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ENSAIOS HISTóRICOS
Marcasdágua filigranas 1
Expressão artística sua comunicação
Leopold Rodé
Entre as diversas marcasdágua quepodem ser encontradas nas folhas
de papel manual merecem unidestaque especial as filigranasporquanto as técnicas inovadoras dasfiligranas oferecendo um novo estilode representação gráfica as tornouobjetos muito valiosos em estudoshistóricos Mesmo resumida uma
visão em perspectiva ampla do campoda filigranologia demanda juntarinformações e comentários sobreaspectos artísticos técnicocientíficos e históricos ligados às filigranasque demandam um espaço maior queo disponível para um único ensaiona presente série Assim sendo cadaum destes aspectos será apresentadoseparadamente numa seqüência dequatro ensaios mutuamente complementares
0 presente ensaio inicia a seqüênciacom a apresentação de umas notasrelativas à origem e significado artístico da comunicação visada pelas filigranas e a eficácia conseguida natransmissão deste significado mediante os traços de maior transparênciaque carregam sua mensagem
0 segundo Filigranas II continuapela descrição das tecnologias usadasna elaboraçãodas filigranas e a utilização e processamento dos materiaisque as compõem mediante utensíliose ferramentas adequadas assim comopela descrição dos procedimentos paraconseguir as filigranas nas folhas depapel manual
0 terceiro Filigranas IU apontaalgumas das alternativas de classificação que levaram até o presente sistema recomendado pelo IPH Instituteq Paper Hístorians com base a tipologia da representação
0 último Filigranas IV indica as
precauções metodológicas que devempresidir o uso dos modernos instrumentos analíticos que tomam possívelo estudo não destrutivo das filigranase dos papéis que as suportam
A obra de arte instrumento decomunicação
No trabalho clássico de Shannon e
Weaver sobre a Teoria Matemática
da Comunicação o termo comunicação é usado no seu sentido mais amploe abrangente incluindo aqueles procedimentos mediante os quais umamente pode influir sobre o comportamento de outra mente Assim defini
do o termo inclui não somente osdiscursos escrito e oral mas também
música as artes pictóricas o teatrobalé em suma praticamente todas
as atividades artísticas Seja qual foro nível de abrangência escolhido osproblemas usualmente encontrados nacomunicação podem ser classificadosem três níveis como segue
nível A problemas de tipo técnico causados pela maior ou menorfidelidade com a qual os símbolosusados na comunicação podem sertransmitidos
nível B problemas semânticosque resultam de vartaçoes na exatidão com a qual os símbolos transmitidos transportam o significado desejado
nível C problemas relativos a eficácia quando o significado recebidonão consegue afetar na forma esperada o comportamento do receptor
Se as filigranas foram sempre umaexpressão artística qual era inicialmente a sua mensagem e qual o níveldos problemas na sua comunicaçãoproposital quando elas apareceram equal a evolução subseqüente
Causas que motivaram oaparecimento das filigranas
As versões relativas ao aparecimérito das filigranas provavelmenteficarão sempre no terreno das interpretações educadas sobre como osnossos antepassados medievais souberam tirar proveito das marcasdágua marcas assim denominadaspara designar os traços retos eqüidistantes e paralelos entre si que marcamna folha o posicionamento de cadaum dos fios pontusais da peneira durante a formação das folhas Interessante nestas marcas é o fato delas
ficar dissimuladas e ser necessário
para sua melhor visualização colocaras folhas marcadas entre uma fonte
luminosa o olho do observador paraassim aumentar o contraste entre a
sua maior transparência e a opacidadenormal da folha de papel
Para interpretar melhor como ocorreu este aproveitar as marcasdágua jáexistentes na nova forma de filigranasé conveniente fazer vários mergulhosnas épocas históricas que presenciaramo aparecimento das primeiras filigranasisto é nos séculos XIII e XIV
Um mergulho no intelectualidademedieval
Um primeiro mergulho nos leva aointeressante estudo de Zipora Rubi nstein sobre Shem Tob de Carri ón autor
da Disputa entre o Cálamo e a Tesoura obra que propícia uma descrição do ambiente dos escritores daépoca mediante uma troca de argumentos entre o autornarrador e a
pena ou cálamo de sua propriedadeconto situado na melhor tradiçãocatalã e provençal de narrar debatesentre o amo e o objeto por ele possuído Extraídos do texto de Zipora
COM LUU MI pág 20
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1298 Barcelona 1301 Fabriano 1303 Olot 1303 alot
I
1304 Barcelona 1305 Gênova 1308 Barcelona
Lf
1346 Inglaterra 1348 Itália 1359 Calals 1360 paris
o o 1
1370 Inglaterra 1383 Paris 1390 Catalunha
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os seguintes trechoseou comentáriossobre o Debate entre o Cálamo e a
Tesoura ilustram o nível e sensibili
dade do pensamento dos escritoresintelectuais daquelas épocas6Um tipo especial de escrita muçul
mana que requer especial habilidadee que está quase mais próximo dasbelas artes do que a pura caligrafia éo que consiste em recortar com tesouraas letras no papel não deixando nelemais do que o vazio das mesmas0 autor sugere duas modalidades
de escrita recortada nos seus poemasuma recortar o papel em torno dasletras e a outra seria o contrário istoé recortar as letras do papel a escritaseria então formada pelo espaço oco
Por causa da educação tradicionalos judeus estudavam a Bíblia e conheciam capítulos inteiros de cor Assim quando se expressavam por escrito ou verbalmente era freqüente autilização de nomes e palavras bíblicas partes de versículos ou versículosinteiros conservados na memória 0
uso deste recurso se acentua com o
surgimento da Maqama séculos XIIe XIII palavra de origem árabe quese refere às reuniões onde poetas nômades ou pregadores contavam histórias acompanhadas de provérbiosOs modernos pesquisadores da literatura hebraica chamam essa figura delinguagem de íricrustação bíblica eao estilo gerado por esse recurso deestilo mosaico pelo acúmulo defragmentos bíblicos encaixados notexto Os leitores familiarizados com
a Bíblia reconheciam o fragmento queos remetia às Escrituras
No nlcíicampo ainda não ocupado na época e situado entre a escritacom tinta mediante o cálamo e a es
crita peloepaço oco usando a tesoura podemos situar a escrita mediante os traços translúcidos das marcasdágua numa predisposição favorãvel extrapolação gratuita e semmuito fundamento por se tratar de doisníveis diferentes com base à aceitaçãopopular da figura de linguagem denominada incrustação bíblica
Um passeio pelo campo dosemblemas heráldicos
Um segundo mergulho no passadoque viu nascer as filigranas nos levaaté os emblemas heráldicos tão fre
qüentemente representados mediantefiligranas A história do papel apresenta uma longa fronteira com a dosemblemas heráldicos e tudo indica
que em algum ponto dessa fronteiraem algum momento de alguma maneira e por alguém foi iniciado o usodo papel como materialsuporte paraos emblemas heráldicos no formato
de filigranas É óbvio que ocorreu umencontro entre duas evoluções históricas a dos emblemas heráldicos e a
das manufaturas papeleiras A partirdeste cruzamento e na fronteira imer
disciplinar que junta ou separa estasduas evoluções foi se costurando ainteressante história das filigranaspapeleiras Naquela época o papel jáera uni material que juntava às suascaracterísticas físicoquímicas e àaparência de sua superfície externaumas condições de produção artesanalque o tornavam muito adequado comosuporte na representação gráfica dosemblemas heráldicos Não demorou
muito o aparecimento de cópias dosdesenhos emblemáticos elaboradas
mediante arame para reproduzir deforma simplificada os traços fundamentais do emblema original A filigrana assim elaborada era fixada sobrea peneira da fôrma papeleira e assimposicionada conseguia deixar umconjunto de marcasdágua de modo areproduzir pelos traços de maior transparência o desenho da figura ou doemblema a ser representado na folhade papel A representação figurativamediante traços de maior transparência na folha de papel recebeu o nomede filigrana assim herdando o nomedo artifício elaborado com arames ou
fios metálicas visando a obtenção dostraços desejados com maior transparência
Na série de ensaios históricos queprecederam o presente ensaio foi dedicada uma atenção especial ao estudoevolutivo do papel feito à mão e dastecnologias demandadas pela feituramanual do papel Considerar as filigranas sobre este pano de fundo poderia nos levar a uma visão muito parcial
por exclusivamente papeleiraAs formas artísticas devem ser avaliadas so
bre o pano de fundo do contexto erelação que foi por elas mantida comas forças culturais que as geraram Asobras de arte são expressões de umasociedade cujos sonhos elas alimentam Este conceito de obra de arte
encaixa na definição de comunicaçãoproposta por Shannon e até esticaseu escopo porquanto ele passa aabranger o campo dos sonhos Assimsendo uma rápida incursão no campodos emblemas heráldicos mostrando
sua evolução histórica a partir dassuas origens até o ponto do seu tropeço com o papel deverá nos fornecer perspectivas mais equilibradas para melhor interpretação das influências mútuas que resultaram do histórico encontro
Como identificar os sem lençonem documento escondidosatrás do seu escudo defensivo
A identificação individual dos competidores nas justas da Idade Médianos torneios e nos campos de batalhase tornava difícil devido a que os guerreiros participavam nestas lides comsuas faces escondidas pelo elmo quelhes protegia a cabeça A colocaçãode signos identificadores sobre assuperfícies visíveis dos seus cimosdas rodelas e dos escudos defensivos
usados pelos cavaleiros medievaispropiciou a preparação de símbolosgráficos que permitiam uma identíficação visual rápida mesmo no elevado nível de analfabetismo característi
co da época Assim e não somentenos escudos defensivos mas tambémnos estandartes flâmulas moedas e
medalhas aparecem signos na formade traços e formas geométricas simples varas cajados bastões de comando como símbolos individuais
que ao serem herdados passam a
representar vínculos e títularidadescom características de continuidade
familiar hereditária
A disseminação de emblemas destinados a distinguir determinadas pessoas recebeu um grande incentivo naépoc das Cruzadas pelo fato destemovimento promover encontros de
cffiLinua moo 24
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cavaleiros das mais diversas procedências desejosos de se identificarmediante signos externos sem precisar levantar o seu elmo protetor Avontade de se identificar individual
mente não foi um anseio limitado aos
guerreiros medievais Naquelas épocas podem ser observadas ocorrências que indicam no seu paralelísmouma predisposição em setores da sociedade religioso artesanal e comercial para fortalecer a conscientizaçãorelativa à participação individual numdeterminado contexto social Esta predisposição deve ter gerado expectativas sobre a forma de ser conhecida
ou reconhecida cada participaçãoindividual Como exemplo destas expressões paralelas pode ser mencionado o uso e difusão dos tartans
escoceses visando diferenciar os di
versos clãs mediante superposição dedesenhos elaborados mediante entre
cruzamentos de faixas estreitas colo
ridas diferentemente e integradas notecido dos cobertores e dos kilts ou
saiotes típicos da Escócia
Antroponímia medievalNos séculos X1 e X11 pode ser veri
ficada também uma mudança estrutural importante na maneira de designar as pessoas o nome único é substituído pela denominação dupla ondeo elemento nominal anteriormente
usado é complementado com um segundo elemento o qual derivandodo nome do pai do seu antecessor ouda localidade onde nasceu estabelece
a identificação patronímica que passaa ser hereditária Ao mesmo tempoos sinais que identificam os guerreirosescondidos atrás dos seus escudos protetores foram reproduzidos em tatuanho reduzido para serem gravados nosselos peças metálicas mediante asquais o desenho emblemático nelesgravado era usado para validar aassinatura de quem subscrevia umdocumento Estes selos aumentam seu
diâmetro com relação ao dos selosanteriormente usados para esta finalidade visando aumentar o espaço disponível para transferir os elementosartísticos que expressam a categoriada pessoa a ser representada pelo selo
A crescente incorporação dos emblemas heráldicos na vida civil conser
vou suas características guerreirasiniciais mas é interessante observara influência do ambiente civil sobre
as expressões artísticas dos emblemasidentificadores Elas se apresentamcom desdobramentos inovadores cada
vez que aparecem novos suportes para
emblemas novos situação que gerauna grande diversidade de aspectosformais atendendo preferências regionais modas e seus mimetismos0 momento é de criatividade artística
de soltura de grande liberdade comrelação às normas e padrões heráldicosque caracterizaram a continuidade dalinha militar dos escudos de armas A
História dos escudos de armas dos
emblemas heráldicos é percebidanuma maior sintonia com as grandescorrentes artísticas da época e suascorrespondentes expressões As diferenças regionais são mais facilmentepercebidas por contraste No caso dasFiligranas por se tratar de unia expressão artística escondida ou submer
sa a sua aceitação e rápida difusãopode ser explicada por urna simpatiasubliminarmente alimentada pelaclandestinidade aparente da filigranacausada por sua limitada visibilidadecondicionada ao posicionamento dafolha contra a luz
A criatividade na elaboração dosemblemas heráldicos recusouse a
acompanhar normas muito rígidas edisciplinadas descritas mediante umvocabulário ou glossário especializadoconhecido por brasão Para este fimo campo do escudo é dividido emnove áreas situadas em três níveis
superpostos contendo três áreas cadaum 0 escudo pode conter faixas emdiversas posições que podem se apresentar em duas cores metálicas ouroe prata e de cinco a sete tonalidadesde cor Ao se independizar do seu usoguerreiro os emblemas heráldicos foram progressivamente incorporandosímbolos diversos para comunicar visualmente informações sobre a pessoainstituição ou autoridade administrativa à qual o emblema estava ligadoAparecem então os elmos com diferentes tipos de penachos leões águias
correntes dragões e outros animaismitológicos veleiros canhões folhasde vegetais seus frutos e suas florescada peça com seu significadosimbólico portadora de uma informação específica para uns ou umasimples impressão artística para osnão iniciados na heráldica
Novas ex ressões artísticasa Lm os novos supodes
Muitos temas cobertos pelas artesplásticas que foram repetidamentetransmitidos de uma cultura determi
nada para outra cultura coetânea ouhistoricamente subseqüente ficamdespidos dos seus significadosoriginais por ficarem retidos na culturacedente assim entrando com uma
vestimenta de significados inéditos nanova cultura que os acolhe Esta transformação que é observada na emigração de uma cultura para outra podetambém ser detectada nas mudançasde suporte para uma expressão artística A passagem dos emblemas heráldicos do suporte oferecido pelas superfícies dos escudos defensivos parao suporte do papel para a representação gráfica tradicional com tinta eseguidamente para a nova modalidade de suporte papeleiro propiciandoa representação de filigranas exemplifica de modo esplendido este tipode acontecimentos
Portanto e tal como era de se esperar ao passar ao papel como filigranasos emblemas heráldicos precisaram seadaptar ao novo suporte de papel o quedemandou modificações que foramacompanhadas da atribuição de significados diferentes Modificações parecidas podem ser observadas quandodo escudo de armas o emblema he
ráldico migra para uma lápida oupara inscrições em outros materiaisresistentes e cujo estudo pertence aocampo dos conhecimentosepigráficosPor regra geral estas modificaçõesconsistem em manter inicialmente as
estruturas e detalhes essenciais da
função guerreira inicial detalhes quevão sendo suprimidos por supérfluosem cópias sucessiva até atingir umarepresentação gráfica despida da maioriados seus significados bélicos
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As filigranas de hojePelo acima exposto fica claro que
desde antigamente urna filigrana eraurna marca que do seu esconderijona folha de papel visava induzirmaior confiança na validade de umtexto nela documentado Portanto
visando modificar o comportamentodo seu leitor a marca da filigranaencaixa muito bem na definição conceitua dada por Shannon à palavracomunicação
Do mesmo modo que as filigranas
contribuíam na validação de um textomediante a sua visualização pelo exame a contraluz das folhas do papelque a suportavam hoje é tambémusada urna versão eletrônica dalili
grana para reconhecer um direitoou para validar uma promessa depagamento Este tipo de filigranaconsiste em partículas metálicas detamanho adequado que ficamconvenientemente dispersas na tintausada para imprimir uma faixacontínua sobre um pedaço de carto
1 ina ou plástico de um tamanho semelhante ao de um cartão de visita As
partículas metálicas contidas na faixaimpressa com a tinta são magnetizadas de forma a conter uma mensa
gem que pode ser captada por umdetetor adequado no sentido de autorizar o portador a cruzar uma barreira passagem múltipla de metrocartão de estacionamento ou de validar uma movimentação na conta corrente de um banco cartão de crédito
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Engenheiro mecânico Poli USP com 15 anos
de experiência no ramo de papel e celulose
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Contato Eng Mauro M Silvério
Fone 011 5772398
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