cultura e rádio desterritorialização, global e local na programação musical da valente fm ...
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UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA Aline de Oliveira Araújo
CULTURA E RÁDIO: DESTERRITORIALIZAÇÃO, GLOBAL E
LOCAL NA PROGRAMAÇÃO MUSICAL DA VALENTE FM
Conceição do Coité – BA 2010
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Aline de Oliveira Araújo
CULTURA E RÁDIO: DESTERRITORIALIZAÇÃO, GLOBAL E
LOCAL NA PROGRAMAÇÃO MUSICAL DA VALENTE FM
Trabalho de conclusão apresentado ao curso de Comunicação Social - Habilitação em Radialismo, da Universidade do Estado da Bahia, como requisito parcial de obtenção do grau de bacharel em Comunicação, sob a orientação da Prof.ª Esp. Vilbégina Monteiro.
Conceição do Coité
2010
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Aline de Oliveira Araújo
CULTURA E RÁDIO: DESTERRITORIALIZAÇÃO, GLOBAL E
LOCAL NA PROGRAMAÇÃO MUSICAL DA VALENTE FM
Trabalho de conclusão apresentado ao curso de Comunicação Social - Radialismo, da Universidade do Estado da Bahia, sob a orientação da Prof. Esp. Vilbégina Monteiro.
Data:____________________________
Resultado:________________________
BANCA EXAMINADORA
Prof. (orientador)___________________
Assinatura________________________
Prof.____________________________
Assinatura_______________________
Prof.____________________________
Assinatura_______________________
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RESUMO
CULTURA E RÁDIO: DESTERRITORIALIZAÇÃO, GLOBAL E LOCAL NA PROGRAMAÇÃO MUSICAL DA VALENTE FM
A cultura de um local está frequentemente passando por transformações e isso se dá
porque as relações culturais estão em constante contato com outros “universos” que as
influenciam e modificam. Entender de que modo essa relação – entre o que é considerado
cultura local e o que é cultura global – transforma as relações sociais e culturais de uma
comunidade é o desafio deste trabalho que tenta discutir os processos de des-re-
territoriazação presentes na comunidade de Valente, município do interior da Bahia, situado
na região sisaleira, através da programação musical da rádio comunitária Valente FM. Para
alcançar esse fim, analisou-se a programação musical do programa Ligação Direta, da
Rádio Comunitária Valente FM, além de ter-se realizado entrevistas com o locutor do
programa e diretoria da emissora. A análise das músicas pedidas pelos ouvintes e tocadas
no programa, somadas aos estudos sobre os processos de reterritorialização comprovam
que a programação musical da Rádio Comunitária Valente FM é um elo entre a cultura local
e a global influenciando no modo como o indivíduo re-significa o seu meio. Essa articulação,
proporcionada pela Rádio, acontece de maneira naturalizada, ou seja, as pessoas
reterritorializam o seu espaço cultural sem se darem conta dessa presença e influência do
que é global no seu dia-a-dia. Isso se reflete no comportamento da comunidade, na
valorização e incorporação da linguagem urbana dentro de um contexto rural, e da própria
expressão da cultura local que é, cada vez mais, penetrada pelo global.
Palavras-chave: cultura – reterritorialização – programação musical – local – global –
rádio
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Sumário
INTRODUÇÃO.................................................................................................................. 6
1. CULTURA E O RÁDIO: RETERRITORIALIZAÇÃO DO SUJEITO NO SEU
TERRITÓRIO SIMBÓLICO...................................................................................
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1.1. Cultura e desterritorialização: onde o local e o global se encontram............ 11
1.2 . Cultura e música nas ondas do rádio........................................................... 22
2. O LOCAL E O RÁDIO: A VALENTE FM E SEU TERRITÓRIO DE
ATUAÇÃO............................................................................................................
33
3. A MÚSICA QUE VAI AO AR.......................................................................... 44
CONSIDERAÇÕES FINAIS................................................................................ 54
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS..........................................................................
ANEXOS...............................................................................................................
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INTRODUÇÃO
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6
A cultura de um local está frequentemente passando por transformações e
isso se dá porque as relações culturais estão em constante contato com outros
“universos” que as influenciam e modificam. Entender de que modo essa relação –
entre o que é considerado cultura local e o que é cultura global – transforma as
relações sociais e culturais de uma comunidade é um desafio proposto nesse
estudo. Para isso, é preciso observar não só aspectos da cultura popular que podem
melhor demonstrar essa relação híbrida entre local e global, como os instrumentos
que, de algum modo, promovem os contatos entre diferentes universos. Assim, a
escolha foi estudar a música e o rádio, dois elementos tão intimamente relacionados
que ilustram perfeitamente os fluxos entre a cultura popular e a re-significação do
sujeito ao compartilhar territórios simbólicos. Desse modo, determinou-se analisar as
músicas tocadas no programa matinal Ligação Direta da rádio comunitária Valente
FM, situada no interior da Bahia, região sisaleira.
O processo de globalização é o principal responsável pelas alterações na
identidade cultural de uma sociedade. O tradicional/local recebe forte influência dos
métodos mecanicistas e o ser humano, agente ativo, deseja cada vez mais usufruir
desses recursos para facilitar sua vida, modernizando automaticamente seu meio
cultural de forma despercebida, criando assim “identidades partilhadas” entre
pessoas que estão bastante distantes umas das outras. Essa modernidade oriunda
da globalização diluiu fronteiras e aproximou culturas distantes no espaço e no
tempo. No entanto, isso não poderia ter-se realizado com tamanha fluidez se não
fosse a atuação dos veículos de comunicação, em especial o rádio, que com suas
ondas sonoras alcança os territórios mais isolados geográfica e socialmente. A
relação dominante da população brasileira com o rádio é de intimidade, que passou
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a ser companhia para o ouvinte, tornando-se um vínculo de ligação entre o indivíduo
e sua comunidade.
Esta monografia discute as transformações da cultura popular que ocorrem
em determinado local a partir da influência do global, através dos processos de
desreterritorialização. Para isso, foi necessário situar os conceitos dentro do
referencial teórico que abordou inicialmente a cultura popular. Os estudos de Jesus
Martin Barbero (2003) muito contribuem para a idéia de cultura abordada neste
trabalho, quando define a cultura popular como um processo vivo formado por
“saberes que carregam simbolicamente a cotidianidade e a convertem em espaço de
uma criação muda e coletiva.” E que carrega em si ainda um estilo, ou seja, um
“esquema de operações” que se refere ao modo de agir, pensar e se comportar, um
“estilo de intercâmbio social, de inventividade técnica e de resistência moral.” Nestor
Canclini (1999) colabora com essa discussão ao analisar modalidades de
organização da cultura e de hibridação das tradições de classes. Além disso, o autor
discute a idéia das transformações na cultura tradicional e homogênea a partir da
influência da tecnologia e do contato com os meios de comunicação e demais
culturas. Renato Ortiz (2005) aprofunda a discussão sobre esse tema quando reflete
sobre os limites em que essa cultura floresce e, como esses mesmos limites, vão se
diluindo e se transformando a partir da modernidade.
O segundo conceito estudado nessa pesquisa é o de local e global apoiado-
se nas idéias de Elenaldo Teixeira (2001) que analisa como a participação do
cidadão na sociedade civil global (ações locais, realizadas por seus cidadãos, mas
que apresentam interesse global) pode contribuir nesse processo de
reterritorialização de um território cultural e social. O autor discute sobre como
sociedade civil, espaço público, esfera pública, poder local, participação política e
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participação cidadã convergem para a qualificação desta última como condição de
aperfeiçoamento do processo democrático. Além disso, Teixeira traz exemplos do
estudo de caso realizado em Valente, município do interior da Bahia e mesmo local
que se passou o estudo do projeto em questão, no qual analisou as potencialidades
e limitações de experiências locais.
Territorialização é a terceira temática debatida e, na verdade, permeia todos
os outros assuntos abordados aqui e Ortiz (2007) é a principal fonte utilizada sobre
esse tema. A idéia de desterritorializar-se leva-nos a observar a diluição dos antigos
limites impostos por uma sociedade, que era cheia de formalidades e cerimônias, e
que agora se abre para esse constante fluxo de resignificação do espaço, da cultura
e do meio de vida que surge com a modernidade. Nessa antiga sociedade a cultura
popular crescia no interior de determinados limites, longe dos centros urbanos,
mantendo sua pureza e complexidade. Segundo o autor, cada sítio, cada cultura
constituía um território particular. Isso mudou. A modernidade trouxe consigo uma
nova dinâmica para as sociedades, que passam a interagir, transformar e
reterritorializar suas vivências a partir do contato com o outro, num processo
chamado de mundialização, que acontece através da “desterritorialização das
coisas, gentes e idéias, a proliferação de colagens, pastiches e simulacros, a
transfiguração da realidade em virtualidade ou vice-versa.” André Lemos (2005)
também colabora com o debate sobre territorialização. Segundo ele “o próprio do
homem é viver e construir na natureza, o seu mundo. A cultura humana é uma des-
re-territorialização da natureza”, defendo a idéia de que o homem se vale tanto de
meios técnicos quanto simbólicos para reterritorializar-se.
Como se trata de um projeto sobre os processos de reterritorialização da
cultura local através da programação musical de uma rádio comunitária se faz
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necessário conhecer em que contexto essa rádio foi criada e está inserida até hoje,
bem como saber sobre sua política e valores sociais. Antonio Dias Nascimento
(2005) traça o histórico das rádios comunitárias na região sisaleira, entre elas a
Valente FM, objeto de estudo da pesquisa, bem como analisa a relação entre rádio e
comunidade, destacando o papel da sociedade civil organizada na democratização
da comunicação através desse meio. Sobre rádio comunitária, além de trabalhar os
conceitos definidos por Cicilia Peruzzo (1998), a pesquisa dialoga com o
pesquisador José Ignácio Lopez Vigil (2003) que percorre toda a problemática da
especificidade de emissoras desse tipo, desde suas origens, analisando a linguagem
que lhe é própria e as exigências que as presidem, tanto do lado dos locutores como
dos gêneros (dramático, jornalístico, musical) e formatos (radiorevista, vinheta).
Além dessa definição sobre qual deve ser o papel das rádios comunitárias, ao autor
também se refere à programação musical dessas rádios, o que é o assunto mais
relevante para esse trabalho. Seguindo nessa mesma linha, Dioclécio Luz (2001)
também fornece informações pertinentes sobre o universo desses veículos de
comunicação, principalmente no que se refere a sua programação.
No Brasil são muitos os estudos sobre a programação musical do rádio, mas
a maioria se refere ao seu formato ideal, aos gêneros musicais tocados. As rádios
comunitárias também despertam o interesse dos estudiosos, principalmente por
causa de sua efervescência nos últimos anos, no entanto, a maioria dos livros e
trabalhos sobre o assunto se refere às problemáticas de legislação, as origens, a
linguagem própria e, no trato da programação musical, a pesquisa também é dirigida
ao formato e sobre a discussão do que se deve tocar numa rádio comunitária, da
importância da qualidade das músicas etc. Assim, o trabalho presente procura
constatar, através de entrevistas com funcionários e análise das músicas tocadas na
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programação matutina da emissora, de que maneira a Rádio Comunitária Valente
FM contribui para resignificação do território cultural local a partir da presença do
global inserido no cotidiano dessas pessoas através de sua programação musical.
Esta pesquisa, além de refletir sobre os processos de reterritorialização
cultural, também auxiliou na compreensão da influência da articulação entre o global
e o local na construção da cultura do valentense, além de ter permitido saber qual o
papel exercido pelo rádio local nessa relação. Estudando essa articulação e
descobrindo a função desse meio de comunicação nesse processo, é possível
compreender quais transformações culturais essa comunidade passou ao longo
desses anos e como isso se reflete no cotidiano desse lugar.
Por fim, nota-se que a cultura popular não é algo que morre, porém está
sempre em mudança, fluindo, e isso se dá, sem dúvida, pela capacidade que o ser
humano tem de interagir com seu território, reconhecê-lo e a partir do contato e
experiência com o outro, significá-lo. Os processos de desterritorialização,
territorialização e reterritorialização são constantes na vida do homem, afinal é
desse intenso movimento de ir e vir que o ser humano constrói seu próprio mundo.
1. Cultura e rádio: reterritorialização do sujeito em seu território simbólico
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A idéia de desterritorializar-se leva-nos a observar a diluição dos antigos
limites impostos por uma sociedade, que era cheia de formalidades e cerimônias, e
que agora se abre para esse constante fluxo de re-significação do espaço, da cultura
e do meio de vida que surge com a modernidade. Nessa antiga sociedade, a cultura
popular crescia no interior de determinados limites, longe dos centros urbanos,
conseguindo manter sua complexidade bem como uma idéia de pureza, já que os
contatos com outras culturas aconteciam de maneira mais lenta e demorada. Cada
cultura, cada lugar constituía um território particular. Isso mudou. A modernidade
trouxe consigo uma nova dinâmica para as sociedades, que passam a interagir,
transformar e reterritorializar sua vivências a partir do contato com o outro, num
processo chamado de mundialização. Esse capítulo aborda justamente essas
relações entre local e global e os processos de reterritorialização através da música
tocada no rádio.
1.1 Cultura e desterritorialização: onde o local e o global se encontram.
Os estudos antropológicos costumam conceituar cultura como o conjunto
complexo dos códigos e padrões que orientam e coordenam a ação humana
individual e coletiva. Assim, é certo afirmar que todo indivíduo possui cultura, pois,
de algum modo, se relaciona com a sociedade na qual se originou e convive. Os
componentes de cada grupo social aprendem e aplicam no seu cotidiano esses
códigos comportamentais que conduzem, de forma relativamente harmoniosa, as
ações nesse meio social.
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Quando se trata de cultura popular, a maioria dos estudos a define como uma
cultura inferior, pertencente à massa, ao povo que é subalterno e dominado pelos
interesses da classe dominante que deteria a chamada alta cultura. Outros ainda
confundem cultura popular com as manifestações culturais de uma determinada
sociedade, acreditando que só na dança, na tradição, no folclore, no artesanato, na
música etc, ela se manifesta e se faz presente. Nesses estudos valorizam-se mais
os produtos culturais que seus agentes sociais que os criam e consomem. Sendo
assim, esses conceitos e visões a cerca do popular não interessam aqui. Deseja-se
mostrar nesse estudo que cultura popular é um processo vivo, de constantes
transformações, as quais envolvem muito mais que os costumes e tradições de um
povo, é algo que faz parte da identidade, da história e do desenvolvimento de cada
grupo social. Os estudos de Jesus Martin Barbero (2003) trazem uma definição
interessante de cultura popular. Para ele, cultura popular são “saberes que carregam
simbolicamente a cotidianidade e a convertem em espaço de uma criação muda e
coletiva” (BARBERO, 2003, p.122). O popular carrega em si ainda um estilo, ou seja,
um “esquema de operações” que se refere ao modo de agir, pensar e se comportar,
um “estilo de intercâmbio social, de inventividade técnica e de resistência moral.”
(IDEM, p.122) Esse esquema de operações citado por Barbero revela-nos que essa
cultura, além de ter autenticidade e beleza, também é um forte elemento de
representação sociocultural que expressa não só o estilo de vida da classe popular,
mas também seu modo de pensar, de sobreviver, de interagir numa sociedade que a
engloba - mas nem sempre a considera -, além das estratégias utilizadas para se
firmar, organizar e integrar na memória histórica do meio que a cerca.
Como todo processo social, a cultura popular também se desenvolve e se
transforma. Essas transformações se dão por diversos fatores: primeiro porque é
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próprio do homem evoluir, adquirir novos saberes e hábitos; segundo porque a
cultura faz parte de um sistema que envolve fatores como economia, política,
tecnologias diversas e a modernidade de modo geral. Não estando isolada a cultura
popular desenvolve-se, transformando-se a partir do contato com todos os outros
elementos que compõem uma sociedade. O contato com o mundo externo retira do
popular a idéia de círculo impenetrável, imutável e as diversas relações que se
estabelecem criam um sistema de hibridação entre culturas que se comunicam e se
influenciam mutuamente. “É possível pensar que o popular é constituído por
processos híbridos e complexos, usando como signos de identificação elementos
procedentes de diversas classes e nações”.(CANCLINI, 2000, p.220-221)
As palavras de Canclini nos propõem observar os cruzamentos culturais que
acontecem numa sociedade local, principalmente nas novas gerações, que
permitem um re-ordenamento no seu modo de agir e pensar, alterando os vínculos
entre o tradicional e o moderno, o popular e o culto etc. As relações são
modificadas, mas nem por isso pode-se dizer que houve uma perda total da
tradição, ou “morte” da cultura local. Pelo contrário, como já foi dito, a cultura é um
processo vivo e pulsante, está em constante transformação, os indivíduos que a
compõe conseguem absorver as influências externas, incorporando-as a seu meio
de vida com uma fluência própria daqueles que se relacionam sem conflitos com o
novo e conseguem manter firme sua identidade. Sendo assim, deixam de existir
limites que segregam e isolam os diversos grupos sociais e suas culturas, criando o
que alguns estudiosos chamam de cultura mundializada. No entanto, a ruptura
desses limites e a existência de uma cultura mundializada “não implica o
aniquilamento das outras manifestações culturais, ela cohabita e se alimenta delas”.
(ORTIZ, 2007, p.22).
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Essa diluição de limites proporcionada pela mundialização das culturas
permite que sejamos penetrados pela „modernidade-mundo‟, um processo que
provoca certa semelhança de costumes, que, de certo modo, dá sentido à
determinados comportamentos e conduta dos indivíduos. Isso poderia ser explicado
quando imaginamos o quanto nossa sociedade moderna partilha determinados
elementos de uma coletividade comum, como signos comercias (ex: Coca-cola,
Nike, Disney), o cinema, a música pop etc. Todos esses símbolos da modernidade-
mundo estão ao redor dos indivíduos em qualquer parte do planeta e, como afirma
Ortiz (2005), isso os torna cidadãos mundiais, pois o mundo penetrou no seu
cotidiano. Apesar de a modernidade-mundo trazer a idéia de que as relações sociais
e culturais entre os diversos grupos sociais não têm mais limites firmemente
definidos de interpenetração, é preciso lembrar que “a quebra das fronteiras, não
significa o seu fim, mas o desenho de novos territórios e limites” (ORTIZ, 2005,
p.47). Isso significa dizer que à medida que determinadas fronteiras são
transportadas, o indivíduo traz consigo uma nova visão de mundo proporcionada
pela experiência do „desenraizamento‟ de seu território devido o contato com os
elementos da mundialização, e essa nova visão de mundo o faz estabelecer limites
outros e redesenhar seu espaço.
Historicamente, o território tem sido definido a partir das relações de poder,
visto como fator regulador das relações entre seus membros, ou seja, ele é
composto por ação e poder que se manifestam por pessoas ou grupos. Existem
vários teóricos que hoje se debruçam sobre a discussão a cerca de territorialização
e costumam se dividir em dois grupos de pesquisa: os materialistas que partem da
visão de que o território é constituído predominantemente por características físico-
materiais e os idealistas que definem o território, principalmente, pelo “valor
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territorial”, no sentido simbólico. Rogério Haesbaert (2004) propõe uma perspectiva
integradora dessas duas visões tentando superar a dicotomia material/ideal,
“considerando que o território envolve, ao mesmo tempo, a dimensão espacial
material das relações sociais e o conjunto das representações sobre o espaço”
(CARVALHO, 2007). Essa perspectiva integradora, que enfatiza aspectos políticos,
econômicos e simbólicos é interessante e torna possível compreender o que na
atualidade vem a ser a complexidade do território.
Segundo João Pacheco de Oliveira (1999), “a noção de territorialização é
definida como um processo de reorganização social”, no qual os diversos membros
de determinada comunidade, conectados com outros territórios, não só vivenciam
experiências, como novas categorias são criadas ou transformadas no seu interior,
reorganizando a partir daí seu espaço social, cultural e político. Esse novo modelo
de organização social faz com que os lugares sejam mesclados de experiências
locais e mundiais, e é a partir disso que novas territorialidades podem ser
construídas, como síntese das novas experiências. Desse modo, o território se
constitui pela interação de territórios-rede, onde se cruzam as diversas
manifestações territoriais. Esse cruzamento, no entanto, não elimina a
particularidade de cada território, ele apenas vai se fundamentar sob novos
patamares, e a sua abordagem se torna cada vez mais variada pela multiplicidade
de significações.
Cada sociedade, cada cultura está inserida num território próprio, particular
que pode ser chamado como seu local de atuação e desenvolvimento. Esse local
seria a origem de determinada sociedade, seu espaço geográfico e simbólico, um
lugar particular e único, embora não seja isolado nem impenetrável. Para Elenaldo
Teixeira (2001 p.54-55), “a sociedade civil situa-se num determinado território, no
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qual desenvolve suas relações e constrói seus espaços públicos para expressão e
participação de seus atores.” No entanto, essa sociedade não se desenvolve
sozinha, sem interferências de outros territórios, pelo contrário, seus atores
socioculturais estão em constate movimento dentro de um sistema amplo e
complexo, que reorienta, modifica e estimula seu comportamento social e cultural. O
local deixa de ser um espaço “puro”, “intacto” a partir da existência desse fluxo que
lhe permite assimilar e re-significar suas ações. Ele não deixa de existir, mas passa
a se relacionar com o mundo em meio ao processo de globalização, no qual há uma
enorme mistura de povos, raças, culturas, filosofias, modos de governabilidade etc.
“A globalização reforça identidades, internacional e extraterritorialmente e, de forma
contraditória, também na esfera local. O local não desaparece, mas a noção de
espaço passa a ser compreendida mais social que territorialmente.” (WATERMAN
apud TEIXEIRA, 2001)
O local e o global articulam-se entre si, no entanto, não se confundem. O local
permanece local, com suas particularidades, interesses, mecanismos e autonomia.
O que acontece é uma interpenetração de elementos que fazem parte da esfera do
global, uma hibridação de símbolos, códigos e fluxos. Isso se dá em todos os
setores da sociedade, ou seja, no campo político, no econômico, no social e,
especialmente, no cultural. Um aspecto que não pode deixar de ser mensurado
nessa relação entre local/ global é a importância dos meios de comunicação e
informação que permitem e proporcionam esse intercâmbio de forma instantânea e
constante, eles aproximam e misturam o que antes se encontrava separado. Os
meios de comunicação se tornam, cada vez mais, reguladores das mais diversas
atividades humanas. Criam a chamada sociedade da informação, na qual o indivíduo
é bombardeado diariamente por informações que são utilizadas intensivamente
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como elemento da vida econômica, social, cultural e política, baseada, sobretudo, no
suporte tecnológico. E tudo isso acarreta mudanças na maneira de uma sociedade
agir, pensar, produzir etc. E, obviamente, na valorização e manifestação de sua
cultura.
A articulação entre o global e o local permite que o local sofra modificações,
como se fosse um processo de mutação, que resultam na constante re-significação
de seu espaço material e imaterial. Global/local “se realizariam no espaço de suas
fronteiras, possuindo capacidade de definir sua própria centralidade e contracenar
com o que lhe é externo”. (ORTIZ, 2007, p.60). Os indivíduos que constituem essa
sociedade cultural-local, relacionando-se com o global, passam pelo processo de
desterritorialização de seu território local-cultural. Dessa maneira um novo território é
redesenhado, no entanto, a identidade dessa sociedade mantém-se conservada.
O conceito de desterritorialização nos permite entender o espaço
independentemente do meio físico, pois espaço aqui não se refere apenas a um
território geográfico, material, mas refere-se também ao espaço imaterial, que
alcança dimensões muito mais amplas e complexas. Desterritorializar-se, então,
seria o indivíduo movimentar-se entre fronteiras, criando linhas de fuga que o
permite re-significar seu meio e para isso ele não necessita, necessariamente, sair
de seu território local, já que diversos símbolos e signos de outros espaços sociais e
culturais infiltram-se no seu cotidiano. Esse contato com o outro, mesmo em seu
próprio meio, o faz tomar conhecimento daquilo que é diferente de si, havendo o que
poderíamos chamar de „desenraizamento‟ do sujeito. Assim, os processos de
desterritorialização levam-nos a crer numa unificação de espaços (tangíveis e
intangíveis), nos quais lugares e culturas se globalizam, onde cada local revela o
mundo devido à presença de diversos pontos de intercomunicação entre si.
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é preciso pensar a desterritorialização como uma potência perfeitamente positiva, que possui seus graus e seus limiares (epistratos), e sempre relativa, tendo um avesso, tendo uma complementaridade na reterritorialização(...) (DELEUZE e GUATTARI apud LEMOS, 2005.)
Segundo Ortiz, são vários os sinais de desterritorialização da cultura e este
movimento “não se consubstancia apenas na realização de produtos compostos, ele
está na base de formação de uma cultura internacional-popular cujo fulcro é o
mercado consumidor” (ORTIZ, 2007, p.110). A desterritorialização da música é um
exemplo de como determinados produtos culturais transbordam fronteiras saindo do
universo local para o global. Nesse caso, segundo Canclini (2000, p.217) os meios
de comunicação, a exemplo do rádio e da televisão, contribuíram para que isso
ocorresse, ampliando em escala nacional e até mesmo internacional músicas de
repercussão local. A música „flutua‟ pelos espaços, ultrapassando fronteiras, não só
físicas, mas também imateriais proporcionando uma relação de trocas e diferentes
verbalizações entre os indivíduos. A música que nos chega aos ouvidos, às vezes
em outra língua, num outro ritmo de algum modo chama a atenção e penetra no
cotidiano das pessoas através desse processo de desterritorialização, que pode ser
mais ou menos intenso de acordo com o contanto, com conhecimento que se tem
desse tipo de som. Esse processo provoca o „nascimento‟ de uma nova natureza,
que se apodera desses novos elementos e re-significa seu território cultural,
trazendo para seu “quintal” uma diversidade de símbolos e sons que passam a fazer
parte de seu conhecimento de mundo.
Para entendermos ainda melhor essa interação da música com a
desterritorialização basta tomarmos como exemplo como se dá a relação entre as
novas gerações e os diversos sons. Hoje, com a ajuda dos meios de comunicação,
principalmente do rádio e da televisão, e da internet, um jovem que vive no interior
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do Nordeste, numa cidadezinha afastada da capital, „curte‟ o mesmo tipo de som
que os jovens dos grandes centros urbanos. A globalização da cultura permite que
ele escute no seu rádio, deitado no seu quarto ou numa roda de amigos, a canção
que é sucesso nas paradas americanas, com seus astros do pop ou o som do hip
hop, do reggae jamaicano que agita grupos de jovens de cidades grandes. Aliás,
realizando uma rápida pesquisa das músicas mais tocadas nas rádios comerciais
brasileiras, percebe-se um forte grau de influência e a constante presença das
músicas internacionais em suas programações. A programação das rádios é feita
pelos sucessos do momento, as músicas que ganham o carisma do público e se
alastram por todo país invadindo até mesmo os territórios mais afastados dos
centros urbanos.
O contato com esse som “estrangeiro,” “forasteiro” é só um primeiro passo, é
a desterritorialização, que inicialmente causa estranheza, mas também desperta
interesse. O segundo passo acontece quando há uma aceitação dessa canção e
uma significação dela no cotidiano desse jovem, ou seja, ele a absorve e, ao mesmo
tempo, a integra ao seu meio, ao seu mundo particular. Fica claro que, por possuir
fluidez e diluir limites extraterritoriais, a música é um elemento constante e
importante na desterritorialização e reterritorialização do sujeito.
A modernidade-mundo não significa apenas desterritorialização. Este é um primeiro passo que ela deve percorrer, mas, para existir enquanto tal, seus objetos devem se reterritorializar. Uma cultura mundializada só faz sentido quando enraizada em nossos hábitos mais prosaicos. Ela necessita localizar-se neste ou naquele lugar, realizar-se desta ou daquela forma. (ORTIZ, 2005, p. 42)
Toda desterritorialização é acompanhada por uma reterritorialização,
processo no qual o homem se utiliza tanto de meios técnicos quanto simbólicos para
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realizá-lo. Reterritorializar-se significa criar outro espaço significativo, ou seja, uma
nova construção do nosso território, o que também poderia ser entendido como
novos encaixes culturais. Tomemos mais uma vez o mundo da música como
exemplo para explicar esse processo. O universo musical é tão amplo e complexo
que, na maioria das vezes, é difícil classificar as músicas em categorias distintas.
Isso ocorre porque a música é híbrida, permite uma mistura de elementos tão
variados que nem sempre é possível afirmar que ela pertença, exclusivamente, a
esta ou aquela cultura. A música brasileira é uma prova disso, pois carrega em seu
“DNA” influências européias, africana e indígena e é justamente essa variedade de
componentes que a torna tão característica, tão particular. Levando a discussão
para o âmbito local/regional essa tentativa de classificação se torna ainda mais
complicada de se realizar. No senso comum, e também entre alguns estudiosos, a
música regional é aquela que caracteriza um povo de determinada região, seja
através dos instrumentos utilizados nos arranjos, na composição da letra que fala
sobre os costumes do lugar ou o ritmo que se disseminou naquele território. Seria
parte da cultura que carrega traços da identidade de cada região, de cada local.
Assim, entende-se que a música regional possui uma identidade própria que a
identifica e diferencia. Carrega em sua composição elementos próprios de sua
tradição e as memórias de um território particular. As músicas das diversas regiões
do país comprovam isso. As canções gaúchas conservam a tradição de seu povo,
seja no ritmo ou na linguagem, assim como a música nordestina, que com o baião e
o forró pé-de-serra traduzem a vida, os costumes e anseios de quem vive nessa
região do Brasil.
No entanto, na modernidade-mundo na qual nos encontramos, as culturas se
relacionam e se desterritorializam constantemente e isso acontece também com as
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produções culturais, inclusive com a música regional/local. Esta também se
reterritorializa partindo da hibridação com outros estilos. Essa música típica de
determinado lugar convive ao lado das inovações tecnológicas da música pop, numa
troca de ritmos e técnicas musicais e instrumentais e, de algum modo, incorpora
elementos dessa música de fora, seja na forma de um novo instrumento utilizado,
num ritmo diferente adaptado ao tradicional, mas que também traz harmonia e
diversidade à produção. Nesse processo, há uma re-elaboração de sua identidade
cultural, numa superação de fronteiras entre a música regional e a música pop, entre
o folclórico e o tecnológico. Essa incorporação harmoniosa de elementos conhecidos
através dessa troca é o que podemos chamar de reterritorialização.
Na reterritorialização o sujeito se desloca (fisicamente ou não) entre os
mundos (tangíveis ou intangíveis) e retorna ao seu território com uma nova visão,
com uma nova bagagem que passa a fazer parte de seu modo de viver e influencia
na sua produção e interação na sociedade em que atua. A reterritorialização
acontece de várias formas e em todas as áreas de atuação humana. É um processo
fluido e contínuo e é influenciado também por muitos elementos, entre eles os meios
de comunicação de massa. O rádio, o meio que se insere mais rapidamente entre as
diversas classes populares, tem um papel fundamental nesses processos de
desterritorialização-reterritorialização das culturas populares. Ao mesmo tempo em
que traz o global para dentro do local (e vice-versa), numa dinâmica
desterritorializante, ele também influencia o indivíduo na reterritorialização de seu
território, ou seja, altera, através do fluxo constante de informações que irradia, o
comportamento e a visão do sujeito sobre o seu meio, que influenciado pelo que
vem de fora, re-significa suas ações sociais e culturais.
22
O constante ir e vir do ser humano é o que lhe permite ser o que é: um ser
distinto e único capaz de transformar seu meio da maneira que melhor lhe convir.
Para isso, o homem desenvolveu mecanismos para se mover entre os mundos e
descobrir novas formas de habitar e desenvolver-se, de evoluir e criar, afinal como
diz Lemos (2005) “próprio do homem é viver e construir na natureza, o seu mundo. A
cultura humana é uma des-re-territorialização da natureza.”
1.2 Cultura e música nas ondas do rádio
Quando falamos de processos de desreterritorialização um aspecto que não
pode deixar de ser mensurado é a importância dos meios de comunicação e
informação. Esses meios permitem e proporcionam o intercâmbio entre o local e o
global de forma instantânea e constante, aproxima mundos antes separados. O
rádio, a mídia que interessa a esse estudo, é um grande difusor cultural,
possibilitando que as pessoas tenham contato e possam se identificar com
características das diversas culturas promovendo assim uma constante hibridização
destas. É um veículo de comunicação que pode ser caracterizado como
essencialmente auditivo, formado pela combinação do binômio: voz (locução) e
música. Nascido, tal qual o conhecemos hoje, em 1907, esse veículo de
comunicação logo se popularizou e alcançou os territórios mais isolados geográfica
e socialmente.
O rádio passa a ser companhia para os solitários, seja na moradia, no trabalho urbano ou rural, na caminhada, ou na viagem. Tornou-se um veículo de ligação entre o ouvinte e as dimensões ausentes do mundo no qual ele vive, incluindo-se aí as ligações entre os indivíduos e a sua comunidade, (DIAS, 2005, p.16)
23
Na América Latina, os argentinos foram os pioneiros em descobrir e
experimentar o fascínio do rádio. Realizaram em 27 de agosto de 1920, o primeiro
programa radiofônico dirigido a um público aberto. No Brasil, a primeira experiência
radiofônica foi em 1922, mas foi no ano seguinte com Roquette Pinto, que o
movimento do rádio começou a crescer e se destacar. A idéia de Pinto era que o
rádio tivesse caráter educativo, característica essa que nunca foi alcançada de fato
pelo veículo. No princípio, o rádio brasileiro era dominado por programas eruditos e
com o tempo a programação das emissoras foi se adaptando até chegar à
transmissão de programas populares, ou seja, o espaço inicial ocupado pela
transmissão de óperas, conferências e músicas clássicas, foi cedendo lugar para a
apresentação de cantores e compositores de sucesso na época, além de incluir
programas para públicos distintos como, por exemplo, o infantil.
Atento ao crescimento e ao enorme potencial do rádio, tanto em alcance
quanto em influência da opinião pública, Getúlio Vargas lançou nos primeiros anos
de seu governo dois decretos de lei (nº 20.047 em 1931 e nº 21.111 em 1932) que
estruturaram os serviços de radiocomunicações brasileiros.
Foi a partir do Decreto nº 20.047 que o leque dos serviços normatizados foi ampliado, incluindo-se também, além das convencionais radiotelegrafia e radiotelefonia, a radiofotografia e a radiodifusão, pela primeira vez assim denominada. (...) Outros princípios oriundos de 1924, como a finalidade educativa e a obrigatoriedade de nacionalidade brasileira aos concessionários de radiodifusão também foram mantidos. (...) Um ponto central (no decreto nº 21.111) foi regulamentar o processo de outorga para os serviços de radiodifusão: as concessões deveriam ser objeto de decreto presidencial, com prazo de 10 anos, „renovável a juízo do governo‟. (RAMOS E SANTOS, 2007, p.310)
24
Não se pode deixar de mencionar que essa finalidade educacional do serviço
de radiodifusão estava baseada por interesses de difusão da ideologia
governamental, inclusive era o veículo proclamado como de interesse nacional e de
finalidade educativa. Com a influência do governo e da elite empresarial, os formatos
dos programas foram se tornando cada vez mais populares, com o objetivo de
alcançar maior número possível de brasileiros e, com isso, transformar o rádio num
veículo de manipulação de opinião. A radiodifusão foi um importante instrumento da
disseminação da ideologia do governo em épocas como a Era Vargas e a ditadura
militar, tanto Vargas quanto os militares percebiam o poder de alcance e também de
manipulação que o rádio tinha sobre as massas e utilizavam-se dele para disseminar
seu poder, sua ideologia e manter o controle sobre a sociedade. O rádio é uma arma
poderosa, de ampla penetração e sedução, por isso os governos, não só brasileiro,
mas do mundo inteiro, sempre se utilizaram dele e procuraram manter a dominação
sobre a sua atuação. As telecomunicações no Brasil passaram por diversos
processos e as leis que regem esses segmentos foram se aprimorando, no entanto,
com relação à radiodifusão, o Código Brasileiro de Telecomunicações, promulgado
em 1962, “não alterou de forma significativa o status quo da prestação dos serviços,
garantindo aos radiodifusores maior estabilidade empresarial, com a imposição de
prazos dilatados e renováveis das outorgas.” (RAMOS e SANTOS, 2007, p.327)
O movimento da radiodifusão extrapolou barreiras e as rádios se espalharam
por todo país, em cada canto nascia uma emissora levando para os brasileiros
informação, entretenimento e, principalmente, muita música. As diversas maneiras
de se fazer rádio foram surgindo, cada uma baseada no interesse de quem
comandava as diretrizes da emissora. São muitas as classificações para as
atuações das rádios e, em alguns casos, várias até se confundem. As rádios
25
comerciais são as mais comuns e existem milhões espalhadas em todo mundo,
seguem os princípios do mercado capitalista, visando o lucro e a audiência da
massa, a maior parte de sua programação é composta por programas musicais e de
entretenimento. No Brasil, as emissoras comerciais, geralmente, pertencem às
grandes redes e/ou a grupos empresariais que monopolizam o setor de
comunicação no país, e atendem aos interesses econômicos e políticos de seus
donos. A concentração dos meios de comunicação de massa nas mãos desses
grupos acirrou a discussão sobre a democratização da comunicação e novos
modelos de se fazer rádio começaram a se desenhar na América Latina no fim dos
anos 60 e início de 1970, nesse contexto, surgiram as primeiras experiências de
rádios livres, mais tarde chamadas de comunitárias.
Nas últimas três décadas as emissoras radiofônicas com estilos diferenciados
de programação começaram a crescer e ganhar destaque na América Latina, onde
se começou a observar uma intensificação das experiências participativas do uso do
rádio. Os movimentos políticos sociais latino-americanos contribuíram, e muito, para
que se pensasse numa reformulação dos meios de comunicação para que estes
ouvissem e dessem voz aos setores marginalizados da sociedade. Inicialmente, as
rádios, muitas vezes apoiadas pela Igreja Católica e por sindicatos, levavam para o
ar assuntos relacionados à educação e a prática religiosa; no entanto, percebeu-se
que o rádio era um instrumento valioso e que poderia ser utilizado para levar
reivindicações e transformar realidades. Na América Latina surgiu uma variedade de
modelos de fazer rádio, por exemplo, as rádios revolucionárias, guerrilheiras e livres,
porém todas com o propósito inicial de promover transformações sociais (cada uma
buscando esse ideal segundo os seus princípios). Uma experiência foi a da rádio “A
26
voz do mineiro” na Bolívia, que levava ao ar as lutas e interesses dos mineiros da
Siglo XX.
É a partir da década de 70 que o uso comunitário do rádio começa a se
intensificar, impulsionando o surgimento de novas experiências e projetos de rádio
por parte de segmentos populares na América Latina. O Brasil acompanhou esses
experimentos vividos por seus “vizinhos” e também tem exemplos de rádios livres
(mais tarde chamadas de comunitárias), que eram mescladas aos movimentos
sociais e comunitários. A origem das emissoras comunitárias no Brasil relaciona-se
as experiências de rádios livres nos anos 70 e de alto-falantes na década de 80.
Nesse período, várias emissoras comunitárias surgiram no país, que passou a
contar com uma série de modelos de comunicação comunitária, nos quais o maior
interesse era levar informação, consciência, cultura, lazer e voz àqueles excluídos
socialmente. A Favela FM 104,51 é um destaque de rádio comunitária no Brasil.
Criada em 1981 por favelados, a rádio de Belo Horizonte, situada na favela Nossa
Senhora de Fátima, é reconhecida pelo seu caráter social e comunitário, além de
prestar serviços de utilidade pública à população da favela, a emissora tem um
trabalho social contra drogas, debate temas de interesse social como eleições, voto
consciente, segurança, saúde etc. A Favela FM também se destaca por fazer um
jornalismo sério, realista e com denúncias, por incentivar a educação, a cultura e o
lazer de sua comunidade. A rádio é sem fins lucrativos e recebe apoio de sindicatos,
empresas, ONG´s entre outros.
A proliferação atual de emissoras comunitárias é o resultado de um processo de mobilização social pela regulamentação da radiodifusão de
1 A Favela FM é denominada como rádio comunitária, segundo informações que constam no
histórico apresentado no site da emissora, www.radiofavelafm.com.br, acessado em 20 de dezembro de 2009.
27
baixa potência, cujo marco histórico é o dia 10 de abril de 1995, data em que o Ministro das Comunicações, Sérgio Motta, recebeu, em audiência, um grupo de representantes de rádios livres e comunitárias. Nessa ocasião ele reconheceu, publicamente, a existência de milhares de emissoras de baixa potência em todo país e assumiu o compromisso de regulamentar seu funcionamento. (PERUZZO, 1998, p.5)
Assim, em 1998, o governo brasileiro criou a lei 9.612 para regulamentar o
segmento dessas rádios no país. Essa lei estabelece que as comunitárias “tem por
finalidade o atendimento à comunidade beneficiada, com vista á criação de
oportunidades de idéias, difusão cultural (...)”, devem ter “programação com
finalidades educativas, artísticas, culturais e informativas.” Muitos estudiosos e,
principalmente, radioamadores, consideram essa lei contraditória e excessivamente
burocrática. Essas opiniões se baseiam no fato de que a 9.612/98 limita as
possibilidades dessas emissoras se manterem, já que veta a busca por comerciais,
há imposições a respeito da faixa, da potência, do alcance etc. Afirma-se que a lei é
rigorosa demais com as emissoras de baixa potência, não só porque incentivam e
promovem a disseminação da informação e da cidadania, mas porque contrariam os
interesses das grandes emissoras comerciais que não aceitam perder audiência,
espaço político, muito menos dinheiro da publicidade. As rádios comunitárias são
comumente batizadas de piratas por aqueles que são contra o movimento (entende-
se aqui por governo, redes e empresas que controlam os meios de comunicação),
pois, segundo Peruzzo (1998, p. 7), “são portadoras de um conteúdo político que
amedronta os três poderes constituídos”.
Enfim, é evidente que a disseminação das rádios comunitárias no país não se
pauta apenas no fato de o rádio ser um instrumento de longo alcance, mas,
principalmente, porque a emissora comunitária tem papel de mobilizar, promover e
incentivar o desenvolvimento e a transformação na comunidade na qual está
28
inserida. A emissora comunitária tem um caráter diferenciado, pois não objetiva
apenas entreter o ouvinte, mas contribuir para o desenvolvimento da comunidade,
incentivando a cultura, a democracia, a transparência na administração pública,
além de ser uma porta-voz da população. Para cumprir todas essas metas, a rádio
comunitária deve ter uma associação comunitária para geri-la, uma programação
diferenciada e atender a diversas exigências legais. “A rádio comunitária é a porta-
voz da gente, do ser humano, do povo. O que ela fizer, o que for dito, é a voz da
comunidade lá - com seus erros e seus acertos.” (LUZ, 2001, p. 27)
No entanto, nem toda rádio que se denomina comunitária o é de fato. Cecília
Peruzzo (1994, p. 9) diz que existem pelo menos quatro tipos de emissoras que se
intitulam comunitárias; as que são eminentemente comunitárias, que seguem um
modelo de gestão e participação popular, sem fins lucrativos; aquelas que são
controladas por poucas pessoas, têm um dono, mas prestam algum tipo de serviço a
comunidade; há ainda aquelas que mantém uma programação bem semelhante as
emissoras comerciais, sem vínculos com a comunidade local e também existem as
rádios que se dizem comunitárias, mas que são ligadas à políticos ou candidatos à
cargos eletivos, que se utilizam do rádio para fazer campanha eleitoral. Essa
variedade de comportamentos pode confundir e até mesmo incentivar o uso de
termos pejorativos para com as emissoras realmente comunitárias, ou seja, aquelas
rádios que são um produto da comunidade, que não tem fins lucrativos, que tem
uma programação interativa com a participação direta da população, valoriza e
incentiva a cultura local etc. Diversos autores concordam com essa classificação
feita por Peruzzo, entre eles Denise Cogo e Augusto Coelho. No entanto, há
pesquisadores mais flexíveis e com uma visão menos carregada de ideologia, que
29
se pautam na observação de cada realidade. É o caso de José Ignácio Vigil que
considera rádio comunitária aquela que
Quando uma emissora promove a participação dos cidadãos e defende seus interesses; quando responde aos gostos da maioria e faz do bom humor e da esperança a sua primeira resposta; quando informa com verdade; quando ajuda a resolver os mil e um problemas da vida cotidiana; quando em seus programas são debatidas todas as idéias e todas as opiniões são respeitadas; quando se estimula a diversidade cultural e não a homogeneização mercantil; [...] quando não se tolera nenhuma ditadura imposta pelas gravadoras; quando a palavra de todos voa sem discriminações ou censuras – essa é uma rádio comunitária. (VIGIL, 2003, p. 506)
Essa visão realista sobre a atuação das emissoras comunitárias percebe a
impossibilidade de se enxergar a comunicação popular apenas sob uma perspectiva
positiva, levando em consideração que não se trata de uma receita única de fazer
rádio, é preciso perceber diferentes níveis de atuação, de acordo com a realidade de
cada território. A própria Associação Mundial de Rádios Comunitárias (AMARC)
concorda que a classificação dessas rádios é variada.
rádio comunitária, rural, rádio, rádio participativa, rádio livre, alternativa, popular, educativa... se as estações de rádio, as redes e os grupos de produção que constituem a AMARC se referem a elas mesmos por meio de uma variedade de nomes, suas práticas e perfis são ainda mais varia dos. (BAHIA, 2006)
Assim, para qualificar uma emissora como comunitária ou não é preciso se
considerar os diferentes níveis de atuação desta, levando-se em conta as
dificuldades financeiras, técnicas e humanas, a cultura local, a realidade de cada
comunidade. Podemos dizer então que se uma rádio pode não ser gerida pela
comunidade local, mas apresenta uma programação interessante e presta serviço
comunitário ou outra que é gerida por um conselho comunitário, mas ainda não
30
conseguiu fazer uma programação que valorize a cultura local, elas não deixam de
ser comunitárias, apenas atuam em diferentes níveis de atuação comunitária.
A programação da rádio comunitária é outro assunto que gera debates e
diversos autores estudam e opinam sobre qual seria a programação ideal para esse
tipo de emissora. Segundo Luz (2001), a grade de programas de uma emissora
desse tipo deve ser diversificada, plural, prestar sempre serviço comunitário a
população e transmitir cultura. Mas a realidade é um pouco diferente, pelo menos na
maioria das rádios comunitárias da região sisaleira, já que os programas musicais
são os mais presentes e ocupam quase todo espaço na programação, pois o custo
de produção é mais baixo e essas emissoras costumam operar com muito pouco
dinheiro.
Reconhece-se que algumas emissoras comunitárias reproduzem o modelo de emissoras comerciais no que se relaciona com conteúdo musical, que se estende por horas seguidas, intercalado com rápidas inserções para recados e diálogos comunitários. Em muitos casos, os próprios coordenadores das rádios admitem esta prática para não perderem a audiência para as emissoras comerciais, sendo obrigados, portanto, a mesclar a programação que, de acordo com o projeto, deveria focalizar questões voltadas para o desenvolvimento sócio-econômico e cultural da sociedade. (BAHIA, 2010
2).
A discussão então gira em torno de que música se deve tocar numa rádio
comunitária. Sabe-se que as rádios comerciais seguem a lógica do mercado e da
indústria cultural, tocam o que vira sucesso, as músicas que são mais massificadas
nas grandes emissoras e que logo caem no gosto popular. “Em geral, os sucessos
se identificam com as listas que as gravadoras promovem.” (VIGIL, 2003, p. 343)
Essa é a lógica das comerciais, pois estão numa busca constante e desenfreada
2 Não foi possível encontrar a data de publicação do texto.
31
pela audiência. O que interessa no meio comercial é ter muitos ouvintes e
consumidores em potencial, para que através da publicidade essas rádios possam
se sustentar. As rádios comerciais são, principalmente, emissoras para
entretenimento, por isso sua programação é quase toda musical.
Dioclécio Luz afirma que as rádios comunitárias devem tocar músicas que
fogem dessa linha da indústria cultural, da fábrica de sucessos. “Devemos ouvir
músicos independentes, aqueles que estão mais preocupados em fazer arte do que
repetir o que se toca por aí.” (LUZ, 2001, p.76). Para ele, a rádio comunitária deve
incentivar a divulgação dos trabalhos dos artistas local e o locutor deve ter um papel
de educador do gosto popular. Essa é uma linha um tanto perigosa de se seguir,
pois trabalhamos aqui com o valor e poder da diversidade cultural. O rádio invade as
casas e leva em todas as direções uma quantidade infinita de produção cultural e
julgar a qualidade, o valor ou o que quer seja dessa produção é um trabalho
complexo e minucioso que varia de olhar para olhar, de pessoa pra pessoa, de
cultura pra cultura. Não cabe aqui uma análise desse tipo, pretende-se apenas saber
como a música tocada numa rádio comunitária interfere na desterritorialização do
sujeito dessa comunidade.
Numa visão um pouco mais ampla, Vigil (2003) traz uma reflexão interessante
quando afirma que o desafio das emissoras consiste em atender as preferências
musicais do público, ao mesmo tempo em que oferece alternativas que permitam
ampliá-los. O autor chama a atenção para o fato de que o radialista e os produtores
de programas radiofônicos não devem se prender a moralismos exagerados, pois há
de se levar em conta que os gostos variam e as sensibilidades também. As rádios
comunitárias devem tocar de tudo um pouco, privilegiando as canções de bom gosto
e qualidade. E a música internacional deve ser tocada na programação musical de
32
uma emissora comunitária? Segundo o autor todo estilo pode ser tocado. “Não há
lugar para racismo musical. Não é preciso negar o que é de fora para afirmar o que
é nosso. (...) Cabe ao bom senso do radialista manter esse sábio balanço entre as
nacionalidades dos discos.” (Vigil, 2003, p.345)
Todas essas definições são pertinentes e devem ser praticadas, contudo, o
que acontece na prática é que muitas rádios comunitárias, quando se trata de
música, acabam repetindo os formatos dos programas das emissoras comerciais,
tocando as canções de sucesso no momento, atendendo as demandas do mercado
fonográfico sem se esforçar para cumprir um de seus deveres que é valorizar e
promover também a cultura local. A rádio comunitária deve tocar de tudo, sabendo
dosar as proporções e lutando para fugir da guerra da audiência e do comodismo do
servilismo musical. Além disso, não é só colocar uma música no ar e pronto. É
preciso criar estratégias para que a programação se mantenha interessante, manter
o equilíbrio entre os gêneros tocados, misturando os ritmos, combinando-os para
manter um programa vivo e atraente como o é o próprio rádio. É necessário atender
aos pedidos da população, mas não ser escrava desses pedidos. A programação da
emissora comunitária deve deixar claro o perfil da rádio, ou seja, definir seu papel
específico diante de seu ouvinte para que este seja atraído pelo que a emissora tem
de melhor.
33
2 . O local e o rádio: a Valente FM e seu território de atuação
O rádio cria laços com a comunidade na qual está inserido e, se tem caráter
comunitário, é também o porta-voz do cidadão. No interior, em regiões mais
afastadas dos grandes centros urbanos, o rádio é mais que companhia, é também
um representante das lutas e anseios da população local. A região sisaleira da
Bahia, localizada no semi-árido nordeste do estado (a pouco mais de 200 km de
Salvador), com quase 800 mil habitantes distribuídos em 25 municípios, é uma prova
da importância do rádio no desenvolvimento de um território. Com um clima seco e
uma vegetação caracterizada pela caatinga, cerrado e vegetação arbórea aberta, a
região tem como principal atividade econômica o cultivo e comercialização do sisal.
É um território culturalmente diversificado, que carrega ainda fortes traços das
manifestações tradicionais do sertanejo nordestino como o reisado, a literatura de
cordel, a festa da Quixabeira etc. É também uma região conhecida por ter um
movimento social atuante e diversas entidades de associativismo e cooperativismo
espalhadas por seus municípios. Por ter um caráter tão mobilizador, o movimento
das rádios comunitárias floresceu por aqui no início dos anos noventa e muitos
municípios passaram a ter uma emissora comunitária atuando na comunidade. Isso
trouxe para o território um novo olhar sobre a importância da comunicação no
desenvolvimento de uma sociedade.
Incentivado pelo sucesso dessas rádios na região, o movimento social passou
a experimentar e investir em iniciativas que favorecessem a comunicação social no
território. O Movimento de Organização Comunitária (MOC) , organização não-
governamental que atua na região há mais de quarenta anos e apóia as rádios
34
comunitárias, foi um dos primeiros a desenvolver um projeto voltado para a área. No
final de 2001 e início de 2002 lançou, em parceria com outras entidades da região e
o Instituto Credicard, o projeto Jovens Comunicadores, no qual vinte e sete jovens
de nove municípios da região foram capacitados para trabalhar e assessorar a
sociedade civil organizada na área de comunicação. Com oficinas teóricas e
práticas, os jovens aprenderam a fazer e pensar programas de rádio e boletins
informativos que debatessem assuntos importantes para o desenvolvimento da
região, como por exemplo, cultura, políticas públicas, participação e cidadania etc. O
projeto durou três anos e como resultado trouxe para a região sisaleira a Agência
Mandacaru de Comunicação e Cultura (AMAC). Criada em julho de 2005, por quinze
jovens oriundos do projeto Jovens Comunicadores, a AMAC, sediada no município
de Retirolândia, produz diversas peças que são veiculadas nos meios impressos,
radiofônicos, virtual, em vídeo e fotos. Os produtos da Agência procuram dar
visibilidade às iniciativas do movimento social, aos assuntos ligados ao bem-estar da
criança e do adolescente, aos direitos humanos etc, seu maior parceiro é o MOC.
Praticamente nesse mesmo período de planejamento e criação da AMAC, outra
entidade “nasceu” na região. Em 2004, foi criada a Associação de Rádios
Comunitárias do Sisal (ABRAÇO-SISAL) com o objetivo político de contribuir para a
efetivação de oportunidades locais de democratização da comunicação na região
sisaleira da Bahia, passando a existir juridicamente em 2005, com a realização de
uma Assembléia Geral para aprovação de seu marco legal, eleição e posse da
diretoria e construção do seu planejamento estratégico. Na prática, a ABRAÇO-
SISAL presta uma espécie de assessoria às rádios comunitárias afiliadas,
fornecendo capacitação para locutores, diretoria e gestores, além de discutir,
defender e orientar as emissoras nas questões ligadas à legalização. Atualmente a
35
ABRAÇO-SISAL atua diretamente em quinze municípios do território sisaleiro. Sem
fins lucrativos, a associação conta a parceria de diversas entidades do movimento
social.
Outra entidade da sociedade civil organizada que também vem tentando
desenvolver algum trabalho relacionado à comunicação é o Conselho Regional de
Desenvolvimento Rural Sustentável da Região Sisaleira da Bahia (CODES-SISAL).
Em fevereiro de 2008, o CODES-SISAL elaborou um plano territorial de
desenvolvimento determinando seis eixos prioritários de desenvolvimento, entre eles
o da comunicação. Este eixo tem por finalidade buscar o fortalecimento das
entidades do movimento social do território do sisal em relação às ações ligadas à
comunicação a nível interno e externo. Como se pode notar, o movimento social da
região sisaleira, incentivado pela atuação das rádios comunitárias, vem, ao longo
dos últimos anos, ampliando suas ações no que se refere à comunicação. É possível
destacar em meio aos municípios da região, as ações ocorridas na cidade de
Valente, que sediou até o ano 2009 a ABRAÇO-SISAL, é sede do CODES-SISAL e
possui uma das mais antigas emissoras comunitárias no ar.
Valente está localizada a 240 km da capital, e é uma típica cidade do interior.
Segundo o IBGE possui aproximadamente vinte e dois mil habitantes, tendo sua
economia baseada no cultivo do sisal e na agricultura familiar. Além dessas
atividades o município é ainda impulsionado economicamente por duas grandes
empresas: a Via Uno (empresa de calçados) e a Associação de Desenvolvimento
Sustentável e Solidário da Região Sisaleira (APAEB-Valente), empresa que
comercializa sisal e seus artefatos. O município é reconhecido pela força do
movimento social e organização popular mantendo até hoje diversas entidades
36
atuantes na luta por uma sociedade mais justa e igualitária. Segundo Elenaldo
Teixeira (2001),
A base do processo organizativo da sociedade de Valente concentra-se no meio rural, entre os pequenos produtores e trabalhadores sem terra, em torno de cerca de 50 associações comunitárias, situadas nos povoados. (...) Merece destaque o Movimento de Mulheres Trabalhadoras Rurais, que além de atuação especificamente sindical, com forte liderança (...) realiza capacitação, educação e discussão política sobre a problemática da mulher. (TEIXEIRA, 2001, p 175).
Foi a partir dessa articulação da sociedade civil organizada de Valente e do
território, e da necessidade de se comunicar de forma mais aberta e democrática
que o movimento social e a organização popular passaram a contar com o rádio
como instrumento de mobilização e transformação social na região. Segundo a
pesquisa realizada pelo professor Antonio Dias (2005), as rádios comunitárias
„nasceram‟ no território do sisal a partir de dois contextos: pela mobilização dos
movimentos sociais que precisavam se comunicar melhor com suas bases e pela
iniciativa privada. “O principal objetivo nesta investida era o de “dar voz ao povo”, ou
seja, de construir um espaço onde a comunidade pudesse ouvir a si mesma e onde
as entidades pudessem conversar e discutir com ela, além de informá-la.” (DIAS,
2005, p.24)
A Rádio Comunitária Valente FM foi fundada em fevereiro de 1998, época em
que o país estava com um forte movimento pela legalização desse segmento.
Algumas entidades da sociedade civil local (APAEB-Valente, Sindicato dos
Trabalhadores Rurais, Fórum da Cidadania etc) discutiam esse projeto há mais de
dois anos. Os preparativos para implantação da rádio comunitária foram
coordenados por representantes da APAEB, que cuidaram do envolvimento de
outras entidades para cuidar da Associação. A entidade também financiou os
37
treinamentos iniciais. A programação musical consistia (e ainda hoje é assim) em
tocar de todos os estilos um pouco; o sucesso da mídia, forró, internacional, música
de artistas da cidade e da região etc. Para o jornalismo foram planejados boletins de
hora em hora, um jornal pela manhã e um rádio revista de uma hora, ao meio dia.
Além dessa programação, sempre que o locutor “abria o microfone” deveria ler
avisos da comunidade. O programa jornalístico começou um mês após a rádio ter
entrado no ar, em abril de 98, e foi planejado para ter notícias locais, regionais,
estaduais e nacionais. Eram mais notícias policiais, sobre realizações da sociedade
civil e acompanhamento de reuniões, ainda sem muitas críticas e cobranças ao
poder público. Com o tempo isso mudou um pouco e as denúncias e investigações
sobre as ações do poder público local se tornaram pauta constante no programa
jornalístico.
Em muitos anos de atuação a emissora, assim como muitas outras da região
e do país, passou por muitas perseguições políticas e também pela ANATEL
(Agência Nacional de Telecomunicações), que diversas vezes lacrou a rádio,
carregou seus equipamentos e, algumas vezes, em ação conjunta com a Polícia
Federal, agrediu seus locutores. A pesquisa realizada pelo professor Antonio Dias
(2005), relata essa fatos através de entrevistas
Depois vieram com a presença da polícia, não se identificaram que era a polícia, o prédio não funcionava aqui na época, mas tinha inclusive uma testemunha, coincidentemente tinha um ouvinte no momento que eles arrombaram, presenciou o fato... E eram vários policiais acompanhados de fiscais da Anatel que, como falei, não se identificaram, foram muito ousados,mandava abrir: „abra logo, que é que você quer ainda aqui perguntando nada, abra logo, largue de conversa, viemos buscar isso aqui‟... Foi o que eu entendi, perguntei, explorei, mas quem é e quem são, não se identificaram. E aí, fechei, depois eles pularam o portão do muro, depois quebraram a porta que dá acesso ao interior da rádio e aí já chegaram mesmo me batendo mesmo, me agredindo, entendeu, no meu pescoço, me empurraram sobre paredes, me algemaram... E enfim, queriam que eu desse
38
depoimentos, entregasse pessoas lá mesmo, na maior pressão (ENTREVISTADO VALENTE FM, 2004).
Foram muitos anos de luta pela liberação da autorização para que a Valente
FM pudesse atuar de maneira legal, ou seja, com a permissão emitida pelo
Ministério das Comunicações. Na verdade, a luta pela outorga é um dos maiores
desafios das emissoras comunitárias, que encontram em seu caminho excesso de
burocracia e disputa política. A Rádio Comunitária Valente FM somente conseguiu a
outorga depois de quase cinco anos de luta, apesar de a Lei 9.612, que institui o
serviço de radiodifusão, ter sido criada em 20 de fevereiro de 98. Em outubro de
2002, a emissora recebeu a outorga do Ministério das Comunicações. Era uma
autorização provisória, enquanto a matéria não era votada pelos deputados no
Congresso Nacional. Nesse período, a ABRAÇO-SISAL participou de manifestações
e reuniões com representantes do governo na tentativa de conseguir outorga para
algumas emissoras da região, entre elas a da Valente FM. Finalmente, em 15 de
outubro de 2003, o Congresso Nacional aprovou a outorga da Rádio Comunitária
Valente FM.
Em mais de onze anos de atuação a Valente FM ganhou credibilidade na
comunidade principalmente devido ao seu programa jornalístico, o Rádio
Comunidade, que já foi um dos mais ouvidos da região. Hoje a equipe da Rádio é
composta de acordo com cada núcleo de trabalho (Jornalismo, Locução dos DJs e
Direção). Existe um coordenador de Jornalismo, que define as pautas, encaminha os
repórteres e supervisiona a produção das matérias. Diferente de outras redações de
radiojornalismo, a reunião de pauta não é uma prática comum na emissora,
geralmente os próprios repórteres definem suas matérias ou o coordenador
determina qual será a matéria. Os repórteres realizam as matérias nas ruas,
39
enquanto um editor de textos realiza a clipagem de notícias dos jornais, definindo o
que deve ir ao ar, editando os textos, e transpondo a linguagem para a radiofônica.
Há ainda os apresentadores que fazem o papel de âncora no programa jornalístico.
Os próprios repórteres editam suas matérias. O programa já possui o roteiro base
onde serão inseridas, pelo editor de texto, as manchetes dos principais jornais de
país, os textos obtidos com a clipagem, além de notas de interesse da comunidade.
Esse trabalho é realizado pelo editor durante toda manhã, e só se encerra ao final
do programa jornalístico, no início da tarde. Os fatos e notícias que serão objeto de
matérias são definidos conforme critérios pré-estabelecidos pela equipe jornalística
da rádio, e que tem a ver com a “missão da Rádio”, as notícias se referem
normalmente a atividades do movimento social, do poder público, a fatos e assuntos
de interesse da região, com destaque ao local, além de temáticas como saúde,
educação, cultura e economia. Geralmente nas chamadas do roteiro destacam-se as
locais, três regionais, três nacionais e uma internacional.
As fontes de informações para equipe de jornalismo da rádio são mais
diversas, desde os jornais escritos do estado e do país (principalmente os sites dos
jornais exemplo do A Tarde, Tribuna da Bahia, Correio da Bahia, Folha de São
Paulo, I Bahia, MOC, Agecom, etc) para matérias de contexto nacional e/ou
estadual. Quanto ao que acontece na região, o “rádio escuta”, e a parceria (não
formalizada) com diversas rádios comunitárias da região são as principais fontes de
informação (Sabiá FM, Agência Kalila, Baianinha, Contorno FM, dentre outras). Em
suas pautas a rádio conta ainda com a colaboração de líderes comunitários e da
população em geral.
[...] o programa rádio comunidade, que é um dos mais ouvidos, badalados aqui na comunidade. Porque é essa forma que Toni
40
coloca, é de denúncia, é de chegar e apertar o prefeito mesmo, o vereador, o porquê não foi feita as ações, de chegar e apertar o sindicato, a Apaeb, enfim, ou até mesmo as associações. Então a rádio tem o seu caráter lá, comunitário, que não tá atrelado a político, nem à associação, nem a sindicato e nem a nada, tá fazendo o seu papel que é de botar as informações com transparência, com responsabilidade, mostrando as duas visões: a que tá errada e a que deveria está sendo feita certa (ENTREVISTADO VALENTE FM, 2004).
Em termos financeiros a Valente FM vende espaços para propagandas,
chamadas de apoio cultural, e para programas terceirizados. Além disso, recebe
apoio financeiro de algumas entidades sociais do município. O maior apoio vem da
APAEB- Valente. A influência do público - que abrange a Zona Rural e sede do
município de Valente - na programação é inevitável, toca-se o que as pessoas
querem ouvir. Quando se trata das notícias, não há participação direta no jornalismo,
ainda que a população, principalmente a sociedade civil, paute a rádio em boa parte
das matérias locais. A influência dos patrocinadores é pequena, com exceção da
entidade que mais contribui com a rádio (APAEB-Valente), que tem direito a um
programa, a anúncios sem custo algum, além de exercer maior influência nas
decisões da diretoria em relação às demais entidades que a compõe. A relação da
Rádio Valente FM com o poder público local é um tanto tumultuada, pois,
freqüentemente, a emissora faz denúncias e investigações que nem sempre
agradam ao executivo e legislativo. Além disso, há um entrave muito forte nessa
relação por a Valente FM ser vista por parte da população e pelo poder público
como uma emissora da APAEB - Valente, uma instituição que é oposição do
governo municipal.
Nenhum diretor da Apaeb nunca chegou pra pressionar qualquer um da gente. A gente já fez matérias – inclusive, Cléber que é o chefe de Jornalismo do programa “rádio comunidade” pode reforçar isso – a gente já botou matérias contra a própria Apaeb, pessoas reclamando
41
de alguma coisa que não tá legal na indústria, de alguma matéria contra um diretor, a gente já colocou isso no ar (ENTREVISTADO VALENTE FM, 2004).
Embora seja afiliada a ABRAÇO-SISAl, a Valente FM não participa das
atividades e discussões promovidas pela entidade e se mantém afastada das ações
do CODES-SISAL. Segundo Cléber Silva, coordenador de jornalismo da emissora,
“esse afastamento das atividades tanto da ABRAÇO-SISAL quanto do CODES-
SISAL não provocam atritos na relação da rádio com essas entidades”3. A rádio é
ainda sócia da AMARC Brasil e geralmente participa das discussões através de
Cléber Silva, que também é sócio da entidade. Ao longo dos anos, a rádio Valente
FM passou por muitas transformações, com períodos de muita popularidade e
jornalismo de ótima qualidade, do mesmo modo que passou por períodos difíceis
como diminuição de funcionários e falta de recursos financeiros, o que acarretou
numa perda de qualidade na programação e produção dos programas. Por um
período, a emissora ficou sem uma diretoria atuante, ficando a cargo de seus
funcionários. Em 2006, com a entrada do presidente José Melquiades de Oliveira, foi
feita uma mudança no estatuto da rádio, dando maiores poderes ao presidente e
gerente. A partir daí a rádio teria um presidente mais presente, um tanto
centralizador e arbitrário, mas que conseguia colocar um mínimo de organização nos
trabalhos, ajudando a Valente FM a seguir adiante. Outra mudança no estatuto
aconteceu em janeiro de 2009, quando a associação que gere a rádio passou a ser
uma Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP), permitindo
assim que pessoas físicas e jurídicas se associem à emissora; que a associação
3 Informação concedida por Cléber Silva através de entrevista realizada em dezembro de 2009.
42
possa pleitear projetos; receber doações de recursos físicos, humanos e financeiros
etc.
A programação da Valente FM é basicamente formada por programas
musicais, um de jornalismo e um esportivo, como podem ser verificados no quadro
abaixo:
HORÁRIOS PROGRAMAS CARACTERISTICAS
5:00 ás 8:00 Vozes da Terra Toca músicas regionais, forró pé-de-serra, artistas
locais, sertanejo raiz. Com o locutor Gel Santos.
8:00 ás 11:30 Ligação Direta Toca de todos os estilos, sucessos do modo, conta
com a participação dos ouvintes através dos pedidos
por telefone. Locução de Gel Santos.
11:30 às 12:00 Conversa da Gente Programa terceirizado em estilo revistas que traz
notícias da instituição (APAEB- Valente) e assuntos
variados. Toca muita música, principalmente
internacionais, sucessos e artistas locais.
12:00 às 13:00 Rádio Comunidade Jornalístico com notícias locais, regionais e nacionais
13:00 as 14:00 FMPB Programa que toca apenas música popular brasileira.
As vezes tem locutor apresentando e as vezes é
apenas uma programação do playlist.
14:00 às 18:00 Show da Tarde Programa comandado por Tony Sampaio, toca de
todos os estilos, sucessos do modo, conta com a
participação dos ouvintes através dos pedidos por
telefone.
18:20 às 19:00 Bola na Rede Programa com notícias do esporte local, regional e
nacional.
19:00 às 20:00 Retransmissão da
Hora do Brasil
21:00 as 23:00 Noite de Sucessos Os sucessos do momento e as músicas românticas.
43
Atende pedidos por telefone. Locutor Lecildo Silva.
23:00 às 6:00 Músicas programadas no playlist, prioriza-se as
românticas e internacionais.
Aos domingos pela manhã tem o programa do Sindicato dos Trabalhadores e
Agricultores Familiares de Valente, com notícias da instituição e de interesse dos
associados.
Observando a programação da emissora, percebe-se que não é muito variada
seguindo a linha de muitas outras rádios comunitárias da região que carecem de
maiores investimentos financeiros e humanos para levarem ao ar uma grade mais
diversificada, pois fazer programas diferentes e com qualidade exige recursos e
estrutura, o que nem sempre esse tipo de emissora dispõe. Na verdade, a
programação da emissora, principalmente o espaço disponibilizado para a música,
se assemelha as rádios comerciais, embora existam espaços dedicados a produção
local e de artistas da região, além da emissora não receber das grandes gravadores
nenhum incentivo financeiro para isso. Sob aspectos acadêmicos, a Valente FM
poderia ter sua nomenclatura de comunitária questionada e reavaliada, pois não se
encaixa perfeitamente em todas as categorias elencadas por estudiosos na
classificação dessas rádios. No entanto, já se discutiu aqui nesse trabalho que
existem níveis de atuação comunitária e isso é determinado por variados fatores.
Embora seja relevante discutir um pouco sobre o tema, não é interesse desse
estudo aprofundar a análise sobre o caráter comunitário ou não dessa emissora,
mas analisar as músicas tocadas na programação. Esse assunto será abordado no
próximo capítulo.
44
3. A música que vai ao ar
A intenção desse capítulo é analisar a programação musical da Rádio
Comunitária Valente FM, tentando perceber e refletir a presença e influência que
essa programação exerce sobre aspectos como cultura e desterritorialização, bem
como a relação entre local e global. Para melhor encaminhamento do trabalho foi
feito um recorte na programação analisada selecionando para estudo o programa
Ligação Direta, que vai ao ar de segunda a sábado das 8:00 ás 11:30 da manhã, e
foi ouvido por uma semana, dos dias 16/11 a 20/11/2009. O Ligação Direta foi
escolhido por ter um público ouvinte bem variado; por publicizar todos os estilos
musicais e por ser, segundo a própria equipe da rádio, o programa musical de maior
audiência da emissora. Além de tudo isso, pesquisas realizadas pelo IBOPE4
(Instituto Brasileiro de Opinião Pública e Estatística) em diversos estados do país,
inclusive na Bahia, comprovam que o horário matutino possui uma grande audiência.
Pensado para veicular todos os estilos musicais, o programa Ligação Direta
segue exatamente essa linha, toca o que o ouvinte pede e o que é sucesso no
momento. É assim desde o surgimento da rádio, quando o nome do programa
matutino era Show da Manhã. A mudança dos nomes do programa aconteceu em
abril de 2008, quando numa reunião entre funcionários decidiu-se mudar um pouco a
imagem emissora, fazendo novas vinhetas e rebatizando os programas. A maior
transformação aconteceu mesmo no horário da manhã, os programas Bom Dia
Sertão e Clube do Forró fundiram-se, transformando-se em Vozes da Terra,
4 Informação retirada do site www.ibope.com.br, acessado dia 22 de janeiro de 2010.
45
dedicado aos artistas locais, regionais, a música sertaneja e ao forró pé de serra,
que vai ao ar das 6:00 ás 8:00. Em seguida vem o Ligação Direta, que foi ao ar pela
primeira vez em maio de 2008 e é uma remodelagem do antigo programa (Show da
Manhã). Segundo o locutor Gel Santos, a mudança mais significativa entre os dois
programas foram as vinhetas novas, que deram uma renovada na programação,
com mais qualidade, atraiu ainda mais o público e deu um novo ritmo ao programa.
A emissora é gerida por um diretor- presidente e mais três diretores. O diretor-
presidente José Melquiades está à frente da rádio há três anos e foi um dos
mobilizadores pela mudança na imagem da emissora, por reforçar essa
preocupação com as músicas tocadas na emissora. Com uma visão um tanto
conservadora, Melquiades diz que tenta conscientizar os locutores sobre a música
de qualidade e por isso, admite que já interferiu na programação mandando
suspender determinadas músicas. Segundo a equipe, hoje não é mais necessária
essa intervenção direta, cada um já tem noção do que deve ir ao ar ou não.
Embora os aspectos relacionados à gestão e planejamento da programação
musical não tenham sido aprofundados aqui, vale ressaltar que eles são importantes
para a análise do que é veiculado no programa, além de servirem como norteadores
desse trabalho que busca refletir e perceber aspectos da cultura popular, dos
processos de desreterritorialização, as relações estabelecidas entre o local e o
global na programação da emissora. É com base nesses elementos que é possível
observar as tentativas de territorialização ocorridas nesse processo, na medida em
que as pessoas tentam atender aos seus desejos, reterritorializando-se.
O Ligação Direta é comandado por Gel Santos, 26 anos, que está há sete
anos na emissora, a frente da programação musical matutina. Adepto da locução
coloquial, aquela em que o locutor fala de igual pra igual com o ouvinte,
46
considerando-o um amigo especial, Santos é um locutor jovem, que tem um ritmo
dinâmico dando ao programa um ar mais descontraído e alegre. Faz uma locução
típica das emissoras FM, comunitárias ou não, sem utilizar palavras rebuscadas ou
formais, lendo sempre os recados mandados pela população e as notas de
prestação de serviço comunitário. Para Gel Santos, “o trabalho do locutor não é só
está aqui tocando músicas, mandando alô, é também ser amigo do ouvinte e fazer
com que ele entenda que a gente segue uma linha e tem música que não é legal,
por isso não é tocada.”5
O programa Ligação Direta foi idealizado para apresentar uma maior
variedade de canções, já que tem um público mais diverso e jovial, que acompanha,
principalmente, os sucessos do momento. A questão é que a rádio executa todos os
estilos, mas não qualquer música dentro desse estilo. Os locutores seguem uma
linha proposta pela direção para não tocar músicas com sentido ambíguo, que façam
apologia as drogas, sexo, violência etc, eles devem observar as letras e filtrar aquilo
que vai ao ar, mesmo que o ouvinte peça, os funcionários explicam que a emissora
não tem a canção pedida e sugerem outras opções no mesmo ritmo, às vezes até
do mesmo artista, mas que não vá contra os princípios determinados pela rádio
comunitária.
“Toca tudo, toca o que o público pede. A única coisa que a gente pede é que não toque determinadas músicas, que façam apologia a raça, cor, religião ou qualquer outra coisa por ser uma rádio comunitária (...) tem muita criança ouvindo a rádio, principalmente na programação de Gel, então a gente pede pra que os locutores não toquem.” (JOSÉ MELQUIADES, presidente da Valente FM, entrevistado dezembro de 2009)
5 Informação concedida por Gel Santos, através de entrevista realizada em dezembro de 2009.
47
A maior parte da programação musical é composta pelos sucessos de artistas
explorados no momento pelas mídias, canções que são trilha sonora das novelas e
que são muito tocadas nas emissoras comerciais. As produções dos artistas locais e
regionais não aparecem muito na programação desse horário, costumam ser
tocadas no programa Vozes da Terra, que vai ao ar das 6:00 as 8:00 diariamente.
Além disso, a rádio tem uma programação no piloto automático que distribui os mais
variados tipos de música, e os locutores tentam garantir que essas produções
locais/regionais façam parte do playlist. Essa programação pré-selecionada vai ao ar
diariamente a partir das 22:00 horas, nos fins de semana e feriados. Segundo
Santos, o gosto pessoal do locutor não interfere tanto na escolha das músicas, a
programação é definida pelo ouvinte que liga e escolhe o que quer ouvir. No entanto,
nem sempre é possível atender aos pedidos e, pode acontecer de não se ter tantas
solicitações, assim é evidente que o locutor também coloca outras músicas na grade
do programa. No caso da programação em estudo, é possível perceber a influência
do gosto pessoal do locutor no número de canções executadas no estilo pop rock, o
seu preferido.
Para alcançar o objetivo desse estudo, definiu-se analisar a programação
observando quais as músicas e os estilos mais tocados, a presença ou ausência da
música popular e das produções local e regional e quais as possíveis interferências
da própria emissora na seleção das músicas. Considerando esses fatores foi
possível identificar, através das músicas veiculadas na rádio, o quanto o global está
inserido no cotidiano da comunidade local, influenciando nos processos de
reterritorialização e perceber como se dá a valorização e incentivo da produção
cultural local. Assim, para saber quais músicas são as mais pedidas na emissora,
durante o Ligação Direta, esse estudo analisou as canções tocadas durante a
48
semana de 16 a 20 de novembro de 2009. Nesses cinco dias, foram tocadas em
média trinta e nove músicas por programa, totalizando cento e noventa e seis
durante a semana. Os ritmos predominantes foram o sertanejo universitário
(26,53%), forró eletrônico (15,82%), axé (13,78%), pagode romântico (13,275) e pop
rock (10,20%). Também estiveram presentes na programação os estilos: pagode
baiano (5,10%), MPB (4,08%), a música pop internacional (3,06%). Outros rimos
musicais somaram 8,16%. Percebe-se que, de fato, veicula-se músicas para
variados gostos, de diversos ritmos. Um aspecto notado nesse estudo foi que,
durante o período de análise, a programação foi feita basicamente com os mesmos
artistas. O estilo musical que mais trouxe nomes diversificados foi o sertanejo
universitário, já que nesse momento muitos artistas desse estilo estão sendo
explorados pela mídia. Outro fator interessante de se perceber foi que a música mais
pedida pelos ouvintes (Vem pra cá – Papas na Língua) faz parte da trilha sonora da
“novela das oito” Viver a vida, da Rede Globo. O quadro abaixo traz os artistas e
músicas mais executadas durante a semana analisada.
ARTISTA MÚSICA
Papas na Língua Vem pra cá
Belo Reinventar
Edson e Hudson Foi você quem trouxe
Natália Siqueira Você vai voltar pra mim
Banda Imortal Mentes tão bem
Perlla Beijo de cinema
Mariah Carey I wanna know what love is
Michel Telo Ei, psiu! Beijo, me liga
Anjo Azul Não sou de ninguém
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Guilherme e Santiago Quando você vem me abraçar
Bruno e Marrone Amor não vai faltar
Cláudia Leite Horizonte
Molejo Voltei
Cheiro de Amor Pense em mim
Jota Quest Vem andar comigo
A lista acima ilustra os artistas e músicas que foram tocadas praticamente a
semana inteira. Além desses artistas outros como Harmonia do Samba, Menina
Faceira, Jorge e Matheus, Aviões do Forró e Skank também se repetiram ao longo
da programação, no entanto, as músicas desses artistas variavam.
“em relação a gente tocar as mesmas músicas, eu tô no ar há quase 8 anos e tem gente que liga pra mim e pede a mesma música todos os dias, então a gente acaba se influenciando, de repente o cara nem ligou e a gente já tá tocando. A Valente FM tem essa meta de tocar todos os ritmos, tocar para todos os gostos, mas meu programa não tem jeito... meu programa pela manhã o telefone toca o tempo inteiro e o cara vai pedir a música do momento, ele não vai pedir...sei lá...Djavan, vai pedir Dejavú, Calcinha Preta, infelizmente ou felizmente a gente acaba influenciado pelo ouvinte.” (Gel Santos, entrevistado dezembro 2009)
O que fica claro é que o programa Ligação Direta é um espaço de divulgação
das músicas que são sucessos do momento, dos artistas que estão nas grandes
mídias. É perceptível também a influência que a televisão exerce no momento da
escolha do ouvinte. Além da canção do grupo Papas na Língua, aparece também na
lista das mais publicizadas a música da cantora internacional Mariah Carey, também
presente na trilha sonora da novela global citada anteriormente. Esse aspecto
reforça a discussão de como a indústria fonográfica, juntamente com a televisão,
50
através das trilhas das novelas, consegue interferir no gosto do ouvinte e influenciar
no consumo desse produto cultural.
É preciso considerar que a trilha sonora, como produto cultural, traz em si mesma, como elemento constitutivo, a capacidade de atingir o espectador/consumidor em condições muito especiais de recepção. Divulgar a música através da cena é uma estratégia que acaba por permitir que seu consumo seja potencializado através de sua associação com personagens e situações propostos por determinado enredo. Propicia, dessa forma, que se realize o que alguns pesquisadores chamam de consumo aleatório, momento no qual se escuta uma canção, o que não é produto direto da escolha do indivíduo (DIAS, 2000, p. 157 apud TOLEDO, 2008)
Não se pode negar que o ouvinte participa e contribui significativamente para
a programação do Ligação Direta. O público da manhã, segundo Santos, é aquele
que gosta de escolher, de mandar recado e essa participação acontece por telefone
(no entanto, sem o ouvinte entrar no ar para fazer o pedido), MSN e, em algumas
vezes, pessoalmente. Os pedidos são, invariavelmente, pelas músicas do momento
e, como o nome diz, são os sucessos que logo passam, que aparecem de época em
época. Em sua maioria essas músicas são de artistas de referência nacional, que
fazem nome no eixo Rio - São Paulo e se espalham por todo país, chegando em
todas as regiões através do rádio e da televisão, sendo exemplos evidentes da forte
relação entre local e global na constituição do nosso universo cultural. A
programação do programa muda um pouco no verão, pois o axé e o pagode tocam
um pouco mais, mas, como explicitado anteriormente, os campeões na lista dos
ouvintes são os artistas chamados novos sertanejos ou sertanejos universitários,
nomes como Edson e Hudson, João Bosco e Vinicius, Hugo Pena e Gabriel, César
Menotti e Fabiano etc, e o forró eletrônico. Os artistas locais não aparecem no
playlist do programa, sendo lembrados apenas com o grupo No Name, de estilo pop,
em outros espaços da emissora e com alguns artistas que tocam forró e arrocha. A
51
música regional, basicamente o forró das bandas Imortal e Menina Faceira, totaliza
apenas 4 % da programação da semana estudada. Chama a atenção também a
pequena presença da música popular no programa, já que em diversos momentos, a
rádio afirma seu papel de educadora e defensora da cultura popular.
Apesar de fazer parte da grade de uma rádio comunitária o Ligação Direta
não apresenta nenhum diferencial em relação às demais atrações das emissoras
comerciais, como por exemplo, não apresenta nenhuma informação adicional a
respeito dos artistas ou músicas, cita apenas o nome da canção e do/a cantor/a.
Dessa forma, o programa traz todas as marcas da indústria do entretenimento
comercial, reproduzindo um modelo no qual o único objetivo é massificar as músicas
e os artistas explorados pela grande mídia.
Por fim, é notável a forte presença da cultura mundializada na programação
matinal da Valente FM. O local se relaciona profundamente com o global, um se
“alimenta” do outro não tornando possível separá-los, distingui-los, impossibilitando
até mesmo identificar qual elemento pertence a cada um. As músicas mais ouvidas
são as mais globalizadas, de artistas de projeção nacional e vindos de culturas de
outras regiões do país, que, por sua vez, se relacionam com culturas de outras
regiões e outros países. A programação musical da Rádio Comunitária Valente FM é
um elo entre a cultura local e a global influenciando no modo como o indivíduo re-
significa o seu meio nesse processo de ir e vir. Essa articulação, proporcionada pela
Rádio, acontece de maneira naturalizada, assim as pessoas reterritorializam o seu
espaço cultural sem se darem conta dessa presença e influência do que é global no
seu dia-a-dia. Isso se reflete no comportamento da comunidade, na valorização e
incorporação da linguagem urbana dentro de um contexto rural, e da própria
expressão da cultura local que é, cada vez mais, penetrada pelo global.
52
Essa relação é tão fluída e integrada que, observando atentamente, pode-se
notar determinados pontos de combinação, como por exemplo, na aceitação que o
público tem das canções da banda local No Name, que segue um estilo pop,
totalmente urbano e mundializado, mas que trazem em suas letras a linguagem
comum dessa região, a pronúncia típica das pessoas desse lugar etc. O mesmo se
dá com o forró, ritmo típico do nordestino, popularizado por Luis Gonzaga, que com
a influência das novas tecnologias e combinações tornou-se eletrônico, no entanto,
não deixou de ser um estilo musical da cultura de quem cresce por esses territórios,
que vive e produz no interior, no meio rural, da seca e dos causos. Até mesmo o
ritmo campeão de escolhas, o sertanejo, que mesmo revestido por novos arranjos,
não só a viola, mas de combinações diversas, de artistas mais jovens e
midiatizados, continua sendo a música popular do homem do interior seja aqui no
nordeste ou no sul do Brasil. A música permite combinar aspectos da cultura popular
local e da cultura mundo, re-significando o território simbólico do sujeito, sem deixá-
lo, contudo, sem identidade, sem a bagagem de tudo que aprendeu e criou.
O rádio e a televisão fazem seu papel: divulgam, massificam, disseminam.
Unem e misturam o que antes estava separado, ligam culturas e incentivam a
criatividade para experimentar produções novas, todavia, não corrompem o homem
na sua essência, não apagam a semente plantada pela sua vivência. Os gostos até
variam, transformam-se, alargam-se, entretanto, o sujeito não deixa para trás quem
foi ou o que fez ao longo da estrada, pelo contrário, ele vai somando experiências,
adquirindo novos conceitos, remodelando outros, evoluindo e re-significando
territórios. A cultura popular é parte integrante do sujeito, por isso segue no mesmo
sentido, vai evoluindo com os contatos que estabelece na jornada, com as
53
novidades que entrecruzam seu caminho. Se reinventa, se remodela, mas nunca
pára, não morre. Se reterritorializa.
54
4. Considerações finais
Uma curiosidade natural pelo universo da música, elemento fluido e híbrido
presente em todas as culturas, foi o que incentivou esse trabalho a estudar as
canções tocadas no rádio, meio de comunicação de ampla penetração e
abrangência, na tentativa de tentar compreender de que forma esse elementos se
entrecruzam e influenciam no cotidiano das pessoas. Assim, o principal objetivo
dessa monografia foi analisar a articulação do local e do global através da
programação musical de uma emissora de rádio, observando os processos de
reterritorialização sofridos pelo indivíduo, refletidos no seu meio cultural.
O território do sisal, reconhecido pela organização da sociedade e civil e pelo
caráter mobilizador do movimento social, é o espaço desse estudo, delimitado no
município de Valente, por este possuir uma emissora comunitária no ar há mais de
onze anos. Desse modo, para melhor alcançar o objetivo proposto nesse trabalho
analisou-se a programação da rádio comunitária Valente FM, 104,9. Essa análise
pautou-se na observação das músicas mais veiculadas pelo programa matinal
Ligação Direta (ouvido durante uma semana), no intuito de compreender de que
maneira os indivíduos deste local têm re-significado seu território cultural a partir
desse elo proporcionado pela emissora, entre o local e o global.
É preciso ressaltar que para se entender e identificar melhor essa relação foi
necessário dialogar com diversos autores e estudiosos de temas como
desreterritorialização, reterritorialização, local e global, e com pesquisadores da
cultua popular. Esses diálogos proporcionaram uma maior percepção da dinâmica
desses processos, assim como ajudaram a perceber os diversos caminhos que o
55
sujeito percorre na construção e produção de seu território simbólico. Buscou-se
ainda discutir com estudiosos sobre rádio comunitária, assunto fundamental para
realização deste trabalho.
Esta é a era da modernidade, na qual a globalização, ferramenta fundamental
do sistema capitalista, é uma impositora das relações existentes entre territórios e
sujeitos. Fluida e constante, a globalização atravessa fronteiras e permite que
universos distintos e distantes se conectem e se relacionem, proporcionando uma
troca de fluxos que interferem em todos os campos de cada sociedade,
principalmente no campo complexo da cultura.
Culturas antes isoladas, que mantinham pouco contato com o “mundo
externo”, começam a se relacionar e interagir com outras culturas. Esse processo
acaba por interferir no modo pelo qual cada sociedade passa a vivenciar suas
experiências e produções culturais. Os territórios particulares são penetrados por
diversos elementos globais que se misturam e são absorvidos no cotidiano das
pessoas destes territórios. O resultado desse fluxo entre o local e o global é uma
cultura híbrida, mundializada.
Os meios de comunicação são importantes aliados da globalização,
permitindo que mundos antes separados possam se relacionar. O rádio, pioneiro
nesse trabalho, a televisão e, mais atualmente, a internet tem exercido um papel
fundamental nessa diluição de limites e interferência na re-significação do território
simbólico do ser humano. Atendo-se ao rádio, é possível identificar rapidamente o
que o torna tão eficaz nesse processo: é dinâmico, envolvente, abrangente,
alcançando lugares remotos e de difícil acesso. Além disso, esse meio de
comunicação mantém uma relação „íntima‟ com a música, produto cultural presente
56
em toda e qualquer sociedade. O objeto de estudo dessa monografia, a
programação musical do programa Ligação Direta da Valente FM, demonstra
claramente o poder do rádio em interferir no gosto particular de cada pessoal e
evidencia a significativa participação do rádio na relação entre o local e o global. Até
mesmo no interior da Bahia, como é o caso da cidade de Valente, esses vínculos se
tornam perceptíveis observando-se as músicas pedidas pelos ouvintes durante o
programa. Em sua grande maioria, são os sucessos do momento, de artistas de
referência nacional e internacional. A rádio comunitária que poderia e deveria
exercer um papel de incentivadora da música popular, das produções local e
regional, acaba por reproduzir modelos de emissoras comerciais que seguem a
cartilha da indústria fonográfica, massificando os ritmos e artistas explorados pela
grande mídia. Outro importante fator que contribui para essa apropriação e
valorização dessa cultura nacional/global é a influência da televisão, que através das
trilhas sonoras das populares novelas, populariza determinadas canções e interfere
no gosto e apreciação do indivíduo, levando a fazer escolhas induzidas por
estratégias mercadológicas sem nem mesmo se dar conta dessa manipulação.
Embora possa se dizer que exista manipulação e persuasão sobre as ações
do sujeito, é impossível não perceber os processos de desterritorialização e
reterritorialização vivenciados a partir dessa relação híbrida entre local e global. O
homem, em contato com o novo, desterritorializa-se, sai de seu universo particular
para conhecer e experimentar outras vivências, para, em seguida, retornar a esse
seu território simbólico trazendo um novo olhar, novas formas de produzir e atuar.
Essa é a reterritorialização, a conjunção entre os aprendizados que o homem já
carrega e os novos saberes adquiridos ao desterritorializar-se.
57
O universo cultural, por ser naturalmente fluido e ativo, é o espaço mais
propício para que esses processos aconteçam. A cultura não está fadada a morrer,
a ter um fim. Muito pelo contrário, está sempre em mudança, fluindo, se
remodelando. E isso se dá devido à capacidade que o ser humano tem de interagir
com seu território, reconhecê-lo e a partir do contato e experiência com o outro,
significá-lo. Sem dúvida, são os processos de desterritorialização, territorialização e
reterritorialização, constantes na vida do ser humano, que permitem e proporcionam
essa complexa e excitante re-significação do nosso próprio mundo.
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REFERÊNCIAS:
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ANEXOS Programação da Valente FM Programa Ligação Direta 8:00 às 11:30 Período de observação: 16 a 20 de novembro de 2009 16/11 Leonardo - Esse Alguém sou Eu Edu e Maraial - Telefone Fora de Área Maria Cecília e Rodolfo - Você de Volta Desejo de Menina - Na Dor e no Prazer Frejat – Segredos Forró Sacode 2007 - Não Desliga o Telefone Tomate - Cuida de Mim Belo - Reinventar Carla Cristina - Timidez Skank - Dois Rios Limão com MeL - O Espetáculo Aviões do Forró - Tarde Demais Beyonce - Halo Cheiro de Amor - Pense em Mim Dejavu – Novo amor Edson e Hudson - Foi Você Quem Trouxe Bruno e Marrone - Amor não Vai Faltar Amor de Cinema - Beijo de Cinema Guilherme e Santiago - Quando Você vem me Abraçar Calcinha Preta - Como fui me Apaixonar Eduardo Costa - Não Valeu Pra Você Jorge e Matheus - Um dia Te Levo Comigo Jammil - Tchau I Have to go Now Harmonia do Samba - batida de Rua Hugo Pena e Gabriel - Cigana Anjo Azul - Não Sou de Ninguém Lulu Santos - Baby de Bailon Jota Quest - Vem Andar Comigo Menina Faceira - Sucesso Natália Siqueira - Você vai Voltar pra Mim Myllena - Quando Michel Telo - Ei Psiu, Beijo, Me liga Molejo - Voltei Mariah Carey - I Wanna Know What Love is Banda Imortal - Mentes tão Bem Jorge e Matheus – Tem nada a ver Silvano Salles - Acabou o Amor Papas na Língua - Vem pra Cá Sociedade do Samba e Perlla - No Rádio _________________________________________________ 17/11
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Jorge e Matheus - Um dia Te Levo Comigo Daniel - Amor Absurdo Wanessa Camargo - Não estou Pronta Pra Perdoar Rick E Rener - Credencial Alexandre Pires - Eva Meu Amor Engenheiros do Hawai - Até o Fim Mariah Carey - I Wanna know what Love is Capital Incial - Não Olhe Pra Trás Ana Carolina - Rosas Tomate - Cuida de Mim 50- Silvano Sales - Você Brincou de Amar Sociedade do Samba e Perlla - No Rádio Louro Santos - Retrato Skank - Sutilmente Aviões do Forró - Tarde Demais Adão Negro - Anjo Bom Sorriso Maroto - Revelação Amor de Cinema - Castelo de Areia Cláudia Leite - Horizonte Carlos E Jader - Cala a Boca e me Beija Cheiro de Amor - Pense em Mim Calcinha Preta - Como fui Me Apaixonar Bruno e Marrone - Amor não Vai Faltar César Menotti e Fabiano - Caso por Acaso Belo - Reinventar Harmonia do Samba - Meu Jeito Banda Imortal - Mentes tão Bem Ivete Sangalo e Aviões do Forró - Sintonia e Desejo Hugo Pena e Gabriel - Cigana Jota Quest - Seis e Trinta Edson e Hudson - Foi Você quem Trouxe Molejo - Voltei Noda de Cajú - Miragem no Deserto Natália Siqueira - Você vai Voltar pra Mim Papas na Língua - Vem pra Cá Perlla - Beijo de Cinema _____________________________________________________ 18/11 Ivete Sangalo - Ilumina Jeito Moleque - Sem Radar Fábio JR - Anjo Paula Toler - Meu Amor se Mudou pra Lua Limão com Mel - Metade da Metade Daniel - Me joguei no Chão Skank - Sutilmente Tomate - Cuida de Mim Tânia Mara e Alexandre Pires - Não me Ame Sorriso Maroto - Nada de Pensar em Despedida Rosa de Saron - Do Alto da Pedra
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Victor e Léo - Sem Trânsito, Sem Avião Papas na Língua - Vem pra Cá Pixote - Insegurança Menina Faceira - Levada do Pisomar Perlla - Beijo de Cinema Natália Siqueira - Você vai Voltar pra Mim Myllena - Quando Silvano Salles - Você Brincou de Amar Sociedade do Samba e Perlla - No Rádio Molejo - Voltei Banda Imortal - Mentes tão Bem Mariah Carey - I Wanna know what Love is Michel Telo - Ei Psiu, Beijo, Me liga Sorrio Maroto e Ivete Sangalo - E agora Nós Guilherme e Santiago - Quando Você vem me abraçar Harmonia do Samba - Meu Jeito Edson e Hudson - Foi Você Quem Trouxe Engenheiros do Hawai - Até o Fim Claudia Leite- Horizonte Cheiro de Armor - Pense em Mim Calcinha Preta - Como Fui me Apaixonar Jota Quest - Seis e Trinta Jorge e Matheus - Mistérios Hugo Pena e Gabriel - Cigana Belo - Perfume Aviões do Forró - Tarde Demais Carlos E Jader - Cala a Boca e me Beija Chiclete com Banana - Flutuar Bruno e Marrone - Amor não Vai Faltar César Menotti e Fabiano - Caso por Acaso Colbi Caillat - Fallin For you _____________________________________________ 19/11 Alexandre Pires - Eva Meu Amor Gian e Giovane - Dou a Cara pra bater Edu e Maraial - Telefone Fora de Área Maskavo - Anjo do Céu Exalta Samba - Livre pra Voar Banda Nechivile - Pode Chorar Leonardo - Esse Alguém sou Eu Cavaleiros do Forró - Umbrella Michel Telo - Ei Psiu, Beijo, Me liga Tomate - Cuida de Mim Asa de Águia - Além Mar - Part. Ivete Sangalo Natália Siqueira - Você vai Voltar pra Mim Zezé de Camargo e Luciano - Faça Alguma Coisa Marcelinho de Lima e Camargo - Pago pra Ver Aviões do Forró - Corra corra Bruno e Marrone - Amor não Vai Faltar
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Cheiro de Amor - Pense em Mim Frejat - Segredos Cláudia Leite - Horizonte Belo - Reinventar Amor de Cinema - Beijo de Cinema Eduardo Costa - Não Valeu Pra Você João Bosco e Vinicius - Curtição Jota Quest - Vem Andar Comigo Menina Faceira - Sucesso Mariah Carey - I Wanna know what Love is Edson e Hudson - Foi Você Quem Trouxe Guilherme e Santiago - Quando Você vem me Abraçar Molejo - Voltei Anjo Azul - Não Sou de Ninguém Sorriso Maroto e Ivete Sangalo - E agora Nós Myllena - Quando Jorge E Matheus - Mistérios Psirico - Panhadinha do Papai Perlla - Beijo de Cinema Harmonia do Samba - batida de Rua Silvano Salles - Acabou o Amor Pixote - Insegurança Papas na Língua - Vem pra Cá ________________________________________________ 20/11 Alexandre Pires - Pode Chorar Terra Samba - Calafrio Banda Nechivile - Enquanto o Sol Brilhar Araketu - Incendeia Asa de Águia - OOÔ Camila Vitorino - A Camisa e Botão Cavaleiros do Forró - Umbrella Skank - Sutilmente Anjo Azul - Não Sou de Ninguém Silvano Sales - Você Brincou de Amar Tânia Mara e Alexandre Pires - Não me Ame Papas na Língua - Vem pra Cá Tomate - Balança e Papa Psirico - Panhadinha do Papai Rapazola - Vem de Salvador Netinho - Holiday Papas na Língua - Vem pra Cá Michel Telo - Ei Psiu, Beijo, Me liga Banda Imortal - Mentes tão Bem Perlla - Beijo de Cinema Menina Faceira - Levada do Pisomar No Estylo - Caguete Ivete Sangalo e Aviões do Forró - Sintonia e Desejo Jammil - Tchau I Have to go Now
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É Xeke - Cavalinho Sociedade do Samba e Perlla - No Rádio Jorge e Matheus - Um dia te Levo Comigo João Bosco e Vinicius - Curtição Exalta Samba - Fui Eu Sorriso Maroto e Ivete Sangalo - E agora Nós Harmonia do Samba - Meu Jeito Belo - Reinventar Guilherme e Santiago - Quando Você vem me Abraçar Chiclete com Banana - Flutuar Carla Cristina - Timidez Edson e Hudson - Foi Você Quem Trouxe Aviões do Forró - Corra corra Calcinha Preta - Como fui me Apaixonar Cheiro de Amor - Pense em Mim