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NOTA SOBRE A GEOLOGIA DA SERRA DO MARAO (*) POR A. RIBEIRO(l), C. CRAMEZ (2), L. C. DA SILV A (3) e J. MACEDO (4) lNTRODUÇÃO A Serra do Marão deve a sua originalidade geológica à presença de afloramentos de terrenos ordovícicos e silúricos, que contactam, a leste, com o chamado Complexo xisto-grau- váquico ante-ordovícico e, a oeste, com os granitos porfhóides da mancha de Anciães. Os terrenos ordovícicos, constituídos por rochas muito resistentes à erosão, dão cristas imponentes, que imprimem à região características morfológicas estreitamente relaciona- das com a natureza geológica dos mesmos. Por outro lado, a ocorrência de minérios de ferro (magnetite, especialmente) deu interesse económico à região, onde se realiza a extracção e primeiras operações de trans- formação dos minérios referidos. Apesar de todas estas condições favoráveis ao estudo da Serra, do ponto de vista geológico e geomorfológico. e das suas relações com os aspectos económicos, os conheci- (*) Trabalho realizado, em grande parte, graças a um subsídio da Fundação C. Gulbenkian. (l) Colaborador do Centro de Estudos de Geologia da Faculdade de Ciências de Lisboa. (2) Bolseiro da Fundação Calouste Gulbenkian. (3) Investigador da Junta de Investigações do Ultramar. (4) Bolseiro da OTAN.

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NOTA SOBRE A GEOLOGIA DA SERRA DO MARAO (*)

POR

A. RIBEIRO(l), C. CRAMEZ (2), L. C. DA SILV A (3) e J. MACEDO (4)

lNTRODUÇÃO

A Serra do Marão deve a sua originalidade geológica à presença de afloramentos de terrenos ordovícicos e silúricos, que contactam, a leste, com o chamado Complexo xisto-grau­váquico ante-ordovícico e, a oeste, com os granitos porfhóides da mancha de Anciães.

Os terrenos ordovícicos, constituídos por rochas muito resistentes à erosão, dão cristas imponentes, que imprimem à região características morfológicas estreitamente relaciona­das com a natureza geológica dos mesmos.

Por outro lado, a ocorrência de minérios de ferro (magnetite, especialmente) deu interesse económico à região, onde se realiza a extracção e primeiras operações de trans­formação dos minérios referidos.

Apesar de todas estas condições favoráveis ao estudo da Serra, do ponto de vista geológico e geomorfológico. e das suas relações com os aspectos económicos, os conheci­

(*) Trabalho realizado, em grande parte, graças a um subsídio da Fundação C. Gulbenkian.

(l) Colaborador do Centro de Estudos de Geologia da Faculdade de Ciências de Lisboa.

(2) Bolseiro da Fundação Calouste Gulbenkian. (3) Investigador da Junta de Investigações do Ultramar. (4) Bolseiro da OTAN.

SGP
Referência bibliográfica
Boletim da Sociedade Geológica de Portugal, Vol. XIV, Fasc. II-III, 1962.
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mentos que possui mos sobre a reglao são ainda manifesta­mente insuficientes. A causa deste facto reside no seguinte:

1- Do ponto de vista geológico: a ausência de fósseis na maior part~ das formações e a complexidade da estrutura da Serra do Marão dificultam a interpretação dos fenómenos geológicos que ali se desenrolaram;

2 - Do ponto de vista morfológico: a carência de estudos suficientemente profundos sobre o relevo de certos sectores do norte de Portugal não permite o enquadramento da uni­dade constituída pela Serra do Marão dentro de outras unida­des mais vastas, enquadramento sem o qual qualquer inter­pretação genética do relevo resulta deficiente.

Iniciámos o estudo da Serra do Marão em Novembro de 1961. Tínhamos algumas observações efectuadas quando saiu a lume a obra «Geological, Petrological and Mineralogical investigation in the Serra do Mat'ão Region, Northern Por­tugal» de H. N. A. PRIEM. "

Verificamos a existência de discl'epâ~cias com este autor, quer no que diz respeito ~. descrição, quer na interpretação da geologia daquela região.' Por outro lado, o autor citado ocupou-se, especialmente, dos granitos e do metamorfismo com eles relacionado e da geologia económica (estudo do nível ferrífero do Ordovícico e dos filões minerálizados). As nossas observações dizem sobretudo respeito à estratigrafia e à estrutura das formações metassedimentares.

A descoberta de novas jazidas fossilíferas - as primeiras assinaladas no Complexo xisto-grauváquico-e a possibilidade do estabelecimento de uma escala estratigráfica da base do Ordovícico, suficientemente per menorizada para permitir a representação da estrutura à escala média, são tllementos que consideramos importantes e originais para o estudo geológico da região.

Nesta nota ocupar-nos-emos da separação do Complexo xisto-grauváquico e do Ordovícico e da extensão provável dos terrenos do último sistema, problemas que em trabalhos ante­riormente realizados não foram investigados com suficiente profundidade e rigor.

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SEPARA.ÇÃO DO COMPLEXO XISTO-GRAUVÁQUICO E DO ORDOVÍCICO

Dos diferentes autores que se ocuparam do estudo geoló­gico da Serra do Marão apenas NERY DELGADO (2, pág. 148; 3) e CARLOS TEIXEIRA (11, pág. 3) fizeram a separação correcta do Ordovícicú e do Complexo xisto-grauváquico. O primeiro, refere-se a uma formação inferior aos quartzitos skidavianos que, pela descrição, corresponde ao que, posteriormente, C. TEIXEIRA

interpretou como conglomerado de base do Ordovícico. PRIElVI, por defeito de interpretação da bibliografia, consi­

derou corno base do sistema em questão o conglomerado interformacional do Complexo xisto-grauváquico que ocorre em Paradela (7, pág. 4). Daqui advém que o critério por ele usado na distinção dos dois sistemas é errado. Assim, a sua «Quartz·schist formation» abrange parte do Complexo. refe­rido e a base do Ordovícico. O limite entre os « Beiras Schists» e tal formação é, pois, puramente arbitrário. .

Um corte realizado ao longo do estradão que conduz à mina do Marão mostra a seguinte sucessão, caminhando de SW para NE (o corte é feito de camadas mais recentes para camadas mais antigas):

Junto à boca da mina existem xistos e quartzitos com­pactos, com magnetite, que noutros pontos contêm bilobites (Oruziana). Uma falba com caixa muito reduzida, masapro­veitada por uma linha de água, põe esta formação em con­tacto com um conglomerado de matriz pelítica, com poucos calhaus de quartzo e numerosos calhaus de xisto e de quartzito, quase sempre bem rolados, e no geral fortemente tectonizados, tendo diâmetro entre 5 e 10 cm. A matriz deste conglomerado vai-se, depois, tornando gresosa e ocorrem, mesmo, bancadas de quartzito finamente gresoso. Os elementos do conglomerado diminuem de dimensões e a matriz carrega-se de grãos de quar­tzo (1 mm de diâmetro). Surgem intercalações gresosas e de quartzitos finamente gresosos; os elementos estão muito tecto­nizados.

11- BOL. Soe: GEOL. XIV (II'ln)

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o calibre do grão do conglomerado vai diminuindo, pas­sando a grés quartzílico, que constitui ai báse 'da forinação.

A direcção das bancadas doconglomel ado está compreen­dida entre N 550 We N 650 . W. A inclinação varia entre 550 e 650 para SE. A espessura da formação é de cerca de9200 melros.

Ao conglomerado seguem-se xistos e grauvaques onde se notam finas alternâncias de leitos predominantemente pelílicos e leitos predominantementepsamíticos, que dão aspecto listrado à rocha. A regularidade da alternância observa-se em muitos locais, mas noutros foi afectada e observa-se, a olho nu, uma estrutura fina, extremamente complicada, que interpretamos provisoriamente como «boudinage», em que os leitos psamí­ticos se comportam como material mais rígido do que os leitos pelíticos. Uma intercalação de quartzito, com 40 cm de espessura, mostra que esta alternância corresponde a ver­dadeira estratificação, embora se desenvolva uma xistosidade cujos planos são paralelos aos da estratificação da série con­glo merática. ...

Assim, as coordenadas da estratifica~ão /'

são, geralmente: ..,

Direc~ão N 80~ VI Inclinação 75° N

e as da xistosidade:

Dir~»ção N 60° W Inclinação 70° SE

É nesta série que ocorre uma fauna de Lingulídeos, numa camada de grauvaque com um metro ele espessura e com direçcão N 70° W e inclinação de 65° N, situada a 475 m N 49° "\V do vértice trigonométrico de FREITAS, sobre o estradão.

O corte permite concluir que existem duas formaçõesdife­rentes, separadas por uma discordância angular:

a) - O chamado Complexo xisto-grau váquico, que corres­ponde a formações pelítico-psamíticas (grauvaques, xistos e quartzitos), alternantes, onde ocorrem fósseis de Lingulídeos; todavia, estes fósseis não permitem datar com precisão o refe­rido Complexo, como veremos adiante.

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b) -,-'- OOrdovícico, composto por formações muito;riJais grosseiras (conglomerados, quartzitos' e xistos),ondE!dCGrrem Cruziana' e Vexillurn, fósseis considerados indicadores do Skidaviano. Visto a série conglomerática ser inferior~aos quar­tzitoscorri bilobites, tanto pode pertencer ao Skidaviano infe­rior como representar o Tremadociano.

Pensamos que a ocorrência da f~una mencionada e' a discordância da base do Ordovícicopermitem considerar defi­nitivamente resolvido o problema de que nos vínhamos ocupando neste parágrafo.

RECONHECIMENTO SUMÁRIO· DOS AFLORAMENTOS ORDO VÍCICOS

Os critérios estabelecidos nd' parágrafo anterior, permitem t'econhecer com segurança a extensão dos terrenos ordoví­cicos, separando-os nitidamente dos do Complexo xisto-grau­váquico.

A aplicação dos critérios citados levou-Qos a ,considerar o Ordovícico inferior representado nas seguintes regiões: bordo E e SE da Serra do Marão; bordo SW da Serra do Corgo (a N de Vila Cova); bacia superior do rio 010.

Passemos à descrição sumária destes aflQramentos.

A) - Bordo oriental da Serra do Marão:

A vertente NE da Serra do Marão, entre oAlto de Espinho e a portela a sul do vértice de Fragas da Ermida, é formada por cristas de rochas duras (quartzitos e conglomerados do Ordovícíco) que se sobrepõem a rochas mais brandas (xistos, grauvaques, conglomerados e raros quartzitos, do Complexo xisto-grauváquico ante-oruo\'Ícico). As cristas têm a direcção aproximada N\V-SE e, porque -as camadas que as formam mergulham geralmente para SW; terminam por um~ cornija abrupta que olha para NE, com 250 a 400 m de desnível.

Este panorama geral é modificado peja existência de falhas de direcção aproximadamente normal à, das cristas, que segmentam o conjunto em blocos e formam" unidades

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geológicas, ainda que de pequenas dimensões. A existência destas falbas foi admitida por outros autor:es (5, pág. 10).

A estrutura geral corresponde ao flanco SW de umanti­clinal cujo eixo tem direcção hercínica. Porém, existem dobras secundárias que, aliadas à pouca frequência de vestígios fossi­líferos, diticultam, como dissemos, o estabelecimento da escala. estratigráfica.

1) - Estratigrafia

Um corte efectuado ao longo da ribeira que passa entre as aldeias de Póvoa da Serra e de Soutelo, permitiu estabe­lecer a estratigrafia da base do Ordovícico. Na realidade, trata-se de um local onde as camadas formam um flanco monoclioal e estão representadas desde a uase do sistema até o Lanvirniano-Landeiliano. o

Observa-se a seguinte sucessão:

{} - xistos sericíticos com porfiroblastos I -.. de quiastolite ~anVlrnIano-

.. Landeiliano ('4) 5 - xistos ardosíferos _ ,

4 - xistos q. ua.rtzíticos, quartzitos. e grés } _ Skidaviano

3 - quartzitos

2 - conglomerado de matriz ora pelítica, } T d' ('ii)'t' rema oelano ,ora psaUH Ica

1-' xistos e grauvaques do Complexo xislo-grauvaquico

Os primeiros sedimentos ordovícicos são grosseiros e repousam em discordância sobre os terrenos anteriores.

Trata-se de conglomerados que apresentam três tipos princi pais:

a) - Com elementos mal rolados, sobretudo de quartzo, imersos numa matriz relativamente fina, psamítica. A tecto­nização posterior é responsável pelo aspecto brecbóide (pseudo­-milonítico) destas formações, pois, devido à pouca plasticidade dos elementos constituintes, estes foram fracturados e apre­sentam bordos agudos.

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b) -,- Com elementos bem rolados e grosseiros, de quartzo, quartzito e xisto, numa matriz pelítica.

Aqui, apesar da tectonização, o aspecto típico de con­glomerado manteve-se, porque os elementos de quartzo e quartzito, menos plásticos, conservaram os contornos arre­dondados em detrimento dos de xisto, mais plásticos, que moldam então a superfície daqueles.

c) - Com elementos muito mal rolados, grosseiros e raros, sobretudo de quartzo, numa matriz ora psamítica, ora pelítica, em leitos pouco espessos e alternantes, bastante finos, ou mais grosseiros.

Seguem-se intercalações de xistos e de quartzitos, ora finos e compactos, ora com fragmentos angulosos de quartzito, que, por vezes, formam toda a massa da rocha, dando-lhe um aspecto de brecha quartzítica. Algumas camadas repre­sentam efémeras recorrências de fácies conglomeráticas. As alternâncias de xistos e quartzitos deste tipo formam camadas com poucos metros de espessura.

Algumas das brechas parecem ter significação intrafor­macional. Estas assentadas forneceram bilobites,pelo que as consideramos pertencentes ao Skidaviano (2, pág, 148).

Correspondem a um mar mais profundo do que aquele em que se depositou a série conglomerática, evidenciando a transgressão geral do início do Ordovícico. A estas forma­ções sucedem xistos cada vez mais finos, que irão formar toda a monótona série que se sobrepõe aos quartzitos com bilobites e é interrompida pelo batólito granítico de Anciães.

Pela fauna que apresentam, estes xistos correspondem ao Lanvirniano-Landeiliano (2, pág. 148-9).

A passagem dos quartzitos com bilobites aos xistos é gradual, como pode observar-se, por exemplo, no corte da ribeira dos Azivais: dos quartzitos compactos passa-se aos xistos quartzíticos com limonite e, destes, a xistos cinzentos que, paloa o topo, se vão carregando deporfiroblastos de quiastolite, devido ao metamorfismo de contacto do granito porfiróide de Anciães.

As camadas magnelíticas. ocorrem, sobretudo, na série dos quarlzitoscom bilobiles; havendo níveis diversos.

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Existe pm nível geral e constante no contacto com os xistos lan virnianos, observado em todo o sectorin vestigado.

PRIEM estudou em. pormenor a composição e origem deste nível ferrífero e cartografou-o; no geral correctamente, na;, região entre o Alto de Espinho eas Fragas da Ermida, tal comoo.limite Skidaviano"Lanvirniano.

~) - Estrutura

Situada entre os dois complexos predominantemente xis­tentos (Lanvirniano-Landeiliano e Complexo xisto-grauváquico ante-ordovÍcico) as camadas de base do Ordovícico, conglo­meráticas e quartzíticas, formam um acidente de rochas com"; petentes intercalado numa massa de rochas menos compe­tentes. São, portanto, muito importantes .para a determinação do tipo de estrutura; pelo que o seu estudo terá de ser feito' com especial cuidado.

Porém, o estilo estrutural da- série com~tente parece ser, .p

específico dela, facto que não autori;l;a extrapolações para os restantes. complexos. Na repW:iade, emquanto nàquela série as dobras são assim.étricas ou hesitantes, nos xistos domina o estilo isoclinal. Isto deve-se, tal vez, à natureza plástica dos materiais da série, o que explica, também, a multiplicidade de contactos anormais.

A direcção ,das dobras é sensivelmente NW-SE (os eixos mergulham ligeiramente para NW, tal como sucede em Vila Cova, onde a inclinação dos eixos varia de 10 a ~OO). As dobras são muitas vezes desarmónicas, mesmo dentro das camadas mais competentes.

As vergências «<'/ergenz », «déjettemen t») são para NE. As dobras são acompanhadas por falhas longitudinais,

ao 'longo das quais a rejeição varia, segundo a vertical ;as últimas parecem, pois, estar intimamente associadas ao dobr.a, mento.

Outras falhas, transversais, estarão também associadas ao dobramento, porque as dobras mudam de natureza nos dois blo'Cosque cada falha delimita.

Este, bordo" da., Serra; corresponde", como dissemps,ao

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flanco de um anticlinorium, acidentado por nllÍn~rosas dobras secundárias. O eixo. deste anticlinorium deve mergulhar tam­bém para NW, como as dobras secundárias.

A descrição tectónica começa pelo SE (região da Ferraria); em direcção a NW (Portela de Espinho).

N a região de Ferraria o flanco do anticlinorium apresenta a complexidade máxima: está acidentado por dobrat; muito apertadas, ou trata-se mesmo de um estilo imbricado, de tal modo que o Complexo ante-ordovícico é, por vezes, incor~

porado na massa das formações o.rdovícicas. A NW da Ermida; as dobras são cortadas, normalmente ao eixo, por uma escarpa de erosão importante. No interior do Complexo xisto-grauvá... quico ocorre um contacto disconforme que não sabemos se corresponde a discordância ou a contacto mecânico. A dar-se a última hipótese, o facto estaria,. certamenle, relacionado com o estiramento das formações, junto dos planos axiais das dobras, o que sucede, especialmente com o conglomerado.

Neslaregião poderá confrontar-se o estilo tectónico da série dos xistos lavirno·landeilianos e da dos quartzitos e conglo-, merados,porque a espessura do corte abrange as duas séries. Porém, a inacessibilidade da região dificulta tal confronto.

Um corte para N E de Fragas da Ermida, em direcção à Póvoa da Serra, mostra menor complicação estrutural: as dobras secundárias são de menor amplitude e mais raras.

Junto ao v. g. do Marão uma falha longitudinal corta a série, abaixando-a no lábio N~; em virtude da falha este lábio é ocupado por um sinclinal que desaparece para a pro, fundidade, o que mostra que a dita falha tem rejeição vertical que aumenta para a superfície.

O curso superior da Ribeira das Bojas está localizado numa falba transversal (N E-SW) que desliga as camadas de 500 m, tendo sido deslocado para N E o bloco NW.

N a zona da mina, a falha longitudinal citada atrás pro~ longa-se, também, mas no bordo NE existe apenas conglo­merado, que tem aqui uma espessura de 200 m. Para SW estendem-se 4 dobras nos quartzitos, até atingir os xistos lanvirno-Iandeilianos. '.

Na Portela, ar SW do v. t. ,de Freitas existe uma falha,

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de direcção E-W, que as ribeiras do Ramalboso e dos Moínhos parecem aproveitar, em parte. J1~sta falba desliga o conglo­merado de base do Ordovícico e parece corresponder a uma flexura-falha, provà velmente ante-ordovícica, porque OR desli­gamentos das camadas do Ordovícico e do Complexo xis{o­-grll.uváquico parecem não ter o mesmo valor e sentido.

A zona do v. t. de Freitas é composta por um sinclinal de conglomerado. Para E da cril'?ta de Freitas nota-se o desa-. parecimento gradual das camadas da base do Ordovícico, de tal modo que no Alto de Espinho os xistos com quiastolíte repousam directamente sobre o complexo. Este estiramento das camadas é, certamente, devido a um acidente tectónico importante, que deve passar próximo, de direcção aproximada­mente meridiana e de sentido sinislrógiro.

A falha que NERY DELGADO assinalou entre os xistos pro­và velmente ordovícico-silúricos da região de Campanhó e os do Complexo xisto-grauváquico, a W e NW da Campeã, responde àqueles requisitos, quer- pela direc~ão (N N E-SSW), quer pela natureza. ~

. Este acidente prolongar-se.i~a peló vale do rio Marão, que parece ser de fractura, situ'a'do imediatamente a W do Alto de EspilJho.

A interpretação de PRIEM é díferente da nossa: o acidenle responsável pela lacuna das camadas seria o que poria em contacto anormal_o Ordbvícico e o Complexo.xisto-grau váquico, e não o citado, que, segundo ele, teria apenas rejeição vertical. Porém, se assim fosse, o conglomerado deveria desaparecer antes dos quartzitos com níveis terríferos, o que não sucede, visto que se interpõe entre os xistos do Complexo e os do Lan­virniano. Todavia, nada impede que a falha assinalada por PRlEM, de direcção W-E, exista também, sendo então homó· Ioga da da portela de Freitas.

3) - Extensão provável do Ordovícico no bordo SE da Serra do Marão

As formações do bordo NE da Serra do Marão prolon­gam-se até a região situada a oeste da Ferraria.

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A partir da ribeira do Largo das Águas Santas, que corre entre ",,'erraria e Atderete, desaparecem as 'formações da base do Ordovícico (conglomerados e quartzitos).

O último atloramento observa-se na vertente da dita ribeira, onde, em virtude de dobras apertadas, as camadas se apresentam próximas da vertical; para sul estendem-se xistos; a ribeira corre no contacto das duas formações acima referidas.

O desaparecimento dos terrenos do Ordovícico levanta problemas estratigráficos importantes, porque sem a presença deles torna-se difícil separar os xistos do Lanvirniano-Landei. tiano e os do Complexo xisto-grauváquico, por vezes seme­lhantes.

Assim sucede no maciço de Seixinhos e para sul: aqui observa-se uma espessa série de xistos com quiastolite, de côr azul escura, a oeste, que contacta com xistos com anda­luzi te, acastanhados, a leste. Devido à proximidade do gra­nito de Anciães, o metamorfismo é bastante elevado, pelo que as estruturas sedimentares estão assaz obliteradas, sendo difí­cil distinguir xistosidade e estratificação.

Os xistos com andaluzite possuem no topo uma interca­lação de quartzito, de poucas dezenas de metros de espessura, onde ocorrem alguns leitos muito finos de minérios ferríteros. Os xistos apresentam-se listrados, pelo que se aparentam aos do Complexo xisto-grauváquico (o listrado não ocorre nos xistos ordovícicos); a direcção do conjunto é nitidamente N 250 E e a inclinação 500 para W.

Nos xistos com quiastolite torna-se difícil determinar os planos de estratificação. Podem estar concordantes com os xistos andaluzíticos ou, pelo contrário, assentarem sobre etes dÜlcordantemente, com direcção N 600 W e inclina­ção 600 S. ,

PRIEM colocou os xistos com andaluzite no Ordovícico, devido à presença de quartzitos com finos leitos ferríferos intercalados,confundíveis com os do topo do Skidaviano; porém, a ausência do conglomerado de base, a menor espessura dos quartzitos e a exiguidade dos leitos ferríferos, tornam falível, e mesmo impossível, tal assimilação; por outro lado, aquele

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autor supõe os xistos com quiastolite sobrepostos concordante­mente. aos acima citados, o que o levou a atribuir-lhes idade lan vimo-Iandeiliana.

Ora, sendo quase certo que o nível de quartzitos com leitos finos de minérios de ferro é ante-ordovícico,a idade a atribuir aos xistos com quiastolite é mais difícil de deter..; minar.

Duas soluções são possíveis: 1) - Se se supõem os xistos ordovícicos, repousando sobre

o dito nível quartzítico, torna-se necessário admitir a exis­tência. de um contacto mecânico entre as duas formacões ao. , longo do qual foram laminadas as camadas mais grosseiras da base do Ordovícico, acompanhando os quartzitos ante" -ordovícicos o contacto assim estabelecido, devido à maior com petênciadeles.

Contra esta solução ergue-se a dificuldade de, em virtude deste acidente, terem sido laminados os quartzitos e os con.,. glomerados ordovícicos, muito espessos, enJ,l.uanto os delgados leitos de quartzitos ante-ordovícicos se cd'bservaralIJ. Por outro lado, parece passar-se gradualmente do nível de quartzitos ferríferos aos xistos com· qlliastolite, por vezes, também, com estreitos . leitos de minérios de ferro, o que é contra a exis" tênciado contacto mecânico.

<!l) ~ Se se lhes atribui idade ante-ordovícica, é mais pro .. vável que haja",concordância entre as duas formações. A direc­ção atrás indicada corresponderia, então, a dobras locais, que na realidade parecem acidentar os xistos com quias­tolite, respeitando os quartzitos e criando, assim, um dis­positivo desarmónico, que faria supor a existência de uma discordância, estratigráfica ou mecânica, que na verdade nã.o existe.

Por esta solução optoq NEHY DELGADO no mapa de 1899; para este autor o Ordovícico termina a sul de Fragas da Ermida..

Esta hipótese tem apoio nos seguintes factos: : . a) - Os xistos de Seixinbos são muito mais ricos de

'quiastolite do que os do Lanvirniano-Landeiliano: 'b) - Noutros pontos do Com plexo xisto- grauváquico

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fontm citados xistos com quiastolite (Caramulo (1); 'frás­-os-Montes oriental (2)).

No Câmbrico da Galiza, SAMPELAYO cita (3), mesmo~ um nível de xistos grafitosos ricos de minério de ferro, inferior aos· grauvaques e quartzitos com Lingula, e supenor aos xistos argilosos com Paradoxides, portanto, pertencentes aó Acadiano ou ao Potsdamiano.

A dar-se a segunda alternativa, existiria um acidp-nte, entre os vértices de Seixinhos e Fragas da Ermida, que poria em contaCto anormal as formações ordovicianas, a norte, e o Complexo xisto-grauváquico, a sul.

As formações descritas prolongam-se, ainda, para sul (7, pág. 18): o nível de quartzitos ante-ordovícicos é observável na estrada de Amarante a Mesão Frio, assim como na estrada de Barqueiros à Régua, onde os minérios de terro estão trans­formados em gt'anadas; e parece prolongar-se para Sul do Douro (são vIsíveis, mesmo à distância, camadas mais resis­tentes, no prolongamento dos quartzitos do último afloramento, na vertente do Montemuro, do v. t. de Mesquitela para NNW). Constituem, assim, um óptimo horizonte-guia do Complexo xisto-grau váquico.

Este nível separa, na estrada de Mesão Frio a Amarante, os xistos com quiastolite dos xistos 'com andaluzite e na estrada de Barqueiros, as corneanas dos xistosmosqueados com andaluzite.

As corneanas estão, porém, muito alteradas e podem corresponder aos xistos com quiastolite. muito compactos (4).

(1) J. ÁVILA. MA.RTINS, "Contribuição para o conhecimento geológico da região do Caramulo» - Rev. F. C. L, 2·a série, vol. IX, Fase. 2.°; págs. 123-128, Lisboa 1962.

(2) Relatório em preparação, em que colaboram os autores da pre­sente nota.

, .(3) P. H. SAMPELAYO,,,El Sistema Cambrico» - Explicaciones deZ Nuevo Mapa Geol6gico de Espana, Madrid, 19M.

(4) A importância, para a geologia económica, da resolução do pro­blema tratado neste parágrafo, é transcendente. Se as formações que se estendem a sul de Fragas da Ermida pertencem ao Complexo xisto-grau­

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B) - Bordo sul da Serra do Oorgo:

A norte do paralelo de Vila Cova afloram novamente os terrenos ordovícicos.

Um corte desde o v. t. de Covelos até ao v. t. de Vaquei­ros mostra a seguinte sucessão:

6 - xistos com quiastolite 1Lanvirniano - Lan­

[) - xistos ardosíferos f deiliano ('1) 14 - xistos mosqueados com andaluzite, xis- } ! tos quartzíticos, quartzitos friáveis e Skidaviano quartzitos compactos

3 - conglomerado de matriz pelítica, muito) T d' (")rema OClano ,metamorfi zado f

\ Complexo xisto­2 - xistos mosqueados com andaluzite j '-'grauváquico

1 - granito de grão médio, de duas micas

Embora não tenham aparecido fósseis, a sucessão é em tudo análoga à do Marão.

O conglomerado tem a espessura aproximada de 30 m e apresenta-se ~formado .por matriz pelítica abundante (recris­talizada, com andaluzite), de que emergem alguns calhaus de quartzo, com ~ a 5 cm de diâmetro. É possível que parte da matriz pelítica corresponda a calhaus de xisto que, fortemente tectonizados, foram deformados e metamorfizados.

váquico, as reservas de minérios de ferro serão certamente inferiores às do Ordovícico; dificilmente justificam uma exploração rendosa. Seria a primeira vez que o Complexo xisto-grauváquico forneceria minérios de ferro com interesse económico.

Se, como supôs PRIEM, pertencem ao Ordovícico, seria provável que viessem a encontrar-se jazigos com valor económico que, no entanto, não são ainda conhecidos. Porém, é muito mais admissível que se verifique a primeira hipótese, uma vez que a segunda esbarra contra argumentos teóricos de valor.

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A reglao de Vila Cova é ocupada por estas formações, que entram em contacto anormal com o Complexo xisto-grau­váquico, visível, por exemplo, sobre a estrada de Vila Real a Mondim de Basto (Portela do Alto do Velão) e 900 m a W da capela de N.a Sr.a de La SaleUe.

Forma um isosinclinal com o eixo dirigido na direcção NW-SE, deitado para SW, onde só o flanco N E está completo e corresponde ao corte descrito, ao passo que o flanco SW está cortado pelo acidente referido, o que ocasiona a falta das camadas '2, 3 e base da 4.

Um corte na estrada de Vila Real a Mondim de Basto mostra bem estll estrutura; mas o sinclinal encontra-se com­plicado por dobras de '2. a ordem; o flanco SW mostra, também, dobras secundárias próximo do contacto com o Complexo xisto-grauváquico, que se faz por meio de quartzitos do Ski­daviano.

O conglomerado aflora, portanto, apenas no flanco N E do sinclinal; segue-se bem no terreno desde o Alto de Ola até a estrada de Mondim a Vila Real, que o corta duas vezes (uma próximo da ponte sobre o rio Sião, outra a 1 km a WSW do v. t. de Linhares), corre paralelamente ao contacto xisto­-granito de grão médio, de duas micas, e sobrepõe-se aos xistos mosqueados com andaluzite do Complexo xisto-grau­váquico.

Existem duas camadas ferríferas no contacto das cama­das 4 e 5, visíveis no corte primeiramente citado, ou, na estrada referida, onde sublinham as dobras menores da estru­tura. Estas camadas, intercaladas em quartzitos, xistos quar­tzíticos e xistos, são exploradas na mina de Vila Cova.

Prova-se, assim, que estas camadas são equivalentes das do Marão. A estrutura de pormenor foi estudada (6, pág. '2~5) e figurada no mapa de PRIEM.

C) - Bacia do rio mo:

Os quartzitos reaparecem na reglao da· queda de água das Fisgas de Ermelo, onde contêm Veroillum. A estrutura é bastante complexa e parece corresponder a um anticlinal dei­

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tado para ,NW. Talvez por isso, o congl'omerado basal Só se observa na zona axial do dito anticlinal, junto ao cemitério de li-'ervénça.

É em tudo semelhante ao dos afloramentos anteriores, mas apresenta-se muito mais recrista'lizado, pelo que a matriz é constituída quase só por cristais de andaluzite de 9l a 5 cm de tamanho.

Esta série quartzítica foi colocada inicialmente no Gotlan­diano (3; 10, pág. 45). Porém, a descoberta de Vexillum veio mostrar que se trata de Skidaviano (13, pI. XI, fig. 2); a ocor~ rência de um nível ferrífero no contacto com os xistos lanvir­l1ianos, figurado no mapa de PRIEM, e a do conglomerado vêm confirmar a idade proposta em último lugar.

CONCLUSÕES

o estudo realizado permitepõr certos problemas, muito gerais, da geologia portuguesa, a saber:4" /"

1) - Idade do CompÍexo xisto-grauváquico

A fauna de Lingulídeos citada, a primeira que ocorre neste complexo, levanta, uma vez mais, o problema da idade do mesmo, tão controvertida.

Infelizmenfe, trata-se de fósseis de um grupo cujas formas têm pouco valor estratigráfico. Embora seja importante o seu achado, não foi possível identificá-las com formas de qualquer espécie conhecida.

Em virtude das dimensões insólitas (5 cm) que atingem, as formas referidas devem corresponder a uma fase avançada da evolução do grupo, e, portanto, indicarem um nível estra­tigráfico elevado da série Câmbrica.

Alguns esp~cialistas consultados, cqmo o Prof. LOTZE e o Dr. SP.JELDNAES, pronunciaram-se a favor da idade acadiana ou potsdamiana.

Na realidade, encontram-se Lingulídeos deiSde o Infra­câmbTiéo (LinguleUa montana Fent. e. Fent., na,série de Belt),

i

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embora também existam formas semelhantes no Potsdamiano da Europa ocidental.

O Complexo xisto-grauváquico ante-ordovícico pode,pois, ser de idade câmbrica oU infracâmbro-câmbrica.

A espessura que este complexo exibe no Ocidente da Península, traduzida na extensão, por ve~es enorme, dos seus afloramentos, milita a favor da idade infracambro-câmbrica.

Torna-se difícil resolver o problema, enquanto não for estabelecida uma estraligrafia fina do dito complexo, correla­cionando-a com a de complexos semelhantes doutras regiões.

~) - Separação do Complexo xisto-grauváquico e do Ordovícico

Nos trabalhos anteriormente publicados sobre o Marão, tal separação nem sempre é correcta, exceptuando o mapa de 1899, onde, apesar da reduzida escala, a estrutura parece estar bem interpretada.

A separação entre o Complexo xisto-grauváquico e o Ordo­vícico é, de acordo com o que observámos, muito nítida, pois:

a) - existe discordância angular entre os terrenos dos dois sistemas;

b) - na base do Ordovícico ocorre um conglomerado muito grosseiro e poligénico.

Assim se torna possível o enquadramento da geologia do Marão na do resto de Portugal, dado que o começo do Ordo­vícico é geralmente acompanhado de discordância angular e de conglomerado de base.

3) - Estratigrafia e paleogeografia do Ordovícico inferior

A estratigrafia estabelecida enquadra-se dentro da gene­ralidade do Ordovícico português (13, págs. 237-8).

A grande espessura do conglomerado mostra que o lito­ral se encontrava muito próximo, possivelmente a norte, visto que a leste (afloramento de Vila Flor) e a oeste (afloramento

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de Valongo) a espessura do conglomerado diminui conside­ràvelmente.

Esta conclusão concorda com a distribuição dos conglo­merados de base do Ordovícico, dos jazigos de ferro e com a presença de um soco, provàvelmente ante-paleozóico, no NW da península.

4) -- Estrutura Geral da Serra do Marão

Verifica-se que, no conjunto, a Serra do Marão corres­ponde a um anticlinorium, cujo núcleo é ocupado por terrenos do Complexo xisto-grauváquico (veiga da Campeã) e cujos flancos, constituídos por terrenos do Ordovícico inferior, estão localizados no bordo meridional da Serra (flanco SW) e na região de Vila Cova (flanco NE). Porém, este anticlinat apre­senta-se fortemente inclinado para SW, estando o flanco N ~~

estirado (1).

RESUMÉ' .. Différents auteurs se, sànt occupés jusqu'à maintenant de

la géologie de la Serra do Marão, dans le Nord du Portugal. Toutefois, la structure deêe massif D'a pas été suffisam­

ment éclaircie. .

(1) Este trabalho só foi possível graças ao apoio da Direcção da Campanhia V. L C. O., a quem agradecemos a hospitalidade e meios de transporte que nos forneceu especialmente nas primeiras fases do nORSO trabalho. Não esquecemos, em especial, a ajuda prestada pelo Engenheiro Acácio Marques e por Luís Alberto Lopes, ambos daquela Companhia, em todas as nossas visitas à região,

Para os colegas Dr. J. ALMEIDA REBELO, J. BAL~CÓ MOREIRA e l". HORTA SANTOS, que durante alguns dias trabalharam connosco no Marão, vão os nossos agradecimentos pela agradável e útil companhia.

Finalmente «Iast but not the least» agradecemos ao Prof. C. TEI­XEIRA. que orientou todo o noSSO trabalho e consultou os especialistas Prof. F. LOTZE e Dr. NILS SPJELDNAES, sobre a fauna encontrada; testemu­nhamos, igualmente, os nossos agradecimentos ao Prof. Engenheiro A. CERVEIRA, pelas facilidades que para nós obteve juntei da V. I. C. O.

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Des observations récentes ont apporlé des éléments assez importants pour la connaissance de la Serra.

En premier lieu, une faune de Lingulidés a été lrouvée dans les roches du Com'plexe de scbistes et grauwackes anlé­-ordovicien. Ces roches n'avaient jamais donné de fossilps jusqu'à présent.

Sur les roches fossiliferes reposent, en discordance, les banes de conglomérats de la base de I'Ordovicien. Ces con­glomérats sont assez épais et déveJoppés.

II y a donc une séparation tres nette de I'Ordovicien et du Complexe de schistes et grauwackes.

La faune ei-dessus eitée peut indiquer pour le Complexe un âge Cambrien ou Infracambrien-Cambrien.

En ce qui concerne la structure de la 8erra do Marão il s'agit d'un anticlinorium déjeté vers le NEet dont le flanc de ce côté a été étiré.

BIBLIOGRAFIA

Uma vez que tratamos sàmelÍ.te da ~eologia ~eral da Serra do Marão, em espécial do Ordovícico, a bibliografia citada reduz·se àquele aspecto. Uma bibliografia mais completa pode consultar-se em (7), em especial no que diz respeito à geologia de pormenor dos jazil!OS de ferro.

1 - BRINK, A. H. - Pelrology and ore ~eology of the Vila Real, Sabrosa, Vila Pouca de Aguiar region, Northern Portu~al. (Thesis Uni­versity of Amsterdam), Com. Ser. Geol. Pm·t., tomo 43, págs. 5·144, 1961, Lisboa.

~ - DELGADO, J. F. NERY - Systeme Silurien du Portugal. Étude de stratigraphie paléontolo~ique. Mem. Sei'. Geol. Portugal, 1906, Lisboa.

'3 - DELGADO, F. NERY & CHOFFAT, PAUL - Carta geológica de Poriu­gal. Escala 1 : 500000, 1899, Lisboa.

4 - MEDEIROS, A. CÂNDIDO DE, FARIA, F. LIMPO DE & CARVALHO, A. DIAS DE - Calcáreos cristalinos da Serra do Marão. Est. Not. Trab. Ser. Fom. Min., n.O 9, pá~s. 1-19, 1953, Porto.

5 - NEIVA, J. M. COTELO, SILVA, G. HENRIQUES DA & PUREZA, F. GON­ÇALVES - Novas jazidas de magnetite na Serra do Marão e contri­buição para o estudo geoi'ógico da Serra. Mem. Not. Mus. Lab. Min. Geol. Fac. Ciências Coimbra, n.O 43, 1957, Coimbra.

p. - NEIVA, J. M. COTELO & CERVEIRA, A. !\'lORMS - A estrutura do

~2 - j30L, S9C, GllOL, XIV (II'III)

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jazigo de magnetite de Vila Cova do Marão. Com. Sef', Geol. POf' ­tugal, t. 3~, págs. 5-11, 1951, Lisboa.

7 - PRIEM. H. N. A. - Geological, Petrological and Mineralogical inves­tigation in Lhe Serra do Marão Region, Northern Portugal, 1962, Amsterdam.

8 - TEIXEIRA, C. - Os conglomerados do Complexo xisto-grauváquico ante-si/úrico. Sua importância geológica e paleogeográfica. Com . Sef'. Geol, Po1'tugal, t. 35, págs. 33-49, 1954, Lisboa.

9 - TEIXEIRA, C, - O Complexo xisto-grauváquico anle- ordoviciano. Notas sobf'e a geologia de POf'tugal, 1955, Lisboa.

10 - TEIXEIRA, C. - O Sistema Silúrico. Notas sobt'e a geologia de POf'­tugal, 1955, Lisboa,

11 - TEIXEIRA, C. - Novos elementos para o conhecimento do Silúrico português, Com, Set'. Geol. Portugal, t. 36, págs, 1-8, 1955. Lisboa.

1~ - TEIXEIRA, C. - Notícias geológicas e paleontológicas, XIII - Da queda da água das Fisgas . . . às cristas quartzíticas do Marão. Natut'úlia, IV (9 ·10) : 86-87. Lisboa, 1956.

13 - TEIXEIRA, C. - L'évolution du territoire portugais pendant les temps anté-mésozolques. Bol. Soe. Geol. POl'tt~gal, vol. XIII, págs. 229-255, 1959.

• • .. Centro de Estudos de Geologia da Faculdade

de Ci tlllcia! de LIsuoa (Fllndllção do Instituto de Alta Cultura).

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A. RIBEIRO, C. CRAlIlEZ, L. C. DA SILVA e J. MACEDO -Geologia da Serra do Marão

1 -- Bordo oriental da serra do Marão, observado da Boavista

Fot . C. TEIXEIRA

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A. EIBElfW, C. CRAi\IEZ, L. C . DA SILVA e J. lVIACEDO- Geologia da S erra do 111arrTo.

.., 3 - Vertente NE do rio ião.

Estrada de \ ' tla Real a :\I'bndim de Basto

Fot. C. T E IX E IRA