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Acórdãos STA Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo Processo: 0716/13 Data do Acordão: 14-03-2018 Tribunal: 2 SECÇÃO Relator: PEDRO DELGADO Descritores: NULIDADE DE SENTENÇA OMISSÃO DE PRONÚNCIA IRC CUSTOS INDEMNIZAÇÃO PROVISÕES PRINCÍPIO DA ESPECIALIZAÇÃO DO EXERCÍCIO PRINCÍPIO DA JUSTIÇA Sumário: I - A nulidade de sentença por omissão de pronúncia só ocorre quando o tribunal deixar de apreciar questão que devia conhecer. II - A obrigação que impende sobre o Tribunal de se pronunciar sobre as questões submetidas pelas partes à sua apreciação e decisão e que se não mostre prejudicada pelo conhecimento e decisão porventura dado a outras, não significa que o juiz tenha de conhecer todos os argumentos ou considerações que as partes hajam produzido. A omissão de pronúncia só existe quando o tribunal deixa, em absoluto, de apreciar e decidir as questões que lhe são colocadas, e não quando deixa de apreciar argumentos, considerações, raciocínios, ou razões invocados pela parte em sustentação do seu ponto de vista quanto à apreciação e decisão dessas questões. III - O princípio da especialização dos exercícios visa tributar a riqueza gerada em cada exercício e daí que os respectivos proveitos e custos sejam contabilizados à medida que sejam obtidos e suportados, e não à medida que o respectivo recebimento ou pagamento ocorram. IV - Contudo esse princípio deve tendencialmente conformar-se e ser interpretado de acordo com o princípio da justiça, com conformação constitucional e legal (artigos 266.º, n.º 2 da CRP e 55.º da LGT), por forma a permitir a imputação a um exercício de custos referentes a exercícios anteriores, desde que não resulte de omissões voluntárias e intencionais, com vista a operar a transferência de resultados entre exercícios. Nº Convencional: JSTA000P23055 Nº do Documento: SA2201803140716 Data de Entrada: 29-04-2013 Recorrente: AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA Recorrido 1: A..., SGPS, S.A. Votação: UNANIMIDADE Aditamento: Texto Integral Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo Acordão do Supremo Tribunal Administrativo http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/7ae... 1 de 23 26-03-2018, 18:02

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Acórdãos STAAcórdão do Supremo Tribunal Administrativo

Processo: 0716/13Data do Acordão: 14-03-2018Tribunal: 2 SECÇÃORelator: PEDRO DELGADODescritores: NULIDADE DE SENTENÇA

OMISSÃO DE PRONÚNCIAIRCCUSTOSINDEMNIZAÇÃOPROVISÕESPRINCÍPIO DA ESPECIALIZAÇÃO DO EXERCÍCIOPRINCÍPIO DA JUSTIÇA

Sumário: I - A nulidade de sentença por omissão de pronúncia só ocorrequando o tribunal deixar de apreciar questão que deviaconhecer.II - A obrigação que impende sobre o Tribunal de se pronunciarsobre as questões submetidas pelas partes à sua apreciação edecisão e que se não mostre prejudicada pelo conhecimento edecisão porventura dado a outras, não significa que o juiz tenhade conhecer todos os argumentos ou considerações que aspartes hajam produzido. A omissão de pronúncia só existequando o tribunal deixa, em absoluto, de apreciar e decidir asquestões que lhe são colocadas, e não quando deixa deapreciar argumentos, considerações, raciocínios, ou razõesinvocados pela parte em sustentação do seu ponto de vistaquanto à apreciação e decisão dessas questões.III - O princípio da especialização dos exercícios visa tributar ariqueza gerada em cada exercício e daí que os respectivosproveitos e custos sejam contabilizados à medida que sejamobtidos e suportados, e não à medida que o respectivorecebimento ou pagamento ocorram.IV - Contudo esse princípio deve tendencialmente conformar-see ser interpretado de acordo com o princípio da justiça, comconformação constitucional e legal (artigos 266.º, n.º 2 da CRPe 55.º da LGT), por forma a permitir a imputação a um exercíciode custos referentes a exercícios anteriores, desde que nãoresulte de omissões voluntárias e intencionais, com vista aoperar a transferência de resultados entre exercícios.

Nº Convencional: JSTA000P23055Nº do Documento: SA2201803140716Data de Entrada: 29-04-2013Recorrente: AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRARecorrido 1: A..., SGPS, S.A.Votação: UNANIMIDADE

Aditamento:

Texto Integral

Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo TribunalAdministrativo

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1 – Vem a Fazenda Pública recorrer para este Supremo Tribunal dadecisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, que julgouprocedente a impugnação judicial deduzida pela A…………… SGPS,SA, melhor identificada nos autos, contra o despacho que indeferiu orecurso hierárquico da decisão da reclamação graciosa quanto àcorrecção dos prejuízos fiscais do ano de 2004, no montante de €813.903,13.

Termina as suas alegações de recurso, formulando as seguintesconclusões:«Visa o presente recurso reagir contra a douta sentença proferida nosautos em epígrafe, que julgou procedente a impugnação judicialdeduzida por A……….. SGPS, S.A. contra a liquidação de IRC,referente ao exercício de 2004, pretendendo a Fazenda Pública, orarecorrente, a sua revogação e substituição por decisão que consideretal impugnação improcedente;II. A presente peça estruturar-se-á em dois planos distintos, a saber:I- DA NULIDADE POR NÃO APRECIAÇÃO DAS ALEGAÇÕESPRODUZIDAS PELA FAZENDA PÚBLICA NOS TERMOS DO ARTIGO120-° DO CPPTIII. Consta do proémio da douta sentença que, não obstante as partesterem sido notificadas para apresentar alegações escritas, apenas aimpugnante usou dessa prerrogativa;IV. No entanto, também a Fazenda Pública produziu e remeteu ao TAFas respectivas alegações escritas;V. Importa, então, saber se esta omissão de apreciação das alegaçõesconstitui uma mera irregularidade ou uma nulidade processual,susceptível de determinar a anulação de todos os actos processuaissubsequentes, incluindo a douta sentença de mérito entretantoproferida;VI. As nulidades processuais distinguem-se das nulidades dassentenças;VII. Nos termos do n.º 1 do artigo 201.º do CPC, norma especialmentedirigida às nulidades processuais, ocorre nulidade quando a prática deum acto ou a omissão de um acto possam influir no exame ou nadecisão da causa, sendo esta apreciação da competência da entidadejulgadora, à qual cabe, no seu prudente arbítrio, decretar ou não anulidade;VIII. Devem as partes ser notificadas para alegações se, sendo aquestão de facto e direito, os autos não contiverem, findos osarticulados, todos os elementos necessários para a sua apreciaçãosegura, ou seja, se posteriormente àquela fase (que finda com acontestação), qualquer das partes tiver junto elementos/meios de provacom relevância para a decisão;IX. Para efeitos da invalidade em causa, existe uma equivalência entrenão notificar as partes para produzir alegações e notificá-las, mas nãoas apreciar, considerando-as inexistentes, na medida em que aconsequência é exactamente a mesma: a parte ver-se impedida delevar o Tribunal a tomar em consideração a sua posição, de facto e dedireito, sobre a relevância desses novos documentos na apreciação ejulgamento jurídico da sua pretensão;

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X. Nos presentes autos, a impugnante deu entrada de um requerimentoe respectivos documentos, referentes a uma decisão da Direcção deServiços de IRC que recaiu sobre um recurso hierárquico interpostopela ora recorrida relativamente a IRC de 2005, argumentando que omesmo versaria sobre matéria alegada na PI e que a AT teria adoptadoposição divergente da dos presentes autos naqueloutro caso;XI. Tal entendimento foi acolhido pelo douto Tribunal na sentença aquiposta em crise, (fls. 10 in fine);XII. Ora, como se pode retirar das alegações então produzidas pelaagora recorrente, foi tomada posição expressa sobre a (ir)relevância detais documentos para a decisão da causa, sustentando que inexistequalquer incoerência na posição da AT;XIII. Destarte, não poderia o douto Tribunal a quo ignorar o teor dasalegações produzidas pela Fazenda Pública, na medida em que queros documentos juntos pela parte, quer a sua apreciação por parte darecorrente, influenciaram o exame da causa;XIV. Não obstante a recorrente ter sido notificada da junção aos autosdaqueloutros documentos, entendemos, como JORGE LOPES DESOUSA (op. cit, pág. 298), que, ainda que “a parte contrária tenha sidonotificada da junção e se tenha pronunciado, não pode dispensar-se anotificação das partes para alegações”;XV. Assim, esta não apreciação das alegações produzidas pelaFazenda Pública, ao não permitir levar para a discussão da causa odebate de facto e direito das questões nelas suscitadas, mormentesobre a pronúncia quanto à relevância ou irrelevância desses mesmosnovos documentos na apreciação e julgamento jurídico da suapretensão, nos termos consagrados na alínea e) do n.º 3 do artigo 652.°e no artigo 657.º, ambos do CPC, constitui a omissão de um actosusceptível de influir na decisão da causa.XVI. Tendo sido cometida a identificada nulidade e tendo sido a mesmaarguida em tempo — na medida em que a arguente apenas teveconhecimento de tal nulidade com a notificação da douta sentença deque ora se recorre — por força do preceituado no n.º 2 do artigo 201.ºdo CPC, deverão ser anulados os termos processuais subsequentes aomomento em se não apreciaram as alegações escritas da FazendaPública, no que se inclui a douta sentença de mérito proferida, o quedesde já se requer.No caso de assim se não entender,II- DA ILEGALIDADE DAS CORRECÇÕES POR «VÍCIO DE LEI»XVII. A Direcção de Finanças de Aveiro realizou uma acção inspectivaà ora recorrida, relativamente aos exercícios de 2004 e 2005, a qualculminou com a elaboração do Relatório Final, que o douto Tribunal deupor integralmente reproduzido (ponto 1. dos FACTOS PROVADOS);XVIII. O douto Tribunal recorrido considera, portanto, que “a questãoque importa apreciar e decidir, é a de saber o seguinte:- se a constituição da provisão em causa seria obrigatória para aimpugnante, a fim de que esta, mais tarde, pudesse deduzir o custoefectivo em que veio a incorrer;- e se a mesma teria de ser inscrita no exercício em que a acção judicialfoi interposta contra a empresa”;XIX. Quanto à OBRIGATORIEDADE DE CONSTITUIÇÃO DAPROVISÃO, o douto Tribunal a quo considerou que a sociedade se nãoencontrava obrigada a constituir a aludida provisão, com base em dois

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argumentos:a) até ao trânsito em julgado da decisão condenatória, sempre confiouno sucesso da sua pretensão de não pagar qualquer indemnização;b) só com o trânsito em julgado é que pôde conhecer o exacto valor apagar.XX. O regime jurídico das provisões fiscais encontrava-se, à data dosfactos e na matéria que importa aos autos, consagrado na alínea c) don.º 1 do artigo 34.º do Código do IRCXXI. As provisões são, por definição, custos estimados de um exercício,correspondentes a despesas cujo montante ainda não é certo ou adespesas que são de eventual ocorrência futura e têm por primacialdesiderato imputar os custos aos exercícios a que respeitam, evitandofazer deslocar para exercícios futuros custos ou perdas pertencentesàqueles em que se concretizam.XXII. Ora, QUANTO AO PRIMEIRO ARGUMENTO, o douto Tribunalrecorrido entendeu que, até ao trânsito de uma decisão, é lícito que aparte vencida tenha uma expectativa de sucesso quanto ao resultadoda querela;XXIII. Nem legislador o pretendeu, nem o intérprete se pode bastar comuma mera expectativa para justificar a não constituição de tal provisão;XXIV. No caso em apreço, a impugnante não podia alegar que confiousempre no sucesso da acção, atendendo a que (cfr. ponto 3. dosFACTOS PROVADOS), consta no RIT o seguinte:i) B………….. exerceu funções na sociedade A……………, S.A. até12/07/1988;ii) em 1989 intentou no Tribunal do Trabalho de Santa Maria da Feirauma acção de condenação, emergente de contrato individual detrabalho, contra a referida sociedade;iii) em 22/03/1991 foi proferida sentença condenatória desfavorável àimpugnante;iv) em 1991 a ora impugnante constituiu uma provisão contabilística —Provisão para Outros Riscos e Encargos — no valor de € 374.098,00;v) por acórdão do tribunal da Relação do Porto, de 28/09/1992 foiconfirmada a sentença proferida em 1.ª Instância;vi) em 1993 a ora impugnante reforçou a provisão Contabilística —Provisão para Outros Riscos e Encargos — em € 124.699,00;vii) tendo aquela sentença transitado em julgado em 23/03/1995, pordecisão do Supremo Tribunal de Justiça, foi a impugnante condenada apagar ao então requerente as diferenças de retribuição referentes a:férias e subsídios de férias resultantes da consideração dasremunerações do “saco azul” ou “caixa B” e da participação nos lucroscomo parte integrante da retribuição; prestações vencidas, desde adata do despedimento até à data da sentença, de remunerações pagaspor cheque do designado “caixa B” e da participação nos lucrosreferentes aos exercícios de 1988 a 1990; participação nos lucrosreferentes aos exercícios de 1986 e 1987; as retribuições vencidasdesde a data da suspensão até à data do despedimento; juros de moraaté total reembolso sobre os montantes anteriormente referidos;viii) em 24/04/1996, por apenso ao processo supra mencionado, foirequerida a execução da sentença, atendendo a que foram somenteliquidadas na sentença exequenda as prestações atinentes ao saláriobase, habitualmente processado por talão de salário;ix) em 13/07/2001 foi proferida sentença que ordenou o prosseguimento

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da execução pelo valor global de € 945.700, 61 (189.595.950$00),acrescido de juros de mora vincendos;x) por acórdão proferido em 21/10/2002 pelo Tribunal da Relação doPorto foi negado provimento ao recurso interposto por ambas as partes;xi) por decisão proferida em 20/01/2004 pelo Supremo Tribunal deJustiça foi condenada a ora impugnante a pagar o montante de €557.449,61;xii) a impugnante contabilizou, no exercício de 2004, na conta 698401— Outros Custos e Perdas Extraordinárias o montante de € 813.903,13;xiii) notificada para o efeito, a sociedade apresentou um mapa em quediscriminou o valor registado na referida conta 698401, sendo o mesmoreferente: ao montante da condenação no processo judicial, a IRS deconta do mencionado B………. pago pela sociedade, a descontos paraa Segurança Social, a juros de mora e a um acerto por erro efectuadonos cálculos;xiv) no exercício de 2004 anulou o montante provisionado em 1991 e1993.XXV. Atendendo ao que se expôs, não poderia a Autora alegar quesempre confiou plenamente no sucesso das suas pretensões nodissídio laboral que a opôs ao referido B…………, mormente porque(cfr. pág. 32 do RIT):i) constituiu uma provisão para outros riscos e encargos em 1991(aquando da decisão proferida em 1ª instância, desfavorável àimpugnante), no montante de € 374.098,00;ii) reforçou essa provisão em 1993 (após acórdão do Tribunal daRelação do Porto, de 28/09/1992, que confirmou a sentença proferidaem 1ª Instância, acórdão do qual a impugnante recorreu para oSupremo Tribunal de Justiça), no montante de € 124.699,00.XXVI. Ou seja, se o risco de vir a ser condenada naquele processofosse tão improvável e incerto como alega, não faria sentido aprudência evidenciada na constituição daquelas provisões;XXVII. À luz das mais elementares regras da experiência, face a setedecisões judiciais desfavoráveis (22/03/1991, 28/09/1992, 23/03/1995,24/04/1996, 13/07/2001, 21/10/2002 e 20/01/2004), o custo seria tudomenos imprevisível;XXVIII. Esta posição dos SIT, no sentido de considerar comonecessária a constituição da provisão, não constitui qualquermanifestação de ingerência na esfera das opções empresariais;XXIX. Não se trata de a AT se imiscuir na condução da actividadeempresarial e nas opções tomadas pelas empresas, mas unicamentede extrair consequências fiscais dessas mesmas opções, o que ésubstancialmente diverso;XXX. O entendimento dos SIT não contraria o espírito da lei, na medidaem que o processo judicial não pode ser apodado de “encargomeramente eventual”;XXXI. “Eventual” será o resultado desse processo, as suas“consequências” — usando a terminologia de MARIA DOS PRAZERESLOUSA (op. cit., pág. 121) — e não o facto gerador das mesmas, namedida em que este tem existência certa e material.XXXII. QUANTO AO SEGUNDO ARGUMENTO, o douto Tribunalrecorrido foi do entendimento de que só com o trânsito em julgado éque a impugnante pôde conhecer o exacto valor a pagar.XXXIII. Tal asserção colide com outra, extraída da mesma sentença, de

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acordo com a qual “a estimativa do montante da provisão deve serdeterminada com razoável aproximação”;XXXIV. Mal se compreende que o douto Tribunal a quo considere — ebem — que o montante da provisão seja apurado por estimativa para,depois, dar razão à impugnante afirmando que a provisão não podia serconstituída porque não se conhecia o “exacto valor a pagar”;XXXV. Ora, demonstrado que o douto Tribunal incorreu em erro dejulgamento por considerar não existe “qualquer irregularidade pelo factode a impugnante não ter criado a provisão em causa desde 1989” —constata-se que a argumentação vertida na sentença se desloca para ocampo da alegada APLICAÇÃO rígida, por parte da AT, DO PRINCÍPIODA ESPECIALIZAÇÃO DOS EXERCÍCIO.XXXVI. Considerando o douto Tribunal recorrido que o entendimento daAT violaria o princípio da justiçaXXXVII. Como consabido, vigora no ordenamento jurídico pátrio oprincípio da periodização do lucro tributável, o qual, não sendo emboraum princípio absoluto e hermético, imune às vicissitudes da vidasocietária, também não será, como pretende inculcar a Autora, umprincípio cuja ductilidade se encontra unicamente condicionada pelasopções empresariais;XXXVIII. Apesar da ligação entre este princípio da especializaçãoeconómica dos exercícios e o regime das provisões, aquele princípio dajustiça somente encontrará campo de aplicação quando, através deuma imposição rígida do princípio da especialização, se chegue aresultados de flagrante injustiça material;XXXIX. Tal sucederia no caso dos autos se a AT tivessedesconsiderado, quanto ao exercício de 2004, um custo referente a1989 e, relativamente ao qual, não se verificasse a necessidade deconstituir provisão;XL. Porém, a realidade dos autos é outra: a AT limitou-se adesconsiderar, no exercício de 2004, um custo que se reportava a1989, não contabilizado naquele ano e, em relação ao qual, a empresanão constituiu provisão, devendo tê-lo feitoXLI. Conquanto se não pretenda defender uma corrente formalista,também não será de aceitar a antinómica corrente voluntarista;XLII. A solução propugnada pelos SIT coloca-se, portanto, num outroplano, ainda que paralelo e interligado com o princípio da periodização— o da constituição ou não da provisão em causa;XLIII. Logo, quando um contribuinte — desde logo por força do princípioda prudência — deva constituir uma provisão em determinado períodoe não o faz, ao arrepio dos critérios objectivamente fixados na lei,coloca-se numa posição que lhe não possibilita a consideração daquelevalor como custo no exercício em que o mesmo se efectivou.XLIV. Ademais, conquanto não tenha qualificado tal vício, sustenta oTribunal a quo — em consonância com a impugnante — que aFUNDAMENTAÇÃO, no que respeita à prática de infracções, ÉOBSCURA E INCONGRUENTEXLV. Estamos no domínio da fundamentação do acto tributário,importando formular aqui a necessária distinção entre fundamentaçãoformal e fundamentação substancial do acto tributário;XLVI. Sabendo-se que a fundamentação incongruente ou obscuraequivale à falta de fundamentação, o douto Tribunal imputou àliquidação um vício de forma por falta de fundamentação formal;

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XLVII. No entanto, a fundamentação produzida revela com clareza asrazões que levaram a AT a desconsiderar aquelas importâncias comoencargos fiscalmente dedutíveis (a condenação da sociedade pelaprática de infracções ao Código do Trabalho), tanto mais que aimpugnante atribuiu à liquidação vício de violação de lei, denotando umcabal conhecimento dos motivos que conduziram às mencionadascorrecções;XLVIII. Questão diversa prende-se com o acerto de tal correcção, a qualnão poderá ser confundida com a eventual falta de fundamentação,visto que isso se situa já no plano da fundamentação substancial;XLIX. De qualquer modo, as correcções estribaram-se não só na nãoaceitação daquele montante como encargo fiscal mas também na nãoconstituição, por parte da impugnante, da aludida provisão, sendo queeste fundamento é, por si só, dotado de suficiente autonomia ecapacidade para justificar as correcções que o douto Tribunal entendeuanular.L. Finalmente, o douto Tribunal alicerçou também a sua decisãoanulatória no facto de, em sede de RECURSO HIERÁRQUICOreferente às correcções de IRC do exercício de 2005, a AT terreconhecido a dedutibilidade dos juros de mora;LI. No entanto, o que resulta daquela decisão é que a Direcção deServiços do IRC se limita a referir que os Serviços de InspecçãoTributária deveriam ter averiguado e analisado a correcta aplicação doprincípio da especialização dos exercícios para o ano de 2005, tal comoo fizeram para o ano de 2004;LII. Porém, tais Serviços de Inspecção entenderam fundar a correcçãopara o ano de 2005 unicamente no preceituado na alínea d) do n.º 1 doartigo 42.º do Código do IRC, o que, na óptica daquela Direcção deServiços, não se mostrou acertado;LIII. Como a fundamentação para a correcção do exercício de 2005 é aque consta no respectivo Relatório Final, não poderiam vir os Serviços,numa decisão de um recurso hierárquico, alterar tal fundamentação ousuprir as deficiências de tal Relatório, o que não significa que aquelecusto seja dedutível em 2005, mas sim que não poderiam os SIT terprocedido à correcção, devendo ter invocado fundamento diverso (aaplicação do princípio da especialização dos exercícios, tal comofizeram para o ano de 2004);LIV. Logo, aquela decisão do recurso hierárquico não equivale a umaaceitação daquele custo em 2005 à luz do aludido princípio daespecialização dos exercícios, pelo que a posição da AT se manteveimutável quanto aos dois exercícios.LV. Incorreu, assim, o douto Tribunal a quo em erro de julgamento dedireito, por violação do disposto:i) na alínea c) do n.º 1 do artigo 34.° do Código do IRC (redacção enumeração à data), devendo tal norma ser interpretada e aplicada nosentido de que a constituição de provisão para processos judiciais nãopode ficar dependente de uma mera expectativa quanto ao sucesso daacção, nem da quantificação exacta do montante em causa;ii) no artigo 18.º do Código do IRC, devendo tal norma ser interpretadae aplicada no sentido de que a consagração do princípio da justiça noque se refere à especialização dos exercícios não encontra campopleno de aplicação quando o contribuinte, devendo constituir umaprovisão para um determinado exercício, não o faz;

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iii) no artigo 77.° da Lei Geral Tributária, devendo tal norma serinterpretada e aplicada no sentido de que a fundamentação obscura eincongruente equivale a falta de fundamentação, determinando aanulação do acto por vício de forma e não por vício de lei.»

2 – A recorrida, A………….., SGPS, S.A apresentou contra-alegaçõesque rematou com as seguintes conclusões:«1. A correcção dos prejuízos fiscais que a Recorrida realizou no anode 2004 em causa nos autos recorridos foi fundamentada tanto nodisposto no n.º 2 do artigo 18.º como na alínea d) do n.º 1 do artigo42.º, ambos do Código do IRC na redacção em vigor à data dos factos.II. Invoca a ora Recorrente, como fundamento do recurso, a nulidadeprocessual decorrente da aparente preterição do disposto no artigo120° do CPPT, porquanto, alegadamente, não foram apreciadas asalegações finais que por escrito apresentou ao abrigo daquelenormativo, motivo por que requer a anulação de todos os termossubsequentes à data da apresentação em juízo das sobreditas,incluindo da douta sentença proferida nos autos recorridos, tudo aoabrigo do artigo 20l.º do CPC.III. Para tanto bastou-se a Recorrente com a singela alegação de que acircunstância de o proémio da sentença a quo não fazer referência àssuas alegações finais escritas conduz à necessária conclusão de quetais alegações não foram de todo apreciadas pela M.ma Juiz.IV. Partindo dessa conclusão, a Recorrente fundamenta que a alegadaomissão influiu na decisão da causa dado que nessas alegações aFazenda Pública tomara uma posição expressa sobre os documentosque a ora Recorrida juntou a fls. 148 a 184 dos autos.V. Porém, nem a circunstância de a M.ma Juiz a quo, por mero lapso,omitir referência às alegações da Recorrente conduz necessariamenteà conclusão de que estas não foram por ela apreciadas, nem de resto a“posição expressa” que a Fazenda Pública diz ter tomado sobre odocumento que a ora Recorrida juntou a fls. 148 a 184 dos autosinfluiria de algum modo no sentido da decisão final aqui recorrida.VI. Quanto à pronúncia da ora Recorrente sobre o documento de fls.148 a 184, consistiu na tentativa de preservar a legalidade do actoimpugnado, alicerçada no argumento de que a ilegalidade confessadapela Direcção de Serviços do IRC se limitou ao fundamento da alínea d)do n.º 1 do artigo 42.º, mas não ao do n.º 2 do artigo 18.º do Código doIRC.VII. Porém, a douta sentença recorrida julgou procedente a impugnaçãoconsiderando que a administração tributária errou na interpretação eaplicação que fez do artigo 18.º do Código do IRC, sem se referir àdecisão de 17 de Junho de 2011 da Senhora Directora de Serviços doIRC constante do documento de fls. 148 a 184 dos autos.VIII. De igual modo sem necessidade de recurso ao documento de fls.148 a 184 dos autos, a douta sentença recorrida julgou procedente aimpugnação considerando que a administração tributária também errouna interpretação e aplicação que fez da alínea d) do n.º 1 do artigo 42.ºdo Código do IRC, por ser “claramente contraditório com o que resultadas decisões proferidas pelo Tribunal do Trabalho e pelos TribunaisSuperiores, e mesmo com o que se encontra exarado no relatório” (cfr.pag. 10)IX. Em caso algum o juiz tem o dever de pronúncia sobre toda a

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matéria alegada. Seria descabido que se impusesse ao Tribunal atarefa de apreciar explicitamente cada uma das observações invocadaspelas partes sobre as quais não se suscita controvérsia no casoconcreto.X. Quanto ao mérito da decisão, também não merece a douta sentençarecorrida qualquer censura, devendo ser negado provimento aorecurso, mantendo-se a mesma nos seus precisos termos.XI. Segundo a Recorrente, não tendo a Recorrida deduzido a títuloprovisional um custo incorrido com o despedimento de um trabalhadorocorrido em 1988, não mais poderia deduzir esse custo a título efectivoquando, em 2004 o seu valor foi finalmente liquidado e se tomouconhecido por decisão judicial transitada em julgado.XII. Com esse fundamento, atribui a Recorrente à douta sentençarecorrida erro de julgamento de direito, por violação do disposto naalínea c) do n.º 1 do artigo 34.° e no artigo 18.º ambos do Código doIRC, por entender que a primeira deveria ser interpretada e aplicada nosentido de que a constituição de provisão para processos judiciais nãopode ficar dependente da expectativa quanto ao sucesso da acção nemda quantificação do montante em causa; e a segunda, no sentido deque o princípio da justiça não prevalece sobre a regra daespecialização dos exercícios quando o contribuinte, devendo constituiruma provisão para um determinado exercício, não o faz.XIII. Pretende assim a Recorrente que os encargos cujo valor só em2004 veio a ser liquidado pelo Supremo Tribunal de Justiça em sede derecurso de um pedido de liquidação que só em 1996 veio a serinterposto, já seriam conhecidos da Recorrida “desde 1989” ou “desde1991”, pelo que nalgum desses anos os deveria ter deduzido a títuloprovisional.XIV. Tivesse porém a ora Recorrida deduzido, em 1989 ou em 1991,uma provisão não inferior ao custo que viria a reconhecer em 2004, novalor de € 813.903,13, não deixaria certamente de ser confrontada pelaadministração tributária com o seu excesso ou com a suaespecialização indevida em face das circunstâncias à data conhecidas.XV. As circunstâncias à data conhecidas determinavam a plenaconvicção dos responsáveis da empresa sobre a manifestaimprocedência da pretensão do trabalhador despedido bem como atotal incerteza sobre o seu montante, razão pela qual não viram razãopara julgar ser fiscalmente dedutível uma provisão por remuneraçõesou indemnizações que lhe pudessem vir a ser exigidas.XVI. Numa questão de contornos tão incertos — incertos an, incertosquando e incertos quanto — não pode deixar de ser valorada aconvicção subjectiva do contribuinte à data dos factos, em detrimentodo juízo póstumo da administração tributária.XVII. Segundo entendimento pacífico deste Supremo TribunalAdministrativo não põe em causa o princípio da especialização deexercícios a imputação, a um exercício, de custos referentes aexercícios anteriores, desde que tal imputação não resulte de omissõesvoluntárias e intencionais com vista a operar a transferência deresultados entre exercícios.XVIII. Esse entendimento é exigido pelo princípio da justiça,consagrado no n.º 2 do artigo 266.º da Constituição da República e noartigo 55.° da Lei Geral Tributária.XIX. Foi com base nesta jurisprudência, fazendo prevalecer o princípio

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da justiça tributária sobre o da especialização dos exercícios, que adouta sentença recorrida concedeu provimento à impugnação judicial.XX. Pois não resulta dos autos que a imputação ao exercício de 2004do encargo fixado no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de20.01.2004, e pago nesse mesmo ano, tivesse resultado de omissõesvoluntárias e intencionais, com vista a operar transferência deresultados entre exercícios, como bem julgou a douta sentençarecorrida.XXI. Pelo contrário, a dar por verificado um erro da ora Recorrida nafalta de constituição da provisão fiscal, concluir-se-á que daí resultaramprejuízos apenas para a própria. Mesmo dando por verificado esse erro,ficou demonstrado que a Fazenda Nacional não saiu daí prejudicada.XXII. Não só reconheceu a douta sentença recorrida ser lícito até aotrânsito em julgado da decisão manter uma expectativa no sucesso daacção, e bem assim ser dificil constituir uma provisão fiscal para umprocesso judicial em curso quando o Réu desconhece o montanteconcreto que poderá ter de vir a pagar (como sucedeu no caso emapreço), como entendeu, face à prova produzida e carreada, que “dosautos, não resulta que tenha ocorrido qualquer prejuízo para a FazendaPública, nem tão pouco a administração fiscal imputou aocomportamento da impugnante uma prática intencional no sentido damesma retirar qualquer benefício resultante da aludida omissão” (cfr.pág. 10).XXIII. Mas mesmo assim insistiu a ora Recorrente em esgrimir contraextensa jurisprudência dos tribunais superiores da nossa jurisdiçãoadministrativa e fiscal, uniforme e reiterada, que aqui deverá mais umavez prevalecer.XXIV. Finalmente, não resulta do acórdão de 20.01.2004 do SupremoTribunal de Justiça, nem de qualquer outra decisão judicial proferida naacção declarativa ou executiva que o antecedeu, que a ora impugnantetenha sido condenada no pagamento de multas, coimas ou outrosencargos pela prática de infracções de qualquer natureza, pelo quehaverá de soçobrar a tentativa espúria da administração tributária emsalvar a correcção impugnada no disposto na alínea d) do n.º 1 doartigo 42.º do Código do IRC.»

3 – O Exmº Procurador Geral emitiu parecer a fls. 499 e segts. dosautos que, na parte relevante se transcreve:(…) Além do mais a recorrente vem arguir pretensa nulidade processualdecorrente da alegada não apreciação das alegações por si produzidasnos termos do artigo 120.º do CPPT, o que seria equivalente à omissãode notificação para produzir alegações.Ora, como resulta do despacho de fls. 489 a sentença recorrida não sealheou das alegações produzidas pela recorrente, sendo certo que,como é indiscutível, o tribunal recorrido não tem de apreciar todos osargumentos esgrimidos pelas partes.Não se verifica, pois, a alegada nulidade processual.Como resulta do probatório, o trabalhador da recorrente, B……………foi despedido em 1988.07.12, sendo certo que tal despedimento deuorigem a um litígio judicial laboral que decorreu entre 1989 e 2004, anoem que o STJ deu parcial provimento à pretensão do trabalhador,condenando a recorrente a pagar um total de € 813.0 903,13, a título deindemnização, juros de mora e contribuições para a segurança social.

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De acordo com o princípio da especialização dos exercícios, osproveitos e custos, assim como outras componentes positivas ounegativas do lucro tributável, são imputáveis ao exercício a que digamrespeito (artigo 18.º/1 do CIRC).«A imputação de um proveito ou custo a certo exercício obedece a umcritério económico (e não a um critério financeiro), ou seja, asoperações nele efectuadas afectam o respectivo resultado,independentemente do recebimento ou pagamento do respectivo preçoou outra contrapartida. Contabilizam-se créditos e custos e nãopagamentos e recebimentos.O n.º 3 do art. 18.º concretiza este princípio. A regra geral aí expressa éa de que proveitos e correspondentes custos se têm por ocorridos: navenda de bens, no momento da sua entrega ou colocação à disposição:nas prestações de serviços, no momento da sua conclusão.Inversamente não releva para a imputação temporal de um custo, omomento em que a empresa extingue os seus débitos, mas sim omomento em que tais obrigações nascem. Incluem-se, pois, nosproveitos e custos do exercício, os encargos com origem no mesmo,ainda que a receber ou a pagar no futuro.Esta regra geral sofre excepções. Interessará aqui focar o caso deterem acontecido pagamentos antecipados (ou seja, antes da entregado bem ou da conclusão do serviço). Sirvam de exemplo o pagamentode um sinal aquando da compra de um bem ou a entrega de uma«provisão» (adiantamento por conta de honorários) a uma sociedade deadvogados. Tais pagamentos originam um proveito (para a empresaque os recebe) e um custo (para a empresa que os efectua) imputáveisao exercício em que ocorrerem.Os momentos antes referidos, em que se considera ter acontecido oproveito ou o custo são, também, aqueles em que, por regra, nasce aobrigação do vendedor ou prestador de serviços emitir a factura oudocumento equivalente, comprovativa de tal operação.O mesmo é dizer que, em termos práticos e na normalidade dascircunstâncias, a data em que se deve ter por ocorrido o proveito ou ocusto será a do documento que os titula.Cabe aqui sublinhar que tendo a administração fiscal constatado, emsede de fiscalização, que um custo ou outra componente do lucrotributável foi, indevidamente, contabilizado num dado ano (ou seja, quehouve uma violação do princípio da especialização dos exercícios),deverá proceder à respectiva correcção, o que, normalmente, conduziráa uma liquidação adicional. Mas a administração fiscal tem, também, odever de fazer a «correcção simétrica, ou seja, a relativa ao exercícioem que tal custo, correctamente, deveria ter sido contabilizado. Doutraforma estar-se-ia, relativamente a este exercício, a tributar ocontribuinte por um rendimento que, efectivamente, não obteve, emclara violação do princípio da legalidade dos impostos.A exigência de uma «correcção simétrica» coloca-se em muitas outrassituações. Na prática, a administração fiscal tende a alterar o queresulta a seu favor (a proceder às correcções de que resulta aexigibilidade de mais imposto), esquecendo o seu dever legal de,oficiosamente, proceder às correcções favoráveis ao contribuinte que,em decorrência daquelas, se impõem. Atitude que parece gozar dealguma aceitação (injustificada), por parte dos tribunais.Mais, entendemos que não sendo a «correcção simétrica» possível, p.

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ex., por razões de tempestividade — deve, o custo, ainda queindevidamente contabilizado, ser aceite / (sem prejuízo da eventualaplicação de uma coima, decorrente da infracção constatada). De outraforma, desconsiderar-se-ia um custo efectivo e a empresa seria, porrazões de índole formal, sujeita (num horizonte temporal mais alargado,o do conjunto dos exercícios em causa) a uma tributação por um lucroque, efectivamente, não obteve.” (Apontamentos ao IRC, Professor RuiDuarte Morais, páginas 64, 65 e 70).A regra estatuída no n° do artigo 18.º do CIRC sofre a excepçãoregulada no n.º 2, de acordo com a qual as componentes positivas enegativas só não são imputáveis ao exercício quando na data doencerramento das contas daquele a que deveria ser imputadas eramimprevisíveis ou manifestamente desconhecidas.Ora, tendo a acção judicial sido intentada em 1989 e uma vez que aestimativa do montante da provisão deve ser determinada com umaaproximação razoável e não pelo exacto valor a pagar quando tal não épossível, parece-nos que, de facto, deveria ter sido constituída arespectiva provisão em 1989.De qualquer modo, pelas razões já atrás enunciadas, a AdministraçãoTributária não deveria ter procedido à correcção técnica em causa.Dado o tempo decorrido já não é possível proceder à correcçãosimétrica. No ano de 1989.Por outro lado, uma vez que não estão alegados/provados factosatravés dos quais se demonstre que houve a intenção deliberada deproceder à transferência de resultados de exercício ou de fuga àtributação, deveria a Administração Tributária abster-se de proceder àcorrecção, a fim de evitar a violação do princípio da legalidade dosimpostos. (Acórdãos do STA de 2006.01.25-P 0830/05 e de2008.04.02-P.0807/07, ambos disponíveis no sítio da Internetwww.dgsi.pt)Também, como muito bem sustenta a sentença recorrida, em função doprobatório, não tem aplicação ao caso em análise o estatuído no artigo42.º/l/d) do CIRC, uma vez que não estão em causa multas, coimasdemais encargos pela prática de infracções.Termos em que, salvo melhor juízo, pelas razões apontadas, devenegar-se provimento ao presente recurso jurisdicional, mantendo-se asentença recorrida na ordem jurídica.»

4 – Colhidos os vistos legais, cabe decidir.

5 – A sentença recorrida deu como provada a seguinte matéria defacto:1 — A impugnante foi objeto de uma inspeção tributária relativamenteaos exercícios de 2004 e 2005, cfr. relatório constante destes autos defls. 8 a 75 e que aqui se dão por reproduzidas.2 — Dessa inspeção, resultou entre outras, uma correção em sede deIRC do ano de 2004 no valor de € 813.903,13 e ora impugnada.3 — Os fundamentos para a dita correção referida em 2), encontram-seexarados no relatório constante destes autos de fls. 58 a 75 e cujosextratos a seguir se transcrevem relativamente às questões que aimpugnante discorda: “(...) Desde o ano de 1989 que corria contra aA………… Lda um processo contencioso no Tribunal de Trabalho deSanta Maria da Feira, instaurado pelo seu funcionário B…………., que

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fez parte dos seus quadros desde 03-01-77 até 02-09-87, altura em quefoi suspenso das suas funções de director. (...) Em 12-07-88 o referidodirector foi despedido da empresa. Por acção requerida por B……….,que correu termos no Tribunal de St. Maria da Feira veio estecolaborador, solicitar a sua reinserção nos quadros da empresa. A datada 1ª sentença foi de 22-03-91, em que foi considerado procedente opedido de B…………… Dando-se como provado que este usufruía,nessa data, de acordo com a sentença proferida em 22-03-91 asseguintes remunerações: (...) A A…………. contabilizou em 2004 naconta 698401-Outros Custos e Perdas Extraordinárias o valor de €813.903,13, referente ao processo judicial relativo ao antigocolaborador B…………….. que saiu da empresa (…) em 1987.(…) Osujeito passivo constitui provisões contabilísticas no exercício de 1991no valor de € 374.098,00, reforçando-as em 1993 em mais €124.699,00.(... ) No ano de 2004 anulou o montante provisionado de €498.797,00 (...) A A……….. considerou custo fiscal do exercício de2004, relevando na conta 6 98401 (O valor total de € 813.903,13referente ao processo judicial envolvendo B……………..(...) Comorelatamos anteriormente, este processo judicial teve o seu início em1989.(...) Nesta medida, sendo conhecida do sujeito passivo desde1989 a instauração contra ele de um processo judicial, bem como aexistência das sentenças desfavoráveis de 1991 e 2001, o encargo emquestão era mais do que provável, quase certo e perfeitamentequantificável, pelo que fica afastado o carácter de imprevisibilidade domesmo.(...) No que respeita a processos judiciais intentados contra umqualquer sujeito passivo, a concretização do principio daespecialização, aliado ao princípio da prudência, opera-se através daconstituição de uma provisão para processos judiciais em curso, que éaceite fiscalmente, no âmbito da actual alínea c) do n° 1 do art° 34.º doCIRC.(...) No caso em apreço a criação da provisão com efeitos fiscaisjustifica-se desde 1989. Dado que a decisão judicial de 2001 ascendeuao valor de 189.595,950 (€ 945.700,61), acrescido dos descontoslegais, a referida provisão deveria, em termos acumulados atingir, pelomenos, o valor referido. Desta forma o custo em questão seriaimputável aos exercícios a que respeitam, cumprindo-se o princípio daespecialização dos exercícios (...) Ao considerar o custo (...) comointegralmente imputável ao exercício de 2004, o sujeito passivo não deucumprimento ao princípio da especialização dos exercícios previsto noart° 18° do CIRC.(...) Em face do exposto, efectuou-se o acréscimo aolucro tributável declarado pelo grupo no exercício de 2004, (...) pelovalor de 813.903,13, por, por um lado, respeitar a encargos com aprática de infracções e, por outro, por não respeitar a periodização dolucro tributável, respectivamente (...)”.6 — B…………….. foi trabalhador da impugnante de onde foi despedidoem 12.07.1988.7 — O despedimento deu origem a um litígio judicial que decorreu entre1989 e 2004.8 — Após a apresentação de recursos nas respetivas instâncias até aoSupremo Tribunal de Justiça, foi proferido acórdão no sentido de darrazão parcial ao trabalhador identificado em 6).9 — O pedido inicial de € 1.057.079,53, decaiu para € 557.449,61,conforme acórdão do STJ de 20.01.2004 — processo 1399/03 - 4 e

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constante do documento n° 3 que se encontra junto à petição inicial eque se dá aqui por integralmente reproduzido.10 — A impugnante foi condenada em 20.01.2004 a pagar aotrabalhador a importância de € 557.499,61 a título de indemnização,bem como juros e contribuições para a segurança social, perfazendoum total de € 813.903,13.11 — A impugnante pagou a importância referida em 10, no ano de2004.12 — O recurso hierárquico apresentado pela ora impugnante foitotalmente indeferido, conforme despacho proferido em 10.09.2009 econstante destes autos de fls. 35 a 38 e que aqui se dão porreproduzidas.13 — Dá-se aqui por reproduzida a sentença proferida no Tribunal deTrabalho de Santa Maria da Feira, o acórdão proferido no Tribunal daRelação do Porto e o acórdão proferido no Supremo Tribunal de Justiçae constantes destes autos de fls. 193 a 356.14 — Dá-se aqui por reproduzido o despacho proferido no recursohierárquico apresentado pela impugnante contra as correções do anode 2005 e constante destes autos de fls. 150 a 184.15 — A petição inicial foi apresentada em 31 de Outubro de 2010, cfr.fls. 2 destes autos.

6. Do objecto do recurso

Da análise da sentença recorrida e dos fundamentos invocados pelarecorrente para pedir a sua alteração, podemos concluir que são asseguintes as questões objecto do recurso:a) A nulidade processual decorrente da invocada não apreciação dasalegações produzidas pela Fazenda Pública, nos termos do art.º 120.ºdo CPPT;b) O alegado erro de julgamento imputado à sentença recorrida, porviolação do disposto na alínea c) do n.º 1 do artigo 34.° e no artigo 18.ºambos do Código do IRC, ao, fazendo prevalecer o princípio da justiçatributária sobre o da especialização dos exercícios, ter julgadoprocedente impugnação judicial deduzida do despacho que indeferiurecurso hierárquico interposto de reclamação graciosa da correcçãoaos prejuízos fiscais do exercício de 2004, no montante de € 813.903.c) O alegado erro de julgamento na interpretação e aplicação dodisposto no artº 77º da LGT.

6.1 Da nulidade processual decorrente da alegada não apreciação dasalegações produzidas pela Fazenda Pública, nos termos do art.º 120.ºdo CPPT;

Invoca a Fazenda Pública a nulidade processual decorrente dapreterição do disposto no artigo 120° do CPPT, porquanto,alegadamente, não foram apreciadas as alegações finais que porescrito apresentou ao abrigo daquele normativo, motivo por que requera anulação de todos os termos subsequentes à data da apresentaçãoem juízo das sobreditas alegações, incluindo a sentença recorrida, tudoao abrigo do artigo 201.º do CPC.

Em síntese argumenta que existe, para efeitos da nulidade prevista no

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artº 201º, nº 1 do Código de Processo Civil, uma equivalência entre nãonotificar as partes para produzir alegações e notificá-las, mas não asapreciar, considerando-as inexistentes.E concluiu que esta alegada não apreciação das alegações produzidaspela Fazenda Pública, ao não permitir levar para a discussão da causao debate de facto e direito das questões nelas suscitadas, mormentesobre a pronúncia quanto à relevância ou irrelevância desses mesmosnovos documentos na apreciação e julgamento jurídico da suapretensão, nos termos consagrados na alínea e) do n.º 3 do artigo 652.°e no artigo 657.º, ambos do CPC, constitui a omissão de um actosusceptível de influir na decisão da causa.

Esta argumentação da Fazenda Pública não é porém, de acolher.

Em primeiro lugar cumpre sublinhar que constituem realidades bemdiversas a nulidade processual por falta de notificação para alegações,com violação do contraditório e a nulidade (da sentença) por falta deapreciação da matéria das alegações, a envolver, eventualmente,omissão de pronúncia.Com efeito o dever de facultar sempre às partes a oportunidade de,antes de a decisão ser proferida, se pronunciarem sobre qualquerquestão que as possa afectar e que ainda não tenham tidopossibilidade de contraditar, mesmo tratando-se de questõesmeramente de direito e que sejam de conhecimento oficioso, decorredo princípio do contraditório, e a sua omissão constitui nulidadeprocessual na medida em que seja susceptível de influir na decisão dacausa.Ora essa nulidade manifestamente não ocorre porque a FazendaPública foi notificada da junção dos docs de fls. 148-184 e requerimentoapresentado pela impugnante –fls. 357 – e subsequentemente paraproduzir alegações escritas, nos termos do artº 120º do CPPT, comoresulta de fls. 362.Quando muito, atenta a forma como a recorrente estrutura as suasalegações, o vício que imputa à sentença recorrida poderia, emabstracto, integrar omissão de pronúncia.De facto, embora invoque, como fundamento do recurso, a nulidadeprocessual decorrente da aparente preterição do disposto no artº 120ºdo CPPT, a recorrente vem sustentar, na concretização de tal alegação,que a sentença recorrida ignorou as alegações produzidas pelaFazenda Pública na sequência da notificação que lhe foi feita da junçãode documentos pela impugnante.Mas também aqui carece de razão.

Com efeito, de harmonia com o disposto nos arts. 608º n.º 2 e 615º n.º1 al. d) do Código de Processo Civil, ocorre omissão de pronúnciasusceptível de demandar a nulidade de sentença ou acórdão, quando oTribunal deixe de se pronunciar sobre questão submetida pelas partesà sua apreciação e decisão e que se não mostre prejudicada peloconhecimento e decisão porventura dado a outras.Contudo, e como também é jurisprudência corrente e pacífica, essaobrigação não significa que o juiz tenha de conhecer todos osargumentos ou considerações que a parte tenha produzido. Uma coisasão as questões submetidas ao tribunal e outra são os argumentos que

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se usam na sua defesa.Sendo que só têm dignidade de questões as pretensões processuaisformuladas pelas partes ao tribunal e não os argumentos por elasusadas em defesa das mesmas, não estando o tribunal vinculado aapreciar todos os argumentos utilizados pelas partes.Ou seja a omissão de pronúncia só existe «quando o tribunal deixa, emabsoluto, de apreciar e decidir as questões que lhe são colocadas, enão quando deixa de apreciar argumentos, considerações, raciocínios,ou razões invocados pela parte em sustentação do seu ponto de vistaquanto à apreciação e decisão dessas questões, sendo que, comoensina o Prof. Alberto dos Reis (Cfr. Código de Processo Civil, Anotado, vol. V,

pág. 143), «Quando as partes põem ao tribunal determinada questão,socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos parafazer valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida aquestão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ourazões em que eles se apoiam para sustentar a sua pretensão» (cf.,neste sentido, Acórdãos deste Supremo Tribunal Administrativo de27.05.2015, recurso 77/14, de 11.05.2016, recurso 1668/15).No caso vertente a Fazenda Pública fundamenta-se na circunstância deo proémio da sentença não se fazer referência às suas alegações finaisescritas, inferindo de tal facto que tais alegações não foram de todoapreciadas pela Tribunal a quo.Concretizando a invocada nulidade processual alega que a impugnantedeu entrada de um requerimento e respectivos documentos (de fls.148-184), referentes a uma decisão da Direcção de Serviços de IRCque recaiu sobre um recurso hierárquico interposto pela ora recorridarelativamente a IRC de 2005.Mais alega que tomou, nas alegações então produzidas posiçãoexpressa sobre a (ir)relevância de tais documentos para a decisão dacausa, sendo que o Tribunal recorrido não poderia ignorar, comoalegadamente ignorou, o teor de tais alegações, na medida em que,quer os documentos juntos pela parte, quer a sua apreciação por parteda recorrente, influenciaram o exame da causa.Consistem tais documentos no recurso hierárquico apresentado pelaRecorrida relativo ao exercício de 2005 que confirmou a dedutibilidade,nesse exercício de 2005, dos juros contados sobre a indemnizaçãopaga em 2004, cuja dedutibilidade se discutiu nos presentes autos e nadecisão de 17 de Junho de 2011 da Senhora Directora de Serviços doIRC nele proferida.Sobre tal decisão argumentava a Fazenda Pública que: "a posição daAT neste particular não sai minimamente beliscada pelo teor dodocumento (..) [pois deste apenas resulta que] os serviços deinspecção tributária deveriam ter averiguado e analisado a correctaaplicação do princípio da especialização dos exercícios para o ano de2005, tal como fizeram para o ano de 2004. No entanto, entenderamfundar a correcção para o ano de, 2005 unicamente no preceituado naalínea d) do n.º 1 do artigo 42, o do Código do IRC, o que, na ópticadaquela Direcção de Serviços, não se mostrou acertado" (cfr. pág. 7das alegações finais da FP).Sucede que a correcção aos prejuízos fiscais do ano de 2004, que éobjecto dos presentes autos, foi fundamentada no disposto quer no nº 2do artigo 18.°, quer na alínea d) do n.º 1 do artigo 42.°, ambos doCódigo do IRC na redacção em vigor à data dos factos.

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E a sentença recorrida julgou procedente a impugnação considerandoque houve uma errada interpretação e aplicação do artigo 18.° doCódigo do IRC pela Administração Tributária, sem que para tanto fossenecessário fazer relevar os documentos de fls. 148 a 184 dos autos.Ou seja, independentemente do teor da decisão de 17 de Junho de2011 da Sr.ª Directora de Serviços do IRC, a correcção impugnada,relativa ao exercício de 2004, foi julgada ilegal.Ora, como atrás se deixou sublinhado, o juiz não tem o dever depronúncia sobre toda a matéria alegada, tendo antes o dever deseleccionar apenas a que interessa para a decisão. Não se impondo aoTribunal apreciar explicitamente cada uma das observações invocadaspelas partes, nomeadamente quando sobre elas não se suscitacontrovérsia no caso concreto.

Ainda assim a sentença recorrida não deixou de fazer breve referênciaao teor do documento de fls. 148 a 184 dos autos e isto a propósito dacorrecção aos prejuízos fiscais do ano de 2004 ter sido fundamentadatambém no disposto no artº 42º, nº 1, al. d) CIRC, na redacção em vigorà data dos factos, norma da qual resultava não serem dedutíveis paraefeitos fiscais, as multas, coimas e demais encargos pela prática deinfracções, de qualquer natureza, que não tenham origem contratual,incluindo os juros compensatórios.E o que na sentença se exarou a este propósito é que a dedutibilidadeda indemnização fixada por decisão judicial de 2004, em causa nestesautos, não podia ser posta em causa tendo por base o disposto naalínea d) do nº 1 do artigo 42º do Código do IRC pelo facto de isso ser"claramente contraditório com o que resulta das decisões proferidaspelo Tribunal do Trabalho e pelos Tribunais Superiores, e mesmo com oque se encontra exarado no relatório" (cfr. sentença, fls.415).Poderá, nesta matéria, haver erro de julgamento, mas não há,claramente, omissão de pronúncia.Termos em que deverá improceder a invocada nulidade processual coma consequente manutenção do julgado.

6.2 Do alegado erro de julgamento imputado à sentença recorrida, porviolação do disposto na alínea c) do n.º 1 do artigo 34.° e no artigo 18.ºambos do Código do IRC

A sentença recorrida julgou procedente impugnação judicial deduzidado despacho que indeferiu recurso hierárquico interposto dereclamação graciosa da correcção aos prejuízos fiscais do exercício de2004, no montante de € 813.903,13, no entendimento de que não foiviolado o princípio da especialização dos exercícios por parte darecorrente ao imputar o custo fiscal de tal montante ao exercício de2004, pois só nesse ano foi fixada por decisão judicial a quantia devidaao trabalhador da empresa que a havia accionado judicialmente, emacção laboral, no ano de 1989, não havendo, assim, lugar àobrigatoriedade de constituição de provisões desde o referido ano de1989 e, mesmo que assim não fosse, a actuação da AdministraçãoTributária violaria o princípio da justiça previsto no artigo 266.º/2 daCRP, na medida em que já não poderá lançar mão da revisão daautoliquidação de IRC de 1989, por estar há muito ultrapassado o

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respectivo para o fazer.

Contra o assim decidido se insurge a Fazenda Pública alegando emsíntese o seguinte:- Apesar da ligação entre o princípio da especialização económica dosexercícios e o regime das provisões, o princípio da justiça somenteencontrará campo de aplicação quando, através de uma imposiçãorígida do princípio da especialização, se chegue a resultados deflagrante injustiça material;- Tal sucederia no caso dos autos se a Administração Tributária tivessedesconsiderado, quanto ao exercício de 2004, um custo referente a1989 e, relativamente ao qual, não se verificasse a necessidade deconstituir provisão;- Porém a Administração Tributária limitou-se a desconsiderar, noexercício de 2004, um custo que se reportava a 1989, não contabilizadonaquele ano e, em relação ao qual, recorrida não constituiu provisão,devendo tê-lo feito;- quando um contribuinte — desde logo por força do princípio daprudência — deva constituir uma provisão em determinado período enão o faz, ao arrepio dos critérios objectivamente fixados na lei, coloca-se numa posição que lhe não possibilita a consideração daquele valorcomo custo no exercício em que o mesmo se efectivou.

Entendemos porém, atentas as circunstâncias do caso vertente, quenão será de acompanhar este discurso jurídico.

O princípio da especialização dos exercícios, do qual resulta umasegmentação da vida das empresas em períodos de certo modoindependentes entre si, correspondentes ao ano civil, tem em vistatributar a riqueza gerada em cada exercício, respondendo também anecessidades de natureza económica, contabilística e de gestão.A periodização anual do imposto implica que tanto os rendimentoscomo os gastos (e as variações patrimoniais fiscalmente relevantes)sejam imputados a cada período de tributação. Esta imputação resultaessencialmente da aplicação das normas contabilísticas, justamenteporque o legislador entendeu que as regras de periodização aíprevistas oferecem um sistema coerente, fiável e eficaz também paraefeitos fiscais (Vide António Rocha Mendes, IRC e as Reorganizações Empresariais,ed. da Universidade Católica, pag. 72.).Por isso, como sublinha António Rocha Mendes (Ob. citada, pag. 72.), amaioria das regras descritas no artº 18º do CIRC são coincidentes comas regras de periodização dos rendimentos estabelecidas pelas normascontabilísticas.Aquele princípio vale assim para os casos em que os custos sãocontabilizados num exercício mas em que a despesa efectiva só ésuportada noutro, e para os casos em que o ganho ainda quecontabilizado num exercício, só é, de facto, recebido noutro. Ora emtais situações, em que existe desencontro entre a contabilização doscustos e dos proveitos e a sua efectiva concretização, a lei ordena queos mesmos sejam contabilizados à medida que sejam obtidos esuportados, e não à medida que o respectivo recebimento oupagamento ocorram.Daí que se devam imputar ao exercício os encargos que emergem de

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operações nele realizadas, ainda que nele não suportadas, do mesmomodo que se devem imputar a um exercício os proveitos resultantes deoperações nele feitas mesmo que arrecadados noutro (cfr. nestesentido Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 27/4/2008,recurso nº 0807/07).Com vista a evitar práticas de manipulação do cálculo do lucrotributável, nomeadamente o adiamento da tributação ou a suaconcentração em exercícios onde a tributação possa resultar maisfavorável, a lei fiscal consagra com grande rigidez este princípio daespecialização de exercícios (Rui Duarte Morais, Apontamentos ao IRC, Ed.

Almedina, pag. 69).Testemunho dessa rigidez é, como sublinha Rui Duarte Morais (Ob.

citada, pag. 70), o nº 2 do artº 18º do CIRC que dispõe que ascomponentes positivas ou negativas consideradas como respeitando aexercícios anteriores só são imputáveis ao exercício quando na data deencerramento das contas daquele a que deveriam ser imputadas eramimprevisíveis ou manifestamente desconhecidas.Constitui no entanto jurisprudência pacífica deste Supremo Tribunal quea rigidez deste princípio tem de ser colmatada ou temperada com ainvocação do princípio da justiça, nas situações em que, estando jáultrapassados todos os prazos de revisão do acto tributário e nãohavendo prejuízo para o Estado, se deve evitar cair numa injustiça nãojustificada para o administrado – vide, neste sentido, acórdãos daSecção de Contencioso Tributário de 19.11.2008, recurso 325/08, de02.04.2008, recurso 807/07, de 19.05.2010, recurso 214/07, de25.06.2008, recurso 291/08, de 09.052012, recurso 269/12 e de02.03.2016, recurso 1204/13.Foi com base nesta jurisprudência, fazendo prevalecer o princípio dajustiça tributária sobre o da especialização dos exercícios, que asentença recorrida concedeu provimento à impugnação judicial.

No caso resulta do probatório que na sequência do despedimento dotrabalhador da recorrente, B…………….., teve início um litígio judiciallaboral que decorreu entre 1989 e 2004, ano em que o SupremoTribunal de Justiça deu parcial provimento à pretensão do trabalhador,condenando a recorrente a pagar um total de € 813.903,13 a título deindemnização, juros de mora e contribuições para a segurança social.E a Administração Tributária desconsiderou, no exercício de 2004, essecusto que se reportava a 1989, não contabilizado naquele ano e, emrelação ao qual, a recorrida não havia constituído provisão, com aseguinte fundamentação:«(….) sendo conhecida do sujeito passivo desde 1989 a instauraçãocontra ele de um processo judicial, bem como a existência dassentenças desfavoráveis de 1991 e 2001, o encargo em questão eramais do que provável, quase certo e perfeitamente quantificável, peloque fica afastado o carácter de imprevisibilidade do mesmo.(...) No querespeita a processos judiciais intentados contra um qualquer sujeitopassivo, a concretização do princípio da especialização, aliado aoprincípio da prudência, opera-se através da constituição de umaprovisão para processos judiciais em curso, que é aceite fiscalmente,no âmbito da actual alínea c) do n° 1 do art° 34.º do CIRC.(...) No caso em apreço a criação da provisão com efeitos fiscaisjustifica-se desde 1989. Dado que a decisão judicial de 2001 ascendeu

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ao valor de 189.595,950 (€ 945.700,61), acrescido dos descontoslegais, a referida provisão deveria, em termos acumulados atingir, pelomenos, o valor referido. Desta forma o custo em questão seriaimputável aos exercícios a que respeitam, cumprindo-se o princípio daespecialização dos exercícios (...) Ao considerar o custo (...) comointegralmente imputável ao exercício de 2004, o sujeito passivo não deucumprimento ao princípio da especialização dos exercícios previsto noart° 18° do CIRC. (...) Em face do exposto, efectuou-se o acréscimo aolucro tributável declarado pelo grupo no exercício de 2004, (...) pelovalor de 813.903,13, por, por um lado, respeitar a encargos com aprática de infracções e, por outro, por não respeitar a periodização dolucro tributável, respectivamente (...)”.

A sentença recorrida entendeu, por um lado, que, muito embora aimpugnante tivesse conhecimento da acção interposta pelo trabalhador,só com a decisão final, tomou conhecimento do valor em concreto apagar, considerando lícito que, até ao trânsito em julgado da decisão,se criasse expectativa no sucesso da acção.E por isso concluiu não ser imputável à impugnante qualquerirregularidade pelo facto de não ter criado a respectiva provisão desde1989.Mas por outro lado ponderou também que actuação da AdministraçãoTributária implica uma violação do princípio da justiça previsto no artigo266.º/2 da CRP, na medida em que já não poderá lançar mão darevisão da autoliquidação de IRC de 1989, por estar há muitoultrapassado o respectivo para o fazer.Sendo com base em tal fundamentação que determinou a anulação dassindicadas correcções ao lucro tributável.

Pois bem, se é certo que, como sustenta a Fazenda Pública, os custosem questão não eram manifestamente imprevisíveis, já quanto àaplicação do princípio da justiça entendemos que não merece censurao juízo formulado pelo tribunal recorrido.De facto dúvidas não há que sendo a recorrida demandadajudicialmente por um trabalhador que exige o pagamento de quantias aque se considera com direito, ocorre, na procedência da acção, umaobrigação de pagamento que corresponde a um custo aceite pela leifiscal.Encargo esse para o qual a lei previa a constituição de provisão comrelevância fiscal (arº 34º, nº 1, al. c) do CIRC, na redacção então emvigor: provisões para ocorrer a obrigações e encargos derivados deprocessos judiciais em curso por factos que determinariam a inclusãodaqueles entre os custos do exercício).E, sendo certo que a constituição de uma provisão implica sempre umaavaliação por parte do sujeito passivo, haverá que notar que, comosublinha Rui Duarte Morais (Ob. citada, pags. 128/129.), dada a incertezaque qualquer pleito judicial envolve, existe sempre um risco real de aempresa ser condenada no valor total peticionado, pelo que,verificando-se os demais condicionalismos legais, deverá ser aceite arelevância fiscal de uma provisão correspondente ao montante dopedido.Por isso entendemos que, ao invés do que decidiu a sentençarecorrida, deveria de facto, ter sido constituída a respectiva provisão em

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1989.Ainda assim, e na linha do que atrás foi dito, entendemos que nãomerece censura o juízo formulado pelo tribunal recorrido ao fazerprevalecer o princípio da justiça sobre o princípio da especialização dosexercícios.Como bem nota o Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, a seguir oentendimento da Fazenda Pública, no sentido de que a referidaprovisão haveria de ser criada desde 1989, no ano de 2009, em que aAdministração Fiscal procedeu às correcções impugnadas, já aimpugnante não poderia proceder à revisão da autoliquidação de 1989,por há muito estar ultrapassado o respectivo prazo para o fazer, vendo-se assim impossibilitada de efectuar a dedução desse custo emqualquer dos anos.Numa situação destas, em que não seja possível a “correcçãosimétrica”, por razões de tempestividade, a doutrina (Neste sentido LeiGeral Tributária Anotada, Diogo Leite Campos, Benjamim Silva Rodrigues e JorgeLopes de Sousa, 4ª edição, Encontro da Escrita, pag. 454 e Rui Duarte Morais, ob.citada, pag. 70.) e a jurisprudência supracitadas vêem afirmando que ocusto, ainda que indevidamente contabilizado, deve ser aceite,nomeadamente quando a respectiva imputação não tenha resultado deomissões voluntárias e intencionais, com vista a operar transferência deresultados entre exercícios.De facto, como ficou sublinhado no referido Acórdão 214/07, «no casodo referido art. 18, n.º 1, do CIRC resulta uma vinculação para aAdministração, que, em regra, deve aplicar o princípio daespecialização dos exercícios na sua actividade de controle dasdeclarações apresentadas pelos contribuintes.Mas, o exercício deste poder de controle, predominantementevinculado, pode conduzir a uma situação flagrantemente injusta e,nessas situações, é de fazer operar o princípio da justiça, consagradonos arts. 266, n.º 2, da CRP e 55 da LGT, para obstar a que seconcretize essa situação de injustiça repudiada pela Constituição.Na ponderação dos valores em causa (por um lado o princípio daespecialização dos exercícios que é uma regra legislativamentearbitrária de separação temporal, para efeitos fiscais, de um factotributário de duração prolongada e, por outro lado, o princípio da justiça,que reflecte uma das preocupações nucleares de um Estado deDireito), é manifesto que, numa situação de incompatibilidade se devedar prevalência a este último princípio.»Neste contexto haveremos de concluir que serão de consideraranuláveis, por vício de violação de lei, actos de correcção da matériatributável que, como no caso subjudice, conduzam a situações injustasdeste tipo.Pelo que é de aceitar, para efeitos fiscais, a contabilização efectuadapela recorrida já que não estão alegados ou provados factos atravésdos quais se demonstre que houve a intenção deliberada de proceder àtransferência de resultados de exercício ou de fuga à tributação.A sentença recorrida, que se moveu nestes parâmetros, não merece,pois, censura.

6.3 Do alegado erro de julgamento na interpretação e aplicação dodisposto no artº 77º da LGT.Neste segmento do recurso, e se bem entendemos a alegação da

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Fazenda Pública, sintetizada nas conclusões XLIV a XLIX, pretende arecorrente que o Tribunal incorreu em erro de julgamento ao qualificar afundamentação das correcções efectuadas de «obscura eincongruente» sustentando que tais correcções não padecem de faltade fundamentação formal já que a fundamentação produzida revelacom clareza as razões que levaram a Administração Tributária aproceder às correcções e à não consideração dos encargos em causa.E alega na conclusão XLIX que tais correcções se estribaram «não sóna não aceitação daquele montante como encargo fiscal mas tambémna não constituição, por parte da impugnante, da aludida provisão,sendo que este fundamento é, por si só, dotado de suficiente autonomiae capacidade para justificar as correcções que o douto Tribunalentendeu anular».Esta alegação não é muito clara e só se compreende o seu verdadeiroalcance se se tiver em conta que a correcção aos prejuízos fiscais doano de 2004, objecto da presente impugnação, foi fundamentada querno disposto no artº 18º, nº 2, quer no disposto no artº 42º, nº 1, alínead) do CIRC, norma esta que, na redacção em vigor à data dos factosdispunha que eram dedutíveis para efeito de determinação do lucrotributável as multas, coimas e demais encargos pela prática deinfracções, de qualquer natureza, que não tenham origem contratual,incluindo os juros compensatórios.Ora, como atrás se referiu no ponto 6.1, o que na sentença se exarou aeste propósito é que a dedutibilidade da indemnização fixada pordecisão judicial de 2004, em causa nestes autos, não podia ser postaem causa tendo por base o disposto na alínea d) do nº 1 do artigo 42ºdo Código do IRC, sendo tal fundamento "claramente contraditório como que resulta das decisões proferidas pelo Tribunal do Trabalho e pelosTribunais Superiores, e mesmo com o que se encontra exarado norelatório".E de facto, não resulta do acórdão de 20.01.2004 do Supremo Tribunalde Justiça, nem de qualquer outra decisão judicial proferida na acçãodeclarativa ou executiva que o antecedeu, que a impugnante tenha sidocondenada no pagamento de multas, coimas ou outros encargos pelaprática de infracções de qualquer natureza, sendo que, como bem senota na decisão recorrida, o que resulta do relatório dos serviços defiscalização (fls. 73 v.) é que a as verbas pagas ao trabalhador, e postasem causa, respeitavam a remunerações, IRS, descontos para aSegurança Social, juros e erros de cálculo, que manifestamente nãocabem na previsão do invocado artº 42º, nº 1, al. d) do CIRC.

Improcede pois, também nesta parte, a alegação de recurso.

7. DecisãoTermos em que, face ao exposto, acordam os juízes da Secção deContencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em negarprovimento ao recurso.

Custas pela Fazenda Pública.

Lisboa, 14 de Março de 2018. – Pedro Delgado (relator) –Isabel Marques da Silva – Ascensão Lopes.

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