telejornalismo - manual completo

108
Faculdades Integradas Univest Faculdade de Ciências da Comunicação Curso de Comunicação Social – Jornalismo Professor: Marco Aurélio Silva Disciplina: Telejornalismo I (Todo o conteúdo da disciplina TELEJORNALISMO I das 5ª e 6ª fases do Curso de Jornalismo, com EXERCÍCIOS OBRIGATÓRIOS) Lages, 2005

Upload: susy-freitas

Post on 25-Dec-2015

133 views

Category:

Documents


8 download

DESCRIPTION

Telejornalismo - Manual Completo

TRANSCRIPT

Page 1: Telejornalismo - Manual Completo

Faculdades Integradas Univest Faculdade de Ciências da Comunicação Curso de Comunicação Social – Jornalismo Professor: Marco Aurélio Silva Disciplina: Telejornalismo I

(Todo o conteúdo da disciplina TELEJORNALISMO I das 5ª e 6ª fases do Curso de Jornalismo, com EXERCÍCIOS OBRIGATÓRIOS)

Lages, 2005

Page 2: Telejornalismo - Manual Completo

1

Page 3: Telejornalismo - Manual Completo

2

ÍNDICE

Capítulo I - Introdução Ao Telejornalismo 4 1. Os principais fundamentos 5 2. A História do telejornalismo no Brasil 10 3. Televisão e Sociedade 16 4. O Repórter e a Reportagem 20

Capítulo II - O Texto na TV 30

1. Apenas palavras 31 2.As normas básicas para Editores e Repórteres 33 3. A Produção da Matéria 37

3.1 Medidas Para Facilitar a Edição 37 3.2 Como Elaborar o Script 39

4. Palavras e Expressões a Evitar 48 5. A Gravação do Off e Locução 51

5.1 Off 51 5.2 Locução 53 Capítulo III - Como Funciona o Telejornalismo 55

1. Os diferentes formatos 56 1.1 O Modelo Antidemocrático do Telejornalismo Brasileiro 56 1.1.1 Introdução 56

1.1.2 O Jornalismo Filmado – Histórico 56 1.1.3 O Modelo Sociológico 57

1.1.4 Os Outros Modelos 59 1.2 Telejornalismo, Povo e Preconceito 61

2. Reportagem 62 2.1 Apuração 63 2.2 Pauta 64 2.3 Chefia de Reportagem 66 2.4 Externas 68

2.4.1 Equipamento 68 2.4.2 Equipe 69

Page 4: Telejornalismo - Manual Completo

3

3. Os Tipos e as Técnicas Básicas da Reportagem 70 3.1 Técnicas Básicas 71

3.2 Os Tipos de Reportagem 75 3.2.1 Factual 75

3.2.2 Stand up e Flash 76 3.2.3 Perfil 78 3.2.4 A Reportagem Especial 78

4. A Entrevista no Telejornalismo 82 4.1 Exclusiva 82 4.2 Coletiva 83 4.3 Estúdio 84 4.4 “Povo Fala” 86

5. Produção e Edição do Telejornal 87 5.1 A Edição do Telejornal 88 5.1.1 Editorias 89 5.1.2 Considerações Técnicas 89 5.1.3 A Edição de Matérias 91 5.2 O Telejornal 95 5.2.1 O Espelho 96 5.2.2 Arte 99 5.3 No Ar 99 5.3.1 Exibição 100 5.3.2 Um Trabalho de Equipe 102 6. Boa noite 104 Bibliografia 107

Page 5: Telejornalismo - Manual Completo

4

Introdução ao Telejornalismo

Capítulo I

Page 6: Telejornalismo - Manual Completo

5

1. OS PRINCIPAIS FUNDAMENTOS1

a televisão o jornalismo salta da letra para a imagem. São duas linguagens, a da notícia gráfica e a da notícia eletrônica. Na imprensa, predomina o espaço; na te-

levisão (como no rádio), predomina o tempo. Em uma, a unidade de medida é o cen-tímetro; na outra, é o segundo. No jornal e na revista, o movimento precisa ser des-crito; na televisão, o movimento está no meio.

A notícia na televisão antes de se consolidar como telejornalismo absorve experi-ências da imprensa e do rádio. A influência do radiojornalismo é maior e por alguns anos o telejornalismo é um jornal radiofônico com imagens em preto e branco ou em cores. Dos anos 80 em diante, a televisão define mais precisamente as suas formas de expressão.

O tamanho ideal do lead para jornal e rádio - quatro linhas de 72 batidas ou qua-renta palavras - é longo para TV. Embora não exista uma regra para o texto na televi-são, a média de 28 palavras ou de dez segundos é usual e satisfaz o propósito de clare-za, objetividade e concisão.

A síntese necessária por que passa o texto na TV é compensada, em termos de ex-plicação e compreensão, pelos elementos naturais do meio. Nele, o princípio funda-mental é de que a toda imagem corresponde um som, e não uma palavra. Dez segun-dos de silêncio na TV podem ser uma pane no vídeo, um bloqueio do comunicador ou uma atitude mais conseqüente que as palavras ditas com eloqüência.

No jornal e no rádio, o comunicador é mais eficiente quando alia à imagem e ao som a força da palavra. Na TV, a palavra é um acessório para ser usado apenas como apoio à imagem e ao som. É por isso que, quanto mais verbal e prolixa, a mensagem na TV fica radiofônica e repete os vícios do texto escrito.

O texto na TV deve ser tão claro, objetivo e conciso como no jornal e no rádio, mas não é só. As palavras devem ser bem pronunciadas, o comunicador deve satisfa-zer visualmente a simpatia que dele espera o telespectador sem prejuízo de seriedade e credibilidade, pois nesse meio mais que em qualquer outro a complexidade é punida pela rejeição.

Uma fantasia no rádio e um pecado na imprensa, a prolixidade é uma inimiga para a televisão. Seu ruído está no choque que causa à imagem e ao som como expressões de informação e de convicção. Rimas, estrangeirismos, abreviações, ilações, lateralida-des, preciosismos costumam ser mais desastrosos na TV.

Enquanto no jornal e no rádio (mais no jornal e menos no rádio) é o estilo que faz o ritmo, na televisão é o ritmo que faz o estilo. Um locutor que precisa associar a elo-qüência ao visual impõe o seu próprio ritmo à notícia, independentemente do estilo de quem a redigiu. O estilo e a linguagem na TV só se conjugam quando há identida- 1 Telejornalismo, in Jornal: história e técnica, de Juarez Bahia.

N

Page 7: Telejornalismo - Manual Completo

6

de de unidade, coerência e ênfase entre o que está escrito e o que é dito. A notícia precisa ser direta e simples. Mas se o seu texto for excessivamente frio e

impessoal, enfraquece a ação do locutor que tem de ver nela a essência em que apóia o seu próprio estilo. É por esta razão que no telejornalismo o redator é cada vez mais um especialista em notícias, e não propriamente em textos.

Uma coisa é redigir tendo em vista o estilo na notícia; e outra é redigir para qual-quer outro efeito que não seja o do telejornal. Assim como no jornal e no rádio a re-dação para a seção internacional, ou para a economia, ou para o esporte, é uma especi-alidade, também na TV o telejornal diário se especializa em relação, por exemplo, a programas noticiosos que têm por base pesquisa e produção demoradas.

Unidade, coerência e ênfase – um esquema de texto que se exige de um lead de 28 palavras ou 10 segundos – estão sujeitas na TV a armadilhas como a longa denomina-ção de um cargo (chefe de departamento de pesquisas tecnológicas), que reduz o tempo para o que há de novo a se dizer. Isto acontece mesmo quando a notícia se es-tenda por quarenta, cinqüenta segundos.

O texto exerce na TV urna tirania interna que é mais dramática do que se imagina. Na medida em que a TV reduz o âmbito do improviso – uma tendência que se tornou dogma – tudo que ela transmite procede de um texto pronto e acabado. O texto transcende a organização da notícia para orientar diretores e coordenadores no posi-cionamento das câmaras e nos cortes de imagem.

À exceção de alguns analistas que gravam sem roteiro – porque mentalmente já têm o seu texto – e de apresentadores de auditório, o resto do pessoal da TV depende de um texto pronto que monitora as atividades de toda a operação técnica e editorial envolvida numa transmissão.

Na TV a organização da notícia não se limita ao texto. Um repórter ou redator de-ve ser capaz de descrever a realidade como é no jornal e na rádio. Mas deve saber também sinalizar o texto (com anotações de tonalidade - mais lento, engraçado, dra-mático, severo etc.) para o locutor que lê em off.

O texto altera a sua relação com o locutor quando é lido no teleprompter (aparelho adaptado à lente da câmara para reproduzir o que está escrito sem que o locutor des-vie o rosto na leitura feita no papel). O texto também muda a relação do repórter, com a notícia: na TV o repórter colhe e escreve a matéria; o locutor a transmite; o e-ditor junta a imagem ao texto, dando-lhe a redação final. Esse trabalho de edição in-corpora, além do copy da matéria, acabamento, cortes e sonorização.

O problema de adaptação de linguagem pressiona a má qualidade do telejornalis-mo. Ele se manifesta em todo lugar – nos Estados Unidos, na Europa ou no Brasil – e perdura até que a televisão forme os seus próprios quadros de repórteres, redatores, entrevistadores, produtores e editores.

O conflito de herança entre a televisão e os outros meios está no método da in-formação. Nos meios impressos e no rádio, a credibilidade é um efeito que se limita

Page 8: Telejornalismo - Manual Completo

7

ao relato; neles, contar o fato é suficiente dede que veraz e exato. Na televisão isto só é possível mostrando o fato. A credibilidade depende de um elemento essencial – o testemunho, que se traduz na presença e não numa referência qualquer.

Mesmo assim, a televisão desenvolveu padrões de noticiário – como a entrevista – mais eficiente que em outros meios. Graças precisamente à natureza testemunhal da notícia na televisão, a entrevista do telejornalismo é mais convincente que a da im-prensa ou a do rádio. Nas ocasiões em que os interlocutores conseguem eliminar o constrangimento da tralha eletrônica, o resultado é mais satisfatório que o das entre-vistas na imprensa e no rádio.

A notícia de impacto – tão sumária quanto dramática - também pode se realizar na TV sem exigir acréscimos de outros meios. Neste caso ela depende da qualidade de edição, e não propriamente da capacidade do veículo. Esses procedimentos noticiosos tornam-se mais eficazes na TV à proporção que se libertam dos vícios radiofônicos.

Duas ou três horas diárias de notícias na televisão podem demonstrar que é insatis-fatória a taxa de informação fornecida ao público por uma grande rede. Milhões de telespectadores que acompanham diariamente o telejornal podem comprovar que a sociedade tem mais interesse do que parece pelo que está acontecendo.

Mais que qualquer outro gênero de jornalismo, a TV se beneficia das tecnologias avançadas do sistema de comunicações. A possibilidade de adicionar à imagem o som-ambiente – uma câmara que filma em cores; o uso amplo do videocassete; o recurso da televisão por cabo ou circuito fechado; os microondas portáteis e de polarização circular; a utilização ilimitada dos satélites, dão ao telejornalismo uma dianteira, ape-sar das contingentes limitações à liberdade e imposições éticas que pesam sobre a TV como instituição de direito público.

O arco da notícia na TV pode ser medido pela programação habitual das grandes redes. A TV Globo – padrão equivalente às maiores redes dos Estados Unidos e da Europa – emite diariamente noticiosos matinais de informação política, entrevista e assuntos nacionais e locais; vespertinos, de serviço e entretenimento; e noturnos, co-mo o Jornal Nacional que dá uma visão dos acontecimentos no país e no exterior, ou como o jornal de fim-de-noite que resume o principal até as 23h e dedica a maior par-te do tempo à análise de temas internacionais, políticos e culturais. O telejornalismo inclui ainda informação rural e debates, assim como reportagens especiais semanais.

Os blocos noticiosos contornam a opinião. Na TV brasileira, opinar é um ato raro, temerário. O editorial, portanto, entra como uma casualidade e não como uma regra, como acontece na imprensa. Mesmo assim eles mantêm um nível consistente de competição jornalística.

O telejornalismo não se propõe a competir com jornais, revistas e radiojornalismo num sentido amplo, mas apenas num sentido estrito. Essa inclinação caracteriza o ti-po de notícia que a TV emite - selecionada, objetiva, superficial, engrandecida pelo patriotismo ou pelo triunfalismo.

Page 9: Telejornalismo - Manual Completo

8

A TV concentra o seu fogo - e faz isso muito bem - sobre a primeira página dos jornais. Os grandes noticiosos do horário nobre da Globo, BBC, CBS etc. procuram basicamente antecipar os títulos de capa da imprensa do dia seguinte.

Com isso a TV exerce não só as vantagens de trabalhar com pessoal em quantidade e com equipamento sofisticado, como a de ser doze horas à frente dos meios impres-sos. Tais vantagens, associadas à sedução natural do meio, praticamente absorveram o peso do noticiário radiofônico, limitando o rádio à cobertura emergencial, acidental quando não o marginaliza, submetendo-o a rotineiras funções informativas de peque-na audiência.

O fenômeno de esvaziamento do radiojornalismo pelo telejornalismo não se dá nas mesmas proporções em relação à imprensa. Pelo contrário, há uma crescente ten-dência de jornais e revistas - e, em alguns casos, do livro - para prover com densa in-formação as vagas de expectativas abertas pela TV toda vez que um fato relevante gera desdobramentos, conseqüências, repercussões inesperados.

A TV é incapaz de responder com tempo o espaço que os meios impressos reser-vam à notícia. Verifica-se aí um confronto de conceitos. Na imprensa - jornal e revis-ta, além do livro -, o conceito de espaço conota algo sem limite. Um jornal pode sair com dobro ou o triplo de páginas, se isto for necessário. Na TV, como no rádio, o tempo conota limitações irremovíveis.

Estabelecido que por natureza própria um tipo de veículo pode apresentar nor-malmente uma massa de informações que o outro está impedido de fazer, resta ao te-lejornalismo a opção de qualificar seu noticiário: ele despreza o mote de dar tudo, que vem da origem da imprensa, e se fixa na proposta do essencial possível. Não há cho-que para o telespectador, que, embora se frustre com a superficialidade da TV, não se coloca diante do receptor como quem espera todas as explicações de uma enciclopé-dia.

Ao contrário do que parece, a notícia na TV causa a mesma devoção, constância e fidelidade que se observa em relação a outros meios - e que no jornal e na revista ad-quire o sentido de tradição ou o valor de civilidade. Quer dizer, assim como há leito-res que só lêem jornais, há os que só se informam através da TV.

"O que o jornal da TV tem que o jornal impresso não tem?", pergunta Wesley Du-ke Lee, que responde: "O jornal da TV tem imagens, o impresso, palavras. O jornal televisivo encurta o caminho. Quando fala de Kadafi, mostra Trípoli, então vejo a Lí-bia e associo as imagens. Da TV recebo informações e não comentários. E eu quero todas as informações que puder receber. Tem muito amador escrevendo em jornal. Além disso, os jornalistas precisam descrever as cenas com palavras.

E pouca gente sabe escrever hoje em dia. São raros os jornalistas que anotam coisas à mão, porque a maioria prefere o gravador. Isso é um desastre, porque o jornalista usa o gravador sem prestar atenção no que ouve, na pausa que se dá entre uma fala e outra, nas emoções, no rosto. (...) Não tenho necessidade de ler jornais, porque tudo

Page 10: Telejornalismo - Manual Completo

9

que a gente precisa saber a televisão mostra. Por que, então, ficar perdendo tempo com as mentiras impressas num jornal?”

A notícia na TV ganha em relação à imprensa e ao rádio elementos de comprova-ção que reduzem ao mínimo ruído ou distorção. Aliás, a distorção da TV não está no registro, mas na manipulação do fato – na sua elaboração, na sua exigüidade. A tecno-logia do meio facilita um padrão de veracidade que dificulta o desmentido, conjugan-do som e imagem a um grau resistente às deturpações.

A TV põe a imagem no vídeo e, esteja ela no estúdio ou na rua, o seu poder de co-municação e de afetação pouco ou nada depende de palavras. Quando a palavra se in-corpora é para complementar a informação e a ação. Na transmissão de um jogo de futebol pelo rádio o narrador pode acrescentar tanta emoção ao lance que torna a in-formação mais ficção do que realidade; mas na TV isso é impossível.

Um jornal pode precisar de, cinco páginas para descrever e analisar um único fato. O telejornalismo é capaz de fazê-lo no tempo que corresponde ao espaço de uma primeira página. Quanto mais é a primeira página de um jornal, mais eficaz pode ser o telejornal. Diante do receptor quem está interessado na notícia é, em geral, a mesma espécie de leitor apressado quer não lê muito mais que títulos e primeiros parágrafos. ATV dá-lhe só uma versão, o que é perigoso e antidemocrático.

O texto no telejornal é diferente de texto na imprensa e no rádio em função da es-trutura de movimento, instantaneidade, testemunhalidade, indivisibilidade de imagem e som, sintetização e objetividade da televisão.

Armando Nogueira conta a história de um debate entre jornalistas de jornal e jor-nalistas de televisão, em Columbia, Nova York, sobre como focalizar uma notícia, um fato importante, de peso jornalístico. Questionado por um jornalista de jornal, um jornalista de televisão mostrou como apresentaria a notícia de que Moisés voltou à Terra com a tábua dos Dez Mandamentos: “Moisés acaba de receber a tábua com uma série de mandamentos. Dentre eles, podemos destacar dois...”

Incomum na televisão brasileira, o anchorman ou ponto de apoio (âncora) é nos Estados Unidos e na Europa a figura central do telejornal, um apresentador que tam-bém edita, eventualmente apura, escreve e comenta o noticiário. Essa figura que se tornou mais conhecida na pessoa de Walter Cronkite, da CBS, é uma invenção da TV americana para dar maior credibilidade e objetividade às notícias.

Sua função é "ancorar" as informações de repórteres e outros que intervêm no no-ticiário como entrevistados e entrevistadores, analistas etc. É uma inovação do tele-jornalismo desde os anos 60, sem parentesco próximo na imprensa e no rádio. Num jornal, equivaleria talvez ao coordenador de uma entrevista coletiva que ao mesmo tempo apresentasse os entrevistadores e esclarecesse algumas omissões do entrevista-do; e num radiojornal, ao moderador de um debate. Vê-se que âncora desempenha um papel muito mais significativo.

Para Cronkite, que introduziu os americanos em acontecimentos de importância

Page 11: Telejornalismo - Manual Completo

10

em três décadas - como os assassinatos do presidente John Kennedy, do senador Ro-bert Kennedy e de Martin Luther King; a guerra do Vietnã; Watergate e o colapso do presidente Nixon; e o furo do encontro entre o presidente Anuar Sadat, do Egito, e o premier Menahem Begin de Israel -, “não há dúvida de que o público conhece melhor os políticos e o mundo através da televisão do que por meio de qualquer outro veícu-lo”.

A sua visão crítica da mídia TV tanto lamenta a cobertura que estações locais dão a qualquer estória que renda boas imagens, mesmo que não tenham qualquer importân-cia, deixando de lado assuntos mais complexos, como reconhece a limitação de tempo imposta às notícias nas grandes redes, justamente as que têm um desempenho me-lhor.

Cronkite considera restritivo “o fato de que o telejornal principal de todas as noi-tes tem apenas meia hora, 26 minutos se excluirmos os comerciais. É simplesmente impossível cobrir adequadamente o que acontece todos os dias nestes 26 minutos. Quando se trata de aprofundar a cobertura, interpretar os acontecimentos, depara-mos com a limitações da televisão”.

2. A HISTÓRIA DO TELEJORNALISMO NO BRASIL2

telejornalismo chegou ao Brasil com o início da implantação da indústria da te-levisão, em setembro de 1950. Na definição de Mello e Souza, "no dia seguinte

ao da inauguração, em São Paulo, da primeira emissora brasileira de TV, a PRF-3, foi ao ar um programa de caráter jornalístico que se chamava Imagens do Dia. Não tinha horário fixo. Podia começar às 9 e meia da noite ou meia hora depois, dependendo da instabilidade da programação e dos problemas de operação". Para a estruturação do novo sistema de comunicação, algum padrão externo ao meio deveria ser adotado já que, como todo processo inédito, os paradigmas para a produção deveriam vir de fo-ra. Para Sérgio Mattos, "ao contrário da televisão norte-americana, que se desenvolveu apoiando-se na forte indústria cinematográfica, a brasileira teve de se submeter à in-fluência do rádio, utilizando inicialmente sua estrutura, o mesmo formato de progra-mação, bem como seus técnicos e artistas".

O primeiro telejornal da televisão brasileira, o Imagens do Dia permaneceu no ar pouco mais de 2 anos. No início de 1952 foi substituído por novo telejornal que ia ao ar pontualmente às 9 da noite e se chamava Telenotícias Panair. Este ficou no ar por reduzido tempo, até ser substituído pelo Repórter Esso, que vinha de uma carreira de sucesso no rádio. Além de se espelhar no rádio, a indústria da televisão no Brasil de-monstrou, desde o início, ser também dependente do suporte publicitário para a sua

2 Do livro Boris Casoy, o âncora no Telejornalismo Brasileiro, de Sebastião Squirra.

O

Page 12: Telejornalismo - Manual Completo

11

sobrevivência. Priolli defende a tese de que “duas características são marcantes na programação inicial da TV brasileira: a herança radiofônica e a subordinação total dos programas aos interesses e estratégia dos patrocinadores”.

Desta forma, na época do nascimento da televisão, o maior sucesso jornalístico do rádio acabou sendo prontamente adotado pela televisão como o primeiro noticiá-rio televisivo sólido. O programa jornalístico radiofônico Repórter Esso vinha de uma encomenda da Esso à agência de propaganda McCan-Erickson e foi lançado na noite de 28 de agosto de 1941 pela Rádio Nacional do Rio de Janeiro. O programa - que era uma cópia do similar existente nos Estados Unidos - tinha quatro emissões diárias, às 8:00. 12:55, 19:55 e 22:55 horas.

Em depoimento a Mello e Souza, Armando Nogueira lembra que “o Repórter Es-so era feito na redação da UPI, era um jornal americano, que carregava na informação internacional”. Para Ana Bittencourt, ele foi criado porque"a emissora sentiu que era preciso um informativo que desse cobertura rapidamente aos fatos que estavam ocor-rendo, mantendo o povo brasileiro informado das notícias da guerra (Segunda Guerra Mundial)”.

Este radiojornal veio impor o primeiro padrão para a apresentação de noticiário no jornalismo eletrônico brasileiro e também para os demais fatos ligados à imagem do programa e de seus apresentadores, que, via de regra, eram locutores com experi-ência no veículo, mas que não eram jornalistas profissionais. Este primeiro programa de radiojornalismo, organizado em padrões norte-americanos, determinava um estilo preciso:

"As frases nunca deviam ter mais de 30 palavras, e cada notícia devia durar, no máximo, 14 ou 15 segundos. Era obrigatório o uso da linguagem popular (correta-mente) e dizer sempre a procedência da notícia. O Repórter Esso não noticiava suicí-dios, crimes horrendos' e desastres que não fossem fatos de grande repercussão na comunidade. Só pessoas muito importantes eram citadas nominalmente. Nas campa-nhas eleitorais, sempre que o Repórter Esso falava de um candidato, falava dos outros. Ameaças de perturbação social também não entravam”.

O modelo deste programa radiofônico foi levado para a televisão, em 1952, pela TV Tupi do Rio de Janeiro, com a apresentação de Gontijo Teodoro. Tinha 33 minu-tos de duração e recebeu o nome de O Seu Repórter Esse. Entretanto, a abrangência do sinal da emissora ainda era limitada aos Estados do Rio de Janeiro, Minas Gerais, Espírito Santo e norte de São Paulo. Naqueles tempos, os transmissores não tinham grande potência e a rede de microondas não estava montada. No último ano das transmissões na TV, em 1970, a empresa patrocinadora procurou manter vivo o pro-grama, que já agonizava, e tentou criar um telejornal a nível nacional Por várias razões o projeto foi arquivado e, assim, o primeiro telejornal 'organizado' da TV brasileira acabou morrendo em 31 de dezembro de 1970. A principal delas, seguramente, foi o fato que a TV Tupi não conseguiu acompanhar o ritmo do desenvolvimento e os cus-

Page 13: Telejornalismo - Manual Completo

12

tos da implantação dos programas de telejornalismo nacionais. Outros fatores signifi-cativos aconteceram e foram estudados por Caparelli e por Mattos. Entre eles, o de-clínio dos Diários Associados e a chegada da Rede Globo, a reorganização do proces-so de produção dos telejornais - agora, não mais atrelados a uma agência de publici-dade - e os princípios dinâmicos de mercadologia implantados pela Globo - que não aceitava mais o patrocínio de um programa por um único anunciante.

A relação dos programas da televisão brasileira, hoje, com seus similares norte-americanos, é muito grande e relativamente fácil de ser detectada. Entretanto, o jor-nalista Fernando Barbosa Lima afirma que nos primeiros momentos "cada estação de TV procurou criar suas próprias formas, encontrar seu próprio estilo, sem copiar os telejornais americanos". Ele se refere a um momento especial do telejornalismo , perí-odo em que ele implantou e dirigiu o Jornal de Vanguarda, que tinha proposta de um novo estilo de telejornal. Este foi o primeiro grande choque na forma de apresentar um telejornal no Brasil. Para Barbosa Lima, "visualmente, todos os telejornais eram parecidos: uma cortina de fundo, uma mesa e a cartela com o nome do patrocinador. O mais famoso era o Repórter Esso da Rede Tupi". Cláudio Mello e Souza lembra que "na televisão, o esquema do Repórter Esso não diferia muito do modelo radiofônico, consagrado nos anos 40. Havia um locutor só, matérias afins reunidas em blocos, ou segmentos, e a principal notícia do dia, a 'manchetona', lida em tom vibrante, quase dramático, no encerramento do programa. Na Rádio Nacional também se fazia assim, manchete no fim".

Apesar do sucesso como veículo de comunicação novo, o visual pobre difundido na apresentação dos telejornais e a acanhada produção revelaram-se cansativos e de-sestimulantes para os telespectadores da época. Assim, os programas acabaram sendo profundamente abalados pela experiência inovadora realizada pelo jornalista Fer-nando Barbosa Lima. O Jornal de Vanguarda, no Rio, e o Show de Notícias, em São Paulo, romperam com o formato padronizado, até então presente nas telas, passando a ser apresentados por jornalistas e a contar com atraentes inovações visuais. Para Eli-sabeth Carvalho, “o velho porta-voz dos revendedores Esso (fruto de uma época em que o patrocínio na tevê se fazia de forma direta, ostensiva, e não camuflada, como acontece nos dias de hoje) chegava ao fim quase exatamente no mesmo estilo em que começou - 15 a 20 minutos de programa - em que o locutor lia as notícias ao vivo, o-cupando um espaço bem maior que os pequenos e irrelevantes filmes de assuntos lo-cais ou as velhas fotos de arquivo”.

De outro lado, as experiências de Fernando Barbosa Lima também enfrentaram dificuldades. Elas não eram, entretanto, referentes à qualidade visual das informações ou à independência e diversificação das fontes. Fernando Barbosa Lima relata que a instabilidade provocada pelo Ato Institucional n° 5 veio matar aquele tipo de telejor-nalismo mais criativo e crítico que eles faziam. E conclui afirmando: "a saída mais' digna para os telejornais foi copiar o estilo e a forma dos informativos norte-america-

Page 14: Telejornalismo - Manual Completo

13

nos". O exemplo melhor planejado e mais bem sucedido desta tendência foi o Jornal Nacional da Rede Globo, que foi ao ar pela primeira vez em 1° de setembro de 1969.

Até aquela época, a inexistência de uma infra-estrutura tecnológica de transmis-são atingindo toda a nação fazia com que os telejornais existentes atuassem como no-ticiários regionais. Como ressalta Caparel1i: "experiências como o Jornal de Vanguar-da, da Excelsior, que sucumbiu com o Ato Institucional n° 5, ou seu similar em São Paulo, Show de Notícias, pertencem à pré-história do telejornalismo , tratando-se de experiências regionais”. Nesse sentido, o Jornal Nacional da Rede Globo tornou-se a primeira experiência jornalística na televisão brasileira que conseguiu unir instantane-amente todo o país. Ainda para Caparelli "a possibilidade de um jornal nacional... só se tomou possível na segunda fase da televisão, após 1964. Nessa época, a Embratel já tomava possível a interligação de diversos pontos do Brasil, via satélite ou microon-das. Por isso, o telejornal nacional é tão recente na televisão brasileira...”

Entretanto, o desenvolvimento tecnológico possibilitado pelo regime militar na área das telecomunicações tinha um preço salgado: a liberdade de informar. Carvalho lembra que "a integração pela notícia coincidia com o endurecimento do regime". E o endurecimento do regime caminhava paralelo ao projeto militar do Palácio do Pla-nalto de unir o país pela televisão, aplicando ao máximo o poder centralizador na di-vulgação e controle das notícias, num exercício contínuo de verticalização da infor-mação.

Assim, na primeira participação do famoso Hilton Gomes estava redigido no s-cript que "o Jornal Nacional da Rede Globo, um serviço de notícias integrando um Brasil Novo, inaugura-se neste momento: imagem e som de todo o pais".

Mas, quais eram estes “som e imagem de todo o Brasil"? A primeira autoridade federal a falar no novo jornal foi Delfim Neto. Para Mello e Souza, naquela noite, "a fala do Ministro da Fazenda, Delfim Neto, levou uma palavra de tranqüilidade para todos os brasileiros, graças à formação da primeira rede nacional de informação jorna-lística". Quer dizer, o oficialismo representado por um dos mais fortes ministros que este país já conheceu foi colocado em segundo plano, já que a nação passou a ser in-terligada instantaneamente pela televisão, numa clara alusão do valor da tecnologia contrapondo-se ao conteúdo divulgado. Este era o "Brasil Novo" de então.

Mas, é necessário reconhecer que o telejornal em questão trouxe consideráveis contribuições para a incipiente e desorganizada apresentação de noticiários pela tele-visão. Para Lins da Silva, o Jornal Nacional da Rede Globo “inaugurou um novo esti-lo de jornalismo na TV brasileira. Primeiro, por iniciar a era do jornal em rede nacio-nal até então inédito entre nós. Depois, por consolidar um modelo de 'timing' da in-formação ... terceiro, porque consagrou um estilo de apresentação visual requintado e frio, pretensamente objetivo... quarto, pela extensão dos assuntos abrangidos, com a instalação e escritórios no exterior”.

Vários desses parâmetros de atuação foram, realmente, introduzidos no meio pe-

Page 15: Telejornalismo - Manual Completo

14

lo Jornal Nacional. Todavia, lembramos que eles já se encontravam sólidos nos simi-lares norte-americanos da época.

Assim, o modelo no qual se basearam os profissionais brasileiros da TV Globo para definir um projeto de programação nacional para a televisão foi sedimentado a partir do conhecimento, avaliação e adoção de diversas experiências externas. A Rede Globo tinha, claramente, no modelo internacional - sobretudo o norte-americano - seu eixo orientador principal. Para Priolli "era o padrão de 'networks', das redes norte-americanas, implantado na emissora carioca (a TV Globo) por especial gentileza do regime militar”. Essa 'internacionalização' do processo de produção e apresentação do jornalismo eletrônico foi facilitada pelo acordo entre a emissora e o Grupo Time Life. Segundo Mello e Souza, “a idéia de se fazer 'um jornal de caráter nacional', à seme-lhança do que já existia nos Estados Unidos, vinha sendo debatida, desde algum tem-po, por todas as pessoas da direção da Globo". Dessa maneira, o conceito de rede - o extraordinário recurso que permite falar ao mesmo tempo para toda a nação - foi via-bilizado, no Brasil, num programa jornalístico.

Basear-se nos exemplos norte-americanos para definir o padrão de redes, as es-truturas administrativas e mesmo os projetos joma1ísticos não representa novidade na cultura televisiva do pais. Este costume tem longa tradição. Walter Clark revela que “Assis Chateaubriand começou a pensar em fazer televisão no Brasil em 1947 e foi aos Estados Unidos procurar o David Sarnoff, fundador da RCA (Radio Corpora-tion of America)". A jovem e crescente indústria televisiva dos Estados Unidos en-contrava-se no centro das atenções do cidadão que trouxe a TV para o Brasil. Capa-relli lembra que "a primeira TV, a Tupi-Difusora de São Paulo, recebeu aparelhagem e assistência técnica da General Electric, enquanto que a TV Rio, da RCA Victor". Jun-to com elas, chegaram as facilidades para a aquisição de filmes e programas de TV - que difundiam o 'american way-of-life' - e que eram produzidos por Hollywood. A tática atravessou décadas, revelando uma constante atuação cultural transnacional que atingiu em cheio todo o continente.

Dessa forma, uma revisão do modelo de televisão adotado no Brasil remete-nos a uma inevitável comparação com seus congêneres dos EUA. Pode-se exemplificar co-meçando, inclusive, pela análise dos títulos de alguns programas. A decisão adotada na televisão norte-americana de colocar o nome do patrocinador no titulo do progra-ma foi também aqui seguida. Naquele país, os programas receberam o nome de patro-cinadores em títulos como: a Festa da Família General Motors, a Hora Palmolive, o Teatro de Estrelas Texaco e O Carretel de Notícias Esso, entre outros. Este último programa se tornaria, nos EUA em 1947, O Repórter Esso.

No início das transmissões da TV no Brasil, este hábito também representou um caminho natural, já que os patrocinadores eram os 'senhores absolutos' dos progra-mas. Para Priolli "esta era a razão por que naquele período, os programas tivessem seus nomes associados diretamente do patrocinador: Teledrama Três Leões, Espetácu-

Page 16: Telejornalismo - Manual Completo

15

los Tonelux, Grande Gincana Kibon, etc”. No Brasil, no caso do telejornalismo, o e-xemplo mais importante foi o do Repórter Esso.

Além da questão do título, os programas brasileiros copiaram aqueles norte-americanos também na forma de apresentação, no conteúdo dos temas tratados, no desenvolvimento da ação e no uso da linguagem televisiva. O que, aparentemente, não representava nenhuma afronta ou invasão cultural, pois se espelhava em antecedente anteriormente vivenciado - e assimilado - pelo jornalismo impresso brasileiro.

(...) Um recente estudo levado a cabo por Lins da Silva reforça essa tese: "primeiro, a

influência existe... segundo, que ela não é nem poderia ser absoluta, já que as diferen-ças culturais, políticas, econômicas e históricas entre as duas sociedades necessaria-mente modificam o caráter original das noções e qualidades geradas numa delas e tra-zidas para outra".

No processo de opção por uma das formas do fazer jornalístico praticado nas so-ciedades neste século, o modelo norte-americano é o que pareceu ser naturalmente aquele que deveria ser adotado. Lins da Silva acrescenta que "o jornalismo brasileiro aceita o modelo americano de jornalismo (dentro da sistematização feita por Siebert, Peterson e Schramm, a qual distingue quatro teorias de imprensa: a líbertária, que é a americana; a socialista, que é a soviética; a da responsabilidade social, que é a da Euro-pa Ocidental, e a autoritária que é a de muitos países do Terceiro Mundo) como o hegemônico".

O autor adverte que "é verdade ser possível encontrar no Brasil casos de assimila-ção acrítica de valores ou conceitos jornalísticos gerados nos EUA', que acabam por se converter em 'idéias fora de lugar’”, concluindo que, felizmente, “isso não significa ser ele (o jornalismo brasileiro) submisso, dependente ou mero reprodutor de valores e conceitos alheios. Ele goza de relativa autonomia, reinterpreta o que absorve, incor-pora suas próprias idéias, junta aspectos de outras escolas (a francesa, a britânica e a ibérica em particular) para formar um jornalismo com características peculiares, mas ainda assim dentro da hegemonia ideológica do jornalismo americano”.

(...) A própria idéia da Rede Globo de implantar um jornal nacional, em rede, também

foi espelhada na experiência norte-americana. O depoimento de José Bonifácio de O-liveira Sobrinho confirma que “a idéia de jornal em rede não era original. Nos Estados Unidos, ela já tinha sido posta em prática”. No caso da Rede Globo, até o prédio on-de ela está situada no Rio de Janeiro foi copiado de uma estação existente nos EUA. (...) Dessa forma, as soluções encontradas e aplicadas nos EUA serviam como espe-lho e como modelo de referência. E eram válidos e adotados em todos os setores no novo processo de produção implantado pela TV Globo no Brasil. Da conceituação conteudística ao equipamento. Do estilo, da linguagem ao espaço físico do ambiente de trabalho.

Page 17: Telejornalismo - Manual Completo

16

Até na questão da formação do pessoal a Rede seguiu experiências feitas nos Es-tados Unidos. Nos primeiros tempos, criaram a 'Escola Shakespeare' para formar os técnicos que iriam operar os moderníssimos equipamentos que estavam chegando dos EUA. Nenhuma outra rede investiu na formação regular de seus técnicos e jornalistas em toda a história do veículo no Brasil. (...)

Na programação, a Rede Globo trazia uma inovação: o conceito de 'faixas', que veio suceder a época do 'tráfego'. O conceito de 'Tráfego' era a escapatória para a pro-gramação, quando as fitas com os programas para as afiliadas eram enviadas de avião ou captadas pela rede terrestre de torres de microondas. Com a chegada do lntelsat, em janeiro de 1983, a Rede passou para o conceito de 'Faixas', que consiste em usar o satélite, no período da manhã, para enviar a programação para as emissoras que inte-gram a rede. Dessa forma, lembra Mello e Souza que "em alguns horários, portanto, já havia algo bem mais parecido com a programação de uma verdadeira rede, a exemplo do que já existia nos Estados Unidos. Lembramos que, neste momento, o Jornal Na-cional era o único programa “ao vivo”. ou seja, em “tempo real” de toda a Rede.

Outra concepção vinda dos EUA foi especialmente importante para o padrão de telejornalismo adotado na Rede Globo: eram as Normas Básicas de Redação do Jornal Nacional, que de forma praticamente inevitável, foram também copiadas ou adotadas em todos os outros telejornais concorrentes. Cláudio Mello e Souza explica que" em 1975, por exemplo, essas normas achavam-se já compendiadas em um pequeno manu-al, baseado em uma publicação americana e adaptado à fala brasileira, com todas as su-as muitas peculiaridades e exigências”. Esse primeiro 'manual' para o telejornalismo usava como padrão normas lapidadas a partir da experiência do jornalismo eletrônico nos EUA. Os jornalistas da Rede Globo o estudaram e o adaptaram para a nossa rea-lidade.

3. TELEVISÃO E SOCIEDADE 3

roduzida segundo as normas da fabricação industrial, propagada pelas técnicas de divulgação maciça, a televisão integra o esquema da cultura de massa como uma

síntese do cinema e do rádio. Ela surge após a Segunda Guerra e incorpora o imedia-tismo do rádio à empatia do cinema. Ela tem em comum com o cinema a capacidade de dinamizar o espaço e espacializar o tempo. E isso de maneira corriqueira. Essas de-finições elementares foram desenvolvidas por Theodoro W. Adorno em 1953. Anos depois, Fellini diria que ela é um eletrodoméstico.

Antes de falar na produção da notícia na televisão, gostaria de exprimir o que sinto diante desse veículo, não como jornalista mas como telespectador. E isso para separar,

3 A Construção da Notícia, de Claudio Bojunga.

P

Page 18: Telejornalismo - Manual Completo

17

como muito bem recomendou Silviano Santiago, as limitações inerentes à TV das li-mitações que lhe são impostas de forma perversa.

Como telespectador, me sinto ambíguo em face da telinha. Não tenho dúvidas so-bre o fato de que ela é um dado da modernidade, desse nosso mundo que se constrói e se desfaz no ar, com um dinamismo vertiginoso, impensável até meados do século XX. Sob este aspecto, a televisão é exaltante, incontornável. Insustentavelmente leve e liberadora da nossa percepção e dos nossos sentidos. Ela nos transforma em antenas ela nos "antena" e, como sou fundamentalmente cosmopolita, nutrindo até uma séria desconfiança em relação ao sombrio culto das raízes, acho isso fascinante.

Se a televisão não fosse fascinante (e potencialmente liberadora), não estaríamos aqui tentando pensá-la e sonhando em aperfeiçoá-la. Tomemos, pois, o nosso empe-nho como uma velada declaração de amor. Por outro lado, trata-se de um amor cons-trangido, ou mal correspondido, uma vez que ela é também insuportavelmente fútil, diluidora, superficial, manipuladora, interesseira. É a permanente cascata de detergen-tes, cigarros, eletrodomésticos. cadernetas de poupança; o bombardeio embrutecedor de signos supérfluos, o linguajar pobre, rotineiro, repetitivo. Aí ela nos pede passivi-dade e conformismo: a tela se apresenta como uma banheira quente onde é mais fácil digerir o massacre do bard-selling. Isto é, um grosseiro processo de massificação e normalização pela banalização das imagens. A idéia é fomentar a credulidade do con-sumidor potencial (é assim que ela nos vê) através de uma "programação" dos nossos desejos reprimidos. Joga-se então com a saúde, a beleza, a aceitação social, o sucesso sexual. Manipula-se o inconsciente em nome do sonho e do consolo: é a tentativa de. teleguiar o comportamento em direção às mercadorias. É o espectro do Big Brother disfarçado em Papai Noel (cf. Baudrillard).

Temos, então, de um 1ado, uma tecnologia capaz de suscitar uma mutação vertigi-nosa, desprovincianizando o mundo - uma janela eletrônica aberta sobre a realidade. Do outro, como disse belamente Ítalo Calvino (em Seis propostas para o próximo mi-lênio), temos "a transformação do mundo em imagens, multiplicando-o numa fan-tasmagoria de jogos de espelhos, imagens que são destituídas da necessidade interna que deveria caracterizar toda imagem, como forma e significado, como força de im-por-se à atenção, como riqueza de significados possíveis.

Acho que o telejornalismo deve ser considerado dentro dessa ambigüidade ampla que caracteriza a televisão dos dias de hoje. É da essência da notícia na TV o modo indicativo e a captação e transmissão do visível imediatamente. McLuhan escreveu agudamente que a câmera de TV age visualmente como o microfone em relação à voz. Enquanto o ouvinte de rádio tem de adivinhar rostos e paisagens, a TV nos mostra o homem descendo na Lua, o atentado ao papa, o acidente da Challenger, a mão trêmu-la de Sarney jurando a Constituição.

São gestos e atitudes, seqüências temporais, agenciados numa determinada escala de importâcia. É também o "quadro sério" do espetáculo, o momento em que se troca

Page 19: Telejornalismo - Manual Completo

18

o feérico pelas asperezas do mundo. Como as palavras são escritas para serem ouvi-das, o estilo da notícia é conciso, preciso, direto. A preocupação básica é saber se a informação tem importância ou desperta suficiente interesse para ir ao ar. Telejorna-lismo é um serviço. E não há quem não queira ver a queda do Muro de Berlim.

Acho que esses manuais de telejornalismo, que tanto impressionaram Marilena Chauí, misturam algum bom senso com a mais pura imbecilidade. Como esses livros americanos “do it yourself” (faça você mesmo), que ensinam por correspondência co-mo conquistar amigos e fazer sexo numa boa. Meu Deus, ninguém aprende sexo len-do manuais!

Mas estamos aqui para falar no telejornalismo que não está nos manuais. Porém, antes de entrar nos "bastidores", seria preciso limpar a área.

Marilena Chauí falou sobre cinco características do telejornalismo. Resumindo: 1) a destruição do tempo real; 2) a anulação do raciocínio e da reflexão; 3) a perda de re-ferência do espaço; 4) a triagem de quem pode e de quem não pode aparecer no vídeo; e 5) a banalização, a tendência ao espetacular, fenômenos que massageiam nossa emo-ção a expensas da inteligência. Quero voltar ao assunto para distinguir algumas carac-terísticas da televisão de uma certa manipulação que Marilena classifica de "contra-informação" e de "intimidação".

Estou inteiramente de acordo com duas dessas impugnações: a seleção de quem aparece ou não na telinha (reproduzindo discriminações sociais); e a oscilação perma-nente entre o banal e o espetacular, processo anestesiante destinado a toldar a capaci-dade de discernimento do telespectador. Não concordo muito com as outras. Falta nuance.

Em relação à fragmentação do espaço e à destruição do tempo, acho que a gente precisa evitar os preconceitos da cultura tipográfica (na qual, aliás, me incluo). O que hoje dizemos da televisão é o que, provavelmente, diria do jornal impresso moderno um homem do século XVII. Imaginem como ele reagiria diante de uma primeira pá-gina com títulos de tamanho variado, colunas interrompidas, "continua na página tal", etc. Ora, ninguém pode dizer que o New York Times, a Folha e o Jornal do Brasil se-jam os responsáveis pela "fragmentação da percepção do mundo moderno".

Mais: acho que, tecnicamente, a fragmentação pode ser saudável e proveitosa. Do ponto de vista do entendimento, uma corrida de Fórmula 1 é muito mais compreen-sível vista na segmentação das muitas câmeras alinhadas ao longo do percurso do que no autódromo. O mesmo se pode dizer de um desfile de escolas de samba. O que se perde longe do autódromo e do sambódromo não é o entendimento, mas a emoção.

Na minha opinião, a grande dificuldade é conciliar a retórica referencial da televi-são, sua vocação pela superfície e pela fluidez, com as realidades abstratas do mundo moderno. Garanto que não é fácil explicar, nos limites estreitos de um telejornal, a lógica do crash financeiro de 1988, ou os meandros dos conflitos no Golfo. Uma pes-quisa americana revelou que os telespectadores médios só se lembram de l0% do que

Page 20: Telejornalismo - Manual Completo

19

foi ao ar no jornal da noite. Essa terrível volatilidade é compensada pela imprensa es-crita que, se for esperta, deverá se tomar, dia a dia, mais analítica e interpretativa. Nesse sentido, o que a foto fez em relação à pintura, a TV fará em relação ao jornal impresso. Sustento ainda que a fragmentação é positiva, se praticada de maneira ativa, e isso com O aparelho mais temido pelos anunciantes e donos de canais: o controle remoto. O zapping é a vingança do te1espectador contra a ditadura da antena.

Creio que há muito preconceito das críticas genéricas à fragmentação, à perda de referências espaciais, à destruição do tempo. O romance moderno já foi vítima disso. Basta lembrar o que Lukács disse sobre Joyce e Proust. Também não estou convenci-do da total anulação da reflexão na telinha. Acho que os registros interpretativos e analíticos aumentaram depois do fim da ditadura. Sem voltar ao que já disse antes: que a televisão induz aos jornais, o espaço analítico da informação por excelência ao lado das revistas.

Mas há um detalhe: nesse caso é preciso ser alfabetizado. Por isso, estou menos preocupado com os balbucios dos pichadores do que com os milhões que não sabem ler e que constituem a massa de manobra do consumismo desvairado das grandes re-des. Sem falar nas crianças.

ATIVIDADES Com base nos 3 textos anteriores, elabore uma resenha crítica sobre o Telejornalismo brasi-leiro. Use como ponto de análise um telejornal brasileiro e tente criticá-lo do ponto de vista técnico e social. Não esqueça de considerar este jornal como parte integrante de uma histó-ria maior e também de situá-lo como pertencente à lógica da indústria cultural. A quem interessa a pauta deste telejornal? Compare o telejornal em questão com um jornal impresso e pontue as principais diferenças. Elabore um texto de 40 linhas.

Page 21: Telejornalismo - Manual Completo

20

4. O REPÓRTER E A REPORTAGEM4

"A glória de um repórter dura menos que a digestão de uma feijoada." David Nasser - "Luz de vela", in Revista de Comunicação, n° 10, ano 3, pp. 12-13, 1987.

O jornalismo viu nascer, nos últimos tempos, um novo tipo de profissional, um elemento diferente dos demais. Nas entrevistas se tornou comum a presença desse personagem que tem preocupações que o individualizam dos seus companheiros. A-lém disso, faz perguntas extremamente objetivas e sempre necessita realizar seu traba-lho antes dos outros. Muitos profissionais da imprensa escrita acham-no, inclusive, inconveniente e até desrespeitoso, pela maneira agitada e apressada de atuar. Esse no-vo profissional, o repórter de telejornal, nunca está só, como é o caso do com-panheiro de rádio, ou com fotógrafo, caso da imprensa escrita. O repórter de televi-são está sempre acompanhado de uma equipe composta por mais quatro profissionais. Para complicar, porta equipamento incômodo para todos quando produz entrevistas ou reportagens coletivamente. Este profissional, que tem ainda de se preocupar com a aparência e luta cotidianamente contra o tempo, é a partir de agora o nosso sujeito.

Inicialmente, vamos indicar quais são as principais diferenças existentes na prática da reportagem de televisão e da imprensa escrita. O repórter Caco Barcelos, da Rede Globo, afirma que "em televisão, o importante é chegar com a coisa acontecendo. Em jornal, ou revista, você poderá reconstituir o fato, além de ter maior liberdade para investigar. Na televisão, a gente chega sempre seguido de um batalhão (a equipe), e não há discrição possível". Além de não ser possível esconder uma equipe de televisão – que é muito maior que a de imprensa -, a excitante luta contra o tempo faz com que todos, do repórter ao iluminador, trabalhem de modo diferente na tentativa de contar e mostrar os fatos "ainda acontecendo", ou que acabaram de acontecer "há muito pou-co tempo".

O telejornalista não poderá reconstituir os fatos para mostrá-los - ainda em ação - para os telespectadores, pois os elementos televisivos essenciais da notícia poderão não mais estar presentes no palco do acontecimento. O folclore do telejornalismo re-gistra o caso do repórter de uma emissora de televisão paulista que chegou à Praça da Sé momentos depois da primeira manifestação pela abertura e volta à democracia, for-temente reprimida pela polícia. Ele implorou, aos poucos populares que ainda se en-contravam no local, para tentarem reproduzir "os ares" da manifestação. O repórter se esforçou bastante e foi, inclusive, solicitar ao padre da Catedral que o ajudasse no seu intento. Obviamente, ele nada conseguiu, e acabou realizando um simples boletim sobre o fato. Sem imagens que demonstrassem a verdadeira dimensão dos elementos sociais em atrito.

Podemos concordar que, mesmo na TV. é sempre possível descrever o que acon-

4 Do livro Aprender Telejornalismo, de Sebastião Squirra.

Page 22: Telejornalismo - Manual Completo

21

teceu num determinado palco de ação. Mas este recurso poderá diminuir a força dra-mática da telenotícia. Para realizar uma matéria, a repórter Ana Maria Badaró pondera que "o repórter passa bem a informação se o corpo, a expressão facial, mão e voz es-tão atuando em harmonia".

Seu desempenho deve ser similar ao do ator de teatro ou de televisão ao conviver com palcos de ação e situações que mudam constantemente e que, muitas vezes, tra-zem perigo à sua própria vida e à da equipe que o acompanha. Esta é uma das diferen-ças básicas no exercício da reportagem telejornalística.

Tal situação não acontece com o profissional da imprensa escrita. É freqüente o repórter redigir seu texto horas depois de o fato ter acontecido, após levantar dados complementares e ter checado informações que, num primeiro momento, eram ver-dadeiras, mas que não suportavam uma segunda análise.

Muitas são as atribuições de um repórter de televisão. Por exemplo, deverá realizar a(s) entrevista(s) com as pessoas indicadas pela chefia de reportagem. Na ausência de indicação ou ainda de mudança nos rumos dos acontecimentos, deverá encontrar a pessoa certa, aquela que tenha ideais condições de dizer coisas relevantes sobre o as-sunto. Isso nem sempre é fácil de se decidir, pois requer especial grau de concen-tração, agilidade, intuição e coragem para "apostar" no escolhido. O repórter deverá desenvolver a capacidade de achar e escolher a pessoa ideal para falar, que, além disso, saiba expressar seu pensamento de forma clara e concisa. Falando pouco e bem, en-fim, que consiga dar seu "recado" curta e objetivamente. O repórter de televisão não pode deixar o entrevista do falar à vontade. usando o tempo que queira para desen-volver uma idéia. Na realização da reportagem, ele deverá memorizar o tempo que o entrevistado está levando para responder a cada pergunta. E saber escolher o momen-to certo de interromper o entrevistado para apresentar mais uma questão - visando maior objetividade - ou ainda formulando nova pergunta, para melhor desenvolvi-mento do assunto. Para isso, é preciso saber interromper a entrevista. A A repórter Ana Maria Badaró afirma que "interromper uma entrevista é uma arte que quase sem-pre se transforma numa aventura. Não há técnica que livre o repórter de televisão da inconveniência de cortar o entrevistado e passar a outro assunto sem o risco de deixar de ouvir o mais importante que ele ainda não havia dito".

Outra das atribuições do repórter de televisão é a produção dos contraplanos. Os contraplanos são enquadramentos onde o repórter, obedecendo à regra dos 180 graus, refaz as perguntas inicialmente apresentadas ao entrevistado. São planos fundamen-tais para a hora da edição do material.

Para isso, o repórter deverá ter memorizado ou anotado em algum lugar todas as perguntas realizadas no início da reportagem. Se for possível, e o entrevista do puder esperar um pouco mais, o repórter deverá realizar os contraplanos com ele mesmo. Se não contar com a presença do entrevistado, deverá realizar o contraplano sozinho. É uma situação no mínimo embaraçosa para o repórter: na ausência do entrevistado, ele

Page 23: Telejornalismo - Manual Completo

22

estará falando "para alguém", para o vazio à sua frente. Dependendo da situação, isto pode ficar muito engraçado de acompanhar e tornar-se motivo de pilhéria da parte de populares.

Ele deverá ainda realizar abertura e encerramento da reportagem no palco da ação, com informações claras e interessantes para os telespectadores. Tudo muito bem do-sado e interligado, com "pontes" que façam evoluir a matéria sem repetir informações. Sobretudo quando houver mudança do palco da ação, pois, geralmente, a reportagem é feita num local, a abertura em outro e o encerramento em um terceiro. As mudan-ças de cenário são importantes e úteis para a matéria, pois, conforme Peter Ruge, "as mudanças de cenário podem constituir excitadores formais da tensão narrativa".

Ainda no que diz respeito às atribuições do repórter de televisão, ele deverá tam-bém realizar texto em off. Trata-se da parte constituída somente de informações em áudio, sem imagem do repórter ou do assunto em pauta. Entretanto, o repórter de televisão deve levar em conta que o texto em off servirá para aprofundar o tema trata-do em todas as suas dimensões e deverá ser ilustrado, na edição, com imagens sobre o assunto. Por isso, é importante manter com a equipe estreito "cordão umbilical", para que as informações em áudio complementem as visuais e não simplesmente as repi-tam. O repórter deverá também tomar cuidado para que o texto produzido não seja redundante como um audiovisual de nível primário. E não pode esquecer: períodos curtos, palavras curtas e claras, apresentando sempre uma idéia central por período.

Estas são as principais atribuições do repórter de televisão na produção de entre-vistas e coberturas de assuntos em externa. Com um detalhe importante: a constante e nem sempre imperdível luta contra o tempo. Por isso, deverá sempre chegar à emi-sora em tempo de a matéria ser editada, para que possa entrar no telejornal previsto. Todo e qualquer argumento para chegada atrasada à emissora será considerado – mas será inútil se a matéria não for veiculada. A situação será agravada se os concorrentes falarem do assunto e o mostrarem com reportagem externa, bem editada. Se tudo correr bem, o trabalho de um dia inteiro, às vezes sem descanso ou refeições, será re-duzido à verdadeira dimensão da notícia telejornalística: a informação clara, precisa e objetiva do telejornal. O repórter André Luiz, da Rede Globo, passou por uma expe-riência documentada pela revista Veja: "No final, as quase sete horas de trabalho do repórter e sua equipe se transformaram numa notícia de 1 min. 23 seg.".

O repórter tem lugar assegurado hoje na produção de matérias para a televisão. Mas, no início, com as dificuldades de convencer os repórteres, que freqüentemente vinham do jornalismo impresso, a aparecerem no vídeo, e ainda na ausência de uma linha de jornalismo que "valorizasse o jornalista", a situação era indefinida para essa área profissional. Naquela época o repórter não tinha outra função além de segurar microfone e fazer perguntas que quase nunca iam ao ar. A diretora de Jornalismo da Rede Globo, Alice Maria, lembra que, nos "primeiros anos da reportagem, o repórter era apenas 'uma pergunta'. Ele não aparecia. Ninguém lhe ouvia a voz, e muito menos

Page 24: Telejornalismo - Manual Completo

23

lhe via o rosto". Hoje, a situação é bem diferente, e são raras as ocasiões sem a parti-cipação "viva" do repórter na matéria. Inclusive se tornou freqüente a presença de re-pórteres setoristas dentro do telejornalismo. Este tem sido um caminho seguido pelas emissoras, já que o público passou a identificá-los com certos tipos de matérias e eles se tornaram confiáveis para tratar de assunto específico.

Os repórteres de televisão têm que cuidar ainda, de forma especial, da sua vida pessoal, já que são familiares à população. Aonde chegam são logo reconhecidos por todos, o que lhes traz vantagens, mas também alguns embaraços. O jornalista Clóvis Rossi afirma que "o jornalista de jornal raramente é conhecido do público, mesmo daquele público que o lê freqüentemente. No máximo, seu nome será conhecido por seus leitores mais fiéis, mas ele jamais será, por exemplo, reconhecido na rua. Com o pessoal da televisão, acontece o contrário: sua fisionomia acaba se fixando, na mente do telespectador quase como se fosse um astro de telenovela".

Esse reconhecimento público traz aos repórteres de televisão muitas responsabili-dades, ou mesmo certas vantagens. Mas também ocasionais incômodos. Simples ou radicais, já que muitas vezes os populares os confundem com a política da emissora. Eles são sempre o "alvo possível" para a demonstração do carinho ou do ódio da po-pulação em relação à forma como as noticias estão sendo mostradas no vídeo. Como exemplo prático desta situação, lembro que os telejornalistas da Rede Globo enfren-taram problemas nas ruas e também no seu trabalho por causa da indiferença da emis-sora em abordar ou até mostrar a verdadeira dimensão do movimento pelas Diretas Já. O repórter Ronald Carvalho passou por uma situação no mínimo delicada quando tomou um táxi no Rio de Janeiro. Ele foi reconhecido no final do ano passado pelo motorista quando solicitou uma corrida na véspera da greve geral do dia 12 de de-zembro de 1986. O jornalista Paulo de Tarso conta a situação: "O motorista olhou bem para ele e disparou: – O senhor trabalha na Globo, não é'? – Trabalho sim, por quê? – O senhor vai fazer greve amanhã? – Ronald escapou por pouco: –Vou, vou sim. – Ainda bem. Se o senhor dissesse que não ia fazer greve, eu ia lhe dar uma por-rada". Quer dizer, para demonstrações de estados de espírito conflitantes - a admira-ção e o desprezo -, os repórteres de televisão podem ser os alvos catalisadores possí-veis das emoções populares.

Para poder se safar de todas as situações embaraçosas, o repórter de televisão tem que ter muita astúcia, sabedoria e senso de oportunidade. Para realizar as reportagens e obter o máximo delas, ele deverá complementar as qualidades próprias do veículo eletrônico com as dos seus similares impressos. A diretora de Jornalismo Alice Maria, da Rede Globo, que também foi repórter, revela que o repórter “vai ter de usar tudo quanto se exige normalmente de um bom repórter de jornal de papel: tem de ter gar-ra, ter informação, bom texto, saber apurar, ter boas fontes de informação. Além dis-so, tem de ter o quê? Uma bela imagem”. A questão da aparência é importante para o jornalismo eletrônico, pois ao ser enquadrado e captado pela câmara, o repórter não

Page 25: Telejornalismo - Manual Completo

24

poderá parecer inibido, indeciso, inseguro e, muito menos, "fotografar mal". Esta questão levanta discussões, às vezes acirradas, entre os profissionais do telejornalis-mo: afinal, beleza é fundamental ou é secundária? Paulo Francis, quando relata as pe-culiaridades do telejornalismo americano e a atuação da repórter e apresentadora Dia-ne Sawyer, que, por sinal, acabou se tornando a primeira anchor-woman dos EUA, afirma: '''Talvez só tenha prestado atenção em Diane, loiríssima, mas sem um pingo de maquilagem, de calças compridas e blusa larga, fazendo tudo para ser levada a sério como repórter e para não ser tida como objeto sexual. Não adianta. A gente a ouve falando de todas aquelas coisas sérias e o que se pensa não é nada sério, ou ao menos publicável". Um dos dez mandamentos que governam o telejornalismo americano, pesquisados pelo professor Frank Reed e citados em documentário realizado pela Central Globo de Jornalismo em Nova York, conclui que "os telejornalistas negam que beleza seja condição para as mulheres trabalharem em televisão. Mas quando é preciso decidir entre um careca feio e uma loira bonita, os produtores derrubam o ca-reca".

Alice Maria complementa: "Além disso tudo, tem que ter uma virtude fundamen-tal. Chama-se humildade. Se a pessoa não for humilde, ela está liquidada". Pessoas ar-rogantes e de relacionamento difícil quase sempre afastam as outras de si. E isso é prejudicial ao repórter de televisão. Ele necessita se relacionar, sem afetações, com os entrevistados para poder realizar as reportagens e as entrevistas de forma ideal e acer-tada. Uma coisa é segura: o repórter de vídeo tem que ser simples, ter equilíbrio plás-tico, qualidade de comunicação verbal para poder ocupar um posto em um telejornal de importância. Pode se concordar que um pouco de vaidade pessoal pode ser ideal para conquistar a confiança do telespectador. O repórter Ronald de Carvalho esclare-ce que "há todo um lado narcísico na minha atividade profissional. Quem não acha bom ser reconhecido na rua e virar objeto de admiração popular?". Quer dizer, o re-pórter de televisão deverá ter garra, bom texto, desinibição, objetividade, segurança, humildade, educação, e ainda por cima domínio do seu aspecto visual.

Sabemos que não se trata somente de ter um belo visual, conseguir ser claro e sa-ber dizer o texto corretamente. É necessário que o repórter de televisão saiba abordar corretamente o assunto pautado. Que tenha intuição para selecionar o que é realmen-te importante para a reportagem e saiba decidir, eliminando o indispensável da maté-ria. Para isso, ele conta na emissora com um setor importantíssimo para o seu traba-lho: a Chefia de Reportagem.

A Chefia de Reportagem é a parte mais importante do levantamento e da produ-ção de matérias para o telejornalismo . É, pode-se dizer, o coração de todo o processo de produção de notícias com imagens e entrevistas, na retaguarda e no palco da ação. Os americanos chamam de "Assignement Desk" a função da Chefia de Reportagem. É deste setor que parte a decisão final de cobrir ou não um determinado assunto. O responsável pela chefia, de acordo com as necessidades dos editores-chefes dos tele-

Page 26: Telejornalismo - Manual Completo

25

jornais e em concordância com a Direção de Jornalismo, é quem organiza a cobertura diária dos assuntos pautados, orienta os jornalistas na maneira adequada de abordar os temas e indica qual o aspecto deles que interessa naquele momento. Ele tem também a incumbência de informar aos repórteres qual a duração aproximada das matérias e também a variação possível para as suas entradas ao vivo.

Nas reuniões de Chefia de Reportagem, realizadas durante o dia, são determina-dos os assuntos da pauta para cobertura com reportagens externas. A pauta é o levan-tamento diário dos assuntos que podem ser objeto de reportagem e que, de forma previsível, vão acontecer naquele dia. É função da Chefia de Reportagem checar se não existem novidades nos assuntos pautados na véspera e, a partir de levantamentos por telefone, marcar ou confirmar entrevistas para os repórteres. Antes de sair para a rua, o repórter deve conversar detidamente com a Chefia de Reportagem e se infor-mar da abordagem ideal, naquele momento, do assunto em questão.

Nos Estados Unidos, os repórteres não precisam se dirigir às emissoras para se in-teirar dos assuntos pautados e da forma de abordagem das matérias. Mas no Brasil, este é um hábito costumeiro. Não raro, os repórteres têm, inclusive, que assinar pon-to de presença na emissora. A presença do repórter na emissora é um costume co-mum na totalidade das emissoras brasileiras, e tem muito a ver com a nossa maneira de fazer telejornalismo. O contato pessoal entre a Chefia de Reportagem e o repórter tem também a intenção clara de, além de fornecer objetivamente os alvos e aborda-gens a serem seguidos, poder controlar o trabalho e o desempenho das equipes de ex-ternas.

A produção de reportagem para o telejornalismo requer muita atenção, pesquisa, checagem, além de muito profissionalismo da parte de todos os envolvidos no pro-cesso. Apesar de todo o cuidado, na prática da reportagem externa os problemas au-mentam e as dificuldades se avolumam assustadoramente. A equipe é grande: são, no mínimo, quatro profissionais que trabalham com equipamento pesado, de delicado manuseio, e que freqüentemente apresenta problemas nas horas mais impróprias. São quatro profissionais: o camera-man ou cinegrafista, o auxiliar (que se encarrega do aparelho de videoteipe), o iluminador e, obviamente o repórter. O tamanho da equipe de televisão é um fator que inibe os entrevistados e traz incômodo para todos os en-volvidos na reportagem.

É possível passar despercebido numa reportagem investigativa ou num momento que requeira discrição do jornalista para saber qual a verdadeira dimensão dos fatos. Marc Paillet concorda com isso, e afirma que, "a rigor, uma testemunha sem aparelha-gem pode manobrar em terreno proibido. Mas não é possível dissimular uma câmara de televisão". A presença da grande equipe, do equipamento e da luz pode inibir as pessoas, ou ainda levá-las, numa tentativa de aparecer em veículo tão atraente como a televisão, a dizer coisas não-comprováveis e que podem prejudicar a matéria. Quando perguntado se "a presença da televisão criava uma notícia", o responsável pela Central

Page 27: Telejornalismo - Manual Completo

26

Globo de Jornalismo, o jornalista Armando Nogueira, afirmou: "Se você sai com uma câmara e vem uma passeata pela avenida, ela vem bem comportada; quando você a-cende a luz e bota a câmara na direção, eles se inflamam e fazem uma algazarra que é irreal". Esta é uma situação facilmente comprovável em manifestações populares. A televisão exerce grande fascínio sobre as pessoas, que sabem da força da sua comuni-cação.

Na grande maioria das vezes, a reportagem externa é realizada para ouvir pessoas que tenham alguma opinião sobre os fatos importantes do dia. Para isso, o repórter precisa encontrar e entrevistar pessoas que tenham, de alguma forma, participado ou presenciado algo que mereça ser divulgado. Nos fatos ocorridos em locais públicos, sempre que uma equipe de televisão aparece, muitas pessoas, querendo ver sua opini-ão ou rosto no vídeo de casa, se dispõem a falar. O repórter de televisão precisará, en-tão, ter bom discernimento para escolher e entrevistar a(s) pessoa(s) realmente cate-gorizada(s) a falar sobre o assunto em questão. Se não souber fazê-lo, poderá preju-dicar a matéria.

Toda entrevista tende a se transformar numa espécie de jogo de inteligência. De um lado, o entrevistado, disposto a declarar apenas aquilo que interessa a si, à empresa ou entidade pública a que pertence, e, do outro, o repórter, tentando obter o máximo de informações significativas para a sua audiência.

Maury Green revela que “todo repórter tem que usar de psicologia no contato com os entrevistados, porém o repórter de televisão tem que recorrer muito mais à psicologia que a maioria de seus colegas dos outros veículos”. Isto se torna evidente na prática da reportagem televisiva, já que muitas pessoas ficam nervosas diante do equipamento e não conseguem desenvolver o tema da reportagem. Elas podem, inclu-sive, ficar totalmente bloqueadas no momento da entrevista, e vão, seguramente, dar resposta pouco conveniente aos telespectadores. Para evitar isso, o repórter de televi-são deverá usar de psicologia e colocar o entrevistado à vontade na presença dele, re-pórter, da equipe e do equipamento. Se for preciso, poderá adiar por alguns instantes a realização da reportagem, até que o entrevistado tenha recuperado o bem-estar físi-co e mental.

A missão do repórter de televisão é dar tranqüilidade ao entrevistado, fornecendo condições para que ele fale confortavelmente, a fim de obter a informação desejada. Carlos Drummond de Andrade, numa de suas raras entrevistas, sabiamente disse: "As entrevistas são trocas de palavras em que um formula ao outro perguntas cujas res-postas já conhece de antemão".

A televisão, pelas suas características próprias, desperta insegurança nos entrevis-tados, na medida em que eles terão o rosto e a voz gravados na fita de vídeo que irá ao ar. Além disso, deixará claro como ele se desincumbe e desenvolve o raciocínio na ho-ra de explicar o fato ou a posição desejada. No sentido geral, as pessoas são preocu-padas em como vão parecer publicamente. E isto se evidencia na televisão, já que ela

Page 28: Telejornalismo - Manual Completo

27

atinge uma quantidade de pessoas significativamente maior que os jornais e as revis-tas. Para dar tranqüilidade ao entrevistado, o repórter de televisão deverá, inicialmen-te, explicar o motivo da reportagem, ouvir a opinião do entrevistado sobre o assunto e combinar com ele a melhor forma de encaminhar a entrevista. Pode parecer "entre-guismo" da parte do repórter de televisão, mas uma coisa é segura: ele não deve dar a impressão de que veio a fim de obter resposta sensacionalista que, no fundo, pode prejudicar o entrevistado. Se der essa impressão, o entrevistado pode não concordar em recebê-lo novamente. E o repórter poderá estar perdendo uma grande fonte de in-formações. É claro que ele não deverá simplesmente ouvir o que o entrevistado deseja falar e concordar com ele. É sua função "negociar" com o entrevistado, dando-lhe chance de dizer o que deseja e também satisfazer os interesses do próprio repórter no encaminhamento da entrevista, e os alvos definidos pela Chefia de Reportagem.

O repórter de televisão deverá ainda, e sempre que possível, obter o máximo de informações sobre o entrevistado e sua importância no cenário político, econômico, social ou cultural do país. Enfim, deverá descobrir e avaliar a credibilidade do entre-vistado para falar sobre o assunto para o qual foi procurado e que se dispõe a abordar. É fundamental também que o repórter de televisão obtenha a confiança e disposição do entrevistado para a entrevista em questão, pois, se ele não se convencer da sua o-portunidade e importância, seu desinteresse poderá ficar claro quando a reportagem for ao ar.

Algumas regras básicas devem ser seguidas pelo repórter de televisão: 1) O repórter deve estar o mais atualizado possível sobre os assuntos que podem

ser pauta no dia-a-dia do telejornalismo. 2) É importante que tenha conhecimento do pensamento da empresa para a qual

trabalha sobre todos os assuntos, principalmente os de relevância e os que envolvem a classe política e econômica a nível regional e nacional. Isso vai, seguramente, facilitar o seu trabalho.

3) No trato social das pessoas, deve identificar-se educadamente no primeiro con-tato com o entrevistado. O contato inicial é sempre importante em qualquer entrevis-ta, e precioso para o sucesso, no caso de telejornal.

4) O repórter de televisão deverá sempre ser pontual com os horários acertados com os entrevistados. O atraso poderá provocar indisposição dos entrevistados para com a reportagem programada.

Algumas pessoas acreditam que o mistério é peça importante na reportagem. Mas, no telejornalismo, não se deve seguir esse raciocínio. Por isso:

5) O entrevistado deve sempre ser informado sobre a razão por que ele foi procu-rado para dar uma entrevista.

Outra regra básica que o repórter de televisão deverá seguir é a de, quando neces-sário:

Page 29: Telejornalismo - Manual Completo

28

6) Tentar ajudar o entrevistado a esclarecer suas opiniões, e quando ele se distan-ciar do assunto, reconduzi-lo ao eixo da entrevista.

Outra circunstância que poderá ser somada às anteriores é o fato de que: 7) O repórter de televisão deverá escutar atentamente o que o entrevistado declara

na entrevista para poder complementar, com novas perguntas, o que inicialmente ti-nha programado realizar. É comum presenciar situação na qual o repórter não conse-gue prestar atenção no que o entrevistado diz e realizar pergunta totalmente diferente do que deveria. Muitos entrevistados têm o hábito de "dar uma pista" para o repórter que, preocupado com a memorização da próxima pergunta, não percebe o jogo de in-teligência proposto pelo entrevistado e acaba fazendo perguntas sem sabor lógico.

8) As perguntas realizadas pelo repórter de televisão deverão ser objetivas, claras e curtas. Isso deve ocorrer para a obtenção de respostas concretas e significativas.

9) Toda pergunta comporta uma resposta significativa. Muitas respostas poderão ser fornecidas, mas, seguramente, uma delas é muito melhor que todas as outras.

10) Toda resposta tem, em televisão, uma duração que se pode chamar de ideal, na qual o entrevistado "esgota" o assunto. Acima desse tempo, corre-se o risco de desin-teressar o público telespectador. Uma regra corrente no telejornalismo norte-americano diz que se um entrevistado não consegue dar o seu recado em quinze se-gundos, ele vai ser, inevitavelmente, cortado do telejornal, ou sua resposta será edita-da para ficar dentro desse limite. Na maioria dos telejornais brasileiros, esse espaço é um pouco maior. No telejornalismo praticado pela Rede Globo, varia, em média, de vinte a quarenta segundos, podendo ficar acima desse limite em situações excepcio-nais.

Uma característica importante da prática da reportagem para telejornal deve ser ressaltada:

11) Se o entrevistado acabar falando "em círculos", inclusive reprisando o que já disse antes, mas, fundamentalmente, não abordando o assunto da maneira esperada, o repórter deverá interferir na respostas, tentando fazer com que seja clara e definida, ou ainda formulando nova pergunta com outra ótica sobre o assunto.

12) É fundamental que o repórter não entregue, em hipótese alguma, o microfone para o entrevistaddo pois este deverá estar em seu poder no momento em que decidir interferir.

13) Outra regra básica é demonstrar real interesse por tudo que o entrevistado es-tiver dizendo. Mas um detalhe tem que ser observado: demonstrar interesse não quer dizer, de nenhuma forma, que a repórter deverá concordar com o que o entrevistado estiver dizendo, ou ainda com seus pontos de vista.

14) O repórter de televisão deverá acompanhar o raciocínio exposto pelo entrevis-tado e não deverá, em hipótese alguma, sacudir a cabeça em movimentos de concor-dância ou discordância, O repórter não deve deixar passar a sensação de que participa

Page 30: Telejornalismo - Manual Completo

29

de “uma conversa de comadres”, e sim de que está ali para obter opiniões objetivas sobre algum assunto relevante.

15) O repórter de televisão não deverá dar opinião sobre o assunto tratado quan-do estiver realizando a entrevista. É sempre bom lembrar que quem deve falar é o en-trevistado, pois é dele que o público aguarda as informações e quer saber a opinião.

16) Se ficar evidente que o entrevistado está mentindo ou ainda se desviando acin-tosamente do assunto, é dever do repórter de televisão forçá-lo, obviamente que com sabedoria e educação, a aprofudar a resposta adequadamente, ou ainda a abordar al-gum aspecto no qual ele esteja evitando tocar.

17) Uma regra básica da entrevista para telejornal é freqüentemente desrespeitada: é comum os repórteres perguntarem ao entrevistado: “como o senhor vê”. Isso já foi bastante debatido no telejornalismo, mas sempre leva algum repórter mais desavi-sado a uma situação embaraçosa: pessoas maldosas podem responder que "Vejo bem; no olho esquerdo tenho 0,5 grau de miopia e no direito, 0,25". Este é um erro que po-de ser facilmente contornado no jornalismo impresso, mas que derruba uma matéria no telejornal.

18) Por último, uma regra destinada a orientar o trabalho do repórter e sempre va-lorizada pela Chefia de Reportagem: deve-se procurar ouvir as partes envolvidas no assunto tratado. A conclusão final deve ser do telespectador. Para isso, ele necessita que lhe sejam apresentadas as opiniões em conflito, para poder avaliar e tomar posi-ção quanto às dimensões do fato tratado.

ATIVIDADES Questão 1) Você é repórter de telejornal local e vai cobrir a visita do presidente Lula a Lages. A visita que vai durar 5 horas se concentrará nos locais mais repre-sentativos da economia local. Como seria o seu trabalho, as suas preocupações e as suas ações como responsável pela reportagem? Considere uma reportagem espe-cial de cerca de 2 minutos que será o carro-chefe da edição do telejornal. Questão 2) Elabore um resumo de todos os textos do Capítulo 1 e faça conside-rações críticas sobre o Telejornalismo.

Page 31: Telejornalismo - Manual Completo

30

O Texto na TV

Capítulo 2

Page 32: Telejornalismo - Manual Completo

31

1. APENAS PALAVRAS5

palavra é tão importante na televisão quanto no jornal. A diferença é que o texto do jornal é para ser lido pelo público e o de televisão é para ser ouvido. Na televi-

são, não dá para voltar e ler de novo ou ouvir de novo. É importante pois que o texto seja claro, direto, simples, enfim, tenha as virtudes da linguagem coloquial. O locutor conversa com o telespectador.

O livro Television News faz uma comparação feliz: é como se a gente abrisse a ja-nela e contasse para o vizinho a novidade do dia. Se a gente fizer assim, certamente começará o papo com uma expressão do gênero: “Ei, João! Sabe o que aconteceu?” – esse é o truque que você deve usar na hora de escrever uma notícia. Imagine que você está contando alguma coisa pra alguém. Sempre que escrever, imagine uma pessoa – é com ela que você vai conversar, é pra ela que você vai transmitir a sua informação. Não esqueça que é importante motivar a pessoa para que ela receba o seu recado.

O texto de televisão que é para ser ouvido, é também, naturalmente, para ser lido em voz alta pelo narrador. Então, a primeira pessoa a ler o seu texto deve ser você mesmo. A leitura em voz alta vai dar a você a chance de descobrir muitos erros. Pala-vras que não soam bem, comprometendo a musicalidade da frase; palavras mal colo-cadas prejudicando o ritmo do texto – e o ritmo é essencial para a apreensão da mensa-gem. Corrija as falhas. E, depois, mais uma vez, leia em voz alta. Se tiver tempo de ler para outra pessoa, não deixe de ler. Duvide sempre do texto que lhe sair de primeira. O texto tem que ser curtido, vivido, sofrido na máquina. Há redatores capazes de fa-zer um bom texto de primeira. Mas, esses a gente conta nos dedos. E, talvez não seja o seu caso. Por isso, duvide sempre do seu primeiro texto.

A televisão exerce sobre as pessoas um grande fascínio. Ao contrário do cinema, no entanto, ela nunca é dona absoluta do ambiente. Na sala, no quarto, onde quer que esteja, a televisão está sofrendo a concorrência de outros elementos: gente entrando e saindo, coisas acontecendo na sala, bagunça de crianças. Quando o telejornal entra no ar, geralmente ele fala para o homem que chegou cansado do trabalho, para a dona de casa, suas panelas, a mesa e as crianças. Essas pessoas querem se informar. É preciso que a televisão dê a elas um telejornal bem escrito, bem ilustrado, bem dosado, senão simplesmente, poderá se desligar ou desligar o aparelho até amanhã ou até nunca mais. E todo o seu trabalho e de uma equipe terá ido por água abaixo. Seu objetivo, transmitir a informação, fracassou redondamente.

Outra coisa importante na hora de escrever: lembrar que o locutor precisa respirar. E uma pausa para respirar no meio de uma frase quebra o ritmo da leitura e pode até alterar o sentido do texto. Portanto, frase curta, ordem direta. As intercaladas, a não

5 Do Manual de Telejornalismo, da Rede Globo de Televisão

A

Page 33: Telejornalismo - Manual Completo

32

ser curtinhas, devem ser evitadas. Não só frases curtas: prefira também palavras cur-tas. Aí está outro segredo de um bom texto de televisão. A palavra longa geralmente sugere coisa abstrata. A frase é um pacote de informação e a informação em palavras longas é um pacote pesado demais. Evidente que você não poderá evitar sempre a pa-lavra longa e abstrata. Mas se tiver que usar, use em frases curtas.

Uma série de frases curtas incisivas dá a notícia um sentido de ação e urgência. As-sim mesmo, é bom variar um pouco o comprimento das frases para evitar que o estilo fique muito ping-pong. Um conselho de muita sensibilidade de um editor americano: “Não escreva sobre idéias ou sobre coisas. Escreva sobre pessoas que tiveram idéias ou fizeram alguma coisa. Faça sempre que possível referência a pessoas na notícia. A briga de dois homens é mais interessante que a briga de dois exércitos”.

Procure tirar o caráter oficial da notícia. Comece o texto com a novidade, com o que houver de mais atraente. Só depois diga quem decidiu, quem decretou. Um bom recurso para a notícia é o título: uma ou duas linhas bem escritas, despertando o inte-resse do telespectador, enriquecem a edição. Faça isto sempre que possível. Um e-xemplo ao acaso: o título que abriu uma reportagem de pesquisa sobre a família real espanhola: “Caudilho morto, rei posto”.

A televisão herdou do rádio, que por sua vez tinha erradamente copiado do jornal, a mania de não usar os artigos. Por exemplo: “Vietnã do Norte ataca Vietnã do Sul”. O pessoal do radiojornalismo não percebeu que a supressão dos artigos nos títulos das notícias tinha e tem uma razão própria de jornal dada à limitação do espaço. Para poder usar uma tipagem mais destacada, e com isto valorizar a matéria – os redatores de jornais não só eliminaram os artigos como cometeram e ainda cometem outras li-cenças desse gênero, tais como o emprego de siglas em vez de nomes (JK, BB, BID, INSS), chegando mesmo ao extremo de abreviar palavras. Na televisão, o artigo é in-dispensável ao coloquial e, convenhamos um artigo a mais não chega a provocar es-touro no tempo do jornal.

Churcill dizia com muita sabedoria: “As palavras curtas são as melhores. E as pala-vras curtas, quando são velhas, são as melhores de todas.” O importante é levar a no-tícia, a idéia, em poucas e bem escolhidas palavras. Não se quer o texto pobre, vulgar. O que se quer é um texto coloquial, com as palavras bem escolhidas, usadas na hora certa e no ritmo certo.

Respeitar a palavra é muito importante no texto de televisão. Imprescindível, no entanto, é não esquecer que a palavra na televisão está casada com a imagem. O papel da palavra é enriquecer a informação visual. Quem achar que a palavra pode competir com a imagem está completamente perdido. Ou o texto tem a ver com o que está sendo mostrado ou o texto trás sua função. Repetir palavra, nome de lugar, de órgão, de pessoa é legítimo e ajuda, geralmente, a chegar ao coloquial, ao espontâneo. Não tenha medo de repetir, mas repita com bom gosto. Jamais use “naquele órgão”, “refe-rida pessoa” e coisas do gênero.

Page 34: Telejornalismo - Manual Completo

33

2.AS NORMAS BÁSICAS PARA EDITORES E REPÓRTERES6

texto jornalístico, seja em veículo impresso ou eletrônico, deve ser claro, conci-so, direto, preciso, simples e objetivo. São normas universais, de absoluto con-senso em TV, rádio, Internet, jornal ou revista. Algumas regras, no entanto, de-

vem ser seguidas em cada veículo para que a missão de conquistar o telespectador, ouvinte ou leitor seja alcançada.

A televisão e o rádio têm a característica da instantaneidade, o que obriga o jorna-lista a fazer com que a notícia seja entendida pelo receptor no exato momento em que é transmitida. Na TV, assim como no rádio, o texto deve ser coloquial e o jornalist1 precisa ter em mente que está contando uma história para alguém, mac; existe uma diferença fundamental: o casamento da palavra com a imagem. É a sensibilidade do jornalista que vai fazer essa "união" atingir o objetivo de levar ao ar uma informação que seja fácil de ser compreendida pelo telespectador.

O texto do telejornal tem uma estrutura de movimento, instantaneidade, testemu-nhalidade, indivisibilidade de imagem e som, sintetização e objetividade .

1. O primeiro passo para a redação de um texto na TV é conhecer as imagens que po-derão ser usadas na edição. É preciso saber o que usar para fazer o casamento da pala-vra com a imagem. Não descreva no texto exatamente o que está na imagem. O resul-tado será a redundância.

2. Em que pese a utilização do computador e a exibição do texto diretamente da rede para o teleprompter eletrônico da câmera, o formato ainda lembra os antigos scripts. Ou seja, do lado esquerdo da tela vão as informações do vídeo, e do lado direito o texto para ser lido pelo apresentador.

3. O texto começa com o lead. Procure a novidade, o fato que atualiza a notícia e a tora o mais atraente possível.

4. O texto deve ter uma seqüência lógica, na ordem direta. A regra é simples: sujeito + verbo + predicado.

5. A pontuação merece atenção especial. O uso dos sinais ortográficos facilita a ento-nação da voz e a respiração do apresentador. Por exemplo, em frases interrogativas faça uso da técnica espanhola de pontuação. Colocando um sinal de interrogação no início da frase o apresentador não será pego de surpresa.

(?) Quem será o campeão brasileiro?

(!) Atenção para esta última informação!!!

6. A adjetivação excessiva ou inadequada enfraquece a qualidade e o impacto da in-formação. Substantivos fortes e verbos na voz ativa reforçam a densidade indispensá- 6 Do livro: MANUAL DE TELEJORNALISMO, de Heródoto Barbeiro e

O

Page 35: Telejornalismo - Manual Completo

34

vel ao texto jornalístico.

7. O texto deve ser coloquial, mas sem apelos à linguagem vulgar. Fique longe de gí-rias, chavões, lugares-comuns e expressões que se desgastaram com o tempo.

8. Evite frases longas: elas dificultam a respiração do apresentador e são mais difíceis de ser entendidas. Cada frase deve expressar uma idéia.

9. O texto precisa ter ritmo. Use frases curtas, mas que não sejam telegráficas. Evite frases intercaladas, entre vírgulas.

10. A repetição de palavras na TV; desde que na medida certa, ajuda na compreensão da notícia. É uma questão de bom senso. Tanto a repetição desnecessária quanto a an-siedade de buscar um sinônimo podem empobrecer o texto.

11. Evite começar o texto com as palavras CONTINUA ou PERMANECE. Procure dar um enfoque novo para não dar a conotação de que o assunto está superado.

12. Fique atento ao efeito sonoro das palavras com a mesma terminação. Não é agra-dável ouvir: "O temporal na capital alagou a marginal", "A organização da programa-ção da televisão”.

13. Cuidado com os cacófatos. O encontro de sílabas de palavras diferentes pode formar som desagradável ou palavras obscenas. Por exemplo:

boca dela confisca gado de então ela tinha marca gol nunca ganhou

por cada Existem cacófatos que podem ser evitados substituindo a palavra por um sinônimo ou mudando a estrutura da frase. Por exemplo: O prêmio por cada vitória. O prêmio para cada vitória. Nunca ganhouI uma eleição. Jamais ganhou uma eleição.

14. Os artigos não devem ser suprimidos, especialmente nas manchetes. O uso do ar-tigo tem função importante na linguagem coloquial da Tv.

15. Verifique se o artigo um tem função na frase. Por exemplo: "o jogador sentiu me-do" é melhor que "o jogador sentiu um medo".

16. Não confunda os pronomes demonstrativos este e esse. Este indica o que está mais próximo de quem fala ou escreve. Esse indica o que está mais distante de quem fala ou escreve.

17. Atenção com os gerúndios. Eles deixam as frases longas e enfraquecem o texto.

Page 36: Telejornalismo - Manual Completo

35

Nunca inicie uma frase com gerúndio.

18. Cuidado com o "queísmo". O uso excessivo do "que", principalmente numa mesma frase, prejudica o ritmo e empobrece o texto.

19. Avalie os verbos usados nas declarações. Os mais usados são dizer e afirmar. In-formar significa relatar um fato. Garantir é assegurar, dar certeza absoluta. Declarar significa pronunciar. Admitir tem sentido de confessar. O verbo advertir é ambíguo: tem sentido de censurar, chamar a atenção etc.

20. Prefira o uso do presente no indicativo e do futuro composto quando se referir ao que vai acontecer. É melhor ouvir "O presidente viaja amanhã", ou "O presidente vai viajar amanhã", do que "O presidente viajará amanhã".

21. Seja criterioso no uso dos verbos no futuro do pretérito, eles expressam dúvida ou incerteza. Devem ser usados quando se tem consciência de um fato social, mas não há provas.

22. Cuidado com os verbos dever e poder. Eles são ambíguos: indicam capacidade e possibilidade. O verbo querer indica intenção, nunca decisão.

23. Use o cargo, profissão ou título para identificar autoridades e personalidades. A forma de tratamento deve vir antes do nome. No caso de pessoa que morreu no exer-cício do cargo não se usa "ex". Pessoas consagradas dispensam qualificação. Exemplos: Pelé, Madonna, etc. Respeite os casos em que a pessoa é conhecida pelo nome com-pleto. Não use dona, doutor, senhor e senhora no texto.

24. Redija os números por extenso para facilitar a leitura pelo apresentador. Exemplos: sessenta e duas mil pessoas

dois terços da população setecentas caixas dezoito por cento dois milhões e quinhentos mil reais onze de setembro de dois mil e um cento e sessenta quilômetros por hora cinco quilos e trezentos gramas nove da manhã

25. Em algumas situações os números podem ser simplificados para que o telespecta-dor capte melhor a informação. Exemplo: a informação vai chegar mais clara se redi-girmos que o prêmio da loteria é de oito milhões e quatrocentos mil reais, em vez de oito milhões, 401 mil, 795 reais e 76 centavos.

26. Nunca arredonde um número quando ele for a notícia principal. Exemplo: O au-mento no preço da gasolina vai ser de seis por cento.

Page 37: Telejornalismo - Manual Completo

36

27. É preciso atenção ao redigir medidas estrangeiras. Quanto vale uma milha terres-tre? E uma milha náutica? E um nó? E um pé? São termos que indicam extensão, altu-ra e velocidade usados tanto na aviação quanto na marinha. Não confunda altura com altitude. Altitude é a partir do nível do mar, altura é a partir do solo. Acidentes geo-gráficos e aéreos são expressos em altitude. No caso de velocidades (milhas, nós etc.) redija sempre o equivalente em quilômetros por hora. Toda redação tem uma tabela para conversão.

28. Não se deixe envolver pela linguagem de documentos oficiais, redigindo detalhes como número, parágrafo, inciso da lei etc.

29. As siglas mais conhecidas não precisam ser desdobradas. Podemos usar INSS, FMI, ONU, etc. Separe a sigla por hífen para facilitar a leitura do texto. Ex.: I-P-C-A. Não separe letras de siglas pronunciadas como palavras. Ex.: FIESP.

30. As siglas estrangeiras pouco conhecidas devem ser adaptadas. Exemplo: FED, banco central dos Estados Unidos; FAO, órgão das Nações Unidas de incentivo à agricultura.

31. Identifique os lugares. O telespectador nem sempre sabe onde fica cada cidade, cada país, etc. Exemplo: Afeganistão, na Ásia Central, Ubatuba, no litoral norte de São Paulo. lembre-se de que os recursos visuais facilitam a identificação dos lugares.

32. Evite o estrangeirismo. Mesmo que sejam de uso freqüente, as palavras estrangei-ras não são conhecidas de todos os telespectadores.

33. Indique no script como é a pronúncia das palavras estrangeiras. Fique atento aos nomes próprios. O ideal é que a pronúncia seja de acordo com o país de origem, mas lembre-se de exceções, como Nova York etc.

34. Os termos técnicos devem ser explicados. Há expressões que são conhecidas ape-nas pelos profissionais da área. Isso acontece muito com economistas, médicos e advogados.

35. A revisão do texto em voz alta é a melhor maneira de evitar que erros "derrubam" o apresentador. Com a leitura em voz alta é possível descobrir problemas com a so-noridade das palavras, concordância, cacófatos, frases sem sentido, enfim, uma série de "defeitos" que podem comprometer a qualidade da informação.

ATIVIDADES Elabore textos simples para telejornal, a partir de notícias de jornal impresso. Não se preocupe, por enquanto, em estruturar as reportagens, apenas escreva textos que possam ser lidos e utiliza-dos em televisão. Para exercitar, transforme 10 notícias de jornal impresso em notícias de TV.

Page 38: Telejornalismo - Manual Completo

37

3. A PRODUÇÃO DA MATÉRIA7

A edição correta é a que conta a história no tempo certo. O tempo certo de cada assunto depende da importância jornalística e da força das imagens. O ritmo, o estilo de cada telejornal ou programa também é um fator de peso na determinação do tem-po da reportagem.

O lead na televisão tem duas funções: atrair a atenção e demorar o tempo suficien-te para que o telespectador prepare o espírito para o fato. Nunca dê uma informação importante logo no início da notícia. O telespectador pode estar distraído. Um pro-blema técnico pode cortar o início da frase. Por exemplo: “Dez mil pessoas ficaram desabrigadas...”. Se por qualquer motivo o número for cortado, a notícia fica enfra-quecida.

Na hora de cortar uma entrevista, uma fala, você também pode tomar um limite como orientação: quando o entrevistado fala mais de trinta segundos, desconfie. Ou-ça de novo tantas quantas você precisar para descobrir o que está sobrando. Raramen-te você não terá o que cortar. E não adianta usar imagens para cobrir a cara do entre-vistado se a fala é longa. O importante acaba se perdendo na enxurrada de coisas que ele diz. Se você souber aproveitar o essencial, terá, na certa, uma boa edição.

Um bom recurso para cortar uma fala é começar mais adiante, em vez de tentar ti-rar o final. Começando na frente, você resume o que o entrevistado falou antes na in-trodução da sonora. Ele entrará naturalmente, completando o pensamento.

Desconfie das sonoras que você tem de ouvir três ou quatro vezes para entender: não esqueça que o telespectador, em casa, na sala nem sempre em silêncio, vai ouvir apenas uma. 3.1 Medidas para facilitar a edição

1. Veja todo o material, anotando as principais imagens e as falas que você vai usar. Na hora de escrever, você não vai esquecer de um detalhe importante. Normalmente, as imagens sugerem palavras, comparações, frases. Anote tudo isso, que a matéria será enriquecida na hora da redação.

2. Faça um planinho de edição depois de ver o material. Com o tempo, você encon-trará a sua própria maneira de fazer o plano. Ele deve ser simples, de preferência por escrito. Por exemplo: a) cabeça do locutor; b) fala do Prefeito; c) imagem do avião - 20";

7 Manual de produção: telejornais e programas – RBS e Rede Globo.

Page 39: Telejornalismo - Manual Completo

38

d) sobe som do avião; e) passagem do repórter; f) povo-fala.

Com um plano, fica mais fácil ordenar o pensamento.

3. Não diga no texto o que o entrevistado vai falar. Procure, isto sim, despertar no telespectador o interesse pela fala do entrevistado.

4. Um critério para usar a entrevista: se a pessoa é desconhecida, a fala só deve ser se-lecionada se contiver uma informação importante ou uma boa dose de emoção; se o entrevistado é um nome-notícia e principalmente se ele aparecer pouco, o que disser geralmente merece ir ao ar. Pense bem antes de usar mais de uma fala na matéria. Ir e voltar com o entrevistado só quando ele realmente está dizendo coisas muito interes-santes. Ex.: o sobrevivente de um desastre de avião, embora desconhecido terá certa-mente, um depoimento dramático. O Presidente Sarney, se fala para nosso repórter, em nossa região, vale o que ele disser; mesmo que não tenha impacto. Em falas muito importantes - discursos de Presidente, por exemplo - os diversos trechos escolhidos devem ser apresentados, sempre, com a maior clareza. Cada tema deverá ser destaca-do com um título ou selo, um bom texto de introdução e, na sonora, o ponto mais importante de cada pensamento.

5. O som e a imagem devem ser sempre de boa qualidade. Se você tiver que aumentar o nível de áudio para ouvir determinada sonora, "estourar" o som para "conseguir" um bom sobe-som, alguma coisa está errada e normalmente isso significa que o som foi mal colhido. Você estará apenas ampliando o defeito. Pese bem a importância da no-tícia. Um som ruim só deve ser usado no caso de um depoimento indispensável. Mas é fundamental antecipar, na voz do apresentador, o que vai dizer o entrevistado.

6. Sempre que mais de uma pessoa deva ser identificada pelo gerador de caracteres, o editor deve mostrar ao operador a quem identificar. Quando os nomes seguem a or-dem das falas e há tantos entrevistados quantos créditos, não há problema. Mas quan-do há pessoas que devem ser creditadas e outras não, é preciso dar a dica para o ope-rador. Ex.: é o segundo que fala, é a moça de cabelo comprido, é o de barba etc. A di-ca para identificar o entrevistado deverá ser colocada entre parênteses, ao lado do nome. Se a identificação deve ser feita em imagens que cobrem um texto, o editor co-loca o nome para o gerador ao lado da linha de texto, onde entrará a imagem e indica com uma seta.

7. As imagens colhidas pelo cinegrafista não são os únicos recursos de informação vi-sual. Mapas, selos, gráficos, desenhos, cartões, caricaturas e a própria valorização da imagem da reportagem com efeitos eletrônicos podem enriquecer um assunto. A edi-toria de arte é parte integrante da editoria de texto. O bom editor deite aproveitar ao máximo os recursos audiovisuais da televisão.

Page 40: Telejornalismo - Manual Completo

39

8. Variar a edição é enriquecer o jornal ou o programa. Com som e imagem e um pouco de criatividade,qualquer editor de sensibilidade pode fazer boas edições, uma diferente da outra. Um telejornal ou um programa são um conjunto de várias repor-tagens: Se todas estiverem editadas. do mesmo jeito, o jornal ou o programa ficam monótonos.

9. A presença do repórter na matéria também deve ser variada. Nunca, a não ser em casos excepcionais, o repórter deve aparecer no início da reportagem. A matéria deve começar com som ambiente ou com texto em off. A presença do repórter na abertura só se justifica quando ele está participando e absolutamente integrado na reportagem. Na rotina, o repórter que aparece numa passagem ou no encerramento. É preciso cui-dado pra não forçar a passagem. É comum a gente ver matérias interrompidas na sua seqüência natural só para que o repórter apareça. É bom que os repórteres se lembrem sempre que o que precisa aparecer, e bem, é a notícia. O repórter pode ficar apenas em off, ou então, se tiver uma informação a acrescentar,aparecer para encerrar a maté-ria.

10. No texto de chamadas das reportagens, o editor deve ter o cuidado de não anteci-par o que o repórter vai dizer. É bom ter sempre uma informação diferente para a-nunciar a reportagem. Esta informação poderá ser separada pelo próprio repórter quando fizer a reportagem. Poucas coisas irritam mais o telespectador do que ouvir a mesma informação no apresentador, no repórter e no entrevistado. É preciso atenção, portanto, para evitar as repetições desnecessárias.

Um dos grandes desafios do telejornalismo é a "tradução" de informações técnicas, a apresentação de pacotes econômicos, a decifração de termos financeiros etc. Tanto o repórter - na hora de colher as informações - como o redator, na hora de escrever em off, a cabeça da matéria, devem ser humildes o suficiente para perguntar, repergun-tar, pesquisar e simplificar. Essas matérias exigem desenhos, imagens, gráficos e, prin-cipalmente, exemplos que o telespectador entenda. É preferível sermos tachados de professorais por uma elite de escolarizados a não sermos entendidos por uma massa enorme de telespectadores comuns. O repórter e o editor devem procurar ser sim-ples, mas criativos. 3.2 Como elaborar o Script

Toda a operação para pôr no ar um telejornal ou um programa tem como guia o

script. É nele que estão todas as informações necessárias à equipe envolvida na exibi-ção do programa. As informações do script devem ser divididas assim: a) Do lado esquerdo ficam as informações de vídeo: o nome do apresentador e se ele deve estar ao vivo (V), em cromaqui (CK), ou em off (O); se a ilustração é um slide, quadro parado (QP), selo, filme, VT, etc. Vão ao lado esquerdo também as indicações

Page 41: Telejornalismo - Manual Completo

40

para o gerador de caracteres (GC). Todas as marcações técnicas devem ser em caixa alta. b) No lado direito, ficam as informações de áudio: novamente o nome do apresenta-dor e se ele deve estar ao vivo (V), em cromaqui (CK) ou em off (O); o texto que o locutor vai ler, as marcações das matérias com som, as deixas para a narração em off, as deixas finais das matérias. Importante: Todas as deixas devem ser bem marcadas. As deixas de áudio devem estar sempre entre aspas. Antecede a deixa de áudio, a deixa de vídeo, sempre entre parênteses.

Na hora de escrever a página, siga as seguintes normas:

1. Escreva sempre no computador, na lauda. No papel, o ideal é que não haja nenhu-ma correção à mão. Por isso o texto deve ser lido e relido antes de sair da impressora para as mãos do apresentador

2. Use espaço duplo, sempre letra maiúscula para indicações técnicas e letra minúscu-la para o texto do locutor e deixas.

3. Nunca divida palavras de uma linha para outra.

4. Nunca divida frases quando mudar de página. É preferível deixar um espaço maior no pé da folha a dividir uma frase entre duas páginas.

5. Escreva uma notícia em cada página.

6. Identifique sua matéria no alto da página. Se houver necessidade de mais de uma página para a matéria, escreva de novo o nome, o assunto e numere. Exemplo: Agri-cultores - 2.

7. Não faça correção como em jornal.

8. Pontuação deve ser diferente da pontuação de jornal e revista. Ela deve orientar a leitura do locutor: parênteses, travessão, reticências são usados para o ritmo da leitu-ra. Uma das coisas que mais atrapalham os apresentadores é a leitura dos nomes complicados e desconhecidos. Escreva à mão, em cima da palavra, entre parênteses, a pronúncia correta.

9. Sublinhe as palavras do texto em que você quiser maior ênfase do locutor.

10. Na televisão, quando se quer fazer uma citação literal, é preciso escrever para o locutor: ABRE ASPAS. Quando terminar o texto, ele também deve dizer: FECHA ASPAS.

Page 42: Telejornalismo - Manual Completo

41

A lauda

CURSO DE COMUNICAÇÃO SOCIAL – Jornalismo

SCRIPT TV

LADO ESQUERDO: MARCAÇÕES DE IMAGEM - LADO DIREITO: MARCAÇÕES DE TEXTO - ESCREVER EM TAMANHO 14 - ESPAÇO DUPLO - NÃO CORTAR PALAVRAS DE UMA LINHA PARA OUTRA - TERMINAR FRASES COM .// TERMINAR A LAUDA EM PONTO FINAL

Data: Editor: Jornal: Assunto: Tempo:

LAUDA

Page 43: Telejornalismo - Manual Completo

42

Veja os exemplos do script:

LADO ESQUERDO: MARCAÇÕES DE IMAGEM - LADO DIREITO: MARCAÇÕES DE TEXTO - ESCREVER EM TAMANHO 14 - ESPAÇO DUPLO NÃO CORTAR PALAVRAS DE UMA LINHA PARA OUTRA - TERMINAR FRASES COM .// TERMINAR A LAUDA EM PONTO FINAL

LOC (V) Estúdio

G.C.: MARIA BELTRÃO

RODA VT REPORTAGEM 2’25”

G.C.: - Rio de Janeiro, mapas históricos roubados - SANDRA MOREYRA , Rio de Janeiro (em frente ao Itamaraty) - Luiz Antônio Custódio, Pres. No Brasil do Cons. Intern. De Museus

LOC (V) Estúdio

LOC (V)

CENTENAS DE MAPAS DO ACERVO DO ITA-

MARATY NO RIO DE JANEIRO ESTÃO DESAPA-

RECIDOS HÁ QUASE TRÊS MESES.// O

MATERIAL ROUBADO VALE MAIS DE SEIS MI-

LHÕES DE REAIS.// OS DOCUMENTOS DA ME-

MÓRIA NACIONAL ESTAVAM EXPOSTOS EM

SALAS SEM SEGURANÇA CONTRA FURTO

NEM PROTEÇÃO CONTRA O DESGASTE DOS MA-

PAS.//

RODA VT REPORTAGEM 2’25”

D.I.: “A mapoteca tem o acervo...

D.F.: anunciada num certo sentido”.

LOC (V) NOTAPÉ

O MINISTRO DA JUSTIÇA, MÁRCIO THOMAZ

BASTOS, NÃO QUIS COMENTAR O FURTO NA

MAPOTECA.// A POLÍCIA FEDERAL INFOR-

MOU QUE O CRIME ESTÁ SENDO INVESTIGA-

DO PELA DELEGACIA DE REPRESSÃO A CRI-

MES FAZENDÁRIOS COM O AUXÍLIO DO SETOR

DE INFORMAÇÕES. // O MINISTRO DA JUS-

TIÇA DISSE QUE SÓ VAI SE MANIFESTAR

SOBRE O CASO DEPOIS DA CONCLUSÃO DO

INQUÉRITO.//

Data: 6/10/03 Editor: SANDRA MOREIRA

Jornal: EM CIMA DA HORA - GLOBONEWS

Assunto: MAPOTECA ROUBADA

Tempo: 3’14’’

(Script da Locutora)

Page 44: Telejornalismo - Manual Completo

43

LADO ESQUERDO: MARCAÇÕES DE IMAGEM - LADO DIREITO: MARCAÇÕES DE TEXTO - ESCREVER EM TAMANHO 14 - ESPAÇO DUPLO NÃO CORTAR/HIFENIZAR PALAVRAS DE UMA LINHA PARA OUTRA - TERMINAR FRASES COM .// TERMINAR A LAUDA EM PONTO FINAL

G.C.: Imagens de mapas antigos Imagens do livro Imagens externas do palácio Ita-maraty Imagens do acervo Mapoteca Imagem do mapa devolvid0 Imagens dos retratos da princesa e D. Pedro Imagens das fotos de Ferrez e do Barão Imagens do mapa da Bacia do Prata e das capitanias RODA ENTREVISTA 1 G.C.: Luiz Antônio Custódio Pres. No Brasil do Cons. Intern. De Museus

OFF 1

A MAPOTECA TEM O MAIOR ACERVO CARTOGRÁFICO

DO BRASIL.// SÃO ROTAS DE NAVEGAÇÃO, DIVI-

SAS DE CAPITANIAS HEREDITÁRIAS, MAPAS DOS

TRATADOS DE DELIMITAÇÃO DAS FRONTEIRAS DO

TERRITÓRIO BRASILEIRO.// TODOS FEITOS À

MÃO, PINTADOS EM AQUARELA E QUE FORAM RE-

PRODUZIDOS NUM LIVRO EM 1993.// O ACERVO

OCUPA UM SALÃO INTEIRO DO SEGUNDO ANDAR DO

PRÉDIO DO ANTIGO PALÁCIO ITAMARATY, NO

CENTRO DO RIO.// NO DIA VINTE E DOIS DE

JULHO, O ITAMARATY DESCOBRIU QUE CENTO E

CINQUENTA PEÇAS HAVIAM DESAPARECIDO DO

ACERVO.// UMA SEMANA DEPOIS DO ROUBO, AL-

GUMAS PEÇAS FORAM DEVOLVIDAS POR CORREI-

O.// ENTRE ELAS, ESTE MAPA DE 1631, UM DOS

MAIS VALIOSOS DA COLEÇÃO.// ENTRE AS PEÇAS

ROUBADAS, ESTÃO OS RETRATOS DA PRINCESA

LEOPOLDINA E DE DOM PEDRO PRIMEIRO.// SETE

ÁLBUNS ORIGINAIS DE FOTOS DE MARK FER-

REZ.// A COLEÇÃO DE FOTOS DO BARÃO DO RIO

BRANCO.// E CENTENAS DE ATLAS E MAPAS HIS-

TÓRICOS, COMO DA BACIA DO PRATA DE 1635 E

DA CAPITANIA DE PERNAMBUCO E ITAMARACÁ, DE

1643, DESENHADOS POR HOLANDESES, ALEMÃES E

PORTUGUESES, MESTRES DA CARTOGRAFIA.// O

ITAMARATY COMUNICOU O ROUBO À INTERPOL E

AO CONSELHO INTERNACIONAL DE MUSEUS.

ENTREVISTA LUIZ CUSTÓDIO

D.I.: “É GERALMENTE O TRÁFICO ILÍCITO DE

BENS ...

D.F.: ... DA MAIOR IMPORTÂNCIA PARA A HIS-

TÓRIA DO BRASIL.”

Data:6/10/3 Editor: SANDRA Jornal: EM CIMA DA Assunto: MAPOTECA Tempo: 2’25”

(Script da Repórter)

Page 45: Telejornalismo - Manual Completo

44

LADO ESQUERDO: MARCAÇÕES DE IMAGEM - LADO DIREITO: MARCAÇÕES DE TEXTO - ESCREVER EM TAMANHO 14 - ESPAÇO DUPLO NÃO CORTAR PALAVRAS DE UMA LINHA PARA OUTRA - TERMINAR FRASES COM .// TERMINAR A LAUDA EM PONTO FINAL

PASSAGEM

G.C.: Sandra Moreyra - Rio de

Janeiro (em frente ao palácio

Itamaraty)

Imagens de Leonel Kaz RODA ENTREVISTA 2 G.C.: Leonel Kaz Editor e professor de Arte Finaliza com imagens de mapas.

PASSAGEM

DESDE JULHO, A POLÍCIA FEDERAL E A INTER-

POL ESTÃO INVESTIGANDO O CASO EM SIGILO.//

NESTE DOMINGO, O ASSESSOR DO ITAMARATY,

GLÁUCIO VELOSO, NOS ENVIOU UMA NOTA EM

EXPLICA QUE O ITAMARATY JÁ FEZ UMA SINDI-

CÂNCIA INTERNA PARA APURAR OS FATOS.// A

NOTA EXPLICA AINDA QUE O MINISTRO DAS RE-

LAÇÕES EXTERIORES, CELSO AMORIM, CONSIDERA

O CASO DE EXTREMA GRAVIDADE.// E PEDIU

PESSOALMENTE AO MINISTRO DA JUSTIÇA QUE A

POLÍCIA FEDERAL APRESSE AS INVESTIGAÇÕES,

COM A INTENÇÃO DE RECUPERAR AS PEÇAS ROU-

BADAS, DESCOBRIR E PUNIR OS CULPADOS.//

OFF 2

O EDITOR E PROFESSOR DE ARTE, LEONEL KAZ,

LAMENTOU QUE UM ACERVO TÃO PRECIOSO NÃO

TIVESSE CONDIÇÕES MÍNIMAS DE SEGURANÇA.//

ENTREVISTA LEONEL KAZ

D.I.: “Eu tive lá várias vezes...

D.F.: ...morte anunciada num certo senti-

do”

Data: 6/10/03 Editor: SANDRA Jornal: EM CIMA DA Assunto: MAPOTECA Tempo: 2’25’’

Page 46: Telejornalismo - Manual Completo

45

ATIVIDADES Questão 1) Agora é a sua vez. Assista uma reportagem na TV e elabore o script dela, co-mo no exemplo anterior. Use a lauda apropriada (uma para o apresentador e uma com o texto do repórter). Não esqueça das marcações de som e imagem. Questão 2) PROVÃO DO MEC 1999. Leia atentamente os textos a seguir, publicados no primeiro semestre de 1999 na Folha de S. Paulo. Considere-os como se fossem a transcrição de depoimentos dos autores gravados em vídeo. A partir deles e de outras i-magens de arquivos a seu critério, produza um script de matéria de telejornalismo sobre a polêmica em questão, com dois minutos de duração, incluindo colunas indicadoras de vídeo e áudio, cabeça para o apresentador, trechos editados dos depoimentos em vídeo, passagens e indicações de caracteres. TEXTO I Tributos e políticas de emprego HÉLIO ZYLBERSTAJN

O acordo de redução do IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados) fa-rá com os nossos automóveis a mesma coisa que a desvalorização cambial fez com as nossas exportações. O real desvalorizado barateou nossos produtos e vai induzir o consumidor externo a comprar mais bens "made in Brazil". O acordo do IPI reduziu os preços dos automóveis e, pela mesma razão, vai induzir o consumidor brasileiro a comprar carros novos.

É claro que a maneira mais eficaz de combater o desemprego seria ampliar diretamente a atividade econômica. O desemprego cairia rapidamente se pu-déssemos aumentar os gastos do governo, reduzir a taxa de juros, ampliar o crédito e assim por diante.

Mas essa não é a única maneira de enfrentar o problema. É possível man-ter e até mesmo ampliar o emprego com outro tipo de políticas: as que fo-calizam o lado da oferta. Por exemplo, a diminuição dos custos de produção dos bens e serviços. Com menores custos, os preços caem - e os consumido-res ganham um forte incentivo para comprar. Resultado: a demanda aumenta, induzida pelo lado da oferta.

É exatamente isso que o acordo do IPI faz. O governo reduz impostos, os fabricantes e os revendedores reduzem suas margens, os automóveis ficam mais baratos, e os consumidores voltam ao mercado. Para completar, as mon-tadoras se comprometem a não fazer demissões por três meses. Ao final des-se prazo, será feita uma avaliação do programa. Se tiver sido bem-sucedido, poderá ser estendido e ampliado, lançando as bases para um pro-jeto mais ambicioso e permanente: a reciclagem da nossa frota de carros e caminhões.

É evidente que tudo isso deverá ter conseqüências positivas. Os encadea-mentos da indústria automobilística com outros setores industriais provo-carão impactos multiplicadores importantes nas fábricas de autopeças e de

Page 47: Telejornalismo - Manual Completo

46

outros insumos, nos prestadores de serviços industriais, nas revendas, nas companhias de seguro, etc.

O potencial de impacto, portanto, não é desprezível. Não apenas demis-sões serão evitadas como muitos empregos, diretos e indiretos, poderão ser criados. De quebra, o governo manterá a arrecadação, pois as alíquotas me-nores serão compensadas pelo crescimento nas vendas.

O acordo do IPI é importante também por outros motivos. Em primeiro lu-gar, tendo sido uma iniciativa dos trabalhadores, é uma demonstração do amadurecimento do sindicalismo brasileiro. Ele mostra que parcelas impor-tantes dos sindicalistas ultrapassaram a fase da reivindicação e adotaram uma conduta construtiva e propositiva mais apropriada para a solução efe-tiva dos nossos problemas.

Em segundo, a idéia de combater o desemprego pela redução negociada dos custos e dos preços não precisa ficar restrita às montadoras. Pelo contrá-rio: o eventual sucesso do acordo emergencial dos automóveis poderá trans-formá-lo em um paradigma a ser adotado em outros segmentos do mercado.

Estendida a outros setores, a redução do IPI e das margens de lucro, vinculada à manutenção dos empregos, não poderia ser apontada como um pri-vilégio da indústria automobilística e dos metalúrgicos. Finalmente, tudo isso poderá convencer nossos governantes de que a reforma tributária é, nas condições peculiares da economia brasileira, um instrumento de políti-ca de emprego.

Os trabalhadores metalúrgicos estão mostrando que, em vez de continuar a manipular impostos transitoriamente e casuisticamente, precisamos de uma reforma tributária inteligente, radical e definitiva, capaz de ampliar e tornar permanentes as conquistas do acordo de redução do IPI.

Hélio Zylberstajn, 53, é professor da FEA (Faculdade de Economia e Admi-nistração) da USP (Universidade de São Paulo) e pesquisador da Fipe (Fun-dação Instituto de Pesquisas Econômicas), na qual coordena o programa Me-diar (Informações para a Mediação Estratégica entre Trabalho e Capital). TEXTO II Preservar quais empregos? ENILSON SIMÕES DE MOURA

A imprensa tem noticiado, mesmo sem grande destaque, dados que reforçam minha posição contrária à redução de impostos para a indústria automobi-lística. A própria Receita Federal calcula em R$ 792 milhões a perda anual que a União terá por conta da redução do IPI. Esse dinheiro seria sufici-ente para que mais de 500 mil desempregados recebessem um salário mínimo durante 12 meses. Número que, segundo dados da pesquisa Seade/Dieese, cor-responde a um terço de todos os desempregados da área metropolitana de São Paulo.

Esses cálculos não incluem o que será perdido com a redução de ICMS, im-posto estadual. Alega-se que a redução de impostos será compensada pelo aumento nas vendas, o que, por conseqüência, manterá os empregos dos tra-balhadores. Puro engano. Para começar, o acordo com as montadoras, que re-duz o IPI, prevê garantia de emprego por apenas 90 dias. A redução de IPI já foi posta em prática no ano passado, numa época em que a economia não atravessava a crise que ora enfrentamos. O desemprego cresceu, e a arreca-dação caiu 47%...

Page 48: Telejornalismo - Manual Completo

47

O fato principal é escamoteado. Hoje, produzem-se muito mais carros com o mesmo número de operários. A modernização das linhas de produção decre-tou o fim de inúmeras profissões na indústria, principalmente no setor au-tomotivo. Em 1959, a proporção de veículos fabricados por trabalhador era de 3,2. Ela foi aumentando: em 1974, saltou para 8,7; em 1997, chegou a 19,5. Isso mesmo: quase 20 carros fabricados por trabalhador! E a indús-tria, mascarando um dado que é evidente, condiciona a manutenção de empre-gos à redução de impostos. Que empregos? Vários setores da economia sofrem com impostos absurdos. Nem por isso contam com a mesma benevolência das autoridades. Pelo que sei, o povo ainda não come carros. Essa falta de hi-erarquia nas prioridades oficiais contrasta com a sanha do governo em par-tir para cima de setores com menor poder de mobilização e, portanto, com menor visibilidade na mídia. Refiro-me aos aposentados, às mulheres traba-lhadoras gestantes e ao funcionalismo público (que não vê a cor de reajus-tes salariais há cinco anos).

Fatos como a redução de impostos para montadoras, sob a esfarrapada des-culpa de que é preciso garantir o emprego de metalúrgicos, revelam a abso-luta (e absurda) falta de política para o trabalho e o emprego no Brasil.

Trabalho, no mundo de hoje, não conhece geografia. As relações traba-lhistas, antes perenes e objetivas, hoje se mostram em constante processo de mutação, rápidas e dinâmicas. Já vai longe o tempo em que um trabalha-dor iniciava e concluía sua carreira sob o teto de uma mesma empresa,assim como já ficou na história a relação quase automática entre diploma e em-prego.

Hoje, a constante necessidade de especialização, ao mesmo tempo em que exige do trabalhador um conhecimento cada vez mais generalista, impõe me-canismos novos e revolucionários às relações trabalhistas.

Vivemos hoje a terceira Revolução Industrial. A remodelação tecnológica e administrativa das empresas exige um novo perfil de trabalhador e põe a descoberto as falhas graves de um país que veio, ao longo das últimas dé-cadas, descuidando da educação básica de suas crianças e de seus cidadãos. As exigências para o trabalho mudaram rapidamente, mas o trabalhador ainda é o mesmo de décadas atrás...

A Social Democracia Sindical postula uma política de trabalho voltada para o cidadão. Uma política que o transforme num verdadeiro empreendedor, em vez de um empregado descartável. Enilson Simões de Moura (Alemão), 38, metalúrgico, é presidente da central SDS (Social Democracia Sindical).

Utilize a lauda de TV para o exercício.

Page 49: Telejornalismo - Manual Completo

48

4. PALAVRAS E EXPRESSÕES A EVITAR8

Um dos piores defeitos no texto de televisão é a linguagem pretensiosa, usada no

velho radiojornalismo. Vamos, então, procurar dar o nosso recado com a maior natu-ralidade, no tom coloquial, espontâneo. Evite, no texto dos noticiários, palavras e ex-pressões que você jamais diria num bate-papo. EM VEZ DE USE Ancião. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Velho Atear fogo.. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Tocar, botar, pôr fogo Agente da lei. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Policial Aeronave. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Avião Assentar. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Sentar As chuvas. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . A chuva (sempre no singular) Ambos. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Os dois Ataúde. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Caixão Agente do mal, malfeitor. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Ladrão Anuência. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Aprovação, consentimento Bandido. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Assaltante, ladrão Bichano . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Gato Bovino. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Boi Cadáver; . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Corpo Condolências. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Pêsames Chefe da Nação. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Presidente Colisão, colidir. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Batida, bater Câmara Alta. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Senado Causa Mortis . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . A causa da morte Data natalícia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Aniversário Detento, presidiário . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Preso Mandatário . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Título da autoridade Manter encontro. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Encontrar-se Manter conversação. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Conversar Fazer visitação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Visitar Árbitro. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Juiz Edil. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Vereador Eqüino. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Cavalo Enfermidade, moléstia. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Doença Esposa, esposo. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Mulher, marido Familiares, membros (família). . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Família, parente Falecer. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Morrer Falecido. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Morto Facultativo. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Médico Fazer um telefonema. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Dar um telefonema, telefonar Flagelado vítima . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . da seca, da inundação, do incêndio Genitora . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Mãe 8 Manual de produção: telejornais e programas – RBS e Rede Globo.

Page 50: Telejornalismo - Manual Completo

49

Interregno . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Intervalo Implementos (agrícolas) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Material (agrícola) Instalação sanitária. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Banheiro Imortal. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Acadêmico Larápio. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Ladrão Lograr (êxito). . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Ter Logradouro. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Rua, avenida, praça Matrimônio. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Casamento Menor. . . . .. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Garoto, menino Magistrado . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Juiz Mal súbito, . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Dizer que mal Marido da morta. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Viúvo Mulher do morto. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Viúva Nosocômio. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Hospital Numerário. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Dinheiro Óbito. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Morte Prélio, peleja, contenta. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Jogo, partida Parabenizar. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Dar parabéns Perceber (salário) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Receber Parlamentar . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Deputado, Senador . Pessoa de cor. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Negro Sepultar, sepultamento. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Enterrar, enterro Soldado do fogo. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Bombeiro Sinistro. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Incêndio, tragédia Tombar. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Virar Trajar. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Vestir Teve início, terá início. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Começou, começará Templo. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Igreja Transgressor da lei. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Criminoso Ter lugar. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Acontecer Viatura. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Dizer o tipo de carro ou veículo Vítima fatal. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Morto Vindouro. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Próximo que vem Via, principal artéria. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Rua, avenida Versou. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Tratou NUNCA USE AS SEGUINTES EXPRESSÕES À guisa de... Adotou as providências de praxe Aquela casa do Congresso A referida matéria A nível de Ambiente descontraído ou grande descontração As solenidades de praxe Boletim médico Briosa corporação Com vistas a Com a chancela

Page 51: Telejornalismo - Manual Completo

50

Capotou espetacularmente Calor senegalesco Com o correr das horas Cumprir extenso programa Digna de louvor Daquela nação amiga Erário público Em fase de Entidades aqui representadas Em ambiente salutar Eximir de culpa Fontes bem-informadas Ferimentos contusos, contusões e escoriações generalizadas Filho próprio Filho maldito Fulminado por um colapso Fortes chuvas Falou à nossa reportagem Famoso, artista, cantor etc. (se é famoso não é preciso que diga) Homem de negócio Internacionalmente famoso Imprensa escrita, falada e televisada Lamentável acidente Morte infeliz Modus vivendi Mau tempo reinante Mera coincidência Numeroso público presente Pistas escorregadias Ponto alto Por outro lado Pai desnaturado Pego de surpresa Pivô da tragédia Poder público Precioso líquido (água) Presentes autoridades civis, militares e eclesiásticas (se for o caso, diga o nome das autoridades presentes) Quebrar o protocolo Reverenciar a memória Sob os auspícios Sob intenso tiroteio Sagrou-se campeão Surto epidêmico Status quo Tempo sujeito a chuvas e trovoadas Tempo material Titular daquela pasta Tantos mortos foi o saldo (ou balanço) trágico Todavia Últimos retoques

Page 52: Telejornalismo - Manual Completo

51

Vive à margem da lei Valorosos soldados Zona boêmia

Esses e outros lugares-comuns empobrecem o texto, demonstram falta de imagi-nação e de criatividade. O texto de televisão deve ser simples, mas isso não significa que deva ser pobre.

5. A GRAVAÇÃO DO OFF e LOCUÇÃO 5.1 Off

Falta esclarecer mais um ponto a respeito das técnicas básicas: o off, que é toda narração editada com imagens. Vimos que as reportagens de tevê possuem passagens do repórter, entrevistas e, finalmente, off. As informações apuradas pelo repórter são gravadas na mesma fita onde estão registradas as imagens ou em fita separada. Essas informações gravadas, ou off, depois são editadas e cobertas com imagens relaciona-das com o texto narrado pelo repórter.

O que é preciso ressaltar aqui é a necessidade de aprender a técnica de narração de reportagem em tevê, muito diferente da locução em rádio. Televisão não precisa da-quela locução tensa, típica de rádio. Não se pode esquecer que na tevê existe a ima-gem. O telespectador não precisa, como o ouvinte de rádio, de efeitos sonoros e dra-matização de situações para visualizar o acontecimento. Se a imagem predomina, a informação auditiva deve ser usada para complementar a visual.

O repórter deve observar algumas recomendações básicas na redação e gravação do off. Na hora de redigir, deve pronunciar as palavras em voz alta para ouvir se estão soando bem, evitando cacófatos, aliterações etc. A leitura em voz alta permite tam-bém sentir o ritmo do texto. Por exemplo, leia em voz alta: "a cocaína que a polícia encontrou". Tem muito fonema /K/. Fica melhor assim: "a cocaína apreendida pela polícia".

Outro exemplo de texto off mal construído:

ATIVIDADES Elabore matérias completas para telejornal, a partir de notícias de jornal impres-so. Estruture as matérias de acordo com as regras de TV, utilizando a lauda apro-priada e seguindo as normas de redação. Para exercitar, transforme 10 notícias de jornal impresso em notícias de TV.

Page 53: Telejornalismo - Manual Completo

52

Off 1 – Duas crianças estão internadas desde ontem, no Hospital de Nilópolis, com meningite. As crianças estudam na Escola Rei David. Hoje, pela manhã, os pais de alunos se reuniram com a diretora do colégio. Foi decidido que a escola vai ficar fechada enquanto existir o foco da doença na área.

ENTREVISTA COM MÃE DE ALUNO Off 2 - Além de Nilópolis, há casos de meningite em outras lo-

calidades da Baixada, o maior foco da doença até agora. O caso mais grave aconteceu em Queimados,distrito de Nova Iguaçu.

CABEÇA - Aqui no conjunto Pindorama, em Queimados, três crian-ças já morreram e duas estão internadas. Uma menina de três anos e um menino de cinco. Os pais estão com medo de ter seus filhos contagiados, e as crianças que normalmente brincam nestas quadras agora estão em casa.

Off 3 - No Hospital São Sebastião, no Caju, estão mais de dez crianças internadas com meningite. A maioria vinda da Bai-xada. Nos últimos dias tem aumentado o número de pais que trazem seus filhos para serem examinados, por suspeitarem que eles tenham sido contagiados. O hospital assegura que está preparado para um possível aumento de casos. Para o Governo do Estado, a situação não chega a ser de epidemia.

ENTREVISTA COM O SECRETÁRIO DE SAÚDE Cabeça- Os dois milhões de doses de vacinas compradas de Cuba

já estão sendo testadas para comprovação da sua eficácia. O presidente da Fiocruz afirmou que, por causa destes tes-tes, a vacinação não poderá ocorrer antes do dia quinze de maio.

O texto anterior é um exemplo extremo de off mal feito: estrutura ruim, mal escri-

to e confuso. Não tem ritmo e algumas palavras se embaralham na pronúncia, como "destes testes". O mesmo texto corrigido ficou assim:

Locutor - Aumenta o número de casos de meningite no Estado do

Rio de Janeiro. Somente no mês de abril foram registrados trezentos casos da doença - cinqüenta por cento a mais do que em abril do ano passado. A região mais atingida é a Baixada Fluminense.

Off 1 - Em Nilópolis, esta escola foi fechada hoje a pedido dos pais dos alunos. Duas crianças da primeira e da quarta séries foram internadas no Hospital do Município com me-ningite do tipo B.

Page 54: Telejornalismo - Manual Completo

53

ENTREVISTA COM OS PAIS Cabeça- Além de Nilópolis, as regiões de Duque de Caxias, Quei-

mados e São João de Meriti apresentaram casos da doença. O caso mais grave aconteceu aqui, no conjunto Pindorama, em Nova Iguaçu. Na semana passada, três crianças morreram e duas foram internadas com a doença.

Off 2 - O Hospital São Sebastião, no Caju, recebe os casos mais sérios, por ser especializado no tratamento de meningite. Dez crianças estão internadas em estado grave. Mesmo as-sim, o Secretário Estadual de Saúde descarta a possibili-dade de uma epidemia no Estado.

ENTREVISTA COM O SECRETÁRIO Cabeça- As vacinas cubanas contra a meningite ainda estão sendo

testadas aqui na Fundação Oswaldo Cruz. A previsão é de que o lote de um milhão e meio de doses para a vacinação esteja liberado somente no próximo dia quinze.

Neste exemplo acima, as informações foram estruturadas de forma mais coerente e

encadeada, com os offs sendo costurados pelas entrevistas e as cabeças de passagem e encerramento. Leia os dois textos em voz alta e compare.

6.2 Locução O texto em tevê é para ser falado e ouvido. Falam o repórter, o apresentador, o lo-

cutor; ouve o telespectador. E na mediação dessa conversa, um elemento fundamen-tal: a imagem. Diferentemente do rádio, na tevê o telespectador ouve e vê. E o que é dito tem sempre relação direta com o que é mostrado. Como se costuma dizer, texto e imagem têm que estar casados. Não se pode dizer uma coisa e mostrar outra.

Essa relação fundamental nem sempre foi assim. Entre nós, o início da televisão foi marcado pela narração radiofônica, porque do rádio saíram os primeiros grandes no-mes do telejornalismo. A locução radiofônica exigia um colorido verbal, um ritmo e um tom de voz entendidos como vozeirão. Esse mesmo tom marcou o início da locu-ção na tevê.

Hoje, não importa a potência da voz, mas a modulação, o tom coloquial. A impo-nência cedeu lugar à cordialidade. Muitos locutores apresentam as notícias como se estivessem conversando com o telespectador. Há pessoas que são mais naturais do que outras diante do vídeo. Mas todos podem desenvolver a técnica de falar em televi-são. A voz pode ser melhorada com a ajuda de um fonoaudiólogo. É importante saber pronunciar corretamente as palavras, modular a voz e dominar a entonação para não tornar a narração monótona.

Page 55: Telejornalismo - Manual Completo

54

Especialistas recomendam: - controle fono-respiratório; - articulação correta; - ento-

nação perfeita. A respiração incorreta mostra ansiedade porque a pessoa suga as palavras. Quando

falamos, devemos inspirar com as narinas e expirar com a boca, com um tipo de respi-ração chamada de diafragmática. O pulmão age como fole e as costelas flutuantes também participam do processo.

A boca é fundamental para a articulação. Ela é o alto-falante do corpo humano. As pessoas têm medo de abrir a boca, geralmente por algum tipo de inibição. Falam para dentro e engolem a maioria das palavras. A articulação correta facilita o ritmo da nar-ração e a ligação correta das palavras resulta em economia de tempo. Entre os princi-pais defeitos de articulação estão o cicioso ou chiante, a pronúncia escarrada ou arra-nhada de erres, consoantes pronunciadas com maior duração do que as vogais e a o-missão de consoantes e sílabas finais.

Repórteres e locutores não devem se preocupar apenas com a voz. A apresentação também é fundamental. A fala deve ser acompanhada de uma correta expressão facial e até mesmo corporal. Um repórter, por exemplo, ao fazer uma cabeça de passagem não deve manter o corpo rígido e a cabeça imóvel, ou parecerá um boneco falante. Da mesma forma, os movimentos faciais ou corporais não podem ser desordenados e mecânicos. É preciso, sempre, buscar tom de voz e expressão corporal corretos para melhor transmitir uma informação. E isso só se aprende com boa vontade e disciplina.

Nem toda locução ruim é culpa apenas do narrador. Muitas vezes o culpado é o re-dator. O texto em telejornalismo deve ser claro e objetivo. As frases não podem ser longas e o editor deve estar atento à pronúncia das palavras antes de escrevê-las. Mui-tas delas são boas para serem lidas em silêncio, mas não para serem pronunciadas. A-cabam soando cacófatos e aliterações. A frase deve ter sujeito, predicado e complementos, de preferência em ordem direta. As frases curtas dão ritmo à leitura e deixam o locutor respirar. O texto tem que ser objetivo e coerente, de fácil compreensão. O telespectador não pode voltar atrás para ouvir o que não entendeu.

EXERCÍCIO Elaboração e gravação de offs em sala de aula.

Page 56: Telejornalismo - Manual Completo

55

Como funciona o Telejornalismo

Capítulo 3

Page 57: Telejornalismo - Manual Completo

56

1. OS DIFERENTES FORMATOS

1.1 O modelo antidemocrático do telejornalismo brasileiro9 1.1.1 Introdução

O modelo telejornalístico de reportagem que domina no Brasil, há mais de vinte anos, tem sua origem numa escola de documentários que teve seu auge nos anos de 1965 e 1966. A pesar de terem surgido outros modelos de narrativa para o jornalismo filmado, este, que Jean Claude Bernardet chama de "modelo sociológico", é o vigente em qualquer jornal ou programa jornalístico da televisão brasileira.

Com base na obra de Bernardet - Cineastas e Imagens do Povo -, faz-se aqui uma constatação da estrutura daquele que é a maior fonte de informação no Brasil - o tele-jornalismo. Não se pretende, como em muitos trabalhos já feitos, criticar a ideologia do veículo televisão, mas sim questionar a forma como a "realidade" é transmitida ao povo. Um modelo que, segundo Bernardet, não dá plena voz ao cidadão comum e, ao contrário, apenas usa-o como um simples exemplo de sua teoria.

Toma-se, aqui, como referência de questionamento os principais programas tele-jornalísticos do Brasil, como Globo Repórter e Fantástico, e algumas produções de documentários independentes que fogem ao modelo convencional dos grandes meios. Os telejornais de grande penetração, como o Jornal Nacional da Rede Globo, não se-rão tomados como referencia por dois motivos. Seguem o mesmo modelo dos pro-gramas citados e o modelo que será proposto,no final desta monografia, tem maior aplicabilidade nos programas que exibem médias e grandes reportagens. 1.1.2 O Jornalismo Filmado - Histórico

A origem do telejornalismo antecede à da própria televisão. Já na década de 1920, com o advento do som no cinema, o cine-jornal marca um grande avanço nas comu-nicações humanas. O cinema é jornalismo na medida em que informa, documenta, influencia e diverte. Até os anos 50, as salas de exibição atraem não s6 pelos filmes, mas também pelas notícias (BAHIA, 1990).

Quando a televisão surge no Brasil, em 1950, por questões técnicas, é o rádio que serve de modelo ao telejornalismo de então. Um exemplo é que o primeiro noticiário televisivo sólido, o REPÓRTER ESSO, vinha de um grande sucesso no rádio, na dé-cada de 1940. Na televisão, estreou em 1952, na TV Tupi do Rio de Janeiro, com o mesmo formato e as mesmas normas de redação. A sua derrocada foi marcada pelo

9 Artigo de Marco Aurélio Silva, 1995.

Page 58: Telejornalismo - Manual Completo

57

surgimento da Rede Globo, em 1965, que, copiando modelos norte-americanos reor-ganizou o processo de produção de telejornais (SQUIRRA, 1993).

Foi nessa época que os modelos usados na produção do cinema-documentário fo-ram adaptados à TV. Até os anos 50, esse tipo de produção não continha aspectos crí-ticos à realidade. A partir da década de 1960, os problemas da sociedade brasileira pas-sam a cruzar nas telas do cinema documentário. As propostas de linguagem eram muitas. A televisão, porém, tomou para si a que mais críticas recebeu na época. O "modelo sociológico", que pré-define toda a estrutura de uma reportagem, foi consi-derado formalista.

A partir do final da década de 1960, mais e mais linguagens foram surgindo. O "modelo sociológico" se enquadrou melhor na rapidez exigida pelo meio e impossibi-litou o uso de formas consideradas mais democráticas. Essas formas resistem hoje nas produções independentes e nos programas (raros) telejornalísticos de vanguarda. 1.1.3 O Modelo Sociológico

O modelo usado nas reportagens dos programas telejornalísticos brasileiros é fa-cilmente identificado pelo telespectador: texto em off (lido pelo locutor ou pelo re-pórter), passagem e entrevistas. É uma estrutura pré-determinada, segundoJean Clau-de Bernardet que, em sua obra, faz uma analise dos documentários produzidos no Brasil, de 1960 a 1980. Essa forma telejornalística, chamada aqui de “modelo socioló-gico”, tem origem em meados da década de 1960. Caracteriza-se por usar personagens que apenas reforçam teorias apresentadas pelo repórter.

No "modelo sociológico” podem ser identificadas dois tipos de vozes: a voz da ex-periência e a voz do saber. A primeira pertence aos entrevistados, os que vivenciaram o assunto em questão. Eles falam de suas vivências sem generalizá-las. Ao emitir seu ponto de vista quem fala fala de si e o que diz continua sendo um dado da experiência imediata (BERNARDET, 1985). Tal relato deve obedecer perguntas já estabelecidas e não podem exceder o contexto. As histórias individuais que não condizem com o te-ma são limpas na edição.

A voz do saber, proferida pelo repórter ou pelo locutor, na forma de um texto em off, é única, homogênea e de acordo com a gramática. Fala espontaneamente e nunca fala de si. “Ele dá números, estatísticas. Ele é a voz do saber, um saber generalizante que não encontra sua origem na experiência, mas no tipo sociológico. Ele dissolve o indivíduo na estatística e diz dele coisas que ele próprio não sabe a seu respeito” (BERNARDET, 1985). Os entrevistados falam de histórias individuais e não se vêm como porcentagens. Se o saber for a voz do locutor, os entrevistados não possuem nenhum saber sobre si mesmos.

Tal estrutura esta presente diariamente nas televisões brasileiras e poucos tem a percepção da antidemocracia que se estabelece. Forma-se um monólogo autoritário,

Page 59: Telejornalismo - Manual Completo

58

onde quem tem a experiência funciona como simples amostragem. “Estamos longe da rede de comunicação em que se resgate a presença da pessoa, se abram canais para os testemunhos anônimos. O diálogo é democrático; o monólogo é autoritário. O pri-meiro interpreta as vozes dos grandes movimentos populares do século XX; o segun-do satisfaz o jogo da livre expressão - plataforma do liberalismo, nos séculos XVIII e XIX” (MEDINA, 1986).

Os idealizadores deste tipo de linguagem se defendiam afirmando que esse modelo era decorrente da censura e da auto-censura imposta pelo novo regime, iniciado em 1964, com o golpe militar. Dissolver experiências pessoais em estatísticas e colocar entrevistas curtas para comprovar uma teoria abstrata era mascarar uma realidade la-tente, amenizando a problemática dos temas sociais (BERNARDET, 1985). Mostra-se o tema com uma erta superficialidade onde ninguém pode passar dos limites da te-oria sociológica.

Mas como justificar que, hoje, num país que, teoricamente, há democracia, tal mo-delo ainda seja dominante, principalmente, em programas telejornalísticos como Fan-tástico e Globo Repórter da Rede Globo, onde os temas sociais mais passeiam? Existe um sistema de auto-censura que não pode ser justificado pelo regime do país, mas sim pelas ideologias coligadas do meio de comunicação com o poder.

Para formar um sistema, onde o outro fique dissolvido em estatísticas, o locutor se apóia em alguns pilares para defender sua teoria sociológica. Uma delas é o locutor-auxiliar, ou seja, aquele que participa dando referências científicas à teoria do locutor, apoiado na própria ciência. Ele auxilia o locutor na exposição das idéias e conceitos, e sua competência é confirmada pela sua qualificação profissional e social. “Ele alivia a locução off do filme (uma vez que aparece no vídeo) possibilitando que ela ocupe me-nos tempo e aproxime as informações genéricas do 'real'” (BERNARDET, 1985).

Completando toda essa estrutura, as reportagens são amarradas de tal forma que são acompanhadas como um fluxo ininterrupto de imagens, sons e idéias, com a fun-ção de não dar folga ao telespectador. Não se oferece como um tema aberto a discus-sões, e sim como uma teoria hermeticamente fechada, assumindo para si o caráter do "real". “O discurso é coeso, não se contradiz não se nega em momento algum, fecha-se sobre si mesmo, tendo desenvolvido todas as linhas de pensamento que anunciou. Nada ficou suspenso” (BERNARDET, 1985).

Porém, tal modelo mostra-se ideal nos assuntos corriqueiros do dia-a-dia, em re-portagens de várias áreas. O importante é que essa estrutura não se mostre sufocado-ra de uma realidade que não se encontra no saber científico, uma realidade que só quem conhece pode falar.

Um dos motivos porque tal modelo se estabeleceu com tanto vigor na televisão pode ser o ritmo acelerado que se impõe aos telejornais de uma forma geral. Com is-so, o repórter concebe a história na sua cabeça e elabora um texto generalizante para ser lido em off e na passagem. Nessa estrutura, os entrevistados são apenas a certeza,

Page 60: Telejornalismo - Manual Completo

59

para o telespectador, de que aquele tema existe. Seu depoimento não extrapolará aos limites já concebidos pelo repórter.

Outro motivo seria a importância que se dá ao repórter, nessas reportagens. No Fantástico e no Globo Repórter, vemos frequentemente: “Helena de Grammond mostra como...”, “Ernesto Paglia conta...”, “Glória Maria e...”, e assim por diante. O repórter é sempre o principal testemunho dos fatos. Falam de variados personagens e não vem neles nada mais do que uma amostragem. Claro que esses repórteres não fa-zem tal coisa de ma fé. Apenas estão inseridos de tal forma no "modelo sociológico" que não conseguem fugir dele. 1.1.4 Os Outros Modelos

Muitos documentaristas da década de 1960 se opuseram ao “modelo sociológico". Porém, nenhum deles conseguiu romper com tal estrutura totalmente. O que se tem feito desde então foi trocar a univocidade pela ambigüidade. Foi permitido que o plu-ralismo se manifestasse, derrubando o pedestal do documentarista.

Nenhum modelo conseguiu fazer aparecer"o outro". Porém as transformações que ocorreram, destruíram o saber unívoco e centralizado, impedindo que o tomássemos pelo real (BERNARDET, 1985). Na metade dos anos 70, alguns documentários es-treavam vozes diversificadas na locução. As entrevistas passam a ser depoimentos. “O entrevistador não sugere temas, limitando-se a pequenos empurrões para deslanchar a fala. O diretor põe o seu trabalho à disposição de quem tem a experiência, o veículo torna-se a expressão dessa pessoa” (BERNARDET,1985).

Nessa linha, outras linguagens foram surgindo, imprimindo cada vez mais desta-que às experiências pessoais e fugindo do saber sociológico. Alguns documentários, produzidos nos últimos anos, aboliram de vez a voz off, proferida pelo repórter ou pelo locutor. Neles, as entrevistas foram "costuradas" na intenção de mostrar vivên-cias diversificadas. Não se dá tanta importância às teorias sociológicas, o que vale é a vivência de cada um acerca daquele tema.

Um desses documentários é o produzido por Henri Gerveseau, em 1992, Tem que ser baiano. O vídeo mostra o preconceito contra nordestinos na cidade de são Paulo. É uma variedade de entrevistas com vários imigrantes e moradores da cidade. Estudi-osos dão alguns depoimentos, mas nenhum se sobrepõe às histórias particulares. A-lém disso, não há uma teoria unívoca. Cada um expressa sua opinião de formas dife-rentes e todas juntas não fecham o tema em si mesmo.

Outro documentário, Boca do Lixo, produzido em 1991 por Eduardo Coutinho, mostra a vida de uma população que retira o sustento de um lixão, no Rio de Janeiro. Da mesma forma, a narrativa se constrói em cima de depoimentos, onde cada um conta variadas experiências. As respostas não estão presas a uma só pergunta, vão a-lém. Mostram a vida particular dessas pessoas, onde moram e assim por diante.

Page 61: Telejornalismo - Manual Completo

60

Por fim, o vídeo-documentário Ele não meu deixava rir, produzido,em 1993, pela jornalista Kátia Klock, na época formanda do Curso de Jornalismo da UFSC, mos-trava a violência contra a mulher. Os depoimentos mostram toda uma realidade frag-mentada, sem uma teoria que generalize a história.

Em comum, estes documentários têm a não pretensão de mostrar uma realidade hermeticamente fechada. Os temas abordados possuem uma narrativa que não se fe-cha sobre si mesma. O assunto é exposto de tal forma que se abre a discussões. As causas e conseqüências de um fenômeno são variadas. O telespectador constrói no seu imaginário uma realidade a partir dos elementos apresentados. Conclusões

Os cineastas que conceberam o "modelo sociológico", na década de 1960, não ti-nham o objetivo de abafar as vivências do "outro". Havia, nesses filmes, um interesse social por aqueles que são praticamente excluídos da sociedade e vivem na miséria. “Esta linguagem que pressupõe uma fonte única do discurso, uma avaliação do outro da qual este não participa, uma organização da montagem, das idéias, dos fatos que tende excluir a ambigüidade, esta linguagem impede a emergência do outro” (BER-NARDET, 1985).

Muitos desses cineastas tinham uma atitude humilde, mas acabavam sendo usados por uma linguagem que não era. Tal situação é perfeitamente aceitável, ou pelo menos perdoável, quando o regime é tão autoritário quanto o era. O que precisa ser feito na televisão brasileira é um repensamento da estrutura do telejornalismo. Não é possível que, num país que se proclama democrático, a maior fonte de informação do povo brasileiro tenha um modelo que não permita a pluralidade de pensamento e, ao con-trário, proponha uma teoria que não permite discussões.

Não se faz aqui uma proposta para que todo o telejornalismo siga o modelo dos três documentários acima citados. Porém, uma reestruturação deve ser feita, princi-palmente, nas reportagens que se propõem a mostrar a “vida como ela é”. Talvez isso aconteça quando os telejornais e programas jornalísticos tiverem a pretensão de mos-trar fragmentos da realidade e não a “realidade”, como a maioria se propõe hoje em dia.

REFLITA! Como seria em sua análise um telejornalismo que mostrasse não apenas uma mas várias realidades do Brasil? Você acredita que a forma de fazer jornalismo na TV condiz com uma democracia? Você concorda com a antidemocracia da voz off?

Page 62: Telejornalismo - Manual Completo

61

1.2 Telejornalismo, povo e preconceito10

Brasil Urgente é o novo telejornal popular da Rede Bandeirantes. O adjetivo 'po-

pular', aqui, eu o emprego de propósito. Note o leitor como essa palavra adquire uma conotação preconceituosa: indica um gênero bem marcado de noticiário, normalmen-te feito de delegacia, medo e futebol, que cai como uma luva (ou como chuteira) no gosto do povão, a turba indistinta que se farta de atrocidades e que sapateia na geral. Sendo produto desse preconceito, esse tal de jornalismo popular é uma aglomeração mal-acabada de baixezas criminais, reportagens apressadas e muita gritaria. Em tese, até poderia existir um jornalismo que tratasse de estupros, entre outros fatos munda-nos, e que, ao mesmo tempo, fosse criterioso e elegante. Em tese, bem entendido. Na prática, jornalismo popular continua sendo isso aí, uma expressão equivalente a carne de segunda. Moída.

No meio desse mundo-cão do jornalismo, 'Brasil Urgente' estreou dando sinais de que teria vindo para superar as mazelas crônicas do gênero. A começar pelo apresen-tador, Roberto Cabrini, que tem o que se chama de uma reputação a zelar. Algumas de suas reportagens na Globo marcaram época, como a que localizou PC Farias, en-tão foragido da Justiça. Se há um jornalismo nobre na TV, é o que Cabrini fazia (não por acaso, o termo 'nobre', aqui, carrega o mesmo preconceito que o termo 'popular', mas com os sinais invertidos). Agora, o ex-nobre Cabrini se vê engolido por um ce-nário plebeu: enchentes, autópsia de ET, crianças molestadas, um crematório ameri-cano que dá sumiço nos cadáveres. Poderá ele renovar o gênero?

Por enquanto, o que se tem é o seguinte: o jornalismo popular ganha Roberto Ca-brini, um repórter reconhecido, e isso talvez seja bom para o público; em troca, Ro-berto Cabrini ganha o problemaço que é o telejornalismo popular, e isso não se sabe ainda se será bom ou ruim para ele, quanto mais para o público. Ele topou um senhor desafio, é verdade. Topou-o contra a corrente..

Os melhores profissionais da televisão ainda torcem todos os narizes de que dis-põem para os telejornais na linha crime-e-castigo. Daí que o jornalismo centrado no cotidiano dos brasileiros mais simples, cotidiano que envolve, claro, assuntos polici-ais, mas não só isso, ainda não foi bem feito entre nós. Sim, é preciso reconhecer que 'Cidade Alerta', da Record, às vezes traz boas coberturas, como as que mostraram os protestos em Salvador contra o então senador ACM. Antes de 'Cidade Alerta', o ve-lho 'Aqui Agora', do SBT, também teve bons momentos, apesar da sujeira que lhe era dominante. Mas nenhum deles conseguiu se livrar completamente do monstro do sensacionalismo, nenhum teve como escapar à fórmula de segurar a audiência na base da oferta de deformidades morais. Com isso, todo programa 'popular' vai se afundan-do mais e mais no popularesco. É uma sinuca de mau gosto, por assim dizer. 10 Artigo de Eugênio Bucci, jornalista e professor universitário. Transcrito da Folha de São Paulo, 200

Page 63: Telejornalismo - Manual Completo

62

Ainda é cedo para saber se 'Brasil Urgente' vai se sair bem. Há pistas duplas. Às ve-zes, o apresentador tenta emprestar um ar mais digno ao programa, orientando o pú-blico sobre seus direitos, tomando partido de ações em defesa da cidadania, o que é sempre bom, mas não rende ibope. De outro lado, não lhe faltam horrores, tiroteios, discos voadores. Essa ambiguidade é inevitável; até mesmo para elevar o padrão do 'popular', 'Brasil Urgente' precisa negociar com o popularesco, não há outro caminho. Junto da ambiguidade, porém, existe o risco, que é cada vez mais forte, de que o pro-grama, ao se valer das atrações popularescas, acabe se tornando mais uma delas. Seria um triste desfecho. Cabrini seria então apenas um Gil Gomes mais escanhoado. Quanto ao gênero do jornalismo popular, ficaria ainda mais escravizado pelos seus próprios defeitos. Esse triste desfecho não está descartado. Ao contrário, é cada vez mais iminente.

EXERCÍCIOS Questão 1) Dos telejornais brasileiros do momento, qual é na sua opinião o mais san-guinário? Assista a uma edição deste telejornal (Cidade Alerta, Brasil Urgente, Repórter Cidadão etc.) e compare com um telejornal considerado mais sério (Jornal Nacional, Esporte e Notícias etc.). Elabore um comentário de 30 linhas. Questão 2) PROVÃO MEC 2001 - Ao completar 50 anos, a TV brasileira enfren-ta críticas pela espetacularização de sua informação jornalística. Até que ponto o de-safio de tornar a informação atraente para o grande público justifica a dramatiza-ção de seu conteúdo? Avalie esta questão citando um exemplo de situação recente de repercussão nacional que tenha tido esse tipo de tratamento pelo meio.

2. REPORTAGEM11

Uma consulta ao Aurélio define assim o repórter: "pessoa que noticia ou informa pelos jornais". Mas a palavra repórter pode ter ainda, familiarmente, o sentido de no-ticiário: "programa noticioso em rádio ou televisão". E é em relação à mídia televisiva que nos interessa falar em repórter: aquele que noticia ou informa em programa noti-cioso de televisão. As qualidades necessárias a um repórter já são demasiadamente conhecidas. Basta consultar um desses jornais que saem às vésperas dos vestibulares. Lá encontraremos definições interessantes, do tipo: o repórter deve ter espírito de aventura, muita curiosidade etc., qualificações que fariam inveja a Indiana Jones.

11 Manual de Telejornalismo, de Luís Carlos Bittencourt.

Page 64: Telejornalismo - Manual Completo

63

Uma boa definição para repórter foi dada por um velho jornalista: é um profissio-nal da fofoca. E talvez ele tenha razão. Foi bisbilhotando que repórteres deram gran-des furos e mudaram o rumo da história. Um exemplo clássico é o caso Watergate. Outro, mais próximo, é o caso Collorgate. E assim, à definição tradicional, pode-se acrescentar mais esta: repórter é todo indivíduo cuja profissão é ouvir coisas aqui para contar adiante.

Supondo que a curiosidade seja o pé direito do bom repórter, o pé esquerdo seria o sentido social da profissão. Sem isso, o adjetivo curioso não passaria de um eufemis-mo para mexeriqueiro. Um exame preliminar sério de qualquer estudante sobre o que fazer na vida implicaria, se ele optasse pelo jornalismo, na resposta a uma questão fundamental: para quê? Dinheiro? Neste aspecto, o jornalismo é semelhante a outras profissões liberais, tendo também o seu código de ética que nem sempre é cumprido. Algumas vezes ele acaba sendo passaporte para enriquecimento ilícito e meio fácil de ascensão social.

Jornalismo é, sobretudo, uma profissão de caráter social. A notícia é um fato social do qual o jornalista só é protagonista em casos excepcionais. É dever ético do jorna-lista se informar e divulgar a informação da maneira mais isenta possível. Porém, é importante ressaltar que muitas vezes os fundamentos éticos e morais da profissão podem ser ocultados pelo predomínio dos interesses de empresa no trato da informa-ção.

Mas o que interessa, no momento, é o que diferencia o repórter de televisão. Ele deve ter a mesma formação de qualquer outro repórter, mas o telejornalismo tem al-gumas particularidades. Um bom repórter de jornal, por exemplo, não terá necessari-amente o mesmo desempenho na tevê. Na televisão, uma coisa chamada imagem tem absoluta primazia. Sem imagem, a televisão não passa de um rádio disfarçado. Repór-teres de veículos impressos precisam, para trabalhar na tevê, ter consciência de que imagem é informação.

Se, no jornal impresso, repórteres aprendem a se orientar diante de um aconteci-mento para organizar melhor as informações, na tevê esse entendimento tem que va-lidar-se nas cenas mostradas. A necessidade de síntese é muito maior e o processo é mais seletivo. Além disso, o resultado do trabalho não depende apenas do repórter, mas de toda uma equipe. 2.1 Apuração

É a checagem prévia de informações que conduzem a uma matéria, junto a fontes confiáveis (polícia, por exemplo), antes da equipe sair às ruas. Muitos profissionais se especializaram na função de apurador e ganhavam bem por isso. Um bom apurador era essencial em qualquer órgão de imprensa. Na televisão, sobretudo, a apuração é fundamental. O custo operacional do telejornalismo é muito alto. Um jornal impres-

Page 65: Telejornalismo - Manual Completo

64

so pode deslocar apenas um repórter para cobrir algum evento. Em televisão isso é praticamente impossível. A equipe básica necessária é formada por, pelo menos, duas pessoas, considerando os equipamentos mais modernos. O deslocamento de profis-sionais e equipamentos, portanto, exige mais precisão na apuração.

Não há chefe de reportagem que dispense o trabalho de um boa apuração. E o apu-rador sempre foi uma figura chave numa redação. Podia-se passar diante dele quantas vezes fossem necessárias durante o dia, e lá estava o apurador, conversando ao telefo-ne, marcando e confirmando entrevistas, garantindo com a experiência dele o apoio fundamental à produção de um telejornal.

Hoje, no entanto, praticamente não existe mais a figura do apurador como a des-crita acima. Suas funções se confundem com a de pauteiro, e ambas foram absorvidas pela equipe de produção. Mesmo assim, a atividade de apuração, longe de extinguir-se, continua viva e fundamental à prática do bom jornalismo. Sem apuração não há notícia. 2.2 Pauta

O pauteiro é um conhecido "bode expiatório" das redações. Ele costuma levar a culpa de tudo, até mesmo da incompetência dos chefes.

- A pauta de hoje está demais! - lamenta o chefe de reportagem. Culpa de quem? Do pauteiro, naturalmente. Mas deram ao pauteiro condições fa-

voráveis de trabalho? O pauteiro não pode ser um "criador inspirado", que do nada produz uma agenda extensa de assuntos. Ele trabalha com informações.

O pauteiro mesmo, aquele profissional do ramo que não faz outra coisa na vida, cabe no perfil estereotipado de um sujeito razoável de se conviver. Bem informado, espirituoso, sabe de tudo antes dos outros. Mas vive com uma sensação de opressão no peito. Angústia pura. Razões não faltam: lê com atenção os jornais, folhetos, relea-ses e tudo mais que chega às suas mãos, e acompanha os noticiários das emissoras concorrentes. Em resumo: está sempre à cata de assuntos. E essa busca é a fonte de suas angústias.

Nem nas férias o coitado se livra desse garimpo de informações, em que nada de importante pode lhe escapar. É que as férias acabam e o pauteiro terá de voltar à reda-ção, bem informado sobre o que está acontecendo na cidade, no país e no mundo. Em outras palavras, nem em balneários ou nos descansos semanais ele pode abrir mão de ler e se informar.

É certo que hoje o pauteiro conquistou algumas regalias oferecidas pela tecnologia. O computador, por exemplo, transformou em relíquia a tradicional pasta sanfonada, antigo tesouro dos pauteiros. A pasta ficava sempre à mão, com os seus comparti-mentos - um para cada dia do mês - numerados e repletos de papéis com os fatos pro-gramados, dicas e lembretes.

Page 66: Telejornalismo - Manual Completo

65

Hoje, num jornalismo sério, e em empresas de porte, o trabalho de garimpagem de assuntos para reportagens é feito por uma equipe de profissionais experientes coor-denada por um editor de pauta. Todas as informações precisam convergir para a edi-toria de pauta, que possui uma rede de fontes: jornais, releases, dicas de colegas, ser-viços de escuta, telefonemas do público etc. Todas as informações, selecionadas e checadas, são arquivadas em computador. Depois, são impressas e distribuídas diari-amente a outros setores do jornalismo.

JORNAL DE PAUTA data 00/00/00 BRASÍLIA CARROS OFICIAIS O Governo vai anunciar a venda de 200 carros oficiais. Vamos saber da uti-lização dos carros, a economia e a destinação do dinheiro arrecado. NOSSA NATUREZA O presidente anuncia hoje o programa ""Nossa Natureza"" de defesa da Ama-zônia. O projeto vai ser enviado para apreciação do Congresso. BELO HORIZONTE REC-FRENTE/CRIANÇA Matéria recomendada. Reunião de um grupo parlamentar pelos Direitos das Crianças. Vai ser às 10 horas da manhã. GREVE/FUNCIONALISMO O funcionalismo público estadual de Minas em greve realiza uma grande as-sembléia hoje às 4 da tarde. RIO DE JANEIRO CENTRAL/CONFUSÃO Nova confusão foi registrada ontem no final da tarde com a paralisação dos maquinistas da Central do Brasil. Vamos fazer o rescaldo, mostrando os es-tragos, prejuízos e feridos.

O exemplo é de uma pauta simples, com poucas informações. E muito restrita

também, porque relaciona apenas três capitais. Uma pauta nacional inclui previsões de todos os estados nos quais a emissora tem sucursais ou afiliadas. Um item de pauta mais completo teria ainda outras informações importantes como no exemplo:

JORNAL/HORA RETRANCA LOCAL DATA AUTOR JD / 08:30 GREVE DIVERSOS 00/00/00 BITT HOJE E AMANHÃ, CERCA DE 1 MILHÃO DE ALUNOS DA REDE ESTADUAL VÃO FICAR SEM AULAS. OS PROFESSORES FAZEM UMA PARALISAÇÃO DE ADVERTÊNCIA DE 48 HORAS, REIVINDICANDO MELHORIAS SALARIAIS E MAIS VERBAS PARA O ENSINO E RECUPERA-ÇÃO DAS ESCOLAS. APESAR DE NÃO DAREM AULAS, OS PROFESSORES PEDIRAM AOS PAIS QUE LEVEM OS FILHOS ÀS ESCOLAS PARA QUE SEJAM REALIZADOS DEBATES SO-BRE A QUALIDADE DO ENSINO. MARCAMOS ÀS 08:30 NO CEPE, COM O (...). ELE VAI NOS DAR TODAS AS INFORMAÇÕES SOBRE A PARALISAÇÃO, INCLUSIVE DANDO OS ENDE-REÇOS DAS MELHORES ESCOLAS PARA QUE POSSAMOS FAZER A MATÉRIA. O ENDEREÇO É (...). DEPOIS, VAMOS ATÉ AS ESCOLAS, E FECHAMOS A MATÉRIA COM A SECRETARIA DE EDUCAÇÃO DO ESTADO. ELA VAI PERCORRER ALGUMAS ESCOLAS PELA MANHÃ. A SE-CRETARIA DE EDUCAÇÃO FICA NA RUA (...).

Page 67: Telejornalismo - Manual Completo

66

Note-se a diferença deste item de pauta para o anterior. É muito mais completo.

Tem informações gerais sobre os motivos do evento, hora e endereço, além de indica-ções sobre o que fazer. O item de pauta acima pressupõe um trabalho de produção que implica a marcação de entrevistas: a primeira, com um representante dos profes-sores; a segunda, com a secretária de educação, cuja agenda para o dia foi confirmada com antecedência. Os auxiliares do editor de pauta, os produtores, fizeram todo o trabalho prévio de confirmação e marcação de entrevistas.

Uma pauta completa deve ter, além de informações gerais, hora, nomes, endereços e telefones para contato. Isto permite que o chefe de reportagem localize o repórter numa emergência. Um pauteiro cuidadoso dá dicas importantes não só para o repór-ter, mas também para o chefe de reportagem e, mesmo, para o editor. Os itens de pauta não trazem indicações de imagens, isso porque os pauteiros, em geral, não pre-cisam ter conhecimento operacional e prático de câmera em reportagem. E podem levar um "passa-fora" do camera-man se resolverem "apitar" em campo alheio.

2.3 Chefia de Reportagem

O chefe nunca está sozinho. Tem muita gente à sua volta, e uma estrutura bem

montada para que a parte dele no sistema funcione. Geralmente o chefe de reporta-gem tem auxiliares. Por exemplo, três subs: um pela manhã, outro à tarde e um tercei-ro à noite. Além disso, o chefe de reportagem tem ao seu lado a equipe de produtores. De maneira geral, a rotina da chefia começa bem cedinho: o subchefe de reportagem da manhã consulta o computador, dá uma olhada na pauta feita na véspera e lê aten-tamente os jornais do dia. Ele já recebeu o primeiro serviço de radio-escuta do dia. Os produtores também já fizeram a primeira rodada de telefonemas para os lugares estra-tégicos: polícia, bombeiros, defesa civil etc. Com isso, quando o chefe de reportagem chega, a pauta está atualizada e mapeados os principais acontecimentos previstos para o dia. O resto fica por conta dos imprevistos.

Radio-escuta é um serviço de apoio fundamental em telejornalismo; como o pró-prio nome diz, é uma escuta pelo rádio. Muitas redações reservam esse tipo de traba-lho a um estagiário ou a um repórter iniciante. A tarefa consiste em ouvir e gravar os noticiários mais importantes das emissoras de rádio; relacionar as notícias em uma ou mais laudas; tirar cópias e distribuí-las aos diversos setores do jornalismo, como che-fia de reportagem, pauta e editorias. As notícias de maior interesse são transcritas na íntegra. Se for necessário, a equipe de produção, pelo telefone, complementa a notícia com outras informações.

Page 68: Telejornalismo - Manual Completo

67

De posse do re-

sumo do noticiário, o chefe de reporta-gem e os editores assinalam o que inte-ressa e o serviço de radioescuta transcre-ve as notícias na ín-tegra. As rádios são mais ágeis na divul-gação de informa-

ções, e o chefe de reportagem precisa receber as notícias a tempo de deslocar equipes para a cobertura. Por isso, a chefia de reportagem é prioritária dentre os destinatários do boletim da radio-escuta.

Outro rádio também fundamental nas redações é o "alcagüete da polícia", um re-ceptor que faz o rastreamento permanente da intercomunicação via rádio da polícia, bombeiros e ambulâncias. Se acontece, por exemplo, um assalto em algum lugar da cidade, o setor de comunicações da polícia informa às patrulhas pelo rádio. E a infor-mação chega ao mesmo tempo na redação.

O deslocamento de equipes de um lugar para outro é uma rotina nas redações das emissoras. Ele pode ser feito por telefone comum (razão suplementar para a necessi-dade de uma pauta completa), celular ou via rádio. Este é o meio mais comum de co-municação entre equipe de externa e redação. O chefe de reportagem geralmente pos-sui um transmissor-receptor instalado próximo à sua mesa para falar com as equipes em serviço. Todos os carros que servem à reportagem devem ter rádio de comunica-ção. O bom chefe de reportagem exerce um controle rigoroso sobre as equipes; preci-sa saber a todo momento a localização de cada uma para deslocá-las se for necessário. Neste caso, é útil um mapa da cidade para coordenar as equipes como faz um bom general em guerra.

O telejornal depende do desempenho da chefia de reportagem. Afinal, ele é feito com notícias e reportagens. Mas o bom chefe de reportagem não é avaliado apenas por sua capacidade de coordenação. Ele tem que orientar a equipe, dando dicas ao re-pórter e mesmo ao câmera-man. Muitas vezes uma reportagem se perde por erro de estrutura ou de enfoque. E o repórter deve dividir essa responsabilidade com o seu chefe imediato.

Muitos jornalistas não se adaptam ao ritmo acelerado do trabalho em tevê, nem conseguem entender que a imagem é a base fundamental da informação. Isso não é fácil para quem passou anos numa redação de jornal ou revista.

Exemplo de rádio-escuta:

RÁDIO DIAL/12:30 - TRÊS HOMENS ARMADOS ASSALTARAM UM BANCO NO MÉIER. - ACIDENTE COM ÔNIBUS NA TIJUCA. CINCO FERIDOS. - PREFEITURA ANUNCIA A ANISTIA FISCAL. - O PREFEITO VISITOU A FAVELA DA ROCINHA. - GREVE DE ÔNIBUS TUMULTUA O CENTRO DA CIDADE. - VIOLÊNCIA NA COLÔMBIA. TRAFICANTES MORTOS. - ESTADOS UNIDOS LANÇAM AVIÃO ESPACIAL. - EM BRASÍLIA, PRESIDENTE DÁ COLETIVA HOJE. - CONGRESSO REÚNE-SE À TARDE PARA VOTAR O PACOTE. - SECRETÁRIO DA RECEITA ADVERTE CONTRIBUINTE.

Page 69: Telejornalismo - Manual Completo

68

2.4 Externas É assim: muitas vezes as coisas só acontecem depois que a televisão chega. Um dos

dez mandamentos do telejornalismo norte-americano, enumerados por um pesquisa-dor, diz exatamente isso: a notícia está onde estão as câmeras - tal é o poder da televi-são nos Estados Unidos (e aqui). Que político, empresário ou simples cidadão não gostaria de aparecer alguns segundos no jornal nacional de uma emissora?

A audiência e o prestígio político-social da tevê alimentam o narcisismo até mesmo de quem a faz.

2.4.1 Equipamento

O repórter de tevê não trabalha sozinho. Aqui vale a máxima dos Mosqueteiros:

"um por todos, todos por um". Quebrar o juramento é risco de vida profissional. Mesmo porque não há justificativa. O equipamento de tevê não dá chance ao repórter faz-tudo, aquele que entrevista, ilumina e grava. Pelo menos, não dava, até que a tec-nologia possibilitou o aparecimento desse selfmademan, isto é, o telejornalista faz-tudo. Que o diga Luiz Nachibin. Ele e sua câmera rodaram mundo em busca de as-sunto para a televisão brasileira.

No Brasil, o telejornalismo usou, durante muitos anos, o sistema U-Matic, des-cendente do primeiro equipamento de videotape, o Ampex, lançado nos Estados U-nidos em 1956. O videotape possibilitou um grande salto de qualidade na televisão, mas o telejornalismo só foi realmente beneficiado com o lançamento, em 1969, do videocassete U- Matic pela Sony japonesa. Inicialmente criado para ser um videocas-sete doméstico, o U-Matic era grande e muito caro, e por isso acabou se transfor-mando em equipamento profissional de televisão.

O videocassete doméstico surgiu só em 1975, com o lançamento do Betamax, também criado pela Sony. O VHS - video home system - apareceu dois anos depois, em 1977, lançado pela também japonesa JVC, e tornou-se o videocassete doméstico por excelência. Hoje, o mercado está repleto de modelos de vídeos domésticos digi-tais, que estão substituindo o sistema analógico. O S-VHS chegou a ser usado profis-sionalmente, como também, o HI-8 mm, o substituto em vídeo do filme Super 8, que ajudou a formar tantos cineastas. O VT portátil da microcâmera, por exemplo, utili-zado em algumas reportagens de denúncia, grava em HI-8 mm. Ele oferece versatili-dade de gravação e intercomunicação com outros sistemas, como o Betacam, barate-ando o custo de produção sem perda considerável de qualidade.

No mercado de televisão e vídeo profissional, o lançamento da câmera Betacam melhorou a qualidade da imagem e possibilitou maior agilidade ao telejornalismo. A Betacam é do tipo camcorder, com o sistema de gravação instalado no próprio corpo. Com isso, a equipe de externa pode ser reduzida para duas pessoas, já que não há mais

Page 70: Telejornalismo - Manual Completo

69

a necessidade de um operador de VT e o iluminador pode ser dispensado em muitos casos.

Antes do VT, o telejornalismo usava filmes. Uma das primeiras câmeras de repor-tagem em televisão foi a Bell & Howell, pequenina e barulhenta mas eficiente. Era movida a corda e o filme não tinha som. A Auricom sucedeu a "mudinha", introdu-zindo o som ótico. Mas a câmera que deu grande impulso ao telejornalimo foi a fa-mosa CP, câmera de filmar portátil com som magnético, possibilitando a edição. No Brasil, a Rede Globo usou as CPs até o final da década de 70, quando elas foram subs-tituídas pelas UPJs, ou Unidades Portáteis de Jornalismo, equipadas com as câmeras de VT U-Matic. O U-Matic, aposentando os filmes de 16 milímetros, barateou o cus-to do telejornalismo. As fitas de 3/4 polegadas, bem como as de meia polegada, po-dem ser reutilizadas muitas vezes sem perda de qualidade. Além disso, e principal-mente, o U-Matic deu agilidade ao telejornalismo, embora os gravadores portáteis não pudessem ser acoplados à câmera, o que só veio a acontecer com a Betacam.

A imagem gravada pode ser vista no próprio visor da câmera ou no monitor, um aparelho de televisão com imagem de alta resolução. Câmera e monitor funcionam com baterias, como pilhas de eletrodomésticos. Para gravar o som, usa-se microfone . A luz é fundamental para se obter imagem de qualidade.

2.4.2 Equipe

O tipo de equipamento condiciona, portanto, o número de pessoas na equipe.

Com o Betacam, a equipe terá apenas três pessoas: repórter, câmera-man e operador de externa, dublê iluminador, operador de áudio e motorista. As câmeras digitais têm grande capacidade de captação de imagens em condições razoáveis de iluminação e podem reduzir a equipe a duas pessoas: repórter e câmera-man. Conflitos podem a-contecer devido à diferença de formação entre repórteres e câmera-man. No Brasil, a Rede Globo procurou diminuir o distanciamento cultural na equipe proporcionando cursos de formação universitária para os câmera-men. Além disso, cursos internos sobre a prática e a importância da imagem ajudam a desenvolver o senso jornalístico dos profissionais da imagem.

Prática comum - e errada - nas emissoras é orientar apenas um integrante da equi-pe, em geral o repórter, sobre a matéria que todos vão fazer. Se o repórter é do tipo calado, a equipe técnica segue para o local sem noção do que vai fazer. É importante que o câmera-man também receba orientação do chefe de reportagem ou, se for o ca-so, de um editor de imagens ou chefe dos câmera-men. O câmera-man bem informa-do sobre a pauta sai da emissora melhor preparado para cobrir o assunto. Em primei-ro lugar, porque se familiariza com o assunto. Em segundo, porque avalia melhor suas necessidades de equipamento. Mesmo assim, os procedimentos de rotina são funda-mentais.

Page 71: Telejornalismo - Manual Completo

70

Toda emissora tem um almoxarifado técnico. Equipamento eletrônico não é infalí-vel; precisa de manutenção. Em televisão, as câmeras mudam de mãos as 24 horas do dia. Assim, antes de sair para fazer uma reportagem, o cameraman tem que checar to-do o equipamento: câmera, bateria, luz etc.

3. OS TIPOS E AS TÉCNICAS BÁSICAS DA REPORTAGEM

Na verdade, não existe "a" reportagem. Nem uma fórmula matemática que pudesse

ser usada em todas as ocasiões. Se fosse assim não haveria necessidade de escolas de comunicação. Bastaria ao estudante aplicar aos fatos aquela fórmula mágica que abri-ria as portas do sucesso profissional. Cada assunto merece um tratamento particular. A tal fórmula, que vem com o tempo, é a experiência de cada um: técnica personali-zada e macetes adquiridos. Mas este capítulo não faria sentido se a sua máxima fosse "a experiência forma o bom repórter". Não há dúvida de que sim, mas a prática de re-portagem pressupõe uma técnica mínima justificadora, em última instância, dos cur-sos de jornalismo.

No caso do telejornalismo, esse pressuposto é fundamental. A reportagem em tevê exige conhecimento técnico do meio. Tanto é assim que o melhor repórter de jornal se vê em apuros quando pega pela primeira vez um microfone de tevê, sem nenhum treinamento. Técnica e experiência: duas palavras chaves em telejornalismo. Existe outra - informação - que na verdade é uma premissa na vida de todo jornalista. Quan-do o repórter chega à redação para iniciar mais um dia de trabalho, deve ter lido, pelo menos, um jornal.

Nem sempre o repórter encontra um chefe generoso. Ele pode ser daqueles que entregam a pauta e mandam o repórter se virar. Ou pode ser o atencioso, que entrega a pauta, orienta na elaboração de perguntas e ainda fornece recortes de jornais do dia para o repórter ler e se informar. A rotina reserva ao repórter uma pauta feita com an-tecedência e atualizada durante o dia. Assim, a primeira providência é receber a pauta, atualizar-se através da leitura dos jornais e pedir o apoio da pesquisa, se for preciso. Repórter bem informado e orientado pela chefia trabalha melhor. Mais ainda se o câ-mera-man também recebe as instruções do chefe de reportagem.

Na maioria das vezes a equipe já sabe o que vai encontrar na rua. Com a experiên-cia, repórter e câmera-man sabem com antecedência o andamento natural do aconte-cimento. Uma entrevista coletiva, por exemplo, reserva surpresa apenas no assunto, porque o jogo de cena já é conhecido. Mas pode acontecer de o entrevistado reservar uma surpresa extra à equipe, como aquele político norte-americano que se matou di-ante das câmeras de tevê. O suicídio do político fez a festa da mídia naquele dia. E um acontecimento rotineiro - uma entrevista coletiva - de repente assumiu proporções de tragédia.

Page 72: Telejornalismo - Manual Completo

71

Outra tragédia que levou o Brasil a discutir a violência na tevê, como faz em ocasi-ões semelhantes, aconteceu em São Paulo. A equipe do telejornal Aqui Agora, do SBT, registrou ao vivo o suicídio de uma moça. Houve surpresa na cobertura? Neste caso, a resposta mais correta é não. O que se pode esperar de um telejornal que de-pende do fait-divers? A equipe está preparada para tudo, sabendo que o tratamento que dará aos fatos será o mais sensacionalista e emocional possível. No primeiro caso, tudo o que a equipe planejou ruiu diante da surpresa do suicídio do político. A reação é a mais inusitada possível. Já no segundo caso, a equipe sempre espera - e torce - pelo pior. Os telejornais e programas que exploram o fait-divers constroem as surpresas.

3.1 Técnicas Básicas

Experiência vem com o tempo. Traz segurança, confiabilidade e o que se pode

chamar de "substância informativa". O tele-repórter novato precisa de muito treino até chegar ao ponto de transmitir confiança ao telespectador. E esse treino começa com as noções técnicas básicas em telejornalismo. a) Entradas

Há três tipos de entradas do repórter na matéria: no início, no meio ou no fim. As-

sim, de acordo com o lugar da entrada na matéria, o repórter pode fazer: 1 - abertura; 2 - passagem; 3 - encerramento. Não se deve abusar da entrada do repórter no início da matéria, sobretudo porque

antes dele já existe a cabeça do locutor apresentando a reportagem. A passagem, co-mo o próprio nome diz, é usada para fazer a transição de um assunto ou ambiente pa-ra outro. Mas ela pode ser usada apenas para marcar a presença do repórter na repor-tagem. Mesmo assim, deve ser usada com critério.

A escolha do ambiente para a gravação das entradas depende da matéria. Se a re-portagem é sobre um show de motonáutica, por exemplo, é evidente que a cabeça não deve ser feita num campo de futebol. O cenário deve ser, sempre, o ambiente onde se desenrola a ação. Mas toda regra tem exceção. Em último caso, na falta de outro, po-de-se escolher um ambiente neutro. Exemplos de entradas vão ser analisados com mais detalhes quando falarmos sobre os tipos de reportagens. A localização da entra-da do repórter na estrutura da matéria é uma escolha dele próprio. Já o ambiente deve ser discutido com o câmera-man. Cabe a ele decidir se o local é tecnicamente adequa-do para a gravação. Mesmo assim, repórter e câmera-man não devem perder de vista o interesse jornalístico do ambiente.

Page 73: Telejornalismo - Manual Completo

72

b) Enquadramento Há outras duas preocupações técnicas básicas que devem ser discutidas em equipe:

o enquadramento e o tipo de plano. Em relação ao primeiro, os enquadramentos mais comuns em telejornalismo para as entradas são dois: central e lateral, que pode ser à direita ou à esquerda do vídeo, sendo o segundo tipo mais adequado, em virtude da tradição de percepção visual da esquerda para a direita.

c) Planos Os planos são muitos e variados, e o

cinema costuma usar e abusar deles. Em telejornalismo, alguns planos são mais freqüentes. Sete deles estão ilustrados abaixo: big-close, close, plano médio aproximado (PMA), plano médio (PM), plano americano (PA), plano de conjunto (PC) e plano geral (PG).

d) Imagens de apoio

Este manual não se propõe a detalhar

o trabalho de câmera em telejornalismo. Mas alguns procedimentos técnicos, co-mo esses de que vimos tratando, dizem respeito também ao repórter. Como, por exemplo, as imagens de apoio ou de cor-te. Em todas as gravações, externas ou de estúdio, o câmera-man tem que fazer, obrigatoriamente, imagens ou takes de apoio ou de corte. Eles são usados nas

Page 74: Telejornalismo - Manual Completo

73

edições para, entre outras coisas, cobrir "pulos" de imagens. Num exemplo simples, se uma entrevista ficou longa demais, o editor vai ter que

diminuir a fala do entrevistado, fazendo alguns cortes. Às vezes ele precisa tirar o meio da fala para juntar início e fim. A "colagem"das partes pode gerar um pulo de imagem. Neste caso, o editor usa o take de apoio, que pode ser um plano detalhe, o contraplano do repórter ou mesmo a imagem de um câmera-man filmando.

É certo que atualmente os editores estão usando outros recursos, como o conge-lamento da imagem do entrevistado, reiniciando o depoimento no ponto de entrada seguinte. Emissoras como a MTV não se preocupam com o take de corte. Os pulos de imagem fazem parte do estilo da emissora, copiado por outras que interpretam es-ses recursos como a linguagem visual dos jovens.

e) Movimentos

Os movimentos de câmera em telejornalismo seguem os de cinema, com algumas

exceções. A imagem em telejornalismo não precisa ser bonita. O importante é a in-formação que transmite. Muitas vezes, uma imagem feia, desfocada, tem um impacto informativo excepcional, como a seqüência de imagens de um acidente.

O câmera-man de telejornalismo faz tomadas de ângulos variados e movimentos tais como: 1 - PANORÂMICA (PAN), que é o movimento horizontal contínuo, da esquerda para a direita ou vice-versa; 2 - TILT, uma panorâmica vertical; 3 -TRAVELLING, que é o passeio da câmera, como as imagens feitas do interior de um carro em movimento; 4 - DOLLY, o deslocamento da câmera na vertical, muito comum em cinema, mas praticamente sem uso em telejornalismo; 5 - ZOOM IN-OUT, que é o movimento de aproximação e afastamento diante do objeto filmado, como a ilustração a seguir:

Page 75: Telejornalismo - Manual Completo

74

O telejornalismo não costuma usar plano seqüência. E quando usa, faz diferença. Foi o que aconteceu com o telejornal Aqui Agora, do SBT. O plano seqüência passava a idéia de imediatismo. A câmara era o olho do telespectador no palco do aconteci-mento. No telejornalismo tradicional, as imagens são muito picotadas na edição. Mesmo o plano geral não deve ser usado em excesso. A tela é muito pequena e torna os elementos insignificantes em planos gerais. Da mesma forma, não se pode abusar do ponto de vista. Telejornalismo não é cinema. A imagem é "casada" com o texto e com ele forma unidade referencial de informação.

No telejornalismo noticioso, as edições "lógicas" buscam passar a noção de objeti-vidade, de distanciamento, pressupondo o discernimento crítico do telespectador. O uso de plano seqüência envolve outro tipo de concepção, objetivando a participação do telespectador. Neste caso, as edições usam imagens seqüência com a narração em tempo presente: "neste momento" , "vocês estão vendo", "veja só" etc. O repórter pas-sa a ser um protagonista do acontecimento, e o câmera-man, os olhos do telespecta-dor. Há um jogo de interação discursiva que envolve, sobretudo, o aspecto emocional da situação.

Na verdade, as diferenças técnicas escondem os mesmos objetivos. São duas for-mas de representação do fato jornalístico - a objetiva e a participativa - que veiculam a notícia como um espetáculo. Com um agravante, podemos acrescentar: o telejorna-lismo "participativo" assume uma postura extremamente conservadora na medida em que abusa do fait-divers, disseminando na sociedade modelos de representação basea-dos na violência e no medo. Em resumo, e à parte a discussão ideológica, o tratamen-to da imagem vai depender do estilo do telejornal, que pode usar e abusar do estilo ficcional e dramático ou dar preferência a uma narrativa que permita uma construção mais "objetiva" da notícia, o que não inviabiliza uma análise dramática de sua estrutu-ra.

f) Microfone

Outro procedimento técnico

básico que precisa ser lembrado aqui é o uso correto do microfo-ne. As reportagens de rua são fei-tas, na maioria das vezes, com mi-crofone de mão. Os microfones de lapela são usados para entrevis-tas, principalmente em interiores. Nas externas, em geral, o micro-fone de mão proporciona mais agilidade ao repórter. Nas entre-

Page 76: Telejornalismo - Manual Completo

75

vistas, o repórter deve sempre colocar o microfone numa posição que permita ao câ-mera-man fazer o enquadramento adequado. Para isso, o repórter que use a mão di-reita tem que se posicionar num ângulo aproximado de 90 graus diante do entrevista-do, permitindo o enquadramento de frente.

A ilustração mostra a possibilidade de o câmera-man fazer um ângulo de 180 graus. Ele pode enquadrar o entrevistado e o entrevistador separadamente. Da mesma for-ma, pode fazer uma tomada de frente, enquadrando os dois. Além disso, a "lei dos 180 graus" permite a feitura dos contraplanos sem perda de eixo. Isso é fundamental para o uso correto do microfone de mão. O movimento de levar e trazer o microfone tem que ser bem feito, no enquadramento certo, para que ele tenha continuidade no en-trar e sair do quadro.

g) Iluminação

O iluminador é um profissional respeitado em qualquer atividade, como no cine-ma, núcleo de novelas ou setor de produção de uma emissora. O telejornalismo, no entanto, aprendeu a discriminar o trabalho do iluminador. Ele costuma ser chamado de "pau de luz", aquele sujeito que fica de pé num canto, feito um poste, iluminando o ambiente. Essa é uma visão completamente equivocada a respeito da iluminação em reportagem. Costuma-se dizer que "para jornalismo, qualquer luz é boa", tal é o des-leixo com a imagem.

Algumas câmeras são mais sensíveis do que outras. As câmeras digitais, por exem-plo, filmam bem num ambiente fechado, com pouca luz. Já uma câmera Betacam pre-cisa de iluminação adequada para registrar as cores reais. O iluminador precisa conhe-cer os princípios físicos das cores, as diversas fontes de luz (sol, lâmpadas etc.) e os equipamentos de gravação. No telejornalismo diário, as necessidades de luz são bási-cas, mas as produções jornalísticas mais elaboradas exigem iluminação adequada.

3.2 Os Tipos de Reportagem 3.2.1 Factual

Alguns exemplos citados acima podem ser definidos como reportagem factual.

Neste caso, a reportagem se limita a contar o que aconteceu. E, como já foi dito aci-ma, não há fórmula definida. Na reportagem sobre o ladrão baleado, por exemplo, o trabalho do câmera-man foi fundamental. Foi ele quem deu o clima da matéria, com imagens em plano seqüência e som direto, características básicas da técnica de docu-mentário. O off do repórter foi escrito para reforçar a imagem, e a edição valorizou as

Page 77: Telejornalismo - Manual Completo

76

cenas de ação. Esse conjunto de procedimentos técnicos resulta numa matéria em que o telespectador é levado a "participar" do acontecimento.

Voltando ao exemplo acima, suponhamos que o repórter decidiu ouvir alguém da companhia de águas e esgotos da cidade. Neste caso, ele vai escrever o off depois, já que a matéria terá mais de uma locação. O off só pode ser escrito depois que terminar a cobertura. No exemplo do buraco, feitas as gravações, a matéria ficou construída assim:

O exemplo acima é de uma reportagem factual simples, isto é, com gravações em

apenas dois lugares diferentes: a rua onde aconteceu o estouro do cano e o prédio da companhia de águas e esgotos. Simples também é a estrutura da matéria, com off, po-vo fala, cabeça e entrevista final. Mas a mesma reportagem poderia ser estruturada de outras formas, como: cabeça, off e entrevista; off, povo fala e cabeça de encerramento com as informações obtidas na companhia etc. Como já foi dito, não existe uma fór-mula, mas formas diferentes de estruturação de matérias, adotadas de acordo com o assunto e o desejo do repórter.

3.2.2 Stand up e Flash

Se o repórter tem uma boa informação e não tem imagem, não tem problema. Dá

uma de locutor. Em vez de levar a informação para o editor escrever apenas uma nota, o próprio repórter pode chegar à redação com uma fita gravada no local.

- Não deu matéria, mas fiz um stand up - dirá o repórter ao chefe de reportagem. O chefe ficará contente e o editor também, porque terá mais VT com informação

importante. Para ele, é melhor ter uma informação importante gravada pelo repórter do que divulgá-la através do locutor.

O stand up é um recurso técnico muito usado em televisão. Pode ser usado tam-bém por comentarista. Em vez de gravar no estúdio, ele faz o comentário em qual-quer outro lugar, desde que o ambiente tenha relação com o assunto ou seja o mais neutro possível. O stand up deve ser feito em câmera fixa, enquadrando o repórter em plano americano e fazendo o movimento de aproximação, zoom-in, ou de afasta-mento, zoom out.

- OFF inicial apresentando o assunto - POVO FALA sobre o estouro do cano - OFF de continuação sobre as conseqüências - CABEÇA DE PASSAGEM sobre o engarrafamento - OFF com imagens do prédio da companhia - ENTREVISTA com o responsável anunciando as medidas que vão ser toma-das.

Page 78: Telejornalismo - Manual Completo

77

O flash pressupõe movimento de câmera, enquadrando outras imagens além do repórter. Pode começar com a câmera fixa no repórter e fazer movimento panorâmi-co para o lado ou vice-versa, ou começar com uma imagem do ambiente, enquadrar o repórter, fazer movimento panorâmico para a imagem anterior. A escolha entre estas formas depende do assunto, das possibilidades técnicas e do bom gosto da equipe.

As entradas ao vivo no meio de um noticiário podem ser feitas na forma de stand up ou de flash. Elas também são chamadas de net, de news electronic television, en-tradas ao vivo em rede. O repórter pode até fazer uma entrevista, com a câmera fa-zendo um dos movimentos descritos acima. Neste caso, o tempo do net e os movi-mentos têm que ser planejados e treinados previamente para evitar erros.

Como saber o momento exato de entrar? Isso depende dos recursos técnicos da emissora. Já houve época em que entrar ao vivo num telejornal era um exercício de loucos. Um técnico à frente, de fone no ouvido, dava o sinal com a mão para o repór-ter começar a falar. Um segundo de distração e a operação fracassava. Além disso, a equipe dispunha de um monitor para a equipe acompanhar o andamento do telejornal e garantir a entrada na hora certa.

Atualmente a operação é mais segura porque todos estão mais experientes e a téc-nica mais confiável. Um ponto eletrônico, daqueles usados no estúdio pelo apresen-tador, é o apoio essencial ao repórter e ao cameraman, tornando obsoletos aparelhos como o watchman, uma antiga alternativa visual aos walkie-talkies. O único imprevis-to fica por conta do repórter. Inseguro, ele pode gaguejar e perder totalmente o con-trole diante da câmera. Uma operação ao vivo desse tipo exige carros com microon-das, que são antenas geradoras e receptoras de ondas eletromagnéticas. Mas a topo-grafia do lugar deve ser adequada para que o enlace (link) seja feito. Se a região tiver muitos obstáculos, como montanhas e edifícios - caso típico do Rio de Janeiro - é preciso rebater o sinal em microondas distribuídas em pontos estratégicos da cidade. Há carros que transmitem a imagem via satélite, os chamados SNG (Satélite News Gathering), que superam os obstáculos naturais da região. Nas externas, emissoras como a Rede Globo usam a UMJ (Unidade Móvel de Jornalismo).

Nas transmissões ao vivo de eventos mais importantes, como o carnaval ou uma solenidade política, usa-se uma unidade móvel de produção, veículo bem mais prepa-rado equipado com mesa de corte, ilha de edição e atém mesmo uma central técnica para o ajuste da imagem. caminhão com mesa de corte e mais de uma câmera. Trans-missões desse tipo são mais complicadas e precisam ser planejadas com alguma ante-cedência. Na cobertura de um desfile de escolas de samba, por exemplo, participam vários repórteres. Todos eles sabem os detalhes da cobertura e recebem indicações precisas de quando entrar e sair do ar. Geralmente os repórteres passam a vez através de deixas, como "a TV Tal é a melhor do carnaval". Todas as entradas ao vivo descritas acima ocorrem na forma de flash, uma das mais usadas em telejornalismo para levar ao público a idéia de imediatismo.

Page 79: Telejornalismo - Manual Completo

78

3.2.3 Perfil É fato universal que todo mundo gosta de aparecer. Em maior ou menor escala. Se

alguém não se enquadra neste caso, alguma coisa está errada. E não é a afirmação ini-cial. Também é fato universal que a vida dos outros é sempre mais interessante do que a nossa. Em maior ou menor grau. E se alguém não se enquadra também neste caso, alguma coisa está errada. E não é a proposição inicial. Por estas e outras razões é que Freud se transformou na aspirina para os problemas pessoais do século XX.

Veja a revista Time, em que a seção "Profile" é uma das mais lidas. Veja também um exemplo mais próximo: as seções de perfis dos jornais e revistas nacionais. Quem é fulano? De onde veio? O que fez para chegar aonde está? O que faz de tão interes-sante? E fulano, por sua vez, recortará a matéria do jornal ou gravará a reportagem da tevê para guardar como recordação. As emissoras costumam ter um setor de cópias trabalhando ininterruptamente. Copiam em fitas profissionais ou domésticas as parti-cipações de convidados e entrevistados em programas e telejornais.

Aqui interessa saber como dar conta visualmente de um perfil no telejornal. E a primeira coisa a pensar é que isso depende do estilo do telejornal. Se é apenas um no-ticiário, o perfil será rápido, deixando os detalhes para os jornais e as revistas. Um programa jornalístico com reportagens produzidas pode aprofundar um perfil. Se fu-lano é um ator famoso, é quase certo que o arquivo de imagens da emissora terá cenas dele representando em algumas peças e novelas. O setor de pesquisa também poderá ter revistas antigas em que fulano aparece em fotografias bonitas e significativas. Tu-do isso contribui para a produção de um perfil.

Este é um exemplo simples de um perfil em que o fundamental é comunicar idéias. O off introdutório do repórter teve o objetivo de preparar o telespectador para rece-ber informações de conteúdo subjetivo mais denso. Há outro tipo de reportagem em que o próprio entrevistado se encarrega de traçar o seu perfil. Um dos perfis mais bo-nitos foi feito com o escritor Antônio Fraga, autor, entre outros, do romance Desa-brigo. A repórter escolhida era novata em televisão. Desconhecia a técnica, mas tinha uma qualidade fundamental neste caso: era bonita e natural. Tinha um jeito especial de conquistar a simpatia dos entrevistados. E o importante no perfil do Fraga era dei-xar que o próprio escritor criasse o clima da entrevista. A inexperiência da repórter foi compensada pela experiência do cameraman.

3.2.4 A Reportagem Especial

Não se define reportagem especial pelo tamanho. Uma reportagem de dois minu-

tos pode ser especial para um jornal com duração total de dez minutos. Da mesma forma, uma reportagem de dez minutos pode ser especial para um telejornal de ses-senta minutos. Pressupondo o caráter relativo da definição de reportagem especial,

Page 80: Telejornalismo - Manual Completo

79

que depende do telejornal, é importante ressaltar o que em geral dá unidade ao termo: a produção. Num primeiro momento é preciso escolher o tema. As motivações po-dem ser muitas: uma data comemorativa, o lançamento de um livro, um acontecimen-to histórico, um fato de interesse geral (a poluição sonora, um seqüestro) etc. Tudo é pretexto para uma reportagem especial.

Ela pode pretender - o que é difícil - esgotar ou apenas abordar determinado aspec-to do assunto. Um exemplo: a data comemorativa do nascimento da fotografia, tema vasto e difícil de ser tratado em uma reportagem especial. Ao mesmo tempo, envolve tantos aspectos e locações que uma emissora gastaria milhares de dólares para fazer uma reportagem original e completa. Assim, pressupondo uma cobertura modesta e a mais completa possível, poderíamos planejar a reportagem com dez minutos de dura-ção, gravações em uma única localidade e utilização de imagens de arquivo.

Em primeiro lugar é preciso levantar todo o material impresso e visual existente na emissora. E para isso recorre-se ao departamento de pesquisa e ao arquivo de ima-gens. Como o tema é fotografia, muitas imagens vão ser fixas e reproduzidas de livros e revistas. Mas é preciso tomar cuidado para não se fazer uma reportagem monótona, sem ritmo, o que não significa falta de movimento. É possível produzir uma reporta-gem sobre fotografias com imagens fixas e com ritmo.

No momento em que se pergunta o que gravar, surge a necessidade de delimitar o campo de trabalho: que ramo da fotografia vai ser abordado na matéria? O levanta-mento prévio das imagens disponíveis na emissora e em outras descarta as soluções inviáveis. Com isso, concluímos que a reportagem deve falar dos 150 anos da fotogra-fia, mas destacando, principalmente, o fotojornalismo. Delimitado o tema, começa a segunda etapa na produção da reportagem: a coleta de imagens e as gravações exter-nas. Para mostrar um pouco da evolução técnica do equipamento, câmeras antigas fo-ram gravadas em estúdio e reproduzidas fotografias de revistas especializadas. Três fotógrafos em atividade foram escolhidos e contatados para entrevistas, cada um para falar sobre determinado aspecto da fotografia: um deles sobre a evolução da lingua-gem fotográfica; outro sobre o dia-a-dia do fotojornalista; e o terceiro para dar uma entrevista mais pessoal sobre o trabalho dele.

A equipe decidiu mostrar que até hoje existem profissionais que usam técnicas se-melhantes às dos pioneiros da fotografia: os "lambe-lambe". Assim, com poucas ex-ternas e bom material de arquivo, fez-se uma reportagem especial relativamente sim-ples. E sem sair da cidade ou mobilizar correspondentes em outros países. A reporta-gem ficou estruturada assim: - SOBE SOM inicial com imagens antigas - OFF sobre o surgimento da fotografia - ENTREVISTA com lambe-lambe - OFF sobre a evolução técnica do equipamento

Page 81: Telejornalismo - Manual Completo

80

- ENTREVISTA com um fotógrafo sobre a influência de Henri Cartier-Bresson no fotojornalismo - SOBE SOM com imagens de fotojornalista em ação - PASSAGEM do repórter apresentando outro entrevistado - ENTREVISTA com fotógrafo - OFF sobre a importância da fotografia no mundo moderno - SOBE SOM rápido com os entrevistados - SOBE SOM final com imagens em geral.

**********************

EXERCÍCIO Provão MEC 1998 - Considere como se as tabelas abaixo tivessem sido obtidas junto a uma das superintendências regionais da Polícia Rodoviária Federal.

Page 82: Telejornalismo - Manual Completo

81

A partir da análise e comparação das tabelas, elabore uma notícia sobre a segu-

rança do tráfego naquele trecho de rodovia, considerando os possíveis efeitos da en-trada em vigor do novo Código Nacional de Trânsito no dia 22 de janeiro de 1998. Utilize os dados para produzir um texto para TV, produzindo um script de ma-

téria de telejornal de aproximadamente um minuto (1'), incluindo: · colunas específicas para vídeo e áudio; · cabeça para o apresentador; · texto em off (sobre imagens de arquivo definidas a seu critério); · indicação de caracteres.

Page 83: Telejornalismo - Manual Completo

82

4. A ENTREVISTA NO TELEJORNALISMO Pode-se escrever todo um livro sobre a "arte e a técnica de entrevistar". Mas, aqui,

interessa descrever os tipos mais comuns de entrevistas em telejornalismo. É certo que cada um entrevista a seu modo. Há o entrevistador impaciente, que nunca deixa o entrevistado falar. Há também o entrevistador generoso, aquele tipo que deixa o en-trevistado falar até a exaustão e, depois, leva a maior reprimenda do editor ou diretor do programa. Há, enfim, todo tipo de entrevistador. Mas seja qual for o seu estilo, é importante respeitar algumas técnicas básicas para obter melhor resultado com o en-trevistado.

Como fazem os americanos, aqui vão algumas dicas para obter bons resultados nas entrevistas:

1) Pesquise a vida do entrevistado. Use o departamento de pesquisa ou consulte ou-tras pessoas. Leve tudo sobre a pessoa ou sobre o tema da entrevista.

2) Defina a entrevista, escolhendo enfoque e delimitando assuntos.

3) Planeje a entrevista com o câmera-man. Ele precisa estar a par do assunto que vai registrar. Talvez precise de equipamento ou acessório extra.

4) Evite perguntas gerais, do tipo "o que o senhor acha?" e "o que o senhor pensa so-bre isso?". Se o entrevistado for daqueles que gostam de falar, uma pergunta genérica pode significar respostas enormes.

5) Seja específico e direto. É difícil alguém driblar o repórter quando ele faz perguntas objetivas. O pior que pode acontecer é o entrevistado ficar mal diante do telespecta-dor ao dar respostas evasivas.

6) Mantenha o microfone diante do entrevistado por mais alguns segundos depois da resposta anterior. Muitas vezes a gente pensa que a entrevista acabou no momento em que começa a melhor parte.

7) Se possível, converse antes com o entrevistado para organizar melhor as idéias. Anote as perguntas, mesmo as que forem feitas durante a entrevista. Você vai precisar delas para fazer os contraplanos.

8) Evite o "ahn han!". O seu áudio interfere no do entrevistado. Ele também pode en-carar o "ahn han!" como aprovação e alongar as repostas.

4.1 Exclusiva

Exclusividade de informação envolve a noção de furo de reportagem: um fato rele-

vante que só um telejornal conseguiu registrar. Ele vai deter a exclusividade da veicu-lação daquela entrevista.

Page 84: Telejornalismo - Manual Completo

83

Um entrevistado pode falar individualmente sobre o mesmo assunto para repórte-res de emissoras diferentes. Neste caso, todos os repórteres fizeram entrevistas indi-viduais. Mas pode acontecer de o entrevistado anunciar um fato importante a apenas um dos repórteres. Neste caso, o editor pode chamar a entrevista de exclusiva. É uma questão de qualidade de informação.

Nos dois casos de entrevistas citados acima, individual ou exclusiva, os procedi-mentos técnicos são os mesmos. É obrigatório fazer contraplanos de todas as pergun-tas e gravar takes de apoio para a edição. Vamos supor que o entrevistado tenha inter-calado duas frases interessantes para o editor com uma explicação sem atrativos. O editor vai ter que cortar o que não interessa e juntar um trecho do início a outro do fim da entrevista. Essa "emenda" é feita eletronicamente. Se o editor não usar uma i-magem de um ou dois segundos para cobrir a emenda, o telespectador vai notar a di-ferença, o que em telejornalismo chama-se de pulo de imagem.

O pulo pode ser acentuado - ou explicitado, em lugar de suprimido - pelo uso de um efeito (fusão, cortina, congelamento de imagem) se a ilha de edição dispuser des-ses recursos. Eles são pouco usados nestes casos, mas são procedimentos técnicos mais éticos. 4.2 Coletiva

Existe ainda aquela entrevista em que o entrevistado, detrás de uma mesa, respon-

de às perguntas dos repórteres. É a mais tradicional e exige uma boa dose de organi-zação. No Brasil, esse tipo de entrevista não é muito comum. Mas, em ocasiões ex-cepcionais, as entrevistas coletivas acontecem. Como no seqüestro do publicitário Luís Salles. Ele reapareceu e houve duas coletivas à imprensa. Uma do irmão, Mauro Salles, e outra do próprio Luís, na verdade um depoimento com poucas interrupções.

Neste caso, as emissoras individualizaram a cobertura, não durante a gravação da coletiva, mas depois, na edição. Durante a coletiva, Luís Salles falou indistintamente para todas as emissoras. Na edição, uma emissora, por exemplo, separou o depoimen-to em blocos por tema. Na parte em que o publicitário narrou o seqüestro, a emissora usou caracteres (o seqüestro) sobre imagem frisada. Mais adiante, quando Luís Salles contou como foi a volta para casa, a emissora usou novamente caracteres sobre ima-gem frisada (a emoção), soltando o VT em seguida com o depoimento. Trata-se de um recurso de edição muito usado em entrevistas ou depoimentos longos onde o re-pórter tem pouco poder de intervenção.

Nos Estados Unidos a coletiva é uma prática comum das autoridades e de persona-lidades destacadas. Qualquer situação é pretexto para uma coletiva. Por exemplo, um caso de polícia. O policial responsável pelas investigações sempre dá uma coletiva no estilo tradicional: fica atrás de uma mesa cheia de microfones, enquanto repórteres e câmeras se posicionam à sua frente. Ainda nos Estados Unidos, o Presidente da Re-

Page 85: Telejornalismo - Manual Completo

84

pública costuma falar com freqüência aos jornalistas credenciados na Casa Branca. Os assessores instalam um microfone sobre um praticável e de lá o presidente fala aos re-pórteres, nem que seja para dar um bom dia. Mesmo assim, neste caso como no pre-cedente, é preciso todo um trabalho prévio de produção, que é preparar o local para a gravação ou geração, se a entrevista for ao vivo.

No Brasil, é muito comum os jornalistas literalmente aprisionarem o entrevistado na luta corporal por algumas palavras. Almir Pazzianotto, ex-Ministro do Trabalho, chegou a desenvolver uma técnica de falar à imprensa. Os jornalistas faziam um círcu-lo à sua volta e ele, bem no centro, respondia a pergunta de um repórter movendo a cabeça de um lado para o outro num ângulo de 180 graus. A imagem final era de um entrevistado falando a todos individual e indistintamente.

Em uma situação de cerco, o entrevistado não pode falar especificamente a quem fez a pergunta, porque a câmera de outra emissora, posicionada do lado contrário, vai registrar a imagem em ângulo inadequado. A solução é a fórmula Pazzianotto: mover a cabeça em semicírculo, para lá e para cá. De qualquer maneira, em coletiva o câmera-man tem que gravar tudo. Mais tarde o repórter decide o que fazer, como usar alguns segundos de imagens para um off resumindo partes da entrevista. Aqui, vale a lei do mais forte e do braço maior. Quem estende o microfone mais rápido tem prioridade de resposta. O repórter inexperiente pega carona dos outros. É só esticar o braço.

Por exemplo, uma reportagem sobre a decisão do governo de importar gasolina. O ministro vai falar aos jornalistas e convoca uma coletiva. Vamos supor que ele se co-loque de pé, diante de um batalhão de repórteres, e fale durante trinta minutos. O re-pórter estruturou a matéria assim:

4.3 Estúdio

A entrevista de estúdio costuma ser um pouco maior, dependendo do telejornal. Se

ele tiver uma sessão de entrevistas, melhor ainda. Um exemplo é a entrevista especial de sábado do telejornal Hoje, da TV Globo. Um telejornal de rede no horário nobre, como o Jornal Nacional da mesma emissora, dificilmente faz entrevistas em estúdio.

A entrevista de estúdio precisa de clima e tempo. Um telejornal noticioso não tem clima para entrevista de estúdio, principalmente no horário considerado nobre, entre novelas. A entrevista de estúdio reduz o ritmo do jornal, estanca a sucessão de fatos e imagens do noticiário. Assim, o mais adequado é deixar esse tipo de entrevista para telejornais da tarde ou de fim de noite.

- OFF com imagens de postos sobre a falta de gasolina - PASSAGEM do repórter diante do posto dizendo que o Governo resolveu importar gasolina - OFF com imagens da coletiva em que o Ministro anunciou as medidas - SOBE SOM da entrevista com o Ministro.

Page 86: Telejornalismo - Manual Completo

85

Além do TJ Brasil, outro telejornal com cenário adequado para entrevistas é o Bom Dia Brasil, da TV Globo, cuja bancada permite a participação de convidados. Assim, fazer ou não entrevista de estúdio ao vivo é uma decisão que envolve o estilo do tele-jornal e a conveniência política da emissora. E isso tem que ser levado em considera-ção na hora de se projetar o cenário do telejornal.

A entrevista de estúdio pode também ser gravada e editada, como é o caso do tele-jornal Hoje. A gravação permite maior controle sobre o tempo (e o conteúdo!) da entrevista. Durante a gravação, os produtores seguem uma espécie de cartilha de pro-cedimentos técnicos que, depois, facilitam a edição. As entrevistas são feitas, geral-mente, com pelo menos duas câmeras cruzadas, o que não impede que se faça com apenas uma. No caso de duas câmeras, uma focaliza o entrevistador e a outra o entre-vistado. As cadeiras ou mesa têm que estar colocadas de tal forma que permitam o cruzamento de câmeras. Um ângulo de 45 a 90 graus facilita o trabalho de câmera.

Não é regra, mas geralmente a entrevista começa com uma câmera fechada no en-trevistador, enquadrado em PMA (plano médio aproximado) ou em close. O entre-vistador introduz o assunto enquanto a câmera faz o movimento zoom out até en-quadrá-lo junto com o entrevistado. O entrevistador faz a primeira pergunta e o dire-tor de TV pode cortar para o entrevistado, mostrando-o à espera da completa formu-lação da pergunta para iniciar a resposta. Isso depende do estilo que se quer dar à en-trevista.

Se a entrevista é longa, torna-se importante fazer alguns movimentos de câmera para variar os enquadramentos. De vez em quando o diretor de TV faz cortes mos-trando o entrevistador olhando atento para o entrevistado. Nas perguntas, corta para o entrevistador. Por isso é importante que as câmeras estejam cruzadas. O cruzamen-to é fundamental para que o entrevistado fique de frente para o telespectador. A parte superior da câmera tem uma luz vermelha que acende quando está gravando. É o sinal de alerta para que a pessoa focalizada olhe para aquela câmera, especificamente.

Mesmo com todo esse cuidado de movimentar as câmeras, variar planos etc., é fundamental fazer, quando a entrevista não é ao vivo, os tradicionais contraplanos: as perguntas do entrevistador são regravadas para serem usadas depois durante a edição. São feitos também takes de apoio que podem ser necessários à edição. Os takes de apoio podem ser imagens do entrevistador olhando para o entrevistado, big closes das mãos e outros detalhes significativos.

A entrevista de estúdio raramente é espontânea. Em primeiro lugar, porque é feita com a parafernália técnica e muita gente em volta. Deve-se descontrair o entrevistado, até mesmo para que a entrevista renda mais. Prática comum é conversar com o entre-vistado antes da gravação. Claro que não se deve quebrar o fator surpresa; mas é pre-ciso definir com o entrevistado as regras da conversa: comportamento diante da câ-mera, tempo de duração da entrevista e limite dos temas a serem abordados.

Page 87: Telejornalismo - Manual Completo

86

O diretor, editor ou produtor responsável pelo programa deve acompanhar a en-trevista. Ao lado do diretor de TV, ele pode passar informações e dicas para o entre-vistador: como está de fora, pode ter uma visão mais objetiva e melhor avaliar o ren-dimento da entrevista. 4.4 "Povo Fala"

Há quem considere o "povo fala" ou "fala povo" como o canal de retorno da infor-mação em tevê. Não é bem assim, mas as entrevistas de rua com o povo, se não resol-vem um dilema teórico da comunicação, pelo menos ajudam a solucionar um proble-ma de audiência. Recurso simples, mas de muito dinamismo, o "povo fala" dá mais vi-da a uma reportagem ou a um telejornal quando é usado como seção fixa. Nestes ca-sos, usa-se uma vinheta identificando a seção: povo fala, fala povo, tribuna do povo etc. Os temas podem ser variados e sem qualquer relação com o restante do telejor-nal, ou podem ser "ganchos" para alguma reportagem. Por exemplo, uma reportagem especial sobre consumo. O "povo fala" pode ser uma pergunta para todas as pessoas: "o que pesa mais no seu orçamento do mês?". No telejornal, o "povo fala" antecederia a reportagem sobre consumo.

O povo pode falar também dentro de uma reportagem específica, como a citada a-cima sobre o consumo. Em vez de editar o "povo fala" em fita à parte, o editor chefe decide incorporar as entrevistas com os populares à estrutura da reportagem especial. Um dos programas mais inteligentes surgidos nos anos 80 em televisão era baseado no fala povo. O Olhar Eletrônico, veiculado inicialmente pela TV Cultura de São Paulo e depois pela TVE do Rio de Janeiro para, finalmente ser, incorporado durante algum tempo ao Fantástico da TV Globo, era, na verdade, um "fala povo" criativo que explorava os efeitos das perguntas aparentemente ilógicas. Por exemplo, "o que há depois do horizonte?". Esta pergunta rendeu um dos programas mais bonitos na fase do Olhar Eletrônico na TV Cultura.

- Além do horizonte é o sonho - respondeu o senhor de cabelos brancos. (Quem editou o programa usou então a imagem de um avião cruzando o horizonte com uma música adequada ao clima.)

- E além do sonho? - perguntou o repórter. - Além do sonho, o nada - respondeu o entrevistado, com o repórter dando se-

qüência à série de perguntas do mesmo tipo. Se nem todas as respostas foram exatamente como essas, as palavras tinham senti-

dos semelhantes. O que importa observar é que, a uma série de perguntas objetiva-mente feitas, os entrevistados deram respostas subjetivas, valorizadas na edição com extremo bom gosto.

Page 88: Telejornalismo - Manual Completo

87

5. PRODUÇÃO e EDIÇÃO do TELEJORNAL

O que é produção em tevê? O que faz um produtor de televisão? Ao contrário do cinema, em telejornalismo produção não é sinônimo de capital, mas de trabalho.

Há um tipo de produtor que ainda pode ser comparado ao de cinema. É o produ-tor de vídeo. Geralmente é dono de uma produtora, tem algum capital e contrata os serviços de outros profissionais. Tem parentesco com o produtor de telejornal por causa do veículo. O produtor, mesmo de telejornalismo, trabalha para que repórteres e editores cumpram adequadamente as suas funções.

O produtor não precisa ser jornalista. Na maioria das vezes, nem faculdade ele cur-sou. O diploma só é exigido nas cidades em que há alunos formados em radialismo por alguma faculdade de comunicação. Muitos produtores, no entanto, são formados em jornalismo, o que ajuda muito no desempenho profissional.

Mas o que interessa aqui, no momento, são as funções de produção em telejornal. a) Produtor de reportagem: Esse tipo de produtor não é muito comum entre nós. De vez em quando ele entra em moda e tem bastante trabalho: sai a todo momento para todo tipo de reportagem. Mas, na maioria das vezes, trabalha somente em repor-tagens especiais. Nos Estados Unidos, um produtor de reportagem descobre assuntos interessantes, faz contatos, marca entrevistas, acerta as equipes de externa, dirige o repórter nas gravações, edita o material produzido e, finalmente, acompanha a exibi-ção. É uma espécie de faz-tudo, que cuida dos mínimos detalhes de uma reportagem, deixando ao repórter a tarefa de aparecer. No Brasil também há produtores semelhan-tes, fundamentais em grandes reportagens. As matérias de rotina (entrevistas, aciden-tes comuns etc), no entanto, podem ser feitas apenas pelo repórter. Mas um grande evento ao vivo, como a cobertura de uma visita do Papa a uma favela, exige o trabalho de uma equipe e a presença fundamental do produtor. b) Produtor de Notícia: Já se falou alguma coisa do produtor de notícia: aquele jor-nalista que trabalha na "cozinha" da redação. Mantém contato permanente com as su-cursais e os correspondentes. Toma conhecimento das produções em andamento nos Estados e em outros países, e também sugere assuntos. O produtor de notícia partici-pa das reuniões com os editores, quando relata o que apurou nos contatos e recebe novas sugestões para serem repassadas. Ele é uma espécie de ponte entre a redação da emissora cabeça de rede e as emissoras afiliadas.

c) Produtor de Redação: Entende-se aqui como produtor de redação aquele profis-sional da produção que exerce funções dentro da emissora, geralmente não ligadas à produção de notícias.

Page 89: Telejornalismo - Manual Completo

88

d) Geração/Recepção: É outra atividade essencial em telejornalismo exercida pelo produtor. Um telejornal não inclui apenas reportagens feitas na cidade sede da emis-sora. Muitas são feitas em outros Estados e mesmo no exterior, através dos corres-pondentes. Além disso, os telejornais recebem imagens das agências internacionais de notícias, como a UPI, a Visnews e outras que têm serviço diário distribuído às emis-soras de todo o mundo. As emissoras possuem no seu quadro de funcionários técni-cos especializados em lidar com equipamentos, como os videocassetes utilizados para a gravação de reportagens enviadas pelos Estados. Mas a responsabilidade de receber e gravar as imagens é, geralmente, da produção do telejornal. Da mesma forma, os pro-dutores, além da recepção dessas imagens, fazem o trabalho inverso, isto é, geram ou enviam matérias feitas pela reportagem do jornalismo da emissora.

e) Exibição do Telejornal: O produtor é responsável também pela exibição do tele-jornal, seja ele gravado ou ao vivo. Não pela parte técnica da exibição, mas pelo traba-lho de controle e organização operacional do que está determinado no script. Quando o telejornal vai ser exibido, toda a produção trabalha, cada qual com uma tarefa: um leva o script à mecanografia para tirar cópias e distribuí-las a todos os que participam da operação de levar o telejornal ao ar; outro fica responsável pela organização e a-companhamento das fitas com as matérias editadas; um terceiro se encarrega de con-trolar o teleprompter; e assim por diante.

O produtor executivo é aquele que coordena a equipe e acompanha a feitura do s-cript ao lado do editor chefe. Ele tem que zelar o tempo todo pelo cumprimento dos prazos previstos, e também fechar o telejornal junto com o editor chefe porque, na hora da exibição, geral-mente é ele que assume o comando. Ele mantém na equipe uma série de produtores assistentes, pelos quais é responsável.

A presença do produtor é fundamental em televisão. Não adianta uma emissora ter uma equipe de bons jornalistas, editores ou repórteres, se os produtores não estão preparados para dar o suporte operacional adequado. Inevitavelmente, então, os jor-nalistas vão "morrer na praia".

5.1 A Edição do Telejornal

Editoria aqui deve ser entendida como setor e processo de produção responsável pelo acabamento técnico da notícia para que ela possa ser veiculada junto com outras em um telejornal. Podemos dividir a editoria em edição e editoria propriamente dita.

Edição é o processo de acabamento do material informativo bruto, a partir de um conjunto de técnicas, com o fim de torná-lo compreensível e veiculável por um tele-jornal. O profissional que executa esse trabalho é o editor.

Editoria é uma conjugação de experiência e normas técnicas adquiridas com as quais é possível organizar e relacionar notícias e informações em um telejornal, se-

Page 90: Telejornalismo - Manual Completo

89

gundo a política editorial da emissora. O profissional que executa esse trabalho tam-bém é um editor. O termo editoria refere-se, ainda, a setores no departamento de jornalismo, como economia, política, cultura etc. 5.1.1 Editorias

O editor chefe controla todas as editorias, revisa os textos e faz a avaliação geral do

telejornal junto com os editores setoriais. Ele decide o que entra no telejornal. À pri-meira vista, pode parecer todo-poderoso, mas suas decisões são tomadas ouvindo os editores setoriais. Em linhas gerais, podemos dividir as editorias de um telejornal em seis, embora esse número varie de acordo com a estrutura do jornalismo de cada e-missora: economia, política, nacional, internacional, esporte e cultura.

Essa divisão serve para um telejornal nacional. Os telejornais locais ou regionais funcionam de outra forma, geralmente com apenas um editor chefe e uma equipe de editores de texto. Cada editoria tem um editor responsável, que por sua vez pode ter na equipe dois ou mais editores de texto.

A estrutura de um telejornal pode ser resumida assim, ressalvando as diferenças por emissoras: a) EDITOR CHEFE b) EDITORIAS (ECONOMIA NACIONAL POLÍTICA INTERNACIONAL ESPORTE CULTURA)

Essa é uma estrutura tradicional, atualmente pouco usada em função de da redução de custos e porque uma estrutura enxuta torna-se mais operacional. A Rede Globo, por exemplo, trabalha com editorias Internacional, Rio (local) e Esporte. E isso basta para dar conta de todos os assuntos veiculados diariamente.

As editorias trabalham integradas. O telejornal é resultado de um trabalho de e-quipe, no qual o editor chefe é o profissional que dá unidade ao conjunto. Acima dele estão o diretores de jornalismo da emissora. Apesar de aparentemente ter um telejornal nas mãos, o editor chefe não tem o poder de fazer o que bem entende. Ele segue a linha editorial da emissora. Muitas vezes o editor chefe é vencido numa discussão sobre o enfoque de matérias, mas na hora deci-siva a palavra final é sua. 5.1.2 Considerações técnicas

Antes de falarmos sobre edição, é preciso fazer algumas considerações técnicas e-

lementares sobre televisão. O olho humano apresenta um fenômeno chamado persis-tência da visão, que é o tempo em milissegundos que a imagem permanece no cérebro depois de sair da retina. Assim, uma freqüência de amostragem de imagens estáticas pode dar a idéia de movimento, desde que a troca de imagens aconteça em menor

Page 91: Telejornalismo - Manual Completo

90

tempo que o da persistência da visão. Um fenômeno físico tornou possível o cinema e a televisão.

No cinema, a freqüência de amostragem de 24 fotogramas por segundo resolveu o problema do movimento, mas o olho humano percebia uma cintilação na tela causada pela variação da intensidade luminosa. A solução para mais este problema foi mostrar o fotograma duas vezes. Assim, chegamos às condições técnicas do cinema: uma fre-qüência de amostragem de 24 quadros por segundo com uma freqüência de cintilação de 48 quadros por segundo.

Na televisão, a imagem depende da freqüência da rede elétrica, que no Brasil é de 60 Hertz. Nossa freqüência de cintilação é de 60 quadros por segundo para uma fre-qüência de amostragem de 30 quadros por segundo. Já nos países onde a freqüência da rede elétrica é de 50 Hertz, como na Europa, a imagem na tevê se forma com uma freqüência de cintilação de 50 quadros por segundo e uma freqüência de amostragem de 25 quadros por segundo.

A imagem na tevê aparece quando um feixe de elétrons bombardeia os pontos lu-minosos da tela do aparelho em movimentos contínuos da esquerda para a direita, de cima para baixo. Esse movimento é chamado varredura, e duas varreduras formam um quadro, que em vídeo chama-se frame. Na primeira varredura, o feixe de elétrons tra-ça as linhas ímpares formando um campo; na segunda, traça as linhas pares formando outro campo. Dois campos de 262,5 linhas formam um quadro de 525 linhas horizon-tais.

Portanto, quando se diz, no Brasil, que o nosso padrão de televisão é o M, enten-de-se por isso que a imagem da nossa tevê é formada com 525 linhas por quadro e 60 campos por segundo. Na maioria dos países europeus, o padrão G emprega 625 linhas por quadro e 50 campos por segundo.

Os padrões acima são adotados para transmissões monocromáticas de televisão. Nas transmissões a cores, os padrões combinam com os sitemas adotados por cada país: nos Estados Unidos, o NTSC (National Television System Comittee); na maio-ria dos países europeus, o SECAM (Séquentiel Couleurs avec Mémoire) e o PAL. No Brasil, buscou-se um sistema que permitisse a recepção simultânea em preto e branco e a cores. Foi criado o PAL-M (Phase Alternative Line), a união do sistema de cores alemão M com o padrão norte-americano em preto e branco, o que resultou numa in-compatibilidade com sistemas e padrões de outros países. Na reprodução de uma fita NTSC nós vemos a imagem mas não as cores; se a fita é SECAM, não há reprodução da imagem por causa da diferença de padrão, isto é, freqüência de campo.

A edição em tevê é eletrônica, ao contrário do cinema, que é mecânica. No filme cinematográfico há um corte físico na fita que depois é emendada com uma fita adesi-va. Já no VT, os cortes e as emendas são feitos eletronicamente, sem afetar fisicamen-te a fita magnética.

Page 92: Telejornalismo - Manual Completo

91

EXERCÍCIOS

PROVÃO 1999. O que é edição não-linear e qual o seu impacto no processo de produção da mídia eletrônica (rádio e TV)? Se não encontrar informações suficientes na apostila, pesquise.

5.1.3 A Edição de Matérias

As edições de matérias para um telejornal são feitas, em geral, por dois profissio-

nais: o editor de texto e o editor de imagem. Eles trabalham em conjunto. A palavra final na edição é a do editor de texto, em última instância o responsável pela matéria. O editor de imagem, que em algumas emissoras recebe o nome de editor ou operador de VT, é quem opera o equipamento de edição. A esse equipamento básico pode-se acrescentar outros, como uma mesa de efeitos, gerador de caracteres etc. Todo esse equipamento, distribuído em um espaço relativamente pequeno, recebe o nome de ilha de edição.

O processo de edição de uma reportagem em tevê pressupõe etapas:

a) DECUPAGEM - é a primeira coisa a ser feita pelo editor de texto juntamente com o editor de imagem. Decupagem é o ato de ver e ouvir seletivamente todo o material bruto gravado em fita videocassete, incluindo o off do repórter e as entrevistas. No ato da decupagem as imagens, sobe sons e trechos de entrevistas mais importantes são anotados na ordem direta da gravação, o que pode ser feito pelo conta-giros ou pelo indicador de tempo do VCR player. O editor anota as voltas da fita ou o time code (código de tempo) e as informações correspondentes que neste caso devem ser entendidas como informações audiovisuais.

Aí está um exemplo simples de decupagem feita de forma mais clara. Geralmente, para economi-zar tempo, o editor simplifica as informações criando quase que um código particular em que cita apenas uma palavra chave relacio-nada à imagem ou áudio gravados. A decupagem pode ser feita em folha apropriada ou em um peda-ço de papel que pode ou não ser guardado na caixa com a fita.

Exemplo de Decupagem 00:10 - VISUAIS DE ÁRVORES 00:36 - VISUAIS DO CÉU 00:47 - "DA AMENDOEIRA" 01:05 - CLOSE DO TRONCO 09:12 - ENTREVISTA COM ECOLOGISTA 09:40 - FALA SOBRE ÁRVORE E VIDA 12:20 - CABEÇA DE PASSAGEM DA RE-PÓRTER 12:57 - REPETIÇÃO 13:19 - OFF

Page 93: Telejornalismo - Manual Completo

92

b) EDIÇÃO - A idéia geral que vai direcionar a edição é desenvolvida durante a de-cupagem. O editor seleciona as imagens e os áudios à medida que decupa o material. Depois da decupagem, passa ao editor de imagem a idéia geral da edição e pode deixar com ele a execução da tarefa. Isso depende do esquema de trabalho na emissora. Mui-tas vezes o editor de texto acompanha a edição até o final.

Em telejornalismo, ao contrário da montagem em cinema, não se pode abusar dos tipos de edição. A mais comum e apropriada ao telejornal é a edição narrativa linear, que segue uma ordem lógica e cronológica. Em telejornal quase não se vê edição in-vertida (flashback) ou paralela (faz surgir a significação pela justaposição de relatos).

Para citar um exemplo, vamos supor que o material bruto de uma reportagem so-bre um acidente de trânsito tem a seguinte ordem de gravação:

- IMAGENS DIVERSAS DO ACIDENTE ENTRE CARROS - ENTREVISTA COM UMA TESTEMUNHA - PASSAGEM DO REPÓRTER - IMAGENS DO TRÂNSITO ENGARRAFADO - ENCERRAMENTO DO REPÓRTER NO HOSPITAL - OFF EM DUAS PARTES NARRANDO O ACIDENTE

Na edição, a primeira coisa a ser feita é montar a estrutura ou o esqueleto da maté-

ria colocando, na ordem: - PRIMEIRO OFF (COMO FOI O ACIDENTE) - PASSAGEM (APRESENTA A TESTEMUNHA) - ENTREVISTA DA TESTEMUNHA - SEGUNDO OFF (CONSEQÜÊNCIAS: ENGARRAFAMENTO) - ENCERRAMENTO (HOSPITAL: FERIDOS) A seqüência acima é passada da fita bruta, com imagens e áudios variados, para

uma fita de edição previamente preparada, isto é, com as imagens antigas apagadas. Depois de montada a estrutura da matéria na fita record - ou de edição -, o editor in-sere as imagens, fazendo o que na gíria televisiva se chama de "cobrir a matéria".

No processo de cobertura, as imagens têm que coincidir com as informações cita-das pelo repórter em off. Por exemplo, não se pode colocar imagens de pessoas quan-do o repórter diz que o "carro ficou totalmente destruído". Da mesma forma, não se pode colocar sobre o off imagens de trânsito engarrafado quando o repórter diz que "muita gente passou a manhã aqui, diante desta padaria".

Uma matéria - ou reportagem - de telejornal tem que ter ritmo. Não deve ter, por exemplo, um off muito grande seguido de uma entrevista curta ou vice-versa. A nar-

Page 94: Telejornalismo - Manual Completo

93

rativa linear precisa de atrativos. Na verdade, uma reportagem de telejornal é como se fosse uma história bem contada, com princípio, meio e fim, e a vantagem adicional de ter imagem e som.

Veja três seqüências narrativas de um acidente de bicicleta: - A primeira tem uma cena maior cobrindo o off, que na edição antecede a passagem do repórter e uma en-trevista. Na segunda seqüência, a reportagem tem uma entrevista seguida do off e o encerramento do repórter. Nos dois casos, a edição ficou sem ritmo. Visualmente é possível concluir que a terceira seqüência é mais harmoniosa. Neste caso, o editor di-vidiu o off do repórter em dois, intercalando-o com a passagem.

Muitos recursos técnicos podem ser usados na edição. Uma ilha de edição moder-na permite ao editor fazer o que quiser com a imagem: editá-la como se virasse uma página de livro; frisar um quadro, isto é, congelar a imagem e deslocá-la para qualquer lugar da tela do monitor; ou recortar a imagem em mil pedaços, reconstruindo-a no-vamente. Enfim, os recursos técnicos são muitos e variados, mas nem todos são usa-dos em telejornalismo, porque o excesso de efeitos cansa o telespectador. Em telejor-nalismo, a pirotecnia só deve ser usada para reforçar uma informação, ou caimos no exercício do formalismo. c) MIXAGEM/SONORIZAÇÃO - muitas vezes uma reportagem exige várias to-madas de cena com diferentes níveis de som. Uma entrevista, por exemplo, mantém um único nível de áudio. Uma manifestação estudantil em conflito com a polícia, po-rém, tem maior variedade de níveis de áudio: gritos, tiros, entrevistas etc. O câmera-man ou o operador de VT gravam o som em apenas um canal de áudio, 1 ou 2. Na e-dição, se o editor quiser manter o som ambiente em BG (background), com o off do repórter mais alto, vai ter que balancear o áudio para mantê-lo uniforme sem atrapa-lhar a narração. Isto é feito mixando off e som ambiente depois da matéria montada, isto é, estruturada e coberta, compensando assim as diferenças de áudio. Se o editor quiser pode também sonorizar a matéria. A fita passa então para outro profissional de televisão, o sonoplasta, que pode acrescentar à matéria determinada música ou ruído, mexendo novamente nas trilhas de áudio. d) FICHAMENTO - também é fundamental no processo de edição, apesar de ser aparentemente uma tarefa burocrática. A ficha de edição deve conter informações ge-rais sobre a matéria editada: nome do jornal, nome da matéria, tempo, se tem áudio ou não, nome do editor, número da fita, número da ilha, data de edição e outras ob-servações necessárias. Em algumas emissoras anota-se também a deixa final da maté-ria.

A perda da ficha de edição de uma fita pode ocasionar um desastre. Diariamente, a edição de um telejornal manipula inúmeras fitas. O que fazer se uma ficha de edição desaparece na hora da exibição do telejornal? Uma alternativa é ter um caderno de e-

Page 95: Telejornalismo - Manual Completo

94

dição, onde são anotados o número da fita e o nome - ou retranca - da matéria. O ca-derno pode ser consultado em caso de emergência. É preciso ter muito cuidado tam-bém com a troca de fichas. O que fazer se alguém troca as fichas de caixa? Na hora do sufoco, é impossível conferir todas as caixas. Para simplificar o processo e garantir maior segurança, algumas emissoras colocam adesivos nas fitas em vez de fichas sol-tas, eliminando também as caixas na hora da exibição.

EXERCÍCIO PROVÃO MEC 2003 - Considere o depoimento abaixo, do líder indígena Ailton Krenak, como tendo sido gravado para a televisão, na aldeia dos índios Krenak, em Minas Gerais. A partir de seu conteúdo, planeje a produção e edição de uma repor-tagem para um telejornal regional, com duração máxima de três minutos. Aponte, no planejamento, as informações necessárias para a contextualização da matéria, como e onde irá obtê-las, descrição de imagens e arte que irá precisar, além de su-gestão e roteiro de entrevistas complementares. Antes de iniciar o planejamento, in-dique qual será o enfoque da matéria, levando-se em conta o conteúdo do depoi-mento.

Ailton Krenak foi empossado pelo governador Aécio Neves, no dia 15 de abril de 2003, no cargo de assessor para assuntos indígenas do Governo de Minas Gerais. Na sua posse, o povo Krenak cantou e dançou nos jardins do Palácio da Liberdade. Representante dos Direitos Indígenas na Constituinte de 1988, ele é autor do livro O lugar onde a terra descansa.

“Você me perguntou, há pouco, sobre minha educação e alfabetização. Para

mim e para meu povo, ler e escrever é uma técnica, da mesma maneira que alguém pode aprender a dirigir um carro ou a operar uma máquina. Então, a gente opera essas coisas, mas nós damos a elas a exata dimensão que têm. Escrever e ler para mim não é uma virtude maior do que andar, nadar, subir em árvores, correr, caçar, fazer um balaio, um arco, uma flecha ou uma ca-noa.

Acredito que, quando uma cultura elege essas atividades como coisas que têm valor em si mesmas, está excluindo da cidadania milhares de pessoas para as quais a atividade de escrever e ler não tem nada a ver. Como elas não escrevem e não lêem, também nunca serão parte das pessoas que decidem, que resolvem. E, quando aceitei aprender a ler e escrever, encarei a alfa-betização como quem compra um peixe que tem espinha. Tirei as espinhas e escolhi o que eu queria. Acho que a maioria das crianças que vão hoje para a escola e que são alfabetizadas é obrigada a engolir o peixe com espinha e tudo. É uma formação que não atende à expectativa delas como seres huma-nos e que violenta sua memória. Na nossa tradição, um menino bebe o conhe-cimento do seu povo nas práticas de convivência, nos cantos, nas narrati-vas. Os cantos narram a criação do mundo, sua fundação e seus eventos.

Page 96: Telejornalismo - Manual Completo

95

Então, a criança está ali crescendo, aprendendo os cantos e ouvindo as narrativas. Quando ela cresce mais um pouquinho, quando já está aproxima-damente com seis ou oito anos, aí então ela é separada para um processo de formação especial, orientado, em que os velhos, os guerreiros, vão iniciar essa criança na tradição. Então, acontecem as cerimônias que compõem essa formação e os vários ritos, que incluem gestos e manifestações externas. Por exemplo, você fura a orelha. Fura o lábio para colocar o botoque. De-pendendo de qual povo a que você pertence, você ganha sua pintura corpo-ral, seu paramento, que vai identificar sua faixa etária, seu clã e seu grupo de guerreiros.

Esses são os sinais externos da formação. Os sinais internos, os sinais subjetivos são a essência mesma daquele coletivo. Então, você passa a com-partilhar o conhecimento, os compromissos e o sonho do seu povo. As gran-des festas se constituem em instantes de renovação permanente do compro-misso de andar junto, de celebrar a vida, de conquistar as suas aventuras. Então, de maneira resumida, a nossa tradição consiste nesses eventos. A formação é isso”.

(Trecho da entrevista concedida por Ailton Krenak a Eugênio Bucci e Alí-pio Freire, out. de 2002.)

5.2 O Telejornal

Num país com alto índice de analfabetismo, o telejornal é o principal meio de in-formação para milhões de pessoas. Compare-se a tiragem de um grande jornal brasi-leiro (200/300 mil exemplares) e a audiência do Jornal Nacional da TV Globo, atin-gindo milhões de brasileiros em todo o país. Além disso, há várias edições de telejor-nais durante o dia, muitas vezes repetindo a mesma notícia, alterada apenas na forma. Como o público de televisão é muito variado no decorrer do dia, os telejornais são produzidos para atingir faixas diferenciadas de telespectadores.

Considerando a abrangência, o telejornal pode ser nacional ou local. Nacional é o telejornal em rede, alcançando o maior número possível de regiões. Os telejornais lo-cais são veiculados para uma única região ou Estado.

Considerando o horário, há quatro tipos de telejornais: 1 - MATUTINO 2 - VESPERTINO 3 - NOTURNO 4 - FIM DE NOITE O telejornal é fruto de um processo de produção contínuo que tem início na edito-

ria de pauta. Lá os assuntos são arquivados, agendados e selecionados. Alguns preci-sam de produção: levantamento de informações adicionais, locações e marcação de entrevistas. Os produtores da editoria de pauta fazem esse tipo de trabalho. Com ba-se na pauta, o chefe de reportagem seleciona os assuntos e cobre o que considera mais

Page 97: Telejornalismo - Manual Completo

96

importante na cidade. Nas outras regiões ou Estados, as chefias são mobilizadas pelos produtores de jornalismo. No final do dia, todo o material produzido convergiu para um único ponto: a emissora cabeça de rede que edita e gera o telejornal.

As equipes de editores e produtores dos telejornais de rede fazem reuniões diárias para discutir pautas e planejar o jornal. O trabalho de produção do telejornal começa na véspera do dia da exibição, logo após o término da edição anterior. O editor chefe se reúne com os editores e produtores e ouve o editor de pauta sobre os assuntos a-gendados para o dia seguinte. Os assuntos são discutidos e aprovados. Logo em se-guida, o editor de pauta transmite a pré-pauta por telefone, computador, telex ou fax para as outras emissoras da rede. 5.2.1 O espelho No dia seguinte, pela manhã, os pro-dutores checam a agenda com as pra-ças, sugerem matérias e cobram outras a partir da leitura dos jornais do dia. No final da manhã acontece a primeira reunião do editor chefe com os produ-tores locais e editores de outras pra-ças. As sucursais participam por tele-fone ou através de linha direta com a emissora sede. Ao fim da reunião, está pronto o primeiro "espelho" do tele-jornal.

No meio da tarde, editor chefe e editores de área se reúnem e fecham o espelho, definitivo até que um fato novo aconteça. O espelho está sujeito a mudanças com a chegada de notícias, reportagens etc. O exemplo ao lado é de um espelho resumido, em que há indicações de VTs ou notas seguidas de informações sobre a origem: Rio de Janeiro, Bahia etc. Dependendo das normas da emissora, outras informações podem entrar no espelho, como as iniciais das praças geradoras: BC (Brasil Central), TVU (TV Universitária) etc. Cada emisso-ra tem um código na Embratel para facilitar o tráfego diário de comunicações entre elas. As cidades também recebem um código: PAE é Porto Alegre, RCE é Recife, SPO é São Paulo etc. É importante notar que, nas redações informatizadas, todo pro-

Abaixo, um exemplo de espelho: QUINTA-FEIRA, 05 MAIO, 1990 1 - VT-PE FRIGORÍFICOS 2 - VT-CE MACONHA 3 - NOTA POLÍCIA FEDERAL 4 - VT-RJ APREENSÃO ARMAS 5 - VT-BSB CÃES FAREJADORES 6 - PASSAGEM 7 - VT-LON THATCHER (CORRESPONDENTE) 8 - VT-VISNEWS POLÔNIA 9 - VT-VISNEWS ALEMANHA 10- NOTAS-VÁRIAS-INTERNACIONAL 11- VT-NY TERREMOTO (CORRESPONDENTE) 12- NOTAS-VÁRIAS 13- ARTE NACIONAL - LOTO 14- VT-SP SENA 15- PASSAGEM 16- VT-MG GREVE BANCÁRIOS 17- VT-RJ GREVE BANCÁRIOS 18- NOTAS 19- VT-RS GREVE COMERCIÁRIOS 20- VT-BSB COMENTARISTA 21- VT-MA PRESIDENTE 22- PASSAGEM 23- VT-BSB ECOLOGIA 24- VT-AM FLORESTA 25- NOTAS 26- VT-BA CHAPADA 27- BOA NOITE

Page 98: Telejornalismo - Manual Completo

97

cesso de produção de um telejornal é feito em computadores. O editor chefe de um telejornal faz os espelhos no computador. Só ele tem acesso ao script a partir do mo-mento em que considerar fechada a edição.

O espelho acima mostra que a emissora não faria o telejornal apenas com os VTs de uma única praça, como Rio de Janeiro ou São Paulo. Um telejornal realmente na-cional depende do Sistema Nacional de Telecomunicações, administrado pela Embra-tel. As emissoras compram serviços da empresa para gerar e receber matérias e pro-gramas. Um dos serviços é chamado de multi, porque várias emissoras podem gerar matérias dentro do horário programado. Abaixo, um esquema- exemplo de multi:

No exemplo, cada emissora tem seis minutos para gerar as matérias que vão ser ve-iculadas pelo telejornal. Geralmente as matérias vêm editadas, mesmo porque não há tempo de gerar reportagens brutas. A emissora cabeça de rede reedita as matérias de acordo com as necessidades do telejornal. Até os primeiros anos da década de 1970, o material jornalístico internacional chegava ao Brasil de avião com um ou dois dias de atraso. O primeiro acordo da TV Globo com a UPI para receber imagens via satélite aconteceu em 1974. A recepção do material internacional também está indicada no espelho. O editor chefe selecionou matérias internacionais e correspondências de re-pórteres no exterior: Londres e Nova Iorque, VTs 7 e 11 do espelho. Neste caso, a emissora compra horário da Embratel para receber gerações das duas cidades, via saté-lite internacional. As outras matérias foram geradas por agências internacionais, como a UPI e a Visnews.

Hoje, o acesso às imagens do que acontece no mundo é muito mais fácil. A pre-sença de uma rede como a CNN, principalmente depois da Guerra do Golfo, tornou mais democrático o acesso às notícias internacionais. A recepção de material interna-cional também tem hora certa. O horário de geração da Visnews, por exemplo, pode mudar em função dos serviços oferecidos (início ou fim da tarde) e do horário de ve-rão, daqui e de Londres. O noticiário dura, em média, vinte minutos. As informações sobre as matérias que vão ser geradas chegam antes, através dos teletipos das agências de notícias. Dependendo da agência, os despachos podem ser em inglês, espanhol ou português. A Visnews, para continuar no mesmo exemplo, também envia um espelho com as previsões de matérias para o dia. Em algumas redações o espelho internacional é chamado de cardápio.

Aí está um espelho resumido. Em primeiro lugar vem o nome do serviço (LANA), o dia e a data. Depois vem a relação das matérias previstas. O espelho indica a locali-dade, o assunto, a língua de origem, a existência ou não de áudio ambiente, narração de repórter ou não, e o tempo da matéria. Mais tarde o espelho é confirmado e come-çam a chegar, também por teletipos, os textos (ou scripts) das matérias pre-vistas e a relação das imagens para que os editores internacionais possam redigir e editar.

No exemplo, em primeiro lugar vem a identificação da matéria (TOBOLSK/ URSS). Depois, vem o texto resumido com a relação das imagens na ordem em que

Page 99: Telejornalismo - Manual Completo

98

foram editadas em Londres. O texto acima não chega a um minuto, mas o editor in-ternacional pode melhorar a matéria com as informações das agências. Com a experi-ência, o editor costuma adiantar o texto. Mais tarde ele confere as imagens geradas e faz as alterações necessárias. Nas redações informatizadas, os editores têm acesso aos despachos das agências pelo computador. A tela é dividida em duas: de um lado, o despacho da agência; do outro, o texto do editor. A qualquer momento uma informa-ção de última hora pode aparecer na tela do computador, sendo indicada por uma pa-lavra piscando, como, por exemplo, "urgente". O editor abre acesso à informação, avalia o interesse e volta à redação do texto.

A emissora pode personalizar o noticiário internacional através do corresponden-te. Usando imagens do serviço internacional, ele grava suas entradas com o equipa-mento alugado ou da própria emissora. Certa vez um barco afundou no Canal da Mancha. O correspondente da TV Globo usou as imagens da agência para cobrir um off e gravou cabeças no local do acidente. Com isso, personalizou a cobertura. Um recurso barato e de bom efeito. É com todo esse material que os editores trabalham para fazer um telejornal: reportagens locais e nacionais, despachos de agências, satéli-te internacional etc. Cada editor de área - ou de setor - faz a sua parte. Ao final, o edi-tor chefe monta o espelho definitivo que orienta o trabalho de editores e produtores.

O espelho a que nos referimos, por exemplo, prevê um telejornal de quatro blocos: geral, internacional, greve e ecologia. Todos os blocos têm unidade, até mesmo o primeiro, unido pelo conjunto de matérias fait-divers. É um bloco para prender a a-tenção do telespectador. O segundo bloco foi montado com notícias internacionais e jogos de sorte, como Loto e Loteca. Já o terceiro bloco, bastante movimentado, fala das greves e termina com a cobertura da viagem do presidente. É um bloco político. O último bloco é todo ele dedicado à ecologia.

Ao final de cada bloco há uma passagem, em que o apresentador chama as matérias mais importantes do bloco seguinte, uma forma de manter o telespectador atento du-rante todo o noticiário. Recursos não faltam, como a estruturação dos blocos e inter-calação de notas e VTs. O telejornal é montado de forma a ter princípio, meio e fim, como uma boa história bem contada por quem sabe. E os editores sabem contar uma história usando imagem e som.

As três figuras representam a narrativa jornalística. A número 1 representa a forma primitiva da narração jornalística: o interesse cresce no decorrer do texto. A figura número 2 representa a narrativa moderna: a pirâmide invertida. O corte é feito pelo pé sem perda de conteúdo. A figura número 3 representa a forma narrativa em tele-jornalismo. A pirâmide volta à posição normal, mantendo o lead, que em tevê é a ca-beça do locutor. A matéria editada deve segurar a atenção do telespectador do início ao fim. Ao contrário da narrativa de jornal na forma de pirâmide invertida, a matéria de tevê não pode ser cortada pelo pé. Ela é um todo estruturado que faz sentido pelo conjunto. A sucessão de matérias desse tipo, intercaladas por notícias ao vivo e orga-

Page 100: Telejornalismo - Manual Completo

99

nizadas num ritmo adequado, contribuem para manter o telespectador atento ao no-ticiário. Outro recurso fundamental é a arte. 5.2.2 Arte

Uma das coisas que caracteriza o telejornalismo de uma emissora é o tratamento visual. A emissora que leva a imagem a sério sai com vantagem em busca de audiência. A notícia é para ser divulgada, mas com um tratamento visual adequado que ajude o telespectador a decodificar a informação recebida. Muitas vezes, a arte torna mais fácil a compreensão de uma notícia.

O telejornalismo usa arte para fazer mapa, selo, reconstituição, maquete, gráfico, vinheta, abertura etc. O uso de gráfico, por exemplo, torna mais fácil o entendimento de notícias econômicas. Pode ser animado e servir de base visual para um off, ou mesmo um selo para ilustrar uma notícia. A arte em telejornalismo usa todo tipo de material e equipamento, dos antigos aos modernos. O equipamento pode ser compu-tadores AT- 486 com programas gráficos, mesas Chyron 4 criadoras de tipos e letras em diferentes formatos e cores, até moderníssimas estações gráficas.

Os computadores e o Chyron podem estar ligados a dois VTs BVU 800 e 820, que gravam os desenhos. Duas câmeras, usadas na captura de imagens, completam o equi-pamento básico. Uma delas é usada na trucagem para fazer movimentos, reproduzir fotos e cenas, como o espaço sideral a partir de bolas de isopor. Os computadores também fazem animação, muitas vezes depois de horas de trabalho. Os programado-res visuais montam a estru-tura básica da animação, como a simulação de um acidente de carro, e os computadores fazem o resto durante a noite. Um novo equipamento da Quantel, o Paint Box, dá mais agilidade à animação, feita em tempo real. Basta captar uma imagem, programar o início e o final da cena, e riscar o bitpad com a pen: o computador reproduz o movimento na velocidade da mão.

Mesmo tendo à disposição novas gerações de computadores, a arte do telejorna-lismo continua usando a técnica antiga do desenho em papel. Ele é muito usado em reconstituições, como as cenas de um seqüestro. Depois de prontas, as ilustrações são filmadas e editadas com base no texto fornecido por um editor do telejornal. Outra técnica usada com freqüência é a da reconstituição gravada. Neste caso, atores repre-sentam os papéis dos envolvidos no acontecimento. Depois, na edição, as imagens são processadas eletronicamente no computador. 5.3 No ar

O telespectador, confortável em sua poltrona favorita, não percebe a complexidade da produção de um telejornal. Ele recebe o resultado de um trabalho estafante, envol-vendo diariamente centenas de profissionais e milhares de dólares. E tudo é feito para

Page 101: Telejornalismo - Manual Completo

100

não acontecer o mínimo erro: fita trocada, engasgo do locutor, falha no som etc. A hora de maior tensão é a de colocar o telejornal no ar, principalmente se for ao vivo. Durante aqueles minutos, o comando das transmissões da emissora está nas mãos do diretor de tevê, do editor chefe e do produtor executivo do telejornal. E para eles, como no jogo do bicho, vale o que está escrito.

5.3.1 Exibição

Se vale o escrito, vale o script. Ele é o resultado de um dia de trabalho e deve ser preparado de tal forma que não deixe margem de erro. Tem que ser numerado ade-quadamente, não deve ter rasuras que o tornem incompreensível à leitura e todas as informações técnicas, além do texto para o locutor, devem constar nas laudas. O s-cript abre com o espelho definitivo do telejornal:

JORNAL DE HOJE 02/05/00 5A. 0 30" ESCALADA / ABERTURA 1 20" NOTA BANCOS 2 4532 1'15" VT FORTALEZA - BANCOS 3 3426 1'00" VT PORTO ALEGRE - BANCOS 4 8756 57" VT RIO - BANCOS 5 1'10" VIVO SÃO PAULO - BANCOS 6 34" NOTA BANCOS 7 2314 48" VT BSB - MINISTRO DA ECONOMIA 8 26" NOTA PASSAGEM / COMERCIAL 9 20" NOTA SÃO PAULO - VIOLÊNCIA 10 5748 1'48" VT PORTO ALEGRE - ASSALTO 11 15" NOTA RIO - POLUIÇÃO 12 4567 1'12" VT RIO - BAÍA DA GUANABARA 13 40" GC COTAÇÕES 14 21" NOTA IMPOSTO DE RENDA 15 24" NOTA PASSAGEM / COMERCIAL 16 32" NOTA URSS 17 4637 39" VT FRANÇA 18 3645 1'01" VT ESPANHA 19 20" NOTA REI 20 1278 46" VT ESTADOS UNIDOS 21 34" NOTA FURACÃO 22 8573 1'18" VT PAPA 23 18" NOTA PASSAGEM / COMERCIAL 24 50" VIVO BSB - CONGRESSO 25 2314 1'24" VT VOTAÇÃO 26 32" NOTA ELEIÇÕES 27 1'12" VIVO SÃO PAULO - CANDIDATO 28 4526 49" VT RIO - FESTIVAL DE MÚSICA 29 22" NOTA BOA TARDE / ENCERRAMENTO

Page 102: Telejornalismo - Manual Completo

101

Neste exemplo, temos o espelho resumido do script de um telejornal da tarde. No exemplo, ele está dividido em três blocos de notícias. A primeira coluna, à esquerda, corresponde às páginas ou laudas numeradas. A segunda coluna corresponde à nume-ração das fitas, no caso de um telejornal que vai ao ar em fitas U-Matic (uma alterna-tiva seria copiar com antecedência as fitas U-Matic em fitas de uma polegada). A ter-ceira coluna corresponde ao tempo da lauda. A coluna seguinte tem informações so-bre o tipo de matéria: ao vivo, nota ou VT. A última coluna relaciona a cidade de ori-gem e o assunto.

Há três formas de notícia no telejornal: 1 - nota do locutor: o texto que o apresentador lê ao ser foca-lizado; 2 - nota coberta: o texto que o apresentador lê em off enquanto as imagens rodam na tela; 3 - VT: a matéria com a presença do repórter.

As matérias do telejornal têm estrutura semelhante à narrativa ficcional, como já

observamos anteriormente. Um VT com reportagem editada, por exemplo, tem a nar-ração propriamente dita (o off), o discurso indireto ("fulano disse que"), o discurso direto (os sobe-sons dos entrevistados) e até mesmo a descrição, atributo da imagem reforçada pelo texto. Voltando ao espelho, o tipo de matéria aparece indicado na ter-ceira coluna. Há uma indicação de GC no espelho acima. Significa gerador de caracte-res: o locutor lê a nota em off enquanto na tela aparecem os caracteres corresponden-tes. As laudas seguintes também devem estar com todas as informa ções técnicas ne-cessárias, além do texto para o locutor. Abaixo, dois exemplos de lauda: uma nota ao vivo e um VT. No exemplo, a nota vai ser lida pelo locutor ao vivo. Exceto contra-cheque; as palavras não podem ser divididas para não dificultar a leitura do texto pelo locutor.

Na lauda acima, ao contrário da anterior, vê-se indicações de roda VT do lado es-querdo e abre som VT do lado direito. Isso quer dizer que a nota ao vivo lida pelo lo-cutor vai ser seguida de um VT com a reportagem editada sobre o incidente. O tempo do VT é de 52", que somados ao tempo da nota de apresentação da matéria totalizam 1'07", indicados no retângulo correspondente ao tempo da lauda. Note-se também que na indicação de assunto está escrito VT. Em redações informatizadas, a lauda do script não precisa do tempo da matéria. O cálculo é feito automaticamente a partir do espelho, com todas as indicações referentes aos VTs e notas. Outra observação a res-peito da lauda acima é a deixa redigida do lado direito. Denomina-se "deixa" a indica-ção de áudio ou imagem finais de uma matéria. Ao final da deixa, o diretor de tevê e os outros profissionais envolvidos na exibição passam para a lauda seguinte em corte sincronizado.

Page 103: Telejornalismo - Manual Completo

102

Durante muitos anos, o apresentador de telejornal no Brasil tinha duas alternativas para ler as notícias: abaixar a cabeça a todo momento ou ler o texto copiado em carto-linas colocadas à sua frente, diante da câmera. A descoberta do teleprompter facilitou a leitura dos textos, ao mesmo tempo em que deu mais naturalidade à locução, com o apresentador falando diretamente para o telespectador. Durante a exibição do telejor-nal, uma pessoa da produção tem a tarefa fundamental de rodar o teleprompter, uma espécie de esteira rolante com uma câmera. Ela capta o texto e o transmite a uma tela colocada diante da câmera que focaliza o locutor no estúdio. Hoje o teleprompter es-tá sendo trocado pelo computador. 5.3.2 Um trabalho de equipe

No momento da exibição, o diretor de tevê é o maestro, e o script, a partitura. Os demais intérpretes são, numa operação básica: dentro do switcher - corte ou controle - (lugar de controle da operação), operador de áudio, operadores de VT, operador de caracteres e operador de vídeo; no estúdio, câmera-men, coordenador e auxiliares. Como nenhum deles participou das fases de produção do telejornal, precisam seguir o script, que é a partitura operacional de cada um. Portanto, se alguma indicação não está correta, alguém pode errar na operação.

O diretor de tevê precisa receber o script com antecedência para tomar conheci-mento do telejornal e fazer as marcações de câmeras para cada locutor, indicar os cor-tes e programar todas as operações necessárias ao telejornal. Se vai usar chroma-key, por exemplo, precisa preparar a mesa para obter o efeito.

O chroma-key - ou chave de cor - é muito usado em telejornalismo, principalmente em arte. Na ilustração abaixo, um exemplo da utilização da mesa. A figura 1 mostra uma câmera focalizando uma pessoa de pé diante de um fundo azul. Enquanto isso, outra câmera focaliza um painel com determinada paisagem. O efeito desejado é ob-tido superpondo as imagens. O Newsmatte está substituindo o chroma-key com me-lhores resultados.

Há diversos tipos de mesas de corte, operadas pelo diretor de tevê. Algumas são simples e permitem as operações básicas; outras, bem mais complexas, possibilitam uma variedade infinita de efeitos com a imagem. Em telejornalismo não se deve abu-sar dos efeitos. Como foi dito no início, a pirotecnia tem limite, a partir do qual pre-judica o objetivo principal: a informação.

A mesa de corte de um switcher é cheia de botões e alavancas. É com eles que tra-balha o diretor de tevê. Cada botão comanda um aparelho ou equipamento determi-nado, com as câmeras. As imagens captadas são vistas em monitores diante do diretor de tevê. Os outros monitores são: um para cada VT com as fitas a serem exibidas, ca-racteres, imagem do programa no ar ou PGM e preview da imagem ou PVM. O painel pode ter outros monitores, mas estes são os básicos.

Page 104: Telejornalismo - Manual Completo

103

O diretor trabalha o tempo todo com um fone de ouvido para se comunicar com os locutores e com os outros profissionais envolvidos na operação. Além disso, ele não fica sozinho no switcher. Com o diretor trabalham outros profissionais, cada um responsável por uma tarefa.

O operador de áudio controla os sons dos VTs e dos locutores; o operador de ví-deo cuida da qualidade da imagem que vai ao ar; os operadores de VT soltam as fitas com as matérias editadas; e o operador de caracteres coloca os créditos no telejornal, isto é, os letreiros com os nomes das pessoas que aparecem no vídeo e outras infor-mações textuais.

O editor chefe ou o editor executivo do telejornal costumam acompanhar a exibi-ção de dentro do switcher. Ao lado deles está o produtor executivo ou o coordenador de produção. Eles devem estar perto do diretor de tevê na eventualidade de algum problema, como a queda de uma matéria ou uma notícia de última hora. O editor de-termina o lugar e o produtor altera o script passando as informações para todos os envolvidos na operação.

Dentro do estúdio ficam os locutores, os câmera-men e auxiliares, iluminadores e o coordenador de estúdio. Um telejornal com cenário simples e dois apresentadores usa três câmeras. Duas trabalham cruzadas e a terceira mostra os apresentadores em plano mais aberto. Outros profissionais estão envolvidos na operação de exibir um telejornal, como os técnicos do controle mestre, responsáveis por manter a emissora no ar.

EXERCÍCIO Provão MEC 2001 - Há 16 anos, o dia 5 de dezembro foi escolhido pela Assembléia Ge-ral das Nações Unidas como data oficial para a celebração do trabalho voluntário. Desde então, centenas de países, inclusive o Brasil, aderiram à comemoração. Em 2001, Ano Internacional do Voluntário, instituições governamentais e não governamentais, entida-des de classe, sindicatos e associações de moradores programam no Brasil uma série de atividades para marcar a data – entre elas concertos, exibição de filmes, lançamento de livros, exposições, mostras de iniciativas cidadãs, seminários e cursos em universidades e organizações sociais e comunitárias. Considerando essas informações, planeje, para um telejornal de seu estado, a cobertura jornalística da data, considerando que a matéria terá a duração de quatro minutos. Defi-na os recursos humanos e serviços auxiliares a serem mobilizados. Esboce também as pautas, as estratégias que orientarão a equipe de produção e de reportagem (incluindo ân-gulos de cobertura) e indique os possíveis entrevistados.

Page 105: Telejornalismo - Manual Completo

104

6. BOA NOITE Quando o locutor encerra o telejornal com um educado "boa noite", dá por termi-

nada uma longa e estafante jornada de trabalho envolvendo dezenas de profissionais. As notícias do dia foram ao ar, mas o telejornal continua a repercutir na redação. Os editores e produtores, formal ou informalmente, discutem os erros e começam a pen-sar no dia seguinte. Retomam todo o processo de produção de notícias, em que a tec-nologia, como se viu, é um ingrediente fundamental na "reconstrução" dos aconteci-mentos dentro dos limites impostos pelos códigos audiovisuais.

Se tecnologia e discurso estão intimamente associados em telejornalismo, o resul-tado são mudanças constantes nas técnicas de produção da notícia. No Brasil, o tele-jornalismo vem se adaptando como pode às mudanças. Mas adaptar-se a novas tecno-logias é um investimento caro e, muitas vezes, sem retorno imediato. Nos anos 50, o telejornal no Brasil era uma espécie de rádio com imagem, ainda não considerada um elemento constitutivo da informação televisiva. Só muito tempo depois os editores começaram a se preocupar em casar imagem e texto.

Se o telejornal era para ser "ouvido", o sotaque era radiofônico. O Repórter Esso, de junho de 1953, o primeiro grande telejornal brasileiro, teve como apresentadores Kalil Filho (em São Paulo) e Gontijo Teodoro (no Rio de Janeiro), dois conhecidos locutores de rádio.

A abertura do telejornal ficou famosa: "Aqui fala o seu Repórter Esso, testemunha ocular da história". Durante muitos anos, o Repórter Esso foi sinônimo de telejorna-lismo no Brasil, até que o globo da vinheta de abertura parou de girar no dia 31 de de-zembro de 1970. O seu lugar já estava sendo ocupado por um telejornal lançado em 11 de setembro de 1969.

Na estréia, Cid Moreira terminou o Jornal Nacional enaltecendo o primeiro jornal ao vivo "realmente nacional" da televisão brasileira. Na verdade, o Jornal Nacional rompia com o esquema de transmissão diferenciada do Repórter Esso, com locutores no Rio de Janeiro e em São Paulo.

Antes da TV Globo, a TV Excelsior tentara inovar as técnicas de produção da no-tícia em telejornalismo. Mudou a forma e avançou no conteúdo. O Jornal de Van-guarda, levado ao ar de 1962 a 1965, às dez da noite, tinha uma preocupação toda es-pecial com o visual, ao mesmo tempo em que adotava postura mais crítica no noticiá-rio. A fórmula da TV Globo, adaptada da televisão norte-americana, uniu tecnologia e informação, seduzindo público e profissionais. E o telejornalismo passou a incorpo-rar, sem nenhum pudor, as lantejoulas tecnológicas de última geração.

De qualquer maneira, a introdução de novas tecnologias, como o VT portátil, per-mitiu que as notícias ganhassem novas roupagens e facilitou o trabalho de repórteres e editores. A entrada em cena dos repórteres, cada vez mais presentes nos aconteci-mentos, tornou possível a descontração também dos locutores. A rua era o lugar do

Page 106: Telejornalismo - Manual Completo

105

simples e do coloquial, o oposto do estilo de narração dramática e grandiloqüente do radialismo.

Hoje, a televisão passa novamente por profundas e revolucionárias transformações tecnológicas com a introdução de novas técnicas de difusão (satélites, antenas parabó-licas, fibras óticas) e recursos eletrônicos de produção, como os adquiridos a partir do avanço na computação. O telejornalismo, necessariamente, se adaptará às novas tec-nologias, formulando novas técnicas de produção da notícia.

A Guerra do Golfo, além de sua importância histórica, é um marco no telejorna-lismo mundial. A presença das câmeras de televisão influenciou, decisivamente, o de-senrolar dos acontecimentos. Se a televisão foi usada ou não pelos atores desta tragé-dia moderna é outra história a ser discutida. Cabe ressaltar, aqui, a importância das novas tecnologias na produção da notícia e na transmissão de sinais.

Os pequenos transmissores e os satélites se transformaram em instrumentos fun-damentais para disseminar a informação por todo o mundo. O telejornalista tornou-se co-partícipe dos acontecimentos, no momento exato em que se desenrolam, fato que será objeto de muitas discussões sobre o papel e a ética do telejornalismo no mundo contemporâneo.

O ritmo de mudança é tão veloz que torna obsoletos, em pouco tempo, os livros técnicos e manuais didáticos. Ainda mais num país como o Brasil, na periferia do de-senvolvimento econômico e social. Nos últimos anos, à parte a contribuição isolada de material publicado em jornais e revistas, pouca coisa original foi editada ou mesmo compilada para ajudar professores e estudantes de comunicação. Esta publicação ins-creve-se, portanto, na linha dos manuais técnicos descritivos dos modos de produção em telejornalismo.

Retomando a história inicial, o mestre e o peregrino devem trilhar juntos o cami-nho do saber. De um, exige-se não fazer da pedagogia uma simples transferência de tecnologia; de outro, resistir às facilidades de seguir o manual sem discussão. Para um e outro, afinal, os caminhos se cruzam no objetivo maior de alcançar uma práxis de vida mais equilibrada e harmoniosa.

EXERCÍCIOS Questão 1) Crie, individualmente, um telejornal de exibição nacional que tenha cerca de 30 minutos no ar. Planeje em papel todas as etapas de produção e elabore um espelho de uma edição. Utilize um jornal impresso para elaborar as pautas. De-fina também as características técnicas e editoriais da edição e apresentação.

Page 107: Telejornalismo - Manual Completo

106

Questão 2) Provão MEC 2000 - O Ministério da Saúde, em parceria com as Se-cretarias Municipais e Estaduais de Saúde, promove todos os anos o dia nacional de vacinação contra a paralisia infantil. A campanha é um reforço à imunização de rotina realizada nos postos de saúde. A meta é vacinar todas as crianças do país com idade entre zero e cinco anos. De acordo com o Guia de Informações Epidemioló-gicas do Ministério da Saúde, o Brasil erradicou a doença, e há dez anos não são registrados novos casos em conseqüência das campanhas de vacinação. Consideran-do essas informações, elabore o planejamento da cobertura do dia nacional de vaci-nação em seu estado para uma emissora de televisão regional. Defina os espaços de programação que serão usados nesta cobertura; os formatos dos programas; as estra-tégias que orientarão a equipe de produção e de reportagem (incluindo pautas e ân-gulos de cobertura); os possíveis entrevistados; os recursos humanos; os equipamen-tos necessários e serviços auxiliares a serem mobilizados.

Page 108: Telejornalismo - Manual Completo

107

Bibliografia

BAHIA, Juarez. Jornal, História e Técnica. São Paulo, Ed. Ática, 1990.

BARBEIRO, HERODOTO & LIMA, PAULO RODOLFO DE. Manual de Tele-jornalismo. São Paulo: Campus, 2002.

BERNARDET, Jean Claude. Cineastas e Imagens do Povo. São Paulo, Ed. Brasiliense, 1985.

BITTENCOURT, Luís Carlos. Manual de Telejornalismo. Ed. UFRJ, 1994.

BOJUNGA , Cláudio. A Construção da Notícia.

BUCCI, Eugênio. Televisão, povo e preconceito. Artigo da Folha de São Paulo.

MEDINA, Cremilda de Araújo. Entrevista: O diálogo possível. São Paulo, Ed. Ática, 1986.

REDE Brasil Sul e Rede Globo. Manual de produção: telejornais e programas – RBS e Rede Globo.

REDE Globo de Televisão. Manual de de Redação da TV Globo.

SILVA, Marco Aurélio. O modelo antidemocrático do Telejornalismo Brasileiro. UFSC, 1995.

SQUIRRA, Sebastião. Boris Casoy, o âncora no telejornalismo brasileiro. São Paulo, Ed. Brasiliense, 1993.

SQUIRRA, Sebastião. Aprender telejornalismo. São Paulo: Brasiliense, 1990.