resumo - fund socioculturais

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1 Fundamentos Socioculturais da Educação Capítulo 1. Educação como Fenômeno Humano Capítulo 1.1 Significado amplo de Educação Durkheim é considerado o “pai da Sociologia “ e foi pioneiro nos estudos da sociologia da educação. Se debruçou sobre questões como “Qual a função da educação em nossa sociedade?” e “Como ela Funciona?”, analisando a “educação como fato social”. (p.24/25) A visão de Durkheim da sociologia é positivista, objetiva e quantitativa, passível de comparação. O fato social é generalista, coercitivo e exterior. O conceito de Fato Social de Durkheim passa por algumas especificações, sendo que nem todo fato ocorrido na sociedade é um fato social. O Fato Social existe exteriormente ao indivíduo, ou seja, não é um fato individual ou psicológico, mas sim social, de forma que o Fato Social existe antes do indivíduo, é algo herdado da sociedade na qual está inserido, ou seja, existe fora dele e antes dele, não tendo sido criadas por ele, mas sim herdadas por ele. É objetivo, exterior ao indivíduo e transmitido pela educação. (p.25) O indivíduo, ao nascer, se depara com as regras sociais sendo-lhe impostas como algo superior de forma que a única alternativa é se adaptar a essas regras, valores, crenças normas e relações sociais. Durkheim se refere a esta imposição pelo termo “coerção”, e constata que essa coerção existe como mecanismo controlador e de manutenção por meio de sanções sociais que podem ser implícitas – como o desprezo, por exemplo – ou explícitas, nas reações de adversidade dos outros diante de uma cultura ou posicionamento diferente, ou mesmo pela legislação através de sanções violentas como a retirada da liberdade. Coerção – Sanções Sociais – Implícitas, Explícitas e pela Legislação. (p.26) Para Durkheim não interessam as manifestações individuais dos fatos sociais, mas apenas as coletivas. Para ele, a sociedade não se constitui da soma das individualidades, mas de algo que é totalmente indiferente às manifestações individuais. (p.28) Para Durkheim a educação é o motor da coerção social, um mecanismo de imposição da herança social que cada indivíduo deve assimilar e reproduzir em sociedade. Nisso, a educação serve, ao mesmo tempo, como impositora de valores e regras sociais, e como mantenedora de uma sociedade coesa como um organismo em bom estado de funcionamento. (p.29) O conceito de “consciência coletiva”, para Durkheim, pode ser definida como o conjunto das crenças e dos sentimentos comuns à maioria (média) dos membros de uma mesma sociedade. Na escola a criança desde cedo sofre a pressão do meio social tentando moldá-la à sua imagem, forçando seu ingresso nessa consciência coletiva, lançando o indivíduo pra fora de si ao inseri-lo na vida coletiva, auxiliando na coesão social. Para ele, essa obediência a regras exteriores não amesquinha os indivíduos, ao contrário, leva-os a construir uma sociedade melhor, pois a ação de cada um para melhorar a sociedade objetiva melhorar a si mesmo, ao mesmo tempo em que a educação objetiva tornam “humanos” (sociais) os “homens” (indivíduos), inserindo-os em sociedade. Dessa forma, o fato social tem como meio a coerção social, que tem como objetivo a conservação social, ou seja, a coesão social. (p.30) Para ele, não é possível “fugir” dessa coerção pela educação pois, se alguém for educado fora dos padrões sociais vigentes, pode vir a ser violentamente rechaçado, visto que não encontrará harmonia no ambiente em que cresceu e para o qual não foi devidamente educado. (p.31) Estabelece também, em suas teorias, que existe uma diferenciação entre os papéis sociais e o tipo de educação, onde afirma que para cada grupo social deveria constituir uma educação específica, de modo que cada qual cumprisse seu papel social, como se fosse algo natural, onde não deveríamos todos nos dedicar ao mesmo gênero de vida pois temos diferentes funções a preencher na sociedade e deveríamos nos colocar em harmonia com o trabalho que ela nos incumbe, seja como homens de sensibilidade ou como homens de ação, de forma que a educação não deveria ser a mesma para todos os indivíduos. (Parecido com a ideia de Platão onde cada indivíduo nasceria com potencialidades distintas e deveria ser nelas educado.) (p.31/32) A solidariedade mecânica caracteriza uma sociedade mais simples, marcada pela semelhança social entre os homens, que partilham uma consciência comum nos modos de pensamento, crenças, etc., como uma comunidade rural ou indígena que viva do mesmo modo, por exemplo, ou uma comunidade pré-capitalista.

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Resumo dos Fundamentos Socioculturais

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Fundamentos Socioculturais da Educação Capítulo 1. Educação como Fenômeno Humano Capítulo 1.1 Significado amplo de Educação Durkheim é considerado o “pai da Sociologia “ e foi pioneiro nos estudos da sociologia da educação. Se debruçou sobre questões como “Qual a função da educação em nossa sociedade?” e “Como ela Funciona?”, analisando a “educação como fato social”. (p.24/25) A visão de Durkheim da sociologia é positivista, objetiva e quantitativa, passível de comparação. O fato social é generalista, coercitivo e exterior. O conceito de Fato Social de Durkheim passa por algumas especificações, sendo que nem todo fato ocorrido na sociedade é um fato social. O Fato Social existe exteriormente ao indivíduo, ou seja, não é um fato individual ou psicológico, mas sim social, de forma que o Fato Social existe antes do indivíduo, é algo herdado da sociedade na qual está inserido, ou seja, existe fora dele e antes dele, não tendo sido criadas por ele, mas sim herdadas por ele. É objetivo, exterior ao indivíduo e transmitido pela educação. (p.25) O indivíduo, ao nascer, se depara com as regras sociais sendo-lhe impostas como algo superior de forma que a única alternativa é se adaptar a essas regras, valores, crenças normas e relações sociais. Durkheim se refere a esta imposição pelo termo “coerção”, e constata que essa coerção existe como mecanismo controlador e de manutenção por meio de sanções sociais que podem ser implícitas – como o desprezo, por exemplo – ou explícitas, nas reações de adversidade dos outros diante de uma cultura ou posicionamento diferente, ou mesmo pela legislação através de sanções violentas como a retirada da liberdade. Coerção – Sanções Sociais – Implícitas, Explícitas e pela Legislação. (p.26) Para Durkheim não interessam as manifestações individuais dos fatos sociais, mas apenas as coletivas. Para ele, a sociedade não se constitui da soma das individualidades, mas de algo que é totalmente indiferente às manifestações individuais. (p.28) Para Durkheim a educação é o motor da coerção social, um mecanismo de imposição da herança social que cada indivíduo deve assimilar e reproduzir em sociedade. Nisso, a educação serve, ao mesmo tempo, como impositora de valores e regras sociais, e como mantenedora de uma sociedade coesa como um organismo em bom estado de funcionamento. (p.29) O conceito de “consciência coletiva”, para Durkheim, pode ser definida como o conjunto das crenças e dos sentimentos comuns à maioria (média) dos membros de uma mesma sociedade. Na escola a criança desde cedo sofre a pressão do meio social tentando moldá-la à sua imagem, forçando seu ingresso nessa consciência coletiva, lançando o indivíduo pra fora de si ao inseri-lo na vida coletiva, auxiliando na coesão social. Para ele, essa obediência a regras exteriores não amesquinha os indivíduos, ao contrário, leva-os a construir uma sociedade melhor, pois a ação de cada um para melhorar a sociedade objetiva melhorar a si mesmo, ao mesmo tempo em que a educação objetiva tornam “humanos” (sociais) os “homens” (indivíduos), inserindo-os em sociedade. Dessa forma, o fato social tem como meio a coerção social, que tem como objetivo a conservação social, ou seja, a coesão social. (p.30) Para ele, não é possível “fugir” dessa coerção pela educação pois, se alguém for educado fora dos padrões sociais vigentes, pode vir a ser violentamente rechaçado, visto que não encontrará harmonia no ambiente em que cresceu e para o qual não foi devidamente educado. (p.31) Estabelece também, em suas teorias, que existe uma diferenciação entre os papéis sociais e o tipo de educação, onde afirma que para cada grupo social deveria constituir uma educação específica, de modo que cada qual cumprisse seu papel social, como se fosse algo natural, onde não deveríamos todos nos dedicar ao mesmo gênero de vida pois temos diferentes funções a preencher na sociedade e deveríamos nos colocar em harmonia com o trabalho que ela nos incumbe, seja como homens de sensibilidade ou como homens de ação, de forma que a educação não deveria ser a mesma para todos os indivíduos. (Parecido com a ideia de Platão onde cada indivíduo nasceria com potencialidades distintas e deveria ser nelas educado.) (p.31/32) A solidariedade mecânica caracteriza uma sociedade mais simples, marcada pela semelhança social entre os homens, que partilham uma consciência comum nos modos de pensamento, crenças, etc., como uma comunidade rural ou indígena que viva do mesmo modo, por exemplo, ou uma comunidade pré-capitalista.

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A solidariedade orgânica é típica das sociedades mais complexas, em que a divisão do trabalho é amplamente disseminada, diferenciando os indivíduos e grupos pelas suas funções sociais, como numa cidade grande, industrializada, onde cada um tem sua função e instrução específicas. A solidariedade orgânica seria uma evolução da solidariedade mecânica, pré-capitalista, para uma sociedade complexa capitalista. (p.32) Nas sociedade mais simples a educação era feita cotidianamente na família, no trabalho, nas tradições e na comunidade. Em sociedades mais complexas há a necessidade de instituições específicas para a formação específica dos especialistas em determinados setores. A sociedade capitalista, alicerçada na solidariedade orgânica, não consegue manter a coesão social apenas sob os auspícios da “consciência coletiva”, mecanismo suficiente para as sociedades mais simples e tradicionais. Os laços sociais da sociedade capitalista são mais elásticos e as relações sociais não são apenas relações coercitivas, mas também de interdependência entre indivíduos e grupos diferentes. Dessa forma, essa interdependência faz com que os grupos tenha que conviver com as diferenças, assim, a solidariedade orgânica somada à divisão do trabalho leva ao individualismo, contrário à coesão social almejada pelo autor. (p.33) Para Torres, o funcionalismo na educação atribui a ela quatro funções específicas: acadêmica, distributiva, econômica e política. A Função Acadêmica: subdividida em três outras funções, a de socialização das crianças pela internalização das normas, a reprodução cultural e as construções intelectuais. A Função Distributiva: relativa ao papel de seleção social, na relação entre status social e educacional, impactando, inclusive, no planejamento educacional. A Função Econômica: inserida na teoria do capital humano, relaciona educação, trabalho e desenvolvimento econômico, de forma que quanto maior a escolaridade maior a produtividade do trabalhador, o que resulta numa melhor distribuição de renda na sociedade. Dessa forma investir em educação seria investir na promoção da igualdade social e no desenvolvimento do país. A Função Política: leva em conta seu papel de alinhar e fortalecer a convivência social. (p.35) Concluímos, na concepção de Durkheim, que a educação tem o papel de não estimular os indivíduos à crítica do sistema social, sendo uma teoria de adaptação à sociedade, mesmo que isso signifique a reprodução de suas diferenças e de suas desigualdades, visto que, por um lado, educa-se uma elite para conduzir um país e, por outro, civiliza-se o conjunto das massas (para obedecer e ser oprimida?). (p.36) Sendo assim, a educação é uma obra sistemática e intencional da geração adulta sobre as novas gerações, com o fim de desenvolvê-las, podendo ser como uma mimese da vida, em comunidades simples, ou sistematizada, no capitalismo complexo. Dessa forma a educação é a conservação daquilo que foi construído socialmente pelos homens. (p.37) A educação na sociedade capitalista se concentra na instituição da escola mas, independente dela, somos educados em várias instâncias da vida, seja em casa, na família, pelos amigos, no trabalho, nos movimentos sociais, na igreja, entre outros, de forma que o conceito de educação ampla é inevitável sobre os indivíduos. (p.38) Libâneo, fundador da “pedagogia crítico-social dos conteúdos”, determina que o projeto educacional de cada sociedade está vinculado e relacionado a um projeto de sociedade, ou seja, a concretização de uma sociedade almejada por aquela comunidade específica, seja ela indígena, rural, urbana, capitalista ou qualquer outra. (p.39) Para ele a educação ocorre de duas formas: intencional e não intencional. A forma intencional se dá de duas formas também, a formal, através da escola, e a não formal, através de movimentos sociais, igrejas e sindicatos, ou seja, em estruturas fora do sistema escolar convencional. A forma não intencional acontece de modo informal por influência de ideias, valores, orientações familiares, ambiente de trabalho, práticas, experiências, sendo que estes não estão vinculados a uma instituição como escola, igreja e afins. Entretanto, há críticas a esse modelo por afirmar que a educação familiar e a experiência trabalhista seriam pertencentes ao modelo não intencional. (p.40/41) Capítulo 1.2 Significado restrito da educação na sociedade capitalista

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O que caracteriza o capitalismo é o uso do capital na exploração da mão de obra para geração de mais-valia, não paga, na produção de mercadorias e seu desenvolvimento no mercado. Há uma divisão de classes onde a burguesia detém os meios de produção enquanto o proletariado é detentor da força de trabalho. (p.44) Saviani nos lembra do início da diferenciação da educação a partir do escravismo antigo, onde haviam duas modalidades de educação: a primeira, centrada nas atividades intelectuais, na arte da palavra e nos exercícios físicos de caráter lúdico ou militar, direcionada para os homens livres, e a segunda, assimilada ao próprio processo de trabalho, para os escravos e serviçais. A primeira modalidade deu origem à escola que, em grego, significa “lugar de ócio, de tempo livre”. (p.45) A escola era um apêndice da divisão social, que concretizava a divisão entre o trabalho intelectual, para as classes dominantes, e o trabalho manual, para os escravos. Já no capitalismo, a escola tem uma relação intrínseca com a formação humana voltada para a forma predominante de produção, a indústria. (p.46) Dessa forma, a partir do século XIX, com a Revolução Industrial, a educação tornou-se questão de Estado, que passou a se responsabilizar pela formação dos trabalhadores para a produção, numa clara parceria e compromisso dos governantes com as classes dominantes. Assim, o Estado começou a promover uma educação adaptativa ao invés de emancipatória para as classes trabalhadoras. (p.47) Capítulo 1.3 Educação e humanização Saviani desenvolveu a PHC – Pedagogia Histórico-Crítica, cujos fundamentos encontram-se calcados na teoria de Karl Marx e afirma que: a natureza humana não é dada ao homem mas é por ele produzida sobre a base da natureza biofísica. O trabalho educativo é o ato de produzir, direta e intencionalmente, em cada indivíduo singular, a humanidade que é produzida histórica e coletivamente pelo conjunto dos homens. Ou seja, humanizar-se em sociedade é a única condição para que isso ocorra, visto que não nascemos “humanizados”, mas nos humanizamos através das relações sociais. (p.50) Mas essa afirmação não faz possível o acesso ao mesmo grau de “humanização” das diferentes esferas sociais, visto que não existe equilíbrio social e nem acesso aos mesmos bens sociais, independente da localidade. A desigualdade social é uma recorrente no mundo todo e a distribuição de renda é totalmente desequilibrada, além dos índices de analfabetismo, entre outros agravantes da desigualdade social. (p.52) A PHC trabalha a partir de dois conceitos: a individualidade para si e em si. Individualidade para si: significa o projeto mais desenvolvido de constituição da humanidade em cada indivíduo singular, levando em conta que ele tenha acesso ao máximo desenvolvimento de suas potencialidades humanas numa formação omnilateral. Individualidade em si: representa a formação alienada proporcionada pela sociedade capitalista. (p.53) Capítulo 1.4 Introdução à ideia de cultura Para se entender a relação entre educação e cultura, primeiro precisamos definir o que é “cultura” a partir da sociologia da cultura, que a vê de duas formas: (p.55) Kultur: indica o que há de mais elevado, tendo como parâmetro a grande cultura, a grande arte, espaço de realização humana por excelência; Civilização: nesse caso, indica apenas as marcas materiais da sociedade relativas à produção. Taylor, Malinowski, Frazer e Radcliff-Brown, autores da Antropologia Clássica, entendiam cultura como o estudo dos povos primitivos em comparação a sociedade “evoluída” e “civilizada”, que seriam as europeias e norte-americanas, com ideais etnocentristas. (p.56) James George Frazer: fez estudos comparativos entre folclore e religião e defende a evolução da cultura e do pensamento humano em três fases, mágico, religioso e o científico. Charles Taylor: faz uma análise antropológica de viés liberal, afirmando que a inserção do indivíduo no grupo ou na comunidade reforça e dá significado a sua identidade. Alfred R. Radcliffe-Brown: estudioso das culturas, definiu os contornos da antropologia social e cultural.

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Seus estudos iniciais, focou as relações familiares de povos nativos. Bronislaw K. Malinowski: contribui para a perspectiva funcionalista na pesquisa social e antropológica. Descreveu os métodos que usava para realizar suas pesquisas. O homem seria um ser “racional” devido a sua produção cultural e educacional, enquanto aos animais haveria o limite orgânico restrito ao instinto. (p.58) Para Geertz, em uma visão configurativista, não se pode falar em cultura, no singular, mas em culturas, de forma a abranger um espectro amplo, entendido como aquilo que pertencia aos povos e que os mantinha em comum com os demais. Dessa forma, começa-se a tratar as culturas como identidades contrastantes, de diferenças que fazem com que haja identificação mútua, mesmo que, historicamente, isto não tenha trazido mútuo respeito e compreensão entre os povos. (p.59) Laraia definiu os cinco operadores da cultura: a cultura condiciona nossa visão de mundo (1); a cultura interfere no plano biológico (2); a relação dos indivíduos que participam da sociedade (3); a cultura apresenta uma lógica própria (4); a cultura tem sua própria dinâmica (5). (p.64) É claro o fato de que não podemos participar de toda a extensão da cultura, mas a ignorância dos elementos básicos da cultura gera exclusão social, temos como exemplo disso o analfabetismo. (p.67) Capítulo 1.5 Educação e socialização A socialização, a transformação de uma criança em um ser social adaptado as suas regras e obediente a elas, deve acontecer de forma natural, sem que a pessoa sinta o “peso” da socialização a oprimindo. (p.72) Socialização Primária: é aquela que acontece na família, onde as crianças aprendem os valores básicos da vida social. Socialização Secundária: é aquela que acontece em diversos meios sociais diferentes, entre eles a escola, em processos específicos de adaptação ao meio. (p.73) Capítulo 2. Temas contemporâneos da relação entre educação e cultura Em todo o mundo as relações preconceituosas se dão de forma inerente a sociedade que já traz, historicamente, inclinações etnocentristas de intolerância “racial”, antigamente apoiadas pelas pífias “teorias raciais”. No Brasil o índice de desigualdade se reflete não só no preconceito direto, mas também no acesso a educação e a igualdade de renda entre trabalhadores brancos e negros. Além disso seguimos com dificuldade de inclusão na escola de pessoas portadoras de deficiência ou que necessitem de tratamento especial, além de uma cultura que ainda vê com maus olhos a comunidade LGBT. Capítulo 2.1 Multiculturalismo e interculturalidade Os movimentos sociais deram origem às discussões multiculturais. Como o movimento negro nos Estados Unidos, através de ícones como Martin Luther King e Malcolm X, cuja luta reivindicava direitos sociais iguais aos negros, independente de suas diferenças de cor, de pele e história. (p.88) O multiculturalismo é entendido, de modo geral, como a luta pelo respeito às diferenças e pela igualdade de acesso aos direitos sociais, conceito que se multiplicou em inúmeras organizações que pleiteiam serem ouvidos e considerados nas políticas públicas, entre eles não só os negros, mas também diferentes etnias como os indígenas, que lutam pela preservação de sua própria cultura ante o domínio da cultura “branca”, a comunidade LGBT, em sua luta por direitos iguais de casamento, adoção, herança, entre outros, os portadores de limitações físicas, que necessitam de políticas públicas para inserção no mercado de trabalho, melhoria de locomoção e acesso na cidade, e portadores de deficiências mentais, em busca de respeito no tratamento pelo movimento antimanicomial. (p.89-90) O multiculturalismo não nasceu nas universidades e no âmbito acadêmico em geral, mas sim através das lutas dos grupos sociais discriminados e excluídos de uma cidadania plena que constituem o locus de produção do multiculturalismo. (p.90) O multiculturalismo é polissêmico (possui mais de um significado), e se apresenta em diversas perspectivas, das quais a autora (Candau) chama atenção para três principais: assimilacionista, diferencialista (ou plural) e interativa (também chamada de interculturalidade). (p.91)

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Assimilacionismo: nessa perspectiva não existe igualdade na sociedade multicultural e, portanto, há uma assimilação da maioria à cultura hegemônica na sociedade. Não se critica ou discute as bases sociais, caracterizando-a como uma teoria reprodutivista. Nela promove-se a política de universalização da escolarização, mas não se coloca em questão o caráter monocultural etnocentrista presente em sua dinâmica. Todos tem acesso, mas devem se adaptar a cultura vigente. Através dessa perspectiva que foram construídas as bases curriculares europeias que posteriormente foram importadas para o Brasil, onde a concepção de currículo era considerada a correta e o aluno, independente de sua própria cultura, deveria se adaptar. O que remete as teorias raciais de que a Europa era a evolução da civilização. (p.91) Diferencialismo: perspectiva que prega o respeito às diferenças e o reconhecimento destas, criando espaços onde grupos de diferentes culturas possam se expressar mantendo suas raízes culturais em ambientes diferentes, separadamente umas das outras evitando, assim, o confronto. O problema é que esta separação pode criar forte visão essencialista de identidade de gueto, favorecendo o conflito entre grupos que não dialogam uns com os outros. (ex.: como uma rua com uma escola de cada lado dela, uma frequentada por brancos e uma por negros, formando assim dois grupos possivelmente conflitantes) (p.92) Interculturalismo: corrente que defende a inter-relação entre grupos de diferentes culturas, baseada numa cultura dinâmica em constante reconstrução sem negar raízes mas rompendo com a concepção essencialista, afirmando a hibridização cultural como veículo de construção de identidades culturais abertas, negando a pureza cultural (nazismo, apartheid), levando em conta que as relações culturais são também relações de poder onde os grupos hegemônicos exercem poder sobre os grupos subalternos, num compromisso com a justiça social que privilegie a transformação das relações sociais, culturais e institucionais. (p.92/93) Dessa forma, Candau defende que o encontro entre diferentes culturas seja permeado pelo reconhecimento e o diálogo entre os grupos culturais e sociais, o que a autora chama de negociação cultural. Mas essa negociação é problematizada quando se nota a diferença de poder entre o grupo hegemônico e o subalterno, o que dificulta este diálogo, visto que o primeiro detém tanto o poder econômico quanto o cultural. (p.95) Hegemonia (Gramsci): de forma sucinta significa o domínio e direção intelectual e moral de uma classe sobre outra ou sobre a sociedade como um todo, onde os aparelhos de hegemonia contribuem para esse fim, como a mídia, a escola, a justiça, as forças armadas, a religião (vide Jesus ser branco e ter olhos azuis), os sindicatos, entre outros. (p.96) A indiferença, característica do nosso tempo, é um comportamento estático e apático em relação à situação dos outros, oriunda do sistema capitalista que diminui, aparentemente, a diferença de renda entre a maioria, dando a impressão de que podemos ser indiferentes para com a situação dos outros. (adendo)(p.93) Nesse modelo intercultural podemos observar dois aspectos: primeiro o de ser uma teoria extremamente contemporânea que dialoga com as necessidades urgentes de conscientização das diferenças sociais e culturais e de uma aceitação da hibridização da cultura e, na sequencia, sua limitação frente ao modelo capitalista, visto que essa teoria teria mais possibilidade de aplicação através de um sistema ou modelo de sociedade, que supere o capital como o centro das relações sociais. (p.98) Candau conclui sua teoria interacionista apontando os seguintes desafios desse modelo no âmbito da educação: desconstrução dos paradigmas preconceituosos, monoculturais e etnocêntricos das práticas escolares; articulação entre igualdade e diferença nas políticas e práticas educativas; resgate das identidades culturais; promoção de experiências de interação entre culturas; empoderamento dos atores sociais historicamente menos privilegiados; e formação para uma cidadania aberta e interativa capaz de reconhecer assimetrias de poder entre grupos e de trabalhar os conflitos promovendo relações solidárias. (p.98/99) Capítulo 2.2 Etnocentrismo Etnocentrismo: é uma visão de mundo onde o nosso próprio grupo é tomado como centro de tudo e todos os outros são pensados e sentidos através de nossos valores, nossos modelos, nossas definições do que é a existência. De forma que esta visão acarreta a base dos conflitos étnicos da atualidade que se multiplicam pelo mundo como as disputas árabe-israelenses, os internos do Iraque, os urbanos da Europa envolvendo

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imigrantes africanos e asiáticos, a ascensão dos movimentos neonazistas na Alemanha e assim por diante. (p.100) No século XVI, o encontro dos europeus com a civilização nativa do que viria a ser a América, foi o momento crucial para a formação do que chamamos hoje de modernidade. Esse encontro foi seguido do genocídio e saque das riquezas dos nativos pelo povo europeu, riqueza essa que produziu as condições materiais para a Revolução Industrial dos séculos XVIII e XIX. (p.101) Desse encontro duas visões diferentes emergiram: Las Casas construiu sobre os indígenas uma visão romântica onde apontava naqueles povos valores perdidos pela civilização europeia; enquanto Sepulvera legitimava a conquista e dominação dos europeus sobre os nativos, dado que estes não participavam da mesma humanidade que os europeus. (p.103) Morgan, Frazer e Comte foram teóricos do evolucionismo “social”, abordagem historicista, e postulavam uma unidade entre as culturas como se todas tivessem de dar conta de problemas idênticos e que, mais cedo ou mais tarde, os “primitivos” chegariam às formas da “civilização”, cujo modelo encontrava-se perfeitamente produzido nas condições europeias de então. Interessava pra eles elencar as fases de evolução das sociedades. Morgan em, Ancient Society, divide essa evolução em três etapas: selvageria, barbárie e civilização. (p.104) Na corrente contrária ao evolucionismo, autores como Durkheim, Malinowski, Mauss, Boas e Radcliff-Brown, trouxeram uma perspectiva funcionalista, que discordava desta vinculação que existia entre a compreensão do presente de uma cultura e o estudo do seu passado, onde o presente não precisava, necessariamente, ser explicado pelo passado. Em termos mais técnicos a sincronia (presente) não está submetido à diacronia (história). (p.105) Dessa forma substituiu-se uma abordagem evolucionista por uma abordagem funcionalista, ou seja, o estudo do outro já não se vincula ao seu passado, mas ao retrato que nos delineia o presente dessa sociedade, tendo como foco o funcionamento das sociedades em seus próprios termos. (p.106) Como conhecer o outro sincronicamente? A essa pergunta a antropologia respondeu: com o trabalho de campo. Malinowski inaugurou este tipo de pesquisa ao relativizar os olhares europeus com o dos trobiandeses da Melanésia, percebendo as similaridades entres essas duas culturas. (p.107) Levi-Strauss, em Raça e história, nos aponta que os homens raramente conviveram com as diversidades como elas são, ou seja, naturais, resultado das relações entre as sociedades, ao contrário, sempre se referiram à diversidade de forma bruta, como se tratasse de uma monstruosidade, uma aberração, sendo o etnocentrismo a mais comum e antiga dessas atitudes. (p.108/109) Dizer que as sociedades evoluem como evoluem os animais é retirar destas o que lhe é inerente: a construção social, a ação humana e diferenciadora. Não é possível aplicar ao social, ao cultural, o mesmo raciocínio que usamos para explicar a evolução animal. Dessa forma Levi-Strauss critica o evolucionismo social e cultural. (p.110/111) Geertz, em Nova luz sobre a antropologia, instiga a discussão daquilo que chamou de o futuro do etnocentrismo, argumento embasado numa tese de Levi-Strauss que defende que a atitude etnocêntrica não pode ser exagerada como unicamente negativa, não sendo ruim em si, mas até podendo ser considerada uma coisa boa, desde que não fuja ao controle. Ou seja, não há nada de errado em se ter em boa conta a sua própria cultura, desde que isso não sirva de pretexto para a eclosão de guerras ou outros atentados. (p.111) Capítulo 2.3 Pluralidade cultural: um breve estudo à luz dos PCN Os PCN – Parâmetros Curriculares Nacionais colocam a educação como elemento crucial no processo de inclusão social. Entretanto a escola tem se mostrado um lugar de reprodução das desigualdades e diferenças ao silenciar diante de situações que fazem seus alunos alvos de discriminação. O “mito da democracia racial”, onde o Brasil, por sua história, seria um local de harmonia, não passa de um mito, visto o alto índice de preconceito que se observa em seu contexto social de modo geral. Nos professores, diretores e instituições de ensino é bastante comum que em relação ao aluno proveniente das camadas economicamente menos favorecidas se desenvolva uma expectativa de desempenho baixo, mesma situação que se observa nos alunos provenientes de grupos étnicos socialmente discriminados. Dessa forma, podemos observar que existe uma construção de “ideal de aluno” pela escola, que não corresponde ao perfil de alunos provenientes das classes baixas, negros, indígenas, homossexuais ou deficientes.

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Mas deve-se salientar que, quando o PCN coloca a responsabilidade na escola, professores e administração, acaba por amenizar o papel do Estado nessa cultura discriminatória, o que se mostra uma inverdade visto que há uma grave situação física das escolas, além dos baixos salários dos professores e os escassos investimentos em educação. Entretanto o PCN também enfatiza que a reversão desse quadro depende do “reconhecimento e valorização de características específicas e singulares de regiões, etnias, escolas, professores e alunos”, mas ao imputar a mudança educacional apenas à mudança de atitudes, acaba se fixando numa mistificação ideológica, que dificilmente passará de discurso, visto que há uma urgente necessidade de revisões estruturais e macroeconômicas oriundas de iniciativas e investimentos do Estado/União. Dessa forma os PCN tratam desses conceitos abstratamente de forma a não lhes conferir materialidade, realidade. (p.116/119) Capítulo 2.4 A diversidade cultural e a escola: uma pequena discussão preliminar Tragtemberg, inspirado na crítica de Foucalt aos presídios e manicômios, define a escola como espaço em que o totalitarismo acontece a partir do disciplinamento dos corpos e mentes, o que, por sua vez, gera o saber, que está relacionado com a vigilância dos alunos na escola através de um olhar permanente, de registro e observações de suas atividades, boletins de avaliação individual, ou uniformes-modelo, estabelecendo classificações rigorosas. Já Adorno, em Educação após Auschwitz, levanta a bandeira da superação desse paradigma escolar totalitarista ao denunciar a necessidade de que tal genocídio não se repita, sob o perigo de retornarmos à barbárie, da qual o homem hoje tem todas as condições de evitar dadas as condições socioculturais e materiais que a humanidade produziu. (p.127) A partir de 1960 houveram marcos históricos nas discussões de diversidade, iniciando com o movimento negro por direitos sociais, tendo como ícone Martin Luther King, seguido pelos movimentos feministas que reivindicavam direitos iguais para as mulheres em detrimento do modelo patriarcal machista opressor, além da luta dos estudantes europeus em 1968 por melhoria na educação e por um mundo mais aberto e menos repressivo, que levou para a sociedade e para os intelectuais a questão de resolver as diferenças dentro de seu próprio mundo. (p.128) Antes desses movimentos a intelectualidade europeia se preocupava com o tratamento das diferenças existentes entre sua própria civilização para com os outros povos distantes do centro civilizatório europeu, como africanos, asiáticos, os indígenas americanos, entre outros, mas, a partir de 1968, o eixo das discussões passou a ser o estudo da própria sociedade ocidental e suas próprias relações de desigualdade. (p.129) A LDBEN de 1996, no capítulo V, dispõe que a educação de pessoas com necessidades especiais deve se dar, preferencialmente, na rede regular de ensino. Este trecho, teoricamente, defende a inclusão no ensino regular de portadores de necessidades especiais, entretanto, para alguns críticos, não haver escolas específicas para portadores de necessidades, obrigando-os a frequentarem o ensino regular, na verdade os deixa em uma situação de exclusão. Dessa forma, eles não tem o cuidado apropriado, visto o despreparo dos professores da rede regular no cuidado de alunos especiais, vide, por exemplo, a um aluno surdo, para o qual é negado o acesso a uma rede que trabalhe de forma especializada em Libras, em uma escola regular a ele será negado o acesso a sua linguagem, o que causará mais danos que benefícios. (p.130) Geertz, ao falar sobre integridade cultural, reitera que a inclusão dos diferentes na mesma sala de aula força uma identidade que não existe, a não ser como fundo comum, como o “ideal de aluno” citado anteriormente. (p.131) Padilha nos afirma que a escola está cada vez mais distante de ser o lugar para os diferentes, visto que ela tem o mesmo programa para todos, mas que não é apropriado para todos; uma única forma de avalição para os iguais e para os diferentes, apesar dos iguais nem serem tão iguais assim, de forma que a escola está sempre procurando um jeito de se programar para os que são os “mais iguais” a ela, novamente com o foco no “aluno ideal”. (p.132) Bourdieu e Passeron, em “A Reprodução: elementos para uma teoria do sistema de ensino”, problematizam que estes “mais iguais à escola” seriam aqueles que são “escolarizados” em casa, onde teriam acesso livre e irrestrito a livros, filmes, peças, música diversificada, informação, internet e cultura em geral, ou seja, aqueles que já vão para a escola com estofo cultural que, a priori, a própria escola deveria transmitir.

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Surgem, desse modo, os vários mecanismos institucionalizados de exclusão existentes na escola, como a repetência, as notas baixas, a desconstrução da autoestima dos alunos, a marginalização deles nas brincadeiras escolares ou nos jogos competitivos, nos casos em que a própria escola reproduz o esquema da “seleção natural” darwiniana, mesmo na educação física, de forma que relegam a estes excluídos a culpa pela sua condição, minimizando o papel da escola e da própria estrutura social na construção da exclusão da escola. (p.132/133) Padilha, a partir de Vigiar e Punir de Foucalt, descreve a visão da escola dizendo que nela “deve-se punir a ignorância com as provas, os exames, as avaliações, as correções, as repetições, as cópias dos modelos.. alunos e professores devem seguir as determinações da mais moderna pedagogia, de forma dócil e obediente”. (p.133) Paulo Freire é reconhecido internacionalmente pelo método de alfabetização que criou, onde propõe uma prática que estimule o senso crítico do aluno de modo que este possa transformar o mundo. (p.136) No estudo de Fleuri sobre a diversidade, ela aponta o grupo indígena, em relação ao aprendizado do português além de sua língua natural, tupi ou outra, como um aparato de dominação da sociedade ao oprimir a língua original desses povos, mas também aponta a importância desse conhecimento para não se deixarem manipular nas negociações que são obrigados a realizar com os brancos, de forma a estar em melhores condições para dialogar, compreendendo o lugar que ocupam na sociedade que lhes cerca. Dessa forma, a escola apresenta valores, concepções e comportamentos da sociedade ocidentalizados aos indígenas, que passam a criar uma relação intercultural e, nessa mistura, novos sujeitos e novas identidades de cultura híbrida. (p.137) Em relação aos negros ainda podemos observar que os preconceitos e os estereótipos raciais são absorvidos de maneiras diferentes de acordo com a reação de cada pessoa negra individualmente, da forma singular com que cada um percebe o processo de subjetivação e de socialização ao qual foi submetido de acordo com sua experiência própria. Outra questão é que, apesar de estarem localizados socioespacialmente nas mesmas condições, há uma grande diferença econômica e de rendimento escolar entre brancos e negros em todas as classes. Esse fenômeno se refere não apenas a condição social, mas também a fatores sócio-históricos pertinentes ao negro. (p.138) Dessa forma, faz-se ruir a ideia de que bastaria inserir todos na mesma escola para que o problema da exclusão fosse resolvido, ao mesmo tempo em que a concepção de que a história dos negros escravizados já foi esquecida, faz parte do passado e não influencia o presente, se mostra pífia e totalmente inverídica. Juntamente disso o discurso de que tanto brancos quanto negros, desde que tenham os mesmos recursos, possuem as mesmas possibilidades e podem alcançar os mesmos patamares pode ser facilmente problematizada e questionada, principalmente nos modelos meritocráticos e liberais. (p.139) Outro ponto a problematizar vem da relação de gênero e educação, onde mesclam-se os fatores biológicos, sociais e históricos de lutas por direitos iguais do gênero feminino, dos homossexuais, e da categorização do que é normal ou anormal em relação a sexualidade de cada um, e do como deve-se orientar ou não esse desenvolvimento. Hoje em dia já não se pode buscar um ideal de família tradicional, formada por um casal heterossexual e seus filhos, visto que os modelos de família são variados e estão em constante adaptação ao meio e a cultura. (p.140) Sendo assim, o papel do educador, e da concepção educativa de modo geral, seria o de desconstruir os discursos de dominação de uma classe sobre outra, dos heterossexuais sobre os homossexuais, do homem sobre a mulher, do branco sobre o negro, do modelo ideal de família e assim por diante. (p.141) A relação de o que é “coisa de menino” e o que seria “coisa de menina”, como as cores azul/rosa, tipos de brinquedos e de atividades e o que se espera do comportamento de cada um, também são colocados em discussão, assim como a integração de alunos surdos na escola regular sem uma preparação adequada, o que acaba “excluindo ao incluir”, pois a falta de preparo do educador retira direitos do aluno com necessidade ao não atender plenamente sua linguagem, numa tentativa de inclusão que acaba ampliando a percepção de que há exclusão. (p.146) Em relação aos jovens, podemos observar uma busca por agremiação, o fazer parte de um grupo ou tribo, normalmente relacionada a um estilo específico de vestuário, maquiagem, atividades e comportamentos que acabam se ligando a fortes estereótipos. Assim, a escola se torna um locus de discriminações atribuídas estas a aparência, deficiência, vestuário, religião, sexualidade, cor da pele, inteligência, habilidades motoras, entre outras. (p.146)

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A criança, por outro lado, deve-se tratar a partir de suas características próprias, sem impingir a elas um formato adulto, permitindo que ela desenvolva em sua ludicidade, sem um direcionamento adultocentrista, em que o modelo da geração anterior é infligido a nova geração, independente de suas próprias aspirações. Algo similar se dá na educação da terceira idade, na qual não se pode ignorar a experiência de vida dos alunos e seus temas importantes de debate, entre eles a pré-aposentadoria, a aposentadoria, o viver em comunidade, o se manter ativo, o estar sozinho, entre outros. (p.147) Capítulo 3. As concepções sociológicas clássicas e a sua contribuição para a educação Capítulo 3.1 A contribuição de Max Weber à sociologia da educação A visão sociológica de Weber é considerada diametralmente oposta a de Durkheim, visto a incisiva luta de Weber contra os preceitos positivistas na sociologia. Durkheim partia do pressuposto teórico de que o fato social era uma “coisa”, objetiva, exterior aos indivíduos e que lhes coagia a se modelar às normas e valores da sociedade. Para Weber o ponto de partida está justamente no indivíduo, que passa a ser compreendido como o motor das relações sociais. Dessa forma, o principal conceito na sociologia de Weber constitui-se na ação social em contraponto ao fato social de Durkheim. Ação Social: é uma ação com sentido e orientada pelas ações de outras pessoas, de forma que somente é uma ação social se esta for compartilhada, em sentido, por ambas as partes dessa ação, sendo tal sentido não objetivamente constituído, como acreditava Durkheim, mas ao contrário, é um dado subjetivo acionado por cada participante da ação, é a expressão da própria vontade do agente. Sem reciprocidade. (p.161) Ex.: escrever uma carta seria uma ação social, visto que o intuito de alguém ao escrever uma carta é de direcioná-la a uma pessoa que, provavelmente, a lerá, de forma que sua ação só tem significado enquanto envolver outra pessoa. Diferentemente de escrever uma poesia quando esta envolve apenas a satisfação do poeta, não envolvendo especificamente outra pessoa, não caracterizando, assim, uma ação social. O funcionamento da sociedade é motivado pelas ações dos indivíduos entre si, nas várias facetas que a vida social promove e exige. É na caracterização das motivações das ações que reside o trabalho do sociólogo para Weber. Não se qualifica como social, por exemplo, uma ação de massa, que é uma ação reflexa e não realizada por um sentido próprio. Nesse caso, a conduta individual guia-se pelas ações de outros indivíduos, motivadas ou pela moda ou pela tradição, mas que ainda assim são ações que ganham sentido, tanto pelo indivíduo que age quanto para os outros que compartilham o significado desta ação na sociedade. No entanto, a ação social não é de fácil apreensão pelo sociólogo, por conta do caráter subjetivo das motivações, residindo ali o desafio ao pesquisador de descobrir as motivações que levam os indivíduos a agirem em relação aos demais. (p.162) Relação Social: Realizada de forma recíproca, onde há a questão da probabilidade de conduta dos diversos atores, onde o cada um supõe que o outro agirá de determinada forma de acordo com os valores pré-estabelecidos. Uma mesma pessoa pode ter diferentes papéis de acordo com a posição que ocupa, e pode ocupar diferentes posições de acordo com a atividade. Ex.: uma mesma pessoa pode ser o chefe de uma empresa, um frequentador da comunidade religiosa e um jogador de futebol paralelamente, de forma que em cada uma dessas atividades haverá uma expectativa diferente de “atuação” de um mesmo indivíduo. A relação social diz respeito à conduta de múltiplos agentes que se orientam reciprocamente em conformidade com um conteúdo específico do próprio sentido das suas ações. Na ação social, a conduta do agente está orientada significativamente pela conduta de outro ou outros, ao passo que na relação social a conduta de cada qual entre múltiplos agentes envolvidos (que tanto podem ser apenas dois e em presença direta quanto um grande número e sem contato direto entre si no momento da ação) orienta-se por um conteúdo de sentido reciprocamente compartilhado. (wiki) Ou seja, ação social não é recíproca e está ligada a ação de outros, enquanto que a relação social é recíproca e está relacionada a um conteúdo de sentido e valores compartilhados. Conceitos Tipo/Tipos Ideais: Weber constitui um recurso de compreensão da realidade que é infinita, o que o obriga a tomar dessa realidade apenas uma pequena fração, a qual denomina de individualidade sociocultural, a partir dos conceitos-tipo, que são vazios de realidade, mas que se constituem em

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ferramentas interpretativas, racionais e que possibilitam compreender a realidade, embora não sejam a realidade em si. Dessa forma, cada tipo ideal se aproxima da realidade, mas não é a própria realidade. A partir disso ele distinguiu as ações sociais em quatro tipos ideais diferentes: (1) Ação Social Racional com Relação a Finalidades: é aquela em que o indivíduo planeja e calcula todos os movimentos dele até as consequências do seu ato, orientando sua ação conforme o fim desejado, sem agir afetivamente nem com relação a tradição. (p.167) (similar ao pensamento de Maquiavel) Ex.: empresários que precisam se relacionar com outros empresários com a finalidade de fechar negócios e valorizar seu capital, evitando a falência, e com os funcionários e pessoas envolvidas, mas de acordo com seu interesse particular, sem relações afetivas e sim racionais. O mesmo pode se dizer da educação, onde os pais colocam os filhos na escola para que eles alcancem o objetivo de entrarem numa faculdade ou de conseguir melhores oportunidades de trabalho. (2) Ação Social Racional com Relação a Valores: é aquela onde o indivíduo, sem considerar as consequências previsíveis, se comporta conforme suas convicções sobre o que o dever, a dignidade, a beleza, a sabedoria religiosa, a piedade ou a importância de uma “causa”, qualquer que seja seu gênero, parecem lhe ordenar. (p.168) (similar ao pensamento de Kant) (3) Ação Tradicional: é a vontade deliberada de manter tradições específicas de um grupo como, por exemplo, a vida simples do campo sem tecnologias, num ponto extremo, ou a tradição do casamento, preservada na nossa sociedade contemporânea. (p.169) (4) Ação Afetiva: se encontra na fronteira do racional e se manifesta como uma expressão de afetos, alegrias, complacências, tristezas, ódios e afins, tendo como exemplos as comoções de grandes perdas nacionais ou o contrário, na alegria da conquista de um campeonato mundial, ou seja, são manifestações de emoções por acontecimentos. (p.170) É necessário destacar que, por vezes, um ou mais desses tipos ideais acontecem em paralelo, por exemplo os Menonitas que mesclam a ação social racional com relação a valores com a ação tradicional, pois ao mesmo tempo em que defendem valores éticos e morais, perpetuam tradições arraigadas de seu povo. (p.169) Dominação (na escola): representa o tipo de ação que a escola procura exercer sobre as novas gerações, sendo ela o locus de reprodução cultural e de domínio social, como uma instituição na qual uma determinada cultura, de um determinado grupo, impõe-se a grande parte dos membros das novas gerações. (como nos conceitos de hegemonia e etnocentrismo) Burocracia: é o meio de dominação racional legal típico da sociedade capitalista, um mecanismo legal, racional, provido de regras normativas pela impessoalidade, pelos arquivos de registros, pela ação de funcionários altamente especializados, cada qual cumprindo suas funções determinadas por uma hierarquia constituída efetivamente e assim por diante, que leva-nos a discutir a educação como sistema educacional, visto que ela passa a servir ao poder e à dominação constituída e alimentada pela burocracia. (p.171) Assim como as formas de dominação, Weber destaca os três tipos de educação: Educação Humanística (ou tradicional): corresponde à forma de dominação tradicional e tem por propósito cultivar um determinado modo de vida que comporta particulares atitudes e comportamentos, seja de caráter mundano, seja de caráter religioso. Ou seja, é o tipo de educação praticada pelas elites, em escolas especialmente destinadas a seus filhos, de caráter eminentemente humanístico e voltada para a ascensão (preparação inicial) destes aos altos graus das carreiras burocráticas, como profissionais liberais ou como administradores de bens familiares. Esta educação forma o homem culto possuidor de um particular sistema de hábitos, valores e códigos de conduta que não estão necessariamente ligados à instrução explícita. (p.172) Educação Especializada (ou racional-burocrática): educação na qual o especialista ou expert se constitui num produto da instrução e se define socialmente pelos saberes concretos, sendo o funcionário a serviço das grandes corporações. No Brasil essa educação aproxima-se do modelo tecnicista, preponderante na escola nas décadas de 1960 e 1970. (p.173) Educação Carismática: é aquela que forma líderes cuja característica está depositada no carisma individual, pelo qual seus súditos o seguem, tanto na política quanto na religião ou outra forma de dominação. Essa

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educação visa despertar “qualidades heroicas ou dons mágicos”, sendo esta vertente ligada a ação social afetiva visto a relação não racional envolvida. (p.173) Burocracia Escolar: a educação tradicional se vincula a propósitos próprios, alienados da prática social e das características da vida dos alunos. Os conteúdos trabalhados na escola, sua forma, a relação autoritária imposta que obriga-os a disciplinarem seus corpos e mentes de acordo com as regras da escola, além da impessoalidade, na qual cada aluno é tratado apenas como um número, são indícios de uma educação burocrática. (p.174) Capítulo 3.2 A educação em Marx e Engels: as contradições sociais e a educação no capitalismo A base da teoria de Marx e Engels assenta-se no materialismo histórico, que vê na história anterior o processo de desenvolvimento da humanidade, cujas leis e dinâmicas é missão sua descobrir. As leis do movimento histórico são compostas pela dialética relação histórico-cultural dos homens entre si e destes em suas relações com a natureza. Tais relações têm como motor as relações de contradição entre as diferentes classes sociais constituídas ao longo dos tempos, e que ganha, em cada período, características peculiares. (p.176) Em A Ideologia Alemã, Marx e Engels apontam que: a primeira premissa materialista é que, para existir a história, é necessário que haja seres humanos vivos e em condições de realizar essa história. (p.177) Os homens, na concepção materialista, não se distinguem dos animais por serem “racionais”, mas a partir do momento em que a sua existência passa a depender da sua própria ação para que se reproduza, de forma que esta ação ocorre por meio do trabalho, que é, em última instancia, a ontologia do homem como ser social. (ontologia: estudo do ser enquanto ser?) (p.178) Tal como os indivíduos manifestam sua vida, assim são eles. O que eles são coincide, portanto, com sua produção, tanto com o que produzem, como com o modo como produzem. O que os indivíduos são, portanto, depende das condições materiais de sua produção. Dessa forma, a concepção de homem depende da forma como ele se organiza em sociedade para produzir a sua existência. Logo, a identidade humana é constituída nas relações de produção da vida material em sociedade. (p.178/179) Os homens conquistaram as condições de subverter a natureza às suas necessidades, diferentemente dos outros animais que podem apenas se adaptar a essa mesma natureza. Mas a produção humana só pode ocorrer em conjunto com o meio natural, do qual os homens retiram seu meio de vida, ou seja, as condições materiais são dadas ao homem pela natureza. (p.179) Do Feudalismo ao Capitalismo: nas sociedades feudais o poder era exercido a partir de estamentos superiores, do poder da igreja e do poder da força bruta sobre os estamentos inferiores dos servos do feudo. Com o tempo diversos comerciantes de fora dos feudos começaram a enriquecer transportando mercadorias entre os feudos. Aos poucos esses comerciantes foram adquirindo poder e modificando a situação social de feudalista para capitalista, visto que o comércio passou a ser o modelo principal de relacionamento social entre as pessoas. Dessa forma o comércio nasceu a partir dos feudos e acabou por “destruí-los”. Este é um exemplo de como a luta de classes movimenta a história. (p.182) Mas as relações produzidas pelo capitalismo trazem consigo uma contradição fundamental, visto que para a ascensão da burguesia ela teve de trazer consigo uma ascensão inicial do proletariado, que lhe deu sustentação moral e material, e que seria a mão de obra do comércio. Assim, o capitalismo cria condições para que todos adquiram as condições materiais dignas de vida mas, ao mesmo tempo, é o responsável pelo aumento da miséria da população mundial. Isso se dá porque o trabalho gera riqueza monstruosamente suficiente para todos, entretanto esta riqueza não é socialmente distribuída e socializada na mesma proporção. Esta contradição pode vir a ser responsável pela derrocada do capitalismo. Tonet denomina esta situação de decadência ideológica.(p.183) É possível uma educação ética nos marcos desse sistema (o capitalismo) que constrói e destrói expectativas para uma vida digna? R: A ética na sociedade capitalista é impossível de ser concretizada, em sua concepção como busca do bem comum visto sua contradição entre interesses particulares e coletivos. Dessa forma, a educação sozinha não é capaz de garantir eticidade na prática educativa. A escola na sociedade em que vivemos sempre esteve vinculada aos interesses da classe dominante onde os seus limites como uma educação humanizadora são postos desde a partida. (p.184) Em “O Capital”, Marx analisa a consolidação histórica do capitalismo através das fases de desenvolvimento da produção: cooperação, manufatura, maquinaria e indústria moderna. A organização do trabalho sob o

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capital consiste na lógica do “trabalhador coletivo”, somatório de inúmeros “trabalhadores parciais”, onde cada trabalhador realiza uma parcela das atividades que compõem o processo integral da produção. O Capitalista oferece o ambiente de trabalho, a fábrica, e os materiais para a produção, visto que o trabalhador possui a força de trabalho mas não os materiais para a produção, e assim se estabelece a relação entre eles. Cooperação: primeira forma capitalista de produção, mas que ainda não se distinguia do processo artesanal, visto que os antigos artesãos, destituídos da propriedade dos meios de produção, passaram a vender a sua força de trabalho para um capitalista, que os organiza agora numa oficina, mas mantendo basicamente os mesmo método de produção artesanal de quando eram autônomos. Dessa forma vários artesãos trabalhavam numa mesma oficina produzindo o mesmo produto, ou a mesma gama de produtos, para venda. (p.185) O valor da mercadoria não se da mais pelo tempo de trabalho e maestria do artesão, mas sim pelo tempo médio e pela destreza média, onde a quantidade produzida em nível médio supera a qualidade do produto artesanal original único. (p.186) Manufatura: a partir do sec. XIV até o XVIII aproximadamente, perdurou o processo de manufatura, onde se reuniam num mesmo espaço trabalhadores de ofícios diversos onde cada um realizava apenas uma parcela do produto final, fazendo com que o trabalho do antigo artesão, que conhecia todas as etapas do processo, fosse substituído por trabalhadores que se especializavam em apenas uma parcela do produto final. Exemplo principal disso nessa época foi a montagem de carroças. (p.186) Nesse modelo era exigido do trabalhador uma habilidade específica, como força, destreza, atenção, etc., de acordo com sua função, na qual desenvolveriam prática e virtuosidade, sacrificando a capacidade total de trabalho do ser humano. Dessa forma os trabalhadores são separados pelos termos “hábeis” e “inábeis”, de acordo com suas habilidades, transformando em especialidade a ausência de qualquer formação completa, como era a do artesão, e hierarquizando o processo de produção. (p.187) Além disso, torna-se necessário ao trabalhador que este tenha sua mão de obra comprada pelo capitalista para que possa realizar sua força de trabalho, de forma que, além de ser destituído de seus conhecimentos e ofícios anteriores, não possui mais autonomia para trabalhar para si mesmo. O antigo artesão de líder, mestre e artista, passa agora a ser um peão de produção parcial. Maquinaria: iniciada no sec. XVIII a partir da Revolução Industrial com o aumento da demanda e a necessidade de ampliar a produção, ampliação esta limitada e arriscada na manufatura, que deixava o processo de trabalho, ritmo e quantidade, na mão dos trabalhadores, o capital começou a implementar máquinas e a generalizar o processo produtivo, que não necessitaria mais do trabalho manual artesanal, mas sim da operação de maquinaria que realizaria o trabalho de vários homens a partir da operação de apenas um em uma máquina. (p.188) Com a virtuosidade do trabalhador repassada para a máquina, elimina-se o inconveniente da insubordinação dos trabalhadores e a dependência do capital em relação às habilidades destes, transferindo-o todo para a máquina-ferramenta, que inclui em seu funcionamento várias ferramentas ao mesmo tempo, permitindo maior produtividade. (p.189) Entretanto, este processo de mecanização e parcialização do trabalho em detrimento da produção artesanal criou uma desqualificação do trabalhador, visto que o conhecimento completo de um ofício se torna algo dispensável. Capítulo 3.2.2 A contribuição de Gramsci: o princípio educativo Gramsci analisa a educação a partir dos modelos de Marx, apontando historicamente onde o capitalismo vinculou as esferas de produção e da educação, naquilo que Gramsci denominou de princípio educativo do trabalho. Em Gramsci, a relação entre trabalho e educação carrega a positividade de ser uma possibilidade revolucionária, pela superação da subalternidade da classe trabalhadora, vítima da hegemonia burguesa, que impõe a essa classe o senso comum como forma dominante de conhecimento. A hegemonia burguesa não reside apenas no poder econômico, que é central, mas na consolidação de uma visão de mundo difundida na sociedade, uma ética, uma moral que a legitimam no poder. (p.194/195)

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Gramsci amplia o conceito de Estado através da incorporação da hegemonia, assim, o Estado é concebido como sociedade política mais sociedade civil, o que significa coerção mais consenso. Dessa forma é possível entender o princípio educativo da sociedade capitalista como a conjugação da força coercitiva com o domínio ideológico levado a efeito pelas instituições da sociedade civil, entre elas, a escola. (p.195/196) Classes parasitárias: compostas pelos resquícios medievais e aristocráticos, assim como o corpo de funcionários públicos que vivem na esfera do Estado. As classes parasitárias e sua influência na sociedade retiram dela a racionalidade necessária para o desenvolvimento capitalista, algo visto nos países europeus, mas ausente nos Estados Unidos, praticamente livre dessa classe parasitária. (p.196) Gramsci analisa o fordismo e identifica nele elementos da hegemonia que interferiram na educação. O sistema fordista faz moldar um homem de novo tipo, um homem capaz de adaptar-se às condições de trabalho na linha de montagem num ritmo veloz e repetitivo, o que foi diretriz para o novo foco educacional com esse intuito, o de transpor a futura realidade do trabalhador para o aluno através de uma didática conteudista através da memorização e imitação, meritocrática avaliativa de rendimento, conformista com o sistema, hierárquica, através de matérias gerais que dessem condições aos futuros trabalhadores de entender a organização social e a organização do trabalho sem questioná-la, estando para ela preparado. Dessa forma o aluno se resume em observar, repetir, memorizar e reproduzir. Esse novo tipo de homem, além do aspecto físico necessário para a produção, deveria desenvolver uma destreza nas tarefas e, fora da fábrica, ser um indivíduo moralmente condicionado à sociedade, um perfeito cidadão monogâmico e fiel à sua família, concentrado na produção. Dai a luta de Ford contra os vícios de seus empregados e a qualquer tipo de “animalidade”. Ou seja, um homem adaptado às condições do trabalho na esteira de produção em detrimento da vida pessoal e familiar, que se organizariam em favor da produção, através da moralidade pregada na fábrica. (p.197/198) Porém, enquanto ao proletariado era reservada essa educação limitadora, para a burguesia era disponibilizada uma formação de qualidade que procurava qualificar nos mais altos níveis com formação técnica e tecnológica consistente, com domínio das ciências e do desenvolvimento intelectual, formando assim a pequena parcela da elite trabalhadora advinda da burguesia. (p.203) Mas, para Gramsci, é exatamente no trabalho industrial como modelo mais avançado de produção, que deveria inspirar os modelos de uma educação emancipatória para a classe trabalhadora, visto que a produção fabril necessita dos conhecimentos científicos e técnicos mais avançados para poder se desenvolver e ampliar sua produtividade, havendo ali uma união intrínseca entre teoria e prática produtiva, que são os princípios educativos de uma educação Omnilateral. Educação Ominlateral: é aquela que objetiva a formação integral do ser humano, abrangendo suas mais amplas potencialidades e não apenas a formação para o trabalho. (p.198) Em 1970 o modelo fordista/taylorista entra em crise devido à crise da rigidez generalizada das políticas de bem-estar social, do sistema de produção em massa de base eletromagnética e da pressão constante da classe trabalhadora fortemente organizada. Assim, de um Estado intervencionista amplo e socialmente direcionado, passou-se a propor, com os criadores do neoliberalismo (Hayek e Friedman), um Estado mínimo, que apenas interviesse nas questões essenciais para a classe burguesa, ou seja, na manutenção e estabilidade dos mercados que possibilitasse a confiança para os investimentos. (p.204/205) Devido a isso, emerge o modelo flexível de produção japonês, o Toyotismo, que rompe com a parcialização das funções Fordista e implementa as Células de Produção Toyotista, na qual o grupo de trabalhadores passa a se responsabilizar pelo processo de produção como um todo, mas sem inserir ainda os trabalhadores no projeto final da alta gerência. Nas células de produção os trabalhadores gerenciam máquinas microeletrônicas, que incorporam em seu funcionamento diversas operações antes realizadas pelos trabalhadores nas máquinas eletromecânicas. (p.205) Resta a uma cada vez menor elite de trabalhadores as tarefas de manutenção e projeção dessas máquinas que, dada sua complexidade, exigem deles profundos conhecimentos científicos que são sumariamente negados a classe mais baixa. O Toyotismo intensificou o trabalho a níveis insuportáveis a partir da Gestão por Tensão, onde a partir de sinais luminosos verde, laranja e vermelho, tentava zerar o ócio dos trabalhadores, obrigando a produção a estar sempre no limite. Exigiu também o máximo uso de horas extras, conforme a necessidade da produção, e obrigou o operário a ser polivalente, trabalhando/gerenciando várias máquinas ao mesmo tempo nas células de produção. Entretanto, essa “evolução” não veio acompanhada de uma melhora na

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remuneração, mas foi possível graças a destruição da organização dos sindicatos de classe e sua substituição pelo “sindicato-empresa”, que substitui também a crítica e o confronto pela cooperação, que passa a ser palavra de ordem nesse sistema. (p.206) Além disso, nesse modelo, ao trabalhador é imposto a participação e comprometimento com o processo de trabalho e com o sucesso da empresa, onde os funcionários participam dos Círculos de Controle de Qualidade, os CCQs, onde fazem sugestões para a melhoria de produção da empresa, que permite isso para que o funcionário se sinta “feliz porque está participando da vitória e fortalecimento da empresa”, o funcionário se “torna” a empresa. (p.207) A partir disso vincula todas as esferas de sua vida na empresa, sacrificando sua vida pessoal em busca de uma qualificação melhor para “crescer” na empresa, o que coloca os trabalhadores frequentemente em situações de luta e competição entre si, quebrando os laços de solidariedade classista que unia os sindicatos proletariados no Fordismo. Na educação, esse modelo originou um novo quadro de competências a serem ensinadas aos alunos, substituindo as qualificações objetivas pelas qualificações subjetivas, entre elas a capacidade de incorporação de novos conhecimentos, o manejo das relações interpessoais e a habilidade de reagir subjetivamente as situações de forma correta. (p.208) A partir disso percebemos que, desse momento em diante, o trabalhador passa a ser explorado duplamente, através de seu esforço muscular, como anteriormente, e de seu esforço intelectual, que envolve não só o desenvolvimento técnico mas também de habilidades e competências para o relacionamento interpessoal, a liderança e a dedicação integral ao processo de produção. Nisso, os trabalhadores se focam em mostrar cada vez mais serviço, rendimento, competência e a ser simpático, confiável e um líder, buscando assim uma promoção. (p.209) Assim, se desenvolve o trabalhador generalista, aquele que tem uma formação mais ampla, uma visão global do todo, conhecendo um pouco de tudo, especialistas em generalidades. Esse trabalhador pensa nos objetivos tendo uma visão mais ampla e conseguindo entender o inter-relacionamento das partes de uma organização. As políticas educacionais acompanharam esse pensamento, preparando o alunos valorizando mais o processo que o produto, mais o método de conhecer que o conhecimento, mais a forma que o conteúdo. (p.210) Dessa forma, a empresa passa a necessitar de uma subjetividade flexível de seus funcionários. Estes estão sempre ameaçados pelo desemprego, de forma que adquirir uma posição superior na empresa o colocará em situação de maior segurança contra o desemprego em momentos de crise. (p.211) Capítulo 4. As tendências pedagógicas e seus fundamentos socioantropológicos Capítulo 4.1 Formar homens para a nascente sociedade capitalista: a escola tradicional Educação/Ensino Tradicional é considerado a forma hegemônica na qual se configurou a educação burguesa, localizando-se inicialmente no século XIX no processo da Revolução Burguesa/Industrial, cujo projeto educativo tinha como objetivo a preparação do estudante para servir como mão de obra para o capitalismo. Para isso, a burguesia rompeu os laços rurais, fundando uma civilização predominantemente urbana, e esse rompimento constituiu o inicio do processo histórico da constituição do capitalismo, num processo de urbanização em massa, que subordinou o campo à cidade. (p.225) Os pilares da pedagogia tradicional são a instrução educativa, o governo e a disciplina. O governo é um ente externo aos indivíduos e impõe para cada um a ordem e as regras. Na escola, os educandos devem focar a atenção para a matéria a ser aprendida. Nesse período a escolarização em massa era uma necessidade urgente para a formação e manutenção da sociedade burguesa em constituição. (p.227) O professor desse modelo é o centro do processo, cuja ação deveria seguir cinco passos: a preparação, a apresentação, a assimilação, a generalização e a aplicação. (p.228) Capítulo 4.2 Formar indivíduos autônomos para uma sociedade cada vez mais complexa: a escola nova A Escola Nova surge nos fins do século XIX e adentra as primeiras décadas do século XX, tendo como principal expoente John Dewey, que fazia parte da corrente filosófica pragmatista, que acredita na utilidade da ação humana, nas suas consequências e sentido prático, na qual a verdade encontra-se na ação que produz resultados. Essa corrente escolanovista criticava a vertente tradicional, de base kantiana, por

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“moldar” o aluno de acordo com o modelo capitalista vigente, enquanto exaltava uma escola com foco no desenvolvimento da criança para a vida autônoma, e não apenas para o trabalho. (p.228) O modelo tradicional preparou a massa escolar para as necessidades da Revolução Industrial, onde era necessário a assimilação e imitação exata da parcela da produção, enquanto o modelo novo de escola tinha como objetivo a formação da massa escolar de forma autônoma, onde o conhecimento seria um processo de acumulação a partir da iniciativa própria do indivíduo, no conceito de “aprender a aprender”, de forma autônoma, buscando uma superação dos concorrentes futuros do mercado de trabalho através do conhecimento superior e da maior preparação, além do desenvolvimento da habilidade de trabalhar em conjunto e de seguir hierarquias definidas. Podemos observar que o modelo tradicional partiu do fordismo, enquanto o modelo da escola nova, tem como foco a demanda toyotista, de células de produção. (p.230) Capítulo 4.3 Formar trabalhadores para o desenvolvimento do país: o tecnicismo O tecnicismo no Brasil foi uma corrente hegemônica da educação no período pós 1964, ou seja, durante o período da Ditadura Militar brasileira. A principal característica desse modelo educacional é a implantação de uma lógica empresarial no seio da escola, desde a gestão até os currículos, a didática e a avaliação, com foco na racionalização do sistema de ensino visando à sua eficiência. O objetivo da educação era formar um quadro competente de trabalhadores que pudessem alavancar, por meio da produtividade, a economia do país. Esse modelo seguia os preceitos da ideologia da segurança nacional da Escola Superior de Guerra. (p.232/233) Capítulo 4.4 O indivíduo bio-psico-social: a concepção construtivista de homem – o construtivismo No construtivismo, a concepção do indivíduo parte de sua função bio-psico-social socialmente adaptado às mudanças do capitalismo no final do século XX e início do século XXI. Partindo dos preceitos de Piaget, a dimensão psicológica é a mediadora entre a dimensão biológica e a social, combinando-se, inclusive, com as influências sociais. Dessa forma, ele aponta que o que define a relação entre o indivíduo e o meio é a adaptação, sendo a assimilação e a acomodação partes desse processo de troca entre o organismo e o meio, através do qual chega-se à autorregulação/equilibração. A partir dessas premissas podemos analisar o mundo atual, onde há a forte necessidade de múltiplos discursos e pontos de vista serem agregados em uma mesma sociedade sem confrontos, mas a partir da compreensão e aceitação de outros pontos de vista, constituído, assim, um estado democrático onde as pessoas consigam conviver em paz. (p.237)