pdf - [selma] aula 3 - metabolismo dos xenobióticos
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52: Metabolismo dos xenobiticos
Robert K. Murray, MD, PhD
IMPORTNCIA BIOMDICA Os seres humanos esto cada vez mais expostos a diversas substncias qumicas
estranhas (xenobiticos) frmacos, aditivos alimentares, poluentes etc. A situao foi bem
resumida na seguinte citao de Rachel Carson: Com uma arma to tosca quanto o porrete do
homem das cavernas, a barragem da qumica foi lanada contra a fbrica da vida. O
entendimento da maneira como os xenobiticos so manipulados no nvel celular importante
para aprendermos a lidar com os ataques qumicos violentos.
O conhecimento sobre o metabolismo dos xenobiticos fundamental para o
entendimento racional da farmacologia e da teraputica, da farmcia e da toxicologia, do
tratamento do cncer e da dependncia qumica. Todas essas especialidades incluem a
administrao ou a exposio aos xenobiticos.
OS SERES HUMANOS ENTRAM EM CONTATO COM MILHARES DE
XENOBITICOS, QUE PRECISAM SER METABOLIZADOS ANTES DE
SEREM EXCRETADOS
Xenobitico (do grego xenos, estranho) um composto qumico estranho ao corpo. As
principais classes de xenobiticos de relevncia mdica so frmacos, carcingenos qumicos e
vrios compostos que so liberados no ambiente de uma forma ou de outra, tais como os
policlorados bifenilos (PCB) e alguns inseticidas. Existem mais de 200.000 compostos
qumicos ambientais manufaturados. A maioria desses compostos metabolizada (alterada
quimicamente) no corpo humano e o fgado o principal rgo envolvido nesse processo; em
alguns casos, o xenobitico pode ser excretado sem alteraes. No mnimo 30 enzimas
diferentes catalisam as reaes envolvidas no metabolismo dos xenobiticos; entretanto, este
captulo descreve apenas um grupo seleto dessas enzimas.
interessante considerar o metabolismo dos xenobiticos em duas fases. Na fase 1, a principal
reao envolvida a hidroxilao, catalisada pelos componentes de uma classe de enzimas
conhecida como monoxigenases ou citocromos P450. A hidroxilao pode suprimir a ao de
um frmaco, embora nem sempre isto ocorra. Alm da hidroxilao, essas enzimas catalisam
grande variedade de reaes, inclusive as que envolvem desaminao, desalogenizao,
dessulfatao, epoxidao, peroxigenao e reduo. As reaes que envolvem hidrlise (p.
ex., catalisadas pelas esterases) e algumas outras que no so catalisadas pelo citocromo P450
tambm ocorrem na fase 1.
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Na fase 2, os compostos hidroxilados ou outros gerados na fase 1 so convertidos por enzimas
especficas em vrios metablitos polares, por conjugao com cido glicurnico, sulfato,
acetato, glutation ou alguns aminocidos, ou por metilao.
O propsito final dessas duas fases metablicas dos xenobiticos aumentar sua
hidrossolubilidade (polaridade) e, desse modo, facilitar a excreo pelo corpo. Os
xenobiticos muito hidrofbicos podem permanecer quase indefinidamente nos tecidos
adiposos, se no forem convertidos em compostos mais polares. Em alguns casos, as reaes
metablicas da fase 1 convertem os xenobiticos inativos em compostos biologicamente
ativos. Nesses casos, os xenobiticos originais so conhecidos como pr-drogas ou pr-
carcingenos. Em outros casos, reaes adicionais da fase 1 (p. ex., reaes adicionais de
hidroxilao) convertem os compostos ativos em formas menos ativas ou inativas antes da
conjugao. Tambm existem casos em que as prprias reaes de conjugao convertem os
produtos ativos gerados pelas reaes da fase 1 em compostos menos ativos ou inativos, que
depois so excretados na urina ou na bile. Em casos muito raros, a conjugao pode, na
verdade, acentuar a atividade biolgica de um xenobitico.
O termo destoxificao s vezes utilizado para descrever algumas das reaes envolvidas
no metabolismo dos xenobiticos. Contudo, esse termo nem sempre apropriado porque, como
j foi mencionado, em alguns casos as reaes s quais os xenobiticos so submetidos na
verdade aumentam sua atividade e sua toxicidade biolgicas.
AS ISOFORMAS DO CITOCROMO P450 HIDROXILAM INMEROS
XENOBITICOS NA FASE 1 DO SEU METABOLISMO
A hidroxilao a principal reao envolvida na fase 1. As enzimas responsveis so
conhecidas como monoxigenases ou citocromos P450. Algumas estimativas sugeriram que
existam cerca de 60 genes para os citocromos P450 existentes nos seres humanos. A reao
catalisada por uma monoxigenase (citocromo P450) a seguinte:
RH +O2 + NADPH + H + R OH + H2 O + NADP
Nessa reao, RH pode representar uma grande variedade de xenobiticos, inclusive frmacos,
carcingenos, pesticidas, produtos derivados do petrleo e poluentes (p. ex., uma mistura de
PCB). Alm disso, os compostos endgenos, tais como alguns esterides, eicosanides, cidos
graxos e retinides, tambm atuam como substratos dessas enzimas. Em geral, os substratos so
lipoflicos e transformam-se em compostos mais hidroflicos por hidroxilao.
O citocromo P450 considerado o biocatalisador mais verstil que se conhece. O mecanismo
real dessa reao complexo e j foi descrito sucintamente nos captulos anteriores (Fig. 12.6).
Com a utilizao do 18O2, estudos mostraram que um tomo de oxignio entra em R-OH e
outro vai para a gua. Essa destinao dupla do oxignio explica por que as monoxigenases
eram conhecidas no passado como oxidases de funo mista. A reao catalisada pelo
citocromo P450 tambm pode ser representada da seguinte forma:
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O citocromo P450 tem esse nome porque a enzima foi descoberta quando se observou que as
preparaes de microssomos que tinham sido reduzidas quimicamente e depois expostas ao
monxido de carbono apresentavam um pico de absoro bemdefinido em 450 nm. Entre as
razes pelas quais essa enzima importante est o fato de que cerca de 50% dos frmacos
comumente ingeridos pelos seres humanos so metabolizados pelas isoformas do citocromo
P450; essas enzimas tambm atuam em vrios carcingenos e poluentes. Os principais
citocromos P450 envolvidos no metabolismo dos frmacos so os membros das famlias CYP1,
CYP2 e CYP3 (ver adiante).
As isoformas do citocromo P450 constituem uma superfamlia de
enzimas que contm heme
Com referncia aos citocromos P450, so importantes as seguintes consideraes:
(1) Em virtude do grande nmero de isoformas (cerca de 150) descobertas, tornou-se
importante desenvolver uma nomenclatura sistemtica para descrever as isoformas do P450 e
seus genes. Hoje, essa terminologia est disponvel, amplamente utilizada e baseia-se na
homologia estrutural. O smbolo-raiz abreviado CYP denota um citocromo P450. Em seguida,
h um algarismo arbico que designa a famlia; os citocromos P450 so includos na mesma
famlia se tiverem homologia de 40% ou mais entre as seqncias dos aminocidos. O nmero
arbico seguido de uma letra maiscula que indica a subfamlia, caso existam dois ou mais
componentes; os citocromos P450 so agrupados na mesma subfamlia se tiverem homologia
de seqncia maior que 55%. Em seguida, os citocromos P450 individuais recebem algarismos
arbicos atribudos arbitrariamente. Desse modo, o termo CYP1A1 descreve um citocromo
P450 que faz parte da famlia 1 e da subfamlia A e foi o primeiro membro identificado nessa
subfamlia. A nomenclatura dos genes que codificam os citocromos P450 a mesma descrita
antes, exceto quanto ao fato de que se utilizam smbolos em itlico; desse modo, o gene que
codifica o CYP1A1 o CYP1A1.
O CYP3A o citocromo P450 mais importante envolvido no metabolismo dos frmacos, tendo
em vista sua abundncia no fgado e no intestino. Essa enzima pode atuar em grande variedade
de frmacos de quase todas as classes farmacolgicas. Alm disso, sua atividade at certo
ponto imprevisvel, porque ela pode variar quase 400 vezes em virtude da inibio e induo;
isto acarreta dificuldades na determinao da posologia dos frmacos.
(2) Assim como ocorre com a hemoglobina, essas enzimas so hemoprotenas.
(3) Os citocromos P450 esto amplamente distribudos entre as espcies, inclusive bactrias.
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(4) Essas enzimas esto presentes em quantidades maiores nos hepatcitos e nos entercitos,
mas provavelmente so encontradas em todos os tecidos. No fgado e em muitos outros tecidos,
elas esto localizadas principalmente nas membranas do retculo endoplasmtico liso, que
constituem parte da frao microssomal quando os tecidos so submetidos ao fracionamento
subcelular. Nos microssomos hepticos, os citocromos P450 podem constituir at 20% das
protenas totais. Essas enzimas so encontradas na maioria dos tecidos, embora geralmente em
quantidades pequenas, quando comparadas com o fgado. Na supra-renal, os citocromos P450
esto presentes nas mitocndrias e tambm no retculo endoplasmtico; as diversas
hidroxilases presentes nesse rgo desempenham papel importante na biossntese do colesterol
e dos esterides. O sistema dos citocromos P450 mitocondriais difere do sistema microssomal,
porque utiliza uma flavoprotena ligada ao NADPH (adrenodoxina redutase) e uma protena
no-heme com ferro e enxofre (adrenodoxina). Alm disso, as isoformas P450 especficas
envolvidas na biossntese dos esterides geralmente so muito mais estritas no que se refere
especificidade pelos substratos.
(5) No retculo endoplasmtico do fgado humano, existem no mnimo seis isoformas do P450,
cada qual com especificidades por substratos amplas e at certo ponto superpostas, com
atuao nos xenobiticos e em compostos endgenos. Nos ltimos anos, os genes de algumas
isoformas do P450 (nos seres humanos e em animais como ratos) foram isolados e estudados
detalhadamente.
(6) O NADPH, em vez do NADH, est envolvido no mecanismo de reao do citocromo P450.
A enzima que utiliza NADPH para gerar o citocromo P450 reduzido, assinalado no lado
esquerdo da equao ilustrada anteriormente, conhecida como NADPH-citocromo P450
redutase. Os eltrons so transferidos do NADPH para a NADPH-citocromo P450 redutase e,
depois, para o citocromo P450. Isso resulta na ativao redutora do oxignio molecular e, em
seguida, um tomo de oxignio inserido no substrato. O citocromo b5, outra hemoprotena
encontrada nas membranas do retculo endoplasmtico liso (Cap. 12), pode participar da reao
como doador de eltrons em alguns casos.
(7) Os lipdios tambm so componentes do sistema dos citocromos P450. O lipdio preferido
a fosfatidilcolina, o principal lipdio encontrado nas membranas do retculo endoplasmtico.
(8) A maioria das isoformas do citocromo P450 indutvel. Por exemplo, a administrao de
fenobarbital ou muitos outros frmacos provoca hipertrofia do retculo endoplasmtico liso e
um aumento de 3 a 4 vezes na quantidade de citocromo P450 em 4 a 5 dias. O mecanismo
dessa induo foi exaustivamente estudado e, na maioria dos casos, envolve o aumento da
transcrio do mRNA do citocromo P450. Contudo, alguns casos de induo dependem da
estabilizao do mRNA, da estabilizao enzimtica ou de outros mecanismos (p. ex., um
efeito na traduo).
A induo do citocromo P450 tem implicaes clnicas importantes, porque este um dos
mecanismos bioqumicos de interao farmacolgica. A interao farmacolgica ocorre
quando os efeitos de um frmaco so alterados pela administrao prvia, concomitante ou
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subseqente de outro frmaco. Por exemplo, consideremos a situao em que um paciente
utiliza o anticoagulante varfarina para evitar a coagulao do sangue. Esse frmaco
metabolizado pelo CYP2C9. Ao mesmo tempo, o paciente comea a utilizar fenobarbital (um
indutor desse P450) para tratar algum tipo de epilepsia, mas a dose da varfarina no alterada.
Depois de 5 dias ou algo assim, o nvel do CYP2C9 no fgado do paciente aumentar em 3 a 4
vezes. Por sua vez, isso significa que a varfarina ser metabolizada muito mais rapidamente do
que antes e que sua dosagem passar a ser insuficiente. Por essa razo, a dose precisa ser
aumentada para que a varfarina mantenha sua eficcia teraputica. Para ampliar ainda mais esse
exemplo, mais tarde poderia ocorrer outro problema se o uso de fenobarbital fosse interrompido
e a dose aumentada de varfarina fosse mantida. O paciente estaria sob risco de sangramento,
porque a dose alta de varfarina seria ainda mais ativa do que antes, pois o nvel do CYP2C9
declinaria aps a interrupo do tratamento com fenobarbital.
Outro exemplo de induo enzimtica envolve o CYP2E1, que induzido pelo consumo de
etanol. Isso preocupante, porque este citocromo P450 metaboliza alguns solventes
amplamente utilizados e tambm os componentes encontrados na fumaa do tabaco, entre os
quais muitos so carcingenos comprovados. Desse modo, se a atividade do CYP2E1 for
aumentada por induo, isto poderia agravar o risco de carcinogenicidade secundria
exposio a esses compostos.
(9) Algumas isoformas do citocromo P450 (p. ex., CYP1A1) esto envolvidas especialmente
no metabolismo dos hidrocarbonetos aromticos policclicos (PAH) e das molculas
semelhantes; por esta razo, no passado elas eram conhecidas como hidroxilases dos
hidrocarbonetos aromticos (AHH). Essa enzima importante para o metabolismo dos PAH
e para a carcinognese produzida por esses compostos. Por exemplo, nos pulmes, essas
enzimas podem estar envolvidas na converso dos PAH inativos (pr-carcingenos) inalados
pela fumaa em carcingenos ativos depois das reaes de hidroxilao. Os fumantes tm
nveis mais altos dessa enzima em algumas de suas clulas e tecidos, quando comparados com
os indivduos que no fumam. Alguns estudos indicaram que a atividade dessa enzima pode
estar aumentada (induzida) na placenta de mulheres fumantes, o que altera potencialmente as
quantidades de metablitos dos PAH (dos quais alguns so deletrios) aos quais o feto fica
exposto.
(10) Alguns citocromos P450 tm formas polimrficas, (lisoformas genticas) das quais
algumas possuem pouca atividade cataltica. Essas observaes constituem uma explicao
importante para as variaes das respostas de alguns pacientes aos frmacos. Um citocromo
P450 que mostra polimorfismo o CYP2D6, que est envolvido no metabolismo da
debrisoquina (um frmaco anti-hipertensivo; ver Quadro 52.2) e da espartena (um frmaco
antiarrtmico e oxitcico). Alguns polimorfismos do CYP2D6 reduzem o metabolismo desses
frmacos e de vrios outros, de modo que eles podem acumular-se no organismo e trazer con se
qn cias deletrias. Outro polimorfismo curioso o do CYP2A6, que est envolvido no
metabolismo da nicotina em cotinina. Existem trs alelos conhecidos do gene CYP2A6: um tipo
selvagem e dois alelos inativos ou nulos. Estudos mostraram que os indivduos com alelos
inativos, que deprimem o metabolismo da nicotina, aparentemente ficam protegidos de se
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tornarem fumantes dependentes do tabaco (Quadro 52.2). Esses indivduos fumam menos,
provavelmente porque suas concentraes sanguneas e cerebrais de nicotina permanecem
elevadas por mais tempo do que nos in di v duos com o alelo natural. Alguns autores
especularam que a inibio do CYP2A6 poderia ser uma abordagem nova para evitar e tratar o
tabagismo.
O Quadro 52.1 resume alguns dos principais aspectos dos citocromos P450.
Quadro 52.1
Algumas propriedades dos citocromos P450 humanos
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AS REAES DE CONJUGAO PREPARAM OS XENOBITICOS
PARA A EXCREO NA FASE 2 DO SEU METABOLISMO
Nas reaes da fase 1, os xenobiticos geralmente so convertidos em derivados hidroxilados
mais polares. Nas reaes da fase 2, esses compostos so conjugados com molculas, tais como
o cido glicurnico, o sulfato ou a glutation. Isso os torna ainda mais solveis e, por fim, eles
so excretados na urina ou na bile.
Cinco tipos de reaes da fase 2 esto descritos a seguir
A. GLICURONIDAO A glicuronidao da bilirrubina analisada no Cap. 31; as reaes pelas quais os xenobiticos
so glicuronizados so praticamente idnticas. O UDP-cido glicurnico o doador de
glicuronil e vrias glicuroniltransferases presentes no retculo citoplasmtico e no citossol so
os agentes catalisadores. Molculas como o 2-acetilaminofluorano (um agente carcinognico),
a anilina, o cido benzico, o meprobamato (tranqilizante), o fenol e alguns esterides so
excretadas em forma de glicurondios. O glicurondio pode ser ligado ao oxignio, ao
nitrognio ou aos grupos com enxofre nos substratos. A glicuronidao provavelmente a
reao de conjugao mais comum.
B. SULFATAO Alguns alcois, as arilaminas e os fenis so sulfatados. O doador de sulfato dessas e de
outras reaes de sulfatao biolgica (p. ex., sulfatao dos esterides, dos
glicosaminoglicanos, dos glicolipdios e das glicoprotenas) a adenosina-3-fosfato-5-
fosfossulfato (PAPS) (Cap. 24), que tambm conhecido como sulfato ativo.
C. CONJUGAO COM GLUTATION O glutation (-glutamil-cisteinilglicina) um tripeptdio formado por cido glutmico, cistena
e glicina (Fig. 3.3). O glutation geralmente abreviado pela sigla GSH (em razo do grupo
sulfidrila da sua cistena, que a parte ativa da molcula). Alguns xenobiticos eletroflicos
potencialmente txicos (como, por exemplo, certos carcingenos) so conjugados com o GSH
nucleoflico por meio das reaes representadas da seguinte forma:
R + GSH R S G
em que R = xenobitico eletroflico. As enzimas que catalisam essas reaes so conhecidas
como glutation-S-transferases e esto presentes em grandes quantidades no citossol dos
hepatcitos e em nveis mais baixos em outros tecidos. Nos tecidos dos seres humanos, existem
vrios glutation-S-transferases, que mostram diferentes especificidades pelos substratos e
podem ser separados por eletroforese ou por outras tcnicas. Se os xenobiticos potencialmente
txicos no fossem conjugados com o GSH, poderiam ficar livres para estabelecer ligaes
covalentes com o DNA, o RNA ou as protenas celulares e, desse modo, poderiam causar srios
danos s clulas. Assim, o GSH um mecanismo de defesa importante contra alguns
compostos txicos, inclusive certos frmacos e agentes carcinognicos. Se os nveis do GSH
em tecidos como o fgado forem reduzidos (como se pode conseguir pela administrao a ratos
de alguns compostos que reagem com o GSH), esses tecidos podem ficar mais suscetveis aos
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danos causados por vrios compostos qumicos que, em condies normais, seriam conjugados
com o GSH. Os conjugados de glutation ainda so submetidos a outras reaes metablicas
antes da excreo. Os grupos glutamil e glicinil, que fazem parte da molcula do glutation, so
removidos por enzimas especficas e um grupo acetil (doado pela acetil-CoA) acrescentado
ao grupo amino da molcula de cisteinila remanescente. O composto resultante um cido
mercaptrico, conjugado de L-acetilcistena, que depois excretado na urina.
O glutation desempenha outras funes importantes nas clulas humanas, alm do seu papel no
metabolismo dos xenobiticos:
1. O glutation participa da decomposio do perxido de hidrognio potencialmente
txico na reao catalisada pela glutation peroxidase (Cap. 21).
2. O glutation um redutor intracelular importante, que ajuda a manter os grupos SH
essenciais das enzimas em seu estado reduzido. Essa funo analisada no Cap. 21 e sua
participao na anemia hemoltica causada por deficincia de glicose-6-fosfato-desidrogenase
est descrita nos Caps. 21 e 51.
3. Um ciclo metablico que envolve o GSH como carreador foi implicado no transporte
de alguns aminocidos atravs das membranas das clulas renais. A primeira reao desse
ciclo est ilustrada a seguir.
Aminocido + GSH Aminocido -glutamilamino + Cisteinilglicina
Essa reao ajuda a transferir alguns aminocidos atravs da membrana plasmtica e, em
seguida, esses aminocidos so hidrolisados do seu complexo com o GSH e esta sintetizada
novamente a partir da cisteinilglicina. A enzima que catalisa a reao descrita antes a -
glutamiltransferase (GGT). Essa enzima est presente na membrana plasmtica das clulas
tubulares renais e nas clulas dos dctulos biliares, assim como no retculo endoplasmtico dos
hepatcitos. A GGT tem valor diagnstico porque liberada na corrente sangunea pelos
hepatcitos lesionados em vrios distrbios hepatobiliares.
D. OUTRAS REAES As duas outras reaes mais importantes so a acetilao e a metilao.
1. Acetilao a acetilao representada pela seguinte reao:
X + Acetil-CoA Acetil-X + CoA
em que X representa o xenobitico. Assim como ocorre com outras reaes de acetilao, a
acetil-CoA (acetato ativo) o doador de acetil. Essas reaes so catalisadas pelas
acetiltransferases presentes no citossol de vrios tecidos, principalmente no fgado. O frmaco
isoniazida utilizado no tratamento da tuberculose metabolizado por acetilao. Existem tipos
polimrficos de acetiltransferases e isto permite que os indivduos sejam classificados como
acetiladores lentos ou rpidos e influencia a taxa de depurao sangunea de frmacos como a
isoniazida. Os acetiladores lentos esto mais sujeitos a determinados efeitos txicos da
isoniazida porque este frmaco persiste por mais tempo nesses indivduos.
2. Metilao alguns xenobiticos so metilados por metil-transferases, que utilizam S-
adenosilmetionina (Fig. 29.17) como doador de grupos metila.
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AS ATIVIDADES DAS ENZIMAS QUE METABOLIZAM
XENOBITICOS SO INFLUENCIADAS PELA IDADE, PELO SEXO E
POR OUTROS FATORES
Vrios fatores influenciam as atividades das enzimas que metabolizam os xenobiticos. As
atividades dessas enzimas podem diferir substancialmente entre as diversas espcies. Desse
modo, por exemplo, a toxicidade ou carcinogenicidade potencial dos xenobiticos no pode
ser extrapolada diretamente de uma espcie para outra. Existem diferenas significativas nas
atividades enzimticas em cada indivduo e algumas parecem ser atribuveis aos fatores
genticos. As atividades de algumas dessas enzimas tambm variam de acordo com a idade e o
sexo.
A ingesto de vrios xenobiticos como o fenobarbital, as PCB ou alguns hidrocarbonetos pode
causar induo enzimtica. Desse modo, importante saber se um indivduo foi ou no
exposto a esses agentes indutores, antes de avaliar as respostas bioqumicas aos xenobiticos.
Os metablitos de alguns xenobiticos podem inibir ou estimular as atividades das enzimas
que metabolizam esses compostos. Tambm nesse caso, isso pode afetar as doses de alguns
frmacos administrados aos pacientes. Vrias doenas (p. ex., cirrose heptica) podem afetar as
atividades das enzimas que metabolizam frmacos e, em alguns casos, necessrio ajustar as
doses dos vrios frmacos utilizados pelos pacientes que tm esses distrbios.
ENTRE AS RESPOSTAS AOS XENOBITICOS ESTO EFEITOS
FARMACOLGICOS, TXICOS IMUNOLGICOS E
CARCINOGNICOS
Os xenobiticos so metabolizados no organismo por meio das reaes descritas antes. Quando
o xenobitico um frmaco, as reaes da fase 1 podem produzir sua forma ativa, ou reduzir
ou suprimir sua ao, caso ele seja farmacologicamente ativo no corpo sem metabolismo
prvio. Os diversos efeitos produzidos pelos frmacos constituem o campo de estudo da
farmacologia; neste caso, importante reconhecer que os frmacos atuam predominantemente
por mecanismos bioqumicos. O Quadro 52.2 resume quatro reaes importantes aos frmacos,
que refletem diferenas geneticamente determinadas nas enzimas e estruturas proticas dos
diferentes indivduos parte do campo de estudo conhecido como farmacogentica (ver
adiante).
Quadro 52.2
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Algumas reaes farmacolgicas importantes atribudas s formas mutantes ou polimrficas
das enzimas ou das pro tenas1
1 A G6PD analisada nos Caps. 21 e 51 e a hipertermia maligna no Cap. 48. Alm do gene que
codifica o receptor da rianodina, no mnimo um outro est envolvido em determinados casos de
hipertermia maligna. Existem muitos outros exemplos de reaes farmacolgicas acarretadas
pelo polimorfismo ou por mutaes.
Os polimorfismos que afetam o metabolismo dos frmacos podem envolver qualquer uma das
enzimas envolvidas nesse processo metablico (inclusive citocromos P450), os
transportadores e os receptores.
Alguns xenobiticos so muito txicos mesmo em nveis baixos (p. ex., cianeto). Por outro
lado, existem alguns xenobiticos, inclusive frmacos, que no produzem alguns efeitos txicos
quando so administrados em quantidades suficientes. Os efeitos txicos dos xenobiticos so
muito variados, mas os principais podem ser classificados em trs grupos (Fig. 52.1).
Fig. 52.1
Esquema simplificado mostrando como o metabolismo de um xenobitico pode causar danos
celulares, anormalidades imunolgicas ou cncer. Nesse caso, a converso do xenobitico em
um metablito ativo catalisada por um citocromo P450, enquanto a converso do metablito
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ativo (p. ex., um epxido) em outro metablito atxico catalisada por uma GSH-S transferase
ou epxido hidrolase.
O primeiro tipo a leso celular (citotoxicidade) que pode ser grave a ponto de provocar a
morte da clula. Existem alguns mecanismos pelos quais os xenobiticos danificam as clulas.
O mecanismo considerado aqui a ligao covalente s macromolculas celulares das
espcies reativas dos xenobiticos metabolizados. Entre esses alvos macromoleculares esto o
DNA, o RNA e as protenas. Se a macromolcula qual o xenobitico reativo se liga for
essencial sobrevivncia imediata da clula (p. ex., uma protena ou enzima envolvida em
alguma funo fundamental, como a fosforilao oxidativa ou a regulao da permeabilidade
da membrana plasmtica), os efeitos graves na funo celular seriam evidenciados muito
rapidamente.
Em segundo lugar, as espcies reativas de um xenobitico podem ligar-se a uma protena e
alterar sua antigenicidade. Nesse caso, diz-se que o xenobitico atua como hapteno, isto ,
uma molcula pequena que isoladamente no estimula a sntese de anticorpos, mas se combina
com o anticorpo formado. Em seguida, os anticorpos resultantes podem lesionar a clula por
vrios mecanismos imunolgicos que, grosso modo, interferem nos processos bioqumicos
celulares normais.
Em terceiro lugar, as reaes das espcies ativadas dos carcingenos qumicos com o DNA
parecem ser muito importantes na carcinognese qumica. Algumas substncias qumicas (p.
ex., benzo[]pireno) precisam ser ativada pelas monoxigenases do retculo endoplasmtico para
se transformar em um composto carcinognico (por esta razo, elas so conhecidas como
carcingenos indiretos). Desse modo, as atividades das monoxigenases e de outras enzimas
que metabolizam os xenobiticos e esto presentes no retculo endoplasmtico ajudam a
determinar se os compostos atuaro como agentes carcinognicos ou sero desintoxicados.
Outros compostos qumicos (p. ex., vrios agentes alquilantes) podem reagir diretamente
(carcinognese direta) com o DNA, sem precisar ser ativados quimicamente dentro da clula.
A enzima epxido hidrolase interessante porque pode conferir efeito protetor contra alguns
carcingenos. Os produtos da ao de determinadas monoxigenases em alguns substratos pr-
carcinognicos so epxidos. Os epxidos so altamente reativos e mutagnicos ou
carcinognicos, ou ambos. A epxido hidrolase assim como o citocromo P450, que tambm
est presente nas membranas do retculo endoplasmtico atua nesses compostos e os
converte em diidrodiis muito menos reativos. A reao catalisada pela epxido hidrolase pode
ser representada da seguinte forma:
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A FARMACOGENMICA PROMOVER O DESENVOLVIMENTO DE
FRMACOS NOVOS E MAIS SEGUROS
Como foi mencionado, farmacogentica o estudo das influncias das variaes genticas nas
respostas aos frmacos. Em virtude do progresso efetuado no seqenciamento do genoma
humano, recentemente surgiu um novo campo de estudo a farmacogenmica. Essa
especialidade inclui a farmacogentica, mas abarca uma rea muito mais ampla de atividades.
As informaes fornecidas pela genmica, pela protemica, pela bioinformtica e por outras
disciplinas como a bioqumica e a toxicologia sero incorporadas para possibilitar a sntese de
frmacos mais novos e mais seguros. medida que as seqncias de todos os nossos genes e
das suas protenas codificadas forem determinadas, isto revelar muitos alvos de ao
farmacolgica novos. Esses estudos tambm esclarecero os polimorfismos (este termo est
descrito sucintamente no Cap. 49) das enzimas e das protenas relacionadas com o
metabolismo, a ao e a toxicidade dos frmacos. No futuro, sero construdos microarranjos
capazes de detectlas, o que possibilitar a triagem dos indivduos quanto existncia de
polimorfismos potencialmente deletrios, antes de se iniciar o tratamento com um frmaco. J
existem chips genticos para analisar alguns gentipos dos citocromos P450 (p. ex., para o
CYP2D6, cujo produto gentico est envolvido no metabolismo de alguns antidepressivos,
antipsicticos, betabloqueadores e alguns quimioterpicos). A Fig. 52.2 resume algumas
abordagens utilizadas para o desenvolvimento de novos fr-macos. As principais razes para o
desenvolvimento de novos frmacos so melhorar a eficcia teraputica e fornecer frmacos
personalizados mais seguros, levando em considerao os polimorfismos e outros fatores.
Alguns estudos estimaram que cerca de 100.000 mortes por reaes adversas a frmacos
ocorrem anualmente apenas nos EUA. A esperana que as informaes novas fornecidas
pelos estudos nessas vrias reas indicadas na Fig. 52.2 e em outras reas sejam traduzidas em
tratamentos bem-sucedidos e, por fim, tambm abram uma nova era de teraputica
personalizada.
Fig. 52.2
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Esquema simplicado para algumas abordagens do desenvolvimento de novos frmacos
RESUMO Os xenobiticos so compostos qumicos estranhos ao orga-nismo, inclusive frmacos,
aditivos alimentares e poluentes ambientais; existem mais de 200.000 xenobiticos conhecidos.
Os xenobiticos so metabolizados em duas fases. A principal reao da fase 1 a
hidroxilao catalisada por vrias monoxigenases, tambm conhecidas como citocromos P450.
Na fase 2, os compostos hidroxilados so conjugados com vrios compostos hidroflicos, tais
como o cido glicurnico, o sulfato ou o glutation. A atuao simultnea dessas duas fases
transforma os compostos lipoflicos em molculas hidrossolveis que podem ser eliminadas
pelo organismo.
Os citocromos P450 catalisam as reaes que introduzem um tomo de oxignio
derivado do O2 molecular no substrato, gerando um produto hidroxilado. O NADPH e a
NADPH-citocromo P450 redutase esto envolvidos nesse complexo mecanismo de reao.
Todos os citocromos P450 so hemoprotenas e, em geral, tm especificidade ampla por
substratos e atuam em compostos endgenos e exgenos. Essas enzimas so os biocatalisadores
mais versteis que se conhece.
Nos tecidos humanos, existem cerca de 60 genes para os citocromos P450.
Os citocromos P450 geralmente esto localizados no retculo endoplasmtico das
clulas e so particularmente abundantes no fgado.
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Os citocromos P450 podem ser induzidos. Isso tem implicaes importantes em
fenmenos como as interaes farmacolgicas.
Tambm existem citocromos P450 mitocondriais, que esto envolvidos na biossntese
do colesterol e dos esterides. Essas enzimas utilizam uma protena no-heme que contm
ferro, a adrenodoxina, que no necessria s isoformas microssomais.
Em virtude das suas atividades catalticas, os citocromos P450 desempenham funes
importantes nas reaes das clulas aos compostos qumicos e na carcinognese qumica.
As reaes da fase 2 so catalisadas por enzimas como as glicuroniltransferases, as
sulfotransferases e o glutation S transferases, que utilizam como doadores o UDP-cido
glicurnico, o PAPS (sulfato ativo) e o glutation, respectivamente.
O glutation no tem apenas uma funo importante nas reaes da fase 2, mas tambm
um agente redutor intracelular envolvido no transporte de alguns aminocidos para dentro das
clulas.
Os xenobiticos podem produzir vrios efeitos biolgicos, inclusive respostas
farmacolgicas, toxicidade, reaes imunes e cncer.
Impulsionado pelos progressos efetuados no seqenciamento do genoma humano, o
novo campo da farmacogenmica traz a promessa de conseguir desenvolver vrios frmacos
mais seguros planejados em bases mais racionais.
(MURRAY 583-589)
MURRAY. HARPER BIOQUMICA ILUSTRADA, 27th Edition. ArtMed.
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