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  • 7/26/2019 Jornalismo imersivo: Exploraes e caminhos para apropriaes do acontecimento jornalstico a partir de experin

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    Intercom Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da ComunicaoXVII Congresso de Cincias da Comunicao na Regio Sul Curitiba - PR 26 a 28/05/2016

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    Jornalismo imersivo: Exploraes e caminhos para apropriaes do acontecimento

    jornalstico a partir de experincias com dispositivos de realidade virtual1.

    Giovanni Guizzo da Rocha2;Pontifcia Universidade Catlica do Rio Grande do Sul (PUCRS)

    Resumo

    Este artigo apresenta os movimentos iniciais da pesquisa para a tese de doutorado do autor.Sua problemtica parte da constatao das diversas crises que desafiam o jornalismo e danecessidade dos jornalistas buscarem novos modos narrativos para suas reportagens. Seuenfoque est localizado na emergncia de produtos digitais e identifica no chamadojornalismo imersivo, linguagem hbrida que rene elementos do jogo digital,entretenimento e reportagem, um caminho a ser explorado. Como resultado dessas

    exploraes iniciais, identifica caminhos a partir dos recursos prprios dos jogos digitais eapresenta alguns conceitos formadores para a essa nova narrativa, como o sistema de fluxoe imerso em ambientes virtuais simulador pelo computador.

    Palavras-chave

    Comunicao; Jornalismo; Imerso, Realidade Virtual; Jogo Digital

    Reinventar o jornalismo

    "O jornalismo tem um futuro enorme, mas preciso reinvent-lo. Esse o desafio

    para os jovens jornalistas". Foi com essa frase que Juan Luis Cebrin, fundador e primeiro

    diretor do jornal espanhol El Pas, encerrou sua fala aps ser homenageado pelo Instituto

    Tecnolgico de Estudos Superiores de Monterrey, no Mxico, em outubro de 2014. Falando

    para estudantes de jornalismo, Cebrin afirmou que a imprensa escrita est fadada a

    desaparecer, e que o desafio est em transportar a qualidade do papel para a rede. "A

    liderana e os mestres vo continuar existindo no mundo digital, mas no precisam ser os

    mesmos", disse3. A fala de Cebrin mais uma das inmeras advertncias s quais o

    jornalismo e os jornalistas acompanham desde que as notcias deixaram de ser uma

    exclusividade dos profissionais da imprensa. A velocidade das transmisses das redes de

    computadores aliada voracidade por informaes exige do jornalismo uma constante

    atualizao.

    1Trabalho apresentado no DT 1 Jornalismo do XVII Congresso de Cincias da Comunicao na Regio Sul realizado de 26 a 28 de

    maio de 2016.2Jornalista, doutorando do Programa de Ps-Graduao em Comunicao Social (Famecos). E-mail: [email protected]: O jornalismo tem futuro, mas preciso reinvent-lo. Jornal El Pas. 10 out. 2014 Disponvel em .Acesso em: 20 abr. 2016.

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    O jornalismo na era do Homo ludens

    Em seu livro O Pianista no Bordel, uma coleo de ensaios sobre a profisso

    jornalstica e seus desafios, Cebrin diagnostica que a sociedade digital est influenciando

    poderosamente o jornalismo e todas as suas manifestaes (2009, p. 42). Entre as grandes edefinitivas transformaes do jornalismo, estaria a adoo, irreversvel, da mistura de

    informao e entretenimento em razo dos novos comportamentos da audincia

    contempornea.

    Mistura que consequncia no s da predominncia da imagem no mundo dainformao, mas tambm da convergncia empresarial dos meios de comunicao coma consequente tendncia a fundir o Homo sapiens com o Homo videns em sua nova, eainda pouco analisada, condio de Homo ludens. (CEBRIN, 2009, p. 78).

    O Homo ludens ao qual Cebrin se refere um conceito elaborado por Johan

    Huizinga descrito em uma obra pioneira nos estudos relacionados aos jogos e suas

    implicaes na cultura. Para Huizinga, o ludens seria uma terceira funo para a raa

    humana, uma denominao para alm do homem que raciocina (sapiens); ou daquele que

    cria tecnologias (faber), mas aquele homem que joga (ludens). Em Homo Ludens, escrito na

    dcada de 1950, Huizinga discute o ato de jogar como uma ao no apenas para o

    entretenimento, mas algo formador da cultura humana. Para Huizinga (2001), jogarpressupe posies essenciais: 1) O jogo obrigatoriamente uma atividade espontnea (p.3)

    e aceitar e participar do jogo de forma espontnea definir a verdadeira experincia ldica;

    2) O jogo desinteressado e no pertencente vida comum. Ele ocorre em intervalos em

    que as delimitaes da vida normal perdem sentido e devemos atuar conforme as regras do

    jogo (p. 15); 3) Desse modo, fundamental a determinao de tempo, por qual o perodo

    ser permitido desfrutar da fantasia, e a determinao de espaos exclusivos para as

    atividades do jogo, seja ele uma mesa, um tabuleiro, um campo de futebol ou uma tela paraos videogames (p.13); 4) Jogos devem criar elementos de tenso em que os jogadores

    busquem resultados a partir de esforos, sejam eles mentais ou fsicos, e 5) Todo jogo

    possui significado para quem o joga (p.16).

    Retomando a reflexo de Cebran sobre as questes que envolvem o entretenimento,

    o autor se ampara na frase do escritor ingls G.K. Chesterton: divertido no o contrrio

    de srio. Divertido o contrrio de enfadonho e nada mais e considera ser

    responsabilidade dos jornalistas saber combinar reflexo com diverso, a denncia com o

    diletantismo e o prazer com responsabilidade. O autor finaliza O entretenimento engloba

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    todos os aspectos de nossas vidas nessa vitria permanente do Homo ludens sobre seus

    competidores (CEBRIN, 2009, p. 94).

    Eu seu livro Hamlet no Holodeck (2003), Janet Murray apresenta os desafios das

    mdias tradicionais, como a literatura, o cinema e a televiso a partir do surgimento de noapenas novos meios de comunicao digital, mas de uma sociedade digital. Entre as vrias

    questes que esse tema carrega, Murray problematiza sobre o formato da narrativa nessas

    mdias. O que esperar de uma mdia to interativa quanto imersiva e, de acordo com a

    autora, como se adaptar para uma mdia procedimental, participativa, espacial e

    enciclopdica?

    O holodeck, termo que nomeia o livro, tem origem em um episdio do seriado de

    fico cientfica Jornada nas Estrelas exibido pela primeira vez em 1987. Esse equipamentosimula acontecimentos por meio de realidade virtual projetadas em uma sala escura. Seu

    usurio participa de aes e se relaciona com pessoas e ambientes que existem apenas de

    forma hologrfica de um mundo ilusrio. Ao final da seo, uma ordem verbal encerra a

    aplicao e a sala volta a se transformar em um espao escuro e vazio. Nas prprias

    palavras de Murray, O holodeck um meio de entretenimento apropriado para os

    afortunados cidados de tal mundo; uma tecnologia utpica aplicada ancestral arte de

    contar histrias (MURRAY, 2003, p. 30). Certamente a tecnologia descrita est longe de

    ser algo constitudo de forma igual ao narrado por Murray, porm algumas construes

    narrativas a partir do uso de computadores esto prximas de apresentar os resultados do

    holodecka partir do princpio de navegao que a autora defende.

    A qualidade espacial do computador criada pelo processo interativo da navegao.Sabemos estar numa determinada situao porque, quando acionamos uma tecla ou omouse, o que a tela exibe (texto ou grfico) alterado conforme nossa ordem. () Omundo tridimensional e contnuo das paisagens imaginrias nos novos videogames

    todos sos percebidos pelo usurio atravs do processo de navegao, que exclusivodo ambiente digital (MURRAY, 2003, p. 30.).

    Esse princpio de navegao descrito por Murray poderia ser tambm de

    interatividade, agncia e outros termos usados pela autora na obra. De forma objetiva, o que

    Murray nos prope observar as novas mdias digitais no apenas pelos recursos de

    instantaneidade, mas de participao plena na narrativa, buscando nas possibilidades dos

    videogames para experimentar novos modos de relatar histrias. Para Murray (2003, p. 10),

    Histrias contadas em formatos participativos nos envolvem de uma maneira diferente

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    daquelas s quais assistimos ou ouvimos. No ficamos apenas observando as batidas e os

    roubos de carros no jogo GTA4, ns os cometemos.

    A exploso dos videogames

    Os videogames tiveram sua origem em 1962 nos laboratrios do Massachusetts

    Institute of Technology (MIT), nos Estados Unidos. Novos computadores tinham como

    objetivo ajudar cientistas com assuntos estratgicos durante a guerra fria, principalmente a

    corrida espacial travada entre norte-americanos e soviticos. Mas aps um ano de

    pesquisas, o destaque era para cdigos que deram origem ao primeiro jogo de videogame e

    trouxe um nome sugestivo para poca: Spacewar!5(HERZ, 1997, p. 5).

    Passados mais de 50 anos desde o seu surgimento e atravessando crises de ordemfinanceira e tica que quase acabaram com a indstria, os videogames representam

    atualmente a mais lucrativa indstria do entretenimento, superando de forma expressiva o

    cinema e a msica (POOLE, 2004, p. 20). Nenhum outro setor do entretenimento teve o

    mesmo crescimento como a indstria dos computadores e videogames. Em um perodo de

    10 anos, de 1994 a 2004, o console Playstation da Sony atingiu a penetrao que o telefone

    demorou 30 para conseguir. (CHAPLIN, 2006, p.12). Em 2011, a indstria de jogos, ento

    avaliada em 60 bilhes de dlares, j era maior que todas as vendas de msica e bilheterias

    no cinema juntas. (KUSHNER, 2014, p. 18). No Brasil, a venda de consoles atingiu R$ 1

    bilho em 2012. O Brasil tem 3,1 milhes de videogames de ltima gerao6, mas o lder

    durante a realizao da pesquisa ainda era o Playstation 2, lanado em 2000. No Brasil,

    23% de sua populao so jogadores assduos. Isso representa 45,2 milhes de pessoas.

    Muitos desses nmeros se devem aos jogos em celulares e tablets, aparelhos que

    aumentaram suas vendas em 200% ao longo dos ltimos quatro anos da pesquisa. Esse

    crescimento de jogos online dever atingir em 2016 um volume global de US$ 46 bilhes7.

    O crescimento da indstria de jogos domina o espao do consumo e por vezes

    supera faturamentos de ttulos consagrados do cinema. Lanado em setembro de 2015, o

    4Sigla para Grand Theft Auto. Uma das mais famosas e polmicas franquias de jogos de videogames. Lanado em 2013, oquinto captulo da srie custou US$ 255 milhes para ser lanado e arrecadou US$ 1 bilho em vendas em apenas trs diasaps o seu lanamento.5Existem divergncias sobre qual foi o primeiro jogo de videogame. Em 1958, William Higinbotham desenvolveu Tennisfor Two, experimento que simulava a precria ideia de uma partida de tnis entre dois operadores a partir de umosciloscpio, utilizado para mensurar tenses eltricas. As linhas de tempo da histria dos videogames de Herz, (1997) eWolf (2008) no consideram Tennis for Twocomo um jogo de videogame. Uma provvel justificativa para isso esteja nano utilizao de recursos grficos, j que Spacewar! operava a partir de grficos vetoriais, e de que Spacewar!pudesseser copiado e compartilhado com outros computadores (WOLF, 2008, p. 67).6Na poca de realizao da pesquisa, eram considerados consoles de ltima gerao os modelos Playstation 3 e Xbox 360.Com o lanamento das novas plataformas, PS4 e Xbox One, no final de 2013, esses dados necessitam de atualizao.7Pesquisa A indstria de games no Brasil e no mundo. Disponvel em Acesso em: 20 abr. 2016.

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    quinto episdio da franquia de jogos de espionagemMetal Gear, lucrou US$ 179 milhes

    no dia do seu lanamento, enquanto o filme da Marvel Comics, Vingadores 2 - Era de

    Ultron arrecadou US$ 84 milhes8 em sua estreia. Em pases como o Reino Unido, a

    indstria dos jogos digitais j reconhecida como um importante motor econmico comdemanda de anlises aprofundadas sobre esse mercado9.

    Algumas estatsticas de tempo dedicados pelos usurios aos jogos permitem

    compreender um pouco da exploso da indstria dos games na atualidade. No perodo de

    outubro a dezembro de 2013 o jogo de guerra Battlefield 4teve mais de 8 milhes de horas

    de voo realizadas pelos jogadores. Isso representaria o tempo necessrio para se obter 90

    mil licenas de voo. O game decorridaReal Racing 3, no mesmo perodo, teve 1,4 bilho de

    corridas realizadas e o pico das disputas foi no dia do Natal. No gamePlants Vs. Zombies 2,foram plantadas 53,4 bilhes de mudas. Se transportadas para a vida real, esse nmero

    seria equivalente ao espao de quase quatro cidades do tamanho de Nova Iorque10.

    Games e aprendizado

    As qualidades do videogame enquanto elemento utilizado para o estudo so

    debatidas no campo dos educadores. De um lado, professores que consideram negativo o

    uso de narrativas que envolvem fico misturadas a momentos histricos em razo de uma

    provvel confuso dos usurios. De outro lado, entusiastas dos sistemas digitais que

    consideram os games uma via para aproximar estudantes que no conseguem assimilar o

    tradicional mtodo de ensino.

    A franquia chamadaAssassins Creed, baseada em uma irmandade milenar criada a

    partir de fatos reais e ficcionais, serve de exemplo como os games podem participar no

    aprendizado dos jogadores. O jogo conta com cerca de seis episdios e em cada um deles o

    jogador controla um membro da irmandade em perodos diferentes da histria, passando

    pelas Cruzadas, o Renascimento, a guerra civil americana, alm de ttulos que envolvem a

    escravido nas amricas e a Revoluo Francesa. Em todos os ttulos, o personagem

    controlvel tem participao fundamental nos fatos e por vezes precisar da ajuda ou ter de

    enfrentar personagens histricos, como Leonardo Da Vinci, Nicolau Maquiavel, George

    Washington, entre outros.

    8Metal Gear Solid Vs opening day was twice as good as Avengers: Age of Ultrons. Site Venture Beat. Disponvel em

    . Acesso em: 20 abr. 2015.9UK Video Games Fact Sheet. Disponvel em . Acesso em: 20 abr. 2016.10Dados da pesquisa Gaming and Numbers. Disponvel em . Acesso em :20 abr. 2016.

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    No caso de Assassins Creed, alguns pesquisadores consideram que os videogames

    podem ser uma ferramenta que no eduque para a verdade do fato, mas para que os

    estudantes se perguntem sobre as verdades universais da histria. o caso do pesquisador

    Nicolas Trepnier, professor de histria da Universidade do Mississipi, que considerabenfico um game como Assassins Creed aliado ao estudo por permitir a quem joga se

    aprofundar nos temas tratados.

    (...) os jogos histricos so recheados de imprecises. Mas, mais que uma limitao,elas podem servir como um pretexto para discusso. Por exemplo, que fatores, alm dapura ignorncia, poderia ter gerado essas imprecises? Como as variadas influnciasculturais de hoje, como o cinema, moldam o jeito com que a histria apresentada?(TRPANIE, 2014).

    Ainda entre os que detectam benefcios ligados atividade de jogar videogame,

    algumas pesquisas apontam que os idosos tm sua atividade cerebral estimulada a partir da

    incluso da rotina de jogar videogames. Por meio do uso de sensores de movimentos, hoje

    cada vez mais comuns em plataformas como Xbox, Playstation e Wii, esses equipamentos

    estimulam as capacidades motoras e cognitivas dos jogadores e no requerem a necessidade

    do uso de joysticks. Os movimentos dos personagens obedecem aos comandos corporais

    traduzidos pelos sensores. Segundo os resultados, as atividades aumentam o fluxo

    sanguneo em regies do crebro ligadas tomada de deciso, ao controle motor e

    ateno, sentidos que diminuem com o envelhecimento. reas ligadas memria e

    aprendizagem tambm foram favorecidas a partir das pesquisas com o uso de videogames11.

    O sistema de fluxo

    Considerada uma das principais obras sobre como os jogos podem auxiliar nossas

    vidas, A realidade em jogo, de Jane McGonigal, aborda os motivos que fazem com que a

    nossa sociedade cada vez mais busque no entretenimento digital significados para a vida.

    Segundo McGonigal, na sociedade atual, os jogos de computador e videogames esto

    satisfazendo as genunas necessidades humanas que o mundo real tem falhado em atender

    (MCGONIGAL, 2012, p. 14).

    Entre essas necessidades a autora lista as recompensas, os ensinamentos, as

    inspiraes e o envolvimento voluntrio entre os jogadores. McGonigal aborda o conceito

    deflow experience(ver figura 1), aqui neste projeto apenas chamado de fluxo. Surgido em

    11 Training the Older Brain in 3-D: Video Game Enhances Cognitive Control Disponvel em .Acesso em: 20 abr. 2016.

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    1975 a partir do trabalho do psiclogo Mihly Cskszentmihlyi, definido pela sensao

    gratificante e empolgante da realizao criativa e do funcionamento elevado.

    (Cskszentmihlyi in McGonigal, 2012, p. 44).

    Entre os resultados encontrados, Cskszentmihlyi aponta que a vida cotidiana responsvel por um fluxo negativo, enquanto os jogos e atividades similares eram

    abundantes em fluxo positivo. Porm, como j apontava Huizinga sobre a necessidade de

    espontaneidade, era necessrio pratic-los por puro prazer, sem almejar status, dinheiro ou

    obrigaes.

    Figura 1. Flow experience

    Porm, segundo McGonigal (2012, p. 49), o fluxo que o psiclogo localizava em

    suas observaes ocorria em jogadores especialistas, profissionais, de xadrez, basquete e

    montanhismo. O fluxo era, tipicamente, o resultado de anos, se no de dcadas, de

    aprendizado da estrutura de uma atividade e do esforo das habilidades e destrezas

    exigidas. Ou seja, o fluxo no ocorria de forma automtica apenas a partir da prtica. Era

    necessria experincia e isso no era fcil de acontecer.

    McGonigal apresenta em seu trabalho o relato de David Sudnow, sobre suas

    memrias para tentar dominar um dos primeiros videogames domsticos: Breakout, jogo

    parecido com umpingpongpara o console Atari. O que Sudnow revela o rpido estado de

    fluxo que ele sentia ao jogar videogames: Tratava-se de um negcio completamente

    diferente, nada do que eu jamais conhecera, (...) trinta segundos de jogo e j estou

    inteiramente em outro estgio do meu ser, com todas as minhas sinapses em atividade

    (Sudnow, in McGonigal, 2012, p. 49). Para McGonigal, essa a potncia ldica dos jogos

    de videogame, ao conseguirem disparar e alcanar de forma quase instantnea o estado de

    fluxo.

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    Do zero experincia mxima em apenas trinta segundos no de surpreender queos videogames o tenham conquistado. Nunca antes na histria da humanidade esse tipode ativao emocional perfeita pde ser acessado de modo to barato, confivel erpido. (...) O que Sudnow descreve a extrema ativao neuroqumica que acontecenos crebros e corpos quando comeamos a jogar um bom jogo de computador ouvideogame. Ele estava intensamente focado, altamente motivado, criativamenterecarregado e trabalhando nos exatos limites de suas habilidades. A imerso era quaseinstantnea. O fluxo estava rpido e virtualmente garantido. (MCGONIGAL, 2012, p.49)

    Por um jornalismo engajado

    Os games parecem promissores meios de construo de significados. Porm

    importante ressaltar que esse projeto prope a investigao do jornalismo. Um jornalismo

    construdo a partir das ferramentas oferecidas a partir dos jogos digitais. Veremos no

    decorrer desse projeto de pesquisa, o trabalho da pesquisadora Nonny De La Pea. De La

    Pea considera que a proliferao de informao audiovisual tem transformado a audincia

    indiferente para temas preocupantes, como o sofrimento humano. Segundo Pea, um dos

    papeis do jornalismo de imerso poderia ser o de reinstituir o envolvimento emocional do

    pblico em eventos atuais.

    O que se busca no criar um produto jornalstico voltado nmeros de audincia

    como sinnimo de qualidade. H de se ter cuidado com erros j realizados em propostas deinovaes em jornais.

    Mais importante talvez o fato de que recuperar pblico por meio de melhoresnarrativas jornalsticas um objetivo difcil, demorado e custoso. [...] Quando aindstria da comunicao, a televiso sobretudo, tenta resgatar esse pblicodecrescente, geralmente o faz dando nfase a aspectos mais fceis de administrar aumento os oramentos de marketing, reduzindo custos, trocando ncoras ouconstruindo um novo cenrio de fundo dos noticirios. Quando os jornais comearam,nos anos 80, a tentar trazer de volta seu pblico, foram pelo mesmo caminho

    destaque no leiaute, desenho e cores. [...] Ningum estava pensando em reformular oenfoque narrativo para o noticirio (KOVACH & ROSENSTIEL, 2004, p. 235)

    A proposta adequar novas formas de narrativa que produzam um jornalismo que

    envolva seu pblico. O que se procura so formas de produo baseadas em ferramentas

    digitais para um produto jornalstico de anlise, de reflexo audincia. Um movimento

    que parte das prticas jornalsticas aplicadas aos recursos tecnolgicos dos videogames ser

    a base dessa proposta de pesquisa: o Jornalismo Imersivo. O jornalismo imersivo est

    relacionado ao desenvolvimento de sensaes aos usurios do que controle de personagens

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    ou tomada de decises. Diferentemente do suporte dosNewsgames, baseados em jogos com

    mecnicas simples tanto de produo quanto de interao, o jornalismo imersivo busca nos

    elementos da realidade virtual, fundamento principal em games mais complexos, para

    transmitir sensaes durante as narrativas aos usurios.

    Jornalismo imersivo

    O jornalismo imersivo, conforme define a pesquisadora e jornalista Nonny de La

    Pea, (2010) consiste em permitir audincia participar ou interagir em cenrios

    construdos a partir de imagens tridimensionais geradas por computador que recriam

    histrias a partir de notcias. Dentro dos ambientes virtuais, os participantes podem tanto ter

    a viso em primeira pessoa, ou seja, do ponto de vista normal, ou observar seus avataresdurante os acontecimentos. O jornalismo imersivo, alm de descrever fatos e

    acontecimentos, prope uma experincia em primeira pessoa das situaes contidas nas

    notcias. A narrativa jornalstica no ocorre a partir de reportagens ou entrevistas escritas,

    mas por meio experincia das aes.

    Entre os trabalhos j desenvolvidos por Pea, est Hunger in Los Angeles12, uma

    simulao em realidade virtual que prope uma viso sobre o problema da fome nos

    Estados Unidos. A recriao permite a uma testemunha ocular acompanhar os

    acontecimentos durante uma fila em um banco de alimentos. No decorrer da simulao,

    uma pessoa passa mal e o participante acompanha a agonia dos personagens virtuais

    durante a ao. Para isso, ela utiliza ferramentas de desenvolvimento de videogames, um

    sistema de rastreamento de corpo, culos de projeo que preenche todo o campo de viso

    do participante13, juntamente com udio para a construo de um mundo simulado

    totalmente imersivo14. Segundo Pea (2010), podemos localizar os conceitos do jornalismo

    imersivo tanto em obras literrias e tradicionais do jornalismo, como em materiais

    multimdia que envolvem o uso de vdeos, sons e fotografias, tambm chamados de

    narrativas imersivas.

    De La Pea considera que a proliferao de informao audiovisual tem

    transformado a audincia indiferente para temas preocupantes, como o sofrimento humano.

    Para Pea, um dos papeis do jornalismo de imerso poderia ser o de reinstituir o

    12Disponvel em . Acesso em: 20 abr. 2016.13Equipamentos com o objetivo de ampliar a imerso de jogadores por meio de culos que simulassem ambientes no souma novidade. Em 1995, a Nintendo lanou o Virtual Boy, console montado em uma plataforma em forma de culos sob

    um trip acompanhado de um joystick. O projeto no obteve sucesso em razo das deficincias da projeo em terceiradimenso do aparelho.14Para mais informaes sobre os trabalhos similares: www.immersivejournalism.com Acesso em 20 abr. 2016.

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    envolvimento emocional do pblico em eventos atuais. Pea considera o uso de

    videogames de forma positiva para o jornalismo, porm ela argumenta que os videogames

    representam uma ferramenta adequada para a transmisso de informaes cognitivas, mas

    no constituem um substituto de experincias fsicas em termos de respostas emocionais eviscerais conforme identificadas nos projetos que envolvem o uso da realidade virtual. Para

    Pen, h de se diferenciar entre jornalismo interativo (newsgames) e jornalismo imersivo

    (realidade virtual mediada pelo computador). De acordo com Pea, um dos aspectos

    fundamentais para o jornalismo imersivo est na reao dos participantes para situaes

    virtuais e eventos em que sabido que tal ao no real.

    Para trabalhar essas questes que envolvem os sentidos, o processo de produo do

    jornalismo imersivo se baseia em trs conceitos: 1) iluso de presena, 2) plausibilidade e,3) posse do corpo virtual. A iluso de presena a sensao de pertencer a um ambiente

    virtualmente renderizado mesmo sabendo que isso no ocorre de verdade. A plausibilidade

    fornece a sensao de algo que real e que no existe uma inteno de ser ficcional. De La

    Pea sugere que esse seja um dos principais fundamentos para as experincias do

    jornalismo imersivo. Por fim, o pertencimento ao corpo virtual a necessidade de existir

    do mundo virtual. Assim como o nosso corpo fsico fundamental para que participemos

    dos acontecimentos, necessrio um corpo virtual, ou avatar, nas experincias do

    jornalismo imersivo.

    A tecnologizao das emoes

    Sendo o jornalismo um campo produtor de textos com o objetivo fundamental de

    aproximao da realidade, ou fielmente obstinado pela construo do sentido de verdade em

    suas narrativas, conveniente e necessrio aproximar algumas articulaes tericas para os

    resultados de trabalhos de De La Pea. At o estgio atual da pesquisa, dois temas se

    mostram emergentes frente s necessidades, se no de oposio aos argumentos do

    jornalismo imersivo, servem como elementos de ancoragem para explorao desse novo

    campo de discursos. Primeiramente, parece se fazer necessrio o apontamento de prticas

    baseadas em um modelo de seduo, formado a partir da tecnologizao das emoes,

    conforme veremos em Oliveira (2010). Em segundo lugar, h de se aproximar as questes

    fundantes que envolvem as questes de verdade e realidade nos discursos do jornalstico.

    Em razo de tamanha construo terica envolvendo verdade e realidade, aqui nos

    basearemos nos pilares centrais discutidos e localizados em Gomes (2009.)

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    Partindo da aproximao que Mafesoli faz para construir o homo sensilis como o

    homem de afeto, de sensaes, de desejos e de paixes Oliveira aponta que a nossa

    civilizao se define por uma cultura de sentimento. Se amparando em Baudrillard, a autora

    acrescenta: Quando, em 1979, Baudrillard publicou la sducion, havia nele um j aintuio de que o sentimento dominava de algum modo a socialidade, determinada pela

    consumao de prazeres imediatos. Partindo desse princpio, a autora aponta, como

    determinante para esse fenmeno de realizao imediata, a seduo bem a expresso do

    nosso tempo. Ela a ordem dos objetos e da simulao, da iluso, e da aparncia.

    (OLIVEIRA, 2010, p. 85) Oliveira considera que a seduo onipresente no mundo ps-

    moderno, pertencendo aos espaos da moda, publicidade, nos discursos polticos, na

    aparncia dos objetos de consumo. Porm, segundo a autora, o que emerge de formadestacada o encontro da seduo pela tcnica e que parece ir de encontro s simulaes do

    real descritos no trabalho de De La Pea.

    uma excitao nova que deriva da quase fuso entre a mquina e os corpos, uma excitaoporm abstracta que d entrada a um tipo de sentir neutro ou impessoal. Nas palavras dePacheco Pereira, diramos que os aparelhos se esto a colar ao nosso corpo, a biologizar-se, adominar os nossos sentidos, diminuindo a capacidade de mediao. Estaro, no fundo, a sentir

    por ns e isso que torna o sentir impessoal. (OLIVEIRA, 2010, p. 86)

    No campo jornalstico atual, no h grandes margens que possam afastar o cenrio

    descrito por Oliveira. A produo de notcia a partir da reproduo de cmeras de vigilncia

    e de material coletado em redes sociais, por exemplo, presentes em todos os meios sejam

    eles analgicos ou digitais, parecem ser elementos constitutivos desse ambiente de seduo

    travestido pela informao. A notcia hoje parece operar em opostos completos, que ora

    enaltecem as grandes conquistas, as alegrias, e ora relatam as grandes tragdias, a dor, a

    morte. Sinal dos tempos, a maquinao emotiva da informao diz bem o que a tecnologia

    tem feito nas nossas paisagens interiores ao sentimento: desloca-o, f-lo viajar, percorrer e

    explorar o sentimento alheio, subvertendo a lgica que acentuaria o habitar, o morar, o

    residir (OLIVEIRA, 2010, p. 92).

    Certamente o fenmeno da sensao na notcia pertinente nos discursos em geral

    das mdias, seja essas voltadas informao ou entretenimento. Porm, parece-nos que

    nessas fronteiras cada vez mais prximas entre tcnica e sentido, fundamental aproximar

    pilares pertencentes ao jornalismo. Desse modo, partimos de uma definio que nos parece

    bastante clara entre os limites e deveres no campo do jornalismo e seu compromisso com averdade.

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    No h notcia sobre a qual no se imponha legitimamente uma obrigao de veracidade; alis,s notcia um ato verbal que comporte uma pretenso de ser verdadeiro. Uma sentena poticano pode mentir ou enganar, uma prece pode ser insincera, mas no pode ser errada, enquantouma notcia pode ser mentirosa ou falsa. Portanto, pode tambm ser verdadeira, ao contrrio da

    poesia ou da prece, que no tem consigo obrigaes de dizer como a realidade . S o que podedizer a verdade pode mentir, e verdade e falsidade no tem a ver com toda espcie de fala, massomente com aquele tipo que pretende dizer alguma coisa sobre a realidade. A notcia, e no a

    poesia ou a prece, um discurso deste tipo. (GOMES, 2009, p. 11)

    Gomes nos parece elucidativo ao nos apontar para a base fundamente, determinada

    pela necessidade de rigor dos fatos. Esse rigor, se respeitado na essncia do fazer

    jornalstico, no nos parece impeditivo de produzir novas linguagens a partir dos sentidos.

    Como bem aponta Oliveira, a seduo est presente em campos alm do d comunicao.

    Nos parece que esse formato de seduo no pertena somente ao campo das novas

    tecnologias, mas talvez transite mais fortemente no campo dos estilos narrativos. No caso

    do jornalismo, poderamos citar o chamado Novo Jornalismo como exemplo de

    transformaes aos quais as marcas dos estilos nos influenciam at os dias de hoje.

    Um novo Novo Jornalismo?

    Em Radical Chique e o Novo Jornalismo Tom Wolfe faz uma srie apontamentos

    a respeito do surgimento do New Journalism, um movimento surgido no final dos anos1960 em que os jornalistas comearam a se utilizar de tcnicas do realismo literrio para a

    produo das reportagens. Wolfe (2005, p. 53) apresenta quatro recursos responsveis pelo

    poder extraordinrio do Novo Jornalismo: 1) Construo cena a cena; 2) registro dos

    dilogos completos; 3) ponto de vista em terceira pessoa 4) e o registro de hbitos, maneiras

    costumes e outros detalhes simblicos do dia-a-dia que possam existir dentro de uma cena.

    Os quatro pontos detalhados por Wolfe parecem alinhados aos recursos necessrios e

    possveis a partir do jornalismo imersivo. Outros pontos observados por Wolfe apontampara semelhanas e caminhos de partida para exploraes entre a produo jornalstica e os

    games.

    Neste Novo Jornalismo no h regras sacerdotais; em nenhum caso. Se o jornalistaquer mudar o ponto de vista da terceira pessoa para o ponto de vista da primeira pessoana mesma cena, ou entrar ou sair dos pontos de vista de diferentes personagens, ou atda voz onisciente do narrador para o fluxo de conscincia de alguma outra pessoa (...)ele simplesmente faz isso. (WOLFE, 2005, p. 57)

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    Certamente, com essa pretensiosa aproximao entre os objetos dessa proposta e o

    Novo Jornalismo, no se prope a elenc-los, ou pensar em sugeri-los como mais uma

    frmula para tentar salvar o jornalismo. De maneira alguma. O objetivo comear a

    trilhar novas formas que deem conta dos problemas que a produo de notcias enfrenta,principalmente em sua essncia: a reportagem jornalstica. Mas alm de tentar resgatar a

    produo da notcia e da reportagem, tambm importante contextualizar essas evolues

    da tecnologia e das possibilidades da narrativa como uma legtima ferramenta para a

    pluralidade dos fatos e verses que cercam o acontecimento. Assim como sugere Murray,

    sobre as diversas perspectivas que compreendem um mesmo acontecimento.

    Reconstituir a situao a partir de diferentes perspectivas leva a um contnuoaprofundamento da compreenso do leitor sobre o ocorrido, aprofundamento esse quepode resultar num sentimento de resoluo capaz de levar em conta a complexidade dasituao e de manter o momento do choque inalterado e ainda central (MURRAY,2003, p. 135).

    A imerso em ambientes virtuais

    Karl Kaap, autor que trabalha fundamentalmente com os elementos da

    Gamificao15, traz em uma de suas obras um exemplo que servir como ponto de partida

    para a compreenso da imerso nos games que se prope a ser transportada para o campo

    jornalstico.

    Quando voc joga Uncharted 3 no Playstation 3, voc no diz ao Nathan Drake[protagonista e personagem controlvel] para que ele atire, voc no aponta para ondeele deve ir, e voc no d comandos a ele para seguir. No, voc no controla NathanDrake porque voc Nathan Drake! Por operar o personagem no jogo, voc aprende asregras do mundo que voc est habitando naquele momento. (...) O ambiente [domundo virtual] pacientemente ensina voc como Drake de se comportar e quais aes eatividades tem sentido para o desenvolvimento do jogo. (KAAP, 2012, p. 70)

    Kaap considera que o jogador, ao participar de um estado de imerso a partir do

    fluxo proporcionado pela experincia de fantasia, assume no o controle de um

    personagem, mas transforma-se no personagem do jogo. Como apontado por essa viso,

    no ficaria ento o jogador determinado pelo mundo ao qual ele agora faz parte? Estaria o

    15Gamification ou gameficao a utilizao de elementos de jogo e tcnicas de design de jogos em contextos de no-

    jogos. Exemplo: Um software que calcula a distncia percorrida de um corredor, gerando informaes de feedbackdinmicas e que podero ser utilizadas posteriormente para melhorar o desempenho desse atleta. Usa os recursos dos jogos(recompensa, feedback, esforo espontneo) para a realizao de tarefas que no so jogos.

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    jogador confinado a atividades exclusivas do jogo? E quanto ao que foi abordado a respeito

    da narrativa emergente?

    Fragoso (2013) ir reunir uma srie de colocaes de autores que iro trabalhar o

    jogador no enquanto a metamorfose digital para com o personagem controlvel, massendo o jogador um ator criativo dentro da narrativa. A partir do termo suspenso de

    descrena, usado de forma mais frequente, segundo Fragoso, para representar o abandono

    da capacidade crtica diante do apelo imersivo de universo ficcional, Fragoso aponta: a

    fruio de qualquer produto miditico sempre um ato criativo (Fragoso, 2013. p.6). Se

    amparando no trabalho de Salen e Zimmerman (2004), responsveis por uma das principais

    obras dos estudos em games, Fragoso aponta

    A despeito do excessivo peso da associao entre essa ideia de imerso como umafalcia e um entendimento simplista da suspenso voluntria de descrena, precisoreconhecer que a perspiccia dos autores que entendem que o envolvimento com osgames envolve um estado de dupla conscincia em que o jogador est plenamenteconsciente da artificialidade da situao do jogo (SALEN e ZIMMERMAN, 2004, in.Fragoso, 2013).

    Fragoso tambm sugere caminhos para a compreenso dos jogos enquanto

    ambientes de experincias. Tomando o trabalho de Oldenburg e sua organizao dos trs

    reinos de experincias, Fragoso ir trabalhar os conceitos os multiplayer games como

    terceiro lugares, ou seja de sociabilidade inclusiva.

    Permanentemente e ubiquamente disponveis e balizados pela caracterizao de umuniverso ficcional de fundo claramente estabelecido e destinado fruio ldica, osgames online caracterizam-se como novos espaos privilegiados para a emergncia deum novo tipo de sociabilidade, que atende demanda por interaes interculturais pelapopulao cosmopolita contempornea. (FRAGOSO, 2007, p. 44)

    H ainda que se trabalhar as questes de interface dentro do jogo e fundamentaispara a experincia narrativa. Localizaremos em Nitsche (2008) a ideia de planos que

    compe a relao entre jogo e jogador. De acordo com o autor, eles esto divididos em

    cinco ambientes: 1) As regras ou leis que estabelecem elementos relativos fsica do

    mundo virtual, das inteligncias artificiais e limites dos nveis do game; 2) A mediao:

    aquilo que apresentado ao jogador e ser responsvel pela imerso do jogador no universo

    virtual; 3) A fico: ou local de criatividade na mente dos jogadores, e portanto algo

    subjetivo e individualizado entre cada tipo jogador; 4) O espao: Local em que se d o jogoe 5) O social: Quando existe interao com outros players, seja por jogar ao lado de uma

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    segunda pessoa ou compartilhar experincias em locais distantes, muito frequentes nas

    partidas multiplayer.

    BIBLIOGRAFIA CONSULTADA

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