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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS Programa de Pós-Graduação em Comunicação A INTERAÇÃO QUE NÃO TEM PREÇO: o consumidor como co-produtor da mensagem publicitária Isabela Soares Hatem Belo Horizonte 2011

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS

Programa de Pós-Graduação em Comunicação

A INTERAÇÃO QUE NÃO TEM PREÇO:

o consumidor como co-produtor da mensagem publicitá ria

Isabela Soares Hatem

Belo Horizonte

2011

Page 2: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS … · o consumidor como co-produtor da mensagem publicitária Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Comunicação

Isabela Soares Hatem

A INTERAÇÃO QUE NÃO TEM PREÇO:

o consumidor como co-produtor da mensagem publicitá ria

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-

Graduação em Comunicação Social da Pontifícia

Universidade Católica de Minas Gerais como

requisito parcial para a obtenção do título de

Mestre em Comunicação Social.

Orientador: Prof. Dr. Júlio César Machado Pinto

Belo Horizonte

2011

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FICHA CATALOGRÁFICA Elaborada pela Biblioteca da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais

Hatem, Isabela Soares H361i A interação que não tem preço: o consumidor como co-produtor da mensagem

publicitária / Isabela Soares Hatem. Belo Horizonte, 2011. 91f. : il. Orientador: Júlio César Machado Pinto Dissertação (Mestrado) – Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais.

Programa de Pós-Graduação em Comunicação Social. 1. Propaganda. 2. Mídia (Propaganda). 3. Semiótica. 4. MasterCard

International Incorporated. I. Pinto, Júlio César Machado. II. Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Programa de Pós-Graduação em Comunicação Social. III. Título.

CDU: 659.118

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Isabela Soares Hatem

A INTERAÇÃO QUE NÃO TEM PREÇO:

o consumidor como co-produtor da mensagem publicitária

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-

Graduação em Comunicação Social da Pontifícia

Universidade Católica de Minas Gerais como

requisito parcial para a obtenção do título de

Mestre em Comunicação Social.

___________________________________________________________________

Júlio César Machado Pinto (Orientador) – PUC Minas

___________________________________________________________________

Vander Casaqui – ESPM - SP

___________________________________________________________________

Mozahir Salomão Bruck – PUC Minas

Belo Horizonte, 24 de fevereiro de 2011.

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Dedico esta dissertação aos meus pais,

pelo carinho e incentivo.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço a todos que de alguma forma sempre me apóiam e me incentivam a

seguir em frente diante de meus desafios, em especial àqueles que torceram por

meu sucesso no Mestrado.

À Deus por ter me dado a vida, saúde, ter colocado em meu caminho pessoas

incríveis, por ter feito de mim quem sou e por ter sempre facilitado minha caminhada.

Ao meu Anjo da Guarda por me proteger o tempo todo e por ter me livrado de

inúmeras situações ruins, inclusive das quais muitas vezes o perigo não era

aparente.

Aos meus pais, Pedro e Celeste, pelo amor e por terem investido em minha

formação profissional, acadêmica e pessoal, apoiando meus estudos de acordo com

minhas próprias escolhas. Amo vocês!

Aos meus irmãos Rodrigo e Gustavo, com quem sempre aprendi muito, e à

Dani, minha irmã, a primeira pessoa a me incentivar a cursar o Mestrado. Obrigada

por fazer o máximo para que eu não me deixasse abater quando surgiram

dificuldades.

À Cláudia, Raquel e Júnior pelo afeto de irmãos e por estarem sempre

presentes.

A todos os queridos cachorros que já tive, em especial à Priscila e Magali,

pela bondade e proteção 24 horas por dia, e ao Neguinho, companheiro fiel, que me

acompanhou desde criança, dando carinho e amor todos os dias sem pedir nada em

troca. Estarão sempre presentes em lembranças felizes!

Aos meus verdadeiros amigos e amigas com os quais nem sempre existe um

convívio diário, mas que estão continuamente presentes: Joyce, Marina, Nayara,

Magda e Leo. Agradeço ainda, especialmente, minhas amigas: Camilla, Mary, Elisa

e Olga. Obrigada por dividirem comigo as alegrias e me confortarem nos momentos

difíceis. O apoio de vocês é muito importante para mim!

Ao Fred pelo amor, companheirismo e paciência. Obrigada simplesmente por

estar ao meu lado!

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Aos colegas da FEAMIG, com quem trabalho e passo a maior parte dos meus

os dias. Obrigada pelo ótimo ambiente de convivência, por compreenderem minhas

trocas de horário no início do curso e por torcerem pela minha vitória.

Ao Professor José Albino, pelos ensinamentos transmitidos desde a minha

Graduação. Apesar de não ter tido contato com esta dissertação, mostrou-se

sempre disponível e disposto a ajudar nos momentos que precisei.

Aos professores e mestres que tive desde o jardim da infância até o

Mestrado, dos quais muitos me lembro com frequência. Com certeza cada um de

vocês contribuiu para minha formação.

Ao meu orientador, Professor Júlio Pinto, pela dedicação dispensada a mim

durante a realização desta dissertação e pela compreensão durante as orientações,

mesmo nos momentos difíceis nos quais minha vida pessoal esteve à frente da vida

acadêmica. Muito obrigada por tudo!

Aos meus colegas de Mestrado, com quem compartilhei diariamente medos,

incertezas, angústias, mas também com quem dividi grandes momentos de alegria e

cumplicidade. A companhia de vocês me deu forças para prosseguir nessa jornada.

Obrigada e sucesso!

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RESUMO

Esta dissertação propõe uma discussão e análise acerca do conteúdo gerado por

consumidores/receptores, a partir de anúncios da campanha “não tem preço” da

MasterCard, com o objetivo de investigar como e por que o fenômeno de

recirculação supostamente espontânea da mensagem publicitária acontece em

alguns casos e, especificamente, na campanha da MasterCard. Para esse perfil de

receptor que também age como um emissor da mensagem publicitária foi designado

o termo receptor-agente, considerando o receptor de uma forma geral e não

necessariamente um consumidor no sentido estrito, como a ideia do termo

prossumidor. Foram encontrados fatores determinantes mostrando que o receptor-

agente, no caso da MasterCard, faz uso da dedução para criar seus anúncios e

spoofs (espécie de imitação), visto que a campanha apresenta uma estrutura fixa e

fechada. Foram analisadas peças publicitárias da campanha “não tem preço” e

anúncios, ou spoofs, feitos por receptores-agentes reverberando a mesma

campanha. Por não terem sido encontradas pesquisas que abordam a produção

publicitária feita pelo receptor, espera-se que esta dissertação possa contribuir com

o campo da publicidade e com os estudos relacionados à midiatização.

Palavras-chave: MasterCard, não tem preço, receptor-agente, spoof, prossumidor,

midiatização, publicidade, semiótica.

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ABSTRACT

This thesis proposes a discussion and an analysis of the contents produced by

consumers/receptors that takes the MasterCard Priceless advertising campaign as

point of departure. The purpose is to investigate how and why the phenomenon of

the apparently spontaneous recirculation of ads happens in some instances and,

particularly, in the MasterCard campaign. For this type of receptor who also acts as

an emitter of advertisements the term agent-receptor was created, considering the

receptor in a general status e not necessarily only as a consumer, like the ideia of the

term prosumer does. Determining factors were found that demonstrate that agent-

receptors, in the case of MasterCard ads, utilize deduction to create their ads and

spoofs (kind of imitation), insofar as the campaign presents a fixed and closed

structure. Advertisements of MasterCard Priceless campaign were analyzed such as

ads and spoofs created by agent-receptors related to the same campaign. Because

research work on receptor production is scarce, it is expected that this thesis will

contribute some ideas to the fields of advertisement and mediatization-related

studies.

Key-words: MasterCard, priceless, agent-receptor, spoof, prosumer, mediatization,

advertisement, semiotics.

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LISTA DE FIGURAS

FIGURA 1 Anúncio da campanha “não tem preço”....................................................16

FIGURA 2 Anúncio criado por receptor-agente..........................................................16

FIGURA 3 Campanha convidando o consumidor a contar histórias que não têm

preço...........................................................................................................................56

FIGURA 4 Detalhe do formulário contido no anúncio impresso.................................56

FIGURA 5 Imagens retiradas do vídeo “Vestibular”...................................................57

FIGURA 6 Imagens retiradas do vídeo “Urso”...........................................................58

FIGURA 7 Vídeo criado por receptor-agente, postado em 2006...............................61

FIGURA 8 Outro vídeo criado por receptor-agente, postado em 2006......................61

FIGURA 9 Vídeo criado por receptor-agente, postado em fevereiro 2007................62

FIGURA 10 Comunidade criada por usuário do Orkut em 2004................................62

FIGURA 11 Anúncio da campanha “não tem preço”..................................................66

FIGURA 12 Anúncio Impresso da MasterCard de 2000............................................67

FIGURA 13 Anúncio Impresso da MasterCard de 2001............................................67

FIGURA 14 Anúncio Impresso da MasterCard de 2005............................................68

FIGURA 15 Anúncio Impresso da MasterCard de 2005............................................69

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FIGURA 16 Anúncio criado por receptor-agente........................................................71

FIGURA 17 Anúncio criado por receptor-agente........................................................72

FIGURA 18 Anúncio criado por receptor-agente........................................................73

FIGURA 19 Anúncio criado por receptor-agente........................................................73

FIGURA 20 Vídeo criado por receptor-agente, postado em 2007.............................74

FIGURA 21 Toalha bordada remetendo à campanha “não tem preço”.....................75

FIGURA 22 Fragmentos retirados do vídeo “não tem preço”.....................................76

FIGURA 23 Anúncio criado por receptor-agente........................................................78

FIGURA 24 Anúncio criado por receptor-agente........................................................79

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LISTA DE ABREVIATURAS

TV – Televisão

Vc – Você

VT - Vídeo Tape

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO........................................................................................................12

2 MIDIATIZAÇÃO, CONTRATOS E TECNOLOGIA............. ....................................15

3 RECEBER É AGIR................................... ...............................................................36

4 A RESPEITO DE UMA CAMPANHA PUBLICITÁRIA.......... .................................54

4.1 Trajetória da campanha......................... ............................................................54

4.2 Os anúncios.................................... ....................................................................63

4.2.1 Universalidade da Estrutura ...........................................................................63

4.2.2 Variações Temáticas .......................................................................................75

5 CONCLUSÃO........................................ .................................................................81

REFERÊNCIAS.........................................................................................................84

APÊNDICE A......................................... ...................................................................89

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1 INTRODUÇÃO

O objetivo desta dissertação é analisar o fenômeno da participação do público

na produção publicitária de campanhas, especialmente a campanha “não tem preço”

da MasterCard, a fim de se pensar novos processos de subjetivação e de

agenciamento dos consumidores, evidenciando a chamada midiatização.

O fenômeno de participação ativa dos receptores e os desdobramentos dessa

história despertaram o interesse para que esta pesquisa fosse feita. Por isso, esta

dissertação propõe uma discussão e análise acerca da publicidade, em especial do

conteúdo gerado por consumidores/receptores, a partir de anúncios de uma

campanha. A pesquisa visa compreender como e por que o fenômeno de co-

produção e recirculação de uma mensagem publicitária é feita pelo receptor, tendo

como seu objeto empírico a campanha “não tem preço” da MasterCard.

Esta pesquisa espera contribuir com o campo da publicidade e com os

estudos sobre midiatização, por acreditar tratar-se de uma pesquisa que ainda não

foi feita, que é a produção publicitária por parte do receptor, supostamente

espontânea, e envolvendo uma marca real a partir de uma campanha existente.

A dissertação foi estruturada em três capítulos, além da introdução e da

conclusão. O primeiro deles, denominado “Midiatização, contratos e tecnologia”,

apresenta brevemente o objeto deste trabalho, aborda as teorias de midiatização,

com referência nos estudos de Fausto Neto, contratos de leitura de Verón, bem

como os conceitos de analíticas midiáticas, midiatização, nova visibilidade, de

Thompson, bios midiático, de Cabral1, conceitos de semiótica abordados por Júlio

Pinto, à luz dos estudos de Charles Peirce, e outros termos. No capítulo é discutida

também a evolução das ferramentas tecnológicas que provocaram mudanças nas

relações sociais e na relação com a mídia nas últimas décadas.

No segundo capítulo, “Receber é agir”, o significado do termo prosumer é

apresentado e, a partir disso, propõe-se o termo receptor-agente, para designar um

novo receptor que também é produtor de mensagens. São tratadas ainda as teorias

de obra aberta, de Umberto Eco, o dispositivo de Agamben, os conceitos de

inferências (indução, dedução, abdução) de Peirce, o marketing 3.0, proposto por 1 Em algumas obras esse autor é referido como “Muniz Sodré”, porém, a referência utilizada nesta dissertação será “CABRAL”, tal como o currículo Lattes do próprio autor.

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Phillip Kotler, além de outros conceitos fundamentais para a realização desta

dissertação.

No terceiro capítulo, “A respeito de uma campanha publicitária”, foi descrita a

trajetória da campanha “não tem preço” da MasterCard no Brasil. Foi feita também

uma análise de peças publicitárias sob a ótica dos estudos realizados e conceitos

apresentados nos capítulos anteriores.

O método usado para essa pesquisa foi o Estudo de Caso único. De acordo

com Yin (2001), o uso do Estudo de Caso único (ao invés de múltiplo), justifica-se

“se o caso se constituir em um evento raro ou exclusivo ou se servir a um propósito

revelador” (p. 67). Acredita-se que a campanha “não tem preço” da MasterCard se

encaixa nesse perfil.

Tendo em vista atingir os objetivos apresentados, como procedimentos para

coleta de dados foi feita uma pesquisa bibliográfica em livros, artigos, teses,

dissertações, vídeos, sites e documentos diversos. Foi realizada, desde o ano de

2008, uma coleta de materiais como: imagens, vídeos e anúncios criados por

receptores e anúncios da campanha “não tem preço” da MasterCard. Foi feita

também, em dezembro de 2010, uma breve entrevista por e-mail com a profissional

Luciana Sanches, Gerente de Planejamento da agência de publicidade W/McCann,

que atende a conta da MasterCard. A entrevista completa encontra-se no Apêndice

A desta dissertação2.

Foram utilizadas ainda entrevistas realizadas por outros sites com

profissionais envolvidos com a campanha “não tem preço”. Entre essas, destaca-se

a entrevista realizada no evento MaxiMídia, em outubro de 2008, com Amy Fuller,

Diretora de Marketing da MasterCard.

Por fim, foi feita uma análise, tendo como substrato teórico a semiótica.

Foram selecionados anúncios da campanha “não tem preço” da MasterCard e

também anúncios criados por consumidores remetendo à campanha. Esses

anúncios coletados datam desde o ano 2000 ao ano de 2009.

2 É importante frisar a importância da rede social twitter para que a entrevista com a profissional da agência W/McCann fosse realizada. Após um contato sem sucesso pelo e-mail geral da agência, foram feitas tentativas com amigos que pudessem ter conhecidos trabalhando na W/McCann. Esses contatos também não obtiveram resultados positivos. Veio então a ideia de tentar encontrar no twitter pessoas que trabalham na agência. As buscas encontraram vários usuários da rede social que aparentemente trabalham na agência. Foram contatados então, três profissionais de áreas diferentes. Em dois dias, os três publicitários contatados responderam à solicitação por twitter e, depois de algumas trocas de e-mails, se dispuseram a ajudar. Um deles conseguiu o contato direto da Gerente de Planejamento, Luciana Sanches, que concedeu a entrevista por e-mail.

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Algumas imagens não foram analisadas, mas foram inseridas neste trabalho

como exemplos de especificidades de campanha e de suas reverberações.

Foram selecionados e analisados somente anúncios brasileiros, bem como a

trajetória da campanha no Brasil, mas ainda sim, durante as pesquisas bibliográficas

e de material ilustrativo, pode-se observar que na campanha estrangeira, Priceless,

também ocorreu a participação do consumidor na co-criação de anúncios.

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2 MIDIATIZAÇÃO, CONTRATOS E TECNOLOGIA

Em outubro de 1997, a empresa de cartões de crédito e débito MasterCard

lançou uma campanha publicitária com o conceito “Não tem preço” (em inglês,

“Priceless”). Nos anúncios da campanha eram mostradas situações em que os

personagens adquiriam produtos. Juntamente com a imagem dessas mercadorias, o

preço delas era exibido (adquiridos com MasterCard) e logo depois, dentro da

mesma história, uma situação impossível de ser comprada aparecia com a frase

e/ou locução “não tem preço”. Ao fim das propagandas vinha o slogan: “Existem

coisas que o dinheiro não compra. Para todas as outras, existe MasterCard”.

Graças a essas primeiras peças, a MasterCard tornou conhecida a frase “não

tem preço” que quando usada, automaticamente vem com o sentido implícito desse

momento tão especial ou único que é impossível de ser comprado. Segundo a

MasterCard (2009), a campanha já foi veiculada em 98 países e em 46 idiomas.

A partir do lançamento mundial da campanha pessoas começaram a criar

espontaneamente, textos, frases e histórias, sobre suas vidas remetendo ao

conceito abordado pela MasterCard, sempre relacionando bens materiais e seus

preços a situações que, para elas, “não têm preço”, da mesma forma como é feito

nos anúncios.

Alguns anos se passaram e devido à rápida propagação da internet e das

tecnologias, mais pessoas começaram a criar textos, vídeos e imagens usando o

mesmo conceito trabalhado pela campanha publicitária da MasterCard. Esses

materiais eram e são criados em maioria por amadores, que mantinham e mantêm a

identidade dos anúncios da campanha, sendo possível reconhecê-los facilmente. O

site de vídeos YouTube, por exemplo, apresenta hoje em dia aproximadamente

5.070 registros de vídeos com o título “não tem preço”, sendo que muitos deles não

são propagandas da MasterCard, e sim, vídeos criados por usuários da internet.

Na figura 1 é possível ver um exemplo de propaganda da campanha “não tem

preço” da MasterCard. A figura 2 mostra um “anúncio” criado por consumidor, e

disponibilizado na internet, remetendo à campanha.

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Figura 1: Anúncio da campanha “não tem preço”

Fonte: Revista Veja, dezembro de 2000

Figura 2: Anúncio criado por receptor-agente

Fonte: http://www.portalms.com.br/noticias/Persiste ncia-e-a-chave-para-fixar-a-sua-marca-entre-os-consumidores-/Campo-Grande/Economia/21873. html

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É fácil notar quando um anúncio é criado por um consumidor e ao mesmo

tempo reconhecer que ele remete à campanha da MasterCard. No entanto, para que

esse reconhecimento aconteça, é essencial manter de algum modo o enunciado e

uma estrutura de enunciação, ou seja, a “substância”, em sintonia com os anúncios

e outras peças da campanha real da empresa.

Segundo Eco (2007), quando houver uma projeção em escala reduzida, a

substância da expressão (no caso da MasterCard, o conteúdo dos anúncios) muda,

assim como quando uma mesma frase é pronunciada por dois falantes diversos,

gritada ou sussurrada. Essa mudança, porém, não interfere na interpretação dos

signos por um receptor. Eco (2007) exemplifica a importância da substância para

que essa identificação ocorra:

os turistas podem extrair uma experiência estética satisfatória do Davi representado no exterior do Palazzo Vecchio em Florença, mesmo sabendo que o original está em outro lugar. Mas se o Davi fosse reproduzido em bronze dourado, em estanho ou em plástico, mesmo permanecendo no interior do mesmo continuum de matérias tridimensionais de algum modo manipuláveis, a mudança de substância anularia grande parte do efeito estético do original. Isso nos diz que, mesmo em sistemas semióticos não-linguísticos, a mudança de substância torna-se relevante quando se quer obter um efeito estético. (ECO, 2007, p. 280).

No caso da MasterCard, o que talvez explique a manutenção da ideia da

campanha nos anúncios dos receptores é que a enunciação só muda em seus

elementos nominais, ou seja, partes da frase. A estrutura (objeto + preço)

permanece inalterada independente de qual seja o objeto ou o preço. O mesmo

acontece com o slogan final dos anúncios da campanha (a estrutura “algo

importante não tem preço”). A frase “não tem preço”, no entanto, deve permanecer

inalterada.

É por isso que, além de produzirem mensagens semelhantes às peças da

campanha, os consumidores se apropriaram também da frase “não tem preço”, que

foi adaptada para o cotidiano e passou a ser usada em diversas situações, sempre

remetendo à ideia de que algo é tão importante ou único que não há preço a ser

estabelecido. O conceito da campanha acabou se apoiando nesta frase. No site de

relacionamentos orkut é possível encontrar comunidades criadas utilizando a frase e

a ideia da campanha adaptadas em outros contextos, como por exemplo, “Amizade

não tem preço”.

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De acordo com Felinto (2008) há um fenômeno que se manifesta na internet,

chamado spoof. O termo remete originalmente a um jogo, mas algumas de suas

características foram transpostas para a internet e, principalmente para as redes

sociais. O termo spoof, de acordo com Kirkpatrick citado por Felinto (2008), significa

imitação, farsa ou paródia, e seu poder de multiplicação é muito grande. Felinto

(2008) acredita que o spoof presta homenagem ao original, já que se mostra digno

de ser imitado ou parodiado, ao mesmo tempo em que desqualifica, por meio da

imitação ou paródia que faz.

O spoof ainda “estende o qualificativo de ‘criador’ ou ‘artista’ a um público que

antes devia se contentar com apenas o consumo, respeitoso e distanciado, das

grandes obras ‘originais’’ (FELINTO,2008, p.37) .

É possível encontrar muitos episódios de spoofs em campanhas de marcas

diversas. Se digitada hoje em dia no Google (www.google.com) a expressão

“MasterCard spoof”, por exemplo, aproximadamente 168.000 registros serão

encontrados (a maioria em inglês). É previsível que muitos desses registros

encontrados na busca fujam do tema, mas ainda sim, logo nas primeiras páginas do

resultado da pesquisa no site, é possível encontrar outros sites, vídeos e anúncios

feitos por usuários (ou seja, vários spoofs) recirculando a campanha “não tem preço”

da MasterCard.

A empresa percebeu que a participação espontânea dos receptores por meio

do uso do slogan “não tem preço”, principalmente na internet, alcançou uma

repercussão tal, que justificaria assumir parte do “controle” dessa espontaneidade,

incentivando a participação do público. Em abril de 2008, a empresa lançou o hotsite

(minisite) www.naotempreco.com.br juntamente com campanhas de TV e impressa

convidando pessoas a escrever e enviar, por meio do site ou correio, histórias que

para eles “não têm preço”. As melhores histórias viraram comerciais de televisão e

muitos anúncios impressos, online, e de rádio, além de serem sorteados prêmios

semanalmente. Depois dessa campanha, algumas propagandas feitas a partir de

histórias enviadas pelo público foram escolhidas e veiculadas nacionalmente no ano

de 2009. Ao longo de 2009 também e em 2010, a campanha “não tem preço”

original, continuou a ser trabalhada.

De acordo com o site Powerfullbrands (2009), a campanha da MasterCard é

“considerada atualmente o mais bem sucedido esforço de construção de uma marca

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na história da indústria de meios de pagamento, conquistou mais de 100 prêmios

internacionais.”

“O consumidor hoje não quer mais ser simplesmente impactado por uma

propaganda e sim, fazer parte dela. Então, para conquistá-lo, temos que interagir

com ele e levá-lo a enxergar nossa comunicação como entretenimento”, afirma

Cristina Paslar, Diretora de Marketing da MasterCard Brasil. Mesmo que essa

constatação seja impressionista e não comprovada, fica evidente que a MasterCard

percebeu, por meio da publicidade, que houve mudança de comportamento do

consumidor.

“Desta vez, a marca, ao invés de mostrar o que não tem preço, vai perguntar

e querer saber de cada consumidor, o que não tem preço para ele”3, completa

Cristina.

É possível notar que, enquanto em alguns casos essa produção é

espontânea, como as exemplificadas anteriormente, em outros, os receptores são

incentivados pelo próprio anunciante a reproduzir/criar a mensagem (assim como a

própria MasterCard fez em 2008). Outro exemplo acontece em um processo

transmidiático, em que um spot (propaganda de rádio) da campanha do motel Forest

Hills conta uma história e pede que o ouvinte escolha um final para ela no site da

empresa. O título da peça, criada pela agência Lápis Raro, de Belo Horizonte, é

“Elevador” e é o terceiro spot de uma série (os outros eram “Tatuagem” e “Analista”).

Assim como aconteceu com as outras duas peças, o usuário pôde votar em 3

opções de spot com finais diferentes. É relevante ressaltar que na campanha do

motel Forest Hills, situado em Belo Horizonte, o consumidor tem limitações mais

visíveis, já que tem três finais como opção, não podendo livremente criar o seu fim

para a propaganda.

A campanha da LG, ao contrário, encontra um público que dialoga mais

explicitamente com as peças. Em 2008, a LG Eletronics fez uma campanha

publicitária para divulgar os telefones musicais da marca, em que o diferencial era a

qualidade do som que saia do aparelho. Segundo o site Propmark (2008), a

campanha apresentou o conceito “Você espera um som, mas acaba ouvindo mais

do que esperava”. O VT (propaganda exibida em televisão) se inicia com cenas de

um parto, em que o médico e enfermeiros ajudam no nascimento do bebê. Ao 3 A entrevista foi feita pelo Portal Fator Brasil (a fonte completa encontra-se nas referências deste trabalho).

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receber o tradicional “tapinha no bumbum”, ao invés de chorar, o recém-nascido

canta a música “Born to be wild”. A campanha contou com mídias tradicionais e

também esforços de marketing viral, que permitiam aos consumidores interagir

totalmente com as peças publicitárias e ainda gravar a própria voz, com o conteúdo

que quisesse para que o bebê “cantasse”, por meio do hotsite criado para a ocasião

www.bebelg.com.br. Após gravar o som que queria que o bebê emitisse, o

consumidor poderia enviar a mensagem aos amigos, via e-mail.

Outra participação do consumidor na construção da mensagem aconteceu

com o receptor atuando mais do que como produtor, mas também, como

personagem. Segundo o site Brainstorm (2009), em dezembro de 2008 a agência

publicitária “ Wieden+Kennedy” instalou em uma janela em frente à agência, em

Londres, uma “máquina de fazer cartões”. Qualquer pessoa que passasse por lá,

poderia parar em frente à máquina, esperar, e ser fotografado. A imagem ia para o

site da empresa, que encaixava o rosto de cada pessoa em uma das 12 figuras que

o cartão tinha. Para encontrar a foto no site, bastava digitar o dia e horário em que

esteve em frente à “máquina”, e ainda era possível transformá-la em um cartão de

Natal para ser enviado a quem quisesse. Assim, o receptor/produtor, além de

personagem, era também emissor da mensagem.

A produção de conteúdo por parte do receptor pode ser observada ainda em

vários outros tipos de campanhas e produtos. Outro exemplo é a campanha da

empresa McDonald’s, com o slogan “Amo muito tudo isso”. Na internet é possível

encontrar vários registros em blogs, comunidades do orkut e em sites diversos

fazendo referências ao slogan, sempre adaptado ao cotidiano de cada um dos

receptores/produtores desses sites.

As participações citadas, contudo, não apresentam o mesmo nível de

envolvimento e espontaneidade que a campanha da MasterCard. Isso ficará mais

evidente ao longo dos próximos capítulos.

É curioso notar que essa prática apresenta certa regularidade semântica que

pode se assentar na utilização daquilo que, para qualquer pessoa, seria percebido

como uma emoção básica, aceita sem pensar (amor, afeto, respeito, por exemplo).

Essa emoção básica, na semiótica, pode ser chamada de primeirdade.

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De acordo com Pinto (1995), a primeiridade é uma das três categorias da

experiência. Esse nome foi dado por Peirce, que também denominou outras duas

categorias: secundidade e terceiridade.

A primeirdade está relacionada a um aspecto qualitativo e refere-se ao sujeito

(substância). É “a categoria da experiência da sensação não-pensada” (PINTO,

2010, p. 4), é um “pré-sentimento”. (p. 9)

“A abstração pura é pré-reflexiva, mais ou menos como um sentimento.

Assim, a primeiridade é também a categoria da sensação ou do sentimento,

entendidos como pré-reflexivos, isto é, anteriores a uma consciência deles”. (PINTO,

1995, p. 41).

O mesmo autor ainda afirma que, a primeiridade, por ser uma categoria de

estado pré-reflexivo, “foge do nosso alcance, pois, no momento em que ela atinge

nossa consciência, através de reflexão ou conhecimento, ela deixa de ser primeira”.

(PINTO, 1995, p. 42). No caso da emoção, ela seria algo não-elaborado e ingênuo,

não mediado.

A secundidade é a categoria daquilo que se manifesta, que existe. A

primeirdade (a sensação) só faz sentido quando comparada ou referida a uma outra

(um objeto). Ou seja,

enquanto o sentimento não analisado estaria na primeirdade, o registro do sentimento, a atenção a ele, seria um fato na secundidade, porque implica por parte de quem o sente uma resistêncioa análoga à que uma parede oferece ao tato. (PINTO, 1995, p. 48).

Outra categoria da experiência é a terceiridade. Segundo Pinto (1995) seria a

representação, considerando a relação signo, objeto e interpretante. A terceiridade é

a conexão entre a primeirdade e a secundidade.

Sobre a emoção/sensação, ou primeiridade, Cabral (2006) afirma que Hitler

acreditava que as massas têm um caráter feminino, pois nelas o afeto é

predominante em relação à razão. Partindo desse pressuposto, a propaganda

política fazia uso de técnicas de persuasão e controle. Essas técnicas acabaram

sendo aproveitadas pela publicidade. E completa:

Persuadir, emocionar, abrir os canais lacrimais do interlocutor por meio do apelo desabrido à banalidade são recursos centrais da retórica propagandística, aperfeiçoada pela publicidade e pelo marketing de hoje. (...) a mídia não se define como mero instrumento de registro de uma

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realidade, e sim como dispositivo de produção de um certo tipo de realidade, espetacularizada, isto é, primordialmente produzida para a excitação e gozo dos sentidos. (CABRAL, 2006, p. 79).

A mudança gradual que vem acontecendo na sociedade, vis-à-vis sua relação

com a mídia, não muda esse acontecimento do foco no que poderia ser chamado de

razão sensível.

O fenômeno de apropriação de um conteúdo semântico que recircula de outra

maneira, se encaixa em várias das noções de midiatização que estão sendo

discutidas atualmente.

Segundo Fausto Neto (2008), antes, vivia-se na era dos meios, agora, vive-se

uma estrutura regulada pela comunicação midiática. Nessa estrutura, são

organizados e dinamizados processos que reformulam as condições de enunciar a

realidade, porém não mais como um fenômeno representável pela linguagem, mas

que se constitui no próprio agenciamento enunciativo dos novos modelos de

interação. A cultura midiática transforma-se em sujeito dos processos e das

dinâmicas de interação social, tornando-se um complexo aparato, cujas gramáticas,

regras e estratégias geram as inteligibilidades sobre as quais a sociedade estrutura

novas possibilidades de interpretação.

A midiatização resulta da evolução de processos midiáticos que se instauram nas sociedades industriais, tema eleito em reflexões analíticas de autores feitas nas últimas décadas e que chamam atenção para os modos de estruturação e funcionamento dos meios nas dinâmicas sociais e simbólicas (Fausto Neto, 2008, p. 90).

De acordo com o mesmo autor, a convergência de fatores sócio-tecnológicos

disseminados, sobretudo nas três últimas décadas, produziu profundas alterações

na constituição da sociedade, em suas formas de vida e em suas interações. Ocorre

a disseminação de novos protocolos técnicos em toda extensão da organização

social e a intensificação de processos que transformam tecnologias em meios de

produção, circulação e recepção. Os meios já não representam mais apenas a

centralidade na tarefa de organização de processos de interação entre os campos

sociais, mas atravessam e permeiam a constituição e o funcionamento da

sociedade, suas práticas, lógicas e esquemas de codificação. As mídias se colocam

então, como um novo aparelho de leitura e de organização dos sentidos.

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Fausto Neto (2008) no trabalho de interpretar a mídia, por ele chamado de

“analítica midiática”, toma como referência aspectos das transformações do

processo de produção no jornalismo. No caso desta dissertação, será tomada como

referência a Publicidade. Para o autor, a analítica midiática funcionaria de acordo

com quatro aspectos: as transformações da topografia jornalística; a auto-

referencialidade; auto-reflexividade; e a transformação do status do leitor.

As transformações da topografia do jornalismo caracterizam-se por fazer virar

um costume dentro de um jornal ou revista, seções dirigidas aos leitores relatando a

organização e o funcionamento da dinâmica da redação da empresa, ou de outro de

seus ambientes de trabalho. O objetivo dessa prática seria o de aproximar o leitor do

veículo. Os ambientes das redações e suas editorias são evidenciados, às vezes por

meio de imagens para o leitor.

Segundo Fausto Neto (2008), para o jornal, é preciso tornar este processo de

trabalho palpável a fim de que a noção do veículo não se reduza apenas ao ato de

venda e compra. Essas estruturas que exibem os detalhes do nicho produtivo,

expandem-se para a configuração do próprio jornal em seu modo de ser. As

reformas em um projeto gráfico de um jornal, por exemplo, tornam-se reportagem

nele próprio.

Segundo o autor, os relatos chamam também atenção do leitor para os efeitos

deles no próprio contrato de leitura que articula a produção e o consumo da

informação. Poucas empresas exibem os bastidores dos seus processos produtivos

como atualmente faz o jornalismo. A estratégia desses veículos é construir um

vínculo mais duradouro entre produção e recepção, dando visibilidade ao processo

produtivo, cativando ainda mais o leitor.

Fausto Neto (2008) afirma que na auto-referencialidade do processo produtivo

são elaborados discursos que fazem referência ao próprio veículo sobre seu

processo produtivo. Não se trata mais, como nas transformações da topografia

jornalística de falar para o leitor sobre as características de seu processo produtivo.

Mas, de relatar como é feito para que esse processo funcione. Neste contexto é

construído um novo contrato de leitura, pelo qual as mídias tornam-se seu próprio

objeto. Com um novo modelo de se expressarem o meio começa a falar de si

mesmo, privilegiando suas próprias operações, nas quais explicitam-se os

fundamentos dos seus próprios processos interpretativos. Um exemplo pode ser

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visto no site da globo.com4 em um vídeo no qual a jornalista Fátima Bernardes

apresenta como é feito o Jornal nacional, mostrando seus bastidores e rotinas de

trabalho.

O discurso auto-referencial chama atenção para a própria existência do jornal

e de suas rotinas internas. De acordo com Fausto Neto (2008), a ênfase na analítica

midiática não está no que é mostrado, mas nos próprios atos da empresa (jornal ou

revista), e em seus procedimentos desenvolvidos para mostrar o acontecimento,

produzindo assim um discurso de auto-celebração de uma prática do jornalismo

como personagem de si mesmo.

O terceiro aspecto da analítica midiática, a auto-reflexividade, caracteriza-se

por conter reflexões acerca da produção jornalística, que refletem sobre os desafios

e os efeitos de enunciação, chamando atenção para o seu trabalho e seu próprio

processo produtivo. Fausto Neto (2008) traz o exemplo da Revista da Semana, que

em seu primeiro número, em setembro de 2007, explicitou os fundamentos que

orientam o seu projeto editorial:

Você tem em mãos uma revista diferente.(...) Ela é propositadamente fininha. (...) Seus textos são curtos, mas curto, aqui, não quer dizer superficial. O objeto aqui é apresentar a notícia (...) e tudo que significa no menor espaço possível. (...) Notícias na medida do seu tempo (...) Por que a Editora Abril resolveu lançar uma revista noticiosa neste cenário? A resposta é simples: alguém precisa filtrar e organizar este tsunami de informação. (...) Por isso que o slogan da Revista da Semana é ‘É mais informação em menos tempo. Para um novo leitor de uma nova época’. (Revista da Semana apud Fausto Neto, 2008, p. 99).

Outro exemplo citado por Fausto Neto (2008) é o da Revista Pesquisa

Fapesp, na qual a própria editora da publicação reflete sobre os critérios e as

definições de matérias de capa e o processo dos jornalistas na escolha da matéria.

A editora chama atenção ainda para a importância das regras específicas dentro de

um determinado processo produtivo, que orienta a produção de sentido em uma

publicação, e sobre as quais estão o contrato e os efeitos presumidos inicialmente.

Pensando essas estratégias com a lente da publicidade, percebe-se que a

MasterCard também faz uso estratégico da auto-referencialidade e da auto-

reflexividade, que aproximam o receptor da empresa, quando os convida

explicitamente a relatar acontecimentos do cotidiano, com o pretexto de escolher as 4 http://jornalnacional.globo.com/Telejornais/JN/0,,MUL632252-10406,00-OS+BASTIDORES+DO+JORNAL+NACIONAL.html

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melhores histórias e transformá-las em campanha publicitária. Essa aproximação

ocorre também quando, ao término do VT ou ao fim dos impressos, o nome do

receptor autor, da história, é mencionado.

Por último, sendo este talvez um dos aspectos mais relevantes tratados pelo

autor, e que dialoga com esta dissertação, está a transformação do status do leitor

(receptor), na qual ele passa a ter outro papel fundamental na comunicação,

aproximando-se mais do emissor. De acordo com Fausto Neto (2008), as fronteiras

entre os dois pólos se diluem, e os receptores começam a fazer parte da produção.

Essas mudanças reconfiguram as identidades desses atores bem como suas

posições de enunciador e enunciatário. A cultura tanto do jornalismo, quanto da

publicidade e da comunicação de uma forma geral, sofre complexas alterações em

suas rotinas e possibilidades de interação. Os fatores que explicariam tal mudança,

representando um leitor com papel mais central na produção de sentidos, seriam as

possibilidades vindas com a tecnologia, que rearticula as interações entre produtores

e receptores, “na medida em que lógicas, processos, produtos e metodologias de

produção de mensagens passam gradativamente para as mãos dos receptores”

(FAUSTO NETO, 2008, p. 100).

Tais formas de articulação entre produção e recepção estariam reformulando

as lógicas até então existentes, já que antes, a produção era creditada somente à

emissão. Essa mudança pode ser percebida no ambiente jornalístico em sites como,

por exemplo, o www.terra.com.br na sessão “Vc repórter”, na qual o usuário é

convidado a relatar notícias, registrá-las e enviar para o portal. Semelhante a essa

seção, existe o “Vc no G1”, do site www.g1.com.br. Na publicidade, nem sempre

essa participação é tão evidente, mas de fato, acontece, como já foi e será vista ao

longo desta dissertação.

O desenvolvimento de tecnologias da comunicação relacionadas aos

computadores e à internet criou várias situações de interações com características

próprias, assim como a TV criou quando surgiu e quanto começou a fazer

transmissões ao vivo. É importante ressaltar que a interação face-a-face, ou os

outros tipos de interação, não acabaram, mas foram e são complementados e

também alterados pelos novos tipos de interações surgidos com as recentes

tecnologias.

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O desenvolvimento dos meios cria novos campos de ação e interação que envolvem diferentes formas de visualidade e nos quais as relações de poder podem alterar-se rapidamente, dramaticamente e tomando caminhos imprevisíveis. (THOMPSON 2008, p. 20).

Segundo Thompson (2008), o surgimento da internet e outras tecnologias

digitais amplificou o fluxo de conteúdo audiovisual nas redes de comunicação, e

também permitiu que um número maior de usuários produzissem e difundissem esse

tipo de conteúdo.

Para Ferreira (2009) as novas tecnologias tornam-se meios de comunicação,

que operam em meio a processos de interação social, linguagem, técnica e

tecnologia. Complementando o raciocínio, de acordo com Fausto Neto (2008), as

mídias deixaram de ser apenas instrumentos a serviço da organização do processo

de interação dos demais campos, e se transformaram em uma realidade mais

complexa em torno da qual se constituiria uma nova ambiência, novas formas de

vida, e interações sociais cruzadas por novas modalidades na produção de sentido.

As mídias se afetam entre si, mas também a outras práticas sociais, no cerne do seu

próprio funcionamento.

Ferreira (2009) considera a midiatização em três pólos: os dispositivos de

comunicação e midiáticos (que abrangem conceitos específicos, como linguagem);

os processos sociais (que são analisados pela sociologia, antropologia, psicologia,

política, economia, entre outras áreas); e os processos de comunicação (onde há

um frequente processo de re-elaboração de produção social de sentido. Por isso,

esse é o lugar central do problema comunicacional). A midiatização está imbricada

nas relações dos três pólos. No encontro e intervenção dessas três esferas um

determinado pólo atua sobre as relações dos outros dois. Desse modo, as relações

entre processos sociais e processos de comunicação são, cada vez mais,

interferidas pelos processos dos dispositivos midiáticos. O contexto também

representa papel importante neste cenário, e será melhor explicado no próximo

capítulo.

Para Cabral (2002) a midiatização representa uma qualificação específica da

vida, um novo modo de presença do sujeito. Ele define esse fenômeno, então, como

uma nova forma de mediação, um novo bios. Três gêneros de existência, ou seja,

bios, são definidos por Aristóteles: bios theoretikos (vida contemplativa), bios

politikos (vida política) e bios apolaustikos (vida prazerosa, vida do corpo). Partindo-

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se dessa classificação, a midiatização é pensada como tecnologia de sociabilidade

ou um bios midiático, uma espécie de quarto âmbito existencial, onde predomina a

tecnologia virtual.

O filme “O show de Truman” é usado por Cabral (2002, p.27) como exemplo

para evidenciar que a ideia de um quarto bios ou uma nova forma de vida já está

dentro do imaginário das pessoas sob forma de ficções. No filme, o personagem

principal, vivido pelo ator Jim Carrey, mora em uma cidade cenográfica onde todas

as suas ações cotidianas são filmadas ininterruptamente, sem que ele saiba. As

pessoas com as quais ele se relaciona são atores contratados pela emissora de TV,

e essa, por sua vez, transmite ao vivo a vida de Truman a milhares de

telespectadores. A cidade de Truman é uma metáfora do quarto bios, se

assemelhando à sociedade midiatizada.

A mídia é (...) uma velha técnica política de linguagem, apenas potencializada ao modo (...) de uma técnica formadora ou interventora na consciência humana – para requalificar a vida social, desde costumes e atitudes até crenças religiosas, em função da tecnologia e do mercado. (CABRAL, 2002, p. 26)

Essa requalificação de alguma forma influencia na construção da realidade

social, baseando-se na interação e na possibilidade de criação de espaços artificiais

ou virtuais. Ainda de acordo com Cabral (2002, p. 27) pesquisas levam à conclusão

de “que a mídia é estruturadora ou reestruturadora de percepções e cognições,

funcionando como uma espécie de agenda coletiva”. Sintetizando essa ideia, Cabral

(2002, p. 21) afirma que “a sociedade contemporânea rege-se pela midiatização”.

De modo não dessemelhante, Thompson (2008) discorre sobre a ideia de

uma nova visibilidade, que seria elaborada pela mídia, e as novas maneiras de agir

e interagir surgidas com ela. O avanço das mídias modificou as interações sociais

existentes. Essas interações passam pelo face-a-face, em que existe uma co-

presença, ou seja, emissores e receptores compartilham de um mesmo ambiente

espaço-temporal. Existem também as interações mediadas, como uma carta ou uma

conversa ao telefone, por exemplo; ambas ações dependem de um meio para

transmitir a mensagem para indivíduos distante no espaço e/ou no tempo. Em

ambos os casos, os indivíduos partilham de referências simbólicas comuns e no

caso do face-a-face, essa partilha é ainda maior.

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Outro tipo de ação mediada, chamada pelo autor de “quase-interação

mediada” ocorre na produção de materiais como livros, jornal, programas de

televisão, vídeos, filmes, entre outros (anúncios publicitários também se encaixariam

nessa definição). Nesses casos existe a diferença na interação espaço-temporal e

uma escassez de referências simbólicas.

Outras diferenças destacam ainda mais essa forma de interação das outras

mediadas. Primeiramente, o número de receptores visados pelo emissor é

indefinido. Em uma conversa telefônica, exemplifica Thompson (2008), as

mensagens são enviadas a outro indivíduo específico, mas, em um programa de

televisão as mensagens estão disponíveis e são enviadas para qualquer um que

dispuser dos meios culturais e materiais necessários para recebê-las. Em segundo

lugar, essa quase-interação mediada é predominantemente monológica. Enquanto a

interação mediada por uma carta ou uma conversa telefônica é dialógica, a quase-

interação tem seu fluxo comunicativo em grande parte em um só sentido. “O leitor de

um livro ou jornal, ou o telespectador de um programa de TV ou de um filme é

basicamente o receptor de uma forma simbólica cujo emissor não pede (e

normalmente não recebe) uma resposta direta e imediata” (Thompson 2008, p. 18 e

19).

Por ser, portanto, esse tipo de interação aparentemente monológica, a

questão do fenômeno que ocorreu/ocorre com a campanha da MasterCard torna-se

ainda mais relevante, já que em vários momentos, essa “resposta” ao emissor,

ocorre.

Segundo Fausto Neto (2008) na sociedade dos meios, a mídia está a serviço

de uma organização de um processo interacional e sobre o qual teria uma

autonomia relativa, frente à existência dos demais campos. Já na sociedade

midiatizada, a cultura midiática é a referência sobre a qual a estrutura sócio-técnica-

discursiva se estabelece, interferindo em vários níveis da organização e da dinâmica

da sociedade. As mídias abandonam o lugar auxiliar e são recolocadas como uma

referência no modo de ser da sociedade e nas interações entre as instituições e as

pessoas.

Um exemplo prático da influência da mídia na sociedade é citado por Ferreira

(2009). Ele identificou que agentes sociais das instituições de segurança pública

(policiais civis, militares, guardas municipal), sofrem interferência da mídia em seus

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processos técnico-normativos. As normas aprendidas em suas academias são

fragilizadas nas interações com a mídia; e as políticas públicas acabam sendo

reguladas pelo discurso midiático (definição pela mídia de focos de violência, por

exemplo).

Rodrigues (2000), citado por Fausto Neto (2008, p. 90), afirma que na

contemporaneidade “a experiência passa a ser redesenhada pela presença de

tecnologias e seus protocolos comunicacionais, atribuindo ao campo que organiza

tais práticas um certo papel regulatório”. Portanto a vida e dinâmica dos diferentes

campos são atravessadas, ou mediadas, pela tarefa organizadora tecno-simbólica

de novas interações realizadas pelo campo das mídias.

De acordo com Silverstone (2002), a mídia filtra e molda o cotidiano, por meio

de suas representações, fornecendo referências para as pessoas no que diz

respeito à vida diária, produzindo e mantendo, dessa forma, o senso comum. A

mídia fornece palavras e ideias, não de uma maneira destacadamente imposta, mas,

que acaba entrando na realidade das pessoas, que, por sua vez, partilham, dividem

e sustentam os mesmos discursos.

O mesmo autor afirma que é impossível fugir da presença e das

representações da mídia. As pessoas passam a depender da mídia para ter

informação, entretenimento, conforto, segurança e “para ver algum sentido nas

continuidades da experiência e também, de quando em quando, para as

intensidades da experiência” (SILVERSTONE, 2002, p. 12). Vale ressaltar que,

dentro dessa realidade, a internet vem se destacando dos outros meios, ganhando

espaço bastante significativo.

A segunda metade da década de 1990 no Brasil foi marcada pelo início da

propagação da internet.

A Internet se disseminou de modo irreversível no meio doméstico e comercial desde meados da década de 90 do século passado, com a implementação de um modo gráfico que foi, aos poucos, agregando suportes de texto, imagem, áudio e vídeo em qualidade de definição e “tempo real”, além de aplicações em ferramentas e recursos dos mais diversos. (CABRAL FILHO, 2010, p. 1).

Cogo e Brignol (2010) afirmam que a comunicação midiática vive um

momento de transformação rápida, com o desenvolvimento de aparatos tecnológicos

e também com alterações nos usos dos mesmos. Segundo as autoras, os meios não

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apenas estabelecem e fazem circular sentidos, mas, configuram uma ambiência,

redefinindo, desse modo, a experiência das pessoas. Essa nova configuração

implicaria uma reorganização na comunicação, incluindo especialmente a instância

da recepção e a internet.

Nessa época somente os programadores e profissionais da área detinham o

conhecimento técnico. Ao longo dos anos, no entanto, a internet foi se popularizando

e os usuários comuns (amadores), por meio das interfaces criadas, ficaram aptos a

produzir conteúdos para internet por conta própria, sem necessariamente ter

conhecimentos técnicos de programação, por exemplo. Os usuários comuns, que

antes somente recebiam (no sentido de recepção) e contemplavam o “original”,

passam também a ser criadores, como Felinto (2008) afirma. Com os sites como o

YouTube e os blogs, ficou ainda mais simples essa produção de conteúdo.

A expansão da midiatização como um ambiente, com tecnologias elegendo

novas formas de vida, com as interações sendo afetadas e/ou configuradas por

novas estratégias e modos de organização, coloca produtores e consumidores em

uma mesma realidade, aquela de fluxos e de envio/re-envios, que permite conhecer

e reconhecer, ao mesmo tempo. (FAUSTO NETO 2008, p. 93).

A palavra mediatização5 pode ser relacionada com pelo menos dois âmbitos sociais. No primeiro, são tratados processos sociais específicos que passam a se desenvolver (inteira ou parcialmente) segundo lógicas da mídia. Aqui, pode-se falar em mediatização de instâncias da política, do entretenimento, da aprendizagem. Já em um nível macro, trata-se da mediatização da própria sociedade. (BRAGA, 2006, p. 1).

Para o desenvolvimento da mediatização é necessária a

criação de tecnologias para atingir objetivos sociais e interacionais (...). Alguns afazeres específicos dos processos mediáticos derivam de objetos dessa sociedade por definição pré-mediática. (...) podemos observar objetivos como: maior abrangência geográfica e populacional de envolvimento; maior rapidez nas comunicações; maior permanência das mensagens (registro); maior diversidade de captura, objetivação, transformação, transmissão e circulação de tipos de informações e comportamentos – possibilitando usá-los diretamente em interações sociais (v.g. sons, imagens, gestos, ambientes,...); busca de adesão mais direta e mais rápida a proposições dominantes (hegemonia); ampliação de consumo; maior agilidade e rapidez na captação de informações e de comportamentos sociais. (...) a busca de tais objetivos leva a uma crescente

5Nesta dissertação a palavra mediatização é usada intercambiavelmente com midiatização, dependendo dos autores citados.

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tendência no sentido de que as interações sociais se tornem diferidas e difusas, através de desenvolvimento tecnológico. (BRAGA, 2006, p. 6 e 7).

Vaz (1999, p.01) afirma que “há um consenso crescente em nossa cultura de

que as novas tecnologias, (...) estão transformando as experiências de corpo,

pensamento, trabalho, espaço e tempo”. Cabral (2002, p. 26) corrobora essa ideia,

afirmando que “o desenvolvimento dos sistemas e das redes de comunicação

transforma radicalmente a vida do homem contemporâneo, tanto nas relações de

trabalho como nas de sociabilização e lazer”.

A internet, conforme afirma Vaz (2001), rompe com a hierarquia entre

emissores e receptores ao possibilitar que cada pólo possa produzir e distribuir

mensagens. Com a internet, a troca de mensagens se assemelha a um diálogo que

ocorre numa praça ou numa festa. A atividade do consumidor vai além da recepção

da mensagem.

De acordo com Natansohn (2007), o indivíduo pode ter os recursos interativos

necessários para ser, ao mesmo tempo, emissor e receptor. Enquanto a recepção

de televisão é uma produção de sentido, na internet, por exemplo, essa produção

adquire uma materialidade diferencial, o sujeito pode alimentar o circuito

comunicacional através de uma produção mais concreta (enviar mensagens, propor

pautas, comentar e escrever notícias, criar anúncios, entre outros).

Segundo Anderson (2006), com a democratização das ferramentas de

produção as pessoas deixam de ser consumidores e passam a ser produtores

ativos. Algo que era antes reservado apenas para profissionais, chega à mão do

consumidor facilmente. Os blogs amadores, por exemplo, disputam a atenção do

público com a grande mídia.

A principal diferença entre esses amadores e seus colegas profissionais é simplesmente a lacuna cada vez menor nos recursos disponíveis, para que ampliem o escopo de seu trabalho. Quando as ferramentas de trabalho estão ao alcance de todos, todos se transformam em Produtores. (ANDERSON, 2006 p. 71).

Felinto (2008) reconhece que a expansão exponencial da internet favorece a

difusão de materiais como vídeos pessoais, produções independentes, álbuns de

fotografias, entre outros, que se multiplicam na rede. “Flogs, videoblogs e podcasts

se multiplicam no espaço da rede em velocidade vertiginosa” (FELINTO, 2008, p.2).

O site YouTube, por exemplo, dá a “a possibilidade de tornarmo-nos produtores

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culturais (extrapolando, portanto, a posição de meros consumidores a que nos

condenavam as mídias de massa)” (FELINTO, 2008, p. 8).

Santos e Cypriano (2009) afirmam que Criar um blog ou fazer um vídeo e

publicá-lo na internet tornou-se simples; nenhum conhecimento muito específico é

exigido para executá-los.

As tecnologias se dissimulam quase que exatamente na mesma proporção que as dificuldades de utilização diminuem. (...) O serviço de compartilhamento de vídeos recebe qualquer material que envolva imagens em movimento, as interdições de conteúdo sendo muito reduzidas; o autor envia o material de seu próprio computador, mesmo não tendo nenhum conhecimento técnico sobre o processo de envio. (SANTOS e CYPRIANO, 2009, p. 06 e 07).

Ainda segundo Santos e Cypriano (2009), a simplificação no uso da internet

aumentou a participação dos indivíduos, assim como o aumento das velocidades de

navegação da internet e sua proliferação, tornaram mais fáceis os envios e

compartilhamentos de conteúdos cada vez mais ricos, contendo textos, sons, fotos,

vídeos e vários outros tipos de materiais.

Nessa nova ambiência midiatizada, no novo bios, um “quase bordão” como o

da MasterCard (objeto + preço + objeto singular + não tem preço) funciona de certa

forma como uma interatividade programada (clique aqui para...) e, portanto, dado o

seu quase automatismo, é de fácil circulação.

De acordo com Fausto Neto (2008, p. 96), a midiatização instala novas

formas de interação e de práticas de sentido, que “redesenham os vínculos sociais

que passam a se reger por novas formas de contrato”. Algumas dessas novas

formas de interação foram trazidas com o avanço de tecnologias como a Internet, o

que possibilitou a ação de receptores e amadores como produtores de sentido e

conteúdo.

Quando o emissor torna-se produtor, enviando sua mensagem e esta

chegando ao receptor, um pacto, ou, contrato de leitura se estabelece. Para detalhar

o termo contratos de leitura é importante primeiro entender mais alguns outros

conceitos.

Segundo Verón (2004), o termo enunciado está relacionado com o que é dito,

com o conteúdo. Já a enunciação está ligada ao modo (ou aos modos) de dizer. Os

dois conceitos andam juntos, mas é possível, por exemplo, que aconteça do

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conteúdo (enunciado) de duas ou mais frases serem idênticos e, ao mesmo tempo,

o modo de dizê-las variar bastante.

Em um discurso, seja ele escrito, oral, ou de outra natureza, as modalidades

do dizer constroem o que Verón (2004) denomina dispositivo de enunciação. Esse

dispositivo abriga: o enunciador (aquele que fala) e o lugar do qual ele fala; o

destinatário (a quem o discurso é endereçado); e a relação entre o enunciador e

este destinatário, que é proposta no próprio discurso e por meio dele.

Os suportes da imprensa possuem seus dispositivos de enunciação. No caso

da imprensa escrita, Verón (2004) dá a esses dispositivos de enunciação, o nome de

contrato de leitura.

A noção de “contrato” enfatiza as condições de construção do vínculo que une no tempo uma mídia a seus “consumidores”. (...) o objetivo desse contrato é construir e preservar o habitus de consumo. (...) A diferenciação entre os produtos faz-se, então, principalmente no plano do vínculo que a mídia propõe ao receptor. (VERÓN, 2004, p.275 e 276).

Ainda de acordo com Verón (2004), as características de um contrato são o

fato de ser mais ou menos adaptado para o público, transparente ou opaco,

coerente ou incoerente, entre outras. Ao fazer a escolha dessas características, o

veículo propõe um lugar ao receptor. Por isso, um mesmo conteúdo pode ser usado

por diversos meios com abordagens diferentes. Nesse momento, o contrato de

leitura fica mais evidente. Os contratos podem ser de leitura, de audiência ou de

visão, conforme o suporte midiático, e representam o vínculo que a mídia propõe ao

receptor. “É o contrato de leitura que cria o vínculo entre o suporte e seu leitor”

(VERÓN, 2004, p.219).

Fausto Neto (2007) afirma que os contratos são ordenações de regras para

operações, que refletem lógicas de calculabilidade e previsibilidade. Porém, os

contratos não são unidimensionais e os efeitos de sentido se produzem em meio a

muitas relações e se desenvolvem nos complexos ambientes proporcionados pela

midiatização.

Nestas condições, pode-se afirmar que os vínculos entre produção-recepção tendem a aumentar, a se afastar, cada vez mais. E, é por esta razão que a esfera produtiva, visa, através de novas modalidades de “contratos”, transformar por tentativas regulatórias estes “quadro de incompletudes”. (FAUSTO NETO, 2007. p. 8).

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Segundo Natansohn (2005, p. 4), os contratos de leitura são estruturados a

partir da bagagem cultural do receptor, mas também obedecem a “formas de

enunciação que classificam, hierarquizam, quantificam, formulam, ordenam o

discurso dado” estabelecendo relações de poder entre emissores e receptores.

Fausto Neto (2007) afirma ainda que o status do contrato de leitura é o de

organizar a relação emissor-receptor, da perspectiva da interação e da

complementariedade. Os contratos de leitura são ainda

um dispositivo tensional, pois além de levar em conta certas marcas que constituem o mundo cognitivo-cultural-discursivo dos leitores, poderia interpelá-los, desenvolvendo possíveis níveis de cumplicidades, operando como um “guia interpretativo”. (FAUSTO NETO, 2007. p. 9).

Oliveira (2008) nomeia um desses processos como contratos de interação.

Segundo a autora, para ocorrer a inter-relação entre os emissores e receptores é

preciso que antes o destinador da mensagem selecione a quem ele quer atingir para

com esses destinatários, articular sua mensagem. A interação torna o receptor

participante na construção de significados.

A modificação no papel do receptor evidencia que houve uma reformulação

no contrato, onde o receptor passa a ser um co-gestor, de acordo com Fausto Neto

(2008).

Além disso, impulsionados principalmente pelos avanços nos processos e

dispositivos tecnológicos, a organização e funcionamento dos contratos de leitura

sofre alguns impactos. Fausto Neto (2007, p. 15) sugere que esses impactos

incidem no processo de construção de vínculo com os receptores. Surgem então

novas formas de contratos, alguns nos quais o receptor é um co-gestor no processo

produtivo das mensagens.

Esses avanços e essas modificações nos contratos explicitam a aposta no

consumo feito por agentes, e não apenas pacientes do processo publicitário. Existe

um termo que poderia representar esse novo papel do receptor, a palavra prosumer

(prossumidor).

Prosumer é uma contração de duas palavras em inglês, producer (produtor) e

consumer (consumidor). Em português também é usado o termo prossumidor (em

alguns casos encontra-se prosumidor). Por outro lado, se pensar-se o consumidor

em senso estrito, isto é, aquele que efetivamente consome, ele não pode ser

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conceitualmente comparado ao receptor, que é uma noção de escopo bem mais

amplo e que acomoda o consumidor em seu bojo. Uma solução para esse problema

teórico seria considerar o receptor em seu papel duplo de agente e paciente,

hifenizando o termo receptor-agente.

Esse conceito e seus desdobramentos serão detalhados no próximo capítulo.

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3 RECEBER É AGIR

Antes de aprofundar a discussão sobre o receptor-agente, é importante

entender alguns outros fatores que interferem no processo de recepção. O contexto

da sociedade midiatizada e dos desenvolvimentos das tecnologias nas últimas

décadas, já mencionado no capítulo anterior, interfere para que o fenômeno da co-

criação de peças pelo receptor aconteça. Além desses acontecimentos, o contexto

específico de cada sociedade, e mais, o contexto de cada indivíduo também é

essencial, pois influencia na forma pela qual a mensagem será assimilada.

Exemplificando a importância do contexto dentro de cada sociedade, Kotler

(2010) cita uma campanha realizada nos EUA em 1970, quando a Coca-Cola lançou

um anúncio com a música I’d Like to Teach the World to Sing, (Eu gostaria de

ensinar o mundo a cantar). Na época em que o anúncio foi veiculado, a sociedade

americana passava por um momento bem específico, pois “estava dividida quanto

ao apoio à Guerra do Vietnã. Hoje, não seria mais tão relevante, embora as pessoas

não tenham se esquecido da campanha cultural” (Kotler, 2010, p.16). Se fosse feita

hoje em dia, a campanha provavelmente não alcançaria o nível emocional e nem

chamaria tanta atenção quanto na década 70, quando a realidade vivida pelos

americanos era outra.

Por isso, para atingir determinado público, é interessante pensar e analisar o

contexto de cada sociedade antes da elaboração de campanhas publicitárias. De

acordo com Rocha (2006), o marketing e a publicidade se encarregam de usar

códigos culturais compostos tanto de signos de uma cultura global, quanto de uma

cultura local. Kotler (2010) da o nome de marketing cultural a essa função

responsável por abordar preocupações e desejos do cidadão global. Por isso é

recomendado às empresas que se atentem para os acontecimentos comunitários

relacionados a seus negócios. O marketing cultural é um elemento de uma nova

fase, chamada marketing 3.0, que será detalhada mais adiante.

Da mesma forma como em parâmetros mais amplos os contextos são

importantes, os contextos mais específicos de cada indivíduo também são

fundamentais, já que o sentido das mensagens é construído juntamente com o

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receptor. Vários autores afirmam como e porque esse contexto interfere na leitura da

mensagem.

Segundo Pinto (2008, p.1, p.2) “os sentidos se conformam aos contextos”, por

isso, o processo interpretativo deve levar em conta o contexto em que o sentido vai

se produzir, pois, “o sentido é uma direção que a significação pode tomar

dependendo das escolhas que o receptor fizer, dependendo daquilo que o atinge ou

que ele quer atingir”.

Pinto (2008) propõe ainda uma palavra, permediatividade, por ele derivada da

teoria semiótica, que toma como base a instabilidade dos processos comunicativos,

se concentrando nos sentidos, e não nos significados. Significado é um sentido

paralisante, é algo que foi atribuído a um objeto ou a uma situação e ali se

cristalizou. A reprodução do significado mantém o sujeito “no mesmo lugar”. Já o

sentido é flexível e construído a partir de cada relação. A permediatividade considera

que há intenção no pólo emissor das mensagens, mas também nos receptores

dessas mesmas mensagens, já que as pessoas são vítimas e algozes de seus

próprios discursos. Cada indivíduo tem uma bagagem de signos que vai adquirindo

ao longo do tempo. Cada pessoa é constituída por determinados signos, e estes

diferem dos signos trazidos por outras pessoas, mesmo que essas sejam próximas,

como um irmão ou um colega de trabalho, por exemplo.

Segundo Fausto Neto (2008), na sociedade midiatizada, as operações de

sentido passam a ocorrer em situações cada vez mais heterogêneas, e os

receptores trazem consigo a bagagem das experiências cognitivas e culturais

vividas. Além disso, as fronteiras entre produtores e receptores são diluídas, com

estes últimos, se transformando em personagens.

Natansohn (2007, p.8), no mesmo diapasão, afirma que, nas novas mídias “o

receptor é solicitado pelo texto a construir, individualmente seu próprio percurso de

leitura, a partir de uma unidade textual ofertada. A seqüência de leitura é criada

individualmente”.

Segundo as autoras Ferreira e Dias (2004), na organização dos sentidos por

parte do leitor ou receptor, o processo cognitivo que permite a ele atribuir coerência

ao texto dando sua interpretação, se dá em sua relação com o texto. A partir desse

processo, o estabelecimento da relação entre as partes do texto e entre estas e o

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contexto torna-se possível, fazendo do texto uma unidade aberta de sentido. Esse

processo é chamado de processo inferencial, ou inferência.

O significado não está embutido ou inscrito totalmente no texto oral ou escrito. Embora o texto carregue um sentido pretendido pelo autor, ele é polissêmico e, como tal, oferece possibilidades de ser reconstruído a partir do universo de sentidos do receptor, que lhe atribui coerência através de uma negociação de significados·. Esse processo, por sua vez, amplia as chances de compreender e ser compreendido na e pela interação. (FERREIRA; DIAS; 2004, p. 440).

Para Ferreira e Dias (2004), a compreensão da leitura não é norteada apenas

pelos elementos de forma, as marcas gráficas do texto, mas, sobretudo pelo que

estas marcas têm a dizer e como o leitor assimila e interpreta a intenção do autor.

Para as autoras, esta interpretação ocorre no momento da interação leitor/autor,

gerando sentidos que variam de acordo com a subjetividade do leitor, seus

conhecimentos, suas experiências, seus valores, e com a natureza da interação. Na

produção de sentidos de textos, o leitor desempenha papel ativo, e nesse contexto,

as inferências representam um processo cognitivo relevante.

Existem três tipos de inferências: indução, dedução e abdução. De acordo

com Pinto (1995), a dedução e a abdução compartilham de uma regra geral

estabelecida. Enquanto a abdução e a indução arriscam palpites que estão sujeitos

a erro. Pode-se considerar, por isso, segundo Pinto (1995), que a abdução encontra-

se entre as outras duas formas de inferência. No entanto, a dedução e a indução

estão baseadas na experiência, enquanto a abdução apresenta maior possibilidade

de erro pela hipótese lançada.

Pinto (1995) afirma, à luz dos escritos de Peirce, que abdução também pode

ser chamada de hipótese, ou inferência hipotética, e é a responsável pela lógica da

descoberta, já que é por meio dela que teorias e hipóteses são formuladas. “A

inferência hipotética nos capacita a formular uma previsão geral sem que tenhamos

a garantia de um resultado correto” (PINTO, 1995, p 13).

A fertilidade da abdução, de acordo com Peirce, citado por Sebeok (2008),

aumenta, na proporção em que diminui o nível de segurança, ou de proximidade

com o exato. No entanto, mesmo com essa alta possibilidade de erro, a lógica não

pode tomar como base somente a indução e a dedução, já que, segundo Pinto

(1995), a abdução é responsável por descobertas, pois ela se projeta para o futuro

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enquanto os dois outros tipos de inferências se projetam nas experiências já

conhecidas, ou seja, no passado.

Para esclarecer melhor os conceitos de indução dedução e abdução, tanto

Sebeok (2008) quanto Pinto (1995) fazem uso de um exemplo clássico de Peirce,

sobre o saco de feijões, considerando as mesmas três frases.

A dedução seria a combinação das frases na seguinte ordem:

Todos os feijões deste saco são brancos (essa é a regra);

Estes feijões provêm deste saco (esse é o caso);

Estes feijões são brancos (esse é o resultado).

Já a indução, traria as frases nesta ordem:

Estes feijões provêm deste saco (esse é o caso);

Estes feijões são brancos (esse é o resultado);

Todos os feijões deste saco são brancos (essa é a regra).

E a abdução:

Todos os feijões deste saco são brancos (essa é a regra);

Estes feijões são brancos (esse é o resultado);

Estes feijões provêm deste saco (esse é o caso).

A abdução se refere a uma produção mais aberta de interpretantes. Isso seria

típico dos textos mais literários ou poéticos, menos comprometidos com o

espelhamento de alguma realidade. Portanto, a obra mais aberta, geralmente de

teor literário, depende mais da abdução.

Já a dedução, segundo Peirce, citado por Sebeok (2008), depende da

confiança e habilidade de cada um em analisar o significado dos signos nos

pensamentos.

Há suspeitas de que o receptor-agente que produz mensagens a partir dos

anúncios da MarterCard faça uso da dedução. Como visto no capítulo anterior, as

peças da campanha “não tem preço” possuem uma estrutura fixa, cabendo ao

consumidor manter a carcaça da estrutura e “trocar” as palavras e valores que estão

no anúncio por outras que se encaixam nesse esquema. Por isso, por causa dessa

estrutura fechada (do ponto de vista sintático, mas não do léxico), a propaganda da

MasterCard dependeria muito mais da modalidade inferencial da dedução, já que a

regra geral se confirma a cada nova instanciação do anúncio.

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As inferências possibilitam, portanto, de acordo com Ferreira e Dias (2004), a

construção de novos conhecimentos a partir de dados previamente existentes na

memória do interlocutor. Esses conhecimentos prévios são ativados e relacionados

às informações veiculadas pelo texto, favorecendo a mudança e a transformação do

leitor, que modifica o texto construindo-o então, a cada leitura. O texto, portanto, não

traz em si um sentido pré-estabelecido pelo autor, mas indícios para os sentidos

possíveis.

Os conhecimentos prévios, a que se referem as autoras, também podem ser

chamados de “matrizes culturais”.

Entendemos as matrizes culturais como marcas incrustadas na experiência social dos sujeitos, que são ativadas nas interações sociais, embaralham-se com as novas experiências e os novos movimentos. São fazeres na vida do sujeito, sejam estes individuais ou coletivos. Estas matrizes culturais atualizam-se no (des) encontro cultural da interação social – comunicacional e/ou midiatizada – é quando se modificam, desterritorializam-se para reterritorializarem-se. As matrizes culturais se constituem por via das mediações sociais, e, ao mesmo tempo, são elas mesmas mediações para os fazeres sociais e na construção de novas identidades. (MAZZARINO, 2006, p. 5).

O conceito de matrizes culturais é análogo ao conceito de dispositivo, de

acordo com Agamben (2009). O autor relaciona a palavra “dispositivo” ao

pensamento de Foucault, mas situa o termo em um novo contexto.

Segundo Agamben (2009, p. 40), dispositivo é tudo que de algum modo tenha

a capacidade de “capturar, orientar, determinar, interceptar, modelar, controlar e

assegurar os gestos, as condutas, as opiniões e os discursos” dos indivíduos, ou,

como se refere, dos seres viventes. As matrizes culturais são, portanto, um

dispositivo, pois orientam, interceptam, ajudam a capturar, determinar, controlar e

assegurar as interpretações e modelam o sentido que o receptor vai dar ao texto.

Não só locais que têm uma relação mais direta com o poder, como prisões,

manicômios, escolas, mas também são dispositivos canetas, celulares,

computadores, cigarros, e principalmente o que seria o mais antigo dos dispositivos,

a própria linguagem.

De acordo com Agamben (2009), os dispositivos crescem ilimitadamente, ao

mesmo tempo em que processos de subjetivação também estão se proliferando.

Desde quando o homem surgiu havia dispositivos, mas “hoje não haveria um só

instante que na vida dos indivíduos que não seja modelado, contaminado ou

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controlado por algum dispositivo” (AGAMBEN, 2009, p. 42). A estratégia para seguir

o cotidiano então, apesar dessas disseminações, não é tentar eliminar os

dispositivos ou de usá-los de forma “correta”. Esse mesmo autor afirma que a

estratégia é usá-los para capturar e subjetivar o que se encontra na própria raiz

desses dispositivos, um forte desejo humano de felicidade, e depois liberar o que foi

capturado e separado para disponibilizá-los novamente a um uso comum.

Duas classes são estabelecidas por Agamben (2009): os seres viventes (as

substâncias) e os dispositivos. O que resulta da relação entre esses dois pólos é o

que ele chama de sujeito. Um mesmo indivíduo (ser vivente), por exemplo, pode

apresentar múltiplos processos de subjetivação: ser um navegador da internet,

usuário de telefones celulares, apaixonado por certo tipo de música, entre outras

subjetivações. Portanto, na produção de sentidos, a interpretação e a subjetivação

são produzidas na articulação entre o indivíduo (ser vivente) e suas matrizes

culturais (o dispositivo).

Rocha (2006) afirma que as escolhas de cada pessoa em comprar ou gostar

de determinadas grifes, lojas, marcas e estilos, são relações sociais e não estão

exatamente ligadas a necessidades ou instintos. O consumo é, portanto, “um

sistema simbólico que articula coisas e seres humanos” (p. 86), de certa forma,

ecoando o pensamento de Agamben (2009). Por meio desse consumo, a cultura

expressa suas identidades, estilos de vida, ideias. O autor afirma, além disso, que

códigos culturais (termo também análogo ao conceito de matrizes culturais e

dispositivo) são veiculados pelos meios de comunicação de massa, fazendo com

que os produtos sejam socializados para o consumo.

Ainda segundo Rocha (2006), para o consumo ocorrer, é preciso significado.

E ele demonstra isso com um exemplo pessoal, devidamente relativizado,

permitindo o estranhamento.O autor relata uma situação ocorrida há 40 anos na

Bolívia quando um grupo de amigos, interessados em conhecer uma feira local,

acabou por não praticar o consumo, sendo que todas as condições primárias

necessárias para tal existiam (produtos, vendedores, lojas, dinheiro, possíveis

compradores). Uma das lojas chamou atenção pela diversidade de cores e

materiais; eram muitos potes com líquidos de cores diferentes, vários tipos de pó, e

ainda outros materiais como pêlos e ervas. Apesar da vontade inicial dos visitantes,

durante todo o dia, nenhuma compra havia sido feita. O que faltava era significado.

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Faltava um código ou um sistema simbólico que atribuísse aos objetos as razões

pelas quais adquiri-los, bem como uma classificação que oferecesse sentido aos

produtos. Mais ainda, faltava a mídia (e a propaganda) para colocar os produtos na

forma de objetos de desejo e dotados de alguma utilidade. Havia também a carência

de um código cultural comum.

O autor questiona o que seria dos produtos de um supermercado se eles

fossem todos acondicionados em sacos plásticos iguais, sem qualquer identificação

de nome ou rótulo. Como adquirir um produto nesse local com a certeza de não

estar levando uma farinha de trigo ao invés de um fermento em pó ou outro produto

com aparência semelhante?

O uso da publicidade e propaganda e de seus rótulos, etiquetas, jingles,

slogans é que realiza esse trabalho de dar significado e humanizar produtos e

serviços, classificando-os para o consumo.

Corroborando essa ideia e adicionando à noção de produto também os

produtos culturais, aqueles que circulam pela mídia e entre eles a publicidade,

Flausino (2002) afirma que:

tomada como instituição de produção discursiva, a mídia existe no simbólico e constrói uma estratégia de mercado que se insere num dado imaginário que ela (mídia) dinamiza. Para que haja consumo dos produtos culturais que cria e veicula, é preciso pensá-los dentro dessa rede (FLAUSINO, 2002, p. 11).

Esses podem ser alguns dos fatores pelos quais o “consumo” da propaganda

da MasterCard e o consumo dos produtos que são exibidos nas campanhas

ganharam visibilidade e despertam interesse de muitos espectadores e receptores.

A campanha “Não tem preço” oferece a cada um dos produtos um significado e

humaniza os serviços e produtos apresentados. Sejam eles os produtos possíveis

de serem adquiridos com o cartão de crédito (produtos e serviços diversos) ou os

impossíveis (situações que não têm preço). Os consumidores também se identificam

com os casos evidenciados na campanha, compartilhando de códigos culturais

semelhantes, por isso o significado dado às situações é ainda mais importante.

Jacks e Piedras (2005, p. 203) afirmam que o discurso publicitário vinculado

às forças sociais que o condicionam e contextualizam é essencial para analisar “as

ambiguidades e contradições que permeiam a relação dos sujeitos, em suas práticas

sócio-culturais, com esses textos”.

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Verón (2004) destaca que uma mensagem nunca gera automaticamente um

efeito, e que os discursos traçam um campo de efeitos de sentido e não um e único

efeito. Isso seria, em semiótica Peirceana, o que o conceito de interpretante imediato

cobriria: a cada momento da semiose, produção de sentidos, o signo ostenta um

campo de possibilidades interpretativas, de dentro do qual o receptor/intérprete retira

o interpretante dinâmico, isto é, aquele que vai dar curso à semiose.

Portanto, de acordo com Verón (2004), um tipo de discurso pode ser “lido” de

diversas formas, pois há sempre várias gramáticas de reconhecimento, esquemas

de leituras e de interpretação diferentes.

Os indivíduos, de acordo com França (2006), possuem estruturas

psicológicas complexas, deste modo, recebem e reagem de forma diferente aos

estímulos recebidos.

o indivíduo não é um átomo, e só existe porque tem um papel numa ambiência de comunhão, que estimula as potencialidades de seu ser; é um ser heterogêneo que existe graças ao outro e aos recursos que seu ambiente social lhe proporciona. (FRANÇA, 2006. p.74).

Segundo França (2006), variáveis sócio-econômicas e culturais podem

interferir nos indivíduos: “inseridos em contextos e grupos específicos, eles reagem

dentro de padrões estabelecidos por seu meio” (FRANÇA, 2006, p. 64). É por isso

que, como dito no início deste capítulo, os contextos onde se encaixam os indivíduos

são importantes e podem interferir na recepção da mensagem.

Ainda de acordo com França (2006), estudos dos últimos anos trazem uma

nova perspectiva de se olhar para a recepção, os chamados estudos da recepção.

Ligados nos estudos culturais, com enfoque nas mediações culturais, os estudos de

recepção expõem a inclusão dos sujeitos nas redes sociais, identificando

receptores/usuários que promovem usos específicos e adequados à sua realidade

dos produtos consumidos, afrontando e driblando muitas vezes os propósitos do

emissor.

Em uma certa perspectiva sobre as teorias semióticas e da linguagem, França

(2006) afirma que, nelas, o produtor de discursos, também chamado de narrador,

enunciador, locutor, constrói a mensagem (ou narrativa), que abrange elementos

diversos, orientando a interpretação e a produção de sentidos. Ele é que fala, produz

o enunciado e, por isso, é sempre visto como agente, ser de intencionalidade. O

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receptor, segundo a autora, às vezes ainda é visto como indivíduo de ação mais

modestamente, embora, nos estudos mais recentes, ele também seja considerado

sujeito, ser de escolha e agente, já que reconhece e aplica o código do emissor, e

outros códigos, interpretando-os, selecionando-os, se apropriando dos mesmos,

fazendo dessa forma, outra produção a partir da leitura feita da mensagem.

França (2006) prossegue dizendo que o sujeito da comunicação, ao mesmo

tempo em que é enunciador, é também leitor. E mais, é um sujeito social. Por isso,

ser sujeito da comunicação ou em comunicação implica um sujeito envolvido em

uma teia de relações. Segundo a autora, são essas relações com o outro, com a

linguagem e com o simbólico, que constituem o sujeito. Eles são, por sua vez,

interlocutores, que dialogam entre si, pelos laços discursivos que os une.

Os sujeitos “são constituídos na relação e pela presença do outro, a partir da

capacidade de construção de gestos significantes e de projeção dos movimentos e

expectativas recíprocas” (FRANÇA, 2006, p. 78).

Indo ao encontro dessas ideias, Flausino (2002) afirma que o sentido é

construído socialmente, em coletividade, e a mídia participa da construção de

sentidos a partir dos quais se cria e com que se lida no cotidiano.

Spink e Medrado, citados por Flausino (2002), nomeiam as matrizes culturais,

que são fundamentais na construção do sentido, como “repertórios interpretativos”.

Esses repertórios servem de suporte e referência para se entender a construção dos

sentidos que dão significado ao mundo.

Os repertórios interpretativos são, em linhas gerais, as unidades de construção das práticas discursivas – o conjunto de termos, descrições, lugares-comuns e figuras de linguagem – que demarcam o rol de possibilidades de construções discursivas, tendo por parâmetros em que essas práticas são produzidas e os estilos gramaticais específicos ou speech genres. (SPINK e MEDRADO apud FLAUSINO, 2002, p. 2.)

Um enunciado pode mudar de significado se for falado por duas pessoas

diferentes, cada uma com contextos específicos. E esse significado muda também,

dependendo de quem recebe a mensagem. Segundo a autora, é preciso perceber

as articulações estabelecidas entre os discursos, as condições históricas (contextos)

e o emissor e o lugar social de onde ele fala. “Definido por diferentes eixos, inclusive

pela classe à qual pertence o emissor, esse lugar social é carregado de ideologia,

assim como o lugar ocupado pela audiência” (FLAUSINO, 2002, p. 9).

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A leitura é, portanto “um processo inferencial e cognitivo, ativado a partir da

relação entre leitor, texto e contexto” (FERREIRA e DIAS, 2004, p. 447).

Graesser e Zwaan, citados por Ferreira e Dias (2004), afirmam que muitas

inferências construídas na compreensão de textos narrativos são inferências de

conhecimento-base, em que durante a compreensão, são ativadas na memória de

longo prazo conhecimentos gerais e específicos. Os conhecimentos gerais são

mensagens automáticas e dizem respeito a conjuntos genéricos de conhecimento de

mundo como, por exemplo, estereótipos, o que facilita a compreensão de situações

existentes no texto que não são completamente descritas, já que o outro supõe que

sua audiência tem esse conhecimento genérico para preencher as possíveis

lacunas. Já as estruturas de conhecimento específico não são automáticas e dizem

respeito às experiências ou leituras individuais. Portanto, enquanto as estruturas de

conhecimento gerais são acionadas instantanea e inconscientemente na memória,

as mais específicas exigem mais tempo para serem acessadas e utilizadas, sendo,

portanto, um processo de busca consciente e seletiva.

É possível comparar os conhecimentos gerais, essas mensagens automáticas

que vêm à mente do receptor com a dedução. O leitor faz uso de uma regra geral

que seriam conjuntos genéricos, como os estereótipos, baseados em experiências

consolidadas no passado para fazer sua dedução. Usando esse tipo de inferência os

receptores interpretariam o texto como esperado.

Por sua vez, os conhecimentos específicos, que se referem a cada indivíduo,

seriam da ordem da abdução. Esse tipo de inferência não tem uma amarra tão forte

com o passado e nem comprometimento com os estereótipos. A abdução faz uso de

hipóteses e, portanto, a chance de interpretar o texto, exatamente com a mesma

ideia do autor que o escreveu, é menor. Ao mesmo tempo, a possibilidade de criar

outras possíveis interpretações para o texto, também aumenta.

Segundo Graesser e Zwaan, citados por Ferreira e Dias (2004), essa busca

na memória pode ser entendida como uma investigação aos significados já

existentes e presentes na mente de cada indivíduo. A partir dessa verificação e com

a relação dos vários significados com a mensagem, o sentido é construído.

Mais uma vez fica clara a semelhança do que os autores denominam de

conhecimentos gerais e específicos com os conceitos de matrizes culturais,

dispositivos, códigos culturais, repertórios interpretativos, entre outros. Vale ressaltar

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que em todos os termos, o que prevalece é a ideia de que os receptores constroem

o sentido a partir de significados diversos e outros sentidos que já possuem dentro

de si, de acordo com a cultura da sociedade, o contexto vivenciado e as

experiências que cada um possui.

Utilizando esses conceitos e retomando o termo receptor-agente, é possível

fazer uma analogia com o sujeito semiótico. Assim como o receptor-agente, o sujeito

da semiose também passa pelo processo de receber uma mensagem e, a partir dela

produzir outra. O sujeito da semiose depara-se com signos e aciona os

conhecimentos que tem para interpretá-los e decifrá-los. Ou seja, é um receptor-

agente por natureza.

Esses conhecimentos, dispositivos ou matrizes culturais que o sujeito

percorre, podem ser chamados também de repertório. O sujeito da produção de

sentidos percorre o seu repertório de signos para saber qual sentido vai dar a

determinada mensagem. Vale ressaltar que “um signo, ou representâmen, é algo

que está no lugar de algo para alguém, em algum aspecto ou capacidade (...).”

(Peirce citado por Pinto, 1996, p.88).

Os signos, no entanto, só são considerados como tal se de fato fizerem seu

papel de signo. Peirce afirma “Of course, nothing is a sign unless it is interpreted as

a sign6.” (Peirce apud Andrade, 2008, p. 91).

Após acionado esse repertório de signos pelo sujeito, a interpretação

acontece. Em semiótica pode-se chamar essa interpretação de experiência colateral.

De acordo com Peirce, citado pelo site Jornalismo e Linguagem (2006):

Para que um signo possa ser interpretado, isto é, para que o representamen possa ser um signo, é necessário que seu intérprete tenha um conhecimento colateral do objeto (ou dos objetos) do signo. Este conhecimento é resultado da experiência, o que corresponde a um estado cognitivo resultante, em última análise, da percepção. (Peirce, MS 675).

Peirce, citado por Andrade, ainda afirma que:

Por observação colateral não quero dizer familiaridade com o sistema de signos. O que é assim obtido não é COLATERAL. É, pelo contrário, o pré-requisito para se obter qualquer idéia significada pelo signo. Mas, por observação colateral entendo uma prévia familiaridade com aquilo que o signo denota. Assim se o signo for uma sentença “Hamlet era louco”, para compreender o que isso significa deve-se saber que, às vezes, os homens

6 “Claro, nada é um signo a não ser que seja interpretado como um signo” (tradução nossa).

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ficam nesse estado estranho; deve-se ter visto homens loucos ou deve-se ter lido sobre eles; e será melhor se se souber especificamente (e não houver necessidade de se presumir) qual era a noção que Shakespeare tinha de sanidade. Tudo isto é observação colateral e não faz parte do interpretante. (PEIRCE apud ANDRADE, 2008, p. 99).

A experiência colateral, portanto, fornece um conhecimento prévio sobre

determinado objeto. De acordo com o site Jornalismo e Linguagem (2006) estes

elementos fornecidos pela experiência colateral permitem uma “economia” do uso de

signos, otimizando o processo comunicativo. Essa economia de signos seria a

ausência da necessidade de repetir vários signos, partindo do pressuposto de que o

intérprete possui uma experiência colateral sobre o objeto do signo, ou seja, possui

informações prévias sobre o assunto tratado.

Na publicidade, e no caso específico da campanha objeto dessa dissertação,

a “economia” de signos também ocorre. Quando o receptor-agente cria seu anúncio

ou usa uma frase com o conceito não tem preço, mesmo que somente a frase “não

tem preço” seja usada, ela já remete aos anúncios da MasterCard e implicitamente

ao conceito que a campanha transmite. Portanto, não é necessário que nos

anúncios criados pelos receptores-agentes e até pela própria MasterCard constem

todos os signos ou todo o esquema da campanha inicial (objeto + preço + objeto

singular + não tem preço), pois os receptores possuem uma experiência colateral

sobre a campanha. Essa economia de fato ocorre tanto nos anúncios de amadores

quanto da campanha MasterCard, e será evidenciada no próximo capítulo.

As autoras Ferreira e Dias (2004, p. 440) também afirmam que:

o ser humano tem o ímpeto de atribuir sentidos às coisas do mundo e (...) a ausência de relações de significado entre estas coisas o perturba. A mente humana necessita organizar as vivências e experiências de modo significativo e articulado, buscando relações até mesmo entre acontecimentos que não revelam ligações ou correspondências evidentes entre si.

Segundo Ferreira e Dias (2004), o leitor tem liberdade de construir sentidos,

mas é limitado por significados já intrínsecos à mensagem. O texto é gerado a partir

dos significados atribuídos pelo emissor em interação com seu mundo de

significação, e depois é recontextualizado pelo receptor quando ele atribui

significados intrínsecos à vida dele juntamente às possibilidades de formar novos

significados delimitadas pelo texto. Assim acontece quando o emissor tem acesso a

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uma campanha publicitária e a partir dos significados já trazidos por ela ele produz

sentidos por meio de uma resposta ou de uma “edição” a essa campanha.

“Descobre-se que os indivíduos na relação com a mídia, trazem os

condicionamentos de suas outras interseções, e que estas inserções atuam no

indivíduo” (FRANÇA, 2006, p.70).

As mudanças no comportamento do produtor e do consumidor também são

previstas pelo marketing. Falando de um ponto de vista centrado na empiria, Kotler

(2010) contribui com este tema ao afirmar que o mundo está passando por várias

mudanças rápidas e avassaladoras, principalmente do ponto de vista das

tecnologias, onde há uma transformação do mundo mecânico para o mundo digital

(que engloba os celulares, os computadores, a internet e as redes sociais),

impactando o comportamento tanto de produtores quanto de consumidores. Essas

mudanças representam desafios que fazem com que o marketing seja repensado.

Em uma breve retomada, Kotler (2010) explica os conceitos de marketing 1.0

e 2.0. Na primeira fase (1.0) o marketing focava-se em como efetuar a venda. Na

segunda fase (2.0) o relacionamento era o ponto principal para se pensar como o

consumidor poderia voltar e comprar mais. O autor propõe então, o conceito de

marketing 3.0, onde os consumidores são convidados a participar do

desenvolvimento de produtos e da comunicação da empresa. Nessa terceira fase,

as empresas mudam seu foco, que antes era nos produtos, para os consumidores e

principalmente o ser humano.

Essa alteração de foco ocorreu devido aos avanços tecnológicos do século

XX, que provocaram mudanças nos consumidores, nos mercados e no marketing.

Além do marketing cultural, já mencionado no início deste capítulo, outro elemento

básico propulsionado pela tecnologia, e que também caracteriza o marketing 3.0, é a

ascensão da sociedade criativa e do chamado marketing do espírito humano, ou

marketing espiritual. Os usuários inovam criando e fazendo uso das novas

tecnologias e conceitos e criam conexões entre os próprios consumidores. São

formadores de opiniões, participam do ambiente colaborativo e criticam marcas que

tem impactos negativos na vida das pessoas. Por isso, segundo Kotler (2010),

fazendo referência ao roterista Robert McKee, uma das formas mais eficazes de se

conseguir convencer o consumidor é mostrando histórias que envolvam emoção.

Pode-se notar que justamente a emoção é um elemento-chave presente na

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campanha “não tem preço” da MasterCard, conforme visto rapidamente no capítulo

anterior (os anúncios da campanha serão analisados detalhadamente no próximo

capítulo).

O termo marketing do espírito humano se deve pelo fato de que o lucro das

empresas resultaria da valorização das mesmas pelos consumidores, devido às

suas contribuições para o bem-estar humano. No marketing 3.0 as práticas do

marketing são bastante influenciadas pelas mudanças no comportamento e nas

atitudes do consumidor.

Atualmente, “as pessoas criam e consomem notícias, ideias e entretenimento.

A nova onda de tecnologia transforma as pessoas de consumidores em

prossumidores.” (KOTLER, 2010, p. 7) Os prossumidores, ou, como proposto aqui,

os receptores-agentes, por meio da tecnologia, têm o poder de se expressarem e

colaborarem entre si. E à medida que as mídias sociais (tais como orkut, twitter,

facebook, entre outras) forem se tornando mais expressivas, os consumidores terão

o poder, maior ainda, de influenciar outros consumidores com suas ideias e

experiências. “As pessoas também estão criando videoclipes de curta duração e

colocando-os no You Tube para que o mundo os veja” (p. 9).

Hoje em dia, os profissionais de marketing estão concorrendo com os próprios

receptores-agentes, que muitas vezes (ou na maioria delas) são amadores.

Ainda segundo Kotler (2010), a colaboração começa quando os gerentes de

marketing buscam compreender o consumidor mais a fundo, para entender o que

passa em suas mente, e acabam captando insights, ideias importantes, do mercado.

Outro tipo de colaboração, mais avançada, acontece quando os consumidores

participam em uma co-criação de produtos e serviços. A campanha da MasterCard

que convidou os consumidores diretamente a colaborar na elaboração das peças

publicitárias enviando histórias, evidencia essa co-criação.

Uma rede de pesquisas de tendências, a Trendwatching, sintetizou o que leva

os consumidores a participar na co-criação juntamente com o anunciante. Alguns

consumidores gostam de mostrar suas habilidades para que outras pessoas vejam.

Outros querem adequar um produto ou serviço a seu estilo de vida e “existem

também aqueles que encaram a co-criação como mera diversão” (Kotler, 2010, p.

11). “Além de ajudar as empresas a desenvolver produtos, os consumidores também

podem contribuir com ideias para anúncios” (Kotler, 2010, p. 12). O autor cita o caso

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do anúncio Free Doritos, nos Estados Unidos. O anúncio, criado por um receptor-

agente, foi o escolhido para ser veiculado durante o Super Bowl (campeonato de

futebol americano) dentre vários outros anúncios, inclusive realizados por agências

de publicidade. Kotler (2010) afirma que essa vitória prova que o conteúdo gerado

pelo consumidor muitas vezes promove uma identificação maior com os

consumidores, por ser mais relevante e acessível.

Kotler (2010) evidencia o aumento na participação e colaboração e afirma

que, à frente do marketing cultural e do marketing espiritual, o marketing

colaborativo é o elemento básico da terceira fase do marketing.

A palavra colaboração é um termo que remete ao conceito de web 2.0. No

ambiente da web 2.0 os usuários podem se transformar em produtores auxiliando

outros usuários em fóruns, softwares e comunidades abertas à colaboração, como o

site Wikipédia, por exemplo, uma enciclopédia virtual cujo conteúdo é editado pelos

próprios usuários. A web colaborativa tem justamente essa característica dos

usuários, de querer colaborar, ajudar. Podem se encaixar também no conceito de

colaboração as situações em que o leitor é convidado a ser “jornalista por um dia”,

ajudando os veículos a divulgar certas notícias, conforme exemplos mostrados no

capítulo anterior.

No caso desta dissertação, a participação do consumidor não é abordada

nessa perspectiva da colaboração, dentro do conceito de web 2.0. O enfoque é no

receptor-agente especificamente dentro da publicidade e que produz uma

mensagem publicitária, ou reproduz a ideia da mensagem fora do ambiente de

colaboração. Sua intenção não é participar desse ambiente colaborativo, mas sim,

de adaptar e retransmitir a mensagem do anúncio. Mesmo que o receptor seja

diretamente convidado a participar na produção de campanhas publicitárias, a

finalidade da participação dele é muito mais aparecer e se mostrar do que colaborar.

Cogo e Brignol (2010) afirmam que o papel ocupado pelas redes na

organização das relações sociais traz conseqüências para a própria configuração e

usos das mídias, principalmente para a internet. A principal dessas implicações é a

mudança da lógica de transmissão das informações, que antes era feita de forma

massiva e generalizada de um pequeno grupo produtor para um coletivo

indiscriminado, e que agora vive a possibilidade de produção de informações e

estabelecimento de comunicação de uma forma mais descentralizada.

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Os meios de comunicação anteriores continuam existindo, mas a internet e

seus desdobramentos vieram para complementar a oferta midiática. Segundo Cogo

e Brignol (2010), é possível encontrar na própria internet o modelo de comunicação

massiva. Porém, esse modelo é fortemente impactado por uma comunicação em

que os públicos têm participação na produção da informação e maior autonomia do

processo comunicativo.

Um dos outros impactos que atinge o processo comunicacional recente, de

acordo com as autoras, é a interatividade. Com a mudança na relação entre usuário-

computador, e produtores e receptores, várias possibilidades de interação foram

desenvolvidas nos meios de comunicação. É na internet que ela adquire força e

passa a ser prática constante. No entanto, as autoras atentam para o fato de que

nas outras mídias, as possibilidades de interação entre os pólos não devem ser

ignoradas.

Ainda de acordo com Cogo e Brignol (2010), a interatividade é maior no

ciberespaço pela possibilidade mais concreta de aproximação entre a produção e a

recepção.

Se por parte dos receptores as matrizes culturais, o contexto no qual a

sociedade está imbricada e os impactos dos avanços tecnológicos influenciam na

leitura da mensagem, por outro lado, a mensagem em si também apresenta fatores

que interferem e até facilitam com que o receptor transforme-se em produtor,

exercendo um papel de prossumidor, e mais ainda de receptor-agente.

Subsumindo toda a discussão da semiose no trânsito da obra entre a

produção e sua recepção tal como discutido anteriormente neste capítulo, Eco

(1991) afirma que a obra de arte é uma mensagem essencialmente ambígua,

possuindo uma pluralidade de significados que convivem em um só significante. E

essa ambiguidade acaba por ser - nas poéticas contemporâneas - uma das

finalidades explícitas da obra. É importante ressaltar que entende-se por "obra" o

objeto dotado de propriedades estruturais definidas que permite, mas de forma

coordenada, o revezamento de interpretações e o deslocar-se de perspectivas. Essa

noção representa um modelo hipotético que o autor dá o nome de “obra aberta”.

Cada obra é modificada pela intervenção ativa do consumidor, com certos limites,

sem, contudo deixar de ser obra e sem deixar de ser ela mesma. Vale ressaltar que

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nesta dissertação o conceito de “obra” será usado dentro da publicidade, aplicando a

teoria da “obra aberta” nas campanhas publicitárias.

Eco (1991) faz um comparativo entre obras fechadas e abertas. A obra

musical clássica como a Aída, ou Le Sacre du Printemps, tinha as realidades

sonoras organizadas pelo autor de forma definida, delimitada e acabada, e assim

era oferecida ao ouvinte; ou então era transcrita de modo a guiar o executante a

reproduzir substancialmente a forma criada pelo compositor. Já as novas obras

musicais não consistem em mensagens acabadas e definidas, mas, na possibilidade

de várias organizações que ficam a cargo do intérprete, apresentando-se, portanto,

não como obras concluídas, que pedem para ser compreendidas em uma direção

estrutural determinada, mas como obras “abertas”, que serão finalizadas pelo

receptor no momento em que ele as fruir esteticamente, sentir a obra.

Algumas obras são ainda abertas em um sentido muito mais palpável, são

obras inacabadas, como se o autor não tivesse interesse em finalizá-las e

entregasse essa função ao intérprete, como se desse os pedaços de um brinquedo

para ele montá-lo. O artista, muitas vezes, em lugar de sujeitar-se à abertura da obra

como fator inevitável, já propõe a obra visando promover a maior abertura possível.

E completa:

a definição de “aberta” dada a estas obras, ainda que sirva magistralmente para delinear uma nova dialética entre obra e intérprete, deve ser tomada aqui como apoio numa convenção que nos permita fazer abstração de outros significados possíveis e legítimos da mesma expressão. (...) uma obra de arte é o objeto produzido por um autor que organiza uma sessão de efeitos comunicativos de modo que cada possível fruidor possa recompreender (através do jogo de respostas à configuração de efeitos sentido como estímulo pela sensibilidade e pela inteligência) a mencionada obra, a forma originária imaginada pelo autor. Neste sentido, o autor produz uma forma acabada em si, desejando que a forma em questão seja compreendida e fruída tal como ele a produziu; todavia, no ato de reação à teia dos estímulos e de compreensão de suas relações, cada fruidor traz uma situação existencial concreta, uma sensibilidade particularmente condicionada, uma determinada cultura, gostos, tendências, preconceitos pessoais, de modo que a compreensão da forma originária se verifica segundo uma determinada perspectiva individual. (ECO, 1991 p. 39 e 40).

Segundo Eco (1991, p. 41), na poética da obra aberta o receptor instaura sua

própria forma e a obra “não poderá ser realmente compreendida se o intérprete não

a reinventar num ato de congenialidade com o autor”.

Portanto:

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o leitor do texto sabe que cada frase, cada figura se abre para uma multiformidade de significados que ele deverá descobrir; inclusive, conforme seu estado de ânimo, ele escolherá a chave de leitura que julgar exemplar, e usará a obra na significação desejada. (ECO 1991, p.43).

Essas características nas obras de arte e, neste caso, situando os anúncios

publicitários no conceito de “obra aberta”, cooperam para a existência do receptor-

agente.

Entretanto, a estrutura um pouco fechada da campanha da MasterCard, como

visto no primeiro capítulo (objeto + preço + objeto singular + não tem preço), reduz o

campo de abertura. De certa forma, isso reduz também as possibilidades de

interferência na peça, mas em contrapartida, evidencia para o receptor que, dentro

dessa estrutura específica, praticamente qualquer objeto e situação podem se

encaixar, desde que ele siga o modelo da campanha, tornando o anúncio, assim,

uma obra aberta novamente.

Mesmo tendo uma estrutura fechada, Eco (1991) afirma que toda obra acaba

por ser aberta. Um exemplo mais evidente é o sinal de trânsito, que deve ser

encarado de maneira única. Se for transfigurado por uma interpretação fantasiosa

deixa de ter seu significado específico. Portanto, uma obra de arte, de forma

acabada e fechada, é também aberta, passível de muitas interpretações diferentes,

só que essas interpretações não são passíveis de alteração em sua singularidade. O

que não é o caso da MasterCard, em que as obras fechadas se abrem, mas a

singularidade da campanha permanece inalterada.

Cada fruição é, assim, de acordo com Eco (1991), uma interpretação e uma

execução, pois em cada fruição a obra revive numa perspectiva original.

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4 A RESPEITO DE UMA CAMPANHA PUBLICITÁRIA

4.1 Trajetória da campanha

Para um olhar em profundidade sobre os anúncios da MasterCard, faz-se

necessária uma retrospectiva detalhada que descreva a estrutura fundante da

campanha. Por isso, será traçada uma breve trajetória, tendo como foco a

campanha “Não tem preço”.

Há 14 anos aconteceu o lançamento da campanha publicitária mundial não

tem preço. A campanha, que está no ar no Brasil até os dias de hoje, teve seu

primeiro comercial lançado no país em 1998.

Como já mencionado no capítulo Midiatização, Contratos e Tecnologia, as

peças da campanha seguiam a seguinte linha: contextualizavam uma determinada

história e mostravam um produto (ou serviço) qualquer e seu preço com MasterCard,

depois mostravam outro produto, e em seguida, seu preço com MasterCard, um

terceiro produto, então, era exibido, e depois seu preço com MasterCard. Por fim,

uma situação impossível de ser comprada, normalmente um acontecimento de

extrema felicidade ou satisfação para os personagens do comercial, era exibida com

a frase “não tem preço”. As peças eram assinadas com o slogan completo: “Existem

coisas que o dinheiro não compra, para todas as outras, existe MasterCard.”

Em alguns casos havia ainda outra frase fechando os anúncios que

dependiam do tema da propaganda. A estrutura dessa frase, que se referia ao

cartão de crédito (ou débito) era: “Aceito de (determinados locais) a (outros locais)”,

por exemplo, aceito de lojas de brinquedo a cafeterias.

No primeiro semestre de 2007, a campanha passou por uma nova etapa.

Juntamente com a campanha “Não tem preço”, a empresa lançou a campanha

nacional do Viajante MasterCard, que tinha uma abordagem diferente, mas não

abandonava o conceito que já era trabalhado.

A campanha Viajante MasterCard tinha o mote “Descubra o Brasil que não

tem preço, e que ele inteiro aceita MasterCard”. Na campanha, que aparentemente

tinha o objetivo de simular uma história real, um viajante percorria vários lugares do

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Brasil a bordo de um balão, usando apenas seu cartão de crédito como forma de

pagamento por onde passava. A proposta era provar que MasterCard era aceito em

muitos locais do país, mesmo em estabelecimentos improváveis, como fazendas,

por exemplo.

Para que as pessoas pudessem acompanhar o viajante, foi criado um hotsite

e um blog, onde o personagem mostrava as curiosidades de suas viagens e permitia

que o público interagisse com o viajante, inclusive opinando nos próximos destinos

de sua jornada. Além do blog, foram criadas possibilidades de interação em outras

redes, como o orkut e o Second Life.

A campanha Viajante MasterCard durou menos de 1 ano, saindo do ar ainda

em 2007. De acordo com a própria MasterCard a campanha mostrou um

personagem viajando tanto por grandes metrópoles como por pequenos vilarejos do

Brasil, totalizando 39 cidades e mais de 10 mil quilômetros rodados.

Embora o Viajante MasterCard não tenha conseguido visivelmente tanta

repercussão quanto a campanha original “Não tem preço”, a empresa, em um

release no site www.mastercard.com.br, mostrou-se satisfeita com os resultados

obtidos: “a repercussão do Viajante MasterCard superou todas as metas projetadas

inicialmente. (...) O website, por exemplo, registrou (...) mais de 1,1 milhão de

visitantes únicos.”

No ano seguinte, em 2008, dando continuidade à campanha “Não tem preço”,

a MasterCard entrou em uma outra fase. Dessa vez, os consumidores foram

convidados abertamente a contar o que para eles não tinha preço. Por meio de

diversas mídias, como TV e anúncios em revistas, as pessoas eram convocadas a

acessar o site www.naotempreco.com.br e deixar um registro de sua história que

não tinha preço. A frase principal da campanha era “Você viveu uma história que

não tem preço? Compartilhe com a gente”, conforme mostra a figura 3.

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Figura 3: Campanha convidando o consumidor a contar histórias que não têm preço

Fonte: http://www.portaldapropaganda.com/comunicaca o/2008/04/0037

É interessante notar que nas propagandas em internet ou impressas, como a

figura acima, o próprio anúncio já fornecia para o consumidor a estrutura própria

para que ele montasse sua história.

Nesse caso, a estrutura objeto + preço + objeto singular + não tem preço, era

imposta ao consumidor explicitamente e não intuitivamente, conforme mostra a

figura 4, em uma clara demonstração do caráter dedutivo da campanha, em

oposição às outras formas de inferência lógica.

Figura 4: Detalhe do formulário contido no anúncio impresso

Fonte: http://www.portaldapropaganda.com/comunicaca o/2008/04/0037

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Posteriormente, os autores das melhores histórias ganharam prêmios e viram

suas histórias serem transformadas em comerciais. Inicialmente seriam

selecionadas apenas duas histórias para virarem comerciais de TV, mas pelo menos

quatro delas foram selecionadas e veiculadas: “Vestibular”, “Urso”, “Cão de Honra” e

“Voluntária”. Além disso, muitas outras histórias enviadas por meio do hotsite foram

publicadas em meios impressos e online, de acordo com o site Folhablu.

Figura 5: Imagens retiradas do vídeo “Vestibular”.

Fonte: http://www.youtube.com/watch?v=sEfaug92cdY

No filme “Urso”, por exemplo, um rapaz chega à casa da namorada para

conhecer o sogro, que metaforicamente é representado por um urso, forte e

assustador. O rapaz tenta conquistá-lo com presentes, um CD e um livro (os preços

são exibidos por meio de legendas e locução, mantendo a estrutura das

campanhas). O último presente dado pelo rapaz, uma camisa do time de futebol

para o qual o sogro torce, acaba então por conquistar o sogro (urso), que dá um

abraço no rapaz. Ao final, a frase fecha o esquema da propaganda: "Conquistar a

confiança do sogrão: não tem preço". Nesse caso, como a história partiu de um

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consumidor, o nome do autor da história é mencionado ao final. Em algumas das

outras peças o nome do consumidor também é divulgado e os expectadores,

convidados a enviarem sua história.

Figura 6: Imagens retiradas do vídeo “Urso”.

Fonte: http://www.youtube.com/watch?v=KVQfosQ0cXk&f eature=related

O hotsite www.naotempreco.com.br ainda está no ar, mas o foco é outro.

Agora o usuário escolhe uma das ações sociais disponíveis no site (dança e música,

esporte e cidadania, saberes e sabores) e envia uma palavra compartilhando o que

ela o faz sentir, com o mote “Compartilhe o que não tem preço.”

A campanha “Não tem Preço” semelhante à sua forma inicial continua sendo

trabalhada. Paralelamente, outras campanhas da marca também estão no ar, como

o “Programa Surpreenda”.

A agência de publicidade responsável pela criação das peças da MasterCard

no Brasil há mais de 10 anos é a McCann Erickson e o conceito “Priceless”,

desenvolvido em 1997, foi criado pela McCann Erickson New York.

Segundo a MasterCard (2008) a McCann Erickson Publicidade teve origem

nos Estados Unidos, em 1930, com a fusão de duas agências de propaganda

fundadas por Alfred W. Erickson e Harrison King McCann. No Brasil, a McCann

Erickson possui escritórios no Rio de Janeiro, em Brasília e em São Paulo. A filial da

agência em São Paulo é a responsável pela conta da MasterCard.

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Em 2010 a agência W/Brasil e a McCann Erickson passaram por uma fusão,

o novo grupo então passou a se chamar W/McCann.

Luciana Sanches (Gerente de Planejamento da W/McCann) declara, em

entrevista realizada por e-mail, que a campanha Priceless/não tem preço foi uma

estratégia global, criada nos Estados Unidos e logo depois implementada nos outros

países.

Sobre a campanha que incentivava a participação do consumidor contando

sua história, Luciana afirma que o objetivo era criar um canal de diálogo entre os

consumidores e a MasterCard. Essa campanha foi desenvolvida pela McCann

Brasil, em uma iniciativa local. A entrevista completa realizada com a publicitária

Luciana Sanches encontra-se no Apêndice A desta dissertação.

Apesar da afirmação de Luciana de que a campanha convidando o

consumidor a participar contando suas histórias era uma iniciativa local, tem-se

conhecimento de uma estratégia semelhante adotada em outros países, ou pelo

menos nos Estados Unidos, como afirma a Diretora de marketing da MasterCard

Worlwide, responsável pelo setor da empresa nos EUA, Canadá e América Latina,

Amy Fuller.

No evento MaxiMídia (2008), Amy Fuller gravou uma entrevista na qual

afirmou que em 1996 a marca passou por algumas revisões acerca de suas ações e,

juntamente com a agência de publicidade, quis descobrir como o consumidor se

sentia. As descobertas feitas pelas pesquisas eram de que os consumidores

entendiam como sinais de uma vida bem sucedida situações como poder tirar um

dia de folga e ter um casamento de sucesso. O desejo das pessoas era ter boas

experiências e não exatamente comprar bens. Se fossem comprar algo, o

interessante seria o resultado final dessa compra. Nesse contexto surgiu o conceito

priceless.

Segundo Amy, em informações do site Coluna do Nenê (2008) desde a

criação da campanha “Não tem preço” o volume de transações com cartões da

marca aumentou 400%. A Diretora de marketing afirma que para realizar esse

trabalho foi preciso estudar os consumidores, o mercado de cartões e analisar a

concorrência.

O site Coluna do Nenê (2008) afirma que a divulgação por meio de

admiradores da marca do slogan “Não tem preço” em camisetas e vídeos chamaram

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atenção da empresa, que criou campanhas interativas, chamando os clientes para

participar.

A partir da assertiva acima fica evidente que a MasterCard percebeu o

fenômeno de participação espontânea dos consumidores e resolveu aproveitar esse

momento. Fica claro também que esse fenômeno não ocorria só no Brasil, mas em

outras partes do mundo.

Ainda segundo o site Coluna do Nenê (2008), no portal priceless.com (e

também por meio de envio de cartas), consumidores podiam criar as frases dos seus

próprios comerciais. Os vencedores dos concursos veriam suas frases se

materializarem em comerciais oficiais da marca que seriam veiculados na televisão,

assim como foi no Brasil.

De acordo com a MasterCard (2008), a campanha Não tem preço foi decisiva

para que o público criasse um laço emocional com a empresa, e o Brasil foi um dos

países pioneiros no qual a empresa adotou uma linha de comunicação que valoriza

o diálogo com o consumidor (no caso, a campanha que convida os consumidores a

contarem suas histórias). Ainda de acordo com a MasterCard (2008), estudos de

comportamento realizados pela empresa demonstram que os brasileiros gostam

bastante de interagir e comunicar-se.

Em 2009, o case “Resgatando a Emoção de MasterCard. O Consumidor

como Protagonista da Marca” foi um dos vencedores do Marketing Best, um

importante prêmio de marketing do país.

É importante entender que a campanha que convocava o consumidor a contar

sua história por meio do hotsite foi lançada em 2007. No entanto, entre 1998, data

do primeiro comercial “não tem preço” no Brasil, e 2007, vários receptores-agentes

criaram espontaneamente conteúdos remetendo à campanha da empresa.

Nas figuras 7, 8 e 9, é possível ver imagens de vídeos do site

www.youtube.com que estão no site desde 2006 e na figura 10, uma comunidade do

site de relacionamentos Orkut desde 2004. Ou seja, anos antes da MasterCard

convidar abertamente os consumidores a fazer parte da campanha não tem preço,

eles já faziam.

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Figura 7: Vídeo criado por receptor-agente, postado em 2006

Fonte: http://www.youtube.com/watch?v=svoLhjuL3CE

Figura 8: Outro vídeo criado por receptor-agente, p ostado em 2006

Fonte: http://www.youtube.com/watch?v=2h4oUFYKqF8

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Figura 9: Vídeo criado por receptor-agente, postado em fevereiro 2007

Fonte: http://www.youtube.com/watch?v=GwhkTT5qM8M

Figura 10: Comunidade criada por usuário do Orkut e m 2004 Fonte: http://www.orkut.com.br/Main#Community?cmm=2 926

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4.2 Os anúncios

4.2.1 Universalidade da estrutura

Como já foi discutido ao longo desta dissertação, a campanha não tem preço

da MasterCard segue uma estrutura fixa:

objeto (ou serviço) + preço com MasterCard

objeto (ou serviço) + preço com MasterCard

objeto (ou serviço) + preço com MasterCard

objeto ou situação singular + não tem preço

Existem coisas que o dinheiro não compra. Para todas as outras existe

MasterCard.

Em alguns casos a estrutura ainda abrange: aceito de (determinados locais) a

(outros locais).

Ao criar vídeos e imagens fazendo referência à campanha “Não tem preço” a

maioria dos usuários mantém essa estrutura fixa, muitas vezes, inclusive tentando

fazer com que sua mensagem seja bem semelhante a um anúncio da campanha.

A existência dessa estrutura é fundamental para que a participação do

receptor-agente no processo da campanha da MasterCard ocorra. Fazendo uma

retomada da ideia de repertório (experiência de vida), abordada no capítulo Receber

é Agir, acredita-se que quanto mais fácil e compartilhado é um repertório, mais

existe a possibilidade de participação do receptor.

A hipótese subjacente equivale à seguinte comparação: um analfabeto tem

um vocabulário de oitocentas palavras e um culto vocabulário de duas mil palavras.

O culto tem repertório suficiente para entender o analfabeto, porém o contrário será

difícil, já que o culto sabe muitas palavras que o analfabeto desconhece.

Portanto, o repertório da campanha da MasterCard tem um nível “simples”,

que permite grande participação dos receptores, e essa estrutura fixa, apesar de

limitar as mensagens dos receptores-agentes facilita o processo de participação,

pois funciona como um guia. Se a estrutura fosse mais simples, possivelmente mais

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pessoas participariam. Se a estrutura fosse mais complexa, contudo, possivelmente

menos pessoas participariam.

Ou seja, se a campanha da MasterCard apresenta uma linguagem simples,

uma composição fácil de ser entendida, fica mais propício e mais fácil se encaixar

dentro do repertório de linguagem e experiência de vida do receptor, dessa forma,

pavimentando o caminho para ele se tornar um receptor-agente.

Com a repetição em toda a campanha da estrutura objeto + preço + objeto

singular + não tem preço, um pouco fechada, de acordo com o conceito de obra

aberta de Eco (1991), o anúncio da MasterCard já define os campos de repertório e

experiência colateral que o receptor-agente irá utilizar. De certa forma, os anúncios

impõem uma limitação de criatividade e extrapolação por parte do receptor-agente.

Mas, ao mesmo tempo, permitem que mais pessoas participem, já que o repertório

exigido para a compreensão e (re)criação do anúncio é mais compartilhado.

Abordando os anúncios de um ponto de vista semiótico, é possível notar que

na estrutura os índices mudam, mas o controle simbólico permanece o mesmo.

De acordo com Pinto (1995), o índice é um signo que aponta para o objeto. O

índice se relaciona com o objeto de alguma forma existencial. Pode ser, por

exemplo, uma relação de contraste, causa e efeito, ação e reação.

Pinto (1995) lembra que exemplos clássicos de índices são os chamados

“signos naturais”. A nuvem indicando chuva, a fumaça indicando fogo, pegadas

como indício da passagem de uma pessoa ou um animal.

O índice é como se fosse um meio, um veículo, pois o símbolo muitas vezes

se manifesta através dele.

Nos anúncios da campanha “não tem preço” os índices seriam os objetos ou

serviços dotados de preço e as situações ou objetos que não tem preço. É fácil

perceber que os índices são facilmente trocados na figura 4, em que um formulário é

dado aos receptores para que ele preencha com novos objetos (novos índices) e

possa assim, elaborar sua história. O controle simbólico, no entanto, o sentido, a

ideia do que tem e do que não tem preço, permanece.

Acselrad e Freitas (2009) analisam o slogan da campanha “não tem preço”.

Segundo os autores, o slogan contraria os conselhos de especialistas em

publicidade de usar poucas palavras, já que trata-se de uma frase bem longa, e isso

não atrapalhou em seu sucesso.

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Os autores percebem na frase “Existem coisas que o dinheiro não compra” o

uso da emotividade, e consideram curioso o fato de uma empresa de cartões de

crédito reconhecer explicitamente que o dinheiro não pode comprar tudo.

Para os consumidores seria, pelo menos, uma surpresa a mostra de

humanidade apresentada por uma empresa que vive do consumo e do consumismo,

além de, naturalmente, usar a sensorialidade de modo disfarçado.

A emoção que é evidenciada na campanha da empresa faz com que o

receptor se envolva e não se incomode com a estrutura fixa. É como se essa

primeiridade, a emoção, ofuscasse a rigidez apresentada pela estrutura e chamasse

a atenção dos consumidores, como um recurso usado pela publicidade, conforme

acredita Cabral (2006), visto no capítulo Midiatização, Contratos e Tecnologia.

Continuando a análise do slogan da campanha, Acselrad e Freitas (2009)

afirmam que a frase “Para todas as outras existe MasterCard” rompe bruscamente a

afetividade proposta pela frase anterior e enaltece as possibilidades oferecidas pelo

cartão de crédito (ou débito).

Dizendo implicitamente que para tudo o que tem preço existe MasterCard, a

empresa destaca que vários objetos e serviços podem ser comprados, e que o

cartão pode ser utilizado para tais compras. “Portanto, o consumidor não deve se

preocupar, pois conta com a MasterCard como uma entidade protetora, capaz de

arcar com todos os custos que uma vida tranquila requer”. (Acselrad e Freitas, 2009,

p. 156).

É interessante atentar para o modelo que, segundo Acselrad e Freitas (2009),

é seguido na campanha da MasterCard. Para os autores os objetos que têm preço

são considerados o passaporte para os sentimentos e as sensações que não têm

preço.

O slogan acaba situando o que é comprável como uma ponte de acesso ao que não é comprável. Isso fica claro em algumas possíveis situações de comerciais de TV: flores têm um preço, anel de noivado tem um preço, já um “sim” da noiva não pode ser comprado. No entanto, com o cartão de crédito, você pode comprar os meios de seduzir e encantar a noiva (flores e anel, por exemplo), levando-a mais facilmente a dizer o “sim”. (...) O paradoxo implícito é que, ao permitir a aquisição de todas as coisas que dinheiro pode comprar, o cartão irá naturalmente permitir também a aquisição das coisas que o dinheiro não pode comprar. Ao afirmar que o dinheiro não pode comprar felicidade, o slogan acaba, paradoxalmente, afirmando o seu contrário. (ACSELRAD E FREITAS, 2009, p. 156).

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As figuras 11, 12, 13, 14 e 15 são digitalizações de anúncios impressos da

campanha “não tem preço” da MasterCard, nos quais fica evidente o uso da

estrutura fixa e da utilização da emoção como estratégia para conquistar o

consumidor. Os vídeos da campanha seguem a mesma linha. Os textos dos

anúncios são os seguintes:

Figura 11: Anúncio da campanha “não tem preço”

Fonte: Anúncio na Revista Veja em dezembro de 2000

Texto do anúncio da figura 11:

Cesta de piquenique: R$60,00; Óculos de sol: R$75,00; Tênis novo: R$45,00.

Ter uma namorada que, além de linda, bate um bolão: não tem preço.

Ao final do anúncio, acompanhando a marca da empresa, as frases: Existem

coisas que o dinheiro não compra. Para todas as outras existe MasterCard.

Texto do anúncio da figura 12:

Batom: R$12,00; Sombra: R$15,00; Pó facial: R$23,00. Ele chegar antes da

hora, encontrá-la sem maquiagem e achar que você está pronta: não tem preço. Por

fim, acompanhando a marca da empresa, Existem coisas que o dinheiro não

compra. Para todas as outras existe MasterCard.

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Figura 12: Anúncio Impresso da MasterCard de 2000

Fonte: Revista Veja, outubro de 2000

Figura 13: Anúncio Impresso da MasterCard de 2001

Fonte: Revista Veja, dezembro de 2001

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Texto do anúncio da figura 13:

Comprinhas na rôtisserie: R$55,00; 1 garrafa de vinho tinto: R$45,00; Pó 1

vestidinho novo: R$23,00. Ele te ligar no dia seguinte: não tem preço.

Assinando a peça, acompanhando a marca da empresa, Existem coisas que

o dinheiro não compra. Para todas as outras existe MasterCard.

Texto do anúncio da figura 14:

Aparelho de videogame: R$800,00; Televisão 20”: R$490,00; CD com

joguinho de futebol: R$90,00. Futebol de verdade: não tem preço.

E por fim, sempre acompanhando a marca da empresa, Existem coisas que o

dinheiro não compra. Para todas as outras existe MasterCard.

Figura 14: Anúncio Impresso da MasterCard de 2005 Fonte: www.mastercard.com.br

Texto do anúncio da figura 15:

Livro com fotos do Brasil: R$180,00. O Brasil posar para suas fotos: não tem

preço.

E novamente, acompanhando a marca da empresa, Existem coisas que o

dinheiro não compra. Para todas as outras existe MasterCard.

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Figura 15: Anúncio Impresso da MasterCard de 2005 Fonte: www.mastercard.com.br

A figura 15 contém um texto que remete a uma promoção feita pelos cartões

de crédito, assim como a figura 14, que remete ao patrocínio da marca na Copa do

Mundo. Mesmo assim, ambos os anúncios fazem parte da campanha não tem

preço.

É possível observar na figura 15, que é um anúncio mais recente, a estrutura

fixa abreviada, com apenas um objeto com preço e uma situação que não tem

preço. Depois de tantos anos de campanha, o restante do esquema não precisa

mais ser mostrado para que o sentido esteja completo, a estrutura já está implícita,

na medida em que os sentidos se tornaram significados.

Também fazendo parte dos anúncios que “resumem” a estrutura, alguns

vídeos da campanha “Não tem preço” ao invés de mostrar os preços dos objetos em

reais, mostram o objeto seguido da logo da MasterCard. É justamente um resumo da

seguinte parte da estrutura: “objeto + preço com MasterCard”. Depois, mostra uma

situação impossível de ser comprada e o valor em reais R$,0,00 (zero reais, ou seja,

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sem preço). Depois, a situação impossível de ser comprada é mencionada

acompanhada do slogan “Não tem preço”.

Outra variação ocorre em um vídeo em que um casal cuida de várias

crianças. Ao fundo, uma música suave é cantada por vozes de criança. Enquanto o

casal dá banho, troca fraldas, alimenta e desempenha muitas outras tarefas, frases

são exibidas na tela: “criança arrumadinha $” ao lado da marca da MasterCard;

“criança cheirosinha $$” também ao lado da marca da MasterCard; “criança de

barriguinha cheia $$$” juntamente com a marca da MasterCard.

Ao terminar as tarefas, o casal coloca as crianças para dormir e pedem

silêncio, como se estivesse falando com o telespectador. Aí, mais uma frase é

mostrada: “zzzzzzzzzzzzzzzzzzzz: não tem preço”. Enquanto isso, o locutor fala:

“Existem coisas que o dinheiro não compra. Para todas as outras existe

MasterCard”. E completa: “Aceito do bom dia ao boa noite.” (esta última, variação da

estrutura onde normalmente encaixam-se nomes de tipos de estabelecimentos

comerciais).

É evidente que esses últimos casos mencionados apresentam variações em

cima do esquema da campanha, mas é possível notar que o esqueleto da estrutura

em si, permanece intacto.

Comparando os anúncios profissionais com os anúncios “amadores” nota-se

certas semelhanças entre eles. Além do uso da estrutura fixa da campanha, alguns

anúncios criados por receptores-agentes utilizam a marca da MasterCard. É como

se o criador quisesse aproximar ao máximo seu spoof do que seria um anúncio

original. Nem todos têm essa preocupação, mas é grande o número de anúncios e

vídeos criados por receptores-agentes com essas características, como mostram as

figuras a seguir.

Texto do anúncio criado por receptor-agente, figura 16:

Ingressos para o Jogo: R$60,00; Camiseta Tricolor: R$ 139,00; Cervejas: R$

25,00. Ver o Grêmio ser Campeão em cima dos “Diamantes” do Internacional em

pleo Beira-Rio... Não tem preço!

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Figura 16: Anúncio criado por receptor-agente

Fonte: http://www.portalms.com.br/noticias/Persiste ncia-e-a-chave-para-fixar-a-sua-marca-entre-os-consumidores-/Campo-Grande/Economia/21873. html

Assim como a figura 16, as figuras 17 e 18 também se encaixam nesses

anúncios que inserem a marca da MasterCard em suas criações remetendo à

campanha “não tem preço”.

Texto do anúncio criado por receptor-agente, figura 17:

Passagem aérea executiva para a Alemanha: R$7mil; Ingresso para a Copa

das Confederações: R$ 1mil. Tirar a foto abaixo, em pleno vôo de volta da seleção

argentina, logo após uma vitória do Brasil por 4 a 1: não tem preço!

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Figura 17: Anúncio criado por receptor-agente

Fonte: http://74.54.222.7/showthread.php?t=46855

É interessante notar na figura 17 também a estrutura da frase que aparece

em algumas propagandas da MasterCard, “Aceito de (determinados locais) a (outros

locais)”, nesse caso, “Aceito de escolas de dança a lojas de chocolate”, fazendo

ironia ao tango (escolas de dança) e à goleada sofrida pela seleção argentina (no

Brasil, essa goleada também é popularmente chamada de “chocolate”).

Texto do anúncio criado por receptor-agente, figura 18:

Sofá: R$ 500,00; Televisão: R$ 900,00; Limpeza Total: R$ 100,00. Concluir

que pagar R$3,00 por um pacote de camisinhas seria um investimento melhor: Não

tem preço.

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Figura 18: Anúncio criado por receptor-agente

Fonte: http://t3.gstatic.com/images?q=tbn:DgKD7szrulj6XM:h ttp://i216.photobucket.com/albums/cc47/

Zanfelitche/naotempreco.jpg&t=1

Texto do anúncio criado por receptor-agente, figura 19:

Ingresso para o clássico: R$ 30,00; Cachorro quente no estádio: R$ 7,00;

Camisa do clube do coração: R$ 150,00. Ver o Botafogo, ex-líder do Brasileirão,

caindo na tabela. Não tem preço. Fluminense 2 X 0 Botafogo.

Figura 19: Anúncio criado por receptor-agente

Fonte: http://globoesporte.globo.com/platb/bolanasc ostas/

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Na figura 19, existe a presença de uma marca que remete à da empresa de

cartões de crédito, no entanto, ao invés de MasterCard, lê-se BolaCard. Acredita-se

que o motivo da marca que consta no anúncio ser “BolaCard” é deve-se ao fato da

figura estar hospedada em um site pertencente ao portal da globo.com. Presume-se

que ela foi feita por um consumidor, enviada ao site e que os administradores desse

site, para não fazer publicidade gratuita e tampouco uso indevido da marca,

utilizaram essa opção de parodiá-la para não copiá-la. Essa informação não foi

confirmada pelo site, trata-se de uma indução.

Durante as pesquisas feitas para esta dissertação, foi possível encontrar

também um vídeo criado por um receptor-agente que misturava o conceito “Não tem

preço” da MasterCard com uma empresa concorrente, a Visa. O nome do vídeo é

“Visa MasterCard não tem preço” e a descrição: “Da série Visa MasterCard não tem

preço. Algumas coisas não podem ser compradas...”.

O usuário que criou o vídeo utilizou a mesma estrutura da campanha da

MasterCard, mas na hora de atribuir a ideia, utilizou tanto a marca da MasterCard

quanto a da Visa, algo inconcebível do ponto de vista publicitário, visto que as duas

são empresas concorrentes.

Figura 20: Vídeo criado por receptor-agente, postad o em 2007

Fonte: http://www.youtube.com/watch?v=Nphs3gfTzAA

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4.2.2 Variações temáticas

Nos anúncios criados por receptores-agentes pode-se perceber a prevalência

de peças que remetem ao futebol. A campanha da MasterCard abriga temas

diversos, mas é visível a predominância do tema futebol dentre os anúncios e vídeos

criados por receptores-agentes, talvez, ou quase certamente, por ser o esporte mais

popular do Brasil e considerado por alguns uma “paixão”, confirmando Rocha (2006)

e Kotler (2010) nas constatações de que os contextos de cada sociedade

influenciam a produção e o resultado de campanhas publicitárias.

Alguns desses anúncios e vídeos criados pelos receptores-agentes

remetendo à campanha da MasterCard e que são relacionados a futebol

comemoram vitórias de seus times. Outras vezes, fazem alusão a derrotas sofridas

pelo time rival. As figuras 7, 8 e 20, que são imagens retiradas de vídeos feitos pelos

usuários, e as imagens 16, 17 e 19, anúncios feitos para a internet, mostram o uso

do tema “futebol”.

Outra variação temática são temas relacionados a sentimentos tais como

amor e felicidade, como mostram as figuras 10 e 21.

Figura 21: Toalha bordada remetendo à campanha “não tem preço”

Fonte: http://feitoamaoporjulianamelo.blogspot.com/search/ label/Toalhas%20de%20M%C3%A3o

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É interessante ressaltar que o modelo da toalha da figura 21, foi apelidado

pela pessoa que a bordou de toalhinha “MasterCard”. Ou seja, apesar de não ter a

marca da empresa como os anúncios criados pelos receptores-agentes, fica

evidente que os créditos da ideia são dados à MasterCard pelos consumidores.

Também dando os créditos à MasterCard, a figura 22 mostra imagens

retiradas de um vídeo criado por receptor-agente. O vídeo, intitulado “não tem preço”

segue a linha dos VTs da campanha, no entanto, seus textos e a estrutura são um

pouco mais estendidos.

Figura 22: Fragmentos retirados do vídeo “não tem p reço” Fonte: http://www.youtube.com/watch?v=AM2mvAdZPew

O vídeo mostra vários slides com textos e fotos, sempre acompanhados por

uma trilha sonora. Primeiramente é mostrado o texto “Baseado numa história real.

24 de janeiro de 2009”, depois, a marca da MasterCard é exibida ocupando toda a

tela. A partir desse momento começa o uso da estrutura da campanha.

A foto de vários objetos é mostrada, juntamente com o preços dos mesmos e

a marca da MasterCard, no canto da tela. O texto a partir de então é o seguinte:

Terno: R$ 399,00; Camisa: R$ 120,00; Cinto: R$ 27,00; Gravata: R$ 63,00; Sapato:

R$ 180,00.

Após esses objetos e seus preços, a marca da MasterCard é novamente

exibida ocupando toda a tela e um slideshow com fotos de várias pessoas em uma

festa é exibido com as seguintes legendas: Galera reunida...; Festa Open-Bar...; E

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Pakito bebendo água...; NÃO TEM PREÇO!!!; TEM COISAS QUE O DINHEIRO

NÃO COMPRA; PARA TODAS AS OUTRAS EXISTE MASTERCARD (enquanto

isso, uma imagem de cartões MasterCard é exibida); ACEITO DESDE SAPATARIAS

À CASA DE SHOWS. A marca da MasterCard é exibida uma terceira vez, ocupando

toda a tela, e os créditos do vídeo são exibidos: FIM; MASTERCARD NÃO TEM

PREÇO; G. PEREIRA 2009.

O vídeo aparentemente traz uma brincadeira entre amigos, que gastaram

dinheiro comprando roupas e acessórios para uma festa com bebida á vontade,

cercados de seus amigos, sendo que um deles não estava consumindo bebidas

alcoólicas. Esse é o momento que não tem preço para eles.

O vídeo busca ser bem fiel à estrutura da campanha, mostrando os objetos,

seus preços, a marca da MasterCard o tempo todo e ainda utilizando uma frase da

estrutura que não é tão comumente usada: aceito de (determinados locais) a (outros

locais).

Muitos desses anúncios e vídeos criados por receptores-agentes realmente

imitam a campanha, tentando aproximar-se bastante do que seria um anúncio ou VT

real da empresa.

Outro estilo de anúncios criados por receptores-agentes bastante recorrente

são aqueles com teor erótico, spoofs brasileiros, mas também internacionais,

fazendo paródias da campanha Não tem preço/Priceless. Esses anúncios não foram

coletados, mas são facilmente encontrados na seção de Imagens do buscador

www.google.com. Inclusive, ao digitar no buscador a expressão “não tem preço” é

mais fácil encontrar imagens que foram feitas por usuários da internet do que as que

realmente fazem parte da campanha da MasterCard.

Para o “sucesso” dos spoofs, os usuários utilizam também da emoção, assim

como as campanhas da MasterCard, e da ironia e o humor, que estão presentes em

tanto nos anúncios que têm relação com futebol, ou outros temas quanto os de

temas variados, como a figura 18.

Não tão recorrentes, mas ainda sim presentes, são os anúncios criados por

receptores-agentes que fazem referência à política ou pessoas desse meio,

conforme figuras 23 e 24.

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Texto do anúncio criado por receptor-agente, figura 23:

Vestido de festa: 500 reais; Brincos e colar de pérolas: 1.500 reais; Super

Bonder para colar os dentes: 8 reais; Festa da cúpula política paga com dinheiro

público: 300.000 reais. Ver Heloísa Helena curtindo o melhor da burguesia: Não tem

preço! Algumas coisas na vida não têm preço. Para todas as outras existe

MarterCard.

Figura 23: Anúncio criado por receptor-agente

Fonte: http://midia-livre.blogspot.com

Texto do anúncio criado por receptor-agente, figura 24:

Jantar em um restaurante Francês: R$1.000,00; Anel de brilhantes: R$

15.000,00; Viajar para a Europa, a pedido da sogra e as custas do dinheiro do povo.

Não tem preço! Acerto de contas no restaurante a viagens com a sua sogra.

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Figura 24: Anúncio criado por receptor-agente

Fonte: http://raphaelgnipper.wordpress.com/2008/05/ 09/coisas-que-nao-tem-preco/

É interessante ressaltar que a maioria dos spoofs, independente do assunto

que tratam, fazem uso do humor. Talvez essa seja outra característica determinada

pelos contextos: o humor é uma presença marcante na sociedade brasileira.

Conforme foi visto, os produtores brasileiros de spoofs da campanha “não tem

preço” utilizam, principalmente, o tema futebol. Também são recorrentes, porém em

menor proporção, outros temas como: felicidade, amizade e política.

No entanto, apesar do futebol ser o tema mais frequente, ele é, ao mesmo

tempo, o menos criativo. De acordo com os vídeos e anúncios coletados, foi possível

observar que as abordagens dos receptores-agentes quando se trata de futebol são

bem parecidas e um pouco limitada. A maioria desses spoofs ou comemoram

grandes vitórias de seus times, ou fazem alusão a derrotas sofridas pelo time rival. A

maneira de apresentar tais fatos também é sempre bem semelhante.

Com os outros temas, como amizade ou política, as formas de abordagem se

mostram mais amplas, mesmo com o uso da estrutura fixa e fechada que a

campanha apresenta.

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Talvez isso ocorra pelo fato do futebol ser um símbolo forte, um clichê

nacional, e, por isso, um poderoso dispositivo restritor de sentidos. Os anúncios

mais raros talvez sejam os mais criativos por se aproximarem mais do conceito de

obra aberta e exigirem mais do leitor/produtor.

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5 - CONCLUSÃO

É inegável a longevidade da campanha “Não tem preço”, Priceless, da

empresa MasterCard, surgida em 1997 e veiculada no Brasil a partir de 1998.

A campanha teve grande repercussão despertando o interesse e a iniciativa

de receptores, não necessariamente consumidores da marca, a começarem a criar

vídeos, imagens, spoofs, imitando (ou parodiando) as peças originais da campanha

e adaptando-as para suas próprias realidades. Essa prática é ainda observável hoje.

Para esses consumidores e receptores que participavam e ainda participam

da campanha criando seus próprios anúncios, vídeos e histórias, designou-se o

termo receptor-agente.

Percebendo esse fenômeno de participação espontânea, a MasterCard criou

um hotsite e inseriu em suas campanhas um convite explícito para o consumidor

contar sua história que não tem preço.

Independente do convite da MasterCard, essa co-criação por parte do

receptor-agente já acontecia e continua acontecendo. O objetivo desta dissertação

foi, portanto, o de desvendar os fatores que propiciaram e propiciam a participação

do público na campanha.

A relação entre os receptores e a empresa MasterCard, como co-criadores de

sua campanha publicitária altera os contratos de leitura (ou de visão) tradicionais.

Conforme Fausto Neto (2008) afirma, e já visto no capítulo “Midiatização, contratos e

tecnologia”, a midiatização traz consigo mudanças nos vínculos sociais, que passam

a ser regidos por novas formas de contrato. De acordo com Fausto Neto (2007), os

avanços tecnológicos também contribuem no processo de vínculo entre a mídia e

seus receptores surgindo então novas formas de contratos, entre ele, alguns nos

quais o receptor é co-gestor no processo produtivo das mensagens. A campanha

“não tem preço” se encaixa nessa situação.

A partir do referencial teórico utilizado, das entrevistas, anúncios e spoofs, foi

possível expor alguns desses fatores. O primeiro deles é a universalidade da

estrutura imposta pela campanha “não tem preço”. Ou seja, os anúncios seguem um

esquema único que, ao longo dos anos, acabou sendo fixado na mente dos

consumidores. A partir da estrutura: objeto + preço com MasterCard; objeto + preço

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com MasterCard; objeto + preço com MasterCard; objeto ou situação singular + não

tem preço; e a frase Existem coisas que o dinheiro não compra. Para todas as

outras existe MasterCard, criou-se um padrão para as peças dessa campanha.

Esse esquema reduz o campo de abertura da campanha, de acordo com o

conceito de obra aberta de Eco (1991). No entanto, ao mesmo tempo, essa abertura

reduzida, juntamente com a existência de uma estrutura fixa, facilita a participação

do receptor-agente, já que ele precisa apenas completar as lacunas da estrutura

com os objetos, preços e situações que lhe convirem. Outro fator diretamente ligado

a essa estrutura fixa e que contribui para participação do receptor-agente, é o

repertório.

Tendo um repertório simplificado, o processo de co-criação é ainda mais fácil,

já que, sendo bem simples, ele se torna, consequentemente, muito compartilhado.

Ou seja, devido à estrutura, os anúncios impõem certa limitação na

extrapolação por parte do receptor-agente, mas, ao mesmo tempo, permitem que

mais pessoas participem, já que o repertório exigido para a compreensão e

(re)criação do anúncio é simples e de fácil compreensão, por isso, bem

compartilhado.

Para a participação do receptor-agente ter ocorrido, e ainda ocorrer, significa

que algo tenha atraído sua atenção para que ele pudesse espontaneamente se

sentir motivado a produzir uma imagem ou vídeo simulando ou imitando uma peça

da campanha. Uma das principais estratégias utilizadas na campanha é emoção,

acredita-se que isso tenha motivado às pessoas a querer participar como co-

criadores da campanha. As pesquisas realizadas com consumidores pela

MasterCard, citadas pela Diretora de Marketing, Amy Fuller, mostram que as

pessoas acreditavam (em 1996) que ter uma vida de sucesso é bem mais do que

adquirir produtos, é ter relacionamentos felizes, desfrutar de dias de folga.

Possivelmente esse sentimento ainda existe nos dias de hoje.

Com base nos resultados da pesquisa a McCann Erickson e a MasterCard

criaram a campanha “não tem preço” valorizando esses momentos que o dinheiro

não pode comprar. Essas situações acabam tocando o consumidor, que se identifica

com a emoção vivida pelos personagens dos anúncios.

O fenômeno da circulação espontânea de anúncios produzidos pelos

receptores em um agenciamento confirmador da não-passividade dos sujeitos da

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comunicação, tal como evidenciado pela campanha MasterCard aqui analisada,

pode, talvez, ser tomado como importante sintoma de um fenômeno mais amplo: o

da midiatização, que, ao imbuir o indivíduo com sua lógica, torna-o ao mesmo tempo

apto e desejoso de participar no novo bios midiático. Esse não é apenas um

resultado da inegável facilitação proporcionada pelos meios digitais, mas constitui

também, ao mesmo tempo, uma demonstração de que o processo de comunicação

não pode ser mais descrito simplesmente por meio de um paradigma sistêmico-

cibernético que envolve a idéia de um circuito fechado e auto-regulador. De fato, ao

mesmo tempo que recebe uma mensagem e a percebe como aberta, no sentido de

Eco (1991), o sujeito a reverbera (retuíta, reencaminha, etc.), tendo uma função

tanto de receptor quanto de emissor. Nesse sentido, fica claro que a comunicação

não se dá de forma transmissiva, mas de maneira reticular.

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APÊNDICE A

Entrevista realizada por e-mail em dezembro de 2010 .

Qual o seu nome?

Luciana Sanches

Qual o seu cargo e há quanto tempo trabalha na agên cia?

Gerente de Planejamento. 2 anos.

Qual a relação e proximidade do seu trabalho com a MasterCard?

Sou atual gerente de planejamento de MasterCard. Anteriormente, fui gerente de

Atendimento para a mesma conta.

Você sabe em qual país teve início a campanha “não tem preço” (Priceless)?

Foi uma estratégia Global, criada nos Estados Unidos mas imediatamente

implementada em todos os países.

A agência, na época McCann Erickson, atende a Maste rCard desde o

surgimento dessa campanha?

A McCANN Erickson foi a que essa campanha.

No Brasil, a campanha teve uma grande repercussão p or parte do público, que

criava e ainda cria espontaneamente vídeos e imagen s de acordo com sua

própria experiência, remetendo ao conceito da campa nha. A W/McCann e a

MasterCard perceberam essa repercussão no Brasil? V ocê sabe se nos outros

países isso também aconteceu ou acontece?

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A campanha “Priceless”, desenvolvida no Brasil como “Não tem Preço” é sucesso

mundial, de fato.

Essa repercussão é nítida no Brasil. A McCANN, como agência global da

MasterCard, monitora a aplicação e evolução dessa campanha em todos os países.

Vale lembrar que no Brasil, ‘Não tem Preço’ já é uma cultura e um conceito

imediatamente remetido à MasterCard.

A campanha que convidava o consumidor a contar o qu e para ele não tem

preço surgiu devido a essa percepção da participaçã o espontânea?

Surgiu de uma necessidade de fazer o “Não tem Preço” parte da vida das pessoas.

O objetivo era ‘criar um canal de diálogo’ entre os portadores de cartão e a

MasterCard.

Vale ressaltar que essa campanha foi desenvolvida pela McCANN Brasil. Não foi

uma idéia global e sim uma idéia local.

Antes dessa campanha convidando o público a partici par, a McCann ou a

MasterCard recebiam algum tipo de carta ou e-mail c om sugestões de

propaganda?

Não que eu saiba.

Porque você acha que a campanha “não tem preço” fez sucesso e está no ar

até os dias de hoje?

“Não tem preço” já faz parte do DNA da MasterCard. É como um ativo da marca.

Mas ele não é estático. Está evoluindo ano após ano.

Qual foi a primeira peça da campanha “Não tem preço ” lançada no Brasil? É

possível me enviar essa peça digitalizada?

Vou verificar se posso enviar, ok?

Preciso de autorização da própria MasterCard.

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A filial de SP cuida de toda a conta da MasterCard no Brasil?

Sim.