sartre e o problema da coisa em si no pos kantismo

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SARTRE E O PROBLEMA DA COISA-EM-SI NO PÓS-KANTISMO RESUMO Neste artigo, procuro apoiar a afirmação de Sartre feita no primeiro parágrafo de O ser e o nada. Neste parágrafo, Sartre afirma um suposto progresso da filosofia moderna, que buscou reduzir o existente a uma série de aparições, visando suprimir certos dualismos que embaraçavam a filosofia. Para isso, faço um esboço geral do problema da “coisa-em-si” no pós-kantismo, através de uma breve introdução histórica da recepção da Crítica da razão pura, para mostrar que Kant estará comprometido com uma visão solipsista e dogmática, deixando-o vulnerável às críticas de seus sucessores, para que esses, mais tarde, como ressalta Sartre: busquem reduzir o dualismo ao monismo do fenômeno. Palavras-chave: Sartre; Kant; coisa em si; monismo; fenômeno. ABSTRACT In this paper I try to give support to Sartre´s assertion made in the first paragraph of Being and Nothingness. In this paragraph, Sartre says that there was a supposed development of modern philosophy, which sought to reduce the existing to a series of appearances in order to suppress certain dualisms that hindered philosophy. For this, I make a general outline of the problem of the "thing-in- itself" in post-Kantianism, through a brief historical introduction to the reception given to the Critique of Pure Reason. I show that Kant is committed to a solipsistic and dogmatic vision which leaves him to be vulnerable to criticisms of their successors. Later these ones, as Sartre notes, will seek to reduce dualism to monism of the phenomenon. Keywords: Sartre, Kant; thing itself; monism; phenomenon. Introdução Neste trabalho, procurarei esboçar, brevemente, o problema da coisa-em-si no pós- kantismo; isto é, farei uma breve introdução histórica para buscar clarear o contexto em que Sartre, no primeiro parágrafo de O Ser e o Nada, refere-se ao suposto progresso realizado pela filosofia moderna, que buscou reduzir o existente a uma série de aparições. Em Kant 1 , ou algo era coisa-em-si, ou era fenômeno. Isso porque como disse o próprio Sartre, quando se refere à filosofia da modernidade, essa visava suprimir certo número de dualismos que embaraçavam a filosofia, substituindo tal dualismo pelo monismo do fenômeno. Creio que Kant não era propriamente um monista, porém, sua filosofia, ao se comprometer com um pressuposto dogmático e solipsista, como veremos, deixará a porta aberta às críticas de seus sucessores na história da filosofia, para que esses, mais tarde, pudessem vir a consolidar uma supressão do dualismo na filosofia. Nesse sentido, para melhor compreensão da redução do “existente à série de aparições que o manifestam” 1 Geralmente considerado o pensador mais importante e influente da era moderna. Fonte de inspiração determinante do Idealismo Alemão (Fichte, Schelling e Hegel) no século XIX. Detentor de uma filosofia “revolucionária”, Kant proporcionou uma doutrina não apenas histórica, mas também divisora de águas no pensamento “pré-moderno” e no pensamento genuinamente “crítico” (HANN, 2008).

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SARTRE E O PROBLEMA DA COISA-EM-SI NO PS-KANTISMO RESUMO Nesteartigo,procuroapoiaraafirmaodeSartrefeitanoprimeiropargrafodeOsereo nada. Neste pargrafo, Sartre afirma um suposto progresso da filosofia moderna, que buscou reduzir o existenteaumasriedeaparies,visandosuprimircertosdualismosqueembaraavamafilosofia. Para isso, fao um esboo geral do problema da coisa-em-si no ps-kantismo, atravs de uma breve introduohistricadarecepodaCrticadarazopura,paramostrarqueKantestar comprometidocomumavisosolipsistaedogmtica,deixando-ovulnervelscrticasdeseus sucessores, para que esses, mais tarde, como ressalta Sartre: busquem reduzir odualismo ao monismo do fenmeno. Palavras-chave: Sartre; Kant; coisa em si; monismo; fenmeno. ABSTRACT In this paper I try to give support to Sartres assertion made in the first paragraph of Being and Nothingness.Inthisparagraph,Sartresaysthattherewasasupposeddevelopmentofmodern philosophy, which sought to reduce the existing to a series of appearances in order to suppress certain dualisms that hindered philosophy. For this, I make a general outline of the problem of the "thing-in-itself" in post-Kantianism, through a brief historical introduction to the reception given to theCritique of Pure Reason. I show that Kant is committed to a solipsistic and dogmatic vision which leaves him to be vulnerable to criticisms of their successors. Later these ones, as Sartre notes, will seek to reduce dualism to monism of the phenomenon. Keywords: Sartre, Kant; thing itself; monism; phenomenon. Introduo Nestetrabalho,procurareiesboar,brevemente,oproblemadacoisa-em-sinops-kantismo;isto,fareiumabreveintroduo histricaparabuscarclarearocontextoem que Sartre, no primeiro pargrafo de O Ser e o Nada, refere-se ao suposto progresso realizado pela filosofia moderna, que buscou reduzir o existente a uma srie de aparies. Em Kant1, ou algo era coisa-em-si, ou era fenmeno. Isso porque como disse o prprio Sartre, quando se refere filosofia da modernidade, essa visava suprimir certo nmero de dualismos que embaraavam a filosofia, substituindo tal dualismo pelo monismo do fenmeno.CreioqueKantnoerapropriamenteummonista,porm,suafilosofia,aose comprometercomumpressupostodogmticoesolipsista,comoveremos,deixaraporta abertascrticasdeseussucessoresnahistriadafilosofia,paraqueesses,maistarde, pudessemviraconsolidarumasupressododualismonafilosofia.Nessesentido,para melhorcompreensodareduodoexistentesriedeapariesqueomanifestam

1Geralmenteconsideradoopensadormaisimportanteeinfluentedaeramoderna. Fontedeinspirao determinantedoIdealismoAlemo(Fichte,SchellingeHegel)nosculoXIX.Detentordeumafilosofia revolucionria,Kantproporcionouumadoutrinanoapenashistrica,mastambmdivisoradeguas no pensamento pr-moderno e no pensamento genuinamente crtico (HANN, 2008).(SARTRE,1997, p. 15),realizadapelafilosofia moderna,comoapontou Sartre,perpassarei, brevemente, os argumentos dos filsofos da poca de Kant, mais envolvidos no problema da coisaemsi2:Jacobi,Reinhold,SchulzeeFichte.Apsisso,fareiumabreveconclusodos aspectosquecomprometem,emparte,todosessesautorescomavisodemodernidade filosfica dada por Sartre.Desde j, digo que meu propsito no analisar a exatido de tais argumentos, menos ainda avaliar se o problema conseguiu ser resolvido dentro desse contexto. Buscarei analisar comoosps-kantianos(JacobieSchulze:antikantianos.ReinholdedecertomodoFichte: defensoresdeKant)acolheramolegadoproblemticodafilosofiacrticakantiana,isto, como eles entenderam o problema da coisa-em-si. No explanarei a fundo a teoria de cada um desses autores, mas, sim, buscarei frisar os aspectos principais dessa discusso para situar um dos pontos da histria da filosofia, em que o pensamento moderno, como disse Sartre: tentou transformar tudo aquilo que existe, em mera apario fenomenal, que pode ser conhecida por um sujeito dotado de razo. Jacobi: Kant, solipsista? A polmica um feto parido do apndice de um dilogo de 1792 de Friedrich Heinrich Jacobi3intitulado:DavidHumeSobreaCrena:ouRealismoeIdealismo.Nesseapndice, Jacobio precursorem trabalhar oproblema daafeco(centro dapolmicadacoisaem si),procurandodemonstrar,atravsdelongaspassagensdaprimeiraediodaCrticada RazoPura4,queoIdealismoTranscendentallevariaaosolipsismo.Jacobidesmascarao problemaqueosentusiastasdafilosofiakantiananoenxergavam;comobemresumiu Bonaccini (2003):

2 Essa polmica tem sua origem na Alemanha, poucos anos depois de Kant ter efetuado a virada crtica. O quepodemosconhecerdascoisasmeraaparncia(fenmenos),umavezqueacoisa-em-si,segundo Kant, totalmente incognoscvel (GIL, 1992).3FoiumfilsofoAlemo(1743 -1819),presidenteda AcademiadeCinciasdaBaviera duranteoperodo 1807/13.Ligou-seespecialmentea JohannGottfriedvonHerder, JohannGeorgHamann e Goethe.Discpulo de Rousseau,Jacobicombateuvivamenteosherdeirosidealistasde Kant,particularmenteJohannGottlieb Fichte e FriedrichSchelling(DIGIOVANNI,George."FriedrichHeinrichJacobi".In:THETANDFORD ENCYCLOPEDIAOFPHILOSOPHY.2010.Disponvelem:. Acesso em 19 set. 2011). 4 De acordo com Soares (2009) na sua dissertao sobre a funo do corpo na filosofia de Schopenhauer, aspassagenscitadasporJacobiencontram-senaCrticadoquartoparalogismodapsicologia transcendental(A367A380),mashtambmumapassagemdaEstticaTranscendentalquetratada idealidade do tempo (A 36 A 37).[...]oidealismotranscendental,princpioquefundamentaadoutrinadaCrticada RazoPura,noadmitenadaquenosejamrepresentaes;enosepronunciasobre nadaquepossaserexterioreindependentederepresentaes(BONACCINI,2003, p.43). SeKant,atravsdoidealismotranscendental,dizquenosepodesereferira fenmenosforadenscomosendocoisaemsi,Jacobimostraquetaisrepresentaes (material dado pela sensibilidade) fazem do idealismo transcendental uma teoria to solipsista quanto de George Berkeley5. Alm disso, para Jacobi, essa tese de que as impresses so provocadasporobjetosexternosnocompatvelcomosolipsismodoIdealismo Transcendental(BONACCINI,2003,p.47),comopodemosvernasprpriaspalavrasde Jacobi: Quando se considera os fenmenos exteriores como representaes, provocadas em ns como coisas em si, que nos so exteriores, ento no se v como seria possvel conhecer a existncia dessas coisas, a no ser mediante a ilao do efeito para a causa, no entanto, quenoresolveadvidadeseestacausaestemnsouforadens.Podeento admitir-secerto,queacausaseriaalgoemnossasintuiesexterioresqueno entendimento transcendental, poderia estar fora de ns, mas esse algo no o objeto que ns entendemos como fazendo parte das representaes da matria e das coisas fsicas, poisessascoisassoapenasfenmenos,isto,merasformasderepresentaoquese encontram sempre e apenas em nse cuja a realidade assenta na conscincia imediata, talcomoaconscinciademeusprpriospensamentos.Considerandoqueraintuio interiorqueraexterior,oobjetotranscendental-nossempredesconhecido.Nose trata,porm,aquidele,masdoobjetoemprico,quesedenominaexterior,quando representado no espao, e interior, quando representado apenas em relao ao tempo; mas o espao e o tempo encontram-se apenas em ns (JACOBI, 1992, p.102 103).Sabe-sequeKantnoqueriaserconsideradoumsolipsista,atporquenoseu significadohistrico,otrabalhodeKant,almdequererrefutaroceticismodeHume, procuroucensuraraCosmologia,TeologiaeOntologiaracionalistaeescolstica(TELES, 2009).Assim, segundo Jacobi, Kanttevedeadmitirqueascoisasem si nos so dadas(fora dasrepresentaes),quandodizqueobjetosexternossopercebidospelapercepointerna, como vemos em suas prprias palavras:

5Filsofo irlands(1685 -1753)queaceitouo empirismo deLocke,masnoadmiteapassagemdos conhecimentos fornecidos pelos dados da experincia para o conceito abstrato de substncia material. Por isso, e assumindo o mais radical empirismo, Berkeley afirma que uma substncia material no pode ser conhecida em si mesma. O que se conhece, na verdade, resume-se s qualidades reveladas durante o processo perceptivo. Assim, oqueexisterealmentenadamaisqueumfeixedesensaeseporissoque serserpercebido(Downing, Lisa."GeorgeBerkeley".In:THETANDFORDENCYCLOPEDIAOFPHILOSOPHY.2011.Disponvelem: . Acesso em 19 set. 2011). Noposso,porconseguinte,propriamente,percepcionarcoisasexteriores,masapenas partindodaminhapercepointerna,concluiraexistnciadelas,namedidaemque consideroessapercepooefeitodealgumacoisadeexternoacausamaisprxima (KANT, A 368). VemosclaramenteKantdizerqueapercepointernaconcluiaexistnciadecoisas exteriores e que essas so a causa da prpria percepo. Por isso, Jacobi diz que Kant assume queimpressessensveissoprovocadasporobjetosexternos(nosentidodecoisaemsi). Dessaforma,entraaquioargumentocontraditriodeKant,porque,comoqueemsua filosofia,Kantdizquesconhecemosfenmenoseestamospresosarepresentaes(coisas emsi soincognoscveis)como queagorapressupecoisasem siafetando nossos sentidos? Assim, de onde surgem tais objetos, se no podem ser empricos e nem transcendentais? No podesertranscendentalporqueoobjetoempriconoexisteforadens,masidnticoa nossarepresentao,enopode seremprico, pois o objetotranscendental(melhordizendo, transcendente)nostotalmentedesconhecido,umavezquenosabemosseeleouno causa e se ele age ou como age. Para Jacobi, o sistema de Kant no pode ser entendido sem o pressupostodequesomosafetadospelosobjetos:problemadaafecopelosobjetos.O grandeproblemaparaJacobipareceestarnofatodequequandofalamosderepresentaes, sem poder admitir o que ela re-representa (por causa da tese de incognoscibilidade das coisas em si mesmas), a no ser como outra representao (BONACCINI, 2003, p.47), acaba-se por tomarumaposturadogmtica,poisnosepodechamardemerofenmenoaquiloque pressupomos existir fora de ns, no espao, como pensa um realista e ainda assim compactuar essa tese com coisas que existem em si mesmas. Portanto, se o objeto emprico fenmeno, [...]representao,nopodeexistirforadens;esedoobjetotranscendental[...]nada podemossaber(BONACCINI,2003,p.47),comoadmitirdogmaticamentequeesse fenmeno a causa de nossas representaes? Assim, o problema de Kant no se esgota em admitirqueexistemcoisasemsimesmas,masnofatodequeissolevaacrerqueno sabemosabsolutamentenadasobrecomosomosafetadosporobjetos,problemaquenos carrega de encontro ao ceticismo, porque: Se objetos so fenmenos e fenmenos representaes cujas causas desconhecemos (e a rigornodeveramosfalarsequerdecausas),notemossenosensaese representaes.Noqueserefereorigemdasafecessomosignorantes (BONACCINI, 2003, p. 50) Oceticismopareceevidenciar-sequandopensamosquetodososconceitosso subjetivos, bemcomo nossosconhecimentos, quedeformaalgumadizemrespeitoprpria natureza em si, pois apenas aparncia, fenmeno. A soluo ao problema dada por Jacobi que o idealista deve afirmar o mais forte idealismo, mesmo sob o risco decair no egosmo terico (CACCIOLA, 1994). Reinhold: reconstruindo a filosofia crtica

A defesa dos kantianos partir do maior divulgador da filosofia de Kant na poca, o j conhecido Karl Leonard Reinhold6, por ter escrito suas cartas sobre a filosofia kantiana e ter publicadoem1789oEnsaiosobreateoriadafaculdaderepresentativahumana,quemais tarderecebeuonomedeFilosofiaElementar,emquedefendeumacinciaquefundamente todososprincpiosdafilosofiaenosomentedametafsicacomotentouKant,poisessa nova cincia tinha justamente o objetivo de complementar a tarefa realizada por Kant na CRP e, ainda, conferir a ela total poder persuasivo (TELES, 2009, p.24). Dessa forma, Reinhold tentar fazer da faculdade representativa, um elemento prvio faculdadedeconhecimento,fazendodarepresentaoumacondionecessriaparao conhecimento. Provando tal feito, espao em que a filosofia transcendental ou, ainda, a teoria doconhecimentoempricoestejafundamentadaemumateoriageraldarepresentao,far com que a filosofia crtica tenha um primeiro princpio para se sustentar. Isso se daria atravs domonismometodolgico,queReinholdbuscouintroduzirparaprovarquetodasas proposies de uma teoria devem ser justificadas a partir de uma s proposio fundamental para a teoria possuir unidade sistemtica (KLOTZ, 2008, p.37). Portanto, para buscar reconstruir a filosofia crtica, a partir de um primeiro princpio, Reinholdtrabalhoutentandodistinguirascondiesinternasderepresentao,dasexternas, naqualasinternascorrespondemaaquiloquenointeriordaprpriarepresentaofazem refernciaaosujeitorepresentanteeaoobjetorepresentado(SOARES,2009,p.20), chamandodematriadarepresentaooqueserefereaoobjetorepresentadoematriado representante aquilo que se refere ao sujeito representante (forma da representao).

6 Foi um filsofo austraco (1757 1823) e primeiro ocupante da cadeira de filosofia crtica da Universidade de Jena (1787 1794). Proclamador da necessidade de uma apresentao mais cientfica e sistemtica da filosofia crtica,almdedefensordoiluminismopopular.Alcanouafamacomoumdosprimeirosdefensoresda filosofiacrticakantiana(BREAZEALE,Dan."KarlLeonhardReinhold".In:THETANDFORD ENCYCLOPEDIAOFPHILOSOPHY.2008.Disponvelem:, Acesso em 19 set. 2011). O que Reinhold queria parecia ser distinguir a matria da representao do seu objeto representado. Fazer da representaoum meio para o conhecimento e no um conhecimento propriamente dito. Isso porqueesseesforo poderialivrarKant dasacusaesa qualestava envolvida a sua filosofia. J que a matria da sensao se tornaria a coisa em si em Kant, de acordocomascrticasdeJacobi,quedemonstrouqueeraamatriaquedavaformaa representao kantiana. E para aludir sua teoria, de acordo com Soares (2009), Reinhold d o exemplo de uma rvore: [...]Pensemosnarepresentaodeumarvore.Vistadelongeamatriada representaodarvoreassazeconfusa.Amedidaquenosaproximamos,a representao vai ganhando cada vez mais matria. Ao passo que o objeto representado (a rvore) permanece sempre o mesmo (SOARES, 2009, p. 21). Notemos, ento, que a representao seria a matria ganhando forma de representao, uma vez que para uma representao existir seria necessria a forma e a matria. Assim, para Reinhold,acoisaemsioobjetoemsimesmo,masaindanosintetizadopelaformada representao,oquesalvariaKantdascrticas.Masentooquesoessesdadosafectantes que determinam a representao? Parece que nesse ponto Reinhold volta estaca zero, pois: [...] esse justamente omodo de conceber asfaculdades cognitivas queKant declarou ser a razo de parecer ao leitor da Crtica da Razo Pura que sua deduo subjetiva era umahipteseequeeleseprontificouamostrar,emoutraoportunidade,quenossas faculdades cognitivas no deveriam ser assim explicadas (TELES, 2009, p.29). VemosassimcomoemKant,Reinhold,aceitarqueacoisaemsiexiste,mas incognoscvel,pelomesmofatoqueKant:arecusadesertachadodesolipsista.Assim, quando Reinhold determina as condies internas como sendo a conscincia algo que recebe eproduzasrepresentaes,tentandofazerdascondiesexternas,algoquenopertence faculdadehumanadarepresentao[...]nonosparecequeporaseresolveoimpasse (BONACCINI, 2003, p. 66).Assim, em parte, Reinhold se encontrar vulnervel e a resposta ctica que vir nas palavras implacveis de Gottlob Ernst Schulze. Schulze: o ceticismo detalhista Conta-seque,em1792,GottlobErnstSchulzeapenasrepetiunoEnesidemo7a objeo de Jacobi de modo mais forte. Porm suas crticas no se dirigiram apenas ao prprio Kant,mastambmaReinhold.Schulzetentanessetrabalho,primeiramente,refutarateoria da faculdade representativa, criada por Reinhold, para depois, alegar que Kant teria cometido uma petio de princpio ao dizer, sem provas, que todo o conhecimento humano comea com a ao de objetos sobre nossos sentidos - sendo tais objetos que fornecem a ocasio para que nossamenteseexteriorize(pretensokantianadeafastarofantasmadoidealismoedo cepticismo, que no admitem tal proposio): [...]Aprpriacrticadarazoavanaaproposio:todooconhecimentohumano comea com a influncia de objetos objetivamente existentes sobre os nossos sentidos, e estes objetos proporcionam o primeiro ensejo para que o nosso nimo se manifeste; no s sem qualquer prova, e com proposio em si totalmente assente e incontestavelmente certa,erefutando,portanto,osfantasmasdoceticismoedoidealismoatravsdeuma proposioaceiteamododepetio,cujaverdadeambosnegavam;mastambmos seus prprios resultados anulam completamente a verdade dessa proposio admitida a modo de petio (SCHULZE, 1992, p.261-262).Dessa forma, se ver que na opinio de Schulze, Kant teria erigido sua crtica custa deumdogma,umavezqueelapartedeumapetiodeprincpio,pois,paraSchulze,os resultados da Deduo Transcendental das categorias de causa e de realidade s se aplicam s intuies empricas e, se essa deduo estiver correta, um dos principais princpios da Crtica estariaincorreto.DequeformaKantbuscadefenderaobjetividadedoconhecimento humano quando esse se reduz a representaes? E como partir da afeco de objetos externos, seessesltimossoincognoscveis?(BONACCINI,2003,p.84).MasSchulzenoest voltando seu argumento crucialmente a Kant, mas sim a Reinhold nesse sentido, pois: [...] nesidemus aceita as motivaes de Reinhold para constituir o edifcio da filosofia crtica sinteticamente a partirde um primeiro princpio; aceita o que Reinholdentende porprimeiroprincpio;aceitaqueumafilosofiacompretensesdecientificidadedeva comearcomanooderepresentao,apesardefazerinmerasqualificaesaos princpiosdeReinhold(Schulze,1792,p.49-47;[45-50]),masrejeitaanoode faculdade-representativaesposada,tantoporReinhold,comopelafilosofiacrticaem geral(idem:p.95-108;[74-83]).Emresumo,aestratgiadeReinholdemsua Elementharphilosophieseriaaseguinte:todocticoaceitaquetemosrepresentaes, entodeveaceitartambmquetemosfaculdadesrepresentativasquesoacausade nossas representaes. Esse ltimo passo Schulze no aceita (TELES, 2009, p. 31).

7EnesidemoousobreosfundamentosdafilosofiaelementarapresentadapelosenhorprofessorReinhold (1792). Livro de Schulze que colocou o ceticismo em lugar importante nas discusses ps-kantianas (GIL, 1992). Emsuma,SchulzemaisminuciosodoqueJacobi,poisencontranoargumentode Reinhold, alm do problema da afeco, uma contradio interna no idealismo transcendental. O ctico implacvel com Reinhold, que pressups faculdades cognitivas sua interpretao das pretenses da Crtica da razo pura em provar a existncia de juzos sintticos, a priori, em que o conhecimento se d atravs de intuies e conceitos para que fosse possvel refutar o empirista Hume. Em suma, para Schulze, aceitando a tese de Kant, teramos que aceitar essa tesecomoumarefutaodogmticadoidealismoedoceticismo(BONACCINI,2003, p.85),pois,seaplicassemascategoriasacoisasemsimesmas,fariaquetomssemospor certo coisas que no podem ser conhecidas.Reinhold, nessainterpretao,pressupefaculdadescognitivas,eoqueSchulzequer saberoquesignificapressuporquetemosfaculdadescognitivas,oqueentendemospela noodesujeitotranscendentale,qual,ouquetipodeentidadequenosReinhold,mas Kantpressupeparaqueexistaesseaparatocognitivoquegarantaosjuzossintticosa priori? Assim, nota-se a ambiguidade do sujeito transcendental kantiano, pois no faz sentido tentar declar-lo como fonte do conhecimento, uma vez que, se for entendido como coisa em si, a categoria de causalidade no poder ser aplicada a ele e se for entendido como noumenon ser entendido como entidade puramente inteligvel ou unidade formal da experincia, o que, a princpio, Kant no se comprometeu (TELES, 2009). Almdisso,Schulzequersabersetemosrepresentaesequemasgarante,ouseja, qualentidadefundamentaquetemosrepresentaesquandosedizquetemos representaes?Assim,atravsdessaanlisefeitaporSchulze,dofundamentodadopor Reinhold filosofia de Kant, que armado o contra-argumento, alegando que esse primeiro princpiodadoporReinholdfilosofiacrticaestariasendoexpostocomoumargumento dogmtico. Porm, Kant teve, como veremos, a sua noo de sujeito transcendental defendida por Solomon Maimon8 em seu comentrio ao Anesidemo, mais precisamente em suaDritter Brief des Philaletes na nesidemus (1794), em que enfatiza: AexplicaodoSr.Reinholddefaculdadeemgeral,aqualelenasuaexplicaode faculdade representativa fundamenta, est incorreta. Faculdade-representativa aquilo atravsdoqueamerarepresentaopossvel,portantoafaculdadegeraldo fundamento da possibilidade de uma coisa; mas isto no s contra toda terminologia filosfica,masnofazabsolutamentequalquersentido.(...)Agora,umavezquede

8CticoquereforouemseucomentrioaoAnesidemo,quenofazsentidoparaumadeptodoidealismo transcendental manter uma referncia de nossas representaes a algo distinto e que para respeitar o uso correto da linguagem, a filosofia crtica deveria revogar completamente o conceito de representao (TELES, 2009, p. 30). acordo com a filosofia crtica, o sujeito das representaes para ns um mero conceito formal,nopodeeleserchamadodepoderderepresentaesenquantofaculdade representativaporquetantoumcomoooutropressupeumobjetorealeumarelao real (de causalidade). Deveria o Sr. Reinhold ter entendido sob faculdade representativa noofundamentorealdaefetividade(acausa)dasrepresentaes,massomenteisto comum a todas representaes efetivas, assim como, por exemplo, a lei de atrao, que no entendida como causa da atrao, mas somente o modo geral ou a lei segundo a qual a atrao ocorre; deste modo, no presente caso, faculdade representativa seria de modo algum algo distinto da mera representao (MAIMON, 1794, apud TELES, 2009, p.33) O que se pode notar, aqui, das palavras de Maimon, que a filosofia crtica precisa ter comprometimento,paraservalidadaapenascomumxsuficienteparaexplicarque possumos representaes. Isso porque a Crtica da razo pura no precisa explicitar o que ou qual entidade o sujeito transcendental, assim como a fsica no precisa determinar que tipo de entidade corresponda a uma lei da natureza para explicar os fenmenos que explica (TELES, 2009, p.34).exatamentedessaproblemticaentreReinholdeSchulzeedadefesadocrtico Maimon que surge a posio de Fichte, que, por um lado, concordou com Reinhold (que a filosofia crtica precisa encontrar um primeiro princpio), mas, por outro, aceitou o que disse Schulze, que ressaltou que o primeiro princpio encontrado por Reinhold estaria incorreto. Por isso,comoveremos,Fichte dir que o primeiro princpio no poderserumfatoempricoe ainda acabar por suprimir a noo de coisa-em-si. Fichte: a natureza geral do eu O projeto monista (primeiro princpio) de Johann Gottlieb Fichte9 concebe a estrutura de nosso conhecimento como tendo seu ponto de partida numa explicao da espontaneidade do eu. Tal projeto se denominou Doutrina da Cincia, publicado em 179410, que apresenta o objeto da sua doutrina como sendo representao, adotando o termo central de Reinhold (KLOTZ, 2008). Por isso, para uma melhor compreenso da postura de Fichte, em relao coisa-em-si, fica mais evidente se nos concentrarmos naPrimeira Introduo Doutrina da Cincia (1797), que diz:

9InspiradopelasobrasdeKant,Fichte(1762-1814)desenvolveudurantealtimadcadadoXVIIIumaviso radicalerigorosamentesistemticadoidealismotranscendentalkantiano,queeleintituloudeDoutrina-da-cincia,ondeexpressouasubjetividade,oeupuro,sobreoquallecionoudurante(1794-1799)na Universidade de Jena (FICHTE, 1992).10 A obra foi publicada originalmente com o ttulo deFundao de Toda a Doutrina-da-Cincia e carregava osubttulo:Comomanualparaseusouvintes.Consideradoumdoslivrosmaisdensosedifceisda filosofia ocidental (FICHTE, 1992, p.35).Atentaemtiprprio:desviaoteuolhardetudoqueterodeiaedirige-oparaoteu ntimo esta a primeira exigncia que a filosofia tem para com o seu aprendiz. No se trata de nada que te seja exterior, mas apenas de ti prprio (FICHTE, 1992, 315-316). Ento,vamos diretoao ponto:comoFichteentende o problema dacoisa-em-si? Para isso,precisocompreenderbrevementecomoFichteviaapolmicaentreoskantianose antikantianos, para depois mostrar que a sada dada por Fichte foi a total supresso da noo de coisa-em-si. Adianto, aqui, que, para Bonaccini (2003), a resposta de Fichte dogmtica (supe como provado o que Schulze questiona (BONACCINI, 2003, p. 108), a saber: se as coisasemsinoproduzemnadaemns,ento,tambmpodemosdizerqueelasno produziram essas determinaes que se encontram em ns, pois, se so incognoscveis, parece serplausvel,quenopodemossaberseela(acoisaemsi)podeounoproduziressas determinaes em ns. NaIntroduoDoutrinadaCincia,Fichtefazumacomparaoentreas interpretaesdoskantianoseantikantianos,queolevaaconcluirquetodaapolmica poderia ser evitada se ambas as correntes tivessem compreendido bem o que escreveu Jacobi em seu trabalho:David Hume sobre a crena: ou realismo e idealismo. Uma vez que, nesse trabalho, como vimos no comeo desse primeiro captulo, Jacobi procura demonstrar, citando vrias passagens de obra, na qual Kant no se refere s coisas exteriores e a ns como sendo coisa-em-si (o que faz Jacobi acus-lo de solipsista, dizendo que isso que faz Kant assumir talnoo).EdessapossvelminterpretaodoapndicedaobradeJacobiqueFichte concluiseupontodevista,queentendeaconsideraodoscrticoscomosendodogmtica, pois para Fichte a lei da causalidade no pode ser aplicada na experincia, mas apenas apriori pelas categorias do entendimento: DesejariaapenasqueaquelesinterpretesdeKantmepermitissemfazer-lhesumas perguntas.Atagora,ondepodeir,segundoKant,aaplicabilidadedetodasas categorias e, em especial, a da causalidade? Apenas at ao domnio dos fenmenos, ou seja,somenteataquiloquejparanseemns.Comosepoderiaentochegara admitiralgodiferentedoEU,comofundamentodocontedoempricodo conhecimento? [...] assim que o prprio Kant v o problema (p.211 da obra de Jacobi) e, no aceita coisas que se encontrem em si fora de ns (FICHTE, 1992, 347). Fichteentendequeessaaplicaodacausalidade,porpartedeJacobieSchulze, considerada como dogmtica, uma vez que eles aplicam a causalidade s coisas em si. Dessa forma,oqueacoisaemsiparaKantdopontodevistadeFichte?Umnmero11como podemos ler em muitas passagens dos seus escritos (FICHTE, 1992, p.347). Fichte entende queesseskantianosafirmamqueessenmero(coisaemsi),que,paraele,apenasum pensamentosurgidodofenmeno,nopodesercausadesseltimo,poisessefenmeno apenas um ser pensado como complemento e que existe apenas para o nosso pensamento. Por isso, Fichte ironiza: Oglobo terrestre assenta sobreograndeelefantee ograndeelefante... assentasobreo globo terrestre.Segundoeles, a coisaem si, que um mero pensamento,h-deactuar sobre o EU! Ser que esqueceram j o seu primeiro discurso? Ser que a sua coisa em si que ainda h pouco no passava de um mero pensamento, agora algo de diferente de um mero pensamento? (FICHTE, 1992, p.348).Essekantismodoskantianos,nainterpretaodeFichte,umretrocessoao pensamento dogmtico que a filosofia crtica de Kant deveria ter extinguido, porm o prprio Schulzej haviaadvertidoisso,masessee Jacobi noescapamscrticas deFichte, que os censuradedogmticos,alertandoqueoprprioKantdeixoubrechasparaessas interpretaes,umavezque,paraele,asformaspurasdaintuiosomerasformasda faculdade humana de representao. E que essa brecha deixou a hiptese de que haveria uma coisa-em-si e, ainda, de que haveria outra entidade alm da humana, que a pudesse captar.Kant no falou que as coisas-em-si eram causas das nossas representaes, mas disse queacoisa-em-siexistia,pormincognoscvel,comoalertou Jacobi, na sua hiptesede que Kantassumeessanoopormedodesertachadodesolipsista.Fichteinsinuanasua argumentaoque,enquantooprprioKantnoexplicarcomassuaspalavrasquea sensao explicvel em filosofia a partir de um objeto transcendental que existe em si fora dens(FICHTE,1992,p.350),elenoassumiriaopontodevistadadopeloscrticosde Kant, que ele considera terem interpretado mal a filosofia feita pela obra de uma cabea, e no do mero acaso. Fichte,ento, seimbui namisso deexterminarqualquerresqucio dedeterminaes que se dem atravs dessa passagem externa e interna (problema da afeco), inclinando-se a explicarquetodasasdeterminaesocorremnointeriordoeu,atravsdenossa subjetividade, suprimindo, assim, a noo de coisa em si. Mas, antes de mostrar tal supresso, interessanteanalisar,aqui,maisumpassodaargumentaofichteana,cujoobjetivo

11preciso ressaltarqueacoisa-em-si no pareceserapenasum sinnimo denmero,masassimque Fichte a interpreta, como podemos ver na passagem citada logo acima (GIL, 1992). demonstrarcomodesencadeiaasupresso:oentendimentodizKant(p.221doensaio sobre Jacobi) que aduz o objeto ao fenmeno, articulando numa conscincia o seu carter de multiplicidade (FICHTE, 1992, p.351).O que Fichte quer aqui, em suma, demonstrar que o objeto um mero pensamento. Nota-se claramente que no est preocupado com acusaes de solipsismo, mas, sim, apenas em livrar a filosofia kantiana da interpretao que ele diz ser dogmtica de sua filosofia. A afeco, para Fichte, apenas um mero pensamento. Se pe um objeto, pensando que ele te afetou,pensas-tenestecasoatiprprioafetado(FICHTE,1992,p.352).Atentemos-nos, aqui,queasuaargumentaoquerdemonstrarqueoconhecimentonopartedosobjetos, mas, da afeco. E, por isso, para Fichte, na filosofia crtica, no se poder falar de coisas em si mesmas, porque tudo que pensado partir do EU, eas coisas em si mesmas nada mais sodoqueumno-pensamento.Comopodemosvernaargumentaodadaporessena Recenso de Enesidemo (1792): [...]eusou,svlidotambmparaoEu;quetodoNo-EusparaoEu;queele recebe todas as determinaes deste sera priori apenas atravs da sua relao com um Eu; mas que todas essas determinaes, na medida em que o seu conhecimento de fato possvelapriori,setornamabsolutamentenecessriasatravsdameracondioda relao de um No-Eu com um Eu em geral resultaria daqui que uma coisa em si, na medida em que deve ser um No-Eu que no est em oposio a um Eu, se contradiz a si mesma [...] (FICHTE, 1992, p. 312) ParaFichte,oEuinteligvelpensvel,deveserpensadodentrodoprincpiode identidadeenodacontradio,porisso,ascoisasquesopensadasefaladasjnoesto maisemsimesmaseindependentesdasubjetividade.dessaargumentaoqueFichte conclui ser umabsurdo pensaremcoisasem si mesmas, poisestas so umno-pensamento. Assim, acaba por seguir o conselho de Jacobi e se agarra a um idealismo radical (SOARES, 2009). Concluso Poressaanlisedoproblemadacoisaemsinops-kantismo,pode-senotarquea filosofia de Kant, dependendo da argumentao que se comprometer, estar sempre tentando escapardeumaconceposolipsista,recaindosobreodogmatismooufugindodessepara agarrar-seaosolipsismo.Ora,sedefato,asensaoqueforneceomaterialparaquea percepo, atravs das categorias, possa formular o objeto transcendental, ento, significa que o material da intuio, ou seja, aquilo que dado atravs das formas da sensibilidade (tempo e espao),temdeprovirdealgumlugar.Seessematerialfornecidosensaodeforma exteriorans,ento,teremosdereconhecerqueacausadenossassensaesalgoreale existente,independentedenossassensaes.Seissoforverdadeeumkantianose comprometercomanoodecoisaemsi(comofezoprprioKant),entoeleestar recorrendoaumaconcepodogmticadomundo.Assim,teremosdereconhecerqueesse algo exterior a ns propriamente a coisa em si. Se no, esse algo que no cognoscvel para ns,masqueafetaasnossassensaes,terdesercognoscvelaalgum.Quemseresse ente?E,ainda,seaceitarmosqueexistemcoisasqueafetamosnossossentidosouqueo materialdaintuionosdado,comodisseKant,entoele(essematerial)spodeser entendidocomocausadasnossasrepresentaes,oquecaracterizaumacompreenso dogmtica.Por outro lado, se um kantiano disser que no a coisa em si que nos afeta, pois essa incognoscvel,entoterquedizerque,almdasnossasprpriasrepresentaes,noexiste nada,caracterizando,assim,umaconceposolipsista.E,porfim,aindatemosaalternativa de total supresso da coisa-em-si da filosofia kantiana, a exemplo do que pensou Fichte, que assumiu um idealismo extremo, ao dizer que a noo de coisa-em-si nem sequer existe, pois umno-pensamento,eoqueexisteapenasaexperinciaindividualdecadaum, consolidandooseuprojetomonista,quesecomprometecomamodernidadefilosfica descritaporSartre:Certoqueseeliminouemprimeirolugaressedualismoqueno existenteopeointerioreoexterior(SARTRE,1997,p.15).Essafilosofiamonista, entendida como uma busca de reduzir os dualismos existentes na filosofia a meros fenmenos daexperinciaemprica,afastaapossibilidadedesecompreenderoexistente,enquanto existencial, em que o dualismo no mais pode ser entendido como um sujeito que interage em seumeioetemconscinciadesi,masapenasdotadoderazoepode,atravsdisso,agir livremente nesse mundo de aparies manifestadas por esse prprio sujeito do conhecimento. Sartre,corretamente,dizqueofenmenonoescondenada,poisarealidadedestataa consisteemqueelaestaenooqueeusou(SARTRE,1997,p.17).Asupressodo dualismopelafilosofiamodernaimpossibilitapensarohomemenquantoalgoalmdo perigoso conceito de animal dotado de razo. Referncia BONACCINI,JuanA.KanteoproblemadacoisaemsinoIdealismoAlemo:suaatualidadee relevncia para a compreenso do problema da Filosofia. Rio de Janeiro: Relume do Mar; Natal, RN: UFRN, Programa de ps-graduao em filosofia, 2003. BREAZEALE,Dan.KarlLeonhardReinhold.Thestandfordencyclopediaofphilosophy,2008. Disponvel em: . Acesso em 19 set. 2011. CACCIOLA,MariaL.M.Oliveira.Schopenhauereaquestododogmatismo.SoPaulo:Editora universidade de So Paulo, 1997. DIGIOVANNI,George.FriedrichHeinrichJacobi.Thestandfordencyclopediaofphilosophy,2010. Disponvel em: . Acesso em 19 set. 2011. DOWNING,Lisa.GeorgeBerkeley.Thestandfordencyclopediaofphilosophy,2011.Disponvelem: . Acesso em 19 set. 2011. 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