manual de extradição
TRANSCRIPT
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MINISTRIO DA JUSTIASECRETARIA NACIONAL DE JUSTIADEPARTAMENTO DE ESTRANGEIROS
Manual de
Extradio
Braslia, 2012
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MINISTRO DE ESTADO DA JUSTIAJos Eduardo Cardozo
SECRETRIO NACIONAL DE JUSTIAPaulo Abro Pires Junior
DIRETORA DO DEPARTAMENTO DE ESTRANGEIROSIzaura Maria Soares Miranda
ELABORAO: Aldenor de Souza e SilvaDenise Barros PereiraIzaura Maria Soares MirandaRiane Freitas Paz Falco
COLABORAO: Maurcio Correali
Esplanada dos Ministrios, Ministrio da Justia, Bloco T, Anexo II, 3 Andar.70.064-901 Braslia-DF
Distribuio Gratuita - Proibida a Venda
Ficha elaborada pela Biblioteca do Ministrio da Justia
341.144B823m Brasil. Secretaria Nacional de Justia (SNJ) Manual de extradio. -- Braslia : Secretaria Nacional de Justia (SNJ), Departamento de Estrangeiros, 2012. p.770 ISBN: 978-85-85820-17-6
1. Extradio. 2. Direito Penal Internacional. 3. Cooperao internacional. I. Ministrio da Justia. Departamento de Estrangeiros.
CDD
SECRETRIA-EXECUTIVAMrcia Pelegrini
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Sumrio 3
SUMRIOAPRESENTAO
INTRODUO
EXTRADIO: CONCEITOS E PRINCPIOS
Institutos Distintos: Extradio, Expulso e Deportao
Expulso
Repatriao e Deportao
Extradio e Transferncia de Pessoas Condenadas
Classificao da Extradio
Autoridade Central Brasileira: O papel da Secretaria
Nacional de Justia, do Ministrio da Justia
Controle de Legalidade: O papel do Supremo Tribunal
Federal
Trmite dos processos de extradio no Brasil
Processamento dos pedidos de extradio ativa
Processamento dos pedidos de extradio passiva
Concorrncia de pedidos
Documentos justificativos e formalizadores do pedido de
extradio
Informaes e diligncias complementares
Denegao da extradio
Entrega de extraditando: requisitos e procedimentos
Extraditando que responde a processo penal perante a
Justia brasileira
Extradio Voluntria
Extradio Temporria
Extradio Simplificada
Mandado Mercosul de Captura
Refgio e Extradio
Extradio de Brasileiros
............................................................................................ 11
................................................................................................ 13
........................................................ 15
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Sumrio4Extradio de Portugueses
Trnsito de extraditando pelo territrio nacional
Contagem de Prazos
LEGISLAO
Constituio Federal (art. 5)
Lei n 6.815, de 19 de agosto de 1980 - Define a situao jurdica do estrangeiro no Brasil, cria o Conselho Nacional de Imigrao
Decreto n 86.715, de 10 de dezembro de 1981 - Regulamenta a Lei n 6.815, de 19 de agosto de 1980, que define a situao jurdica do estrangeiro no Brasil, cria o Conselho Nacional de Imigrao e d outras providncias
Lei n 9.474, de 22 de julho de 1997 - Define mecanismos para a implementao do Estatuto dos Refugiados de 1951 e determina outras providncias
Decreto n 6.061, de 15 de maro de 2007 - Aprova a Estrutura Regimental e o Quadro Demonstrativo dos Cargos em Comisso e das Funes Gratificadas do Ministrio da Justia, e d outras providncias
Portaria MJ n 1.443, de 12 de setembro de 2006 - Aprova o Regimento Interno da Secretaria Nacional de Justia
Portaria MJ n 68, de 17 de janeiro de 2006 - Delega competncia ao Diretor do Departamento de Estrangeiros, da Secretaria Nacional de Justia, para autorizar trnsito pelo territrio nacional de pessoas extraditadas por Estados estrangeiros
Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal
Portaria MJ n 737, de 16 de dezembro de 1988 - Altera a Portaria n 557, de 04 de outubro de 1988 e estabelece procedimento a ser adotado em relao priso para fins de extradio de que tratam os artigos 81 e 82, da Lei n 6.815, de 19 de agosto de 1980, alterada pela Lei n 6.964, de 09 de dezembro de 1981
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...................................... 202
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Sumrio 5
Decreto n 3.447, de 5 de maio de 2000 - Delega
competncia ao Ministro de Estado da Justia para resolver
sobre a expulso de estrangeiro do Pas e sua revogao, na
forma do art. 66, da Lei n 6.815, de 19 de agosto de 1980,
republicada por determinao do art. 11, da Lei n 6.964,
de 9 de dezembro de 1981
Portaria DEEST n 8, de 05 de dezembro de 2011
Disciplina a contagem de prazos referentes a processos
administrativos de competncia do Departamento de
Estrangeiros/SNJ
ACORDOS DE EXTRADIO EM VIGOR
ARGENTINA - Tratado de Extradio entre o Brasil e
a Argentina - Assinado em 15 de novembro de 1961,
promulgado pelo Decreto n 62.979, de 11 de julho de
1968, e publicado no Dirio Oficial de 15 de julho de 1968
AUSTRLIA - Tratado sobre Extradio, celebrado entre o
Governo da Repblica Federativa do Brasil e o Governo da
Austrlia - Assinado em 22 de agosto de 1994, promulgado
pelo Decreto n 2.010, de 25 de setembro de 1996, e
publicado no Dirio Oficial de 24 de setembro de 1996
BLGICA - Tratado de Extradio entre o Brasil e a Blgica -
Assinado em 6 de maio de 1953, promulgado pelo Decreto
n 41.909, de 29 de julho de 1957, e publicado no Dirio
Oficial de 1 de agosto de 1957. Acordo Complementar
estendendo a aplicao do Tratado de Extradio ao Trfico
Ilcito de Drogas, assinado no Rio de Janeiro, por troca de
notas de 22 de abril e 8 de maio de 1958
BOLVIA - Tratado de Extradio entre o Brasil e a Bolvia
- Assinado em 25 de fevereiro de 1938, promulgado pelo
Decreto n 9.920, de 8 de julho de 1942, publicado no
Dirio Oficial de 10 de julho de 1942
CHILE - Tratado de Extradio entre o Brasil e o Chile -
Assinado em 8 de novembro de 1935, promulgado pelo
Decreto n 1.888, de 17 de agosto de 1937, e publicado no
Dirio Oficial de 20 de julho de 1937
......................................................................... 210
........................................................................................ 212
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.......................................................... 263
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Sumrio6COLMBIA - Tratado de Extradio entre o Brasil e a Colmbia - Assinado em 28 de dezembro de 1938, promulgado pelo Decreto n 6.330, de 25 de setembro de 1940, e publicado no Dirio Oficial de 27 setembro de 1940
EQUADOR - Tratado de Extradio entre o Brasil e o Equador - Assinado em 4 de maro de 1937, promulgado pelo Decreto n 2.950, de 8 de agosto de 1938, e publicado no Dirio Oficial de 11 de agosto de 1938
ESPANHA - Tratado de Extradio, entre a Repblica Federativa do Brasil e o Reino da Espanha - Assinado em 2 de fevereiro de 1988, promulgado pelo Decreto n 99.340, de 22 de junho de 1990, e publicado no Dirio Oficial de 25 de junho de 1990
ESTADOS UNIDOS DA AMRICA - Tratado de Extradio com os Estados Unidos da Amrica e respectivo Protocolo Adicional - Assinado em 13 de janeiro de 1961, promulgado pelo Decreto n 55.750, de 11 de fevereiro de 1965, e publicado no Dirio Oficial de 15 de fevereiro de 1965; e Protocolo Adicional ao Tratado de Extradio, assinado aos 18 de junho de 1962
FRANA - Tratado de Extradio entre o Governo da Repblica Federativa do Brasil e o Governo da Repblica Francesa - Assinado em 28 de maio de 1996, promulgado pelo Decreto n 5.258, de 27 de outubro de 2004, e publicado no Dirio Oficial de 28 de outubro de 2004
ITLIA - Tratado de Extradio, entre a Repblica Federativa do Brasil e a Repblica Italiana - Assinado em 17 de outubro de 1989, promulgado pelo Decreto n 863, de 9 de julho de 1993, e publicado no Dirio Oficial de 12 de julho de 1993
LITUNIA - Tratado de Extradio entre o Brasil e a Litunia - Assinado em 28 de setembro de 1937, promulgado pelo Decreto n 4.528, de 16 de agosto de 1939, e publicado no Dirio Oficial de 16 de agosto de 1939
MERCOSUL - Acordo de Extradio entre os Estados Parte do Mercosul - Em vigor para o Brasil, o Paraguai e o Uruguai. Assinado em 10 de dezembro de 1998, promulgado pelo Decreto n 4.975, de 30 de janeiro de 2004, e publicado no Dirio Oficial de 2 de fevereiro de 2004
..................... 271
.................................................. 280
........................................................................................ 291
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.............................. 318
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....................................................... 344
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Sumrio 7
MERCOSUL e ASSOCIADOS - Acordo de Extradio entre os Estados Parte do Mercosul e a Repblica da Bolvia e a Repblica do Chile - Em vigor para o Brasil, o Paraguai, o Uruguai, a Bolvia e o Chile. Assinado em 10 de dezembro de 1998, promulgado pelo Decreto n 5.867, de 03 de agosto de 2006, e publicado no Dirio Oficial de 04 de agosto de 2006
MXICO - Tratado de Extradio entre o Brasil e o Mxico e o respectivo Protocolo Adicional - Assinado em 28 de dezembro de 1933, promulgado pelo Decreto n 2.535, de 22 de maro de 1938. Protocolo Adicional assinado em 18 de setembro de 1935, promulgado pelo Decreto n 2.535, de 22 de maro de 1938, e publicado no Dirio Oficial de 2 de abril de 1938
PARAGUAI - Tratado de Extradio de Criminosos entre o Brasil e o Paraguay - Assinado em 24 de fevereiro de 1922, promulgado pelo Decreto n 16.925, de 27 de maio de 1925, e publicado no Dirio Oficial de 30 de maio de 1925
PERU - Tratado de Extradio entre a Repblica Federativa do Brasil e a Repblica do Peru - Assinado em 25 de agosto de 2003, promulgado pelo Decreto n 5.853 de 19 de julho de 2006, e publicado no Dirio Oficial de 20 de julho de 2006
PORTUGAL - Tratado de Extradio entre o Governo da Repblica Federativa do Brasil e o Governo da Repblica Portuguesa - Assinado em 7 de maio de 1991, promulgado pelo Decreto n 1.325, de 2 de dezembro de 1994, e publicado no Dirio Oficial de 5 de dezembro de 1994
REINO UNIDO DA GR-BRETANHA E IRLANDA DO NORTE - Tratado de Extradio, celebrado entre o Governo da Repblica Federativa do Brasil e o Governo do Reino Unido da Gr-Bretanha e Irlanda do Norte - Assinado em 18 de julho de 1995, promulgado pelo Decreto n 2.347, de 10 de outubro de 1997, e publicado no Dirio Oficial de 13 de outubro de 1997
REPBLICA DA CORIA - Tratado de Extradio entre a Repblica Federativa do Brasil e a Repblica da Coria - Assinado em 1 de setembro de 1995, promulgado pelo
.......................................................................................... 373
......................................................................................... 391
....................... 401
..................... 407
............................. 422
......................................................................................... 438
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Sumrio8Decreto n 4.152, de 7 de maro de 2002, e publicado no Dirio Oficial de 8 de maro de 2002
REPBLICA DOMINICANA - Tratado de Extradio entre o Governo da Repblica Federativa do Brasil e o Governo da Repblica Dominicana - Assinado em 17 de novembro de 2003, promulgado pelo Decreto n 6.738, de 12 de janeiro de 2009, e publicado no Dirio Oficial de 13 de janeiro de 2009
ROMNIA - Tratado de Extradio entre a Repblica Federativa do Brasil e a Romnia - Assinado em 12 de agosto de 2003, promulgado pelo Decreto n 6.512, de 21 de julho de 2008, e publicado no Dirio Oficial de 22 de julho de 2008
RSSIA - Tratado de Extradio entre a Repblica Federativa do Brasil e a Federao da Rssia - Assinado em 14 de janeiro de 2002, promulgado pelo Decreto n 6.056, de 6 de maro de 2007, e publicado no Dirio Oficial de 7 de maro de 2007
SUA - Tratado de Extradio entre o Brasil e a Sua - Assinado em 23 de julho de 1932, promulgado pelo Decreto n 23.997, de 13 de maro de 1934, e publicado no Dirio Oficial de 16 de maro de 1934
UCRNIA - Tratado de Extradio entre a Repblica Federativa do Brasil e a Ucrnia - Assinado em 21 de outubro de 2003, promulgado pelo Decreto n 5.938, de 19 de outubro de 2006, e publicado no Dirio Oficial de 20 de outubro de 2006
URUGUAI - Tratado de Extradio de Criminoso, entre a Repblica dos Estados Unidos do Brasil e a Repblica Oriental do Uruguay - Assinado em 27 de dezembro de 1916, promulgado pelo Decreto n 13.414, de 15 de janeiro de 1919, e publicado no Dirio Oficial de 18 de janeiro de 1919. Protocolo Adicional assinado em 7 de dezembro de 1921 e promulgado pelo Decreto n 17.572, de 30 de novembro de 1926
VENEZUELA - Tratado de Extradio entre o Brasil e a Venezuela - Assinado em 7 de dezembro de 1938,
......................................................... 452
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............................................................................................ 493
.................................................................. 507
......................................................................................... 518
..................................................................................... 532
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Sumrio 9
promulgado pelo Decreto n 5.362, de 12 de maro de
1940, e publicado no Dirio Oficial de 15 de maro de 1940
CONVENO DAS NAES UNIDAS CONTRA O CRIME
ORGANIZADO TRANSNACIONAL (CONVENO DE PALERMO)
Adotada em 15 de novembro de 2000, ratificada pelo
Brasil em 29 de janeiro de 2004, promulgada pelo Decreto
n 5.015, de 12 de maro de 2004 e publicada no Dirio
Oficial de 15 de maro de 2004
ACORDOS DE EXTRADIO APROVADOS PELO CONGRESSO,
PENDENTES DE RATIFICAO E/OU PROMULGAO
ANGOLA - Acordo entre o Governo da Repblica Federativa
do Brasil e o Governo da Repblica de Angola sobre
Extradio, assinado em Braslia, em 3 de maio de 2005,
aprovado pelo Decreto Legislativo n 04/2008
CANAD - Tratado de Extradio, celebrado entre o
Governo da Repblica Federativa do Brasil e o Governo do
Canad, em Braslia, em 27 de janeiro de 1995, aprovado
pelo Decreto Legislativo n 360/2007
CPLP - Conveno de Extradio entre os Estados Membros
da Comunidade dos Pases de Lngua Portuguesa, assinada
na Cidade de Praia, em 23 de novembro de 2005, aprovada
pelo Decreto Legislativo n 45/2009
GUATEMALA - Tratado de Extradio entre o Governo da
Repblica Federativa do Brasil e o Governo da Repblica
da Guatemala, celebrado em Braslia, em 20 de agosto de
2004, aprovado pelo Decreto Legislativo n 301/2007
LBANO - Tratado de Extradio entre o Governo da
Repblica Federativa do Brasil e o Governo da Repblica
Libanesa, celebrado em Beirute, em 4 de outubro de 2002,
aprovado pelo Decreto Legislativo n 348/2008
MOAMBIQUE - Acordo de Extradio entre a Repblica
Federativa do Brasil e a Repblica de Moambique, assinado
em Maputo, em 6 de julho de 2007, aprovado pelo Decreto
Legislativo n 894/2009
..................... 544
................................................................. 554
.................................... 609
.......................................... 610
......................................................... 627
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............................... 660
........................................ 676
.............................................................................. 689
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Sumrio10PANAM - Tratado de Extradio entre a Repblica Federativa do Brasil e a Repblica do Panam, assinado na Cidade do Panam, em 10 de agosto de 2007, aprovado pelo Decreto Legislativo n 281/2010
SURINAME - Tratado sobre Extradio entre o Governo da Repblica Federativa do Brasil e o Governo da Repblica do Suriname, celebrado em Paramaribo, em 21 de dezembro de 2004, aprovado pelo Decreto Legislativo n 655/2010
ACORDOS DE EXTRADIO EM TRAMITAO LEGISLATIVA; ASSINADOS, PENDENTES DE RATIFICAO; E EM NEGOCIAO
EXTRADIO SIMPLIFICADA - Acordo sobre Extradio Simplificada entre a Repblica Argentina, a Repblica Federativa do Brasil, o Reino da Espanha e a Repblica Portuguesa Assinado em 03 de novembro de 2010, na cidade de Santiago de Compostela, Espanha (pendente de encaminhamento aprovao legislativa)
MANDADO MERCOSUL DE CAPTURA - Acordo sobre Mandado Mercosul de Captura e Procedimentos de Entrega entre os Estados Partes do Mercosul e Estados Associados Aprovado pela Deciso CMC n 48/10 (pendente de encaminhamento aprovao legislativa)
........................................................ 705
......................... 721
.................... 735
........................................................................................ 737
........................................................................................ 746
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Apresentao 11
APRESENTAO
O processo de integrao por que passa o mundo globalizado impe
aos Estados especial ateno ao movimento migratrio em seus territrios,
cujo aumento vertiginoso do fluxo proporciona terreno frtil ao acesso e
escalada da criminalidade organizada internacional nos mais diversos
planos.
Os operadores do crime utilizam-se de recursos tecnolgicos e
econmicos para subsidiar as atividades ilcitas e articulam-se em forma
de organizaes para as implementar nos Estados, que se tornam alvos em
suas estruturas econmicas, sociais e at mesmo culturais.
Vrias so as vertentes em que o crime internacional est presente, a
exemplo da prtica da corrupo, que contamina as estruturas do Estado e
compromete o bem comum; fraudes diversas a inviabilizar a estabilidade
econmica; o narcotrfico que ceifa vidas, adoece e desestrutura a
sociedade como um todo; trfico de armas, que estimula a violncia;
e o trfico de pessoas, que escraviza vidas e que, entre outros, cora de
vergonha o rosto da humanidade.
A experincia emprica indica que a cooperao entre os pases o
veculo mais eficaz de enfrentamento e desarticulao dessas atividades
criminosas, e o fortalecimento dos canais de comunicao tem demonstrado
que o trabalho coletivo no pode ser preterido por aes unilaterais, sob
pena de no resultar na esperada eficcia da atividade estatal.
O esforo coletivo dos Estados est presente em diversas reas do
conhecimento, das quais se podem destacar as cooperaes policial e jurdica,
a difuso de dados e a extradio.
No entanto, as limitaes verificadas no sistema legal dos mais
diversos pases reclamam exaustiva atividade administrativa em busca
da harmonizao legislativa, a fim de que seja emprestada a necessria
agilidade nos procedimentos de extradio, persecuo criminal e demais
medidas de cooperao, cujas regras sejam claras o suficiente a ponto de
atender satisfatoriamente s pretenses das Partes.
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Apresentao12O Brasil no admite a presena de criminosos foragidos da Justia
internacional, pelo que, vista da extenso continental de suas fronteiras,
necessita dispor de meios capazes de proporcionar a imediata retirada de
criminosos de seu territrio e devolv-los jurisdio do Estado que os
reclama.
Preocupada com a escalada da criminalidade internacional, a
Organizao das Naes Unidas aprovou, no ms de dezembro de 2000,
a Conveno de Palermo sobre o Crime Transnacional Organizado,
reservando captulo especfico para o instituto da extradio.
Com esse esprito que a presente obra rene diversos acordos
bilaterais e multilaterais acerca do tema afeto cooperao, resultado
de intensas negociaes e prova do consenso internacional em torno da
matria, cujo manejo adequado encerra importante meio de facilitao
das atividades tcnicas nsitas aos procedimentos, permitindo agilidade e
viabilizando a eficcia da prestao jurisdicional e administrativa do Estado
na busca do bem comum.
Jos Eduardo Cardozo
Ministro de Estado da Justia
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Introduo 13
INTRODUO
A poltica pblica brasileira tem sido marcada pela perspectiva de
consolidao do bem-estar social de seus habitantes e pela aplicao
de fundamentos humanistas, de incluso social, de respeito dignidade
humana e de equalizao dos dilemas e dvidas histricas do Estado
perante a sociedade. A insero internacional do pas pauta-se, tambm,
pela projeo exterior desses valores e referenciais, bem como pela
difuso de uma cultura de cooperao e compreenso que reposiciona
a ordem internacional a servio da possibilidade de cada pas, para,
autnoma ou articuladamente, buscar as melhores condies, alcanar o
desenvolvimento econmico, social e humano.
A gesto domstica que permite o aprofundamento dessas relaes
passa pela existncia de um regime jurdico que provenha bem-estar ao
migrante e consonncia com os princpios sociais e normativos brasileiros,
permitindo integrao e contato harmnicos. So vrios os institutos
de cooperao internacional demandados para a implementao de
tal regime, cujo objetivo proporcionar a aproximao entre pases e
desburocratizao da vida dos cidados migrantes.
A globalizao, caracterizada pela intensificao dos fluxos de
informaes, produtos e pessoas, intensifica tambm os padres de
estabelecimento de novos vnculos, novas cidadanias, novos trnsitos,
gerando demandas cotidianas cada vez maiores para uma populao de
pessoas fora de seus pases de origem. Igualmente, o carter transnacional
das relaes humanas perpassa toda a vida social, inclusive dando
complexidade extra s relaes criminosas. Como fato da vida social,
torna-se, historicamente, objeto de polticas de cooperao, e o principal
e mais antigo instituto como resposta a extradio.
Compete ao Estado munir-se de instrumentos adequados para
paralisar a ao de grupos criminosos, e aos Estados, no plano das
relaes intergovernamentais e supranacionais, cabe a cooperao
investigativa, de reforo da legalidade, de promoo da repatriao de
pessoas condenadas, enfim, a atuao responsiva organizao do crime
para alm das fronteiras.
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Introduo14Dentre os mecanismos de cooperao jurdica internacional, a
extradio simboliza esse esforo entre Estados de convergncia no
combate ao crime transnacional e impunidade. Mecanismos como
este objetivam a reduo dos custos de transao, a amenizao das
dificuldades burocrticas, financeiras e logsticas para a aplicao da
Justia que as fronteiras nacionais representaram historicamente, tendo
como referente fundamental o respeito soberania de cada nao.
Este livro rene os acordos internacionais j firmados, e outros em
negociao, os quais buscam viabilizar pronta resposta aos pedidos de
extradio e estabelecer regras claras sobre a efetivao da entrega do
extraditado ao Estado requerente, que realiza o objetivo finalstico de
possibilitar a persecuo criminal dos que cruzam fronteiras na tentativa
de se esquivar da Justia.
O Ministrio da Justia, por meio da Secretaria Nacional de Justia
- rgo competente para representar o Brasil internacionalmente em
temas afetos extradio busca, portanto, democratizar os conceitos e
as bases legais deste instituto. Espera-se, assim, socializar conhecimento
que permite alm da mais ampla difuso dessas prticas em atores
institucionais no Brasil que os atores sociais engajados na integrao da
populao migrante possam se empoderar para o acompanhamento e o
controle democrtico desses processos.
Paulo Abro Pires Jnior
Secretrio Nacional de Justia
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Extradio: Conceitos e Princpios 15
EXTRADIO:
CONCEITOS E PRINCPIOS
Se, por um lado, a intensificao mundial dos fluxos de bens, servios,
capitais e pessoas trouxe vrios benefcios aos pases, como crescimento,
desenvolvimento e evoluo em sentido amplo, de outro, acabou por
transnacionalizar e expandir, tambm, as atividades criminosas. Isto porque
as fronteiras para as pessoas reclamadas pela Justia no representam
to-somente limites territoriais, mas tambm uma barreira ao alcance da
Justia, capaz de resultar em impunidade.
nesse contexto que o instituto da extradio apresenta-se como um
dos mais eficientes e eficazes meios de cooperao jurdica internacional,
eis que permite a entrega jurisdio do Estado requerente de pessoas
reclamadas, seja para responder a processos-crime ou para cumprimento
de pena.
O renomado jurista Francisco Rezek, ex-ministro do Supremo Tribunal
Federal (STF), em sua obra Direito Internacional Pblico, Curso Elementar,
avalia a extradio como a entrega, por um Estado a outro, e a pedido
deste, de pessoa que em seu territrio deva responder a processo penal ou
cumprir pena (...). A extradio pressupe sempre um processo penal: ela
no serve para a recuperao forada do devedor relapso ou do chefe de
famlia que emigra para desertar dos seus deveres de sustento da prole 1
Nas palavras do professor Hildebrando Accioly, extradio o ato
mediante o qual um Estado entrega a outro Estado indivduo acusado de
haver cometido crime de certa gravidade ou que j se ache condenado
por aquele, aps haver-se certificado de que os direitos humanos do
extraditando sero garantidos. 2
A extradio encontra-se amparada por Acordo celebrado entre os
Estados envolvidos, devendo ser observado o conjunto de requisitos
1 REZEK , Francisco. Direito Internacional Pblico: curso elementar. 10 ed. rev. e atual. So Paulo:
Saraiva, 2005.
2 ACCIOLY, Hildebrando; NASCIMENTO E SILVA, G. E. do; CASELLA, Paulo Borba. Manual de Direito
Internacional Pblico. 17 ed So Paulo: Saraiva, 2009.
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Extradio: Conceitos e Princpios16estabelecidos no texto ratificado. Na ausncia deste, o pedido de extradio
poder ser formulado com promessa de reciprocidade de tratamento para
casos anlogos entre os dois Estados, materializada por meio de Nota
Diplomtica3.
Os pedidos de extradio com base em promessa de reciprocidade de
tratamento encontram respaldo legal e so instrudos, no Pas, na forma
da Lei 6.815, de 19 de agosto de 1980, que define a situao jurdica do
estrangeiro no Brasil, bem assim nos compromissos internacionais firmados
com vistas ao combate impunidade. Tal promessa constitui declarao
de Governo em que, ocorrendo situao anloga no pas requerido, o pas
requerente compromete-se a conceder a extradio nos mesmos moldes.
O primeiro princpio fundamental da extradio o Princpio da
Especialidade, ou seja, o extraditando no poder ser processado e/
ou julgado por crimes que no embasaram o pedido de cooperao e
que tenham sido cometidos antes de sua extradio, podendo o Estado
requerente solicitar ao Estado requerido a extenso ou ampliao da
extradio ou extradio supletiva.
Referido princpio no pode deixar de ser observado, ainda que a
pessoa extraditada consinta em ser processada no Estado requerente por
outros delitos que no os que instruram o pedido de extradio.
O modelo de Acordo de extradio das Naes Unidas, em seu artigo
14, trata da extenso ou ampliao do pedido da seguinte forma: um
indivduo extraditado (...) no poder, no territrio do Estado requerente,
ser processado, condenado, detido ou reextraditado para um terceiro
Estado, nem ser submetido a outras restries em sua liberdade pessoal,
por uma infrao cometida antes da entrega, salvo: a) se se tratar de uma
3 Supremo Tribunal Federal, Extradio 633, Relator Ministro Celso de Mello, julgada em 28.08.1996:
Nota Diplomtica e presuno de veracidade. A Nota Diplomtica, que vale pelo que nela se contm, goza da
presuno juris tantum de autenticidade e de veracidade. Trata-se de documento formal cuja eficcia jurdica deriva
das condies e peculiaridades de seu trnsito por via diplomtica. Presume-se a sinceridade do compromisso
diplomtico. Essa presuno de veracidade sempre ressalvada a possibilidade de demonstrao em contrrio
decorre do princpio da boa f, que rege, no plano internacional, as relaes poltico-jurdicas entre os Estados
soberanos.
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Extradio: Conceitos e Princpios 17
infrao pela qual a extradio tenha sido concedida; ou b) se o Estado
requerido manifestar a sua concordncia.
Outro princpio basilar da extradio o da Dupla Tipicidade, tambm
conhecido como Princpio da Identidade ou da Dupla Incriminao do
Fato ou Incriminao Recproca. Sob a gide deste, impe-se que somente
seja concedida uma extradio para um fato tpico e antijurdico, assim
considerado tanto no pas requerente quanto no requerido4.
O princpio supra alinha-se em sua forma ao Princpio da Legalidade, ou
seja, no h crime sem lei anterior que o defina. Os pedidos de extradio
no se restringem existncia de previso de tipos legais idnticos, mas
aos que a conduta ou omisso tpica e antijurdica no ordenamento
jurdico dos Estados requerente e requerido, no se incluindo os delitos de
natureza poltica ou militar.
Outra circunstncia que deve ser analisada a do non bis in idem, por
meio da qual, no ser concedida a extradio quando j existir sentena
transitada em julgado pelo mesmo fato em que se baseia o pedido de
extradio. Destaque-se, aqui, o termo fato, j que poder ser solicitada
a extradio de um indivduo por um determinado crime em relao ao
qual j tenha sido condenado, mas no em relao ao mesmo fato delitivo5.
4 Supremo Tribunal Federal, Extradio 953, Relator Ministro Celso de Mello, julgada em 28.09.2005:
Extradio e dupla tipicidade. A possvel diversidade formal concernente ao nomen juris das entidades delituosas
no atua como causa obstativa da extradio, desde que o fato imputado constitua crime sob a dupla perspectiva dos
ordenamentos jurdicos vigentes no Brasil e no Estado estrangeiro que requer a efetivao da medida extradicional.
O postulado da dupla tipicidade por constituir requisito essencial ao atendimento do pedido de extradio impe
que o ilcito penal atribudo ao extraditando seja juridicamente qualificado como crime tanto no Brasil quanto
no Estado requerente. O que realmente importa, na aferio do postulado da dupla tipicidade, a presena dos
elementos estruturantes do tipo penal (essentialia delicti), tais como definidos nos preceitos primrios constantes da
legislao brasileira e vigentes no ordenamento positivo do Estado requerente, independentemente da designao
formal por eles atribudos aos fatos delituosos.
5 Supremo Tribunal Federal, Extradio n 890, Relator Ministro Celso de Mello, julgada em 05.08.2004:
Obstculo ao deferimento do pedido extradicional, quando fundado nos mesmos fatos delituosos objeto da
persecuo penal instaurada pelo Estado brasileiro. A extradio no ser concedida, se, pelo mesmo fato em que
se fundar o pedido extradicional, o sdito estrangeiro estiver sendo submetido a procedimento penal no Brasil, ou,
ento, j houver sido condenado ou absolvido pelas autoridades judicirias brasileiras. Ningum pode expor-se, em
tema de liberdade individual, situao de duplo risco. Essa a razo pela qual a existncia de situao configuradora
de double jeopardy atua como insupervel obstculo ao atendimento do pedido extradicional. Trata-se de garantia
que tem por objetivo conferir efetividade ao postulado que veda o bis in idem
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Extradio: Conceitos e Princpios18No tocante aos pedidos de extradio passiva, o Estado brasileiro
segue o Sistema de Contenciosidade Limitada. De acordo com este, a
ao para julgamento do pedido de extradio junto ao Supremo Tribunal
Federal no consiste na repetio do litgio penal que lhe deu origem. A
Suprema Corte possui limitaes que a impedem de reexaminar o quadro
probatrio ou a discusso sobre o mrito tanto da acusao quanto da
condenao emanadas pela autoridade competente do Estado estrangeiro.
O Sistema de Contenciosidade Limitada no impede, contudo, que o
Supremo Tribunal Federal analise os aspectos formais do processo criminal
que embasa o pedido de extradio, garantias e direitos bsicos da pessoa
reclamada.6
INSTITUTOS DISTINTOS:
EXTRADIO, EXPULSO E DEPORTAO
A Extradio, a Expulso e a Deportao so as chamadas Medidas
Compulsrias previstas na Lei n 6.815, de 1980, conhecida como Estatuto
do Estrangeiro. So tidas como as modalidades de retirada forada do
estrangeiro do Territrio Nacional, sendo independentes e peculiares. Nas
palavras do ilustre Mestre Francisco Guimares, tem-se que: enquanto
a deportao se dirige s hipteses de entrada ou estada irregular, a
expulso se volta contra o estrangeiro nocivo ou indesejvel ao convvio
social, sendo a extradio a forma processual admitida, de colaborao
internacional, para fazer com que um infrator da lei penal, refugiado em
um pas, se apresente ao juzo competente de outro pas onde o crime foi
cometido7.
6 Supremo Tribunal Federal, Extradio n 549, Relator Ministro Celso de Mello, julgada em 28.05.1992:
O Supremo Tribunal Federal, na ao de extradio passiva, no dispe de qualquer poder de indagao probatria
sobre o mrito da pretenso deduzida pelo Estado requerente. A defesa do extraditando sofre, no processo
extradicional, limitaes de ordem material, eis que no podendo ingressar na anlise dos pressupostos da
persecutio criminis instaurada no Estado requerente somente poder versar os temas concernentes identidade
da pessoa reclamada, existncia de vcios formais nos documentos apresentados ou ilegalidade da prpria
extradio.
7 GUIMARES, Francisco Xavier da Silva. Medidas compulsrias: a deportao, a expulso e a extradio.
2 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002
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Extradio: Conceitos e Princpios 19
Expulso:
Consiste em medida coercitiva de carter discricionrio de um Estado,
levada a efeito em face do estrangeiro que, de qualquer forma, atentar
contra a segurana nacional, a ordem poltica ou social, a tranquilidade ou
moralidade pblica e a economia popular, ou cujo procedimento o torne
nocivo convenincia e aos interesses nacionais.8
Compete ao Diretor do Departamento de Estrangeiros, da Secretaria
Nacional de Justia, determinar a instaurao de Inqurito de Expulso
em que so assegurados ao estrangeiro a ampla defesa e o contraditrio e
que ir compor o processo administrativo para fins de expulso como pea
instrutria, dentre outras. A deciso sobre a expulso e sua revogao,
desde maio de 2000, de competncia do Ministro de Estado da Justia,
delegada pelo Presidente da Repblica por meio do Decreto n 3.447, de 5
de maio de 2000, vedada subdelegao.
Vale ressaltar que no ser efetivada a expulso de estrangeiro quando
esta implicar extradio inadmitida, conforme previsto no artigo 75, I, da
Lei 6.815/809, ou seja, ainda que o estrangeiro seja passvel de expulso,
o Governo brasileiro no poder efetivar referida medida compulsria
para o mesmo pas em que houver deciso de indeferimento de pedido
de extradio, sob pena de configurar uma extradio indireta e, portanto,
no admitida pela legislao brasileira.
Uma vez expulso, o estrangeiro impedido de reingressar no territrio
nacional, sob pena de configurar-se o delito tipificado no artigo 338, do Cdigo
Penal, tratando-se de crime permanente cuja pena, de recluso, de um a
quatro anos, sem prejuzo de nova expulso aps o cumprimento daquela.
Trata-se de crime que se consuma com o reingresso no territrio
nacional, e cuja ao penal pblica incondicionada, de competncia da
Justia Federal, ex vi do art. 109, X, da Constituio Federal.
8 Artigo 65, da Lei n 6.815, de 1980.
9 Lei n 6.815, de 1980, artigo 75 No se proceder expulso: I - se implicar extradio inadmitida pela
lei brasileira; (...)
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Extradio: Conceitos e Princpios20Repatriao e Deportao:
A repatriao ocorre quando um estrangeiro sem autorizao
impedido de ingressar no Brasil, ainda na rea de controle migratrio
do porto, aeroporto ou da fronteira. Ocorre a expensas da empresa
transportadora, uma vez que se obriga a permitir o embarque somente
daqueles que estejam identificados e com vistos vlidos, se for o caso.
A deportao, por sua vez, ser aplicada nas hipteses de entrada
ou estada irregular de estrangeiros no territrio nacional, e geralmente
ocorre quando o estrangeiro mesmo tendo sido notificado, no deixa o
Pas no prazo estipulado, que pode variar de um a oito dias.
No entanto, poder ser procedida a deportao sumria, desde que
conveniente aos interesses nacionais luz do dispoto no 2 do artigo 57
da Lei n 6.815, de 1980.
O estrangeiro que ingressa no territrio nacional sem autorizao
reputado como clandestino na Lei n 6.815, de 1980, sendo que a estada
irregular refere-se mera infrao administrativa, no sendo considerado
crime no Brasil, razo porque o termo estada ilegal inapropriado.
Em nenhum dos casos, o retorno do estrangeiro ao Brasil ser impedido,
desde que sejam ressarcidos eventuais gastos da Unio com a deportao
ou repatriao e haja o recolhimento da multa imposta, se for o caso.
EXTRADIO E TRANSFERNCIA DE PESSOAS
CONDENADAS
O instituto da transferncia de pessoas condenadas reveste-se de
carter eminentemente humanitrio que visa facilitar a reintegrao de
pessoas condenadas ao meio social de que so originrias, na medida em que
possibilita o cumprimento junto a seus familiares e compatriotas do restante
da pena aplicada pelo Poder Judicirio de pas do qual no nacional.
Diversamente da extradio, em que a pessoa reclamada por
determinado pas para responder a processo ou para execuo de pena, a
transferncia de pessoas condenadas s ocorre aps sentena transitada
em julgado e depende de vontade expressa do preso em cumprir o restante
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Extradio: Conceitos e Princpios 21
da pena em seu pas de nacionalidade ou de residncia, se assim estiver
previsto no Acordo respectivo.
A transferncia de pessoas condenadas somente ser autorizada entre
pases com os quais o Brasil possua Acordo em vigor, e sua efetivao ocorre
concomitantemente com a expulso do estrangeiro do territrio nacional.
CLASSIFICAO DA EXTRADIO
A extradio poder ser solicitada tanto para fins de instruo de
processo penal a que responde a pessoa reclamada (instrutria), como
para cumprimento de pena j imposta (executria).
No Brasil, a extradio ativa quando o Governo brasileiro solicita
a entrega de uma pessoa procurada pela Justia brasileira a outro pas,
para fins de julgamento ou cumprimento de pena. considerada passiva
quando a pessoa objeto de processo penal em outro pas encontra-se no
Brasil e o Estado estrangeiro requer sua entrega para instruo de processo
penal ou execuo de sentena, ainda que no transitada em julgado.
AUTORIDADE CENTRAL BRASILEIRA:
O PAPEL DA SECRETARIA NACIONAL DE JUSTIA,
DO MINISTRIO DA JUSTIA
Em matria de extradio, a Autoridade Central designada como
competente para tratar do tema. Entre as atividades desempenhadas,
destacam-se: providenciar o recebimento e envio de documentos;
examinar a viabilidade dos pedidos de extradio, procedendo ao juzo
da admissibilidade nos termos dos Acordos ou da legislao interna;
adotar as medidas necessrias visando agilizar da tramitao de pedido
de extradio at sua finalizao; otimizar as eventuais diligncias;
assessorar as autoridades competentes; autorizar a entrega e o trnsito
de extraditandos, entre outros.
A Secretaria Nacional de Justia, do Ministrio da Justia, por meio
do Departamento de Estrangeiros, a Autoridade Central em matria de
extradio, sendo responsvel por formalizar os pedidos de extradio
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Extradio: Conceitos e Princpios22feitos por autoridades brasileiras a um determinado Estado estrangeiro
(ativa) ou, ainda, processar, opinar e encaminhar as solicitaes de
extradio formuladas por outro pas Suprema Corte brasileira (passiva).
No mbito do Departamento de Estrangeiros, realizado um juzo
de admissibilidade das solicitaes de extradio, submetendo-as ao
respectivo pas requerido, quando ativa, ou ao Supremo Tribunal Federal,
quando se tratar de extradio passiva. Nessa anlise, verificam-se
especialmente os documentos apresentados, e se foram observados os
requisitos legais necessrios concesso da medida, auxiliando o Estado
requerente no que for necessrio correta formalizao do pedido.
Atua, ainda, no sentido de agilizar os trmites dos pedidos de
extradio, agindo em parceria com outros rgos, incluindo o Ministrio
das Relaes Exteriores, a INTERPOL, e o Supremo Tribunal Federal.
CONTROLE DE LEGALIDADE:
O PAPEL DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
De forma geral, o Poder Judicirio do Estado requerido responsvel
por decidir se o pedido de extradio formulado deve ou no ser concedido.
So analisados, principalmente, os aspectos formais que conduziram o
processo criminal objeto do pedido de extradio, levando-se em conta
as garantias fundamentais do extraditando, as limitaes prescricionais e
a inexistncia de motivaes polticas ou ideolgicas que prejudiquem o
pedido formulado.
importante salientar que, no Brasil, a Autoridade Judicial competente
o Supremo Tribunal Federal, e este no se constitui em instncia revisora
dos atos praticados pela Justia do Estado requerente, no sendo admitida
anlise de mrito desses atos ou dos meios probatrios que influenciaram
as decises. Por esse motivo, como antes mencionado, o ordenamento
jurdico brasileiro adota o sistema de contenciosidade limitada, no sendo
possvel proceder a qualquer tipo de indagao probatria.
O Supremo Tribunal Federal realiza um rgido controle de legalidade
do pedido, verificando, por exemplo, se o fato imputado punvel na
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Extradio: Conceitos e Princpios 23
legislao de ambos Estados, se j era tipificado anteriormente a seu
cometimento, se j foi extinta a punibilidade do delito praticado em
qualquer dos Estados requerente e requerido , e se o crime ou no de
natureza poltica ou militar.
No controle da legalidade, verificado se a pessoa estar sujeita
a uma pena inexistente ou no admitida no Brasil, sendo que, ainda
assim, a extradio poder ser deferida, ficando apenas condicionada a
entrega apresentao pelo Estado requerente, de compromisso formal
de substituio de eventual pena morte ou perptua por privativa de
liberdade.
Da deciso do Supremo Tribunal Federal no cabe recurso, apenas
embargos de declarao quando se verificar omisso, obscuridade ou
contradio10.
TRMITE DOS PROCESSOS DE EXTRADIO NO BRASIL
Ao formular o pedido de extradio ou de priso preventiva, o Estado
requerente poder solicitar a apreenso, reteno ou outras medidas
cautelares anlogas, de bens que forem encontrados em poder do foragido
e que tenham vnculo com o crime pelo qual a extradio solicitada.
Para tanto, o pedido dever ser formulado expressamente, com indicao
precisa dos bens e a razo pela qual acreditam tratar-se de objetos ou
valores obtidos com a prtica criminosa.
Processamento dos pedidos de extradio ativa:
No caso da extradio ativa, o Poder Judicirio encaminha a
documentao correspondente ao Departamento de Estrangeiros, da
10 Supremo Tribunal Federal, Extradio 1139 ED, Relatora Ministra Ellen Gracie, julgada em 17.12.2009.
Ementa: EMBARGOS DE DECLARAO. REDISCUSSO DOS FUNDAMENTOS EXPOSTOS NO VOTO. INADMISSIBILIDADE.
AUSNCIA DE OBSCURIDADE, OMISSO OU CONTRADIO. EMBARGOS REJEITADOS. 1. Os embargos de declarao
so cabveis para devolver ao rgo jurisdicional a oportunidade de pronunciar-se no sentido de aclarar julgamento
obscuro, completar deciso omissa ou dirimir contradio de que se reveste o julgado. 2. imperioso o registro de
que, no julgamento dos embargos de declarao, a regra que no h prolao de nova deciso ou julgamento, mas
sim apenas clareamento do que j foi julgado. 3. No h obscuridade, omisso ou contradio no julgado impugnado.
4. Com efeito, todas as questes ora suscitadas j foram devidamente analisadas quando do julgamento do pedido
extradicional, restando ntida a inteno do embargante de rediscutir os fundamentos da deciso do Plenrio deste
Tribunal. 5. Embargos rejeitados.
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Extradio: Conceitos e Princpios24Secretaria Nacional de Justia, que analisa a admissibilidade do pedido, a fim
de verificar se est na forma estabelecida no Acordo e/ou legislao interna.
Sendo admitido, o pedido de extradio ser encaminhado ao
Ministrio das Relaes Exteriores, a fim de que seja formalizado ao
Estado onde se encontra o foragido da justia brasileira, ou diretamente
Autoridade Central do respectivo pas, quando permitido em Acordo.
Ordinariamente, a priso preventiva para fins de extradio
solicitada antes da formalizao do pedido, visando evitar eventual fuga do
extraditando. Nesses casos, aps a priso, o Brasil notificado a apresentar
os documentos justificativos e formalizadores da extradio no prazo
estipulado no acordo ou, na falta deste, conforme legislao interna do
Estado requerido, sob pena de concesso de liberdade pessoa requerida.
Uma vez em liberdade, novo pedido de priso preventiva s ser aceito
por ocasio do encaminhamento de todos os documentos necessrios
anlise e deciso do pedido de extradio.
Acordos atuais preveem que a priso preventiva seja requerida por
meio da INTERPOL. Neste sentido, o Governo brasileiro vem buscando
incluir esta possibilidade em todos os Acordos em negociao, uma vez
que a tramitao do pedido de priso preventiva, via de regra, torna-se
mais clere e dificulta a fuga da pessoa procurada.
Sendo diferida a extradio, o Estado requerido comunicar a deciso
Autoridade Central, com urgncia, para que as autoridades brasileiras
retirem o extraditando do territrio estrangeiro no prazo previsto no
Acordo, ou na data estipulada pela legislao interna do pas requerido.
A entrega poder ser diferida se razes de sade assim recomendarem,
ou ainda, se o extraditando estiver sujeito a processo criminal, ou estiver
cumprindo pena por crime cometido no territrio do Estado requerido. No
caso de constar processo criminal em curso, poder o Estado requerido
entregar o extraditando independentemente do resultado deste, caso sua
legislao interna o permita.
Denegado o pedido de extradio, total ou parcialmente, os seus
fundamentos devero ser comunicados imediatamente ao Estado
requerente.
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Extradio: Conceitos e Princpios 25
Na hiptese de deferimento de pedido de extradio somente para
um dos processos a que responde o extraditando, e havendo notcia
sobre a existncia de outro(s), a Autoridade Central, em vista do Princpio
da Especialidade, solicita aos demais juzos que se manifestem quanto
ao interesse em formalizar pedido de extenso ou ampliao (tambm
conhecida como extradio supletiva ou complementar).
Processamento dos pedidos de extradio passiva:
O Governo brasileiro recebe o pedido de extradio, por meio do
Ministrio das Relaes Exteriores ou diretamente da Autoridade Central
do Estado requerente, conforme previsto na legislao vigente.
A Secretaria Nacional de Justia, por meio do Departamento de
Estrangeiros, realiza a anlise de admissibilidade ao amparo do respectivo
Acordo e da lei interna, e, uma vez devidamente instrudo, encaminha o
pedido ao Supremo Tribunal Federal, a quem compete a anlise de mrito,
conforme previsto no artigo 102, inciso I, alnea g da Constituio Federal.
Sobre pedido e deferimento de priso preventiva para fins de
extradio, segue-se a mesma regra em relao extradio ativa. Ou
seja, caso solicitada por via diplomtica, ou pela INTERPOL se previsto
em Acordo especfico, ser encaminhada, por intermdio do Ministrio
da Justia, ao Supremo Tribunal Federal. Decretada a priso preventiva
pela Egrgia Corte e efetivada a coao, o pas requerente ser notificado
a apresentar os documentos justificativos e formalizadores no prazo
previsto no respectivo Acordo ou na falta deste, no prazo de noventa dias,
contados da data do recebimento pelo Estado requerente da notificao
da efetivao da priso, conforme previsto na Lei n 6.815/80.
Independentemente de solicitao de priso preventiva para casos de
urgncia, dispe a legislao brasileira que no ter andamento o pedido
de extradio sem que o extraditando seja preso e colocado disposio
do Supremo Tribunal Federal11.
11 Supremo Tribunal Federal, HC 73.023, Relator Ministro Maurcio Correa, julgada em 30.11.1995: A
priso preventiva decretada pelo Ministro-Relator em sede extradicional tem por finalidade especfica submeter o
extraditando ao controle jurisdicional do Supremo Tribunal Federal at o julgamento final da extradio (art. 84,
pargrafo nico, da Lei n. 6.815/80). Concedida a extradio, a priso do extraditando tem por objetivo viabilizar a
sua remoo do territrio nacional pelo Estado-requerente (art. 86, da Lei n 6.815/80)
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Extradio: Conceitos e Princpios26Deferida a extradio pelo Supremo Tribunal Federal, e aps o
trnsito em julgado da deciso, a Autoridade Central brasileira poder
diferir a entrega na hiptese de o extraditando responder a processo-
crime perante a Justia brasileira ou estiver cumprindo pena, ou, ainda,
na ausncia de apresentao dos compromissos formais, se for o caso, do
que se tratar adiante.
Se no houver pendncias com a Justia brasileira, ou o Governo
brasileiro decidir discricionariamente sobre a entrega, independentemente
de processo-crime a que responda o extraditando no Brasil, com base no
artigo 67 da c/c 89 da Lei n 6.815/80, a Autoridade Central comunicar
ao pas requerente que a retirada do extraditando do territrio nacional
dever ser providenciada no prazo fixado no Acordo ou em sessenta
dias, conforme disposto no art. 86, da Lei n 6.815, de 1980, contados do
recebimento da notificao pelo Estado requerente. Caso no seja retirado
no prazo estipulado, o indivduo ser colocado em liberdade e o Brasil no
ser obrigado a det-lo novamente em razo do mesmo pedido.
Eventual deciso, total ou parcialmente denegatria pelo Supremo
Tribunal Federal, ser fundamentada e informada ao pas requerente da
extradio.
CONCORRNCIA DE PEDIDOS
Caso mais de um Estado solicite a extradio de uma mesma pessoa, a
preferncia ser analisada de acordo com o previsto no Acordo respectivo.
Caso no haja, a soluo ser dada na forma da legislao interna do
Estado requerido.
No caso do Brasil, no havendo previso em Acordo, ou na falta deste,
a anlise da concorrncia de pedidos de extradio passiva obedecer ao
que dispe o artigo 79, da Lei n 6.815, de 1980, in verbis:
Art. 79 - Quando mais de um Estado requerer a extradio da
mesma pessoa, pelo mesmo fato, ter preferncia o pedido
daquele em cujo territrio a infrao foi cometida.
1 - Tratando-se de crimes diversos tero preferncia,
sucessivamente:
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Extradio: Conceitos e Princpios 27
I o Estado requerente em cujo territrio haja sido cometido
o crime mais grave, segundo a lei brasileira;
II o que em primeiro lugar houver pedido a entrega do
extraditando, se a gravidade dos crimes for idntica; e
III o Estado de origem, ou, na sua falta, o domiciliar do
extraditando, se os pedidos forem simultneos.
2 - Nos casos no previstos decidir sobre a preferncia o
Governo brasileiro.
3 - Havendo tratado com algum dos Estados requerentes,
prevalecero suas normas no que disserem respeito
preferncia de que trata este artigo.
DOCUMENTOS JUSTIFICATIVOS E
FORMALIZADORES DO PEDIDO DE EXTRADIO
Os documentos necessrios instruo do pedido de extradio
podem variar conforme o Acordo ou, ainda, segundo a legislao interna
do pas requerido.
Os pedidos de extradio passiva tero sua legalidade analisada pelo
Supremo Tribunal Federal e, em regra, devem ser instrudos com:
- todos os dados que possibilitem a identificao do
indivduo procurado, a exemplo de fotografias e individuais
datiloscpicas, bem assim a indicao sobre sua possvel
localizao no Brasil;
- cpia autenticada ou certido da sentena condenatria
ou, no caso de extradio instrutria, cpia da sentena de
pronncia ou da deciso que decretou a priso preventiva,
proferida por autoridade competente, contendo indicaes
precisas sobre o local, data, natureza e circunstncias do fato
criminoso;
- cpia do mandado de priso expedido em desfavor do
nominado; e
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Extradio: Conceitos e Princpios28- cpia dos textos legais aplicveis ao crime, pena, e sua
prescrio.
Para pedidos de extradio ativa, solicita-se, alm dos tens acima
transcritos, pedido formal dirigido ao Excelentssimo Senhor Ministro
de Estado da Justia, juntamente com informaes eventualmente
disponveis, capazes de auxiliar as autoridades do Estado requerido na
localizao do extraditando, a exemplo do provvel endereo no exterior.
Nos casos de urgncia, poder ser formulado pedido de priso
preventiva contendo, no mnimo, cpia do mandado de priso,
acompanhada dos textos legais aplicveis ao crime, pena, e prescrio,
alm das informaes necessrias identificao do indivduo.
Na forma dos Acordos e da legislao interna, os documentos
encaminhados pela via diplomtica dispensam outras formalidades de
legalizao, sendo considerados autnticos para todos os fins. Eventual
permissiva em Acordo para o encaminhamento entre Autoridades Centrais
igualmente confere autenticidade aos documentos, dada a boa f reputada
aos agentes pblicos internacionais.
Salvo disposio diversa em Acordo, os documentos devem estar
sempre acompanhados da respectiva traduo para o idioma do pas
requerido.
INFORMAES E DILIGNCIAS COMPLEMENTARES
O Estado requerente poder, a qualquer tempo, solicitar informaes
acerca do andamento do processo de extradio no Estado requerido.
O Estado requerido poder solicitar diligncias adicionais ao
Estado requerente, fixando prazo para seu cumprimento, sob pena de
arquivamento, por entender no haver interesse na extradio.
A Autoridade Central brasileira transmitir ao Estado requerente,
sem demora, todas as comunicaes relativas ao processo de extradio,
tais como: decises; requerimento de diligncias; transferncia de
estabelecimento prisional do extraditando; e outras julgadas pertinentes.
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Extradio: Conceitos e Princpios 29
DENEGAO DA EXTRADIO
De acordo com o Artigo 77, do Estatuto do Estrangeiro, no ser
concedida extradio quando, in verbis:
I se tratar de brasileiro, salvo se a aquisio dessa
nacionalidade verificar-se aps o fato que motivar o pedido;
II - o fato que motivar o pedido no for considerado crime no
Brasil ou no Estado requerente;
III - o Brasil for competente, segundo suas leis, para julgar o
crime imputado ao extraditando;
IV - a lei brasileira impuser ao crime a pena de priso igual ou
inferior a 1 (um) ano;
V - o extraditando estiver respondendo a processo ou j
houver sido condenado ou absolvido no Estado requerido pelo
mesmo fato em que se fundar o pedido;
VI - estiver extinta a punibilidade pela prescrio segundo a lei
brasileira ou a do Estado requerente;
VII - o fato constituir crime poltico; e
VIII - o extraditando houver de responder, no Estado
requerente, perante Tribunal ou Juzo de exceo.
1 A exceo do item VII no impedir a extradio quando
o fato constituir, principalmente, infrao da lei penal comum,
ou quando o crime comum, conexo ao delito poltico, constituir
o fato principal.
2 Caber, exclusivamente, ao Supremo Tribunal Federal, a
apreciao do carter da infrao.
3 O Supremo Tribunal Federal poder deixar de considerar
crimes polticos os atentados contra Chefes de Estado ou
quaisquer autoridades, bem assim os atos de anarquismo,
terrorismo, sabotagem, sequestro de pessoa, ou que
importem propaganda de guerra ou de processos violentos
para subverter a ordem poltica ou social.
-
Extradio: Conceitos e Princpios30O inciso I supra, que prev a no extradio de brasileiro, salvo se
a aquisio dessa nacionalidade verificar-se aps o fato que motivar
o pedido, reportava-se Constituio de 1967, com redao dada pela
Emenda Constitucional de 1969, cujo artigo 153, 19, explicitava: No
ser concedida a extradio do estrangeiro por crime poltico ou de opinio,
nem, em caso algum, a de brasileiro. No entanto, em face da posterior
promulgao da Constituio de 1988, referido inciso deve ser tratado
luz do que prev o inciso LI, do art. 5 da CF/88, que explicita: nenhum
brasileiro ser extraditado, salvo o naturalizado, em caso de crime comum,
praticado antes da naturalizao, ou de comprovado envolvimento em
trfico ilcito de entorpecentes e drogas afins, na forma da lei.
Merece destaque a previso do inciso VII, do artigo 77, do Estatuto
do Estrangeiro suso transcrito, que veda a extradio quando presente
o carter poltico do fato pelo qual a pessoa reclamada. Todavia, na
forma do 1 do mesmo artigo, poder ser deferida a extradio, a juzo
do Supremo Tribunal Federal, quando o fato principal for tipificado como
crime comum pela lei penal, ou, ainda, quando se verificar conexo com
crime poltico, o principal seja comum.
Sobreleva esclarecer que a natureza poltica do crime deve ser
analisada de acordo com os aspectos fticos que envolvem o caso concreto.
Contudo, a lei ordinria permite que no sejam considerados como tal
aqueles descritos no 3 acima transcrito.
Outra hiptese de denegao da extradio pode ocorrer quando
poca do cometimento do crime a pessoa procurada era menor de dezoito
anos.
Diferentemente da medida compulsria de expulso, no ser causa
de indeferimento da extradio o fato de o estrangeiro ser genitor ou
cnjuge de brasileiro12.
12 Smula n 421 do Supremo Tribunal Federal: No impede a extradio a circunstncia de ser o
extraditando casado com brasileira ou ter filho brasileiro.
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Extradio: Conceitos e Princpios 31
ENTREGA DE EXTRADITANDO:REQUISITOS E PROCEDIMENTOS
Na hiptese de extradio passiva, cabe ao Departamento de
Estrangeiros, da Secretaria Nacional de Justia, do Ministrio da Justia, por
delegao de competncia, autorizar a entrega do extraditando ao Estado
requerido. Neste caso, a autorizao encaminhada ao Departamento de
Polcia Federal para efetivar a medida, na forma do artigo 110, do Decreto
n 86.715, de 1981, que lavrar o respectivo Termo e o remeter ao
Departamento de Estrangeiros, in verbis:
Art. 110 - Compete ao Departamento de Polcia Federal, por
determinao do Ministro da Justia:
I - efetivar a priso do extraditando;
II - proceder sua entrega ao Estado ao qual houver sido
concedida a extradio.
Pargrafo nico - Da entrega do extraditando ser lavrado termo,
com remessa de cpia ao Departamento Federal de Justia.
Para tanto, dever o pas requerente informar previamente os dados
pessoais das autoridades responsveis pela escolta e o roteiro de viagem.
Autorizada a entrega, o pas requerente ser notificado a providenciar
a retirada do extraditando do territrio do pas requerido no prazo fixado
em Acordo, ou, na ausncia deste, no prazo previsto na legislao interna
deste ltimo. No caso de extradio passiva, inexistindo Acordo especfico,
prev a lei brasileira o prazo de sessenta dias13.
Caso o Estado requerido no retire o extraditando no prazo fixado,
este ser posto em liberdade e ordinariamente o Estado requerido no
obrigado a det-lo novamente em razo do mesmo pedido14.
13 Lei n 6.815, de 1980, art. 86 Concedida a extradio, ser o fato comunicado atravs do Ministrio
das Relaes Exteriores Misso Diplomtica do Estado requerente que, no prazo de sessenta dias da comunicao,
dever retirar o extraditando do territrio nacional.
14 Lei n 6.815, de 1980, art. 87 Se o Estado requerente no retirar o extraditando do territrio nacional
no prazo do artigo anterior, ser ele posto em liberdade, sem prejuzo de responder a processo de expulso, se o
motivo da extradio o recomendar.
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Extradio: Conceitos e Princpios32O Brasil no poder entregar o extraditando ao Estado requerente15 sem
que este assuma os compromissos previstos no art. 91, da Lei n 6.815/80,
in verbis:
Art. 91. No ser efetivada a entrega sem que o Estado
requerente assuma o compromisso:
I - de no ser o extraditando preso nem processado por fatos
anteriores ao pedido;
II - de computar o tempo de priso que, no Brasil, foi imposta
por fora da extradio;
III - de comutar em pena privativa de liberdade a pena corporal
ou de morte, ressalvados, quanto ltima, os casos em que a
lei brasileira permitir a sua aplicao;
IV - de no ser o extraditando entregue, sem consentimento
do Brasil, a outro Estado que o reclame; e
V - de no considerar qualquer motivo poltico, para agravar
a pena.
O inciso I, do artigo suso transcrito, resulta do princpio da
especialidade. Conforme alhures referenciado, havendo outro fato
criminoso anterior extradio que no tenha sido includo no pedido,
dever o Estado requerido solicitar a extenso da extradio.
O inciso II refere-se detrao penal em relao ao tempo em que o
extraditando permaneceu preso no Estado requerido exclusivamente por
fora do pedido de extradio formulado pelo Estado requerente. Neste
15 Supremo Tribunal Federal, Ext 1.013, Relator Ministro Marco Aurlio, julgada em 1.03.2007: Extradio
Forma Compromisso do Estado requerente. Uma vez observada a forma estabelecida na Lei n 6.815/80, cumpre
o deferimento da extradio. Os compromissos previstos no artigo 91 desse diploma podem ser assumidos quando
da entrega do extraditando.
Supremo Tribunal Federal, Ext 1.069, Relator Ministro Gilmar Mendes, julgada em 09.08.2007: Diante da
possibilidade de aplicao de priso perptua pelo Estado requerente, o pedido de extradio deve ser deferido
sob condio de que o Estado requerente assuma, em carter formal, o compromisso de comutar a pena de priso
perptua em pena privativa de liberdade com o prazo mximo de 30 anos.
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Extradio: Conceitos e Princpios 33
caso, dever o pas requerido computar o tempo de priso em relao ao
tempo de pena que haver de cumprir naquele pas16.
O inciso III impe que no seja aplicada pena corporal, ou de morte,
se for o caso, substituindo-a por pena privativa de liberdade. Observe-se
que a pena corporal aqui tratada refere-se que atinja a integridade fsica
e a sade do preso, consubstanciada em sofrimento fsico. Isto porque o
ordenamento jurdico reprime as penas de morte, de carter perptuo, de
trabalhos forados, de banimento e cruis, conforme dispe o inciso XLVII,
do artigo 5, da Constituio Federal, pelo que no se entregam pessoas
por meio da extradio a pases que possam aplic-las.
Assim, o Estado requerido deve comprometer-se a comut-las em
uma pena privativa de liberdade, cuja execuo no seja superior ao
mximo permitido no Brasil, atualmente, trinta anos.
No h interferncia do Estado requerido no poder jurisdicional
soberano do Estado requerente, uma vez que o extraditando pode ser
condenado pena prevista na legislao estrangeira, mas a execuo
dessa pena estar condicionada s condies previstas na legislao do
Estado requerido.
A exigncia do inciso IV reporta-se vedao da reextradio, que
consiste em entregar um extraditando a um terceiro pas que o reclame por
fato ocorrido antes da extradio sem o consentimento do pas inicialmente
requerido. Eventual pedido de reextradio ser analisado como incidente
do primeiro processo e sujeita-se a todos os procedimentos e requisitos
para a concesso de uma extradio17.
16 Supremo Tribunal Federal, Ext 495, Relator Ministro Paulo Brossard, julgada em 19.12.1990: Consigno,
por fim, que a pena que o extraditando est cumprindo no Brasil por trfico de entorpecentes, no poder ser
computada como tempo de priso imposto por fora da extradio, pois se cuida de espcies distintas, no se
aplicando o que dispe o art. 91, II, da Lei n 6.815/80.
17 Supremo Tribunal Federal, Pet. 2562 QO, Relator Ministro Nelson Jobim, julgada em 11.02.2002:
Extradio. Questo de Ordem que se resolve no sentido de receber a petio como reextradio e no como
pedido de extenso da extradio. Consentimento do Brasil e a interveno do STF. A deliberao de consentir com a
extradio a outro Estado que a reclame sujeita-se ao controle judicial deste Tribunal (Lei n 6.815/80, art. 91, inc. IV).
Procedimento. Na verdade, a reextradio uma nova extradio. Por isso, tem incidncia o procedimento ordinrio,
no que lhe for aplicvel.
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Extradio: Conceitos e Princpios34Por fim, o compromisso previsto no inciso V deriva da vedao de
extraditar por crime poltico, no sendo permitido, tambm, agravar a
pena por motivao de igual natureza. Cuida-se de medida de cautela que
objetiva resguardar direitos, caso no se tenha presente o carter poltico
da infrao, mas que, aps a entrega, seja o extraditado submetido no
pas requerente a constrangimento superior e incompatvel com o crime
que autorizou a medida em razo da ocorrncia de dita natureza. Referida
precauo justifica-se sob o ngulo da nova ordem mundial, onde no se
admite punio de conduta praticada com o pretexto de contribuir para a
evoluo da sociedade.
A apresentao formal dos compromissos pode ser dispensada
quando a extradio fundada em Acordo vigente em que as previses j
se encontrem expressas, pois entende-se que, com a ratificao deste, os
pases envolvidos j se comprometeram com todos os seus termos.
O Estado requerido arcar com as despesas ocasionadas em seu
territrio desde a priso do extraditando at o momento da entrega. As
despesas decorrentes do traslado aps a entrega sero suportadas pelo
Estado requerente.
No momento da entrega, documentos, valores e bens que se
encontrem no Estado requerido, e que sejam produto do crime ou que
possam servir de prova, sero igualmente entregues ao Estado requerente,
de acordo com a legislao do Estado requerido e respeitados os direitos
de terceiros, ainda que haja morte ou fuga do extraditando.
Se, aps a entrega, o extraditando evadir-se do territrio da Parte
requerente e retornar ao Estado requerido, ser detido mediante simples
requisio feita por via diplomtica, e novamente entregue, sem outras
formalidades, na forma do Acordo especfico ou do artigo 93, da Lei n
6.815, de 1980, no caso de extradio passiva.
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Extradio: Conceitos e Princpios 35
EXTRADITANDO QUE RESPONDE A PROCESSO PENAL
PERANTE A JUSTIA BRASILEIRA
O artigo 89, da Lei 6.815/80, prev que: quando o extraditando
estiver sendo processado, ou tiver sido condenado, no Brasil, por crime
punvel com pena privativa de liberdade, a extradio ser executada
somente depois da concluso do processo ou do cumprimento da pena,
ressalvado, entretanto, o disposto no artigo 67.
Por sua vez, o art. 67, do mesmo Estatuto, dispe que: desde que
conveniente ao interesse nacional, a expulso do estrangeiro poder
efetivar-se, ainda que haja processo ou tenha ocorrido condenao.
Sendo assim, o Ministrio da Justia poder, excepcionalmente,
entregar o estrangeiro ao pas requerente independentemente do
processo em curso ou do cumprimento da pena j imposta, seja por
motivos humanitrios, como no caso de doena em estgio terminal, seja
porque o crime cometido no exterior de maior gravidade.
Um exemplo de crime de menor gravidade no Brasil em relao ao
objeto da extradio verificado quando a pessoa procurada faz uso de
documento falso para ocultar sua verdadeira identidade visando no
responder a processo ou cumprir pena no exterior por trfico de drogas
ou homicdio.
A entrega imediata do extraditando tambm poder ser autorizada
pelo Ministrio da Justia quando o Poder Judicirio brasileiro conceder
a progresso de pena para o regime semi-aberto ou aberto, ou quando
beneficiar o condenado com livramento condicional, hiptese em que
se verifica oportuna a efetivao da entrega ante a impossibilidade de o
condenado efetivamente beneficiar-se da medida, notadamente porque o
instituto da progresso de regime tem como finalidade a reinsero social, o
que falece na espcie, haja vista no ser esta a sociedade de que faz parte.
Extinta a pena a que o extraditando foi condenado no Brasil, ou
verificadas as circunstncias recomendveis acima citadas, poder ser
-
Extradio: Conceitos e Princpios36submetido simultaneamente extradio e expulso, impedindo, assim,
o retorno do mesmo ao Brasil, uma vez que o reingresso de estrangeiro
expulso constitui crime previsto no artigo 338, do Cdigo Penal18.
EXTRADIO VOLUNTRIA
A extradio voluntria encontra-se prevista em Acordos mais
modernos negociados pelo Brasil, a exemplo do Acordo de Extradio
entre os Estados Parte do Mercosul, que consiste em autorizar o
extraditando, com a devida assistncia jurdica, e perante a autoridade
judicial competente, a manifestar-se expressamente pela anuncia em
ser entregue ao Estado requerente, ocasio em que ser informado sobre
seu direito a um procedimento formal de extradio e da proteo que tal
direito encerra, sem prejuzo ao controle de legalidade pela autoridade
competente, conforme jurisprudncia do Supremo Tribunal Federal19.
A modalidade voluntria reduz a durao mdia dos processos de
extradio, alm do que no h a necessidade de publicao do Acrdo
que deferiu a extradio, ou de decurso de prazo para interposio de
embargos declaratrios, sendo a pessoa imediatamente colocada
disposio do Estado requerente.
O Projeto de Lei (PL) n 5.655/2009, que substituir o atual Estatuto
do Estrangeiro, e encontra-se em trmite no Congresso Nacional, prev
diversas inovaes, entre as quais o expresso reconhecimento do instituto
da extradio voluntria. De acordo com o projeto, continuar havendo
a necessidade de apreciao pelo Supremo Tribunal Federal quanto ao
consentimento expresso do extraditando. Entretanto, no haver mais
18 Cdigo Penal, artigo 338 Reingressar no territrio nacional o estrangeiro que dele foi expulso: Pena -
recluso, de um a quatro anos, sem prejuzo de nova expulso aps o cumprimento da pena.
19 Supremo Tribunal Federal, Ext 789, Relator Ministro Maurcio Corra, julgada em 18.10.2000:
Consoante orientao desta Corte, a concordncia do extraditando com sua extradio no dispensa o exame de
legalidade do pedido. Precedente.
Supremo Tribunal Federal, Ext 805, Relator Ministro Maurcio Corra, julgada em 18.04.2001: Satisfeitos os
requisitos da Lei n 6.815/80, de ser deferido o pedido de extradio, independentemente da concordncia, ou no,
do extraditando. Precedentes. Cumprimento de pena no Brasil por delito diverso do praticado no Estado requerente.
Circunstncia que no obsta o deferimento da extradio. Precedentes.
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Extradio: Conceitos e Princpios 37
necessidade de um processo formal de extradio, o que implicar sua
entrega ao Estado requerente em um prazo consideravelmente reduzido.
Cabe salientar, entretanto, que a autorizao da extradio voluntria
ser relativa, ou seja, no ser efetivada a entrega, na hiptese, por
exemplo, de o extraditando responder a processo ou estiver cumprindo
pena por crime praticado no Brasil.
EXTRADIO TEMPORRIA
Acordos em vigor, a exemplo dos bilaterais com a Austrlia, Frana,
Itlia e Portugal, preveem a concesso de extradio temporria, ou seja, a
extradio em que o Estado requerente assume o compromisso de devolver
a pessoa reclamada aps a realizao de determinado ato processual.
Ordinariamente, ocorre quando o extraditando responde a processo
tanto no pas requerido como no requerente, mas neste segundo
necessria a sua presena para ser submetido a procedimento urgente e
imprescindvel instruo do processo em curso no Estado requerente.
Sendo autorizada a extradio, mas postergada a entrega at a
finalizao do processo a que responde, ou ao cumprimento da pena imposta
no Brasil, poder a pessoa reclamada ser entregue temporariamente, na
forma acordada entre as Partes, e devolvida to-logo sejam finalizados os
atos processuais respectivos no Estado requerente.
Com a extradio temporria, o extraditando dever permanecer
preso no Estado requerente, e o perodo ser computado no pas requerido
para fins de cumprimento do restante da pena.
EXTRADIO SIMPLIFICADA
O Acordo sobre Extradio Simplificada foi assinado pelo Brasil,
Argentina, Espanha e Portugal, em 03.11.2010, na cidade de Santiago de
Compostela, Espanha, e encontra-se, no Brasil, pendente de aprovao
legislativa para posterior ratificao.
O texto consensuado por tcnicos dos quatro pases busca agilizao
-
Extradio: Conceitos e Princpios38do procedimento de extradio, reduzindo as dificuldades e simplificando
as regras que regem o seu funcionamento.
Entre as diferenas comparativamente aos atuais Acordos, destaca-se a
criao de modelo de requerimento para fins de extradio, uniformizando
as solicitaes e facilitando a compreenso do pretendido, alm de evitar
eventual inadequao dos pedidos e a necessidade de reestruturao ou
esclarecimento destes.
Os pedidos de priso preventiva para extradio podero ser
transmitidos entre as Autoridades Centrais por qualquer meio eletrnico,
o que torna o procedimento mais gil.
Consta do referido Acordo, ainda, a hiptese de consentimento do
extraditando em ser extraditado, o que resulta em diminuio do lapso
temporal verificado no modelo tradicional de extradio, sem, no entanto,
verificar-se prejuzo proteo aos direitos humanos, porque deve ser
voluntrio em sua essncia.
Outra situao que se amolda realidade ftica hoje vivenciada pelos
Estados, a possibilidade de extradio temporria, e a reduo para 30
dias para retirada do extraditando, aps autorizao do pas requerido,
podendo o prazo ser prorrogado uma nica vez, por mais quinze dias.
Objetivando esclarecer a interpretao de trs artigos do texto
final acordado, o Governo brasileiro apresentou uma Declarao
Interpretativa, relativamente aos artigos que tratam do consentimento
da pessoa procurada em ser entregue, prazos e entrega temporria, cujo
inteiro teor encontra-se ao final do Acordo, que pode ser encontrado neste
Manual (pginas 737 745).
MANDADO MERCOSUL DE CAPTURA
O Acordo sobre Mandado Mercosul de Captura e Procedimentos de
Entrega entre os Estados Parte do Mercosul e Estados Associados (MMC),
exsurgiu de proposta do ento Excelentssimo Senhor Ministro da Justia
do Brasil, Luiz Paulo Barreto, e foi aprovado pela Deciso no 48/10, do
Conselho do Mercado Comum do Sul, em dezembro de 2010.
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Extradio: Conceitos e Princpios 39
Sua criao parte do pressuposto da necessidade de um instrumento
penal comum no Bloco que proporcione uma cooperao mais intensa entre
os agentes responsveis pelo combate ao crime organizado transnacional.
Visa, ainda, ao enfrentamento impunidade e celeridade no trmite dos
instrumentos de cooperao jurdica internacional no mbito do Mercosul,
de modo a reduzir o gasto pblico, bem assim proporcionar mais certeza e
segurana no cumprimento das decises judiciais.
A partir do referido instrumento, confere-se legitimidade e assegura-
se o cumprimento, de forma mais clere em qualquer Estado Parte ou
Associado do Mercosul, de ordem de deteno emanada de autoridade
judiciria competente de qualquer uma das Partes.
O resultado um instrumento capaz de evitar a impunidade de forma
efetiva e eficaz sem perder de vista, contudo, valores nsitos dignidade da
pessoa, permitindo a captura e posterior entrega de pessoas procuradas
pela Justia de qualquer dos Estados Parte do Mercosul que se encontrem
no territrio de outro.
Isto porque se almeja na Regio uma maior integrao entre os
pases; porm, as facilidades migratrias proporcionadas aos cidados do
Bloco so as mesmas utilizadas pelos criminosos que buscam impunidade
e acabam por convulsionar os procedimentos de captura e inviabilizar o
exerccio da jurisdio.
O MMC foi inspirado no Mandado de Deteno Europeu, que
representa na Unio Europia importante ferramenta de combate ao
crime transnacional, desburocratizando os procedimentos de extradio,
ao permitir a devoluo imediata jurisdio do Estado requerente da
pessoa procurada.
Comparativamente ao instituto da extradio, podem ser destacados
avanos significativos desse instrumento de cooperao jurdica, tais como:
- a desburocratizao das comunicaes entre os Estados
Parte;
- a possibilidade de pedido direto e imediato de priso;
-
Extradio: Conceitos e Princpios40- a simplificao da documentao exigida;
- decises do Estado de emisso e do Estado de execuo
limitadas esfera judiciria;
- dispensa de outra deciso de carter poltico;
- estabelecimento de orientaes que simplificam a tomada
das decises judiciais;
- entre outros, simplifica a entrega de provas ao Estado Parte.
O texto assinado pelos Ministros da Justia encontra-se, no Brasil,
pendente de encaminhamento aprovao legislativa, e pode ser encontrado
neste Manual (pginas 746 770 ).
REFGIO E EXTRADIO
Consoante o disposto no art. 33, da Lei n 9.474/97 Lei do Refgio
o reconhecimento da condio de refugiado obstar o seguimento de
qualquer pedido de extradio baseado nos fatos que fundamentaram a
concesso do refgio (destacado).
Do artigo suso, abstrai-se que, se houver um pedido de refgio
com base nos mesmos fatos que serviram de fundamento para um
pedido de extradio, esta ser obstada at a deciso final do pedido
de refgio, que, em sendo reconhecida a condio de refugiado, restar
prejudicado o processo daquele, mas no implicar necessariamente seu
indeferimento.
Em julgado do STF, nos autos da extradio n 493, decidiu-se que: De
acordo com o art. 33, da L. 9474/97, o reconhecimento administrativo da
condio de refugiado, enquanto dure, elisivo, por definio, da extradio
que tenha implicaes com os motivos do seu deferimento. Resultado do
julgamento: Pedido de extradio no conhecido, extinto o processo, sem
julgamento do mrito e determinada a soltura do extraditando.
No mesmo sentido, a extradio n 1170, teve como deciso: O
Tribunal, por unanimidade e nos termos do voto da Relatora, declarou
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Extradio: Conceitos e Princpios 41
extinto o processo sem resoluo de mrito e determinou a imediata
expedio de alvar de soltura do extraditando, se por outro motivo no
estiver preso.
Uma vez extinto um processo de extradio, sem julgamento de
mrito, no h falar em coisa julgada, sendo, portanto, passvel de nova
anlise, consoante o disposto no art. 268, do Cdigo de Processo Civil,
nesse sentido, in verbis:
Art. 268. Salvo o disposto no art. 267, V, a extino do
processo no obsta a que o autor intente de novo a ao.
A petio inicial, todavia, no ser despachada sem a prova
do pagamento ou do depsito das custas e dos honorrios de
advogado. (destacado)
Na Lei de Refgio, os artigos 38 e 39 tratam, respectivamente, das
hipteses de cessao e perda da condio de refugiado, e explicitam:
Art. 38. Cessar a condio de refugiado nas hipteses em
que o estrangeiro:
I - voltar a valer-se da proteo do pas de que nacional;
II - recuperar voluntariamente a nacionalidade outrora
perdida;
III - adquirir nova nacionalidade e gozar da proteo do pas
cuja nacionalidade adquiriu;
IV - estabelecer-se novamente, de maneira voluntria, no pas
que abandonou ou fora do qual permaneceu por medo de ser
perseguido;
V - no puder mais continuar a recusar a proteo do pas de
que nacional por terem deixado de existir as circunstncias
em consequncia das quais foi reconhecido como refugiado;
VI - sendo aptrida, estiver em condies de voltar ao pas
no qual tinha sua residncia habitual, uma vez que tenham
deixado de existir as circunstncias em consequncia das
quais foi reconhecido como refugiado.
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Extradio: Conceitos e Princpios42Art. 39. Implicar perda da condio de refugiado:
I - a renncia;
II - a prova da falsidade dos fundamentos invocados para o
reconhecimento da condio de refugiado ou a existncia de
fatos que, se fossem conhecidos quando do reconhecimento,
teriam ensejado uma deciso negativa;
III - o exerccio de atividades contrrias segurana nacional
ou ordem pblica;
IV - a sada do territrio nacional sem prvia autorizao do
Governo brasileiro.
Pargrafo nico. Os refugiados que perderem essa condio
com fundamento nos incisos I e IV deste artigo sero
enquadrados no regime geral de permanncia de estrangeiros
no territrio nacional, e os que a perderem com fundamento
nos incisos II e III estaro sujeitos s medidas compulsrias
previstas na Lei n 6.815, de 19 de agosto de 1980.
Nos termos do art. 40, da mesma Lei, a competncia para decidir
em primeira instncia sobre a cessao ou perda do refgio do Comit
Nacional para os Refugiados (Conare) e, em segunda instncia, do Ministro
de Estado da Justia.
EXTRADIO DE BRASILEIROS
O inciso LI, do artigo 5o, da Constituio Federal, prev que nenhum
brasileiro ser extraditado, salvo o naturalizado, em caso de crime comum,
praticado antes da naturalizao, ou de comprovado envolvimento em
trfico ilcito de entorpecentes e drogas afins, na forma da lei.
Nesse contexto, somente ser admitida a extradio instrutria
ou executria de brasileiros naturalizados envolvidos com o trfico de
substncias entorpecentes, ou por qualquer crime tipificado no Brasil e no
pas requerente, desde que este fato tenha ocorrido antes da concesso
da nacionalidade brasileira.
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Extradio: Conceitos e Princpios 43
H que ressaltar que a inadmissibilidade da extradio de brasileiros
no significa, em tese, a impunidade, uma vez que o pas requerente
poder solicitar que o Brasil proceda com a persecuo crimin