o homem sem qualidades, mesmo
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testo de Elida Tessler o Homem Sem Qualidades, MesmoTRANSCRIPT
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O HOMEM SEM QUALIDADES, MESMO
Elida Tessler 1
Resumo
Este artigo desenha um dilogo entre duas obras emblemticas da produo artstica do
sculo XX: a literatura de Robert Musil e o trabalho plstico de Marcel Duchamp.
Mostro a radicalidade destes dois processos de criao que colocam em cena um
exemplar trabalho com a linguagem. Estas obras nos permitem ver o inacabado e a
dimenso de equivoco presente em toda produo de linguagem.
Palavras-chaves: Robert Musil, Marcel Duchamp, literatura , artes visuais
Abstract
This article draws a dialogue between two emblematic works of the artistic production
of the twentieth century: the literature of Robert Musil and the plastic work of Marcel
Duchamp. Show the radicalism of these two processes of creation that put on the scene
un exemplary working with the language. These works allow us to see the unfinished
and the dimension of equivocal throughout the production of language.
Key-words: Robert Musil, Marcel Duchamp, literature, visual arts.
Alis, so sempre os outros que morrem2
Marcel Duchamp
O artista um inventor de lugares. Todo o seu empenho concentrado em criar
situaes especficas de onde se pode ver e re-configurar um espao, abrindo frestas por
onde seja possvel passar e mudar de posio. A arte prope questes de
1 Artista plstica, professora no Instituto de Artes da UFRGS. Pesquisadora do CNPq. Atualmente realiza
ps-doutorado na EHESS- Ecole des Hautes Etudes em Sciences Sociales e Universit de Paris I com bolsa
CAPES. Fundadora e coordenadora, junto com Jailton Moreira, do TORREO, centro de produo e
pesquisa em arte contempornea, Porto Alegre.
2 Frase escolhida por Marcel Duchamp para estar inscrita em seu tmulo, no cemitrio de Rouen, Frana.
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posicionamento e de deslocamento. Portanto, o tempo elemento indissocivel em toda
criao artstica. Vejamos: o melhor comear pela minha posio de hoje.
Estou em uma biblioteca, com todos os meus livros, caderno de anotaes,
caneta azul e vermelha, como tubos de ensaio colocados sobre uma mesa branca, ampla,
diante de uma janela. Estou em uma ambiente cuja arquitetura me oferece vidros por
todos os lados, e paisagens de um tempo que eu no vivi. Estou fora? Estou dentro?
Pode a arte e a literatura provocar tamanha transposio? Com tantos livros ao meu
redor, considero legtimo evocar mais uma vez a imagem de um tubo de ensaio. Tubo
de cultura, onde dois ou mais elementos distintos esto destinados a nos revelar o sim e
o no de uma tentativa de amlgama.
Intuitivamente, percebi relaes fortes entre o romance O homem sem
qualidades de Robert Musil e a obra de Marcel Duchamp La marie mise nu par ss
clibataires, mme.3 De fato, estas obras so colocadas lado a lado na histria da
cultura ocidental como marcas fundamentais, na literatura e nas artes plsticas por
serem, ambas, obras inacabadas. Tentei condensar, assim, os dois ttulos em um s,
propondo um trabalho artstico desenvolvido no perodo de um ano, entre 2007 e 2008,
com o seguinte ttulo: O homem sem qualidades, mesmo. Procurarei relatar um pouco
do trabalho e como este inusitado encontro ocorreu em meio s minhas pesquisas
daquele momento.4
Desde muito cedo, tanto eu como vocs escutamos dizer: A pintura uma
janela aberta para o mundo. Pois bem, pelo menos desde que inventaram a perspectiva,
e a partir de ento, questes de representao tornaram-se fundamentais para a histria
da arte. A pintura deveria remeter realidade com o mximo de detalhes possvel. A
partir do sculo XV, o que vemos no quadro deve reproduzir com exatido aquilo que
visto pela janela. O lance deixar-se confundir. Trompe-loeil.
Robert Musil, atravs da voz de sua personagem Ulrich, procura nos esclarecer
acerca das relaes entre o senso de realidade e o senso de possibilidade: Quem o
possui (o senso de possibilidade), no diz por exemplo: aqui aconteceu, vai acontecer,
tem que acontecer isto ou aquilo; mas inventa: aqui poderia, deveria ou teria de
acontecer isto ou aquilo; e se lhe explicarmos que uma coisa como , ele pensa: bem,
provavelmente poderia ser de outro modo. (Musil, 2006, p. 34) Eis o que tanto
aproxima Marcel Duchamp e Robert Musil.
3 MARCEL DUCHAMP e ROBERT MUSIL so contemporneos, com produes que marcam a histria da cultura ocidental do sculo XX. Duchamp nasceu em 1887, na cidade de Blanville e morreu
em 1968, em Neuilly, Frana. Musil nasceu em 1880, em Klagenfurt, Austria, e morreu em 1942, em
Genebra, Suia. 4 A partir deste momento, adotaremos somente a traduo para o portugus do ttulo da obra de Marcel
Duchamp A NOIVA DESNUDADA POR SEUS CELIBATRIOS, MESMO, preferindo a proposio
de Donaldo Schler que mantm a evocao da nudez na palavra desnudada, ao invs de despida,
proposta por tantos outros tradutores.
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Meu desejo aqui de evocar um encontro que me antecede. Eis a origem de
uma histria. Em todo caso, cabe aqui remontar a proposio do prprio Marcel
Duchamp a respeito do conceito de readymade, quando o deslocamento de um objeto
faz a obra. Readymade seria o j feito, o j pronto, um objet-trouv que, segundo o
artista, foi encontrado com alguma espcie de atraso. Marcel Duchamp tambm
considera o Grande vidro como uma espcie de encontro, um rendez-vous entre a
noiva e os seus celibatrios, como o readymade o encontro (amoroso?) entre o criador
e a criao. como se Duchamp quisesse colocar como equivalentes os dois atos
criadores implicados no amor e na arte.
Hoje eu olho pela janela, mas j no vejo atravs. Esqueo a sua transparncia e
distraio-me em sua consistncia vtrea. Esbarro na superfcie, no a atravesso. Invisto
em meu senso de possibilidade. Por uma terrvel coincidncia, o vidro est quebrado, ou
melhor, rachado. Fissuras delatam uma tenso. Por alguns segundos, tive a impresso de
que tudo o que eu gostaria de dizer neste texto, aproximando Marcel Duchamp e Robert
Musil, j estaria escrito no vidro trincado da janela minha frente. O texto se
encontraria aqui terminado, ponto final, eis tudo. Fala inacabada. E agora?
Provavelmente eu no saberei dizer melhor, nas prximas pginas, do que esta espcie
de marca de um impacto. Algo fez presso. Um disparo? Uma trepidao? Uma
vrgula? Imagino Marcel Duchamp, quando declara no poder fazer melhor do que o
incidente com seu trabalho durante um transporte de caminho. Sobre este acaso,
falaremos mais tarde. Por enquanto, sigo o desenho das linhas: cinco traos que se
expandem a partir de um ponto, chegando cada um a uma distncia diferente da
esquadria. Para fornecer mais dados imaginao de vocs, eu diria que este desenho
que vejo agora assume a estrutura inicial de uma teia de aranha.
Mas o que h de to terrvel na coincidncia do vidro trincado? Eu vim
biblioteca com o objetivo, justamente, de escrever o texto a partir das anotaes do
trabalho por mim apresentado no Congresso da Angstia, quando tentei compartilhar
com vocs a intuio que tive de que haveria um caso de amor entre um homem sem
qualidades e uma noiva desnudada. Ora, j tnhamos o ttulo do trabalho: O HOMEM
SEM QUALIDADES, MESMO. Era preciso falar de uma vrgula. Com este intuito,
iniciei minha apresentao, e a repito aqui, com um fragmento literrio que me
acompanha a cada novo livro que abro para ler:
Caminhos... A floresta tem mil caminhos e no tem caminho nenhum.
Caminhos que se abrem e se fecham. Para caminhar na floresta, preciso conhecer a
floresta: cada pinheiro, cada p de angico, cada rancho. Tudo se individualiza: os
sulcos da casca, a curvatura do galho, o cinza do telhado. A esto escrita, mapa. Voc
conhece gramtica e vocabulrio ou por aqui voc no anda. A floresta o geral, mas
isto no lhe basta. como se voc conhecesse o livro s de capa. Voc tem que entrar
nele. Vagarosamente, freqentemente. Cada vrgula importa(...). (Schuler, 2004, p.
xx)
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,
O artista respira. O artista prope pausas, tanto para si mesmo, quanto queles
que da obra usufruem. O artista aspira e transpira ao mesmo tempo. O artista, tal qual a
aranha, produz com suas secrees. Como colocar uma vrgula na histria da arte?
Considero o trabalho Fontaine de Marcel Duchamp uma grande vrgula.5 S
podemos falar de arte contempornea, na cultura ocidental, considerando o antes e o
depois desta proposio que, em si, constituda por um deslocamento: do espao
comum da vida cotidiana para o espao sacralizado do museu. Se a inveno da
perspectiva nos fez valorizar as questes de representao, eis que a inveno do
readymade pe em evidncia as formas de apresentao dos objetos que, em si, contm
as questes fundamentais e caras ao pensamento contemporneo, fragmentado e
ordenado artificialmente por estruturas impostas por um sistema de valores cujos
critrios quase sempre nos escapam.
Uma das mais conhecidas definies de readymade aquela proposta por Andr
Breton em seu artigo Le phare de la Marie 6 , escrito em 1934. Ali ele conceitua:
Readymades: objetos manufaturados promovidos dignidade de objeto de arte pela
escolha do artista. (Breton, 1935, p. 45) Mas o gesto no to simples, e no
podemos reduzi-lo a uma leviandade em relao aos cnones artsticos tradicionais. A
questo muito mais elaborada do que podemos aprofundar aqui, mas o que queremos
dizer que esta uma estratgia que envolve tempo e espao especficos, com critrios
de escolha por parte do artista, escolha esta que dispensa as qualidades estticas
reconhecidas como feio ou belo.
Vocs conhecem este trabalho, se no a obra em si, pelo menos o seu registro
fotogrfico, realizado por Alfred Stanglitz em 1917, publicado na revista Dada The
Blind man .Talvez vocs no tenham escutado ainda o ttulo Fontaine ou Fonte, e
sim, o seu hilrio apelido O urinol de Duchamp.
A escolha deste objeto foi estabelecida por Marcel Duchamp para configurar um
trabalho de sua autoria a ser enviada para a Sociedade dos Artistas Independentes,
formada em 1916, com a seguinte finalidade: montar uma exposio em Nova York nos
moldes do Salo dos Independentes em Paris, questionando os seus critrios de seleo
e apresentao de obras artsticas naquela poca. Duchamp escolheu e comprou um
5 Fontaine, 1917. Este trabalho assinado por Richard Mutt, pseudnimo de Marcel Duchamp, e enviado
ao Salo dos Artistas Independentes de Nova York. O comit de seleo recusou o trabalho, temendo o
descrdito que esta obra traria ao Salo. Marcel Duchamp, que fazia parte, como presidente, do comit
de montagem pede demisso e torna pblica a sua autoria da obra
6 O farol da noiva
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mictrio de porcelana, modelo Bedfordshire, na loja J.C.Mutt Iron Works, que vendia
equipamentos sanitrios.
Duchamp levou o mictrio para seu estdio, virou-o de cabea para baixo e
pintou, na borda inferior esquerda, o nome R. MUTT e ps a data 1917. Mesmo o seu
pseudnimo j seria uma espcie de readymade.7 Marcel Duchamp estava cansado de
conviver com as premissas de um sistema de arte que no condiziam com os desafios
que a vida moderna oferecia sociedade em geral, e aos artistas em particular. A
manuteno das fronteiras entre distintas categorias da arte, tal como pintura, escultura,
desenho, fotografia, j no convinha s produes recentes.
A criao de Robert Musil tambm nos apresenta um homem que est cansado:
Ulrich. Seu pai um homem com qualidades, e prev para o filho uma srie de xitos
que exigem disposio. Cansado de seu prprio cansao, a personagem principal do
romance O homem sem qualidades decide tirar frias de si mesmo por um perodo de
um ano. De si mesmo, reforo. Um si mesmo que no faz sentido, a no ser pelo
apontamento de uma civilizao inteira em esgotamento de valores, j que o romance
inicia em 1913, s vsperas de uma primeira guerra. em 1919 que Musil comea a
elaborar o romance, com o ttulo provisrio de O espio. A primeira parte do romance
concluda em 1930 e todo o decorrer da elaborao de O homem sem qualidades
abarca o perodo entre-guerras, e por conseqncia, a ascenso do nazismo. Entre 1919
e 1931, ele trabalha intensamente em seu romance. A publicao do segundo volume se
d em 1933. Com Hitler j no poder, Musil deixa Berlin e passa a viver em Viena. O
mal estar dos indivduos decorrente de situaes da vida moderna que impe desafios,
e estes devem ser enfrentados, porm sem os recursos de subjetividade suficientes para
crises sucessivas que se desenrolam, seja de identidade, seja da capacidade de narrar s
novas experincias pelas quais o homem est passando. Pelo menos, deste mal que
Ulrich sofre: uma incapacidade de integrar-se exatamente quilo que ele vive, de
realizar um elo entre si e o mundo exterior. Frias de si mesmo, que atitude tentadora!
Suas frias, que duram exatamente 1267 pginas na traduo do romance para o
portugus, constituem tambm uma grande e bonita vrgula:
A questo que coloca Ulrich, quando ele assume a impossibilidade de ligar os
acontecimentos a si mesmo traduz uma inquietude cujas implicaes so, ao mesmo
tempo ticas, pessoais e histricas. Esta inquietao, em sua simplicidade conjuga, no
seio da mesma exigncia, duas questes grandes, questes que do ao romance a sua
plena significao: Como viver? e por que no fazer histria? (Cometti, 1997, p.
109)
Nos dirios de Musil, anotaes acerca das personagens que circulam em torno
de Ulrich acabam por mesclar-se prpria biografia do autor, de maneira to estreita
que tudo nos leva a acreditar no carter sempre auto-referente de toda obra de arte. Mas
7 Ver o livro de TOMKINS, Calvin. Marcel Duchamp: uma biografia. SP, Cosacnaify, 2005, p. 204/205
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as dificuldades esto ali colocadas: em uma das notas, entre 1939 e 1941, encontramos:
Eu no sei porque, no consigo mais escrever. Eu seco 8
Voltamos aqui a nossa questo da vrgula como pausa, como respirao. Musil
seca, a saliva falta, e sem esta secreo orgnica, o homem sem qualidades encontra o
destino de uma obra inacabada. Enquanto isso, Marcel Duchamp respira: Gosto mais
de viver, de respirar, do que de trabalhar. Eu no considero que o trabalho que eu fao
possa ter alguma importncia do ponto de vista social no futuro. Ento, se voc quiser,
minha arte seria a de viver : cada segundo, cada respirao uma obra que no est
inscrita em parte alguma, que no nem visual nem cerebral. uma espcie de euforia
constante9
A inveno do readymade um ato diante do abandono da pintura no sentido de
ser uma ao deflagrada pela pausa. Com esta parada Marcel Duchamp agiu sobre a
histria da arte. Segundo Thierry du Duve, o abandono da pintura por Marcel Duchamp
foi uma estratgia similar ao abandono do claro/escuro por Monet, do abandono da
perspectiva por Czanne, do abandono da figura por Kasimr Malvitch.10
O que est em
questo aqui so gestos de ruptura fundamentais para quem no assume as polaridades
to tirnicas da histria da arte, que nos fazem conceber isto ou aquilo, sem considerar a
possibilidade de convivncia de diferentes atitudes artsticas configurando uma s
linguagem.
Ser interessante reproduzir neste momento um fragmento de dilogo entre
Marcel Duchamp e Pierre Cabanne, pois este tambm nos aproxima de algumas
proposies distradas de Ulrich. Pierre Cabanne pergunta a Duchamp: Como voc
chega a escolher um objeto de srie, um readymade, para fazer uma obra de arte? Ao
que o artista responde: Eu no queria fazer uma obra de arte, observe. A palavra
readymade s apareceu em 1915, quando eu cheguei aos Estados Unidos. Ela me
8 Ver esta citao no livro de COMETTI, Jean Pierre.Lhomme exact Essai sur Robert Musil, Paris,
Editions du Seuil, 1997. p.93
9 Ver esta citao no livro de CABANNE, Pierre. Marcel Duchamp: Engenheiro do tempo perdido. SP,
Perspectiva, 2008, p. xx
10 Ver o livro de DE DUVE, Thierrry. Nominalisme Pictural Paris, Ed. Minuit, 1984 p.222
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interessou como palavra, mas quando eu coloquei uma roda de bicicleta sobre um
banquinho de cozinha, de cabea para baixo, no havia nenhuma idia de readymade,
nem mesmo qualquer outra coisa. Era simplesmente uma distrao. Eu no tinha
nenhuma razo determinada para fazer aquilo, nem inteno de exposio, de
descrio, no, nada disso!(Cabanne, 2008, p. 79)
Nesta mesma entrevista, encontraremos: Toda minha vida consegui viver com
muito pouco dinheiro. Eu preencho meu tempo muito facilmente, mas no saberia
contar o que eu fao (...) um respirador. Sinto o maior prazer nisto.(Cabanne, 2008, p.
xx)
m
Aqui, a virgula no separa: ela une. Rene duas obras contemporneas, com
caractersticas prprias. A primeira, j vimos, O homem sem qualidades de Robert
Musil. A segunda, que talvez muitos de vocs conheam pelo apelido de O grande
vidro uma das mais radicais proposies da arte contempornea, de autoria de Marcel
Duchamp, sob o ttulo A noiva desnudada pelos seus celibatrios, mesmo. Lembrem-se
de que este trabalho composto por duas superfcies de vidro contendo entre elas todos
os materiais utilizados pelo artista para conceber a obra: p, fios de chumbo, pigmentos,
fragmentos de desenhos realizados anteriormente. Duchamp j trabalhava neste projeto
h oito anos, quando algo da ordem do acaso aconteceu. No Brooklin, em 1923, as duas
placas de vidro foram colocadas em um caminho, uma sobre a outra, para que fossem
transportadas Califrnia. Diz o artista que o motorista ignorava totalmente as
qualidades fsicas, e portanto a fragilidade, daquilo que transportava. O resultado das
intercorrncias deste trajeto o que fez Duchamp gostar ainda mais de seu trabalho,
considerado at ento inacabado: o vidro trincou: Mas eu gosto destas rachaduras
porque elas no parecem vidro quebrado. Elas tem uma forma, uma arquitetura
simtrica. Melhor, eu vejo a uma inteno j pronta, de maneira que eu as respeito e
gosto.11
importante falar aqui destas duas obras inacabadas que desafiam a nossa
aspirao completude. Sabe-se que Marcel Duchamp nunca considerou O Grande
11 Registro do filme sonoro realizado em 1955 pela National Broadcasting Company e apresentado pela
TV americana. A entrevista foi realizada por James Johson Sweeney e publicada no livro de escritos de
Marcel Duchamp DUCHAMP DU SIGNE Paris, Flammarion, 1994, p.175/176
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Vidro uma obra terminada. Sua ltima interveno neste trabalho data de 1923.
Duchamp respeita as rachaduras como o resultado do acontecimento. Assume o vidro
trincado. Mas, para ele, esta uma obra sempre incompleta, pois a cada olhar, ela
prope novos acrscimos. Por exemplo, o seu posicionamento no Museu da Filadelfia
proposital: a obra colocada no centro da sala, de modo que se possa circular em torno
e ver, atravs de sua transparncia, outras transparncias, como a de uma janela com
vista para o jardim. Aqui, poderamos tambm retomar uma das proposies mais
conhecidas de Duchamp: So aqueles que olham que fazem o quadro (Duchamp,
1994, p. 23). A cada um de ns cabe uma interpretao.12
O romance de Robert Musil tambm uma obra inacabada. Os seus primeiros
manuscritos datando de 1919, a publicao do primeiro volume s aconteceu em 1930.
Em 1933, o segundo volume foi publicado. Musil sentiu a necessidade de revisar e
modificar a primeira parte do romance, o que acarretou uma nova publicao, aps
1933, em Genebra. Obra em progresso. Obra em processo. Obra inacabada. E ainda:
passou a fazer parte da lista de livros prejudiciais e indesejveis de 1938, estabelecida
pelo III Reich.
Marcel Duchamp sempre colocava bastante nfase na questo da elaborao da
obra, e por esta razo, no vejo como separar os seus escritos, as suas anotaes acerca
da realizao de seus trabalhos e tambm ensaios crticos a respeito da obra de outros
artistas seus contemporneos. O processo de elaborao de uma obra equivale ao da
criao de um pensamento. Podemos mesmo sublinhar aqui o valor de um trabalho em
processo, de um work in progress, seja em Marcel Duchamp, seja em Robert Musil, ou
ainda em James Joyce, para no ir muito longe. A vida, como a arte, um processo,
mesmo.
Todo o trabalho de Duchamp auto-referente. Como j assinalei, seus escritos
no podem ser distanciados de suas proposies artsticas. Eis que encontramos o seu
nome prprio no ttulo de um primeiro livro, com notas organizadas por Michel
Senouillet, com a colaborao do prprio artista, revistas e ampliadas inmeras vezes
em 1958: Marchand du Sel. 13
A traduo literal nos oferece: Mercador de Sal. Mas e a
presena do nome? Vamos acompanhar a sonoridade do ttulo, deslocando algumas
slabas: Mar Sel du chand = Marcel Duchamp.14
Ora, encontraremos tambm o nome do
artista no ttulo que j tanto nos intrigou at este momento: La marie mise par ses
clibataires mme. Como em um caa-palavras, podemos aqui reconhecer e demarcar
as slabas: La MARie mise nu par ses CELibataires, mme. Para quem j assumiu o
pseudnimo feminino Rrose Slavy, fica evidente a atitude irnica, com carter ertico,
deste artista que marcou to profundamente a histria da arte moderna e contempornea.
12
Ver a citao de Duchamp: Somme tout, lartiste nest pas seule accomplir lacte de creation car le
spectateur tablit le contact de loeuvre avec le monde extrieur en dchiffrant et en interprtant ses
qualifications profondes et par l ajoute sa propre contribution au processus creative (Duchamp, 1994, p.
189)
13 MARCHAND DU SEL o mercador de sal , o primeiro conjunto de textos de Marcel Duchamp
publicados em 1958 Editions du Terrain Vague em Paris. 14
Ver DUCHAMP, Marcel. Duchamp du Signe.Paris, Flammarion,1994. Notas de apresentao do livro.
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Na segunda publicao de Marchand du sel, j com o ttulo Duchamp du signe
Senouillet abre o seu prefcio com a seguinte proposio de Robert Desnos: Rrose
Slavy conhece bem o mercador de sal. (Duchamp, 1994, p.11) Temos novamente
aqui um encontro marcado, indicando um envolvimento de Duchamp com questes de
identidade. Para quem no sabe, em 1929, o artista faz nascer em Nova Iorque, com a
sua fina ironia de sempre, Rrose Slavy. Rose vem tambm de um quadro de Francis
Picabia, Loeil cacodylate no qual pediu para que muitos outros artistas assinassem seu
nome. Duchamp assinou: Pi Quhabilla Rrose, ainda deleitando-se na sonoridade do
nome de seu amigo. Em portugus, teramos simplesmente: PI que vestiu Rrose.
Duchamp est mais interessado em despir do que vestir.15
Mas eis o que ele mesmo diz:
Eu quis mudar de identidade e a primeira idia que me veio foi a de tomar um nome
judeu. Eu era catlico, e j seria uma mudana passar de uma religio a outra. Eu no
encontrava um nome judeu que eu gostasse ou que me tentasse, e de repente, tive uma
idia: por que no mudar de sexo. Rose sendo o nome mais feio para o meu gosto
pessoal (Duchamp, 1994, p. 151)
Para ns Slavy, um jogo de palavras fcil: Cest la vie!. a vida! Simples
constatao. Mas h a duplicao do R que nos intriga. Talvez a mesma repetio que
nos oferece Gertrude Stein: Uma rosa uma rosa uma rosa. Mas uma rosa a ser
regada. importante notar que em francs ou em ingls, rose anagrama de Eros. Eis
que o amor tambm deve ser regado, arros, Rrose. Nossa leitura possvel: A vida
cor-de-rosa. Rrose Slavy. A vida puro Eros.
Em algumas proposies artsticas, busca-se uma espcie de reunio de distintas
idias em um s trabalho. Escolhemos apresentar Tu m obra de Marcel Duchamp de
1918, pelo que o seu prprio ttulo indica de reflexividade e, sem dvida, pela
sonoridade elucidativa que nos evoca. Mme, me ame, mesmo....
Aps ter se proposto a no mais pintar, Marcel Duchamp aceita uma encomenda
de Katherine Dreier, que gostaria de ter um quadro em sua biblioteca. Havia uma srie
de indicaes, por exemplo, ele deveria caber em um espao estreito, acima de uma
estante de livros. Da, que o ttulo poderia tambm manifestar uma indignao do
artista, j que a contrao pode significar, na lngua francesa, T memerde. Voc me
incomoda! Voc me chateia! Tu m o ltimo quadro de Marcel Duchamp e pode ser
tambm ser considerado como um resumo de suas preocupaes. Neste trabalho, com a
tcnica do desenho e pintura, fixou as sombras projetadas de sua roda de bicicleta, de
seu porta-chapus, de um saca-rolhas e das rguas de um de seus trabalhos anteriores,
denominado Trois stoppages talon. No meio, Marcel Duchamp acrescentou uma mo
pintada por um profissional de tabuletas, incluindo a sua assinatura - A. Klang - O que
diz Duchamp:Era uma espcie de resumo das coisas que eu havia feito antes, posto
que o ttulo no tem nenhum sentido.16
Alm dos elementos j citados, a obra tambm
15
A ttulo de curiosidade, eis alguns ttulos de trabalhos de Marcel Duchamp evocando a nudez: Nu em
meias pretas (1910), Nu descendo a escada n1 (1911), Nu descendo a escada n2 (1912), O rei e a
rainha atravessados por nus rpidos (1912), A noiva despida... (1923)
16 Ver CHALUMEAU, Jean-Luc. Marcel Duchamp 1887-1968. Coleo Dcouvron lart, Cercle d'art,
1995 Ctait une sorte de resume des choses que javais fait plus tt, puisque Le titre na aucun sens.p.36.
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apresenta uma srie de amostras de tintas em formato romboidal, que percorrem uma
escala de cores que vai do amarelo brilhante ao cinza plido. Duchamp deixou para
Yvonne Chastel o tedioso trabalho de pintar esta parte. Mais uma vez algo referente ao
incmodo: T m! Calvin Tomkins, bigrafo de Duchamp que afirma ser esta uma das
quatro grandes obras primas do artista, assim a descreve: A primeira mostra (amarela)
est presa na tela por um pino de verdade, no pintado; do lado direito do
quadriltero amarelo est o que parece ser um rasgo na tela; embora o rasgo seja
pintado, ele est fechado por dois alfinetes de segurana reais. Uma escova de
limpar garrafas de verdade foi inserido no rasgo trompe-loeil; ela se estende cerca
de 60 cm para fora da superfcie do quadro. Embaixo do rasgo e um pouco
esquerda, v-se uma mo grosseiramente pintada; o dedo indicador est estendido e
aponta para a direita (Tomkins, 2005, p. 204/205)
O homem sem qualidades a sntese final, tanto da obra quanto da vida de
Robert Musil. Todas as obras anteriores do autor so uma espcie de preparao ao
Homem sem qualidades, toda sua vida parece ter sido direcionada para a escritura final
do romance. Como j dissemos a primeira parte foi publicada em 1930 e a segunda em
1933. A terceira parte, ainda organizada pelo autor, seria publicada em 1943, na Sua.
A edio de 1952 traz o acrscimo de um quarto volume, organizado por Adolf Fris e
baseado nas notas deixadas pelo autor.
Maime
O que que separa os celibatrios, os solteiros, da noiva? Quem despiu a noiva?
A noiva foi despida mesmo? A vrgula diz que a noiva foi despida mesmo. A vrgula
aqui pontua apenas um tempo de retardamento. Marcel Duchamp considera a pintura
retiniana, com cheiro de terebentina, um atraso. Chega a chamar seu trabalho por um
retard em verre, um atraso em vidro. Um comentrio acerca da pintura, ou o prprio
silncio em torno da atividade do pintor, se quisermos fazer valer uma de suas
fantsticas aliteraes: comment taire?17
Como um comentrio poderia fazer calar as
reflexes crticas e descabidas a respeito de uma obra sempre inacabada?
Em 1912, Marcel Duchamp declara:Chega de pintura! Procure trabalho! E
empregou-se na Biblioteca Sainte Genevive em Paris, como bibliotecrio. Em seus
17 Em francs vemos o jogo de palavras : comment taire? Como calar?
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escritos encontramos suas indicaes sobre a necessidade de estudar perspectiva na
referida biblioteca.18
Bem, o Grande Vidro uma espcie de janela. A noiva, neste caso, poderia ser
uma janela aberta para o mundo moderno, tanto quanto as pernas abertas pintadas por
Gustave Courbet, no quadro intitulado A origem do mundo ou da figura (masculina?
feminina?) atrs da porta do ltimo trabalho de Duchamp tant donns, uma obra que
foi inteiramente confeccionada em segredo, no perodo de 1946 a 1966. Somente sua
mulher Tennie e seu assistente conheciam o projeto e acompanharam sua execuo.
Para todos os seus amigos ou pblico em geral, Duchamp havia realmente parado de
trabalhar e apenas jogava xadrez. O trabalho foi construdo em um apartamento em
Nova Iorque. Foi todo pensado para ser deslocado para qualquer outro lugar. Ele s foi
definitivamente instalado em julho de 1969, no Philadelphia Museum of Art, na
Filadlfia, aps a morte do artista, seguindo as suas instrues. Alis, so sempre os
outros que morrem.
tant donns no uma pintura ou uma escultura no sentido tradicional. No
um readymade nem uma vitrine, apesar de fazer apelo ao nosso olhar e interceptar,
como condio sine qua non o nosso toque. uma instalao tridimensional, um espao
construdo, um environment. E s saberemos disso se formos suficientemente corajosos
para espiar o trabalho de perto. Muitos passam pelo trabalho sem se aproximar. Afinal
de contas, nada to banal quanto uma porta. Se formos curiosos, devemos parar,
observar, examinar, procurar o buraco da fechadura naquela imensa porta de madeira.
No vamos esquecer que os primeiros esboos do romance de Musil receberam o ttulo
provisrio O espio, que mais tarde definira-se por O homem sem qualidades. No
esta uma coincidncia que faz pensar? Porm, em Etant donn no h fechadura, no h
chave. O que faz uma porta de madeira velha em um museu de arte? O que haver atrs
dela? Algo para ver? H alguma coisa ali...
Associa-se a este trabalho deciso de parada, uma vrgula, na atividade de
pintor, quando ele declara, a partir de ento, dedicar-se ao jogo de xadrez. : No houve
uma deciso, eu posso voltar a pintar amanh, se eu quiser. Eu no acho que a pintura,
ou a idia de pintura, ou do pintor, ou do artista, convm hoje a minha atitude diante da
vida. Em outros termos, a pintura somente um instrumento. Uma ponte para ir alm.
Onde, eu no sei. E eu no posso saber, porque isso seria um pensamento to
revolucionrio em sua essncia, que eu no poderia nem mesmo formular. 19
18
Ver livro de Duchamp, Marcel. Duchamp du Signe. Encontrei um emprego como bibliotecrio na
Sainte-Genevive em Paris. Era um emprego remarcvel, no sentido que me deixava muitas horas de
lazer. Eu procurei um emprego a fim de pintar para mim (moi-mme). P. 179-180
19 Ver livro de SCHWARTZ, Arturo. Duchamp. Paris, Hachette-Fabbri, 1969, p. xx
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moi-mme
A gente pode fazer o que quiser, disse o homem sem qualidades para si
mesmo, dando de ombros que isso no tem importncia neste emaranhado
de foras.
Robert Musil
Fao agora, eu mesma, um exerccio: coloco-me perguntas acerca de um
processo de criao de um trabalho. Arrisco um movimento de oroboro: a cobra que
morde o prprio rabo, aludindo ao processo dinmico e transformador da vida. Meu
fim meu comeo, diz a cobra neste ato mgico de devorar-se e cuspir-se
representando a unidade indiferenciada da vida e seu carter divino implcito na
perfeio do crculo . A palavra oroboro pode ser lida de trs para frente, transmitindo a
idia de algo que se expressa ciclicamente. A serpente pensa. A serpente intelecto,
sendo o pensamento levado s ltimas conseqncias. O pensamento que se devora a si
mesmo tal a cobra que morde a prpria cauda. Foi Augusto de Campos que nos apontou
o sonoro palndromo silbico entre penser e serpent, que em francs opera
perfeitamente, Aqui, em transcriao ao invs de traduo, poderamos dizer: um
pensamento em serpentina, no eliminando a figura da serpente, e muito menos a de
uma fita de moebius que se alonga e, ao longo do discurso, cerca uma obra com
espirais, o que possibilita um contorno aerado.
Decido ento sublinhar todos os adjetivos do romance de Robert Musil.20
Preciso pensar o que define um atributo. Como eu poderia identificar as qualidades de
um homem sem qualidades? Percebo minhas dvidas e assim vou criando uma
gramtica intuitiva. Preciso confiar em uma listagem. Esta uma lista que deixa rastros.
De toda forma, h um tateamento do texto, pgina por pgina, linha por linha, quando
decido rasurar as palavras. Musil me ajuda em momentos importantes de dvida. Em
primeiro lugar, na pgina 335: sempre se procura o homem para os adjetivos. E mais
para o final, na pgina 1262: um corte sempre arbitrrio. A caneta esferogrfica
calca o papel-pele do livro. Reafirmo com a rasura a fragmentao presente no romance
de Robert Musil e a nossa vida mesma. O inacabado aponta a incompletude em cada um
20 Refiro-me aqui ao trabalho por mim realizado O homem sem qualidades caa palavras, apresentado
na Galeria Oeste em So Paulo em 2007. Para visualizar algumas imagens ver www.elidatessler.com.br
http://www.elidatessler.com.br/
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de ns. A exposio era composta por 134 telas de tecido de algodo recobrindo toda a
superfcie das paredes da galeria. As letras foram impressas em preto, com formato
correspondente quelas das revistas de passatempo encontradas em bancas de jornal e a
escala da reproduo dos jogos foi ampliada em dez vezes. Todos os quadros contm
quarenta adjetivos retirados do romance de Musil. Embora todos os quadros paream
iguais, nenhum apresenta as mesmas palavras e as mesmas solues dos problemas. A
apresentao das telas foi acompanhada pela publicao de um livreto contendo todos
os jogos, apresentando ao pblico a listagem de 5360 adjetivos, transcritos aps uma
primeira leitura do livro.
Este trabalho integra o projeto que venho desenvolvendo h quinze anos
intitulado Falas Inacabadas, onde as noes de tempo e memria assumem um eixo
importante de investigao. Em todos os meus trabalhos, a relao com a literatura e
com os objetos do cotidiano fundamental. Nos ltimos anos, acentuou-se o carter de
listagem de palavras, incorporadas aos objetos
Integram tambm a exposio dois objetos-caixa reunindo, cada um, dois
exemplares do livro O Homem Sem Qualidades de Robert Musil . Assumindo o
carter de readymade e readymade aid (readymade ajudado) proposto por Marcel
Duchamp, os livros so retirados de seu contexto habitual e apresentados como
trabalhos de arte. Lado a lado em uma caixa especialmente concebida para este trabalho,
um dos livros apresenta todos os adjetivos rasurados em esferogrfica preta, ampliando
a lista de adjetivos nesta segunda leitura. Ainda fazendo referncia a Marcel Duchamp,
o ttulo da obra com as rasuras ficou definido como O Homem sem qualidades, mesmo.
J para o segundo objeto-caixa, ao invs da rasura, fiz uso de corretivo branco para
cobrir todos os adjetivos do romance, em um total de 30.301 adjetivos. Considerado
por mim, ento, como um trabalho de pintura, este recebe o ttulo de O Homem sem
qualidades, mesmo assim.
,mesmo
Marcel Duchamp escolheu uma frase como ttulo para o seu trabalho que aqui
nos dedicamos a aproximar do romance de Robert Musil: A noiva desnudada por seus
celibatrios, mesmo. Como o prprio artista comenta, esta frase, ao invs de descrever
o objeto, como muitas vezes faz um ttulo, apenas conduz os leitores/espectadores a
outros universos verbais. Por esta razo, encontramos mesmo, precedido de uma vrgula.
Para Duchamp, o mesmo no est relacionado nem noiva, nem aos celibatrios.
Duchamp afirma ter simplesmente acrescentado uma vrgula e um advrbio sem
nenhum sentido. Diz ele: Esta falta de sentido me interessa muito sobre o plano
potico, do ponto de vista da frase (...) Quando traduzimos para o ingls, ns colocamos
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even, e este igualmente um advrbio absoluto, e aqui tambm no h sentido... A
possibilidade de desnudar a noiva um non-sense .21
A ltima frase do livro pstumo de Musil nos traz o elemento oroboro da
narrativa: E escreveu assim o que pensara. ( Musil, 2006, p. xxx) Musil morre em 15
de abril de 1942, em pleno trabalho de preparao, reviso e correo do que seriam os
vinte captulos finais. Alis, so sempre os outros que morrem. Mesmo.
REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS
BRETON, Andre. Le phare de marie, Revista Minotaure II, n 6, Paris, 1935.
CABANNE, Pierre. Marcel Duchamp: Engenheiro do tempo perdido. SP, Perspectiva,
2008
COMETTI, Jean Pierre.Lhomme exact Essai sur Robert Musil, Paris, Editions du
Seuil, 1997
DUCHAMP, Marcel. Duchamp du signe. Paris, Flammarion, 1994
MUSIL, Robert. O homem sem qualidades. RJ, Nova Fronteira, 2006
SCHLER, Donaldo. O imprio caboclo. Porto Alegre, Ed.Movimento/Florianpolis,
Ed.UFSC, 2004.
TOMKINS, Calvin. Marcel Duchamp: uma biografia. SP. Cosacnaify, 2005
21
Ver livro de CABANNE, Pierre. Marcel Duchamp lingnieur du temps perdu. Paris, Belfond, 1977,
p 50.