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Page 1: Reforma curricular do ensino médio politécnico reflexos no interior da escola reflexos na docência

 

X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014.                                                                                p.1 

 

 

 

 

    Reforma Curricular do Ensino Médio Politécnico: reflexos no interior da escola, reflexos na docência    

 

Resumo A cada mudança de governo o estado do Rio Grande do Sul sofre  a  imposição  de  reformas  e  políticas  educacionais. A ausência de debate, tanto com os professores quanto com a  comunidade  escolar,  têm  produzido  efeitos  negativos para a educação pública estadual. Os professores sentem‐se desvalorizados,  perdem  o  interesse  pela  profissão  e  pelo ato de educar e  relutam em aceitar, entender e aplicar as novas  políticas.  É  o  que  pode  estar  ocorrendo  com  a “Proposta  pedagógica  para  o  ensino médio  politécnico  e educação profissional integrada ao ensino médio 2011‐2014” implantada  nesse  estado.  Diante  disto,  este  artigo apresenta  o  resultado  de  uma  investigação  em  que  se analisam  alguns  dos  efeitos  produzido  pela  reforma curricular  imposta às escolas e seus professores a partir de entrevistas  realizadas  com  professores  de  uma  escola pública  estadual.  Os  resultados  demonstram  que  há  um sentimento de  impotência da parte dos professores diante da  reforma  implantada,  ainda  que  os  mesmos  apontem algumas possibilidades positivas.  Palavras‐chave: Reforma educacional. Ensino médio politécnico; Reforma curricular; formação de professores.  

 Cláudia Zank 

Universidade Federal do Rio Grande do Sul  [email protected] 

   

Margareth Fadanelli Simionato Centro Universitario Metodista IPA 

[email protected] 

 

 

 

 

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 Reforma Curricular do Ensino Médio Politécnico: reflexos no interior da escola, reflexos na docência  Cláudia Zank ‐ Margareth Fadanelli Simionato 

X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014.                                                                                p.2 

 

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Introdução 

Os anos de 2007 a 2010 foram difíceis para a educação no Rio Grande do Sul (RS). 

As  ações  levadas  a  efeito  pela  Secretaria  da  Educação,  estabeleceram  ações  como  a 

enturmação  (junção de  turmas numa mesma  sala de aula), a multisseriação  (junção de 

séries  diferentes  em  uma  mesma  sala  com  apenas  um  professor),  o  fechamento  de 

turmas da modalidade EJA (Educação de Jovens e Adultos), o fechamento de escolas, e a 

implementação de políticas privatizantes (BACCIN; MENDES, 2009). Acrescenta‐se a estes 

cortes, os relativos à manutenção da infraestrutura das escolas e o não cumprimento do 

Piso Salarial Profissional Nacional. Como consequência, a educação pública gaúcha entrou 

em grave crise: escolas sucateadas,  laboratórios fechados, bibliotecas precárias, falta de 

professores e funcionários aliados a um enorme número de aposentadorias em três anos 

(LAZZAROTO, 2011). 

  Em 2011, quando da posse do novo governo (do Partido dos Trabalhadores  ‐ PT), 

professores e comunidade escolar esperavam por ações que viessem a acabar com esta 

crise, propondo mudanças que garantissem ganhos na qualidade da educação. Na visão 

da Secretaria de Educação do Rio Grande do Sul  (SeducRS), estes ganhos ocorreriam a 

partir da  implantação de  sua “Proposta pedagógica para o ensino médio politécnico e 

educação profissional integrada ao ensino médio  2011‐2014”.   

Na  introdução da Proposta são relatados alguns dos problemas enfrentados pelo 

Ensino Médio  no  RS,  dentre  estes  a  baixa  taxa  de  escolaridade  líquida1,  a  defasagem 

idade‐série, os altos índices de abandono e reprovação, o alto número de alunos fora da 

escola,  o  pouco  número  de  professores  atuando  no  Ensino  Médio,  a  infraestrutura 

precária das escolas e, por fim, o currículo fragmentado. Diante disso, a Seduc apresenta 

sua solução:  

Essa  conjunção  de  fatores  apresenta  uma  realidade  que  exige, urgentemente, novas formas de organização do Ensino Médio. Além do aporte de  investimentos para a ampliação e  recuperação da  rede  física das escolas, do investimento na formação e valorização do magistério, há a necessidade da construção de uma nova proposta político‐pedagógica [...] (SEDUC, 2005, p. 7).  

                                                            1 Idade esperada para o ensino médio, a qual é, segundo o documento da Seduc, dos 15 aos 17anos. 

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 Reforma Curricular do Ensino Médio Politécnico: reflexos no interior da escola, reflexos na docência  Cláudia Zank ‐ Margareth Fadanelli Simionato 

X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014.                                                                                p.3 

 

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  O  documento  segue,  então,  justificando  e  apresentando  sua  proposta  que,  em 

poucas palavras, se constitui em um Ensino Médio Politécnico2 e na Educação Profissional 

integrada ao Ensino Médio3.  

Vê‐se, assim, e na  falta de ações até o momento que mostrem o  contrário, que 

esse  governo  propunha  acabar  com  a  crise  na  educação  através  de  alterações  na 

estrutura curricular do Ensino Médio: “Os problemas de  infraestrutura, da remuneração 

dos trabalhadores da educação, do acesso à formação continuada, de recomposição do 

quadro  e de  reestruturação da  jornada  são  secundarizadas. O  único problema  tratado 

com urgência é o currículo [...]” (BÚRIGO, 2013, p. 13). 

  Ainda  que  ficasse  claro  para  a  comunidade  escolar  e  acadêmica  que  a  crise  da 

educação pública estadual não seria resolvida com esta proposta, foi sua imposição o que 

mais  angustiou  os  docentes,  principalmente  no  período  inicial  de  sua  implantação. 

Conforme aponta Búrigo (2013, p. 13), “A reforma em curso na rede estadual gaúcha se 

apresenta  com  um  discurso  que  tem  confundido  muitos  professores  e  estudantes: 

formula enunciados de  tom emancipátório, mas  impõe uma vontade de governo  [...]”. 

Devido a prazos apertados, não pode se considerar que houve real debate, a proposta foi 

apresentada no segundo semestre de 2011 para implementação no primeiro semestre de 

2012:  

Ao  apresentar  seu  projeto  de  Reestruturação  do  Ensino Médio,  bem como  o  cronograma  de  “debates”,  estabelecendo  o  prazo  para  a elaboração do documento final para  janeiro de 2012, o governo derruba seu  próprio  argumento  de  que  a  proposta   vai  ser  construída democraticamente (CPERS, 2011, online).    

Na  visão do  sindicato CPERS  (Centro de Professores do Estado do Rio Grande do Sul) 

(2011, online), a proposta foi construída de “cima para baixo”, sem uma consulta séria e o 

necessário debate com os docentes:   “Estaremos novamente diante de um  ‘regimento 

padrão’ elaborado pela SEC à revelia da comunidade escolar”. Para o sindicato (2011), a 

democracia do governador e de seus secretários está presente apenas em seus discursos.                                                              2 O Ensino Médio Politécnico “tem por base na sua concepção a dimensão da politecnia, constituindo‐se na 

articulação das áreas de conhecimento e suas  tecnologias com os eixos: cultura, ciência,  tecnologia e trabalho enquanto princípio educativo” (SEDUC, 2011, p.5). 

3 “A educação profissional integrada ao ensino médio se configura como aquisição de princípios que regem a vida social e constroem, na contemporaneidade, os sistemas produtivos” (SEDUC, 2011, p.5). 

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 Reforma Curricular do Ensino Médio Politécnico: reflexos no interior da escola, reflexos na docência  Cláudia Zank ‐ Margareth Fadanelli Simionato 

X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014.                                                                                p.4 

 

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  De  modo  democrático  ou  não,  a  “Proposta  pedagógica  para  o  ensino  médio 

politécnico e educação profissional  integrada ao ensino médio 2011‐2014” foi  implantada 

e, desde então, são muitas as questões que se apresentam. Dentre estas, a que trata dos 

reflexos dessas mudanças no trabalho e na vida do professor. Ainda que os problemas na 

educação pública estadual não  tenham  começado no governo do PT ou mesmo no do 

PSDB, as constantes alterações, ocorridas nas mudanças de governo, sem o necessário 

debate  com  a  comunidade  escolar,  podem  apresentar‐se  como  difíceis  de  aceitar, 

entender e aplicar para a maioria dos professores.   Ao sentirem que não  têm “voz”, 

estes professores podem perder a eficácia e o  interesse pela profissão (HARGREAVES et 

al,  2002).  Eles  se  sentem  sobrecarregados  e  desvalorizados.  Nas  palavras  de  uma 

professora  da  rede  estadual,  o  que  sobrecarrega  os  professores,  no  entanto,  não  é 

apenas o excesso de trabalho, às vezes de 60 horas, em escolas diferentes, mas  

Sobrecarrega‐os  o  insuficiente  investimento  no  setor  educacional,  que transforma  o  cotidiano  escolar  numa  luta  permanente  contra  o desconforto (quando não contra a insalubridade) no local de trabalho. Sobrecarrega‐os a política pública que não transgride a ordem do capital e  os  estimula  a  permanecer  exclusivamente  como  "preparadores"  de mão‐de‐obra para o mercado de  trabalho. Embora os discursos oficiais afirmem o inverso. Sobrecarrega‐os,  também  o  salário  miserável,  representante  e desvelador da grande contradição das sociedades capitalistas que, com "mão‐de‐obra barata", fazem da precariedade no atendimento ao grande público um instrumento garantidor da supremacia do poder privado. Mais do que tudo isso, no entanto sobrecarrega‐os a falta de perspectiva profissional, o estreito e nublado horizonte que seus olhos vêem, quando saem para trabalhar (GAUTÉRIO, 2013, online).  

  Diante  disto,  este  artigo  busca  em Hargreaves  (2001;  2004)  e Hargreaves  et  al 

(2002)  o  embasamento  teórico  necessário  às  reflexões  sobre  as  questões  docentes 

frente às reformas educacionais  . E, a partir de entrevistas com 08 professores da rede 

pública  do  Rio  Grande  do  Sul,  investiga  e  analisa  alguns  dos  efeitos  produzidos  pela 

última reforma nas escolas e em seus professores. 

 

 

 

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 Reforma Curricular do Ensino Médio Politécnico: reflexos no interior da escola, reflexos na docência  Cláudia Zank ‐ Margareth Fadanelli Simionato 

X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014.                                                                                p.5 

 

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1. Reformas educacionais, reflexos nas escolas e nos professores 

A lógica neoliberal não é prerrogativa do Estado do RS e nem mesmo do Brasil. Presente 

em  diferentes  países,  mostra‐se  no  final  do  século  XX  como  uma  tendência 

governamental,  alterando  profundamente  o  funcionamento  das  escolas  em  diversas 

partes do mundo. Em contextos neoliberais, as questões econômicas  se  sobrepõem às 

sociais. Há movimentação de recursos entre os países, e da esfera pública para a privada. 

Além disso, os governos reduzem os gastos públicos, e a educação, como “um dos itens 

mais onerosos e vulneráveis na lista de gastos públicos” (HARGREAVES, 2001, p.17) sofre 

cortes constantes. 

A vulnerabilidade da educação traz consequências para alunos e para aqueles que 

vivem e trabalham com ela, os professores. Em diferentes países, eles tornam‐se “vítimas 

do enfraquecimento da  rede de previdência  social, da  redução nos gastos  com o bem 

estar público, das convulsões sociais nas famílias dos alunos e do descompromisso geral 

com a vida pública” (HARGREAVES, 2001, p.17).  

No  Brasil,  e  mais  especificamente  no  Rio  Grande  do  Sul,  não  é  diferente.  As 

mudanças  protagonizadas  durante  os  últimos  governos  estaduais  encontram 

semelhanças com o que é descrito por Hargreaves sobre a educação nos Estados Unidos 

no fim do século XX, início do século XXI: 

Os  salários dos professores  foram  congelados. Os  cargos  remunerados de coordenação foram reduzidos. As cargas de trabalho ainda continuam a aumentar. Os professores se viram em uma cilada em que se faz mais por menos (2004, p. 94).    

Além dessa situação salarial e de carga de trabalho, os professores ainda tiveram 

que  enfrentar  as  avaliações  externas  e  as  reformas  educacionais  que  comumente 

ocorrem sem que sejam consultados. Hargreaves (2004, p. 73) aponta uma relação entre 

as avaliações e as reformas, explicando suas ocorrências:  

[...] as agendas globais preocupadas com padrões e metas mensuráveis, resultados  de  pesquisa,  dados  para  responsabilização,  ênfase  nas habilidades  básicas  e  o  impulso  à  privatização,  colonizaram progressivamente  as  práticas  de  reforma  educacional  e  as  prioridades dos países menos desenvolvidos.    

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 Reforma Curricular do Ensino Médio Politécnico: reflexos no interior da escola, reflexos na docência  Cláudia Zank ‐ Margareth Fadanelli Simionato 

X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014.                                                                                p.6 

 

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Vê‐se, portanto, que estas situações, claramente  impostas por agendas globais e 

de  interesse de alguns poucos  setores,  se apresentam de  forma  independente de uma 

preocupação com a qualidade da educação, o que explica a não necessidade de colocar 

os professores como protagonizadores.  

As avaliações externas  surgiram no  final dos anos  1980 como uma  tendência da 

gestão escolar de contar com indicativos de qualidade da educação. O PISA (Programme 

for International Student Assessment/Programa Internacional de Avaliação de Estudantes) 

torna‐se  referência e, aqui no Brasil,  influencia a metodologia de outros programas de 

avaliação, como o SAEB4 (Sistema de Avaliação da Educação Básica) e o ENEM5 (Exame 

Nacional do Ensino Médio).  

Hargreaves  (2004,  p.  77)  aponta  que  esse  tipo  de  gestão  escolar  supervaloriza  

resultados e desempenhos em detrimento de aspectos essenciais à educação:  

Padrões  de  desempenho,  metas,  listas  de  competências  são  as prioridades  e,  ao  lhes  dar  ênfase  exclusiva  ou  excessiva,  não  apenas descuidam, mas  também prejudicam ativamente a dimensão emocional do  ato  de  educar.  Transformam  a  aprendizagem  em  uma  corrida mecânica  e  desobrigada  rumo  a  metas,  ou  preenchem  o  tempo  dos professores  com  tarefas  técnicas,  não  sobrando  espaço  para  a criatividade,  a  imaginação  e  os  relacionamentos,  ou  seja,  para  todas aquelas coisas que estimulam a paixão de ensinar.  

Conforme  aponta  este  autor,  em  vez  de  se  preocuparem  em  promover  a 

aprendizagem, em  se envolver emocionalmente  com os  alunos, e em  se  atualizar e  se 

capacitar, os professores  sentem‐se pressionados  a  fazer o que é  “mandado”: ensinar 

para  resultados,  treinar  os  alunos  para  avaliações  padronizadas.    Com  isso  perdem  a 

flexibilidade,  a  criatividade  e,  por  fim,  o  ânimo:  “A  realidade  de  trabalho  desses 

professores não tem sido energizadora [...]; tem sido antes um mundo desanimador de 

microgestão,  padronização  e  complacência  profissional  [...]”  (  HARGREAVES,  2004,  p. 

90).  

                                                            4  O  SAEB  é  composto  por  três  avaliações:  a  Aneb  (Avaliação  Nacional  da  Educação  Básica),  a  Anresc 

(Avaliação Nacional do Rendimento Escolar) e a Ana (Avaliação Nacional da Alfabetização). 5 O ENEM surgiu, inicialmente, para avaliar o desempenho do estudante no final do Ensino Médio. Somente  

a partir de 2009 passou a também ser utilizado para ingresso no Ensino Superior. 

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X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014.                                                                                p.7 

 

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Com relação especificamente à última alteração no currículo do Ensino Médio no 

RS,  implantada  na  vigência  do  atual  governo  estadual,  pode  se  dizer  que  esta 

desencadeou uma serie de reordenações pedagógicas, alterando profundamente o modo 

como escolas e professores estavam estruturados.  

Exemplo  disto  é  o  trabalho  por  área  de  conhecimentos.  Este,  proposto  e 

materializado  na  avaliação  da  aprendizagem  apenas  por  áreas  de  conhecimento  e  

utilizando‐se de conceitos para  informar o rendimento do aluno, gerou um desconforto 

muito  grande  no  interior  das  escolas,  como  é  possível  observar  na  fala  de  um  dos 

professores entrevistados:  

Não que sejamos contra reformas que venham para promover a aprendizagem do nosso 

aluno, mas o que mais angustia é quando não  sabemos o que  fazer, ou melhor,  como 

fazer para ser justo na avaliação do aluno (Professor 8).   

Da mesma forma, outro docente se manifesta sobre as mudanças provocadas no 

interior da escola e no seu trabalho diário com os alunos:  

O que queremos, na maioria das vezes são as condições mínimas de trabalho, tempo para 

preparar  nossas  aulas,  tempo  de  pensar  os  projetos  de  pesquisa  no  coletivo  e  não 

precisar correr de escola em escola para completar a carga horária e conseguir um salário 

ao menos digno  para  sobreviver.  Trabalho manhã  tarde  e  noite,  com  ensino médio,  e 

tenho  em média  350  alunos  por  semana.  Como  acha  que  vou  conseguir  realizar  uma 

avaliação individual e por parecer como escreveram na proposta? (Professor 3). 

É  importante  ainda  destacar,  dentro  da  proposta  da  Seduc,  o  trabalho 

interdisciplinar.  A  interdisciplinaridade  vem  sendo,  já  há  algum  tempo,  estudada  e 

defendida  por  diferentes  educadores.  Contudo,  no  RS  o  trabalho  interdisciplinar  não 

contempla  a  integração  de  disciplinas,  mas  de  áreas  de  conhecimento.  Estas 

oportunizariam a construção de projetos, “elaborados a partir de pesquisa que explicite 

uma  necessidade  e/ou  uma  situação  problema”  (SEDUC,  2011,  p.  28),  em  seminários 

integrados, ou seja, em espaços de comunicação, socialização, planejamento e avaliação 

das vivências de professores e alunos e práticas do curso (SEDUC, 2011, p. 28).  Na fala de 

um  dos  professores  entrevistados,  fica  clara  a  abertura  para  a  proposta,  mas  com 

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 Reforma Curricular do Ensino Médio Politécnico: reflexos no interior da escola, reflexos na docência  Cláudia Zank ‐ Margareth Fadanelli Simionato 

X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014.                                                                                p.8 

 

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ponderações da realidade escolar que os afeta no cotidiano e que faz parte das condições 

reais e objetivas do desenvolvimento do trabalho escolar: 

Entendo  que  a  proposta  do  seminário  integrado  é  uma  janela  que  se  abre  para  que 

possamos trabalhar com eles [os alunos] temas antes não abordados, como, por exemplo 

a questão do machismo nos dias de hoje. Mas o que mais me angustia, é que nem consigo 

encontrar os colegas na escola para conversar sobre os avanços dos alunos porque um dá 

aula num turno, outro  já saiu para dar aula em outra escola, e assim por diante. Tem as 

horas  atividade, mas não  se  consegue  reunir  todos da mesma  área no mesmo horário 

sempre. Essa reforma deveria ter previsto que pudéssemos trabalhar 40 horas na mesma 

escola, no mínimo. Sem contar que agora temos que avaliar de um  jeito muito diferente 

sem  preparo  nenhum.  Não  sei  como  vou  fazer  isso.  Na  escola  o  Pedagógico  tem 

trabalhado  isso nas reuniões, mas é difícil para todos. Vai passar muito aluno sem saber 

muita coisa” (Professor 2). 

A proposta de Ensino Médio Politécnico está bem fundamentada e pensada, mas 

não  se  trata  de  uma  proposta  simples,  que  pode  ser  rapidamente  compreendida  e 

aplicada.  Ela  requer  leituras,  debates  e  estudo  por  parte  dos  professores,  conforme 

explicam  Hargreaves et al (2002, p. 113): 

Integrar o currículo, quando a prática dominante por décadas  tem sido dividi‐lo em disciplinas e em especialidade, é um trabalho árduo do ponto de  vista  conceitual  e  prático.  Planejar  o  ensino  conforme  padrões  a serem cumpridos, no lugar do conteúdo a ser vencido, requer mudanças fundamentais  nas  estratégias  de  sala  de  aula  dos  professores  e,  para muitos deles, saltos consideráveis em seu nível técnico.    

Assim,  se  concorda  com  estes  autores  (2002)  de  que  parece  haver  um  abismo 

entre aquilo que consta em documentos oficiais e aquilo que é implantado. Para diminuir 

este abismo, é preciso o convencimento da comunidade escolar sobre o efetivo avanço 

qualitativo que  a mudança pode  proporcionar, o que  só ocorre  na  troca de  ideias,  no 

debate entre as partes. Sem esse convencimento, qualquer mudança pode fracassar, pois 

levará ao desestímulo, sensação de desvalorização e de fracasso: “para qualquer tipo de 

reforma ter sucesso, os professores devem acreditar que terão uma voz significativa nas 

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 Reforma Curricular do Ensino Médio Politécnico: reflexos no interior da escola, reflexos na docência  Cláudia Zank ‐ Margareth Fadanelli Simionato 

X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014.                                                                                p.9 

 

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decisões  e  não  irão  se  tornar  os  únicos  bodes  expiatórios  do  fracasso  em  atingir  os 

objetivos” (MARSH, 1999, p. 192 apud HARGREAVES et al, 2002, p. 18). 

Convencer os professores da necessidade de mudança  significa  convencê‐los de 

que essas mudanças serão em prol da educação e dos alunos. Hargreaves et al (2002, p. 

119)  apontam  que,  para  os  professores,  a mudança  que  beneficia  os  alunos  é  sempre 

positiva, já  

 A  mudança  negativa  foi  considerada  como  sendo  aquela  que  está  a serviço  de  uma  agenda  política,  e  não  de  uma  agenda  educacional; aquela  que  é  “imposta”,”ditada”,  “forçada”  ou  “empurrada”  aos professores pelo governo (Hargreaves et al., em fase de elaboração). De maneira  interessante,  nesse  vocabulário  da  mudança  imposta,  os professores  se  representam  como  tendo  sido  desrespeitados, desconsiderados e invadidos.  

  Os autores (2002) apontam então perspectivas6 que devem ser levadas em conta 

quando  se deseja promover mudanças nas escolas e na educação, uma vez que estas, 

inevitavelmente, envolvem os professores. A primeira perspectiva relaciona‐se à questão 

técnica,  ou  seja,  à  possibilidade  de  proporcionar  aos  professores  aprender  sobre  as 

novidades apresentadas. Estas não devem ser formações aligeiradas ou superficiais, mas 

proporcionar  aprendizado,  experimentação  e  a  oportunidade  de  entender  a mudança, 

afinal “Os professores não alteram e nem devem alterar suas práticas apenas porque uma 

diretriz  lhes é apresentada, e eles se sentem forçados a cumpri‐la” (HARGREAVES et al, 

2002, p. 114).  

  O que se observou nas escolas, entretanto, foi o aligeiramento da implantação da 

proposta,  sem  maiores  estudos  e  apropriação  das  novas  organizações  didático‐

pedagógicas  implicadas na proposta. Soma‐se a  isso o desencontro de  informações, por 

vezes gerado pelos setores externos à escola, como é possível constatar na  fala de um 

dos entrevistados: 

 

                                                            6 Hargreaves et al (2002) tratam de 04 perspectivas: a técnica, cultural, política e pós‐moderna. No entanto, 

este  artigo  não  abordará  a  perspectiva  pós‐moderna  por  entender  que  as    características    dessa sociedade,  conforme  apontado  pelos  autores,  não  se  fazem  presente  na maior  parte  da  sociedade brasileira, mais heterogênea em diferentes aspectos. 

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 Reforma Curricular do Ensino Médio Politécnico: reflexos no interior da escola, reflexos na docência  Cláudia Zank ‐ Margareth Fadanelli Simionato 

X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014.                                                                                p.10 

 

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Pra  começar,  soubemos muito pouco do politécnico. Na escola pouco  foi  falado  sobre 

isso e quando começaram a explicar,  já  tivemos que começar as aulas com essa grade 

nova. Nem elas [direção e pedagógico] sabiam explicar o que era essa reforma. Foi muita 

mudança  de  uma  hora  para  outra.    Diminuiu  carga  horária  de  algumas  disciplinas,  e 

entrou o seminário integrado. Não se sabia bem o que fazer nessa aula. Era pesquisa? De 

que tipo? Foi tudo muito confuso. Ainda está confuso (Professor 5). 

Nesse  sentido,  Kuenzer  (2011)  observa  que  a  questão  conceitual  proposta  nos 

textos  legais  ainda  gera  discussões  e  controvérsias  entre  professores  e  gestores. 

Segundo a autora,  isto pode ocorrer devido a pouca apropriação teórico‐epistemológica 

dos conceitos por parte dos atores envolvidos na materialização da proposta.  

A segunda perspectiva diz respeito à questão cultural e refere‐se:  

[...] aos  significados e às  interpretações que os educadores atribuem à mudança;  mostra  como  ela  afeta  e  até  confronta  as  crenças  dos professores e as suas práticas; como os professores (juntos ou sozinhos) entendem  as  mudanças  nas  ideias,  nas  crenças,  nas  emoções,  nas experiência e na vida dos professores.” (HARGREAVES et al, 2002, p. 115)  

  A perspectiva cultural relaciona‐se diretamente à parte humana, presente em toda 

e qualquer  reforma educacional, e pode ser a menos  levada em conta por aqueles que 

propõem  as mudanças e desejam  implanta‐las. Segundo Morgado  (2005, p.77) um dos 

grandes  problemas  “das  reformas  educativas  passa  por  desvalorizarem  o  poder  da 

cultura instituída na escola para aceitar, adaptar e/ou repudiar as inovações que lhes são 

propostas  e  que  entram  em  conflito  com  as  estruturas  e  valores  dominantes  na 

instituição”.  

Uma terceira perspectiva apontada pelos autores é a política:  

A perspectiva política diz  respeito  à maneira  como o poder  é exercido sobre outras pessoas ou desenvolvido com elas, aos modos como grupos e  seus  interesses  influenciam  o  processo  de  inovação  e  reforma  e  à maneira  como  as  finalidades  abordam, ou desafiam  as distribuições de poder  existentes  na  sociedade  ou,  ainda,  concordam  com  elas. (HARGREAVES et al, 2002, p. 118) 

   

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 Reforma Curricular do Ensino Médio Politécnico: reflexos no interior da escola, reflexos na docência  Cláudia Zank ‐ Margareth Fadanelli Simionato 

X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014.                                                                                p.11 

 

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No sentido abordado por estes autores, podemos relacionar a perspectiva política 

com as mudanças de governo e  respectivos modelos de gestão educacional que estes 

adotam, bem como com os objetivos que pretendem atingir com as reformas. Acredita‐se 

que o  ideal seria que estes objetivos fossem ao encontro dos propósitos da educação e 

de sua inerente missão social.  

  Para Hargreaves et al (2002, p. 151), os legisladores, governantes, administradores 

públicos e  líderes educacionais devem refletir melhor sobre as mudanças que propõem, 

pois elas afetam diretamente e significantemente “o modo como o trabalho intelectual e 

emocional do  ensino  são  concretizados”. Assim,  antes de  ter objetivos políticos,  estas 

pessoas devem ter como atribuições fundamentais o apoio aos professores, dando‐lhes 

garantia que as mudanças serão mantidas (HARGREAVES et al, 2002, p. 151).  

Os  mesmos  autores  afirmam:  “os  professores  esperam  receosos  a  próxima 

iniciativa  caprichosa  de  reforma,  sofrem  de  ansiedade  com  relação  ao  desempenho 

diante  da  avaliação  e  da  inspeção  constantes,  e  não  se  sentem  confiantes  em  seus 

superiores, nem que estes confiem neles” (2004, p. 98). Diante disso, se questiona: Como 

podem  realizar um bom  trabalho nessas condições? Qual a educação que esta  reforma 

está promovendo? 

   

Considerações Finais 

Uma  breve  retomada  do  panorama  da  educação  no RS  nos  últimos  anos mostra  uma 

série  de  reformas  que  ocorreram  de  forma  imposta,  ou  seja,  sem  que  houvesse  um 

debate com os professores e comunidade escolar acerca dos problemas e possibilidades 

de soluções. 

De um governo para outro, continuam ou se ampliam algumas questões, dando a 

impressão que reformas entram e saem do cenário educacional assim como os partidos 

políticos entram e saem dos governos. Nessa dança, políticas educacionais são impostas, 

implantadas, engavetadas e  substituídas. Nesses  casos,  resta aos professores assistir à 

desvalorização  de  tudo  o  que  foi  construído  (e  desconstruído)  no  período  anterior  e 

recomeçar a partir de uma nova política. Mas qual o resultado disso para a educação? 

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Hargreaves (2004) não é positivo quanto a esses resultados. Ao contrário, mostra 

que  os  professores  se  sentem  desvalorizados,  desacreditados,  cansados, 

sobrecarregados. A educação, naturalmente,  sente os  reflexos desse profissional. Para 

Hargreaves et al (2002), há aspectos que devem ser levados em conta se o que se deseja 

é  uma  reforma  que  se mantenha  e  que  beneficie,  de  fato,  a  educação.  Todos  esses 

aspectos relacionam‐se com os professores. 

Ainda  que  as  pesquisas  e  estudos  realizados  pelo  referido  autor  se  deem  em 

países de  língua  inglesa, principalmente Estados Unidos, Canadá e  Inglaterra, há pontos 

em comum conosco no que  tange à educação. E um deles diz que não é possível  fazer 

educação de qualidade sem ouvir a classe docente, o que é atestado por este professor 

da rede estadual:  

Sabemos que  a educação escolar  sempre  foi e  continua  sendo  alvo de opiniões, críticas e tentativas. Está na hora de sofrer mudanças, porém, que devam ser pensadas e repensadas dialogando com os responsáveis que  estão  em  sala  de  aula.  Somos  nós, professores, que  sabemos  das realidades  e  desafios  enfrentados  no  dia  a  dia.   Mudanças  são necessárias, sim. Entretanto, não podemos abraçar um projeto no qual os caminhos  não  se  mostram  claros  e  coerentes.  [...]  Não  podemos esquecer que, além de tudo, são nossos alunos que saem prejudicados. (HÜBNER, 2012, online).  

Assim,  as  pesquisas  e  reflexões  de Hargreaves  (2001;  2004)  e Hargreaves  et  al 

(2002) acerca das questões docentes frente às mudanças são um convite à reflexão e à 

realização  de  pesquisas.  Acrescenta‐se,  ainda,  a  possibilidade  de  ampliar  os  estudos 

acerca  das  possíveis  relações  entre  as  análises  realizadas  pelos  referidos  autores  e  a 

realidade dos professores do ensino público estadual no RS. 

Referências 

BACCIN, Ecléa Vanessa Canei; MENDES, Valdelaine da Rosa. Algumas Considerações sonre as Políticas Educacionais e as Reformas da Educação no Rio Grande do Sul. XVII CIC  XI ENPOS. Anais... Universidade Federal de Pelotas.  2009. Disponível em: http://www2.ufpel.edu.br/cic/2009/cd/pdf/CH/CH_01455.pdf. Acesso em: 05 maio 2014. 

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X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014.                                                                                p.13 

 

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GAUTÉRIO, Maria do Carmo. Onde estão os professores sobrecarregados? (retalho da história‐presente). In: CPERS, 14/11/2011.  Disponível em: http://www.cpers.org.br/imp_noticia.php?origem=artigo&acao=imprimir&cd_noticia=448  Acesso em: 30 jul 2013.  

HARGREAVES, Andy. O Ensino como profissão paradoxal. Pátio Revista Pedagógica. Editora Artmed, v.4, n.16, fev/abr 2001, p. 13‐18. 

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