ad hoc para julgar os vencidos de guerra...

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1 TRIBUNAL INTERNACIONAL PENAL PEDRO WILSON BUGARIB Promotor de Justiça e Professor de Direito Penal da PUC-SP Diante das barbáries das Guerras Mundiais, especialmente a 2ª Grande Guerra quando milhares de mulheres, crianças e homens foram cruelmente dizimadas, e das inúmeras violações aos direitos humanos fundamentais por governos tirânicos, como foi o caso da Bósnia, Ruanda, Chechênia, Timor Leste e outras mais, e, notadamente, a inviabilidade da constituição de Tribunais ad hoc para julgar os vencidos de guerra (Nuremberg, Tóquio, Ruanda, Bósnia, etc), impôs-se, de maneira vital para a paz e a segurança mundial e o bem estar da humanidade mundial, a implantação do Tribunal Penal Internacional (criado pelo Tratado de Roma em 1.998) para processar e julgar aqueles que violam os direitos humanos fundamentais. A Conferência das Nações Unidas realizada em Roma entre 15 de junho a 17 de julho de 1.998 foi, sem sombra de dúvida, o marco histórico do Direito Internacional Penal, na medida em que, atendendo reclamo da comunidade jurídica internacional, criou o Tribunal Penal Internacional, impondo normas regulamentadoras e proibitivas de comportamentos de indivíduos, grupos sociais, governos nacionais e internacionais, violadores dos direitos humanos fundamentais. O Tribunal Penal Internacional, criado para processar e julgar os crimes contra a humanidade, crimes de genocídio, crimes de guerra e de agressão, é inovador no campo do Direito Penal Internacional, na medida em que, pela primeira vez, as Nações Unidas (ONU), viabilizaram o surgimento de um órgão judiciário internacional, possuidor de personalidade jurídica internacional, de caráter permanente, complementar aos sistemas judiciários nacionais, instituído por meio de tratado internacional e dotado de competência universal.

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TRIBUNAL INTERNACIONAL PENAL

PEDRO WILSON BUGARIB

Promotor de Justiça e Professor de Direito Penal da PUC-SP

Diante das barbáries das Guerras Mundiais, especialmente a 2ª

Grande Guerra quando milhares de mulheres, crianças e homens foram

cruelmente dizimadas, e das inúmeras violações aos direitos humanos

fundamentais por governos tirânicos, como foi o caso da Bósnia, Ruanda,

Chechênia, Timor Leste e outras mais, e, notadamente, a inviabilidade da

constituição de Tribunais ad hoc para julgar os vencidos de guerra (Nuremberg,

Tóquio, Ruanda, Bósnia, etc), impôs-se, de maneira vital para a paz e a

segurança mundial e o bem estar da humanidade mundial, a implantação do

Tribunal Penal Internacional (criado pelo Tratado de Roma em 1.998) para

processar e julgar aqueles que violam os direitos humanos fundamentais.

A Conferência das Nações Unidas realizada em Roma entre 15 de

junho a 17 de julho de 1.998 foi, sem sombra de dúvida, o marco histórico do

Direito Internacional Penal, na medida em que, atendendo reclamo da

comunidade jurídica internacional, criou o Tribunal Penal Internacional,

impondo normas regulamentadoras e proibitivas de comportamentos de

indivíduos, grupos sociais, governos nacionais e internacionais, violadores dos

direitos humanos fundamentais.

O Tribunal Penal Internacional, criado para processar e julgar os

crimes contra a humanidade, crimes de genocídio, crimes de guerra e de

agressão, é inovador no campo do Direito Penal Internacional, na medida em

que, pela primeira vez, as Nações Unidas (ONU), viabilizaram o surgimento de

um órgão judiciário internacional, possuidor de personalidade jurídica

internacional, de caráter permanente, complementar aos sistemas judiciários

nacionais, instituído por meio de tratado internacional e dotado de

competência universal.

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A importância do Tribunal Penal Internacional revela-se pela

inovação em criar estruturas de governança global e, principalmente, o poder

supranacional de jurisdição sobre qualquer pessoa ou grupo social,

independentemente de área geográfica, buscando o fim maior da execução de

uma Justiça Universal.

A sede do Tribunal Penal Internacional é a cidade de Haia, na

Holanda, podendo atuar e realizar sessões, dependendo da peculiaridade e

conveniência de cada caso, no território de qualquer Estado-parte e mediante

acordo especial, no território de qualquer outro Estado, garantida a jurisdição

plena e universal do Tribunal.

A Assembleia dos Estados-partes do Tribunal deverá aprovar

acordo de cooperação com a ONU, vinculando o Tribunal às Nações Unidas,

visando o efetivo cumprimento do Estatuto do Tribunal.

O artigo 5º do Estatuto definiu que a jurisdição do tribunal incidirá

sobre os crimes de genocídio, os crimes contra a humanidade, os crimes de

guerra e os crimes de agressão.

De acordo com o artigo 6º do Estatuto, entende-se por

“genocídio” qualquer um dos seguintes atos praticados com a intenção de

destruir total ou parcialmente um grupo nacional, étnico, racial ou religioso. São

eles: a) matar membros do grupo; b) causar lesão grave à integridade física ou

mental de membros do grupo; c) submeter intencionalmente o grupo a

condições de existência capazes de ocasionar-lhe a destruição física, total ou

parcial; d) adotar medidas destinadas a impedir os nascimentos no seio do

grupo; e) efetuar a transferência forçada de crianças do grupo para outro grupo.

É importante destacar a diferença entre crimes contra a

humanidade e crimes de guerra prevista no Estatuto.

Prevê o artigo 7º por “crime contra a humanidade” qualquer um

dos seguintes atos quando praticados como parte de um ataque generalizado

ou sistemático contra uma população civil e com conhecimento de tal ataque,

sendo eles: a) homicídio; b) extermínio; c) escravidão; d) deportação ou

transferência forçada de populares; e) encarceramento ou outra privação grave

da liberdade física, em violação às normas fundamentais do direito

internacional; f) tortura; g) estupro, escravidão sexual, prostituição forçada,

gravidez forçada, esterilização forçada ou outros abusos sexuais de gravidade

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comparável; h) perseguição de um grupo ou coletividade com identidade

própria, fundada em motivos políticos, racionais, nacionais, étnicos, culturais,

religiosos, de gênero ou outros motivos universalmente reconhecidos como

inaceitáveis conforme o direito internacional; i) desaparecimento forçado de

pessoas; j) crime de “apartheid”; k) outros atos desumanos de caráter similar

que causem intencionalmente grande sofrimento ou atentem gravemente

contra a integridade física ou a saúde mental ou física.

De acordo com o artigo 8º entende-se por “crimes de guerra”,

sujeitos à jurisdição do Tribunal, violações graves às disposições estabelecidas

nas Convenções de Genebra de 12 de agosto de 1949, bem como em outras

violações graves às leis e usos aplicados aos conflitos armados internacionais no

marco do direito internacional, dentre os quais podemos destacar os seguintes

atos: homicídio doloso; submeter à tortura ou a outros tratamentos

desumanos, incluídas as experiências biológicas; infligir de forma deliberada

grandes sofrimentos ou atentar gravemente contra a integridade física ou a

saúde; destruir bens e apropriar-se deles de forma não justificada por

necessidades militares, em grande escala, ilícita e arbitrariamente; obrigar um

prisioneiro de guerra ou outro indivíduo protegido a prestar serviços nas forças

de uma potência inimiga; privar de forma deliberada um prisioneiro de guerra

ou outro indivíduo do seu direito a um processo justo e imparcial; submeter à

deportação, transferência ou confinamento ilegais; tomar reféns; dirigir

intencionalmente ataques contra a população civil enquanto tal ou contra civis

que não participem diretamente das hostilidades; dirigir intencionalmente

ataques contra pessoal, instalações, material, unidades ou veículos

participantes de uma missão de manutenção da paz ou de assistência

humanitária, em conformidade com a Carta das Nações Unidas, sempre que

tenham o direito à proteção outorgada a civis ou bens civis de acordo com o

direito internacional dos conflitos armados.

Entende-se ainda por “crimes de guerra” os seguintes atos: lançar

um ataque intencional, sabendo que incidentalmente causará perda de vidas,

lesões em civis ou danos a bens de caráter civil ou danos extensos, duradouros e

graves ao meio ambiente; atacar ou bombardear, por qualquer meio, cidades,

aldeias, povoados ou prédios que não estejam defendidos ou que não sejam

objetivos militares; causar a morte ou lesões a um inimigo que tenha deposto as

armas ou que, por não ter meios para defender-se, tenha se rendido; dirigir

intencionalmente ataques contra prédios dedicados ao culto religioso, às artes,

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às ciências, monumentos históricos, hospitais e lugares onde se agrupam

doentes e feridos sempre que não sejam objetivo militares; submeter indivíduos

que estejam em poder de uma parte adversária a mutilações físicas ou

experiências médicas ou científicas de qualquer tipo que não sejam justificadas

em razão de tratamento médico, dental ou hospitalar, nem sejam levadas a

cabo em seu interesse e que causem a morte ou ponham gravemente em perigo

a saúde de tal indivíduo ou indivíduos; matar ou ferir de modo traiçoeiro

indivíduos pertencentes à nação ou exército inimigo; utilizar veneno ou armas

envenenadas; utilizar gases asfixiantes, tóxicos ou similares ou qualquer líquido

ou material ou dispositivo análogo; provocar intencionalmente a inanição da

população civil como método de fazer a guerra, privando-a dos bens

indispensáveis para a sua sobrevivência, inclusive por meio da obstrução

intencional da chegada de suprimentos de socorro, de acordo com as

Convenções de Genebra.

Segundo a regra prevista no artigo 9º do Estatuto, os elementos de

definição dos crimes sujeitos à jurisdição do Tribunal serão adotados por

maioria de dois terços dos membros da Assembleia dos Estados-partes.

O artigo 11 é de vital importância, uma vez que prevê, em

obediência aos princípios da legalidade e anterioridade da lei penal, que o

Tribunal somente terá jurisdição sobre os crimes cometidos após a entrada em

vigor do Estatuto.

Caso um Estado venha a se tornar parte após a entrada em vigor

do Estatuto, poderá o Tribunal somente exercer sua jurisdição em relação aos

crimes cometidos após esta data, salvo declaração expressa em sentido

contrário do Estado recém-ingresso.

Os princípios gerais do Direito Penal estão assegurados nos artigos

22 a 33 do Estatuto, destacando-se, dentre eles, os princípios da legalidade –

“nullum crimen sine lege”, da irretroatividade “ratione personae”, e

especialmente o da imprescritibilidade dos crimes sob a jurisdição do Tribunal.

Visando afastar a mácula do Tribunal de Nuremberg que afrontou

os princípios da legalidade e da irretroatividade da lei penal, incriminando fatos

pretéritos, fazendo tábula rasa da regra “nullum crimen nulla poena sine lege”,

bem como buscando limitar a jurisdição do Tribunal Penal Internacional e

controlar seu poder punitivo, excluindo, assim, toda e qualquer arbitrariedade,

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o Estatuto, nos artigos 22 e 23, consagra que ninguém será penalmente

responsável e punido, a menos que sua conduta constitua, no momento em que

ocorrer, um crime sob a jurisdição do Tribunal.

Consagrando o princípio da irretroatividade “ratione personae” o

artigo 24 estabeleceu que ninguém será penalmente responsável por uma

conduta anterior à entrada em vigor do Estatuto.

O artigo 25 cuida da responsabilidade penal individual,

asseverando que um indivíduo que cometer um crime sob a jurisdição do

Tribunal será individualmente responsável e passível de pena, em conformidade

com o Estatuto, não se excluindo a responsabilidade do Estado agente, de

acordo com as regras do direito internacional.

Procurando individualizar as condutas puníveis, o Estatuto

destacou algumas formas de coautoria e participação: a) cometer crime

individualmente, em conjunto com outrem ou por meio de outrem, seja este ou

não penalmente responsável; b) ordenar, propor ou induzir a prática de crime,

que de fato ocorra ou seja tentado; c) com o propósito de facilitar a prática de

crime, ajude ou colabore de algum modo na prática ou na tentativa de praticar

o crime, inclusive fornecendo os meios para sua perpetração; d) contribuir de

qualquer outro modo à perpetração ou tentativa de perpetração do crime por

um grupo de pessoas que tenham uma finalidade comum.

A contribuição deverá ser prestada com a intenção de levar a cabo

a atividade delitiva ou o propósito criminoso do grupo, mesmo que o crime não

seja consumado devido a circunstâncias alheias à vontade do agente.

O indivíduo que abandonar o esforço de perpetrar o crime ou de

outra forma impedir a sua consumação, não deverá ser passível de pena se

renunciar íntegra e voluntariamente ao propósito delitivo.

Em relação à inimputabilidade penal, em que pese a divergência

de opiniões no tocante ao início da idade penal, se aos treze ou dezesseis anos,

ou até mesmo aos vinte e um, o Estatuto, no artigo 26, optou pela exclusão da

jurisdição do Tribunal ao menor de dezoito anos de idade no momento da

prática do crime.

No tocante à responsabilidade penal do Chefe de Estado ou

Governo, o artigo 27 do Estatuto prevê que a função oficial de chefe de Estado

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ou Governo, de membro de um governo ou parlamento, representante eleito

ou funcionário de governo, não eximirá o indivíduo da responsabilidade penal,

nem deverá, per se, constituir motivo para redução da pena.

É importante ressaltar que o Estatuto deixou consignado que as

imunidades ou normas especiais de procedimentos vinculadas à função oficial

de um indivíduo, de acordo com o direito interno ou com o direito

internacional, não obstarão o Tribunal de exercer a sua plena jurisdição.

Na mesma linha, o artigo 28 dispõe que o comandante militar ou o

indivíduo que atue efetivamente como comandante militar será responsável

penalmente pelos crimes sob a jurisdição do Tribunal que tiverem sido

cometidos por forças sob o seu comando ou sua autoridade e controle efetivo.

O Estatuto vai mais além, pune, também, por negligência, o

comandante militar que “sabia” ou “deveria saber” que as forças estavam

cometendo ou pretendiam cometer os crimes.

Pune, ainda, o comandante militar que não tenha adotado todas

as medidas necessárias e razoáveis, no âmbito de sua competência, para

prevenir ou reprimir sua perpetração ou para levar o caso ao conhecimento das

autoridades competentes para fins de investigação e persecução.

Como não poderia ser diferente, a presença do elemento subjetivo

veio expressamente prevista no artigo 30 do Estatuto, segundo o qual, salvo

disposição em contrário, um indivíduo somente será penalmente responsável e

passível de pena por um crime sob a jurisdição do Tribunal se agir com intenção

e conhecimento dos elementos materiais do crime.

De acordo com a regra do artigo 30, responde penalmente o

agente que tem a intenção de praticar o crime ou a consciência de que o

resultado se produzirá no curso normal dos acontecimentos.

As circunstâncias que excluem a responsabilidade penal vêm

previstas no artigo 31 do Estatuto, destacando-se a inimputabilidade por

doença ou deficiência mental e por estado de intoxicação, a legítima defesa

própria e de terceiro, o estado de necessidade, a coação irresistível e a

obediência hierárquica.

De acordo com a regra do artigo 31, o agente não será penalmente

responsável se no momento em que incorrer na conduta estiver sofrendo de

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uma doença ou deficiência mental, que o prive de sua capacidade de entender a

ilicitude ou a natureza de sua conduta, ou de sua capacidade de controlar a

conduta ilícita.

Importante menção fez o Estatuto à teoria da actio libera in causa,

na medida em que o agente não responde penalmente se no momento da

conduta encontra-se em estado de intoxicação que o prive de sua capacidade

de entender a ilicitude ou a natureza de sua conduta, ou capacidade de

autocontrolar, a menos que tenha se intoxicado voluntariamente em

circunstâncias que lhe permitiam ter conhecimento de que, em consequência

da intoxicação, poderia ou assumiria o risco de incorrer numa conduta tipificada

como crime da competência do Tribunal.

Igualmente exclui-se a responsabilidade penal do agente que no

momento da conduta encontra-se em legítima defesa própria ou em defesa de

terceiro ou, em caso de crimes de guerra, em defesa de um bem que seja

essencial para sua sobrevivência ou a de terceiro ou para a realização de sua

missão militar contra o uso iminente e ilícito da força, em forma proporcional ao

grau de perigo para ele, um terceiro ou para os bens protegidos.

Por fim, referindo-se tanto à coação irresistível como ao estado de

necessidade, dispõe o artigo 31 que o agente não será penalmente responsável

de cometer uma conduta que presumivelmente constitui um crime sob a

jurisdição do Tribunal como consequência de coação derivada de uma ameaça

iminente de morte ou de contínua ou iminente ameaça de lesão corporal grave

contra si mesmo ou contra outrem, e age necessária e razoavelmente para

evitar essa ameaça, desde que não tenha tido a intenção de causar um dano

superior àquele que se propunha evitar.

O Estatuto também fez menção, em seu artigo 32, ao erro de fato

e ao erro de direito como circunstâncias que excluem a responsabilidade penal,

mas apenas e tão somente se o elemento subjetivo da intencionalidade exigido

pelo crime e de um determinado tipo de conduta que constitui crime sob a

jurisdição do Tribunal não puder estar presente no momento da prática da

conduta, isto é, somente excluirá a responsabilidade penal se ensejar o

desaparecimento do elemento volitivo.

Em relação ainda ao erro de direito e à obediência hierárquica, o

artigo 33 do Estatuto dispõe que o fato sob a jurisdição do Tribunal ter sido

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cometido em cumprimento a uma ordem emitida por um Governo ou um

superior, militar ou civil, não eximirá o agente de responsabilidade penal, a

menos que o subordinado estivesse por lei obrigado a obedecer ordens

emitidas pelo governo ou superior hierárquico, ou não soubesse que a ordem

era ilícita, ou ainda a ordem não fosse manifestadamente ilícita, não podendo,

assim, o agente ter sua responsabilidade criminal excluída pelo simples

argumento de defesa de que estava seguindo ordens de um superior

hierárquico.

Por fim, no tocante às causas de exclusão de responsabilidade

penal, é de suma relevância a regra expressamente insculpidas no item 2 do

artigo 33 do Estatuto, pela qual as “ordens de cometer genocídio ou crimes

contra a humanidade são manifestadamente ilícitas” , não se podendo colher,

em tese , a excludente da obediência hierárquica.

No tocante à aplicação das penas, o artigo 77 do Estatuto prevê

duas espécies de reprimenda aos condenados por crimes previstos no artigo 5º

( crime de genocídio, crimes contra a humanidade, crimes de guerra e o crime

de agressão). Pena de reclusão por um período que não exceda 30 anos e pena

de prisão perpétua, quando justificada pela extrema gravidade do crime e pelas

circunstâncias pessoais do criminado.

É de se consignar que, por questões humanitárias e vedações

constitucionais de muitos dos Estados-membros, acolheu-se a tese da abolição

da pena de morte, adotando-se a prisão perpétua como solução intermediária

nos casos de extrema gravidade e comprovada necessidade pelas condições

desfavoráveis do condenado.

O Tribunal também poderá impor penas acessórias de multa e

sequestro do produto, dos bens ou dos haveres procedentes direta ou

indiretamente dos crimes, sem prejuízo dos direitos de terceiro de boa-fé.

Interessante regra é a da revisão de penas insculpidas no artigo

110 do Estatuto, pelo qual, quando o recluso tiver cumprido dois terços da

pena, ou 25 anos de prisão, em caso de prisão perpétua, o Tribunal poderá

revisar a pena a fim de determinar se esta deverá ou não ser reduzida.

Entretanto, a revisão das penas estará condicionada à vontade do

recluso de, desde o princípio ou de forma continuada, cooperar com o Tribunal

em suas investigações e processos ao facilitar, de forma voluntária, a execução

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das decisões e ordens do Tribunal em outros casos, em particular auxiliando na

localização de bens sobre os quais incidam multas, sequestro ou reparação que

possam ser utilizados em benefício das vítimas, além de outros fatores que

permitam justificar plenamente a redução da pena.

Ressalta-se que o indeferimento da revisão não obsta ao Tribunal

reexaminar posteriormente a redução da pena, se assim indicar o mérito do

condenado, de acordo com as regras de procedimento e prova previstas no

Estatuto.

De acordo com o artigo 13 o Tribunal poderá exercer sua jurisdição

se um Estado-parte ou o Conselho de Segurança das Nações Unidas comunicar

ao Promotor a ocorrência, em tese, de qualquer dos crimes a que se refere o

artigo 5º (crime de genocídio, crimes contra a humanidade, crimes de guerra e

crime de agressão.)

O Promotor, segundo a regra do artigo 15, poderá instaurar de

ofício uma investigação com base em informações acerca de um crime sob a

jurisdição do Tribunal, podendo receber testemunhos escritos ou orais na sede

do Tribunal, solicitar informações a Estados, órgãos das Nações Unidas,

organizações intergovernamentais ou não governamentais, ou a outras fontes

fidedignas que considere apropriadas.

Se o Promotor chegar à conclusão que não há base razoável para

uma investigação, informará formalmente a decisão ao requerente, nada

impedindo, contudo, que os fatos sejam reexaminados posteriormente à luz de

novas provas.

O Promotor, por outro lado, se concluir que há prova suficiente

para iniciar uma investigação, apresentará à Câmara de Questões Preliminares

um pedido de autorização, e, em sendo acolhido o requerimento, instaurar-se-á

o inquérito, sem prejuízo das resoluções subsequentes que possa adotar

posteriormente o Tribunal a respeito de sua jurisdição e admissibilidade da

causa.

Em sendo negativa a autorização para a instauração do inquérito,

nada impedirá que o Promotor possa vir a apresentar posterior pedido com

base em novos fatos ou provas.

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Interessante é a regra da suspensão da investigação ou do

processo previsto no artigo 16, pela qual, nenhuma investigação ou processo

poderá ser iniciado ou encontrar-se em andamento, sob a jurisdição do

Tribunal, por um período de doze meses, após a adoção pelo Conselho de

Segurança de resolução suspendendo o feito, em conformidade com o

dispositivo no Capítulo VII da Carta das Nações Unidas, podendo a medida ser

renovada por igual período.

Levando em consideração que a jurisdição do Tribunal Penal

Internacional deverá ser complementar às jurisdições penais nacionais, o artigo

17 do Estatuto estabelece que o Tribunal decidirá pela inadmissibilidade de um

caso quando:

a) O caso estiver sendo objeto de investigação ou processo em Estado que

tenha jurisdição sobre os fatos, a menos que o Estado não seja capaz ou

não esteja disposto a instaurar a investigação ou o processo;

b) O caso tiver sido objeto de investigação por um Estado que tenha

jurisdição sobre os fatos e que tenha decidido não promover ação penal

contra o autor do crime, a menos que a decisão tenha resultado da falta

de disposição do Estado de instaurar o processo ou da impossibilidade de

fazê-lo;

c) O autor do crime já tiver sido processado pela conduta em outro

Tribunal, a menos que tenha obedecido ao propósito de subtrair o

acusado de sua responsabilidade penal por crime sob a jurisdição do

Tribunal, ou o processo não tenha sido conduzido de forma

independente ou imparcial, em conformidade com as normas do devido

processo pelo direito internacional, de modo a subtrair o acusado à ação

da justiça ( parágrafo 3º do artigo 20 );

d) O caso não for suficientemente grave para justificar a adoção de outras

medidas por parte do Tribunal.

De acordo com o artigo 18, existindo base razoável para iniciar uma

investigação, o Promotor notificará todos os Estados-partes e também

aqueles Estados que teriam a jurisdição natural sobre a causa.

A notificação poderá ser em caráter confidencial, limitando-se ao

alcance das informações para o fim de proteger pessoas ( testemunhas,

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vítimas e até para preservar a segurança do autor do crime), bem como para

impedir a destruição de provas ou impedir a fuga de indivíduos.

O Estado interessado poderá, no prazo de 30 dias após o

recebimento da notificação, informar ao Tribunal de que está realizando ou

já realizou uma investigação a respeito da conduta de seus nacionais ou de

indivíduos sob sua jurisdição.

A requerimento do Estado interessado, o Promotor declinará de

sua competência, a menos que a Câmara de Questões Preliminares decida, a

pedido do Promotor, autorizar a investigação.

O Promotor poderá reexaminar a questão da abstenção de sua

competência ao final de seis meses, a partir da data da comunicação, ou

quando tenha se produzido uma mudança significativa de circunstâncias,

pelo fato do Estado interessado não estar disposto a investigar os fatos ou

não poder realmente fazê-lo.

Segundo a regra do artigo 54, o Promotor, a fim de estabelecer a

veracidade dos fatos, ampliará a investigação de modo a cobrir todos os

fatos e provas relevantes para determinar se há responsabilidade penal,

abrangendo tanto as circunstâncias agravantes como atenuantes.

Adotará medidas adequadas para assegurar a eficácia da

investigação e a persecução dos crimes sob a jurisdição do Tribunal,

respeitando os interesses e circunstâncias pessoais das vítimas e das

testemunhas, levando em consideração a natureza dos crimes, em particular

os de violência sexual, violência por razão de gênero e violência contra

crianças.

Dentre as suas atribuições, o Promotor poderá realizar

investigações no território de um Estado; coletar e examinar provas;

interrogar indivíduos sob investigação, vítimas e testemunhas; solicitar a

cooperação de um Estado ou organização intergovernamental; concordar

em não divulgar, em nenhuma etapa do processo, os documentos ou

informações obtidos em caráter confidencial e unicamente com o propósito

de produzir novas provas; e adotar ou solicitar que sejam adotadas medidas

necessárias para assegurar o caráter confidencial da informação, a proteção

de indivíduos e ou a proteção de provas.

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Durante a investigação, prevê o artigo 55 do Estatuto, que

ninguém será compelido a testemunhar contra si mesmo, nem a se declarar

culpado, bem como ninguém será submetido a forma alguma de coação,

intimidação ou ameaça, à tortura nem a outros tratamentos ou castigos

cruéis, desumanos ou degradantes.

Está assegurado ao acusado o direito de não ser submetido a

prisão ou detenção arbitrárias, nem ser privado de liberdade, exceto nos

casos previstos no Estatuto e em conformidade com os procedimentos nele

estabelecidos.

É direito do acusado, antes do interrogatório, ser informado de

que há motivos para acreditar que tenha cometido um crime sob a jurisdição

do Tribunal, bem como, se manter em silêncio, sem que isso seja levado em

consideração na determinação de sua culpabilidade ou inocência.

É garantia do acusado ser interrogado na presença de um

advogado de defesa, a menos que venha renunciar voluntariamente a esse

direito.

No interrogatório é direito do acusado ser assistido por um

advogado de sua escolha ou, se não dispuser de recursos, que lhe seja

designado um defensor dativo, sempre que seja necessário, no interesse da

justiça e, em qualquer caso, se não tiver meios suficientes para constituir um

defensor.

O artigo 58 dispõe que, a todo momento, após iniciada a

investigação, a Câmara de Questões Preliminares, a requerimento do

Promotor, poderá expedir mandado de prisão contra pessoa que tenha

cometido crime sob a jurisdição do Tribunal, existindo prova razoável da

autoria e a prisão seja necessária para assegurar que o autor do crime

compareça em juízo, não obstrua nem ponha em risco a investigação nem os

procedimentos do Tribunal e, principalmente, para impedir que o autor

prossiga cometendo crimes que seja do âmbito do Tribunal.

Em não estando presentes os motivos da prisão provisória, o

Promotor poderá requerer da Câmara de Questões Preliminares a expedição

de um mandado de citação, se considerar que há base razoável para supor

que o autor do crime compareça aos atos processuais.

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Segundo o artigo 59, o Estado-parte que tiver recebido um pedido

de prisão provisória ou de prisão, imediatamente tomará as medidas

necessárias para a captura e entrega do autor do crime, em conformidade

com o seu direito interno e as regras procedimentais do Tribunal.

O preso será levado à presença de autoridade judicial competente

do Estado de custódia, que decidirá, de acordo com as regras do direito

interno, se o mandado é aplicado, se a prisão foi realizada em conformidade

com o devido processo e se foram respeitados os direitos do preso.

Antes de sua entrega ao Tribunal, o preso terá direito de requerer

a liberdade provisória à autoridade competente do Estado de custódia, que

examinará se encontram presentes circunstâncias urgentes e excepcionais

que justifiquem a liberdade provisória, e se há salvaguardas necessárias para

que se possa cumprir a obrigação de entregar o indivíduo ao Tribunal.

O pedido de liberdade provisória será notificado à Câmara de

Questões Preliminares, que fará recomendações à autoridade competente

do Estado de custódia acerca das medidas cabíveis para impedir a fuga do

autor do crime.

Estabelece o artigo 60 que, uma vez tendo sido entregue o

indivíduo ao Tribunal, ou se apresentando voluntariamente, ou, ainda, em

cumprimento ao mandado de citação, a Câmara de Questões Preliminares

tomará as cautelas devidas no sentido de se certificar se o indivíduo foi

informado dos crimes que lhe são imputados e dos direitos que lhe são

assegurados pelo Estatuto do Tribunal.

A Câmara de Questões Preliminares, a pedido do autor do crime

ou do Promotor, poderá revisar periodicamente sua decisão de manter a

prisão ou conceder a liberdade provisória, zelando para que o indivíduo não

permaneça preso por um período excessivo antes do julgamento por

demora inescusável do Promotor, considerando a possibilidade de colocar o

preso em liberdade com ou sem condições.

Caso necessário, a Câmara de Questões Preliminares poderá

expedir mandado de prisão em desfavor do indivíduo colocado em liberdade

a fim de que o faça comparecer ao Tribunal.

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De acordo com o artigo 61, dentro de um prazo razoável, após a

entrega do indivíduo ao Tribunal ou sua apresentação voluntária, a Câmara

de Questões Preliminares realizará uma audiência, na presença do

Promotor, do acusado e do seu defensor, para confirmar as acusações, com

base nas quais o Promotor irá propor a ação penal.

No caso do acusado renunciar a seu direito de estar presente à

audiência ou estiver foragido, ou não for possível encontrá-lo, desde que

tenham sido tomadas todas as medidas razoáveis para assegurar seu

comparecimento em juízo e informá-lo das acusações, a Câmara de

Questões Preliminares, a requerimento do Promotor ou de ofício, poderá

realizar a audiência na ausência do acusado, sendo este representado no ato

por um defensor indicado pelo Tribunal.

Durante a audiência, o Promotor fundamentará cada acusação

com provas suficientes de que há base fundada para supor que o indivíduo

cometeu o crime que se lhe imputa.

O Promotor poderá apresentar provas documentais ou um resumo

das provas e não será necessário que convoque as testemunhas que deverão

depor durante o julgamento.

O acusado, por seu turno, poderá, no curso da audiência, arguir a

improcedência das acusações, impugnar as provas apresentadas pelo

Promotor e apresentar provas de sua inocência.

Ao final da audiência, a Câmara das Questões Preliminares,

confirmada as acusações de que existem provas suficientes de que o

acusado cometeu cada crime que lhe é imputado, encaminhará os autos a

uma das Câmaras de Primeira Instância para julgamento.

Uma vez não confirmada as acusações, nada obsta que o Promotor

solicite nova audiência, caso disponha de provas adicionais.

Antes de iniciar o julgamento, o Promotor, com a autorização da

Câmara de Questões Preliminares e mediante prévia notificação do acusado,

poderá modificar as acusações. Se quiser apresentar novas acusações, ou

substituí-las por outras mais graves, deverá ser realizada nova audiência

para confirmar essas acusações.

15

Uma vez iniciado o julgamento, o Promotor, com a autorização da

Câmara de Questões Preliminares, poderá retirar as acusações.

De acordo com a regra do artigo 62, a menos que se decida de

outro modo, o julgamento celebrar-se-á na sede do Tribunal na cidade de

Haia.

A presença do acusado durante o julgamento é garantia

processual insculpida no artigo 63 do Estatuto.

Se o acusado, estando presente no Tribunal, perturbar

continuamente o julgamento, a Câmara de Primeira Instância poderá

determinar que o mesmo se retire da Sala e que observe o julgamento e

instrua seu defensor de fora do recinto.

Essas medidas serão adotadas unicamente em circunstâncias

excepcionais, após ficar demonstrada a ausência de alternativas razoáveis e

adequadas, e somente pelo tempo em que for estritamente necessário.

A Câmara de Primeira Instância, dentre as atribuições previstas no

artigo 64, poderá requerer o comparecimento e a inquirição de testemunhas

e a produção de documentos e outras provas, solicitando, se necessário, a

assistência dos Estados; adotar medidas para a proteção de informações

confidenciais; determinar a apresentação de provas adicionais às coletadas

antes do julgamento ou às apresentadas durante o julgamento pelas partes;

adotar medidas para a proteção do acusado, das testemunhas e das vítimas

e dirimir quaisquer outras questões pertinentes.

Como não poderia ser diferente, o Estatuto prevê expressamente

no parágrafo 7º do artigo 64 que o julgamento será público.

No entanto, a Câmara de Primeira Instância, poderá decidir que

determinadas diligências sejam efetuadas a portas fechadas, devido a

circunstâncias especiais ou para a proteção de informações de caráter

confidencial que devam ser apresentadas como prova.

Ao iniciar o julgamento, a Câmara de Primeira Instância fará

leitura, na presença do acusado, das acusações confirmadas anteriormente

pela Câmara de Questões Preliminares.

16

A Câmara de Primeira Instância certificar-se-á que o acusado

compreende a natureza das acusações, concedendo-lhe a oportunidade de

se declarar culpado ou inocente.

Nos termos do artigo 65, se o acusado se declarar culpado, a

Câmara de Primeira Instância certificar-se-á se o acusado compreende a

natureza e as consequências da confissão de culpa, se a confissão foi

formulada voluntariamente após suficiente consulta com o advogado de

defesa e, se a confissão de culpa é corroborada pelos fatos contidos nas

acusações apresentadas pelo Promotor.

Poderá a Câmara de Primeira Instância condenar o acusado se

constatar que a confissão de culpa, junto com as provas adicionais

apresentadas, constitui um reconhecimento de todos os fatos essenciais que

configuram o crime do qual o acusado se declarou culpado.

Por outro lado, se constatado que a confissão de culpa é nula,

ordenará o prosseguimento do julgamento, em conformidade com o

procedimento ordinário previsto no Estatuto, podendo remeter a causa a

outra Câmara de Primeira Instância.

O princípio da presunção de inocência vem insculpido no artigo 66

do Estatuto do Tribunal, segundo o qual todo o indivíduo será considerado

inocente enquanto não for provada a sua culpa no Tribunal, conforme o

direito aplicável, cabendo ao Promotor o ônus de provar a culpabilidade do

acusado.

De acordo com o artigo 69, antes de depor, cada testemunha se

comprometerá a dizer a verdade em seu testemunho.

A prova testemunhal deverá ser apresentada pessoalmente em

juízo, exceto nos casos previsto no artigo 67, em que a prova poderá ser

apresentada por meio eletrônico, gravada por meio de vídeo, áudio, ou

transcrições escritas, ou ainda qualquer meio idôneo, se o intuito for de

proteger vítimas e testemunhas, em particular vítimas de agressão sexual ou

menor de idade.

O Tribunal poderá decidir sobre a pertinência ou admissibilidade

de qualquer prova, respeitando os privilégios de confidencialidade

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estabelecidos nas regras de procedimento e prova do Estatuto, não exigindo

ainda prova dos fatos de domínio público.

Todavia, não serão admissíveis as provas obtidas como resultado

de uma violação ao Estatuto do Tribunal ou das normas de direitos humanos

internacionalmente reconhecidas, quando essa violação suscitar sérias

dúvidas sobre a confiabilidade das provas ou sua admissão atentar contra a

integralidade do julgamento ou resultar em grave prejuízo para a formação

da culpa.

Estabelece o artigo 74 que os Juízes da Câmara de Primeira

Instância estarão presentes em todas as fases do julgamento e em todas as

deliberações.

A Câmara de Primeira Instância proferirá a sentença baseada na

avaliação das provas apresentadas durante o julgamento ou na totalidade

dos procedimentos, não podendo extrapolar os fatos e as circunstâncias

descritas na acusação.

Os juízes procurarão adotar a sentença por unanimidade, mas, se

isto não for possível, será esta adotada por maioria de votos.

As deliberações da Câmara de Primeira Instância serão secretas.

A sentença será registrada por escrito e incluirá uma exposição

fundamentada e completa da avaliação da Câmara de Primeira Instância

sobre as provas e as conclusões.

A Câmara de Primeira Instância pronunciará uma única sentença.

Quando não houver unanimidade, a sentença da Câmara de

Primeira Instância conterá as opiniões da maioria e da minoria, registrando

os respectivos votos divergentes.

O artigo 75 prevê como efeito da condenação a reparação de

danos às vítimas, tais como a restituição, a indenização e a reabilitação, a

serem outorgadas às vítimas ou a quem de direito.

O Tribunal poderá, mediante requerimento, ou de ofício, em

circunstâncias excepcionais, determinar na sentença o alcance e a

magnitude dos danos, perdas ou prejuízos causados às vítimas ou a quem de

direito, indicando os princípios em que se fundamenta, ordenando que a

18

indenização outorgada à título de reparação seja paga por meio do Fundo

Fiduciário, criado em benefício das vítimas de crimes sob a Jurisdição do

Tribunal e de suas famílias ( artigo 79 do Estatuto ).

Dispõe o artigo 76, que em caso de sentença condenatória, a

Câmara de Primeira Instância fixará a pena a ser aplicada, levando em

consideração os elementos de prova e as conclusões pertinentes

apresentadas durante o julgamento.

A sentença será pronunciada em audiência pública e, se possível,

na presença do réu.

De acordo com o artigo 81, caberá apelação de sentença

condenatória, absolutória ou da aplicação da pena.

O Promotor ou o condenado ( ou o Promotor em seu nome )

poderão apelar por vício de procedimento, erro de fato, erro de direito ou

qualquer outro motivo que afete a equidade ou a regularidade do processo

ou da sentença, bem como em razão da desproporção entre o crime

cometido e a pena aplicada.

O Tribunal, se conhecer da apelação de uma sentença e considerar

que há base para revogar a condenação em todo ou em parte, poderá

proferir nova decisão quanto à condenação, bem como à aplicação da pena.

Salvo se a Câmara de Primeira Instância determinar de forma

diferente, o acusado permanecerá preso enquanto a apelação estiver sendo

decidida.

Em caso de sentença absolutória, o acusado será posto em

liberdade de imediato, exceto se, em razão da gravidade do delito, houver

probalidade de êxito na apelação e risco concreto de fuga, hipótese em que

o Tribunal poderá determinar que o réu permaneça preso enquanto durar a

apelação.

Nos termos do artigo 82, caberá ainda apelação das decisões

relativas à jurisdição ou à admissibilidade da causa; da decisão que autorize

ou denega o livramento do indivíduo; das proferidas de ofício pela Câmara

de Questões Preliminares; das relativas às questões que possam afetar de

forma significativa a condução equânime e expedita do processo ou o

resultado do julgamento.

19

A apelação não produzirá, por si só, efeito suspensivo, salvo se a

Câmara de Apelações assim determinar, mediante prévia solicitação e em

conformidade com as regras de procedimento e prova previstas no Estatuto.

Segundo o artigo 83, se a Câmara de Apelações decidir que os

procedimentos objeto de apelação foram injustos e que isso afetou a

regularidade da sentença ou da pena, ou que a sentença ou a pena apeladas

foram materialmente afetadas por erros de fato ou de direito ou de vícios de

procedimento, poderá revogar ou emendar a sentença ou a pena ou

determinar a realização de novo julgamento por outra Câmara de Primeira

Instância.

A sentença da Câmara de Apelações será aprovada por maioria

dos Juízes que a compõem, contendo as razões de fato e de direito em que

se fundamenta e pronunciada em audiência pública, na presença ou

ausência do réu absolvido ou condenado.

Quando não houver unanimidade, a sentença deverá conter as

opiniões da maioria e da minoria, caso em que qualquer Juiz poderá

pronunciar uma opinião separada ou dissidente sobre uma questão de

direito.

A revisão da sentença condenatória ou da pena vem disciplinada

no artigo 84 do Estatuto, pelo qual, o condenado, ou no caso de sua morte, o

cônjuge, os descendentes, os ascendentes, procurador legalmente habilitado

com poderes outorgados pelo próprio réu, ou o Promotor ( em seu nome ),

poderão requerer à Câmara de Apelações a revisão de uma sentença

condenatória definitiva, nos seguintes casos:

a) Descoberta de novas provas que não estavam disponíveis à época do

julgamento por motivos que não possam ser atribuídos, total ou

parcialmente, à parte que houver requerido a revisão e sejam tão

importantes que, se tivessem sido apresentadas durante o julgamento,

provavelmente teriam ensejado outro veredicto;

b) Constatação de que um elemento de prova decisivo, apreciado no

julgamento e com base no qual sustentou-se a condenação, era falso ou

teria sido objeto de adulteração ou falsificação;

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c) A prática, no caso em questão, por parte de um ou mais juízes que

tiverem participado da decisão relativa à sentença condenatória ou da

confirmação das acusações, de desvio de conduta grave ou

descumprimento de suas funções, de gravidade suficiente para justificar

o afastamento do magistrado do cargo.

A Câmara de Apelações indeferirá o pedido de revisão se o

considerar infundado e não preencher os requisitos previstos no Estatuto.

Caso determine que o pedido seja atendido, poderá, conforme o

caso, reconvocar a Câmara de Primeira Instância original, constituir uma

nova Câmara de Primeira Instância, ou reter a sua jurisdição sobre a matéria,

a fim de, após ouvir as partes, determinar se a sentença deva ou não ser

revisada.

De acordo com o artigo 85, o indivíduo que tiver sido vítima de

prisão ou detenção ilegal terá direito a indenização.

Quando uma condenação definitiva for posteriormente anulada

em razão de fatos novos que demonstrem, de forma conclusiva, que ocorreu

um erro judiciário, o indivíduo que tiver cumprido pena em razão dessa

condenação será indenizado conforme a lei, salvo se a falta de

conhecimento oportuno desses fatos lhe for total ou parcialmente

imputável.

Essas são as linhas gerais do Estatuto do Tribunal Penal

Internacional, aprovado na cidade de Roma, em 17 de julho de 1998, pela

Conferência Diplomática das Nações Unidas.

O Congresso Nacional aprovou o texto do Estatuto de Roma do

Tribunal Penal Internacional, por meio do Decreto legislativo nº 112, de 6 de

junho de 2002.

O Presidente da República, no uso da atribuição que lhe confere o

art. 84, VIII, da CF, através do Decreto nº 4.338, de 25 de setembro de 2002,

promulgou o Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional.

A Emenda Constitucional nº 45, de 8.12.2004 acrescentou o §4º ao

art. 5º da CF estabelecendo que o Brasil se submete à jurisdição do Tribunal

Penal Internacional.

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BIBLIOGRAFIA

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Saraiva, 1994.

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São Paulo: Revista dos Tribunais, 1991.

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Editora Atlas, 2010.

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Paulo: Quartier Latin, 2007.