sinais clínicos e alterações necroscópicas em filhotes de
TRANSCRIPT
JBCA – Jornal Brasileiro de Ciência Animal 2014 7 (14): 508 – 522.
508
Sinais clínicos e alterações necroscópicas em filhotes de
Eunectes murinus (Linnaeus, 1758) infectados com bactérias
Gram negativas multirresistentes
Clinical and anatomic-pathological findingsin young hatchling
Eunectes murinus infected with multiresistant
Gram negative bacteria
Signos Clínicos y alteraciones necroscópicas en crías de
Eunectes murinus(Linnaeus, 1758) infectados con bacterias
Gram negativas multiresistentes
Paulo Roberto Bahiano Ferreira*1, Victor Pereira Curvelo2, Leane
Queiroz Souza Gondim3, Gilson Oliveira Santana4 e
Alberto Vinícius Dantas Oliveira5
Resumo
Em vida livre ou em conservação ex situ, relata-se uma alta taxa de
mortalidade de Eunectes murinus filhotes. As bacterioses são responsáveis
por altas taxas de morbidade e mortalidade em serpentes cativas,
principalmente aquelas provocadas por agentes multiresistentes aos
fármacos utilizados na clínica de répteis. Sinais clínicos e alterações
anatomopatológicas associados ao isolamento de bactérias
multirresistentes foram descritos numa rotina de manejo de 15 filhotes de E.
murinus mantidos em conservação ex situ. No decorrer do processo, após o
óbito de 4/15 serpentes sem causa definida, todas foram acompanhadas
1 Médico Veterinário. Mestre em Ciência Animal nos Trópicos – Escola de Medicina Veterinária / UFBA.
Técnico do Setor de Herpetologia – Parque Zoobotânico Getúlio Vargas – PZGV (BA). *Email:
[email protected]. 2 Médico Veterinário. Técnico do Setor de Clínica e Quarentena – PZGV (BA). 3 Médica Veterinária. Doutoranda em Ciência Animal nos Trópicos – Escola de Medicina Veterinária /
UFBA. Técnica do Setor de Nutrição – PZGV (BA). 4 Médico Veterinário. Técnico do Setor de Herbívoros – PZGV (BA). 5 Médico Veterinário. Coordenador Técnico do PZGV (BA).
JBCA – Jornal Brasileiro de Ciência Animal 2014 7 (14): 508 – 522.
509
clinicamente através de observações diárias, suspeitando-se de bacteriose
em 5/11 indivíduos. Os animais apresentavam escamas com conteúdo
caseoso, sendo coletadas e enviadas para um laboratório de referência para
o diagnóstico microbiológico. As Salmonella spp., Pseudomonas aeruginosa
e Citrobacter freundii apresentaram resistência para todos os antibióticos
testados no antibiograma: ciprofloxacina, gentamicina, tobramicina,
tetraciclina, doxiclina ou enrofloxacina. Em contrapartida, a Pseudomonas
spp. apresentou sensibilidade para todos os antibióticos anteriormente
mencionados. Mesmo após o tratamento estabelecido, 90,9% (10/11) dos
animais vieram a óbito, constatando infecções pulmonar e hepática em dois
indivíduos necropsiados, sendo isoladas Pseudomonas aeuruginosa e
Enterobacter spp. em amostras de fígado e pulmão de ambos. O isolamento
de bactérias de microbiota oral e/ou intestinal de serpentes e com perfil de
multirresistência, associado à doença e ao óbito de 93,3% (14/15) dos
filhotes de E. murinus indica a sensibilidade dessa espécie às bacterioses
por agentes oportunistas ou patogênicos Gram negativos.
Palavras-chave: anaconda, bacteriose, óbito, herpetocultura, pneumonia
Abstract
A high mortality rate of baby snakes Eunectes murinus in the wild or in ex
situ conservation has been reported. Bacterial diseases are responsible for
high morbidity and mortality rates in captive snakes, especially those caused
by multi-resistant agents to drugs used in the reptile medicine. Clinical signs
and pathological-anatomical findings associated with the isolation of multi-
resistant bacteria were described in routine management of 15 baby snakes
E. murinus kept in ex situ conservation. After the death of 4/15 of the snakes
from undetermined causes, all clinically monitored through daily
observations, bacterial disease was suspected in 5/11 individuals. The
animals had scales with caseous content collected and sent to a reference
laboratory for microbiological diagnosis. The Salmonella spp., Pseudomonas
aeruginosa and Citrobacter freundii were resistant to all antibiotics tested in
the antibiogram: ciprofloxacin, gentamicin, tobramycin, tetracycline, and
enrofloxacin or doxiclin. However, Pseudomonas spp. showed sensitivity to
JBCA – Jornal Brasileiro de Ciência Animal 2014 7 (14): 508 – 522.
510
all antibiotics mentioned above. Even after the established treatment, 90.9%
(10/11) came to death, from lung and liver infections, isolated Pseudomonas
aeuruginosa and Enterobacter spp.in two individuals necropsied. Isolation of
bacteria from oral and/or intestinal microbiota of snakes and profile of multi-
drug resistance associated with the disease and death of 93.3% (14/15) E.
murinus puppies, indicates the susceptibility of this species to opportunistic
and pathogenic Gram-negative bacteria infection.
Key words: anaconda, bacteriosis, death, herpetoculture, pneumonia
Resumen
En vida libre o en conservación ex situ, se reporta una alta tasa de mortalidad
de crías de Eunectes murinus. Las infecciones bacterianas son
responsables por altas tasas de morbilidad y mortalidad en serpientes
cautivas, principalmente aquellas provocadas por agentes multiresistentes a
los fármacos utilizados en la clínica de reptiles. Los signos clínicos y las
alteraciones anatomopatológicas asociadas al aislamiento de bacterias
multiresistentes fueron descritos en una rutina de manejo de 15 crías de E.
murinus mantenidos en conservación ex situ. En el curso del proceso,
después de la muerte de 4/15 serpientes sin causa definida, todas fueron
acompañadas clínicamente a través de observaciones diarias,
sospechándose de infección bacteriana en 5/11 individuos. Los animales
presentaban escamas con contenido caseoso, siendo recogidas y enviadas
para un laboratorio de referencia para diagnóstico microbiológico.
Salmonella spp., Pseudomonas aeruginosa y Citrobacter freundii
presentaron resistencia a todos los antibióticos testados en el antibiograma:
ciprofloxacina, gentamicina, tobramicina, tetraciclina, doxiciclina y
enrofloxacina. Por otra parte, la Pseudomona spp. presentó sensibilidad
para todos los antibióticos mencionados anteriormente. Después del
tratamiento, 90,9% (10/11) de los animales murieron, constatándose
infecciones pulmonar y hepática en los individuos necropciados, siendo
aisladas Pseudomonas aeuruginosa y Enterobacter spp. en muestras de
hígado y pulmón. El aislamiento de bacterias de microbiota oral y/o intestinal
de serpientes y con perfil de multiresistencia, asociado a la enfermedad y
JBCA – Jornal Brasileiro de Ciência Animal 2014 7 (14): 508 – 522.
511
muerte de 93,3% (14/15) de las crías de E. murinus, indica la sensibilidad
de esta especie a las infecciones bacterianas por agentes oportunistas o
patogénicos Gram negativos.
Palabras-clave: anaconda, infección, bacterias, muerte, herpetocultura,
neumonía
Introdução
A Eunectes murinus é uma
serpente constritora, de hábito
semiaquático, noturna e carnívora,
que ocorre na América do Sul com
ampla distribuição no território
brasileiro¹. Em ambiente cativo, é
relatada uma alta taxa de
mortalidade de filhotes2. Trabalhos
científicos sobre patologias e
possível causa mortis em E. murinus
são escassos, sendo estes
importantes para o aprimoramento
do sistema de manejo adotado nas
instituições conservacionistas.
As enfermidades infecciosas
têm sido indicadas como um dos
principais fatores responsáveis pelas
altas taxas de morbidade e
mortalidade em serpentes cativas,
destacando-se as bacterioses por
agentes Gram negativos,
geralmente multirresistentes aos
medicamentos de amplo espectro
normalmente utilizados na clínica de
répteis,3,4,5.
As bactérias podem ser
transmitidas para as serpentes via
alguma porta de entrada, como
feridas provocadas por trauma e o
contato com ambientes, tratadores e
instrumentais clínico-cirúrgicos
contaminados. Contudo, a
imunodepressão, a desnutrição, a
má adaptação ao ambiente cativo,
bem como a manutenção em
temperaturas e umidades distantes
da zona de conforto térmico são
considerados fatores predisponentes
para o desenvolvimento de doenças
bacterianas em répteis5.
Geralmente, as bactérias
provocam nos répteis um quadro
clínico com lesões abscedativas
associadas com estomatite,
pneumonia e dermatites, podendo
evoluir para a sepse resultando em
JBCA – Jornal Brasileiro de Ciência Animal 2014 7 (14): 508 – 522.
512
óbito por choque septcêmico4,5. Por
isso, é importante o conhecimento
das diferentes técnicas de coleta e a
origem das amostras para a
realização de cultura bacteriana e
antibiograma, com o intuito de um
diagnóstico eficaz e capaz de auxiliar
a terapêutica adotada para o
paciente5.
No presente trabalho, são
descritos sinais clínicos e alterações
anatomopatológicas associados ao
isolamento de bactérias multirresistentes
em filhotes de E. murinus cativas.
Relato de caso
No mês de junho de 2012 foi
registrado o nascimento de 15
animais da espécie E. murinus no
Parque Zoobotânico Getúlio Vargas
(PZGV), Bahia (BA). Desde então,
foi criada uma rotina de manejo para
os filhotes, os quais eram mantidos
em um sistema semi-intensivo, sem
controle de temperatura e umidade,
porém individualmente em caixas
plásticas organizadoras, com
ambiente seco e água,
disponibilidade de luz solar, sendo
as mesmas higienizadas
diariamente com hipoclorito de sódio
1% durante 10 minutos com
posterior enxágue. No primeiro mês,
os animais não apresentaram apetite
sendo, assim, realizado o
procedimento de alimentação
assistida semanalmente, com
neonatos de camundongo da
espécie Mus musculus criados no
biotério da própria instituição. No
decorrer do processo, após o óbito
de quatro (4/15) serpentes sem
causa definida, os animais foram
acompanhados clinicamente através
de observações diárias,
suspeitando-se de infecção
bacteriana em cinco dos 11 animais
examinados, os quais apresentavam
inicialmente escamas elevadas e em
destaque em relação às
circunvizinhas (Figura 1),
despigmentadas (Figura 2) ou com
alteração de cor padrão da espécie,
além da presença de escamas com
conteúdo de aspecto caseoso
(Figura 3), que foram coletadas e
enviadas para o Centro de
Diagnóstico Veterinário (CITIVET II),
Salvador, Bahia, para o isolamento
bacteriano e determinação do perfil
de resistência (Tabela 1). Contudo,
inicialmente foi realizada a
JBCA – Jornal Brasileiro de Ciência Animal 2014 7 (14): 508 – 522.
513
antibioticoterapia com sete
aplicações por via intramuscular (IM)
ou oral (VO) de dois medicamentos,
enrofloxacina 2,5% (10 mg/Kg/48q
IM) em 11 indivíduos, numa primeira
etapa, e logo após a azitromicina (40
mg/Kg/q48h VO) em sete indivíduos,
ambas acompanhadas de aplicação
tópica de creme de sulfadiazina de
prata 1% direto nas lesões das
escamas de cada animal. Como
suporte, ainda foram feitas três
aplicações de complexo de
vitaminas B injetável (0,1
mL/kg/q48h) conforme o protocolo
terapêutico padrão do Setor de
Clínica e Quarentena do Parque
Zoobotânico Getúlio Vargas.
Entretanto, entre os meses de
agosto e outubro, mesmo após o
tratamento estabelecido, 90,9%
(10/11) dos animais não resistiram e
vieram a óbito, constatando
infecções bacterianas pulmonar e
hepática em dois indivíduos na
necropsia (Figura 4) e no exame
microbiológico dos fragmentos dos
órgãos acometidos (Tabela 2).
Figura 1: Indivíduo 1 apresentado inicialmente uma escama elevada em destaque (seta).
JBCA – Jornal Brasileiro de Ciência Animal 2014 7 (14): 508 – 522.
514
Figura 2: Indivíduo 14 apresentando escamas despigmentadas (seta amarela) ou com conteúdo de aspecto caseoso (seta vermelha).
Figura 3: Indivíduo 8 apresentando múltiplas escamas com coloração amarelada com conteúdo de aspecto caseoso (seta).
JBCA – Jornal Brasileiro de Ciência Animal 2014 7 (14): 508 – 522.
515
Figura 4: Presença de múltiplos pontos brancos no parênquima hepático do indivíduo 4, sendo isolada a Enterobacter spp. após o envio da amostra para o exame microbiológico.
Discussão
Foram isoladas seis espécies
de bactérias Gram negativas das
escamas dos cinco indivíduos com
suspeita de enfermidade bacteriana,
entre elas a Acinetobacter spp. e
Salmonella spp no indivíduo 1,
Pseudomonas aeruginosa no
indivíduo 6, Citrobacter freundiino
indivíduo 7, Klebsiella pneumonae
no indivíduo 8 e Pseudomonas spp.
no indivíduo 14 (Tabela 1).
No geral, os indivíduos 7, 8 e
14 apresentaram o
comprometimento multifocal de
escamas, que apresentavam uma
coloração amarelada, preenchidas
com conteúdo de aspecto caseoso,
algumas elevadas ou
despigmentadas. Já os indivíduos 6
e 14 manifestaram elevações e/ou
despigmentação de escamas. No
geral, as lesões eram superficiais, as
quais permaneciam na pele antiga
após a muda, dando a impressão de
uma aparente resolução clínica,
porém sendo constatada a recidiva
entre uma e duas semanas após o
evento da troca de pele. Em
JBCA – Jornal Brasileiro de Ciência Animal 2014 7 (14): 508 – 522.
516
infecções fúngicas também são
observadas alterações de cor nas
escamas de E. murinus, porém estas
aparentam ser bem características,
sendo descrito o aparecimento de
pontos escuros de coloração
vermelha em animais infectados com
Trichophyton sp., Verticillium sp., e
Alternaria sp6.
As bactérias Salmonella spp,
Pseudomonas aeruginosa e
Citrobacter freundii apresentaram
resistência para todos os antibióticos
testados no antibiograma (Tabela 1).
O índice de mutação é intenso nas
bactérias Gram negativas, sendo
identificadas diferenças genotípicas
entre microrganismos da mesma
espécie, com isolamento de diversas
cepas com perfis de resistência
distintos7. Os diferentes sorotipos de
Salmonella são frequentemente
associados à microbiota entérica ou
oral normal dos répteis8,9, inclusive
podendo ser transmitida para seres
humanos10. Entretanto, a depender
da virulência da cepa isolada, as
Salmonella spp. podem causar um
processo de doença secundária e
óbito em algumas espécies de
serpentes, dentre elas a E.
murinus11. O gênero Citrobacter
geralmente é reportado em
infecções de pele de quelônios8,
contudo a Pseudomonas aeruginosa
já foi isolada em serpentes com
enterite necrosante mantidas em
zoológicos12.
Mesmo com o
estabelecimento da
antibioticoterapia sistêmica e tópica,
90,9% (10/11) dos filhotes de E.
murinus vieram a óbito,
demonstrando a ineficácia do
protocolo terapêutico adotado sobre
os indivíduos doentes, mesmo
utilizando doses de antibióticos
consolidadas13. É importante
salientar que foram isoladas
bactérias oportunistas ou
patogênicas em todos os cinco
indivíduos amostrados e, dentre
aquelas, 83,3% (5/6) eram
multirresistentes, dificultando a
resolução clínica dos casos. No
geral, diversas bactérias
multirresistentes são isoladas em
répteis, o que preocupa a
comunidade médica em relação às
zoonoses e limitações na
antibioticoterapia adotada14,15,16.
A enrofloxacina é um
antibiótico de amplo espectro
JBCA – Jornal Brasileiro de Ciência Animal 2014 7 (14): 508 – 522.
517
recomendado contra infecções
bacterianas por Acinetobacter,
Citrobacter freundii e
Enterobacterem répteis4. Este
antibiótico foi utilizado inicialmente
até o resultado do isolamento e
conhecimento do perfil de resistência
das bactérias, pois com essas
informações a antibioticoterapia
seria readequada. Mesmo com a
utilização de doses recomendadas
pela literatura, o medicamento não
foi capaz de debelar a infecção
devido à resistência das cepas
isoladas, sendo registrada a morte
de quatro indivíduos, inclusive o n° 7,
que estava infectado com uma cepa
de C. freundii multirresistente. Em
contrapartida, os aminoglicosídeos
são os antibióticos de eleição contra
Pseudomonas aeruginosa e
Klebsiella pneumoniae3, mas a
Pseudomonas aeruginosa isolada
do indivíduo 6 apresentou um perfil
de resistência à tobramicina e à
gentamicina, limitando o uso dos
mesmos.
A azitromicina é um antibiótico
de amplo espectro com alcance em
sistemas respiratórios inferior e
superior, pele e tecidos moles,
agindo bem contra Acinetobacter
sp., ainda apresentando uma
atividade variável contra Samonella
sp., Enterobacter spp. e Kleibsiella
spp. Entretanto, a P.aeruginosa tem
uma frequente resistência sobre este
medicamento17. Entre os sete
animais tratados, apenas um
sobreviveu, sendo o mesmo
encaminhado para a sua
manutenção em recinto de exibição,
com acesso a substrato de terra,
grama, pedras, troncos, uma piscina
central, plantas arbustivas e
arbóreas e exposição solar.
Após a necropsia de dois
animais, foi isolada a Enterobacter
sp. no indivíduo 4 e a Pseudomonas
aeruginosa no indivíduo 2 em
amostras de pulmão e fígado, sendo
observada a presença de pontos
brancos multifocais que se
aprofundavam ao corte durante o
exame macroscópico do fígado e
dos pulmões, o que aparentava ser
uma infecção pulmonar e hepática. A
Pseudomonas spp. é descrita como
uma bactéria de alta patogenicidade,
responsável por causar lesões
tegumentares difusas, estomatites,
pneumonia, enterite necrosante e
septicemia em serpentes, enquanto
a Enterobacter spp. está mais
JBCA – Jornal Brasileiro de Ciência Animal 2014 7 (14): 508 – 522.
518
associada às enfermidades
abscedativas e infecções orais3,8.
Estudos futuros sobre
isolamento de bactéria
multirresistentes deverão considerar
a susceptibilidade a antimicrobianos,
sendo esta avaliada por meio da
determinação da concentração
mínima inibitória. Esse método está
padronizado, possui detalhamento
técnico bem definido e fornece
resultados quantitativos18. Os
resultados obtidos podem ser
interpretados considerando as
características farmacológicas e
farmacocinéticas dos
antimicrobianos através do
estabelecimento da concentração
mínima do medicamento, que deverá
ser utilizada no tratamento das
infecções oportunistas.
A frequente avaliação da
eficácia dos manejos alimentar e
sanitário, o acompanhamento
clínico, bem como a minimização de
estresse com enriquecimento
ambiental de acordo com a biologia
da espécie são elementos
importantes para a prevenção de
doenças infecciosas em serpentes
mantidas em zoológicos. Faz-se
necessária uma maior atenção aos
cuidados de biossegurança
envolvendo o ambiente, os técnicos
e os tratadores envolvidos no
manejo dos animais, pois as
enterobactérias isoladas estão
envolvidas em quase todas as
infecções adquiridas em Unidades
de Tratamentos Intensivos (UTIs),
particularmente infecções
respiratórias e infecções urinárias,
segundo o Manual de Investigação e
Controle de Bactérias
Multirresistentes (2007) da Agência
Nacional de Vigilância Sanitária,
ANVISA, Brasil.
JBCA – Jornal Brasileiro de Ciência Animal 2014 7 (14): 508 – 522.
519
Tabela 1: Informações clínicas e antibiograma das bactérias isoladas das escamas de filhotes de E. murinus.
Indivíduo Sinais clínicos Bactéria isolada
Resistência Sensibilidade *Sobrevivência
01 Desidratação e elevação de escamas multifocal
Acinetobacter spp.
Gentamicina, Tobramicina e Tetraciclina
Enrofloxacina e Ciprofloxacina
68 dias
Salmonella spp.
Enrofloxacina, Ciprofloxacina, Gentamicina, Tobramicina e Tetraciclina
-------------------
06 Desidratação, despigmentação e elevação de escamas, as quais apresentam-se acinzentadas.
Pseudomonas aeuruginosa
Enrofloxacina, Ciprofloxacina, Gentamicina, Tobramicina e Tetraciclina
------------------- 55 dias
07 Desidratação, opacidade discreta e despigmentação de escamas, sendo que algumas de coloração amarelada e com presença de conteúdo de aspecto caseoso.
C. freundii
Enrofloxacina, Ciprofloxacina, Doxiciclina, Gentamicina, Tobramicina e Tetraciclina
------------------- 10 dias
08 Presença de escamas elevadas, sendo que algumas de coloração amarelada e com presença de conteúdo de aspecto caseoso.
Klebsiella pneumonae
Enrofloxacina, Ciprofloxacina e Tetraciclina
Gentamicina e Tobramicina
60 dias
14 Áreas de elevação e despigmentação de escamas, sendo que algumas de coloração amarelada e com presença de conteúdo de aspecto caseoso.
Pseudomonas spp
------------------- Enrofloxacina, Ciprofloxacina, Gentamicina, Tobramicina e Tetraciclina
68 dias
*Quantidade de dias que o animal viveu após a implantação do primeiro protocolo terapêutico.
JBCA – Jornal Brasileiro de Ciência Animal 2014 7 (14): 508 – 522.
520
Tabela 2: Resultado do antibiograma das bactérias isoladas dos indivíduos necropsiados.
Antibióticos
Indivíduo 02 Doxiclina Enrofloxacina Ciprofloxacina Tetraciclina Tobramicina Gentamicina
Pseudomonas aeruginosa isolada do pulmão
Resistente Resistente Sensível Resistente Sensível Sensível
Pseudomonas aeruginosa isolada do fígado
Resistente Sensível Sensível Sensível Sensível Sensível
Indivíduo 04 Doxiclina Enrofloxacina Ciprofloxacina Tetraciclina Tobramicina Gentamicina
Enterobacter spp. isolada do pulmão
Resistente Resistente Sensível Resistente Sensível Sensível
Enterobacter spp. isolada do fígado
Resistente Resistente Sensível Resistente Sensível Sensível
Conclusão
O isolamento de bactérias
comuns à microbiota oral e/ou
intestinal de serpentes e com perfil
de multiresistência, associado à
doença e ao óbito de 93,3% (14/15)
dos filhotes de E. murinus sob um
manejo sanitário bem estabelecido
sugere a sensibilidade de filhotes da
espécie estudada às enfermidades
bacterianas por agentes
oportunistas ou patogênicos Gram
negativos.
Instituição responsável
Parque Zoobotânico Getúlio
Vargas, Bahia.
Agradecimento
A todos os funcionários e
estagiários do PZGV-BA, que se
doam dia a dia para a promoção do
bem estar aos espécimes silvestres
e exóticos mantidos na instituição.
JBCA – Jornal Brasileiro de Ciência Animal 2014 7 (14): 508 – 522.
521
Referências bibliográficas
1. Pinto MGM. Repteis ameaçados de extinção no Brasil - IBAMA. Disponível em:
http://www.ibama.gov.br/projetos_centros/centros/ran/repteis.htm. Acesso em:
01 setembro 2013.
2. Lamônica RC et al., (2007). Growth, Shedding and Food Intake in Captive
Eunectes murinus (Linnaeus, 1758) (Serpentes: Boidae). Int. J. Morphol, 25:
103-108.
3. Mader DR (1998). Common bacterial disease and antibiotic therapy in reptiles.
Supl. Compend. Contin. Educ. Pract. Vet, 20: 23-33.
4. Ferreira PRB et al. (2012). Infecção por Morganella morganii como causa de
abscesso subcutâneo em Boa constrictor em conservação ex situ. Jornal
Brasileiro de Ciência Animal, 5: 320–334.
5. Paré JÁ et al., Microbiology: Fungal and bacterial diseases of reptiles. In: Mader
DR (2006). Reptile Medicine and Surgery. Missouri, St Louis: Elsevier Inc., 217-
238.
6. Miller DL et al. (2004). Cutaneous and pulmonary mycosis in green anacondas
(Euncectes murinus). J. Zoo. Wildl. Med, 35: 557.
7. Tran JH & Jacoby GA. Mechanism of plasmid-mediated quinolone resistance.
PNAS, 99: 5638-5642.
8. Jacobson ER (2007). Bacterial diseases of reptiles. In: Infectious diseases and
pathology of reptiles: Color atlas and text. Boca Raton: CRC Press, 461-526.
9. L. Dipineto et al. (2014). Oral flora of Python regius kept as pets. Letters in
Apllied Microbiology, 58: n.p.
10. Pees et al. (2011). Evidence for the transmission of Salmonella from reptiles to
children in Germany, July 2010 to October 2011. Eurosurveillance, 18: 1-10
11. Goppe NV, Adesiyun AA, Caesar K (2000). Retrospective and longitudinal study
of salmonellosis in captive wildlife in Trinidad. Journal of Wildlife Diseases, 36:
284–293.
12. Gray CW, Davis J, McCarten WG (1966). Treatment of Pseudomonas infections
in the snake and lizard collection of Washington Zoo. International Zoo
Yearbook, 6:278.
13. Funk RS & Diethelm G. Reptile formulary. In: Mader DR (2006): Reptile Medicine
and Surgery. Missouri, St Louis: Elsevier Inc., 1119-1139.
JBCA – Jornal Brasileiro de Ciência Animal 2014 7 (14): 508 – 522.
522
14. O'Neill AJ (2008). New antibacterial agents for treating infections caused by
multi-drug resistant Gram negative bacteria. Expert Opinion on Investigational
Drugs, 17:297-302.
15. Liu D et al. (2013). Prevalence of antibiotic-resistant Gram
negative bacteria associated with the red-eared slider (Trachemys scripta
elegans). Journal Zoo and Wildlife Medicine, 44:666-671.
16. Zajac M et al. (2013). Genetic lineages of Salmonella enterica serovar Kentucky
spreading in pet reptiles. Veterinary microbiology, 166:686-689.
17. Azitromicina. Dr.Luiz Donaduzzi. Toledo-PR: Prati, Donaduzzi & CIA LTDA,
2012. Bula de remédio.
18. Woods GL, Washington JA. Antibacterial susceptibility tests: dilution and disk
diffusion methods. In: Murray PR, Baron EJ, Pfaller MA et al. (1995). Manual of
clinical microbiology. Washington: American Society for Microbiology Press,
1327-1341.
Recebido em: Outubro de 2013
Aceito em: Agosto de 2014
Publicado em: Dezembro de 2014