covid-19 e relações de trabalho · em qualquer modalidade não está sujeito ao capítulo de...
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COVID-19 e
Relações de Trabalho
MP 927/20 Prof. André Dorster
@prof.andre.dorster
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INTRODUÇÃO AO TEMA
O governo federal, por meio do Decreto Legislativo, nº 6, de 20/03/2020, reconheceu
o estado de calamidade pública, como reflexo da emergência de saúde de importância
internacional decorrente do COVID-19.
Para regulamentar a temática trabalhista para este contexto, há dois atos normativos
principais: Lei 13.979/20 e Medida Provisória 927/20.
Na seara trabalhista, a lei 13.979/20 preceitua que ausências ao trabalho em razão de
isolamento, quarentena, realização compulsória de exames/testes, restrições de locomoção e
requisição de bens e serviços (por exemplo, estabelecimento empresarial), são justificadas.
Por sua vez, a MP 927/20 foca-se em ferramentas de flexibilização das normas
trabalhistas destinadas a equalizar a tensão entre capital e trabalho neste contexto de crise.
A par destes normativos editados especificamente para o momento, a CF e a CLT
tratam de institutos que podem ser úteis à solução da crise social e econômica vivenciada
pelos brasileiros no contexto da pandemia.
Aqui nos focaremos, portanto, na análise dos principais institutos aplicáveis para
o momento atual (previstos na CF, na CLT e na MP 927/20).
Especificamente quanto à MP, importante registrar uma premissa importante e que
deve nortear a interpretação dos institutos que nela são tratados: preponderância de
acordo individual escrito (entre empregado e empregador) sobre os instrumentos
normativos, legais e negociais, respeitados os limites fixados pela Constituição Federal
(art. 2º da MP).
Além disso, ainda quanto à MP 927, esta deixa certo que os institutos nela tratados se
aplicam aos trabalhadores terceirizados (lei 6.019/74), rurícolas e domésticos (naquilo em que
os institutos forem compatíveis com estes empregados: jornada, banco de horas e férias).
TELETRABALHO E HOME OFFICE
Teletrabalho e home office são figuras muito próximas, mas que possuem algumas
distinções.
O teletrabalho é aquele realizado à distância, fora do estabelecimento físico do
empregador e por meio de instrumentos telemáticos de comunicação (computadores,
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telefones, smartphones, etc.), como conceitua o art. 75-B. Ou seja, o teletrabalho pode se dar
em casa, ou em outro local qualquer, desde que preponderantemente fora do
empregador e com uso de instrumentos telemáticos.
Por sua vez, o home office necessariamente é realizado na casa do empregado,
podendo se dar em duas modalidades: (i) trabalho em domicílio, conforme art. 6º da CLT,
sem o uso de ferramentas telemáticas (ex. costureiras trabalhando em domicílio); ou (ii)
teletrabalho (com uso de meios telemáticos – arts. 75-A e seguintes da CLT).
Quanto ao trabalho em domicílio, não há exigências legais específicas, de modo que,
este pode ser adotado de plano e sem maiores formalidades específicas (em que pese
recomendável a formalização da alteração de regime e responsabilidade por eventuais
equipamentos que fiquem em posse do empregado).
Por sua vez, o teletrabalho (em home office ou outro local), segundo regramento da
CLT é cercado de formalidades legais específicas. Logo, para converter o trabalhador do
labor presencial para o teletrabalho exige-se: (i) aditivo contratual (com indicação das
atividades que serão desempenhadas pelo empregado); (ii) mútuo acordo formalizado no
aditivo contratual; (iii) previsão em contrato escrito sobre as formalidades relativas à
aquisição, manutenção ou fornecimento dos equipamentos tecnológicos e infraestrutura
necessária e adequada à prestação do trabalho; (iv) previsão em contrato acerca do
reembolso das despesas arcadas pelo empregado para fins de exercício do teletrabalho; e (v)
termo de orientações assinado pelo empregado em que o empregador deverá prestar
orientações sobre precauções a fim de evitar doenças e acidentes de trabalho.
A MP 927/20, por sua vez, mitiga estas formalidades, no período de calamidade
pública, e traz as seguintes peculiaridades:
Alteração do regime presencial para qualquer tipo de trabalho à distância
(teletrabalho, home office, trabalho em domicílio, etc.) por decisão unilateral
do empregador (caput do art. 4º)
Notificação por escrito (pode ser eletrônica) ao empregado com antecedência
de no mínimo 48 horas
A responsabilidade pela aquisição, manutenção ou fornecimento de
equipamentos e infraestrutura para a prestação do trabalho deve ser regrado
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por contrato escrito firmado previamente ou em até 30 dias da mudança do
regime
O empregador pode fornecer equipamentos em regime de comodato e pagar
serviços de infraestrutura (por ex. internet, telefonia), sendo certo que tais
verbas não terão natureza salarial;
É permitido o teletrabalho para estagiários e aprendizes;
Uso de aplicativos ou programas de comunicação fora da jornada normal de
trabalho não constitui tempo à disposição, prontidão ou sobreaviso, salvo
ajuste diverso no acordo individual ou coletivo firmado.
O teletrabalho com uso de ferramentas de comunicação à distância não
implicam em trabalho equivalente ao de teleatendimento e telemarketing, não
se aplicando, portanto, o regramento diferenciado destes quanto a jornada
(art. 33 da MP).
Quanto a este último ponto, interessante notar que via de regra o trabalho à distância
em qualquer modalidade não está sujeito ao capítulo de duração do trabalho (art. 62, III, da
CLT), mas a doutrina costuma indicar que se houver fiscalização efetiva dos horários, o
empregado pode fazer jus a eventuais horas extras praticadas. Logo, temos uma situação
paradoxal na MP e que talvez mereça uma interpretação restritiva, qual seja, o mero uso de
aplicativos e meios de comunicação não constitui tempo à disposição, contudo, se
efetivamente houver trabalho suplementar e houver este controle pelo empregador, haverá
direito a horas extras.
FÉRIAS INDIVIDUAIS
A concessão de férias no contexto de pandemia sempre foi bastante polêmico,
notadamente por desvirtuar o escopo do instituto: lazer, descanso e convívio social do
trabalhador fora do ambiente laboral.
De todo modo, parcela significativa dos estudiosos defendia a concessão de férias
como alternativa no contexto de pandemia, até porque, o art. 136 da CLT prevê que as férias
são concedidas na época que melhor consulte os interesses do empregador.
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Ocorre que, a concessão de férias individuais, à luz da disciplina da CLT exige algumas
formalidades especiais, como: (i) comunicação ao empregado com antecedência de, no
mínimo, 30 dias; (ii) pagamento das férias até dois dias antes do gozo das férias (art. 145 da
CLT); e (iii) concessão das férias após completado o período aquisitivo respectivo.
Além disso, no regramento celetista o empregado tem a prerrogativa de conversão
de 1/3 das férias em abono pecuniário.
A MP 927/20 flexibiliza bastante a questão, permitindo a antecipação de férias no
período de calamidade pública, ainda que não completado o período aquisitivo (art. 6º, II)
desde que:
Seja comunicada a antecipação com no mínimo 48 horas de antecedência;
Comunicação por escrito (pode ser meio eletrônico) com indicação do período
de gozo;
Sejam concedidos no mínimo 5 dias corridos.
O terço de férias poderá ser pago após a concessão das férias, até a data fatal
de pagamento da gratificação natalina, qual seja, 20/12/2020 (art. 8º).
A conversão de parte das férias em abono pecuniário estará sujeita a
concordância do empregador e poderão ser pagas até o dia 20/12/2020 (art.
8º, parágrafo único).
Pagamento das férias até o 5º dia útil do mês subsequente ao início do gozo
das férias.
Caso haja dispensa do empregado, eventuais valores de férias não quitados
deverão ser pagos com o restante das verbas rescisórias.
A MP determina, ainda, que os trabalhadores que pertençam ao grupo de risco do
COVID-19 sejam priorizados para gozo de férias (individuais ou coletivas).
Quanto aos profissionais da área da saúde ou aqueles que desempenhem funções
essenciais, o empregador poderá suspender as férias ou licenças não remuneradas, desde
que o faça por escrito (inclusive meio eletrônico), com antecedência de 48 horas.
FÉRIAS COLETIVAS
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A concessão de férias no contexto de pandemia sempre foi bastante polêmico,
notadamente por desvirtuar o escopo do instituto: lazer, descanso e convívio social do
trabalhador fora do ambiente laboral.
De todo modo, parcela significativa dos estudiosos defendia a concessão de férias
como alternativa no contexto de pandemia, até porque, o art. 136 da CLT prevê que as férias
são concedidas na época que melhor consulte os interesses do empregador.
Especificamente quanto às férias coletivas, o regramento da CLT apresentava alguns
óbices práticos importantes à sua concessão: (i) pagamento até dois dias antes do início de
seu gozo (art. 145 da CLT); e (ii) comunicação ao órgão local da Secretaria Especial de
Previdência e Trabalho (antigo MTE) e aos sindicatos representativos das categorias
profissionais 15 dias antes do início das férias.
A MP 927/20 flexibiliza bastante a questão, primeiro, deixando claro que é possível
a concessão de férias no contexto de calamidade pública, observado:
Comunicação do conjunto de empregados afetados (as férias coletivas podem
ser de um setor, portanto) com antecedência de no mínimo 48 horas;
Não há necessidade de comunicação à Secretaria Especial de Previdência e
Trabalho nem os sindicatos da categoria
Podem ser concedidos mais do que dois períodos de férias coletivas por ano
(diferentemente do que dispõe o art. 139, § 1º da CLT);
Podem ser concedidos períodos de férias inferiores a 10 dias (parece-nos,
contudo, que deve ser concedido período de no mínimo 5 dias, por coerência
ao que a própria MP dispõe sobre as férias individuais – art. 6º, § 1º, I)
Continua sendo possível conceder-se férias coletivas aos empregados que não
tenham completado o período aquisitivo, por força do art. 140 da CLT.
Findas as férias coletivas, inicia-se novo período aquisitivo (art. 140 da CLT)
As regras quanto a pagamentos serão, no nosso sentir, as mesmas das férias
individuais previstas na MP 927/20.
LICENÇA REMUNERADA
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Outra ferramenta legalmente prevista é a concessão de licença remunerada. Neste
caso, o empregador mantém o pagamento de salários, pelo período de afastamento do
trabalhador, interrompendo o contrato de trabalho pelo período que se fizer necessário.
A MP 927/20 não trata desta hipótese, logo, nossas considerações são pautadas
no texto celetista.
Nesta hipótese, caso a licença supere 30 dias, o empregado perde o direito as férias
(art. 133 II, da CLT), sendo certo que, cessado o período de licença, iniciar-se-á novo período
aquisitivo de férias ao empregado (art. 133, § 2º, da CLT).
Além disto, o art. 61, § 1º, da CLT autoriza que nos casos de interrupção do trabalho
por causas acidentais ou por força maior (caso da COVID-19) seja exigida a prorrogação da
duração normal do trabalho até o limite de 2 horas diária, durante o número de dias
indispensáveis à recuperação do tempo perdido, observado o limite de 10 horas diárias e 45
dias por ano, sempre com autorização da autoridade competente.
Registre-se, contudo, que estas horas suplementares não são isentas do pagamento
do adicional de 50% preceituado no texto constitucional (art. 7º, XVI). Neste sentido entende
a doutrina majoritária, ao exemplo de Maurício Godinho Delgado1, José Eduardo Duarte
Saad2, Amauri Mascaro Nascimento3, Mozart Victor Russomano4, Sérgio Pinto Martins5 e
Augusto César Leite de Carvalho6.
Em contraponto, por se tratar de situação de interrupção contratual, ficará vedada a
dispensa do empregado sem justa causa durante o período de licença, por força do que
dispõe o art. 471 da CLT e o entendimento doutrinário dominante7.
APROVEITAMENTO E ANTECIPAÇÃO DE FERIADOS
1 DELGADO, Maurício Godinho. Op. cit., p. 1096.
2 SAAD, José Eduardo Duarte e BRANCO, Ana Maria Saad Castello. Consolidação das Leis do Trabalho
Comentada. 49ª Ed., LTr, São Paulo: 2016, p. 196.
3 NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Curso de Direito do Trabalho. 20ª Ed., São Paulo: Saraiva, 2005, p. 843-844.
4 RUSSOMANO, Mozart Victor. Curso de Direito Do Trabalho. 7ª Ed., Curitiba: Juruá, 1999, p. 304.
5 MARTINS, Sérgio Pinto. Direito do Trabalho. 13ª Ed., São Paulo: LTr, 2001, p. 460.
6 CARVALHO, Augusto César Leite. Direito do Trabalho: Curso e Discurso. 2ª Ed., São Paulo: LTr, 2018, p. 285.
7 DELGADO, Maurício Godinho. Op. cit., p. 1068
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Tal medida é absolutamente nova, prevista na MP 927/20. Segundo o art. 13 de
referida norma, durante o período de calamidade pública os empregadores poderão
antecipar (por ato unilateral) o gozo de feriados não religiosos federais, estaduais, distritais
e municipais. Para tanto deverá o empregador:
Notificar por escrito (pode ser meio eletrônico) os empregados beneficiados
com antecedência de no mínimo 48h;
Indicação expressa dos feriados aproveitados;
Os feriados poderão ser utilizados para compensação do saldo em banco de
horas;
O aproveitamento de feriados religiosos dependerá de concordância expressa do
empregado em acordo individual escrito.
BANCO DE HORAS
O Banco de Horas foi concebido numa tendência flexibilizante da década de 1990,
instituído pela Lei 9.601/98, com alterações implementadas via medida provisória (2.164-
41/01).
Pelo texto pré-reforma, somente seria possível o ajuste de Banco de Horas por meio
de negociação coletiva, de modo que o excesso de horas num dia fosse compensado pela
diminuição noutro dia, dentro do módulo de um ano. A expressão Banco de Horas, portanto,
carrega carga semântica bastante elucidativa, porquanto deixa claro que o sistema de
compensação funciona como um banco, com créditos e débitos de horas.
A Lei 13.467/17, contudo, ampliou a possibilidade do manejo do instituto ao prever
no novo § 5º o ajuste individual escrito para fins de compensação, com a única ressalva de
que neste caso o módulo de compensação é de seis meses.
Atualmente, na CLT existem duas figuras concorrentes na temática, o chamado
Banco de Horas Coletivo, já conhecido e que consiste num sistema de compensação pelo
módulo anual, e o novel Banco de Horas Individual, em que há ajuste individual formal, por
escrito, entre trabalhador e empregador, num sistema de compensação semestral.
Interessante notar que o que difere o Banco de Horas Individual de um acordo de
compensação comum, é que naquele exige-se ajuste formal, por escrito, e com prazo de
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compensação de seis meses, ao passo que este pode se dar de forma tácita (sem ajuste
formal) e deve respeitar o módulo mês.
Em qualquer modalidade de Banco de Horas, caso não realizada a compensação das
horas dentro dos prazos máximos (seis meses e um ano, respectivamente), o trabalhador fará
jus ao pagamento como extraordinárias das horas suplementares não compensadas (§ 3º, do
art. 59).
Atenta a esta utilidade do Banco de Horas como forma de equalizar as tensões capital
trabalho, a MP 927/20 flexibilizou alguns aspectos polêmicos para o contexto de
calamidade pública, permitindo a constituição de regime especial de compensação de
jornada, com as seguintes particularidades:
Instituição por acordo coletivo ou individual formal;
Compensação no prazo de até 18 meses contados do encerramento do estado
de calamidade pública;
A compensação de tempo para recuperação do período de sustação das
atividades poderá ser feita mediante a prorrogação de jornada em até duas
horas por dia e não pode exceder o limite de trabalho de 10 horas por dia no
total;
A compensação pode ser determinada independentemente de anuência do
empregado ou negociação coletiva.
A norma fala em banco de horas em favor do empregador ou do empregado, o
que nos leva a crer que abre margem para instituição do banco de horas
negativo.
REDUÇÃO SALARIAL
A Constituição Federal prevê, excepcionalmente, a redução salarial, desde que
pactuada por meio de negociação coletiva (Acordo Coletivo de Trabalho ou Convenção
Coletiva de Trabalho - art. 7º, VI).
Logo, entendemos que, a despeito da previsão do art. 503 da CLT (que prevê a
possibilidade, sem a exigência de negociação coletiva, de redução salarial em até 25% em
caso de força maior ou prejuízos devidamente comprovados), faz-se sempre imperiosa a
existência de negociação coletiva para validar qualquer tipo de redução salarial.
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Com efeito, parece-nos que o art. 503 em questão, na parte em que autoriza redução
salarial de forma unilateral, não foi recepcionado pela Constituição Federal de 19888.
Ademais, fato é que a própria jurisprudência já manifestou entendimento acerca de
revogação tácita do art. 503 da CLT por meio da lei 4.923/65, que é posterior ao texto
originário da CLT e teria passado a exigir negociação coletiva para a redução salarial (vide RR
1156-96.2011.5.04.0811)9.
Por fim, importante consignar que nas negociações coletivas que visem redução
salarial se faz indispensável observar o disposto no art. 611-A, § 3º da CLT, ou seja, a
existência de cláusula destinada à proteção dos empregados contra dispensa imotivada
durante o prazo de vigência do instrumento coletivo.
LAY OFF
Originalmente o Lay Off é previsto no art. 476-A da CLT e consiste na suspensão do
contrato de trabalho por um período de dois a cinco meses (pode haver prorrogação desde
que observados os demais requisitos legais) para a participação do empregado em curso ou
programa de qualificação profissional oferecido (custeado) pelo empregador (o curso deve
ter duração equivalente ao da suspensão contratual).
Segundo o texto celetista, haveria uma série de requisitos legais e restrições: (i)
sustação da prestação de serviços; (ii) previsão em negociação coletiva; (iii) anuência formal
(por escrito) do empregado e o empregador deverá notificar o sindicato respectivo com
antecedência de 15 dias antes da suspensão; (iv) vedação à dispensa durante a suspensão
contratual e até três meses após o seu término, sob pena de multa (equivalente a no mínimo
100% da última remuneração antes da suspensão, observado o disposto em negociação
coletiva); e (v) vedação à concessão de novo Lay Off no período de 16 meses.
O texto da MP, muito mais flexível, trata do Lay Off no art. 18 (Capítulo VIII – Do
Direcionamento do Trabalhador para Qualificação). Preceitua em breves linhas:
Suspensão de até 4 meses, durante o período de calamidade pública;
8 DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 7ª Ed., LTr, São Paulo: 2008, p. 756
9 MIZIARA, Raphael. Em razão da COVID-19, é lícita a redução geral dos salários dos empregados da empresa,
conforme autoriza o art. 503 da CLT? In Os Trabalhistas. Disponível em: < http://ostrabalhistas.com.br/em-
razao-da-covid-19-e-licita-a-reducao-geral-dos-salarios-dos-empregados-da-empresa-conforme-autoriza-o-art-
503-da-clt/> Acesso em 21/03/2020.
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Ajuste por acordo individual (ou com o grupo de empregados – não depende
de negociação coletiva)
Registro da suspensão em CTPS;
Oferecimento de curso ou programa de qualificação profissional;
o Curso não presencial
o Oferecido pelo empregador ou por terceiros
o Com duração equivalente à da suspensão contratual
Pagamento facultativo de ajuda compensatória mensal, sem natureza salarial,
com valor mínimo definido direta e livremente entre empregado e
empregador por acordo individual;
Direito a benefícios voluntariamente concedidos pelo empregador (cestas
básicas, plano de saúde, etc.). Os benefícios não integrarão o contrato de
trabalho;
O não fornecimento de curso de qualificação, ou a exigência de trabalho no período
de Lay Off implicará na ilegalidade da suspensão contratual e sujeitará o empregador ao
pagamento dos salários e encargos sociais do período, bem como penalidades legais e
sanções previstas em negociações coletivas da categoria.
Importante registrar, ao final, que há indicativo de que o Presidente da
República irá editar nova MP revogando o art. 18 da MP 927/20. Caso isto ocorra, o
regramento de Lay Off será aquele mais restritivo previsto na CLT.
SUSPENSÃO CONTRATUAL EM VIRTUDE DE FORÇA MAIOR
Parte da doutrina defende a possibilidade de suspensão contratual por motivo alheio
à vontade obreira para as situações de força maior10.
Não nos parece, contudo, conduta segura a se adotar por decisão unilateral patronal,
na medida em que não há previsão legal expressa autorizando este tipo de suspensão.
Entendemos ser indispensável negociação coletiva para os trabalhadores em geral,
hipótese em que por força do art. 7º, XXVI, da Constituição Federal, o negociado
coletivamente deve prevalecer. A negociação individual parece-nos muito questionável, dada
10 DELGADO, Maurício Godinho. Op. cit., p. 1059
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a situação de vulnerabilidade dos trabalhadores em geral, ressalvada a situação peculiar
daqueles chamados de empregados hipersuficientes (art. 444, parágrafo único da CLT).
RECOLHIMENTO DIFERIDO DO FGTS
Como forma de reduzir momentaneamente os encargos trabalhistas, a MP 927/20
autorizou o pagamento diferido das competências do FGTS de março, abril e maio de 2020,
sendo certo que tais competências poderão ser pagas de forma parcelada, em até seis vezes,
a partir de julho de 2020, sem atualização e multa.
O benefício se estende a todos os empregadores, independentemente do número de
empregados, regime de tributação e atividade econômica. Não se exige adesão prévia ao
regime de recolhimento diferido, bastando ao empregador declarar as informações
necessárias ao recolhimento diferido até 20/06/2020.
O atraso no pagamento diferido implicará em multa e encargos de atualização nos
termos do art. 22 da lei do FGTS (8.036/90).
A rescisão do contrato de trabalho no curso deste período diferido obriga o
empregador ao recolhimento no prazo legal para pagamento do FGTS e indenização de 40%.
Por fim, a MP determina a suspensão do prazo prescricional dos débitos do FGTS por
120 dias, a partir da entrada em vigor da MPT.
PRORROGAÇÃO DE JORNADA E ESCALAS SUPLEMENTARES PARA PROFISSIONAIS DA
SAÚDE
Considerada a situação crítica da pandemia, a MP 927/20 permite aos empregadores,
mediante acordo individual escrito:
Prorrogar a jornada de trabalho;
Adotar escalas de horas suplementares no período de intervalo interjornada
(entre a 13ª e 24ª hora do intervalo), assegurado RSR
As horas suplementares poderão ser compensadas no prazo de 18 meses do
encerramento da calamidade pública, por meio de banco de horas (para as
empresas que não o adotem, serão pagas como horas extras no mesmo
prazo).
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Tais medidas não se restringem a médicos e enfermeiros, mas para quaisquer
empregados em “estabelecimentos de saúde”.
Tais medidas são possíveis mesmo para trabalhadores que já praticam a escala 12x36
e trabalhadores em ambientes insalubres.
DISPENSA SEM JUSTA CAUSA
Por fim, importante registrar que não há, prima facie, impeditivo legal à dispensa de
empregados sem justa causa, mesmo que de forma coletiva (art. 477-A da CLT11). Isto,
obviamente, se os trabalhadores dispensados não se enquadrarem em hipóteses que
impeçam a ruptura imotivada, por exemplo: interrupção/suspensão contratual; garantias de
emprego em geral (gestante, acidentária, etc.); restrições à dispensa previstas em negociação
coletiva; dentre outras.
Importante ressaltar que, o art. 502 da CLT prevê o pagamento de indenização pela
metade para a ruptura dos contratos por prazo indeterminado em razão de força maior. Tal
dispositivo, contudo, deve ser interpretado adequadamente, já que concebido à luz da
estabilidade decenal (figura extinta com a adoção compulsória do regime do FGTS pela
Constituição Federal de 1988). Logo, o art. 502 não autoriza o pagamento pela metade das
rescisórias em geral, mas tão somente da indenização de 40% do FGTS, inclusive, por força
de imperativo legal específico da lei 8.036/90 (art. 18, § 2º).
De igual modo, quanto aos contratos a termo, o art. 502, III, autoriza o pagamento
pela metade da indenização do art. 479 da CLT, sendo devidas as demais rescisórias cabíveis
à ruptura dos contratos a termo.
Por fim, ressaltamos que a ruptura contratual mostra-se como uma solução pouco
salutar sob o viés coletivo, inclusive econômico.
CONVALIDAÇÃO DE MEDIDAS ADOTADAS ANTES DO ADVENTO DA MP
Por fim, importante registrar que a MP 927/20 prevê que medidas adotadas pelos
empregadores anteriormente ao advento da MP e que não contrariem o que ela dispõe (por
exemplo, concessão de férias sem observância dos requisitos rígidos da CLT ou instituição de
11 Importante ressalvar que há parcela da doutrina que defende a inviabilidade das dispensas
coletivas/plúrimas mesmo na vigência do art. 477-A da CLT à luz de uma interpretação constitucional.
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teletrabalho sem observância dos prazos e aditivos legais previstos na CLT) serão
consideradas convalidadas (art. 36).
Logo, para aqueles empregadores que já vinham adotando medidas alternativas para
manutenção de empregos, mesmo que sem respeitar todas as formalidades da CLT, caso a
situação se amoldes às previsões da MP 927/20, a situação restará convalidada, eliminando-
se qualquer vício.
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