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Informativo 750-STF (01/07/2014) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 1 Márcio André Lopes Cavalcante Processos excluídos deste informativo esquematizado por não terem sido concluídos em virtude de pedidos de vista ou de suspensão: ADI 4947/DF; RE 798740 AgR/DF. Julgados excluídos por terem menor relevância para concursos públicos ou por terem sido decididos com base em peculiaridades do caso concreto: HC 118856/SP; RE 230536/SP. ÍNDICE Direito Constitucional CE pode prever afastamento temporário de servidor integrante da executiva de sindicato. Direito Penal Sonegação fiscal e art. 42 da Lei n. 9.430/96. Direito Processual Penal Pluralidade de investigados sendo um deles com foro privativo no STF. No procedimento da Lei de Drogas, o interrogatório continua sendo o primeiro ato da audiência. Direito Tributário Pedágio possui natureza jurídica de tarifa. DIREITO CONSTITUCIONAL CE pode prever afastamento temporário de servidor integrante da executiva de sindicato CE pode prever que o servidor público eleito para um cargo de dirigente sindical terá direito de ficar afastado do serviço, recebendo sua remuneração, enquanto durar seu mandato. STF. Plenário. ADI 510/AM, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgado em 11/6/2014 (Info 750). A Constituição do Estado do Amazonas prevê o seguinte: Art. 110. (...) § 7º O servidor público, investido em função executiva em Instituição Sindical representativa de classe, será afastado do serviço pelo tempo que durar seu mandato, sendo-lhe assegurados todos os direitos e vantagens do cargo como se em exercício estivesse, exceto promoção por merecimento. Desse modo, a CE/AM estabelece que, se o servidor público for eleito para um cargo de dirigente sindical, ele terá direito de ficar afastado do serviço, recebendo sua remuneração, enquanto durar seu mandato. ADI O Governador do Estado ajuizou uma ADI questionando esse § 7º do art. 110 da CE/AM. Dentre os

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Informativo 750-STF (01/07/2014) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 1

Márcio André Lopes Cavalcante Processos excluídos deste informativo esquematizado por não terem sido concluídos em virtude de pedidos de vista ou de suspensão: ADI 4947/DF; RE 798740 AgR/DF. Julgados excluídos por terem menor relevância para concursos públicos ou por terem sido decididos com base em peculiaridades do caso concreto: HC 118856/SP; RE 230536/SP.

ÍNDICE Direito Constitucional CE pode prever afastamento temporário de servidor integrante da executiva de sindicato.

Direito Penal

Sonegação fiscal e art. 42 da Lei n. 9.430/96.

Direito Processual Penal Pluralidade de investigados sendo um deles com foro privativo no STF. No procedimento da Lei de Drogas, o interrogatório continua sendo o primeiro ato da audiência.

Direito Tributário Pedágio possui natureza jurídica de tarifa.

DIREITO CONSTITUCIONAL

CE pode prever afastamento temporário de servidor integrante da executiva de sindicato

CE pode prever que o servidor público eleito para um cargo de dirigente sindical terá direito de ficar afastado do serviço, recebendo sua remuneração, enquanto durar seu mandato.

STF. Plenário. ADI 510/AM, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgado em 11/6/2014 (Info 750).

A Constituição do Estado do Amazonas prevê o seguinte:

Art. 110. (...) § 7º O servidor público, investido em função executiva em Instituição Sindical representativa de classe, será afastado do serviço pelo tempo que durar seu mandato, sendo-lhe assegurados todos os direitos e vantagens do cargo como se em exercício estivesse, exceto promoção por merecimento.

Desse modo, a CE/AM estabelece que, se o servidor público for eleito para um cargo de dirigente sindical, ele terá direito de ficar afastado do serviço, recebendo sua remuneração, enquanto durar seu mandato. ADI O Governador do Estado ajuizou uma ADI questionando esse § 7º do art. 110 da CE/AM. Dentre os

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argumentos invocados, o autor alegou que a CF/88 somente assegura estabilidade sindical aos empregados (art. 8º, VIII, da CF/88), não havendo previsão na Carta Magna de que os servidores teriam direito a afastamento para cargos diretivos em sindicatos. Logo, a CE/AM teria extrapolado sua competência ao instituir esse direito. O STF concordou com os argumentos do autor da ADI? NÃO. O STF entendeu que o § 7º do art. 110 da CE/AM, acima transcrito, é compatível com a CF/88. A Constituição estadual poderia sim ter previsto o direito de os dirigentes sindicais se afastarem do exercício do cargo, sem prejuízo de vencimentos e vantagens. Não há nenhuma vedação para que a CE trate sobre esse tema. A garantia da remuneração e dos direitos inerentes ao exercício de cargo público, ao servidor afastado para atividade em função executiva em instituição sindical, tem suporte, ainda que indireto, no art. 37, VI, da CF/88:

Art. 37 (...) VI - é garantido ao servidor público civil o direito à livre associação sindical;

Sem essa prerrogativa, ficaria inviável a atividade sindical pelos servidores públicos.

DIREITO PENAL

Sonegação fiscal e art. 42 da Lei n. 9.430/96

Atenção! Concursos federais

A Lei n. 9.430/96 trata sobre procedimentos de fiscalização tributária realizados pela Receita Federal. Em alguns dispositivos, a Lei define omissão de receita, ou seja, situações em que a fiscalização considera que o contribuinte não declarou corretamente as receitas ou rendimentos obtidos. Veja o que diz o art. 42:

Art. 42. Caracterizam-se também omissão de receita ou de rendimento os valores creditados em conta de depósito ou de investimento mantida junto a instituição financeira, em relação aos quais o titular, pessoa física ou jurídica, regularmente intimado, não comprove, mediante documentação hábil e idônea, a origem dos recursos utilizados nessas operações.

Em outras palavras, se é depositada uma determinada quantia na conta bancária do indivíduo e este não consegue provar a origem desses recursos, a Receita Federal irá presumir que são rendimentos e, consequentemente, irá lavrar auto de infração e cobrar o valor do imposto de renda sobre tais quantias.

Se o contribuinte não se defender administrativamente ou se a sua defesa não for acatada, haverá a constituição definitiva desse crédito tributário.

A partir daí, a RFB comunica o fato ao MPF que, então, irá formular denúncia (ação penal) contra o contribuinte alegando que ele praticou o delito do art. 1º, I, da Lei n. 8.137/90.

Caso o contribuinte/réu seja condenado por esse fato, haverá violação ao princípio da presunção de inocência?

NÃO. Não ofende o princípio constitucional da presunção de inocência a exigência de comprovação da origem de valores estabelecida no art. 42 da Lei n. 9.430/96.

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Para o STF, o contribuinte, ao não comprovar a origem dos recursos depositados em sua conta bancária, cria, contra si, uma presunção relativa de que houve omissão de rendimentos, ensejando a condenação criminal.

Não há ofensa ao princípio da presunção de inocência porque se trata de um procedimento legalmente estabelecido e disciplinado, sendo certo que ao contribuinte é garantido o contraditório e a ampla defesa.

STF. 2ª Turma. HC 121125/PR, rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 10/6/2014 (Info 750).

CRIMES CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA Normalmente, imagina-se que os crimes contra a ordem tributária são apenas aqueles previstos nos arts.

1º e 3º da Lei n. 8.137/90. Trata-se de um engano. Além desse diploma, existem também crimes tributários tipificados no Código Penal. Vejamos os crimes tributários existentes atualmente:

Na Lei n. 8.137/90:

Sonegação fiscal (art. 1º);

Crimes da mesma natureza de sonegação fiscal (art. 2º);

Crimes funcionais tributários (art. 3º). No Código Penal:

Descaminho (art. 334);

Sonegação de contribuição previdenciária (art. 337-A);

Apropriação indébita previdenciária (art. 168-A);

Excesso de exação (art. 316, § 1º);

Facilitação de contrabando ou descaminho (art. 318);

Falsificação de papeis públicos (art. 293, I e V). LEI 8.137/90

A Lei n. 8.137/90, em seus arts. 1º e 3º, define crimes contra a ordem tributária. Os arts. 1º e 2º da Lei trazem os crimes praticados por particulares contra a ordem tributária. O art. 3º, por sua vez, prevê crimes funcionais contra a ordem tributária, exigindo que sejam praticados por funcionários públicos e em razão da função. Vamos aproveitar este julgado para fazer um estudo sobre o art. 1º. ART. 1º

O art. 1º da Lei n. 8.137/90 prevê cinco delitos, um em cada inciso. CAPÍTULO I Dos Crimes Contra a Ordem Tributária Seção I Dos crimes praticados por particulares

Art. 1° Constitui crime contra a ordem tributária suprimir ou reduzir tributo, ou contribuição social e qualquer acessório, mediante as seguintes condutas:

Estrutura do art. 1º:

O art. 1º da Lei n. 8.137/90 traz a seguinte estrutura: no caput, ele prevê que é crime suprimir ou reduzir tributo. Já nos seus cinco incisos são previstas as condutas por meio das quais o agente suprime ou reduz o

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tributo. Assim, para ser crime, o indivíduo deverá praticar uma das condutas dos incisos e por meio delas suprimido ou reduzido o tributo que era devido. Bem jurídico: O bem jurídico protegido é o interesse do Estado na arrecadação dos tributos (ordem tributária). Sujeito ativo: Trata-se de crime comum, ou seja, pode ser praticado por qualquer pessoa. O autor não precisa ser o contribuinte ou responsável Na maioria das vezes o autor do crime é o contribuinte ou o responsável pelo tributo. No entanto, é possível que outras pessoas também pratiquem o delito. Ex: o contador da pessoa jurídica pode ser o autor do delito mesmo não sendo o sujeito passivo do tributo. Pessoa jurídica não pode ser sujeito ativo Algumas vezes o delito é praticado por meio da pessoa jurídica. Ocorre que a CF/88 não autoriza a responsabilidade penal da pessoa jurídica por crimes tributários (isso é possível no caso de crimes ambientais). Logo, nessa hipótese, quem responderá penalmente é o administrador e outras pessoas físicas que tenham tomados as decisões. Teoria do domínio do fato Nos crimes tributários é muito comum a invocação da teoria do domínio do fato. Isso porque na maioria dos casos quem pratica a conduta de suprimir ou reduzir tributo é o empregado, gerente ou contador da pessoa jurídica. No entanto, a orientação para que fosse feito dessa forma partiu de um sócio-administrador da empresa. Pela teoria tradicional, o autor é aquela pessoa que pratica o verbo nuclear do tipo. Logo, o empregado, gerente ou contador seriam os autores do delito. A teoria do domínio do fato, criada na Alemanha em 1939 por Hans Welzel, teve a finalidade de ampliar o conceito de autor. Por força dessa teoria, pode também ser considerado autor aquele que, mesmo não realizando o núcleo do tipo, domina finalisticamente todo o seu desenrolar. Welzel dizia que autor é o “senhor do fato”. Dessa forma, pela teoria do domínio do fato o autor seria o sócio-administrador que decidiu e determinou que fossem praticados os atos necessários à supressão ou redução do tributo. Deve haver prova de alguma conduta do agente O simples fato de o acusado ser sócio e administrador da empresa constante da denúncia não pode levar a crer, necessariamente, que ele tivesse participação nos fatos delituosos, a ponto de se ter dispensado ao menos uma sinalização de sua conduta, ainda que breve, sob pena de restar configurada a repudiada responsabilidade criminal objetiva. STJ. 6ª Turma. HC 224.728/PE, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 10/06/2014. Sujeito passivo: o Estado (mais especificamente a pessoa jurídica de direito público que tinha o direito de arrecadar aquele determinado tributo que foi sonegado). Em que consiste o crime: - O crime ocorre quando a pessoa não paga nada (suprime) ou paga menos do que deveria (reduz) - o valor do tributo (imposto, taxa, empréstimos compulsórias, contribuição de melhoria ou

contribuições sociais) - ou o do acessório; - mediante uma das condutas fraudulentas previstas nos incisos.

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Tipo objetivo (verbos do tipo): O crime pune a conduta de suprimir ou reduzir o tributo devido. Suprimir: não pagar nada do valor que deveria. Reduzir: pagar menos que era devido. Consumação:

Art. 1º, incisos I a IV: crimes materiais.

Art. 1º, inciso V: crime formal. Tentativa: É possível, apesar de ser de difícil ocorrência na prática. Existe, no entanto, uma peculiaridade interessante. Caso o agente tente suprimir ou reduzir tributo mediante conduta fraudulenta, mas não consiga por circunstâncias alheias à sua vontade, ele irá

responder pelo crime do art. 2º, I, da Lei n. 8.137/90 (e não pelo art. 1º da Lei n. 8.137/90 c/c o art. 14, II, do CP). O art. 2º, I é a forma tentada do art. 1º. Em vez de se valer do art. 14 do CP para fazer a adequação típica da tentativa, utiliza-se o inciso I do art. 2º. Crime material e lançamento definitivo:

Como visto, os crimes dos incisos I a IV do art. 1º da Lei n. 8.137/90 são materiais. Assim, para que se configurem é indispensável a constituição definitiva do crédito tributário, nos termos da SV 24-STF:

Súmula vinculante 24-STF: Não se tipifica crime material contra a ordem tributária, previsto no artigo 1º, incisos I a IV, da Lei nº 8.137/90, antes do lançamento definitivo do tributo.

A SV 24-STF não se aplica (não se exige constituição definitiva) para os seguintes delitos:

Art. 1º, inciso V.

Art. 2º, em todos os seus incisos. Impossibilidade de medidas cautelares penais antes da constituição definitiva Antes da constituição definitiva do crédito tributário não existe crime de sonegação. Logo, não é lícito que a autoridade policial inicie investigação para apurar esse fato e não é possível que o juiz decrete medidas cautelares penais (exs: quebra de sigilo, busca e apreensão etc.). Nesse sentido:

(...) Não existindo o lançamento definitivo do crédito tributário, revela-se ilegal a concessão de medida de busca e apreensão e de quebra de sigilo fiscal, em procedimento investigatório, visando apurar os crimes em apreço. (...) Ordem concedida de ofício, para reconhecer a ilicitude da prova obtida mediante a aludida cautelar, bem como determinar a devolução dos objetos apreendidos na empresa e na residência do ora paciente e levantar a quebra do sigilo bancário, que restou igualmente deferido. (STJ. 5ª Turma. HC 211.393/RS, julgado em 13/08/2013).

Ajuizamento da ação penal antes da constituição definitiva Imagine que, mesmo após a edição da SV 24-STF, o Ministério Público tenha oferecido denúncia contra o réu pelo art. 1º, I sem que tivesse havido constituição definitiva do crédito tributário. O juiz recebeu a denúncia. O réu impetrou habeas corpus invocando o enunciado. Antes que fosse julgado o HC, houve lançamento definitivo. O que deverá acontecer nesse caso? A superveniente constituição definitiva convalida o vício inicial? NÃO. A constituição do crédito tributário após o recebimento da denúncia não tem o condão de convalidar a ação penal que foi iniciada em descompasso com as normas jurídicas vigentes e com a SV24 do STF. Desde o nascedouro, essa ação penal é nula porque referente a atos desprovidos de tipicidade (STJ. 5ª Turma. HC 238.417/SP, Rel. Min. Laurita Vaz, julgado em 11/03/2014).

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Trata-se de vício processual que não é passível de convalidação (STF. 1ª Turma. HC 97854, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 11/03/2014). O MP poderá, no entanto, oferecer nova denúncia após a constituição definitiva. Se essa denúncia tivesse sido proposta antes da SV 24-STF, então, nesse caso, a solução poderia diferente e a superveniência da constituição definitiva do crédito tributário poderia convalidar a ação proposta sem esse pressuposto. Isso porque antes da súmula havia muita polêmica sobre a matéria, sendo razoável, em nome da segurança jurídica, convalidar esses atos. Existe um precedente o STJ nesse sentido:

(...) antes da edição da Súmula Vinculante n. 24-STF, devem prevalecer, não somente por imperativo legal, mas também em atendimento ao Sobreprincípio da Segurança Jurídica - aqui abarcadas a reserva legal, a taxatividade e a anterioridade da lei penal -, as decisões proferidas pelas instâncias ordinárias, cuja certeza do direito, erigida dos fatos praticados em data que dista, e muito, da publicação do enunciado - e, como visto, do primeiro precedente acerca da questão -, estava longe de considerar o lançamento definitivo do crédito tributário, seja como condição de procedibilidade da ação penal, seja como elemento normativo do tipo do inciso I do art. 1º da Lei n. 8.137/91, nos termos do HC n. 81.611/DF (precedentes do STJ e desta Corte) (STJ. 6ª Turma. REsp 1211481/SP, Rel. p/ Acórdão Ministro Rogerio Schietti Cruz, julgado em 15/10/2013).

Termo inicial da prescrição penal Como antes da constituição definitiva do crédito tributário ainda não existe crime, somente com o lançamento definitivo é que se inicia a contagem do prazo de prescrição. Assim, para o STJ a fluência do prazo prescricional dos crimes contra a ordem tributária, previstos no art. 1º, incisos I a IV, da Lei n. 8.137/90, nos termos da jurisprudência desta Corte, tem início somente após a constituição do crédito tributário, o que se dá com o encerramento do procedimento administrativo-fiscal e o lançamento definitivo (STJ. 5ª Turma. AgRg no REsp 1217773/RS, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 20/05/2014). No caso do inciso V, por se tratar de crime formal, não se exige a constituição definitiva do crédito tributário para início da prescrição. Crime tributário, ausência de constituição definitiva e extradição Imagine a seguinte situação hipotética: Wagner, cidadão alemão, mora no Brasil e está respondendo a uma ação penal na Alemanha por sonegação fiscal, razão pela qual a República alemã pediu a sua extradição ao governo brasileiro. A defesa de Wagner alegou que ele não poderia ser extraditado, considerando que o débito tributário ainda estava sendo discutido nos órgãos administrativos alemães. Desse modo, a defesa argumentou que a ação penal na Alemanha foi proposta sem que houvesse constituição definitiva do crédito tributário. Logo, o STF não poderia extraditá-lo, considerando que, pela falta de constituição definitiva, essa conduta não seria crime no Brasil. O STF não concordou com a tese. Para a Corte, a conduta praticada pelo réu na Alemanha, qual seja, a sonegação de impostos (art. 370 do Código Penal alemão) também é crime no Brasil, encontrando

perfeita correspondência no tipo penal previsto no art. 1º, I, da Lei n. 8.137/90. Para que haja a extradição não se exige que a Alemanha comprove a constituição definitiva do crédito tributário. O que se exige, para o reconhecimento do pedido, é que o fato seja típico em ambos os países, não sendo necessário que o Estado requerente siga as mesmas regras fazendárias existentes no Brasil. STF. 2ª Turma. Ext 1222/República Federal da Alemanha, Rel. Min. Teori Zavascki, julgado em 20/8/2013 (Info 716). Pendência de processo em que se discute compensação A pendência de procedimento administrativo em que se discuta eventual direito de compensação de débitos tributários com eventuais créditos perante o Fisco não tem o condão, por si só, de suspender o curso da ação penal, eis que devidamente constituído o crédito tributário sobre o qual recai a persecução penal (STJ. 5ª Turma. REsp 1293633/DF, Rel. Min. Moura Ribeiro, julgado em 25/03/2014).

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Prescrição do crédito tributário e sua influência no processo penal Se após a constituição definitiva do crédito tributário, houve a prescrição do direito de a Fazenda Pública executar esse crédito, isso significa que o réu terá que ser absolvido no processo penal pelo crime tributário? NÃO. Trata-se de tema polêmico, mas existem precedentes do STJ decidindo que não. Confira:

(...) As instâncias administrativo-tributária, cível e penal são independentes, o que reflete no reconhecimento da prescrição da pretensão punitiva estatal. Desse modo, a extinção do crédito tributário pela prescrição não implica, necessariamente, a extinção da punibilidade do agente. (...) STJ. 5ª Turma. AgRg no AREsp 202.617/DF, julgado em 11/04/2013.

Tipo subjetivo: exige-se o dolo. Nenhum dos incisos pode ser punido a título de culpa. Para que se configure a sonegação fiscal, NÃO se exige nenhum elemento subjetivo especial (“dolo específico”). Basta o “dolo genérico” (STJ. 6ª Turma. AgRg no Ag 1157263/PR, julgado em 08/04/2014). Erro na interpretação da legislação tributária: Se ficar provado que o agente suprimiu ou reduziu tributo por conta de um erro na interpretação da legislação tributária, mesmo assim haverá crime? NÃO. Não há crime se ficar cabalmente provado que a supressão ou redução no recolhimento do tributo decorreu de erro na interpretação da lei tributária. Por que não haverá crime? 1ª corrente: verifica-se, no caso, erro de tipo uma vez que o agente não sabe que está suprimindo ou que aquele tributo é devido. É a posição de Baltazar (ob. cit., p. 843). 2ª corrente: trata-se de erro de proibição (TRF4 AC 20010401029987-0). Dificuldades financeiras: É comum haver a alegação de que o agente deixou de pagar os tributos em razão de dificuldades financeiras da empresa. Tal circunstância possui relevância penal e poderá servir para excluir o crime? NÃO. Essa tese tem sido rechaçada pela jurisprudência. Isso porque no art. 1º exige-se a fraude. Assim, não se justifica que a pessoa, mesmo diante de dificuldades financeiras, utilize-se de fraude para tentar burlar o Fisco. Deve-se lembrar que o simples fato de deixar de pagar os tributos não é crime. O delito exige além da inadimplência, a fraude. Relembrando: As dificuldades financeiras podem excluir o crime?

Apropriação indébita previdenciária (art. 168-A do CP): SIM.

Sonegação fiscal (art. 1º da Lei n. 8.137/90): NÃO. Princípio da insignificância: O princípio da insignificância pode ser aplicado no caso de crimes tributários? SIM. É plenamente possível que incida o princípio da insignificância tanto nos crimes contra a ordem

tributária previstos na Lei n. 8.137/90 como também no caso do descaminho (art. 334 do CP). Existe algum limite máximo de valor para que possa ser aplicado o princípio da insignificância nos crimes tributários? SIM. A jurisprudência criou a tese de que nos crimes tributários, para decidir se incide ou não o princípio da insignificância, será necessário analisar, no caso concreto, o valor dos tributos que deixaram de ser pagos.

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E qual é, então, o valor máximo considerado insignificante no caso de crimes tributários? Tradicionalmente, esse valor era de 10 mil reais. Assim, se o montante do tributo que deixou de ser pago era igual ou inferior a 10 mil reais, não havia crime tributário, aplicando-se o princípio da insignificância. Qual era o parâmetro para se chegar a esse valor?

Esse valor foi fixado pela jurisprudência tendo como base o art. 20 da Lei n. 10.522/2002, que determina o arquivamento das execuções fiscais cujo valor consolidado for igual ou inferior a R$ 10.000,00. Em outros termos, a Lei determina que, até o valor de 10 mil reais, os débitos inscritos como Dívida Ativa da União não serão executados. Segundo a jurisprudência, não há sentido lógico permitir que alguém seja processado criminalmente pela falta de recolhimento de um tributo que nem sequer será cobrado no âmbito administrativo-tributário. Nesse caso, o direito penal deixaria de ser a ultima ratio. Esse valor de 10 mil reais permanece ainda hoje? Aqui reside a polêmica. Recentemente, foi publicada a Portaria MF nº 75, de 29/03/2012, na qual o Ministro da Fazenda determinou, em seu art. 1º, inciso II, “o não ajuizamento de execuções fiscais de débitos com a Fazenda Nacional, cujo valor consolidado seja igual ou inferior a R$ 20.000,00 (vinte mil reais).”

Desse modo, o Poder Executivo “atualizou” o valor previsto no art. 20 da Lei n. 10.522/2002 e passou a dizer que não mais deveriam ser executadas as dívidas de até 20 mil reais. Em outras palavras, a Portaria MF 75/2012 “aumentou” o valor considerado insignificante para fins de execução fiscal. Agora, abaixo de 20 mil reais, não interessa à Fazenda Nacional executar (antes esse valor era 10 mil reais). Diante desse aumento produzido pela Portaria, começou a ser defendida a tese de que o novo parâmetro para análise da insignificância penal nos crimes tributários passou de 10 mil reais (de acordo com o art. 20

da Lei n. 10.522/2002) para 20 mil reais (com base na Portaria MF 75). A jurisprudência acolheu essa tese?

STJ: NÃO STF: SIM

O STJ tem decidido que o valor de 20 mil reais,

estabelecido pela Portaria MF n. 75/12 como limite mínimo para a execução de débitos contra a União, NÃO pode ser considerado para efeitos penais (não deve ser utilizado como novo patamar de insignificância). São apontados dois argumentos principais: i) a opção da autoridade fazendária sobre o que deve ou não ser objeto de execução fiscal não pode ter a força de subordinar o exercício da jurisdição penal; ii) não é possível majorar o parâmetro previsto no

art. 20 da Lei n. 10.522/2002 por meio de uma portaria do Ministro da Fazenda. A portaria emanada do Poder Executivo não possui força normativa passível de revogar ou modificar lei em sentido estrito.

Para o STF, o fato de a Portaria 75/2012 do Ministério da Fazenda ter aumentado o patamar de 10 mil reais para 20 mil reais produz efeitos penais. Logo, o novo valor máximo para fins de aplicação do princípio da insignificância nos crimes tributários passou a ser de 20 mil reais. Precedente: STF. 1ª Turma. HC 120617, Rel. Min. Rosa Weber, julgado em 04/02/2014. Vale ressaltar que o limite imposto por essa portaria pode ser aplicado de forma retroativa para fatos anteriores à sua edição considerando que se trata de norma mais benéfica (STF. 2ª Turma. HC 122213, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, Segunda Turma, julgado em 27/05/2014).

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Informativo 750-STF (01/07/2014) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 9

Em suma, para o STJ, o valor máximo para aplicação do princípio da insignificância no caso de crimes contra a ordem tributária (incluindo o descaminho) continua sendo de 10 mil reais. Precedentes: AgRg no AREsp 331.852/PR, j. em 11/02/2014. AgRg no AREsp 303.906/RS, j. em 06/02/2014.

Em suma, qual é o valor máximo considerado insignificante no caso de crimes tributários?

Para o STJ: 10 mil reais (art. 20 da Lei n. 10.522/2002).

Para o STF: 20 mil reais (art. 1º, II, da Portaria MF n. 75/2012). Esse valor não inclui juros e multa O valor a ser considerado para fins de aplicação do princípio da insignificância é aquele fixado no momento da consumação do crime, vale dizer, da constituição definitiva do crédito tributário, e não aquele posteriormente alcançado com a inclusão de juros e multa por ocasião da inscrição desse crédito na dívida ativa (STJ. 6ª Turma. REsp 1306425/RS, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 10/06/2014). Esse valor é considerado insignificante tanto no caso de crimes envolvendo tributos federais, como também estaduais e municipais? NÃO. Esse parâmetro vale, a princípio, apenas para os crimes que se relacionam a tributos federais,

considerando que é baseado no art. 20 da Lei n. 10.522/2002, que trata dos tributos federais. Assim, esse é o valor que a União considera insignificante. Para fins de crimes de sonegação fiscal que envolvam tributos estaduais ou municipais, deve ser analisado se há lei estadual ou municipal dispensando a execução fiscal no caso de tributos abaixo de determinado valor. Esse será o parâmetro para a insignificância (STJ. 6ª Turma. HC 165003/SP, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 20/03/2014). Tipo misto alternativo: Se a pessoa, no mesmo contexto fático, praticar condutas descritas em mais de um inciso do art. 1º, responderá por mais de um crime? Ex: o agente prestou declarações falsas à Receita Federal (inciso I) e, além disso, relacionado com o mesmo fato, inseriu elementos inexatos no seu livro fiscal (inciso II). Ele responderá por dois crimes? NÃO. Se o agente, no mesmo contexto fático, praticar as condutas descritas em mais de um inciso do art.

1º, responderá por crime único. Isso porque o art. 1º da Lei n. 8.137/90 é um tipo misto alternativo (tipo penal de conduta múltipla ou variada ou crime plurinuclear). Vale ressaltar, no entanto, que se o agente praticou várias condutas do art. 1º, o juiz poderá considerar essa circunstância como desfavorável na 1ª fase da dosimetria da pena. Vamos relembrar essa classificação:

Tipo simples: ocorre quando o legislador descreve apenas um verbo para tipificar a conduta. Ex: art. 121 (matar alguém).

Tipo misto: é aquele no qual o legislador descreve dois ou mais verbos, ou seja, mais de uma forma de se realizar o fato delituoso. Ex: art. 34 da Lei de Drogas (o agente pratica o crime se fabricar, adquirir, utilizar etc).

O tipo misto pode ser alternativo ou cumulativo.

Tipo misto alternativo: o legislador descreveu duas ou mais condutas (verbos). Se o sujeito praticar

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mais de um verbo, no mesmo contexto fático e contra o mesmo objeto material, responderá por um único crime, não havendo concurso de crimes nesse caso. Ex: João adquire, na boca-de-fumo, uma máquina para fazer drogas, transporta-a para sua casa e lá a utiliza. Responderá uma única vez pelo art. 34 e não por três crimes em concurso.

Tipo misto cumulativo: o legislador descreveu duas ou mais condutas (verbos). Se o sujeito incorrer em mais de um verbo, irá responder por tantos crimes quantos forem os núcleos praticados. Ex: art. 242 do CP.

Mais de um tributo sonegado: Se o agente, com uma conduta, sonegou dois tributos diferentes, praticou dois crimes? NÃO. Trata-se de crime único. A conduta consistente em praticar qualquer uma ou todas as modalidades descritas nos incisos I a V do art. 1 da Lei nº 8.137/90 (crime misto alternativo) conduz à consumação de crime de sonegação fiscal quando houver supressão ou redução de tributo, pouco importando se atingidos um ou mais impostos ou contribuições sociais. Não há concurso formal, mas crime único, na hipótese em que o contribuinte, numa única conduta, declara Imposto de Renda de Pessoa Jurídica com a inserção de dados falsos, ainda que tal conduta tenha obstado o lançamento de mais de um tributo ou contribuição. STJ. 6ª Turma. REsp 1294687/PE, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 15/10/2013. Crime continuado: O crime continuado ocorre quando o agente: - por meio de duas ou mais condutas - pratica dois ou mais crimes da mesma espécie - e, analisando as condições de tempo, local, modo de execução e outras, - pode-se constatar que os demais crimes devem ser entendidos como mera continuação do primeiro. É possível crime continuado no caso de sonegação fiscal (art. 1º)? SIM. Ex: determinada empresa, mensalmente, tem que recolher o tributo. Todos os meses ela omite valores de seu faturamento a fim de pagar menos tributos. A cada mês ela comete um novo crime, mas pode-se verificar que os demais são continuação do primeiro. Logo, é possível reconhecer a continuidade delitiva. Conexão de tempo (conexão temporal) Para que se configura o crime continuado é necessário que não se tenha passado um longo período de tempo entre um crime e outro. A isso chamamos de conexão temporal entre os delitos. Para os crimes patrimoniais, a jurisprudência afirma que entre o primeiro e o último delito não pode ter se passado mais que 30 dias. Se houve período superior a 30 dias, não se aplica mais o crime continuado, havendo, neste caso, concurso material. No caso de crimes contra a ordem tributária, a jurisprudência admite que esse prazo seja maior. Isso porque, em geral, os tributos são pagos, em geral, em uma periodicidade mínima de 30 dias entre um recolhimento e outro. Logo, se fossemos limitar a continuidade em um mês, isso faria com que, na prática, fosse impossível reconhecer o crime continuado na sonegação fiscal. Falsidade utilizada para praticar os crimes do art. 1º Mais abaixo você verificará que os incisos I a IV do art. 1º preveem que o agente pratica a sonegação fiscal prestando declarações falsas, falsificando documentos ou usando documentos falsos. Diante disso, surge a seguinte questão jurídica: o agente responderá somente pela sonegação fiscal ou também será ser punido, em concurso de crimes, pela falsidade? Em regra, somente pela sonegação. Se a falsidade é o meio necessário para a consumação do crime de sonegação fiscal, fica por este absorvida. Aplica-se, no caso, o princípio da consunção.

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Esse é o entendimento no caso de IRPF: Ex: João, ao fazer sua declaração de imposto de renda, declarou que teve 2 mil reais de despesas com tratamento psicológico, fazendo a dedução desse valor do quanto teria que pagar de imposto. Isso se chama “dedução de despesas para a redução da base de cálculo do Imposto de Renda de Pessoa Física”. A Receita Federal instaurou um procedimento administrativo (ação fiscal) para apurar se realmente essas deduções ocorreram, tendo João sido convocado a comparecer ao órgão, levando o comprovante das despesas feitas com o tratamento. Ocorre que João não tinha realmente feito esse tratamento e só declarou isso para reduzir o valor que tinha que pagar de tributo. João, a fim de garantir a concretização do delito, foi até a Receita Federal levando comprovantes falsificados de pagamentos supostamente feitos a psicólogo. A falsidade foi, contudo, percebida. João não responderá por uso de documento falso (art. 304 c/c art. 299 do CP). O STJ entende que a apresentação de recibo ideologicamente falso quando o contribuinte é chamado a comprovar as declarações prestadas tem a finalidade única e exclusiva de justificar as despesas declaradas e, assim, eximir ou reduzir o pagamento do tributo. Se o agente não apresentasse documento que justificasse a despesa anteriormente declarada estaria frustrada a redução ou supressão do tributo. Desse modo, fica evidente que o falso foi o crime-meio pelo qual o agente buscou alcançar a finalidade de sonegar o imposto. Deve ser aplicado, portanto, no caso, o princípio da consunção, sendo o falso absorvido pelo intento de suprimir ou diminuir tributo. O STJ possui entendimento sumulado no sentido de que se o falso é crime-meio e se este falso não pode mais ser usado para nenhum outro fim (esgotando-se a sua potencialidade lesiva), deve ser absorvido pelo crime-fim. Veja: Súmula 17-STJ: Quando o falso se exaure no estelionato, sem mais potencialidade lesiva, é por este absorvido. STJ. 5ª Turma. AgRg no REsp 1411730/MG, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 18/03/2014. Esse entendimento não se aplica no caso de IRPJ Atenção. Ao contrário do IRPF, no caso de sonegação fiscal envolvendo IRPJ, o STJ tem normalmente refutado o princípio da consunção e aplicado o concurso de crimes, especialmente porque nesses casos a falsidade é mais complexa e envolve uma série de atos, diferentemente do caso do IRPF:

(...) 2. É inviável aplicar o princípio da consunção diante da autonomia de condutas, não se podendo considerar o crime de falsidade ideológica, em tese praticado pelo acusados, como crime meio do delito de sonegação fiscal. 3. Os Recorrentes e outros réus suprimiram e reduziram imposto de renda de pessoa jurídica, fraudando a fiscalização tributária mediante simulação de operações comerciais envolvendo pessoa jurídica fictícia, para quem era transferida toda a carga tributária, imunizando o real patrimônio dos verdadeiros sócios. (...) (RHC 25.978/SP, Rel. Min. Laurita Vaz, Quinta Turma, julgado em 27/03/2012)

1. É inviável o reconhecimento da aplicação do princípio da consunção, diante da autonomia de condutas, não se podendo considerar o crime de falsidade ideológica, em tese praticado pelo ora Paciente, como crime meio do delito de sonegação fiscal. 2. Na hipótese, o Paciente juntamente com outros acusados suprimiram e reduziram imposto de renda de pessoa jurídica e contribuições sociais, fraudando a fiscalização tributária mediante simulação de operações comerciais envolvendo pessoa jurídica, para quem era transferida toda a carga tributária, imunizando o real patrimônio dos verdadeiros sócios. (...) (RHC 24636/SP, 5.ª Turma, Rel. Min. Laurita Vaz, DJe de 21/02/2011)

Alguns tipos penais específicos parecidos com a sonegação fiscal: Deve-se tomar cuidado com algumas condutas assemelhadas com sonegação fiscal, mas que são punidas por outros tipos penais mais específicos:

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Falsificação de selo ou sinal público (art. 293, I e V, do CP)

Art. 293. Falsificar, fabricando-os ou alterando-os: I – selo destinado a controle tributário, papel selado ou qualquer papel de emissão legal destinado à arrecadação de tributo; (...) V – talão, recibo, guia, alvará ou qualquer outro documento relativo a arrecadação de rendas públicas ou a depósito ou caução por que o poder público seja responsável; Pena - reclusão, de dois a oito anos, e multa.

Situação mais comum: falsificação do selo de controle do IPI utilizados em cigarros e bebidas destiladas. Descaminho (art. 334 do CP)

Art. 334. Iludir, no todo ou em parte, o pagamento de direito ou imposto devido pela entrada, pela saída ou pelo consumo de mercadoria: Pena - reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos.

Ocorre nos casos envolvendo impostos aduaneiros (imposto de importação, de exportação e imposto sobre produtos industrializados). Lei de incentivo à cultura

A Lei n. 8.313/91, como forma de incentivar as atividades culturais, prevê que os contribuintes poderão deduzir do imposto de renda as quantias despendidas em forma de doações ou patrocínios para projetos aprovados pelo Ministério da Cultura (art. 18, § 1º). Caso o agente obtenha redução do imposto de renda utilizando-se fraudulentamente dos benefícios dessa

Lei irá responder, não pelos crimes do art. 1º da Lei n. 8.137/90, mas sim por um tipo penal específico

trazido pelo art. 40 da Lei n. 8.313/91, cuja pena é de 2 a 6 meses (!) e multa de 20% do valor do projeto. Competência A competência para julgamento desse delito, em regra, será determinada pela natureza do tributo sonegado:

Se o tributo for federal, a competência para julgar o crime será da Justiça Federal.

Se o tributo for estadual ou municipal, a competência será da Justiça Estadual. Se houver crimes envolvendo tributos federais e estaduais ou municipais, deve-se analisar se eles são conexos. Se forem conexos, a competência para apurar todas as infrações será da Justiça Federal, conforme enuncia a Súmula 122 do STJ. Se os delitos não forem conexos, serão julgados separadamente, na Justiça Federal e na Justiça Estadual. Ação penal: pública incondicionada (art. 15 e Súmula 609 do STF). Questões finais interessantes: Elisão e evasão fiscal:

Elisão fiscal: são atos lícitos praticados pelo contribuinte, antes da ocorrência do fato gerador, com o objetivo de se organizar melhor a fim de evitar a realização de certas operações que fazem com que se pague mais tributos desnecessariamente. É chamado de “economia do imposto” ou “planejamento tributário”. Ex: alguns profissionais autônomos (médicos, psicólogos etc.) decidem constituir uma pessoa jurídica para presar seus serviços. Com isso, a carga tributária que eles pagarão será menor do que incidiria caso atuassem sozinhos e tivessem que emitir RPA, que é o recibo do profissional autônomo.

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Evasão fiscal: são atos ilícitos praticados pelo contribuinte, após da ocorrência do fato gerador, com o objetivo de burlar o Fisco mediante fraude e não pagar o tributo devido. É sinônimo de sonegação fiscal. Dica para memorizar: eLisão = ato Lícito / eVasão = ato Viciado

O delito de sonegação fiscal é inconstitucional por representar a criminalização da dívida? NÃO. Isso porque não há criminalização da dívida. Na sonegação fiscal não se pune a pessoa pelo simples fato de ela estar devendo o tributo. O agente é punido pelo fato de ele estar inadimplente e ter se utilizado de algum tipo de fraude para evitar o pagamento. Exige-se inadimplemento + fraude. Veja como Baltazar explica o tema: “(...) é importante deixar claro que a conduta de deixar de pagar tributo, por si só, não constitui crime. Assim, se o contribuinte declara todos os fatos geradores à repartição fazendária, de acordo com a periodicidade exigida em lei, cumpre todas as obrigações tributárias acessórias e tem escrita contábil regular, mas não paga o tributo, não há crime algum, mas mero inadimplemento (...). O crime contra a ordem tributária, com exceção da apropriação indébita (...), pressupõe, além do inadimplemento, alguma forma de fraude, que poderá estar consubstanciada na omissão de alguma declaração, na falsificação material ou ideológica de documentos, no uso de documentos material ou ideologicamente falsos, na simulação etc. (...) Eis aí a distinção entre inadimplência e sonegação: a fraude. Não procede, portanto, argumento de que a incriminação da sonegação fiscal recai sobre o mero inadimplemento, configurando incriminação por dívida.” (BALTAZAR JUNIOR, José Paulo. Crimes Federais. 9ª ed, São Paulo: Saraiva, 2014, p. 818). INCISO I

Art. 1° Constitui crime contra a ordem tributária suprimir ou reduzir tributo, ou contribuição social e qualquer acessório, mediante as seguintes condutas: I - omitir informação, ou prestar declaração falsa às autoridades fazendárias;

Em que consiste o delito: - O agente deixa de fornecer uma informação que deveria fazer; - ou presta declaração errada - às autoridades responsáveis pela arrecadação tributária - e por conta disso ele acaba deixando de pagar o tributo - ou pagando um valor menor do que seria o devido. Ex1: um médico recebe os honorários de um paciente e deixa de informar esse rendimento em sua declaração anual de imposto de renda. Ex2: um cirurgião recebe 20 mil reais de honorários de um paciente, mas informa à Receita Federal que recebeu apenas 10 mil reais. Ex3: João, ao fazer sua declaração de imposto de renda, declarou que teve 2 mil reais de despesas com tratamento psicológico, fazendo a dedução desse valor do quanto teria que pagar de imposto. Isso se chama “dedução de despesas para a redução da base de cálculo do Imposto de Renda de Pessoa Física”. A Receita Federal instaurou um procedimento administrativo (ação fiscal) para apurar se realmente essas deduções ocorreram, tendo João sido convocado a comparecer ao órgão, levando o comprovante das despesas feitas com o tratamento. Ocorre que João não tinha realmente feito esse tratamento e só declarou isso para reduzir o valor que tinha que pagar de tributo. O agente que faz declaração falsa sobre a existência de despesas com tratamento de saúde/psicológica, com o fim de reduzir o imposto de renda

pode responder pelo delito previsto no art. 1º, I, da Lei n. 8.137/90.

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Tipo subjetivo: O tipo penal descrito no art. 1.º, inciso I, da Lei n.º 8.137/90, prescinde de dolo específico, sendo suficiente, para sua caracterização, a presença do dolo genérico, consistente na omissão voluntária do recolhimento, no prazo legal, do valor devido aos cofres públicos (STJ. 5ª Turma. AgRg no REsp 1283767/SC, Rel. Min. Laurita Vaz, julgado em 25/03/2014).

Art. 42 da Lei n. 9.430/96 e princípio da presunção de inocência

A Lei n. 9.430/96 trata sobre procedimentos de fiscalização tributária realizados pela Receita Federal. Em alguns dispositivos, a Lei define omissão de receita, ou seja, situações em que a fiscalização considera que o contribuinte não declarou corretamente as receitas ou rendimentos obtidos. Veja o que diz o art. 42:

Art. 42. Caracterizam-se também omissão de receita ou de rendimento os valores creditados em conta de depósito ou de investimento mantida junto a instituição financeira, em relação aos quais o titular, pessoa física ou jurídica, regularmente intimado, não comprove, mediante documentação hábil e idônea, a origem dos recursos utilizados nessas operações.

Em outras palavras, se é depositada uma determinada quantia na conta bancária do indivíduo e este não consegue provar a origem desses recursos, a Receita Federal irá presumir que são rendimentos e, consequentemente, irá lavrar auto de infração e cobrar o valor do imposto de renda sobre tais quantias. Se o contribuinte não se defender administrativamente ou se a sua defesa não for acatada, haverá a constituição definitiva desse crédito tributário. A partir daí, a RFB comunica o fato ao MPF que, então, irá formular denúncia (ação penal) contra o

contribuinte alegando que ele praticou o delito do art. 1º, I, da Lei n. 8.137/90. A jurisprudência entende que, se for verificada uma incompatibilidade entre os rendimentos informados na declaração de ajuste anual e os valores movimentados no ano-calendário, haverá uma presunção de que o contribuinte omitiu informação sobre receitas auferidas com o fim de suprimir ou reduzir o imposto

de renda, o que caracteriza a prática do crime previsto no art. 1º, I, da Lei n. 8.137/90. Feitos esses esclarecimentos, imagine a seguinte situação concreta: João declarou, para fins do imposto de renda de 2010, que teve renda anual tributável de 60 mil reais. Ocorre que a Receita Federal constatou que, ao longo de 2010, passaram cerca de 500 mil reais pelas suas contas bancárias. Diante disso, a RFB iniciou um processo administrativo fiscal e intimou o contribuinte para declinar a origem dos valores creditados em sua conta corrente. João não justificou a origem da quantia. Houve constituição definitiva do crédito tributário, o MPF ajuizou ação penal e João foi condenado pelo

crime do art. 1º, I, da Lei n. 8.137/90. Em seu recurso, João alegou que essa condenação violou o princípio constitucional da presunção de inocência uma vez que o MPF não provou que ele sonegou rendimentos. O Parquet provou apenas que houve essa movimentação em suas contas, mas não que tais quantias sejam rendimentos. Logo, ele não poderia ser condenado. Essa tese de defesa é acolhida pelos Tribunais? NÃO. NÃO ofende o princípio constitucional da presunção de inocência a exigência de comprovação da

origem de valores estabelecida no art. 42 da Lei n. 9.430/96. Para o STF, o contribuinte, ao não comprovar a origem dos recursos depositados em sua conta bancária, cria, contra si, uma presunção relativa de que houve omissão de rendimentos, ensejando a condenação criminal. Não há ofensa ao princípio da presunção de inocência porque se trata de um procedimento legalmente estabelecido e disciplinado, sendo certo que ao contribuinte é garantido o contraditório e a ampla defesa. STF. 2ª Turma. HC 121125/PR, Rel. Min. Gilmar Mendes, 10/6/2014 (Info 750).

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Esse é também o entendimento do STJ sobre o tema:

(...) A jurisprudência deste Tribunal Superior é firme no sentido de que a incompatibilidade entre os rendimentos informados na declaração de ajuste anual e os valores efetivamente movimentados no ano-calendário caracterizam a presunção relativa de omissão de receita. (STJ. 5ª Turma. AgRg no REsp 1217773/RS, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 20/05/2014).

Vale ressaltar que essa presunção é relativa. O contribuinte pode fazer prova em sentido contrário, ou seja, pode comprovar que aquelas quantias movimentadas em sua conta não foram rendimentos, mas sim valores que passaram por sua conta por outras razões. INCISO II

Art. 1° Constitui crime contra a ordem tributária suprimir ou reduzir tributo, ou contribuição social e qualquer acessório, mediante as seguintes condutas: II - fraudar a fiscalização tributária, inserindo elementos inexatos, ou omitindo operação de qualquer natureza, em documento ou livro exigido pela lei fiscal;

Em que consiste o crime: Ocorre quando o agente frauda a fiscalização tributária, o que pode ocorrer de duas formas: a) Inserindo elementos inexatos em documento ou livro fiscal; b) Omitindo operação em documento ou livro fiscal. Qual é a diferença entre os incisos I e II?

Inciso I: o agente omite ou presta informação falsa em declaração entregue à autoridade fazendária;

Inciso II: o agente omite ou presta informação falsa em livros ou documentos fiscais que são mantidos em poder da empresa.

Documento ou livro exigido pela lei fiscal: A lei exige que o empresário mantenha certos documentos ou livros com informações que são de interesse do Fisco. É o caso, por exemplo, do livro contendo o registro da entrada e saída de mercadorias. Exemplo: ocorre quando o agente mantém o chamado “caixa dois”, ou seja, quando ele frauda seus livros fiscais, omitindo ou falseando as informações ali contidas a fim de manter uma contabilidade paralela, onde as entradas e saídas com números reais ficam registradas em outros locais. INCISO III

Art. 1° Constitui crime contra a ordem tributária suprimir ou reduzir tributo, ou contribuição social e qualquer acessório, mediante as seguintes condutas: III - falsificar ou alterar nota fiscal, fatura, duplicata, nota de venda, ou qualquer outro documento relativo à operação tributável;

Em que consiste o crime: O agente falsifica ou altera nota fiscal, fatura, duplicata, nota de venda e outros documentos a fim de conseguir suprimir ou reduzir o tributo devido. Exemplo: o vendedor combina com o comprador de registrar a operação em valor menor do que ocorreu com o objetivo de fazer com que ele pague menos imposto sobre a operação. A isso, chama-se na linguagem comercial de “meia nota”.

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INCISO IV

Art. 1° Constitui crime contra a ordem tributária suprimir ou reduzir tributo, ou contribuição social e qualquer acessório, mediante as seguintes condutas: IV - elaborar, distribuir, fornecer, emitir ou utilizar documento que saiba ou deva saber falso ou inexato;

Em que consiste o crime: O agente produz, repassa ou utiliza documento que ele sabe (ou que deveria saber) que não é verdadeiro e com isso ele suprime ou reduz tributo. É parecido com o inciso III, mas aqui o documento está em sentido mais amplo, de forma que, não se enquadrando nos incisos anteriores, poderá incidir neste. INCISO V

Art. 1° Constitui crime contra a ordem tributária suprimir ou reduzir tributo, ou contribuição social e qualquer acessório, mediante as seguintes condutas: V - negar ou deixar de fornecer, quando obrigatório, nota fiscal ou documento equivalente, relativa a venda de mercadoria ou prestação de serviço, efetivamente realizada, ou fornecê-la em desacordo com a legislação.

Em que consiste o crime: O crime pode ocorrer mediante três condutas: a) O agente se nega a fornecer nota fiscal ou documento equivalente, relativa a venda de mercadoria ou

prestação de serviço. Ex: o comprador pede a nota fiscal e o vendedor se recusa a fornecê-la. b) O agente deixar de fornecer nota fiscal ou documento equivalente, relativa a venda de mercadoria ou

prestação de serviço, efetivamente realizada. c) O agente fornece a nota fiscal ou documento equivalente em desacordo com a legislação. Não se aplica a SV 24-STF Chamo atenção novamente para o fato de que, para configurar o crime, NÃO será necessário aguardar a constituição definitiva do crédito tributário. O inciso V do art. 1º NÃO está abrangido pela SV 24-STF. PENA

Pena - reclusão de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa.

PARÁGRAO ÚNICO

Parágrafo único. A falta de atendimento da exigência da autoridade, no prazo de 10 (dez) dias, que poderá ser convertido em horas em razão da maior ou menor complexidade da matéria ou da dificuldade quanto ao atendimento da exigência, caracteriza a infração prevista no inciso V.

Em que consiste o crime: Ocorre quando a autoridade fazendária, no exercício da fiscalização tributária, dá uma ordem à pessoa exigindo alguma providência e esta se recusa a cumpri-la. Esse parágrafo único é como se fosse um crime de desobediência específico para ordens da autoridade fazendária no exercício da fiscalização.

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Tipo autônomo ou vinculado ao caput? Baltazar e grande parte da doutrina defendem que o parágrafo único é um tipo autônomo em relação aos delitos previstos nos incisos do art. 1º. Assim, para que se configure, não se exige que o agente tenha a intenção de reduzir ou suprimir tributos. Basta que a pessoa desatenda a exigência imposta pela autoridade no prazo legal. Ocorre que a 6ª Turma do STJ recentemente decidiu em sentido contrário, ou seja, sustentado que também no parágrafo único exige-se a supressão ou redução do tributo: (...) Partindo da premissa de que o parágrafo único deve ser interpretado de acordo com o caput do artigo e, ainda, que a figura típica nele delineada faz remissão direta ao crime previsto no inciso V, trancada a ação penal em relação a este delito, não se pode admitir a permanência da condenação somente pela conduta prevista no parágrafo único do art. 1º da Lei n. 8.137/90. (...) STJ. 6ª Turma. HC 246.548/SC, Rel. Min. Og Fernandes, julgado em 27/08/2013.

DIREITO PROCESSUAL PENAL

Pluralidade de investigados sendo um deles com foro privativo no STF

Compete ao STF decidir quanto à conveniência de desmembramento de procedimento de investigação ou persecução penal quando houver pluralidade de investigados e um deles tiver prerrogativa de foro perante a Corte.

Em outras palavras, se, durante a investigação criminal, houver investigados com foro por prerrogativa de função no STF e outros sem foro privativo, o STF poderá decidir desmembrar os feitos e permanecer investigando apenas as autoridades, circunstância em que a investigação dos demais será feita em 1ª instância.

STF. 2ª Turma. AP 871, 872, 873, 874, 875, 876, 877 e 878 QO/PR, Rel. Min. Teori Zavascki, julgados em 10/6/2014 (Info 750).

Imagine a seguinte situação adaptada: Havia uma investigação criminal em curso sendo conduzida pela Polícia Federal, com a supervisão do MPF, e que envolvia inúmeros suspeitos de terem praticado diversos crimes de competência federal. O juiz federal que acompanhava o caso já havia deferido diversas medidas cautelares, como interceptação telefônica e telemática. No relatório de monitoramento telemático datado de 17/04/2014, a equipe de analistas da Polícia Federal noticiou que houve trocas de mensagens suspeitas entre um dos investigados e um Deputado Federal. O Deputado Federal não era alvo das investigações e não tinha seus telefones interceptados, sendo captado seu diálogo por conta de ter se comunicado com uma pessoa investigada. Desse modo, houve “encontro fortuito de provas” contra o Parlamentar federal. Ressalte-se que o Deputado não poderia ser investigado em 1ª instância porque desfruta de foro por prerrogativa de função, de forma que eventual interceptação ou qualquer ato de investigação contra ele somente poderia ser autorizado pelo STF (art. 102, I, “b”, da CF/88).

Diante da descoberta de eventual participação de Deputado Federal nos crimes, qual é a providência a ser adotada pelo juiz? Deverá comunicar ao STF sobre esse fato.

O juiz pode continuar investigando o Parlamentar federal? NÃO. Isso porque essa investigação deverá ser autorizada e conduzida pelo STF. Caso o magistrado continuasse as diligências investigatórias, estas seriam ilegais, podendo ser anuladas, por violação ao foro por prerrogativa de função.

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Nesse caso concreto, as diligências investigatórias que ocorreram antes de 17/04/2014 devem ser anuladas? NÃO. Em princípio, tais diligências são válidas porque os alvos da investigação eram pessoas sem foro por prerrogativa de função. Houve um encontro fortuito de provas contra o Deputado Federal. A teoria do encontro fortuito de provas é utilizada quando, no cumprimento de uma diligência para investigar determinados delitos envolvendo certas pessoas, a autoridade policial casualmente encontra provas relacionadas com outra infração penal ou com outros alvos que não estavam na linha de desdobramento normal da investigação. Se o encontro foi realmente casual (fortuito), a prova será lícita. Por outro lado, a defesa pode tentar provar que a autoridade policial sabia que iria encontrar aquelas provas e que, de maneira informal, estava investigando aqueles outros crimes ou pessoas. Nessa segunda hipótese, a “descoberta” seria forjada e a prova seria reputada como ilícita, devendo ser anulada, considerando que teria havido desvio de finalidade. A investigação de todos continuará no STF? Não necessariamente. A investigação da autoridade com foro privativo deverá ser feita, obrigatoriamente, no STF. No entanto, a Corte poderá decidir desmembrar o feito, a fim de conduzir apenas a investigação da autoridade, determinando a remessa do restante da investigação para a 1ª instância. Assim, compete ao STF decidir quanto à conveniência do desmembramento de procedimento de investigação ou persecução penal, quando houver pluralidade de investigados e um deles tiver prerrogativa de foro perante a Corte. Em regra, o STF determina o desmembramento ou faz a investigação/julgamento unificado? Segundo já decidiu a Corte, o desmembramento de inquéritos ou de ações penais de competência do STF deve ser a regra geral, admitida exceção nos casos em que os fatos relevantes estejam de tal forma relacionados, que o julgamento em separado possa causar prejuízo relevante à prestação jurisdicional. STF. Plenário. Inq 3515 AgR/SP, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 13/2/2014 (Info 735).

No procedimento da Lei de Drogas, o interrogatório continua sendo o primeiro ato da audiência

Importante!!!

O rito previsto no art. 400 do CPP NÃO se aplica à Lei de Drogas. Assim, o interrogatório do réu processado com base na Lei n. 11.343/2006 deve observar o procedimento nela descrito (arts. 54 a 59).

O art. 57 da Lei n. 11.343/2006 estabelece que o interrogatório ocorre em momento anterior à oitiva das testemunhas, diferentemente do que prevê o art. 400 do CPP, que dispõe que o interrogatório seria realizado ao final da audiência de instrução e julgamento.

No confronto entre as duas leis, aplica-se a lei especial quanto ao procedimento, que, no caso, é a Lei de Drogas.

Logo, não gera nulidade o fato de, no julgamento dos crimes previstos na Lei n. 11.343/2006, a oitiva do réu ocorrer antes da inquirição das testemunhas.

Segundo regra contida no art. 394, § 2º, do CPP, o procedimento comum será aplicado no julgamento de todos os crimes, salvo disposições em contrário do próprio CPP ou de lei especial. Logo, se para o julgamento dos delitos disciplinados na Lei 11.343/2006 há rito próprio (art. 57, da Lei 11.343/2006), no qual o interrogatório inaugura a audiência de instrução e julgamento, é de se afastar o rito ordinário (art. 400 do CPP) nesses casos, em razão da especialidade.

STF. 2ª Turma. HC 121953/MG, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgado em 10/6/2014 (Info 750).

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A Lei n. 11.343/2006 tipifica os delitos envolvendo drogas. Além de prever os crimes, a referida Lei também traz o procedimento, ou seja, o rito que deverá ser observado pelo juiz. Desse modo, a Lei n. 11.343/2006 traz um procedimento especial que possui algumas diferenças em relação ao procedimento comum ordinário previsto no CPP. Uma das diferenças reside no momento em que é realizado o interrogatório do réu. Vejamos:

CPP (art. 400) Lei n. 11.343/2006 (art. 57)

O art. 400 do CPP foi alterado pela Lei n. 11.719/2008 e, atualmente, o interrogatório deve ser feito depois da inquirição das testemunhas e da realização das demais provas. Em suma, o interrogatório passou a ser o último ato da audiência de instrução (segundo a antiga previsão, o interrogatório era o primeiro ato).

O art. 57 da Lei de Drogas prevê que, na audiência de instrução e julgamento, o interrogatório do acusado é feito antes da inquirição das testemunhas. Em suma, o interrogatório é o primeiro ato da audiência de instrução.

O que é mais favorável ao réu: ser interrogado antes ou depois da oitiva das testemunhas? Depois. Isso porque após o acusado ouvir o relato trazido pelas testemunhas poderá decidir a versão dos fatos que irá apresentar. Se, por exemplo, avaliar que nenhuma testemunha o apontou como o autor do crime, poderá sustentar a negativa de autoria ou optar pelo direito ao silêncio. Ao contrário, se entender que as testemunhas foram sólidas em incriminá-lo, terá como opção viável confessar e obter a atenuação da pena. Dessa feita, a regra do art. 400 do CPP é mais favorável ao réu do que a previsão do art. 57 da Lei n. 11.343/2006. Diante dessa constatação, e pelo fato de a Lei n. 11.719/2008 ser posterior à Lei de Drogas, surgiu uma corrente na doutrina defendendo que o art. 57 foi derrogado e que, também no procedimento da Lei n. 11.343/2006, o interrogatório deveria ser o último ato da audiência de instrução. Essa tese foi acolhida pela jurisprudência? NÃO. Segundo o posicionamento que tem prevalecido no STJ e STF, a regra do art. 57 da Lei n. 11.343/2006 prevalece sobre a regra geral do CPP, sendo legítimo o interrogatório do réu antes da oitiva das testemunhas no rito da Lei de Drogas.

(...) Para o julgamento dos crimes previstos na Lei n.º 11.343/06 há rito próprio, no qual o interrogatório inaugura a audiência de instrução e julgamento (art. 57). Desse modo, a previsão de que a oitiva do réu ocorra após a inquirição das testemunhas, conforme disciplina o art. 400 do Código de Processo Penal, não se aplica ao caso, em razão da regra da especialidade (art. 394, § 2º, segunda parte, do Código de Processo Penal). (...) STJ. 5ª Turma. HC n. 165.034/MG, Rel. Min. Laurita Vaz, DJe 9/10/2012. (...) Ao contrário do que ocorre no procedimento comum (ordinário, sumário e sumaríssimo), no especial rito da Lei 11.343/2006, o interrogatório é realizado no limiar da audiência de instrução e julgamento. (...) STJ. 6ª Turma. HC 212.273/MG, Min. Maria Thereza De Assis Moura, julgado em 11/03/2014. (...) Se a paciente foi processada pela prática do delito de tráfico ilícito de drogas, sob a égide da Lei 11.343/2006, o procedimento a ser adotado é o especial, estabelecido nos arts. 54 a 59 do referido diploma legal. II – O art. 57 da Lei de Drogas dispõe que o interrogatório ocorrerá em momento anterior à oitiva das testemunhas, diferentemente do que prevê o art. 400 do Código de Processo Penal. (...) STF. 2ª Turma. RHC 116713, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgado em 11/06/2013.

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DIREITO TRIBUTÁRIO

Pedágio possui natureza jurídica de tarifa

O pedágio cobrado pela efetiva utilização de rodovias NÃO tem natureza tributária, mas de preço público, consequentemente, não está sujeito ao princípio da legalidade estrita.

STF. Plenário. ADI 800/RS, Rel. Min. Teori Zavascki, julgado em 11/6/2014 (Info 750).

PEDÁGIO Em que consiste Pedágio é um valor pago pelo condutor do veículo para que ele tenha direito de trafegar por uma determinada via de transporte terrestre, como uma estrada, uma ponte, um túnel etc. Essa quantia é paga a um órgão ou entidade da Administração Pública ou, então, como é mais comum, a uma empresa privada concessionária que faz a exploração da via. A finalidade do pedágio é custear a conservação das vias de transporte. Previsão constitucional A CF/88 trata sobre o pedágio em um único dispositivo:

DAS LIMITAÇÕES DO PODER DE TRIBUTAR Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: (...) V - estabelecer limitações ao tráfego de pessoas ou bens, por meio de tributos interestaduais ou intermunicipais, ressalvada a cobrança de pedágio pela utilização de vias conservadas pelo Poder Público;

Qual é a natureza jurídica do pedágio? Trata-se de questão extremamente controvertida na doutrina. As três correntes principais sobre o tema são as seguintes:

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1ª corrente: TAXA (TRIBUTO)

Três argumentos para se considerar o pedágio como taxa: a) a CF/88 trata sobre o pedágio no art. 150, ao falar sobre as limitações constitucionais ao poder de tributar. Em outras palavras, o pedágio está inserido topograficamente em uma seção que trata sobre tributos; b) o pedágio seria o pagamento pela utilização de um serviço específico ou divisível, prestado ao contribuinte ou posto à sua disposição, conceito coincidente com o de taxa; c) não seria possível remunerar os serviços públicos por outro meio que não fosse a taxa. Sendo uma espécie de tributo, somente pode ser instituída e reajustada por meio de lei. Está sujeita ao princípio da legalidade estrita. É a corrente majoritária na doutrina. Exs: Antônio Roque Carrazza; Luciano Amaro; Leandro Paulsen.

2ª corrente: TARIFA (PREÇO PÚBLICO)

Três respostas para se considerar pedágio como tarifa: a) a posição topográfica não é determinante e o que a CF/88 quis dizer é que, apesar de não incidir tributo sobre o tráfego de pessoas ou bens, poderia ser cobrado o pedágio, espécie jurídica diferenciada; b) o pedágio somente pode ser cobrado pela utilização efetiva do serviço. Não é possível sua cobrança em caso de utilização potencial. Logo, não se enquadra no conceito. c) é possível sim remunerar serviços públicos por meio de tarifa, desde que esses serviços não sejam de utilização compulsória. No caso, a utilização de rodovias não é obrigatória. A pessoa pode optar por não utilizar. Como não é tributo, o pedágio pode ser instituído e reajustado por meio de atos infralegais. NÃO está sujeito ao princípio da legalidade estrita. Sustentada por Ricardo Lobo Torres; Sacha Calmon.

3ª corrente: Depende:

Se HOUVER via alternativa: tarifa.

Se NÃO houver alternativa: taxa.

Essa posição é baseada no seguinte raciocínio: se não houver via alternativa, a utilização daquela estrada com pedágio será compulsória. Logo, o valor cobrado a título de pedágio será considerado taxa. Se houver alternativa gratuita, a utilização da via com pedágio é uma faculdade do motorista. Então, o valor cobrado seria reputado como tarifa. É a posição de Andrei Pitten Velloso.

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E para o STF, qual é a natureza jurídica do pedágio? Trata-se de TARIFA (2ª corrente). O pedágio é tarifa (espécie de preço público) em razão de não ser cobrado compulsoriamente de quem não utilizar a rodovia; ou seja, é uma retribuição facultativa paga apenas mediante o uso voluntário do serviço. Assim, o pedágio não é cobrado indistintamente das pessoas, mas somente daquelas que desejam trafegar pelas vias e somente naquelas em que é exigido esse valor a título de conservação. Para o STF, o elemento nuclear para distinguir taxa e preço público é a compulsoriedade.

TAXA TARIFA

É uma prestação compulsória. O contribuinte paga a taxa de serviço não por conta de uma escolha que ele faça. Ele paga porque a lei determina que ele é obrigado, mesmo que o serviço esteja apenas à sua disposição, sem que haja uma utilização efetiva. A lei determina que ele pague, mesmo que não utilize de forma efetiva. Ex: custas judiciais.

É uma prestação voluntária. É chamada de voluntária porque a pessoa só irá pagar se ela escolher utilizar aquele determinado serviço que é efetivamente prestado. O indivíduo escolhe se submeter a um contrato, no qual irão lhe fornecer um serviço e, em contraprestação, ele irá pagar o valor. Ex: pedágio.

Essa distinção foi consagrada pelo STF em um enunciado:

Súmula 545-STF: Preços de serviços públicos e taxas não se confundem, porque estas, diferentemente daqueles, são compulsórias (...).

E por que o STF não adota a 3ª corrente? Segundo o Min. Teori Zavascki, é irrelevante, para a definição da natureza jurídica do pedágio, a existência ou não de via alternativa gratuita para o usuário trafegar. Isso porque essa condição não está estabelecida na CF/88. Dessa forma, esse traço distintivo trazido pela 3ª corrente não encontra amparo na CF/88. Além disso, mesmo que não exista uma estrada alternativa gratuita, na visão do STF, a utilização da via com pedágio continua sendo facultativa. Isso porque a pessoa tem a possibilidade de simplesmente não dirigir o seu veículo, ir a pé, de bicicleta, de ônibus, de avião etc. Enfim, existem outras opções. No mesmo sentido: RIBEIRO, Ricardo Lodi. Tributos. Teoria Geral e Espécies. Niterói: Impetus, 2013, p. 45. Se a única forma de acesso terrestre a determinada localidade for por meio daquela estrada, mesmo assim será possível cobrar pedágio, ou essa exigência seria inconstitucional por violar a liberdade de locomoção? Ainda assim seria possível cobrar o pedágio. Realmente, em alguns casos, a cobrança de pedágio pode, indiretamente, acabar limitando o tráfego de pessoas naquela localidade. No entanto, a CF/88 autoriza a instituição do pedágio mesmo nessas hipóteses. Isso porque não se pode dizer que haverá violação à liberdade de locomoção, já que sempre irão existir outras opções de acesso. O direito de ir e vir não será impedido por conta do pedágio. Resumindo, não é inconstitucional a cobrança de pedágio, ainda que não exista nenhuma outra via alternativa gratuita para o usuário trafegar. Quadro-resumo:

TAXA TARIFA OU PREÇO PÚBLICO

Sujeita a regime jurídico de direito público. Sujeita a regime jurídico de direito privado.

É espécie de tributo. Não é receita tributária.

Trata-se de receita derivada. Trata-se de receita originária.

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Instituída e majorada por lei. Ato de vontade bilateral, independe de lei (instituída por contrato).

Independe de vontade (é compulsória). Dotada de voluntariedade.

O fundamento para sua cobrança é o princípio da retributividade.

O fundamento para sua cobrança é a manutenção do equilíbrio econômico e financeiro dos contratos.

Obediência à anterioridade e aos demais princípios tributários.

Não se submete ao princípio da anterioridade nem aos demais princípios tributários.

Natureza legal-tributária (não admite rescisão). Natureza contratual (admite rescisão).

O serviço à disposição autoriza a cobrança. A cobrança só ocorre com o uso do serviço.

Ex: custas judiciais Ex: serviço de fornecimento de água.

Fonte do quadro: ALEXANDRE, Ricardo. Direito Tributário Esquematizado. São Paulo: Método, 2012, p. 38. Selo-pedágio

Existia uma cobrança chamada de “selo-pedágio” (criado pela Lei n. 7.712/88). Era um tributo cobrado de forma compulsória de todos os usuários de rodovias federais e que deveria ser pago mensalmente, mesmo que a pessoa não utilizasse efetivamente a rodovia. Assim, todos os motoristas que trafegassem por rodovias federais eram obrigados a adquirir mensalmente um selo que seria colado no vidro da frente do carro. O STF chegou a decidir que esse “selo-pedágio” possuía natureza jurídica de taxa (RREE 181.475-RS e 194.862-RS, rel. Min. Carlos Velloso, 04/05/1999).

Ocorre que o selo-pedágio foi extinto pela Lei n. 8.075/90 e não pode ser confundido com os atuais pedágios cobrados nas rodovias brasileiras. Há várias diferenças entre o citado “selo-pedágio” e o pedágio. A principal delas é que o pedágio somente é cobrado se, quando e cada vez que houver efetivo uso da rodovia. Já o “selo-pedágio” era um valor fixo, exigido todos os meses, independentemente do número de vezes que o contribuinte fizesse uso das estradas. Desse modo, se em uma prova perguntarem sobre o extinto selo-pedágio (só se o concurso for muito difícil), saiba que ele tinha natureza de taxa. Os atuais pedágios, por outro lado, constituem-se em tarifa.

EXERCÍCIOS Julgue os itens a seguir: 1) (PGE/BA 2014 CESPE) Suponha que um contribuinte, de forma consciente e voluntária, tenha deixado

de realizar determinada obrigação acessória, o que lhe tenha possibilitado a supressão de tributo sem

que o fisco tomasse conhecimento da prática ilícita. Segundo a Lei n. 8.137/1990, para que os ilícitos tributários sejam puníveis na esfera penal, exige-se a comprovação de dolo ou culpa do agente. ( )

2) (PGE/BA 2014 CESPE) Suponha que um contribuinte, de forma consciente e voluntária, tenha deixado de realizar determinada obrigação acessória, o que lhe tenha possibilitado a supressão de tributo sem que o fisco tomasse conhecimento da prática ilícita. Por ter praticado elisão fiscal, que constitui ilícito administrativo-tributário, o referido contribuinte só poderá ser punido na esfera administrativa. ( )

3) (PGE/BA 2014 CESPE) Suponha que um contribuinte, de forma consciente e voluntária, tenha deixado de realizar determinada obrigação acessória, o que lhe tenha possibilitado a supressão de tributo sem que o fisco tomasse conhecimento da prática ilícita. O contribuinte praticou ilícito, estando, portanto, sujeito à punição pelos ilícitos administrativo e penal praticados. ( )

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4) (Promotor AC 2014 CESPE) Um empresário deixou de emitir nota fiscal ao consumidor e de registrar nos livros fiscais obrigatórios, com o auxílio do contador, que tinha consciência das condutas do contribuinte, as informações referentes às vendas realizadas durante doze meses, o que resultou na supressão do tributo de ICMS devido aos cofres públicos. Nessa situação hipotética, A) o empresário e o contador deverão ser considerados pelo fisco responsáveis tributários, e não contribuintes. B) para a caracterização da conduta como crime contra a ordem tributária, é necessária a inscrição do empresário em dívida ativa. C) o contador não poderá ser responsabilizado na esfera penal, pois não atuou diretamente na infração. D) o contador deverá ser considerado pelo fisco responsável tributário pela infração fiscal praticada. E) o empresário e o contador praticaram crime contra a ordem tributária.

5) (Juiz CE 2012 CESPE) Em regra, é dispensável o exaurimento do processo administrativo-fiscal para a caracterização do crime contra a ordem tributária. ( )

6) (Juiz CE 2012 CESPE) Sendo crime formal, a sonegação fiscal independe da constituição definitiva do crédito tributário para se consumar. ( )

7) (Promotor MG 2013 MP/MG) Segundo orientação do Supremo Tribunal Federal, não se tipifica crime material contra a ordem tributária antes do lançamento definitivo do tributo, a supressão ou redução deste, ou contribuição social e qualquer acessório, mediante as seguintes condutas, EXCETO: A) Negar ou deixar de fornecer, quando obrigatório, nota fiscal ou documento equivalente, relativa à venda de mercadoria ou prestação de serviço, efetivamente realizada, ou fornecê-la em desacordo com a legislação. B) Fraudar a fiscalização tributária, inserindo elementos inexatos, ou omitindo operação de qualquer natureza, em documento ou livro exigido pela lei fiscal. C) Falsificar ou alterar nota fiscal, fatura, duplicata, nota de venda, ou qualquer outro documento relativo à operação tributável. D) Elaborar, distribuir, fornecer, emitir ou utilizar documento que saiba ou deva saber falso ou inexato.

8) (PGE/BA 2014 CESPE) Aquele que utilizar laudo médico falso para, sob a alegação de possuir doença de natureza grave, furtar-se ao pagamento de tributo, deverá ser condenado apenas pela prática do delito de sonegação fiscal se a falsidade ideológica for cometida com o exclusivo objetivo de fraudar o fisco, em virtude da aplicação do princípio da subsidiariedade. ( )

9) (Promotor MS 2013 MP/MS) É pública, condicionada à representação, a ação penal por crime de

sonegação fiscal. ( ) 10) (Juiz RN 2013 CESPE) A União, os estados, o DF e os municípios não podem estabelecer limitações ao

tráfego de pessoas ou bens por meio de tributos interestaduais ou intermunicipais, incluindo-se o pedágio pela utilização de vias conservadas pelo poder público. ( )

11) (Juiz PR 2013 UFPR) O princípio da liberdade de tráfego permite, por meio de tributos interestaduais ou intermunicipais, o estabelecimento de limitações ao tráfego de pessoas ou bens, ressalvada a cobrança de pedágio pela utilização de vias conservadas pelo Poder Público. ( )

12) (Juiz ES 2012 CESPE) O pedágio somente será arrecadado e fiscalizado por entidades privadas sem fins lucrativos, que assumam a condição de sujeitos ativos. ( )

13) (Juiz ES 2012 CESPE) A cobrança do pedágio justifica-se constitucionalmente pelo fato de ser gravame exigido pela utilização das rodovias conservadas pelo poder público, e não pela mera transposição de município ou de estado. ( )

14) (Procurador BACEN 2013 CESPE) Assinale a opção correta em relação a taxas e preços públicos. A) As taxas, diferentemente dos preços públicos, são compulsórias e condicionam-se ao princípio da anterioridade.

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B) O valor que remunera a contraprestação de um serviço público essencial de forma compulsória é tratado como preço público. C) As taxas podem ser instituídas por normas administrativas, ao passo que os preços devem ser fixados por lei. D) Os preços públicos são considerados receitas derivadas, havendo, portanto, discricionariedade em seu pagamento. E) As taxas remuneram serviços públicos e, portanto, são consideradas receitas originárias.

15) (Juiz PI 2012 CESPE) Conforme o CTN, o preço público também é considerado tributo, em razão de sua

finalidade e características determinadas pela lei. ( ) 16) (Cartório ES 2013 CESPE) A instituição de tarifa de serviço público sujeita-se ao princípio da estrita

legalidade. ( )

Gabarito

1. E 2. E 3. C 4. Letra E 5. E 6. E 7. Letra A 8. E 9. E 10. E

11. E 12. E 13. C 14. Letra A 15. E 16. E

JULGADOS NÃO COMENTADOS

Nulidade e julgamento de apelação sem advogado constituído Ante o empate na votação, a 1ª Turma, em conclusão de julgamento, concedeu “habeas corpus” para declarar insubsistente a condenação do paciente tendo em vista a nulidade do julgamento de apelação em virtude da ausência de defensor constituído do apelado, ora paciente — v. Informativo 742. No caso, às vésperas do exame da apelação interposta pelo Ministério Público contra sentença absolutória, o paciente requerera juntada de peça em que cassara os poderes outorgados aos advogados credenciados. Prevaleceu o voto do Ministro Marco Aurélio (relator). Afirmou ser estreme de dúvidas a ênfase normativa (CPP, artigos 261, 263, 264 e 265) à necessidade de o acusado contar com patrocínio no processo-crime. Notou que o caso seria de cassação e não de renúncia. Consignou que o ora paciente, absolvido em primeira instância, teria sido condenado sem defesa técnica. Considerou que o quadro revelaria constrangimento ilegal a alcançar o direito de ir e vir do paciente, uma vez que a absolvição acabara por transformar-se, com o crivo do tribunal decorrente do recurso interposto pelo Ministério Público, em substancial condenação. Por outro lado, os Ministros Roberto Barroso e Rosa Weber denegavam a ordem por entender não estar configurada a nulidade, uma vez que o único ato processual que teria deixado de ser praticado por atitude deliberada do paciente seria a sustentação oral, ato reputado dispensável segundo a jurisprudência do STF. HC 118856/SP, rel. Min. Marco Aurélio, 10.6.2014.

IR: nova hipótese de incidência e irretroatividade tributária A 1ª Turma desproveu recurso extraordinário em que se pleiteava a incidência do art. 63, § 1º, da MP 812/1994, convertida na Lei 8.981/1995, sobre conduta que teria sido praticada em momento anterior à edição daquele ato normativo (“Art. 63. Os prêmios distribuídos sob a forma de bens e serviços, através de concursos e sorteios de qualquer espécie, estão sujeitos à incidência do imposto, à alíquota de trinta e cinco por cento, exclusivamente na fonte. § 1º O imposto de que trata este artigo incidirá sobre o valor de mercado do prêmio, na data da distribuição, e será pago até o terceiro dia útil da semana subseqüente ao da distribuição”). No caso, em 30.11.1994, a associação recorrida fora autorizada a distribuir gratuitamente prêmios a seus associados. No entanto, posteriormente a essa autorização, em 31.12.1994, fora editada a referida medida provisória, que criara nova hipótese de incidência do imposto de renda, ao incluir a distribuição de prêmios na abrangência daquela exação. O Ministro Marco Aurélio (relator) destacou que a autorização em comento precedera à medida provisória e por isso, à época em que distribuídos os prêmios,

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não haveria a hipótese de incidência. Dessa forma, consignou que não caberia a imposição do ônus, pois a lei nova não poderia retroagir, visto que não existiria, ainda, a base de incidência ao fato imponível. O Ministro Roberto Barroso acompanhou o relator, porém por fundamento diverso. Considerou que a criação de um tributo, por medida provisória, no último dia do exercício, seria uma burla ao direito fundamental à anterioridade e à segurança jurídica. RE 230536/SP, rel. Min. Marco Aurélio, 10.6.2014.

OUTRAS INFORMAÇÕES

R E P E R C U S S Ã O G E R A L DJe de 9 a 13 de junho de 2014

REPERCUSSÃO GERAL EM RE N. 647.885-RS

RELATOR: MIN. RICARDO LEWANDOWSKI

EMENTA: CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. SANÇÃO DISCIPLINAR DE SUSPENSÃO DO EXERCÍCIO PROFISSIONAL POR INADIMPLEMENTO JUNTO AO RESPECTIVO CONSELHO FISCALIZADOR. LIBERDADE DE EXERCÍCIO PROFISSIONAL.

RELEVÂNCIA SOCIAL E JURÍDICA. REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA.

I - Possui repercussão geral a controvérsia referente ao exame da constitucionalidade de dispositivos legais que permitam às entidades de classe suspender o direito ao exercício de ofício àqueles profissionais que estejam inadimplentes com as respectivas anuidades.

II - Repercussão geral reconhecida.

REPERCUSSÃO GERAL EM ARE N. 808.524-RS

RELATOR: MIN. TEORI ZAVASCKI

EMENTA: PROCESSUAL CIVIL. RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL. CONCURSO

PÚBLICO. MAGISTÉRIO. DIREITO À NOMEAÇÃO. PRETERIÇÃO. MATÉRIA INFRACONSTITUCIONAL. REEXAME DE FATOS E

PROVAS. INTERPRETAÇÃO DE CLÁUSULAS DO EDITAL. AUSÊNCIA DE REPERCUSSÃO GERAL. 1. Não possui repercussão geral a controvérsia relativa ao direito à nomeação de candidato participante de concurso público, quando decidida pelo Juízo de

origem à luz da legislação infraconstitucional, dos fatos da causa e das cláusulas do edital do certame.

2. Inviável, em recurso extraordinário, apreciar alegada violação aos arts. 5º, XXXV, LIV e LV, da Constituição Federal, quando isso depender de interpretação e aplicação de normas infraconstitucionais (AI 796.905-AgR/PE, Rel. Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, DJe de 21.5.2012; AI 622.814-

AgR/PR, Rel. Min. DIAS TOFFOLI, Primeira Turma, DJe de 08.3.2012; ARE 642.062-AgR/RJ, Rel. Min. ELLEN GRACIE, Segunda Turma, DJe de

19.8.2011). 3. É cabível a atribuição dos efeitos da declaração de ausência de repercussão geral quando não há matéria constitucional a ser apreciada ou quando

eventual ofensa à Constituição Federal se dê de forma indireta ou reflexa (RE 584.608 RG, Min. ELLEN GRACIE, Pleno, DJe de 13/03/2009).

4. Ausência de repercussão geral da questão suscitada, nos termos do art. 543-A do CPC.

Decisões Publicadas: 2

C L I P P I N G D O D JE 9 a 13 de junho de 2014

AG. REG. NO AI N. 730.856-RJ

RELATOR: MIN. MARCO AURÉLIO

COMPETÊNCIA PRIVATIVA DA UNIÃO – DIREITO CIVIL – ESTACIONAMENTO – SHOPPING CENTER – HIPERMERCADOS – GRATUIDADE – LEI Nº 4.541/2005, DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO – PRECEDENTES. Invade competência legislativa da União, prevista

no artigo 22, inciso I, da Carta da República, norma estadual que veda a cobrança por serviço de estacionamento em locais privados.

Precedentes: Ações Diretas de Inconstitucionalidade nº 1.472/DF, relator ministro Ilmar Galvão, nº 2.448/DF, relator ministro Sydney Sanches, e nº 1.623/RJ, relator ministro Joaquim Barbosa.

AG. REG. NO RE N. 435.444-RS

RELATOR: MIN. ROBERTO BARROSO

EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO ESTADO. DANOS CAUSADOS AOS PRÓPRIOS AGENTES PÚBLICOS.

O Supremo Tribunal Federal firmou entendimento no sentido de que excluir da responsabilidade do Estado os danos causados aos próprios agentes

públicos acabaria por esvaziar o preceito do art. 37, § 6º, da Constituição Federal, estabelecendo distinção nele não contemplada. Precedentes. Agravo regimental a que se nega provimento.

HC N. 101.021-SP

RELATOR: MIN. TEORI ZAVASCKI

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Informativo 750-STF (01/07/2014) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 27

EMENTA: PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. INTERROGATÓRIO DE CORRÉUS REALIZADO SEPARADAMENTE. ART. 191 CPP.

PACIENTE ADVOGANDO EM CAUSA PRÓPRIA. CONSTRANGIMENTO ILEGAL INEXISTENTE. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO. ORDEM

DENEGADA. 1. Possibilidade de os interrogatórios de corréus serem realizados separadamente, em cumprimento ao que dispõe o art. 191 do Código de Processo

Penal. Precedente.

2. O fato de o paciente advogar em causa própria não é suficiente para afastar essa regra, pois, além de inexistir razão jurídica para haver essa distinção entre acusados, a questão pode ser facilmente resolvida com a constituição de outro causídico para acompanhar especificamente o

interrogatório do corréu. Assim, e considerando que a postulação é para que se renove o interrogatório com a presença do acusado na sala de

audiências, não há falar em ilegalidade do ato ou cerceamento de defesa. 3. À luz da norma inscrita no art. 563 do CPP e da Súmula 523/STF, a jurisprudência desta Corte firmou o entendimento de que, para o

reconhecimento de nulidade dos atos processuais exige-se, em regra, a demonstração do efetivo prejuízo causado à parte. No caso, segundo consta da

sentença condenatória, a responsabilidade penal do paciente foi embasada nos depoimentos das testemunhas, colhidos sob o crivo do contraditório, os quais foram categóricos ao infirmar as versões apresentadas pelos dois acusados em seus interrogatórios, estes harmoniosos entre si. Esses fatos

revelam, a toda evidência, a inviabilidade e a inutilidade do pedido formulado nesta impetração.

4. Ordem denegada. *noticiado no Informativo 747

HC N. 102.150-SC

RELATOR: MIN. TEORI ZAVASCKI

EMENTA: HABEAS CORPUS. CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL PENAL. PACIENTE DENUNCIADO POR SUPOSTO HOMICÍDIO PRATICADO CONTRA SUA ESPOSA. PROCESSO QUE TEVE INÍCIO EM JUIZADO DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA

A MULHER. PREVISÃO DO ART. 14 DA LEI 11.340/2006. INSTRUÇÃO ENCERRADA NOS TERMOS DO ART. 412 DO CPP [ATUAL ART.

421 DO CPP]. REDISTRIBUIÇÃO À VARA DO TRIBUNAL DO JÚRI. INSTALAÇÃO DE VARAS ESPECIALIZADAS POR MEIO DE RESOLUÇÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA. CONSTITUCIONALIDADE. AUTORIZAÇÃO DO ART. 96, I, “A”, DA CONSTITUIÇÃO

FEDERAL. DEMAIS QUESTÕES NÃO SUSCITADAS NO STJ. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. IMPETRAÇÃO PARCIALMENTE

CONHECIDA E DENEGADA. 1. A distribuição da ação penal ao Juízo da 3ª Vara Criminal e Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher ocorreu nos termos da

legislação vigente à época em que o ato foi praticado. Quando da homologação da prisão em flagrante, encontrava-se em vigor a Lei Maria da Penha

(Lei 11.340/2006), que, no ponto, foi regulamentada pela Resolução 18/2006-TJ/SC, não havendo razão para que a ação penal fosse atribuída à 1ª Vara Criminal da Capital, tal como antes previsto no art. 107 da Lei Estadual 5.624/1979 (Código de Divisão e Organização Judiciárias do Estado de

Santa Catarina). Com o julgamento do recurso em sentido estrito, mantendo a sentença de pronúncia, o processo baixou à origem e foi redistribuído à

Vara do Tribunal do Júri da Capital, então recém-implantada pela Resolução 46/2008 -TJ/SC. 2. Tanto a anexação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher à 3ª Vara Criminal da Capital quanto a instalação da Vara do

Tribunal do Júri da Capital, ambas por meio de Resoluções do TJ/SC, se deram em conformidade com a Constituição Federal, que, em seu art. 96, I,

“a”, autoriza aos Tribunais alterar a competência dos seus respectivos órgãos jurisdicionais e administrativos, desde que observadas as normas de processo e as garantias processuais das partes, como ocorreu no caso. Precedentes.

3. Questões que sequer foram objeto de impugnação no STJ, aqui atacado, não podem ser conhecidas em caráter originário pelo STF, mediante habeas corpus,

sob pena de indevida supressão de instância e contrariedade à repartição constitucional de competências (v.g., entre outros, RHC 112236, Relator(a): Min. TEORI ZAVASCKI, Segunda Turma, DJe de 21-10-2013; HC 108192 AgR, Relator(a): Min. CÁRMEN LÚCIA, Segunda Turma, DJe de 12-06-2013).

4. Habeas corpus conhecido em parte e denegado. *noticiado no Informativo 748

ADI N. 290-SC

RELATOR: MIN. DIAS TOFFOLI

EMENTA: Ação direta de inconstitucionalidade. Inciso II do art. 27 da Constituição do Estado de Santa Catarina. Lei estadual nº 1.117/90.

Vinculação de vencimentos de servidores estaduais a piso salarial não inferior ao salário mínimo profissional. Vício de Iniciativa. Artigo 37,

XIII, CF/88. Autonomia dos estados. Liminar deferida. Procedência.

1. Inequívoco o vício de iniciativa da Lei estadual nº 1.117, de 30 de março de 1990, na medida em que estabelece normas para aplicação do salário mínimo profissional aos servidores estaduais. Incidência da regra de iniciativa legislativa exclusiva do chefe do Poder Executivo para dispor sobre

remuneração dos cargos e funções do serviço público, em razão da cláusula de reserva prevista no art. 61, § 1º, inciso II, alínea a, da Carta Magna.

2. Enquanto a Lei Maior, no inciso XIII do art. 37, veda a vinculação de “quaisquer espécies remuneratórias para efeitos de remuneração de pessoal do serviço público”, a Constituição estadual, diversamente, assegura aos servidores públicos estaduais ocupantes de cargos ou empregos de nível

médio e superior “piso salarial proporcional à extensão e à complexidade do trabalho (...) não inferior ao salário mínimo profissional estabelecido em

lei”, o que resulta em vinculação dos vencimentos de determinadas categorias de servidores públicos às variações do piso salarial profissional, importando em sistemática de aumento automático daqueles vencimentos, sem interferência do chefe do Poder Executivo do Estado, ferindo-se,

ainda, o próprio princípio federativo e a autonomia dos estados para fixar os vencimentos de seus servidores (arts. 2º e 25 da Constituição Federal).

3. A jurisprudência da Corte é pacífica no que tange ao não cabimento de qualquer espécie de vinculação da remuneração de servidores públicos, repelindo, assim, a vinculação da remuneração de servidores do estado a fatores alheios à sua vontade e ao seu controle; seja às variações de índices

de correção editados pela União; seja aos pisos salariais profissionais. Precedentes.

4. Ação direta de inconstitucionalidade julgada procedente. *noticiado no Informativo 736

ADI N. 318-MG

RELATOR: MIN. GILMAR MENDES

Ação direta de inconstitucionalidade. Art. 40, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição do Estado de Minas Gerais. 2. Isonomia assegurada entre servidores de duas empresas públicas. 3. Violação aos artigos 22, I; 37, XIII e 173, § 1º, da Constituição Federal. Matéria

de Direito do Trabalho. Ocorrência de vício formal. Ação direta julgada procedente.

*noticiado no Informativo 736

MS N. 28.408-DF

RELATORA: MIN. CÁRMEN LÚCIA

EMENTA: MANDADO DE SEGURANÇA. REPRESENTAÇÃO PARA PRESERVAÇÃO DA AUTONOMIA DO MINISTÉRIO PÚBLICO.

COMPETÊNCIA DO CONSELHO NACIONAL DO MINISTÉRIO PÚBLICO ESTABELECIDA NO ART. 130-A, INC. I, § 2º, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. SEGURANÇA DENEGADA.

1. A independência funcional garantida ao Impetrante pelo art. 127, § 1º, da Constituição da República não é irrestrita, pois o membro do Ministério

Público deve respeito à Constituição da República e às leis.

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Informativo 750-STF (01/07/2014) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 28

2. Compete ao Conselho Nacional do Ministério Público zelar pela autonomia funcional do Ministério Público, conforme dispõe o inc. I do § 2º do

art. 130-A da Constituição da República.

3. Segurança denegada. *noticiado no Informativo 739

Acórdãos Publicados: 424

TRANSCRIÇÕES

Com a finalidade de proporcionar aos leitores do INFORMATIVO STF uma compreensão mais

aprofundada do pensamento do Tribunal, divulgamos neste espaço trechos de decisões que tenham

despertado ou possam despertar de modo especial o interesse da comunidade jurídica.

Liberdade de Imprensa - Direito de Crítica - Figura Pública - Responsabilidade Civil (Transcrições)

ARE 722.744/DF*

RELATOR: Ministro Celso de Mello

EMENTA: Liberdade de expressão. Profissional de imprensa e empresa de comunicação social. Proteção constitucional. Direito

de crítica: prerrogativa fundamental que se compreende na liberdade constitucional de manifestação do pensamento. Magistério da

doutrina. Precedentes do Supremo Tribunal Federal (ADPF 130/DF, Rel. Min. AYRES BRITTO – AI 505.595-AgR/RJ, Rel. Min. CELSO

DE MELLO – Pet 3.486/DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO, v.g.). Jurisprudência comparada (Tribunal Europeu de Direitos Humanos e Tribunal Constitucional Espanhol). O significado político e a importância jurídica da Declaração de Chapultepec (11/03/1994). Matéria

jornalística e responsabilidade civil. Excludentes anímicas e direito de crítica. Precedentes. Plena legitimidade do direito constitucional de

crítica a figuras públicas ou notórias, ainda que de seu exercício resulte opinião jornalística extremamente dura e contundente. Recurso

extraordinário provido. Consequente improcedência da ação de reparação civil por danos morais.

DECISÃO: O recurso extraordinário a que se refere o presente agravo foi interposto contra acórdão que, confirmado, em sede de embargos de

declaração, pelo E. Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios, está assim ementado:

“DANOS MORAIS – IMPRENSA – PUBLICAÇÃO OFENSIVA – EXCESSO NO DIREITO DE INFORMAR – DANO MORAL

CONFIGURADO – ‘QUANTUM’ – PESSOA PÚBLICA – VALOR REDUZIDO – JUROS E CORREÇÃO INICIAL – TERMO INICIAL –

SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA. 1) – A notícia veiculada em revista de grande circulação que ultrapassa os limites da liberdade de imprensa, extrapolando o ‘animus

narrandi’ e atingindo a honra subjetiva do autor, gera dano moral, que tem que ser indenizado. 2) – O ‘quantum’ indenizatório deve ser fixado com moderação, observando-se a posição social e a capacidade econômica das

partes, a imagem pública e o conceito que tem o ofendido perante a sociedade, sob pena de propiciar o enriquecimento indevido do ofendido

ou o estímulo à prática de nova conduta irregular pelo ofensor. 3) – Mostrando-se o valor da condenação excessivo, necessário que se dê a diminuição.

4) – São devidos juros de mora e correção monetária, incidentes sobre o valor da condenação, contados do instante da fixação do valor da condenação.

5) - Recurso conhecido e parcialmente provido.” (grifei)

A parte agravante, ao deduzir o apelo extremo em questão, sustentou que o Tribunal “a quo” teria transgredido os preceitos inscritos no art.

5º, incisos IV, IX e XIV, e no art. 220, “caput” e § 2º, ambos da Constituição da República. O Ministério Público Federal, em manifestação da lavra do ilustre Subprocurador-Geral da República Dr. WAGNER DE CASTRO

MATHIAS NETTO, opinou pelo improvimento do presente recurso de agravo, com apoio em parecer assim ementado:

“Recurso Extraordinário com Agravo. Reportagem que vai além do caráter meramente informativo. Indenização por dano moral.

Ausência de densidade constitucional. Pelo desprovimento do agravo.” (grifei)

Sendo esse o contexto, passo a apreciar a postulação recursal em causa. E, ao fazê-lo, observo que o recurso extraordinário interposto pela parte ora agravante merece integral provimento.

A questão ora em exame, segundo entendo, assume indiscutível magnitude de ordem político-jurídica e mostra-se impregnada de irrecusável

densidade constitucional, notadamente em face de seus claros lineamentos que, fundados na Constituição da República, foram analisados, de modo efetivo, no julgamento da ADPF 130/DF, em cujo âmbito o Supremo Tribunal Federal pôs em destaque, de maneira muito expressiva, uma das

mais relevantes franquias constitucionais: a liberdade de manifestação do pensamento, que representa um dos fundamentos em que se apoia a

própria noção de Estado democrático de direito. Cabe rememorar, por relevante, a adoção, em 11/03/1994, pela Conferência Hemisférica sobre liberdade de expressão, da Declaração de

Chapultepec, que consolidou valiosíssima Carta de Princípios fundada em postulados que, por essenciais ao regime democrático, devem constituir

objeto de permanente observância e respeito por parte do Estado e de suas autoridades e agentes, inclusive por magistrados e Tribunais judiciários. A Declaração de Chapultepec – ao enfatizar que uma imprensa livre é condição fundamental para que as sociedades resolvam seus

conflitos, promovam o bem-estar e protejam sua liberdade, não devendo existir, por isso mesmo, nenhuma lei ou ato de poder que restrinja a

liberdade de expressão ou de imprensa, seja qual for o meio de comunicação – proclamou, dentre outros postulados básicos, os que se seguem:

“I – Não há pessoas nem sociedades livres sem liberdade de expressão e de imprensa. O exercício dessa não é uma concessão das autoridades, é um direito inalienável do povo.

II – Toda pessoa tem o direito de buscar e receber informação, expressar opiniões e divulgá-las livremente. Ninguém pode restringir

ou negar esses direitos. .......................................................................................................

VI – Os meios de comunicação e os jornalistas não devem ser objeto de discriminações ou favores em função do que escrevam ou

digam. .......................................................................................................

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Informativo 750-STF (01/07/2014) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 29

X – Nenhum meio de comunicação ou jornalista deve ser sancionado por difundir a verdade, criticar ou fazer denúncias contra o

poder público.” (grifei)

Tenho sempre destacado, como o fiz por ocasião do julgamento da ADPF 130/DF, e, também, na linha de outras decisões por mim

proferidas no Supremo Tribunal Federal (AI 505.595-AgR/RJ, Rel. Min. CELSO DE MELLO – Pet 3.486/DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO, v.g.), que o conteúdo da Declaração de Chapultepec revela-nos que nada mais nocivo, nada mais perigoso do que a pretensão do Estado de regular a

liberdade de expressão (ou de ilegitimamente interferir em seu exercício), pois o pensamento há de ser livre, permanentemente livre, essencialmente

livre... Todos sabemos que o exercício concreto, pelos profissionais da imprensa, da liberdade de expressão, cujo fundamento reside no próprio

texto da Constituição da República, assegura, ao jornalista, o direito de expender crítica, ainda que desfavorável e em tom contundente, contra

quaisquer pessoas ou autoridades (Pet 3.486/DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO). Ninguém ignora que, no contexto de uma sociedade fundada em bases democráticas, mostra-se intolerável a repressão estatal ao

pensamento, ainda mais quando a crítica – por mais dura que seja – revele-se inspirada pelo interesse coletivo e decorra da prática legítima de

uma liberdade pública de extração eminentemente constitucional (CF, art. 5º, IV, c/c o art. 220). Não se pode desconhecer que a liberdade de imprensa, enquanto projeção da liberdade de manifestação de pensamento e de comunicação,

reveste-se de conteúdo abrangente, por compreender, dentre outras prerrogativas relevantes que lhe são inerentes, (a) o direito de informar, (b) o

direito de buscar a informação, (c) o direito de opinar e (d) o direito de criticar. A crítica jornalística, desse modo, traduz direito impregnado de qualificação constitucional, plenamente oponível aos que exercem

qualquer atividade de interesse da coletividade em geral, pois o interesse social, que legitima o direito de criticar, sobrepõe-se a eventuais

suscetibilidades que possam revelar as figuras públicas, independentemente de ostentarem qualquer grau de autoridade. É por tal razão que a crítica que os meios de comunicação social dirigem às pessoas públicas, por mais acerba, dura e veemente que possa

ser, deixa de sofrer, quanto ao seu concreto exercício, as limitações externas que ordinariamente resultam dos direitos de personalidade.

É importante acentuar, bem por isso, que não caracterizará hipótese de responsabilidade civil a publicação de matéria jornalística cujo conteúdo divulgar observações em caráter mordaz ou irônico ou, então, veicular opiniões em tom de crítica severa, dura ou, até, impiedosa, ainda

mais se a pessoa a quem tais observações forem dirigidas ostentar a condição de figura pública, investida, ou não, de autoridade governamental,

pois, em tal contexto, a liberdade de crítica qualifica-se como verdadeira excludente anímica, apta a afastar o intuito doloso de ofender. Com efeito, a exposição de fatos e a veiculação de conceitos, utilizadas como elementos materializadores da prática concreta do direito de

crítica, descaracterizam o “animus injuriandi vel diffamandi”, legitimando, assim, em plenitude, o exercício dessa particular expressão da liberdade

de imprensa. Entendo relevante destacar, no ponto, matéria efetivamente debatida no julgamento da ADPF 130/DF, em que também se analisou a questão sob a

perspectiva do direito de crítica – cuja prática se mostra apta a descaracterizar o “animus injuriandi vel diffamandi” (CLÁUDIO LUIZ BUENO DE

GODOY, “A Liberdade de Imprensa e os Direitos da Personalidade”, p. 100/101, item n. 4.2.4, 2001, Atlas; VIDAL SERRANO NUNES JÚNIOR, “A

Proteção Constitucional da Informação e o Direito à Crítica Jornalística”, p. 88/89, 1997, Editora FTD; RENÉ ARIEL DOTTI, “Proteção da Vida

Privada e Liberdade de Informação”, p. 207/210, item n. 33, 1980, RT, v.g.) –, em ordem a reconhecer que essa prerrogativa dos profissionais de

imprensa revela-se particularmente expressiva, quando a crítica, exercida pelos “mass media” e justificada pela prevalência do interesse geral da coletividade, dirige-se a figuras notórias ou a pessoas públicas, independentemente de sua condição oficial.

Daí a existência de diversos julgamentos, que, proferidos por Tribunais judiciários, referem-se à legitimidade da atuação jornalística,

considerada, para tanto, a necessidade do permanente escrutínio social a que se acham sujeitos aqueles que, exercentes, ou não, de cargos oficiais, qualificam-se como figuras públicas.

Lapidar, sob tal aspecto, a decisão emanada do E. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, consubstanciada em acórdão assim ementado:

“Os políticos estão sujeitos de forma especial às críticas públicas, e é fundamental que se garanta não só ao povo em geral larga

margem de fiscalização e censura de suas atividades, mas sobretudo à imprensa, ante a relevante utilidade pública da mesma.”

(JTJ 169/86, Rel. Des. MARCO CESAR – grifei)

É importante acentuar, bem por isso, que não caracterizará hipótese de responsabilidade civil a publicação de matéria jornalística cujo conteúdo divulgar observações em caráter mordaz ou irônico ou, então, veicular opiniões em tom de crítica severa, dura ou, até, impiedosa, ainda

mais se a pessoa a quem tais observações forem dirigidas ostentar a condição de figura pública, investida, ou não, de autoridade governamental,

pois, em tal contexto, a liberdade de crítica qualifica-se como verdadeira excludente anímica, apta a afastar o intuito doloso de ofender. Com efeito, a exposição de fatos e a veiculação de conceitos, utilizadas como elementos materializadores da prática concreta do direito de

crítica, descaracterizam o “animus injuriandi vel diffamandi”, legitimando, assim, em plenitude, o exercício dessa particular expressão da liberdade

de imprensa. Expressivo dessa visão pertinente à plena legitimidade do direito de crítica, fundado na liberdade constitucional de comunicação, é

o julgamento, que, proferido pelo E. Superior Tribunal de Justiça – e em tudo aplicável ao caso ora em exame –, está assim ementado:

“RECURSO ESPECIAL – RESPONSABILIDADE CIVIL – DANO MORAL – (…) – DIREITO DE INFORMAÇÃO – ‘ANIMUS

NARRANDI’ – EXCESSO NÃO CONFIGURADO (...). .......................................................................................................

3. No que pertine à honra, a responsabilidade pelo dano cometido através da imprensa tem lugar tão-somente ante a ocorrência

deliberada de injúria, difamação e calúnia, perfazendo-se imperioso demonstrar que o ofensor agiu com o intuito específico de agredir moralmente a vítima. Se a matéria jornalística se ateve a tecer críticas prudentes (‘animus criticandi’) ou a narrar fatos de interesse coletivo

(‘animus narrandi’), está sob o pálio das ‘excludentes de ilicitude’ (...), não se falando em responsabilização civil por ofensa à honra, mas

em exercício regular do direito de informação.” (REsp 719.592/AL, Rel. Min. JORGE SCARTEZZINI – grifei)

Não é por outro motivo que a jurisprudência dos Tribunais – com apoio em magistério expendido pela doutrina (JULIO FABBRINI

MIRABETE, “Manual de Direito Penal”, vol. 2/147 e 151, 7ª ed., 1993, Atlas; DAMÁSIO E. DE JESUS, “Código Penal Anotado”, p. 400, 407 e

410/411, 4ª ed., 1994, Saraiva; EUCLIDES CUSTÓDIO DA SILVEIRA, “Direito Penal – Crimes contra a pessoa”, p. 236/240, 2ª ed., 1973, RT, v.g.) – tem ressaltado que a necessidade de narrar ou de criticar (tal como sucedeu na espécie) atua como fator de descaracterização da vontade

consciente e dolosa de ofender a honra de terceiros, a tornar legítima a crítica a estes feita, ainda que por meio da imprensa (RTJ 145/381 – RTJ

168/853 – RT 511/422 – RT 527/381 – RT 540/320 – RT 541/385 – RT 668/368 – RT 686/393), eis que – insista-se – “em nenhum caso deve afirmar-se que o dolo resulta da própria expressão objetivamente ofensiva” (HELENO CLÁUDIO FRAGOSO, “Lições de Direito Penal – Parte

especial”, vol. II/183-184, 7ª ed., Forense – grifei), valendo referir, por oportuno, decisão que proferi, a propósito do tema, neste Supremo

Tribunal Federal:

“LIBERDADE DE IMPRENSA (CF, ART. 5º, IV, c/c O ART. 220). JORNALISTAS. DIREITO DE CRÍTICA. PRERROGATIVA

CONSTITUCIONAL CUJO SUPORTE LEGITIMADOR REPOUSA NO PLURALISMO POLÍTICO (CF, ART. 1º, V), QUE REPRESENTA

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Informativo 750-STF (01/07/2014) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 30

UM DOS FUNDAMENTOS INERENTES AO REGIME DEMOCRÁTICO. O EXERCÍCIO DO DIREITO DE CRÍTICA INSPIRADO POR

RAZÕES DE INTERESSE PÚBLICO: UMA PRÁTICA INESTIMÁVEL DE LIBERDADE A SER PRESERVADA CONTRA ENSAIOS

AUTORITÁRIOS DE REPRESSÃO PENAL. A CRÍTICA JORNALÍSTICA E AS AUTORIDADES PÚBLICAS. A ARENA POLÍTICA:

UM ESPAÇO DE DISSENSO POR EXCELÊNCIA.”

(RTJ 200/277, Rel. Min. CELSO DE MELLO)

Daí a existência de diversos julgamentos, que, proferidos por Tribunais judiciários, referem-se à legitimidade da atuação jornalística,

considerada, para tanto, a necessidade do permanente escrutínio social a que se acham sujeitos aqueles que, exercentes, ou não, de cargos oficiais, qualificam-se como figuras públicas:

“Responsabilidade civil – Imprensa – Declarações que não extrapolam os limites do direito de informar e da liberdade de expressão,

em virtude do contexto a que se reportava e por relacionar-se à pessoa pública – Inadmissibilidade de se cogitar do dever de indenizar –

Não provimento.” (Apelação nº 502.243-4/3, Rel. Des. ÊNIO SANTARELLI ZULIANI – TJSP – grifei)

“Indenização por dano moral. Matéria publicada, apesar de deselegante, não afrontou a dignidade da pessoa humana, tampouco

colocou a autora em situação vexatória. Apelante era vereadora, portanto, pessoa pública sujeita a críticas mais contundentes. Termos

deseducados utilizados pelo réu são insuficientes para caracterizar o dano moral pleiteado. Suscetibilidade exacerbada do pólo ativo não

dá supedâneo à verba reparatória pretendida. Apelo desprovido.”

(Apelação Cível nº 355.443-4/0-00, Rel. Des. NATAN ZELINSCHI DE ARRUDA – TJSP – grifei)

“INDENIZAÇÃO. RESPONSABILIDADE CIVIL. DANO MORAL. INOCORRÊNCIA. MATÉRIA QUE TRADUZ CRÍTICA

JORNALÍSTICA. AUTORA QUE, NO EXERCÍCIO DE CARGO PÚBLICO, NÃO PODE SE FURTAR A CRÍTICAS QUE SE LHE

DIRIGEM. CASO EM QUE FERIDA MERA SUSCETIBILIDADE, QUE NÃO TRADUZ DANO. AUSÊNCIA DE ILICITUDE DO

COMPORTAMENTO DOS RÉUS. DIREITO DE CRÍTICA QUE É INERENTE À LIBERDADE DE IMPRENSA. VERBA INDEVIDA.

AÇÃO JULGADA IMPROCEDENTE. SENTENÇA REFORMADA. RECURSO PROVIDO, PREJUDICADO O APELO ADESIVO. (…).” (Apelação Cível nº 614.912.4/9-00, Rel. Des. VITO GUGLIELMI – TJSP – grifei)

“INDENIZAÇÃO. RESPONSABILIDADE CIVIL. DANO MORAL. INOCORRÊNCIA. AUSÊNCIA DE ILICITUDE.

PUBLICAÇÃO DE ARTIGO EM REVISTA COM REFERÊNCIAS À PESSOA DO AUTOR. INFORMAÇÕES COLETADAS EM

OUTRAS FONTES JORNALÍSTICAS DEVIDAMENTE INDICADAS. AUSÊNCIA DE CONOTAÇÃO OFENSIVA. TEOR CRÍTICO

QUE É PRÓPRIO DA ATIVIDADE DO ARTICULISTA. AUTOR, ADEMAIS, QUE É PESSOA PÚBLICA E QUE ATUOU EM FATOS

DE INTERESSE PÚBLICO. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO IMPROVIDO.”

(Apelação Cível nº 638.155.4/9-00, Rel. Des. VITO GUGLIELMI – TJSP – grifei)

“(...) 03. Sendo o envolvido pessoa de vida pública, uma autoridade, eleito para o cargo de Senador da República após haver exercido o cargo de Prefeito do Município de Ariquemes/RO, condição que o expõe à crítica da sociedade quanto ao seu comportamento, e levando-se

em conta que não restou provado o ‘animus’ de ofender, tenho que o Jornal não pode ser condenado ao pagamento de indenização por

danos morais. 04. Deu-se provimento ao recurso. Unânime.”

(Apelação Cível nº 2008.01.5.003792-6, Rel. Des. ROMEU GONZAGA NEIVA – TJDF – grifei)

“A notoriedade do artista, granjeada particularmente em telenovela de receptividade popular acentuada, opera por forma a limitar

sua intimidade pessoal, erigindo-a em personalidade de projeção pública, ao menos num determinado momento. Nessa linha de

pensamento, inocorreu iliceidade ou o propósito de locupletamento para, enriquecendo o texto, incrementar a venda da revista. (…) cuida-

se de um ônus natural, que suportam quantos, em seu desempenho exposto ao público, vêm a sofrer na área de sua privacidade, sem que se aviste, no fato, um gravame à reserva pessoal da reclamante.”

(JTJ/Lex 153/196-200, 197/198, Rel. Des. NEY ALMADA – TJSP – grifei)

Vê-se, pois – tal como tive o ensejo de assinalar (Pet 3.486/DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO, “in” Informativo/STF nº 398/2005) –, que a

crítica jornalística, quando inspirada por razões de interesse público, não importando a acrimônia e a contundência da opinião manifestada, ainda mais quando dirigida a figuras públicas com alto grau de responsabilidade na condução dos interesses de certos grupos da coletividade, não traduz nem se

reduz, em sua expressão concreta, à dimensão do abuso da liberdade de imprensa, não se revelando suscetível, por isso mesmo, em situações de

caráter ordinário, de sofrer qualquer repressão estatal ou de se expor a qualquer reação hostil do ordenamento positivo. Não é menos exato afirmar-se, de outro lado, que o direito de crítica encontra suporte legitimador no pluralismo político, que representa um

dos fundamentos em que se apoia, constitucionalmente, o próprio Estado Democrático de Direito (CF, art. 1º, V).

Não foi por outra razão – e aqui rememoro anterior decisão por mim proferida nesta Suprema Corte (Pet 3.486/DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO) – que o Tribunal Constitucional espanhol, ao veicular as Sentenças nº 6/1981 (Rel. Juiz FRANCISCO RUBIO LLORENTE), nº

12/1982 (Rel. Juiz LUIS DÍEZ-PICAZO), nº 104/1986 (Rel. Juiz FRANCISCO TOMÁS Y VALIENTE) e nº 171/1990 (Rel. Juiz BRAVO-

FERRER), pôs em destaque a necessidade essencial de preservar-se a prática da liberdade de informação, inclusive o direito de crítica que dela emana, como um dos suportes axiológicos que informam e que conferem legitimação material à própria concepção do regime democrático.

Vale rememorar, por relevante, tal como o fiz em anterior decisão neste Supremo Tribunal Federal (Pet 3.486/DF, Rel. Min. CELSO DE

MELLO), fragmento expressivo da obra do ilustre magistrado federal SÉRGIO FERNANDO MORO (“Jurisdição Constitucional como

Democracia”, p. 48, item n. 1.1.5.5, 2004, RT), no qual esse eminente Juiz põe em destaque um “landmark ruling” da Suprema Corte norte-

americana, proferida no caso “New York Times v. Sullivan” (1964), a propósito do tratamento que esse Alto Tribunal dispensa à garantia

constitucional da liberdade de expressão:

“A Corte entendeu que a liberdade de expressão em assuntos públicos deveria de todo modo ser preservada. Estabeleceu que a

conduta do jornal estava protegida pela liberdade de expressão, salvo se provado que a matéria falsa tinha sido publicada maliciosamente

ou com desconsideração negligente em relação à verdade. Diz o voto condutor do Juiz William Brennan:

‘(...) o debate de assuntos públicos deve ser sem inibições, robusto, amplo, e pode incluir ataques veementes, cáusticos e, algumas

vezes, desagradáveis ao governo e às autoridades governamentais.’” (grifei)

Essa mesma percepção em torno do tema tem sido manifestada pela jurisprudência dos Tribunais, em pronunciamentos que se orientam em sentido favorável à postulação dos ora recorrentes, que agiram, na espécie, com o ânimo de informar e de expender crítica, em comportamento

amparado pela liberdade constitucional de comunicação, em contexto que claramente descaracteriza qualquer imputação, a eles, de responsabilidade

civil pelas matérias que escreveram e publicaram:

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Informativo 750-STF (01/07/2014) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 31

“RECURSO ESPECIAL. MATÉRIA PUBLICADA EM REVISTA SEMANAL. VIÉS CRÍTICO SOBRE TERAPIAS

ALTERNATIVAS. LIBERDADE DE IMPRENSA. INEXISTÊNCIA DE DANOS MORAIS.

1. A liberdade de imprensa, garantia inerente a qualquer Estado que se pretenda democrático, autoriza a publicação de matéria que

apresente críticas a quaisquer atividades.”

(REsp 828.107/SP, Rel. Min. HUMBERTO GOMES DE BARROS – grifei)

“Críticas – inerentes à atividade jornalística. Estado Democrático – cabe à imprensa o dever de informar.

Art. 5º, IV e X, da Constituição. Idéias e opiniões pessoais são livres. Garantia constitucional.

Vida pública – todos estão sujeitos a críticas favoráveis ou desfavoráveis. .......................................................................................................

Exercício da crítica não produz lesão moral.”

(Apelação Cível nº 2006.001.21477/RJ, Rel. Des. WANY COUTO – grifei)

“AÇÃO DE INDENIZAÇÃO – DANOS MORAIS – LIBERDADE DE IMPRENSA – DIVULGAÇÃO DE FATOS ENVOLVENDO

O AUTOR – AUSÊNCIA DE DESVIRTUAMENTO.

1 - A liberdade de imprensa deve ser exercida com a necessária responsabilidade, para que não resulte em prejuízo à honra, à imagem

e ao direito de intimidade da pessoa abrangida na notícia.

2 - Não tendo as matérias publicadas ultrapassado os limites legais e constitucionais do direito de informação, afasta-se a ocorrência

de dano moral, eis que ausente a intenção de lesar ou prejudicar outrem.”

(Apelação Cível nº 2004.01.1.063638-4/DF, Rel. Des. HAYDEVALDA SAMPAIO – grifei)

Impõe-se reconhecer que esse entendimento tem o beneplácito do magistério jurisprudencial desta Suprema Corte, que, em hipótese assemelhada à ora em exame, proferiu decisão consubstanciada em acórdão assim ementado:

“Direito à informação (CF, art. 220). Dano moral. A simples reprodução, pela imprensa, de acusação de mau uso de verbas públicas,

prática de nepotismo e tráfico de influência, objeto de representação devidamente formulada perante o TST por federação de sindicatos, não

constitui abuso de direito. Dano moral indevido. RE conhecido e provido.” (RE 208.685/RJ, Rel. Min. ELLEN GRACIE – grifei)

É por tal razão, como assinala VIDAL SERRANO NUNES JÚNIOR (“A Proteção Constitucional da Informação e o Direito à Crítica

Jornalística”, p. 87/88, 1997, Editora FTD), que o reconhecimento da legitimidade do direito de crítica – que constitui “pressuposto do sistema

democrático” – qualifica-se, por efeito de sua natureza mesma, como verdadeira “garantia institucional da opinião pública”. É relevante observar que o Tribunal Europeu de Direitos Humanos (TEDH), em mais de uma ocasião, advertiu que a limitação do direito

à informação (e, também, do poder-dever de informar), quando caracterizada mediante (inadmissível) redução de sua prática “ao relato puro,

objetivo e asséptico de fatos, não se mostra constitucionalmente aceitável nem compatível com o pluralismo, a tolerância (...), sem os quais não há sociedade democrática (...)” (Caso Handyside, Sentença do TEDH, de 07/12/1976).

Essa mesma Corte Europeia de Direitos Humanos, quando do julgamento do Caso Lingens (Sentença de 08/07/1986), após assinalar que

“a divergência subjetiva de opiniões compõe a estrutura mesma do aspecto institucional do direito à informação”, acentua que “a imprensa tem a

incumbência, por ser essa a sua missão, de publicar informações e idéias sobre as questões que se discutem no terreno político e em outros setores

de interesse público (...)”, vindo a concluir, em tal decisão, não ser aceitável a visão daqueles que pretendem negar, à imprensa, o direito de

interpretar as informações e de expender as críticas pertinentes.

É preciso advertir, bem por isso, notadamente quando se busca promover a repressão à crítica jornalística, mediante condenação judicial

ao pagamento de indenização civil, que o Estado – inclusive o Judiciário – não dispõe de poder algum sobre a palavra, sobre as ideias e sobre as

convicções manifestadas pelos profissionais dos meios de comunicação social.

Essa garantia básica da liberdade de expressão do pensamento, como precedentemente assinalado, representa, em seu próprio e essencial

significado, um dos fundamentos em que repousa a ordem democrática. Nenhuma autoridade, mesmo a autoridade judiciária, pode prescrever o

que será ortodoxo em política, ou em outras questões que envolvam temas de natureza filosófica, ideológica ou confessional, nem estabelecer

padrões de conduta cuja observância implique restrição aos meios de divulgação do pensamento. Isso, porque “o direito de pensar, falar e escrever

livremente, sem censura, sem restrições ou sem interferência governamental” representa, conforme adverte HUGO LAFAYETTE BLACK, que

integrou a Suprema Corte dos Estados Unidos da América, “o mais precioso privilégio dos cidadãos (…)” (“Crença na Constituição”, p. 63, 1970,

Forense).

Essa percepção do tema – é importante assinalá-lo – tem sido claramente revelada por este Supremo Tribunal Federal, como o evidencia, p. ex., dentre outras, decisão desta Corte consubstanciada em acórdão assim ementado:

“LIBERDADE DE INFORMAÇÃO – DIREITO DE CRÍTICA – PRERROGATIVA POLÍTICO-JURÍDICA DE ÍNDOLE

CONSTITUCIONAL – MATÉRIA JORNALÍSTICA QUE EXPÕE FATOS E VEICULA OPINIÃO EM TOM DE CRÍTICA –

CIRCUNSTÂNCIA QUE EXCLUI O INTUITO DE OFENDER – AS EXCLUDENTES ANÍMICAS COMO FATOR DE

DESCARACTERIZAÇÃO DO ‘ANIMUS INJURIANDI VEL DIFFAMANDI’ – AUSÊNCIA DE ILICITUDE NO COMPORTAMENTO DO

PROFISSIONAL DE IMPRENSA – INOCORRÊNCIA DE ABUSO DA LIBERDADE DE MANIFESTAÇÃO DO PENSAMENTO –

CARACTERIZAÇÃO, NA ESPÉCIE, DO REGULAR EXERCÍCIO DO DIREITO DE INFORMAÇÃO – O DIREITO DE CRÍTICA, QUANDO MOTIVADO POR RAZÕES DE INTERESSE COLETIVO, NÃO SE REDUZ, EM SUA EXPRESSÃO CONCRETA, À DIMENSÃO

DO ABUSO DA LIBERDADE DE IMPRENSA – A QUESTÃO DA LIBERDADE DE INFORMAÇÃO (E DO DIREITO DE CRÍTICA NELA

FUNDADO) EM FACE DAS FIGURAS PÚBLICAS OU NOTÓRIAS – JURISPRUDÊNCIA – DOUTRINA – JORNALISTA QUE FOI

CONDENADO AO PAGAMENTO DE INDENIZAÇÃO CIVIL POR DANOS MORAIS – INSUBSISTÊNCIA, NO CASO, DESSA

CONDENAÇÃO CIVIL – IMPROCEDÊNCIA DA ‘AÇÃO INDENIZATÓRIA’ – RECURSO DE AGRAVO IMPROVIDO.

- A liberdade de imprensa, enquanto projeção das liberdades de comunicação e de manifestação do pensamento, reveste-se de conteúdo abrangente, por compreender, dentre outras prerrogativas relevantes que lhe são inerentes, (a) o direito de informar, (b) o direito de buscar a

informação, (c) o direito de opinar e (d) o direito de criticar.

- A crítica jornalística, desse modo, traduz direito impregnado de qualificação constitucional, plenamente oponível aos que exercem qualquer atividade de interesse da coletividade em geral, pois o interesse social, que legitima o direito de criticar, sobrepõe-se a eventuais

suscetibilidades que possam revelar as pessoas públicas ou as figuras notórias, exercentes, ou não, de cargos oficiais.

- A crítica que os meios de comunicação social dirigem às pessoas públicas, por mais dura e veemente que possa ser, deixa de sofrer, quanto ao seu concreto exercício, as limitações externas que ordinariamente resultam dos direitos de personalidade.

- Não induz responsabilidade civil a publicação de matéria jornalística cujo conteúdo divulgue observações em caráter mordaz ou

irônico ou, então, veicule opiniões em tom de crítica severa, dura ou, até, impiedosa, ainda mais se a pessoa a quem tais observações forem

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Informativo 750-STF (01/07/2014) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 32

dirigidas ostentar a condição de figura pública, investida, ou não, de autoridade governamental, pois, em tal contexto, a liberdade de crítica

qualifica-se como verdadeira excludente anímica, apta a afastar o intuito doloso de ofender. Jurisprudência. Doutrina.

- O Supremo Tribunal Federal tem destacado, de modo singular, em seu magistério jurisprudencial, a necessidade de preservar-se a prática da liberdade de informação, resguardando-se, inclusive, o exercício do direito de crítica que dela emana, por tratar-se de

prerrogativa essencial que se qualifica como um dos suportes axiológicos que conferem legitimação material à própria concepção do regime

democrático. - Mostra-se incompatível com o pluralismo de idéias, que legitima a divergência de opiniões, a visão daqueles que pretendem negar, aos

meios de comunicação social (e aos seus profissionais), o direito de buscar e de interpretar as informações, bem assim a prerrogativa de expender

as críticas pertinentes. Arbitrária, desse modo, e inconciliável com a proteção constitucional da informação, a repressão à crítica jornalística, pois o Estado – inclusive seus Juízes e Tribunais – não dispõe de poder algum sobre a palavra, sobre as idéias e sobre as convicções manifestadas

pelos profissionais da Imprensa. Precedentes do Supremo Tribunal Federal. Jurisprudência comparada (Corte Européia de Direitos Humanos e

Tribunal Constitucional Espanhol).” (AI 505.595-AgR/RJ, Rel. Min. CELSO DE MELLO)

Todas as observações que venho de fazer – e por mim efetivamente expostas em voto que proferi na ADPF 130/DF – prendem-se ao fato de que esses

temas, ora renovados, com propriedade, pelos recorrentes, nesta sede recursal, foram examinados ao longo daquele processo de controle normativo abstrato,

o que tornaria pertinente, até mesmo, o reconhecimento de ofensa à eficácia vinculante de que se mostra impregnado referido julgamento plenário. Sendo assim, e em face das razões expostas, conheço do presente agravo, para dar provimento ao recurso extraordinário a que ele se refere

(CPC, art. 544, § 4º, II, “c”, na redação dada pela Lei nº 12.322/2010), em ordem a julgar improcedente a ação de reparação civil por danos

morais ajuizada pelo ora recorrido. Condeno o ora recorrido, parte sucumbente, ao pagamento das custas processuais e da verba honorária, ora arbitrada em 5% (cinco por cento)

sobre o valor da causa, observando, para tanto, por tratar-se de sentença declaratória negativa (AI 70.550-AgR/SP, Rel. Min. DJACI FALCÃO –

REsp 428.178-AgR/PR, Rel. Min. LUIZ FUX, v.g.), a regra inscrita no art. 20, § 4º, do CPC.

Publique-se. Brasília, 19 de fevereiro de 2014.

Ministro CELSO DE MELLO

Relator

*decisão publicada no DJe de 13.3.2014

INOVAÇÕES LEGISLATIVAS 9 a 13 de junho de 2014

Lei nº 12.990, de 9.6.2014 - Reserva aos negros 20% (vinte por cento) das vagas oferecidas nos concursos

públicos para provimento de cargos efetivos e empregos públicos no âmbito da administração pública federal, das

autarquias, das fundações públicas, das empresas públicas e das sociedades de economia mista controladas pela União.

Publicada no DOU em 10.6.2014, Seção 1, p. 3.

OUTRAS INFORMAÇÕES 9 a 13 de junho de 2014

Decreto nº 8.265 de 11.6.2014 - Regulamenta a Lei nº 7.565, de 19 de dezembro de 1986 - Código Brasileiro de

Aeronáutica, no tocante às aeronaves sujeitas à medida de destruição, no período de 12 de junho a 17 de julho de 2014.

Publicado no DOU em 12.6.2014, Seção 1, p. 1.

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF)

Prazo – Feriado – Prorrogação – Secretaria Portaria nº 101/STF, de 10.6.2014 – Comunica que, no dia 19.6.2014, não haverá expediente na Secretaria do

Tribunal. Publicada no DJE/STF, n. 113, p.192, em 12.6.2014.

Prazo processual – Suspensão – Secretaria – Horário de funcionamento – Expediente forense Portaria nº 102/STF, de 10.6.2014 – Comunica que, durante o período de 2 a 31 de julho de 2014, os prazos

processuais ficarão suspensos e o expediente na Secretaria do Tribunal será das 13 às 18 horas. Publicada no DJE/STF,

n. 113, p.192, em 12.6.2014.

Secretaria de Documentação – SDO

Coordenadoria de Jurisprudência Comparada e Divulgação de Julgados – CJCD

[email protected]