tese de doutorado -...
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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE
CENTRO DE CIÊNCIAS EXATAS E DA TERRA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIA E
ENGENHARIA DE MATERIAIS
TESE DE DOUTORADO
Estudo da molhabilidade de ligas de adição à base de prata
sobre insertos cerâmicos para aplicação em brocas perfuração
de poços de petróleo
Jorge Carlos Lopes Brás Silva Pereira
Orientador: Prof. Dr. Rubens Maribondo do Nascimento
Co-orientador: Prof. Dr. Antonio Eduardo Martinelli
Novembro de 2012
Natal, RN
JORGE CARLOS LOPES BRÁS SILVA PEREIRA
Estudo da molhabilidade de ligas de adição à base de prata sobre insertos cerâmicos para aplicação em brocas perfuração
de poços de petróleo
Tese apresentada ao Programa de Pós-
Graduação, do Centro de Ciências
Exatas e da Terra, da Universidade
Federal do Rio Grande do Norte, e ao
PRH 30 da ANP, como parte dos
requisitos necessários para a obtenção do
título de Doutor em Ciência e
Engenharia de Materiais.
Área de concentração: Materiais cerâmicos.
Orientador: Prof. Dr. Rubens Maribondo do Nascimento
Co-orientador: Prof. Dr. Antonio Eduardo Martinelli
Novembro de 2012
Natal, RN
UFRN / Biblioteca Central Zila Mamede.
Catalogação da Publicação na Fonte.
Pereira, Jorge Carlos Lopes Brás Silva.
Estudo da molhabilidade de ligas de adição à base de prata sobre
insertos cerâmicos para aplicação em brocas perfuração de poços de
petróleo. / Jorge Carlos Lopes Brás Silva Pereira. – Natal, RN, 2012.
222 f.: il.
Orientador: Prof. Dr. Rubens Maribondo do Nascimento.
Co-orientador: Prof. Dr. Antonio Eduardo Martinelli.
Tese (Doutorado) – Universidade Federal do Rio Grande do Norte.
Centro de Ciências Exatas e da Terra. Pós-Graduação em Ciência e
Engenharia de Materiais.
1. Engenharia dos materiais - Tese. 2. Interface metal-cerâmica - Tese.
3. Broca tricônica - Tese. 4. Brasagem - Tese. 5. Molhamento - Tese. 6.
Ângulo de contato – Tese. I. Nascimento, Rubens Maribondo do. II.
Martinelli, Antonio Eduardo. III. Universidade Federal do Rio Grande do
Norte. IV. Título.
RN/UF/BCZM CDU 620.1
DEDICATÓRIA
Dedico esta tese aos meus queridos pais… António e Maria…
Que abriram mão de seus sonhos para que eu pudesse realizar os meus.
v
AGRADECIMENTOS
A realização desta tese de doutoramento marca o fim de uma importante etapa da
minha vida. Gostaria de agradecer a todos aqueles que contribuíram de forma
decisiva para a sua concretização:
Ao PPGCEM – UFRN e aos seus responsáveis, que calorosamente me acolheram
e permitiram a realização deste trabalho.
À ANP e ao Programa de Recursos Humanos da ANP – PRH30 e seus
responsáveis pelo financiamento do trabalho e dos eventos que participei.
Ao Prof. Rubens Nascimento e Prof. Antonio Martinelli, pela sábia orientação e
transmissão de conhecimento, disponibilidade, amizade, paciência e toda a
confiança depositada em mim.
Ao Prof. Luís Rocha e ao DEM – UMinho pelo apoio, disponibilidade e cedência de
equipamentos e material de apoio. Um grande profissional e amigo.
Ao Prof. Carlos Tavares pela ajuda e meios colocados à disposição.
Ao Prof. N. Eustathopoulos pelas ideias e sábios comentários a este trabalho.
À Carol, pelo carinho, dedicação, paciência e incentivo, mesmo nos momentos
mais difíceis sempre esteve ao meu lado. Obrigado por ter acreditado.
Ao Marzo Dantas, irmão de adoção e amigo de todas as horas, pela pronta ajuda,
motivação e pelas risadas.
Aos meus colegas de laboratório: Jaciane, Wendel, João Moreno, Poliana,
Augusto, Elisinha, Auristela e Rosane, pela ajuda, motivação, troca de ideias,
amizade e pelos momentos felizes.
A todos os meus amigos, que de uma forma ou de outra estão sempre presentes
nos bons e maus momentos da vida.
vi
Tese (Doutorado em Ciência e Engenharia dos Materiais). Programa de Pós-Graduação em
Ciência e Engenharia dos Materiais, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal-
RN.
RESUMO
Interfaces Metal-Cerâmica estão presentes em brocas tricônicas de insertos cerâmicos duros
para utilização em perfuração de poços de petróleo. A ação combinada de corte,
esmagamento e desagregação de rochas causa degradação e falhas nas brocas, as quais
estão relacionadas ao desgaste, à fratura total ou parcial do corpo da broca ou dos insertos,
choque térmico, corrosão. Também o deficiente encaixe mecânico dos insertos cerâmicos
nos cones da broca pode dar origem ao seu destacamento e provocando uma série de danos
à broca. O aprimoramento no processo de produção de interfaces metal-cerâmica pode
eliminar ou minimizar algumas das falhas acima mencionadas nas brocas tricônicas,
otimizando o seu tempo de vida útil, e portanto, reduzindo o custo métrico de perfuração. A
brasagem é uma técnica bastante conhecida para união de metais e cerâmicos, podendo ser
uma excelente alternativa ao processo comum de encaixe mecânico dos insertos cerâmicos
no corpo de aço da broca. O fenómeno da molhabilidade tem um papel fundamental na
produção de uniões metal-cerâmica quando uma fase líquida está presente no processo.
Neste trabalho, ligas de adição com base no eutético 72Prata-28Cobre foram fundidas sobre
substratos de zircônia, nitreto de silício e carbeto de tungsténio/Co, em alto vácuo. A
evolução do ângulo de contato foi registrada graficamente, e as interfaces geradas
analisadas por MEV-EDX. A liga eutética AgCu não molhou qualquer um dos substratos
cerâmicos, revelando elevados ângulos de contato e sem qualquer interação química entre
os materiais. Os melhores resultados foram encontrados para os sistemas contendo 3%wt
titânio na liga AgCu. A presença de titânio na forma de soluto favorece a formação de
compostos molháveis termodinamicamente estáveis, aumentando significativamente a
condição de molhabilidade das cerâmicas.
Palavras-Chave: Interface Metal-Cerâmica, broca tricônica, brasagem, molhamento,
ângulo de contato.
vii
Tese (Doutorado em Ciência e Engenharia dos Materiais). Programa de Pós-Graduação em
Ciência e Engenharia dos Materiais, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal-
RN.
ABSTRACT
Metal-ceramic interfaces are present in tricone drill bits with hard ceramic inserts for oil
well drilling operations. The combination of actions of cutting, crushing and breaking up of
rocks results in the degradation of tricone drill bits by wear, total or partial rupture of the
drill bit body or the ceramic inserts, thermal shock and corrosion. Also the improper
pressfitting of the ceramic inserts on the bit body may cause its total detachment, and
promote serious damages to the drill bit. The improvement on the production process of
metal-ceramic interfaces can eliminate or minimize some of above-mentioned failures
presented in tricone drill bits, optimizing their lifetime and so reducing drilling metric cost.
Brazing is a widely established technique to join metal-ceramic materials, and may be an
excellent alternative to the common mechanical press fitting process of hard ceramic inserts
on the steel bit body for tricone drill bit. Wetting phenomena plays an essential role in the
production of metal/ceramic interfaces when a liquid phase is present in the process. In this
work, 72Silver-28Copper eutectic based brazing alloys were melted onto zirconia, silicon
nitride and tungsten carbide/Co substrates under high vacuum. Contact angle evolution was
measured and graphically plotted, and the interfaces produced were analysed by SEM-
EDX. The AgCu eutectic alloy did not wet any ceramic substrates, showing high contact
angles, and so without chemical interaction between the materials. Better results were
found for the systemns containing 3%wt of titanium in the AgCu alloy. The presence os
titanium as a solute in the alloy produces wettable cand termodinamically stable
compounds, increasing the ceramics„ wetting beahviour.
Keywords: Metal-Ceramic interface, tricone drill bits, brazing, wetting, contact angle.
viii
Índice
CAPÍTULO 1 ....................................................................................................................... 16 1. INTRODUÇÃO ............................................................................................................ 17
1.1. OBJETIVOS .......................................................................................................... 18 1.2. ENQUADRAMENTO PRÁTICO ........................................................................ 19 1.3. CARÁTER INOVADOR ...................................................................................... 19
CAPÍTULO 2 ....................................................................................................................... 20 2. PERFURAÇÃO DE POÇOS DE PETRÓLEO ............................................................ 21
2.1. TIPOS DE BROCAS ............................................................................................. 23 2.1.1. BROCAS SEM PARTES MÓVEIS ................................................................... 24 2.1.2. BROCAS COM PARTES MÓVEIS .................................................................. 30
2.2. DEGRADAÇÃO DE BROCAS COM INSERTOS DE WC-Co .......................... 34 2.2.1. DESGASTE POR ABRASÃO ........................................................................... 35 2.2.2. FRATURA NO INTERIOR DO INSERTO ...................................................... 36 2.2.3. CHOQUE TÉRMICO......................................................................................... 38
2.2.4. DESTACAMENTO TOTAL DO INSERTO WC-Co ....................................... 40 2.2.5. DANO POR DETRITOS.................................................................................... 42
2.2.6. CORROSÃO ..................................................................................................... 43
CAPÍTULO 3 ....................................................................................................................... 45
3. UNIÃO METAL-CERÂMICO .................................................................................... 46 3.1. MÉTODOS DE UNIÃO METAL-CERÂMICO .................................................. 49
3.1.1. UNIÃO MECÂNICA ......................................................................................... 51 3.1.2. UNIÃO COM ADESIVOS ................................................................................ 51 3.1.3. UNIÃO COM FASE VÍTREA ........................................................................... 51
3.1.4. UNIÃO POR DIFUSÃO NO ESTADO SÓLIDO ............................................. 52 3.1.5. SOLDAGEM POR FUSÃO ............................................................................... 52
3.1.6. UNIÃO POR BRASAGEM ............................................................................... 53 3.2. MOLHABILIDADE, ESPALHAMENTO E ADESÃO ....................................... 59 3.2.1. MOLHABILIDADE PASSIVA OU NÃO REATIVA ...................................... 59
3.2.2. MOLHABILIDADE REATIVA ........................................................................ 64 CAPÍTULO 4 ....................................................................................................................... 84
4. SELEÇÃO DE MATERIAIS ....................................................................................... 85 4.1. MATERIAIS CERÂMICOS ................................................................................. 86 4.1.1. ZIRCÔNIA ......................................................................................................... 87
4.1.2. NITRETO DE SILÍCIO...................................................................................... 89 4.1.3. CARBETO DE TUNGSTÊNIO COM MATRIZ DE COBALTO .................... 91 4.2. MATERIAIS METÁLICOS.................................................................................. 92 4.2.1. LIGA DE ADIÇÃO ............................................................................................ 92
CAPÍTULO 5 ....................................................................................................................... 94
5. MATERIAIS E MÉTODOS ......................................................................................... 95
5.1. MATERIAIS ......................................................................................................... 95
5.1.1. INSERTOS CERÂMICOS ................................................................................. 95 5.1.2. LIGAS DE ADIÇÃO .......................................................................................... 99 5.1.3. PONTA DE TITÂNIO ..................................................................................... 102
ix
5.2. MÉTODOS .......................................................................................................... 103 5.2.1. SISTEMA METAL/CERÂMICA .................................................................... 103 5.2.2. PREPARAÇÃO DE AMOSTRAS ................................................................... 103 5.2.3. ANÁLISE SUPERFICIAL ............................................................................... 106
5.2.4. ENSAIOS DE MOLHABILIDADE ................................................................ 106 5.2.5. MICROSCOPIA ELETRONICA POR VARREDURA (MEV) COM
MICROANÁLISE POR ESPETROMETRIA ENERGIAS DISPERSIVAS (EDS) . 111 CAPÍTULO 6 ..................................................................................................................... 112
6. RESULTADOS E DISCUSSÃO................................................................................ 113
6.1. RUGOSIDADE ................................................................................................... 113
6.2. MOLHAMENTO E ANÁLISE MEV-EDS ........................................................ 117
6.2.1 SISTEMA M/C: LIGA BRASAGEM / ZIRCÔNIA ........................................ 117 6.2.2. SISTEMA M/C: LIGA BRASAGEM / NITRETO DE SILÍCIO .................... 153 6.2.3. SISTEMA M/C: LIGA BRASAGEM / CARBETO DE TUNGSTENIO ....... 170
CAPÍTULO 7 ..................................................................................................................... 198
7. CONCLUSÕES .......................................................................................................... 199 TRABALHOS FUTUROS ................................................................................................. 202
SUGESTÕES PARA TRABALHOS FUTUROS .......................................................... 203 REFERÊNCIAS ................................................................................................................. 205
REFERÊNCIAS: ............................................................................................................ 206
x
ÍNDICE DE FIGURAS Figura 1 - Coluna de perfuração. .......................................................................................... 21
Figura 2 – Brocas com lâminas de aço tipo fishtail. ............................................................. 24 Figura 3 – Broca de diamantes naturais. ............................................................................... 25 Figura 4 - Brocas sem partes móveis tipo PDC. ................................................................... 27 Figura 5 – Brocas impregnadas. ........................................................................................... 28 Figura 6 – Tipos de brocas de cones: monocônica, bicônica e tetracônica. ......................... 30 Figura 7 – Constituição das brocas com partes móveis, tricônicas. ..................................... 31
Figura 8 – Brocas com circulação regular de fluido (A), circulação com distribuição de ar
(B) e circulação de jato de ar (C). ......................................................................................... 32
Figura 9 – Desgaste generalizado em broca tricônica (A) e em um inserto WC-Co (B). .... 35 Figura 10 - Aspeto geral da broca tricônica com degradação por fratura no interior (A),
fratura no interior do inserto (B). .......................................................................................... 36 Figura 11 – Mecanismo de fratura no interior do inserto. .................................................... 37
Figura 12 – Padrão das trincas superficiais com origem no choque térmico. ...................... 38 Figura 13 - Perda de material do inserto por trincas “térmicas”. ......................................... 39
Figura 14 – Destacamento do inserto WC-Co em brocas tricônica (A) e broca PDC (B). .. 40 Figura 15 – Folga no encaixe do inserto (A) e lacuna causada pelo destacamento completo
(B). ........................................................................................................................................ 41
Figura 16 – Dano feito por detritos em broca tricônica. ....................................................... 42
Figura 17 – Efeito da corrosão na superfície do inserto WC-Co.......................................... 44 Figura 18 – Processos de união metal-cerâmico. ................................................................. 50 Figura 19 – Gota séssil, ângulo de contato. .......................................................................... 60
Figura 20 - Comportamento do ângulo de contato: a) não-molhável, e b) molhável. .......... 60 Figura 21 - Formação da camada de reação no processo da molhabilidade reativa. ............ 64
Figura 22 – Modelo RPC proposto por Eustathopoulos – Ângulo de contato inicial: (a)
depois de um transiente, é estabelecido um estado de quase equílibrio na linha tríplice e o
avanço do líquido é inibido pelo substrato, (b) e (c) a única maneira do movimento
continuar é pelo crescimento lateral de cada lado do produto de reação (P). ....................... 66 Figura 23 – Modelo de molhabilidade reativa, proposto por Saiz et al. , onde existe
escoamento líquido (a); adsorção de elementos ativos (b); formação e crescimento de uma
frente na tripla interface (c-d). .............................................................................................. 67 Figura 24 - Comportamento da molhabilidade das ligas de Ti-AgCu e Zr-AgCu sobre AlN.
.............................................................................................................................................. 71
Figura 25 - Variação do ângulo de contato no sistema NiPd-Ti- Alumina monocristalina, a
temperatura de 1300ºC, em função da fração molar de Ti. .................................................. 72 Figura 26 – Variação do ângulo de contato em função do tempo e temperatura, para as
concentrações de 0.7Ti (o), 2.9Ti (■) e 8.0Ti (▲) em % at. ................................................ 73 Figura 27 – Coeficiente de atividade do Ti no eutético AgCu fundido a 1000ºC em função
da concentração de Ti. .......................................................................................................... 74 Figura 28 – Efeito da concentração de Cu no coeficiente de atividade de Ti, no eutético
AgCu contendo 1 %wt Ti, a 1000ºC em alto vácuo. ............................................................ 75
Figura 29 - Efeito da concentração de Ag no coeficiente de atividade de Ti, no eutético
AgCu contendo 1 %wt Ti, a 1000ºC em alto vácuo. ........................................................... 76 Figura 30 - Oxigénio dissolvido no metal líquido (Xo). ....................................................... 79
xi
Figura 31 – Compilação de ângulos de contato experimentais de sistemas Metal líquido
puros/ Óxido Vs fração molar de oxigénio calculada no metal líquido, devido a dissolução
do óxido. ............................................................................................................................... 81 Figura 32 - Mecanismos de Naidich(a) e Tournier(b) para adsorção de oxigénio na interface
metal/óxido. .......................................................................................................................... 82 Figura 33 – Superfície e microestrutura da zircônia parcialmente estabilizada com magnésia
(a-b), e com ítria (c-d) ........................................................................................................... 96 Figura 34 - Microestrutura do nitreto de silício. ................................................................... 97 Figura 35 - Microestrutura do carbeto de tungstênio com 12% cobalto. ............................. 98
Figura 36 – Diagrama de fases para Ag-Cu. ........................................................................ 99
Figura 37 - Microestrutura da liga de adição AgCu. .......................................................... 100
Figura 38 - Microestrutura da liga de adição AgCu3Ti. ..................................................... 100 Figura 39 – Sistemas M/C em estudo: a) AgCu-cerâmica; b) AgCu-cerâmica metalizada
com Ti e .............................................................................................................................. 103 Figura 40 – Sistema para metalização mecânica das superfícies cerâmicas. ..................... 104
Figura 41 – Rugosímetro S5P da Mahr Perthen. ................................................................ 106 Figura 42 – Set-up para os ensaios de molhabilidade: a) filmadora digital; b) forno; c)
bomba de vácuo secundário; d) medidor de pressão. ......................................................... 107 Figura 43 – Esquema de medição dos ângulos de contacto para um dado sistema. ........... 108 Figura 44 – Esquema de montagem dos ensaios de molhabilidade no forno. .................... 108
Figura 45 - Ciclo térmico aplicado aos sistemas M/C na realização dos ensaios de
molhabilidade. .................................................................................................................... 109 Figura 46 - Microscópio Eletrónico de Varredura (MEV). ................................................ 111 Figura 47 – Superfície da zircônia YPSZ metalizada com Ti. ........................................... 114
Figura 48 - Filme de Ti depositado na superfície YPSZ. ................................................... 115 Figura 49 - Porcentagem de defeitos na superfície das cerâmicas metalizadas. ................ 115
Figura 50 - Valores de Ra para os sistemas polido e metalizado com Ti. .......................... 116 Figura 51 – Ângulo de contato versus temperatura para os sistemas: liga adição/zircônia 118 Figura 52 – Ângulo de contato versus tempo de estágio a 880ºC para os sistemas: liga de
adição/zircônia .................................................................................................................... 118 Figura 53 – Evolução da molhabilidade da liga AgCu sobre substrato Y-PSZ polido,
durante o aquecimento. ....................................................................................................... 123
Figura 54 – Evolução da molhabilidade da liga AgCu sobre o substrato Y-PSZ polido,
durante o tempo de estágio a 880ºC. .................................................................................. 123 Figura 55 – Evolução da molhabilidade da liga AgCu sobre o substrato M-PSZ polido,
durante o aquecimento. ....................................................................................................... 124 Figura 56 - Evolução da molhabilidade da liga AgCu sobre o substrato M-PSZ polido,
durante o tempo de estágio a 880ºC. .................................................................................. 124 Figura 57 - Evolução da molhabilidade da liga AgCu sobre o substrato M-PSZ metalizado
com Ti, durante o aquecimento. ......................................................................................... 126
Figura 58 - Evolução da molhabilidade da liga AgCu sobre o substrato M-PSZ metalizado
com Ti, durante o tempo de estágio a 880ºC. ..................................................................... 126 Figura 59 – Corte transversal do par: (a) AgCu/ MPSZ metalizada com Ti, e (b)
AgCu/YPSZ polida. ............................................................................................................ 128 Figura 60 – Evolução do molhabilidade da liga de adição AgCu3Ti sobre o substrato
YPSZ, durante o aquecimento. ........................................................................................... 129
xii
Figura 61 – Evolução da molhabilidade da liga de adição AgCu3Ti sobre o substrato
MPSZ, durante o aquecimento. .......................................................................................... 129 Figura 62 – Evolução da molhabilidade da liga de AgCu3Ti sobre o substrato YPSZ,
durante o tempo de estágio de 15min, a 880ºC. ................................................................. 130
Figura 63 – Evolução da molhabilidade da liga AgCu3Ti sobre o substrato MPSZ, durante
o tempo de estágio de 15min, a 880ºC. .............................................................................. 130 Figura 64 – Sistema AgCu3Ti-MPSZ completo (a) e em “cross-section”(b). .................. 132 Figura 65 - Diagrama de fases Zr-O. .................................................................................. 134 Figura 66 - Mecanismo de interação na interface Ti-ZrO2 no estado sólido, para os sistemas
da zircônia metalizada com Ti. ........................................................................................... 136
Figura 67 – Gota séssil AgCu sobre YPSZ polida (a) e metalizada com Ti (b). ................ 138
Figura 68 – Microestrutura da interface de AgCu sobre YPSZ polida e metalizada com Ti.
............................................................................................................................................ 138 Figura 69 – Interface do sistema: AgCu – filme Ti – YPSZ. ............................................. 139 Figura 70 - Gota séssil AgCu3Ti sobre zircônia MPSZ polida. ......................................... 141
Figura 71 – Gota séssil AgCu3Ti sobre a zircônia YPSZ polida. ...................................... 141 Figura 72 - Diagrama de fases ZrO2 – MgO. ..................................................................... 145
Figura 73 - Diagrama de fases ZrO2 – Y2O3. ..................................................................... 146 Figura 74 - Diagrama de fases ternário Ti-Cu-O. ............................................................... 147 Figura 75 – Microestrutura da interface do sistema AgCu3Ti – MPSZ . ........................... 149
Figura 76 – Microestrutura da interface do sistema AgCu3Ti - YPSZ . ............................ 149
Figura 77 - Ângulo de contato versus temperatura para o sistema: liga adição / Si3N4. .... 153 Figura 78 – Ângulo de contato versus tempo de estágio a 880ºC, para o sistema: liga de
adição / Si3N4. ..................................................................................................................... 153
Figura 79 – Sistemas AgCu sobre nitreto de silício polido (a) e metalizado com Ti (b). . 155 Figura 80 – Evolução da gota de AgCu sobre Si3N4 metalizado com Ti, durante o
aquecimento. ....................................................................................................................... 156 Figura 81 – Evolução da gota de AgCu sobre Si3N4 metalizado com Ti, durante o tempo de
estágio a 880ºC. .................................................................................................................. 156
Figura 82 - Evolução da gota de AgCu3Ti sobre Si3N4, durante o aquecimento. .............. 157 Figura 83 – Evolução da gota de AgCu3Ti sobre Si3N4 , durante o tempo de estágio a
880ºC. ................................................................................................................................. 158
Figura 84 – Sistema AgCu3Ti/Si3N4 completo (a) e em cross-section (b). ....................... 158 Figura 85 - Gota séssil AgCu sobre nitreto de silício polido (a) e metalizado com Ti (b). 159 Figura 86 – Microestrutura sistemas AgCu – Si3N4 polido (a) e metalizado com Ti (b). .. 160
Figura 87 – Gota séssil de AgCu3Ti sobre nitreto de silício. ............................................. 161 Figura 88 - Microestrutura do sistema AgCu3Ti – nitreto de silício. ................................ 161 Figura 89 - Interface AgCu3Ti - nitreto de silício. ............................................................. 162 Figura 90 - Diagrama de fases Ti-Si. .................................................................................. 164 Figura 91 - Diagrama de fases Ti-N. .................................................................................. 165
Figura 92 – Ângulo de contato versus temperatura para liga de adição sobre WC-Co. ..... 170 Figura 93 – Ângulo de contato versus tempo de estágio a 880ºC da liga de adição sobre
WC-Co. ............................................................................................................................... 170
Figura 94 - Evolução da gota de AgCu sobre WC-Co polido, durante o aquecimento...... 175 Figura 95 - Evolução da gota de AgCu sobre WC-Co polido, durante o tempo de estágio a
880ºC. ................................................................................................................................. 175
xiii
Figura 96- Evolução da gota de AgCu sobre WC-Co metalizado com Ti, durante o
aquecimento. ....................................................................................................................... 177 Figura 97 - Evolução da gota de AgCu sobre WC-Co metalizado com Ti, durante o tempo
de estágio a 880ºC .............................................................................................................. 177
Figura 98 - Sistemas AgCu sobre WC-Co polido (a) e metalizado com Ti (b). ............... 178 Figura 99 - Evolução da gota de AgCu3Ti sobre WC-Co polido, em função da temperatura.
............................................................................................................................................ 179 Figura 100 – Evolução da gota AgCu3Ti sobre WC-Co polido, em função do tempo de
estágio a 880ºC. .................................................................................................................. 179
Figura 101 – Sistema AgCu3Ti/WC-Co completo (a) e em cross-section (b). .................. 180
Figura 102 - Gota séssil AgCu sobre nitreto de silício polido (a) e metalizado com Ti (b).
............................................................................................................................................ 181 Figura 103 - Microestrutura sistemas AgCu / WC-Co polido (a) e metalizado com Ti (b).
............................................................................................................................................ 181 Figura 104 - Microestrutura do sistema AgCu3Ti / WC-Co. ............................................. 182
Figura 105 - Microestrutura do sistema AgCu3Ti/WC-Co. ............................................... 183 Figura 106 - Microestrutura do sistema AgCu3Ti / WC-Co. ............................................ 184
Figura 107 – Diagrama de fases Ti-C. ................................................................................ 186 Figura 108 – Microestrutura da área central da liga AgCu3Ti após solidificação. ............ 188 Figura 109 – Diagrama de fases Ti-Cu. .............................................................................. 190
Figura 110 - Ângulo de contato versus tempo de estágio a 880ºC, da liga AgCu sobre os
substratos metalizados. ....................................................................................................... 191 Figura 111 - Sistema C/C - zircônia metalizada com Ti/AgCu/zircônia polida. ................ 192 Figura 112 - Molhamento de par M/C por liga de adição. ................................................. 193
Figura 113 – Ângulo de contato versus tempo de estágio a 880ºC, da liga AgCu3Ti sobre
todos os substratos. ............................................................................................................. 194
Figura 114 - Relação entre energia livre de Gibbs e ângulo de contato para as diferentes
cerâmicas. ........................................................................................................................... 195
xiv
ÍNDICE DE QUADROS
Quadro 1 - Características dos insertos de WC-Co [22]. ..................................................... 33
Quadro 2 – Características de alguns métodos de união metal-cerâmica [40]. .................... 50 Quadro 3 - Pares M/C para experimentos de molhabilidade .............................................. 110 Quadro 4 - Rugosidade média (Ra) dos substratos polidos e metalizados com Ti. ........... 113 Quadro 5 - Dados termoquímicos para as frações molares de oxigénio dissolvido no líquido
Ag e Cu. .............................................................................................................................. 120
Quadro 6 - Volume, perda de massa e área espalhada para a liga AgCu3Ti ...................... 142
ÍNDICE DE TABELAS
Tabela 1 - Composição química dos aços e suas identificações. Porcentagem em massa e
balanço em Ferro (Fe). .......................................................................................................... 29 Tabela 2 - Coeficientes de expansão e condutividade térmica de alguns materiais. ............ 48 Tabela 3 - Medidas de espessura camada de reação e ângulo de contato. ........................... 66
Tabela 4 – Ângulo de contato e produtos de reação formados na interface para diferentes
concentrações de Ti na liga AgCu sobre alumina [96]. ........................................................ 74 Tabela 5 - Propriedades físicas e mecânicas de algumas cerâmicas [109-113]. .................. 87 Tabela 6 - Composição da química das ligas de adição [126, 127]. ................................... 101
Tabela 7 - Propriedades físicas e mecânicas das ligas de adição [126, 127]. ..................... 101 Tabela 8 - Composição química da ponta de Titânio [125]. .............................................. 102
Tabela 9 - Propriedades físicas e mecânicas do CP Titânio Grade 2 [125]. ....................... 102 Tabela 10 – Composição química das zonas A, B e C do sistema AgCu – filme Ti – YPSZ.
............................................................................................................................................ 140
Tabela 11 - Composição química e espessura das camadas de reação. .............................. 149 Tabela 12 - Composição química da camada de reação e zonas adjacentes do sistema
AgCu3Ti - Si3N4. ................................................................................................................ 163
Tabela 13 - Composição química da camada de reação, zonas adjacentes do sistema
AgCu3Ti /WC-Co............................................................................................................... 184 Tabela 14 – Composição química da zona central da liga AgCu3Ti. ................................ 189
xv
UFRN - PPGCEM
CAPÍTULO 1
INTRODUÇÃO
Jorge Carlos Pereira
Novembro 2012
Natal - RN
No Capítulo 1 faz-se uma breve introdução à temática da tese. Enunciam-se também os objetivos propostos, o enquadramento pratico-industrial e a contribuição inovadora do trabalho.
Capítulo 1 --- Introdução --- 17
1. INTRODUÇÃO
Uniões metal-cerâmica estão presentes nos mais diversos campos
tecnológicos, desde a indústria automobilística (ex: discos de freio), aeronáutica
(ex: revestimentos térmicos); eletrónica (ex: capacitores); elétrica (ex: lâmpadas),
biomecânica (ex: próteses) [1-3]. Também na indústria do petróleo e gás natural,
tem-se a presença de uniões metal-cerâmica em diversos tipos de equipamentos,
tais como: brocas, colunas de perfuração, ferramentas de monitorização e controle
de trajetória do poço, ferramentas de perfilagem, entre outros [4]. Esses
equipamentos, após algum tempo de serviço, podem apresentar problemas de
desgaste acentuado e/ou falha no mesmo. As brocas tricônicas com insertos
cerâmicos duros, frequentemente utilizadas em perfuração de poços de petróleo e
gás natural, são exemplos marcantes de equipamentos que constantemente
apresentam falhas de diversos tipos, contribuindo assim para o aumento dos
custos de produção.
A união entre materiais metálicos e cerâmicos é um processo complexo por
se tratar de materiais com propriedades físicas (ex. coeficiente de expansão
térmica), químicas (ex: tipo de ligação) e mecânicas (ex. tenacidade)
completamente díspares. A grande maioria dos processos de união envolve o
aquecimento do sistema metal-cerâmica. Após o arrefecimento, diferenças nos
módulos de elasticidade e coeficiente de expansão térmica originam o
desenvolvimento de um campo de tensões residuais, o qual tem maior incidência
junto à interface, podendo conduzir à fratura da mesma. Uma maneira para
atenuar esse campo de tensões residuais é através da introdução de um metal ou
liga dúctil entre os materiais a unir [5-7].
A brasagem é uma técnica extensivamente utilizada para ligar pares metal-
metal, metal-cerâmica, e cerâmica-cerâmica. Algumas cerâmicas apresentam um
comportamento não-molhável e nesses casos será necessário promover a
molhabilidade das superfícies sólidas através de: pré-metalização da parte
cerâmica antes da brasagem ou utilizando ligas de adição com elementos “ativos”.
Titânio, zircónio e alumínio são exemplos de metais de adição, os quais formam
Capítulo 1 --- Introdução --- 18
compostos termodinamicamente estáveis na interface, podendo criar uma
continuidade química entre as duas partes a unir [3,5-8]. Essa continuidade
química pode refletir-se na obtenção de um sistema multicamada entre os
materiais a unir, podendo melhorar a adesão e fornecendo uma transição suave
entre a parte metálica dúctil e a cerâmica frágil, minimizando assim o campo de
tensões gerado pela diferença no coeficiente de expansão térmica [5,8].
A brasagem dos insertos cerâmicos no corpo metálico da broca, poderá
resolver as falhas mais comuns em brocas tricônicas. Podendo ter como resultado
a obtenção de uniões mais estáveis e resistentes, traduzindo-se no prolongamento
do tempo de vida útil das brocas, diminuindo assim os custos associados à
substituição ou reparo da broca na operação de perfuração de poços petróleo.
Desta forma se compreende que os fenômenos da molhabilidade,
espalhamento e adesão possuem um papel ativo e dinâmico, sendo de vital
importância em processos de união metal-cerâmica que contém uma fase líquida,
como é o caso da brasagem.
1.1. OBJETIVOS
O principal objetivo desta tese de doutorado é o estudo da molhabilidade
em novos sistemas de união entre uma liga metálica de adição e algumas
cerâmicas, visando aplicação posterior em brocas para perfuração de poços do
petróleo. Como objetivos específicos podem ser indicados os seguintes:
Avaliação da molhabilidade de ligas comerciais de adição sobre as
cerâmicas com interesse tecnológico em brocas tricônicas.
Caracterizar microestruturalmente as interfaces metal-cerâmica obtidas nos
experimentos de molhamento.
Avaliar as reações ocorridas entre os materiais e relaciona-las com os
mecanismos de união envolvidos em cada sistema específico.
Selecionar o melhor sistema a ser utilizado na produção posterior das
uniões metal/cerâmica por brasagem.
Capítulo 1 --- Introdução --- 19
1.2. ENQUADRAMENTO PRÁTICO
O processo de encaixe dos insertos cerâmicos nos cones ou no corpo da
broca é realizado por aperto mecânico, pressfitting, podendo apresentar falhas
durante a ação de corte e esmagamento da broca, uma vez que não existe uma
verdadeira união química e física entre a componente cerâmica (inserto cerâmico
duro) e a parte metálica (corpo da broca ou cones). Como já citado anteriormente,
a técnica de brasagem recorrendo ligas de adição à base de AgCu pode minimizar
ou eliminar algumas das possíveis falhas. Desta forma, estudos preliminares de
molhabilidade são importantes para entendimento dos processos e mecanismos
presentes na interface inserto cerâmico/corpo da broca, dando informações e
indícios úteis para o processamento posterior das uniões metal-cerâmica por
brasagem. Assim, a importância desta tese de doutorado para a indústria do
petróleo se focaliza, fundamentalmente, na obtenção de interfaces liga de
adição/inserto cerâmico com potencial aplicação em uniões cerâmica/liga de
adição/metal de qualidade superior para brocas de perfuração de poços de
petróleo com insertos cerâmicos.
1.3. CARÁTER INOVADOR
A presente tese revela uma forte componente inovadora, sendo o primeiro
estudo sistemático da molhabilidade da liga de adição eutética AgCu sobre
superfícies cerâmicas metalizadas mecanicamente com Ti, e da liga de adição
ativa, AgCu3Ti, sobre superfícies polidas de insertos cerâmicos duros utilizados
em brocas de perfuração de poços de petróleo (nitreto de silicio HP, e WC-12Co).
Esse estudo foi realizado através da avaliação dinâmica da evolução do ângulo de
contato “in situ” em função da temperatura e do tempo de estágio, sendo
relacionado com os mecanismos envolvidos na formação da inteface metal-
cerâmica.
UFRN - PPGCEM
CAPÍTULO 2
PERFURAÇÃO DE POÇOS DE PETRÓLEO
Jorge Carlos Pereira
Novembro 2012
Natal - RN
No Capítulo 2 faz-se uma breve descrição do processo de perfuração, tipos de brocas e principais processos de falhas que ocorrem nas brocas com insertos cerâmicos.
Capítulo 2 --- Perfuração de Poços de Petróleo --- 21
2. PERFURAÇÃO DE POÇOS DE PETRÓLEO
A perfuração rotativa é a técnica predominante na perfuração de poços de
petróleo e gás natural. Nesta técnica as rochas são perfuradas pela ação da
rotação e peso aplicados a uma broca existente na extremidade de uma coluna de
perfuração (ver Fig.1), a qual é composta basicamente por tubos de perfuração
(DP), tubos intermediários (HW) e tubos pesados (DC ou comandos) - cujas
funções são o de aplicar peso sobre a broca (fornecido pelos DC’s, preservando
desse esforço os tubos de perfuração), transmitir rotação para a broca e permitir a
circulação de fluidos [9,10].
Figura 1 - Coluna de perfuração.
Fonte: PLÁCIDO, JRC, 2009 [9].
O fluido de perfuração, também popularmente conhecido como lama, é o
elemento responsável por carrear o cascalho, refrigerar e lubrificar a broca, conter
as paredes do poço e evitar a irrupção de gás e/ou óleo descontrolada (kick).
Capítulo 2 --- Perfuração de Poços de Petróleo --- 22
O fluido de perfuração é injetado por bombas especiais (bombas de lama)
para o interior da coluna de perfuração através da cabeça de injeção, ou swivel,
atinge a broca e passa por seus bordos e retorna à superfície através do espaço
anular entre a coluna e as paredes do poço. Ao atingir determinada profundidade,
a coluna de perfuração é retirada do poço e uma coluna de revestimento de aço,
de diâmetro inferior ao da broca, é descida no poço. O espaço anular entre os
tubos do revestimento e as paredes do poço é cimentado com a finalidade de
consolidar e isolar as rochas atravessadas, permitindo então o avanço da
perfuração com segurança. Após a operação de cimentação, a coluna de
perfuração é novamente descida no poço, tendo na sua extremidade uma nova
broca, de diâmetro menor do que o do revestimento, para o prosseguimento da
perfuração. Portanto, um poço é perfurado em diversas fases, sendo estas
caracterizadas pelos diferentes diâmetros das brocas [11].
As brocas, colocadas na ponta da coluna de perfuração, são os
equipamentos que promovem a ruptura e desagregação das rochas ou formações
rochosas. O estudo das brocas, considerando seu desempenho e economicidade,
é um dos fatores importantes na perfuração de poços de petróleo [12].
O valor do aluguel de uma plataforma atinge hoje, com facilidade, os US$
200 mil por dia, estimando-se chegar a valores superiores a US$ 500 mil por dia
para operações em águas profundas [13]. Assim se compreende que o
conhecimento da operação de manobra deverá privilegiar o uso de brocas de
superior qualidade que apresentem maior vida útil visando postergar a manobra
de retirada.
É imprescindível que o engenheiro responsável pela perfuração domine os
fundamentos do projeto das brocas e seja capaz de entender seu comportamento
para fazer uma seleção adequada. Para isso, deve-se analisar um grande número
de variáveis que interagem entre si, tais como o seu custo, o tipo de litologia
existente, tipo e profundidade de perfuração, tempo de manobra, a caga/energia
aplicada, assistência técnica, reposição de peças e manutenção, e sobretudo o
tempo de vida útil estimado. O tempo de vida útil está diretamente relacionado
com a sua resistência mecânica, térmica, ao desgaste e corrosão.
Capítulo 2 --- Perfuração de Poços de Petróleo --- 23
2.1. TIPOS DE BROCAS
Como já mencionado anteriormente, a broca é a ferramenta de corte
localizada no extremo inferior da coluna de perfuração, a qual é utilizada para
cortar, raspar, desagregar ou triturar a rocha ou formação rochosa durante o
processo de perfuração rotativa. Para realizar a perfuração as brocas utilizam
como base os princípios fundamentais para vencer os esforços da rocha, e a
forma de ataque pode ser por: acunhamento, cisalhamento, esmerilhamento,
esmagamento, e até mesmo erosão por ação de jatos de fluido [12].
A forma do ataque dependerá do tipo e das características da rocha que se
deseja cortar, principalmente em função de sua dureza e abrasividade. Este fator
é muito importante na classificação das brocas. É o grau de dureza e
abrasividade da rocha que determinará o tipo de broca e o princípio de ataque.
As primeiras patentes de brocas de perfuração surgiram no início do século
XX, paralelamente aos descobrimentos de jazidas de petróleo. O seu projeto e
engenharia melhoraram notavelmente as suas características físicas, mecânicas,
e como consequência o seu tempo de vida e funcionamento também evoluíram.
Da primitiva broca de arraste, tipo rabo de peixe, passando pela revolução
que deu origem às brocas de cones rotativos no principio do século XX e
terminando com as linhas de brocas que utilizam tecnologia de diamantes
sintéticos, as empresas fabricantes de brocas de perfuração tem procurado a
vanguarda tecnológica para se adaptar às exigências de projetos de poços
complicados, sempre buscando a otimização de desempenho em cada tipo de
rocha perfurada [9,11].
As brocas podem ser classificadas segundo alguns critérios, sendo o mais
amplamente aceite no meio académico e profissional o critério em função da
mobilidade das suas partes móveis. Assim sendo, as brocas podem ser
classificadas em brocas sem partes móveis e brocas com partes móveis.
Capítulo 2 --- Perfuração de Poços de Petróleo --- 24
2.1.1. BROCAS SEM PARTES MÓVEIS
Segundo Triggia et al [12], os principais tipos são tipos de brocas sem
partes móveis são: de lâminas de aço, diamantes naturais e diamantes sintéticos
(PDC/TSP).
As primeiras brocas utilizadas na perfuração por método rotativo foram as
chamadas brocas de arraste ou tipo rabo de peixe (fishtail) - ver Fig.2 - as quais
eram constituídas essencialmente por um corpo de aço forjado, com lâminas ou
dentes e uma parte roscada que conectava aos tubos de perfuração. Possuíam
características de perfurar por ação de cisalhamento e orifícios para jatos que
permitiam uma boa limpeza de suas lâminas.
As brocas tipo rabo de peixe são adequadas para formações moles e não
consolidadas. Para formações mais duras e abrasivas, a taxa de penetração
destas brocas cai rapidamente.
Em formações plásticas, do tipo argilosas, estas brocas tendem a encerar
facilmente. Porém, o maior problema deste tipo de broca é que a vida útil de sua
estrutura cortante é muito curta, por esta razão se compreende que este tipo de
broca tenha caído completamente em desuso [9,14].
Figura 2 – Brocas com lâminas de aço tipo fishtail. Fonte: SILVA, R.A., 2009 [14].
Capítulo 2 --- Perfuração de Poços de Petróleo --- 25
As brocas de diamantes naturais tem um corpo fixo, cujo material é
composto de uma matriz de carbeto de tungstênio. O tipo de fluxo pode ser radial
ou cruzado e o tipo de cortador é o diamante natural incrustado no corpo da broca,
com diferentes densidades e desenhos [9].
O uso destas brocas é limitado, utilizado em casos especiais para perfurar
formações muito duras e para cortar núcleos de formações com coroas de
diamante natural, ou na aplicação de brocas desviadoras (side track) para desviar
poços em formações muito duras e abrasivas [9].
O mecanismo de corte deste tipo de broca é o esmerilhamento e arraste, o
qual gera altas temperaturas. O tipo de diamante usado para sua construção é o
diamante em sua forma natural e não comercial. O tamanho varia de acordo com
o desenho da broca: quanto mais dura e abrasiva for a formação rochosa, menor o
diamante que se deve usar. Os diamantes utilizados para este tipo de broca são
arredondados, mas de forma irregular. O tamanho e a quantidade dos diamantes
na broca determinam a sua aplicabilidade [11,12,14]. Um exemplo de uma broca
de diamante natural está ilustrado na Fig.3.
Figura 3 – Broca de diamantes naturais.
Fonte: PLÁCIDO, J.R.C., 2009 [9].
Capítulo 2 --- Perfuração de Poços de Petróleo --- 26
As brocas de diamante termicamente estável - TSP (Thermally Stable
Polycristalline) são usadas para perfuração de rochas duras como granitos,
arenitos finos e duros, entre outras. São mais utilizadas para perfuração
convencional do que as brocas de diamante natural. O uso de brocas TSP
também é restrito porque, assim como as de diamante natural, apresentam
restrições hidráulicas. As vias de circulação estão praticamente em contato direto
com a formação e, além disso, geram altas torções nos tubos de perfuração,
embora hoje se possa usar com motor de fundo. Este tipo de broca usa como
estrutura de corte, diamante sintético em forma de triângulos pequenos e não
redondos [9,15].
As brocas PDC (Polycrystalline Diamond Compact) utilizam diamante
sintético no formato de um compacto de diamante policristalino. A estrutura de
corte é formada por pastilhas, as quais são montadas sobre bases cilíndricas,
instaladas no corpo da broca [12,15]. A pastilha é composta por uma camada fina
de partículas de diamantes aglutinados com cobalto, fixada a outra camada
composta de carbeto de tungstênio. Sendo que a diferença para as brocas de
diamante natural e TSP, está no seu desenho hidráulico, o qual se processa com
um sistema de jatos, similar às brocas de cones (ver subcapítulo 2.1.2). Perfura
por ação de cisalhamento ao promover um efeito de cunha. O mecanismo de corte
das brocas PDC é por cisalhamento [12].
Pelo seu desenho hidráulico, os cortadores em forma de pastilha e pelos
seus bons resultados na perfuração rotativa, este tipo de broca tem sido muito
usado na perfuração de poços de petróleo. Apresenta também muitas vantagens
econômicas pela sua versatilidade [14].
As brocas PDC contam com uma grande gama de tipos e fabricantes,
especiais para cada tipo de formação, desde formações muito moles até muito
duras, e em diferentes diâmetros de acordo com o projeto de cada poço. Além
disso, estas brocas podem rodar a altas velocidades, podendo ser utilizadas com
motores de fundo ou turbinas, com diferentes pesos sobre a broca [11,14,15].
Capítulo 2 --- Perfuração de Poços de Petróleo --- 27
A figura 4 mostra exemplos de brocas do tipo PDC.
Figura 4 - Brocas sem partes móveis tipo PDC.
Fonte: www.onacsolutions.com , acesso 2012 [16].
A broca impregnada (ver Fig. 5) é a evolução da broca de diamante. Elas
possuem seus elementos de corte (cristais de diamante) impregnados na matriz
de carbeto de tungstênio. Geralmente são utilizadas em ambientes de perfuração
duros e abrasivos [9].
Devido à pequena exposição, tal qual nas brocas de diamante, a broca
impregnada necessita de trabalhar a altas rotações para atingir taxas de
penetração significativas. Estas brocas são geralmente usadas com turbinas ou
motores de alta rotação, e são projetadas de forma a ter cobertura completa de
diamante no fundo do poço [9].
A ação de esmerilhamento da formação a altas rotações acarreta a quebra
da cimentação entre os grãos da rocha. Durante a perfuração, com o desgaste da
broca novos cristais de diamantes impregnados na matriz se expõem
continuamente ao ambiente de perfuração mantendo a estrutura de corte afiada.
Capítulo 2 --- Perfuração de Poços de Petróleo --- 28
A figura 5 mostra exemplos de brocas impregnadas com diferentes tipos de
geometrias para a estrutura cortante.
Figura 5 – Brocas impregnadas.
Fonte: PLÁCIDO, JRC, 2009 [9].
Inicialmente, as brocas de lâmina de aço eram manufaturadas com aço de
poucas características conhecidas. Com a crescente demanda para maiores taxas
de penetração e tempo de vida útil e o constante desenvolvimento do projeto de
brocas para perfuração, algumas brocas caíram em desuso, conforme já
comentado nas brocas de arraste ou rabo de peixe [10].
Atualmente, o tipo de aço empregue no fabrico do corpo e lâminas das
brocas é um aço especial mais resistente mecanicamente, ao desgaste e ao
choque térmico [9]. Na tabela 1 estão representados alguns tipos de aços
utilizados no fabrico de brocas de perfuração de poços petróleo, e suas
composições químicas.
Capítulo 2 --- Perfuração de Poços de Petróleo --- 29
Tabela 1 - Composição química dos aços e suas identificações. Porcentagem em massa e balanço em
Ferro (Fe).
Fonte: www.onacsolutions.com , acesso 2012 [16].
Em 1923, o carbeto de tungsténio (WC) foi testado nas lâminas de aço das
brocas, com o objetivo melhorar as suas propriedades e aumentar sua vida útil. As
brocas de lâmina de aço passaram a ser moldadas em uma peça inteiriça de aço,
sendo as lâminas tratadas convenientemente, temperada e revestida com uma
camada de carbeto de tungstênio aplicada sob forma de pastilhas distribuídas
convenientemente sobre os bordos cortantes. Deste modo, a vida útil de uma
broca de lâmina de aço foi grandemente aumentada [9].
Deve-se ressaltar que comumente se refere a peças de carbeto de
tungstênio, mas na verdade é um compósito, onde os grãos de carbeto de
tungsténio estão distribuídos em uma matriz metálica, normalmente de cobalto
(Co). Os grãos de carbeto de tungstênio só por si são extremamente duros, e
como tal apresentam um comportamento frágil. A matriz metálica ligante vem
introduzir uma certa tenacidade ao material [17,18].
Desta forma, a sua elevada dureza aliada a uma boa tenacidade à fratura
proporciona ao compósito WC-Co, também denominado por metal-duro ou cermet,
uma alta resistência ao desgaste, tornando-o ideal para aplicações em insertos
para brocas de perfuração de poços de petróleo e gás natural [19,20].
Capítulo 2 --- Perfuração de Poços de Petróleo --- 30
2.1.2. BROCAS COM PARTES MÓVEIS
As brocas com partes móveis podem ter de um a quatro cones (ver Fig. 6),
sendo raras as brocas com mais de 4 cones. Brocas com 6 cones podem ser
utilizadas em operações de coroas de testemunhagem.
Figura 6 – Tipos de brocas de cones: monocônica, bicônica e tetracônica.
Fonte: PLÁCIDO, JRC, 2009 [9].
As brocas tricônicas são as mais utilizadas tendo em conta a eficiência e
menor custo inicial em relação às demais. As brocas tricônicas consistem de três
componentes principais: os insertos (também chamados botões ou dentes), os
rolamentos e o corpo. Os insertos são montados sobre os eixos dos rolamentos os
quais são parte integrante do corpo da broca [9].
As brocas tricônicas podem ser classificadas de acordo com o material dos
dentes e geometria do cone. Podem também ser divididas em brocas dentes de
aço, que têm sua estrutura cortante fresada no próprio cone (brocas dentadas), e
brocas de insertos, que têm os insertos de carbeto de tungstênio instalados por
processo de encaixe sob pressão (pressfitting) em orifícios abertos na superfície
do cone (ou rolamento) [10].
A figura 7 mostra um exemplo de uma broca tricônica e seus principais
componentes.
Capítulo 2 --- Perfuração de Poços de Petróleo --- 31
Figura 7 – Constituição das brocas com partes móveis, tricônicas.
Fonte: VAREL INTERNATIONL INC., acesso 2012 [21].
Existem vários formatos de dente e de inserto, cada qual para um
determinado tipo de rocha a perfurar. A ação da estrutura cortante das brocas
tricônicas envolve a combinação de ações de raspagem, lascamento,
esmagamento e erosão por impacto dos jatos de fluido de perfuração.
Dependendo das características da broca, um ou outro mecanismo se sobrepõe
aos demais [11].
Existem três tipos de rolamentos que equipam as brocas: com roletes e
esferas não-selados, com roletes e esferas selados e com mancais de fricção tipo
journal. Os não-selados são lubrificados pelo próprio fluido de perfuração
enquanto nos selados há um sistema interno de lubrificação [10,11].
As brocas tricônicas podem permitir a circulação regular de fluido (Fig. 8A),
circulação regular com distribuição de ar (Fig. 8B) ou circulação de jato de ar (Fig.
8C). Quando as brocas são de circulação regular, uma eficiente circulação é
Capítulo 2 --- Perfuração de Poços de Petróleo --- 32
fornecida direto ao centro da broca para limpar os dentes e o fundo do furo. Estas
brocas estão disponíveis com abertura completa ou com três orifícios. No caso de
circulação regular com distribuição de ar, há um suprimento balanceado do ar para
o resfriamento dos rolamentos e para a limpeza do fundo do furo. Neste caso, é
necessária uma válvula de distribuição do ar. Nas brocas de circulação de jato de
ar, os três orifícios de circulação, de acordo com o seu tamanho, regulam a
pressão de saída do ar e direcionam o fluido diretamente para o fundo do furo
fornecendo uma limpeza eficiente [10].
Figura 8 – Brocas com circulação regular de fluido (A), circulação com distribuição de ar (B) e
circulação de jato de ar (C).
Fonte: VAREL INTERNATIONL INC., acesso 2012 [21].
O tipo de formação rochosa é de fundamental importância para se definir a
geometria dos insertos de tungstênio. Ao projetar uma broca tricônica deve-se
procurar maximizar a vida útil e a taxa de penetração. Isto é uma tarefa de difícil
equacionamento, pois para se alcançar altas taxas de penetração é preciso
insertos de geometria agressiva, que por sua vez apresentam maior probabilidade
de falha ou rotura.
O quadro 1 mostra resumidamente as principais geometrias dos insertos de
carbeto de tungstênio com suas respectivas aplicações.
(A) (B) (C)
Capítulo 2 --- Perfuração de Poços de Petróleo --- 33
Quadro 1 - Características dos insertos de WC-Co.
Fonte: SECURITY MINING BIT CATALOG, 1992 [22]
As brocas de cones, como já mencionado, são as mais utilizadas na
atualidade para a perfuração petrolífera. Cada fabricante tem seus próprios
desenhos de brocas de cones, com características específicas de, mas de acordo
com o código de padronização emitido pela IADC (International Association of
Drilling Contractors). O IADC desenvolveu um sistema padronizado para
classificação das brocas tricônicas. Classificam-se de acordo com o tipo, dentes
de aço ou insertos, a classe de formação para a qual foram projetadas (em termos
de série e tipo), as características mecânicas, e em função do fabricante [9]. Essa
classificação é bastante extensa e cai fora do âmbito desta tese de doutorado.
Capítulo 2 --- Perfuração de Poços de Petróleo --- 34
2.2. DEGRADAÇÃO DE BROCAS COM INSERTOS DE WC-Co
Neste subcapítulo estão expostos alguns tipos de falhas mais comumente
encontradas nas brocas tricônicas de perfuração com insertos WC-Co. As
denominações dos modos de degradação não são unânimes entre a comunidade
profissional e científica da indústria do petróleo, variando de região para região,
país para país. Contudo, a IADC tenta padronizar a degradação das brocas, e
estabeleceu um sistema mundial para avaliar o desgaste de brocas, de modo que
qualquer pessoa possa intuir o estado em que se encontra a broca após sua
retirada do poço. Esse sistema de avaliação de desgaste pode ser utilizado em
todos os tipos de brocas: de cones, diamante natural, PDC, TSP, brocas
impregnadas, coroas e outras.
A análise e avaliação de cada broca usada após perfuração pode ser de
muita utilidade para decidir o tipo de broca que será utilizada posteriormente e se
a prática de operação deve ser modificada.
A ação de corte promovida pela broca gera seu desgaste, cuja vida útil
varia em função de fatores como tecnologia de fabricação, adequação à litologia
encontrada, modo como a energia é aplicada, etc. O desgaste da broca leva à
necessidade de uma manobra, quando então toda a tubulação é removida do
poço e a broca trocada. Esta operação de manobra de troca de broca acarreta
uma paragem na perfuração, e como tal, aumenta do custo métrico de perfuração.
Os tipos de falhas aqui apresentados, bem como as ações e sugestões
corretivas propostas, servem também como motivação e enquadramento prático
ao trabalho proposto nesta tese. Será vocacionado para a pesquisa de novas
interfaces entre o inserto cerâmico e o cone/corpo da broca com o objetivo final de
melhorar e otimizar o tempo de vida útil da broca, o que se refletirá na diminuição
do custos associados à operação de perfuração.
Não serão apresentados todos os tipos de falhas indicados pela IADC,
apenas os mais importantes e com relevância direta e prática para o caso da
ausência de uma verdadeira união metal-cerâmica entre o inserto cerâmico duro e
o cone/corpo em aço da broca de perfuração.
Capítulo 2 --- Perfuração de Poços de Petróleo --- 35
2.2.1. DESGASTE POR ABRASÃO
O desgaste por abrasão ocorre como consequência natural do
deslizamento entre duas superfícies em contato e defini-se vulgarmente como a
perda progressiva de material de uma superfície em movimento relativo devido a
ações mecânicas ou químicas. Pode ser controlado mas não completamente
eliminado [23].
Na área da perfuração de poços de petróleo, o desgaste nas brocas com
insertos de carbeto de tungstênio, normalmente acontece através da ação de
corte, onde os minerais duros da rocha penetram no constituinte macio (ligante –
Co) do compacto WC-Co, removendo assim pequenas porções do inserto. O
material ligante é então arrancado, deixando o frágil carbeto de tungstênio exposto
e sujeito à ação de impacto/deslizamento. Quanto maior for o movimento relativo e
a área de contato do inserto contra a rocha, durante o tempo que a carga é
aplicada, maior será a perda de material observada [13].
O desgaste por abrasão é considerado como o principal mecanismo de
degradação das brocas de perfuração [24].
A figura seguinte (Fig. 9A-B) mostra o desgaste acentuado dos cones da
broca e de um inserto de WC-Co.
Figura 9 – Desgaste generalizado em broca tricônica (A) e em um inserto WC-Co (B). Fonte: Drilling Insert Performance Handbook [24].
A B 2mm 4cm
Capítulo 2 --- Perfuração de Poços de Petróleo --- 36
Nos casos em que não se observam fraturas e em que o tempo de vida do
inserto é controlado pelo desgaste, devem-se utilizar insertos com maior
resistência à abrasão ou uma matriz com menos cobalto. Contudo, antes de tomar
tal ação deve-se ter a absoluta certeza que mais nenhum mecanismo de
degradação (fissuras, destacamento, corrosão...) esteja presente, caso contrário a
introdução de brocas com insertos mais duros pode agravar o problema [24].
2.2.2. FRATURA NO INTERIOR DO INSERTO
As denominadas “fraturas no interior” revelam uma superfície de fratura lisa
e sem marcas, podendo ser paralela e/ou perpendicular ao eixo do inserto. A
localização da fratura pode ser encontrada próxima do cone superficial ou interior
do inserto, como revela a Fig. 10 A-B.
Figura 10 - Aspeto geral da broca tricônica com degradação por fratura no interior (A), fratura no
interior do inserto (B).
Fonte: Drilling Insert Performance Handbook [24].
A rocha ao ser perfurada exerce dois tipos de forças no inserto, uma de
compressão no primeiro contato com o inserto mas depois com o movimento da
broca, o inserto fica sujeito a um esforço de cisalhamento. Esta tensão fará com
que a pequena trinca se propague rapidamente, e uma parte do inserto seja
arrancada [24,25]. Um esquema de degradação deste mecanismo está exposto na
figura 11, adaptada de Drilling Insert Handbook [24].
A B 2mm 1cm
Capítulo 2 --- Perfuração de Poços de Petróleo --- 37
Figura 11 – Mecanismo de fratura no interior do inserto.
Fonte: Drilling Insert Handbook [24].
Este tipo de falha pode ser o resultado de defeitos provocados pelo
deficiente aperto e encaixe nos furos (orifícios existentes nos rolamentos ou
cones), mas também por defeitos internos na estrutura WC-Co do inserto, tais
como porosidades ou zonas de maior ou menor concentração de WC que podem
provocar distorções na matriz, ou seja, zonas potenciais de concentração de
tensões. Dando origem a pequenas trincas, as quais se podem propagar
rapidamente para o topo em função da força aplicada no topo do inserto, podendo
ocorrer uma falha catastrófica do inserto, deixando o com ou rolamento exposto à
ação erosiva da rocha, contribuindo assim para o desgaste acentuado dessa zona.
Para evitar este tipo de falhas, o processamento do WC-Co deve ser
bastante rigoroso para assegurar que a mistura dos pós de WC com o ligante Co,
e a posterior sinterização com fase líquida seja a mais homogénea possível,
reduzindo assim o número de defeitos internos.
O encaixe dos insertos nos furos dos cones/rolamentos deve ser realizado
de forma cuidadosa para evitar danos nos insertos ou concentração excessiva de
tensões, sendo que posteriormente podem atuar como geradores de trincas.
Capítulo 2 --- Perfuração de Poços de Petróleo --- 38
2.2.3. CHOQUE TÉRMICO
Falhas por choque térmico têm sido observadas em todas as áreas onde
existe perfuração, seja de poços de petróleo e gás, poços de água, minas ou
túneis, etc. Este é o único mecanismo de falha com um padrão bi-axial bem
distinto, o qual consiste na interceção de várias trincas em ângulos quase retos
[24], como pode ser visto nas figuras 12 A-B.
Figura 12 – Padrão das trincas superficiais com origem no choque térmico. Fonte: Drilling Insert Handbook [24].
O choque térmico pode ser minimizado através da introdução de um tipo de
broca que reduza o tempo de contacto entre o inserto e a rocha a ser perfurada,
ou aumentar o bombeamento de fluido. Este padrão de falha tem origem no
campo de tensões bi-axiais que se forma durante o rápido resfriamento de uma
superfície quente [24].
O alívio de tensões se dá através da formação de trincas em uma direção,
enquanto que as restantes tensões de módulo mais elevado ocorrem na direção
perpendicular às trincas iniciais, Uma posterior relaxação de tensões dará origem
a trincas com direção perpendicular às iniciais. As trincas de origem térmica
podem ser graves em algumas áreas do inserto e inexistentes em outras. Se a
propagação das trincas “térmicas” continuar, pequenas “lascas” típicas serão
observadas na superfície do inserto [24] – ver Fig. 13.
1cm 2mm A B
Capítulo 2 --- Perfuração de Poços de Petróleo --- 39
Casos graves de trincas “térmicas” conduzem à destruição total do inserto.
O aquecimento da superfície do carbeto é causado pela fricção ao deslizar sobre a
rocha. Quanto maior for a carga aplicada, a velocidade de rotação e a formação a
ser perfurada, maior será o aquecimento do inserto.
Figura 13 - Perda de material do inserto por trincas “térmicas”.
Fonte: Drilling Insert Handbook [24].
Do ponto de vista dos materiais, a introdução de um inserto com coeficiente
de expansão térmico mais baixo pode reduzir as trincas de origem térmica. O
coeficiente de expansão térmica (CET) diminui com o teor de cobalto nos insertos.
Contudo, antes de alterar o teor de cobalto nos insertos, outros parâmetros devem
também ser modificados para assegurar que os fatores intrínsecos ao material,
tais como a tenacidade, sejam mantidos. Caso as trincas “térmicas” não possam
ser totalmente eliminadas, devido ao tipo de formação ou de outros fatores, a área
do inserto que revela as trincas pode ser ajustada, através da concepção da broca
e da forma dos insertos, para que a área do material exposta seja mínima [24].
As trincas de origem térmica são o principal modo de falha em insertos com
baixo teor de cobalto e em técnicas de perfuração a seco. A degradação pelo
choque térmico e o lascamento são similares na aparência, no entanto o
lascamento apresenta um aspecto tipo de picada “pitting” ao contrário do aspecto
tipo “pele de crocodilo” apresentado pelo choque térmico, onde se evidencia mais
1 mm
Capítulo 2 --- Perfuração de Poços de Petróleo --- 40
uma aparência quase quadrada [24]. Ambos os modos de falha devem ser
cuidadosamente analisados para garantir e diagnosticar corretamente o
mecanismo de falha.
2.2.4. DESTACAMENTO TOTAL DO INSERTO WC-Co
O destacamento total do inserto é uma falha bastante comum em brocas de
perfuração, e acontece quando o inserto se destaca ou sai completamente do
encaixe no corpo do rolamento/cone, deixando uma lacuna neste (ver Fig. 14A-B),
podendo ocorrer pontualmente ou em uma fileira do rolamento.
Figura 14 – Destacamento do inserto WC-Co em brocas tricônica (A) e broca PDC (B).
Fonte: Drilling Insert Handbook [24].
A proposta de trabalho apresentada nesta tese baseia-se em estudos
preliminares para propor futuras soluções para minimizar este tipo de falha grave,
através da criação de uma verdadeira união química e física entre o inserto
cerâmico e o corpo do rolamento/cone em aço.
O método de encaixe dos insertos cerâmicos no corpo do rolamento é feito
por um processo de ajuste mecânico, “pressfitting”, como já foi citado
anteriormente [11,24]. Este tipo de falha pode ser originado nas diferenças
1 cm A B
1 cm
Capítulo 2 --- Perfuração de Poços de Petróleo --- 41
acentuadas do CET entre o inserto de WC-Co e o corpo em aço do rolamento;
deficiente encaixe dos insertos no corpo dos rolamentos e folgas entre o inserto e
o encaixe. Estas folgas podem ser visualizadas na figura 15A-B. Se a falha for
pontual o desempenho da broca não será afetado. Contudo se o rolamento
apresentar mais do que um destaque do inserto, o corpo do rolamento em aço
passará a estar sujeito a um desgaste intenso e diferentes valores de tensão de
compressão, que podem resultar em trincas e na fratura total ou parcial do
rolamento. Os insertos soltos podem originar danos aos rolamentos ou corpo da
broca, pois possuem uma dureza maior que o aço.
Figura 15 – Folga no encaixe do inserto (A) e lacuna causada pelo destacamento completo (B).
Fonte: Drilling Insert Handbook [24].
Para evitar as diferenças abruptas nos CET entre o inserto de WC - Co e o
corpo em aço do rolamento, o processo de união entre o inserto e o encaixe no
rolamento da broca deverá ser revisto e modificado.
Um processo de união metal-cerâmica recorrendo a técnicas de brasagem
poderá atenuar as diferenças entre os coeficientes de expansão térmica entre os
materiais. Este processo irá aumentar o custo das brocas. No entanto, o aumento
do tempo de vida útil das brocas, se traduzirá na diminuição dos custos de
operação, e certamente compensará o aumento do preço das brocas.
A B 1 cm 5 mm
Capítulo 2 --- Perfuração de Poços de Petróleo --- 42
2.2.5. DANO POR DETRITOS
Todos os tipos de brocas são extremamente susceptíveis aos danos por
detritos, os quais resultam de partes da broca (rolamentos, cones, partes do corpo
da broca), insertos e/ou dentes partidos e soltos, partes ou componentes da
coluna de perfuração (ex: escareadores, alargadores de poços), detritos metálicos
que tenham caído no poço acidentalmente (ex: ferramentas de chave, cunhas),
existentes no fundo do poço.
Marcas ou sulcos em qualquer parte da broca, seja nos insertos,
rolamentos ou restante corpo da broca, são indicativos deste tipo de dano, como
pode ser visto na figura 16A-B.
Figura 16 – Dano feito por detritos em broca tricônica.
Fonte: Drilling Insert Handbook [24].
Uma vez ocorrido o dano, a expectativa de vida da broca é drasticamente
reduzida. A única ação a tomar quando se suspeita de dano por detrito, será parar
a perfuração, proceder a uma operação chamada comumente de “pescaria”
(operação de recuperação, deslocamento ou destruição de elementos
indesejáveis ao poço) e limpar o poço, caso contrário, mais danos na broca ou na
coluna de perfuração poderão acontecer.
A B 2cm
2cm
Capítulo 2 --- Perfuração de Poços de Petróleo --- 43
2.2.6. CORROSÃO
A resistência à corrosão do denominado “metal-duro” ou cermet, é
normalmente muito boa, em relação a outros materiais. Em ambientes corrosivos
onde a resistência ao desgaste é necessária, o WC-Co pode ser utilizado, se
resistência à corrosão não é a principal preocupação. A resistência à corrosão
alcalina do carbeto de tungstênio é excelente, mas o ligante cobalto é suscetível a
ambientes ácidos [26].
Os danos originados por corrosão ocorrem como resultado de algum
elemento do ambiente de perfuração, atacar, fragilizar e erodindo o ligante-Co- (de
caráter macio) da matriz do inserto. Este é um tipo de corrosão galvânica, onde
poderemos estar em presença de uma célula eletroquímica galvânica que faz a
lixiviação do ligante do carbeto de tungstênio. Esta célula é ativada
espontaneamente necessitando apenas de um eletrólito para completar um
circuito eletroquímico. Qualquer líquido utilizado para fins de lubrificação e/ou
refrigeração com pH inferior a 8, ativa automaticamente a célula eletroquímica.
Inicia-se então o processo de lixiviação do cobalto para a solução, deixando os
grãos de WC sem o ligante. Os grãos de WC são expostos e sujeitos à ação de
desgaste/impacto, quebrando e destacando-se da superfície, revelando desta
forma uma cama intacta do inserto [27]. O processo continua até que a falha da
broca esteja eminente, devido ao desgaste prematuro do carbeto, sobretudo
desgaste por abrasão.
Outros fatores como a temperatura e pressão podem desempenhar um
papel importante na dissolução do ligante. O compósito WC-Co sofre uma perda
de resistência a temperaturas acima de 600ºC, causada pela presença de
oxidação e defeitos microestruturais [28].
O dano por corrosão deixa uma superfície muito picada e grosseira. Este
efeito de “cratera” é similar em aparência ao lascamento, mas com uma
quantidade de “poros” mais pronunciada [27]. Na figura seguinte pode-se ver o
efeito da corrosão no inserto de WC-Co (ver Fig. 17).
Capítulo 2 --- Perfuração de Poços de Petróleo --- 44
Figura 17 – Efeito da corrosão na superfície do inserto WC-Co.
Fonte: REYES, M., 2003 [26].
A corrosão pode ser prevenida, garantindo que todos os líquidos utilizados
na perfuração rotativa são estáveis em termos de pH [24]. No entanto, ácidos
minerais e óleos com bastante teor de H2S não podem ser controlados, e se
estiverem presentes, o tempo de vida útil de uma broca rotativa estará seriamente
comprometido. Infelizmente, ligantes mais resistentes à corrosão não possuem a
tenacidade e resistência à compressão que a perfuração rotativa exige [27].
Deverá existir sempre um compromisso entre todos os fatores para que
broca que satisfaça todos os requisitos da operação acarretando o menor custo de
perfuração possível com o máximo de metros de formação perfurado, com
segurança.
10 μm
UFRN - PPGCEM
CAPÍTULO 3
UNIÃO METAL-CERÂMICA
Jorge Carlos Pereira
Novembro 2012
Natal - RN
No Capítulo 3 faz-se uma breve descrição sobre o processo e requisitos para uma boa união metal-cerâmica, métodos de união metal-cerâmica, com maior enfâse na brasagem e no fenómeno da molhabilidade reativa a altas temperaturas, fazendo uma fundamentação teórica breve revisão bibliográfica.
Capítulo 3 --- União Metal-Cerâmica --- 46
3. UNIÃO METAL-CERÂMICO
Geralmente, nas uniões metal-cerâmica (M/C) pretendem-se combinar a
resistência mecânica e tenacidade dos materiais metálicos com a excelente
resistência química, térmica e ao desgaste das cerâmicas. Efetivamente, a união
entre metais e cerâmicos não é mais do que a junção de dois materiais
dissimilares com a intenção de combinar as propriedades de ambos [3,5,29-32].
No entanto, para produzir uma união física e quimicamente forte, é necessário que
haja uma diminuição da energia livre do sistema.
A união entre materiais metálicos e cerâmicos é um processo complexo por
se tratar de materiais com propriedades físicas (ex. coeficiente de expansão
térmica), químicas (ex: tipo de ligação) e mecânicas (ex. tenacidade)
completamente díspares. Como os materiais são diferentes, não existe equilíbrio
termodinâmico, mas podem tender a reagir para formar produtos mais estáveis.
Ou seja, idealmente será a formação de uma interface que consiga conjugar os
diferentes tipos de ligações químicas, desde a ligação metálica até às ligações
iónicas e covalentes da cerâmica [3,5,7,29]. Existem alguns pressupostos a ter em
conta para o sucesso de uma união M/C isenta de defeitos, hermética e com boas
propriedades mecânicas:
i. Deverá existir um contato íntimo entre as peças a unir:
Dependendo do método que se esteja a utilizar para produzir a união M/C,
pode-se estar na presença de uma interface sólido-sólido ou uma interface sólido-
líquido caso haja formação de uma fase líquida à temperatura do processamento.
A obtenção de uma interface sólido-sólido é resultado do ajuste das asperidades e
irregularidades das superfícies dos dois materiais a unir, através da deformação
plástica do metal à temperatura do processamento. Uma elevada rugosidade e a
presença de impurezas podem impedir o contato total entre as superfícies e
originar uma interface descontínua e apresentando defeitos [3,8,33]. Um polimento
cuidadoso, bem como uma limpeza criteriosa das superfícies a unir, é condição
Capítulo 3 --- União Metal-Cerâmica --- 47
obrigatória para se obter uma interface com elevada integridade e com boas
propriedades mecânicas [34]. Para a obtenção de uma interface sólido-líquido, o
contato ideal só acontece se a fase líquida molhar e se espalhar completamente
na fase sólida, penetrando nas suas irregularidades [33-35]. As interfaces sólido-
líquido serão posteriormente discutidas pormenorizadamente no subcapítulo 3.2.
referente ao fenómeno da molhabilidade.
Resumidamente, um mau contato físico entre as superfícies a unir resulta
na formação de uma interface descontínua e com fracas propriedades mecânicas.
As descontinuidades da interface podem tornar-se em locais preferenciais de
concentração de tensões [36,37].
ii. Utilizar materiais que possam reagir para formar compostos estáveis.
Neste pressuposto está em jogo a estabilidade termodinâmica, a qual parte
do princípio que duas fases podem ligar-se quimicamente, caso haja uma
diminuição da energia livre da interface gerada pela reação das duas fases
[34,36]. Teoricamente, o estudo dos equilíbrios termodinâmicos pode dar
informação sobre os possíveis produtos de reação que se podem formar na
interface. Vale salientar que os possíveis produtos de reação que se formam para
um determinado sistema utilizando dados termodinâmicos dependem da qualidade
dos dados termodinâmicos tabelados, sendo que na sua maioria apenas se
referem a sistemas binários [36].
Nas interfaces M/C podem ocorrer reações de dissolução do metal no
cerâmico [33] e reações oxidação-redução, envolvendo a redução da cerâmica e a
oxidação do metal [35]. Se a cerâmica for um óxido, a sua redução libera oxigénio,
o qual vai reagir com o metal dando origem a um óxido. A formação da camada de
óxido resulta em equilíbrio e ligação química, uma vez que este óxido é compatível
com o metal e com a cerâmica [35]. Também é possível usar informação a partir
de diagramas ternários, sendo possível prever os passos de difusão e a evolução
das camadas de reação que se vão formando na interface [36,38]. Contudo, em
muitos sistemas M/C as possíveis reações são de tal maneira complexas que a
Capítulo 3 --- União Metal-Cerâmica --- 48
análise por diagramas ternários se torna insuficiente e inconclusiva sendo
necessário recorrer a diagramas de ordem superior, os quais nem sempre estão
disponíveis [39].
iii. Compatibilidade nos coeficientes de expansão térmica dos materiais.
Tal como se pode verificar pela Tabela 2, os metais e cerâmicas apresentam
coeficientes de expansão térmica bastante distintos.
Tabela 2 - Coeficientes de expansão e condutividade térmica de alguns materiais.
Material Coef. Expansão
Térmica (ºK-1) x10-6
Condutividade
Térmica (Wm-1 ºK-1)
Aço Inox AISI 316 17,5 32,0
Alumínio 23,5 238,0
Cobre 17,0 397,0
Níquel 13,3 88,5
Titânio 9,8 21,9
Alumina - HP 7,6 39,0
Nitreto de silício - HP 3,1 10,0
Zircônia – MPSZ 6,5 2,0
Diamante 1,18 1800,0
Vidro de sílica 0,5 1,5
Vidro Pyrex 4,0 1,2
Granito 7,9 1,7 – 4,0
Concreto denso 14,5 1,0 – 1,8
Polímero PVC 50,4 0,19
Polietileno 200,0 0,42 - 0,51
Madeira de pinheiro 5,0 0,12
Fonte: Compilação de SMITH, W.F., 1996 [1], OLGA, P., 2000 [40].
Capítulo 3 --- União Metal-Cerâmica --- 49
A maioria dos processos de união M/C dá-se por via de um aquecimento
até altas temperaturas e posterior esfriamento. Sendo que os materiais metálicos
e cerâmicos expandem e contraem de maneiras diferentes, com velocidades
distintas, com variações maiores ou menores de volume [3,5,8,29-32].
Após o arrefecimento, a diferença nos módulos de elasticidade e coeficiente
de expansão térmica origina o desenvolvimento dum campo de tensões residuais,
o qual tem maior incidência junto à interface, podendo até conduzir à rotura da
mesma. A distribuição das tensões residuais não é uniforme em toda a interface
M/C, sendo mais severa perto da interface e perto das superfícies livres, isto é nos
extremos opostos à interface. Caso a distribuição de tensões resulte em esforços
de tração na interface ou no cerâmico, a resistência da junta M/C pode decrescer
significativamente [3,6-8]. Para contornar o problema, deve-se ter especial
atenção ao projeto dos dispositivos. Sabendo que os materiais cerâmicos
possuem elevada resistência a tensões de compressão e fraco desempenho
quando sujeitos a esforços de tração, pode-se projetar a peça para que a parte
cerâmica fique sujeita ao campo de tensões compressivas.
Outra maneira para atenuar o campo de tensões residuais será a
introdução de um filme metal ou uma liga de adição dúctil entre os materiais a
ligar, com a finalidade que esta nova camada metálica possa fornecer uma
transição suave entre a componente dúctil metálica e a componente frágil da
cerâmica [5,41].
3.1. MÉTODOS DE UNIÃO METAL-CERÂMICO
A evolução dos métodos de união M/C tem sofrido grande desenvolvimento.
A classificação dos métodos de união M/C não é totalmente consensual entre a
comunidade científica. Contudo, uma classificação amplamente adotada divide as
técnicas de união M/C em três grandes grupos: métodos de união mecânica,
métodos de união direta e métodos de união indireta [5,29]. A figura seguinte (ver
Fig. 18) mostra alguns métodos mais comuns de união M/C.
Capítulo 3 --- União Metal-Cerâmica --- 50
Figura 18 – Processos de união metal-cerâmico.
No quadro seguinte faz-se uma comparação de alguns métodos de união
M/C e C/C, tendo em conta alguns requisitos na sua utilização.
Requisito União
Mecânica
União com Adesivos União com reação
Polímeros Cimentos Brasagem Difusão Soldagem
Resistência
(MPa) 10-50 20-80 ≤ 10 100-300 100-500 50-200
Resistência
ao calor
Pobre-
médio Pobre
Pobre
médio
Médio-
Bom Bom Bom
Juntas p/
vácuo Pobre Não Não Bom Bom Bom
Custo
Baixo Baixo Baixo Médio Alto Baixo-
Médio
Problemas
Fraca
estanqueid.
Concentração
tensões
Baixa
resistência
temperatura
Baixa
resistência
corrosão
Possível
formação
intermetál.
Elevada
pressão e
temperatura
Crescimento
de grão,
Tensões
térmicas
Quadro 2 – Características de alguns métodos de união metal-cerâmica.
Fonte: PAIVA, O., 2000 [40].
União metal/cerâmico
Mecânica Direta
• Parafusos
• Encaixes
• Grampos
Indireta
• Adesivos
• Brasagem
• Fase vítrea
•Difusão estado sólido
• Eletrostática
• Soldagem fusão
Capítulo 3 --- União Metal-Cerâmica --- 51
Dependendo do tipo de aplicação do sistema M/C cada processo de união
M/C tem as suas vantagens e limitações.
3.1.1. UNIÃO MECÂNICA
A união mecânica de metais e cerâmicos é uma técnica bastante simples e
económica, mas apresenta a desvantagem de se obterem juntas de baixa
resistência mecânica, bem como a fraca capacidade de selagem hermética das
juntas. Esta técnica consiste simplesmente em obter ligações por encaixe à
pressão da superfície metálica na cerâmica [5,29,33].
3.1.2. UNIÃO COM ADESIVOS
A união com adesivos não é mais do que uma colagem. Consiste em
colocar uma película polimérica ou um cimento entre a superfície metálica e a
cerâmica a unir. É uma técnica simples e barata, contudo, apresenta várias
limitações tais como a sua temperatura de serviço estar reduzida a temperaturas
inferiores a 200ºC para a maior parte de cimentos e resinas poliméricas. A
resistência mecânica das juntas formadas é baixa, bem como a sua resistência
química em ambientes corrosivos [17,33,34].
3.1.3. UNIÃO COM FASE VÍTREA
A união de metais e cerâmicas com fase vítrea assemelha-se a uma
soldagem com vidros. Este método utiliza um vidro de baixo ponto de fusão,
geralmente sob a forma de pó, o qual é introduzido entre as superfícies a unir.
Posteriormente o par M/C é submetido a um ciclo térmico, formando-se assim uma
fase líquida que promove a união dos materiais [3,8]. Os vidros são selecionados
por forma a se obterem temperaturas relativamente baixas de amolecimento.
Contudo, estas temperaturas podem situar-se entre os 800 a 1000ºC para vidros
de Na2O-CaO-SiO2-PbO, ou mesmo entre 1000 e 1300ºC para borossilicatos. A
esta temperatura devem fluir e formar ligações com boa adesão, sem que se atinja
Capítulo 3 --- União Metal-Cerâmica --- 52
o ponto de fusão de nenhumas das superfícies a ligar [17]. Esta técnica apresenta
problemas a nível de descontinuidades que ocorrem na interface vidro-metal. È
uma técnica relativamente cara, uma vez que requer elevadas temperaturas (entre
800 a 1300ºC). Algumas aplicações deste método podem ser vistas na selagem
de juntas de lâmpadas incandescentes e de vapor, tubos de elétrons e
encapsulamento de semicondutores [17].
3.1.4. UNIÃO POR DIFUSÃO NO ESTADO SÓLIDO
Neste tipo de método a união M/C é formada sem a introdução de qualquer
tipo de elemento ligante e na ausência de formação de fase líquida. Este processo
requer a aplicação de elevadas pressões para manter o contato físico das partes a
unir, bem como temperaturas elevadas (podendo chegar até 90% da temperatura
de fusão do componente metálico) [42].
Facilmente se entende que a preparação das superfícies a unir é um fator
fundamental neste processo. A pressão a aplicar ao par a ser ligado não deforma
macroscopicamente as superfícies, mas a combinação conjunta com a
temperatura elevada, leva a superfície metálica a ajustar, por microdeformação
plástica, às irregularidades da superfície cerâmica. Esta técnica de união M/C
garante a aplicação de juntas em serviço a temperaturas elevadas, próximas da
temperatura de união, com excelentes propriedades mecânicas e elevada
capacidade de estanqueidade [34,35].
3.1.5. SOLDAGEM POR FUSÃO
A técnica de soldagem com fusão local, utilizando soldagem por arco ou por
feixe de elétrons ou a laser, não é habitualmente aplicada a materiais cerâmicos.
As uniões M/C produzidas por este método apresentam baixa resistência à fratura,
com resultado das tensões térmicas oriundas no processo de soldadura. O
principal parâmetro neste processo é a temperatura de fusão dos materiais a unir
[3,5,29].
Capítulo 3 --- União Metal-Cerâmica --- 53
3.1.6. UNIÃO POR BRASAGEM
A brasagem é uma técnica extensivamente utilizada para ligar pares metal-
metal (M/M), metal-cerâmica (M/C), e cerâmica-cerâmica (C/C). Esta técnica tem
uma vantagem fundamental sobre os outros processos, uma vez que as partes a
serem unidas não necessitam de aplicação de pressão e de um controle
dimensional preciso das interfaces [3,5-8,29]. Este processo consiste na
introdução de uma película metálica de baixo ponto de fusão entre os materiais a
unir. Posteriormente esta funde, dando origem a uma fase líquida que assegura o
contacto íntimo entre as duas superfícies sólidas, que após solidificação ajuda a
minimizar o campo de tensões térmicas residuais. Ou seja, a fase líquida deve
penetrar inteiramente nas cavidades, asperidades e porosidades, isto é, deve
“molhar” completamente as duas fases sólidas [2,3,5-8,29].
Ao selecionar a técnica de brasagem para produção de juntas M/C, deve-se
ter em conta alguns fatores, sendo os mais importantes: o estado das superfícies
a unir; a atmosfera do forno e o ciclo térmico.
i. Preparação das superfícies.
Já foi referido anteriormente e dada bastante atenção à questão do
acabamento e limpeza superficial das superfícies a unir. A rugosidade tem
influência no molhamento e espalhamento da liga de adição sobre as
superfícies sólidas [43]. Uma superfície bastante rugosa pode degradar a
resistência da interface liga de adição/componente cerâmico ou metálico. O
valor da rugosidade média para superfícies a serem brasadas não é
consensual. Por exemplo, Schwartz recomenda que a rugosidade média
das superfícies a unir esteja compreendida entre 0,8-2,0 μm. A Associação
Britânica de Padronização (BS 1723) recomenda que a rugosidade média
dos componentes não deve ultrapassar os 1,6 μm [34].
O polimento das superfícies deve ser cuidadoso de modo a obter
uma superfície isenta de heterogeneidades, filmes de óxidos e impurezas.
Esta operação deve ser complementada com uma limpeza (lavagem com
Capítulo 3 --- União Metal-Cerâmica --- 54
água destilada, e banhos de ultrassons), desengorduramento (lavagem com
álcool etílico ou acetona) e secagem com ar quente.
ii. Atmosfera do forno.
Este é um fator fundamental na brasagem, sobretudo quando se
utilizam ligas de adição com elementos reativos na sua composição. Uma
atmosfera de alto vácuo com valores entre 10-4 a 10-5 mbar, é a atmosfera
mais recomendada para diminuir a atividade do oxigénio e nitrogénio [17].
Caso não seja possível usar um equipamento com sistema de vácuo, pode-
se recorrer a atmosferas inertes ou redutoras por insuflação de gases de
elevada pureza, tais como: argónio, hélio.
iii. Ciclo térmico.
Na brasagem, é prática comum aquecer o par M/C a velocidades
baixas. Contudo é possível aquecer a velocidades entre 10 a 20ºC/min até
uma temperatura de 60 a 70% abaixo da temperatura de sólidos da liga de
adição, fazer um estágio de 15 a 30 minutos para homogeneização da
temperatura de todas as partes a unir e depois proceder a um novo
aquecimento até à temperatura de brasagem. Este segundo aquecimento
deverá ser feito a uma velocidade baixa, igual ou inferior a 5ºC/min para
que a uniformidade da temperatura se mantenha em toda a peça. Poderá
se fazer um aquecimento até temperatura de brasagem sem efetuar o
estágio de uniformização, desde que a velocidade de aquecimento seja
lenta (inferior a 5ºC/min). A temperatura de brasagem e o posterior tempo
de estágio devem ser função do tipo de liga que se utiliza. O esfriamento
deve ser realizado a uma velocidade moderada para evitar choques
térmicos e tentar minimizar a formação do campo de tensões residuais
devido aos diferentes CET dos materiais envolvidos [2,3,6,8].
Capítulo 3 --- União Metal-Cerâmica --- 55
Algumas cerâmicas estruturais (ex: ZrO2, Si3N4, AlN, SiC, TiC, Al2O3) são
compostos quimicamente muito estáveis, sendo difícil o molhamento destes
materiais por metais líquidos [43-45]. Nesses casos será necessário promover a
molhabilidade das superfícies sólidas, podendo se realizado através de:
a) Sinterização de um pó metálico na superfície, utilizando temperaturas
entre 1000 e 1800ºC, em atmosfera redutora.
b) Reação superficial com um sal metálico, temperaturas entre 450 a 1250ºC,
em atmosfera redutora.
c) Sinterização de mistura de pó de vidro e metal na superfície, com
temperaturas de 450 a 1250ºC.
d) Deposição física em fase vapor (T≥ 1250ºC, em vácuo).
e) Utilização de ligas de adição com elementos “ativos” – um ou mais
elementos são incorporados na liga de adição, os quais vão reagir com a
cerâmica aumentando a sua molhabilidade, modificando a sua
composição superficial. Titânio, zircónio, berílio e alumínio são exemplos
de metais de adição, os quais formam óxidos mais estáveis do que as
fases cerâmicas, podendo criar uma continuidade química entre as duas
partes a unir [6,44,45].
Um dos processos mais comuns utilizados para tratar as superfícies
cerâmicas para posterior brasagem envolve a sinterização na sua superfície de
um pó metálico, sendo o processo de metalização com molibdénio-manganês
(Mo-Mn) [47,48]. O processo foi desenvolvido em 1950 por Nolte e Spruck e
consiste basicamente na preparação contendo uma mistura de Mo+MoO3,
Mo+MoO2, e vários compostos formadores de uma rede vítrea, a qual será
aplicada na superfície da cerâmica como se tratasse de uma pintura [47].
Posteriormente este revestimento cerâmico é calcinado em uma atmosfera rica em
H2 a uma temperatura de cerca de 1500ºC, onde irá ocorrer a densificação das
fases metálicas pela fase vítrea, obtendo-se então uma ligação do revestimento à
superfície cerâmica [47].
Capítulo 3 --- União Metal-Cerâmica --- 56
Outro processo é a ativação por hidreto de titânio (TiH2), a qual consiste na
aplicação de um pó de TiH2 sobre a superfície cerâmica, antes da brasagem em
vácuo. O TiH2 dissocia-se entre 350 a 550ºC, dando origem a um revestimento de
Ti de elevada reatividade [47-49].
O processo utilizando sais metálicos, que podem ser dispersos em um
solvente, também permite uma pintura da superfície cerâmica. Ou de uma maneira
mais simples, mergulhar a cerâmica na solução contendo o sal metálico.
Seguidamente se procede à secagem e redução a alta temperatura, formando-se
posteriormente um revestimento de metal ativo na superfície da cerâmica [47].
De uma maneira semelhante, dispersões finas de partículas metálicas e de
vidro em suspensão em uma solução orgânica são também utilizadas para
promover a metalização da superfície cerâmica. A cerâmica revestida é depois
aquecida a temperaturas para “fundir” o vidro, garantindo desta maneira a adesão
das partículas metálicas à cerâmica [17,48].
Uma alternativa ao processo de metalização tradicional é a utilização de
revestimentos metálicos obtidos por deposição em fase vapor para promover a
união M/C. São processos com custo elevado mas os filmes finos depositados na
superfície da cerâmica apresentam uma boa homogeneidade de texturas e
espessuras. Os filmes finos, geralmente de metal reativos como o Ti e Zr, são
normalmente obtidos por processos de pulverização (sputtering) ou vaporização
por feixe de elétrons. São exemplos por esta técnica os revestimentos de Ti por
sputtering, para produzir uniões C/C de ZrO2 parcialmente estabilizada ou de
Al2O3 recorrendo posteriormente a ligas de adição Ag-30Cu-10Sn [17,34,49].
A metalização mecânica de superfícies cerâmicas está sendo largamente
estudada, com o objetivo de conseguir uniões M/C por brasagem sem a utilização
de ligas com metal ativo e a um custo reduzido [29-32,50,51]. A metalização
mecânica foi desenvolvida e patenteada no Forschungszentrum Jülich na
Alemanha (Centro de Pesquisa de Jülich), tendo sido estudado inicialmente na
metalização com titânio em peças de alumina [29].
O processo de metalização mecânica consiste em atritar um material
metálico reativo com a superfície cerâmica a ser revestida, provocando o desgaste
Capítulo 3 --- União Metal-Cerâmica --- 57
componente metálico (menor dureza) e a sua deposição na superfície cerâmica
(componente de maior dureza) [29-32]. A metalização mecânica é um processo
com inúmeras vantagens sobre os demais processos, tais como [29]:
A deposição do filme metálico é feita por equipamentos convencionais, na
temperatura ambiente e em uma única etapa;
A deposição do filme metálico pode ser aplicada apenas nas áreas que se
deseja molhar com a liga de adição;
Processo de fácil automatização e que não exige mão-de-obra
especializada;
Simplicidade e rápida execução;
Baixo custo.
Em seus estudos de brasagem, Nascimento e colaboradores [29,30]
obtiveram com sucesso uniões de ligas de FeNiCo e Cu e alumina metalizada com
Ti, através de brasagem com ligas de adição AgCu, tendo as essas uniões
apresentado boas propriedades mecânicas. Nascimento et al. [31] realizaram
também trabalhos de brasagem de aço inox AISI 310 com nitreto de silício
metalizados com Ti, tendo utilizado ligas de adição Ag28Cu e Au18Ni. As uniões
obtidas revelaram boas propriedades de estanqueidade, ficando os valores abaixo
de 2,0x10-9 mbar.L.s-1. Pimenta [32] conseguiu brasar ligas metálicas Kovar e
Ti6Al4V com zircônia metalizada com Ti e Zr, e liga de adição no AgCu, tendo as
uniões apresentado boas propriedades mecânicas e de estanquidade.
Contudo, os filmes depositados por metalização mecânica apresentam
heterogeneidades de distribuição de texturas e espessuras. Podendo assim
comprometer as propriedades mecânicas das juntas M/C. Torna-se necessário um
controle rigoroso dos parâmetros envolvidos no processo. Normalmente, o titânio
e suas ligas são os materiais metálicos mais utilizados na metalização mecânica,
pois apresentam pobres propriedades tribológicas, com um elevado e instável
coeficiente de atrito e um severo desgaste adesivo [29]. A desvantagem da
utilização de titânio é devido a sua capacidade de absorver grandes quantidades
de O2, N2, H2, oxidando facilmente e formando soluções sólidas intersticiais que
Capítulo 3 --- União Metal-Cerâmica --- 58
propiciam o seu endurecimento a frio, o que, em princípio, pode dificultar o
processo de metalização [52].
É importante salientar que todas estas técnicas de revestimento de
cerâmicas são apenas um passo intermediário no processo de união M/C. Após o
revestimento da cerâmica, o passo final será a brasagem propriamente dita com
recurso a ligas de brasagem ou adição (ex. CuAgAu) [6].
Para se obter uma junta M/C com boas propriedades mecânicas e
herméticas, é necessário que ocorra o molhamento da cerâmica pelo metal de
adição. O molhamento de uma cerâmica pode ser conseguido por dois processos
genéricos: ou por aplicação de um revestimento nas superfícies cerâmicas antes
de se proceder à brasagem (como já referido anteriormente), ou por incorporar
elementos reativos na liga de adição [6,44-46].
A denominação de brasagem ativa difere da brasagem normal, pelo fato de
as ligas de adição possuirem na sua composição química um elemento reativo,
evitando desta forma o recurso à operação intermédia do revestimento com metais
da superfície cerâmica. Deste modo, adicionando um elemento ativo na liga de
adição, como Ti ou Zr, resulta de uma forma geral na reação de redução da
cerâmica e a formação de novas fases compostos molháveis na interface M/C
[53,54]. A sequência de formação destes novos compostos pode ser bastante
complexa, e originar uma série de camadas de reação, envolvendo óxidos simples
e complexos de Ti e outros elementos da liga de adição, compostos
intermetálicos. O sistema multicamada vai atenuar o campo de tensões residuais
gerado pelo ciclo térmico, fazendo uma transição gradual das propriedades físicas
e mecânicas entre o metal e a cerâmica [5-8].
Contudo, é necessário um controle cuidadoso com a seleção dos materiais
(composição química da liga adição ativa) e os parâmetros de brasagem
(atmosfera do forno e ciclo térmico) de modo a evitar a presença de intermetálicos
na interface M/C, que irão afetar de forma negativa as propriedades mecânicas da
junta. A espessura e as propriedades mecânicas de cada fase, bem como o CET e
adesão de cada fase, vão determinar as propriedades finais da união M/C
[17,34,47,55,56].
Capítulo 3 --- União Metal-Cerâmica --- 59
O fenómeno da molhabilidade tem uma importância primordial em métodos
de união M/C e C/C que contem uma fase líquida durante o seu processamento.
3.2. MOLHABILIDADE, ESPALHAMENTO E ADESÃO
A molhabilidade, espalhamento e adesão são fenómenos físicos
inteiramente relacionados com o comportamento dos materiais e as suas
propriedades em situação de interação. O jogo das tensões superficiais envolvidas
determina o grau de molhabilidade entre o sólido e o líquido.
Os átomos e moléculas presentes nas superfícies e interfaces são
energeticamente mais instáveis que os mesmos no interior do material, estando
assim sujeitos a forças de atração e repulsão quando em contacto com outro tipo
de superfícies, isto é, gerando uma tensão superficial. Por conseguinte, esta
energia contida na superfície / interface é denominada por energia interfacial ou
superficial [29, 56-58].
3.2.1. MOLHABILIDADE PASSIVA OU NÃO REATIVA
O grau de molhabilidade de um sólido por um líquido pode ser avaliado em
função do ângulo de contato que esse mesmo líquido faz com o sólido. O ângulo
de contato é obtido através do balanço entre as tensões superficiais, é deduzido
pela equação de Young-Dupré:
cos LVSLSV eq. 3.1)
Onde LVSLSV e , são as tensões interfaciais entre sólido-vapor, sólido-líquido e
líquido-vapor respetivamente, nas condições de equilíbrio termodinâmico 0G
[57,58]. Dado que as tensões superficiais envolvidas não são facilmente
mensuráveis, o grau de molhabilidade, em um sistema não reativo, pode ser
medido pelo ângulo de contato formado na linha tríplice, através da técnica
Capítulo 3 --- União Metal-Cerâmica --- 60
conhecida como “sessile drop”, ou gota séssil ou gota em equilíbrio – ver Fig.19.
Variantes ao método da gota séssil são também utilizados, tais como gota
suspensa, gota transferida, gota em duplo substrato e substrato inclinado [56].
Figura 19 – Gota séssil, ângulo de contato.
Fonte: SOBCZAK, N., 2005 [58].
A equação (3.1) prediz então que se o ângulo º90 o sistema é tido
como não-molhável, e º90 existe molhabilidade. No entanto, alguns autores
[57,59] consideram um sistema parcialmente molhável quando º90 . As tensões
interfaciais podem ser representadas em função das energias interfaciais [57].
A figura 20 representa esquematicamente o comportamento do ângulo de
contato, , quando uma gota de metal líquido é colocada sobre a superfície de um
substrato cerâmico.
Figura 20 - Comportamento do ângulo de contato: a) não-molhável, e b) molhável.
Cerâmica
Metal líq.
sl
sv
lv h
Cerâmica
sl
sv
lv
h
a) º90 Não molha b) º90 Molha
Capítulo 3 --- União Metal-Cerâmica --- 61
Como já mencionado anteriormente, a molhabilidade simples ou passiva
ocorre em condições de equilíbrio termodinâmico, isto é, a natureza química e a
temperatura de cada fase são constantes. Tendo em conta estas condições, só
haverá formação da interface sólido-líquido se a variação de energia livre total do
sistema for menor que zero 0ºG [56-58], sendo que, então a força motriz para
que a interface sólido-líquido avance seja resumida pela expressão em função da
altura da gota (ver eq. 3.2):
dh
dA
dh
dA
dh
dG LVLV
SLSVSL (eq. 3.2)
onde dhedA são a variação da área interfacial e a variação da altura da gota,
respetivamente. Uma vez que a altura da gota está relacionada com o ângulo de
contato. Assim sendo, facilmente se entende que à medida que a variação de
energia livre em função da altura da gota tender para um valor inferior a zero
0
dh
dG, a área interfacial aumenta e o ângulo de contato diminui.
O aumento da área está relacionado com a redução da energia livre do
sistema. Este aumento da área interfacial também se denomina por trabalho de
adesão. O trabalho da adesão Wa pode ser definido como o trabalho por unidade
de área necessário para separar reversivelmente uma interface sólido/líquido,
criando interfaces sólido/vapor e líquido/vapor como demonstra a eq. 3.3:
SLLVSVWa (eq. 3.3)
Combinando esta equação com a equação de Young, Wa pode ser definido em
função do ângulo de contato , segundo a eq. 3.4 [56-58].
1cos LV
Wa
(eq. 3.4)
Capítulo 3 --- União Metal-Cerâmica --- 62
Esta equação (eq. 3.4) revela que o ângulo de contato em equilíbrio para
um dado metal líquido sobre o substrato sólido é o resultado da competição entre
dois tipos de forças: forças de adesão que se desenvolvem entre as fases líquido-
sólido, sendo expressas pelo Wa (trabalho de adesão – tendência para aumentar
a área comum, e portanto, melhorando o molhamento), e forças coesivas do
líquido sendo expressa pela energia superficial do líquido LV , atuando no sentido
oposto (a energia de coesão é aproximadamente igual a 2 LV ).
Sendo que a molhabilidade é um processo termodinâmico, o espalhamento
é cinético. Podemos dizer que a molhabilidade está relacionada com o ângulo de
contato, , e o espalhamento está correlacionado com o aumento da área
projetada. É possível abordar o fenómeno do espalhamento sob o ponto de vista
hidrodinâmico ou termodinâmico. Assim sendo, termodinamicamente o
espalhamento acontece com a redução da energia livre de Helmholtz. O
coeficiente de espalhamento de um líquido na superfície dum sólido é então
definido como:
SLLVSVVSS (eq. 3.5)
Assim para se “consumir” a interface SV necessita-se o mesmo trabalho que para
criar as interfaces SL e LV . Como no equilíbrio a variação da energia de
Helmholtz deve tender a zero, o coeficiente de espalhamento sendo positivo, será
sempre maior que a soma de LVSL e . Já com o coeficiente de espalhamento
sendo negativo, SV , será menor que a soma de LVSL e [57].
Apesar do sucesso para explicar a molhabilidade e espalhamento, a
equação de Young tem sido alvo de grande controvérsia e debate, por não ter em
conta alguns fatores que podem influenciar estes fenómenos, como por exemplo:
Capítulo 3 --- União Metal-Cerâmica --- 63
- Gravidade:
A equação de Young prediz um único valor de sem ter em conta a
presença de campos externos, como a gravidade. Isto contrasta com as
observações comuns onde as gotas mostram formas distorcidas em planos
inclinados. Baseado em fatos experimentais, Eustathopoulos et al. [56] concluiram
que a gravidade tem influência na cinética do espalhamento para uma gota com
massa superior a 0,1grama, verificando-se um aumento na base do raio da gota.
A gravidade também influencia a adsorção de gás em superfícies ásperas
não-molháveis e opõem-se a essa adsorção fazendo com que o gás tenha que,
localmente, “empurrar ou levantar” o líquido para poder penetrar nas cavidades de
superfície [56,59,60].
- Rugosidade:
A equação de Young aplica-se a superfícies ideais, perfeitamente lisas e
desprovidas de heterogeneidades químicas e estruturais. O ângulo de contato
medido numa superfície rugosa (chamado ângulo Wenzel, W ) não obedece à
equação de Young e está relacionado com o ângulo de Y (Young) através:
YW r coscos (eq. 3.6)
onde r é a razão entre a área molhada e a área aparente.
Asperidades superficiais excedendo 10nm em tamanho podem “ancorar” a
linha de contato. A evolução do ângulo de contato é sensível ao estado superficial
do material, daí a importância da preparação cuidadosa das superfícies, tornando-
as o mais lisas possível e homogéneas [56,57,61].
- Heterogeneidade química:
A maior parte das superfícies sólidas (com exceção dos monocristais)
raramente são consistentes e limpas. Essa heterogeneidade pode ser o resultado
de oxidação, corrosão, fases múltiplas (ex: eutéticas), filmes adsorvidos,
Capítulo 3 --- União Metal-Cerâmica --- 64
interceção entre discordâncias e contornos de grão com a superfície, anisotropia
cristalográfica, etc. A molhabilidade e espalhamento são sensíveis a tais
heterogeneidades químicas e estruturais. Nos últimos anos, tem-se assistido a
diversos estudos sobre a molhabilidade em monocristais por metais fundidos
estudando precisamente a influência de algumas heterogeneidades em particular
[56,57,59,61,62].
3.2.2. MOLHABILIDADE REATIVA
Até aqui apenas se focaram aspetos que influenciam o fenómeno da
molhabilidade simples ou passiva, a qual possui pouco interesse prático e
comercial. Contudo existem sistemas em que o líquido reage com o sólido,
havendo formação de compostos (novas camadas), difusão, precipitação e
segregação [57]. Estes fenómenos estão todos interligados, tornando o estudo
físico e cinético da molhabilidade reativa bastante complexo.
Na figura seguinte (ver Fig. 21) é apresentado um hipotético sistema com
molhabilidade reativa.
Figura 21 - Formação da camada de reação no processo da molhabilidade reativa.
Capítulo 3 --- União Metal-Cerâmica --- 65
Segundo o anteriormente dito, torna-se então necessário a modificação da
equação de Young. Em 1997 Li [59] propôs a modificação segundo a eq. 3.7:
0cos LVSSSLSV GA (eq. 3.7)
sendo que, SS é a energia interfacial da camada de reação e A uma constante
relacionada o número de moles do produto formado por unidade de área da base
da gota. Não sendo fato estabelecido se a reação interfacial ou a difusão de um
componente de uma fase para a outra é o que provoca a diminuição da energia
interfacial. Contudo, a existência de várias camadas pode tornar o sistema
bastante complexo [59].
Vários têm sido os modelos propostos para descrever o comportamento da
molhabilidade reativa [56,58-79]. Entre esses modelos empíricos existentes, o
chamado “Modelo do Produto de Reação” (Reaction Product Model - RPC)
proposto por Mortensen e Eustathopoulos [62,63] em 1997 e 1998, merece
destaque. Neste modelo, estes autores referem que tanto o grau de molhabilidade
bem como a sua cinética são governados pelo novo composto formado na
interface. Até então a molhabilidade reativa sempre era interpretada em função do
termo ΔG, sendo postulado que quanto maior for a reatividade de um sistema
melhor a sua molhabilidade.
Contudo já em experimentos realizados por Espié em 1994 [68] e Landry
em 1996 [69], o termo ΔG tinha sido variado mas a energia superficial foi mantida
constante, contrariando assim o estabelecido.
De fato, Eustathopoulos [63] ao estudar o sistema Cu/Pd(Ti) sobre dois
óxidos – Al2O3 e SiO2 – verificou que o Ti reagia com ambos os óxidos formando o
mesmo produto de reação interfacial, Ti2O3. Mas a reatividade avaliada pela
espessura da camada de Ti2O3 diferia significativamente. Apesar desta diferença,
a medida do ângulo de contato sobre os dois substratos foi bastante semelhante,
conforme pode ser visto na Tabela 3.
Capítulo 3 --- União Metal-Cerâmica --- 66
Tabela 3 - Medidas de espessura camada de reação e ângulo de contato.
Substrato Produto reação Espessura (μm) Ângulo contato (º)
Al2O3 Ti2O3 0.5 34
SiO2 Ti2O3 10 36
Fonte: EUSTATHOPOULOS, N., 1998 [62].
Estes resultados indicam que o fator determinante na molhabilidade reativa
é a química final da interface, isto é, os produtos de reação interfaciais formados,
e não a intensidade da reação interfacial. Ou seja, é a configuração final da
interface que determinará o ângulo de contato do sistema – ver modelo na Fig. 22.
Figura 22 – Modelo RPC proposto por Eustathopoulos – Ângulo de contato inicial: (a) depois de um
transiente, é estabelecido um estado de quase equílibrio na linha tríplice e o avanço do líquido é inibido
pelo substrato, (b) e (c) a única maneira do movimento continuar é pelo crescimento lateral de cada
lado do produto de reação (P). Fonte: EUSTATHOPOULOS, N., 1998 [62].
Opinião contrária a esta conclusão foi manifestada por Saiz e seus
colaboradores de Berkley (USA) em trabalhos publicados em 1998 e 2000,
utilizando ligas de Cu-Nb ou Cu-Ti sobre alumina. Efetivamente, Saiz et al. [70,71]
propõem um modelo no qual a molhabilidade reativa é provocada primeiramente
pela adsorção do elemento ativo na interface, sendo que a reação subsequente
não exerce influência no processo (ver Fig. 23). Refere também que a cinética do
molhamento é governada pela migração da frente formada na linha tríplice sólido-
líquido-vapor.
Capítulo 3 --- União Metal-Cerâmica --- 67
O modelo de Saiz rejeita também a premissa de que um bom molhamento
só pode ser obtido com uma concentração alta do elemento ativo no líquido [71].
Figura 23 – Modelo de molhabilidade reativa, proposto por Saiz et al. , onde existe escoamento líquido
(a); adsorção de elementos ativos (b); formação e crescimento de uma frente na tripla interface (c-d).
Este modelo foi rejeitado por Estathopoulos em seus artigos de opinião
[72,73]. Pela análise de resultados experimentais em sistemas de ligas adição
contendo Ti/alumina parece evidente que o comportamento da molhabilidade
destes e outros sistemas similares dificilmente pode ser explicado pela adsorção e
pelo controle da frente da linha tríplice. Este fato deve-se pela simples razão de
que para temperaturas baixas e moderadas (T<1200ºC) a taxa de crescimento das
frentes na linha tríplice na superfície cerâmica não é suficientemente grande,
quando comparada as taxas do espalhamento reativo, para afetar a cinética deste
tipo de molhamento. De fato, com o aumento da temperatura o transporte de
massa será mais rápido, resultando no aumento do crescimento das frentes na
linha tríplice.
Contudo um aumento da velocidade do espalhamento reativo também é
suposto ocorrer com o incremento da temperatura, como evidenciado através das
elevadas energias de ativação deste processo (várias centenas de KJ/mol).
Portanto, o papel das frentes da linha tríplice no espalhamento reativo não seria
preponderante mesmo a altas temperaturas.
a) b)a
c)a
d)a
Cerâmica Cerâmica
Cerâmica Cerâmica
Metal liq.
Capítulo 3 --- União Metal-Cerâmica --- 68
Diversos estudos [2,6,43-45,53,54,56-106] mostram vários sistemas de
molhabilidade de altas temperaturas, sob os quais se faz alusão a tentativas de
interpretar o complexo comportamento interfacial que ocorre durante o
espalhamento reativo, oferecendo diversas visões sobre as reações interfaciais e
a cinética do espalhamento, tendo por base o espalhamento viscoso, as reações
químicas na frente de formação; evaporação-condensação de elementos reativos;
nucleação, crescimento e coalescência de produtos de reação na interface sólido-
líquido (baixando a SV ) e finalmente o espalhamento numa camada de reação já
formada anteriormente. No entanto, vale salientar que os modelos apenas
explicam a molhabilidade reativa para um dado sistema em particular.
Conceptualmente, o espalhamento pode ser dividido em dois estágios. O
primeiro estágio corresponde ao rápido espalhamento onde a força motriz é o
balanço entre as tensões interfaciais, característica de líquidos inertes. No
segundo estágio temos as interações químicas entre as espécies na forma de
reações de óxido-redução e dissolução, onde os átomos do substrato se
dissolvem no líquido formando novos compostos. Inicialmente na forma de
pequenos cristais nucleando em locais preferenciais da interface sólido – líquido,
que depois crescem para formar uma camada contínua de produtos de reação
[62,63,74,78]. Essas reações acima mencionadas de oxido-redução e formação de
compostos, ex. intermetálicos, podem ser esquematizadas da seguinte forma:
Me2 + ½O2 → Me2O
Me1 + ½O2 → Me1O
Me1O +Me1 → Me1[O]
Me1O + Me2O → Me2O[Me1O]
Me1 + Me2 → Me1[Me2]
A formação de óxidos e compostos intermetálicos deve ser estável, ou seja,
a variação total de energia livre de formação tem de ser negativa para que a
formação possa ocorrer [81,82].
Capítulo 3 --- União Metal-Cerâmica --- 69
O efeito da difusão no espalhamento reativo tem sido modelado [68,73,74]
assumindo que os efeitos da curvatura da gota e convecção são desprezáveis, e
que a camada de produto de reação na interface atua como uma barreira à
difusão. O modelo mostra que a 4ª potência do valor do raio da gota, R , varia
linearmente com o produto do volume, V , e o tempo de espalhamento, t , de
acordo com:
tVKR 4 (eq. 3.8)
Esta relação contrasta com a relação linear entre R e t obtida quando a
cinética de reação controla o processo de espalhamento.
De fato para certos sistemas tais como Al/C (vítreo); CuAgTi/Al2O3,
observa-se uma cinética linear do espalhamento, e o raio da base da gota
aumenta linearmente com o tempo [62,69]. Nestes sistemas, as reações químicas
modificam a superfície do sólido e controlam o espalhamento. O ângulo de contato
inicial é normalmente elevado, devido à resistência ao espalhamento por parte dos
óxidos superficiais. Mas a “desoxidação” a elevadas temperaturas e o alto vácuo,
atuam para “romper” a barreira dos óxidos superficiais, permitindo assim uma
diminuição do ângulo de contato, , e consequentemente, um aumento da
velocidade de espalhamento. Contudo, uma vez formados os novos produtos de
reação sólidos, a velocidade ou taxa de espalhamento reajusta-se novamente à
molhabilidade da nova fase formada [57].
A molhabilidade a alta temperatura é influenciada por um vasto número de
variáveis, sendo elas: temperatura, tempo de contato, atmosfera, rugosidade,
estrutura cristalina, composição, pré-tratamentos superficiais, segregação,
adsorção e reações interfaciais. Muitos artigos têm sido publicados,
documentando um dos fatores que influenciam o fenómeno da molhabilidade
[6,56,57,61,75,76,78,83-87].
Basicamente, três tipos de interações podem promover a molhabilidade a
elevadas temperaturas de sistemas sólido-liquido: dissociação dos óxidos
Capítulo 3 --- União Metal-Cerâmica --- 70
superficiais no metal líquido; dissolução química do sólido no líquido e adsorção
interfacial de solutos reativos; e formação de um composto interfacial molhável.
Para temperaturas elevadas, o espalhamento pode ser dificultado pela
presença de produtos de reação sólidos (ex: óxidos) no líquido, os quais impedem
o espalhamento resultando assim um ângulo de contato elevado. A estabilidade e
influência protetora da camada de filmes de óxidos são afetadas pelo efeito da
temperatura, atmosfera e elementos de liga [56,62,63,86,87].
Conforme já supracitado, a molhabilidade reativa depende fortemente do
tempo de contato, como pode ser evidenciado pela equação 3.9, que relaciona o
ângulo de contato com o tempo:
t
Pt exp (eq. 3.9)
Em que P é uma constante; é o tempo característico para o espalhamento e
o ângulo de contato para tempos longos [57,84].
A presença de um alto vácuo pode introduzir alterações no sistema. Poderá
eventualmente destruir o filme e formar sub-óxidos ou outros produtos gasosos a
altas temperaturas. Desta forma estabelece-se um contato físico entre a liga
metálica não oxidada e o material cerâmico, originando uma queda súbita do
ângulo de contacto [56,57].
Substratos de carbetos, como o SiC, poderão grafitizar (formando carbono
livre) com a subsequente sublimação de silício a altas temperaturas [89,90].
Temperaturas elevadas diminuem a tensão vapor do líquido e promovem a
molhabilidade. A velocidade de espalhamento aumenta também devido à
diminuição da viscosidade do líquido a temperaturas mais elevadas [56].
A composição do líquido influencia notavelmente a sua molhabilidade com
sólidos. Assim, a presença de Cr e Ti no Cu fazem com que o sistema de
Cu/Grafite se torne molhável. Da mesma forma, Si em Al/SiC, Mg em Al/SiO2 e
Al/Al2O3 e Ti em Al/C melhoram substancialmente a condição de molhabilidade,
embora os mecanismos de molhabilidade sejam diferentes [6,57,73,78,85]. Assim,
Capítulo 3 --- União Metal-Cerâmica --- 71
um teor elevado de Si no sistema Al/SiC reduz a propensão para a não
molhabilidade dos compostos de Al4C3 formados [56,90]. De forma similar, o Mg
em Al/SiO2 e Al/Al2O3 “remove” os óxidos da superfície e forma produtos de
reação molháveis (por exemplo, espinelas de MgAl2O4) [56,60,79].
O Ti e o Zr são os elementos preferenciais para induzir reações na
interface, embora existam outros, tais como Ta, Nb, Al, Cr e V. Sendo o Ti o
elemento mais extensivamente usado, uma vez que a sua adição favorece
substancialmente a molhabilidade e o espalhamento por redução do ângulo de
contato, , e aumento do trabalho de adesão Wa [56,57,85,89,92,93].
Tomsia em 1993 estudou o efeito da variação da concentração dos
elementos Ti e Zr, no molhamento da liga eutética 72Ag28Cu sobre a cerâmica
nitreto de alumínio [94] – ver Fig. 24.
Figura 24 - Comportamento da molhabilidade das ligas de Ti-AgCu e Zr-AgCu sobre AlN.
Fonte: TOMSIA, A. 1993 [94].
Capítulo 3 --- União Metal-Cerâmica --- 72
Através da figura 24 é possível verificar que os elementos de liga Ti e Zr
reduzem consideravelmente o ângulo de contato. À medida que a concentração
do elemento reativo aumenta, verifica-se uma contínua diminuição do ângulo de
contato com o tempo para uma data temperatura. Para uma dada concentração do
elemento reativo, constata-se que o Ti produz um efeito mais pronunciado na
diminuição do ângulo de contato que o Zr. Este fato deve-se à atividade
termodinâmica do Ti (aTi) ser maior do que atividade de Zr na liga AgCu. O Ti é
rapidamente segregado para a interface, reagindo com os demais elementos da
cerâmica e liga metálica, formando compostos estáveis 0ºG e molháveis [94].
A atividade de um dado elemento soluto depende do sistema M/C. Kritsalis
et al. observaram que aumentando o teor de Ti na liga NiPd, sobre alumina
monocristalina, resultava na formação de óxidos de Ti com diversos graus de
oxidação, como indica a figura 25. Contudo, apesar de se verificar um aumento da
molhabilidade, a resistência mecânica da junta metal-cerâmica diminui
consideravelmente [95].
Figura 25 - Variação do ângulo de contato no sistema NiPd-Ti- Alumina monocristalina, a temperatura
de 1300ºC, em função da fração molar de Ti.
Fonte: KRITSALIS, P., 1994 [95].
Capítulo 3 --- União Metal-Cerâmica --- 73
Neste sistema, elevados ângulos de contato são encontrados para
concentrações de até 15% de Ti. Este fato é explicado pela baixa atividade de Ti
na interface, devido às fortes interações químicas entre Ni-Ti e Pd-Ti na liga. Esta
diminuição da atividade de Ti resulta na formação de óxido de Ti de maiores graus
e oxidação, tais como Ti5O9 e Ti3O5.
Voytovych e seus colaboradores [96] estudaram também o efeito da
concentração de Ti no sistema da liga eutéctica AgCu sobre alumina
monocristalina, tendo observado que aumentando o teor de Ti na liga AgCu, havia
uma diminuição do ângulo de contato como mostra a figura 26.
Figura 26 – Variação do ângulo de contato em função do tempo e temperatura, para as concentrações
de 0.7Ti (o), 2.9Ti (■) e 8.0Ti (▲) em % at.
Fonte: VOYTOVYCH, R., 2006 [96].
Valores semelhantes para o ângulo de contato final foram encontrados para
as concentrações de 2,9 e 8,0 de Ti. Este fato pode ser facilmente explicado pela
formação do composto tipo M6X, Ti3Cu3O ou Ti4Cu2O. Para a concentração de 0,7
Ti (%at.) não se verifica a formação do composto M6X, mas sim o óxido TiO. Na
tabela 4 estão expostos alguns resultados de Voytovych et al [96].
Capítulo 3 --- União Metal-Cerâmica --- 74
Tabela 4 – Ângulo de contato e produtos de reação formados na interface para diferentes concentrações
de Ti na liga AgCu sobre alumina [96].
% Ti (at.) Produto de reação Ângulo de contato (º)
0,7 TiO 63
2,9 Camada I : TiO
10 Camada II : Ti3Cu3O
8,0 Ti3Cu3O ou Ti4Cu2O 7
Fonte: VOYTOVYCH, R., 2006 [96].
Estes autores verificaram também que a adição acima de 6.0 Ti (%at.) não
trazia melhoria significativa no aumento da molhabilidade e espalhamento,
reduzindo significativamente a resistência mecânica da interface, devido à
formação de compostos no sistema Cu-Ti próximo à interface e na liga [96].
Wei et al. [97] estudaram a atividade de Ti no sistema eutético AgCu em
substratos de alumina a 1000ºC em alto vácuo, variando ligeiramente os teores
dos elementos. A figura seguinte (Fig. 27) mostra a relação entre o coeficiente de
atividade de Ti (γTi) e a sua concentração (XTi) na liga eutética AgCu fundida.
Figura 27 – Coeficiente de atividade do Ti no eutético AgCu fundido a 1000ºC em função da
concentração de Ti.
Fonte: WEI, P., 2002 [97].
Capítulo 3 --- União Metal-Cerâmica --- 75
Facilmente se constata que o coeficiente de atividade de Ti aumenta com o
incremento da concentração de Ti na liga AgCu. A relação entre γTi e a sua XTi
pode ser expressa por:
277,2208922,39058,2 TiTiTi XXLn (eq. 3.10)
Estes autores estudaram também o efeito do teor de Cu e Ag no coeficiente de
atividade de Ti no eutético AgCu fundido.
Figura 28 – Efeito da concentração de Cu no coeficiente de atividade de Ti, no eutético AgCu contendo
1 %wt Ti, a 1000ºC em alto vácuo.
Fonte: WEI, P., 2002 [97].
O resultado exposto na figura anterior indica que um aumento da
concentração de Cu, resulta na diminuição da no coeficiente de atividade de Ti na
liga AgCu fundida. As fortes interações devido à elevada solubilidade de Cu no Ti,
permitindo fortes interações, as quais resultam na formação de compostos
intermetálicos.
Efeito contrário pode ser observado na figura 29. O aumento do teor de Ag
leva ao incremento do coeficiente de atividade de Ti na liga eutética AgCu, devido
Capítulo 3 --- União Metal-Cerâmica --- 76
à baixa solubilidade do Ti na Ag a 1000ºC. A introdução de outros elementos, tais
como índio (In) e estanho (Sn) com o intuito de melhorar a fluidez e baixar o
intervalo de fusão da liga AgCu, podem influenciar a atividade de Ti na liga AgCu.
A solubilidade de Ti no In é comparável à da Ag para 1000ºC. Como tal, a adição
de In não produz um efeito significativo na solubilidade do Ti ou no coeficiente de
atividade de Ti na liga AgCu. Contudo, o Sn tem uma maior solubilidade de Ti do
que a Ag, e a adição de Sn deve aumentar a solubilidade de Ti. Este fato tem
como resultado a diminuição da atividade do Ti.
Figura 29 - Efeito da concentração de Ag no coeficiente de atividade de Ti, no eutético AgCu contendo
1 %wt Ti, a 1000ºC em alto vácuo. Fonte: WEI, P., 2002 [97].
No geral, a adição de elementos reativos nas ligas de brasagem melhora a
condição de molhabilidade, espalhamento e adesão da união metal-cerâmica.
Elementos reativos, como o Ti, de elevada atividade termodinâmica, promovem a
formação de compostos molháveis na interface. Contudo deverá existir um
compromisso entre molhabilidade e resistência mecânica da junta. Adições acima
de determinadas concentrações diminuem a resistência mecânica, pois podem
induzir a formação de precipitados intermetálicos na interface ou na sua
vizinhança, fragilizando assim a união.
Capítulo 3 --- União Metal-Cerâmica --- 77
As reações interfaciais de molhabilidade/crescimento estão limitadas por
cinéticas de interface, taxa de difusão, ou combinação de ambos. Uma vez
formada uma fina camada de produto de reação, o crescimento está normalmente
limitado por difusão nesta camada e a espessura aumenta “parabolicamente” com
tempo segundo a equação abaixo;
tkX p 2 (eq. 3.11)
onde pk é a constante parabólica de crescimento e t é o tempo [57].
Simples modificações da lei parabólica são necessárias a ter conta para
interfaces irregulares (não-planar), formação de fases de intermédias instáveis e a
existência de circuitos curtos nos movimentos de difusão como interfaces,
contornos de grão e discordâncias [56].
A natureza da ligação atómica e a estabilidade termodinâmica de sólidos
em contato com líquidos estão relacionadas com a sua molhabilidade a altas
temperaturas.
No caso de carbetos, a molhabilidade diminui com o calor latente de
formação do carbeto. O elevado calor de formação implica a formação de fortes
ligações interatómicas, e correspondentemente fraca interação com metais
líquidos.
No caso de óxidos, a molhabilidade diminui com um aumento na energia
livre de formação de óxido [63,68 84,90,91]. Cerâmicos com elevado grau de
ionicidade, como alumina e zircônia, são relativamente difíceis de molhar uma vez
que os seus elétrons estão fortemente emparelhados.
Por outro lado, cerâmicas ligadas covalentemente são mais facilmente
molháveis por metais líquidos do que as cerâmicas altamente iónicas devido a
uma certa semelhança entre as ligações metálicas e as covalentes [56,57,68,79,
96-100].
Capítulo 3 --- União Metal-Cerâmica --- 78
Em sistemas Metal/Metal, e na ausência de barreiras que impedem o
molhamento, tais como filmes de óxidos no líquido ou sólido, os metais líquidos
molham substratos metálicos (usualmente θeq < 50°), qualquer que seja a
intensidade das interações entre o líquido e o sólido. As razões prendem-se com o
fato dos metais liquidos e sólidos metálicos possuírem a mesma estrutura e
coordenação Z. Embora para metais sólidos com estrutura fcc (cúbica de corpo
centrado) Z= 12, sendo que a média do valor de Z para líquidos metálicos situa-se
entre 9-11 [56].
Muitos sistemas Metal/Metal possuem algum grau de solubilidade mútua,
ou formam compostos intermetálicos na interface líquido-sólido, sendo fatores que
também contribuem para um aumento da condição de molhabilidade. A principal
condicionante das reações interfaciais é o rompimento da camada de óxido que
cobre as superfícies metálicas, permitindo assim a formação de verdadeiras
interfaces metal-metal [56].
O conhecimento da molhabilidade em sistemas metal/óxido é
extremamente importante em muitos campos da engenharia de materiais, uma vez
que os óxidos são os materiais cerâmicos mais extensivamente utilizados. Além
do que as interfaces metal/óxido tem também um papel fundamental em pares
metal/metal e metal/cerâmica não-óxida, nos quais um dos componentes é um
material oxidável (ex: aço inox ou SiC). Assim nestes sistemas, é amplamente
reconhecido o efeito preponderante que o oxigénio possui, sendo a sua
concentração no metal líquido importante para a atribuição da condição de
sistema reativo ou não-reativo sob o ponto de vista da molhabilidade.
A alta temperatura existe sempre alguma dissolução do óxido no metal
líquido. A questão fulcral é saber até que ponto esta reatividade afeta a
molhabilidade. Quando a fração molar do oxigénio dissolvido (XO) é maior que o
limite de solubilidade do oxigénio no metal, ocorre a precipitação de um óxido. O
oxigénio dissolvido no metal líquido (XO) pode ter origem na dissolução do óxido
na interface (XIO) ou advir da fase vapor (atmosfera do forno) pela superfície da
gota (XSO) [56]. – ver Fig. 30.
Capítulo 3 --- União Metal-Cerâmica --- 79
Figura 30 - Oxigénio dissolvido no metal líquido (Xo).
Deve-se ter em conta que, embora XIO e XS
O possam ser calculados
teoricamente, é impossível na prática calcular o valor correto de XO na linha tríplice
líquido(metal)-sólido(óxido)-vapor, uma vez que XO depende da cinética da reação
interfacial e dos processos de adsorção de oxigénio.
Considere-se a reação de dissolução do óxido AnOm no metal líquido M na
interface metal/óxido:
OmAnOA mn (eq. 3.12)
Os parêntesis significam que os elementos estão dissolvidos na matriz M. Se a
fase vapor não influencia as reações na interface sólido/líquido e a difusão dos
componentes (A e O) do sólido AnOm é baixa comparada com a taxa de dissolução
na interface, os valores da fração molar de A (XA) e O (Xo) no líquido devem
satisfazer a condição:
OA nXmX (eq. 3.13)
O progresso da reação de dissolução (eq. 3.12) em equilíbrio pode ser
caracterizado pela fração molar de O no líquido M (Xo) através da expressão:
Capítulo 3 --- União Metal-Cerâmica --- 80
RTmn
G
n
mX R
mnn
O
*/
exp (eq.3.14)
onde MOMAAnOmfR GmGnGG 0*
(eq. 3.15)
em que 0
AnOmfG e MOAG , correspondem à energia livre de Gibbs para a
formação do óxido AnOm e à entalpia da solução numa diluição infinita das
espécies A e O dissolvidas no metal M, R é a constante dos gases ideais (8,314
J.mol-1.K-1) e T a temperatura (K).
Baseado em estudos e evidências experimentais de vários sistemas (ver
Fig. 31), Eustathopoulos et al. [56] consideram que os sistemas metal/óxido
podem ser divididos em 3 categorias. Sistemas nos quais a fração molar de
oxigénio dissolvido no metal líquido, com origem no óxido XO, é menor que 10-6,
possuem ângulos de contato de 110 a 140ºC. As fracas interações físicas, entre
metal/óxido situam-se numa estreita interface e resultam em valores do trabalho
de adesão que são menores quando comparados o trabalho de coesão do metal.
Para sistemas com XO> 10-5 o oxigénio dissolvido e os átomos metálicos do
óxido, podem produzir uma melhoria significativa na molhabilidade através da
formação de camadas de adsorção 2D (isto é, com uma espessura típica de 1 nm)
na interface metal/óxido. Estas adsorções podem conduzir a ângulos de contato
inferiores a 90º.
Finalmente, sistemas de baixos ângulos de contato, onde o metal líquido
reage com o óxido formando compostos “3D” na interface, os quais possuem
algum caracter metálico na sua ligação química.
Na figura seguinte está exposta uma compilação de dados de ângulos de
contato de sistemas de metais líquidos puros sobre óxidos, em função da fração
molar de oxigénio no metal líquido (XO).
Capítulo 3 --- União Metal-Cerâmica --- 81
Figura 31 – Compilação de ângulos de contato experimentais de sistemas Metal líquido puros/ Óxido Vs
fração molar de oxigénio calculada no metal líquido, devido a dissolução do óxido.
Fonte: EUSTATHOPOULOS, N., 1999 [56].
O oxigénio dissolvido no metal líquido melhora a molhabilidade, mesmo em
concentrações baixas da ordem das dezenas de ppm [56]. Para atmosferas com
alta PO2, Naidich [107] propôs que o oxigénio dissolvido e os átomos metálicos
formam clusters (aglomerados) possuindo um caráter parcialmente iónico devido à
transferência de carga do metal para o oxigénio. Tais aglomerados podem
desenvolver interações coulômbicas com qualquer substrato iónico, e por esta
razão, segregar para a interface metal/óxido, melhorando desta forma a
molhabilidade e adesão. Para atmosferas com PO2 muito baixa, Tournier [108]
propõe um modelo baseado no movimento de lacunas de oxigénio (vacâncias,
interstícios ou vazios de oxigénio), em analogia ao mecanismo proposto por
Naidich [107] para a adsorção do oxigénio dissolvido no metal para a interface
metal/óxido. A formação de lacunas de oxigénio pode conduzir a uma rutura
parcial da ligação iónica, sendo expectável que alguma redução nos iões
não-reativo
reativo
Capítulo 3 --- União Metal-Cerâmica --- 82
metálicos em torno da lacuna possa ocorrer. Assim, o componente ativo na
interface é um aglomerado constituído por uma lacuna de oxigénio rodeada por
átomos metálicos parcialmente oxidados. A segregação de tais aglomerados para
o lado do óxido na interface assegura uma transição gradual dos átomos metálicos
oxidados (cátions no óxido) para os átomos com ligação metálica (átomos no
líquido). A representação de ambos mecanismos está exposta na figura seguinte.
Figura 32 - Mecanismos de Naidich(a) e Tournier(b) para adsorção de oxigénio na interface
metal/óxido.
A introdução de dopantes (ex: Y2O3 e MgO) em cerâmicas (ex: ZrO2)
aumenta o número de defeitos pontuais (ex: lacunas de oxigénio), e como foi
salientado anteriormente, estes defeitos podem interagir com o metal na interface,
tendo influência na adesão e na molhabilidade. A introdução de outros elementos
de liga no metal líquido, e de dopantes no óxido, torna o processo de adsorção de
oxigénio na interface metal/óxido bastante complexo de ser entendido e modelado.
Em sistemas não-molháveis metal/óxido, uma melhoria na condição de
molhabilidade pode ser obtida ou através da adsorção de oxigénio na interface
metal/óxido, sendo esse oxigénio suprido por um gás com uma pressão parcial de
oxigénio (PO2) controlada, ou através da introdução de um elemento de liga
reativo, o qual modificará in situ a química da interface.
Capítulo 3 --- União Metal-Cerâmica --- 83
De tudo exposto neste sub-capítulo facilmente se entende que a
compreensão do comportamento do fenómeno da molhabilidade a altas
temperaturas em sistemas M/C é um aspeto de vital importância para o sucesso e
aperfeiçoamento de processos industriais nas áreas da fundição e metalurgia,
sobretudo em processos de união M/C, onde esteja presente uma fase líquida,
como é no caso da brasagem. Assim sendo, o entendimento dos mecanismos
inerentes à molhabilidade na brasagem de insertos cerâmicos no corpo metálico
da broca ou do rolamento torna-se fundamental para obtenção de uma união
estável química, térmica e mecanicamente resistente, podendo dar garantias para
uma maior durabilidadel da broca em serviço, e desta forma, optimizando os
custos associados à operação de perfuração de poços petróleo e gás natural.
UFRN - PPGCEM
CAPÍTULO 4
SELEÇÃO DE MATERIAIS
Jorge Carlos Pereira
Novembro 2012
Natal - RN
No Capítulo 4 estão expostos os requisitos e critérios de seleção dos materiais para insertos cerâmicos, bem como as ligas de adição utilizar nos ensaios de molhamentos, para possível aplicação em cones para brocas de perfuração de poços de petróleo e gás natural.
Capítulo 4 --- Seleção de Materiais --- 85
4. SELEÇÃO DE MATERIAIS
Neste capítulo estão expostos alguns pressupostos a ter na seleção de
possíevis insertos cerâmicos e de “metal duro”, bem como das ligas de adição,
para possivel utilização em experimentos de molhamento e futuras brasagens
para brocas de perfuração de poços de petróleo.
Na seleção das cerâmicas foram tidos em consideração alguns requisitos
tidos como importantes para as condições de trabalho das brocas tricônicas. Entre
esses requisitos estão a resistência mecânica em esforços de compressão,
resistência térmica e ao desgaste e a estabilidade química.
As cerâmicas selecionadas para os experimentos de molhamento foram a
zircônia (ZrO2), o nitreto de silício (Si3N4). Além das propriedades acima
mencionadas, estas cerâmicas possuem uma excelente estabilidade química em
meios ácidos e alcalinos, sobretudo a zircônia e o nitreto de silício [17]. Desta
maneira, estas cerâmicas tornam-se materiais interessantes para aplicação como
insertos duros no corpo da broca, dado que os fluidos existentes no poço podem
ter características altamente corrosivas, contendo ácidos do tipo H2S e H2SO4.
O carbeto de tungstênio em matriz de cobalto tem sido utilizado como
material de eleição para os insertos duros nas brocas de perfuração, uma vez que
as brocas com insertos de diamantes naturais e sintéticos são bastante mais
caras, e apenas se justificam para perfuração de poços de grandes profundidades
(acima de 3.000 m), ou com formações rochosas extremamente duras [11,13].
Assim sendo, o carbeto de tungsténio emerge como a cerâmica natural a utilizar
neste trabalho.
Os requisitos para a seleção das ligas de adição ou brasagem estão
relacionados com a disponibilidade imediata das mesmas, o seu custo, ponto de
fusão ou intervalo de fusão relativamente baixo, e possível reatividade com as
cerâmicas selecionadas, tendo também como base trabalhos existentes na
literatura.
Capítulo 4 --- Seleção de Materiais --- 86
4.1. MATERIAIS CERÂMICOS
Os materiais cerâmicos são caracterizados por ligações atómicas fortes, de
caracter iónico e/ou covalentes entre os seus átomos. Os óxidos possuem
ligações predominantemente iónicas e os nitretos e carbetos de carácter
covalente. A natureza destas ligações é responsável por algumas propriedades
que são características das cerâmicas tais como: elevada dureza; alto ponto de
fusão; estabilidade química e resistência ao desgaste. Contudo, estas mesmas
fortes energias de ligação, que mantem os átomos coesos, fazem com que estes
materiais apresentem um comportamento mecânico frágil, sobretudo quando
sujeitos a esforços de tração, cisalhamento e flexão [1].
Para aplicações estruturais, a principal limitação das cerâmicas é a sua
fragilidade. Este fato deve-se à facilidade com que as trincas se iniciam e
propagam nas cerâmicas. Trincas essas que tem seu início nos defeitos que são
introduzidos durante o processo de fabricação (ex: porosidades, inclusões),
acabamento superficial (ex: corte, polimento) ou durante a exposição a ambientes
agressivos (ex: químicos e mecânicos). Uma trinca pode ser atenuada ou
interrompida quando a energia que lhe está associada for consumida, como por
exemplo, quando encontram contornos de grão, barreiras, ou se especialmente
ocorre uma transformação de fases na frente da trinca, como acontece na zircônia
[33,34].
Neste capítulo, o carbeto de tungstênio foi incluído neste como pertencente
à classe de materiais cerâmicos. Contudo na verdade, trata-se de um material
compósito, também denominado por “metal duro”, caberto cementado e cermet.
Este material é composto por uma fase dura frágil formada pelo carbeto (WC, TiC,
TaC; TiCN) e a fase ligante (Co; Ni; Fe) [17].
Na tabela seguinte estão expostas algumas cerâmicas, e suas respetivas
propriedades físico-mecânicas com interesse relevante para aplicação em brocas
de perfuração com insertos cerâmicos.
Capítulo 4 --- Seleção de Materiais --- 87
Tabela 5 - Propriedades físicas e mecânicas de algumas cerâmicas [109-113].
Cerâmica
Densidade
(g/cm3)
Dureza
Vickers
(Kg/mm2)
Resistência
Compressão
(Mpa)
Módulo
Young
(GPa)
Tenacidade
Fratura K1C
(MPa.m1/2
)
Max.
Temp.
Uso (ºC)
CET
(10-6
/ºC)
a 200ºC
Alumina
99,5% 3,89 1440 2600 375 4,2 1800 8,4
Carbeto
boro 2,52 3200 3400 470 - - 5,6
Carbeto
silício 3,10 2800 3900 410 4,6 1400 4,0
Nitreto
alumínio 3,26 1100 2100 330 2,6 1370 4,5
Nitreto
silício 3,29 1800 2000 310 6,1 1150 3,3
Zircônia
YPSZ 6,00 1300 2000 260 12 1500 9-10
Zircônia
MPSZ 5,50 1100 1800 200 10 980 5-6.5
WC-Co
6%Co 14,95 2100 5300 670 12 900 5,4
WC-Co
12% Co 15,10 1890 5200 620 13 900 5.9
4.1.1. ZIRCÔNIA
A zircônia, ou óxido de zircónio é um material com aplicações
extraordinárias em engenharia. Pode ser encontrado na natureza sobre a forma de
mineral zirquita ou badaleíta (ZrO2) ou mesmo como zircão (ZrSiO4), o qual após
processamento adequado dá origem à zircônia. As suas elevadas propriedades
mecânicas, baixa condutividade térmica, elevada resistência à corrosão,
estabilidade a altas temperaturas, coeficiente de expansão térmica semelhante às
ligas de aço, são características que fazem da zircônia um material selecionado
para aplicações tais como ferramentas de corte, materiais refratários,
vitrificadores, pigmentos, recobrimentos térmicos e sensores de oxigénio.
Capítulo 4 --- Seleção de Materiais --- 88
Contudo, a zircônia tem como desvantagens o seu elevado custo e a sua baixa
resistência ao choque térmico [17,114,115].
A zircônia pura exibe três formas polimórficas à pressão atmosférica,
passando por transformações de fase até à sua temperatura de fusão, tais como a
monoclínica, a tetragonal e a cúbica. A fase monoclínica é estável até 1173ºC, a
tetragonal até 2370ºC e posteriormente a fase cúbica até à temperatura de fusão
2680ºC. A transformação de fases de tetragonal para monoclínica é acompanhada
por uma expensão volumétrica da célula unitária entre 3 a 5%, sendo suficiente
para exceder a resistência do material, resultando na sua rotura. Portanto, a
fabricação de componentes de zircônia pura não é possível pelo colapso
espontâneo após o resfriamento. Contudo, a adição de certos óxidos
estabilizadores permite manter a forma tetragonal ou cúbica à temperatura
ambiente. Na mudança de tetragonal para cúbica a variação de volume é
inexistente ou desprezável. As fases tetragonal e cúbica, obtidas a altas
temperaturas, podem ser estabilizadas a baixas temperaturas através da adição
de cátions dopantes que possuem números de valência menores, tais como
cátions alcalinos terrosos Mg2+ e Ca2+ e cátions do grupo das terras-raras Y3+ e
Ce3+, os quais se incorporam à estrutura cristalina da zircônia [116].
Segundo Esquivas et al. a zircônia pode ser total ou parcialmente
estabilizada, dependendo da quantidade e do tipo de óxido dopante. Se a
quantidade de óxidos estabilizadores a adicionar à zircônia for inferior à
necessária para a estabilização completa da fase cúbica, irá dar origem a uma
zircônia parcialmente estabilizada, exibindo uma estrutura de partículas de
zircônia tetragonal meta-estáveis dispersas numa matriz de zircônia cúbica. No
caso da ítria, uma concentração variando entre 3 a 6 %mol é necessária para a
obtenção de uma zircônia parcialmente estabilizada. Para valores acima de 6
%mol a zircônia será totalmente estabilizada na forma cúbica [117]. Já a adição de
uma quantidade entre 6 a 10 %mol de magnésia é necessária para estabilizar
parcialmente a zircônia na forma tetragonal. A ítria, assim como a magnésia,
possui como vantagens a sua extensa solubilidade na zircônia tetragonal e o
poder de proporcionar uma redução na temperatura de sinterização, possibilitando
Capítulo 4 --- Seleção de Materiais --- 89
desta forma a formação de grãos mais finos, tendo como consequência a
obtenção de uma cerâmica mais resistente [17].
Como já citado anteriormente, óxidos como cálcia (CaO) magnésia (MgO),
itria (Y2O3) e céria (CeO2) permitem estabilizar parcialmente a zircônia na fase
tetragonal meta-estável à temperatura ambiente. Quando uma trinca se propaga, o
campo de tensões imediatamente na frente dessa trinca induz essas partículas
tetragonais meta-estáveis a sofrer uma transformação para a fase monoclínica.
Esta transformação é acompanhada de um ligeiro aumento do volume da
partícula, resultando no estabelecimento de tensões compressivas sobre as
superfícies da trinca nas regiões próximas à sua extremidade. Como
consequência deste fato, essas tensões compressivas tendem a estrangular e a
fechar a trinca, obstruindo assim o seu crescimento. Este processo é denominado
de aumento da tenacidade por transformação de fase [118].
4.1.2. NITRETO DE SILÍCIO
O nitreto de silício tem tido um papel proeminente no desenvolvimento de
cerâmicas para aplicações de ponta, possuindo excelente resistência à oxidação;
elevada resistência ao desgaste, boa resistência mecânica a elevadas
temperaturas (até 1000ºC) e baixo coeficiente de dilatação térmica [114,119,120].
O nitreto de silício é formado por átomos de silício e nitrogénio, elementos dos
mais abundantes no planeta. Contudo, o nitreto de silício não ocorre naturalmente,
a não ser pequenas inclusões (nierita) em meteoritos. Pode ser produzido por
vários métodos. A maioria dos pós comercializados é produzida através da reação
do pó metálico de silício com nitrogénio a alta temperatura, entre 1250 e 1400ºC
de acordo com a equação (4.1).
3Si(S) + 2N2(g) → Si3N4(S) (eq. 4.1)
Capítulo 4 --- Seleção de Materiais --- 90
Consistindo numa mistura de pós α-Si3N4 e β-Si3N4. O pó resultante não é de
elevada pureza, uma vez que contém impurezas como o Fe e Al, normalmente
associados ao Si. O nitreto de silício de alta pureza é obtido através da redução de
SiO2 com carbono em atmosfera de nitrogénio como mostra a equação (4.2) e da
reação de SiCl4 ou silanos com amónia.
3SiO2(S) + 6C(S) + 2N2(g) → Si3N4(S) + 6CO(g) (eq. 4.2)
Ambos os métodos produzem um pó de tamanho reduzido, não necessitando de
moagem para o uso. Alguns destes pós são tão pequenos que apenas requerem
calcinação como preparação para a conformação do pó [17].
A qualidade do pó de nitreto de silício é um fator crítico para as
propriedades finais do componente. É desejável que a cerâmica contenha uma
alta quantidade de fase alfa (>90%). Durante o processo de sinterização, a fase
alfa transforma-se em beta, conduzindo a uma densificação e a uma estrutura de
grãos mais coesa. A degradação das propriedades mecânicas do nitreto de silício
a altas temperaturas é causada basicamente pelo amolecimento nos contornos de
grão [120]. O nitreto de silício para aplicações de alta resistência mecânica é
produzido recorrendo ao auxílio de aditivos óxidos, uma vez que a ligação Si-N
(predominantemente covalente) dificulta a densificação pelo método de
sinterização no estado sólido. Durante a queima, os aditivos óxidos reagem com a
camada de sílica presente no pó de nitreto de silício durante a queima para formar
uma fase líquida de baixa viscosidade, promovendo assim a sinterização de fase
líquida, e desta maneira uma melhor densificação do material [121].
No entanto, a adição de óxidos tem também um efeito negativo na
resistência mecânica em altas temperaturas em virtude dos aditivos
permanecerem na fase vítrea nos contornos de grão. Métodos como a prensagem
a quente e a prensagem isostática a quente reduzem consideravelmente a
quantidade de aditivos ao nitreto de silício. Através destes métodos, o nitreto de
silício, mesmo sem a ajuda de aditivos, pode densificar, chegando mesmo a
valores próximos aos da densidade teórica do material. A maior limitação destes
Capítulo 4 --- Seleção de Materiais --- 91
métodos por prensagem seja a quente ou seja isostaticamente, ou mesmo ambos,
é a obtenção de peças com geometrias complexas. Peças simples tais como
blocos, cilindros e discos planos são relativamente fáceis de produzir [120-122].
4.1.3. CARBETO DE TUNGSTÊNIO COM MATRIZ DE COBALTO
Conforme comentado anteriormente, o carbeto de tungstenio é formado por
átomos de tungstenio (W) e carbono (C). O carbeto de tungstênio tem uma dureza
bastante elevada, no entanto, revela-se muito frágil e como tal, tem aplicações
muito limitadas. A utilização de um aglutinante, como por exemplo, cobalto (Co),
permitiu a obtenção de um material “cerâmico” (WC-Co) com alguma tenacidade.
Este material, também denominado de “metal duro” WC-Co, e vulgarmente
incluído na classe de Cermet’s, é um material de grande importância tecnológica,
sendo bastante utilizado na área de corte de metais, madeira e plástico, na área
de conformação, de usinagem e também como matéria-prima para produção de
peças altamente resistentes ao desgaste, como em insertos (dentes ou cones)
para brocas de perfuração de poços de petróleo e gás [17,18].
Atualmente, este material é produzido por processos de metalurgia do pó
através da sinterização com fase líquida, partindo da mistura dos pós de carbeto
de tungstênio e de cobalto em moinho convencional. A obtenção do metal duro
WC-Co, necessita da sinterização por fase líquida do pó de carbeto de tungstênio
com o pó de cobalto, à temperatura de aproximadamente 1400 ºC, na qual o
cobalto funde e difunde pela estrutura atingindo a homogeneidade e a densidade
desejadas [123]. O percentual de cobalto ou da fase matriz está diretamente
relacionado com as propriedades finais do “metal duro” que se deseja obter, de
forma que quanto maior a quantidade desse elemento no material, menor sua
dureza e maior sua tenacidade à fratura. A maior presença de cobalto no “metal
duro” diminui as propriedades relacionadas à fase cerâmica e aumenta as
propriedades relacionadas à fase metálica [124].
Capítulo 4 --- Seleção de Materiais --- 92
4.2. MATERIAIS METÁLICOS
Os materiais metálicos a utilizar nos experimentos de molhabilidade são
ligas de adição ou brasagem com base no eutético Prata-Cobre (72Ag28Cu), e a
ponta de titânio utilizada para metalizar as superfícies das cerâmicas.
Nas duas últimas décadas tem-se verificado um grande interesse e
desenvolvimento de ligas de adição, uma vez que a demanda por dispositivos
metal-cerâmica obtidos por brasagem tem crescido a um ritmo exponencial [6].
As ligas de adição devem possuir certas características essenciais para
melhorar a microestrutura interfacial [29,40]:
Ponto de fusão ou faixa de fusão compatível com os materiais de base;
Fluidez moderada à temperatura de brasagem, promovendo capilaridade e
distribuição uniforme na junção, mas prevenindo infiltração em materiais de
base sinterizados (ambos os metais e cerâmicas);
Composição homogênea e estabilidade para minimizar separação
constituinte ou segregação à fusão e solidificação (ciclo de brasagem);
Compatibilidade termodinâmica com a superfície do metal de base
promovendo molhamento;
Tendência limitada para formação de fase frágil (normalmente
intermetálicas);
Compatibilidade com a temperatura de funcionamento, carregamento
mecânico e ambiente.
4.2.1. LIGA DE ADIÇÃO
Ligas de adição de metal ativo utilizadas para brasagem cerâmica
usualmente fundem entre 700 °C e 1000 °C. São classificadas de acordo com sua
composição em dois grupos principais: ligas Cu-X e Ag-Cu-X. O componente ativo
do sistema (X) é comumente um elemento do grupo de IVB da tabela periódica (Ti,
Zr, Hf) que pode ser usado em combinação com outros elementos (Ni, Be, V, Sn,
Capítulo 4 --- Seleção de Materiais --- 93
ou In) para ajustar o comportamento de liga, por exemplo, aperfeiçoamento da
atividade do elemento, redução da temperatura fusão, aumento na fluidez da liga.
Ligas de adição não-ativas são significativamente mais baratas, mas
exigem uma metalização anterior do substrato cerâmico para aumentar o
molhamento, e assim reagir para criar uma união entre as partes a unir [29].
UFRN - PPGCEM
CAPÍTULO 5
MATERIAIS E MÉTODOS
Jorge Carlos Pereira
Novembro 2012
Natal - RN
No Capítulo 5 explicam-se os critérios de seleção dos materiais usados nos experimentos. Faz-se uma breve introdução a cada tipo de cerâmica e ligas de adição utilizadas. Neste capítulo descreve-se também a metodologia utilizada quer na preparação de amostras quer na realização dos experimentos de molhabilidade.
Capítulo 6 --- Resultados e Discussão --- 95
5. MATERIAIS E MÉTODOS
Neste capítulo estão expostos os materiais utilizados no presente trabalho.
Está também descrito o procedimento de preparação de amostras e o método
utilizado nos experimentos de molhamento.
5.1. MATERIAIS
Os ensaios de molhabilidade foram realizados com ligas de brasagem
sobre substratos cerâmicos (insertos), tendo em conta os materiais mais
adequados para a produção posterior de uniões M/C para a serem utilizadas em
brocas tricônicas de perfuração de poços de petróleo e gás natural.
5.1.1. INSERTOS CERÂMICOS
A zircônia utilizada neste trabalho foi a zircônia estabilizada parcialmente
com 6%mol ítria (YPSZ) e com 6%mol de magnésia (MPSZ) como ajudantes de
sinterização e estabilização- Engecer- Brasil [112]. Segundo o fabricante, o
tamanho médio de partícula do pó precursor de zircônia foi de 0,75μm, tendo sido
prensados em forma de discos cilindros com uma pressão isostática de 100MPa.
A sinterização foi feita sequencialmente num forno com temperatura controlada,
com taxa de aquecimento e resfriamento baixas (2ºC/min), e um patamar máximo
de sinterização de 2 horas à temperatura de 1500ºC [112].
As figuras 33 (a)-(d) revelam a superfície e microestrutura final da zircônia
parcilamente estabilizada com magnésia (Fig 33 a-b) e com ítria (Fig. 33 c-d). Em
ambas superfícies da zircônia é possível verificar a presença de alguns defeitos,
nomeadamente porosidades. A microestrutura da MPSZ exibe grãos de zircônia
de forma arredondada e homogéneos uniformemente distribuídos com tamanhos
variando entre 1 a 2 μm. Recorrendo a análise MEV/EDS é possível também
verificar pequenos grãos, de tamanho entre 0,1 a 0,5μm de composição
essencialmente de magnésia entre os grãos de zircônia. Alguma porosidade está
também presente na microestrutura.
Capítulo 6 --- Resultados e Discussão --- 96
Figura 33 – Superfície e microestrutura da zircônia parcialmente estabilizada com magnésia (a-b), e
com ítria (c-d)
A YPSZ apresenta uma microestrutura de grãos mais fina, onde o tamanho
de grão de zircônia varia entre 0,5 a 1μm e o de ítria entre 0,3 a 0,5 μm.
Comparativamente com microestrutura de MPSZ, a YPSZ exibe maior
homogeneidade de distribuição e tamanho de grãos e menos porosidade interna.
O efeito do tipo de óxido ajudante de estabilização, ítria (Y2O3) e magnésia
(MgO), será avaliado posteriormente no comportamento da zircônia no
molhamento por ligas de adição.
MgO
ZrO2
a) b)
Y2O3
ZrO2
MPSZ
YPSZ
c) d)
Capítulo 6 --- Resultados e Discussão --- 97
O nitreto de silício usado foi o CT-312 HP (Hot Pressing) da Ceramic
Technologies Inc. – USA, tendo 3%wt de magnésia como ajudante de
densificação [113]. Conforme indicação do fabricante, as pastilhas de pós de α-
Si3N4 e de magnésia, nas composições acima mencionadas, foram prensadas
uniaxialmente a 80MPa, e sinterizadas a 1850ºC durante 1 hora [113]. A
microestrutura do nitreto de silício está exposta na figura seguinte.
Figura 34 - Microestrutura do nitreto de silício.
Na figura 34 é possível observar os grãos alongados, típicos da fase β-
Si3N4, com diferentes tamanhos de grão. A fase cinza clara é uma fase vítrea
secundária composta por Mg-Si-O-N, e a fase clara é sílica remanescente.
Durante a sinterização, cada partícula de α-Si3N4 está rodeada por uma fina
camada de sílica. O aditivo MgO reage com a sílica e com algum nitreto para
formar um líquido, o qual permite que a sinterização aconteça em três etapas:
rearranjo dos grãos, precipitação da fase beta, e coalescência. Esse mesmo
líquido ajuda a densificação do material. Após o resfriamento, o líquido dará
origem a uma fase vítrea secundária de oxinitreto, como esquematiza a eq. (5.1):
α-Si3N4 (SiO2)(S) + MgO(S) → β-Si3N4(S) + Fase Mg-Si-O-N(S) (eq. 5.1)
10 μm
Capítulo 6 --- Resultados e Discussão --- 98
A microestrutura resultante consiste em grãos β-Si3N4 em forma de fibra
arredondadas nas extremidades, e uma fase vítrea secundária de oxinitreto nos
contornos de grão, podendo também haver alguma sílica residual. A maior parte
dos grãos de β-Si3N4 estão orientados perpendicularmente relativamente à direção
da pressão uniaxial [17,114,122].
Neste trabalho foi utilizado carbeto de tungsténio em matriz de cobalto,
funcionando como aglutinante, WC com 12%Co, da Ceramic Technologies Inc. –
USA. Os pós de WC de Co foram misturados num moinho de bolas durante
30min, prensados uniaxialmente a 80MPa e posteriormente sinterizados a 1400ºC
durante 30 minutos [113].
A figura seguinte exibe a microestrutura do WC-12%Co fornecido pelo
fabricante.
Figura 35 - Microestrutura do carbeto de tungstênio com 12% cobalto.
A figura 35 mostra uma microestrutura de grãos de WC (fase clara) com
arestas vivas, distribuídos uniformemente numa matriz de Co (fase escura). A
distribuição de tamanhos dos grãos de WC varia entre 1 e 3μm. Contudo é
possível observar a existência de grãos de maiores dimensões, aleatoriamente
10 μm
Capítulo 6 --- Resultados e Discussão --- 99
distribuídos, chegando mesmo a 5 μm. Este tipo de microestrutura é adequada
para aplicações em brocas a serem utilizadas em formações rochosas de dureza
médio-baixa. Para formações duras, a utilização de grãos de arestas vivas
compromete a resistência mecânica, ao apresentar um comportamento frágil.
Teores mais elevados de ligante são requeridos para dar mais tenacidade ao
material, contudo a sua resistência à corrosão diminui [26].
5.1.2. LIGAS DE ADIÇÃO
Para a realização deste trabalho, foram selecionadas duas ligas de adição
do sistema Ag-Cu-(Ti), sob a forma de folha laminada com 50 μm de espessura.
As ligas de adição testadas sobre os substratos cerâmicos foram: Cusil (Morgan
Inc.- USA) ; CB4 (BrazeTec - Umicore Precious Metals Ltd- UK).
A liga Cusil é uma liga Prata-Cobre - AgCu - de composição eutética
(72%Ag – 28%Cu wt), como pode ser observado na figura 36. A liga de adição
CB4 é composta por AgCu com 3%Ti,e nomeada por AgCu3Ti.
Porcentagem atómica Ag
Porcentagem em peso Ag
Figura 36 – Diagrama de fases para Ag-Cu.
Fonte: INFOMET , acesso em 2012 [125].
Capítulo 6 --- Resultados e Discussão --- 100
A microestrutura das ligas de adição Cusil – AgCu e CB4 – AgCu3Ti está
exposta nas figura 37 e 38.
Figura 37 - Microestrutura da liga de adição AgCu.
Figura 38 - Microestrutura da liga de adição AgCu3Ti.
Na figura 37 é possível verificar a existência de duas fases sobrepostas na
forma de lamelas finas. Uma fase de cor clara, atribuída a Ag e a fase mais escura
de Cu. Durante a solidificação, na reação eutética toda a fase líquida transforma-
se em duas fases sólidas bem distintas (L = α + β), para uma determinada e
composição e temperatura do sistema. A liga eutética se comporta como um metal
50 μm
50 μm
Capítulo 6 --- Resultados e Discussão --- 101
puro na solidificação e na fusão, ou seja, não apresenta intervalo de
fusão/solidificação. A liga eutética possui ponto de fusão menor que os elementos
da liga, sendo uma característica útil para aplicações em brasagem de pares M/C
e C/C [1].
A presença de 3%wt de Ti na liga AgCu introduz algumas modificações na
microestrutura da liga eutética. A microestrutura da liga AgCu3Ti deixa de ter a
regularidade e homegeneidade das lamelas presentes na liga AgCu. Pela figura
38 pode-se verficar que existem zonas características do eutético, estrutura típica
lamelar, e regiões claras (Ag) com maior dimensão comparativamente com as
mesmas da liga AgCu. As áreas escuras, de composição Cu-Ti, parecem também
formar pequenos aglomerados.
As características e composições químicas das ligas de adição estão
expostas nas tabelas 6 e 7.
Tabela 6 - Composição da química das ligas de adição [126, 127].
Liga de
adição
Composição química %wt Espessura
(μm) Fornecedor
Preço
USD$/g Ag Cu Ti
AgCu 72,0 28,0 - 50 Morgan 64,27
AgCu3Ti 70,5 26,5 3 50 Umicore 161,34
Tabela 7 - Propriedades físicas e mecânicas das ligas de adição [126, 127].
Propriedade Cusil – Ag28Cu CB4 – Ag26.5Cu3Ti
Densidade (g/cm3) 10,1 9,9
Módulo de Young (GPa) 83 90
Dureza (HV) 87 97
Alongamento (%) 19 25
Coef. Exp. Térmica ( x10-6/ºC) 19,6 18,2
Intervalo de fusão (ºC) 780 780-795
Capítulo 6 --- Resultados e Discussão --- 102
5.1.3. PONTA DE TITÂNIO
A ponta de titânio utilizada na metalização das superfícies das cerâmicas foi
usinada a partir de um cilindro massiço (tarugo) de titanio, denominado por CP
ASTM (Commercially Pure - American Society for Testing and Materials) Grade 2,
da empresa TiBrasil Titânio Ltda- Brasil. A composição e características do Ti
grade 2 estão expostas nas tabelas 8 e 9.
Tabela 8 - Composição química da ponta de Titânio [125].
Ponta Ti
Composição química wt.%
Ti C Fe N O H outros
CP Titânio ASTM Grade 2
99,2 Max. 0,1
Max. 0,3
Max. 0,03
Max. 0,25
Max. 0,015
Max. 0,4
Tabela 9 - Propriedades físicas e mecânicas do CP Titânio Grade 2 [125].
Propriedade CP Titânio ASTM Grade 2
Densidade (g/cm3) 4,51
Módulo de Young (GPa) 83
Resistência à tração (MPa) 344
Dureza (HV) 145
Alongamento (%) 20
Coef. Exp. Térmica ( x10-6/ºC) 9,7
Condutividade Térmica (W/m-K) 16,4
Temperatura de fusão (ºC) 1665
Pelas suas características físicas, mecânicas e resistência química, o Ti Grau
2 encontra um vasto campo de aplicações, na indústria aeronáutica, aeroespacial,
biomédica, naval e química [1].
Capítulo 6 --- Resultados e Discussão --- 103
AgCu
5.2. MÉTODOS
Neste subcapítulo são descritos os procedimentos para a preparação de
amostras, quer para ensaios de molhabilidade quer para posterior caracterização
das interfaces, bem como uma breve descrição das características do método de
metalização mecânica e dos equipamentos de análise utilizados.
5.2.1. SISTEMA METAL/CERÂMICA
Os estudos de molhabilidade foram realizados tendo em conta os sistemas
M/C (liga de adição/cerâmica). Nestes sistemas foram testadas três hipóteses,
conforme indica esquematicamente a figura 39. Cada sistema faz alusão a um par
de brasagem: com liga de adição não-ativa (AgCu) e cerâmica polida; liga de
adição AgCu e cerâmica metalizada com Ti, e finalmente liga ativa (AgCu3Ti) e
cerâmica polida.
Figura 39 – Sistemas M/C em estudo: a) AgCu-cerâmica; b) AgCu-cerâmica metalizada com Ti e
c) AgCu3Ti-cerâmica. .
5.2.2. PREPARAÇÃO DE AMOSTRAS
As amostras cerâmicas enviadas pelos fabricantes têm um diâmetro de
10mm e uma altura 10mm. Seguidamente as amostras foram sujeitas às
Cerâmica Cerâmica
Filme Ti
Liga de adição
Cerâmica
a) b) c)
AgCu3Ti
AgCu
AgCu
Capítulo 6 --- Resultados e Discussão --- 104
operações de lixamento, polimento, e limpeza, de acordo com a seguinte
sequência:
Lixamento das superfícies com lixas de carbeto de silício (SiC) usando a
sequência 320, 400, 600, 800 e 1200 mesh,
Lavagem em água corrente entre cada lixa,
Polimento em pano com pasta de diamante policristalino de 9 μm, no caso
do carbeto o processo iniciou-se com pasta de diamante de 15 μm,
Desengorduramento com acetona,
Lavagem em água corrente,
Banho de água destilada, em ultrassons durante 10 minutos,
Secagem com fluxo de ar quente.
Seguidamente, uma amostra de cada tipo cerâmica foi selecionada para
medição da rugosidade média. Parte de cada grupo de amostras cerâmicas YPSZ;
MPSZ, Si3N4, WC-Co foi submetido ao processo de metalização mecânica, com o
intuito de produzir um revestimento de Ti na superfície da cerâmica. O sistema
para a metalização foi montado em um torno mecânico, conforme ilustrado na
figura 40.
Figura 40 – Sistema para metalização mecânica das superfícies cerâmicas.
Fonte: NASCIMENTO, R.M. 2001 [29].
Capítulo 6 --- Resultados e Discussão --- 105
A amostra cerâmica é fixada na placa do torno, que gira no sentido anti-
horário sob uma rotação conhecida. A ponta de metal ativo reativo (Ti) é acoplada
em uma retífica manual de alta rotação (sentido horário em relação ao operador).
Durante o contato entre a superfície da cerâmica e a ferramenta de metal, o
movimento de relativo, assim como a força de atrito provocam o desgaste da
ponta de Ti, e consequentemente, a deposição de um filme metálico na superficie
da cerâmica [5,29].
Alguns parâmetros do processo de metalização, tais como: rotação da
placa do torno; rotação da ferramenta de Ti; tempo de metalização e força de
metalização, foram estudados por Nascimento [29], tendo concluido que os
melhores resultados, quanto à qualidade da deposição do filme de Ti, foram
obtidos para o sistema utilizando a retificadora manual com rotação de 27.000
rpm, a rotação do torno de 800 rpm, e tempo de metalização para 60 segundos.
As cerâmicas metalizadas foram previa e posteriormente desengorduradas
com acetona e secas com fonte de ar quente. Após este procedimento de limpeza,
foi medida a rugosidade média nas superfícies metalizadas. De salientar que todo
o manuseamento das amostras foi realizado com recurso a pinças e luvas de
látex.
A preparação das amostras das ligas de adição foi simples. Folhas das
ligas de adição, com espessura de 5µm, foram polidas, desengorduradas e limpas
em banho de água destilada em ultassons, com o intuito de remover impurezas e
filmes superficias de óxidos. Cortaram-se pequenas lâminas da liga de adição, as
quais foram posteriormente dobradas com forma semelhante a um pequeno
cilindro, com massa variando entre aproximadamente 0,06 a 0,1 grama.
Seguidamente os cilindros foram lixados com lixa de SiC de 800 mesh para
aplanar as bases e arestas vivas e finalmente seguido o procedimento de limpeza
já referido anteriormente. Findo este procedimento, o cilindro da liga de adição é
imediatamente colocado para o ensaio de brasagem, para evitar futuras
contaminações.
Capítulo 6 --- Resultados e Discussão --- 106
5.2.3. ANÁLISE SUPERFICIAL
A avaliação do estado superficial das cerâmicas polidas e metalizadas foi
feita em função do valor da rugosidade média (Ra), tendo sido realizada em um
rugosímetro S5P da Mahr Perthen (Departamento de Engenharia Mecânica da
Universidade do Minho - Portugal), com resolução de 0.001μm e precisão de ±
0.02μmm – ver Fig. 41. As medições foram realizadas em condições estáveis de
pressão e temperatura (1 atm, 25ºC). O resultado de Ra é uma média entre os
“picos” e “vales” ao longo de uma direção. Para uma maior reprodutibilidade dos
dados, as medições foram realizadas em direções perpendiculares.
Figura 41 – Rugosímetro S5P da Mahr Perthen.
Fonte: Cortesia de DEM – UMinho - Portugal.
5.2.4. ENSAIOS DE MOLHABILIDADE
Os ensaios de molhabilidade foram efetuados num forno Termolab,
existente no Laboratório de Revestimentos Funcionais II - Departamento de Física
(Universidade do Minho – Portugal), com vácuo secundário, inferior a 10-5 mbar. O
apparatus do sistema de molhabilidade está exposto na Fig. 42.
Capítulo 6 --- Resultados e Discussão --- 107
O forno é composto por uma câmara em aço inox em forma de “cruz”,
ladeada por resistências de molibdénio, com flanges de janelas de sílica nas
extremidades horizontais para permitir a iluminação externa e a visualização
interna da câmara do forno. A câmara do forno possui um suporte de alumina para
base de porta amostras. Na parte inferior do forno, estão instaladas as conexões
para as bombas de vácuo, medidor de pressão e entrada de termopar.
Figura 42 – Set-up para os ensaios de molhabilidade: a) filmadora digital; b) forno; c) bomba de vácuo
secundário; d) medidor de pressão.
Fonte: Cortesia de DF e DEM –UMinho – Portugal.
A evolução do ângulo de contato foi filmada, em tempo real a 22frames/s,
recorrendo a uma filmadora digital Handycam Sony DCR-TRV345E.
Posteriormente é extraído o filme para o software Windows Movie Maker, onde
foram feitas imagens a cada 5ºC desde a temperatura de gravação (750ºC). Essa
evolução do ângulo de contato foi avaliada graficamente em função da
temperatura e do tempo de estágio, recorrendo a um software apropriado para
medição de ângulos de contato (SCA20 Dataphysics). Cada experimento de
molhamento foi repetido duas vezes com a finalidade de se obter alguma
validação e reprodutibilidade do processo.
b
c
d
a
Capítulo 6 --- Resultados e Discussão --- 108
Para minimizar o erro de medição, foram realizadas 3 leituras do ângulo de
contato de cada lado da gota. Ou seja, o valor total do ângulo de contato, para
uma dada temperatura ou tempo, corresponde à média do somatório das leituras
de cada lado da gota (ver Fig. 43). Este procedimento é realizado com o intuito de
minimizar efeitos de gravidade ou perturbações externas ao ensaio de
molhabilidade que possam afetar a foma da gota, e consequentemente o valor do
ângulo de contato.
Figura 43 – Esquema de medição dos ângulos de contacto para um dado sistema.
Baseado na experiência de trabalhos anteriores, o intervalo de confiança
das medições do ângulo de contato tem um erro associado de 4,5º. Valor este,
ainda considerável, deverá ser tido em conta no Capítulo 6 de apresentação e
discussão de resultados.
A realização dos ensaios de molhabilidade teve como base o método
clássico da gota séssil (sessile drop) onde uma amostra da liga de adição é
colocada centralmente em cima da cerâmica, a qual está assente em um suporte
de titânio, conforme figura 44.
Figura 44 – Esquema de montagem dos ensaios de molhabilidade no forno.
θi
1
θj
Cerâmica
θTotal = ∑ij θ/n
Suporte cerâmico do forno
Suporte de Ti
Liga de brasagem Substrato
(cerâmica)
Termopar
Capítulo 6 --- Resultados e Discussão --- 109
Tem
pera
tura
(º
C)
TW
TR
Posteriormente, o conjunto foi submetido ao ciclo térmico de previamente
estabelecido. A figura seguinte mostra esquematicamente o ciclo térmico utilizado
nos experimentos de molhabilidade.
Figura 45 - Ciclo térmico aplicado aos sistemas M/C na realização dos ensaios de molhabilidade.
Legenda:
TR – Temperatura de inicio da gravação de experimento
Tw – Temperatura máxima de molhamento
1 – Aquecimento a uma taxa de aquecimento de 5ºC/min até Tb= 880 ºC.
2 – Estágio de 15 minutos, a 880ºC.
3 – Esfriamento lento à velocidade de 5ºC/min até temperatura ambiente
A escolha do ciclo térmico teve em conta trabalhos realizados em sistemas
que utilizaram este tipo de ligas de adição ou semelhantes [2,3,6,17,34,40,47], e a
experiência pessoal em experimentos de molhamento. A baixa taxa de
aquecimento de 5ºC/min permite uma gradual uniformização da temperatura no
forno e em todo o conjunto M/C. A temperatura máxima escolhida, 880ºC, permite
uma fusão e homogeneização completa da liga de adição, sem causar demasiada
vaporização da Ag, Este fenómeno torna-se problemático a elevadas
temperaturas, visto que a Ag tem uma elevada tensão de vapor, levando a uma
acentuada perda de massa e contaminação do forno [56], além da inerente
modificação da composição química do líquido durante o processo de união.
Tempo (min)
880
750 1
2
3
Capítulo 6 --- Resultados e Discussão --- 110
Após os experimentos de molhabilidade, e com o intuito de observar e
analisar a microestrutura das interfaces no microscópio eletrónico de varredura
(MEV), as amostras foram embutidas em resina epoxi, seccionadas em uma
máquina de corte máquina de Isomet 1000 da Buehler com um disco de diamante
330CA da Struers, mantendo constante uma carga de 250g, e velocidade de
rotação de 500 rpm, sendo posteriormente sujeitas ao mesmo procedimento de
preparação metalográfica descrito anteriormente, exceto na fase final de
polimento, a qual teve utilização de panos com pasta de diamante até 1µm.
O quadro seguinte sumariza todos os pares M/C propostos nos ensaios de
molhabilidade.
MATERIAIS LIGA METÁLICA - ADIÇÃO
AgCu AgCu3Ti
CE
RÂ
MIC
A
M-PSZ
Polido √ √
Met. Ti √ X
Y-PSZ
Polido √ √
Met. Ti √ X
Si3N4
Polido √ √
Met. Ti √ X
WC-Co
Polido √ √
Met. Ti √ X
Quadro 3 - Pares M/C obtidos nos ensaios de molhabilidade.
Não foram realizados ensaios da liga de brasagem AgCu3Ti sobre as
cerâmicas metalizadas com Ti, uma vez que são desprovidos de sentido lógico e
prático no âmbito desta tese. Com as cerâmicas metalizadas, pretende-se “ativar”
in situ a liga AgCu com o Ti presente no filme, sendo uma alternativa à brasagem
com as dispendiosas ligas ativas.
Capítulo 6 --- Resultados e Discussão --- 111
5.2.5. MICROSCOPIA ELETRONICA POR VARREDURA (MEV) COM MICROANÁLISE POR ESPETROMETRIA ENERGIAS DISPERSIVAS (EDS)
As microestruturas e composições químicas dos sistemas estudados foram
analisadas por microscopia eletrónica de varredura (MEV), com recurso a imagens
de elétrons retrodifundidos e microanálise por espectrometria de dispersão de
energias (EDS). Para o efeito, foram utilizados um microscópio eletrónico de
varrimento LEICA Cambridge - Stereoscan S360, com detetor de elétrons
secundários e retrodifundidos. Tendo acoplado um sistema de microanálise por
espectrometria de dispersão de energias (EDS) - Link eXL II - Deteção de
elementos (Boro - Urânio) - Análise qualitativa e quantitativa. Previamente as
amostras foram revestidas a ouro por pulverização catódica em magnetrão num
equipamento Sputter Coater SC502 da Fisons Instruments. As análises foram
efetuadas no Centro de Materiais da Universidade do Minho. Foi também utilizado
um MEV Shimadzu, modelo SSX-550 com EDS acoplado, do laboratório de
Ensaios de Materiais do CTGAS-RN-Brasil. Algumas análises foram também
realizadas no MEV LEO 1430VP com sistema PGT-SPIRIT EDX, do Laboratório
de Solidificação Rápida no Centro de Tecnologia (UFPB – Brasil) – ver Fig. 46.
Figura 46 - Microscópio Eletrónico de Varredura (MEV).
Fonte: cortesia CT – UFPB (Brasil).