o que é codependência

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#1 [ O QUE é CODEPENDêNCIA ]

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livroO que é codependência?

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  • #1

    [ o q

    ue codepen

    dncia ]

  • #3

    [ o q

    ue codepen

    dncia ]

  • Instituto IndependaCapivari SP Brasil

    +55 19 2146-1672

    [email protected]

    www.independa.com.br

    1 Edio Maio de 2015

    ISBN 978-85-69203-01-8

    editor: Cristian Fernandes

    Reviso: Izabel Braghero

    Projeto grfico: Andr Stenico

    2015 Romina Miranda

    permitida a reproduo parcial ou total, apenas

    para uso no-comercial, desde que citada a fonte,

    sendo vedada a criao de obras derivadas.

  • #5

    [ o q

    ue codepen

    dncia ]

    O que cOdependncia?

    Termo recente na rea da terapia, ainda com

    conceitos difusos e em construo, por vezes

    conhecido como transtorno, por outras como

    doena, no utilizado cientificamente, mas

    totalmente popularizado, a codependncia no

    passa despercebida.

    Com caractersticas que fazem com que muitas

  • #6

    [ o q

    ue codepen

    dncia ]

    pessoas encontrem identificao e, muitas

    vezes, explicao para seus comportamentos,

    a cada dia ela avana para outras esferas,

    que at h pouco contemplavam apenas as

    comunidades teraputicas para tratamento de

    dependentes qumicos e os grupos de apoio para

    seus familiares.

    Mas afinal, O que cOdependncia?

    Como j mencionei, o conceito est em

    construo e, por isso, um privilgio para

    ns podermos participar deste momento,

    reunindo opinies de autores, estudiosos e,

    principalmente, participando do dia a dia de

    pessoas que, supostamente, seriam portadoras

    do transtorno da codependncia ou teriam

    traos codependentes.

    Porm, antes de entrarmos na construo do

  • #7

    [ o q

    ue codepen

    dncia ]

    conceito, elencando o que sabemos que a

    codependncia, importante dizermos o que ela

    no .

    Infelizmente, no dia a dia, notamos que

    muitas pessoas ao se reconhecerem como

    codependentes, seja num grupo de apoio ou

    num processo teraputico, passam a vestir a

    codependncia como uma segunda pele. Adotam

    o termo como um sobrenome, usam o conceito

    como um legado ou at como um destino fatal

    ao qual esto fadadas at o fim de suas vidas. A frase habitual : ..., afinal sou codependente!

    A est! A codependncia uma srie de coisas

    que ainda vamos juntos analisar ao longo deste

    livro, mas, ELA NO UM DIAGNSTICO

    FATAL. Ela no algo que limita o ser a uma srie

    de comportamentos rgidos e imutveis ou a

    um destino predeterminado. Portanto, qualquer

    pessoa que reconhea em si as caractersticas

    da codependncia possui, na mesma proporo

  • #8

    [ o q

    ue codepen

    dncia ]

    deste reconhecimento, a possibilidade de mutao

    desta condio emocional em que se encontra

    a de codependente seja j pelo motivo que

    tenha chegado at a. Aceitar-se como vtima no

    condio absoluta, mas apenas uma fase do

    transtorno, a primeira, aquela que chamamos

    de negao.

    E por falar em negao, a est uma boa

    maneira de comearmos a traar o conceito de

    codependncia, atravs de suas caractersticas.

    E uma das principais a negao. Quando um

    familiar de dependente qumico conclui que o

    seu ente querido faz uso abusivo de drogas (de

    acordo com o Lenad Famlia 20131 isto ocorre aps cerca de 5 anos da experimentao), ele

    venceu, na realidade, um longo processo de

    negao da doena de seu familiar. Este tempo

    todo que ele levou para descobrir, na verdade

    1 I Levantamento Nacional com Familiares de Dependentes Qumicos, realizado pela Unifesp/Uniad/Inpad. Disponvel em: http://inpad.org.br/_lenad-familia/ Acesso em: 28 abr. 2015.

  • #9

    [ o q

    ue codepen

    dncia ]

    ele levou para aceitar, porque sempre houve

    indcios, mas a negao era utilizada para defend-

    lo da dor de encarar que o seu familiar estava

    fazendo uso de drogas e mais: o que fazer com

    isto? Ento, negando, o familiar mantm tudo da

    mesma forma, doentia sim, mas da forma que

    ele conhece, que ele sabe lidar, sem crises, sem

    grandes tomadas de atitude para as quais ele

    ainda no est preparado.

    Agora, imaginem que aps aceitar que este

    familiar faz uso de drogas e vencer mais uma

    barreira para procurar ajuda, esta pessoa ainda

    confrontada com a ideia de que ela parte

    do problema, ela retroalimenta esta relao

    disfuncional em que se instalou o abuso de drogas

    ou a dependncia qumica. Ela vai aceitar isto

    assim, fcil? Claro que no! Quantos familiares ns

    ouvimos dizer: O problema ele, no eu. Ou

    ainda: Quem precisa se tratar ele, no eu, por

    isso no vou a grupo nenhum.

  • #10

    [ o q

    ue codepen

    dncia ]

    J foi difcil entender e aceitar o uso ou a

    dependncia de drogas por parte do ente querido.

    Aceitando esta situao seria preciso fazer alguma

    coisa por ele. Agora, aceitando que faz parte do

    processo, e que tambm est impactado pela

    doena, far com que tenha tambm que fazer

    algo por si, mudar comportamentos, cuidar

    de si, rever conceitos, histrias, partir para o

    autoconhecimento e a mudana. Quem est

    disposto a isto quando se encontra no olho do

    furaco? Provavelmente aquele familiar que j

    sofreu perdas demais em funo do uso do ente

    querido. Aquele que sabe que do jeito que est

    no d para ficar e que se entrega para toda a

    possibilidade de mudana para sair desta situao.

    Mas, para aquele que ainda no foi

    suficientemente impactado (de acordo com seus

    limites internos), ter que aceitar que de alguma

    forma corresponsvel por esta situao leva

    tempo e, em alguns casos, no chega nunca a

    acontecer. Infelizmente, nestas situaes extremas,

  • #11

    [ o q

    ue codepen

    dncia ]

    o dependente qumico, quando em recuperao,

    tem como principal fator de risco, voltar para esta

    famlia adoecida, que no aceita a realidade e no

    muda comportamentos em prol da sade e bem-

    estar do sistema familiar.

    Antes de continuarmos a traar as caractersticas

    da codependncia, vamos voltar um pouco

    na histria para entendermos o aspecto que

    abordamos neste livro.

    Em meados da dcada de 1940, nos Estados

    Unidos, as esposas de Bill e Bob, os fundadores

    de Alcolicos Annimos, ao perceberem

    que tambm compartilhavam dos mesmos

    comportamentos e que conseguiam melhor-

    los quando compartilhavam suas experincias,

    fundaram o Al-Anon, grupo para familiares e

    amigos de alcolicos. Foi nesta ocasio que surgiu

    o termo codependncia, usado para caracterizar

    estas esposas.

  • #12

    [ o q

    ue codepen

    dncia ]

    Na dcada de 1970, nas Comunidades

    Teraputicas de Minessota, tambm nos Estados

    Unidos, o termo volta a aparecer para designar os

    familiares dos dependentes qumicos internados

    nestes locais. Na dcada de 1980, o termo surge

    na rea da terapia, mas ganha um espectro bem

    mais amplo, no mais se relacionando somente

    aos familiares de dependentes qumicos, mas

    s pessoas que por qualquer outro motivo

    viveram situaes estressantes na famlia de

    origem que as levaram a assumir precocemente

    responsabilidades inadequadas para a idade e

    contexto cultural.

    As possibilidades de vivenciar situaes

    opressoras, em ambientes hostis e lares

    disfuncionais no se limitam ento s situaes

    em que exista a dependncia de lcool ou outras

    drogas, mas de uma srie de outras situaes em

    que o indivduo fique exposto por um determinado

    perodo a uma intensa dor. Seriam estas pessoas

    as codependentes. Porm, neste livro, nosso

  • #13

    [ o q

    ue codepen

    dncia ]

    objeto de estudo so os familiares de usurios e

    dependentes de substncias psicoativas. Por isso,

    vamos restringir a codependncia, neste texto, a

    este grupo de pessoas e suas vivncias.

    Voltando s caractersticas da codependncia,

    uma das mais determinantes, o controle. Em 1981, a educadora e terapeuta familiar Sharon

    Wegscheider-Cruse introduziu o conceito de

    codependncia como uma obsesso familiar sobre

    o comportamento e bem-estar do dependente, em

    que o eixo da organizao familiar passa a ser o

    controle do consumo alcolico.

    Aps a aceitao, sem ainda saber como lidar com

    a situao de forma adequada, a famlia acredita

    que deve controlar, que poder mudar a situao

    desta forma. Cada vez mais sem controle da

    situao, a famlia mantm a iluso do controle

    sobre o uso e fica obcecada pelo comportamento

    de seu familiar. Que horas chegou, como chegou,

    com quem falou, se usou, o que usou, quanto

  • #14

    [ o q

    ue codepen

    dncia ]

    usou? Comea a ditar regras disfuncionais e, na

    maioria das vezes, no as sustenta.

    Importante ressaltar que medida que o familiar

    fica obcecado em controlar o comportamento do

    outro, ele se afasta cada vez mais de si mesmo,

    deixando de lado o controle de sua prpria vida,

    perdendo aspectos de sua identidade, ficando

    cada vez mais mergulhado num universo fora de

    si, rejeitando tudo aquilo que seu, que precisaria

    ser visto, cuidado, amado. Ele se autoabandona.

    Um paralelo importante a traar ao longo

    desta leitura o espelho que veremos refletir

    algumas caractersticas do dependente e do

    codependente. At aqui vimos que o dependente

    nega a sua doena enquanto que o codependente

    nega a sua condio emocional, sua parcela de

    responsabilidade na problemtica da famlia.

    Vimos tambm que o dependente mantm a

    iluso do controle sobre a droga, achando que

    pode parar de usar quando quiser, enquanto

  • #15

    [ o q

    ue codepen

    dncia ]

    que seu familiar acha que pode controlar o seu

    ente querido, o seu uso e o seu comportamento.

    Ambos mantm um comportamento obsessivo

    com seu objeto em questo: a droga, no caso do

    dependente, e o dependente, no caso da famlia.

    Outro sentimento presente no cotidiano de

    um codependente, de uma forma bastante

    exacerbada, a culpa. Para o familiar do dependente qumico muito difcil distinguir culpa

    e responsabilidade. Os pais, ao descobrirem que

    o filho faz uso de drogas, automaticamente se

    perguntam: Onde foi que eu errei?. Os cnjuges,

    por sua vez, buscam erros em todas as situaes,

    anulando-se, colocando-se muitas vezes em

    situaes opressoras, limitantes, humilhantes,

    para no se sentirem como o objeto causador do

    uso do parceiro. Porm, ao depararem-se com a

    frase: Eu bebo porque voc faz isso!, pronto! J

    assumem para si toda a culpa pelo uso do outro. A questo que ningum, nem pais, nem

    parceiros, amigos, irmos tm culpa alguma pela

  • #16

    [ o q

    ue codepen

    dncia ]

    escolha do outro em usar a droga. Por mais que

    os pais tenham falhado na educao, no erraram

    porque queriam errar, mas por no saberem fazer

    da forma correta ou por inmeras outras razes

    que em nada tem a ver com a culpa, mas sim, e

    to somente, com a responsabilidade.

    A diferena entre a culpa e a responsabilidade

    que a culpa paralisa e a responsabilidade mobiliza.

    Se formos culpados, vamos ficar remoendo a

    situao, as mgoas, os erros, estaremos voltados

    para o passado. Nossos conceitos sobre ns

    mesmos sero cada vez mais negativos, nossa

    autoestima ficar cada vez pior e nos revestiremos

    do problema como se ns fssemos o erro. Se

    nos percebemos responsveis, lamentaremos,

    mas estaremos prontos para sermos tambm

    responsveis pela mudana e poderemos, ento,

    avanar em sua direo, afinal, perceberemos

    que cometemos um erro em determinado

    momento, em determinada circunstncia, mas

    que agora temos a escolha de fazer diferente e

  • #17

    [ o q

    ue codepen

    dncia ]

    esta responsabilidade nossa, e somente nossa. A

    responsabilidade positiva e molda o futuro.

    Porm, falando em responsabilidades, muito,

    mas muito importante, que o familiar entenda que

    a responsabilidade precisa ser equilibrada, dividida

    entre todos os membros da famlia, inclusive e

    sobretudo, com o dependente qumico.

    Uma das outras caractersticas marcantes da

    famlia codependente privar o dependente

    qumico de suas responsabilidades e das consequncias de seus atos. Esposas tomam

    para si as despesas do lar, o cuidado com os

    filhos, com a casa, a preocupao em manter a

    relao e a famlia unida. Muitas vezes, mentem

    para os chefes de seus maridos, justificando

    suas ausncias no trabalho por motivos diversos,

    quando estes estavam, na verdade, na ressaca do

    dia anterior.

    Pais pagam todas as despesas para filhos que no

  • #18

    [ o q

    ue codepen

    dncia ]

    estudam e nem trabalham, mas utilizam seu tempo

    livre para fazer uso de drogas. Quando situaes

    complicadas ocorrem como resultado do uso, os pais

    arcam com os danos, com os resultados, evitando

    que os filhos passem pela experincia dolorosa da

    consequncia de uma ao irresponsvel. E, quando

    fazem o menor esforo por algo, so recompensados

    com honrarias, as quais no valorizam em nada

    e logo as descartaro, muitas vezes, trocando-as

    por drogas.

    Exemplos? O filho pego com drogas e deve

    ser levado Justia Teraputica para participar

    de grupos de apoio e/ou prestarem servios

    comunitrios. Os pais chegam antes, e querem

    pagar para que o filho no passe pelo processo de

    ser penalizado pelo ato cometido.

    Outro exemplo: o filho passa alguns meses numa

    comunidade teraputica para se tratar. Ao sair, os

    pais querem recompens-lo pelo esforo de ter

    passado pelo processo teraputico. O filho pede

  • #19

    [ o q

    ue codepen

    dncia ]

    um carro, uma moto. Os pais o presenteiam.

    Logo o bem se tornar moeda de troca para o uso

    de drogas.

    Isso quer dizer que os pais no devero nunca

    mais presentear seus filhos ou recompens-los

    positivamente por comportamentos adequados?

    No. Porm, as famlias codependentes

    normalmente esto com estes parmetros

    comprometidos, querem compensar demais o

    que, na verdade, no mais do que obrigao.

    Afinal, se voc passar um perodo no hospital para

    tratar sua diabetes dever ganhar um carro como

    recompensa? Ou ainda ter que voltar para casa e

    se adequar a uma nova dieta, a um novo estilo de

    vida se quiser manter-se saudvel e no retornar

    novamente ao hospital? E no a dependncia

    qumica uma doena crnica, assim como

    a diabetes?

    Eis a, mais uma questo: a grande dificuldade da

    famlia em entender que dependncia qumica

  • #20

    [ o q

    ue codepen

    dncia ]

    uma doena, reconhecida pela Organizao

    Mundial da Sade, e como tal, precisa de

    tratamento, que inclui todo o sistema familiar

    impactado por ela.

    Estes comportamentos, aliados falta de limites,

    dificuldade em dizer no, necessidade de

    agradar sempre, de ser aceito pelo outro, fazem

    com que o familiar mantenha um padro de

    atitudes facilitadoras para com o uso de drogas

    de seu ente querido. Na maioria das vezes, sem

    saber ou sem perceber, por meio destas atitudes

    equivocadas, ao invs de proporcionar uma crise,

    uma ruptura para que surja a possibilidade de

    mudana, o familiar continua mantendo as coisas

    funcionando da mesma forma e o seu ente usurio

    vai s caminhando, cada vez mais, em direo s

    situaes extremas de uso e abuso de drogas.

    E por falar em dificuldade em dizer no... como difcil isto para um familiar de dependente qumico. Aquilo que para quem

  • #21

    [ o q

    ue codepen

    dncia ]

    est fora da situao parece to simples, para

    ele tarefa homrica. Por qu? Normalmente,

    o lar que propiciou o desenvolvimento da

    dependncia qumica j trazia esta falta de

    regras, disciplinas, limites. Seja por qual for o

    motivo, havia a dificuldade em falar no. Ou,

    no outro extremo da situao, os lares que

    falavam muitos nos no davam espao

    para que eles fossem entendidos, permeando

    os ambientes com autoritarismo, hostilidade,

    frieza, onde as crianas no podiam manifestar

    seus sentimentos.

    De uma forma ou de outra, o problema estava na

    comunicao. E este um grande problema nas famlias que abrigam a dependncia e a

    codependncia: os problemas na comunicao.

    Falta de assertividade, dificuldade em dizer no,

    brigas constantes, segredos de famlia, duplas

    mensagens, falta de comunicao honesta,

    dificuldade em expressar sentimentos e em

    discutir problemas.

  • #22

    [ o q

    ue codepen

    dncia ]

    A necessidade de agradar, muito presente no perfil codependente, parece estar

    atrelada forma que o indivduo encontra de

    sentir-se til, j que no se sente amado. Em

    virtude das vivncias opressoras de longa data,

    muitas vezes desde a infncia, esta pessoa

    entendeu que os sentimentos no tinham valor,

    que no deveriam ser expressos, se sentiu

    abandonado, inferior, rejeitado, insignificante

    e passou a ter vergonha de suas necessidades

    e carncias. Com a autoestima bastante

    comprometida, passou a achar que no seria

    merecedor de amor, mas que poderia agradar

    aos outros sendo til e necessrio. Surge assim a

    necessidade de ser necessrio, que motiva tantos

    codependentes a lutas infindveis pela vida dos

    outros para que suas vidas paream ter sentido.

    Quantos, infelizmente, no se sentem vazios e

    perdidos quando seus entes queridos entram em

    recuperao, por no mais terem aquele problema

    para cuidar, aquela necessidade na vida de outrem?

  • #23

    [ o q

    ue codepen

    dncia ]

    Neste momento teriam ento que olhar para si

    mesmos, cuidar de si mesmos, deixar de serem

    necessrios para os outros. Como o caminho

    doloroso, muitos preferem no percorr-lo. neste

    momento que muitas esposas de dependentes

    em recuperao que no buscaram tratamento

    para si mesmas no conseguem conviver com o

    marido saudvel, desfazem o casamento e iniciam

    um novo relacionamento com outro dependente

    qumico. Voc j ouviu alguma histria assim?

    Quanto aos limites, outro foco de ateno para o tema, estes normalmente esto

    disfuncionais sob todos os aspectos. As

    famlias de dependentes, provavelmente, nunca

    souberam impor limites, portanto continuam a

    no saber durante o uso, o tratamento e, se no

    forem tratadas, continuaro assim por toda a

    vida. Aceitam situaes que para a maioria das

    pessoas seriam absurdas, humilhantes, extremas,

    inaceitveis. Porm, assim como no sabem impor

    limites, tambm no os respeitam. Invadem a vida

  • #24

    [ o q

    ue codepen

    dncia ]

    do outro, sua privacidade, sempre mostrando o

    desejo de cuidar e ajudar.

    Outra caracterstica importante do codependente

    que muito se assemelha do dependente

    relembrando o espelho que travamos no incio

    deste livro a autopiedade. Sempre que nos recusamos a assumir a responsabilidade por

    ns mesmos, ns assumimos o papel de vtimas.

    bastante comum as esposas de dependentes

    qumicos vestirem este papel para si e para os

    outros, afinal, ele o carrasco que usa drogas

    e ela a boa moa, que ajuda, apoia, trabalha,

    cuida da casa e dos filhos. Como ela aguenta?

    Porm, quando lembramos que no sistema

    familiar existe uma retroalimentao e que o

    comportamento de um afeta o do outro, e que h

    responsabilidade de ambas as partes, no existem

    vtimas, nem culpados, mas pessoas responsveis

    pelas situaes em que se encontram e capazes

    de mud-las. Como durante muito tempo as

    famlias convivem com a culpa e no com a

  • #25

    [ o q

    ue codepen

    dncia ]

    responsabilidade, elas tendem a se sentir vtimas e

    no donas de suas prprias vidas.

    No livro Codependncia nunca mais, Melody Beattie aponta o Tringulo do Drama criado por

    Steven Karpman para demonstrar como funciona

    este processo tambm na vida do codependente

    que transita entre os papis de vtima, salvador

    e perseguidor, as trs pontas do tringulo, em

    questo de segundos, sem perceber.

    O salvador o tomador de conta, que tudo

    resolve, que tudo conserta, que ajuda a todos,

    que no deixa que a vtima faa o que pode fazer

    por si mesma. Mas, rapidamente passa a ser

    perseguidor quando a vtima no lhe grata pela

    ajuda oferecida, por no ter sado tudo como ele

    queria, por ter feito mais do que devia, ento fica

    raivoso. Quando pensa que todos os esforos

    foram em vo, ressente-se e volta ao papel

    principal: a vtima. Nada d certo para ele, nada

    funciona como deveria funcionar, ele uma vtima.

  • #26

    [ o q

    ue codepen

    dncia ]

    Para iniciar um processo de mudana, assumindo

    a responsabilidade por seu comportamento,

    o codependente precisa libertar-se da trama

    limitante dos papis deste tringulo.

    Alm das caractersticas marcantes, que acabam

    por modelar o modelo de comportamento do

    codependente, existem os sentimentos presentes

    em seu cotidiano, com os quais todos os que

    sofrem com a dependncia qumica de um ente

    querido convivem.

    Estes sentimentos no esto somente descritos

    nos livros ou artigos dos estudiosos internacionais,

    mas so dados de pesquisa cientfica nacional,

    a primeira realizada com 500 familiares de

    dependentes qumicos dos grupos de Amor-

    Exigente na cidade de So Paulo, pela Unifesp/

    Uniad em 2009.

    Na ocasio, os familiares citaram que os

    sentimentos presentes em seu dia a dia eram:

  • #27

    [ o q

    ue codepen

    dncia ]

    vergonha, tristeza, impotncia, dor, solido,

    angstia, desespero, pena, decepo, medo,

    culpa, da qual j falamos, e raiva.

    Comeando pela raiva. Quanta raiva possuem os codependentes! Raiva do outro, raiva de si,

    raiva do mundo. Raiva pela tristeza, pela dor, pelo

    medo, pela culpa. Raiva por tentar salvar e no

    conseguir, por no ter controle sobre o outro, raiva

    por ter raiva, por no saber lidar com a raiva, que

    vai virar ressentimento. Tanta carga emocional mal

    canalizada, por vezes no podendo ser expressa

    ou sentida, por outras, estupidamente lanada

    pessoa errada, quase sempre causa estrago ao seu

    redor. Como uma bomba-relgio, o codependente

    vive prestes a explodir... ou a implodir, o que pode

    se tornar uma doena fsica ou psquica.

    J o medo, grande medo! Como ele se engrandece na vida dos codependentes. Medos

    reais se misturam aos imaginrios. Medo de agir,

    de criar caso, de gerar crise, de ter que tomar

  • #28

    [ o q

    ue codepen

    dncia ]

    atitude. Medo da separao, medo da intimidade,

    da tristeza e da felicidade. Medo que se torna

    angstia e que alimenta a ansiedade, dia a dia,

    roubando a serenidade de uma vida tranquila.

    a vergonha, por sua vez, companhia constante, principalmente no incio. Caminha com

    a negao e mesmo quando vem a aceitao,

    a famlia ainda passa anos sem procurar ajuda

    porque tem vergonha de falar do assunto. Na

    comunidade, na igreja, na famlia, na escola,

    s vezes, at dentro da prpria casa, o segredo

    impera. O codependente se sente solitrio nesta

    histria, acha que s ele vivencia tamanha dor, tem

    vergonha de falar do problema, pois acha que a

    culpa (que ele j sente!) recair sobre ele, mais uma

    vez! Infelizmente, este sentimento responsvel

    por mais um tempo no processo de busca por

    ajuda. Enquanto a doena progride, a famlia est

    mergulhada na vergonha e com ela, na solido, afinal, constrangida, ela no busca apoio, se sente

    a nica com tamanho problema no mundo.

  • #29

    [ o q

    ue codepen

    dncia ]

    Aliadas aos sentimentos descritos esto a tristeza, a dor, a decepo e a impotncia. Quantas emoes negativas, que drenam a energia e minam as possibilidades

    de viver com qualidade, fazem parte do cotidiano

    destas famlias. Sentimentos que se no

    transformados, certamente daro espao para

    o surgimento de doenas emocionais, o que

    desorganizar ainda mais o sistema familiar,

    diminuindo as chances de melhora dos outros

    membros da famlia. Ou seja, a doena de um cria

    a doena no outro.

    Como parar este ciclo?

    Agora, de acordo com as caractersticas

    que pudemos analisar, com os sentimentos

    que sabemos fazer parte da vida de um

    codependente, de como ele impactado pela

    doena de seu familiar, podemos, finalmente,

    introduzir alguns conceitos j publicados na

    literatura nacional e internacional. Assim, creio

  • #30

    [ o q

    ue codepen

    dncia ]

    que aps a construo acima, temos mais

    condies de entender o que codependncia

    dentro do conceito apresentado por cada autor.

    No livro Codependncia nunca mais, Melody Beattie, afirma que um indivduo codependente

    algum que permite que o comportamento de

    outra pessoa o afete, e sente-se obcecado por

    controlar o comportamento do outro. Neste

    conceito, podemos encontrar a questo da

    circularidade, ou seja, de como o comportamento

    de uma pessoa afeta o de outra dentro do sistema

    familiar e de como isso impactante na famlia

    que sofre com a dependncia qumica. Tambm

    encontramos o aspecto do comportamento

    obsessivo e do controle.

    Os assistentes sociais, especialistas em

    dependncia qumica em Minessota, Ronald e Pat

    Potter, concluem que as famlias de dependentes

    qumicos podem ser modelos para obter

    informaes sobre a codependncia, contudo

  • #31

    [ o q

    ue codepen

    dncia ]

    outras circunstncias familiares poderiam produzir

    padres similares, particularmente famlias com

    problemas crnicos negados, como incesto e

    doenas mentais e sociais.

    Judith L. Fischer, PhD, e Lynda Spann, MS, ambas

    pesquisadoras da Texas Tech University, nos

    Estados Unidos, definem codependncia como padro disfuncional de se relacionar com os

    outros com um foco extremo fora de si mesmo,

    a falta de expresso aberta de sentimentos, e as

    tentativas de obter um senso de propsito por

    meio de relaes com os outros.

    Para a irmandade Codependentes Annimos,

    baseada no programa de 12 Passos de Alcolicos

    Annimos, codependncia a inabilidade de

    manter e nutrir relacionamentos saudveis com os

    outros e consigo mesmo.

    Maria Aparecida Junqueira Zampieri, no livro

    Codependncia o transtorno e a interveno em

  • #32

    [ o q

    ue codepen

    dncia ]

    rede diz que a codependncia tem sido definida mais frequentemente como uma condio

    emocional, psicolgica e comportamental, como

    um padro relacional. A autora apresenta critrios

    diagnsticos para a classificao da codependncia

    como um transtorno de personalidade, e vem

    realizando estudos para classific-la como doena.

    Para Lygia Vampr Humberg, psicanalista, mestra

    em cincias, a codependncia deve ser encarada

    como uma doena crnica assim como

    diabetes e hipertenso, portanto exige contnua

    vigilncia. A possibilidade de desenvolvimento da

    dependncia da pessoa, revelando-se na relao

    com um outro que tenha uma possibilidade

    complementar, posto que uma dependncia do

    vnculo dos dois, destaca a autora em sua tese

    de mestrado.

    Nesta ideia, assim como na dos demais autores, o

    conceito de codependncia est ampliado, no se

    limitando aos familiares de dependentes qumicos,

  • #33

    [ o q

    ue codepen

    dncia ]

    porm, mais especificamente na tese de Humberg,

    fica mais prximo o conceito da dependncia

    afetiva com o de codependncia, j que ela aponta

    como fator principal a dependncia do vnculo,

    que necessita de um outro complementar.

    Diante da inviabilidade diagnstica dos conceitos

    de codependncia, o que podemos, com exatido,

    pontuar que estamos diante de uma condio

    emocional em que se destacam as relaes

    que variam em graus de disfuno e os

    comportamentos que so afetados por outros e

    afetam aos outros, se tornando estereotipados e

    tambm disfuncionais.

    Se estamos falando em condio emocional,

    sabemos que podemos modific-la, transform-

    la. Afinal, no um diagnstico, como falamos

    l no incio, uma condio. Podemos e temos

    dentro de ns todas as ferramentas para sair desta

    condio, porm, para encontrar tais ferramentas,

    precisamos conhecer o caminho, ou seja, nos

  • #34

    [ o q

    ue codepen

    dncia ]

    conhecer. Traamos ento, a primeira meta:

    autoconhecimento, que traz consigo aceitao

    da situao, de si, dos seus erros, acertos,

    condio. Percorrendo este caminho, comeamos

    a conhec-lo e poderemos ento encontrar as

    tais ferramentas que nos ajudaro no processo

    de mudana.

    Importante lembrar, porm, que para iniciar

    esta jornada de autoconhecimento preciso

    se desligar do outro emocionalmente para

    cuidar de si. Como poderemos cuidar de ns,

    nos conhecermos, gastar nosso tempo e energia

    conosco, se estamos obcecados em controlar o

    comportamento do outro? Tambm importante

    libertar-se da negao e aceitar nossa condio

    emocional, sem culpas, sem mgoas, mas com

    o olhar no futuro, na possibilidade de ser e

    fazer diferente.

    Neste caminho, precisaremos perder a vergonha,

    entender que no estamos sozinhos, que existem

  • #35

    [ o q

    ue codepen

    dncia ]

    milhares de pessoas no mundo que sofrem esta

    mesma dor que ns. E quando abrirmos mo da

    culpa, de toda e qualquer culpa, e abraarmos a

    responsabilidade por nossas escolhas, por nossas

    vidas, teremos encontrado a caixa de ferramentas

    que nos permitir, pouco a pouco, arrancar as

    ervas daninhas de nosso jardim o medo, a

    raiva, a dor, o desespero, a angstia, a pena, a

    impotncia, a decepo e plantar as sementes

    das flores que queremos ver desabrochar em

    nossas vidas: respeito, amor-prprio, autoestima,

    paz, harmonia, limites, assertividade, unio,

    esperana, aceitao, desapego, alegria,

    serenidade, amor.

    E, assim, plantaremos todas as outras flores

    e frutos que desejarmos ter no jardim de

    nossa existncia, e faremos de nossas mazelas

    emocionais o adubo para a resilincia necessria

    na construo de uma vida saudvel, equilibrada e feliz.

  • #36

    [ o q

    ue codepen

    dncia ]

    a autOra

    Jornalista, escritora, terapeuta familiar e

    pesquisadora em famlias de dependentes

    qumicos. Atuou como diretora de redao da

    Revista Annimos, assessora de comunicao da FEAE (Federao de Amor-Exigente),

    apresentadora do programa Amor-Exigente na Rede Vida e do programa Uma S Palavra na

  • #37

    [ o q

    ue codepen

    dncia ]

    TV Aparecida e Net Cidade e colunista da Jovem

    Pan na campanha Pela Vida, Contra as Drogas.

    Foi idealizadora, coordenadora e docente do curso de Orientao e Aconselhamento de

    Familiares da Febract (Federao Brasileira de

    Comunidades Teraputicas), pesquisadora da

    Uniad-Unifesp-Inpad no Levantamento Nacional

    de Familiares de Dependentes Qumicos, realizado

    em 2013 sob a coordenao do dr. Ronaldo

    Laranjeira, palestrante da primeira edio do

    CONDEQ (Congresso de Dependncia Qumica)

    e escritora da biografia de Padre Haroldo Rahm, SJ

    (Uma s palavra - Ed. Loyola).

    Atualmente coordenadora do Programa

    Recomeo Famlia do Governo do Estado

    de So Paulo e coordenadora do curso de

    Aconselhamento e Intervenes Familiares em

    Dependncia Qumica do Instituto Independa.

    Mais informaes: www.codependencia.com.br

  • #38

    [ o q

    ue codepen

    dncia ]

    [O QUE CODEPENDNCIA]

    Este livro de Romina Miranda objetiva ampliar o conhecimento sobre o tema, alm de conscientizar e mobilizar para uma mudana de valores e atitudes todos aqueles que desejam conhecer melhor a

    codependncia e a dependncia qumica.

    Esta a primeira edio. Para ter acesso edio atualizada, entre agora em

    www.oqueecodependencia.com.br

    O Instituto Independa acredita que o conhecimento pode efetivamente transformar vidas, e est empenhado em apresentar o melhor contedo e tcnicas inovadoras, eficazes e eficientes, incentivando as pessoas a despertarem para uma nova conscincia, superando seus desafios e

    encontrando seus caminhos de liberdade e felicidade.

    Acompanhe o melhor contedo sobre dependncia qumica:

    www.paraentender.com.br