sobre armas nucleares no Iraque.

2005 Conferência de Revisão do TNP.

Coréia do Norte afirma ter fabricado armas nucleares.

2007 Coréia do Norte realiza teste nuclear.

Inicia-se uma preocupação internacional sobre a possibilidade do Irã

adquirir armas nucleares.

2008 Liderada pela Austrália e Japão é criada a Comissão Internacional de

Não Proliferação Nuclear e do Desarmamento.

2010 Conferência de Revisão do TNP.

Eletrobrás obtém licença para construção de Angra III.

Barack Obama e Dmitri Medvedev assinam acordo para substituir o

Tratado de Redução de Armas Estratégicas.

Conselho de Segurança da ONU aprove sanções contra o Irã

alegando-os de descumprirem as orientações da AIEA.

2011 ABACC comemora 20 anos.

ONU inaugura um Fórum de Discussão sobre uma Zona Nuclear Livre

de Armas no Oriente Médio.

25

2 O CONSTRUTIVISMO

2.1 O pensamento teórico nas relações internacionais

O estudo de Relações Internacionais tem como objetivo, analisar as

interações e comportamentos entre vários protagonistas como os Estados, seus

líderes e governos, câmaras municipais, organizações privadas com e sem fins

lucrativos, organizações internacionais, não governamentais, o indivíduo e entre

outros fatores que influenciam nas tomada de decisões e criam o cenário

internacional.

A disciplina surge no pós Primeira Guerra Mundial nos EUA e na Inglaterra

onde, seus pensadores, tinham o objetivo de que soluções internacionais fossem

encontradas sem a necessidade de uma guerra.

Os primeiros passos levaram a propostas idealistas, porém, este só ficou no

campo das ideias do “dever ser” e, na década de 30 com a eclosão da Segunda

Guerra Mundial o cenário internacional se desestabiliza e frustra os que acreditam

no ideal do “dever ser” na busca da paz.

Partiu-se então, para estudar as relações internacionais, como elas realmente

eram e se traz de volta a razão do Estado, da defesa e segurança baseados no

interesse nacional. Porém, se necessitava de uma análise científica para extrair

teorias onde métodos e mecanismos fossem aplicados no comportamento dos

Estados e suas relações.

Assim, para entender as causas dos eventos, os cientistas políticos e

filosóficos buscaram desenvolver teorias. Karen Mingst define a teoria nas relações

internacionais como: “um conjunto de proposições e conceitos que procura explicar

fenômenos especificando as relações entre os conceitos; o propósito final da teoria é

prever fenômenos.” (MINGST, 2009, p. 2)

As mais acentuadas dentro das Relações Internacionais foram, e ainda são, o

realismo e liberalismo. Em linhas gerais, o liberalismo expõe que, a natureza do

homem é boa. Os Estados cooperam e se interagem baseados em normas que

todos concordam. O realismo expõe que, os Estados vivem em um sistema

internacional anárquico e baseia sua política nos interesses nacionais consolidados

em termos de poder e, a distribuição deste poder, é que cria a estrutura do sistema

internacional (MINGST, 2009).

26

Além das teorias, existem três níveis de análise dentro das relações

internacionais: o indivíduo, o Estado e o sistema internacional. Cada teoria possui

uma visão e aplicabilidade para os níveis.

Pode parecer que somente estes três níveis sejam insuficientes para uma boa

análise, vista a complexibilidade e dinâmica das relações internacionais, contudo,

aumentá-los significaria aumentar também as problemáticas.

Porém, todos os analistas, pensadores e teóricos da época não conseguiram

prever o desfragmento da URSS como foi, e que, consequentemente, gerou o fim da

Guerra Fria. O historiador John Lewis Gaddis enaltece:

As principais abordagens teóricas que modelaram a disciplina de Relações Internacionais desde Morgenthau têm todas em comum, como um de seus principais objetivos, a antecipação do futuro (...) o papel da teoria sempre foi não somente falar do passado e explicar o presente, mas fornecer ao menos uma previsão do que estaria por vir. (...) a teria de relações internacionais respondeu bem a importante tarefa que se propôs de prever o futuro da Guerra Fria? (GADDIS, 1992. p. 10).

Isto deu margem para criticas as teorias, até então existentes, e para o

surgimento de novos pensamentos. Então, surgem ao final do século XX, teorias

alternativas que desafiam as demais, retomando questões fundamentais como a

natureza do Estado e conceitos de soberania e cidadania.

Acreditando que é impossível chegar a uma teoria generalizada com base em métodos históricos, filosóficos ou comportamentais, os teóricos críticos argumentam que a teoria esta situada em um tempo e um lugar determinados, condicionada por influências ideológicas, culturais e sociológicas. Não há uma realidade única, somente múltiplas realidades baseadas em experiências e perspectivas individuais. (MINGST, 2009. p. 3).

Assim, questões como cultura, identidade, nacionalismo, tornam-se campos

de análise das Relações Internacionais, com uso maior de mecanismos e métodos

de outras áreas da ciência como filosofia, sociologia e antropologia.

Baseado nisso, uma das teorias que surge é a construtivista, ao qual iremos

dar destaque no presente trabalho, com o objetivo de verificar sua aplicabilidade

para abolição das armas nucleares.

Enquanto as demais promovem análises de fatores específicos e descartam,

como exemplo, os interesses dos indivíduos, valores e padrões de condutas sociais,

o construtivismo faz uma abordagem da investigação de todas as interações sociais.

Sua visão do Estado (2º nível de análise), é que este é moldado pelas

crenças, normas coletivas e identidade social. As estruturas do sistema internacional

27

(3º nível de análise), entre os Estados, não são materiais, mas intersubjetivas e

sociais.

Assim, tem como protagonista principal o indivíduo (1º nível de análise),

identidades coletivas e acreditam que este é que molda o cenário internacional

através de mudanças evolucionárias.

2.1.1 A teoria construtivista

Vivemos em um mundo que construímos, no qual somos os principais protagonistas, e que é produto das nossas escolhas. (...) não se trata de um mundo que nos é imposto, que é predeterminado, e que não podemos modificar. Podemos mudá-lo, transformá-lo, ainda que dentro de certos limites. Em outras palavras o mundo é socialmente construído. (NOGUEIRA; MESSARI, 2005, p. 162)

A teoria surge pela primeira vez em 1989, por ocasião da publicação do livro

World of Our Making – Rules and Rule in social Theory and international relations de

Nicholas Onuf, e se difundiu no artigo de Alexander Wendt Anarchy is what states

make of it na revista International Organization em 1992 (NOGUEIRA; MESSARI,

2005, passim.).

Podemos destacar como filósofos mais influentes para o surgimento da teoria:

Nietzsche e Foucalt. Os teóricos construtivistas que até o momento mais

contribuíram para a mesma: Kratochwil, Onuf e Wendt (Ibid.). E, como adeptos de

Wendt ao qual focaremos no trabalho: Haas e Adler (SARFATI, 2005).

A partir de então, intensos debates foram desenvolvidos sobre o lugar das

ideias e dos valores na análise de eventos sociais e, após, sobre a antecedência

ontológica dos agentes ou da estrutura.

Os construtivistas acreditam que as ideias têm características estruturais. Em primeiro lugar, as ideias – entendidas mais genericamente como conhecimento coletivo institucionalizado em práticas – são o meio e o propulsor da ação social; definem limites do que é cognitivamente possível ou impossível para os indivíduos. Simultaneamente, práticas baseadas em conhecimento são o resultado de indivíduos que interagem e que agem propositadamente com base ideias, crenças, julgamentos e interpretações (Adler, 1999, p. 210).

No começo a teoria foi esquecida por influentes das relações internacionais

como Keohane, e outros como Lapid a chamaram de pós-positivismo, mas nos

encontros da International Studies Association, na segunda metade da década de

1990, o construtivismo passou a ocupar uma posição de destaque e ganhou, por

28

exemplo, inclusão ao lado do realismo e do liberalismo, como abordagem dominante

das Relações Internacionais por Walt (NOGUEIRA; MESSARI, op. cit.).

O construtivismo acredita que as relações internacionais consistem em fatos

sociais que só ocorrem por acordos entre os indivíduos. O escritor e filósofo Robert

Pirsig expõe: “Inventamos terra e céus, árvores, pedra e oceanos, deuses, música,

artes, línguas, filosofia, engenharia, civilização e ciência. Chamamos esses análogos

de realidade. E eles são realidade.” (PIRSIG, 1974 apud ADLER, 1999, p. 1).

Esta construção da realidade, por se dar no meio social abre espaço para

contínuas mudanças e, o construtivismo, não nega a existência de um mundo lá

fora, mas que este não faz sentido se não pensarmos e nos referirmos ao indivíduo.

Indivíduos em coletivo forjam, moldam e mudam a cultura por meio de ideias e práticas. Estado e interesses nacionais são a resultado das identidades sociais desses protagonistas. Assim, o objetivo de estudo são as normas e práticas dos indivíduos e da coletividade. (MINGST, 2009, p. 68).

Para os construtivistas, o mundo social é intersubjetivo (SCHUTZ, 1964;

KRATOCHWIL, 1989), pois nesta relação entre indivíduos aprendemos,

compreendemos, somos compreendidos, ensinamos e, consequentemente,

transmitimos nossos valores.

Sobre esta realidade social intersubjetiva Karl Popper a dividi em três sub-

universos que denominou de “Mundo 1, Mundo 2 e Mundo 3” e os define da

seguinte forma:

Mundo 1 é o mundo de todos os corpos, forças e campos de forças físicas; e também dos organismos, de nosso corpo, e suas partes. O Mundo 2 é subjetivo das experiências conscientes, de nossos pensamentos, nossos sentimentos de alegria ou depressão, nossos objetivos, nossos planos de ação. O Mundo 3 é o da cultura, ou dos produtos da mente humana, e especialmente o mundo de nossas línguas: nossas histórias, nossos mitos, nossas teorias explicativas (...) de nossas tecnologias (...) da arquitetura e da música. (...) um pensamento, assim que formulado em uma linguagem, torna-se um objeto que nos é externo. Esse objeto pode então ser criticado intersubjetivamente – por outro ou por todos nós mesmo (POPPER, 1982, p. 118).

O Mundo 3, gerado social e coletivamente, podemos associar a visão

construtivista e, este mundo, só se torna real pelo fato de gerar consequências reais,

inclusive nos interesses e comportamento de agentes políticos, sejam intencionais

ou não (ADLER, 1999).

29

Além disso, os construtivistas consideram o poder importante, porém, não em

termos materiais (militar, econômico, politico), mas sim em termos discursivos – o

poder das idéias, da cultura e da linguagem.

O Discurso “não é apenas um instrumento da política, mas sim a própria ação

política” (NOGUEIRA; MESSARI, op. cit., p.183), ele dita regras que constrói o

mundo e, este discurso, é construído com pelos valores e cultura do indivíduo.

E assim, como o liberalismo e realismo, o construtivismo não é uma teoria

uniforme e possui muitas variáveis que são frouxamente definidas. Até então, foram

apresentadas premissas básicas da teoria e faremos referência ao teórico Alexander

Wendt.

Como falado logo no inicio, Wendt difundi o termo construtivista em seu artigo

no ano de 1992, porém, em 1999, ousa e surpreende o meio acadêmico com seu

livro Social Theory of International Politcs, em que expõe sua opinião de que as

demais teorias, até então, nunca foram capazes de prever algo que já não fosse

tendência em curso. No livro Collective Identity Formation, Wendt define o

construtivismo como:

(...) uma teoria estrutural do sistema internacional que faz as seguintes reivindicações centrais: 1 os Estados são a unidade principal de análise para a teoria política internacional; 2 as estruturas chaves no sistema de Estados são mais intersubjetivas do que materiais, e 3 os interesses e as identidades dos Estados são construídos, em grande parte, por essas estruturas sociais, em vez de ser fornecidos de modo exógeno ao sistema, pela natureza humana ou pela política doméstica (WENDT, 1994, p. 385).

Paralelo a essa dissuasão do construtivismo, na década de 90, ocorre à

aceleração do termo e processos de globalização, que também, ganha espaço nas

discussões e análises das relações internacionais.

A globalização abre margem a questões que afetaram diariamente os

indivíduos com inovações tecnológicas, dinâmicas na economia, mobilidade de

mercado e de mão de obra, que invade diretamente a identidade e cultura dos

indivíduos.

E dentro do construtivismo, Wendt descreve o conceito de identidade, onde,

para ele, a identidade é um produto de processos relacionais que se transformam e

se adaptam de acordo com as necessidades, o que geram mudanças no cenário

internacional.

30

Assim, as identidades antecedem os interesses nacionais, pois, antes de

defendê-lo, é preciso definir qual é esse interesse e, para defini-lo, é preciso definir

as identidades que estão em sua origem (NOGUEIRA; MESSARI, op. cit.).

O que precisamos conhecer é a identidade, e as identidades mudam como resultado de comportamento cooperativo e aprendizado. Se o sistema é anárquico ou não, depende da distribuição de identidades e não da distribuição de capacidade militar, como os realistas gostariam que acreditássemos (MINGST, 2009, p. 68).

Wendt define isso como identidade social (WENDT, 1999) em que é “o

conjunto de significados que os atores atribuem a si próprios, tomando em

perspectiva os outros” (SARFATI, 2005, p. 263).

A identidade é a base para a construção de interesses e somente passa a existir quando ambos começam a se relacionar. (...) As relações de cooperação e conflito entre Estados dependem substancialmente do processo de formação de identidade entre eles. (...) Os Estados que identificam positivamente entre si tendem a cooperar, enquanto aqueles que se identificam negativamente tendem a manter uma relação conflituosa. (...) Os Estados que compartilham valores em comum podem formar uma comunidade, assim como os seres humanos (SARFATI, 2005, p. 264).

Entendemos então que essa identidade, construída pela interação dos

indivíduos no âmbito social, gerou a Segunda Guerra Mundial, o holocausto, guerras

civis, acordos ambientais e, da mesma forma, pode contribuir para resoluções como

a abolição das armas nucleares.

Por este motivo, a proposta é que o indivíduo crie consciência da devastação

que as armas nucleares podem gerar e se mova para mudar a visão de que estas

geram segurança a fim de eliminá-las.

Judge Christopher Weeramantry, Presidente da Associação Internacional de

Advogados, enaltece: “na verdade, não estamos vivendo sob a proteção da arma

nuclear, estamos vivendo sob sua sombra. As armas nucleares são a maior ameaça

enfrentada pela humanidade até hoje.” (WEERAMANTRY, 2010, In: Quarterly, p. 4) .

2.2 O papel do indivíduo em prol da abolição das armas nucleares

Necessitamos de mudança de paradigma. É preciso reconhecer que a essência da liderança está nas pessoas comuns — quaisquer que sejam e onde quer que se encontrem — cumprindo o papel que é somente delas. Esta é, por sua vez, a base que, como queria Arquimedes, nos permite fazer o mundo se movimentar. Quando cada um de nós dá contribuição exemplar e, juntos, desenvolvemos redes de solidariedade múltiplas, aprendemos as amargas lições do século 20 tão estigmatizado pela guerra e pela violência. Só então construiremos uma nova era (IKEDA, 2011, p. 33).

31

A ideia de que armas têm haver com segurança, remetendo a teoria realista,

que são necessárias para deter a guerra está sendo o principal impedimento para

sua abolição. Esta visão deve ser contestada.

No Relatório Final da Comissão sobre Governança Global, Nossa Vizinhança

Global, no cinquentenário das Nações Unidas, referente à liderança em ações para

a abolição das armas nucleares, em 1995, consta: “Por liderança, não nos referimos

apenas às pessoas nos mais altos níveis nacionais e internacionais. Mas também às

de qualquer nível” (ONU, 1995, p. 355).

Jon Elster enaltece que “a unidade elementar da vida social é a ação humana

individual” (ELSTER, 1994, p. 29) e, sobre o papel do indivíduo na abolição das

armas nucleares, Judge Christopher Weeramantry declara que “precisamos

aumentar a conscientização pública e estimular o ativismo de modo que possamos

dizer aos governantes mundiais que devem dar ouvidos à opinião pública.”

(WEERAMANTRY, 2010, In: Quarterly, p. 4).

Assim, as atitudes dos indivíduos que geram expressões coletivas, mesmo

que não sejam validas e totalmente efetivas a priori, transformam praticas políticas e

tem capacidade de alastrar-se pelo mundo e tornam-se indiscutíveis (ADLER, 1999).

Neste contexto podemos destacar o termo, “Tabu Nuclear”, criado e exposto

no livro por Nina Tannewald, The nuclear taboo: The United States and the non-use

of nuclear weapons since 1945. A ideia que envolve o Tabu Nuclear é uma proibição

normativa sobre o uso de armas nucleares, que está associado ao sentimento de

vergonha moral.

Tannewald defende a ideia de que, as armas nucleares não foram utilizadas

na Guerra Fria, e não têm sido até agora devido à dissuasão convencional de que o

medo de represália nuclear impede os Estados de fazerem uso dessas armas.

Para desenvolver o termo, “Tabu Nuclear”, Tannewald identificou três pontos:

O primeiro, e mais importante para este trabalho é de que o indivíduo através de

campanhas e movimentos populares globais em prol da abolição das armas

nucleares tornou impossível pensar sobre estas apenas como qualquer outra arma,

mas sim como algo desprezível que coloca em risco toda humanidade

(TANNEWALD, 2010, In: Quarterly).

O segundo ponto se refere, às políticas em prol da abolição das armas

nucleares pelas Nações Unidas e, o terceiro se refere, às pressões estratégicas e

32

riscos da escalada nuclear (TANNEWALD, 2010, In: Quarterly). Em uma entrevista

esclarece:

(...) quando se assumiu que as armas nucleares poderiam ser usadas na guerra, como qualquer outra arma, até hoje, quando o uso de armas nucleares pelas Estados é quase impensável - , ele reflete tanto a moralidade como o interesse próprio. Ou seja, você tem uma convergência de interesse realista e o interesse moral – no sentido de que estas são inaceitáveis, as armas são moralmente repugnantes – e isso cria um círculo bastante grande, talvez maior do que tínhamos há muito tempo, verdadeiramente se movimentando em direção à abolição. (TANNEWALD, 2010, In: Quarterly, p.9).

Durante a história, a maior parte do controle de armas químicas veio de

movimentos da sociedade civil e da pressão por estes exercida. Estes movimentos

ocorrem, pois, os indivíduos são os mais afetados.

Sobre algumas consequências geradas ao indivíduo pelas armas nucleares,

Tilman Ruff, Presidente da Campanha Internacional pela Abolição das Armas

Nucleares expõe: “As taxas de câncer entres os sobreviventes das explosões

nucleares de Hiroshima e Nagasaki e de futuras gerações ainda estão aumentando”

(RUFF, 2010, In: Quarterly, p. 4).

Na Proposta de Paz enviada a ONU, em 2011, pelo Dr. Daisaku Ikeda,

Presidente da Organização Soka Gakkai Internacional enaltece: “essencial é o

compromisso fervoroso dos cidadãos conscientes de que o povo pode sim dar um

novo rumo à história humana.” (IKEDA, 2011, p. 34).

Temos como exemplo de movimentos feitos pelos indivíduos: a Marcha dos

Jovens na Inglaterra em 1958, para a campanha em prol do desarmamento nuclear

e a Manifestação na França em 1951, contra os testes nucleares.

Tannewald compartilha: “esse movimentos tiveram sucesso significativo na

obtenção do controle das armas e possuem condições de mudar suas políticas em

relação a vários tipos de armas.” (TANNEWALD, 2010, p. 9).

Se a sociedade civil mundial levantar sua voz e crescer de presença, erguendo mudança avassaladora na opinião internacional, terá um poder que nenhum governo poderia resistir. Força é começar um processo que cristalize o desejo dos povos do mundo por uma forma concreta e legalmente coercitiva. (...) O trabalho crucial é sensibilizar as pessoas para esta verdade: trata-se de uma questão de consciência humana. Nós não podemos permitir que as pessoas de nenhum país sejam vítimas de armas nucleares, cada indivíduo precisa expressar sua recusa em continuar a viver à sombra de seu perigo (IKEDA, 2011, p. 42).

Acreditando no poder de indivíduos conscientes e comprometidos,

analisaremos a seguir, a participação da política de diplomacia e do povo brasileiro

em prol da abolição das armas nucleares.

33

3 SOBRE O BRASIL

a diplomacia compreende a ação externa dos governos em objetivos, valores e padrões de conduta vinculados a uma agenda de compromissos pelos quais se pretende realizar determinados interesses. Essa agenda é, em princípio, determinada muito mais de fora do que de dentro de cada nação. O elevado grau de determinação externa da diplomacia pode ser observado em sua dimensão global, regional e bilateral (CERVO, 2008, p. 8).

Em meados da década de 30, o Brasil, inicia pesquisas científicas dentro do

setor nuclear, voltadas para questões de física e química, porém, não somente o

Brasil, mas o mundo todo, após o dia 6 de agosto de 1945, coloca os olhos na

questão nuclear como interesse sistêmico e de segurança.

No Brasil, a questão nuclear foi tida como elemento estratégico para o

desenvolvimento nacional, onde, a energia atômica e a tecnologia por ela envolvida,

dariam respaldo no setor econômico e político (BATISTA, 2000). E é neste cenário,

que a diplomacia da época não se comprometeu com o regime de não-proliferação

nuclear.

3.1 Panorama histórico do Brasil e sua relação com as armas nucleares

O primeiro acordo nuclear com o Brasil ocorreu com os EUA e objetivava a

exportação de areia monazítica, que contém o elemento Tório, o mesmo utilizado

nos processos nucleares, na região do Espírito Santo.

Em 1951, foi fundado o Conselho Nacional de Pesquisa (CNPq) tendo o

almirante Álvaro Alberto da Mota e Silva como primeiro presidente e, inicialmente,

apoiava uma transferência de tecnologia nuclear ao Brasil em troca das exportações.

Tal proposta não trouxe resultados devido a conflitos ideológicos.

Em 1953, o almirante realiza secretamente com a Alemanha, a construção de

três ultra-centrífugas. Elas seriam desenvolvidas na Alemanha e enviadas ao Brasil,

com objetivo de desenvolver o urânio enriquecido. Porém, devido ao vazamento de

informações, as ultra-centrífugas não chegam ao Brasil por terem sido apreendidas

pelos EUA.

Com a eleição de Juscelino Kubitschek, se inicia a um movimento nacionalista

contra a exportação de areia monazítica e, devido a esta movimentação, é fundada

a Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN).

34

Já no governo de Jânio Quadros, iniciam esboços para a instalação de um

reator nuclear no sul do estado do Rio de Janeiro. O objetivo era estimular o

desenvolvimento da indústria nuclear brasileira, para tanto, a maior parcela da

tecnologia aplicada seria nacional, pois, utilizaria o urânio natural devido o Brasil

possuir grandes reservas de tório.

Além do desenvolvimento da indústria nuclear nacional, a construção do

reator, tinha como objetivo a obtenção de plutônio, material de interesse nuclear, o

qual não se concretizou devido à renúncia de Jânio Quadros.

Na década de 60, ocorre a militarização do país, onde todos os setores, não

somente foram atingidos, como também dominados pelos militares, incluindo o

nuclear.

Em 1968, a CNEN, assina um acordo com a Eletrobrás, por meio do qual

caberia a Furnas a construção de uma usina nuclear em Angra dos Reis, que foi

efetivada e é conhecida como Angra I, a qual obteve incidentes e erros de projetos.

Sua localização, nas proximidades da cidade de Angra dos Reis, é considerada por alguns pesquisadores, inadequada. A falta de um sistema de transporte eficiente para a retirada dos moradores em caso de acidente compromete a segurança. As condições estruturais do terreno são as piores, devido a uma falha geológica na região denominada de Itaorna, batizada pelos índios com o significado de Pedra Podre (KURAMOTO; APPOLONI, 2002, p. 379).

Na década de 70, o Brasil assina um acordo nuclear com a Alemanha, onde

seriam estabelecidas relações entre a empresa estatal Nuclebrás (Brasil) e Kraftwerk

Unio (Alemanha). Tal acordo foi concluído e aprovado pela Agência Internacional de

Energia Atômica (AIEA), que previa a utilização da energia nuclear para fins

pacíficos, em 1976. Isto resultou na quebra do acordo entre Brasil e EUA.

Neste acordo, os alemães possuíam mais vantagens que os brasileiros, visto

os impasses nacionais encontrados por ecologistas, o interesse nas reservas de

urânio do Brasil e da busca de novos mercados no setor nuclear pelas empresas.

“O acordo era totalmente desfavorável para o Brasil, pois o país se tornaria

dependente da Alemanha na produção e utilização de equipamentos, por um tempo

não determinado” (KURAMOTO; APPOLONI, 2002, p. 381) e, mesmo assim, o país

possuía metas ousadas.

Estimava-se até o ano 2000 a participação de 53% de energia vinda de reatores nucleares. (...) Um exagero em um país que possui um dos maiores potenciais hidrelétricos do mundo. (...) Além disso, o custo por kW da energia nuclear seria de U$ 400.00, que mais tarde passou a U$ 3000.00, enquanto

35

que o da energia hidrelétrica, na época, era de U$ 300.00 (KURAMOTO; APPOLONI, 2002, p. 387).

Dados como estes, fizeram com que a dinâmica e intensidade pelo militares

em adquirir a tecnologia nuclear, exercesse mais calma. Além disso, ocorreram

manifestações contra o acordo, como por exemplo, a feita pela Sociedade Brasileira

de Física (SBF) e, surgia, uma grande preocupação internacional devido ao material

residual deste acordo, o plutônio, que é a matéria-prima na fabricação de armas

nucleares.

Assim, em 1983, devido a pressões externas, dificuldades técnicas e

econômicas, o acordo foi encerrado pelo presidente Figueiredo e, como isso, foi

adiado o início da operação das usinas de Angra II e III.

Devido às tentativas que não obtiveram sucesso no setor nuclear dentro do

Brasil, este tipo de programa começa a perder credibilidade e se inicia um Programa

Nuclear Paralelo, patrocinado pela Marinha, Conselho Nacional de Energia Nuclear

(CNEN), pelo Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (IPEN) e aplicaram

todos os recursos do setor no desenvolvimento da indústria bélica, com objetivo de

construir um submarino nuclear.

Devido aos problemas gerados com o urânio enriquecido e o cenário

internacional movido por uma grande tensão com a proliferação de armas nucleares,

o programa, inicialmente, obteve pouco desenvolvimento.

A Argentina, do contrario crescia rapidamente no setor. Isso fez com que os

militares brasileiros, com receio de perder sua relevância na América do Sul,

criassem um projeto paralelo clandestino, sem fiscalização para desenvolver a

ultracentrifugação para o enriquecimento de urânio.

Porém, com a vitória nas eleições de um partido de oposição militar, o projeto

estava ameaçado e, devido ao cenário de grande desconfiança pelos demais

governos, sociedade e na esfera internacional, o presidente José Sarney, instalou

um Conselho Superior de Política Nuclear (CSPN), composto por 28 cientistas, que

tinha como objetivo gerar uma transparência na política nuclear brasileira e divulgar

projetos para fins pacíficos.

Entretanto, na década de 80, preocupados com a Argentina, é divulgado que

cientistas brasileiros haviam conseguido dominar a tecnologia de enriquecimento de

urânio por ultracentrifugação e, assim, os projetos clandestinos são oficializados e,

além disso, foram apresentados os projetos para o término da construção das usinas

36

de Angra II e III e de um reator em Iperó-SP, que serviria de modelo para reatores de

submarino nuclear.

Com a mudança de governo, na década de 90, o presidente Fernando Collor,

fechou a área do Iperó e, em segunda, anunciou na Organização das Nações

Unidas (ONU), que o Brasil rejeitava qualquer teste de explosões nucleares. Era o

inicio de um afastamento do Brasil nas questões de armamento nuclear.

Isto gerou um ciclo de mudança na política e diplomacia do Brasil. Em 1991,

ocorreu o fim dos governos militares no Brasil e Argentina e culminou na assinatura

de um acordo entre os dois países, que serviu como base para a fundação da

Agência Argentino-Brasileira de Contabilidade e Controle de Materiais Nucleares

(ABACC).

A Marinha suspendeu o projeto de construção do submarino nuclear e

transferiu sua tecnologia para a operação de Angra II, juntamente com Angra I, para

o desenvolvimento de combustível nuclear. Em 1994, o Brasil assina um acordo

nuclear com a Rússia sobre acidentes nucleares, ratifica o Tratado de Tlatelolco e,

em 1996, estabelece um acordo de cooperação nuclear com a Índia.

Com estas demonstrações de compromisso, com a não-proliferação e a

retomada da credibilidade, o Brasil estabelece dois acordos com os EUA, de

cooperação nuclear e espacial. O acordo traz como objetivo o desenvolvimento e

uso conjunto de reatores, salvaguardas de materiais e componentes nucleares e

intercâmbio de técnicas de proteção contra a radiação.

Após os fatos apresentados acima, só faltava uma postura para o Brasil

esclarecer com total transparência sua política e diplomacia nuclear para fins

pacíficos, a retificação do TNP.

Ao analisarmos a história da humanidade, percebemos que a Guerra Fria e

assunto como terrorismo nuclear, não são preocupações do Brasil, pois não

afetaram diretamente os assuntos nacionais. As questões levantadas pelo país com

relação à segurança foram:

Ser ou não ser uma potência, manter ou não uma concepção estratégicas como diretriz de Estado, definir ou não objetivos permanentes, dispor ou não de poder com o fim de conferir apoio logístico ao desenvolvimento econômico, equipar a política exterior com instrumentos de manobra internacional, entrelaçar defesa, segurança e política exterior, postar-se de forma assertiva diante de simplismo da segurança global como a Guerra Fria e o combate ao terrorismo (...) (CERVO, 2008, p. 33).

37

Neste contexto é que encontra a relação do Brasil com o TNP e a efetiva

retificação ou não do Tratado.

3.1.1 Sua politica com relação ao TNP

Em função de todos os fatos históricos, o Brasil recusou-se a ratificar o TNP

inicialmente, devido às condições limitadas e falta de efetivação nas resoluções que

o TNP oferece exposto ao inicio do trabalho, mas, em especial, sobre o controle que

impõe para o desenvolvimento de tecnologia, pois, para aqueles que haviam

investido antes nesse setor, possuíram vantagens em comparação aos outros

Estados (GUIMARÃES, 2007).

na área nuclear, Brasil e Índia se constituíram nos críticos mais veementes ao regime de não-proliferação estabelecido pelos EUA e União Soviética com a entrada em vigor do Tratado de Não-Proliferação das Armas Nucleares (1968). Alegando características discriminatórias do TNP e visualizando-o como um instrumento de “neocolonialismo tecnológico”, o Brasil recusou-se a ceder ao mesmo. Datam de então as diferenças profundas entre Brasil e EUA nessa área – opondo-se o Brasil às iniciativas lideradas pelos EUA de restringir o acesso a materiais e tecnologias nucleares, no âmbito da política externa norte-americana de impedir a

proliferação das armas nucleares. (LIMA, 2000, p. 17).

Porém, com um processo gradual e acúmulo de fatores, que foram as

mudanças de governos, pressões sociais, internacionais, deficiências domésticas,

econômicas, entre outros, em 1997, o Brasil ratifica o TNP.

Ao ratificar o TNP, o Brasil cumpriu com seu objetivo prioritário, o de “resgatar

as hipotecas que ainda pesavam sobre a credibilidade externa do país”

(LAMPREIA,1998).

Na Constituição República Federativa do Brasil, consta no Art. 21 inciso XXIII

alínea “a”: “toda atividade nuclear em território nacional somente será admitida para

fins pacíficas mediante aprovação do Congresso Nacional.”

3.1.2 Pós TNP

Em 1999, realizou-se uma reunião onde participaram todos os secretários de

Energia dos estados brasileiros em Angra dos Reis, ocasião em que se firmou o

projeto da usina nuclear de Angra III.

Os pontos colocados a favor do projeto são: independência do país no setor energético, evitando influências de fatores políticos e econômicos

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internacionais, já que o combustível utilizado é nacional; esgotamento do potencial hidráulico; dependência da importação do combustível para a energia térmica à gás; estímulo à ciência e tecnologia (KURAMOTO; APPOLONI, 2002, p. 390).

Posteriormente, o Brasil iniciou uma postura diplomática voltada totalmente

para a abolição das armas nucleares, que está servindo como referência e

enaltecendo o país em acordos e conferências.

Diplomacia nuclear neste contexto significa estabelecer uma política externa em um mundo competitivo, que responda a um duplo desafio. Os desafios são os de se estabelecer relações científicas, tecnológicas e comerciais com possíveis exportadores de conhecimentos e equipamentos que o país não possui e, ao mesmo, reagir e responder as regras estabelecidas pra o comércio de equipamentos núcleo-elétricos e ao controle do regime de não-proliferação de armas nucleares. (WROBEL, 2000, p. 69)

O site do Itamaraty faz referência à relação do Brasil com o desarmamento,

não-proliferação, e expõe a convicção de que são processos interdependentes, e

que o país busca manter a prioridade no processo de desarmamento nuclear,

enaltecendo a necessidade de efetivas medidas e compromisso com a eliminação

completa das armas nucleares pelas potências que ratificaram o TNP.

3.2 Seleção de discursos

Uma das ferramentas, as quais os construtivistas usam como estudo,

conforme abordado no trabalho é o discurso. Abaixo, comentaremos sobre os

recentes discursos proferidos por representantes do Brasil.

3.2.1 O caso do Irã

Nos últimos anos, um dos Estados que vem causando preocupação no

âmbito de dissuasão nuclear é o Irã, devido seu pronunciamento sobre seu

programa nuclear, que afirmar ser para fins pacíficos. Sobre este assunto o Brasil se

posicionou a favor.

O anuncio deste posicionamento ocorreu no dia 23 de novembro de 2009,

após reunião entre o presidente iraniano, Mahmoud Ahmadinejad, e o presidente

Luiz Inácio Lula da Silva. No momento da entrevista o presidente Lula ressaltou que

a posição brasileira é defender um programa que tenha fins pacíficos.

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No momento do posicionamento, os presidentes falaram a respeito do

programa e responderam perguntas. Dentre as questões expostas, o presidente Lula

fez o seguinte pronunciamento: "Esse é o caminho que o Brasil vem trilhando em

obediência à nossa Constituição que proíbe a produção e utilização de armas

nucleares. Não proliferação e desarmamento mundial devem andar juntos"1.

No decorrer ainda ressaltou que "o Brasil sonha com o Oriente Médio livre de

armas nucleares, como ocorre em nossa querida América Latina."2 Esta atitude, até

mesmo por ser recente ainda esta gerando tensões no cenário internacional, pois a

suspeitas de que o Irã oculta a produção de armas nucleares.

Mas, percebemos a intenção do Brasil de, não somente se mostrar em busca

da abolição das armas nucleares, como também, de se inserir com mais propriedade

e autonomia no cenário internacional.

3.2.2 O ano de 2010 representado por Celso Amorim

Em 2010, o Brasil ganhou destaque no âmbito da abolição das armas

nucleares, em meio a representações do, então Ministro das Relações Exteriores

(MRE), Celso Amorim. Ao todo, foram três discursos que obtiveram grande

repercussão.

São eles: o da Reunião de Cúpula da organização "Global Zero: a world

without nuclear weapons"; da Abertura da 8ª Conferência de Revisão do TNP e; da

Conferência do Desarmamento.

1 SILVA, Luiz Inácio Lula. Declaração à imprensa do Presidente da República, Brasília: MRE, 2009.

Disponível em < http://www.itamaraty.gov.br/sala-de-imprensa/discursos-artigos-entrevistas-e-outras-comunicacoes/presidente-da-republica-federativa-do-brasil/726816030639-declaracao-a-imprensa-do-presidente-da-republica>. Acesso em: 23 de out. 2011

2 Id. 2011.

40

Em seu discurso, proferido na Reunião de Cúpula da organização "Global

Zero: a world without nuclear weapons"3, realizada no mês de fevereiro em Paris, ele

declara sobre o Brasil e a situação no cenário internacional com relação às armas

nucleares:

um país [Brasil] que está passando por mudanças profundas, que está ampliando a sua participação nos assuntos mundiais e que está tentando criar um mundo mais igualitário, seguro e justo, um mundo onde não há justificativa para armas nucleares. (...) Também seria justificável questionar se a não-proliferação, sem ser paralelamente acompanhada pelo desarmamento, é uma proposta com credibilidade ou segura. (...) E devemos nos perguntar se as armas nucleares são um meio apropriado de lidar com as ameaças de segurança do século XXI: terrorismo, conflitos interétnicos e crimes cibernéticos. (...) Um mundo no qual a existência de armas nucleares continua a ser aceita é intrinsecamente inseguro. (...) O Brasil tem autoridade moral para exigir o progresso no campo do desarmamento nuclear e da não-proliferação. Nossa Constituição é uma das poucas no mundo que estipula o uso da energia nuclear apenas para fins pacíficos (AMORIM, 2010).

No mês de maio, por ocasião da 8ª Conferência de Revisão do TNP4, o Brasil

teve a oportunidade de proferir o discurso de abertura que, consta os seguintes

trechos:

O Tratado de Não-Proliferação é intrinsecamente injusto, pois divide o mundo entre “os que têm” e os que “não têm”. Ele é uma expressão dos desequilíbrios do sistema internacional. É o produto de uma era na qual o poderio militar, principalmente o das armas nucleares, era a principal, senão a única, fonte de prestígio e de poder político. O próprio fato, lamentável, de que os membros permanentes do Conselho de Segurança são justamente os cinco Estados nucleares reconhecidos pelo Tratado reforça a percepção de que armas nucleares são um meio para obter proeminência política. (...) O Brasil está convencido de que a melhor garantia para a não-proliferação é a total eliminação das armas nucleares. (...) Os Estados detentores de armas nucleares também deveriam renunciar ao aprimoramento ou desenvolvimento de novos artefatos nucleares. (...) Os argumentos para justificar a posse de armas nucleares durante a Guerra Fria, se em algum momento foram válidos, não podem mais ser sustentados. (...) Os esforços para evitar a proliferação nuclear devem ser conduzidos com absoluta seriedade. (...) O mundo só estará a salvo quando todos os países considerarem que estão sendo tratados com equidade e respeito; quando suas vozes forem ouvidas e as causas dos conflitos, como a pobreza e a discriminação, forem superadas. A presença de armas nucleares apenas agrava esses problemas. As armas nucleares geram instabilidade e insegurança. Aprofundam o sentido de injustiça (AMORIM, 2010).

3 AMORIM, Celso. Palestra na Reunião de Cúpula da organização "Global Zero: a world without nuclear

weapons", Paris: MRE, 2010. Disponível em < http://www.itamaraty.gov.br/sala-de-imprensa/discursos-artigos-

entrevistas-e-outras-comunicacoes/ministro-estado-relacoes-exteriores/palestra-do-ministro-celso-amorim-na-reuniao-de>. Acesso em: 23 de out. 2011. 4 AMORIM, Celso. Discurso na 8º Conferência de Revisão do TNP, Nova York: MRE, 2010. Disponível em <

http://www.itamaraty.gov.br/sala-de-imprensa/notas-a-imprensa/discurso-do-ministro-celso-amorim-na-8a-conferencia-de-revisao-do-tnp-nova-york-3-de-maio-de-2010>. Acesso em: 23 de out. 2011.

41

Pouco tempo depois, no mês de junho, ocorre a Conferência do

Desarmamento5. Nesta ocasião, o Brasil, já com a nova presidência, teve

novamente a oportunidade de proferir seu discurso, em que expõe os seguintes

trechos:

Por experiência própria, posso dizer que, por tempo demais, a Conferência do Desarmamento tem tido o fracasso e a frustração como parte de sua rotina. (...) A infeliz identidade entre os cinco membros permanentes do Conselho de Segurança das Nações Unidas e os cinco Estados reconhecidos pelo TNP como nuclearmente armados torna decisões sobre esses assuntos objeto de certa “reserva de mercado”. (...) Estamos contentes em observar que cada vez mais pessoas – cientistas, ativistas, líderes políticos – passam a compartilhar da nossa visão de que a melhor garantia para a não-proliferação é a eliminação total das armas nucleares. (...) Armas nucleares não têm função no mundo mais pacífico, democrático e próspero que queremos todos construir. (...) Faz-se necessária uma mudança de mentalidade. Deve-se abandonar a lógica da Guerra Fria, a lógica da capacidade de destruição mútua. (...) O mundo não atingirá estabilidade sustentável enquanto a protelação do desarmamento nuclear e a contínua modernização dos arsenais estimularem a proliferação. (...) O Brasil saúda a promessa de reduções quantitativas nos arsenais dos Estados nuclearmente armados. No entanto, isso está longe de ser suficiente. (...) Um calendário mais rigoroso para o desarmamento nuclear também é essencial. Enquanto vinha para cá, reli uma intervenção que fiz nesta Conferência dez anos atrás. É lamentável, mas surpreendente o quanto dela poderia ser repetido, hoje, sem qualquer alteração. Não podemos mais escolher a inércia como procedimento padrão da CD (AMORIM, 2010).

Identificamos uma extrema semelhança em todos os pronunciamentos, e

podemos destacar quatro pontos: a grande insatisfação do Brasil com relação aos

mecanismos, que buscam cada qual da sua forma, a abolição das armas nucleares;

o grande desejo de que todos os países nuclearmente armados, em especial os

membros permanentes do Conselho de Segurança, promovam atitudes concretas

para o desarmamento; seu forte posicionamento contra as armas nucleares,

independente de influências externas e; a convicção de que, o único meio para a

estabilidade internacional a nível de segurança, encontra-se na abolição total das

armas nucleares.

3.2.3 2011 a nova representação.

5 AMORIM, Celso. Discurso na Conferência do Desarmamento, Geneva: MRE, 2010. Disponível em <

http://www.itamaraty.gov.br/sala-de-imprensa/notas-a-imprensa/intervencao-do-ministro-celso-amorim-na-conferencia-do-desarmamento-2013-genebra-15-de-junho-de-2010>. Acesso em: 23 de outro. 2011.

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Foram mostrados, pronunciamentos de ex-presidente Lula e do ex-Ministro

das Relações Exteriores, Celso Amorim, por isto, como abordaremos o ano de 2011

vale ressaltar a mudança de governo, de Lula para Dilma Rousseff, ocasionou na

mudança de representação pelo Ministro das Relações Exteriores, até então, Celso

Amorim, que foi substituído por Antonio Patriota.

Neste ano, por ocasião da 66ª Assembleia Geral da ONU6, o Brasil teve a

chance de se pronunciar novamente a respeito do assunto nuclear, agora, com a

nova presidência. Alguns trechos do discurso foram:

Somos uma área livre de armas nucleares e que acredita no valor do diálogo. Temos [se necessário] legitimidade para recomendar uma atitude mais ousada em razão às rápidas transformações no mundo (...) No Brasil e na América do Sul, trilhamos um outro caminho. Somos hoje modelo de paz, democracia e integração, livre de armas nucleares e que acredita no diálogo. (...) O Brasil deixou claro que um mundo no qual as armas nucleares sejam aceitas será sempre um mundo inseguro. O Brasil compartilha da preocupação mundial com a segurança nuclear (...) Redobremos nossos esforços em prol do desarmamento geral. (...) É imperativo ter no horizonte a eliminação completa e irreversível das armas nucleares. A ONU deve preocupar-se com isso. Estudos apontam a deteriorização do estado de conservação e de manuseio desse material, sem falar da ameaça permanente que essas armas de destruição em massa apresentam para a humanidade. (...) O uso seguro e pacífico é irreversível (para o Brasil) e está na nossa Constituição (ROUSSEFF, 2011).

A partir deste, percebemos que a mudança de governo, não ocasionou a

mudança na política e diplomacia brasileira com relação às armas nucleares. Porém,

identificamos que, não faz um ou dois anos ao qual veem expondo internacional esta

posição que, por sua vez, não conseguiu mudar em nada no posicionamento dos

Estados.

Deste modo, partiremos para a análise da identidade, outro instrumento

utilizado pelos construtivistas e o foco do trabalho, tendo em vista que atitudes e

pronunciamentos políticos não fizeram necessário, na busca para a abolição das

armas nucleares.

3.3 A identidade brasileira

6 ROUSSEFF, Dilma. Discurso na abertura do Debate Geral da 66ª Assembleia Geral das Nações Unidas,

Nova York: MRE, 2011. Disponível em <http://www.itamaraty.gov.br/sala-de-imprensa/discursos-artigos-entrevistas-e-outras-comunicacoes/presidente-da-republica-federativa-do-brasil/discurso-na-abertura-do-debate-geral-da-66a-assembleia-geral-das-nacoes-unidas-nova-york-eua-21-de-setembro-de-2011-1>. Acesso em: 23 de out. 2011.

43

(...) status e identidade, ambos em ampla escala negligenciados pelo realismo e pelo liberalismo, desempenham um papel-chave. (...) superam outros determinantes mais comumente aceitos para o comportamento dos Estados, como as preocupações com segurança (CERVO, 2008, p.1).

O construtivismo busca fornecer explicações baseadas no âmbito social, de

acordo com a identidade estudada, no nosso caso, os brasileiros. Mas, quem são os

brasileiros? Qual sua identidade?

A construção de uma identidade social, então, como a construção de uma sociedade, é feita de afirmativas e de negativas diante de certas questões. Tome uma lista de tudo o que você considera importante — leis, idéias relativas a família, casamento e sexualidade; dinheiro; poder político; religião e moralidade; artes; comida e prazer em geral — e com ela você poderá saber quem é quem. Não é de outro modo que se realizam as pesquisas antropológicas e sociológicas. Descobrindo como as pessoas se posicionam e atualizam as “coisas” desta lista, você fará um “inventário” de identidades sociais e de sociedades. Isso lhe permitirá descobrir o estilo e o “jeito” de cada sistema. (DAMATTA, 2008, p. 15)

O povo brasileiro nasce, “da confluência, do entrechoque e do caldeamento

do invasor português com índios silvícolas e campineiros e com negros africanos”

(RIBEIRO, 1995, p. 19) por isto “somos uma cultura sincrética, um povo novo, que

apesar de fruto da fusão de matrizes diferenciadas se comporta como uma só gente,

sem se apegar a nenhum passado, só olhando para o futuro”. (Ibid.)

Sobre esta influência indígena, portuguesa e africana, não podemos esquecer

que estas sofreram influência de outros povos. Como exemplo, os portugueses, que

na sua formação sócio-cultural sofreram influências árabes, africanas, gregas, e

judias.

Algo que podemos destacar ser um aprendizado para o povo brasileiro, vindo

dos portugueses que, por sua vez, aprenderam com outra cultura é o valor do saber,

do coletivo e do comércio, que são referências árabes.

A junção de tantas culturas e influências deu origem ao povo brasileiro. Um

povo “mestiço de carne e espírito” (RIBEIRO, 1885, p. 453), criativo, ligado aos laços

familiares, que busca relações mais intimas entre as pessoas, no sentimento de

coletivo intrínseco ao interesse pessoal (DAMATTA, 2008).

Trompenaars e Hofstede (1980-2000) desenvolveram a teoria das dimensões

culturais que, dentro mais de 50 dimensões interculturais, selecionaram 7 que

acreditam ser as básicas para compreendermos, a princípio, uma cultura. São elas:

1ª Regras ou relacionamentos;

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2ª Grupos ou individualismo;

3ª Difuso ou específico;

4ª Afetivo ou neutro;

5ª Valorizado pelo o que você é ou o que você conquista;

6ª sincrônico ou sequencial e;

7ª Controle interno ou externo.

Não estudaremos a fundo este conceito, mas, resumidamente, já que

estamos buscando entender a cultura e identidade do povo brasileiro, podemos

caracterizá-lo em:

1º Relacionamento, pois, herdado de suas raízes africanas e indígenas,

possui forte ligação familiar;

2º Paradoxo, pois, ao mesmo tempo em que não gosta de ir ao cinema

sozinho, possui uma forte tendência a buscar somente suas realizações;

3º Difuso, pois, uma comunicação complexa onde muito se fala e gesticula;

4º Afetivo, como já foi explicito na 1ª dimensão.

5º Valorizado pelo que você é visto a importância de raízes familiares, como

exemplo, Diniz e Matarazzo.

6º Sincrônico, pois, é dinâmico e consegue fazer várias tarefas ao mesmo

tempo;

7º Controlado pelo externo, como a chuva ou o trânsito que o atrapalha ao ir

para o trabalho.

Esta é uma pequena premissa perto de inúmeras opiniões e definições para o

povo brasileiro, como exemplo, no livro de Darcy Ribeiro, 1995, em que compartilhar:

Outros intérpretes de nossas características nacionais vêem os mais variados defeitos e qualidades aos quais atribuem valor causal. Um exemplo nos basta. Para Sérgio Buarque de Holanda seriam características nossas, herdadas dos iberos, a sobranceria hispânica, o desleixo e a plasticidade lusitanas, bem como o espírito aventureiro e o apreço à lealdade de uns e outros e, ainda, seu gosto maior pelo ócio do que pelo negócio. Da mistura de todos esses ingredientes, resultaria uma certa frouxidão e anarquismo, a falta de coesão, a desordem, a indisciplina e a indolência. Mas derivariam delas, também, certo pendor para o mandonismo, para o autoritarismo e para a tirania (RIBEIRO, 1995, p. 451).

45

Logo após estas palavras, Darcy Ribeiro, ao buscar uma alternativa para

olhar e caracterizar o povo brasileiro enaltece:

Como quase tudo isso são defeitos, devemos convir que somos um caso feio, tamanhas seriam as carências de que padecemos. Seria assim? Temo muito que não. Muito pior para nós teria sido, talvez, e Sérgio o reconhece, o contrário de nossos defeitos, tais como, o servilismo, a humildade, a rigidez, o espírito de ordem, o sentido de dever, o gosto pela rotina, a gravidade, a sisudez. Elas bem poderiam nos ser ainda mais nefastas porque nos teriam tirado a criatividade do aventureiro, a adaptabilidade de quem não é rígido mas flexível, a vitalidade de quem enfrenta, ousado, azares e fortunas, a originalidade dos indisciplinados (RIBEIRO, 1995, p.451).

Amado Luiz Cervo, 2008, esclarece que o povo brasileiro não é conhecido por

políticos, diplomatas ou cientistas, mas sim por sua literatura e seus personagens

criados que refletem a própria visão da sociedade.

As correntes brasileiras do pensamento político e do pensamento diplomático carregam como legado histórico a identidade pluralista em que nasceu, cresceu e amadureceu a nação, cujo curso profundo repousa sobre substrato étnico-cultural múltiplo (CERVO, 2008, p. 9).

O Brasil, necessita de uma mudança de dentro para fora, “a ação deve ser

sempre entendida de dentro” (WEBER, 1968 apud ADLER, 1999, p. 210), uma

mudança no povo brasileiro, não no aspecto de valores, mas de atitude “construindo

na luta para florescer amanhã como uma nova civilização, mestiça e tropical,

orgulhosa de si mesma.” (RIBEIRO, 1995, p. 455)

Mais do que ações físicas e externas que determinem para onde, como,

quando e por que vamos, somos movidos pelo “conhecimento compartilhado, do

significado coletivo que eles atribuem à situação, (...) de suas práticas, ou mesmo,

algumas vezes, de sua criatividade conjunta.” (ADLER, 1999, p. 213)

Nosso resultado, então, é que, à crítica prática que fala com o idioma da economia e da política pelo mundo da rua, seria preciso somar a linguagem da casa e da família e, com ela, o idioma dos valores religiosos que também operam e, por isso, determinam grande parte do comportamento profundo do nosso povo (DAMATTA, 2008, p. 103).

O povo brasileiro, desde seu inicio, até hoje, é formado por raças distintas que

sabem conviver com as diferenças, a não tratar o outro como estranho, ameaça ou

inimigo e somam valores.

Num mundo que cada vez mais se desencanta consigo mesmo e institui um individualismo sem limites, que reduz os valores coletivos a mero apêndice da felicidade pessoal, a capacidade de ainda deslumbrar-se com a

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sociedade é algo muito importante, algo positivo. E aqui [Brasil], sem dúvida, podemos novamente sintetizar, de modo criativo e relacional, o indivíduo com as suas exigências e direitos fundamentais, com a sociedade, com a sua ordem, seus valores e necessidades (DAMATTA, 2008, p103).

Por toda esta condição histórica no âmbito cultural, na criação da identidade

do povo brasileiro, acreditamos que, o Brasil, possa ser referência através desta,

tendo-a como poder, na resolução de temas internacionais. A identidade, o indivíduo

é que constrói seus interesses.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao estudarmos a história das armas nucleares e sua relação com o mundo

atual, percebemos que se precisa compreender e reconhecer a incompatibilidade

das armas nucleares com segurança.

Analisamos a teoria construtivista, como forma de encontrar uma alternativa

que fosse possível mudar a visão de segurança internacional sob as armas

nucleares e encontrar uma aplicabilidade para sua abolição em um mundo onde o

realismo predomina.

E baseados nos tempos de hoje, percebemos o vinculo das armas nucleares

com a economia e política quando entendemos à segurança de quem se destinam

essas armas.

Assim, após o estudo, assumimos que somente o construtivismo não é capaz

de encontrar todas as respostas e afetivas ações para este feito e, percebemos

ainda que, nenhuma teoria das Relações Internacionais se faz capaz de encontrar

soluções e ações eficazes para o sistema internacional, em todos os aspectos.

Porém, acreditamos que o construtivismo seja uma alternativa mais humana,

visto que teorias, como a realista, em situações de conflito e guerra se pode matar a

qualquer hora por qualquer coisa um inimigo perdendo a visão e essência de que ele

é um ser humano.

Tilman Ruff, Presidente da Campanha Internacional pela Abolição das Armas

Nucleares, expõem: “não há nada além das armas nucleares com capacidade para,

a qualquer momento, acabar com a civilização humana e com a vida em nossa terra

no decorrer de umas poucas horas.” (RUFF, 2010, In: Quarterly, p. 4)

Apesar das armas nucleares parecerem irrelevantes aos problemas que a

sociedade enfrenta como meio ambiente, escassez de água, alimento, energia, entre

outros, a existência destas faz, com que toda a humanidade viva em risco constante.

Além disto, uma pesquisa comprova que os “efeitos da radiação nas futuras

gerações são: crianças com duas cabeças, sem joelhos, três dedos em cada pé e

assim por diante.” (QUARTERLY, 2010, p. 15). E, estes efeitos se manifestam até

hoje nos Hibakuchas (sobreviventes da bomba atômica) e seus descendentes.

Ray Acheson, diretora do Reaching Critical Will, expos a seguinte opinião

sobre o assunto: “As pessoas no mundo todo precisam renunciar às armas

nucleares como ferramenta legítima de segurança nacional ou internacional e deixar

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claro que tanto sua utilização quando sua posse são inaceitáveis” (ACHESON, 2010,

In: Quarterly, p. 11). Por esta razão, já que o sistema não encontra uma solução, a

sociedade deve expor sua opinião.

Percebemos e ousamos dizer que o Brasil, por sua cultura e pela identidade

de seus indivíduos, possui o perfil adequado para estar na vanguarda da causa em

prol da abolição das armas nucleares. Em um discurso, no palácio do Itamaraty,

Dilma declara: “Somos hoje modelo de paz, democracia e integração, somos uma

área livre de armas nucleares que acredita no valor do diálogo.” (MRE, 2011).

Mas, admitimos que identificamos estar, o povo brasileiro, muito a quem de

promover movimentos e ações pela abolição das armas nucleares. Mesmo assim,

ainda acreditamos no poder do indivíduo como protagonista de mudanças no

sistema internacional.

Como exemplo, destacamos Jossei Toda, um líder religioso que no ano de

1957, fez a seguinte declaração sobre a abolição das armas nucleares no Japão:

“Mesmo que neste momento esteja sendo realizado no mundo inteiro um movimento

para abolir os testes nucleares, meu desejo é atacar o problema pela raiz, ou seja,

cortar as garras ocultas exatamente na origem.”

Após seu falecimento, o Dr. Daisaku Ikeda deu continuidade a seus legados

fundando a Soka Gakkai Internacional, organização não governamental filiada a

ONU. A organização promove atividades no âmbito da paz, cultura e educação.

Além disso, Dr. Daisaku Ikeda, envia anualmente uma Proposta de Paz à ONU a fim

de compartilhar ideias e soluções sobre problemas que a sociedade enfrenta.

E aquela declaração de 1957, tornou-se um dos objetivos do Dr. Daisaku

Ikeda, da organização, que se encontra hoje em mais de 192 países e territórios, e

também fez com que indivíduos, voluntários pertencentes ou não a organização,

promovessem ações pela mesma causa.

Temos como exemplo, os dez milhões de assinaturas recolhidas no Japão

para apoiar a abolição das armas nucleares e que, posteriormente, foram

apresentadas ao secretário-geral da ONU.

Posteriormente em 2007, se criou a campanha “Década dos povos de ação

pela abolição nuclear”, com o objetivo de tornar os cidadãos comuns e a sociedade

civil nos protagonistas que criaram uma onda de demanda pela abolição das armas

nucleares que irão influenciar os tomadores de decisão.

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Por esta campanha, já foram realizadas exposições, fóruns, matérias com

Hibakuchas e seus descendentes, pesquisas com os cidadãos, entre outros.

Em 1996, por ocasião da reunião da Corte Internacional da Justiça, um dos

delegados pediu para que os demais fizessem a seguinte reflexão sobre as armas

nucleares: “qual seria nossa reação se o homem da idade da pedra tivesse tido a

possibilidade de devastar o meio ambiente de tal forma que nos afetaria 25 mil anos

depois?”. Sem duvidas os acusaríamos de bárbaros e egoístas, mas, estamos

agindo da mesma forma.

Assim, no decorrer do trabalho, mesmo não mudando nossa convicção

conforme apresentado acima, não foi possível comprovar que o construtivismo é a

alternativa para abolição das armas nucleares, nem que o povo brasileiro seria o

melhor protagonista.

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