disciplinaridade da ci- dialética marxista

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www.sbu.unicamp.br/seer/ojs/index.php ARTIGO © Rev. digit. bibliotecon. cienc. inf. Campinas, SP v.11 n.2 p.1-20 maio/ago. 2013 ISSN 1678-765X CDD: 020 A(S) DISCIPLINARIDADE(S) DA CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO: APLICAÇÃO DAS LEIS DA DIALÉTICA MARXISTA NO CONTEXTO PLURI, INTER E TRANSDISCIPLINAR THE DISCIPLINARITY(S) OF INFORMATION SCIENCE: APPLICATION OF THE MARXIST DIALECTICS LAWS IN THE MULTI, INTER AND TRANSDISCIPLINARY CONTEXT Jonathas Luiz Carvalho Silva 1 Resumo: Discute sobre a construção disciplinar do conhecimento na Ciência da Informação a partir da aplicação das leis da dialética marxista. Apresenta como síntese problematizadora a seguinte pergunta: como é possível aplicar as leis/categorias da dialética marxista à Ciência da Informação? Tem como objetivo uma reflexão sobre a dialética marxista (materialista) e as formas de aplicação das leis da dialética à Ciência da Informação. A metodologia do presente estudo consiste de uma pesquisa de nível exploratório com delineamento bibliográfico. Concluímos que há possibilidades diversas de aplicação das leis da dialética marxista à Ciência da Informação, especialmente no que toca a lei da mudança qualitativa, a lei da ação recíproca e a lei da luta dos contrários. Porém, essas aplicações se estabelecem não como uma verdade, mas como pressupostos para compreender os significados do caráter disciplinar da Ciência da Informação no âmbito de suas transformações epistemológicas. Palavras-chave: Ciência da Informação. Dialética Leis Categorias. Pluridisciplinaridade. Interdisciplinaridade. Transdisciplinaridade. Abstract: Discusses the construction of disciplinary knowledge in Information Science from the application of the Marxist dialectic laws. Presents a synthesis problematizing the following question: how is it possible to apply the laws / categories of Marxist dialectics to Information Science? It aims to reflect on Marxist dialectics (materialistic) and forms of application of dialectics laws to Information Science. The methodology consists of an exploratory study with bibliographic design. Concludes that there are several possibilities for the application of the Marxist dialectic laws to Information Science, especially as regard to qualitative change law, reciprocal action law and struggle of opposite’s law. However, these applications are established not as a fact, but as presuppositions for understanding the meanings of disciplinary information Science within its epistemological transformations. Keywords: Social Network., Information Flows. Information Science. 1 Professor do curso de Biblioteconomia da Universidade Federal do Ceará - Campus Cariri. Mestre em Ciência da Informação pela Universidade Federal da Paraíba (UFPB). E-mail: [email protected] Enviado em: 14/09/2012 Aceito em: 03/03/2013.

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Disciplinaridade da Ciência da Informação - abordagem marxista

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    Rev. digit. bibliotecon. cienc. inf. Campinas, SP v.11 n.2 p.1-20 maio/ago. 2013 ISSN 1678-765X

    CDD: 020

    A(S) DISCIPLINARIDADE(S) DA CINCIA DA INFORMAO:

    APLICAO DAS LEIS DA DIALTICA MARXISTA NO CONTEXTO

    PLURI, INTER E TRANSDISCIPLINAR

    THE DISCIPLINARITY(S) OF INFORMATION SCIENCE: APPLICATION

    OF THE MARXIST DIALECTICS LAWS IN THE MULTI, INTER AND

    TRANSDISCIPLINARY CONTEXT

    Jonathas Luiz Carvalho Silva 1

    Resumo: Discute sobre a construo disciplinar do conhecimento na Cincia da Informao a

    partir da aplicao das leis da dialtica marxista. Apresenta como sntese problematizadora a

    seguinte pergunta: como possvel aplicar as leis/categorias da dialtica marxista Cincia

    da Informao? Tem como objetivo uma reflexo sobre a dialtica marxista (materialista) e as

    formas de aplicao das leis da dialtica Cincia da Informao. A metodologia do presente

    estudo consiste de uma pesquisa de nvel exploratrio com delineamento bibliogrfico.

    Conclumos que h possibilidades diversas de aplicao das leis da dialtica marxista

    Cincia da Informao, especialmente no que toca a lei da mudana qualitativa, a lei da ao

    recproca e a lei da luta dos contrrios. Porm, essas aplicaes se estabelecem no como uma

    verdade, mas como pressupostos para compreender os significados do carter disciplinar da

    Cincia da Informao no mbito de suas transformaes epistemolgicas.

    Palavras-chave: Cincia da Informao. Dialtica Leis Categorias. Pluridisciplinaridade.

    Interdisciplinaridade. Transdisciplinaridade.

    Abstract: Discusses the construction of disciplinary knowledge in Information Science from

    the application of the Marxist dialectic laws. Presents a synthesis problematizing the

    following question: how is it possible to apply the laws / categories of Marxist dialectics to

    Information Science? It aims to reflect on Marxist dialectics (materialistic) and forms of

    application of dialectics laws to Information Science. The methodology consists of an

    exploratory study with bibliographic design. Concludes that there are several possibilities for

    the application of the Marxist dialectic laws to Information Science, especially as regard to

    qualitative change law, reciprocal action law and struggle of opposites law. However, these

    applications are established not as a fact, but as presuppositions for understanding the

    meanings of disciplinary information Science within its epistemological transformations.

    Keywords: Social Network., Information Flows. Information Science.

    1 Professor do curso de Biblioteconomia da Universidade Federal do Cear - Campus Cariri. Mestre em

    Cincia da Informao pela Universidade Federal da Paraba (UFPB). E-mail:

    [email protected]

    Enviado em: 14/09/2012 Aceito em: 03/03/2013.

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    INTRODUO

    A Cincia da Informao vem se desenvolvendo rpida e amplamente como

    campo do conhecimento, mesmo sendo considerada uma cincia jovem. Esse

    desenvolvimento ocorre baseado em um constante processo de transformaes,

    reflexes e contradies como inerente a qualquer campo do conhecimento.

    Um dos principais instrumentos para discusso sobre o desenvolvimento de

    um campo cientfico tem sido a sua configurao disciplinar. No caso da Cincia da

    Informao essa configurao disciplinar tem sido marcada como caracterstica

    natural da rea. As caractersticas disciplinares da Cincia da Informao vem sendo

    discutidas de forma acalorada como fenmeno de construo do conhecimento.

    Conforme Lnine (1975, p. 123) o conhecimento pode ser definido como:

    processo pelo qual o pensamento se aproxima infinita e eternamente do

    objeto. O reflexo da Natureza no pensamento humano deve ser

    compreendido no de maneira morta, no abstratamente, no sem

    movimento, no sem contradio, mas sim no processo eterno do

    movimento, do nascimento das contradies e sua resoluo.

    O conceito apresentado mostra o conhecimento enquanto elemento dialtico

    de intensa movimentao e transformao. O conhecimento deve ser vivo e primar

    pelo desenvolvimento das contradies e de suas possveis solues, visando conotar

    mudanas de cunho qualitativo.

    Assim, entendemos que a dialtica, mais precisamente suas leis e categorias,

    podem contribuir para se pensar a construo disciplinar do conhecimento na Cincia

    da Informao e suas aplicaes na perspectiva epistemolgica da rea.

    O presente trabalho apresenta como sntese problematizadora a seguinte

    pergunta: como possvel aplicar as leis/categorias da dialtica marxista Cincia da

    Informao? Tem como objetivo uma reflexo sobre a dialtica marxista

    (materialista) e as formas de aplicao das leis da dialtica Cincia da Informao.

    DAS CONCEPES DE LEIS E CATEGORIAS DIALTICAS: ALGUMAS

    CONSIDERAES PRELIMINARES

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    As reflexes sobre o(s) conceito(s) de dialtica possuem uma ampla trajetria

    no mbito da Histria da Filosofia e das Cincias Humanas e Sociais com

    pressuposies e significaes diversas.

    Isso significa dizer que ao nos debruarmos sobre a pergunta o que

    dialtica? teremos uma multiplicidade de respostas contemplando questes temporais

    (a formao dos conceitos a partir das variaes dos pensamentos na Histria da

    Filosofia) e temtico-conceituais (estudiosos diversos que pensam a dialtica no

    contexto das contradies, das transformaes/movimentos, alm das concepes da

    lgica e/ou da metafsica).

    Gadotti (2006) destaca que alguns filsofos foram fundamentais para a

    elaborao do conceito de dialtica, especialmente na China e na Grcia Antiga, tais

    como:

    a) Tao Te Ching (primeiro pensador a incorporar o iderio de dialtica no

    contexto da contradio); Zeno de Elia (considera a dialtica como filosofia da

    aparncia);

    b) Herclito de feso (a realidade um constante devir, na qual prevalece a

    luta dos opostos); Parmnides de Elia (o movimento era uma iluso);

    c) Parmnides (o movimento era uma iluso e tudo era imutvel);

    d) Scrates (o maior dialtico da Grcia, pois utilizando a dvida sistemtica,

    procedendo por anlises e snteses, reconhecia que a verdade se estabelecia como um

    parto em que o mestre era apenas um provocador, enquanto o discpulo seria o

    verdadeiro criador);

    e) Plato (a dialtica seria um mtodo de ascenso ao inteligvel ou mtodo de

    educao racional das ideias);

    f) Aristteles (a dialtica era apenas auxiliar a Filosofia, pois no se

    configurava como um mtodo para se chegar a verdade, mas como movimento que

    conduz o conhecimento disputa, probabilidade ou opinio).

    Assim, observamos que a dialtica e suas bases originrias remontam a duas

    questes cruciais, sendo a primeira relativa a explicao do movimento e da

    transformao da realidade e a segunda os construtos norteados a partir das

    contradies (unidade dos opostos) que se constitui como um dos primados das leis

    dialticas na contemporaneidade.

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    preciso ressaltar que na Idade Mdia e Moderna, a dialtica foi subjugada

    como intil ou desnecessria, j que no primeiro perodo, a Filosofia estava ligada aos

    processos teolgicos e, no segundo perodo, a dialtica se aproximava do pensamento

    aristotlico referente a uma lgica das aparncias.

    Conforme Lalande (1996) a partir de Hegel que a dialtica passa a ser

    retomada no mbito das reflexes filosficas como uma aplicao cientfica das leis

    inerentes a natureza e ao pensamento, assim como a sntese dos opostos em uma

    perspectiva eminentemente idealista.

    Mas a partir de Marx e Engels que a dialtica restabelece seu status

    filosfico e cientfico (no movimento do materialismo dialtico e materialismo

    histrico, respectivamente), de sorte que constitui novos fundamentos para construo

    do conhecimento a partir de uma crtica a dialtica idealista (da conscincia como

    dado primrio) de Hegel.

    Marx, ao contrrio de Hegel, no considera que a conscincia um dado

    primeiro do movimento que leva compreenso da realidade, mas pondera sobre a

    primazia dos contedos materiais e histricos que manifestam formas infinitas da

    conscincia. Logo, Marx rejeita a posio pensada posio objetiva, pois para ele

    esta segunda transgresso s pode ser efetivada atravs da prtica. (OLIVEIRA, 2004,

    p. 23).

    Em outras palavras, Marx valoriza a dialtica como mtodo, construto de

    conhecimento e, especialmente, na relao entre o ser e o mundo que aproxima a

    teoria (conhecimento) da prtica (ao), sendo que a construo de conhecimento

    deve ser composta a partir do real ou concreto (das configuraes sociais, materiais e

    histricas), com vistas a transformao da realidade.2

    Por isso, Marx (1983, p. 233-234) reitera uma percepo muito relevante para

    a discusso sobre a dialtica em uma perspectiva materialista quando afirma que No

    2 No caso a transformao se evidencia na constante luta entre a burguesia e o proletariado no sistema

    capitalista. Esta luta reconhecidamente como luta dos contrrios demanda, na concepo dialtica marxista, um processo de transformao que parte de um pressuposto concreto e real. Isso significa

    dizer que a dialtica marxista se institui a partir dos movimentos de dominao e contradio

    constitudos por meio das foras produtivas (percepo concreta e real da realidade) quando o prprio

    Marx (1978, p. 16) afirma que o homem torna-se cada vez mais pobre enquanto homem, precisa cada vez mais do dinheiro para apossar-se do seu inimigo, e o poder do seu dinheiro diminui em relao

    inversa massa da produo.

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    a conscincia dos homens que determina seu ser, mas, pelo contrrio, o seu ser

    social que determina a sua conscincia.

    Vale destacar que na configurao concreta e real que a dialtica, enquanto

    mtodo e fenmeno de construo do conhecimento se desenvolve a partir de um

    conjunto de leis e categorias. Essas leis foram desenvolvidas considerando os estudos

    de Hegel (dialtica idealista), Marx/Engels (materialismo dialtico e histrico) e os

    sucessores estudiosos do marxismo. Podemos definir 4 (quatro) leis da dialtica

    marxista em oposio metafsica, conforme nos revela Politzer (1970):

    a) tudo se relaciona (lei da ao recproca) o mtodo dialtico designa que

    nenhum fenmeno da natureza pode ser compreendido, quando encarado

    isoladamente;

    b) tudo se transforma (lei da transformao universal) o movimento uma

    qualidade inerente a realidade, ou seja, a dialtica considera as transformaes da

    realidade que se manifesta na natureza e na sociedade de forma inacabada. Esta lei

    est ligada a lei da negao da negao formulada por Engels (1976);

    c) mudana qualitativa revela a existncia de uma relao entre as mudanas

    quantitativas e as mudanas qualitativas e que essa relao uma lei universal da

    natureza e da sociedade;

    d) luta dos contrrios (contradio) afirma que a contradio interna, de

    sorte que revela a essncia da transformao e tambm inovadora, pois tomada

    como uma luta entre o velho e o novo, entre o que morre e o que nasce e entre o que

    perece e o que se desenvolve. Leva em conta a unidade dos contrrios, pois no h

    contradio, se no houver luta entre, pelo menos, duas foras que, embora se

    configurem como foras combatentes, so tambm foras inseparveis.

    preciso observar que essas leis possuem uma diversidade de aplicaes

    sociedade, natureza e a construo do conhecimento que envolve, neste estudo, a

    aplicao das leis da dialtica a Cincia da informao e suas percepes

    disciplinares.

    DA CONTRADIO E MOVIMENTO NA CONSTRUO DO

    CONHECIMENTO: AS LEIS DA DIALTICA MARXISTA APLICADAS AS

    PERCEPES DISCIPLINARES DA CINCIA DA INFORMAO

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    Consideramos que as leis da dialtica supramencionadas no tpico anterior

    podem ser aplicadas sociedade e ao conhecimento contemplando fundamentos

    histricos, materiais e naturais.

    No presente trabalho, enfatizamos a aplicao das leis da dialtica aos

    contextos disciplinares da Cincia da Informao podendo ser ratificada como

    dialtica do conhecimento que segundo Mandel (1978, p.116) uma dialtica

    sujeito-objeto, o resultado de uma interao constante entre os objetos a conhecer e a

    ao dos sujeitos que procuram conhec-lo.

    Aplicao da lei dialtica da mudana qualitativa Cincia da Informao: da

    pluridisciplinaridade interdisciplinaridade

    A dialtica em sua mudana da quantidade para qualidade requer um conjunto

    de expresses sociais e cognitivas que elucidem as propriedades, caractersticas,

    diferenas e semelhanas de uma determinada realidade/objeto/fenmeno.3

    Todavia, essa segregao entre quantidade/qualidade no to exata ou

    precisa e muito menos simples de ser estabelecida, pois se a qualidade demanda as

    diferenas e semelhanas dos indcios da dialtica significa dizer que quantidade e

    qualidade so muito mais indissociveis do que opostos/excludentes.

    Cheptulin (2004, p. 208), aps uma discusso sobre a temtica, alm de seus

    determinantes e propriedades define a qualidade como o conjunto das propriedades

    que indicam o que uma coisa dada representa, o que ela , e a quantidade como o

    conjunto das propriedades que exprimem suas dimenses, sua grandeza.4 Assim, de

    forma recproca, qualidade e quantidade contribuem para compreenso do que

    representa uma determinada coisa.

    Diante dessa reflexo, como pensar a aplicao da lei dialtica da mudana

    qualitativa no mbito da disciplinaridade da Cincia da informao? Em primeira

    instncia, pensamos que em uma dialtica disciplinar da Cincia da informao, a

    3 Desse modo, possvel superar a ideia de que a qualidade referente apenas aquilo que diferencia

    uma coisa das outras, mas tambm inerente as condies de semelhana entre as outras coisas.

    (CHEPTULIN, 2004). 4 Cheptulin (2004) mostra essa relao entre quantidade e qualidade quando exemplifica que cada

    ngulo uma das propriedades de um tringulo, mas possui uma qualidade e quantidade rigorosamente

    definidas, sendo a qualidade o fato desse tringulo ser formado por crculos partindo de um mesmo

    ponto e que tenha outras propriedades, enquanto a quantidade representada por sua grandeza

    concreta, sua dimenso, expressa em graus.

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    quantidade poderia ser representada pela pluridisciplinaridade, enquanto a qualidade

    pela interdisciplinaridade da Cincia da Informao.

    A pluridisciplinaridade pode ser entendida, conforme Dellatre (1973) como

    associao de disciplinas que concorrem para uma realizao comum, mas sem que

    cada disciplina tenha que modificar sensivelmente a sua prpria viso das coisas e os

    seus mtodos prprios.

    J a interdisciplinaridade pode ser entendida aqui a partir de dois conceitos,

    sendo o primeiro de Piaget (1972) quando considera a interdisciplinaridade como

    intercmbio mtuo e integrao recproca entre disciplinas variadas, visando um

    enriquecimento recproco e o segundo de Palmade (1979) quando entende a

    interdisciplinaridade como uma integrao interna e de concepo que rompe a

    estrutura de cada disciplina para construir novos axiomas com vistas a estabelecer

    uma viso unitria do saber.

    Dessa maneira, a quantidade disciplinar da Cincia da Informao no

    desiderato da dialtica imprime nas relaes diversas que a Cincia da Informao

    pode constituir com outros campos do conhecimento e disciplinas sem que ocorram

    interferncias diretas (unilaterais ou mtuas) entre essas reas. Por exemplo, a

    quantidade da dialtica da Cincia da Informao ocorre em um contexto

    pluridisciplinar no que toca a relao com vrias disciplinas/campos do conhecimento

    referentes s Cincias Humanas/Sociais, Exatas, Tecnolgicas, Agrrias, Sade, entre

    outras e a representao de contedos em comum entre a Cincia da Informao e

    essas disciplinas/campos do conhecimento.

    J a qualidade disciplinar da Cincia da Informao como fundamento

    dialtico, ocorre quando h um fechamento mais efetivo das relaes disciplinares

    entre a Cincia da Informao e outras disciplinas/campos do conhecimento havendo

    uma interferncia recproca.

    Por exemplo, entre a Cincia da Informao e a Lingustica devemos ponderar

    como processo de uma mudana dialtica qualitativa a natureza entre informao e

    linguagem, alm da Pragmtica que envolve a anlise do discurso que pode ser

    agregada no processo de anlise documentria, representao e recuperao da

    informao constituindo uma propriedade qualitativa de semelhana e de interferncia

    recproca entre estes campos do conhecimento. Como afirma Baranow (1983) os

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    enfoques pragmticos permitem novas solues para problemas de ambigidade

    semntica e sinttica, que so de importncia crucial na recuperao da informao.

    E como se d essa mudana dialtico-disciplinar da quantidade

    (pluridisciplinaridade) para a qualidade (interdisciplinaridade) na Cincia da

    Informao?

    preciso observar o processo da dialtica do conhecimento a partir da relao

    entre sujeito-objeto, suas possibilidades de interpretao da realidade, suas

    contradies e movimentos na construo do conhecimento, bem como as condies

    particulares, institucionais e de construo do conhecimento da pesquisa/pesquisador,

    curso/programa em Cincia da Informao. Consideramos preliminarmente que a

    dialtica fundamentada a partir de uma mudana qualitativa. Como afirma Luckcs

    (1970, p. 260) a dialtica se constitui no mbito da "formao ininterrupta da

    novidade qualitativa."

    A priori, as condies para uma dialtica quantitativa determinante quando

    da insero (no necessariamente recproca) de muitos contedos (atividades de

    pesquisa, artigos, projetos e outros textos acadmico-cientficos) envolvendo a

    Cincia da Informao e outros campos do conhecimento.

    A partir desse determinante quantitativo, possvel observar uma perspectiva

    de mudana qualitativa no mbito de uma relao social e institucional mais concreta

    entre a Cincia da informao e o(s) campo(s) do conhecimento desejveis para

    constituir uma ao recproca e integrao interna.

    Logo, possvel perceber que essa mudana dialtica qualitativa da

    pluridisciplinaridade para a interdisciplinaridade na Cincia da Informao com

    outros campos do conhecimento imanente aos contextos locais e particulares do

    pesquisador/pesquisa e curso/programa.

    Contudo, essa dialtica da mudana qualitativa s pode ocorrer a partir de uma

    negao de que a Cincia da Informao no interdisciplinar com qualquer campo

    do conhecimento e em qualquer contexto, pois essa interdisciplinaridade s possvel

    atravs de aes recprocas que contribuem para um desenvolvimento coletivo de

    conhecimento.

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    A negao de uma interdisciplinaridade aleatria ou natural da Cincia da

    Informao est sensivelmente debruada em uma justaposio sumria da construo

    pluridisciplinar do conhecimento (procedimento sumrio da dialtica quantitativa).

    Outrossim, essa negao pode ser constatada na percepo de Bicalho e

    Oliveira (2011) quando afirmam que a interdisciplinaridade tem sido lugar comum

    quando associado Cincia da Informao, mas, na sua literatura, no est

    devidamente colocado o seu significado enquanto caracterstica marcante e identitria

    e tambm em Pinheiro (1999, p.175-176) quando destaca que [...] a Cincia da

    Informao incorpora muito mais contribuies de outras reas, do que transfere para

    essas um corpo de conhecimentos gerados dentro de si mesma.

    Assim, a mudana dialtica da qualidade na Cincia da Informao reside na

    construo crtica de que a pluridisciplinaridade um fundamento primrio

    quantitativo e que a interdisciplinaridade se constitui na negao da

    pluridisciplinaridade quantitativa para ser constituda e passvel de efetividade5,

    enquanto aspecto dialtico do conhecimento.

    Por exemplo, em um Programa de Ps-Graduao em Cincia da Informao

    que contemple como base as linhas de gesto e tecnologia provvel uma mudana

    dialtica da quantidade para a qualidade quando a quantidade determina as diversas

    relaes possveis da Cincia da Informao com os campos do conhecimento

    (pluridisciplinaridade) e suas representaes conteudsticas dos artigos e projetos

    desenvolvidos no Programa (seja relativo Cincia da Informao ou a outros

    campos do conhecimento sem uma interferncia direta entre esses campos) e a

    qualidade representa o afunilamento dessas concepes pluridisciplinares quando h

    um contato concreto/direto entre a Cincia da informao e outros campos do

    conhecimento relativos as linhas de gesto e tecnologias, como a Administrao e a

    Cincia da Computao, respectivamente, constituindo uma interferncia direta entre

    esses campos do conhecimento. Essa aproximao interdisciplinar estabelece no

    somente as diferenas, mas tambm as semelhanas e peculiaridades que so marcas

    das propriedades da lei dialtica da mudana qualitativa. (CHEPTULIN, 2004).

    5 A efetividade interdisciplinar entendida aqui no argumento de Oliveira (2004, p. 68) quando elucida

    que a efetividade o fenmeno enquanto fenmeno da essncia, a unidade posta da essncia e do fenmeno. Logo, a interdisciplinaridade da Cincia da informao est situada na essncia de suas aes recprocas com outros campos do conhecimento.

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    Aplicao da lei dialtica da ao recproca Cincia da Informao: a

    formao do materialismo interdisciplinar do conhecimento

    A dialtica, enquanto mtodo e concepo lgica do conhecimento possui

    fundamentos efetivos no que tange ao movimento, relao entre os fenmenos,

    transformao da realidade, contradio/antinomia, afirmao/negao/negao /

    negao da negao. (FAUSTO, 1987).

    A lei da ao recproca invoca os fundamentos categoriais dialticos da

    transformao ontolgica no que toca ao relacionamento das coisas, alm dos

    movimentos e negaes causados por essas relaes. Segundo Engels (1877, p. 392)

    a dialtica considera as coisas e os conceitos no seu encadeamento; suas relaes

    mtuas, sua ao recproca e as decorrentes modificaes mtuas, seu nascimento,

    seu desenvolvimento, sua decadncia.

    Consideramos que a ao recproca, como fenmeno dialtico, possui um

    significado que se aproxima da percepo conceitual de interdisciplinaridade. Politzer

    (1970) afirma que essa lei tem grande importncia prtica, pois quando se analisa

    separadamente um fragmento da realidade, deslocado de seu contexto poltico, h um

    abandono da dialtica porque, esta, ensina que tudo se relaciona.

    Da mesma forma, consideramos que se no h um pensamento, um discurso e

    uma ao recproca, a aplicao da interdisciplinaridade abandonada. O comentrio

    de Fazenda (1994, p.28-29) identifica uma estreita relao conceitual e aplicativa

    entre a lei dialtica da ao recproca e a interdisciplinaridade:

    Interdisciplinaridade no categoria de conhecimento, mas de ao; a

    interdisciplinaridade nos conduz a um exerccio de conhecimento: o

    perguntar e o duvidar; interdisciplinaridade a arte do tecido que nunca

    deixa ocorrer o divrcio entre seus elementos, entretanto, de um tecido

    bem tranado e flexvel. A interdisciplinaridade se desenvolve a partir do

    desenvolvimento das prprias disciplinas.

    A interdisciplinaridade tem como finalidade superar a fragmentao e o

    carter de especializao do conhecimento, causados por uma epistemologia de

    tendncia positivista em cujas razes esto o empirismo, o naturalismo e o

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    mecanicismo cientfico do incio da modernidade. A interdisciplinaridade deve ser

    vista no somente como fenmeno epistemolgico e pedaggico, mas tambm

    poltico e cultural, haja vista que est relacionada aos diversos contextos da

    humanidade. (GADOTTI, 1999).

    Para tanto, compreendemos que a interdisciplinaridade s pode ser concebida

    como instrumento de ao recproca. Essa ao recproca constituinte de um

    processo dialtico marxista que vai da prtica a concepo terica de construo do

    conhecimento.

    Por isso, preciso atentar para o fato de que a interdisciplinaridade na Cincia

    da Informao no pode ser simplesmente considerada como fenmeno natural ou

    conformista, mas sim como fenmeno a ser constitudo e conquistado da prtica

    concepo terica de forma coletiva, integrada e autnoma.

    Isso significa dizer que a interdisciplinaridade fruto das configuraes

    sociais que vai firmando a conscincia coletiva e constituindo um novo corpus

    aplicativo e epistemolgico para a Cincia da Informao por meio de um

    reconhecimento mtuo e relegando a um plano inferior a concepo natural,

    positivista e/ou metafsica de que a Cincia da Informao possui natureza

    interdisciplinar.

    Em outras palavras, a interdisciplinaridade na Cincia da Informao

    categoria de ao (recproca, de integrao e interao) que nos conduz a construo

    do conhecimento ou a formao de uma nova conscincia confirmando o iderio

    marxiano de que o ser social engendra a conscincia. (MARX, 1983).

    possvel perceber no cotidiano social e epistemolgico da Cincia da

    Informao a formao heurstica de um pensamento positivista da

    interdisciplinaridade como elemento arbitrariamente imposto, sem considerar essa

    interdisciplinaridade como fundamento dialtico de ao recproca que se institui

    como afirmao do pensamento lgico do conhecimento na Cincia da Informao.

    Todavia, preciso superar esta percepo negando-a como subsdio vivel

    para o amadurecimento social e epistemolgico da Cincia da Informao. A dialtica

    interdisciplinar do conhecimento na Cincia da Informao deve ser respaldada na

    conquista prtica atravs da formao relacional cotidiana com outros campos do

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    conhecimento, visando a sua constatao de elemento de ao e no simplesmente de

    um conhecimento discursivo.

    Essa relao recproca e direto-concreta com outros campos do conhecimento,

    buscando uma contribuio mtua entre as reas que poder promover Cincia da

    Informao um status real de interdisciplinar reconhecendo na mutualidade

    ontolgica e de adequao recproca a formao de um corpus epistemolgico

    dinmico e conquistado da prtica teoria e no apenas no discurso interno da rea.

    Para detalhar de forma mais efetiva esse desiderato dialtico-interdisciplinar

    da Cincia da Informao como instrumento de ao recproca nos remete a baila a

    reflexo sobre a dialtica.

    Aplicao da lei dialtica da luta dos contrrios Cincia da Informao: a

    trade afirmao pluridisciplinar/negao interdisciplinar/negao da negao

    transdisciplinar

    A luta dos contrrios constantemente discutida no mbito das teorias

    marxianas e marxistas. A contradio o motor da luta dos contrrios que se

    configura no eterno devir social e cognitivo e que se institui na formulao da

    diferena (constituem a forma geral do ser a partir da qual as contradies so

    desenvolvidas) e da identidade (a interpenetrao dos contrrios um no outro).

    Isso significa dizer que a luta dos contrrios no se resume apenas ao que

    diferente ou contraditrio, mas tambm a uma unidade dos contrrios (passagem dos

    contrrios um no outro) que se assume como fundamento de sustentao da dialtica.

    No a toa que Lnine (1989, p.107) afirma ser a dialtica uma teoria que mostra

    como os contrrios podem ser e so habitualmente (e tornam-se) idnticos ao

    converterem-se um no outro , por que razo o entendimento humano no deve

    tomar esses contrrios por mortos, petrificados, mas sim por vivos, condicionados,

    mveis, convertendo-se um no outro.

    Observamos que nesse conceito, os processos conteudsticos da dialtica so

    revelados considerando as perspectivas da contradio enquanto fenmeno da

    dinamicidade lgica e ontolgica do carter prtico e terico do conhecimento.

    possvel dizer ainda que nessa concepo dialtica a luta dos contrrios amadurecem

    no apenas pela sua perspectiva de contradio (oposio), mas especialmente pelas

    suas (in)tensas interpenetraes que torna os contrrios idnticos.

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    Essa passagem constante na luta dos contrrios (conotao de identidade no

    sentido de coincidncia da natureza) que permite pensar a realidade dos fenmenos

    como viva, transformadora e atribuir procedimentos de diferena (que levam a

    efetivao das contradies) constituindo a unidade dos contrrios. A unidade dos

    contrrios definida por Cheptulin (2004, p.287) como seu estabelecimento

    recproco, isto , os aspectos ou tendncias contrrios no podem existir uns sem os

    outros.

    E qual a relao dessa luta dos contrrios e unidade dos contrrios com uma

    dialtica disciplinar na Cincia da Informao? Em primeira instncia, essa relao

    reside na trade disciplinar da pluridisciplinaridade, interdisciplinaridade,

    transdisciplinaridade. A pluridisciplinaridade reconhecida como momento de

    afirmao na Cincia da Informao e alegaes sociais para construo do

    conhecimento. A interdisciplinaridade reconhecida como momento de negao na

    Cincia da informao, de modo que se manifesta como elemento contrrio a

    pluridisciplinaridade.

    Dessa maneira, a eterna luta dos contrrios na Cincia da Informao ocorre

    entre a pluridisciplinaridade (afirmao) e a interdiscipinaridade (negao). Essa luta

    de contrrios permite pensar as contradies epistemolgicas da Cincia da

    Informao que se circunscreve em seu mbito de atuao acadmica, cientfica,

    social e profissional.

    Essa luta dos contrrios ocorre quando a afirmao dialtica pluridisciplinar

    reconhece a Cincia da Informao relacionada a uma multiplicidade de

    campos/disciplinas sem ligaes ou interferncias diretas. A negao dialtica

    interdisciplinar ocorre quando rejeita essa ligao aleatria, sem perspectivas mais

    slidas e de interferncias diretas considerando que uma relao interdisciplinar exige

    reciprocidade.

    Contudo, essa negao dialtica interdisciplinar na Cincia da Informao no

    tem como objetivo simplesmente destruir ou menosprezar a afirmao dialtica

    pluridisciplinar. A negao dialtica, sendo uma conseqncia da evoluo e da

    resoluo das contradies prprias a formao material negada, no uma simples

    destruio de um determinismo qualitativo, mas representa uma negao no curso da

    qual tudo o que havia de positivo no estado negado (em nosso caso a

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    pluridisciplinaridade) est retido para um estado qualitativo novo (em nosso caso a

    transdisciplinaridade). (CHEPTULIN, 2004).

    Essa mudana qualitativa entre a afirmao dialtica pluridisciplinar e a

    negao dialtica interdisciplinar se configura na passagem de uma luta dos contrrios

    para uma unidade dos contrrios quando h uma transformao recproca entre

    pluridisciplinaridade e interdisciplinaridade reconhecendo seus potenciais de

    transformao para uma nova qualidade.

    O nome dessa nova qualidade a transdisciplinaridade que se estabelece como

    terceiro fenmeno intitulado negao da negao (novo estado) dos dois primeiros

    fenmenos (em eterna luta dos contrrios). Pombo (1994, p. 13) permite pensar na

    passagem para o novo estado qualitativo da transdisciplinaridade quando a conceitua

    como:

    [...] unificao de duas ou mais disciplinas tendo por base a explicitao

    dos seus fundamentos comuns, a construo de uma linguagem comum, a

    identificao de estruturas e mecanismos comuns de compreenso do real,

    a formulao de uma viso unitria e sistemtica de um setor mais ou

    menos alargado do saber.

    Percebemos que ocorre na transdisciplinaridade a consolidao da unidade dos

    contrrios em face da unificao de duas ou mais disciplinas com fundamentos e

    linguagens em comum.

    No que toca a Cincia da Informao possvel atentar que em termos de uma

    afirmao pluridisciplinar pode estar ligada a qualquer campo do conhecimento por

    meio de relaes indiretas, como a leitura de textos de outras reas do conhecimento e

    o uso dos textos de outras reas para construo dos contedos de pesquisa em

    Cincia da Informao. Essa ligao pode ocorrer com diversas reas do

    conhecimento de forma mais expressiva no mbito da pesquisa, como as Cincias da

    Sade, Cincias Exatas, Tecnologias (Computao, Engenharia de Produo, etc.),

    entre outras.

    J a negao dialtica interdisciplinar demanda uma ao recproca mais

    efetiva, tanto no mbito dos contedos de pesquisa, quanto de ensino e das prticas

    cotidianas, como, por exemplo, entre a Cincia da Informao e a: Psicologia (Estudo

    de usurios (comportamento do usurio, necessidades e usos da informao);

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    Lingustica (anlise documentria; representao e recuperao da informao);

    Cincia da Computao (Representao da informao; Sistemas de recuperao da

    informao; Inteligncia Artificial e Tecnologias da informao e comunicao);

    Comunicao (Tecnologias da informao e comunicao e Comunicao da

    informao cientfica e tecnolgica); Filosofia (Filosofia da informao,

    epistemologia e representao da informao; Sociologia (fundamentos sociais, a

    sociedade da informao, sociologia da cincia, sociologia do conhecimento,

    Comunicao da informao cientfica e tecnolgica e Estudos mtricos da

    informao); Histria (estudos sobre arquivo, museu e preservao da memria);

    Administrao (Gesto da Informao; Gesto do Conhecimento; Inteligncia

    Competitiva; Planejamento e administrao de unidades de informao; Tecnologias

    de Informao e Comunicao e Economia da informao); Economia (Gesto da

    Informao; Gesto do Conhecimento; Inteligncia Competitiva; Economia da

    informao e Avaliao de custo/benefcio); Cincias da Sade (estudos sobre metrias

    de informao (bibliometria, cienciometria, informetria e webometria) aplicados a

    produo na rea da Sade; competncia em informao na rea de Sade; polticas

    de informao cientfica e tecnolgica no mbito da Sade). (PINHEIRO, 2006;

    MIKHAILOV, CHERNYI E GILYAREVSKYI 1969; SARACEVIC 1992).

    possvel perceber que algumas disciplinas podem estabelecer relaes pluri

    e interdisciplinares com a Cincia da Informao a depender dos seus estados de

    mudana quantitativa/qualitativa, assim como das condies gerais e particulares que

    norteiam cada continente, pas, regio, estado e municpio. O fato que em uma

    relao pluridisciplinar com a Cincia da Informao as ligaes so mais indiretas

    e/ou unilaterais, enquanto na relao interdisciplinar h o primado da reciprocidade.

    Com efeito, para uma consolidao dialtico-transdisciplinar da Cincia da

    Informao entendemos que se efetiva com a Biblioteconomia, de sorte que ambas

    possuem a construo de pressupostos tericos, epistemolgicos, histricos e

    materiais em comum que se estabelecem em um constante processo de movimento e

    contradio. Esse movimento dialtico-transdisciplinar pode ser constatado nas

    condies de ensino, pesquisa, extenso das universidades e nas prticas profissionais

    de bibliotecrios, alm dos aparatos institucionais (vinculaes departamentais).

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    Essa percepo dialtico-transdisciplinar entre Cincia da Informao e

    Biblioteconomia pode ser explicitada como a efetividade da unidade dos contrrios

    (uma fuso unificadora) por meio de Pombo (2003, p. 3) que afirma:

    quanto transdisciplinaridade, ela remeteria para qualquer coisa da ordem

    da fuso unificadora, soluo final que, conforme as circunstncias

    concretas e o campo especfico de aplicao.

    Vale ressaltar que essa configurao dialtico-transdisciplinar pode ser

    percebida de forma menos intensa entre a Cincia da Informao e a

    Arquivologia/Museologia, de modo que h muitas polmicas poltico-institucionais e

    acadmico-cientficas que tornam essa dialtica disciplinar, uma lgica do provvel

    como designado por Aristteles (ABBAGNANO, 2003) ou uma eterna luta dos

    contrrios que fundamenta a dialtica do conhecimento e que se desenvolve a partir

    de diversas heursticas afirmativas/negativas, gerais/particulares, singulares/plurais,

    conscientes/inconscientes, diretas/indiretas e individuais/coletivas.

    Vale ressaltar que essa dialtica como instrumento de uma lgica do provvel

    concebida por Aristteles tambm pode ocorrer na relao entre a Cincia da

    Informao e outros campos do conhecimento, assim como ser estendida as outras leis

    da dialtica, pois a construo de uma dialtica disciplinar no discursiva, mas

    depende de aes inerentes aos contextos acadmicos, cientficos e institucionais,

    como a relao entre Programas de Ps-Graduao, entre pesquisadores, etc.

    CONSIDERAES FINAIS

    A Cincia da Informao se constitui como campo do conhecimento em

    constante processo de transformao histrica, material, terica, epistemolgica e

    prtica. Vale ressaltar que essas transformaes so repletas de contradies

    (afirmaes/negaes) que podem ser elucidadas por meio de uma construo

    dialtica e de princpios, leis e categorias dessa dialtica do conhecimento que se

    configuram na relao entre a Cincia da Informao (pesquisa, ensino, eventos,

    peridicos) e os seus componentes humanos (pesquisadores), materiais/institucionais

    (programas de ps-graduaes, departamentos, associaes, entre outros).

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    Observamos que um dos grandes trunfos para se pensar a dialtica do

    conhecimento na Cincia da Informao est em sua concepo disciplinar amparada

    pelo contexto tridico da pluridisciplinaridade, interdisciplinaridade e

    transdisciplinaridade e que essa construo disciplinar do conhecimento pode ser

    compreendida no mbito de aplicao das leis/categorias da dialtica marxista.

    Assim, percebemos que a pluridisciplinaridade e a interdisciplinaridade esto

    inseridas em um intenso espectro dialtico do conhecimento da Cincia da

    Informao no que tange a aplicao da lei da mudana qualitativa em que a

    pluridisciplinaridade se estabelece como aparato dialtico quantitativo e a

    interdisciplinaridade como aparato dialtico qualitativo.

    Verificamos tambm a aplicao da lei dialtica da ao recproca no que toca

    a interdisciplinaridade da Cincia da Informao se constituindo como ncleo

    materializante de sua configurao epistemolgica de pesquisa, ensino e ao

    institucional com outras reas do conhecimento.

    Entendemos que o pice da dialtica do conhecimento da Cincia da

    Informao pode ser concebido em uma (in)tensa luta dos contrrio na Cincia da

    Informao entre pluridisciplinaridade que se caracteriza como uma afirmao, a

    interdisciplinaridade que se identifica como negao. A eterna luta desses contrrios

    no deve ser vista apenas como uma oposio, mas tambm como um processo de

    diferenciao e semelhana ocorrendo uma interpenetrao desses dois elementos e

    criando um terceiro estgio qualitativo (nova mudana da qualidade dialtico-

    disciplinar). Essa mudana qualitativa pode ser constituda como a postulao

    transdisciplinar da Cincia da Informao.

    possvel constatar que a pluridisciplinaridade da Cincia da Informao

    enquanto afirmao pode ocorrer em diversos contextos particulares e gerais. J a

    interdisciplinaridade se d em um contexto mais especfico com outros campos do

    conhecimento constituindo um movimento dinmico de ao recproca em que tanto a

    Cincia da Informao deve contribuir para uma determinada rea do conhecimento

    como essa rea deve contribuir para o desenvolvimento terico-epistemolgico e

    prtico da Cincia da Informao. Essa percepo dialtico-interdisciplinar pode

    ocorrer entre a Cincia da informao e Psicologia; Lingustica; Cincia da

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    Computao; Comunicao; Filosofia; Sociologia; Histria; Administrao;

    Economia; Cincias da Sade.

    A transdisciplinaridade ocorre em um momento muito particular da Cincia da

    Informao com a Biblioteconomia, pois o seu carter de unidade dos contrrios, seja

    no ensino, pesquisa, nas questes institucionais e das prticas do cotidiano

    resultante de um amplo processo de luta e movimentao disciplinar.

    Finalmente, acreditamos que a dialtica disciplinar do conhecimento na

    Cincia da Informao apresentada no presente trabalho no busca estabelecer uma

    verdade, mas conceber elementos para a discusso sobre o que pode ser (ou vir a ser)

    a disciplinaridade na Cincia da Informao, atentando que a dialtica enquanto

    construto do conhecimento e mtodo pode contribuir, sobretudo a partir de suas

    leis/categorias, para aguar e amadurecer as percepes disciplinares da Cincia da

    informao em suas diversas nuances.

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    Como citar este artigo:

    CARVALHO SILVA, Jonathas Luiz. A(s) disciplinaridade(s) da Cincia da Informao: aplicao das leis da dialtica marxista no contexto pluri, inter e transdisciplinar. Rev. digit. bibliotecon. cienc. inf., Campinas, SP, v. 11, n. 2, p.1-20, maio/ago. 2013. ISSN 1678-765X. Disponvel em: